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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ


UNIVERSIDADE DO ESTADO DO AMAZONAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E
MATEMÁTICA
REDE AMAZÔNICA DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

MARISE PIEDADE CARVALHO

FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE FÍSICA: concepções de ciência e


práticas formadoras no curso de Licenciatura para o século XXI

BELÉM-PA
2019
MARISE PIEDADE CARVALHO

FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE FÍSICA: concepções de Ciência e práticas


formadoras no curso de Licenciatura para o século XXI

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em


Educação em Ciências e Matemática da Rede
Amazônica de Educação em Ciências e Matemática -
REAMEC – UFMT – UFPA – UEA, Polo UFPA, como
requisito para obtenção do título de Doutora em
Educação em Ciências e Matemática.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Rosália Maria Ribeiro de


Aragão.

BELÉM-PA
2019
LISTA DE SIGLAS

ATD Análise Textual Discursiva


CEA Casa de Educandos Artífices
CEFET-MA Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão
CNE Conselho Nacional de Educação
CP Conselho Pleno
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
DEFIS Departamento de Física
DHS Departamento de Ciências Humanas e Sociais
EAC Escola dos Aprendizes Artífices
IFMA Instituto Federal do Maranhão
IES Instituição de Ensino Superior
IFs Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC Ministério da Educação
OMS Organização Mundial de Saúde
ONU Organização das Nações Unidas
PNAD Programa Nacional por Amostras de Domicílio
PIBID Programa Institucional de Bolsa de iniciação à Docência
PNE Plano Nacional de Educação
PPC Projeto Pedagógico de Curso
REAMEC Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática
SETEC Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
Ao meu Deus, de puro e incondicional amor aos
filhos e filhas da Terra que me permitiu fazer este
percurso, até o final da tessitura desta Tese.

Ao meu Pai, ALTAMIR DA SILVA CARVALHO,


em memória.

Por endurecer quando foi preciso, ensinando-me


desde cedo que nada seria fácil, mas que tudo é
possível quando nos determinamos.

À minha Mãe, SOFIA PIEDADE CARVALHO,


em memória.

Pela ternura e brandura desde a primeira minha


espera. Por introduzir-me no universo das letras,
com as quais, desde então passei a fazer a leitura
das lições do mundo.

À minha filha Brenda. Pela doçura e paciência


com que entendeu as minhas ausências maternais
nos momentos em que me requisitava e não era
possível atendê-la.
AGRADECIMENTOS

A palavra gratidão é de origem latina gratus, que pode ser interpretada como
agradecimento, reconhecimento ou grato. Grata, esse o sentimento que tenho por tantos
quantos fizeram dessa caminhada um percurso de conquistas, atingindo o final de um trajeto
com muitos dias e horas de total entrega, num espaço de tempo com aprendizado único e
variadas emoções em que esteve envolvido esse itinerário, até que alcançasse o meu
propósito. Pelo fato de ter dividido esses momentos com tantas pessoas, e delas receber o
apoio e solidariedade, desejo agora agradecer a todas elas, e se por ventura a memória me
trair, não permitindo que eu faça o reconhecimento de algumas delas, desejo que estejam
certas da minha profunda gratidão.
Aos meus irmãos e irmãs, pelo companheirismo e zelo com afeto, durante o
tempo que durou a minha caminhada.
À professora Rosália, por ter aceito a responsabilidade de orientar-me e contribuir
com seu olhar para a arquitetura desta obra.
Aos colegas do Departamento de Ciências Humanas e Sociais – DHS/IFMA, pelo
incentivo, espírito solidário, possibilitando que desse um passo à frente, na minha carreira
profissional, e acima de tudo, por acreditar que a qualificação de cada um dos colegas,
representa a elevação da grandeza do trabalho de todos na formação dos novos professores.
Aos Professores do Departamento de Física (DEFIS) do Instituto Federal do
Maranhão - IFMA, pela acolhida do projeto de pesquisa desde o primeiro momento de sua
apresentação ao coletivo de professores, assim como a disponibilidade e solidariedade ímpar
de colaborar com a pesquisa.
À Reitoria do IFMA, à Pró-reitoria de Pesquisa, Pós-graduação e Inovação, e à
Diretoria Geral do Campus São Luís - Monte Castelo, meus agradecimentos pelo incentivo a
formação.
À Coordenação Geral do Programa de Pós-graduação em Educação em Ciências e
Matemática –REAMEC e toda a equipe de docentes pesquisadores, pelo compromisso com a
qualificação dos professores das universidades públicas de nossa região, somando esforços
para o desenvolvimento da pesquisa e da Educação em Ciências e Matemática.
À Professora Terezinha Gonçalves e Professor Licurgo Brito, pela dedicação e
competência na coordenação do programa da REAMEC, Polo UFPA.
Aos professores e professoras do programa, em especial os do Polo UFPA, pela
partilha de conhecimentos e experiências acadêmicas na área das ciências e da matemática.
Aos colegas do doutorado, Turma REAMEC, 2015, Polo UFPA, pela união
fraterna cultivada por todos e todas entre si, com a minha saudade dos amigos (as),
Aos amigos José Costa, Eliane, Regiana, cujos laços de amizade se fortaleceram
no percurso da construção da TESE e à Lourimara e Jacirene, irmãs, fruto de uma amizade
consolidada no doutorado e que levarei comigo indefinidamente.
“A ciência pode classificar
e nomear os órgãos de um sabiá,
mas não pode medir seus encantos.
A ciência não pode calcular
quantos cavalos de força existem
nos encantos de um sabiá.
Quem acumula muita informação
perde o condão de adivinhar: divinare.
Os sabiás divinam.”

(Manoel de Barros)
RESUMO

Esta tese trata da configuração do processo de formação inicial de professores de Física, no


curso de Licenciatura do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão
(IFMA), Campus São Luís, Monte Castelo. Esta experiência surge de um interesse particular
que assumo como problema para dar origem à pesquisa em que busco investigar concepções
de ciência e de práticas de ensino formadoras que se manifestam no curso de Licenciatura em
Física do IFMA para este século XXI. Sustento a tese de que as concepções de Ciência e de
práticas de formação de licenciados em Física implicam pressupostos teórico-metodológicos e
epistemológicos que tendem a aproximar-se da educação para este século XXI. Desenvolvi
uma pesquisa qualitativa de abordagem narrativa com o objetivo de compreender tais
concepções. Além disso, com o propósito de apreender a realidade do objeto investigado
realizei pesquisa bibliográfica e empírica. Para fundamentar a pesquisa busquei
conhecimentos da Filosofia, da História da Ciência, do Ensino da Física, da Educação e
Sociedade, dos Saberes Docentes e da Formação de Professores, estabelecendo permanente
diálogo com as histórias e relatos das experiências dos professores no curso de Física do
IFMA, entre os quais me incluo. Desenvolvi revisão documental, consultando o Projeto
Pedagógico do Curso, Pareceres e Resoluções alusivos à licenciatura em Física, de caráter
nacional e institucional. Na pesquisa empírica fiz uso dos seguintes procedimentos
metodológicos:(i) entrevistas semi-estruturadas e (ii) anotações em diário de campo durante as
reuniões de trabalho realizadas pela Comissão de Reformulação do Projeto Pedagógico do
Curso (PPC) do qual participei. Foram entrevistados 16 professores (as) sendo 14 das
disciplinas da área científica e 2 da área pedagógica, os quais foram selecionados a partir dos
seguintes critérios: (a) ser professor do quadro permanente da instituição; b) estar em pleno
exercício da docência no curso; c) ter vinculação com a história da criação do curso e o
presente da formação de professores de Física, além de d) disponibilizar-se a participar como
sujeito da pesquisa proposta. O material empírico coletado foi analisado reiteradas vezes com
rigor científico, utilizando procedimentos e critérios da Análise Textual Discursiva. No
processo de análise dos dados foi possível apreender sentidos e significados que expressam
aproximação e distanciamento de concepções de Ciência usuais, e implicações teórico-
metodológicas e epistemológicas na prática formadora atinente à educação para este século, as
quais se encontram discutidas em três categorias, quais sejam: (i) Concepções de Ciência e
formação de professores de Física para o século XXI; (ii) Currículo da Licenciatura em
Física e a Educação para o século XXI e (iii)Modelo de professor de Física e de prática
formadora para a Educação neste século. Os resultados das análises apontam concepções de
Ciência e de práticas formadoras reveladoras de teorias, epistemologias e princípios de
formação, que se distanciam e se aproximam da educação para este século, na perspectiva em
que se concebe o professor consoante com as mudanças que a sociedade contemporânea
exige. Conceitos, pressupostos e proposições de Currículo, assentados no modelo da
racionalidade técnica, derivado do positivismo dominante emergem das representações dos
formadores, como também críticas epistemológicas e propostas de ações potencializadoras de
práticas formadoras reflexivas, críticas e transformadoras. O destaque é relativo ao trabalho
coletivo e à formação continuada, bem como a expectativas de reestruturação da política de
formação e da prática pedagógica qualificadora do processo formativo. O modelo de professor
de Física e de prática formadora comparece com bases conservadoras, dominantes, mas se
pode apreender potencialidades pedagógicas de formação do professor de Ciências/de Física
que se ponha nas dimensões técnica, política, ética, estética e cidadã.

Palavras-chave: Formação de professores. Ciência e Educação para o século XXI. Práticas


pedagógicas do ensino de Física. Questões epistemológicas do ensino de Física.
ABSTRACT

This thesis deals with the configuration of the process of initial training of Physics teachers,
in the course of Teaching Training of the Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Maranhão (IFMA), Campus São Luís, Monte Castelo, Estado do Maranhão – Brazil. This
experience arises from a particular interest that I assume as a problem to give rise to the
research in which I seek to investigate conceptions of science and of teaching practices that
are manifested in the training of Physics teachers in Physics of the IFMA consonant with this
XXI century. Simple the thesis of that the conceptions of Science and of teaching practices
expressed by the professors in the course in Physics of the IFMA imply theoretical-
methodological and epistemological presuppositions for the education of this XXI century. I
developed a qualitative narrative approach research with the objective to understand the
conceptions of Science, which interwoven epistemological bases and theoretical and
methodological assumptions in the training practice of the undergraduate course in Physics. In
addition, in order to grasp the reality of the object I was willing to investigate I carried out
bibliographical and empirical research. In order to support the research, I sought knowledge
of Philosophy, History of Science, Teaching of Physics, Education and Society, Teaching
Knowledge and Teacher Training establishing a permanent dialogue with the stories and
reports of teachers' experiences in the Physics of the IFMA, among which I am included. I
developed documentary revision, consulting the Pedagogical Project of the Course, Opinions
and Resolutions allusive to the degree in Physics, of national and institutional character. In the
empirical research I used the following methodological procedures: (i) semi-structured
interviews and (ii) field diary entries in the meetings held during the work to reformulate the
Pedagogical Project of the Course (PPC) of which I participated. We interviewed 16 teachers
14 from the scientific area and 2 from the pedagogical area who were selected based on the
following criteria: (a) to be a professor of the institution's permanent staff; b) be in full
exercise of teaching in the course; c) be linked to the past and present history of the course,
and d) to be willing to participate as a subject of the proposed research. The collected
empirical material was analyzed several times with scientific rigor using procedures and
criteria of the Discursive Textual Analysis. In the process of data analysis it was possible to
perceive meanings and meanings that express the approximation and distancing of usual
conceptions of Science and theoretical-methodological and epistemological implications in
the educational practice related to education for this century, which are discussed in three
categories, which are: (i) Conceptions of Science and training of Physics teachers for the 21st
century; (ii) Curriculum of the Degree in Physics and Education for the 21st century and (iii)
Model of teacher of Physics and training practice for Education in this century. The results of
the analyzes obtained as a result of the Textual Analysis point to conceptions of Science and
formative practices revealing theories, epistemologies and principles of formation, which
distance themselves and approach education for this century, from the point of view of the
teacher consonant with the changes that contemporary society demands. Based on the model
of technical rationality derived from dominant positivism, concepts, presuppositions and
propositions of curriculum emerge from the representations of the trainers, as well as
epistemological critiques and proposals for actions that empower reflective, critical and
transformative formative practices. The emphasis is on collective work and on-going training,
as well as the expectations of restructuring the training policy and the pedagogical practice
that qualifies the training process. The model of teacher of Physics and of formative practice
appears with conservative, dominant bases, but one can apprehend pedagogical potentialities
of the teacher of Sciences / Physics that is put in the technical, political, ethical, aesthetic and
citizen dimensions.
Keywords: Teacher training. Science and Education for the 21st Century. Pedagogical
practices of the teaching of Physics. Epistemological questions of Physicsteaching.
SUMÁRIO

ESTA TESE E EU... ............................................................................................................... 13


ALGUMAS PRELEÇÕES INTRODUTÓRIAS DA PESQUISA ..................................... 16
PARTE I - DA SALA DE AULA AO OBJETO DE INVESTIGAÇÃO ........................... 26
PARTE II - O PERCURSO METODOLÓGICO NO PROCESSO INVESTIGATIVO 45
O Lócus e os Sujeitos da Pesquisa ......................................................................................... 55
PARTE III - ESTEIOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA
CIÊNCIA, DA PRÁTICA DOCENTE E DA EDUCAÇÃO PARA O SÉCULO XXI .... 72
Concepções de Ciência: construções historicamente situadas ............................................ 72
A Prática e a Formação do Professor de Física: relações e implicações com o contexto, o
pensar simplificador e o pensar complexo ........................................................................... 84
Cenários da Educação e da Formação de Professores no e para o Século XXI ................ 96
PARTE IV - NO CONTEXTO DA LICENCIATURA EM FÍSICA DO IFMA:
CONCEPÇÕES DE CIÊNCIA E DE PRÁTICAS FORMADORAS PARA A
EDUCAÇÃO NESTE SÉCULO ......................................................................................... 108
Sentidos e Significados na Formação dos Professores de Física do IFMA para a
Educação do Século XXI ...................................................................................................... 111
Concepções de Ciência e a formação de professores de Física para o século XXI ......... 113
Currículo da licenciatura em Física e a Educação para o século XXI ............................ 132
Modelo de professor de Física e de prática formadora da Educação deste século ......... 148
CONCLUIR É PRECISO .................................................................................................... 167
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 174
13

ESTA TESE E EU...

Em verdade, no princípio houve Caos, mas depois veio


Gaia (Terra), de amplos seios, base segura para sempre
oferecida a todos os seres vivos, [para todos os Imortais,
donos dos cimos do Olimpo nevado, e o Tártaro
(Abismo) brumoso, no fundo da Terra de grandes
sulcos] e Eros, o mais belo entre os deuses imortais, o
persuasivo que, no coração de todos, deuses e homens,
transtorna o juízo e o prudente pensamento.
(Andery)

Ao principiar a apresentação desta investigação, ao tempo de transcrição dos meus


pensamentos, compreensões, do expressar significados e sentidos próprios acerca do objeto de
pesquisa em que está circunscrita esta tese, me ocorreu a ideia de dedicar algumas linhas para
expressar o meu estar em cada etapa dessa construção. Considerando a epígrafe que abre essa
tessitura, cotejaria esse processo metaforicamente, ao Caos, mas logo, aos poucos, surge Gaia,
‘base segura para sempre oferecida a todos os seres vivos’, aqui concebida como o momento
em que passo a desfrutar da firmeza da caminhada sobre o solo da compreensão, do pedaço do
universo que delimitei para este estudo e apreendi com o meu olhar, percebendo tantos outros
sentidos.
Por maior que tenha sido o meu esforço em descrever esse momento do gestar
ideias, percepções, vislumbrar sentidos e significados à luz da razão, não consegui, por certo,
expressar de todo o real que foi vivido. O previsível e o imprevisível. Trata-se de uma
experiência única e incomparável, o compartir da riqueza de saberes e sentimentos projetados
dos sujeitos com quem vivi e transcorri esse processo no percurso da investigação. Não
menos desafiadora foi a caminhada solitária no encontro com os sujeitos de pesquisa. À
medida que me aproximava dos seus relatos e histórias, percebia que surgia, na fala deles,
muito da minha própria história de vida relativa ao percurso laboral. As memórias das
experiências dessas pessoas nos espaços e tempos em que foram vividas trazem ao presente o
partilhar das suas histórias de dedicação ao trabalho de formação de professores de Física e
constituem para mim ricas experiências sobre as quais me debrucei, propondo-me
compreendê-las em processos, relações e intenções.
Desse estar nas questões iniciais da tessitura da tese me ocorreu representá-la
trazendo o mito que, na visão dos gregos, é uma narrativa sobre a origem de alguma coisa
com conotações de irrealidade, por alguém que viveu ou testemunhou o fato ou o recebeu de
quem viu ou viveu a experiência (CHAUÍ, 1997). No fascínio que tenho pela mitologia grega,
14

ainda que seja por leituras secundárias, compararia o início dessa experiência de construção
da minha tese, como dito antes, ao mito do caos, guardadas as devidas proporções e
comparações.
O movimento que descrevo como análogo ao caos remete a uma das canções de
Hesíodo, na qual este descreve a genealogia do mundo, decorrente das relações amorosas
entre forças divinas e das lutas entre os deuses, gerando outros deuses, seres humanos,
animais e plantas, conhecidas como a Teogonia de Hesíodo. Traduzido por Fernandes (2011,
p.1) vale a pena destacar o seguinte:
No princípio, era o Caos (Kháos). O abismo cego, escuro e ilimitado. A total
ausência, um vazio primordial. Isto é instigador. O que pode surgir de um abismo
cego, escuro, ilimitado? Surge a Terra (Gaia) do seio do Caos. De alguma forma,
Gaia representa um contrário de Caos, já que é presença. Uma presença distinta,
uniforme, precisa.

O abismo cego, escuro e ilimitado representa as tensões usuais advindas do


processo da organização mental, intercalando momentos de um vazio-ausência de percepção
dos sentidos, aos quais se seguiam outros de compreensão e explosão de ideias, de intensa luz.
De momentos de certezas e incertezas, de impressões e evidências. Desse fluxo contínuo, flui
esta minha experiência como pesquisadora neste trabalho, na busca de compreender a
concepção de Ciência e pressupostos teórico-metodológicos adotados pelos professores de
Física em suas práticas formadoras no curso de licenciatura do IFMA, consoantes com uma
educação para o presente século.
Em momentos como em meio à exposição das narrativas, abordagem escolhida
para o arranjo desta tese, meus sentidos paralisavam-se por completo na interpretação dos
dados, representando o Caos, a desordem. Parecia difícil ou complexo demais articular
começo, meio e fim daquilo que desejava expressar. Muitas vezes, entretanto, me via no
entrelaçamento do passado-presente, com o presente desenhando um futuro ainda embaçado
ou totalmente sem luz. Descrever esse momento de profundas reflexões com os meus sujeitos
e de reflexões comigo mesma sobre o objeto de estudo e de investigação delineado foi um
assumir, de certa forma, vale insistir, aspectos de caos.
Numa comparação metafórica, os dados da pesquisa, como partes que se
desprendem do caos, constituem o corpus desta pesquisa, transcritos e interpretados. Assim, o
que no início parecia não se ligar, ao se juntar gesta novos significados e (como os filhos de
Gaia) foi de parte em parte tecendo e libertando o novo sentido que estava aprisionado na
busca.
15

Esta narrativa, pois, não se concretizou de imediato, cumpriu uma trajetória de


profundas reflexões e uma espera paciente. Cada fala, cada ideia, cada pensamento, é como se
fosse uma vida gestada, o instante que surge Gaia (a Terra) como ‘ordem’ na ‘desordem’ do
caos. Produto do momento em que ouvi, coletei e reuni histórias de formação e sentidos
aprisionados nos relatos dos professores e de outros. Gaia, quando foi possível revelar,
interpretar, opinar, discutir, perceber e apreender os sentidos e significados ocultos nas vozes
daqueles que constroem esta narrativa junto comigo.
As noções de desordem do Caos (Kháos) e de ordem do Cosmos (Kósmos)
simbolizaram essa construção em que se configura a tese que ora passarei a apresentar.
Conferir sentido à desordem (desconstrução dos dados da pesquisa) e à ordem (processo de
categorização) implica a primazia de atribuição de novos significados, àquilo que buscava
apreender do tema que elegi, qual seja, o da Formação de Professores de Física privilegiando
concepções de Ciência e práticas formadoras no curso de Licenciatura para o século XXI.
A desordem transformada em ordem é o que transcrevo nesta narrativa.
16

ALGUMAS PRELEÇÕES INTRODUTÓRIAS DA PESQUISA

[...] Mas em uma sociedade na qual as mudanças mais importantes se produzem por
meio da deliberação coletiva e onde as revalorações devem basear-se no consentimento e
na compreensão intelectual, se requer um sistema completamente novo de educação; um
sistema que concentre suas maiores energias no desenvolvimento de nossos poderes
intelectuais e dê lugar a uma estrutura mental capaz de resistir ao peso do ceticismo e de
fazer frente aos movimentos de pânico quando soe a hora do desaparecimento de muitos
dos nossos hábitos mentais.
(Karl Mannheim)

Propositadamente nomeei esta seção com o título discriminado acima.


Comprometo-me a ser fiel a ele, trazendo algumas falas tão somente. As páginas que
completam este estudo, na sequência, permitirão ao leitor (a) aprofundar o conhecimento em
torno do objeto desta investigação. Assim, pensando o conteúdo da introdução/apresentação
desta pesquisa intencionei poupar os leitores (as) do cansaço, neste primeiro contato com o
estudo, em ter acesso a tudo que conheceriam ao se debruçarem sobre a tese. Ocorreu que
seria oportuno caminhar com o leitor situando-o rapidamente sobre as partes em que dividi o
tema, inscritas no contexto da conjuntura política e social originada nas décadas finais do
século passado, mas também sobre o alicerce teórico sobre o qual construo a pesquisa, que
apresento a seguir.
As duas últimas décadas que se avizinham ao presente século foram palco de
profundas e radicais mudanças. Sob fortes pressões externas e redirecionamentos políticos
internos, este País caminhou em direção a uma ampla reforma, sob inspiração de uma
democracia brasileira, fase denominada por Diniz (2003) como a de uma ruptura da ordem
econômica e política, anteriores à década de 90. Não foi preciso muito tempo para a realidade
da “nova república” mostrar a face sombria do modelo econômico que a sustentou/sustenta.
Os programas de estabilização da economia nacional decididos pelas elites dirigentes em
meados da década de 901 até o limiar do século XXI ocorreram mediante numerosas reformas,
com foco no mercado, intensificação das privatizações, liberdade comercial e abertura do
mercado brasileiro subordinando ao capital financeiro internacional. Todas essas medidas
afinadas a uma política econômica neoliberal geraram consequências previsíveis e

O período a que nos referimos o Brasil foi governado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso – 1995 a
1

2003. Sociólogo de formação e cientista político. Por suas atividades políticas na época da ditadura foi exilado,
vivendo esse tempo no Chile e na França.
17

imprevisíveis, caracterizando o caos social2, as quais refletiram/refletem sobre o cenário


educacional do país.
Em se tratando do setor educacional, as mudanças desenhadas no corredor das
reformas certamente não trouxeram o novo sistema educacional como era esperado pelos
educadores que defendiam o projeto da democratização do ensino e da educação básica. Isso
porque os interesses recepcionados no seio das políticas decorrentes das reformas, via de
regra privilegiam as exigências do processo de produção capitalista em sociedades como a
brasileira, que em cada momento da história se renova. Com esse propósito, a Educação não
necessitaria ir além do caráter informativo e limitado (TONET, 2016).
Nesse sentido é que, historicamente, as políticas educacionais apresentam-se
vinculadas às políticas de desenvolvimento econômico, sendo as de formação de professores
parte desse contexto, contrariando as aspirações de uma educação verdadeiramente
democrática. A reforma educacional brasileira na década de 1995, pautada nas diretrizes de
agentes financeiros como o Banco Mundial, elegeu inúmeras ações no campo da educação:
financiamento, formação de professores, currículo, avaliação e gestão, deixando, porém,
deixaram de ampliar os recursos financeiros para execução das políticas (LIBÂNEO;
OLIVEIRA; TOSCHI, 2012). Nem reformas, nem mudanças se concretizaram.
Entendo com educadores pesquisadores que as mudanças necessárias nesse campo
não decorrerão exclusivamente por conta das reformas, como entendo ainda que a
democratização da educação/ensino passa pelos professores e por sua formação, a fim de que
se cumpra o papel de educar crianças e jovens de modo a desenvolverem-se em suas
dimensões humana, cultural, científica e tecnológica. Pesquisas em educação têm apontado o
desafio que os professores enfrentam há décadas para cumprir a parte que lhes cabe nesse
projeto. Faltam condições de trabalho, recursos, projetos de formação inicial e continuada
consoante com as necessidades dos educandos nas escolas públicas, e principalmente de
investimentos na profissionalização dos professores sobre bases epistemológicas que confiram
identidade à docência, construída sobre saberes e conhecimentos específicos do seu campo de
ação (PIMENTA; LIMA, 2012).

2
O caos social na forma como o compreendo em nosso contexto social à época, revela-se como expressa Diniz
(2003, p.2) “[...] para além das mudanças, cuja relevância não podemos subestimar, observou-se uma alta
continuidade no que diz respeito ao quadro social do país, marcado pelo aprofundamento da desigualdade, da
violência e da concentração da renda, barreira que nos força a adiar ao infinito a meta da inclusão no seleto
clube dos países desenvolvidos. Efetivamente, a grande lacuna de nosso percurso histórico está representada
pela incapacidade dos governos de reduzirem a exclusão social e o grau extremo de iniquidade característicos da
sociedade brasileira.”
18

Com o olhar aproximado para a História, fica fácil compreender o fenômeno


educativo, incluindo a formação de professores, a partir das relações que se estabelecem entre
educação e sociedade (SAVIANI, 1997, 2017). Desse modo é possível perceber o discurso
falacioso dos reformadores engajados nas esferas governamentais, tratando a educação como
alavanca do desenvolvimento e concretamente nenhum investimento compatível com a
realidade educacional sendo efetivado. Além de conceberem a Educação como meio ignoram
os próprios objetivos do setor educacional que deveriam estar voltados para o
desenvolvimento dos educandos, investindo nos poderes do intelecto da nova geração para o
novo século, através de uma boa formação de professores, na perspectiva da construção de
uma sociedade mais humana e justa.
Paralelamente aos problemas históricos da educação escolar e da democratização
do ensino, a Ciência avança no processo da produção do conhecimento e da inovação
tecnológica, consequência do progresso científico. Amplia-se o capital cultural da
humanidade, mas o acesso ao conhecimento permanece restrito a uma classe social
privilegiada com educação de qualidade, enquanto a maioria de crianças e jovens de classe
pobre e miserável, têm que se adaptar às precárias condições de ensino e aprendizagem nas
escolas públicas, abandonadas pelas políticas governamentais. Até o ano de 2013, segundo
dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) – Síntese de Indicadores
2015, pouco mais da metade da população brasileira possuía acesso à internet. A ciência
avança, a tecnologia progride, contraditoriamente, gerações de crianças e jovens dentro e fora
das escolas permanecem à margem dos benefícios produzidos pela ciência e tecnologia.
O século XXI nasce, portanto, herdando um capital de conhecimentos sem medida
na área das ciências com possibilidade de uma nova revolução científica e técnica, mas nega
às classes economicamente desfavorecidas o acesso ao conhecimento produzido. De outro
lado, o discurso neoliberal aponta o papel da educação como sendo o da preparação da
geração dos futuros atores do desenvolvimento social e econômico em cada sociedade. Contra
o discurso do desenvolvimento perverso e excludente, vozes se levantam das classes dos
excluídos reivindicando condições essenciais de vida como emprego, saúde, moradia e uma
educação que propicie de fato o desenvolvimento social, cultural, político e humano das
crianças e jovens na idade escolar. Chassot (2004, p. 25), ilustra o presente momento da
educação escolar e científica. Ele assim se expressa:
[...] a globalização determinou em tempos que nos são muito próximos uma inversão
no fluxo do conhecimento. Se antes o sentido era da escola para a comunidade, hoje
é o mundo exterior que invade a Escola. Assim, a Escola pode não ter mudado;
19

entretanto, pode-se afirmar que ela foi mudada. Não há, evidentemente, a
necessidade (nem a possibilidade) de fazermos uma reconversão. Todavia é
permitido reivindicar para a Escola um papel mais atuante na disseminação do
conhecimento.

Resulta, porém, das manobras políticas protagonizadas pela classe dirigente em


nossa sociedade uma política de educação centrada na alfabetização tecnológica do
trabalhador simplesmente, no lugar de investir em uma formação de cidadãos emancipados,
erguida sobre as bases de um conhecimento científico sólido, visando à educação integral dos
sujeitos. Pautado na racionalidade instrumental, o projeto pedagógico da maioria das escolas
na sociedade brasileira, na atualidade, deriva do modelo de desenvolvimento econômico
capitalista, concorrendo para a formação do homem e da mulher como trabalhadores,
alienados, garantindo e perpetuando a divisão da sociedade em duas classes distintas
(SANTOS, 1999; CACHAPUZ et al., 2005; CHASSOT, 2007; SHEID, 2016).
Essa visão minimalista do papel da educação, concebida sobre um corpo de
conhecimentos com fins utilitaristas, pragmáticos, contraria a concepção de Educação e de
Ciência que defendo para este século, ou seja, a educação do cidadão e da cidadã capazes de
fazer uma leitura crítica da realidade, de propor soluções sustentáveis e éticas aos problemas
do meio ambiente e de intervir política e efetivamente sobre realidade que os cerca,
contribuindo para uma convivência solidária e fraterna entre os indivíduos no mundo em que
vivem.
A educação, nos moldes a que preconizo acima e como a concebo neste espaço
investigativo, certamente não se concretizará através da abordagem tradicional do ensino de
ciências, conforme vem se dando na atualidade, que privilegia procedimentos conceituais e
experimentais isentos de práticas pedagógicas problematizadoras por parte dos professores,
em sua grande maioria, refratárias de uma formação sobre bases epistemológicas
simplificadora, presumivelmente empirista e indutivista, que corroboram com aprendizagens
equivocadas sobre a natureza da Ciência, restringindo os seus fundamentos a fatos
observados, experimentáveis e definitivos.
Entendo com os teóricos que dialogo nesta pesquisa que “O que ensinar?”, e o
“Para que ensinar?” ciências tem profundas implicações epistemológicas. Desloco para o
centro das discussões o problema da formação do professor e, atrelada a esta, a concepção de
Ciência que orienta a sua prática de ensino, além é claro de fazer uma incursão sobre as
demandas e exigências sociais do século atual no que diz respeito à formação humana,
científica, tecnológica, política e ética. Constato que o conhecimento científico, conteúdo do
20

ensino de ciências no presente século exige do professor desconstruções paradigmáticas sobre


categorias científicas como certezas, verdades, leis definitivas. É de Prigogine (1996, p. 14),
a ideia que compartilho a esse respeito: Pensamos situar-nos hoje num ponto crucial dessa
ventura, no ponto de partida de uma nova racionalidade que não mais identifica ciência e
certeza, probabilidade e ignorância.
Nos estudos realizados e produzidos nesta pesquisa, vejo com clareza a
complexidade do fenômeno da formação de professores de ciências para atuar neste campo do
saber, sobretudo ao situar a prática formadora no espaço e tempo da sociedade no presente
século. Tal complexidade se manifesta desde a prática formadora até a prática educativa
escolar, ambas produto de relações que estabelecem com o contexto social mais amplo. Sendo
a Ciência uma linguagem para facilitar a leitura do mundo (CHASSOT, 2007), ao se tornar
objeto do processo de transposição didática, com fins educacionais, implica uma
epistemologia3 que orienta a organização e direciona os saberes para esses fins, ainda que os
sujeitos das práticas dela não tenham consciência. Desse modo a complexidade da educação
em ciências varia e se amplia.
O século XXI põe desafios à educação que têm como pano de fundo os problemas
acumulados de uma sociedade enferma moral e materialmente, decorrente do modelo de
produção capitalista que vigora no presente, além de situada em um mundo ameaçado de
destruição, consequência da forma como são explorados os recursos naturais para a produção
de bens de consumo. A reflexão sobre a natureza científica e tecnológica em uso pelo setor
produtivo deve passar, obrigatoriamente, pelos saberes escolares, não se permitindo no século
atual o alheamento da educação científica sobre as problemáticas socioambientais. Para
Santos (1999), uma reflexão de natureza sócio-epistemológica. A meu ver, passa, também,
pela formação de professores de ciências, que deverão ser preparados sobre uma base
científica fundamentadora da práxis educativa para uma atuação consciente e crítica em face a
realidade social.

3
A formação de professores, que se vem realizando, tem descuidado da construção dos saberes, pelo facto de
pouco acentuar esta problemática epistemológica acaba por fragilizá-la, pô-la mesmo em questão. O que arrasta
a impossibilidade de se atingirem muitas das finalidades prescritas nos currículos. Neste sentido, os professores
bem (in) formados nesta área podem recuperar um mau currículo e professores com graves deficiências de
formação podem matar um bom currículo. Desejável mesmo é que, de algum modo, o professor não assente o
seu saber sobretudo na informação, mas que possa também desenvolver conhecimentos e saberes no modo
como se investiga, como se faz ciência. O ter conhecido e, se possível, experimentados os lados privados da
ciência ajudam à reflexão epistemológica e permitem uma agilidade e capacidade para transferir para a ação que
se pensa muitas vezes (incorretamente) (CACHAPUZ et al., 2005).
21

Sobre a formação inicial e continuada de professores, nos termos discutidos


acima, a contribuição de Giroux (1997), concebendo o professor como intelectual
transformador4, proposição com a qual me identifico, é, a meu ver, uma orientação
epistemológica que sustenta uma ação formadora de professores e de prática de ensino de
Ciências coerente com este século XXI. Ao discutir o processo de construção de autonomia
do professor, Giroux (1997) apresenta críticas ao paradigma curricular dominante, de base
racional tecnocrática e instrumental e como estratégia de superação a ideia de formar
professores de modo que possam atuar como intelectuais transformadores da realidade social.
Compreendo com Santos (1999), Contreras (2000), Maldaner (2003), Cachapuz et
al. (2005), Carvalho e Gil-Pérez (2011), e Nardi e Cortela (2015) que as considerações
teóricas relacionadas à formação inicial e ao ensino de Ciência por mim discutidas sejam
válidas para iluminar a formação continuada de professores que se encontram em pleno
exercício da docência, independentemente de avanços ou fragilidades evidenciadas em suas
práticas profissionais de ensino de Ciências.
Desse contexto, emerge o Instituto Federal do Maranhão – IFMA -, ofertando a
licenciatura na área das Ciências e da Matemática, marco inicial da minha história com a
Formação de Professores de Física. Uma história que conta mais de vinte anos, com um
envolvimento sobremaneira histórico, uma vez que estive incluída desde a elaboração das
primeiras propostas curriculares dos cursos, bem como dos processos de criação e
reconhecimento das licenciaturas em Ciências do IFMA.
Foi a minha prática como formadora de professores nos cursos de licenciatura da
área de Ciências, bem como a condição de professora da área da educação no curso de Física,
como já disse, que me conduziram ao presente estudo. Nas escolas-campo de estágio minhas
preocupações tomavam corpo e se ampliavam à medida que percebia que o currículo prescrito
para a Licenciatura em relação aos objetivos, pressupostos filosóficos, princípios e
fundamentos traçados para a formação de professores, se contrapunha à prática de ensino dos
alunos da Licenciatura. Demonstravam habilidade técnica no desenvolvimento das aulas, mas
descuidavam da relação teoria-prática, da problematização do conhecimento, do diálogo com
os alunos e principalmente de estimular a reflexão crítica/autonomia de pensamento com os
educandos.

4
Para o aprofundamento das questões teóricas pertinentes ao tema, consultar a obra: GIROUX, Henry A. Os
Professores como Intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas,
1997.
22

As dúvidas foram se plantando em meu pensamento: Qual a natureza/concepção


de Ciência o professor formador tem orientado a sua prática pedagógica na preparação dos
professores? Em que medida os objetivos, fundamentos e princípios prescritos no currículo
do curso são considerados no processo da formação? Em que bases epistemológicas e
pedagógicas se encontram assentadas a prática formadora dos docentes do curso? Em busca
de compreender esse fenômeno me lancei nessa investigação.
A tessitura da trama que teve como cenário o curso de Licenciatura em Física do
IFMA resultou do exercício teórico e epistemológico desta pesquisadora em editar cada cena,
episódios, reconstruções de tempo, espaço, movimento do presente ao passado e voltar do
passado ao presente para prospectar o futuro. Esse movimento também facultou a captura de
dados que extrapolaram os necessários à apreensão do problema de pesquisa, mas não por isso
serão descartados, ao contrário, serão cuidadosamente arquivados para retomada de outras
questões reveladas por ocasião da pesquisa empírica.
O enredamento que cerca a ação formadora de professores de Física do curso de
licenciatura do IFMA emergiu do entrelaçamento das histórias e dos relatos das experiências
dos professores entre si, e desses com a pesquisadora - que toma parte integrante da pesquisa -
haja vista compor o quadro docente que assiste ao curso e principalmente, cumprir o papel de
pesquisadora narrativa. Dos cenários e contextos emergiram as três categorias a que cheguei:
Concepções de Ciência e formação de professores de Física para o século XXI; Currículo da
Licenciatura em Física e a Educação para o século XXI e Modelo de professor de Física e de
prática formadora para a Educação neste século.
Descortinou-se dessa trama a construção de contextos e dramas pertinentes à
formação. Pouco a pouco as diversas lentes da teoria, imitando as luzes nos cenários da trama,
auxiliaram-me na percepção e captura das relações que ocorrem por dentro e no entorno das
práticas docentes, nos espaços e tempos em que os atos se sucederam no contexto da
formação, constituindo e favorecendo a compreensão daquilo que fui em busca para construir
esta Tese, que organizei em quatro partes, além desta introdução, que passo a apresentar a
seguir.
Na parte I deste estudo: Da sala de aula ao objeto de investigação reconstruo a
minha trajetória profissional, resgatando da minha experiência através de recortes da memória
as muitas outras histórias do curso de Licenciatura em Física, e o ponto de encontro com as
outras licenciaturas na área das Ciências do IFMA, a me conduzir pelos desdobramentos
pedagógicos da prática docente formadora, a identificação das bases teóricas e
23

epistemológicas estruturantes do curso, limites e superações historicamente conquistadas na


prática da formação. Trouxe também para este espaço as minhas inquietações com a formação
dos professores, transformada na presente investigação, constituindo a espinha dorsal da
pesquisa, na qual apresento como sendo o problema, objetivos e a tese que sustento.
Na parte II: O percurso metodológico no processo investigativo apresento os
aportes teórico-metodológicos que dão sustentação ao processo investigativo (MINAYO,
2013; ARAGÃO, 2011; CONNELLLY; CLANDININ, 2011; MORAES; GALIAZZI, 2007),
me permitindo um caminhar seguro e sistemático do percurso do estudo e da pesquisa
realizados até os resultados que foram possíveis. Em se tratando de uma pesquisa qualitativa,
de abordagem narrativa, relato as minhas experiências de pesquisadora e a dos sujeitos na
formação, representando os elementos fundamentais das análises discursivas, culminando
com a tessitura da Tese. A metodologia do trabalho envolveu categorias tais como a
subjetividade e intersubjetividade do pesquisador com os sujeitos e dos sujeitos entre si, em
sucessivos momentos da pesquisa. O lócus e os sujeitos da pesquisa são trazidos neste
contexto, complementando os elementos estruturais do processo investigativo. Com eles
discorro sobre a paisagem da narrativa da formação de professores de Física e os atores
envolvidos na trama. Trago para colaborar comigo nessa feição autores como: Castro, (2006),
Nardi e Cortela (2015), Contreras (2002), Ghedin, Almeida e Leite (2008).
Na Parte III - Esteios teórico-metodológicos e epistemológicos da ciência da
prática docente e da educação para o século XXI exponho, primeiramente, as ideias e
conceitos de pesquisadores da área das Ciências, da Filosofia e da História da Ciência a
exemplo de ANDERY et al., 2014; CHASSOT, 2004; 2007; SANTOS, 2010; GHEDIN,
FRANCO, 2011; MORIN, 2005; 2011; GHEDIN, 2017; OLIVEIRA, 2016; CHAUI, 1997).
Fazendo um percurso breve pela história do conhecimento reflito com estes autores sobre as
concepções e epistemologias da Ciência que se constituíram em cada etapa da sua história
evolutiva, ao longo dos séculos, me propondo a compreender os pressupostos teóricos e
epistemológicos dos paradigmas dominantes em cada período, assim como a apreender
possíveis relações com a prática pedagógica formadora de professores para o ensino de
Ciências e de Física no presente século. Em seguida, dirijo meu olhar sobre a prática e a
formação do professor de Física, compreendendo-a em suas interfaces com a realidade social
e tendências da Educação em Ciências, nas quais procuro situar a prática formadora da
Licenciatura em Física, entendendo-a em patamares de complexidade, caracterizada por sua
dimensão cultural, política, social, econômica e ideológica FREIRE (1998); PIMENTA
24

(1999; 2002); CORTELLA (2006); GOBARAC; GARCIA (2007); MORIN (2005; 2008);
RIOS (2008); SANTOS (2010); CARVALHO; GIL-PÉREZ (2011); PIMENTA; LIMA
(2012); ARAGÃO (2000; 2014); TARDIF (2012); LIBÂNEO; ALVES (2012). Em Cenários
da Educação e da formação de professores para o século XXI, faço inicialmente abreviada
análise de conjuntura do limiar do século aos dias atuais, trazendo para o centro das
discussões a globalização da economia e as consequências para as sociedades
economicamente dependentes como a nossa. Com os teóricos que elegi, busco apreender o
perfil de docente necessário para uma educação para o século XXI que venha contribuir para a
vida e o bem-estar das pessoas e um desenvolvimento sustentável para o planeta (FREIRE,
1999; SANTOS, 1999; PIMENTA, 1999; GADOTTI, 2003; PRADO; SILVA, 2003;
MORIN, 2008; ALMEIDA; CARVALHO, 2009; BOFF, 2013; IMBERNÓN, 2011;
CARVALHO; GIL-PEREZ, 2011; GADOTTI, 2003; CHASSOT, 2007; SAVIANI, 2017.
Adiante, na parte IV - No contexto da licenciatura em Física do IFMA:
concepções de ciência e de práticas formadoras para a educação neste século trago,
inicialmente, o cenário institucional onde transcorreu a investigação, rememorando, na
narrativa dos sujeitos envolvidos na trama da formação, os mais significativos eventos da
história da Licenciatura em Física. São relatos de lutas, enfrentamento das adversidades e
acima de tudo de perseverança com a marca das conquistas e superações dos problemas na
gestão da Licenciatura em Física, com as quais os professores convivem permanentemente.
No subitem Sentidos e significados da formação dos professores de Física do IFMA para a
Educação no século XXI, reúno as três Categorias: Concepções de Ciência e formação de
professores de Física para o século XXI; Currículo da Licenciatura em Física e a Educação
para o século XXI e Modelo de Professor de Física e de Prática Formadora para uma
Educação neste século, que emergiram do corpus da pesquisa. Utilizando a Análise Textual
Discursiva (MORAES, GALIAZZI, 2007), foi possível apreender novos sentidos e
significados que expressam aproximação e distanciamento de concepções de Ciência bem
como implicações teórico-metodológicas e epistemológicas na prática formadora atinente à
educação neste século.
Na última parte intitulada Concluir é preciso faço uma incursão sobre os
resultados das análises, apresentando as constatações e confirmando a tese que sustento.
Como é passivo de ocorrer em todo processo investigativo, aponto algumas questões que
emergiram deste estudo, mas que não caberia aprofundar por se distanciarem dos objetivos a
25

que esta pesquisa se propôs. A ideia é que se transformem em indicativos para novas buscas
investigativas.
Por suposto, acredito que a realização do presente estudo venha explicitar as
concepções e práticas formadoras no curso da Licenciatura em Física do IFMA. Guardo a
convicção de que os resultados que alcancei poderão contribuir para novas orientações ou
mesmo reformulações das propostas curriculares do curso, da prática docente formadora e de
uma política interna de formação continuada dos docentes aos gestores para o coletivo de
professores ligados ao curso de Física. Acredito ainda poder colaborar com outras instituições
de ensino superior do Estado e de outras unidades federadas, envolvidas com a formação de
professores de Ciências e de Física. Certamente, o meu trabalho provocará novas
inquietações, a exemplo do que já acontece comigo ao concluir esta pesquisa, motivando-me a
novas investigações a partir desta, assim como a outros que se sentirem provocados e vierem
a se debruçar sobre essa problemática. Por fim, aspiro poder contribuir para a formação do
perfil do professor para este século XXI.
Nesta breve fala, procurei inserir o leitor no contexto da pesquisa explicitando
minhas aspirações e pretensões, a relação que o meu objeto de estudo mantém com o trabalho
na formação de professores de Física, situada em um contexto de profundas contradições
sociais somadas a desafios internos, traduzida na complexidade que caracteriza a Ciência e o
ato formativo-educativo. Considerei para as discussões que apresento inicialmente, minha
concepção de Ciência e Educação, que perpassa toda a tese.
26

PARTE I - DA SALA DE AULA AO OBJETO DE INVESTIGAÇÃO

Como professor num curso de formação docente não posso


esgotar minha prática discursando sobre a Teoria da não
extensão do conhecimento. Não posso apenas falar bonito
sobre as razões ontológicas, epistemológicas e políticas da
Teoria. O meu discurso sobre a Teoria deve ser o exemplo
concreto, prático, da teoria. Sua encarnação. Ao falar da
Construção do conhecimento, criticando a sua extensão, já
devo estar envolvido nela[...].
(Paulo Freire)

O exercício do magistério sempre foi uma das paixões da minha vida. Anos da
minha trajetória profissional foram dedicados à sala de aula e à gestão na educação. Das
etapas constitutivas dessa caminhada, com exceção dos últimos anos do ensino fundamental,
exerci à docência em todas as etapa e níveis da Educação Básica, passando pelo nível superior
até a pós-graduação. Em todas as fases da minha carreira travei inúmeras e diversificadas
relações com pessoas no âmbito acadêmico e do trabalho e desenvolvi embates ideológicos,
que me renderam um processo permanente de construção de mim mesma formando uma
bagagem sempre crescente por onde passo ou me fixo. Eis a história de uma vida profissional
sequenciadas por desafios, sucessos e compartilhada com muitas outras histórias. Nessa
escalada, nem todos os caminhos estiveram pavimentados, obrigando-me a abrir trilhas que
possibilitaram formas diversas de crescimento, mas que sem essas experiências não teriam me
constituído no que me tornei.
Destarte, me constitui docente, iniciando minha carreira no magistério de 2º grau,
seguida da graduação, com o curso de Licenciatura em Pedagogia. A passagem pela
universidade se deu em um contexto extremamente desfavorável à liberdade de pensamento
ou de reflexões críticas, que solapavam os currículos dos cursos, mesmo os da área de
humanas. Em um cenário conservador, respirava-se ares com os ranços da ditadura militar,
anos finais e iniciais das décadas de 70 e 80, respectivamente. Esse é um dado para mim
relevante considerando que, mesmo com toda repressão e atraso das práticas formadoras de
alguns professores à época, nunca aceitei passivamente a ordem estabelecida, me ligando aos
movimentos políticos de base estudantil e mais tarde sindical e partidária. Tal experiência
contribuiu para despertar o inconformismo com as injustiças e desigualdades sociais de então,
formando as raízes da postura política que assumo diante da realidade social.
Muito embora a minha formação acadêmica inicial tenha sido desfavorável à
construção de uma identidade docente crítica, devo, às minhas experiências de vida, nos
espaços dos movimentos sociais, no engajamento na luta por justiça e igualdade social, a
27

constituição de uma visão de mundo, de sociedade e de ser no mundo, contrária às


desigualdades e injustiças sociais, me tornando com as causas dos grupos dos oprimidos. Com
a minha visão reflexiva e crítica tratei de procurar enxergar os fenômenos sociais, políticos e
econômicos em seu movimento cotidiano e histórico, o que sempre me fez enxergar mais
além, diferentemente da imensa maioria que ignora a realidade concreta e considera natural o
fato da dominação e da universalização dos valores em uma sociedade dividida em classes
sociais, como é a nossa. Por conseguinte, procuro pautar minha postura como profissional da
educação, questionando as certezas teóricas e seus reflexos na prática. No meu trabalho como
formadora tenho dividido com meus pares e meus alunos, no espaço da formação, o propósito
de construir intenções e ações que repercutam positivamente no meio em que nos situamos,
aspirando melhorias e transformações compreendidas como necessárias.
Academicamente, existiu um momento igualmente importante nessa minha
permanente construção. Iniciando a carreira profissional o meu espírito inquieto, sagaz,
articulada à visão crítica em relação ao conhecimento, sobremaneira despertado durante um
curso de pós-graduação em Psicologia Social, de forma tal que daí em diante o meu olhar e a
minha leitura de mundo se transformaram. Somos resultados de nossas escolhas e opções
ideológicas e estas caminham comigo desde então.
No campo da educação fui desafiada desde cedo no papel de gestora escolar, e em
seguida à prática docente. Em ambas as funções, tratei de adotar o princípio democrático
como referência para o processo da gestão educacional e do ensino pautadas no diálogo
crítico e construtivo sobre as políticas educacionais e os fins propagados dessa educação,
assim como as práticas pedagógicas que suscitavam. Experiência essa que levei comigo para
o magistério superior completando o ciclo da docência nos dois níveis.
O início da minha carreira como docente no ensino superior se deu como
professora de Didática e Prática de Ensino do primeiro Curso de Licenciatura Plena em
Matérias Específicas do Ensino Industrial do 2º Grau, com habilitações em Construção Civil,
Eletricidade e Mecânica, nos anos 90, implantado pelo extinto Centro Federal de Educação
Tecnológica do Maranhão - CEFET-MA. As mudanças no cenário educacional dessa década
foram inúmeras e desafiadoras, reflexos das transformações no mundo do trabalho em
decorrência dos avanços alcançados pela ciência e pela tecnologia; o processo de
reestruturação produtiva na economia mundial consequência da incorporação desses avanços
no processo produtivo, e a consolidação do projeto de globalização da economia que
caminhavam desde a década anterior.
28

A necessidade de formar quadros para o novo momento da sociedade, não


deixando de incluir na formação o domínio das ferramentas da nova tecnologia, demandava
da educação a urgência na qualificação das pessoas, ao tempo em que se mantinha a carência
de Professores da Área Científica nas escolas, em todo o território nacional. Os cursos de
“licenciatura curta” que até o momento formavam esses professores foram declinando, como
também as licenciaturas em Ciências nos moldes em que vinham sendo criados pelas
universidades (ARAÚJO, VIANA, 2010). Nesse contexto, motivado pela situação de escassez
de professores na área científica, e, possuindo um quadro docente expressivo de professores, o
CEFET-MA implantou os cursos na área de Ciências e de Matemática (anos de 1999 e 2001),
nos quais continuei exercendo a docência até o presente momento.
No ensino superior, minha atuação se deu muito além da docência. Com alguns
anos na instituição assumi a função de coordenadora dos cursos de licenciatura na área das
Ciências e da Matemática, posteriormente, a direção da educação superior do CEFET-MA.
Como ocupante desses cargos, a minha proximidade com os problemas pedagógicos e
administrativos dos cursos era real. Considerando a minha formação na área da educação e
mediante essa visão procurei aproximar-me ainda mais do que via como lacunas nos cursos de
licenciatura, os quais conferiam limites e fragilidades pedagógicas e filosóficas, do ponto de
vista da finalidade dos cursos, sobretudo na relação com a prática docente de alguns
formadores. O curso se mantinha com o propósito de formar professor, no entanto,
privilegiava na prática conhecimentos que contribuíam muito mais para o ideal de uma
formação bacharelesca,
Nesse sentido, algumas tentativas partiram da coordenação, na perspectiva de
obter unidade no processo da formação de professores, sendo realizadas no âmbito da
Instituição5 mediante reuniões de trabalho, rodas de conversa, semanas pedagógicas
institucionais e avaliação de cursos. De forma evidente os professores demonstravam pouca
motivação para participar dessas atividades. A discussão do viés pedagógico na formação era
um assunto pouco atrativo para os professores de Física e das outras ciências, posto que os
resultados com tais iniciativas impactavam quase nada na atividade docente. Entre outras
ações, houve a tentativa de criação do Núcleo de Prática Pedagógica – NPP6, conforme

5
A instituição a qual me refiro é o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão – IFMA,
Campus São Luís, Monte Castelo.
6
O Núcleo de Prática Pedagógica-NPP, citado algumas vezes no contexto da prática formadora, constitui um
espaço privilegiado de interação, trocas, criação, reflexão, planejamento, avaliação, formação continuada entre
outras, pelo fato de abrigar o conjunto de professores formadores e recursos pedagógicos de várias ordens, tendo
29

previsto no projeto das licenciaturas em geral, sem que se obtivesse êxito. Isso constituiu certa
militância junto aos colegas formadores.
A busca por unidade no processo de formação de professores ofertada nas
Licenciaturas em Ciências e Matemática deve ser entendido como trabalho pedagógico,
compreendido em sua intencionalidade com relação às finalidades da formação de docentes.
O currículo posto em prática numa ação coletiva dos professores foi executado
integradamente de modo que o conhecimento específico dialogasse com o pedagógico e
didático, norteado por princípios de contextualização e de interdisciplinaridade, visando à
docência na educação básica e superior (PIMENTA; ANASTASIOU, 2014; PIMENTA,
1997; LIBÂNEO; ALVES, 2012; RIOS, 2008; MALDANER, 2003; FREIRE, 1998.
Sobre esses aspectos reconheço avanços no projeto do curso de Física, no qual
destaco os objetivos que foram prescritos para a formação do professor, apontando para um
perfil profissional que se aproxima do intelectual transformador (GIROUX, 1997), contudo,
enxergo na prática pedagógica dos formadores, pontos de distanciamentos quando se trata de
tornar concreta tal finalidade, por exemplo, o sobrepujamento das bases epistemológicas das
ciências, desconectados da realidade social, malogrando os saberes docentes em suas
dimensões filosóficas, política e técnica. Do objetivo prescrito às condições institucionais e
pedagógicas existentes para sua realização no cotidiano do espaço/tempo da formação existe
um distanciamento claramente observável. Mesmo assim, é importante dizer que visualizo
essa problemática pela minha condição de ‘professora da licenciatura’. Desse modo,
compreendo ser de fundamental importância investigar as bases teóricas, metodológicas e
epistemológicas que dão sustentação aos trabalhos técnicos e pedagógicos dos docentes.
De acordo com o Projeto Pedagógico do Curso – PPC - a formação de professores
de Física tem como objetivo final o seguinte:
Licenciar professores para o ensino da Física, no ensino médio e ciências no ensino
fundamental, mediante aquisição de competências relacionadas com o desempenho
da prática pedagógica, preparando-os para o exercício crítico e competente da
docência, pautado nos valores e princípios estéticos, políticos e éticos, estimulando-
os à pesquisa e ao auto-aperfeiçoamento de modo a contribuir para a melhoria das
condições do desenvolvimento da Educação Básica. (PROJETO PEDAGOGICO
DO CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM FÍSICA, 2005, p.8)

em vista a superação de insuficiências no curso, o planejamento das ações relativas a Prática Educativa, ao
Estágio Supervisionado, às Atividades- Acadêmico-Científico-Culturais –AACC e por fim a avaliação de
todas as atividades formadoras. O foco do Núcleo de Prática Pedagógica reside, portanto no “domínio do
conhecimento pedagógico”. (PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM
FÍSICA, 2005, p.18)
30

Com base nas minhas observações durante os muitos anos que atuo no curso e nos
estudos que venho realizando sobre a formação de professores, que para alcançar o objetivo
que está proposto no PPC da Física do ex-CEFET-MA, ainda se faz necessário:
(i) uma reforma institucional que privilegiasse uma nova estrutura da educação
superior, com reflexo nos projetos pedagógicos das licenciaturas;
(ii) a transformação das práticas de ensino ampliando o espaço/ tempo da
formação;
(iii) uma aproximação cada vez maior da IES com as escolas de educação básica; e
por fim,
(iv) a superação da concepção de Formação Docente, de Ciência, de Prática
Educativa e de Sociedade, aspecto fundante nos propósitos de formação de
professores como intelectuais transformadores, consoante com uma educação
para este século.
Mediante o que venho observando na prática dos formadores, me parece ocorrer
na realidade interna dos cursos de licenciatura do IFMA descompassos teóricos,
metodológicos, que eu caracterizei sob a forma de indicadores, apontando em direção
contrária ao objetivo que está proposto para a formação dos professores. Os indicadores dos
descompassos que destaquei, têm sido evidenciados em pesquisas realizadas sobre a formação
inicial de professores (NARDI; CORTELA (2016); GOBARA; GARCIA (2014),
especialmente no que se refere à prática pedagógica dos professores 7. As fragilidades teóricas
e metodológicas se expressam através de:
(a) a secundarização dos objetivos da formação de professores;
(b) a hierarquização do ensino e da pesquisa no processo da formação;
(c) a atuação dos professores formadores desconsiderando as forças dominantes
internas e externas às instituições na intenção da manutenção do poder hierarquizado que
legitima o autoritarismo;
(d) a falta de formação pedagógica dos professores que exercem o magistério nos
cursos de licenciatura;

7
A expectativa que é criada sobre a prática pedagógica dos professores é a de que a prática docente na
licenciatura em Física pudesse integrar o ideal de cidadania. Influenciados pela racionalidade técnica dominante,
tal expectativa se frustra. Explicam Nardi; Cortela (2015, p. 12) Isto porque, entre outros fatores, os docentes
em exercício, que colocam em prática as políticas educacionais, trabalham de acordo com seus valores, suas
crenças sobre o que seja a escola, os conhecimentos científicos, profissão docente, entre outras. Desta forma, o
que ocorre dentro das salas de aula faz parte de um todo: político, social, econômico e cultural.
31

(e) modelo de racionalidade instrumental8 na prática formadora.


Como professora do curso de licenciatura em Física do IFMA me permito abordar
essas questões. Tais inquietações surgiram/surgem no meu cotidiano do ser professora, posto
que esse espaço faz emergirem problemas estruturais, pedagógicos, de ensino, que são
silenciados/ignoradas pela maioria dos atores no contexto da formação. Na relação com meus
pares, me ressinto da falta de espaço e tempo para o debate sobre essas questões, bem como
sobre a necessidade de maior articulação entre os núcleos do currículo do curso9, que
certamente possibilitaria uma unidade teórico-metodológica e epistemológica mais sólida na
prática formadora do professor de Física, assim como, para as demais Ciências.
No contexto da formação de professores, tais relações têm se configurado como
verdadeiro apartheid, posto que, de um lado situam-se os professores da “parte pedagógica”,
e de outro lado os das “disciplinas específicas”, estabelecidos como territórios incomunicáveis
e invioláveis, ressentindo-se, sobremaneira, de diálogos em torno de questões
epistemológicas, pedagógicas e didáticas da formação docente.
A leitura que fiz de alguns outros projetos de cursos de licenciatura em Física de
outras IES - da Região Nordeste e Sudeste do País e da Rede Federal dos Institutos- a título de
conhecimento evidenciam semelhanças no que diz respeito a avanços sobre concepções de

8
Para compreender tal conceito trago a contribuição teórica de Contreras (2002), com sua classificação acerca da
atividade profissional do docente relativa ao trabalho do ensinar, na qual apresenta três concepções: o professor
como especialista técnico, o profissional reflexivo e o intelectual crítico. Tratando da questão da racionalidade
instrumental situa-a no contexto da prática do profissional do professor como especialista técnico. Contreras
(2002, p. 90) é enfático: Como afirmou Schön (1983-1992), o modelo dominante que tradicionalmente existiu
sobre como atuam os profissionais na prática, e sobre a relação entre pesquisa, conhecimento e prática
profissional, foi o da racionalidade técnica. Sobre este modelo estabeleceu-se normalmente toda a ideologia do
profissionalismo, pelo qual entender suas características, a forma em que, sob esta perspectiva, se interpreta a
atuação, nos permitirá elaborar outras aproximações que levem em conta as características do ensino enquanto
profissão, sem cair nos tópicos e traços comuns que o profissionalismo apresenta como ideologia cientificista. A
ideia básica do modelo de racionalidade técnica é que a prática profissional consiste na solução instrumental de
problemas mediante a aplicação de um conhecimento teórico e técnico, previamente disponível que procede da
pesquisa científica. É instrumental porque supõe a aplicação de técnicas e procedimentos que se justificam por
sua capacidade para conseguir os efeitos ou resultados desejados.
9
O PPC da Física Licenciatura e os das outras áreas das ciências – Química. Biologia e Matemática, possuem em
sua organização curricular aspectos comuns e, diversificados, de acordo com a área de conhecimento que
constitui a formação do professor. No item 8 do PPC da Física encontra-se prescrita a Organização Curricular
da Formação dos Professores, orientando que na construção das Matrizes Curriculares, as atividades da
formação serão estruturadas em quatro núcleos de formação: Núcleo de formação comum a todos os professores
para a educação básica; Núcleo de formação comum a todos os professores para o ensino de ciências; Núcleo de
formação específica dos professores por habilitação e o Núcleo de prática pedagógica, que se articularão
garantindo a formação das competências totalizadoras no Processo Formativo, potencializadas pelos diversos
componentes e atividades da formação a serem desenvolvidas em tempos e espaços curriculares
diferenciados.(PROJETO PEDAGOGICO DO CURSO DE LICENCIAATURA PLENA EM FÍSICA, 2005, p.
23 grifo nosso)
32

ensino, de ciência e de metodologias, conforme o prescrito. No entanto, quando apreciada a


matriz curricular dos mencionados cursos pareceu paradoxal a referência aos componentes, às
atividades formativas, a distribuição temporal e às cargas horárias.
Nos projetos pedagógicos mencionados e no PPC do curso de Física do IFMA, de
acordo com suas matrizes curriculares, a preocupação maior é com a formação do físico-
pesquisador muito mais que com o professor para atuar em sala de aula. Em se tratando do
curso de Física – PPC IFMA – ao analisar as ementas das disciplinas do Núcleo de Formação
Específica, fica evidente a preocupação com uma robusta formação específica, descuidada de
princípios como a interdisciplinaridade e a contextualização. É possível perceber que as
orientações de transposição didática com abordagem histórica, filosófica, política e ética estão
ausentes. A minha análise sobre este aspecto, somada à minha experiência profissional
permite supor que a formação de professores de Física pode estar assentada sobre o
paradigma tradicional, visão bacharelesca, sob forte influência da racionalidade instrumental e
técnica, preponderante nas licenciaturas da área das ciências (CACHAPUZ, 2000; SANTOS,
1999; NARDI; CORTELA, 2016), refletindo sobre a construção dos currículos.
Contudo, devo reconhecer que as concepções e princípios pedagógicos
explicitadas como fundamentos filosófico, pedagógicos e didáticos da formação de
professores - constitutiva do PPC de Física - preveem uma ação docente inovadora,
interdisciplinar e compartilhada, que implicaria um trabalho integrado dos
professores/formadores na licenciatura, assim como, uma abordagem de ensino
permanentemente articulada com a realidade educacional e social. Sobre esse aspecto,
visualiza-se no PPC da Física a seguinte orientação:
O espaço da formação possibilitará aos futuros professores experiências de
aprendizagem que integrem a teoria e a prática profissional, supere as fragmentações
curriculares pela via da interdisciplinaridade onde, professores em formação e
professores formadores poderão vivenciar um trabalho coletivo, solidário e
interativo. As atividades do processo formativo serão orientadas pelo princípio
metodológico da ação-reflexão-ação, sendo a problematização da realidade
estratégia didática privilegiada, e a contextualização princípio pedagógico
fundamental. Os conteúdos do ensino por sua vez, deverão ser tratados de modo
articulado com suas didáticas específicas. (PROJETO PEDAGOGICO DO CURSO
DE LICENCIAATURA PLENA EM FÍSICA, 2005, p. 12).

Particularmente, no que diz respeito ao ensino da Física e das ciências, isto


implica, por exemplo, levar em conta problemas potenciais da natureza, com uma visão crítica
sobre as questões socioambientais, sobretudo, quando a questão passa pelo modo de produção
dos bens necessários à sobrevivência humana, descuidando da sustentabilidade do planeta.
Santos (1999), colabora com essa visão, afirmando:
33

[....] na transição para o terceiro milênio, a cidadania integra uma ampla constelação
de problemas da vida comunitária de que a escola não se pode alhear; que
atualmente o exercício da cidadania é, simultaneamente, mais exigente e mais
complexo; que a educação para a cidadania recusa uma aceitação acrítica da
autoridade da ciência e da tecnologia e, finalmente, que este saber introduz valores
inovadores na esfera cultural – valores que assentam na dignidade da pessoa
humana. Logo, a questão que se nos coloca é a de saber se as diferentes disciplinas
estarão suficientemente amadurecidas para mobilizar saberes, vontade e energias
capazes de responder aos grandes desafios centrados na sua dimensão formativa.
(SANTOS, 1999, p.13)

Compartilhando o espaço da formação com os professores de Física, constato a


expressiva competência acadêmica dos colegas, cuja qualificação apresenta níveis elevados na
área da Ciência, porém, a reflexão epistemológica sobre os conteúdos disciplinares da
licenciatura em Física, bem como as abordagens do ensino em sala de aula pelos alunos
professores nas escolas do campo de estágio, me instigam a buscar compreender com que
bases teórico-metodológicas e epistemológicas, os professores formadores de Física estão
desenvolvendo a pratica pedagógica na licenciatura.
Tal realidade me permite compreender que possa residir nesse ponto três amplas
dificuldades dos professores das Ciências à frente do curso de Física: (i) uma delas diz
respeito à ausência de abordagem dos conhecimentos científicos, na perspectiva do ensino da
Ciência com uma visão interdisciplinar, crítica e transformadora, (ii) a outra implica uma
postura identificada com a formação de bacharéis no curso de Licenciatura muito mais do que
com a formação de professores para atuar na Educação Básica tida como objetivo do curso, e
(iii) os professores formadores do núcleo específico, em sua maioria, não possuem formação
pedagógica inicial ou continuada, influenciando certamente a ação de alguns formadores10.
Em oportunidades promovidas pela Instituição como os ‘encontros pedagógicos’
realizados com o fim de abrigar a discussão de questões pedagógicas, didáticas, profissionais
com foco na formação de professores, eram visíveis o incômodo e a desmotivação dos
professores em discutirem tais temas. Em momentos como esses, ouvi por diversas vezes
colocações feitas pelos pares sobre tais reuniões, dizendo: “encontros inúteis”, “perda de
tempo”, e sobre o currículo dos cursos a visão compartilhada pela quase totalidade dos

10
No campo da educação, a falta da aplicação técnica de grande parte do conhecimento pedagógico juntamente
com a natureza ambígua e, por vezes, conflituosa de seus fins, levou a que se considere o ensino com uma
profissão somente em um sentido muito fraco e limitado. Porém, o reconhecimento dessa limitação não supôs
uma renúncia – em grande parte da pesquisa, da administração e da prática educativa – à aspiração e à prática
de ensino como uma profissão baseada na aplicação de técnicas derivadas de um conhecimento especializado,
isto é, como uma prática profissional concebida sob a perspectiva da racionalidade técnica. (CONTRERAS,
2002, p. 95)
34

formadores era a de que “o quantitativo de disciplinas e horas destinadas à prática docente


compromete qualitativamente a formação na área específica”.
Da parte dos estudantes das Licenciaturas de modo geral, em sala de aula onde a
aproximação se encurta, incontáveis histórias de queixas feitas por eles foram ouvidas, na
maioria das vezes relacionadas à abordagem do conhecimento nas disciplinas da área da
Ciência. De algum modo essas observações pelos alunos vão fazendo sentido e conferindo
veracidade às situações.
Nos relatos dos estudantes de Física foi possível perceber pelas colocações que o
professor em sala de aula se constitui como centro do processo, e os estudantes/professores
como receptores passivos dos saberes da ciência já elaborados (PIMENTA, 1997, 1999;
MALDANER, 2003; LIBÂNEO; ALVES, 2012). Logo, as dimensões histórica, social,
política e econômica da Ciência deixam de ocupar o espaço necessário na formação desses
professores. Pressupõe-se com tal prática pedagógica, a valorização absoluta do conhecimento
de base científica e técnica no lugar da complexidade que envolve o conhecimento sobre o
mundo, com suas relações com a realidade social, a vida dos sujeitos, a educação e o ensino –
visão de totalidade do conhecimento.
Outras vezes, o alvo das insatisfações deslocava-se para o campo profissional no
que diz respeito à preocupação com suas trajetórias formativas e a falta de perspectivas
positivas na profissão que abraçaram. Sobre essa preocupação, e para além dela, entendo que
o problema com a identidade do curso gera nos alunos ausência de pertencimento, e
principalmente no fato dos estudantes percorrerem a formação à margem dos processos de
construção e reformulação do curso, sendo eles a parte mais interessada de todo o conjunto da
formação.
É, contudo, a relação com seus professores, a maior queixa dos estudantes, posto
que estes se ressentem de abertura ao diálogo e de liberdade de expressão. A autoridade
exercida arbitrariamente, às vezes, com base na posição hierarquizada, demarca posições de
subordinação do aluno em relação ao professor, deixando clara a desigualdade na relação
entre ambos.
Formar em pleno século XXI, assumindo atitude sobremaneira autoritária soa
preocupante se entendermos que liberdade de pensamento e de expressão são princípios da
educação de fato democrática e cidadã. Não é difícil antever as consequências de atitudes
como essas na formação de futuros professores.
35

Na visão dos alunos sobre o curso de formação de professores, em suas falas


recorrentes, comparecem observações relacionadas ao seguinte:
(i) Quantitativo das disciplinas pedagógicas superior às disciplinas específicas,
(ii) Programa das disciplinas às vezes repetitivo e sem nexo com a realidade
educacional a ser enfrentada, isto é, a dicotomia entre o que está proposto e o que é
vivenciado pelos estudantes no contato com a realidade das escolas onde colocam em prática
o que assimilam no processo da profissionalização; e, por fim,
(iii) Abordagem dos conteúdos realizada pelos professores.
Constato, pois, que ainda não se alcançou a integração necessária dos professores
formadores da Licenciatura em Física; dos componentes curriculares com o contexto social e
educacional, comprometendo a ação de transmissão dos conhecimentos essenciais à prática
educativa dos futuros profissionais do ensino, na Educação Básica. (PIMENTA;
ANASTASIOU, 2012; LIBÂNEO; ALVES, 2012; PIMENTA; GHEDIN, 2002;
CONTRERAS, 2002; GIROUX,1997; FREIRE, 1998).
Entendo que, desse modo, o ensino fica restrito à memorização/repetição de
conhecimentos e aplicação em situações-problema cujos resultados são previsíveis11, distantes
de uma prática pedagógica formadora autônoma, democrática, reflexiva, interdisciplinar e
contextualizada. Com efeito, a formação que se realiza através da licenciatura em Física pode
implicar uma prática educativa de futuros professores desarticulada de um projeto de
sociedade justa e inclusiva, de formação integral e cidadã, comprometendo o modelo de
formação para a educação básica consoante com este século XXI.
Por essa razão, dedico-me no exercício da docência por manter uma atitude
reflexiva e crítica de ler a realidade, a fim de que os alunos possam construir seus próprios
conhecimentos. Para Freire (2014, p. 52 grifo nosso) “[...] ensinar não é transferir
conhecimento, mas sim criar possibilidades para sua própria produção” [...], tornando os

11
Reafirmo tal suposição com Fichtner (2012, p. 221), contribuindo com uma reflexão epistemológica a esse
respeito. A prática cotidiana nas escolas é determinada por uma cultura do instrucionismo. Entende-se a escola
como a instituição social cuja especificidade é a transmissão do conhecimento historicamente acumulado de
forma sistematizada e organizada. Ensinar significa explicar um conteúdo, sobretudo conceitos científicos.
Nessa cultura do instrucionismo, conhecimento se transforma em objeto “petrificado”, como algo dado,
imutável, estereotipado, que não se renova a cada nova compreensão. E os alunos tornam-se depósitos, garrafas
que precisam ser enchidas de conhecimento. Essa cultura de instrucionismo é marcada pela rotina quase
dogmática das aulas, pela expectativa de aprendizagem centrada na figura do professor, cuja avaliação serve
para selecionar e classificar os alunos.
36

estudantes capazes de compreender os movimentos históricos da sociedade e da educação em


suas relações com os modelos educacionais, políticos e econômicos de desenvolvimento da
sociedade brasileira.
É importante dizer que tenho enfrentado barreiras por parte dos alunos em sala de
aula ao empreender tal prática, sendo interpretada às vezes como artífice dos “pedagogismos”,
sobretudo para os alunos que iniciam o curso, posto que para estes as disciplinas pedagógicas
-e suas metodologias são “perda de tempo”. Dialogando sobre esse ponto de vista usufruo da
minha independência e autonomia na realização das atividades pedagógicas, mantendo a
preocupação com o que faço e como faço. O referencial teórico em que me apoio concebe a
ação docente como mediadora da realidade, na qual se integra e situa a educação em nossa
sociedade (RÊGO, 1995; WACHOVICZ, 1995; FREIRE,1998, 1999, 2014; PIMENTA,
1997, ;1998; PIMENTA; LIMA, 2012; LIBÂNEO, ALVES, 2012). Busco compreendê-la
com os meus alunos, por meio do exercício de reflexão acerca das relações entre Estado,
Sociedade e Educação, função das escolas, papel dos professores, abordagens e
procedimentos do ensino, concepções de mundo e de homem que na maior parte das vezes
respondem por práticas formativas que visam atender aos interesses de uma determinada
camada da sociedade.
Adoto na minha prática formadora princípios de uma pedagogia crítica e uma
concepção de prática na visão freiriana, da qual destaco a dialogicidade12. Busco experienciar
no espaço da sala de aula ou em outros espaços didáticos, a formação que se pretende
emancipatória, visando a profissionalidade do futuro professor e a sua liberdade de expressão
valorizando suas experiências e conhecimentos, revendo com eles análises de senso comum,
visando a construção de saberes e de uma identidade profissional docente interventiva.
Entendo com Freire (2014, p.108 grifo nosso) que “[...] existir, humanamente, é pronunciar o
mundo, é modificá-lo. O mundo pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos
sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar. [...]”.
Sinto-me confortável dessa forma para estimular os meus alunos em sala de aula a
desenvolverem suas práticas futuras adotando a postura dialógica e crítico-reflexiva, correlata
do próprio pensar e fazer, percebendo-se como sujeitos sociais das mudanças e

12
“[...] O que se pretende com o diálogo, em qualquer hipótese (seja em torno de um conhecimento científico e
técnico, seja de um conhecimento “experimental”), é a problematização do próprio conhecimento em sua
indiscutível reação com a realidade concreta na qual se gera e sobre a qual incide, para melhor compreendê-la,
explicá-la, transformá-la.” (FREIRE, 1975, p. 52)
37

transformações nas comunidades em que atuarão e na sociedade em que vivem e trabalham


(GIROUX, 1997; CONTRERAS, 2002; PIMENTA, GHEDIM, 2002; ALARCÃO, 2001).
Tomando por base os princípios pedagógicos da prática docente emancipadora e
transformadora e epistemológica para o ensino das ciências (FREIRE, 1998, 1999, 2014;
CHASSOT, 2004; PIMENTA, 2012, 2014; CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011; IMBERNON,
2011; LIBÂNEO, 2012), diferencio a minha concepção de formação e minha prática
pedagógica em sala de aula, distanciada de práticas conservadoras de ensino, a exemplo das
reveladas pelos alunos-professores em situações peculiares durante o processo formativo
(micro aulas, regência de classe, oficinas didáticas), por vezes caracterizadas pela
transmissão/recepção passiva de conhecimentos, repassados como verdades por meio da
exposição e demonstrações dos conhecimentos científicos – Física -, numa expressão clara da
racionalidade técnica. Tais evidências são produto do trabalho de acompanhamento dos
alunos professores no campo de estágio supervisionado, convivendo de perto com o
desempenho e as atitudes pedagógicas dos futuros professores, em sala de aula.
Nesses espaços é que constato algumas fragilidades e problemas de natureza da
prática educativa e do ensino, manifestadas pelos licenciandos, entendendo que deveriam ter
sido trabalhadas no processo de sua profissionalização e não foram. Muito embora
demonstrem domínio de conteúdo13 e segurança na regência de classe, a atividade didática é
isenta de momentos de diálogos com e entre os alunos, vez que persiste a preponderância da
aula expositiva. São situações que colaboram para o surgimento de um sentimento de
profunda inquietação sobre as práticas formadoras na Licenciatura em Física.
Identificando tais práticas junto aos alunos professores me obrigava a pensar
sobre que relações poderiam haver entre a formação recebida nos cursos de licenciatura e a
prática que os futuros professores demonstravam em situações de ensino. Ficava clara a
dificuldade dos alunos-professores de conectarem o conteúdo das ciências com as situações
concretas da realidade social, com as questões complexas do processo ensino – aprendizagem
e as socioambientais.
Nas minhas reflexões acerca da prática formadora, nos cursos de licenciatura, ao
se voltar para as questões pedagógicas, deixo clara a necessidade de investigar aspectos tais
como: opções teórico-metodológicas da prática formadora, bases epistemológicas do ensino

13
A segurança com que faço a afirmação acima decorre do fato de que nas atividades do estágio supervisionado
relativas à observação das aulas, a título de prática de ensino, divido a responsabilidade da avaliação do
desempenho do estudante/professor, com o professor titular da classe.
38

de ciências, saberes da docência, transposição didática dos conteúdos das ciências na


perspectiva de aprendizagem, objetivos da prática educativa, finalidades da formação em
relação aos sujeitos que queremos formar e ao tipo de sociedade que desejamos construir para
as próximas gerações, ensejando uma convivência social solidária, mais justa, fraterna, com
menos desigualdades.
Pelo fato de ser parte dessa ação formadora de professores é importante dizer que
foi revisitando a própria prática pedagógica que me dei conta do quanto tem sido desafiador,
como pedagoga, introduzir em sala de aula discussões em torno das concepções de Ciência e
suas epistemologias, os fundamentos e metodologias que deem conta de erigir as bases
teórico-práticas do processo ensino-aprendizagem na formação dos futuros professores de
Física, de Química, de Biologia e da Matemática, tendo em vista a educação científica
consoante com as necessidades sócio históricas e políticas do presente século.
Penso que se o desafio pedagógico é menor para mim como pedagoga e
formadora, posso entender a dificuldade, se ela existe, para os demais professores formadores
nos cursos de Física, Química e Biologia, no sentido de refletir o conteúdo específico de suas
disciplinas à luz dos pressupostos pedagógicos e didáticos, demandando o domínio de
conhecimentos de base teórico-metodológica e epistemológica do ensino e da aprendizagem
da Ciência. Isso se põe numa concepção integradora e de totalidade (MORIN, 2005).
Isto posto, os futuros professores vão formando consciência própria acerca do
próprio saber fazer, com perspectivas emancipatórias, inclusivas, cidadã e transformadora.
Desdobra-se desse movimento, a superação do instrucionismo no processo do ensino, adotada
uma concepção crítica e dialética de sua abordagem14.

14
A concepção dialética que admito no processo de ensino em sala de aula é entendido a partir da visão de
totalidade e de mudança na perspectiva de sínteses construídas resultantes das reflexões sobre a realidade
educacional e social, realizando tal processo de abordagem de forma metódica e sistemática. Neste sentido,
“[...] o método didático necessário é aquele capaz de fazer o aluno ler criticamente a prática social na qual
vive. Esse processo não se realiza individualmente, nem mesmo numa relação a dois entre professor e aluno. É
um processo coletivo pelo qual um grupo de pessoas se defronta com o conhecimento (herança e porvir) e no
qual se perde a perspectiva individual.” (WACHOWICZ, 1995, p. 15 grifo nosso). Trata-se, pois, de
permanente leitura e releitura do conhecimento, do fenômeno ou do problema relacionado com a disciplina,
apresentado no contexto de uma realidade considerada unitária, submetendo a questão a uma análise
totalizadora na busca de suas estruturas, relações, funcionamento [...], resultando em uma sistematização e/ou
uma nova compreensão da realidade analisada/investigada. “Além disso o caminho que a inteligência percorre
para apreender a realidade não é o mesmo que a inteligência percorre para apropriar-se daquilo que foi
descoberto e sistematizado, patrimônio científico e cultural da humanidade. Ambos os resultados são o
conteúdo do conhecimento, porém o primeiro refere-se à ciência, enquanto o segundo refere-se ao
saber.”(WACHOWICZ, 1995, p. 21 grifo nosso). Devo admitir que encontro nesta forma de tratar o processo
formativo limites e possibilidades com referência a: disposição dos alunos professores ao diálogo pelo fato de
39

Entendo o professor como um sujeito histórico que se constrói e define a sua


identidade pessoal e profissional, a partir das relações que estabelece com o mundo que o
cerca, refletindo sobre os contextos sociais e culturais, revestido dos valores produzidos pelos
homens em cada tempo e sociedade (RIOS, 2008). Reconheço a competência acadêmica15 do
coletivo de professores da Física, a disposição e o compromisso que possuem com o trabalho
da formação de professores que realizam. Somados esses caracteres, acredito na capacidade
de refletirem sobre as contradições que cerca o trabalho que realizam na licenciatura em
Física
Nesse sentido, acredito na superação dos limites de uma formação e prática
profissional mecânica e conservadora forjada no modelo curricular positivista e fragmentário
do conhecimento, que engessa e isola os professores em suas áreas profissionais, além de
colaborar para o trabalho isolado de formadores, desconectado dos reais problemas
educacionais em nossa sociedade. Vejo como necessário à superação, mudanças na estrutura e
funcionamento do curso, um novo modelo de coordenação acadêmica, revisão no contexto
das relações entre os sujeitos do coletivo do curso e a reformulação do currículo, sob uma
concepção epistemológica crítica e emancipatória16.

desacostumados com essa prática, rejeição a leituras de natureza pedagógica e didática, atitude refratária em
relação a reflexão e crítica ao conhecimento dado entre as principais.
15
A fim de evitar interpretações contraditórias sobre posicionamentos anteriores neste estudo, esclareço que
adoto o conceito de competência do professor de forma ampla e crítica, com o significado apontado por Rios
(2008, p. 89 grifo nosso), “[...] para dizer que um professor é competente, devo levar em conta a dimensão
técnica – ele deve ter domínio dos conteúdos da sua área específica de conhecimento e de recursos para
socializar esse conhecimento; a dimensão política – ele deve definir finalidades para sua ação e comprometer-
se em caminhar para alcança-las; e a ética, elemento mediador – ele deve assumir continuamente uma atitude
crítica, que indaga sobre o fundamento e o sentido da definição dos conteúdos, dos métodos, dos objetivos,
tendo como referência a afirmação dos direitos, do bem comum.
16
Foge ao propósito deste trabalho uma conceituação e caracterização mais exaustiva de currículo, é interessante,
porém, explicitar a natureza dessa categoria, como a concebo neste espaço investigativo. Antes, ainda, julgo
importante trazer para esta discussão, o espaço que ocupa a instituição formadora, seja ela de nível básico ou
superior para a prática de qualquer proposta curricular que expressem possibilidades de discursos e práticas
emancipatórias, atentando em suas análises para a vinculação com a cultura e a sociedade, as finalidades da
educação e o funcionamento desses espaços. Em seus processos organizativos e pedagógicos tem servido a
práticas educativas homogeneizantes, desconhecendo a diversidade cultural, as desigualdades e injustiças nas
sociedades em geral, promovendo a assimilação das expressões culturais dominantes (SILVA; MOREIRA,
1995; FERRAÇO, 2008). Sobre o conceito de currículo numa perspectiva crítica e emancipatória, trago a
contribuição de Carbonell (2016, p. 56-57 grifo nosso) “[...] De forma geral, um currículo crítico e
emancipador se configura a partir destras premissas: Diante do caráter essencialista e do pensamento único,
propõe-se um currículo que respeite a mais ampla diversidade epistemológica, social e cultural, sobretudo das
vozes mais marginalizadas e excluídas; Diante da sala de aula como espaço negado ao sujeito, defende-se a
criação de espaços onde os estudantes construam seus próprios marcos de significação do conhecimento; Ante
o caráter não histórico e não contextual, propõe-se um currículo que reivindique a memória, que se conecte
com a experiência local da comunidade escolar e se projete para um mundo mais justo e esperançoso; Ante o
império da racionalidade que coloniza o espaço escolar de interesses e dispositivos técnicos, a prioridade
deve recair sobre as considerações éticas; Diante da fragmentação curricular, que se opte pela integração de
40

Libertos das amarras da organização do ensino marcada pela ditadura da


legislação, pela hierarquização acadêmica, pela departamentalização na estrutura do ensino
superior, pela organização curricular por disciplinas, pela homogeneização cultural e social,
pela racionalidade técnica e pela ausência de condições concretas para o trabalho, vejo
possível inovar de fato o processo da formação nas licenciaturas de Ciências do IFMA; (re)
construindo o ser professor e o ser aluno (RIOS, 2008).
Dou-me conta da urgência das mudanças na prática docente formadora no
contexto das licenciaturas da área de Ciências do IFMA, assim como da prática educativa
escolar, que depende dos professores que formamos nos cursos. Através do olhar de
pesquisadores e estudiosos, vejo a jornada da cidadania no século XXI, pela via da educação
cientifica correr riscos de concretização (NARDI; CORTELA, 2015; CACHAPUZ, 2005,
SANTOS, 1999). A instância educativa com a finalidade e capacidade de promover a
emancipação do cidadão é a mesma, com igual capacidade de reproduzir a alienação. Ambas
ações se encontram na dependência das práticas pedagógicas que operam em seu interior,
organizadas com a intenção de atender determinadas expectativas educacionais em uma
determinada sociedade (LIBÂNEO; ALVES, 2012). Se o propósito dessa educação visa à
cidadania a opção por uma prática pedagógica incidirá sobre uma prática pedagógica
inovadora, com implicações teórico-metodológicas crítico-reflexiva e epistemológica
emancipatória (ALARCÃO, 2001, 2005; PIMENTA; GHEDIN, 2002; CONTRERAS, 2002;
RIOS, 2008; GHEDIN; ALMEIDA, 2008; CAMPOS, 2009; LIBÂNEO; ALVES, 2012;
GHEDIN, 2017).
A educação é uma prática social visando a transmissão da cultura humana, e está
sempre submissa ideologicamente aos projetos de sociedades, com obrigações de atender aos
requerimentos/exigências da sociedade e de seu tempo. Não existe processo educacional
neutro, as escolas não se organizam e funcionam de forma independente da sociedade na qual
estão inseridas. À vista disso, atingir o objetivo de agências transformadoras da realidade
opressiva, injusta e excludente não é missão das mais fáceis e exigirá mais ainda dos
professores. Para Silva (2005, p. 25 grifo nosso) “[...] o professor é um ser social, constituído
e constituinte de seu meio. Como pessoa, age e sofre as ações de sua sociedade: ele constrói
e é construído por ela.”

saberes; Diante da superioridade e a compartimentalização das diversas dimensões do ser humano, que se
aponte firmemente pela relação entre o sujeito e o conhecimento, entre a razão e o sentimento, entre o
conhecimento e a emoção, ou entre a estética e a ética.”
41

Romper com a neutralidade ideológica, mudar do lugar comum, ou seja, de


agências de controle ideológico e reprodutor da cultura dominante - currículo oculto17 - para
espaço cultural de mediação do conhecimento promotor da emancipação e desenvolvimento
das pessoas e das transformações sociais, é inteiramente possível tanto para as instituições
formadoras de professores, como para as instituições escolares, no contexto da polaridade
afirmação e contradição18, necessitamos apenas de uma pedagogia consoante com a educação
para este século XXI.
As desigualdades sociais, a marginalização cultural e o descaso com a educação
das camadas majoritárias de nossa sociedade devem implicar para o currículo dos cursos de
licenciatura na área das Ciências reflexões teóricas, metodológicas e epistemológicas na
perspectiva de um novo paradigma de formação a ser assumido pelo coletivo de formadores.
Os projetos dos cursos frente às necessidades de transformação deverão alinhar-se à utopia de
uma sociedade humana, justa e solidária, cujos objetivos são urgentes para a educação da
atualidade. Isto exigirá dos professores das licenciaturas assumir o papel de agentes sujeitos
das mudanças e os alunos-professores também. Os primeiros na condição de Professores
como intelectuais transformadores (GIROUX, 1997 grifo nosso)19.

17
O currículo oculto aqui refere-se àquelas normas, valores e crenças não declaradas que são transmitidas aos
estudantes através da estrutura subjacente de uma determinada aula (GIROUX, 1997, p. 86).
18
Sobre o caráter contraditório da educação, Nascimento, et al. (2006, p.173-174) argumentam que: “A
educação ainda é considerada a via e o caminho da marcha de desenvolvimento do ser humano. O grande
esforço histórico social responsável por trazê-lo até o desenvolvimento científico e cultural na atualidade
efetivou a evolução humana, cujo processo histórico dessa trajetória pode ser considerado resultado do
encontro entre a condição humana e a educação. A educação auxilia os indivíduos a compreenderem a
estrutura da sociedade na qual está inserido, o porquê das transformações que nela se processam e contribui
para que deixem de ser expectadores do processo social visando torná-los protagonistas atuantes na sociedade,
podendo favorecer a mudança social ou se posicionarem contra ela, caso a considerem prejudicial aos
interesses do bem comum.”
19
Introduzo nesta discussão o papel que professores/as formadores/as necessitam assumir nas instituições de
ensino em geral, ou seja, a categoria de intelectuais transformadores, apoiando-me na visão epistemológica
empregada por Giroux (1997), exaustivamente discutida na sua obra “Os Professores como Intelectuais: rumo
a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Entramos para o século XXI e a modernidade com a sua
racionalidade instrumental baniu dos meios educacionais as possibilidades de uma dialogicidade na sala de
aula, caminho para a formação de sujeitos conscientes de sua participação ativa (ou passiva) no seu contexto
cultural. O resgate do diálogo oportunizando o protagonismo de professores e alunos é o ponto de partida para
a compreensão das questões políticas e econômicas as quais engendram a dinâmica da vida na sociedade, nela
incluída a educação, cuja relação de dependência e submissão ideológica ao projeto de sociedade que serve,
contribui para as desigualdades sociais, elo que se rompe com a mediação/socialização do conhecimento
universal, de modo crítico e reflexivo. Entendo com Giroux (1997, p. 161) [...] uma forma de repensar e
reestruturar a natureza da atividade docente é encarar os professores como intelectuais transformadores. A
categoria de intelectual é útil de diversas maneiras. Primeiramente, ela oferece uma base teórica para examinar-
se a atividade docente como forma de trabalho, em contraste com sua definição em termos puramente
instrumentais ou técnicos. Em segundo lugar, ela esclarece os tipos de condições ideológicas e práticas
necessárias para que os professores funcionem como intelectuais. Em terceiro lugar, ela ajuda a esclarecer o
papel que os professores desempenham na produção e legitimação de interesses políticos, econômicos e sociais
42

Ao mobilizar essa problemática inserida em um contexto de múltiplas relações de


natureza política, histórica, legal, cultural, pedagógica, inclusiva e ética, ancorada em
questões econômicas, ao concentrar o foco desses estudos no curso da Licenciatura em Física
entendo que seja necessário articular não apenas uma teoria, mas, teorias educacionais e do
ensino, nas áreas das Ciências Naturais, bem como autores das Ciências Humanas e Sociais,
tendo como pano de fundo a educação para este século XXI. Dada a complexidade que cerca
a formação de professores de Física será fundamental a contribuição teórica de autores que
estudam questões relacionadas ao objeto de estudo desta pesquisa, qual seja, concepções de
Ciência e práticas de ensino formadoras no curso de Licenciatura em Física.
Destituída da intenção de esgotar as reflexões que implicam o tema investigado, e
sem obedecer a uma ordem com rigidez para abordagem das questões apontadas acima, minha
pretensão é ir ao encontro de significados acerca das bases teóricas e metodológicas que dão
sustentação às práticas formadoras de professores no curso de licenciatura em Física,
refletindo e interpretando fatos, dados, histórias e experiências dos sujeitos do processo
investigativo, através de suas narrativas. As questões acima contribuem para o meu objetivo,
qual seja, o de compreender para conhecer as concepções de Ciência, bases epistemológicas e
pressupostos teórico-metodológicos na prática formadora do curso de Licenciatura em Física
para este século XXI.
Na perspectiva de atingir esse objetivo, me propus os seguintes objetivos
específicos:
 Analisar os fundamentos teórico-metodológicos que embasam o
Projeto Pedagógico do Curso de licenciatura em Física, tendo em vista apreender
as aproximações e distanciamentos entre o projeto pedagógico da licenciatura e a
prática docente formadora;
 Discutir possíveis relações entre as concepções de Ciência e a
prática formadora manifesta nos relatos de professores da licenciatura em Física;

variados através das pedagogias por eles endossadas e utilizadas. Percebo que a atividade docente caracterizada
pelo autor deve ser traduzida por “práxis”, desse modo complementaria com ele “[...] nenhuma atividade,
independente do quão rotinizada possa se tornar, pode ser abstraída do funcionamento da mente em algum
nível. Este ponto é crucial, pois ao argumentarmos que o uso da mente é uma parte geral de toda atividade
humana, nós dignificamos a capacidade humana de integrar o pensamento e a prática, e assim destacamos a
essência do que significa encarar os professores como profissionais reflexivos.”
43

 Explicitar concepções teórico-metodológicas que são expressas


pelos professores e que se coadunam com as perspectivas de formação para este
século XXI.
Compreendendo as implicações de concepções de Ciência e as implicações de
bases epistemológicas e teórico-metodológicas nas práticas pedagógicas dos professores
formadores do curso de licenciatura em Física do IFMA, campus São Luís Monte Castelo,
cheguei ao seguinte problema: Que concepções de Ciência e de práticas de ensino formadoras
se manifestam no curso de Licenciatura em Física do IFMA consoantes com este século XXI?
Reside, pois, nesse ponto a preocupação com a formação inicial de professores
haja vista a responsabilidade desses na condição de futuros educadores neste século XXI,
levando em conta a necessidade de superação de concepções dogmáticas de Ciência e da
racionalidade técnica como princípio orientador da atividade docente, amplamente discutida
por pesquisadores no campo da educação em ciências. Além disso, a necessidade de rever a
primazia do método experimental como via única da produção do conhecimento entendendo
que, o conhecimento a ser aprendido, mais que uma descoberta provável de um homem
iluminado pelo espírito da Ciência, em determinado tempo, é uma construção permanente,
mutável teórica e metodologicamente.
Os estudos realizados sobre os relatos e histórias de professores, bem como
minhas próprias experiências vividas e trazidas na memória, antes e durante a investigação
tem como lócus o curso de licenciatura em Física, do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Maranhão- IFMA, Campus São Luís Monte Castelo.
Dessa forma, com a intenção de me orientar no processo investigativo em direção
ao que me propus, priorizando o relato dos professores, considerei necessário conhecer:
(a) as concepções de Ciência dos professores formadores;
(b) a articulação entre os fundamentos científico-pedagógicos do projeto do curso
e a prática docente formadora no curso;
(c) as condições de trabalho dos professores formadores;
(d) as condições de formação proporcionadas aos estudantes pela IES;
(e) o perfil profissional dos docentes formadores na Licenciatura em Física;
(f) os fatores presentes na história do surgimento do curso de Licenciatura em
Física na instituição.
Com base no conjunto nos discursos e histórias das experiências dos professores
buscarei identificar sentidos e significados com os quais compreenderei as concepções de
44

Ciência, bases teóricas, epistemológicas presentes na prática pedagógica dos professores-


formadores, aproximando-me da tese que defendo, qual seja: As concepções de Ciência e de
práticas formadoras expressas pelos professores formadores na licenciatura em Física
implicam pressupostos teórico-metodológicos e epistemológicos que tendem a aproximar-se
da educação para este século XXI.
Nesta primeira parte compartilhei as memórias de minha trajetória no magistério
da educação básica e superior, na relação com os primeiros cursos de formação de professores
do IFMA e os cursos de licenciatura na área das Ciências. As experiências na gestão, que
contaram sobremaneira para estreitar ainda mais o vínculo com a história da formação de
professores criando pontes que favoreceram o conhecimento mais aproximado do lado
complexo do funcionamento dos cursos, imersos em desafios internos como a implantação
dos mesmos sem a necessária e adequada estrutura. Mas foram as fragilidades pedagógicas
observadas nos professores em formação, na licenciatura em Física, que me conduziram ao
encontro do meu objeto como ficou descrito aqui.
45

PARTE II - O PERCURSO METODOLÓGICO NO PROCESSO INVESTIGATIVO

Não é à toa que entendo os que buscam caminho. Como


busquei arduamente o meu! E como hoje busco com
sofreguidão e aspereza o meu melhor modo de ser, o meu
atalho, já que não ouso mais falar em caminho. Eu que tinha
querido. O caminho com letra maiúscula, hoje me agarro
ferozmente à procura de um modo de andar, de um passo certo.
Mas o atalho com sombras refrescantes e reflexo de luz entre
as árvores, o atalho onde eu seja finalmente eu, isso não
encontrei. Mas sei de uma coisa: meu caminho não sou eu, é o
outro, é os outros. Quando eu puder sentir plenamente o outro
estarei salva e pensarei: eis o meu porto de chegada.
(Clarice Lispector)

A escolha do caminho a ser trilhado numa pesquisa diz algo do sujeito que a
conduz. Nesse sentido a opção por uma metodologia está impregnada dos valores,
conhecimentos, experiências e modos de pensar do pesquisador, da mesma maneira que a
abordagem escolhida, constituída por seus pressupostos teóricos e princípios fornecerão os
passos seguros em direção ao que se busca compreender.
Ao pensar sobre a questão metodológica para o tipo de pesquisa que intenciono
realizar estava claro para mim que a abordagem metodológica não poderia ser quantitativa,
uma vez que os fenômenos sociais pouco se encaixam nos procedimentos inflexíveis e no
rigor da objetividade da análise com que estão submetidos os fenômenos físicos na pesquisa
usual. Com Brêtas (2000, p. 84) reforço essa minha distinção, nos seguintes termos:
[....] Enquanto a abordagem quantitativa, influenciada pela matriz positivista,
defende a neutralidade da ciência, o não comprometimento social do pesquisador, a
objetividade dos fatos, a utilização de instrumentos padronizados capazes de
mensurar a realidade objetiva; a qualitativa abriga diversas correntes do pensamento
que se contrapõem ao modelo experimental enquanto padrão único de pesquisa para
todas as ciências, prevalecendo entre elas as orientações filosóficas da
fenomenologia e da dialética. A abordagem qualitativa parte da premissa de que
existe uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, entre o sujeito e o
objeto, entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito.

Por essas razões entendo que a abordagem a ser adotada no âmbito desta pesquisa
é a qualitativa, cuja visão de mundo me permite perceber a relação das partes com a totalidade
e vice-versa. Nessa, a subjetividade do pesquisador com a qual me identifico e dos sujeitos da
investigação - os professores - se integram e se complementam, posto que as respostas obtidas
a partir das análises dos dados/experiências/relatos, ficam impregnadas da pessoalidade e da
temporalidade dos acontecimentos/histórias faladas e escritas. Em outras palavras, das
experiências subjetivas de todos.
46

Desse modo, a produção do conhecimento sobre a formação de professores no


âmbito desta pesquisa, como sustenta Minayo (2013), busca compreender questões da
realidade que não podem ser apenas quantificadas, uma vez que consideram no universo dessa
construção valores, crenças, sentidos, motivos e expectativas em relação aos processos e aos
fenômenos, longe de se constituírem variáveis do tipo experimentais. Ainda como justificativa
para o uso da abordagem qualitativa há a aproximação entre sujeito-e-objeto, uma vez que
ambos são considerados na mesma natureza.
Fazer opção por uma metodologia implica a consciência da complexidade de que
todo objeto de investigação se reveste, e quando se trata de problemas relacionados com o
mundo social a exigência dessa escolha parece ampliar-se. A responsabilidade do
pesquisador, no entanto, se aprofunda na medida em que, através do seu método ou
abordagem, deverá assegurar a condição de dialogar com seu problema de forma a interpretar
imagens, textos, gestos, sentimentos, intenções, falas e o silêncio, como é o caso desta
pesquisa que tem como objetivo de conhecer as concepções de Ciência e práticas formadoras
no curso de Licenciatura em Física.
No contexto da abordagem qualitativa assumo a narrativa como trabalho
investigativo, a qual vem sendo utilizada com muita frequência em estudos relacionados com
a educação, no campo do magistério. Como justificativa, pesquisadores apoiados em Connelly
e Clandinin (2011) costumam apresentar o fato de que os seres humanos são contadores de
histórias e compartilham vidas relatadas. Aragão (2011) afirma isto, assim:
De modo geral, tendemos a chamar de história ou relato ao fenômeno, e de narrativa
à investigação e à feição final do texto daí resultante. Assim, quando dizemos que
vivemos vidas relatáveis e contamos as histórias dessas vidas, precisamos dizer -
para explicar – que os pesquisadores que são investigadores narrativos buscam
recolher essas vidas, descrevê-las e, por sua vez, contar histórias sobre elas,
escrevendo seus relatos de tais experiências em uma narrativa. (ARAGÃO, 2011,
p. 15 grifo nosso).

À vista disso, para essa investigação, recorro à pesquisa narrativa, apoiando-me


em Connelly e Clandinin (2011), com entendimento que as histórias e os relatos dos
professores no processo investigativo certamente estão impregnados de suas experiências
profissionais e de vida, de relevantes sentidos. Para esses autores, a vida e a narrativa estão
ligadas. Recontar essas histórias, emprestando a minha voz aos sujeitos e a suas histórias,
significando-as e atribuindo novos/outros significados, fazendo emergir das suas histórias de
vida, do relato de suas experiências como docentes na licenciatura o contexto real da
47

formação de professores para o ensino de Física, é a ampla possibilidade que me é dada pela
pesquisa narrativa.
Ao inquietar-me com questões da prática formadora e dos pressupostos teórico-
metodológicos e epistemológicos como base da formação docente no curso de Licenciatura de
Física não tive dúvida de que estaria navegando em um mar de incertezas e que precisava de
“alguma certeza” para me direcionar. Foi assim que me aproximei da narrativa. Meu objeto
está situado no centro da pedagogia – educação –formação de professores para o ensino de
Física, logo, seria nas Ciências Sociais que eu encontraria os fundamentos necessários às
reflexões para compreender esta ou aquela concepção basal das práticas e para dar sentido à
educação no século XXI. Se por um lado, as Ciências Sociais me dariam à luz, de outro lado,
precisaria de um caminho para aproximar-me do fenômeno em questão. Com a Narrativa me
apropriaria do passado, presente e futuro da prática formadora, mediante a história oral das
experiências dos formadores e a documental do curso.
Na visão de Connelly e Clandinin (2011, p. 48), da qual compartilho, é possível
dizer o seguinte:
[...] Para cientistas sociais, e consequentemente para nós, experiência é uma palavra-
chave. Educação e estudos em Educação são formas de experiência. Para nós,
narrativa é a melhor forma de representar e entender a experiência. Experiência é o
que estudamos, e estudamos a experiência de forma narrativa porque o pensamento
narrativo é uma forma-chave de experiência e um modo-chave de escrever e pensar
sobre ela. Cabe dizer que o método narrativo é uma parte ou aspecto do fenômeno
narrativo.

Será, portanto, a minha experiência narrativa sobre a experiência dos meus


sujeitos ao tempo da pesquisa narrativa que desenvolverei ao longo da minha investigação. A
valorização da experiência é a própria essência da narrativa, e com referência aos relatos dos
professores constituem-se dados da investigação que se processa. Narrativa é vida e a
pesquisa narrativa me insere e me integra na vida dos sujeitos de forma a compreendê-los com
suas experiências, em espaços e tempos diversos.
Sendo a educação um campo de investigação das ciências sociais e tendo a
narrativa uma tipologia afim nos estudos dessa área, complemento tais ideias com a seguinte
afirmação de Connelly e Clandinin (2011, p. 11 grifo nosso): A razão principal para o uso da
narrativa na investigação educativa é que nós, seres humanos, somos organismos contadores
de histórias, organismos que, individual e socialmente, vivemos vidas relatáveis.
As discussões realizadas afirmam a pertinência desta investigação que se propõe a
apreender questões às quais subjazem reflexões epistemológicas sobre as práticas docentes na
48

formação dos professores para o ensino de Física. Portanto, é na história da formação e na


prática formadora relatada pelos professores do IFMA que situo esses estudos, ao tempo em
que os trato numa abordagem qualitativa, caracterizando a pesquisa do tipo narrativa como
historiografia da formação docente.
De acordo com o meu projeto de pesquisa, defini como lócus de investigação o
curso de Licenciatura em Física do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do
Maranhão-IFMA/Campus São Luís Monte Castelo e como sujeitos da pesquisa, os
professores formadores. Os sujeitos da pesquisa foram selecionados a partir dos seguintes
critérios: (a) ser professor do quadro permanente da instituição; b) estar em pleno exercício da
docência no curso; c) ter vinculação com a história da criação do curso e o presente da
formação de professores de Física, além de d) disponibilizar-se a participar como sujeito da
pesquisa. Parte desses professores (6), pertence ao Núcleo Docente Estruturante da
Licenciatura. Foram entrevistados 16 professores (as) sendo 14 das disciplinas da área
científica e 2 da área pedagógica, os quais foram selecionados a partir dos seguintes
Como integrante do grupo de professores formadores do curso de licenciatura
considero-me parte dessa história, cuidando em manter o devido distanciamento, como
pesquisadora. Destaco, ainda, o meu envolvimento no curso de Física desde o início das
discussões sobre a proposta de sua implantação como das demais Licenciaturas da área de
Ciências do IFMA, me conduzindo à coordenação dos trabalhos das primeiras Comissões
para elaboração dos projetos dos cursos. Esse vínculo nunca se desfez, ao contrário, estreitou-
se mais a cada momento da história das licenciaturas e das mudanças que foram se dando no
funcionamento dos cursos, com o passar do tempo, por imposição das legislações
direcionadas para os cursos de formação de professores, ao longo de anos.
A escolha pelo curso de Licenciatura em Física tem implicações subjetivas para
mim haja vista o que explicitei acima. Outra motivação recai sobre o fato da Física como
componente curricular na Educação Básica ser um dos campos de conhecimento das ciências
que mais ruídos tem provocado na área do ensino, mediante queixas dos alunos em relação a
abordagem pelos professores, no contexto da prática educativa nas escolas. Agucei a minha
motivação no sentido de conhecer as concepções pedagógicas e epistemológicas que
embasam o trabalho da formação na Licenciatura em Física consoante com este século XXI.
Tenho em conta ainda, o compromisso dos colegas formadores e o cuidado que dispensam ao
curso, sempre buscando melhorias. Decidida a contribuir com a coordenação do curso na
49

construção de seu novo projeto, vejo a pesquisa que realizo da maior relevância para a
formação de novos professores.
No âmbito dos procedimentos metodológicos, os sujeitos foram ouvidos em
entrevistas gravadas em áudio, que foram subsequentemente transcritas. As entrevistas dos 16
participantes duraram em média 90 minutos, convertidas em aproximadamente quatrocentas
laudas de material de análise, constituindo o corpus da pesquisa de maior referência. À
medida que avançava no trabalho da transcrição providenciava a devolutiva para os
professores, de modo a validarem o material coletado ou acrescentarem algo mais ao texto, de
acordo com suas percepções e necessidades. Esse material juntamente com os documentos
que foram levantados constituíram o corpus da pesquisa, os quais foram submetidos a
estudos, exaustivas análises e interpretações, tendo em vista a construção desta Tese.
No projeto de pesquisa, a observação do trabalho docente em sala de aula chegou
a ser pensada nos casos em que sua entrevista apontasse essa necessidade. Como havia uma
grande abertura e boa relação com os sujeitos facultando novos contatos para eventuais
esclarecimentos considerei a coleta à altura dos propósitos investigativos, dispensando a
observação citada.
Com essas características a pesquisa se concretizou colaborativamente,
pesquisador e sujeitos, resultando na estruturação dos textos de campo. Isto se deu no âmbito
da convivência com os professores de Física no departamento acadêmico; no trabalho
investigativo de campo;20 na revisão de documentos tais como atas, legislações internas e
externas, projeto do curso, bem como informações administrativas acerca da licenciatura.
Dessa forma, foi possível reunir elementos para uma historiografia básica da formação de
professores de Física do IFMA.
Dando início ao meu projeto de pesquisa tratei de apresentá-lo aos professores da
licenciatura, nas reuniões do Núcleo Docente Estruturante (NDE), junto a outros professores
que haviam sido indicados em assembleia departamental para formar uma comissão, cuja
finalidade seria a de construir uma proposta de reformulação da licenciatura. Essa ocasião
acabou me favorecendo, haja vista que posteriormente fui oficialmente convidada para
integrar a comissão constituída, acompanhando desde então, semanalmente, as discussões em
torno do que seria o novo projeto pedagógico do curso de Física. A Comissão foi constituída

20
Iniciado em janeiro deste ano de 2017.
50

por portaria e foi integrada por professores do NDE da licenciatura, duas professoras
pedagogas do departamento de Ciências Humanas e Sociais, e outra professora da área de
Línguas. Um aluno integrava a comissão representando os estudantes do curso.
Essa experiência foi do meu ponto de vista muito valiosa para este trabalho de
investigação, posto que não só possibilitou maior aproximação com os professores do
Departamento de Física (DEFIS), como me oportunizou ocupar um espaço estratégico
considerado por mim fundamental no processo de construção do novo PPC do curso. Tive
oportunidade de observar as relações profissionais que professores mantêm entre si. Pude
conhecer a visão que possuem em torno de questões pedagógicas, do ensino, das ciências e do
trabalho de formação de professores.
Nas interpretações e análises possíveis dessa experiência nesta pesquisa trago
esses relatos, seja na minha voz seja na voz dos sujeitos, abordando impressões e
aprendizagens dessa etapa inicial do trabalho investigativo.
Caminhando paralelamente com a pesquisa e o trabalho da Comissão na
reformulação do curso realizei as entrevistas com os sujeitos desta pesquisa. Devo confessar
que tinha certo receio da aproximação nesse momento, pressentindo reação negativa dos
professores às questões que havia pensado para o diálogo durante as entrevistas. Contudo, fui
tomada de surpresa com a disponibilidade dos colegas em atender-me. A leitura que fiz sobre
essa atenção revela que o meu envolvimento com o trabalho do NDE na comissão e minha
presença no DEFIS colaborou para que, num espaço inferior a 30 dias, com todas as questões
enfrentadas pelos professores, com horários de sala de aula, trabalho de pesquisa, docência na
pós-graduação, orientação, aulas de laboratório, coordenação de curso, concluíssemos as
entrevistas.
A entrevista, como método na pesquisa narrativa, revela-se da maior importância
e adequação tendo em vista a produção dos textos de campo. Com a obtenção do
consentimento dos sujeitos da pesquisa, as entrevistas foram agendadas semanalmente e
realizadas no próprio Campus21. Pontuo este fato para declarar o clima favorável de ambos os
envolvidos na entrevista. Com as propriedades de uma entrevista semiestruturada, as questões
foram organizadas em torno de quatro eixos principais, quais sejam: (i) a concepção de
Ciência e de Educação para o século XXI; (ii) o conhecimento do projeto do curso e a

21
Na sala do laboratório de ensino I do DEFIS.
51

participação do professor na estruturação e organização da Licenciatura em Física do IFMA;


(iii) o currículo (PPC) do curso de Licenciatura em Física para o século XXI e (iv) a prática
pedagógica dos docentes formadores na Licenciatura. Fica caracterizada assim a relação da
entrevista com os objetivos da pesquisa.
Connelly e Clandinin (2011, p. 153-154) reforçam esse ponto de vista afirmando o
seguinte:
A forma como um entrevistador age, questiona e responde em uma entrevista
formula uma relação e por isso os participantes respondem e dão relatos de suas
experiências. O mesmo ocorre considerando as condições que a entrevista acontece
e também a forma, por exemplo, o local, a hora do dia e o grau de formalidade
estabelecida.

Considero que na pesquisa narrativa o elo que se forma entre o pesquisador com
os sujeitos participantes através de suas histórias e das histórias desses sujeitos com o
pesquisador não se completa se não enquanto a pesquisa se desenvolve. A investigação é
precisa em terminalidade, entretanto, se os dados obtidos no processo necessitam ser revistos,
retorna-se às fontes e recomeça-se, num fluxo contínuo, em direção ao objeto, até que o
estado de compreensão esperado possa ser alcançado.
Outros procedimentos da pesquisa empírica foram igualmente planejados.
Mantive em sigilo a identidade dos sujeitos da pesquisa, utilizando nome ‘fantasia’; obtive
consentimento para gravação das entrevistas em áudio; fiz transcrição das entrevistas e
devolutiva aos sujeitos a fim de que complementassem ideias, falas, sentimentos. Das minhas
observações como participante em reuniões, comissões de trabalho e outros eventos, como
pesquisadora, registrava em Diário de Campo dados, aspectos e detalhes considerados de
relevância para o processo de construção do relatório da tese.
A tessitura de uma tese com as características da narrativa se move na
imprevisibilidade do passo seguinte. A incompletude e o inacabamento do pesquisador, como
os concebem Paulo Freire, é explicativo nesse cenário de incertezas e tensões que envolvem a
interpretação, a narrativa e a Tese. Se tentarmos buscar compreender o objeto investigado de
maneira solitária dificilmente o alcançaremos. A experiência não está em nós, em mim, mas
no sujeito que a viveu com os significados que construiu a partir dos próprios conhecimentos,
valores, crenças, interações. Será ainda com os teóricos que escolhemos para nos conduzir às
tempestades de luz (MORAES, 2003) que caminharemos. Conferir significados à
manifestação de sentido do outro exigiu meu envolvimento de corpo inteiro como
pesquisadora, cuja primeira leitura e apreensão dos sentidos e significados
interpretados/produzidos se deram advindos do diálogo, do ouvir a história do outro.
52

A impressão e o sentimento que em mim ficou do momento das entrevistas com


os sujeitos, registrado no Diário de Campo, foi a de que os cinco sentidos se aguçavam em tal
proporção que formava uma única via de percepção. De repente não se escuta com o ouvido,
mas com os olhos, não se interpreta o som das palavras, mas os gestos e expressões. A
emoção do sujeito é percebida pelo pesquisador, com a sensibilidade possível. Assim se deu
todo o processo de apreensão dos significados que eu buscava compreender.
Não foi diferente o exercício do ouvir, do interpretar e do refletir sobre os
discursos, gestos, reações dos professores no espaço das reuniões da comissão de
reformulação, constituída pelo NDE do curso de Física-Licenciatura, com representação de
professores de outras áreas, ligadas ao curso. Durante meses22 encontramo-nos com o
propósito de construir e sistematizar uma proposta de Projeto Pedagógico de Curso – PPC
para a Licenciatura em Física23. Priorizei tais encontros na intenção primeira de apreender as
concepções e práticas formadoras dos professores, vez que, a comissão não poderia ser um
espaço mais apropriado para viver esse desafio, dadas as discussões a esse respeito que
francamente ocorreriam. Seria aquele cenário, o mais apropriado para a expressão do que os
sujeitos pensavam e compreendiam da ação de formar professores de Física. Como segunda
intenção, a opção feita pela participação no trabalho da comissão foi movida pelo meu
envolvimento no processo de criação, implantação e gestão das licenciaturas do IFMA, o qual
gerou ao longo dos anos meu compromisso com os cursos de formação de professores. Uma
história de décadas que guardo na memória da minha jornada profissional naquela instituição.
É importante destacar o compromisso da equipe de professores com a tarefa da
reformulação. Não eram muitos e a frequência às reuniões variava bastante, contudo, nunca a
ponto de comprometer o trabalho em andamento. Delimitei de início quais seriam a minha
participação e contribuições ao trabalho, deixando clara a minha intenção mais imediata ao
integrar o grupo, ou seja, os objetivos de pesquisa. Procurei participar com assiduidade e
afinco desses encontros até uma certa altura do tempo, afastando-me após alguns meses de
trabalho da Comissão, pelo imperativo da pesquisa.
Negociamos na ocasião da primeira reunião que eu auxiliaria com os
esclarecimentos sobre os fundamentos pedagógicos do currículo - PPC - e eles coordenariam

22
Refiro-me ao tempo de 4 meses, de janeiro a abril, às quartas-feiras.
23
Cumprindo determinações das novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível
superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de segunda
licenciatura) e para formação continuada (Resolução CNE/CP Nº 2, de 1º de julho de 2015).
53

o debate sobre a parte específica do currículo do curso. Em conjunto decidiríamos por voto, as
posições tomadas dentro do grupo. Foram momentos de intensos e acalorados debates na
maior parte do tempo, ricos em aprendizagem para os dois lados. As leituras que eu havia
proposto para o início do trabalho não foram completamente acatadas, a Comissão alegava
falta de tempo, pressa e objetividade na conclusão dos trabalhos, o que não me causou
estranheza, haja vista ser caraterística dos profissionais da área das ciências duras. Por
diversas vezes insistia que aprofundássemos as discussões acerca do trabalho de formação de
professores; desejava debater o perfil de profissional que de fato estávamos projetando
naquele momento e qual seria o perfil necessário ao momento vivido pela sociedade na
atualidade; trocar ideias sobre as bases teóricas da prática pedagógica e docente e suas
relações com o contexto econômico e político como fatores relevantes para a formação do
professor como intelectual transformador. Não demorei muito para perceber que não
conseguiria ir além da conquista da participação no grupo como colaboradora, as decisões
estavam com a coordenação dos trabalhos, majoritária dos docentes da Física.
Na tentativa de contribuir para a reformulação do projeto, tratei de abordar a
importância de se pensar, coletivamente, uma concepção de professor e de processo de
formação, a serem transpostas para o currículo do curso de Física, que constituiu o primeiro
grande desafio; iniciar o trabalho avaliando o antigo PPC do curso pareceu ser o segundo
desafio; nas discussões sobre a inserção ou exclusão de disciplinas na matriz curricular dos
cursos estimulava sempre o debate para focar a natureza e identidade do curso, constituindo o
terceiro desafio; destituir a primazia da teoria sobre a prática ou modificar o entendimento da
separação entre o conceito e sua aplicação era, sem dúvida, o quarto maior desafio, mesmo
que esbarrasse nas concepções mecanicistas de formação dos colegas na comissão.
As minhas argumentações eram sobremaneira respeitadas, embora parecessem
muito difícil de serem acolhidas face à distância teórica que existia entre o que eu falava e o
que eles acumulavam sobre os temas de educação, prática docente, formação de professores,
dentre outros, para uma prática educativa deste século.
Porém, ficou claro desde o início que a opção deles em tratar da reformulação,
começando pela matriz curricular do curso, era o que mais interessava e estava em jogo, haja
vista que a composição da matriz era objeto de divergências no grupo do DEFIS como um
todo. Isto porque alguns poucos colegas professores eram favoráveis à construção de um
projeto de curso garantindo a identidade para a docência, com visão emancipatória e
54

transformadora, e os demais, preocupados com uma ampla base científica do futuro professor,
com aptidões e/ou interesse para a pesquisa e pós-graduação tão somente.
Trago na memória cada cena dessa experiência e no diário de campo as anotações
precisas das relações que fiz do que observara em relação ao meu objeto de investigação. Na
expressão de Connelly e Clandinin (2011, p. 120), quando pesquisadores narrativos estão em
campo, eles deixam de estar ali como mentes sem corpo, registrados nas experiências de
alguém. Eles também estão vivenciando uma experiência, qual seja: a experiência da
pesquisa que envolve a experiência que eles desejam investigar.
A seleção e organização de documentos como o PPC do curso, textos da
legislação correspondentes a diretrizes para o curso, dados de ingresso, permanência e
conclusão de estudantes no curso são reveladores do processo de formação dos professores. A
meu ver, o PPC, entre outros, é o documento de maior importância para o curso e para a
pesquisa. Respeitando as determinações das Resoluções dos Conselhos Superiores de Ensino,
concentra as orientações e os fundamentos filosóficos, pedagógicos e didáticos do curso, em
torno dos quais as ações complementares a esse se subordinam e se adequam. A análise dessa
documentação compõe um dos textos de campo e constará do capítulo que trata do corpus da
pesquisa.
Após a pesquisa empírica, o passo subsequente se deu com a construção dos
textos de campo. Desse modo, iniciei timidamente o trabalho, pois me preocupava se já
estaria em condições de interpretar e analisar os dados coletados, apreender os nexos dos
diálogos que acompanhava quando estive presente no Departamento de Física, as falas nas
discussões reiteradas vezes sobre um mesmo conceito ou uma mesma postura, durante as
reuniões de reformulação do PPC e nas entrevistas.
A complexidade dessa tarefa equipara-se à compreensão do conteúdo das falas
dos professores. Por outro lado, fora as entrevistas eu não havia solicitado permissão para
gravar diálogos e debates, apenas para observá-los em situações de trabalho que, a meu ver,
tornava a interpretação, análise e construção do texto complicadas ou complexas. Esse
problema pareceu mais ou menos contornado com os registros no Diário de Campo (DC),
“meu velho companheiro de trabalho”. Meu DC esteve presente todo o tempo e em todos os
lugares que precisei transitar na intenção de obter as informações que precisava.
A transcrição e interpretação dos dados constituíram o corpus da pesquisa. Foi
previsto desde o projeto de pesquisa que para a análise e interpretação do corpus seria
utilizada a Análise Textual Discursiva – ATD. Trata-se de uma construção “com muitas
55

mentes”, cuja interpretação faço a partir desse momento, e que estará afinada com a fala dos
sujeitos, ou seja, com os autores do texto original. Esta fase da investigação, segundo Moraes
e Galiazzi (2007, 20-21) exige uma impregnação aprofundada com os elementos do processo
analítico. Somente essa impregnação possibilita uma leitura válida e pertinente dos
documentos analisados. Sou de acordo que nada é realmente dado, mas tudo é construído.

O Lócus e os Sujeitos da Pesquisa

A aproximação do meu problema de pesquisa com a história da formação dos


professores iniciada no antigo CEFET-MA, prolonga-se até o presente, com o atual Instituto
Federal do Maranhão - IFMA, Campus São Luís Monte Castelo, neste, situado o meu lócus de
investigação já anunciado – o curso de Licenciatura em Física. O IFMA corresponde a mais
nova institucionalidade, completando uma década. No entanto, suas origens estão marcadas
por uma história de inúmeras transformações e mudanças em sua identidade e missão social,
transcorridas num período que compreende mais de um século, contada numa história de
muitas memórias. Revisitando esse tempo, fiz opção por trazer alguns cenários dessa história
que guardam relação com esta pesquisa. A experiência histórica que fica no passado, quando
revisitado, confere sentido ao presente, tal como realça Foucault (2004, p. 147):
A construção, preservação e valorização dos lugares de memória contribuem para
que, no futuro, não se estabeleça, como contraponto à sociedade do conhecimento, a
sociedade do esquecimento, onde o presente será descontínuo e ausente de sentido.
Mas são as palavras, expressões, riscos e rabiscos das materialidades textuais do
passado que corporificam e dão sentido ao presente, a partir dos enunciados, do
dizível e das práticas discursivas que emanam das séries documentais depositadas
em caixas, armários e estantes de arquivos e bibliotecas. Entretanto, os lugares de
memória não são espaços de recolhimento da poeira dos enunciados, mas é onde
ocorre a ressurreição de uma multiplicidade de enunciados oferecidos ao tratamento
e à manipulação.

Os cursos de formação de professores na área de Ciências e Matemática do IFMA,


dentre estes a Licenciatura em Física, vale insistir, ocupa lugar no cenário histórico de uma
instituição centenária. Resistindo ao tempo e acomodada aos interesses econômicos em cada
fase da expansão industrial brasileira e mundial, acolheu várias denominações institucionais,
até a atual IFMA. Considero, portanto, oportuno fazer um breve passeio na história dessa
institucionalidade, situando a educação superior com seus cursos de licenciatura, cujas origens
articulam-se e integram-se com a história da educação profissional técnica.
O atual Instituto Federal do Maranhão em sua origem e história incorporou
inúmeras institucionalidades. Essa história tem início em meados do século XIX, quando o
56

presidente da província do Maranhão24decidiu pela implantação de um ensino de ofícios.


Através de mensagem à Assembleia Legislativa, solicitou a criação de uma escola que veio a
se chamar: Casa de Educandos Artífices (CEA), em nosso Estado foi denominada: Casa dos
Educandos Artífices do Maranhão. O funcionamento dessa escola ocorreu assim em 1842,
vocacionada para o ensino de uma profissão destinada aos “desvalidos da sorte, assim como
aos órfãos e enjeitados”.
A CEA do Maranhão tinha por finalidade acolher, e ensinar um ofício. Para tanto
foram criadas as oficinas de carpintaria, de pedreiro, de sapateiro, alfaiataria e espingardeiro,
e as primeiras letras. Aos poucos se foi “enriquecendo o currículo” no qual eu destaco o
componente de Ciências Naturais, Agricultura e outros. Castro (2006, p.8) descreve o fato,
assim:
[...] Por ordem do presidente da Província, foi criada na Casa, em 1863, a aula de
Ciências Naturais, a ser ministrada pelo Doutor Caetano Candido Cantanhede, lente
dessa mesma cadeira no Liceu, com a finalidade de instrumentalizar os alunos com
conhecimentos de física e de química. Essa aula era ministrada três vezes por
semana, às segundas, quartas e sextas-feiras, nas dependências do estabelecimento.
Entretanto, para funcionar, necessitava de aparelhos e espaço físico para acomodar
grafômetros, bússolas, pranchetas, esquadrias de agrimensura, marcos de nível
d’água e de nível de bolha de ar, escalas de cobre de duas dimensões, dentre outros
instrumentos necessários.

É possível ter ideia que as dificuldades para o funcionamento da escola eram de


toda ordem. Após haver passado por períodos de glória e de declínio, convivendo com sérios
problemas de manutenção por parte do tesouro provincial, as portas da ‘Casa’ foram fechadas,
por ordem do Governo Provisório do Estado, no final da monarquia (CASTRO, 2006.),
deixando para trás uma história de 48 anos de bons serviços prestados à província. No
governo do Presidente Nilo Peçanha, contudo, a educação profissional é retomada com grande
impulso, tendo sido um marco histórico que se desdobrou mais tarde na criação da rede de
escolas técnicas federais25.
As transformações prosseguiram e duas décadas depois veio uma nova mudança
no sistema, posto que o ensino profissionalizante passa a receber maior atenção por parte do
governo federal26. Através da Lei Federal Nº 378 de 13 de janeiro de 1937, as EAA passaram
a se chamar Liceus Profissionais. A EAA do Maranhão recebeu a denominação de Liceu

24
No ano de 1841 a província do Maranhão era presidida pelo Dr. João Antônio de Miranda.
25
Através do Decreto Nº 7.566, de 23 de setembro do ano de 1909, foram criadas Escolas de Aprendizes
Artífices (EAA), visando o ensino técnico. Um total de 19 unidades, uma em cada estado da União. Em janeiro
do ano seguinte, instalou-se a Escola de Aprendizes Artífices do Maranhão.
26
Com a criação do Ministério da Educação na década de 1930, o ensino técnico inicia uma nova fase, sendo
considerado um período de grande expansão do ensino industrial.
57

Industrial de São Luís, permanecendo no bairro do diamante. Porém, um ano antes fora
lançada a pedra fundamental da fundação do prédio que abriga no presente o IFMA Campus
São Luís Monte Castelo. Neste espaço localiza-se a Licenciatura em Física de que trata esta
pesquisa.
Na década seguinte uma nova ordenação do sistema educacional é provocada pela
Reforma Capanema. Por meio das Leis Orgânicas do Ensino: industrial, secundário,
comercial, agrícola, primário, normal e agrícola, no período compreendido entre os anos de
1942 e 1946 foi consolidada a dualidade no ensino. Desse contexto, emergem as Escolas
Técnicas Industriais, reproduzindo a divisão social do trabalho e das classes constitutivas da
sociedade à época. Assim, o nosso Liceu Industrial de São Luís transforma-se em Escola
Técnica de São Luís27.
Nessa perspectiva, a educação superior na Rede Federal desponta timidamente ao
final da década de 7028, abrangendo três escolas técnicas, Minas Gerais, Paraná e Rio de
Janeiro pelo fato de possuírem estrutura física de boa qualidade, uma vez que suas
instalações, laboratórios e equipamentos, e estrutura pedagógica, corpo docente e
administrativo eram considerados de excelência. Por isso as referidas instituições obtiveram
do governo federal autorização para oferecer cursos de graduação. Desde aí se transformam
em Centros Federais de Educação Tecnológica – CEFETs - diferenciando-se das demais
unidades de Ensino Técnico, suas coirmãs.
Considerando esses aspectos, unidos a questões de ordem política, a escola
técnica local transformada em Centro Federal de Educação Tecnológica do Maranhão –
CEFET-MA, dez anos depois foi autorizado a implantar e desenvolver cursos superiores 29.
Em função disto poderia ministrar ensino de 2º grau técnico, ensino superior e de pós-
graduação; desenvolver pesquisa, cursos de extensão e de aperfeiçoamento. Ingressa desse
modo na esfera da educação superior, com 80 anos de história na educação profissional.

27
A transformação se deu por força do Decreto Nº 4.127 de 25 de fevereiro de 1942. Uma história de muitas
mudanças estruturais e educacionais. No ano de 1959, as Escolas Técnicas foram transformadas em Escolas
Técnicas Federais. Com a Lei Nº 3.552, de 16/02/1959, os estabelecimentos de ensino passam a gozar de
autonomia administrativa e financeira. As mudanças neste período atenderam a “necessidade” de formação de
técnicos/mão-de-obra, disponível ao célere processo de industrialização do país. Nesse contexto, em setembro
de 1965, através da Portaria 239, a nossa instituição recebe a denominação de Escola Técnica Federal do
Maranhão.
28
Lei Nº 6.545, de 30 de junho de 1979. Dispõe sobre a transformação das Escolas Técnicas Federias de Minas
Gerais, do Paraná e Celso Suckow da Fonseca em Centros Federias de Educação Tecnológica e dá outras
providências.
29
A criação do CEFET-MA se deu através do Decreto Nº 97.561, de 2 de março de 1989.
58

O CEFET-MA escreve uma nova página na história de sua secular


institucionalidade, dada à implantação da educação superior tecnológica, com o curso de
Tecnologia em Eletrônica Industrial, demarcando o início da oferta de cursos de formação de
professores: Licenciatura Plena em Matérias Específicas do Ensino Industrial de 2º grau, nas
modalidades da Construção Civil, Eletricidade e Mecânica30. Os cursos tiveram início no ano
de 1992. As memórias de um professor de Física que viveu esse momento histórico da
inserção do CEFET-MA inicial, da implantação dos primeiros cursos de formação de
professores, são representativas desse contexto quando ele relata:
Eu estou aqui desde o início. Não dá Licenciatura em Física, mas da formação
desses cursos superiores que era o CEFET-MA. Na época eu era professor da
UEMA, depois fui ser coordenador da área de pesquisa, projeto e pesquisa da
universidade, então do departamento de Física era eu e outro Professor desde o
início mesmo. Isso deve ter sido na década de 90. Então como era a estrutura? O
projeto que foi feito inicialmente era somente para os alunos que tinham terminado o
técnico. Não tinha vestibular, era exclusivo. Era somente para essas pessoas que
tinham uma formação aqui no CEFET-MA. Era um vestibular exclusivo mesmo,
não era aberto. Então, aqui tinha os cursos que eles chamavam tecnólogos e que
depois foi uma confusão que não era técnico. Isso foi no início.... Eu senti a
necessidade de um curso de Licenciatura voltado para a eletromecânica, para a
mecânica, mas quem poderiam ser esses profissionais? Esses profissionais teriam
que ser os profissionais que já teriam passado pela Escola Técnica. Como na época o
governo estava dizendo que para você ser professor você precisava estar formado,
então eu não podia pegar um artífice desses se ele não tinha uma formação superior
para lecionar. Então, eu tinha que criar um curso de Licenciatura para isso. Eu não
podia pegar uma pessoa que terminou o científico, como ele vai ensinar mecânica se
ele nunca
viu mecânica? A justificativa de exclusividade foi por aí, então eu fiz essas
Licenciaturas voltadas para a Mecânica, para a Elétrica, exatamente para poder
suprir a necessidade no futuro porque estariam se aposentando esses outros
professores e o próprio governo tinha uma lei que a parti daquele momento você
teria que ter o curso superior.

Comecei a minha história na educação superior entrelaçada com as histórias dos


cursos de Licenciatura em Eletricidade, Mecânica e Construção Civil, no ano de 1996,
incumbida de lecionar a disciplina Didática nessas Licenciaturas. O trabalho de formação dos
professores desde então já demarcava a separação dos docentes formadores, motivados pela
estrutura curricular dos três cursos, ou seja, a parte específica e a parte pedagógica,
ministradas isoladamente. Portanto, uma formação de professores inicial, fragmentada desde
então. Nos encontros pedagógicos realizados com o objetivo de elaborar os planos de trabalho
para a formação docente, a separação se repetia, os dois grupos mantinham-se isolados por

30
Referidos cursos foram autorizados por Decreto da Presidência da República em 28/01/1992, obedecendo o
que dispunha o artigo 47 da Lei Nº 5.540 de 28/11/1969. Nesse ano de 1992, teve início o funcionamento dos
cursos de Engenharia Mecânica Industrial e Engenharia Elétrica Industrial, com o primeiro vestibular, para
estes cursos.
59

área de conhecimento: educação, eletricidade, construção civil e mecânica. A organização da


instituição em departamentos acadêmicos também favorecia essa separação.
Até 1999 a oferta dessas licenciaturas foi realizada com grande procura e êxito,
declinando progressivamente. A organização do currículo dos cursos adequava-se ao modelo
da racionalidade técnica31. Quando ressalto o êxito do trabalho da formação refiro-me
principalmente ao compromisso e empenho dos professores formadores e dos coordenadores.
Contudo, a retração da matrícula nos anos subsequentes forneceu indícios para a decisão da
direção do ensino superior do CEFET-MA de não abrir novas vagas e encerrar os cursos. No
ano de 2001 os últimos alunos concluíram o curso, encerrando uma história de sucesso das
Licenciaturas Plenas em Matérias Específicas do Ensino Industrial de 2º grau. Outro
acontecimento motivador relacionou-se à aprovação do Decreto nº 2.208/9732 desenhando
outro cenário para a formação de professores. Submetido a severas críticas pelos educadores e
pesquisadores da educação profissional, este decreto foi revogado em 2004 e substituído pelo
Decreto Nº 5.15433.
Dos cursos superiores desse período ainda funcionam os de Engenharia Mecânica
Industrial, Engenharia Elétrica Industrial e Tecnológicos. A formação de professores no
CEFET-MA tende a apresentar novos contornos com o Programa Especial de Formação
Pedagógica de Docentes para as disciplinas do Currículo do Ensino Fundamental, do Ensino
Médio e da Educação Profissional em nível Médio, amparado pela Resolução CNE/CEB Nº
02/199734.
Do cenário político-econômico dessa década, marcado por um amplo processo de
reforma na educação, bem como da composição de forças entre o setor público e o privado

31
[...]formação que considera o professor apenas como transmissor de conhecimentos, que se preocupa somente
com a formação de atitudes de obediência, de passividade e de subordinação nos alunos, que trate os alunos
como assimiladores de conteúdo, a partir de simples práticas de adestramento que tomam como mote as
memorizações e repetições de conhecimentos que pouco têm a ver com a realidade dos alunos (GHEDIN;
ALMEIDA, LEITE, 2008, p. 30).
32
O Decreto Nº 2.208 de 17 de abril de 1997, regulamentava o § 2º do Art. 36 e os Art. 39 a 42 da Lei Nº 9.394
de 20/12/1996. Foi objeto de críticas por quase todo o segmento de professores e educadores dedicados ao
ensino e a pesquisa na educação profissional. O que motivou a insatisfação deveu-se principalmente ao que
estava previsto em seu Art.9º - “As disciplinas do currículo do ensino técnico serão ministradas por
professores, instrutores e monitores selecionados, principalmente, em função de sua experiência profissional
[...]”. Com efeito, observou-se uma desmobilização na formação de professores para as áreas técnicas na
medida em que facultava a admissão de professores aos cursos técnicos, desde que comprovada a experiência
profissional do mesmo.
33
O Decreto Nº 5.154 de 23 de julho de 2004, regulamenta o § 2º do art. 36 e os Art. 39 a 41 da Lei nº 9.394, de
20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências.
34
Resolução CNE/CEB Nº 02/1997, dispõe sobre os programas especiais de formação pedagógica de docentes
para as disciplinas do currículo, do ensino fundamental, do ensino médio, e da educação profissional de nível
médio.
60

resultou a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educacional Nacional (LDB 9394/96).


Com a promulgação dessa Lei novas políticas e nova legislação foram regulamentadas,
instituindo diretrizes e normas para a educação nos níveis Básico e Superior, em sintonia com
as rápidas transformações que se processavam na sociedade (adaptação ao mercado de
trabalho e às condições para o exercício profissional).
Entre outras recomendações da nova lei foram instituídos os Parâmetros
Curriculares Nacionais – PCN (1999)35, orientando os saberes fazeres docentes na Educação
Básica. De acordo com Nardi e Cortela (2016, p.25-26) os PCN foram baseados em modelos
educacionais desenvolvidos na Espanha, vez que os documentos defendem o uso de
abordagens interacionistas para desenvolvimento de conteúdos e para a concepção de
competências. O modelo de competências perpassa o documento que passa a ser alvo de
críticas de educadores e pesquisadores brasileiros, em razão de aspectos filosóficos e
pedagógicos supostamente contraditórios.
Nesse cenário o CEFET-MA abre espaço para a oferta de novas licenciaturas, uma
vez que a LDBEN 9394/96 definiu que a formação de professores se fizesse em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos
superiores de educação (Art. 62). Desse modo, foi criado o curso de Licenciatura Plena em
Matemática, pelo Conselho Diretor CONDIR/CEFET-MA (Resolução Nº 12/1998)36, com
funcionamento a partir de 1999, em convênio com aproximadamente 40 prefeituras. A oferta
de cursos foi diversificada com a implantação das Licenciaturas em Ciências.
No contexto das regulamentações da LDBEN 9394/96 foram aprovadas
posteriormente as Diretrizes Curriculares para a Formação de Professores da Educação Básica
em nível superior (Parecer CNE/CP 09/2001; Resolução CNE/CP 01/2002), traçando “um
novo paradigma” na formação para o magistério ao adotar também o modelo de
competências. No interior das comissões de trabalho os debates foram intensos, posições
favoráveis e desfavoráveis com opção para uma concepção de competências que articulasse a
formação de professores garantindo a dimensão histórica e social da produção do
conhecimento e uma prática pedagógica emancipadora dos alunos na graduação e por

Parâmetros Curriculares Nacionais – Ensino Médio – Parte III – Ciências da Natureza, Matemática e suas
35

Tecnologias.
36
Resolução Nº 12/98, de 29 de dezembro de 1998. Aprova, ad referendum do Conselho Diretor do Centro
Federal de educação tecnológica do Maranhão, a Criação do Curso de Licenciatura Plena em Matemática.
61

extensão nas escolas. Se forem observados os projetos pedagógicos dos cursos tal proposta
poderá ser evidenciada mesmo com ressalvas.
As licenciaturas na área das ciências vieram dois anos depois em resposta ao
quadro de carências de professores de Física, Química e Biologia no Estado e no restante do
território nacional nessa década, quadro inalterado até os dias de hoje, pela ação desfalcada e
lenta de políticas de valorização da carreira, diluídas nos discursos, desaparecendo muitas
delas no vão das intenções, resulta desse contexto uma profissão pouco atrativa para os
candidatos que se lançam ao magistério. Com efeito a desistência dos iniciantes nos cursos de
formação pode ser uma resposta aos altos índices de evasão nas licenciaturas da área das
ciências.
A criação desses cursos no CEFET-MA se deu através da Resolução Nº 08/200137
do CONDIR/CEFET-MA, aprovando inicialmente o Programa Especial de Formação de
Professores para a Educação Básica dos cursos de Licenciatura Plena em Informática e
Licenciatura Plena em Ciências, com habilitação em Física, Química e Biologia, considerando
as deliberações do Conselho Nacional de Educação - CNE, o CONDIR/CEFET-MA, por
meio da Resolução Nº 18/200538 que alterou a Resolução Nº 08/2001 e autoriza o
funcionamento dos cursos de Licenciatura Plena em Química, em Física, em Biologia e em
Informática. Este último foi desativado no presente, por decisão do Conselho Superior da
Instituição, considerando controvérsias acerca de sua finalidade de formação.
Tenho registrado na memória o movimento da Instituição com o empenho dos
colegas dos Departamentos Acadêmicos nas comissões de trabalho, tendo em vista a
construção dos projetos dos cursos. Para cada nova Licenciatura foi formada uma Comissão
para elaborar o PPC, fazendo um enorme esforço para estruturar e organizar os Projetos das
Licenciaturas, dado que nem todos possuíam um lastro teórico e epistemológico no campo da
educação e o CEFET-MA não acumulava qualquer experiência na formação de professores
para a área científica. Nossos encontros de trabalho eram sempre tensos e difíceis, as
discussões teóricas às vezes se prolongavam, outras vezes o tempo se consumia e não
conseguíamos avançar. Com todas as limitações e possibilidades as propostas foram dadas

37
Resolução Nº 08/2001, de 04 de junho de 2001. Aprova o Programa Especial de Formação de Professores para
a Educação Básica dos Cursos de Licenciatura Plena em Informática e Licenciatura Plena em Ciências com
habilitação em Física, Química e Biologia.
38
Resolução 18/2005, de 30 de junho de 2005. Aprova a alteração do Ar.1º da resolução Nº 09/2001de 04 de
junho de 2001 e dá outras providências.
62

como concluídas no ano de 2000, ano anterior ao do início das atividades pedagógicas dos
cursos.
O lançamento das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
Professores (2001) coincidiu com a implantação das licenciaturas em Física, Química,
Biologia e Matemática. Estando esses cursos no início de seu funcionamento as comissões de
trabalho trataram de fazer os ajustes dos Projetos Pedagógicos às novas diretrizes, desse modo
o curso da área das ciências incorporou as novas Diretrizes Curriculares para a Formação de
Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena
(Parecer CNE/CP 09/2001 e Resolução CNE/CP 01/2002).
Em 2002 o CNE estabeleceu as Diretrizes curriculares para os cursos de
Bacharelado e Licenciatura em Física, a Resolução CNE/CES 09/2002, novas orientações
foram aplicadas aos projetos dos cursos. Na visão de Nardi e Cortela (2016, p. 27) essas são
em muitos pontos incompatíveis com aquilo que é proposto nas Diretrizes Curriculares para a
Formação de Professores da Educação Básica. Concordo, pois, as políticas educacionais no
bojo das legislações com a finalidade de ajustar-se aos projetos econômicos em voga impõem
concepções dogmáticas dificultando a elaboração de propostas inovadoras e emancipatórias
para a formação de professores.
É oportuno lembrar que a criação e funcionamento das novas licenciaturas ocorreu
no tempo e espaço limítrofe de uma institucionalidade com um século de tradição em
educação profissional técnica que passou a centro federal - CEFET-MA - portanto, com uma
série de restrições de ordem estrutural, material e de pessoal – professores, técnicos e
servidores administrativos, para aportar os novos cursos de licenciatura na área das ciências e
da matemática. Essa condição obrigou os professores que à época atendiam aos cursos
técnicos e às engenharias, assumirem compromissos com a formação de professores, sem uma
qualificação adequada à tarefa. A ausência de formação pedagógica dos professores
formadores certamente freia alguns avanços de bases teórico-metodológicas e epistemológicas
no processo da formação docente. A parte do currículo da área de educação das Licenciaturas
novas pode contar com os professores remanescentes das Licenciaturas em Mecânica,
Eletricidade e Construção Civil que estavam praticamente encerradas nesse período.
Em torno dos projetos curriculares das novas licenciaturas havia por parte de um
pequeno grupo de professores a expectativa de superação do modelo da racionalidade técnica,
visão burocrática do ensino, acrítica, por uma educação de base emancipadora para assegurar
reflexividade no processo da formação dos novos professores. No entanto, encontravam
63

barreiras a exemplo das mencionadas acima e de ordem legal. Por menores ou maiores que
fossem os avanços apontados pelos projetos dos cursos, observava-se que o conjunto da
formação apresentava rupturas e fragilidades metodológicas na prática docente formadora.
Era possível chegar a essa inferência na própria sala de aula, mediante a observação do perfil
docente que se desenhava nos alunos professores, no interior dos cursos.
Como professora da área de educação lecionando disciplinas nas licenciaturas,
pude participar da elaboração de projetos de criação e implantação das licenciaturas em
ciências; implementação e mais recentemente, da reestruturação dos cursos de Química e de
Física, visando atender às novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em
nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos
de segunda licenciatura) e para a formação continuada ( BRASIL, 2015).
Avançando no tempo e na história da instituição o ano de 2008 se revelou um
marco na institucionalidade da IES como também para as licenciaturas. Em dezembro desse
ano o governo federal realizou o maior investimento da história, na educação profissional e
tecnológica, expandindo a rede e ampliando a oferta de vagas no ensino profissional de nível
médio e na educação superior, com a obrigatoriedade da oferta de vagas para as licenciaturas
em ciências, fixadas percentualmente.
Sobre o movimento de expansão da Rede, Pacheco e Silva (2009, p. 8), dirigentes
da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação
SETEC/MEC assim se referem: a Lei Nº 11.892, publicada em, 29/12/2008, cria no âmbito do
Ministério da Educação um novo modelo de instituição de educação profissional e
tecnológica. Estruturadas a partir do potencial instalado nos ‘CEFET’, escolas técnicas e
agrotécnicas federais e escolas vinculadas às universidades federais, os novos Institutos
Federais de Educação, Ciência e Tecnologia geram e fortalecem condições estruturais
necessárias ao desenvolvimento educacional e socioeconômico brasileiro. Foi assim, portanto,
instituída a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica39.

39
A Lei 11.892, de 29 de dezembro de 2008, traz em seu Art.1º - Fica instituída, no âmbito do sistema federal de
ensino, a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, vinculada ao Ministério da
Educação e constituída pelas seguintes instituições: - Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia -
Institutos Federais; - Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR; Centros Federais de Educação
Tecnológica Celso Suckow da Fonseca - CEFETRJ e de Minas Gerais - CEFET-MG; Escolas Técnicas
Vinculadas às Universidades Federais; Colégio Pedro II Por meio dessa lei o Centro Federal de Educação
Tecnológica do Maranhão CEFET-MA, integrando às escolas Agrotécnicas Federais de Codó, de São Luís e de
São Raimundo das Mangabeiras transforma-se em INSTITUTO FEDERAL DO MARANHÃO - IFMA,
atualmente constituído por 26 campi. O segundo artigo da Lei em questão define os Institutos Federais como
instituições de educação superior, básica e profissional, pluricurriculares e multicampi, especializados na oferta
64

Entre as finalidades que foram previstas na lei para os Institutos Federais


(BRASIL, 2008, p. 3) vale destacar o seguinte:
(i)constituir-se em centro de excelência na oferta do ensino de ciências, em geral, e
de ciências aplicadas, em particular, estimulando o desenvolvimento de espírito
crítico, voltado à investigação empírica; (ii) realizar pesquisas aplicadas; (iii)
desenvolver atividades de extensão; (iv)ministrar cursos de licenciatura, bem como
programas especiais de formação pedagógica, com vistas na formação de
professores para a educação básica, sobretudo nas áreas de ciências e matemática, e
para a educação profissional.

Em relação às Licenciaturas, a lei ainda previu, em termos percentuais, a oferta de


vagas, onde cada instituição passaria a destinar o mínimo de 20% das vagas para cursos de
licenciatura na área das Ciências e da Educação Profissional, 50% das vagas para a educação
profissional técnica de nível médio e os 30% restantes são destinados a outros cursos de
graduação, pós-graduação e extensão, definidos pela Instituição. O Instituto Federal do
Maranhão assume esta denominação a partir da lei 11.892/2008, integrando a Rede Federal de
Educação Profissional, Científica e Tecnológica.
O cenário que descrevi até aqui comportou uma parte importante da história do
IFMA, necessária, do meu ponto de vista porque nela se entrelaça a história das Licenciaturas
em Ciências e particularmente a licenciatura em Física do Campus São Luís Monte Castelo,
locus, desta investigação. Nesta pesquisa tudo inicia e perpassa pela experiência dos
professores de Física e suas histórias vividas no passado, presente e aspirações para o futuro,
no contexto da licenciatura. Para Connelly e Cladinnin (2015, p. 77) na pesquisa narrativa, as
pessoas são vistas como a corporificação de histórias vividas. Nesta pesquisa os professores
formadores de Física são os sujeitos. No processo investigativo, as histórias ou experiências
dos professores, implicou vivenciá-las sincronicamente, apreendendo sentidos para construir
cenários e reunir elementos que me conduzissem ao objetivo a que me alvitrei. Pesquisadora
narrativa e sujeitos (re)contamos a história da formação de professores na tessitura da Tese.
A escolha desses sujeitos esteve orientada pelo objetivo desta investigação.
Segundo Minayo (2013, p. 62), a pesquisa social trabalha com gente e com suas realizações,
compreendendo os sujeitos como atores sociais na relação. No centro desta pesquisa estão,

de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino. Referidas Instituições são
equiparadas às universidades federais, para tanto, possuem natureza jurídica de autarquia, detentoras de
autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e disciplinar. O que lhes confere
autonomia para criar e extinguir cursos. (BRASIL, 2008)
65

pois, os professores e professoras do curso de Física, portanto, as pessoas concretas


implicadas na historicidade da atividade da formação.
Na licenciatura em Física, recai sobre esses sujeitos a responsabilidade da
formação, a feitura da organização e do funcionamento do curso, no qual se envolvem e são
envolvidos por suas concepções científicas e práticas formadoras; suas experiências e valores
na atividade da formação docente. Essas múltiplas vozes, interpretadas na minha voz também
carregada das minhas memórias, experiências e saberes, ganham sentido e significado no
corpus da pesquisa.
Fui motivada pela busca de compreender as concepções de ciência e de práticas de
ensino formadoras no curso de licenciatura em Física do IFMA–, consoantes com a educação
deste século XXI. São os relatos de suas experiências como formadores que me possibilitaram
apreender o sentido da prática pedagógica dos professores no curso, criando a condição para
que eu construísse uma visão sobre a epistemologia presente na formação, entre as questões
que me inquietam nesta pesquisa e me conduzem aos meus objetivos.
Faço justiça com os sujeitos da pesquisa destacando a disponibilidade de todos em
atender-me na realização de tão relevante trabalho. Dedico-lhes, portanto, respeito e
admiração. Percebi o interesse em colaborar movidos pela intencionalidade de que o resultado
do processo investigativo iria na direção de novos entendimentos, novas perspectivas para a
prática formadora que em conjunto realizamos no curso de Licenciatura em Física.
Com a responsabilidade de delinear essa história e coletar das experiências dos
sujeitos os dados que me levam a compreender o fenômeno que investigo, assumo, com
Minayo (2013, p. 75), o ônus da compreensão contextualizada e da interpretação. Nenhuma
barreira me foi imposta nesse propósito, ao contrário, numa demonstração de espírito
colaborativo, meus interlocutores se dispuseram a dialogar comigo, numa atitude valorativa,
entendendo esse estudo com a intenção clara de poder contribuir para a qualidade do trabalho
da formação, com a feliz coincidência do momento em que uma comissão de professores,
discute a reformulação do PPC do curso de Licenciatura em Física.
Participaram da pesquisa, 16 professores no total, sendo 13 doutores e 1 mestre da
área das ciências e 2 professores da área de educação, sendo um mestre e a outra doutora em
educação. Correspondendo à confiança em mim depositada no momento da entrevista e
preservando-os de uma identificação não desejada, ao buscar outra identidade para os
participantes me ocorreu a ideia de atribuir-lhes o codinome de pesquisadores/pesquisadoras
renomados no campo da Física e de outras ciências. Ainda no item caracterização optei pela
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utilização de falas expressivas dos sujeitos que revelam traços marcantes de suas
personalidades. Assim, neste trabalho, os meus sujeitos serão identificados na forma como os
apresento a seguir:
 César Lattes: tem 42 anos. É professor do IFMA há 15 anos. É bacharel em
Física, com mestrado e doutorado em Física. Expressou que:
Quando estava no ensino médio eu tinha um professor de Física que
admirava muito[...] Eu queria ser piloto, de caça, doido por avião...
Eu nasci dentro da escola especialista da aeronáutica, tinha tudo
para ser piloto, mas aí eu tive um professor de Física que ensinava
Física de uma forma diferente... Ele fazia exatamente o que eu acho
que é bacana, que é diferente. Eu posso falar que foi esse camarada
que me trouxe para dentro da Física. E eu fiz física.
 Constantino Tsallis: tem 47 anos, é professor do IFMA há 11 anos. Possui
licenciatura em Física, com mestrado e doutorado em Física Aplicada. Expressou o seguinte:
.... Eu sempre tive e tenho não só um amor, mas preocupação com a questão do ensino da
Física. Aí foi essa a minha formação.
 Jayme Tiomno: tem 43 anos, é professor do IFMA há 10 anos, com atuação
no ensino técnico e superior. Licenciado em Física, possui especialização no ensino de Física,
doutorado em Física Aplicada. Expressou o seguinte:
Se eu fosse dar uma nota para mim em termos de melhoria há dez
anos atrás eu daria uma nota baixa, mas acho que melhorei muito
mesmo. Se antes eu me dava uma nota cinco, de zero a dez, hoje, eu
me dou uma nota oito, talvez até nove. Mas isso eu não digo por conta
da formação, mas pela experiência de vida e boa vontade de querer
melhorar e entender a realidade. Eu acho que isso contou mais.

 José Leite: tem 50 anos, é professor do IFMA há 26 anos. Licenciado em Física,


possui mestrado e doutorado em Engenharia dos Materiais diz que:
Eu tive a grata surpresa de conhecer um aluno importante,
trabalhávamos juntos na iniciação científica, trabalhamos no
mestrado[...] Agora ele acabou de se tornar um futuro professor
porque passou em primeiro lugar em um concurso e foi chamado. Isso
é uma coisa que me deixa muito feliz, alguns ex-alunos se formarem,
fazerem doutorado, pós-doc... Então isso é uma coisa que é boa, você
sente que de alguma forma você contribuiu.

 Luís Davidovich: tem 34 anos, é professor do IFMA há 1 ano e 6 meses. Bacharel em


Física com mestrado e doutorado em Física relata que:
Eu tento ajudar os alunos tentando me ajudar a permanecer nessa
profissão porque do jeito que está eu posso continuar lecionando... A
realização profissional não é exatamente salário ou está atrelada a
67

quanto eu vou receber na parte econômica. É a que você não


consegue observar: formei o aluno tal, o aluno conseguiu caminhar...
com o pouco de conhecimento que eu lhe passei. Então, eu acho que é
um pouco dessa busca que eu percebi.

 Luiz Roberto: tem 63 anos, é professor do IFMA há 32 anos. Licenciado em Física


com mestrado em ciência e matemática e doutorado em Física da Matéria Condensada
expõe:
Eu tenho um carinho muito grande por essa Instituição e tenho muita
paixão por essa família que vou deixar aqui que são os meus colegas
professores... Quando você fala da Instituição você está falando dos
seus colegas. A Instituição não é só o prédio, mas as pessoas que a
fazem. Como é bacana você ver um aluno e ele vem e abraça a gente,
tem coisa melhor do que isso?

 Marcello Damy: tem 52 anos, é professor do IFMA há 26 anos. Licenciado


em Física, com Mestrado em Física do estado sólido diz que:
A gente tem professores que marcam demais a vida da gente na
formação, na fala, no apoio moral, numa orientação. Ele acaba sendo
referência mesmo por ser um bom profissional, um profissional que
mantém a postura, a ética e é isso que eu procuro ser. Ser essa pessoa
de referência, uma pessoa amiga, comprometida com o meu trabalho,
é isso.

 Mario Schenberg: tem 38 anos, é professor do IFMA há 11 anos. Licenciado


em Física, com Mestrado e Doutorado em Mecânica e Estatística conta: Faço questão de
dizer[...] Sou licenciado, fiz boa parte do bacharelado, mas gosto do que eu desenvolvo em
sala de aula. Eu gosto de ser professor.
 Plínio Dellatorre: tem 54 anos, é professor do IFMA há 23 anos. Licenciado
em Física, com Mestrado e Doutorado em Física da Matéria Condensada Expressou o
seguinte:
Porque nem todo mundo é igual, todo ser humano tem que ser visto
como um quantum, como um indivíduo ali com suas deficiências, com
suas qualidades, com suas competências... Temos que ver a pessoa
assim dessa maneira, tem que tentar entender dessa forma.

 Sergio Mascarenhas: tem 58 anos, é professor do IFMA há 24 anos.


Licenciado em Fisica e Bacharael em Engenharia Civil, com Mestrado e Doutorado em Física
fala o seguinte:
Eu acho que o pensamento de Einstein até hoje prevalece. A intuição
vale mais do que o conhecimento. Eu acho que o nosso aluno, se você
o ensinar a intuir pode se tornar um excelente profissional, tanto na
68

área da Educação propriamente dita quanto na área de pesquisa,


tanto na parte empírica como na parte experimental. Ele é um
processo que você tem que ter carinho, tem que ter zelo por aquele
aluno porque ele é uma matéria que você pode trabalhar.

 Ronni Geraldo: tem 59 anos, é professor do IFMA há 24 anos Licenciado em


Física, com Mestrado e Doutorado em Química. Expressou o seguinte:
Aí eu fiz esse projeto e levei para uma escola lá em Ponta Negra fora
do horário de aula. Eu me reuni com os pais e falei que era para levar
os pequeninos. Na primeira aula eu começava passando o filme e
depois eu discutia com eles o que eles tinham entendido do filme. E
essa discussão era de filme científico mesmo, e nessa discussão do
filme eu ia introduzindo a Física sem dizer que era Ciência, porque
eles não sabiam o que era.

 Moyses Nussenzveig: tem 58 anos, é professor do IFMA há 22 anos.


Licenciado em Física, com Mestrado e Doutorado em Engenharia Mecânica. Expressou o
seguinte:
Se você me perguntasse se na vida eu tivesse que fazer outro curso,
não, eu seria professor. Se perguntasse, se insistisse comigo e
perguntasse: -Ttem 58u farias o quê Física ou ser professor? Eu diria
Física para ser professor. Eu acho que não existe papel na sociedade
mais importante no mundo e mais bonito que ser professor.

 Augusto Damineli: tem 57 anos, é professor do IFMA há 22 anos. Bacharel


em Física, com Mestrado e Doutorado em Física relata o que segue:
Naquela época eu achava matemática muito difícil, não era um bom
aluno, não. Aí ela chegava e passava a mão na minha cabeça e
perguntava: o que é que você não está entendendo? Eu dizia: eu não
sei como é que faz. E ela explicava com uma calma. Ela me explicou
uma vez só, pegou na minha mão, me orientou, me explicou e pronto!
Aquilo ali foi como se eu tivesse tirado todo um peso das costas,
sabe? Aí eu comecei a descobrir que matemática era fácil.

 Roberto Salmeron: tem 37 anos, é professor do IFMA há 11 anos. Bacharel


em Física, com Mestrado e Doutorado em Física. Expressou o seguinte:
O que adianta você entrar em sala de aula só para mostrar o que você
sabe? Você tem que entender que o aluno tem que entender aquilo que
você está falando. O aluno tem que aprender. Então esse contato do
professor com o aluno tem que ser mais afinado e como é que pode
ser afinado? O professor querendo ensinar e o aluno querendo
aprender. Essa é a ferramenta chave que eu acho que é válida em
qualquer século dependendo das ferramentas que esse século
possibilite.
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 Marina Vasconcellos: tem 53 anos, é professora do IFMA há 23 anos.


Licenciada em Pedagogia, com mestrado em Educação. Expressou o seguinte:
Eu costumo dizer para os meus alunos: vocês podem não ser uma elite
econômica, mas agora vocês se constituem uma elite cultural em um
país que a maioria das pessoas não chega onde vocês chegaram.
Então, enquanto elite cultural tentem de algum modo fazer com que o
que vocês estão vivendo aqui, modifique o modo de vida de vocês,
modifique a visão de mundo de vocês e de algum modo modifique o
mundo das pessoas que estão em volta de vocês.

 Maria Isaura: tem 58 anos, é professora do IFMA há 23 anos. Licenciada em


Pedagogia, com mestrado e doutorado em Educação. Expressou o seguinte:
Minha formação inicial foi bem livresca mesmo... Eu tive uma grande
sorte. Quando eu me formei fui trabalhar numa escola de magistério
de nível médio, foi esse espaço que me possibilitou entender que eu
precisaria cada vez mais estar me aprimorando como professora. Foi
o momento que a gente passou a compreender que não bastava
entender só como vou ensinar, mas também como se aprende, e o que.

De modo geral, os professores da Física e da Educação possuem uma história em


comum, ou seja, suas trajetórias formativas são ricas de situações de superação no plano
pessoal e profissional, assim como experiências acadêmicas da maior relevância. Faço
registro de que os professores da Física gozam de oportunidades de estudo e pesquisa ao lado
de pesquisadores de renome no campo da Física e da Astrofísica nacional e internacional. As
professoras da área pedagógica são pesquisadoras em educação, com uma história na
instituição que remete à criação das licenciaturas e à relevante contribuição acadêmica no
ensino superior, com destacada atuação nas licenciaturas, docência na pós-graduação e em
cargos de gestão no IFMA.
Destaco do grupo de professores do Departamento de Física uma característica
com a qual passei a identificá-los, qual seja, a vocação de todos para elevar cada vez mais o
padrão de qualidade do curso em termos acadêmicos, estruturais e de funcionamento. É fala
comum entre eles o que expressaram os professores Constantino Tsallis e José Leite, este
último, acrescentando a expectativa criada em torno da pesquisa que ora desenvolvo, trazendo
uma contribuição diferente disse um deles. Assim, manifestaram-se os professores
Constantino Tsallis e José Leite:
Não deixo de fazer pesquisa aplicada, mas meu perfil, meu
pensamento desde quando eu comecei esse processo foi de também
estar ajudando, colaborando na questão da melhoria do
departamento, do curso, na formação das pessoas, na divulgação
70

científica também... Eu sempre pensei nisso e sendo doutor isso iria


me facilitar, assim como a outros professores também... estarmos
fazendo projetos para ajudar também no fortalecimento do curso.
(CONSTANTINO TSSALIS, Entrevista)

Eu faço votos para que essa pesquisa traga uma contribuição,


independentemente da minha fala, uma contribuição para a melhoria
dos cursos do setor de modo geral, porque eu acho que está chegando
a hora de cair a ficha e pensar: olha! Nós precisamos uma
contribuição diferente, ou melhor, não precisa ser diferente apenas a
nossa contribuição, mas assumirmos a missão de ser minimamente
competentes naquilo que podemos e temos capacidade de fazer. Se
não temos experimentos para mostrar vamos apontar os caminhos. Eu
espero que essa pesquisa traga essa contribuição. (JOSÉ LEITE,
Entrevista)

A exemplo dessa postura dos sujeitos, me senti ainda mais motivada na realização
desta pesquisa. Expressões e revelações tão verdadeiras como essas, captadas de suas falas
durante as entrevistas, repercutiam positivamente na minha caminhada investigativa. Certa
ocasião, saindo de uma sessão de entrevista com um dos sujeitos da pesquisa, registrei no meu
Diário de Campo os sentidos da experiência que estava vivendo naquele momento.
Finalizando, transcrevo para este espaço as impressões que em mim causaram:
Todas as falas são extremamente ricas de histórias de superação,
cada uma acrescenta um dado novo, algo interessante, algo que eu
talvez não tivesse a capacidade de supor e de perceber porque não é
uma experiência minha, um sentimento meu. Nesse ponto destaco a
investigação narrativa, pela oportunidade de participar das histórias
das pessoas mesmo sem ter delas tomado parte, e de repente poder
dizer:- Puxa vida! Mas eu não estava nesse momento quando isso
aconteceu! Eu perdi essa parte! Mas não importa porque nesse
momento ao me aproximar dos sujeitos, resgato os fatos no relato
deles, porque nada é mais rico que a experiência trazida à memória.

Descrevo nesta parte o percurso metodológico percorrido, justificando a escolha


da pesquisa narrativa e posso dizer que outra não poderia ser a modalidade de pesquisa
utilizada para este estudo. Dado os objetivos que tracei, encontro na pesquisa narrativa a
metodologia ideal para alcançar os meus propósitos. Lembrando que os sujeitos da pesquisa
são os professores formadores no espaço da licenciatura em Física, vinculados ao curso desde
a sua origem e nele atuando como formadores numa história de décadas. É a partir das
histórias e experiências contadas pelos professores e da colaboração entre pesquisadora e
participantes que reconto essa história da formação, interpretando sentidos e significados
trazidos de suas memórias, tornando possível a construção deste trabalho investigativo.
71

Realizada a pesquisa de campo veio a transcrição dos dados e a partilha das escritas,
caracterizando o processo de construção compartilhado. Caminhos da pesquisa narrativa que
se faz e refaz nesse ciclo contínuo. Fazendo o caminho de volta, o trabalho de imersão sobre
os textos para o processo de unitarização e análise construindo sentidos em direção ao
fenômeno pesquisado, até o ponto em que se completa o ciclo da pesquisa, dado ter
alcançados os objetivos.
72

PARTE III - ESTEIOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA


CIÊNCIA, DA PRÁTICA DOCENTE E DA EDUCAÇÃO PARA O SÉCULO XXI

Concepções de Ciência: construções historicamente situadas

Se por evolução científica e progresso intelectual queremos


significar a libertação do homem da crença supersticiosa em
forças do mal, demônios e fadas, e no destino cego - em suma,
a emancipação do medo - então a denúncia daquilo que
atualmente se chama de razão é o maior serviço que a razão
pode prestar.
(Max Horkheimer)

Considero importante trazer esta discussão, reconhecendo o grau expressivo de


complexidade que envolve a construção do pensamento científico, pautada nas concepções de
Ciência que se constituíram em diversas etapas da história da humanidade, para efeito de
análises e busca de relações com o presente da formação de professores, e envolvendo
questões de outras ordens, extrapolando a dimensão da ciência propriamente dita. Recorro à
história da ciência de forma breve, buscando reconstruir a trajetória do pensamento racional,
da antiguidade à contemporaneidade. Tenho claro que não é este o objeto desta investigação,
porém considero fundamental o resgate de concepções construídas progressivamente,
utilizando abordagens histórico-filosóficas e epistemológicas, de modo a me auxiliar em
minhas análises - que passarão a se concretizar mais à frente - de maneira a compreender em
que referenciais teóricos os professores de Física ancoram a sua prática formadora.
Para além dessa questão existe uma outra que diz respeito à relação entre Ciência
e Educação que perpassa a formação inicial de professores e se revela na prática educativa
preparadora das gerações em dada sociedade. Muito embora esteja ao alcance do observador
tal relação, nem todos conseguem perceber a sua natureza, visão que só é possibilitada pelo
olhar do educador atento, crítico e sensível, interessado na busca de compreender os nexos e
efeitos dessa relação. Reunindo os diversos olhares de autores e o da minha própria
experiência é possível afirmar a intersecção entre os dois campos do conhecimento - Ciência e
Educação - no contexto da prática formadora dos professores de Física, me instigando os
sentidos na busca de investigar e compreender de que modo ela se revela no processo da
formação.
Os professores de Ciências nas instituições escolares por sua vez, em sua maioria,
ou não alcançaram ou têm ignorado as pesquisas nesse campo, apontando para uma prática
73

docente que idealiza a transformação da realidade social naqueles aspectos que mais
diretamente afetam a vida das pessoas, contribuindo para a construção de uma sociedade mais
humanizada e justa. A produção do conhecimento resultante das pesquisas dedicadas ao tema
educação, ensino de ciências e matemática, minimamente, permitem e sugerem diretrizes
curriculares para o ensino e a formação de professores em Ciências e Matemática, com
concepções de práticas inovadoras e transformadoras.
Entendo com Ghedin e Franco (2011) que a educação como prática social
histórica transforma-se pela ação humana como também transforma os que dela participam,
havendo um agente fundamental responsável por essa transformação - o professor. Com sua
atividade docente o professor reflete pressupostos teórico-metodológicos nos saberes e fazeres
de sua formação, temática que me propus aprofundar nesta pesquisa analisando a experiência
formadora dos professores-formadores de Física.
Nessa direção, Rosa e Rosa (2010) ao criticarem o modelo de prática pedagógica
do professor no ensino de ciência apontam a natureza de concepção de ‘Ciência’ do professor
na educação científica e na relação com os processos de ensino-aprendizagem, evidenciando-
se o seguinte:
O ensino de ciência vem historicamente consolidando um modelo no qual o
conhecimento representa um conjunto de fatos “descobertos” pelos cientistas e
acumulados pela humanidade, dentro de um processo a-histórico,
descontextualizado e sem relação entre a concepção da natureza do conhecimento
científico do cientista e a produção desse conhecimento. A concepção sobre a
natureza da ciência subjacente ao processo ensino-aprendizagem decorre, em grande
parte, da visão de ciência do professor, não apenas das concepções imbricadas nas
estruturas organizacionais que direcionam a educação. (ROSA; ROSA, 2010, p. 1)

Vale ressaltar que essa é uma problemática que não se restringe ao ensino das
Ciências, mas, diz respeito ao ensino da Matemática, ainda que se mostre sob outro ponto de
vista, convergindo para a preocupação que se deve ter com a educação, como exigida neste
século XXI. Isto significa ser um professor com a competência científica e pedagógica crítica,
com a visão real dos problemas sociais e ambientais emergentes desta nova era da
globalização nas sociedades, no momento presente (MORIN, 2011; SANTOS, TERÁN,
NICOT, 2015; CHASSOT, 2007).
Tais autores criticam o paradigma educacional vigente, nos moldes cartesianos
que reduz a educação à transmissão de conhecimentos, apontando para a superação por um
novo modelo que inclua a leitura da realidade da sociedade imersa em problemas de várias
ordens. Isto em razão do modelo capitalista e do desenvolvimento tecnológico, que propicia
acumulação de riqueza desigual, consumismo inconsequente, causando impactos ao ambiente,
74

em termos destituídos de ética e indiferente às consequências para a humanidade, como


também para o planeta. Em contraposição, ressaltam a educação crítica nessa realidade sob
uma proposta de cidadania consciente da luta por uma nova ordem social, e vão em defesa da
alfabetização ecológica ou eco-alfabetização.
Com essa linha de raciocínio trago a contribuição de Chassot (2004, p. 257) que
aponta para a forma e o conteúdo das Ciências no momento atual, deixando pistas para uma
prática pedagógica formadora na perspectiva que defendo para uma educação neste século, ou
seja, com perspectivas transformadoras da realidade social desigual e excludente por uma
sociedade mais humana, justa e sustentável, a saber:
Há nesse momento a necessidade de se pensar as Ciências com posturas mais
holísticas – isto é, uma ciência que contemple aspectos históricos, dimensões
ambientais, posturas éticas e políticas, e também encharcada no estudo de saberes
populares e nas dimensões das etnociências, - proposta que traz nítidas vantagens,
especialmente se pensarmos nas ciências que se aprende como um saber escolar.

Retomando o que assinalei no início desta seção e, considerando desde a


complexidade e historicidade que envolve a concepção e natureza da Ciência, ao introduzir as
reflexões acerca das concepções de ciência, apresento a visão de Morin (2005) com quem
compartilho. Este autor aponta para a ambivalência em sua estrutura interna alertando os mais
afoitos do conhecimento e os menos atenciosos para o conteúdo que ela produz e a ‘que’, a
‘quem’ pode beneficiar ou causar prejuízos:
Essa ciência elucidativa, enriquecedora, conquistadora e triunfante, apresenta-nos,
cada vez mais, problemas graves que se referem ao conhecimento que produz a ação
que determina a sociedade que transforma. Essa ciência libertadora traz, ao mesmo
tempo, possibilidades terríveis de subjugação. Esse conhecimento vivo é o mesmo
que produziu a ameaça do aniquilamento da humanidade. Para conceber e
compreender esse problema há que acabar com a tola alternativa da ciência “boa” ou
“má”, que só traz prejuízos. Pelo contrário, há que, desde a partida, dispor de
pensamento capaz de conceber e de compreender a ambivalência, isto é, a
complexidade intrínseca que se encontra no cerne da ciência. (MORIN, 2005, p.1)

Acerca dessa complexidade, considero importante rever alguns momentos da


história da Ciência, apoiada em alguns teóricos com os quais me fundamento e ilumino
minhas percepções mais à frente, ligando os fios que conectam as concepções formuladas no
passado e os meandros da racionalidade, com a reprodução no tempo presente. Uma história
intercalada por períodos de avanços e recuos na construção do conhecimento40, com base nas

40
A ciência fruto do conhecimento produzido culturalmente pelo homem é, por essa razão histórica. Guarda
estreita relação com as necessidades materiais do homem, em cada etapa da história, cada vez que nela
intervém. Para Andery et al. (2014, p. 13) A produção do conhecimento científico não é, pois, prerrogativa do
homem contemporâneo. Quer nas primeiras formas de organização social, quer nas sociedades atuais, é
possível identificar a constante tentativa do homem de compreender o mundo e a si mesmo [...] A ciência
75

concepções de ciência em cada momento, transformado em conteúdo cultural, assimilado pela


humanidade, de grande riqueza pela pluralidade própria do mundo. A ciência como
construção humana, não se mantém isenta das influências externas derivadas do complexo
econômico, social, político e cultural do qual faz parte, em cada período dessa construção
histórica.
São bem diversas as visões, as definições e os conceitos de Ciência, desde o olhar
de um cidadão comum à visão de um pesquisador. A Epistemologia, disciplina filosófica que
tem como função refletir criticamente sobre o conhecimento científico e a prática dos
cientistas (OLIVEIRA, 2016) se ocupa do estudo dessas concepções, ou seja, da
epistemologia das ciências.
Etimologicamente, o termo epistemologia deriva de duas palavras gregas:
episteme que significa raiz, ciência, e logia, vinda de logos que quer dizer conhecimento,
discurso racional, pensamento racional, portanto, análise crítica das ciências em geral,
avaliação de seus métodos e resultados (CHAUI, 1997). Para Santos e Ghedin (2017, p.19)
uma definição que abrange esse conceito o compreende como o estudo da origem, das
estruturas e dos métodos e da validade do conhecimento; nesses termos relaciona-se com a
metafísica, a lógica e à filosofia da ciência, bem como com a História da Ciência e das áreas
específicas.
Esses mesmos autores Santos, Ghedin (2017) dão destaque a uma categoria da
Ciência que forma a ponte que liga a epistemologia às ciências, selando essa relação, o
conhecimento, assim manifestam-se:
A questão do conhecimento sempre esteve presente na história desde que o ser
humano começou a sistematizar metódica e logicamente o saber humano. Nesse
sentido, desde Heráclito, essa questão é posta e permanece como objeto específico
de um saber que se tornou uma cultura: a Ciência. É claro que até a Idade Moderna
nós não tínhamos ainda o que conhecemos como epistemologia, ou seja, uma Teoria
do conhecimento. Pode-se dizer que essa é uma criação Kantiana. O que temos até
então é a compreensão aristotélica de ciência (o que não é uma teoria do
conhecimento, nem uma epistemologia), e temos uma compreensão platônica de
episteme atrelada a uma teoria das ideias. (SANTOS; GHEDIN, 2017, p. 25)

Como está posto acima, a Teoria do Conhecimento e a Epistemologia são


imbricadas como se fossem uma única coisa, por isso é comum se vê a Epistemologia

caracteriza-se por ser a tentativa do homem de entender e explicar racionalmente a natureza, buscando
formular leis que, em última instância, permitam a atuação humana. Tanto o processo de construção de
conhecimento científico quanto o seu produto refletem o desenvolvimento e a ruptura ocorridos nos diferentes
momentos da história [...].
76

denominada Teoria do Conhecimento, entretanto, são distintas em sua função. De acordo com
Oliveira (2016) tem-se o seguinte:
A Epistemologia é uma disciplina filosófica que reflete criticamente sobre o
conhecimento científico. Assim, encontra na Filosofia o seu princípio e na ciência o
seu objeto. Entretanto, a epistemologia não apresenta um estatuto preciso e definido,
sendo seu conceito flexível por estabelecer um trânsito conceitual entre a Teoria do
Conhecimento e a filosofia da ciência. Muitas vezes é expressa como Teoria do
Conhecimento. [...] A epistemologia tem como função refletir sobre a prática dos
cientistas, considerando o conhecimento um processo histórico, as ciências em vias
de se fazerem, em seu processo de gênese, formação e estruturação progressiva.
(OLIVEIRA, 2016, p. 18 grifo nosso)

Sobre a história da ciência, a literatura constitutiva de vários estudos atribui à


Grécia o berço da ciência em sua ligação inicial com a Filosofia41, entendendo, contudo,
ciência como sinônimo de conhecimento. Nesse sentido, estudos identificam a origem do
conhecimento com os nossos ancestrais, advinda da cultura produzida na diversidade cultural
das sociedades humanas42. Ao que tudo indica, de suas observações da natureza e lançando
mão dos resíduos encontrados no meio, empregavam-nos para sua sobrevivência.
Progressivamente vão organizando algumas técnicas e aperfeiçoando-as no percurso de sua
evolução. Assim, o conhecimento, vai incorporando-se de maneira sistemática aos vários
campos das ciências, pressupondo o trabalho dos homens primitivos na relação com a
natureza, no remoto passado (CHASSOT, 2004).
Cada civilização (egípcia, mesopotâmica, fenícia, hebráica, indiana e chinesa)
aprimorou-se em uma determinada área do conhecimento relacionado com a natureza, com a
sobrevivência humana e à vida em sociedade. Entre outras conquistas técnico-científicas das
antigas civilizações merece destaque a utilização dos metais como o ferro, o bronze e o cobre,
dando origem à Metalurgia e conferindo relevantes progressos para os povos na antiguidade.
Entre as civilizações, o destaque vai para a egípcia, com seus conhecimentos de Matemática,
Medicina e Astronomia, comparada às demais na mesma época. Deixaram, portanto, uma

41
Segundo Chauí (1997) a Filosofia, entendida como aspiração ao conhecimento racional, lógico e sistemático
da realidade natural e humana, da origem e causas ao mundo e de suas transformações, da origem e causas das
ações humanas e do próprio pensamento, é um fato tipicamente grego.
42
Em razão da mobilidade dos primeiros habitantes em busca de garantir a sobrevivência, as sociedades
primitivas foram se organizando por relações de parentesco e formando as primeiras civilizações, em diversos
pontos da Terra. Aos poucos foram estruturando a economia e a vida nos agrupamentos, submersos em ritos e
magias. Daí a origem dos mitos (CHASSOT, 2004; ANDERY et al., 2014). Assim, formaram-se diversas
civilizações, com diversificadas culturas e estágios de desenvolvimento atrelado à produção econômica. Para a
produção do conhecimento na história das civilizações, a transformação do homem em agricultor possibilitou-
lhe grandes saltos, incorporados esses conhecimentos e técnicas, às ciências com o tempo (CHASSOT, 2004).
77

herança cultural de milênios, muitas delas válidas em suas culturas até o dia de hoje, outros
ainda verdadeiros mistérios para a ciência contemporânea.
Todavia, nenhum povo da Antiguidade influenciou tão decisivamente nossa
civilização ocidental como os gregos, afirma Chassot (2004). Do período que se estende do
século VII a.C. ao século II a.C. compreende as tentativas dos primeiros filósofos em oferecer
uma explicação racional do mundo, contrapondo-se às explicações míticas43 até aquele
momento. O pensamento científico-filosófico (ANDERY et al., 2014), que florescia em
terreno grego distinguia-se do pensamento mítico, cujas explicações sobre a origem de tudo
quanto existia na realidade (dos astros, da Terra, do homem, das plantas, dos animais, do
fogo, do bem, do mal e assim por diante) era atribuída à força dos deuses, considerados seres
superiores aos humanos.
Por essa razão, a explicação do mito para o que existe na realidade recebe a
denominação de cosmogonia e teogonia. Referidos mitos eram chamados de cosmogônicos ou
teogônicos, isto é, buscavam descrever a ordem do universo e do cosmos, a partir de uma
genealogia dos deuses (CHAUI, 1997; CHASSOT, 2004; ANDERY et al, 2014).
O movimento da passagem da explicação mítica para o processo do conhecimento
de forma racional44 sobre as coisas do mundo se dá quando alguns gregos se espantam com a
realidade e se mostram insatisfeitos com tais explicações, dando início à infância da ciência,
marcada no nascimento da Filosofia. Chauí (1997, p.23) aduz que:

43
Sobre as explicações míticas Andery et al. (2014, p. 20) diz o seguinte: O mito é uma narrativa que pretende
explicar, por meio de forças de seres considerados superiores aos humanos, a origem, seja de uma realidade
completa como o cosmos, seja de partes dessa realidade; pretende também explicar os efeitos provocados pela
interferência desses seres ou forças. Tal narrativa não é questionada, não é objeto de crítica, ela é objeto de
crença, de fé. Além disso, o mito apresenta uma espécie de comunicação de um sentimento coletivo: é
transmitido por meio de gerações, como forma de explicar o mundo, explicação que não é objeto de discussão;
ao contrário, ela une e canaliza as emoções coletivas, tranquilizando o homem num mundo que o ameaça. É
indispensável na vida social na medida em que fixa modelos da realidade e das atividades humanas. O mito
opõe-se ao pensamento racional. Razão, logos – em seu sentido original – significa, por um lado, reunir e ligar,
e, por outro, calcular, medir, ambos relacionados ao pensar, uma atividade fundamental para o homem.
44
Segundo os historiadores da Filosofia o nascimento se deu entre os fins do século VII e início do século VI
a.C., na região da Jônia, na cidade de Mileto e teve como primeiro filósofo Tales de Mileto. Já nasce com um
conteúdo: uma cosmologia. “Assim, a Filosofia nasce como conhecimento racional da ordem do mundo ou da
Natureza, donde, cosmologia.” (CHAUÍ, 1997, p. 25). Logo, o pensamento filosófico em seu nascimento
caracterizava-se entre outros aspectos, por uma tendência à racionalidade, ou seja, a explicação de algo possui
como critério a razão e somente a razão, com seus princípios e regras (CHAUI, 1997).
Esses pensadores, apesar das diferenças nas explicações por eles elaboradas, caracterizaram-se por iniciar uma
nova forma de ver o mundo - suas explicações se constituíram no primeiro momento de ruptura com o mito.
Ruptura porque, mesmo mantendo, em suas explicações, elementos de estrutura mítica (como por exemplo, a
busca da origem do universo em uma unidade), eles introduziram aspectos que possibilitaram a elaboração do
pensamento racional: os fenômenos da natureza foram reconhecidos como tais, e a própria natureza, sua
estrutura, foi assumida como o tema central a ser investigado. (ANDERY et al, 2014, p. 38)
78

[...] A Filosofia surge quando se descobriu que a verdade do mundo e dos humanos
não era algo secreto e misterioso, que precisasse ser revelado por divindades a
alguns escolhidos, mas que, ao contrário, podia ser conhecida por todos, através da
razão, que é a mesma em todos; quando se descobriu que tal conhecimento depende
do uso correto da razão ou do pensamento e que, além da verdade poder ser
conhecida por todos, podia, pelo mesmo motivo, ser ensinada ou transmitida a todos.

Por meio da História da Filosofia e da Ciência não resta dúvida que o


conhecimento racional, lógico e sistemático sobre a natureza, o homem, as origens e causas
das coisas, como são e de suas transformações deveu-se aos gregos. São destaques nesse
período os filósofos Sócrates, Platão e Aristóteles. Os três pensadores e suas obras exerceram
grande influência no seu tempo, assim como contribuíram para o desenvolvimento histórico
da Filosofia e da Ciência. Com eles a filosofia inicia a estrutura do pensamento científico e a
criação de sistemas de conhecimento, com o emprego de métodos em sua construção
(ANDERY et al., 2014; CHASSOT, 2004; CHAUI, 1997).
A Ciência dá os primeiros passos com a Filosofia45. Durante séculos os filósofos
de mãos dadas com a racionalidade organizam o conhecimento nos termos de uma
cosmologia. Os saberes sobre a realidade do mundo e seus fenômenos aos poucos são
iluminados pela razão, atravessa o tempo e abandona uma longa história que absolutamente
não se encerra em determinado período, mas, permanece ou se transforma. Na explicação de
Chauí (1997) pode abstrair-se o sentido de razão, no contexto acima, assim:
Ao afirmar que a razão é histórica, Hegel não está de modo algum, dizendo que a
razão é algo relativo, que vale hoje e não vale amanhã, que serve aqui e não serve
ali, que cada época não alcança verdades universais. Não. O que Hegel está dizendo
é que a mudança, a transformação da razão e de seus conteúdos é obra racional da
própria razão. (CHAUÍ, 1997, p.80)

Contudo, essa razão própria como capacidade de conceber a realidade


historicamente sofre mudanças em seus princípios e métodos como critérios para explicar os
fenômenos. Assim, modifica-se internamente, contribuindo para as transformações que se
processam no tempo, movidas pelos fatores históricos, sociais, econômicos e políticos. As
próprias mudanças que se processam na realidade obrigam o sujeito que conhece a modificar
o pensamento, modificando-se, altera o pensamento sobre o que viu, e o que foi percebido,

45
No seu começo, a ciência estava ligada à filosofia, sendo o filósofo o sábio que refletia sobre todos os setores
da indagação humana. Nesse sentido, os filósofos Tales e Pitágoras eram também geômetras, e Aristóteles
escreveu sobre física e astronomia. Na ordem do saber estipulada por Platão, o homem começa a conhecer pela
forma imperfeita da opinião (doxa) depois passa ao grau mais avançado da ciência (episteme), para só então ser
capaz de atingir o nível mais alto do saber filosófico. (ARANHA; MARTINS, 1993).
79

igualmente se modificando a partir da nova visão. Assim, o conhecimento se refaz, a ciência


renova seus conceitos, princípios e leis. A percepção constante da transformação da realidade
foi objeto de muitas reflexões filosóficas, sobretudo, a partir dos primeiros filósofos. Chauí
(1997, p. 110) através de um deles, de forma metafórica coloca:
Heráclito de Éfeso considerava a Natureza (o mundo, a realidade) como um “fluxo
perpétuo”, o escoamento contínuo dos seres em mudança perpétua. Dizia: “Não
podemos banhar-nos duas vezes no mesmo rio, porque as águas nunca são as
mesmas e nós nunca somos os mesmos”. Comparava o mundo à chama de uma vela
que queima sem cessar, transformando a cera em fogo, o fogo em fumaça e a fumaça
em ar. O dia se torna noite, o verão se torna outono, o novo fica velho, o quente
esfria, o úmido seca, tudo se transforma no seu contrário. A realidade, para
Heráclito, é a harmonia dos contrários, que não cessa de se transformar uns nos
outros. Se tudo não cessa de se transformar perenemente, como explicar que nossa
percepção nos ofereça as coisas como se fossem estáveis, duradouras e
permanentes?

Evoluindo desse pensamento, isto é, considerando a razão, como


condição/capacidade intelectual de apreender o mundo, a Filosofia e a Ciência alcançam a
Idade Média (século V ao XV) e encontram uma sociedade cujo poder econômico
concentrava-se nos proprietários da terra, os senhores feudais e na Igreja Romana. Nesta
ressaltam-se seus bens que se avolumavam à custa de doações, impostos cobrados, cessão e
doação de terras em troca da salvação e proteção espiritual e principalmente pelo domínio do
saber e do controle do sistema educacional.
A vida cultural nas sociedades medievais foi dominada pelo racionalismo
teológico, efetivado através de duas correntes filosóficas: Patrística e Escolástica, implicando
pela união da fé à razão (OLIVEIRA, 2016). Consequentemente, a produção do conhecimento
se punha sob o domínio da igreja. Desse modo, as explicações dos fenômenos ficavam
restritas ao campo das revelações divinas. No máximo recorriam ao pensamento aristotélico.
São os mais representativos desse período: Santo Agostinho e Santo Tomaz de Aquino, Roger
Bacon, Guilherme de Ockham, dentre outros (ANDERY et al.,2014; CHASSOT, 2004;
CHAUI, 1997).
Nos séculos seguintes, relativos à transição para a Idade Moderna (XV a XVIII), a
Europa vive um período de profundas e diversificadas mudanças, período de transição do
feudalismo para o capitalismo, marcada por muitos conflitos pela violência entre o campo e as
cidades, onde inúmeros outros acontecimentos se desenrolaram, tal como a expansão das
atividades comerciais, as conquistas marítimas com a abertura dos portos, camponeses
expulsos da terra, o início da indústria moderna. Do ponto de vista da produção do
conhecimento, a transição se revestiu de um vazio intelectual, implicando a rejeição das ideias
80

feudais das imagens do universo46 com o misticismo, as superstições e crenças irracionais


(ANDERY et al. 2014).
Com o Renascimento (séc. XIV e final do séc. XVI) movimento cultural iniciado
na Itália ocorrido no período de transição da Idade Média para a Moderna, configurou-se a
ruptura das ideias dominantes do período medieval, abrindo espaço para a produção de novos
conhecimentos no âmbito de uma nova racionalidade, revelando-se da maior importância
sobre a cultura das sociedades europeias. A filosofia, as artes e as ciências dão saltos
qualitativos a partir da libertação da filosofia dogmática cristã.
A busca pela verdade se reencontra com a ciência através dos representantes da
filosofia moderna47, tendo por preocupação destituir de vez a patrística e a escolástica,
filosofias dominantes da Idade Média. O critério de verdade forjado na revelação e vontades
divinas é rejeitado pelos modernos trazendo para o centro das reflexões filosóficas o problema
do conhecimento. Para eles, se a verdade depende da revelação e da vontade divinas, e se o
nosso intelecto foi pervertido pela nossa vontade pecadora, como podemos conhecer a
verdade? Se a verdade depender da fé e da fraqueza da nossa vontade, como nossa razão
poderá conhecê-la? (CHAUI, 1997, p. 114).
A questão do conhecimento para os modernos promove uma ruptura com a
racionalidade teológica e retoma a racionalidade clássica. Inicia pelo exame da capacidade
intelectual humana de conhecer e demonstrar a verdade dos conhecimentos, admitindo-se,
pois, o sujeito do conhecimento. Compreende-se esse Sujeito em termos conscientes da
capacidade de conhecer a própria capacidade de conhecer. Segundo Chauí (1997, p. 114), a
teoria do conhecimento volta-se para a relação entre o pensamento e as coisas, a consciência
(interior) e a realidade; em suma, implica e imbrica o sujeito e o objeto do conhecimento.

46
Na nova visão de mundo que veio substituir a visão medieval, o homem, no seu sentido mais genérico, era a
preocupação central. [...] isso significava, com relação ao conhecimento, a valorização da capacidade do
homem de conhecer e transformar a realidade. Foi proposta uma ciência mais prática, que pudesse servir ao
homem, e que teve em Francis Bacon (1561-1626) seu maior defensor, em contraposição ao saber
contemplativo da Idade Média, época de predomínio da Igreja e da nobreza feudal. As crescentes necessidades
práticas geradas pela ascensão da burguesia, aliadas ao desenvolvimento da crença na capacidade do
conhecimento para transformar a realidade, foram responsáveis pelo interesse no desenvolvimento técnico.
(ANDERY et al., 2014, p. 175)

47
A primeira tarefa que os modernos se deram foi a de separar fé de razão, considerando cada uma delas
destinada a conhecimentos diferentes e sem qualquer relação entre si. A segunda tarefa foi a de explicar como
a alma-consciência, embora diferente dos corpos, pode conhecê-los. Consideraram que a alma pode conhecer
os corpos porque os representa intelectualmente por meio das ideias. A terceira tarefa foi a de explicar como a
razão e o pensamento podem tornar-se mais fortes do que a vontade e controlá-la para que evite o erro.
(CHAUI, 1997, p. 114).
81

Nesse contexto, surge a ciência moderna com Galileu, promovendo uma


revolução científica, com a afirmação da tese do heliocentrismo, validando antigas hipóteses
com Copérnico, contrapondo-se ao sistema geocêntrico que era a visão de mundo sustentada
pela Igreja, com base no sistema proposto por Aristóteles. Do ponto de vista metodológico,
Galileu propunha a matematização, a observação e a experimentação na produção do
conhecimento. Com Galileu e Newton dá-se a construção de uma nova visão de mundo, com
suas percepções da matemática e da geometria presentes nos fenômenos da natureza,
propondo leis mecânicas para a apreensão. Nessa mesma temporalidade surgem duas
propostas metodológicas diferentes: o empirismo de Bacon, e o racionalismo de Descartes.
Esses dois autores dedicaram parte de sua obra a discutir o caminho que conduziria ao
verdadeiro conhecimento (ANDERY et al., 2014).
Nessa linha sucessória do tempo da modernidade, destaca-se o filósofo Francis
Bacon, reconhecido historicamente como o criador do “método científico” e da ciência
experimental. Concebia uma visão pragmática da Ciência e defendia o controle e domínio da
natureza pelo homem. Imortalizado com sua mais importante obra – Novum Organum - em
substituição ao Órganon de Aristóteles. Bacon não elaborou uma teoria, mas, um método,
visando a construção do “conhecimento verdadeiro”. Distinguia-se, portanto, dos outros
modernos com suas generalizações abstratas, enquanto pautava a construção do conhecimento
na observação dos fatos e na experimentação (OLIVEIRA, 2016).
Descartes, diferentemente do ceticismo vigente, acreditava na possibilidade de
chegar a ‘verdades’. Igualmente acreditava que só havia um caminho, a razão, empregando
alguns recursos metodológicos. A ênfase que ele dá à razão não significa a opção por um
conhecimento contemplativo, mas por um método único para buscar verdades possibilitando o
controle sobre o mundo. (AUDREY et al., 2014, p. 203).
Com Descartes se dá o resgate da subjetividade do sujeito no processo do
conhecimento, contudo, reformulada em seu sentido. Preocupa-se em como o sujeito pode
alcançar a verdade e começa duvidando de tudo, à exceção, sua existência como ser pensante:
“penso, logo existo”. A dúvida foi transformada por ele em Método. A influência do
pensamento48 cartesiano do século XVII aos dias atuais é justificada pelo poder atribuído à

48
A essência do pensamento cartesiano não consiste na solução dos problemas que preocupavam o os cientistas
de então, mas na elaboração de um sistema completo, com o qual pretendia substituir a escolástica, banindo
todas as qualidades e formas substanciais em favor de um mecanismo universal que explicasse os fenômenos
desse mundo visível com a ajuda de apenas três conceitos: extensão, figura e movimento.
82

razão na forma de perceber o mundo com clareza e distinção (CHASSOT, 2004). Vem de
Descartes, portanto, a racionalidade que atualmente é empregada na apreensão dos
fenômenos, concebendo a ciência como conhecimento irrefutável.
Colaborando com a discussão do tema sobre a subjetividade, Oliveira (2016, p.
53-54), pronuncia o seguinte:
A reflexão sobre a subjetividade no pensamento moderno está associada ao debate
em relação ao processo de construção da racionalidade científica, que perpassa pelo
conflito de concepções do mundo antagônicas como o idealismo e o materialismo. A
subjetividade na modernidade torna-se a referência do conhecimento e da verdade,
por meio do “poder da razão”, delineando-se por essa referência ao “sujeito
pensante”, uma concepção idealista de mundo, evidenciada, sobretudo, no
pensamento de Descartes, via o “Cogito”, a “subjetividade transcendental” Kantiana
e a “consciência absoluta” de Hegel.

Para os modernos a realidade é concebida como um sistema de mecanismos


físicos e matemáticos, constituindo a ciência clássica, objetivando descrever, explicar e
interpretar os eventos no mundo real. A realidade é um sistema de causalidades racionais
rigorosas que podem ser conhecidas e transformadas pelo homem. Nasce a ideia de
experimentação e de tecnologia... e o ideal de que o homem poderá dominar tecnicamente a
natureza (CHAUI, 1997, p. 47). Esse sistema de conhecimento consolidado atravessa os
séculos e na atualidade pode ser identificado como uma epistemologia do conhecimento de
base racional.
Isaac Newton é um personagem reverenciado na história da Filosofia da Ciência
por suas produções teóricas e, sobretudo, por sua mecânica celeste que legou relevantes
contribuições para o desenvolvimento da Ciência. Destaca-se entre os filósofos da
modernidade. Para Santos (1999, p. 51), a “perfeição” da mecânica newtoniana, pela
universalidade de suas leis, por se ajustar tão bem aos dados da experiência e pelo seu
extraordinário poder preditivo, contribuiu fortemente para estabelecer e conseguir uma
imagem da ciência altamente valorizada. A sua genialidade49 na maneira de produzir

49
Segundo Santos (1999, p. 52) É a partir do paradigma newtoniano que os valores da ciência são pensados de
forma imperialista – “Ideal das luzes”. Este ideal parte da convicção de que a luz aberta por Newton jamais se
apagaria, de que iria iluminar a realidade para todo o sempre. Elege como lema da ciência o domínio do
Universo – conhecendo-o, agindo sobre ele, transformando-o, subjugando-o. [...] O ideal das luzes articula-se
diretamente como o “culto da razão”. Na defesa deste culto, Kant define o iluminismo (aufklarung) como
“saída do homem da menoridade – saída da sua incapacidade para se servir do entendimento a não ser que
guiado por outrem”. Note-se que a “divisa das luzes” é precisamente: “tem coragem de te servir do teu próprio
entendimento”. De fato, Kant defende que uma vez que a sensibilidade só por si não basta, o entendimento –
“poder de produzir conceitos” – é fundamental para que haja conhecimento.
83

conhecimentos relacionando a matemática e a experimentação rendeu à humanidade uma


ampla e fecunda obra, apesar de ele próprio não ter publicado nenhum dos seus estudos.
Reconheceu os que o antecederam afirmando: Se vi mais longe do que os outros homens, foi
porque me coloquei sobre os ombros de gigantes.
Ainda no século XVII, as ciências encontram seu método e se estruturam
separadamente destacando-se as ciências particulares50 baseadas em seus princípios e regras,
historicamente construídas até o tempo presente, originando diferentes epistemologias da
Ciência. Sem entrar no mérito da discussão sobre se, de forma cumulativa ou por rupturas, se
constituiu na Filosofia da Ciência, na Teoria do Conhecimento, na Epistemologia, os
fundamentos que ao mesmo tempo em que fornecem as bases para as concepções de ciência e
de racionalidade, na construção do conhecimento, criticam suas leis, princípios e categorias.
O século XVIII, do Iluminismo, período do culto aos poderes da razão, culto pela
ciência – cientismo -, à razão é atribuído todos os poderes: de liberdade (ideário da revolução
francesa), da felicidade social e política, da evolução e do progresso, e da perfeição, conquista
do homem. Nesse cenário desponta em meados do século XIX, o Positivismo de Augusto
Comte51, afirmando o cultivo do modelo ideal de todos os tipos de conhecimento, o
conhecimento científico, a única forma de conhecimento verdadeiro. Dito de outro modo, uma
teoria só é verdadeira se obtida através de métodos científicos válidos. Essa concepção
filosófica afirma a superioridade da ciência acima de qualquer outra forma de apreensão do
mundo, a primazia do método científico e o culto aos seus resultados.
No dizer de Santos (2010, p. 14), de tal modo é assim que é possível dizer que em
termos científicos vivemos ainda no século XIX, e que o século XX ainda nem começou, nem
talvez comece antes de terminar. Estando de acordo com o autor, entendo por essa afirmação

50
A partir do século XVII, a revolução metodológica iniciada por Galileu promove a autonomia da ciência e o
seu desligamento da Filosofia. Pouco a pouco, desse período até o século XX, aparecem as chamadas ciências
particulares - física, astronomia, química, biologia, psicologia, sociologia etc. -, delimitando um campo
específico da pesquisa. Na verdade, o que estava ocorrendo era o nascimento da ciência, como a entendemos
modernamente. Com a fragmentação do saber, cada ciência se ocupa de um objeto específico: à física cabe
investigar o movimento dos corpos; à biologia a natureza dos seres vivos; à química, as transformações
substanciais, e assim por diante. Além da delimitação do objeto da ciência, o aperfeiçoamento do método
científico, fundado sobretudo na experimentação e matematização (ARANHA, MARTINS, 1993, p. 73).
51
A exclusão de intervenções sobrenaturais, o repúdio pela metafísica, a tentativa de substituição da filosofia pela
ciência, o assumir do método científico como normativo de todo saber, a valorização apenas da sua própria
verdade – a verdade científica, a redução da pluralidade de interpretações possíveis à sua própria interpretação,
a base mecanicista e determinista do conhecimento, são ideologias dominados pelo culto do cientismo. Para
qualquer destas ideologias, a ciência, reduzindo a pluralidade cultural a uma uniformidade, é tida como um tipo
de conhecimento altamente valorizado, que conquista a universalidade e que cresce de forma inequívoca, sem
rupturas, continuamente - concepção continuísta linearmente progressiva (SANTOS, 1999, p. 53).
84

o entrelaçamento de sujeitos da ciência com paradigmas da modernidade e sua epistemologia.


Muitos séculos nos distanciam dos primeiros filósofos e cientistas, contudo, o poder da razão
e da ciência preside, nos dias de hoje, a vida em todas as dimensões. Pensamentos e
paradigmas se renovaram nas ciências, mas ainda convivem, em meio a críticas, com os
paradigmas da racionalidade e do positivismo.
A intenção em apresentar esse passeio breve pela história do conhecimento foi o
de introduzir algumas questões de ordem teórica, apontando sua epistemologia localizada em
determinadas épocas, e que serão retomadas nas análises que passo a fazer no capítulo
subsequente, ao tratar das concepções de ciência na prática formadora de professores de
Física para uma educação neste século XXI.

A Prática e a Formação do Professor de Física: relações e implicações com o contexto, o


pensar simplificador e o pensar complexo
Ao pretender refletir sobre a prática docente na formação de professores
no âmbito da licenciatura em Física, entendo ser necessário abordá-la no contexto das
relações que a mesma estabelece com a cultura produzida historicamente no conjunto das
relações e interações que os seres humanos travam entre si, com o mundo natural produzindo
conhecimento, e, com o modelo de educação praticado no contexto social em que estão
situados. Desse modo, a reflexão que faço não estará isenta de uma visão crítica sobre esse
fenômeno, uma vez que pretendo dialogar com a natureza do trabalho pedagógico dos
professores de Física na Licenciatura e suas relações com a prática social mais ampla,
evitando reducionismos na reflexão. Não pretendo esgotar a análise por supostamente ter
clareza de questões-limite de ordem investigativa e metodológica. Minhas impressões e
sentidos estão baseados no conhecimento que possuo sobre o curso e na experiência com
alunos professores nas disciplinas que assumo em processo dessa formação.
A prática docente enquanto atividade formadora/educativa, realizada em um dado
contexto histórico-social, jamais está isenta de fundamentos teóricos, mesmo que estes não
sejam compreendidos com clareza pelo professor no ato da docência. Compreendo desse
modo, vejo a prática pedagógica dos professores de Física fundamentada sobre uma teoria,
desenvolvida a partir de saberes específicos e pedagógicos, tendo em vista garantir aos futuros
professores a formação necessária para o exercício futuro de suas práticas educativas. A
expectativa que se cria é a de que o professor formador trabalhe com uma visão de homem e
85

de mulher, de mundo e de trabalho, e de uma educação que fomente atitudes solidárias, bons
hábitos e bons sentimentos, na intenção da produção e da reprodução da vida em sociedade.

Se, contudo, que a maior parte dos professores com atuação nos cursos de
licenciatura tem formação em outras áreas profissionais, apresentando-se com deficiências de
práticas do magistério em sua formação inicial ou continuada (PIMENTA; ANASTASIOU,
2014). A esse respeito, na Licenciatura em Física do IFMA, parte dos docentes, vêm de outras
áreas profissionais à parte do magistério. O domínio dos conhecimentos específicos e outros
saberes da docência por si só não são suficientes para que o professor exerça a prática
formadora, nos moldes ideais, haja vista a complexidade do ato educativo. O professor
necessita refletir sobre o contexto social sobre o qual atua, sobre seus problemas e
potencialidades educativas, para a partir desses aspectos planejar e organizar sua ação, e ao
final, voltar no que realizou e refletir acerca da repercussão da sua ação na aprendizagem do
aluno, visando a tomada de consciência sobre as melhorias necessárias ao seu processo de
ensino-aprendizagem.

As deficiências teóricas na área da educação podem limitar a atitude e o hábito


reflexivo do professor sobre a própria prática, assim como, dificultar sobremaneira as
reflexões sobre práticas pedagógicas potencializadoras de qualidade do ensino que se
mostrem significativas para seus alunos.

A prática pedagógica docente, no contexto da prática social mais ampla, ainda por
cima sofre influências externas, destacadamente a do modelo de produção econômica,
articulando-se aos diversos setores sociais, colocando no trilho a vida em sociedade, e a
educação, correspondendo a um desses vagões, embarca nessa viagem obediente aos modelos
autoritariamente impostos às universidades e escolas, ora subordinando-se, ora contrapondo-
se tímida e restritamente a eles. Entretanto, na maior parte do tempo prevalecendo o ideário
educacional conservador, que reproduz no interior das instituições as desigualdades que
emergem no cenário social, político e econômico, no comando desse movimento histórico.
Cortella (2006, p. 13) colabora com essa visão quando recomenda o que se segue:
É necessário repensar fundamentos da articulação entre Educação, Epistemologia e
Política, com a finalidade de recolocar o problema desta articulação, pois ele
escapou do universo mais imediato do educador e da educadora que não estejam
conectados diretamente ao mundo acadêmico, de modo a embasar um caminho que
permita avanços significativos na construção de propostas pedagógicas e políticas de
formação de educadores menos inadequadas para um embate social inovador.
86

Ao me relacionar com alunos e professores no curso, portanto, convivendo de


algum modo com os professores formadores, pressuponho limites de natureza teórica e
epistemológica com relação à prática pedagógica inovadora na licenciatura em Física, ou seja,
para além de uma racionalidade técnico-científica na abordagem dos conhecimentos. Isso
significaria maior aproximação com os problemas sociais e ambientais, com perspectivas
transformadoras da realidade em que se vive e produz a existência. Na minha experiência com
a formação docente na licenciatura, percebo que a prática pedagógica dos professores de
Física se mostra à margem desse propósito, o que os afasta, na prática, dos próprios objetivos
proclamados na Licenciatura52.
Com essa perspectiva entendo ser necessário que se repense o modelo da prática
formadora no curso de Física e resgate a função criadora e recriadora do conhecimento, da
cultura científica e do ensino (RIOS, 2008). Ao assumir tal atitude o professor
necessariamente adota uma concepção de ensino como prática social inovadora, refletindo
criticamente sobre as relações que envolve o fenômeno da educação e da prática docente,
compreendidos em termos das dimensões ética, estética política, econômica e inclusiva.
Considero importante trazer esta discussão sobre as bases pedagógicas e a
epistemologia da prática docente, auxiliando-me a compreender as opções metodológicas que
os professores formadores adotam no contexto da formação, assim como as teorias que
fundamentam o exercício da docência. À primeira vista parece ausente na prática formadora a
dimensão pedagógica para as disciplinas específicas da formação. Percebo tal situação na
prática de ensino dos alunos, é como se os professores-formadores abordassem os conteúdos
da base científica sem uma adequada transposição didática ao nível dos adolescentes e jovens
do ensino fundamental e médio. Minha afirmação está baseada também, nas longas discussões
sobre a arquitetura curricular da licenciatura na comissão de reformulação do curso de Física,
experiência que já havia vivenciado com a construção do novo currículo da licenciatura em
Química. Registro que em ambas as licenciaturas os professores se posicionam na defesa de
um currículo extensivo de disciplinas da área específica, justificando a necessidade de uma

52
De acordo com o PPC do curso, no que toca ao objetivo primordial da formação está previsto: Licenciar
professores para o ensino da Física, no ensino médio e ciências no ensino fundamental, mediante aquisição de
competências relacionadas com o desempenho da prática pedagógica, preparando-os para o exercício crítico e
competente da docência, pautado nos valores e princípios estéticos, políticos e éticos, estimulando-os à
pesquisa e ao auto-aperfeiçoamento de modo a contribuir para a melhoria das condições do desenvolvimento
da Educação Básica. (PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE LICENCIATURA PLENA EM FÍSICA,
2005).
87

“excelente base científica à formação”, como garantia de aquisição de “competências para a


docência”.
As relações pedagógicas dos professores com cultura social de princípios
competitivos, e visão de sociedade para o desenvolvimento científico e tecnológico,
primordialmente, colaboram com a postura instrumental na socialização dos conhecimentos e
fidelidade a paradigmas ideologicamente individualistas e competitivos. Entre a ruptura e a
continuidade ainda prevalece no curso de licenciatura em Física a primazia do conhecimento
científico e tecnológico, abordado quase em termos absolutos. Com essa postura o formador
se coloca na contramão da abordagem crítico-reflexiva. O professor é “a autoridade suprema”
quando se trata de transmitir saberes, calando a voz dos alunos em suas experiências e
construções. Desse modo, os estudantes tendem a pensar como seus professores, têm que
pensar por eles e viver o que é por eles ensinado. Há pouco espaço para as experiências
pessoais e individuais. Como expressa Aragão (2014, p. 203):
A concepção de ensino ainda dominante nos meios educacionais, no entanto, centra
a ação de ensinar no professor - é ele que faz tudo – e concebe, em correlação, a
aprendizagem do aluno de forma apenas passiva, posto que cada um e cada qual
recebe o conhecimento/o conteúdo transmitido, dado ou passado pelo professor,
repete-o quantas vezes for necessário para memorizá-lo para, então, devolvê-lo ao
professor, reproduzindo-o fielmente, quando lhe for solicitado, na hora da prova, dos
exames... na hora da comprovação burocrática da aprendizagem.

Concordo com Aragão (2014, p. 202) quando analisa o trabalho docente dos
professores nas áreas das Ciências e da Matemática, e sintetiza: os professores também são
vítimas de sua má-formação profissional, a qual inicia, certamente, um tipo de círculo
vicioso, qual seja: professor-mal-formado-ensina-mal-aos-alunos-mal-formando-os.
O professor formador para este século deverá voltar-se para as necessidades
presentes na realidade social, priorizar o ensino em torno dos conhecimentos que oportunizem
aos alunos uma visão crítico-reflexiva, complexa, criativa sobre o real, recriando-o, portanto,
em termos da aprendizagem que possibilite a transformação de si e do mundo em que está
‘incluído’ (NOVOA, 1995; SAVIANI, 1997; MORIN, 2005; FREIRE, 1998;
SCHNETZLER; ARAGÃO, 2000; PIMENTA, 2002, 2012; ALMEIDA, 2005; CANDAU,
2009; CARVALHO, GIL-PEREZ, 2011;TARDIF, 2012; LIBÂNEO, 2012).
Compreendendo com esses autores e refletindo sobre como tem se dado a
educação em Ciências nas instituições de ensino entendo ser fundamental uma revisão das
bases teóricas, metodológicas e epistemológicas da prática formadora dos professores, nos
níveis em que estão atuando. Compartilho com Candau (2009) a ideia de que a sala de aula
88

não é independente ou neutra, uma vez que está situada histórica e politicamente em uma
dada sociedade. As diferenças culturais, religiosas, de gênero, de sexualidade, nos remete a
um universo no qual vigora uma profunda e (des) conhecida pluralidade, em relação à qual a
autora se expressa da seguinte forma:
Os/as alunos/as estão exigindo de nós, educadores/as, novas formas de
reconhecimento de suas alteridades, de atuar, de negociar, dialogar, propor e criar.
Estamos desafiados a superar uma visão padronizadora, assim como um olhar
impregnado por um juízo, em geral, negativo de suas manifestações. Trata-se de
abrir espaços que nos permitam compreender estas novas configurações identitárias,
plurais e fluidas, presentes nas nossas escolas e na nossa sociedade. (CANDAU,
2009, p. 96)

As pesquisas sobre a prática docente dos professores nas escolas e nas


universidades discutem e evidenciam a prática como ação mecânica. Gobara; Garcia (2007)
assinalam que no ensino de Física do Brasil, entre os vários problemas que o cercam,
destacam-se o ensino expositivo, geral, superficial e baseado na memorização, e a excessiva
dependência dos manuais didáticos. Contrapondo-se a esse modelo, Freire (1975, p. 27)
assevera que:
O conhecimento... exige uma presença curiosa do sujeito em face do mundo. Requer
sua ação transformadora sobre a realidade. Demanda uma busca constante. Implica
em invenção e em reinvenção. Reclama a reflexão crítica de cada um sobre o ato
mesmo de conhecer, pelo qual se reconhece conhecendo e, ao reconhecer-se assim,
percebe o “como” de seu conhecer e os condicionamentos a que está submetido seu
ato.

Por suposto, a concepção de conhecimento alicerçada na “lógica conteudista” que


promove a atuação do docente baseada na transmissão do conhecimento produzido não se
coaduna com a formação do docente para a contemporaneidade. Para o momento, está
delineada uma relação do professor com os múltiplos saberes (TARDIF, 2012) que emergem
de ambientes, tempos e espaços diferentes.
Situando a questão da prática educacional alicerçada na lógica conteudista, no
contexto da formação, concordo com as razões tal como pondera Aragão (2014, p. 204) a
seguir:
A formação pedagógica destes profissionais se dá em termos também
compartimentados ou fragmentados, acentuando a dissociação ou o distanciamento
teoria-prática - sem qualquer convergência para a realidade escolar das aulas - bem
como decorre do ensino discursivo característico das abordagens pedagógicas que
transformam disciplinas que tratam da educação como “perfumarias” ou como
“baboseiras”, na visão dos estudantes.

Possibilitar o acesso ao conhecimento na dimensão humana e cidadã difere, pois,


do ato passivo de recepção pelos estudantes dos conhecimentos arbitrados e
descontextualizados, transformados simplesmente em objeto de transmissão de saberes
89

prontos pelo professor. Nesta direção, é imprescindível superar a prática pedagógica dos
professores da Física sustentada em bases teóricas positivistas, com predomínio da
racionalidade técnica. Ter claro a concepção de ciência é considerado o ponto de partida para
redimensionar a prática no processo formativo. Essa compreensão, por sua vez, não é algo
simples, como afirma Maldaner (2003, p. 97), assim:
A visão epistemológica de ciência afeta a nossa atividade em sala de aula. Mas, não
é fácil responder, com alguma certeza, o que seja ciência, como foi produzida
historicamente, como é recriada na relação pedagógica e como constitui a mente das
pessoas que a aprendem.

A visão de Ciência a que o autor se refere certamente não é qualquer visão ou uma
única e exclusiva visão dada, contudo, ousaria acrescentar que a ação formadora nas
universidades, tanto quanto a das escolas de educação básica, articuladas às concepções
hegemônicas de ciência, fundamentaram e fundamentam essas práticas. Torna-se, portanto,
essencial compreendê-la no contexto da formação de professores de Física.
Nas minhas observações sobre a prática formadora no curso de Licenciatura em
Física percebo a dicotomia constante entre as disciplinas do núcleo pedagógico e as
disciplinas do núcleo específico. Nestas últimas há enorme dificuldade de os professores
relacionarem o conhecimento de suas disciplinas com o ato educativo. Nesse percurso
encontro respaldo em Maldaner (2003, p.45) que explicita essa dificuldade dos professores,
nos cursos de Licenciatura em Química, quando tratam de abordar pedagogicamente o
conhecimento da Química, de tal modo que:
É diferente saber os conteúdos de Química, por exemplo, em um contexto de
Química, de sabê-los em um contexto de mediação pedagógica dentro do
conhecimento químico. Ausente a perspectiva pedagógica, o professor não saberá
mediar adequadamente a significação dos conceitos, com prejuízos sérios para a
aprendizagem de seus alunos.

Compreendo com Maldaner (2003) e outros pesquisadores que na maioria dos


cursos que formam professores de Ciências, não tem sido oportunizada a reflexão sobre a
necessidade de articulação do conhecimento específico com a dimensão pedagógica e crítica,
respaldada nas teorias que constituem as ciências da educação. Na licenciatura em Física,
observado o projeto pedagógico do curso e a análise dos pressupostos teóricos-metodológicos
da prática formadora para o ensino de ciências é possível perceber que houve certa
preocupação dos elaboradores da proposta, a esse respeito. Quanto à sua efetivação nas
práticas docentes dos formadores talvez este seja um aspecto que se mostre como obstáculo à
construção de uma visão de ciência com pressupostos emancipadores e de cidadania
consciente. O que ainda se manifesta na prática da maioria dos professores é a visão
90

reducionista, simplificadora da ciência, aproximando-se de uma concepção de ciência tal


como explicita o autor:
Um bem supremo e a sua produção é a verdade ou a resposta mais adequada a uma
situação. Não se questionam, principalmente, as suas motivações, para se fazer
determinado avanço científico e nem as suas formas de validação ou rejeição.
Embora o cientista, pela própria natureza de sua atividade, se questione sempre e
questione tudo o que se produz como ciência, as crenças de que as “descobertas” da
ciência são definitivas vão se perpetuando no ensino em todos os níveis.
(MALDANER, 2003, p. 117)

Com essa visão e nesse ambiente é que se têm preparado historicamente várias
gerações de professores. A visão de conhecimento que predomina na prática de formação
pode ser compreendida na expressão de Santos (2010, p. 30) ao explicar o seguinte:
Um conhecimento baseado na formulação de leis tem como pressuposto metateórico
a ideia de ordem e de estabilidade do mundo, a ideia de que o passado se estende no
futuro. Segundo a mecânica Newtoniana, o mundo da matéria é uma máquina cujas
operações se podem determinar exatamente por meio de leis físicas e matemáticas,
num mundo estático e eterno a flutuar num espaço vazio, um mundo que o
racionalismo cartesiano torna cognoscível por via da sua decomposição nos
elementos que o constituem.

As críticas dos historiadores ao paradigma tradicional das ciências – visão de


ciência moderna como universalista – implicam outra forma de análise que admitiu, no
processo histórico de desenvolvimento das ciências, a ação de variáveis internas e externas. A
nova historiografia, de forma crescente, tem trabalhado a produção de conhecimentos como
contextualizada, resultante de negociações – de caráter científico e extracientífico – e
consensos que se estabelecem. Tanto para contextos centrais como para periféricos
(DANTES, 2005).
A autora chama a atenção para o fato de que qualquer que seja o grau de
desenvolvimento de uma sociedade, por mais desprovida que seja da tradição cultural erudita,
é descabida a ideia do vazio científico e cultural que recepciona passivamente valores e
conhecimentos produzidos para além do contexto local. Vale ressaltar que, a existência de
outros saberes dialoga com os saberes de outra cultura para possibilitar novos conhecimentos.
O IFMA oferta a Licenciatura em Física em um momento da história em que se
eleva e amplia a discussão sobre uma nova concepção de ciência alicerçada em novas bases
epistemológicas. A visão de Ciência da modernidade, legado de Francis Bacon (1561-1626),
René Descartes (1596-1650), Galileu Galilei (1564-1642), Augusto Comte (1798-1857), que
ainda é hegemônica, foi abalada pelo fim das certezas em sua estrutura teórica e metodológica
e vive uma transição para um novo paradigma, com fortes tendências para o pensamento
complexo. Teóricos como Friederich Nietzsche, Thomas Kuhn, Feyerabend, Pierre Bourdieu,
91

Boaventura de Sousa Santos, Michel Foucault e Edgar Morin, como alguns outros, colocaram
em questão os critérios de verdade e de produção do conhecimento. No dizer de Santos (2010,
p.68) é como se o dito de Durkheim se tivesse invertido e em vez de serem os fenômenos
sociais a ser estudados como se fossem fenômenos naturais, serem os fenômenos naturais
estudados como se fossem fenômenos sociais.
A educação em ciências e matemática está a exigir no século XXI uma mudança
epistemológica, haja vista que o paradigma cartesiano com suas raízes no modelo econômico
capitalista, a serviço do consumismo por sua natureza cumulativa, é contrário à educação
integral dos sujeitos e à sociedade sustentável (SANTOS; TERÁN; NICOT, 2015). Nessa
linha de raciocínio Streck (1999) interpretando o pensamento de Freire acrescenta que a
“história como possibilidade” rechaça a compreensão mecânico-positivo-linear que guarda em
si a certeza de que o futuro é inexorável, posto que implica um caminho diferente de
entendimento da educação e da história.
Com as linhas de pensamento desses autores e de outros, certamente, penso guiar
o meu olhar nas minhas análises sobre os olhares e sentidos dos professores no curso de
licenciatura de Física do IFMA, na intenção de apreender que concepções de Ciência
fornecem as bases teóricas de suas atividades pedagógicas e didáticas no curso de
Licenciatura. Por outro lado, acredito poder contribuir de algum modo para as mudanças no
trabalho pedagógico da formação de professores justamente na licenciatura, cujo ponto de
partida pode contar com as reflexões que faço sobre as concepções teórico-metodológicas e
epistemologias contidas em narrativas e relatos docentes de suas experiências na prática
formadora.
O Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura de Física (2005, p. 10) prevê o
alcance do seguinte perfil profissional:
Um profissional com uma sólida formação em Física, dominando tanto os seus
aspectos conceituais, como os históricos e epistemológicos em Educação, de forma a
dispor de elementos que lhe garantam o exercício competente e criativo da docência
nos diferentes níveis de ensino formal e espaços não formais, atuando tanto na
disseminação dos conhecimentos desenvolvidos pela Física enquanto instrumento de
leitura da realidade e construção da cidadania, como na produção de novos
conhecimentos ao seu ensino e divulgação.

Compreendo que a educação para a cidadania enquanto propósito de construção


do perfil profissional, descrito no PPC do curso, cumpre os propósitos da educação e da
formação de professores que inclui nas entrelinhas, alguns princípios do paradigma complexo,
ideia com a qual comungo. No entanto, quando analiso o programa das disciplinas do curso,
92

percebo limitações de ordem pedagógica, didática e epistemológica, nessa direção. Nesse


instante estou tomando por base, o quantitativo de disciplinas da parte específica, cujo
conteúdo apontam para o domínio dos conhecimentos restritos da Física como ciência
dogmática.
A temática social sobre as desigualdades, a intolerância religiosa e outras como a
sustentabilidade do planeta, as guerras, a corrida armamentista, a economia, as relações de
produção, a subordinação da pesquisa científica à indústria e à comercialização, a ética na
ciência e na política, a tecnologia nos mais diversos campos, entre outras, são questões que
não foram incluídas no conjunto dos conhecimentos das disciplinas da formação especifica da
licenciatura em Física do IFMA. Tratando das disciplinas pedagógicas com outro olhar me
dou conta que existe fragilidade curricular, à medida que os componentes curriculares desse
núcleo deixam de contemplar uma articulação interna em seus conteúdos, sobre as questões
ideológicas, políticas e éticas ‘das ciências’.
Entendo por essa razão, a necessidade de repensar a formação dos professores
para o ensino de Ciências e de Física. Paro (2014) concebe a educação em seu sentido mais
amplo, entendendo-a como apropriação da cultura, e esta, também em seu sentido integral,
compreendendo conhecimentos, informações, valores, crenças, ciência, arte, tecnologia,
filosofia, direito, costumes, resumindo, tudo aquilo que o homem produz em sua
transcendência da natureza. Esclarece que a apropriação da cultura corresponderia a uma
atualização histórico-cultural. Implica dizer que à medida que o sujeito progressivamente se
apropria de um conjunto de conhecimentos que o transforma, humaniza-se e, com isso, reduz
o déficit cultural do seu desenvolvimento como pessoa.
Muito embora os professores apresentem uma formação acadêmica proeminente,
consegui apreender em seus relatos dificuldades sobre a gestão da própria prática, no que se
refere a um ensino sob uma concepção crítica de ciências, à articulação dos saberes científicos
com os saberes pedagógicos, e, destes com a realidade social. Outras dificuldades percebidas
em suas falas ligavam-se à gestão de classe e ao exercício do trabalho coletivo e
compartilhado.
A consciência sobre as mudanças que a nossa sociedade precisa efetivar, a
contribuição da educação no sentido de reduzir desigualdades sociais, de preparar melhor os
jovens de modo a possibilitar maiores oportunidades de concorrência na disputa pelos postos
de trabalho, devolvendo o status de cidadania aos segmentos das classes sociais
economicamente desfavorecidas, são algumas das questões que poucos professores
93

manifestaram o que pensam, um silêncio sujeito a muitas interpretações, entre as quais


arriscaria dizer que o sentido que encontro vai na direção da dificuldade que alguns
formadores encontram na relação teoria-prática. Freire (2014) com sua capacidade sensível
para racionalizar sobre a exclusão e opressão no mundo, consegue resumir o que também
penso a esse, ao dizer que:
A realidade social, objetiva, que não existe por acaso, mas como produto da ação
dos homens também não se transforma por acaso. Se os homens são os produtores
desta realidade e se esta, na “inversão da práxis”, se volta sobre eles e os condiciona,
transformar a realidade opressora é tarefa histórica, é tarefa dos homens. (FREIRE,
2014, p.51)

Disso decorre a necessidade de os cursos de formação de professores na área das


Ciências se encaminharem sob perspectivas inovadoras e transformadoras, de forma que
assumam o desafio de preparar os futuros professores para educarem as crianças e os jovens
em direção a autonomia pessoal e intelectual, com capacidade de se indignarem diante dos
problemas e agirem em favor das transformações da realidade presente53.
A natureza integradora do conhecimento que possibilita o pensar complexo tem
restrições na ação individual do professor, como também no compartilhamento de
experiências na docência. A dificuldade que apreendo na fala dos sujeitos desta pesquisa,

53
Como exemplo de temas para a formação nessa perspectiva, a questão ambiental é um exemplo de
conhecimento, como também uma das temáticas emergentes para a educação neste século XXI. No ano de
1992, 179 países - dos que participaram da Rio 92 - assinaram a Carta da Terra, assumindo o compromisso de
refazer alguns passos em direção à sustentabilidade. O debate girou em torno do “futuro comum”. Gadotti
(2003, p.48-49), tece considerações importantes a esse respeito dando a entender a gravidade da situação
decorrente da destruição do solo, dos recursos hídricos, das espécies distribuídas no planeta e da vida na Terra,
procedendo sua análise a partir do modo pelo qual produzimos a nossa existência. Segundo o autor, ainda neste
milênio é possível que se consolide uma devastação no planeta caso não haja uma ação conjunta global em
favor da civilização e da planetarização. Aponta a urgência de execução de um novo modo de produção
baseado em princípios éticos, no respeito a vida e na inclusão de homens e mulheres, uma outra globalização.
Após três décadas desde a assinatura da Carta da Terra, o aquecimento global do planeta de efeitos
desastrosos aos biomas só se agravou, o sistema econômico capitalista não apresentou retração em seus
métodos exploratórios de recursos naturais com fins cumulativos. Ao contrário, apoiados na tecnologia,
expandiu suas fronteiras. Gadotti (2003, p. 53) interpreta esse crescimento, afirmando: Estamos diante do
crescimento incessante e paralelo entre a miséria e a tecnologia: somos uma espécie de sucesso no campo
tecnológico, mas muito malsucedida no governo do humano. Contraditoriamente, a sociedade modernizada ou
do conhecimento parece não comportar o humano, basta o exemplo da estrutura produtiva no modelo de
produção capitalista atual, para se dar conta de que o emprego das descobertas das ciências e o uso das
modernas tecnologias, contrariam os interesses e necessidades dos sujeitos na sociedade, substituindo-os por
máquinas deixando na marginalidade milhares de cidadãos e cidadãs no mundo. Nesse ponto, reside a urgência
de uma forma diferente de abordagem do conhecimento produzido, dentro de um novo paradigma educacional,
consoante com o século XXI. O imobilismo, a resistência contrária será mais um vetor favorável às injustiças e
desigualdades sociais. É em torno de questões semelhantes a essa que vejo o papel que tem o professor de
Ciências, seja na prática formadora docente seja na prática formadora discente. O planeta Terra aguarda
agonizante por um novo paradigma de desenvolvimento. A ciência tem essas respostas produzidas em
pesquisas científicas ambientais e de desenvolvimento econômico.
94

nessa perspectiva, é justificada por eles pela falta de tempo, de espaço e de oportunidade para
realizar o trabalho em conjunto. Dessa forma, as possibilidades de atuação docente que
possam contribuir para a formação articulada, integradora dos conhecimentos, com
desdobramentos para autonomia e crítica dos sujeitos, e transformações na realidade, ficam
comprometidas.
Certamente que uma concepção simplificadora de análise e apreensão dos
problemas sociais é incompatível com a proposta de cidadania e mudanças neste século.
Concordo com Morin (2008, p. 16-17) no entendimento do seguinte:
Vivemos sob o império dos princípios de disjunção, de redução e de abstração, cujo
conjunto constitui o que eu chamo o “paradigma da simplificação”. Descartes
formulou este Paradigma mestre do Ocidente, ao separar o sujeito pensante (ego
cogitans) e a coisa extensa (res extensa), quer dizer, filosofia e ciência, e ao colocar
como princípio de verdades as ideias “claras e distintas”, ou seja, o próprio
pensamento disjuntivo. Este paradigma, que controla a aventura do pensamento
ocidental desde o século XVII, permitiu sem dúvida os grandes progressos do
conhecimento científico e da reflexão filosófica; as suas consequências nocivas
últimas só começam a revelar-se no século XX.

Trago para o centro da discussão em torno do modelo de formação de professores


de Física o ponto em que o autor chama a atenção para a outra face do progresso das Ciências,
traduzidas pelas consequências nocivas que se mantêm encobertas. Não tenho dúvida de que o
professor deverá ir à busca de uma nova racionalidade e de outra abordagem dos fenômenos,
ou seja, o pensamento complexo. A simplificação do modo cartesiano não permite uma visão
abrangente e totalizadora das múltiplas faces e dimensões que envolvem a problemática dos
fenômenos naturais e sociais. Superar a visão simplificadora da ciência moderna na prática
formadora é o maior desafio nos cursos de formação de professores na área das Ciências. Nas
palavras de Morin (2008, p. 19 grifo nosso) tem-se que: “a incapacidade de conhecer a
complexidade da realidade antropo-social na sua microdimensão (o conjunto planetário da
Humanidade) conduziu a infinitas tragédias e conduz-nos à tragédia suprema”.
Ao chamar a atenção para o desafio acima, importa dizer que a superação da visão
simplificadora reserva uma tarefa igualmente desafiadora no curso de Física, ou seja, a
substituição da ordem fragmentária do currículo pela visão integradora dos conhecimentos.
Ao me voltar para o curso de Licenciatura em Física do IFMA, do que já conheço da matriz
curricular, fica clara a necessidade das mudanças de natureza disciplinar, epistemológica e
pedagógica. Nesse sentido, o trabalho da formação de professores deverá ser objeto de
reflexão e de nova organização.
95

Não só a licenciatura em Física do IFMA, mas vejo necessário que as instituições


formadoras de professores, no geral, deveriam adaptar seus currículos às exigências da
educação para este século, com foco na interrelação Ciência e Sociedade, estruturando seus
projetos de formação sobre temas da realidade social na atualidade, como por exemplo:
projetos armamentistas, impactos ambientais, sustentabilidade do planeta Terra, energia,
indústria alimentar, hidroelétricas, pesquisa educacional, extensão universitária e comunidade,
respeito às diferenças, à justiça e igualdade social, abordando-os criticamente, de modo
contextualizado e interdisciplinar, uma práxis pedagógica. E nesse sentido, inspiro-me em
Freire (1975), ao pensar esse novo paradigma inovador, discutindo a natureza do
conhecimento na formação dos futuros professores, nos seguintes termos:
Conhecer, na dimensão humana, que aqui nos interessa, qualquer que seja o nível
em que se dê, não é o ato através do qual um sujeito, transformado em objeto,
recebe, dócil e passivamente, os conteúdos que outro lhe dá ou impõe. O
conhecimento, pelo contrário, exige uma presença curiosa do sujeito em face do
mundo. Requer sua ação transformadora sobre a realidade. Demanda uma busca
constante. Implica em invenção e em reinvenção. Reclama a reflexão crítica de cada
um sobre o ato mesmo de conhecer, pelo qual se reconhece conhecendo e, ao
reconhecer-se assim, percebe o “como” de seu conhecer e os condicionamentos a
que se está submetido seu ato. Conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é
como sujeito e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer.
(FREIRE, 1975, p. 27)

Com esse pensamento, ao me envolver com esta investigação, compartilho com


professores pesquisadores, a preocupação com o atual contexto político e econômico
brasileiro, cuja realidade se mostra adversa ao bem-estar da população, bem como a projetos
inovadores na Educação Superior e na Educação Básica54. Consequentemente, o espaço para
mudanças de paradigmas aguarda a síntese do movimento que se opera no cenário nacional,
apostando no envolvimento de todos que militam sobre causas populares.
Situo a formação de professores no cenário nacional e vejo que o momento é
desalentador, mas ao mesmo tempo oportuno às mudanças na gestão da educação e do ensino
superior. A democracia da nação brasileira sob o comando do atual governo 55 está sob
ameaça. Alinhado com os propósitos do grande capital empresarial e ruralista, o representante

54
O cenário político atual da educação básica, ensino fundamental e médio, campo de atuação dos professores de
Física, revive o retrocesso de mais de trinta anos no ensino colocando na contra-mão propósitos inovadores na
pratica educativa, nas palavras de Saviani (2017) Um sinal emblemático da intervenção nos próprios
conteúdos e na forma de funcionamento do ensino é o movimento denominado “Escola sem Partido” que
surgiu no âmbito da sociedade civil, se constituiu como uma ONG (Organização não governamental) e agora
se apresenta na forma de projetos de lei na Câmara dos Deputados, no Senado Federal e em várias Assembleias
Estaduais e Câmaras Municipais do país.
55
Refiro-me ao governo Michel Temer.
96

da vice-presidência através de um golpe jurídico, midiático e parlamentar assumiu a liderança


política da nação56.
Desde aí colocou em risco as conquistas da educação obtidas pelos dois governos
que o antecederam, como por exemplo, maior autonomia financeira e pedagógica,
financiamento de bolsas de iniciação à pesquisa e extensão universitárias. No âmbito das mais
drásticas das medidas tomadas incluo a redução e o congelamento do financiamento para
educação e saúde nos próximos 20 anos. O reflexo da política recessiva já é sentido pelas
instituições universitárias, e a expectativa da formação inicial de professores com melhores
condições estruturais, humanas e financeiras se mostra frustrada no presente momento.
Nossa análise é a de que se trata de momento propício para que reflexões sejam
feitas sobre a formação inicial de professores no contexto das políticas nacionais de educação,
tendo em vista mudanças que entendo necessárias no conjunto de ações que dizem respeito ao
processo da formação docente. Na licenciatura em Física do IFMA, o momento não poderia
ser mais oportuno à reestruturação do curso em sua organização pedagógica-curricular, para
pensar uma política institucional de desenvolvimento profissional dos professores, rever as
condições objetivas do trabalho docente, bem como o papel da pesquisa sobre as práticas
profissionais docentes na formação dos professores. Considero tais parâmetros essenciais na
construção de um modelo inovador na licenciatura, consoante com este século XXI.

Cenários da Educação e da Formação de Professores no e para o Século XXI

Na seção anterior apresentei alguns elementos desse cenário, considerando-o


desfavorável, porém, de boa oportunidade para que nele se processe as transformações
necessárias. O entendimento da educação e da formação de professores para o século XXI
remete ao contexto das políticas públicas da educação articuladas com objetivos mais amplos
de políticas macroeconômicas globalizadas, no atual estágio da sociedade. Nesse sentido essa
abordagem não constitui uma tarefa das mais simples, posto que a sua abrangência e relação
com a complexa realidade social exigem compreendê-la em suas múltiplas relações, nas quais
se mostram adversas e cheias de profundas contradições.
Assistimos no contexto da nova era mundial, no âmbito da ciência que expressa
tanto avanços quanto compassos na produção do conhecimento e das tecnologias, numa
velocidade incalculável se comparada às etapas do desenvolvimento do conhecimento, e da

56
Ocorrido no ano de 2016, caracterizando um governo ilegítimo, antidemocrático e autoritário.
97

produção de recursos tecnológicos. Nas cinco primeiras décadas do século passado, contudo,
é a própria realidade que deixa ver que o bem-estar e a segurança das pessoas,
proporcionalmente aos avanços científicos e tecnológicos alcançados privilegiou um número
pouco expressivo das sociedades em geral.
No desenrolar das tramas sociais, atores e autores, num fluxo de permanente
interação, desenham e redesenham itinerários sem certeza, com movimento de continuidade e
descontinuidade, assumindo formas e deformidades. A Ciência e a Educação são produtos
desses movimentos e contradições partes de uma história, mas que têm a sua própria história.
Retomo de forma breve parte dessa trama para identificar como esses movimentos se
relacionam com a formação de professores de Física e a educação para o século XXI.
Os eventos que marcaram e outros que ainda marcam esse início de século
escrevem capítulos negativos da nossa história. Entendo que os fatos trazidos devam ser
tomados como elementos problematizadores de uma educação que compreendo complexa,
contudo, comprometida com as transformações exigidas na contemporaneidade. Portanto,
esses não devem ser esquecidos, mas, incluídos pelos professores-formadores em suas
práticas, merecendo reflexões na perspectiva de que se discuta e encaminhe posturas
formadoras e educativas com expectativas de um mundo justo e fraterno para as futuras
gerações.
No movimento da história compreendo que há influências de relações políticas,
sociais e econômicas sobre questões que dizem respeito à educação (MORIN, 2008;
PIMENTA; LIMA; CONTRERAS, 2002; LIBÂNEO, ALVES, 2012), assim como a projetos
de formação de professores, sobretudo aqueles relacionados às ciências da natureza. Sendo
assim, trago alguns fatos passados e presentes vinculados à realidade mundial e brasileira,
fazendo emergir dos diversos contextos relações com o fenômeno da educação e da formação
de professores de Física, no e para o século XXI, com suas concepções e práticas formadoras.
Quando me detenho no movimento que a história das sociedades realizou até o
presente, e foco os seus sujeitos, essa visão se divide entre o que se pode lamentar e o que
celebrar. O primeiro século do terceiro milênio em seus dez primeiros anos registra
acontecimentos, fatos e descobertas extraordinárias, mas deixa sobressair o acirramento do
terror originado na disputa por hegemonia militar e econômica, protagonizadas pelas maiores
potências mundiais em disputa por poderio econômico. Problemas de raízes profundas nas
sociedades capitalistas periféricas como a fome, a miséria e o desemprego são oportunidades
para agregar lucros. Não há crise para o capital que não se mostre como oportunidade.
98

Em suas diferentes formas de dominação do mundo e sem medida para as


consequências sociais o exercício do poder ilimitado do capital em detrimento do humano
assombra vidas somado ao desrespeito à soberania e à cultura das sociedades no mundo,
assim interpretada por Boff (2013) na forma seguinte:
Podemos dizer: muito mais que o fim do mundo estamos assistindo ao fim de um
tipo de mundo. Enfrentamos uma crise civilizacional generalizada. Precisamos de
um novo paradigma de convivência que funde uma relação mais benfazeja para com
a Terra e inaugure um novo pacto social entre os povos no sentido de respeito e de
preservação de tudo o que existe e vive. Só a partir desta mutação faz sentido
pensarmos em alternativas que representam uma nova esperança. (BOFF, 2013, p.
18)

Vejo que é preciso muito mais que a indignação e a revolta na perspectiva da


superação da crise civilizacional. Sei que a educação sozinha não poderá fazer as
transformações que se fazem necessárias à construção de nova ética e ordenação do mundo,
mas, sem ela certamente nada acontecerá. Aproprio-me de um pensamento de Paulo Freire
que costumeiramente era repetido em suas interlocuções com educadores: Educação não
transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo.
Ao lado das lutas entre explorados e excluídos no presente século, o sonho pelo
fim das guerras, das desigualdades e injustiças se expande. O Brasil, com uma história de
cultura escravocrata e de expressiva miscigenação racial, se inclui na rota da violência e
insegurança, quando ainda alimenta o preconceito racial e de gênero. É, no entanto, a prática
social da educação a via de superação da intolerância, traduzida em preconceitos, aprendendo
a respeitar e conviver com as diferenças de gênero, cor, etnia, sexo e idade.
Para além das desigualdades econômicas e das injustiças sociais, a
vulnerabilidade da criança e do jovem em nossa sociedade devem constituir temas igualmente
relevantes na formação de professores. Sobre esse segmento é preocupante a leitura das
estatísticas no “Mapa da Violência”, através dos dados coletados pelo Ministério da Saúde,
apontando que houve significativo aumento das taxas de suicídio no Brasil, entre 2002 e
2012, tendo como vítimas 44% de crianças na faixa dos 10 aos 14 anos, e 35,5% dos 15 aos
19 anos. Pelo fato de ainda não saberem lidar com as frustrações, com o descaso e o abandono
das famílias, na maioria das vezes causados por questões de ordem econômica associada às
humilhações e à violência nos lares e, ainda, a crueldade do bullying nas escolas, os jovens
99

isolam-se, a depressão se instala rapidamente e um dia, em que a solidão é insustentável,


recorrem ao suicídio57.
A sociedade, a família e a escola, na atualidade, ignoram o jovem e a criança em
suas necessidades de crescimento, de escuta, de afeto. Falta o olhar cuidadoso, sem
preconceitos, para que sentidos e significados expressos por jovens e crianças sejam
responsavelmente interpretados. Não existe espaço nem ambiente onde se encaixem. Em sala
de aula tenho provocado meus alunos a pensarem sobre essas questões sociais na expectativa
de que eles possam pensar que atitudes poderão e deverão assumir em situações semelhantes
em aulas. O cuidado com o humano é uma necessidade urgente no presente século. Nesse
sentido, Imbernón (2011, p. 14) completa nos seguintes termos:
O contexto em que trabalha o magistério tornou-se complexo e diversificado. Hoje,
a profissão já não é a transmissão de um conhecimento acadêmico ou a
transformação do conhecimento comum do aluno em um conhecimento acadêmico.
A profissão exerce outras funções: motivação, luta contra a exclusão social,
participação, animação de grupos, relações com estruturas sociais, com a
comunidade. E é claro que tudo isso requer uma nova formação: inicial e
permanente.

Levando em conta alguns exemplos dos problemas sociais a serem


problematizados na formação de professores58 e alunos reafirmo o entendimento de que os
princípios éticos, políticos, estéticos, pedagógicos... sejam o esteio da formação docente em
foco. Assim, assinalo a urgência de um novo modelo de educação e de formação, no século
atual, articulado à sociedade emergente neste novo século, projeto que implique mudanças de
atitude das pessoas em relação às outras pessoas, e à natureza, edificando-se a construção de
uma nova ética social.

57
De acordo com as pesquisas, elas recorrem à morte por se sentirem sozinhas e abandonadas pelos pais. O
psiquiatra do centro de Promoção da Vida e Prevenção do Suicídio, Dr. Ricardo Nogueira do Hospital Mãe de
Deus no Rio grande do Sul, informa que grande parte das mortes ocorre devido a desestrutura familiar,
deixando os filhos sentindo-se desprotegidos e vulneráveis (MELO, ROSO, 2017).
58
A formação também servirá de estímulo crítico ao constatar as enormes contradições da profissão e ao tentar
trazer elementos para superar as situações perpetuadoras que se arrastam há tanto tempo: a alienação
profissional – por estar sujeitos a pessoas que não participam da ação profissional -, as condições de trabalho, a
estrutura hierárquica etc. e isso implica, mediante a ruptura de tradições, inércias e ideologias impostas, formar
o professor na mudança e para a mudança por meio do desenvolvimento de capacidades reflexivas em grupo, e
abrir caminho para uma verdadeira autonomia profissional compartilhada, já que a profissão docente deve
compartilhar o conhecimento com o contexto (IMBERNÓN, 2011, p. 14).
100

Aos professores da área das Ciências - que por suposição pressupõe o campo de
conhecimento que mais poderá contribuir para o equilíbrio e manutenção da vida com
sustentabilidade no planeta - atribui-se a superação da visão de naturalização dos graves
problemas ambientais. Para tanto, define-se a formação crítica e reflexiva para a nova geração
de professores sobre valores relativos à solidariedade e à sustentabilidade do planeta, mas
também sobre as questões de ordem social, isto é, a preocupação com as condições de
desigualdade e injustiça evidentes na sociedade.
Boff (2013) em defesa do “Saber Cuidar” enumera os sintomas de uma crise
civilizacional generalizada, da qual eu destaco alguns desses sintomas diretamente
relacionados com o que expus até o momento, quais sejam a seguir:
Há um descuido e um abandono dos sonhos de generosidade, agravados pela
hegemonia do neoliberalismo com o individualismo e a exaltação da propriedade
privada que comporta. Menospreza-se a tradição de solidariedade. Faz-se pouco dos
ideais de liberdade e de dignidade para todos os seres humanos. Há descuido e
descaso pela dimensão espiritual do ser humano, pelo esprit de finesse (espírito de
gentileza) que cultiva a lógica do coração e do enternecimento por tudo o que existe
e vive. ... Há um descuido e um descaso pela coisa pública. Organizam-se políticas
pobres para pobres ... há um descuido vergonhoso pelo nível moral da vida pública
marcada pela corrupção e pelo jogo explícito de poder de grupos, chafurdados no
pantanal de interesses corporativos. Há um descuido e um descaso na salvaguarda de
nossa casa comum, o planeta Terra. Solos são envenenados, ares são contaminados,
águas são poluídas, florestas são dizimadas, espécies de seres vivos são
exterminadas; um manto de injustiça e de violência pesa sobre dois terços da
humanidade. Um princípio de autodestruição está em ação, capaz de liquidar o sutil
equilíbrio físico-químico e ecológico do planeta e devastar a biosfera, pondo assim
em risco a continuidade do experimento da espécie homo sapiens e demens. (BOFF,
2013 p. 19-21)

Analiso as assertivas do autor e refletindo sobre as problemáticas apontadas,


indagaria em qual delas não caberia a prática formadora e educativa dos professores de
ciências? Considero o ensinar ciências, sobretudo, o cuidado com a vida, com a natureza e
com todos os elementos que a constitui, organizando os conhecimentos numa visão
interdisciplinar e transdisciplinar. Ao lado disso, relacionar a educação científica com a
sociedade e a cultura nela edificada59 significa criar a consciência social que inclui o cuidado
com a vida e o mundo.

59
Considero oportuno ampliar a reflexão sobre o cuidado, trazendo a contribuição teórica de Gil-Perez; Carvalho
(2011, p. 24-25) no que diz respeito à relação entre a Ciência/Tecnologia/Sociedade, onde explicitam:
Conhecer as interações Ciência/Tecnologia/Sociedade associadas à construção de conhecimento, sem ignorar o
caráter, em geral, dramático do papel social das Ciências [...] e a necessidade da tomada de decisões [...]. Isso
torna-se essencial para dar uma imagem correta da Ciência. Com efeito, o trabalho de homens e mulheres de
Ciências – como qualquer outra atividade humana – não tem lugar à margem da sociedade em que vivem, e se
vê diretamente afetado pelos problemas e circunstâncias do momento histórico, do mesmo modo que sua ação
tem uma clara influência sobre o meio físico e social em que se insere. Afirmar isso pode parecer supérfluo, no
101

Estou me referindo ao mundo, o que não quer dizer que me distancio da realidade
próxima em que vivo e conheço, mas porque devo ser coerente com a visão de totalidade e
relações historicamente edificadas entre as sociedades que ocupam os diversos espaços
geográficos na Terra. Isso é um fato incontestável nos dias de hoje. Com a economia
globalizada, ordenada pelo sistema capitalista hegemônico as fronteiras entre as sociedades
foram removidas e as distâncias do mundo, ora encurtadas, são mediadas pela Revolução
Digital.
Não admitir os benefícios da internet é insensato. Nos dias de hoje é praticamente
impossível viver sem esse valioso recurso tecnológico que permite a conexão entre pessoas e
o mundo. Para a educação e para a medicina os avanços são incalculáveis, não parece restar
dúvida. Contudo, é da responsabilidade da Ciência o controle ético sobre os progressos
científicos-técnicos e em nada devendo se furtar. Não é segredo os riscos que corre a
humanidade com o uso dos conhecimentos produzidos nas Ciências, empregados na produção
de armas, por exemplo, de largo alcance e incalculável poder de destruição, assim como o
lançamento de resíduos químicos, lixos e efluentes de fontes como a indústria, hospitais e
outros, na natureza, poluindo o ambiente e causando danos muitas das vezes irreversíveis à
saúde da população e à vida no planeta. Temas como esses tornam-se obrigatórios na prática
formadora de professor, na física, por exemplo, o tema das armas nucleares cabe uma
discussão interdisciplinar de pontos de vista biológicos, éticos e sociais.
Minha visão sobre a revolução digital traz outra discussão igualmente importante
para o campo da educação científica, qual seja, desvelar alguns dos propósitos ocultos da
informação e comunicação em rede, a serviço da globalização da economia, educando-se para
o seu uso e aplicação. A esse respeito Prado e Silva (2003, p. 15) manifestam-se dizendo que:
A globalização ou mundialização é um processo real, de ordem econômica, cultural
e política que transforma o mundo numa rede de fluxos, mas deve ser pensada como
não unívoco: é antes o resultado de uma composição de sentidos construídos em um
campo de disputas discursivas entre céticos, neoliberais e hiperglobalizadores (Held,
199 e Prado, 2000). Negri e Hardt (2001) chamam “império” à realidade sistêmica
desse novo mundo capitalista globalizador, em que as fronteiras nacionais e
comerciais sofreram mudanças intensas nas últimas décadas e os fluxos de
informação e dinheiro circulam em rede.

entanto, a ideia de que fazer Ciência é pouco menos que trancar-se em uma torre de marfim – “no mundo dos
livros” ou coisa parecida – distanciado da realidade, constitui uma imagem tópica bastante difundida e com a
qual nosso ensino lamentavelmente contribui, reduzindo a Ciência à transmissão de conteúdos conceptuais e,
se muito, treinamento em alguma destreza, deixando de lado os aspectos históricos, sociais etc. que marcam o
desenvolvimento científico.
102

A naturalização da visão de globalização deixa, a meu ver, uma zona de conforto


sem limite para os propósitos do capitalismo na fase atual da economia universalizada. O
fetiche é exercido pelo poder da comunicação digital, a elaboração técnica dos discursos leva
os sujeitos desde o consumo de produtos e serviços ao de experiências virtuais de
interatividade. Nesse processo de convencimento, um elemento tem grande peso, o marketing
– constituindo-se como instrumento regulador de consumo nos mercados globais. Esclarece
Prado e Silva (2003, p. 23).
Os traços culturais (mitos, valores, crenças etc.) da comunidade que se pretende
seduzir para o consumo são incorporados num processo de produção (semiótico) de
sentidos (ou de tecnificação discursiva). Consumir certa experiência vivenciada
garante o sentimento de pertença e identidade. Na medida do interesse de um
determinado segmento produtivo, certa comunidade passa a receber “informação”
selecionada (em textos) que forja a percepção de pertencimento e identidade .

A complexidade da comunicação é de tal proporção que passa ao largo da visão


de quem simplesmente toca a tecla de um aparelho celular, o mesmo que o deslizar do dedo
inocente de uma criança sobre os aplicativos, encantada com as cores, imagens, sons, com
sentimento de falsa pertença. Nem de longe imaginando que consome produtos e serviços que
somam capital de fortunas incalculáveis. Prado e Silva (2003) confirmam que as instituições
industriais e financeiras produzem mercadorias e subjetividades. Também chama a atenção
para os riscos do uso da cultura das sociedades com fins comerciais, desejando atingir os
usuários da comunicação no processo de consumo60.
Castells (2015) como sociólogo e um dos mais influentes pensadores sobre o tema
analisa o comportamento das sociedades conectadas em rede, com foco nos efeitos produzidos
pela informação sobre o desenvolvimento econômico, sobre a cultura e a sociedade. A
respeito do que abordei acima, considero pertinente trazer a visão do autor acima, a respeito
do uso da tecnologia, manifestada em entrevista no portal Fronteiras, em 2015, assim:
A tecnologia em si pouco pode fazer, se a utilizam para acentuar a dominação
política e a exploração comercial das pessoas. Os urbanistas sabem utilizar o

60
Certamente não são só as guerras localizadas em determinadas partes do mundo que ameaçam a integridade
dos seres viventes e a cultura que desenvolveram, tão pouco a violência urbana é por si só a responsável pela
falta de segurança e bem-estar dos indivíduos. As ameaças à integridade da humanidade ganham uma nova
forma confinada no paradigma da comunicação globalizada. Emergiu da revolução digital uma nova ordem
mundial capitaneada pela comunicação virtual. Um mundo virtual onde a comunicação impõe os seus modelos
e meios de consumo exercendo um poder global e sem regulação sobre os seus usuários. Ao comunicar, a
linguagem produz uma mercadoria para o consumo, utilizando-se dos traços culturais cria subjetividades e uma
ordem para a exploração comercial estruturada e multiplicada mediante interconexões via redes.
103

potencial tecnológico atual para melhorar transporte, qualidade de vida, saúde,


educação, meio ambiente. Mas as empresas só se ocupam de suas ganâncias e os
políticos se dedicam prioritariamente a manter seu poder. Dessa forma, ainda que
estejamos conectados, estamos cada vez mais desconectados do poder que
delegamos e da riqueza que produzimos com nosso trabalho. (CASTELLS, 2015, p.
2)

O autor nos diz que as sociedades conectadas em rede não significam de forma
absoluta que estejam integradas, mas que as novas tecnologias da informação tanto podem
servir para facilitar a vida de quem necessita e busca a informação, como,
preponderantemente, serve aos interesses daqueles que detém as conexões e controlam o fluxo
de acesso, trabalhando nos bastidores da comunicação e da informação.
Houve uma mudança gigantesca entre as relações anteriormente presenciais
passando para as virtuais. Consequentemente, houve também mudanças nas relações de poder
utilizando-se do meio virtual possibilitado pelas conexões em redes. Afinal, os países
produtores de hardware e software são os monopolizadores da comercialização desses
produtos como também os organizadores das redes e controladores das conexões. Enquanto
isso os países economicamente em desvantagem representam meros consumidores no mundo
digital.
Quando me detenho sobre essa trama, volto no tempo e visualizo para que seja
percebido o limite alcançado pela revolução digital e os desdobramentos nos dias de hoje,
sendo para isso necessário considerar todo um processo e nele incluem-se a ciência-pesquisa,
o conhecimento-tecnologia, a física-matemática, a educação-ensino. As transposições e
transformações tiveram autorias, posto que criadores sejam pessoas que passaram por um tipo
de formação. Se a aplicação desse conhecimento tem finalidades que concorrem para a
negação da cidadania, contra a segurança das pessoas e na contramão da paz e da felicidade
de povos e nações, quero chegar ao ponto em que se possa considerar o papel de outra
educação-formação, sustentada sobre uma epistemologia da ciência com base crítica, cidadã e
ética.
Na direção desses objetivos, caminho com Santos (1999, p. 13) quando assevera
que:
Para o terceiro milênio, a cidadania integra uma ampla constelação de problemas da
vida comunitária de que a escola não se pode alhear; que atualmente o exercício da
cidadania é, simultaneamente, mais exigente e mais complexo; que a educação para
a cidadania recusa uma aceitação acrítica da autoridade da ciência e da tecnologia e,
finalmente, que este saber introduz valores inovadores na esfera cultural – valores
que assentam na dignidade da pessoa humana. Logo, a questão que se nos coloca é a
de saber se as diferentes disciplinas estarão suficientemente amadurecidas para
mobilizar saberes, vontades e energias capazes de responder aos grandes desafios
centrados na sua dimensão formativa.
104

Insisto nessa temática pelo fato de ter percebido na fala dos professores de Física,
durante entrevistas, a valorização do uso da tecnologia na pesquisa e no ensino61, como a
principal ferramenta do professor na prática pedagógica formadora, numa relação clara de
caráter instrumental e técnico com ela. Entendo ser necessário que os professores lancem
sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação – TIC, um olhar mais reflexivo e
crítico, ao mesmo tempo reconhecendo sua importância, sem, contudo, desconsiderar as
questões que mobilizam interesses de ordem política e econômica envolvendo a tecnologia. É
fundamental que se problematize a sua utilização na forma dada, assim como a qualidade da
informação que disponibiliza. Em outras palavras assevera Gadotti (2003, p. 50 grifo nosso)
que “[...] na era da informação, diante da velocidade com que o conhecimento é produzido e
envelhece, não adianta acumular informação. É preciso saber pensar. E pensar a realidade”.
Compreender a atitude de aparente desconhecimento a respeito dessas questões,
que ficaram ausentes dos relatos dos professores e por suposto, deixadas fora da prática
docente e da formação dos professores, me leva a pensar na fragmentação/especialização do
conhecimento nas disciplinas que formam o currículo do curso de Licenciatura em Física do
IFMA, eximindo os professores de parte da responsabilidade sobre esse aspecto. O
conhecimento específico nas ciências, dependendo da concepção de conhecimento que cada
um possui, na maior parte das vezes concorre para uma análise simplificada sobre a realidade
que nos cerca, contra a profunda complexidade que a caracteriza. A esse respeito, Almeida;
Carvalho (2009, p.18) esclarecem:
[...] Nossa formação escolar, e, mais ainda, a universitária nos ensina a separar os
objetos do seu contexto, as disciplinas uma das outras para não ter que relacioná-las.
Essa separação e fragmentação das disciplinas é incapaz de captar “o que está tecido
em conjunto”. Isto é, o complexo, segundo o sentido original do termo. A tradição
do pensamento que forma o ideário das escolas elementares ordena que se reduza o
complexo ao simples, que se separe o que está ligado, que se unifique o que é
múltiplo, que se elimine tudo aquilo que traz desordens ou contradições para o nosso
entendimento.

61
De outro lado, professores são cobrados quanto ao domínio e uso da tecnologia, no entanto, as salas de aula
ainda conservam a estrutura e a organização das escolas tradicionais. Sem as políticas educacionais que
priorizem a transformação que as escolas necessitam, e sem aproximarem-se da realidade que os alunos
vivenciam fora de seus muros, ou seja, a cultura virtual, a exclusão digital segue ocupando os fóruns
educacionais e outros espaços em defesa da inclusão digital da sociedade brasileira. Considerando os dados da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicilio- PNAD (2016) somos uma nação com 12,9 milhões de
analfabetos. Em 2005, 11% das pessoas com 15 anos e mais não sabiam ler e nem escrever. Seria de grande
importância o emprego da tecnologia na solução do analfabetismo no país, por exemplo.
105

A cultura humanista e a cultura científica devem, pois, unir-se. (ALMEIDA,


CARVALHO, 2009). A pressão exercida sobre a cultura científica para atender de forma
absoluta as demandas econômicas deve encontrar o caminho de volta numa versão nem tanto
antropológica, nem tanto materialista, integrada, portanto, à cultura humanista. Por oportuno
trago novamente os autores que a esse respeito declaram:
A inteligência que só sabe separar reduz o caráter complexo do mundo a fragmentos
desunidos, fraciona os problemas e unidimensionaliza o multidimensional. É uma
inteligência cada vez mais míope, daltônica e vesga; termina a maior parte das vezes
por ser cega, porque destrói todas as possibilidades de compreensão e reflexão,
eliminando na raiz as possibilidades de um juízo crítico e também as oportunidades
de um juízo corretivo ou de uma visão a longo prazo. (ALMEIDA; CARVALHO,
2009, p. 19).

A meu ver, a reforma necessária do pensamento, conforme Almeida e Carvalho


(2009), cabe na discussão que deve ser feita nas universidades e escolas de modo amplo,
independentemente de qualquer formação profissional. Na Licenciatura em Física do IFMA
se faz urgente e obrigatória porque é basilar que esse debate ocorra ligado às questões que
dizem respeito às concepções de ciência, às práticas docentes e ao currículo do curso.
Sendo algo que sempre me intrigou e preocupou na formação dos professores nos
cursos da área das Ciências e da Matemática tive a oportunidade de integrar mais uma vez a
comissão de reformulação do curso de Licenciatura em Química, já finalizada, e o de Física
em andamento. Tem sido uma experiência de extraordinário aprendizado e espaço de troca de
saberes. Nem por isso fácil ou pleno de conquistas em torno das mudanças que acredito
urgentes para os cursos, isto porque o conjunto de professores da área das Ciências apresenta
concepções cartesianas62 consolidadas acerca de conhecimento e da formação. Nesse sentido,
entendo a necessidade de reflexão a este respeito, pelo coletivo de formadores, tendo em vista
rever pressupostos que subjazem a prática profissional docente.
A educação no século XXI ainda sob forte influência dos pressupostos de uma
pedagogia liberal não superou a concepção tradicional de ensino (PIMENTA, 1999; PARO,
2014; IMBERNÓN, 2011), realizada mediante a transmissão de conhecimentos e informações

62
Esse modo de compreender o mundo e pensar a educação no contexto formativo influencia a prática formadora
dos professores. Afirmam Santos; Sommerman (2009, p. 18) Como consequência dele, a prática pedagógica
tendeu a se organizar nos moldes da disjunção dos pares binários: simples-complexo, parte-todo, local-global,
unidade-diversidade, particular-universal; por outro lado, cristalizou-se a subdivisão do conhecimento em
áreas, institutos e departamentos, cada qual delimitado pelas fronteiras epistemológicas. Cada instituto ou
departamento organiza seus respectivos cursos por meio de listas de diferentes disciplinas. São as grades
curriculares que, na prática, funcionam como esquemas mentais ao impedirem o fluxo de relações existentes
entre as disciplinas e áreas de conhecimento.
106

de alguém que sabe – o professor - para aquele que ainda não sabe – o aluno. Uma relação
autoritária e antidemocrática freia a postura sócio-crítica do formador, contributiva de uma
educação que pode ser fundamental para as transformações sociais demandadas pela
sociedade no presente século (FREIRE, 1999; GADOTTI, 2003; CHASSOT 2007;
SAVIANI, 2017).
Dispensando o olhar sobre a matriz do curso e pelo fato de ter tomado parte em
sua elaboração, posso assegurar que, muito embora exista uma orientação no PPC do curso,
apontando para uma prática formadora com um modelo de formação que supere o paradigma
conservador, a ordenação das disciplinas organizadas como componentes isolados,
inviabilizam uma proposta de formação de professores com princípios interdisciplinares e
integradores entre os formadores. Na composição curricular da licenciatura as disciplinas
científicas cuidam do conteúdo específico e as disciplinas de educação cuidam do aspecto
pedagógico, quer dizer, da docência e do ensino63.
Essa reflexão sobre alguns eventos no início deste novo milênio causando
perplexidade e preocupação me deixa convicta da necessidade de buscar modelos integradores
do conhecimento para a formação dos futuros professores de Física. A superação do
paradigma conservador na prática formadora docente encontra no paradigma da complexidade
(MORIN, 2008) que inclui o pensamento complexo e a visão de totalidade64, o modelo de

63
Sobre o insulamento das disciplinas específicas e pedagógicas na Licenciatura em Física, me posiciono
contrária e sustento o meu pensamento em Behrens (2006), suscitando o paradigma da complexidade,
compreendendo que a esfacelamento das disciplinas é propiciada pela visão linear de currículo, tendo como
consequência a fragmentação dos conteúdos, justapostos, ordenadamente, nos sucessivos períodos letivos até a
integralização do curso pelo aluno. Uma visão que encontra fundamento na superespecialização de
determinadas áreas do conhecimento humano. A proposta de formação universitária e escolar, numa visão
complexa, integradora e holística pressupõe maiores contribuições às transformações exigidas no presente
século.
64
A respeito da complexidade Morin (2008, p. 20) traça férteis considerações: À primeira vista, a complexidade
é um tecido (complexus: o que é tecido em conjunto) de constituintes heterogêneos inseparavelmente
associados: coloca o paradoxo do uno e do múltiplo... a complexidade é efetivamente o tecido de
acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo
fenomenal. Mas então a complexidade apresenta-se com os traços inquietantes da confusão, do inexplicável, da
desordem, da ambiguidade, a incerteza. Daí a necessidade, para o conhecimento, de pôr ordem nos fenômenos
ao rejeitar a desordem, de afastar o incerto, isto é, de selecionar os elementos de ordem e de certeza e de retirar
a ambiguidade, de clarificar, de distinguir de hierarquizar... Ora a complexidade voltou, nas ciências, pela
mesma via que a tinha banido. O próprio desenvolvimento da ciência física, que se dedicava a revelar a ordem
impecável do mundo, o seu determinismo absoluto e perpétuo, a sua obediência a uma Lei única e a sua
constituição de uma maneira primeira simples (o átomo) desembocou finalmente na complexidade do real.
Descobriu-se no universo físico um princípio hemorrágico de degradação e de desordem (segundo princípio da
termodinâmica) depois, no suposto lugar da simplicidade física e lógica, descobriu-se a extrema complexidade
microfísica; a partícula é, não uma pedra primeira, mas uma fronteira sobre uma complexidade talvez
inconcebível; o cosmos é, não uma máquina perfeita, mas um processo em vias de desintegração e de
organização e de organização simultâneas. Finalmente, daqui resulta que a vida é, não uma substância, mas um
107

formação que supera a concepção conservadora, destinando bases para uma prática docente
crítica e emancipadora, como proposta para a construção de uma sociedade com menos
desigualdades, mais justa, humana e solidária.
É, pois, da maior importância discutirem-se as bases epistemológicas e
pedagógicas que orientam a organização desde essa arquitetura curricular às atividades na
prática docente formadora de futuros professores no curso de Licenciatura em Física. Penso
ter deixado clara a minha visão sobre a função da educação para o século XXI como sendo
uma atividade humana que cria consciências novas a partir da inclusão de temas e problemas
da realidade material e subjetiva no presente, envolvida em uma teia de complexas e
determinísticas relações, na configuração da vida no mundo.
A partir dessas reflexões, subsequentemente, tratarei do processo de categorização
e análise dos relatos e experiências dos sujeitos desta pesquisa, nos quais busco compreender
para conhecer as concepções de ciência, bases epistemológicas e pressupostos teórico-
metodológicos na prática formadora do curso de Licenciatura em Física do IFMA para este
século XXI.

fenômeno de auto-eco-organização extraordinariamente complexo que produz autonomia. Desde então, é


evidente que os fenômenos antropossociais não poderiam obedecer a princípios de inteligibilidade menos
complexos que os doravante requeridos para os fenômenos naturais. É-nos preciso enfrentar, a complexidade
antropossocial e não dissolvê-la ou ocultá-la.
108

PARTE IV - NO CONTEXTO DA LICENCIATURA EM FÍSICA DO IFMA:


CONCEPÇÕES DE CIÊNCIA E DE PRÁTICAS FORMADORAS PARA A
EDUCAÇÃO NESTE SÉCULO
Assim foi, por gerações sem conta. Até que um dos aldeões
pensou um objeto jamais pensado. (O pensamento é uma coisa
existindo na imaginação antes de ela se tornar real. A mente é
útero. A imaginação a fecunda. Forma-se um feto: pensamento.
Aí ele nasce...) Ele imaginou um objeto para pegar as criaturas
do rio. Pensou e fez. Objeto estranho: uma porção de buracos
amarrados por barbantes. Os buracos eram para deixar passar o
que não se desejava pegar: a água. Os barbantes eram
necessários para se pegar o que se deseja pegar: os peixes. Ele
teceu uma rede.
(Rubem Alves)

O cenário institucional em que se desenvolve esta trama é o IFMA – Campus São


Luís Monte Castelo, curso Licenciatura em Física que, da data da sua criação até o presente,
tem enfrentado inúmeros desafios, compartilhando soluções e continuidade com o corpo
docente dos cursos superiores. Assim, de volta ao passado, recordaram os professores Marina
de Vasconcelos, Cesar Lattes e Luís Roberto a seguir:
... Quando os Cursos Superiores foram criados na Instituição nós não
tínhamos os Cursos de Licenciatura nas Áreas de Ciências e
Matemática; nós tínhamos nas áreas técnicas, tecnológicas. É. Antes
nós erámos uma escola técnica e partimos para a cefetização e eu
acho que até para ser mais fácil e pela mão de obra que já se tinha,
que não tínhamos um quadro específico de Ensino Superior, os cursos
que foram criados primeiro foram de Licenciatura em Eletricidade e
Mecânica, e Construção Civil. Nós já tínhamos professores dessas
áreas, então, foi uma forma de quase rearranjo e em 2001, nós
começamos a oferecer as Licenciaturas nas áreas de Ciências e
Matemática, em substituição as da área técnica que passaram a não
existir. Eu fiz parte do projeto político-pedagógico desse curso. Por
ser docente do magistério superior na Instituição, por conhecer o
histórico de como os cursos superiores foram trazidos para a
instituição e até por uma determinação legal... Agora a instituição
tem um novo perfil institucional, ela não é mais uma mera Escola
Técnica é um centro tecnológico. Primeiro nós fomos centro
tecnológico e depois nos tornamos Instituto Federal. Então, a gente
percebe que essas mudanças históricas elas vão também demandando
certa mudança dentro da estrutura da instituição que muitas vezes
acaba sendo uma mera formalidade....o que se observa é que o ensino
superior entra na Instituição quase como um visitante indesejado; ele
tem um espaço mínimo, ele não tem um quadro docente estruturado,
ele não tem... ele foi sendo reorganizado e até hoje infelizmente
continua sendo estruturado de acordo com a demanda. (MARINA DE
VASCONCELOS, Entrevista).
109

Sempre foi um desafio. O que é mais interessante é que você tem um


corpo docente que tem uma qualificação muito boa dentro do nosso
departamento. E isso é muito positivo, isso sana várias dificuldades....
Então para a gente, isso continua sendo uma dificuldade como foi no
passado. A gente tem ao longo do tempo melhorado e isso à medida
que o tempo passa, na minha concepção, só tende a melhorar mais
ainda. Não estou dizendo que os que saíram primeiro tinham uma
formação pior.... Então, a maneira como o curso foi evoluindo, à
medida que vinham chegando novos recursos a gente tinha a
possibilidade de trabalhar outras habilidades, alguns alunos iam mais
para umas habilidades, outros para outras, ou seja, nos permitiu
diversificar a formação dos alunos, digamos assim... Mas, o nível dos
alunos eu acredito que tenha se mantido mais ou menos constante,
talvez melhorado um pouco, não muito eu diria. Porque eu estou
tirando como base a formação dos professores. Recentemente a gente
tem adotado uma política de melhoria de qualificação do corpo
docente (CESAR LATTES, Entrevista).

... A gente sempre quer o melhor. Às vezes, a gente chega e diz assim:
- está funcionando ruim. Mas, quando a gente sai para ver as outras
co-irmãs, as próprias universidades, percebemos que não estamos
numa situação tão complicada como imaginamos. Eu até às vezes
coloco para os colegas que é bom que cada um de nós saia para dar
uma olhada lá fora, para ver como é que estão as coisas ... O nosso
curso foi avaliado e saiu um conceito no qual baixamos,65 mas
confesso que nessa época, no ano de 2014 quando foi feita essa
avaliação, quando os avaliadores do MEC vieram aqui a gente
passava por uma situação difícil. Confesso que não tínhamos
laboratórios, não tínhamos estrutura de sala de aula, estava um
negócio complicado. Mas, hoje a nossa situação está em termos de
estrutura, em termos de biblioteca está bem melhor que naquela
época... (LUIS ROBERTO, Entrevista).

A professora Marina Vasconcelos resgata da memória fragmentos de um tempo


da história da instituição remontando à origem e implantação dos cursos de formação de
professores no extinto CEFET-MA, apontando para o processo de “cefetização”66. É enfática
ao explicar a ausência de condições adequadas e satisfatórias ao funcionamento dos cursos de
graduação, sobretudo, quando diz que “não tínhamos um quadro específico de Ensino
Superior”. Na época da criação dos cursos, enfrentando sérias dificuldades como a financeira,
a estrutura existente atendia à educação profissional, improvisando espaço para a educação

65
Este ano de 2018, o curso de Licenciatura foi reavaliado por uma comissão do MEC, obtendo conceito 4.
66
Cefetização é um termo criado pelos dirigentes institucionais, final dos anos 80, para denominar o processo de
transformação de antigas escolas técnicas em CEFETs, assimilado pela comunidade escolar, incluindo
professores e técnicos.
110

superior. O quadro docente do CEFET-MA que era representativo na área das Engenharias e
de Exatas, envolveram-se com a formação dos professores, implicando mais desafios ao
funcionamento das Licenciaturas em Ciências. Sobre a jornada de trabalho dos professores,
fica subentendida a sobrecarga de trabalho nessa fase.
Apreende-se do contexto de criação dos cursos na área das Ciências o viés
político que cerca o processo de “cefetização” e a criação dos cursos de licenciatura no
CEFET-MA. Nesse período a sociedade brasileira realinhava suas políticas públicas em
consonância com os problemas econômicos, os desafios impostos pela sociedade da
informação e as novas configurações no mundo do trabalho. O MEC exercia certa pressão
sobre as instituições de ensino superior para que fosse cumprido o que havia sido previsto na
LDBEN (1996) e no Plano Nacional de Educação (2001-2011)67, ambos prevendo a
qualificação dos professores que exerciam o magistério na Educação Básica, mas que não
apresentavam a qualificação exigida por lei ou atuavam no ensino, sem a habilitação
correspondente à disciplina que lecionavam.
O CEFET-MA atendeu tal demanda sem que antes tivessem sido estruturadas as
condições para esse fim. “O ensino superior entra na Instituição quase como um visitante
indesejado” disse a professora Marina, voltando ao passado, num tempo em que nem mesmo
espaço para funcionamento havia, situação que se prolongou até o final do ano de 2017.
Durante anos os cursos de graduação tiveram que dividir os espaços de salas de aula,
laboratórios, biblioteca, quadras esportivas, entre outros recursos, com o ensino técnico,
causando profundos transtornos para toda a comunidade do ensino superior, problema que só

67
A LDBEN, 1996, Título VI – Dos Profissionais da Educação; Artigo 61 - Consideram-se profissionais da
educação escolar básica os que, nela estando em efetivo exercício e tendo sido formados em cursos reco-
nhecidos, são: Inciso I – professores habilitados em nível médio ou superior para a docência na educação
infantil e nos ensinos fundamental e médio [...] (BRASIL, 1996). Lei Nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001.
Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Das 28 metas que previa, guardam relação
com o que estou abordando, as seguintes: 15. Incentivar as universidades e demais instituições formadoras a
oferecer no interior dos Estados, cursos de formação de professores, no mesmo padrão dos cursos oferecidos
na sede, de modo a atender à demanda local e regional por profissionais do magistério graduados em nível
superior. 18. Garantir, por meio de um programa conjunto da União, dos Estados e Municípios, que, no prazo
de dez anos, 70% dos professores de educação infantil e de ensino fundamental (em todas as modalidades)
possuam formação específica de nível superior, de licenciatura plena em instituições qualificadas.19. Garantir
que, no prazo de dez anos, todos os professores de ensino médio possuam formação específica de nível
superior, obtida em curso de licenciatura plena nas áreas de conhecimento em que atuam. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/L10172.pdf Acesso em: 10 mar. 2019.
111

encontrou solução neste ano de 2018, com a construção de um prédio onde foi instalado o
ensino superior do Campus São Luís Monte Castelo.
Os professores Cesar Lattes e Luís Roberto, referindo-se exclusivamente ao curso
de Física, cada um ao seu modo, ao mesmo tempo em que fazem emergir da memória o
cenário de implantação da Licenciatura em Física, comparam as condições iniciais de
funcionamento do curso com as que estão dadas no presente. Ao dizerem “a gente ao longo
do tempo tem melhorado e isso à medida que o tempo passa, na minha concepção, só tende a
melhorar” e “confesso que não tínhamos laboratórios, não tínhamos estrutura de sala de
aula, estava um negócio complicado....” E “em termos de estrutura, em termos de biblioteca
está bem melhor que naquela época”, ambos estão de acordo que ainda que referidas
condições não atendam plenamente é possível formar o professor de Física com maiores
habilidades do que foram formados os egressos de poucos anos atrás, quando a precariedade
do curso era obstáculo à melhor formação, segundo os professores.
Destaco a preocupação do professor Cesar quando se refere à “reciclagem de
formação” dos professores de Física, dando a entender que o foco dessa qualificação deve
apontar para a formação de professores. É o próprio professor que admite que o corpo
docente, em sua quase totalidade possui “qualificação muito boa”. Esse é de fato um aspecto
da maior importância, quando se sabe que há bem pouco tempo a qualificação que era
desejável para professores não priorizava, certamente, a formação de natureza pedagógica.
Ao trazer esses dados que evidenciam a precariedade dos cursos superiores no
início de sua criação tive a intenção de auxiliar à compreensão acerca das fragilidades
administrativas e pedagógicas vividas no presente. A instituição que, durante esses anos não
reduziu ou excluiu a oferta das licenciaturas na área das Ciências, convive com déficit de
professores, em menor proporção, assim como com problemas menores em relação ao acervo,
com laboratórios entre outras demandas. Entendo como os professores que a ausência dessas
condições acarreta implicações de ordem pedagógica e profissional no processo de formação
dos professores de Ciências.

Sentidos e Significados na Formação dos Professores de Física do IFMA para a


Educação do Século XXI
Descrever um fato e relatar um acontecimento são práticas que na forma natural
nada nos exige além da visão do acontecimento. Porém, quando se trata de narrar experiências
vividas com propósitos investigativos é demandado do autor uma audiência atenciosa e
112

extremada percepção na captura do fenômeno que investiga, partindo de contextos subjetivos


expressos por seus interlocutores. Para Silva (2003, p. 21 grifo nosso) a riqueza “de ouvir
experiências vividas por outras pessoas está no fato de podermos nos encontrar no outro, que
é também um pouco de nós e, a partir disso, apreendermos formas de viver muito
semelhantes, apesar de vividas por pessoas diferentes.”
Na pesquisa que realizo procuro ir além da minha escuta e visão, enxergando o
meu objeto na sua profunda complexidade. Valorizei a experiência dos professores e a
história da sua formação no curso de Licenciatura em Física em seus aspectos essenciais,
tornando o enredo da minha narrativa o mais fiel possível em termos dos conceitos
apreendidos e da realidade da formação dos professores de Física do IFMA para este século.
A diversidade conceitual apreendida em cada fragmento – unidades de análise -
oriunda dos discursos dos professores no contexto da pesquisa implicou uma abordagem
teórica multireferenciada resguardando uma unidade em torno de seus princípios e
fundamentos, em cujas bases assentei o diálogo com o corpus da pesquisa. Agi recorrendo aos
autores já discutidos em capítulos anteriores como aqueles com os quais ainda dialoguei nas
subseções deste capítulo da pesquisa. A desconstrução e auto-organização a partir do corpus
da pesquisa criteriosamente analisado teve por intenção a defesa da tese que sustento neste
estudo traduzida nas aproximações, distanciamentos e convergência de ideias que discuto,
defendo e sustento, apoiada em pesquisadores do tema da formação de professores, da
educação e do ensino de ciências consoante com este século.
No cenário formativo no qual me incluo as experiências deles nos momentos de
análise exigiram de mim além do olhar multireferenciado, o envolvimento de todos os
sentidos, como também certo distanciamento em diversos momentos de profunda reflexão
sobre o meu objeto e as relações que posso estabelecer interna e externamente em relação ao
contexto em que se concretiza. Assim, no contexto temporal e espacial da Licenciatura em
Física e dos sujeitos da pesquisa, ouvindo os professores formadores, fui à busca de
compreender as concepções de ciência e práticas formadoras para a educação neste século
XXI permitindo-me compreender a minha própria concepção de educação e de prática
formadora.
Para a análise dos dados coletados nas entrevistas adotei a Análise Textual
Discursiva68. A desconstrução e unitarização do corpus (MORAES; GALLIAZI, 2007)

68
Conforme explicitado na Parte II.
113

possibilitaram-me apreender e expressar sentidos e significados69 a partir dos relatos dos


professores, advindos de suas experiências. Desse processo de intensa impregnação cheguei à
construção de três categorias: (i) Concepções de Ciência e a formação de professores de
Física para o século XXI, (ii) Currículo da licenciatura em Física e a Educação para o século
XXI e (iii) Modelo de professor de Física e de prática formadora para uma Educação neste
século.
Construo, portanto, essa trama, com a minha escuta e outros sentidos. Porém, não
a descrevo sozinha, pois trago os meus interlocutores em primeiro lugar e subo nos ombros de
gigantes em termos de suas experiências docentes para sustentar as minhas análises e
apreensões. O estudo se enriquece com as relações que estabeleço entre meu objeto e essas
dimensões da prática docente formadora, desvelando a complexidade do processo de
formação dos professores que envolve pessoas, e contempla intenções, saberes, valores,
interesses, políticas ideologias, cultura e concepções individualizadas e institucionalizadas.

Concepções de Ciência e a formação de professores de Física para o século XXI

Como discutido antes é consenso entre pesquisadores e educadores da área das


Ciências que existe uma concreta relação entre a concepção de Ciência e o processo de ensino
desenvolvido por professores em sala de aula. (MALDANER, 2003; ALMEIDA;
CARVALHO, 2009; CACHAPUZ, 1999; GONÇALVES, MARQUES, 2006; CARVALHO,
GIL PERREZ, 2011). Estes autores assinalam a importância das discussões em torno dos
conhecimentos relacionados às mudanças ocorridas nas Ciências ao longo da história, a
concepção da natureza da Ciência, o papel das teorias, a observação e a interpretação na
produção do conhecimento para o processo formativo. Concordo com esses autores e nesse
sentido entendo a relação entre a concepção da natureza da ciência com o processo de
formação dos professores.
Em que pese a concepção de Ciência dos professores-formadores de Física para a
educação no século XXI vale considerar que a análise que realizo em torno de suas
concepções na busca de compreender as bases teóricas, metodológicas e epistemológicas
usuais não se faz desvinculada da realidade social brasileira e do contexto das outras

69
A análise textual discursiva opera com significados construídos a partir de um conjunto de textos. Os materiais
textuais constituem significantes a que o analista precisa atribuir sentidos e significados. [...] propõe-se a
descrever e interpretar alguns dos sentidos que a leitura do conjunto de textos pode suscitar (MORAES,
GALIAZZI, 2007, p. 13)
114

sociedades que formam a aldeia global na qual a “solidariedade econômica e financeira” se


sobrepõe à “solidariedade humana”, por essa razão, dominante.
Tenho em conta que os povos estão unidos pelos bens naturais e pelo bem da natureza.
Contraditoriamente, os danos e as alterações no ambiente são alarmantes e fogem ao controle
dos ambientalistas e dos pesquisadores que se dedicam ao desenvolvimento de técnicas de
preservação da natureza. A humanidade corre riscos e convive com uma realidade mundial
ameaçadora do estado de paz e da continuidade da vida no planeta Terra. A perplexidade
diante dos progressos da Ciência nas três últimas décadas registra avanços inimagináveis no
campo da pesquisa científica, contudo, estão sendo apropriados pelas indústrias farmacêutica,
bélica, agrária, entre outras, numa escala sem controle. Um cenário que evolui a partir da
revolução industrial e se intensifica desde o final do século passado. Assim, ao tempo em que
os progressos da ciência promovem satisfação e conforto com os produtos da moderna
tecnologia, inspira imensa preocupação nos sensatos e dotados de humanidade, conscientes da
ilicitude dos desdobramentos que são dados às descobertas da ciência e da aplicação desses
conhecimentos na indústria, com consequências por vezes nocivas para a humanidade.
Recordo que nas sociedades industrializadas da aldeia global econômica o
controle e as leis que regem seu funcionamento são instituídos pelo mercado e, neste os “fins
justificam os meios”. Os interesses econômicos estão acima dos direitos humanos, pois
desconhecem qualquer código de ética quando se trata dos próprios interesses. O mundo que
recebemos após o evento dantesco da segunda guerra mundial parece ter despertado o lobo da
ganância e o vale tudo para demonstrar poder e força entre os países da Europa, América e do
Oriente disputando a hegemonia econômica e das armas no maior vale tudo já testemunhado
pela humanidade.
Desde a antiguidade, filósofos como Platão, Aristóteles e Pitágoras já
expressavam preocupação com a conservação dos bens naturais à disposição do homem.
Neste século XXI cientistas e filósofos permanecem unidos ao redor desse tema. A questão
prioritária do mundo modernizado hoje tem nome, qual seja, “gestão ambiental” com a
finalidade de preservar o planeta para o futuro da humanidade. Afinal, os recursos naturais
são finitos e muitas áreas da esfera global já deram mostras da extinção (CHASSOT, 2014;
CACAHAPUZ et al., 2005; DELIZOICOV; ANGOTTI, PERNAMBUCO, 2011;
MALDANER, 2003; SANTOS, 2010; BOFF, 2017; MORIN, 2013; SANTOMÉ et al., 1998;
CARVALHO; GIL PERREZ, 2011)
115

Nessa perspectiva, as questões ambientais devem constituir a prioridade das


Ciências, em especial, das Ciências Naturais. O cuidado com a “nossa nave mãe Terra” exige
o cultivo de valores, o despertar de sentimentos, a formação de atitudes éticas, políticas e
cidadãs. Tomando parte dessa responsabilidade para si, a educação ambiental tornou-se
disciplina obrigatória nos currículos das escolas e nos cursos de formação de professores.
Assinalo, pois, nessa discussão, a inclusão de componentes ou temas curriculares da área da
História e da Filosofia das Ciências, da Didática das Ciências, da Epistemologia do Ensino de
Ciências no curso de Licenciatura em Física do IFMA tendo em vista orientar a Educação em
Ciências e o ensino de Física na educação básica dos futuros cuidadores deste orbe.
Buscando apreender a concepção de Ciência dos professores-formadores no curso
de Licenciatura em Física para a educação do século XXI, perguntei aos sujeitos o que é
Ciência para cada um, e se eles consideram que a concepção de Ciência é fundamental para o
professor de Física desenvolver a educação/ensino neste século XXI. Em suas respostas
identifiquei significados variados, interpretados nas suas narrativas, os quais denotam
pressupostos teórico-metodológicos e epistemológicos, apontando para a natureza da Ciência
compreendida, preponderantemente, no âmbito de uma visão “neutra” de Ciência e de sujeito
do conhecimento, pautada na racionalidade da ciência moderna, conforme evidencio a seguir:
Entendo ‘ciência’ como... busca de novas ideias, novas descobertas,
novas teorias. Você experimentar essas teorias, você buscar
compreender melhor essas ideias, novos fenômenos, você testar e aí lá
na ponta, se possível aplicar. ... Na medida do possível, ciência é
criar base para que você depois possa trazer essas novas ideias para
a aplicação no nosso cotidiano. (CÉSAR LATTES Entrevista).

...Eu posso definir ciência como sendo o conjunto de conhecimentos


adquiridos pela humanidade via observação de fenômenos da
natureza e por meio dessa observação a experimentação e até mesmo
tentar reproduzir tais fenômenos, então o conjunto disso tudo eu
chamaria de ciência. (LUIS DAVIDOVICH, Entrevista).

Ciência é o todo... se o motivo é o conhecimento... Se eu venho das


ciências Física e Biológica é compreender os fenômenos físicos... e
que o ser humano tenha condições de aplicar esse conhecimento
principalmente para o bem da humanidade. (MOYSÉS
NUSSENZVEIG, Entrevista).

Ciência é algo que soma que engloba um monte de coisas... Ciência é


todo e qualquer tipo de conhecimento que visa certo fim, é descobrir
algo que vai dar numa aplicação ou que não deu uma aplicação... É
um conhecimento básico que 20, 50, 100 anos depois se descobre no
que esse conhecimento básico vai dar, no que resultaria. Por
116

exemplo, a gente vê os físicos fazendo muita coisa na área de


engenharia, umas coisas interessantes e outras nas quais eles fazem
muita tolice porque não entendem da parte de engenharia. Os
“aparelhos” não querem conectar, colaborar. Então ciência é algo
extremamente interdisciplinar. (JOSÉ LEITE, Entrevista).

Das respostas dos professores acerca da “concepção de Ciência” emergiram


conceitos que precisam ser revistos pelos aspectos vagos e sem sentido, principalmente
quando considerados sob a ótica da educação para o século XXI. Na fala dos sujeitos
entrevistados, a ciência é apresentada como “fonte de conhecimento”, corresponde às “novas
descobertas e criação de novas teorias”. Destacam a observação e a experimentação com a
intenção de reproduzir os fenômenos da natureza e definir as leis que regem os fenômenos
físicos, assim como a aplicação dos conhecimentos para diversos fins.
A Ciência, na sua condição de neutralidade é apontada pelos professores como
valioso recurso do ponto de vista da “aplicação dos conhecimentos que produz”. O professor
Moysés completa o seu pensamento ressaltando aplicar esse conhecimento principalmente
para o bem da humanidade. Parece que faltou aos professores compreensão em termos tanto
de um olhar inter quanto multidisciplinar do papel da ciência, possibilitando uma visão
ampliada e crítica em torno da aplicação do conhecimento científico especializado, isto é, das
diversas formas com que vem sendo empregado, no atual estágio das sociedades econômicas
e de consumo, assim como suas consequências de fato para a humanidade.
O distanciamento da visão dos professores acerca desse outro lado da ciência
denota real preocupação quando se trata de formar o professor para atuar como educador no
presente século. Próximo do que está se discutindo e para ilustrar o que digo bastaria lembrar
que em razão da aplicação dos conhecimentos da ciência destituídos de pressupostos humanos
e éticos, chefes de estados de nações do bloco hegemônico capitalista detêm o “botão de
controle” de armas nucleares, nos fazendo refém do medo do fantasma da guerra nuclear,
capaz de levar o planeta à devastação, causando catástrofes ecológicas em toda a extensão da
Terra. São exemplos do passado, os lançamentos das bombas atômicas sobre as duas cidades
japonesas na segunda guerra mundial.
Do mesmo modo que o conhecimento produzido beneficia a sociedade é usado
pelo sistema econômico monopolista na aplicação de programas e projetos de
“desenvolvimento econômico” que favorecem uma minoria, acumulando cada vez mais
riquezas em detrimento da maioria da população que sofre com o desemprego, com a
exclusão social e com outras mazelas sociais. O pensamento simplificador presente no olhar
117

dos professores pode estar impedindo a visão da totalidade social na qual a ciência aplica os
conhecimentos que produz revelando a ligação entre as duas partes: ciência e sociedade.
Compreendo a partir dessas considerações que as concepções de Ciência
expressas pelos sujeitos da pesquisa correspondem a um modelo disperso de racionalidade
técnica (CACHAPUZ, 1999; SHEID, PERISCH, KRAUSE, 2000; MORIN, 2005; NARDI,
CORTELA, 2015; DELIZOICOVI, ANGOTTI, PERNAMBUCO, 2011) que empresta aos
seus adeptos uma visão ou dogmática ou de nonsense de ciência, pelo fato de envolver
fragmentos de ideias sem articulação à guisa de demonstração do conhecimento com
objetivos absolutos de justificar verdades70 e aplicá-las de forma utilitarista.
Depreendo da manifestação dos sujeitos da pesquisa que no curso de Licenciatura
em Física do IFMA as experimentações parecem ocorrer preponderantemente de forma
reprodutivista, reforçando uma visão dogmática de Ciência como soe acontecer. Para
Gonçalves e Marques (2006) a experimentação pode contribuir para a aprendizagem do aluno
e formar uma nova visão de ciência, na medida em que esse procedimento não venha a ser
empregado com fins absolutos de explicar conceitos e confirmar as “verdades” da ciência. Do
contrário, a produção científica é considerada racional, sistemática, exata e verificável da
realidade, cuja origem remete aos procedimentos de verificação baseados na metodologia
científica (SHEID; PERISCH; KRAUSE, 2000)
No contexto das mudanças paradigmáticas advinda das comunidades científicas
acerca da construção do conhecimento, e sobre a relação que estabeleceu com a educação em
ciências, a posição de Cachapuz (1999) é a de que o modelo positivista de ciência está
esgotado, e para o ensino é fundamental avançar em direção a propostas inovadoras, buscar
um novo quadro conceitual com base em apropriações epistemológicas, marcadas pela Nova
Filosofia da Ciência. Ele nos diz que se “há que insistir num conhecimento que possa servir
para ser refletido, discutido, incorporado por cada um no seu saber, na sua experiência, na sua
vida.” (CACHAPUZ, 1999, p. 2)

70
A esse respeito, apresento contribuições por Maldaner (2003, p. 55) que diz: É a ciência vista como detentora
das verdades descobertas pelos cientistas e que precisam ser transmitidas aos alunos de forma a serem mais
digestas. Fazer as práticas demonstrativas [...], significa, dentro da visão empirista/indutivista, comprovar o
acerto das teorias ou pretender chegar a elas por meio de generalizações a partir de regularidades observadas.
Há, ainda, nessa postura [...] dos estudantes da licenciatura de química, uma clara rejeição ao que denominam
“ensino teórico” que vivenciaram em toda a sua formação anterior [...], na verdade eles rejeitam o modelo de
transmissão/recepção quando se referem ao ensino teórico, mas mantém a mesma ideia de conteúdos de
Química que devem ser transmitidos bem e assimilados pelos alunos. Não se referem a uma possível teorização
química sobre fatos e fenômenos, à luz da construção histórica nesse campo do conhecimento.
118

Na perspectiva de formar os docentes que atuarão na educação básica, está clara a


necessidade de uma concepção de Ciência adequada às ideias deste século. Encontro nas
proposições de Sheid; Perisch; Krause (2000), pressupostos essenciais de uma concepção de
ciências para este século XXI, a saber:
A implementação de uma adequada concepção sobre ciência, atualmente, encontra-
se alicerçada sobre três pilares essenciais, conforme determina o projeto Science for
All American (AAAS – Ciências para todos, 1993), que são: i) a ciência não pode
fornecer respostas para todas as perguntas; ii) a investigação científica apresenta
uma base lógica e empírica, porém não se pode esquecer que ela envolve a
imaginação e a criatividade; iii) é importante o reconhecimento dos aspectos social e
político que caracterizam a ciência. (SHEID; PERISCH; KRAUSE, 2000, p. 2)

Professores pesquisadores observam no cenário da educação básica e superior a


prática de docentes e formadores em apreciação a esse modelo de ensino: a prática da
experimentação. Valorizam a atividade experimental em sala de aula ou em laboratórios na
intenção de fundamentar a explicação de conceitos e validar verdades (GONÇALVES,
MARQUES, 2006; TOMAZ, 2000).
Segundo os investigadores desse tema a preocupação e risco que corre a atividade
de ensino com foco na experimentação, sem que se reflita as bases epistemológicas da
produção do conhecimento vem ser a de restringir o trabalho da ciência e do ensino/formação
a uma visão experimental e dogmática. A base do conhecimento possibilitada pela
epistemologia das ciências e da prática profissional pode auxiliar os professores a refletirem
sobre seus conceitos de Ciência, e a fundamentarem suas práticas de ensino e de formação
numa outra perspectiva, minimamente inovadora em busca de formar um professor
pesquisador que ensina ciências.
Como se pode observar, a concepção de Ciência nas expressões dos professores
entrevistados, sustentada em fragmentos positivistas71 de conhecimento através de noções

71
O positivismo é uma corrente filosófica de pensamento, tendo como maior representante Augusto Comte. Para
ele, o conhecimento só teria validade se obtido por meio do método das Ciências Naturais. O conhecimento
científico é, para Comte, baseado na observação dos fatos e nas relações entre fatos que são estabelecidas pelo
raciocínio. Essas relações excluem tentativas de descobrir a origem, ou uma causa subjacente aos fenômenos, e
são, na verdade, a descrição das leis que os regem. Segundo Comte: “Nossas pesquisas positivas devem
essencialmente reduzir-se, em todos os gêneros, à apreciação sistemática daquilo que é, renunciando a
descobrir sua primeira origem e seu destino final” (Discurso sobre o espírito positivo, 1ª parte, III). [...] O
conhecimento positivo, que estabelece as leis que regem os fenômenos de forma a refletir o modo como tais
leis operam na natureza, tem ainda, para Comte, duas características: é um conhecimento sempre certo, não se
admitindo conjecturas, e é um conhecimento que sempre tem algum grau de precisão, embora esse grau varie
de ciência para ciência, dependendo do seu objeto de estudo. Assim, Comte reforça a noção de que o
conhecimento científico é um conhecimento que não admite dúvidas e indeterminações, e o desvincula de todo
conhecimento especulativo. (ANDREY et al., 2014, p. 379-380). Para colaborar com esse tema trago Santos
(1999, p. 53) [...] a Ciência -organização positiva do saber- é o modelo ideal de todos os outros tipos de
119

tênues de observação e de experimentação científica cria a possibilidade de que fragmentos de


racionalidade técnica derivada dessa concepção, por sua vez, exerça influência fragmentária
como é usual na prática pedagógica do futuro docente quando inserido na escola. Desse modo
justifica-se a preocupação com a formação dos professores à luz dessa concepção
(CACHAPUZ, 1999; SHEID, PERISCH, KRAUSE, 2000; GONÇALVES, MARQUES,
2006).
O professor Roberto Salmeron declara sua concepção de Ciência, explorando a
dimensão do conhecimento na Ciência, mas acrescentando-lhe a natureza interdisciplinar.
Nesse sentido, afirma o seguinte:
Ciência é sinônimo de conhecimento. Se você tem conhecimento, você
tem ciência das coisas. Então, dentro do curso de Licenciatura em
Física o estudo das ciências é importante porque a Física tem
buscado dar ideia de interdisciplinaridade. Não é novidade quando
ela se mete na medicina, que ela se mete na construção civil, ela se
mete em atividades de cunho bélico, então, em todas as áreas a Física
está presente. Física vem do grego “fysiki” que significa estudo da
“physis” que é natureza. A gente tanto está na natureza como faz
parte dela... (ROBERTO SALMERON, Entrevista).

A concepção clássica de ‘ciência’, significando saber, conhecimento racional e


sistemático, está colocada de forma explícita pelo professor, como também o entendimento de
que não é qualquer conhecimento que possibilita ao sujeito a compreensão do mundo. Nesse
sentido se distancia da concepção apresentada pelos sujeitos que o antecederam na análise que
realizei sobre a concepção de ciências e a relação que estabelece com a prática formadora no
curso.
O professor Roberto manifesta em sua fala um elemento novo, qual seja, a
interdisciplinaridade, apresentando-a como algo a ser buscado através da Física no curso de
licenciatura. Conceitualmente falando, a busca da interdisciplinaridade representaria a busca
da totalidade, o conhecimento das coisas em suas variadas interfaces e dimensões, um ideal
pedagógico na prática formadora. Segundo Fazenda (1994, p. 23 grifo nosso) “a
interdisciplinaridade torna-se a grande responsável pelo movimento de redimensionamento

conhecimento. É apenas através dela, enquanto sistema de ideias, que defende ser possível completar a vasta
obra intelectual começada por Bacon, Descartes e Galileu. A exclusão de intervenções sobrenaturais, o repúdio
pela metafísica, a tentativa de substituição da Filosofia pela Ciência, o assumir do método científico como
normativo de todo saber, a valorização apenas de sua própria verdade – a verdade científica, a redução da
pluralidade de interpretações possíveis à sua própria interpretação, a base mecanicista e determinista do
conhecimento, são ideologias dominados pelo culto do cientismo.
120

teórico das ciências e pela revisão dos hábitos de pesquisa. Essa propugnaria novos
caminhos para a educação.”
A ideia apresentada nos termos colocados pelo professor está correta do ponto de
vista da integração da Física às outras áreas, como também o leque de possibilidades que se
abre com a adoção da prática da interdisciplinaridade, trazendo para a licenciatura
significativos avanços, sobretudo se essa visão for compartilhada pelo coletivo de professores
formadores, pelos alunos e pela coordenação do curso. Portanto, a superação de concepção de
mundo, de fenômenos, de fatos, do humano, de forma fragmentada, por uma visão de
totalidade, multifacetada, forjada por meio de projetos interdisciplinares.
Desse ponto de vista entendo ter sido da maior importância a releitura
interdisciplinar empreendida pelos docentes envolvidos com a reformulação do currículo da
licenciatura em Física sobre a proposta curricular do curso em construção, implicando um
olhar reflexivo, detendo-se na composição das disciplinas72, entendendo que, se organizada
mais por justaposição que por uma identidade formadora, com cargas horárias exaustivas e às
vezes pouco representativas do ponto de vista da profissionalidade docente, a proposta apenas
reproduziria o modelo atual, de natureza multidisciplinar, nos moldes tradicionais de
composição curricular.
Ao tempo em que me causou uma boa expectativa a possibilidade da prática
interdisciplinar no curso de licenciatura em Física, parece que a compreensão de
interdisciplinaridade tal como expressa pelo professor Roberto faltou o entendimento sobre o
que identifica a interdisciplinaridade como atividade docente. É necessário, esse entendimento
a fim de que venha se aplicar ao contexto curricular da licenciatura. Esta minha observação é

72
Fazenda (1993), esboça essa questão analisando as consequências de um currículo nos moldes tradicionais
explicando: “Sabemos, por exemplo, em termos de ensino, que os currículos organizados pelas disciplinas
tradicionais conduzem o aluno apenas a um acúmulo de informações que de pouco ou nada valerão na sua vida
profissional, principalmente porque o desenvolvimento tecnológico atual é de ordem tão variada que fica
impossível processar-se com a velocidade adequada a esperada sistematização que a escolar quer. Por outro
lado, a opção que tem sido adotada, da inclusão de novas disciplinas ao currículo tradicional, só faz
avolumarem-se as informações e atomizar mais o conhecimento. O currículo tradicional, que já traduzia um
conhecimento disciplinar, com esse acréscimo de disciplinas tende a um conhecimento cada vez mais
disciplinado, onde a regra principal seria somente um policiamento maior às fronteiras das disciplinas. O efeito
nada mais representaria que a punição aos que quisessem transpor essas barreiras (FAZENDA, 1993, p. 16-17
grifo nosso)”. Resgatando o contexto histórico da fragmentação curricular, que pode ser localizada em dois
pontos básicos estruturais da sociedade, a ciência com sua crise da especialidade na produção do conhecimento
e a economia com a divisão e especialização do trabalho, considero oportuno relembrar com Santomé (1998,
p.13) “A taylorização no âmbito educacional faz com que nem professor nem alunos possam participar dos
processos de reflexão crítica sobre a realidade. A educação institucionalizada parece ter-se reduzido
exclusivamente a tarefas de custódia das gerações mais jovens. As análises dos currículos ocultos evidenciam
que o que relamente se aprende nas salas de aula são habilidades relacionadas com a obediência e a submissão
à autoridade [...]”
121

feita com base na afirmação do professor, ao dizer: em todas as áreas a Física está presente. É
preciso ter em conta que a interdisciplinaridade não se reduz à presença ou aplicações da
Ciência Física a outros campos do conhecimento73, a concepção de interdisciplinaridade
suscita o diálogo com diversos campos do conhecimento, tendo em vista apreender o mais
completamente um objeto sob apreciação.
Mesmo que a prática interdisciplinar ainda não seja exercitada de forma coletiva
na licenciatura, não se pode duvidar que em alguns casos isolados de professores da
licenciatura estejam desenvolvendo um trabalho pedagógico forjado nessa concepção e que
tenham substituído a forma tradicional de planejamento e organização do trabalho pedagógico
(FAZENDA, 1994; LIBÂNEO, ALVES, 2012; MALDANER, 2003; PIMENTA, LIMA,
2012; DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011).
Os discursos e representações dos professores Marcelo Damy e Jayme Tiomno,
apresentados subsequentemente sobre a concepção de Ciência, na forma como a
compreendem, parece reproduzir o conceito moderno de Ciência. Além disso, acrescentam
alguns aspectos relacionados à Física, e à Ciência, importando considerar a seguir:
Ciência é a pesquisa sistemática, é a busca pelo conhecimento
científico, é a teoria colocada em prática. Um pesquisador que
pesquisa, faz, simula, faz as contas, investiga e a Física em geral tem
que ter a teoria casada com a prática. Em geral está lá a teoria e
vamos para o laboratório vê se de fato o que eu estou dizendo,
pesquisando, buscando, o que eu encontrei se consigo colocar no
laboratório. Em geral os físicos fazem isso. Tem o físico teórico que
só simula que faz as contas, mas tem também aquele que está no
laboratório buscando comprovar essas teorias levantadas pelos
físicos teóricos. Então ciência para mim é isso, é pesquisa
sistemática... A ciência tem que ser sistematizada, tem que ter os seus
dados, tem que ser anotada, tem que ser bem criteriosa, você tem que
fazer testes... A ciência precisa de comprovação por um método
sistemático. (MARCELLO DAMY, Entrevista).

73
“[...] o pensar interdisciplinar parte do princípio de que nenhuma forma de conhecimento é em si mesma
racional. Tenta, pois, o diálogo com outras formas de conhecimento, deixando-se interpretar por elas. Assim,
por exemplo, aceita o conhecimento válido, pois é através do cotidiano que damos sentido às nossas vidas.
Ampliado através do diálogo como o conhecimento científico, tende a uma discussão utópica e libertadora,
pois permite enriquecer nossa relação com o outro e com o mundo. [...] no projeto disciplinar não se ensina,
nem se aprende: vive-se, exerce-se (FAZENDA, 1993, p.17 grifo nosso)”.
122

A Ciência tem dois focos: a ciência no caso da Física vai estudar a


natureza, vai correr para explicar os princípios físicos que envolvem
vários fenômenos da natureza. Mas dentro da prática de ensino, na
educação básica, é preparar para a vida para que o aluno do ensino
médio ao terminar a educação básica seja capaz de entender os
fenômenos naturais, compreender os objetos que o cerca... A ciência
está por trás de certos relacionamentos, por exemplo, como funciona
um computador, quais os princípios físicos de uma instalação elétrica
de uma residência. O processo de preparo de alimentos que é uma
coisa aparentemente simples, mas que envolvem fenômenos de
termodinâmica. Então, como é que ele vai lidar com todas essas
coisas, esses eletrodomésticos, com todos esses sistemas que são
físicos e fazem parte do cotidiano? Você querendo ou não, você acaba
se envolvendo com esses conceitos que à primeira vista não consegue
compreender (JAYME TIOMNO, Entrevista).

Os relatos dos professores citados apontam para uma concepção de ‘Ciência’


assentada no modelo da racionalidade, que teve suas raízes na revolução científica do século
XVI, prolongada até o século XIX, quando uma nova racionalidade, a científica, ocupa o
cenário social e cultural da Ciência (SANTOS, 2010). O professor Marcelo é ainda mais
enfático ao dizer que a ciência tem que ser sistematizada, tem que ter os seus dados, tem que
ser anotada, tem que ser bem criteriosa, você tem que fazer testes.... que a ciência precisa de
comprovação, de um método sistemático. Com efeito, expõe que bases teóricas e
epistemológicas (positivistas) fundamentam sua prática formadora em sala de aula, ainda
mantendo esses termos para a educação deste século74.
A base teórica empirista enfatiza que esse sujeito da pesquisa se sustenta na
objetividade e neutralidade da ciência, envolvendo observação dos fatos e fenômenos,
verificação de hipóteses para identificação/comprovação de suas leis. Analisando tal conduta
aplicada na prática docente formadora, apreende-se daí uma postura pedagógica reprodutivista
e cumulativo do conhecimento científico, cuja apreensão memorística pelos alunos terá prazo
de validade. Na condição de meros expectadores, correm o risco da desmotivação tão logo
passe o momento do encantamento com as etapas da atividade experimental. Na visão de

74
Uma prática formadora na contramão da educação para o século XXI, com a visão determinista e imutável das
coisas, pautada em conhecimentos, segundo a visão de Santos (2010) Um conhecimento baseado na
formulação de leis tem como pressuposto metateórico a ideia de ordem e de estabilidade do mundo, a ideia de
que o passado se repete no futuro. Segundo a mecânica newtoniana, o mundo da matéria é uma máquina cujas
operações se podem determinar exatamente por meio de leis físicas e matemáticas, um mundo estático e eterno
a flutuar num espaço vazio, um mundo que o racionalismo cartesiano torna cognoscível por via da sua
decomposição nos elementos que o constituem. Esta ideia do mundo-máquina, é de tal modo poderosa que se
vai transformar na grande hipótese universal da época moderna, o mecanicismo. (p. 30-31)
123

Cachapuz et al. (2005, p. 75) os estudantes executam tarefas sem saber para onde caminham e
que respostas hão de dar e a quê. Parece-lhes que os conhecimentos surgem claros, óbvios e
não precisam ser interrogados porque têm uma resposta que é “natural”.
No discurso do professor também encontramos que a Física em geral tem que ter
a teoria casada com a prática75. O professor Marcelo aponta para a relação da Física teórica
com a prática, no entanto, deixa escapar a visão dicotômica na aquisição do conhecimento,
travada no interior do processo da formação, ou seja, um professor cuida da teoria e o um
outro responsabiliza-se pela prática. O professor Jayme, com outra orientação a esse respeito,
explicita a relação teoria prática dizendo que dentro da prática de ensino na educação básica
tem-se que preparar para a vida... compreender os objetos que nos cercam. Mas também
reduz essa preparação para a vida relacionando os conhecimentos da Ciência, por exemplo,
para entender o funcionamento das coisas.
Os sujeitos em questão, ao mesmo tempo em que destacam a necessária relação
teoria e prática no trabalho pedagógico da formação, deixam claro que as bases teóricas e
metodológicas que sustentam suas percepções são de natureza conservadora e reduzem a
prática à atividade simplificadora na compreensão do fenômeno, do real. Ao conceberem a
Ciência como único conhecimento científico válido, as demais ciências tendem a cair na
obscuridade. De outro lado, à medida que deixam de abordar na interconexão teoria e prática,
questões históricas, políticas, sociais, educacionais, ambientais e éticas, constato a
necessidade da superação dos pressupostos positivistas, na perspectiva da práxis docente76
formadora e transformadora do real.
A superação da visão simplificadora do real por uma visão complexa dos
fenômenos naturais, sociais e educacionais, vai exigir dos professores formadores uma
mudança da crença epistemológica positivista e pragmática da ciência por uma visão de
complexidade/totalidade sobre os gravíssimos problemas que envolvem os cidadãos e a
sociedade.

75
A sinalização do professor sobre o entendimento acerca da relação teoria e prática chama a atenção para a
adequada postura pedagógica no processo da formação, o que faltou compreender é que a educação no estágio
atual da sociedade exige que se pense sobre ela para transformá-la. Teoria e prática têm um papel bem definido
no processo. Vásquez (1977, p.207) nos traz o seguinte esclarecimento: “...se a teoria não muda o mundo, só
pode contribuir para transformá-lo exatamente como teoria. Ou seja, a condição de possibilidade – necessária,
embora insuficiente – para transitar conscientemente da teoria à prática e, portanto, para que a primeira cumpra
uma função prática, é que seja propriamente uma atividade teórica – na qual os ingredientes cognoscitivos e
teleológicos sejam intimamente vinculados e mutuamente considerados.
76
A esse respeito Vásquez (1997.p. 207) diz que: Entre a teoria e a atividade prática transformadora se insere um
trabalho de educação das consciências, de organização dos meios materiais e planos concretos de ação; tudo
isso como passagem indispensável para desenvolver ações reais, efetivas.
124

Outros dois professores, sujeitos da pesquisa manifestaram-se sobre o que é


Ciência. Ao expor o seu entendimento o professor Sergio Mascarenhas faz menção a essa
temática, mas não chega a desenvolver um pensamento explicitamente definido,
proporcionalmente ao que manifesta a professora Maria Isaura. Na sequência faço o recorte
do que expressaram esses dois sujeitos, assim:
Ciência é uma coisa que você pode transformar ideias, não só você
manipular, mas converter algo, uma matéria prima ou trabalhar em
cima de uma pesquisa. Ciência significa transformação. É algo que
você pode estar transformando a cada dia. Eu posso fazer ciência não
só estando dentro de um laboratório. Eu posso fazer ciência em uma
sala de aula com o meu aluno. Esse aluno junto comigo, ele é a
matéria-prima que eu tenho. É um processo evolutivo a
transformação do meu aluno... Agora fazer ciência em forma de
pesquisa, em forma de artigo é academicismo, é produtivismo e hoje
os órgãos de fomento te levam a ser uma pessoa produtivista. Você só
pode fazer ciência se você estiver dentro de um grupo de pesquisa, se
você produzir artigo. (SÉRGIO MASCARENHAS, Entrevista).

Eu compreendo a ciência como um conjunto de conhecimentos,


princípios, pressupostos elaborados no campo de determinada área
produzidos historicamente e que se consolidam como ciência porque
eles são validados socialmente. Então não é aquela Ciência que é
produzida, elaborada por aquele cientista, independente, por
exemplo, do contexto social em que ela é produzida. Eu penso que
toda ciência é elaborada para responder determinadas questões
sociais, determinada necessidade e as ciências ao serem reproduzidas
são perpassadas por ideologia, por valores, pela necessidade do
contexto. Então não existe ciência neutra, não existe ciência pura e
nem existe ciência/ conhecimentos que sejam eternos, eles são
dinâmicos, porque como a sociedade é dinâmica, como as
necessidades sociais são dinâmicas, a ciência é reelaborada,
ressignificada para responder a essas necessidades. Esse processo de
elaboração não se dá de forma tranquila, existem as correlações de
forças para que determinadas concepções de ciência, pressupostos,
sejam validados ou não. (MARIA ISAURA, Entrevista).

Na direção apontada pelo professor, apreende-se a Ciência como movimento de


transformação, seja de ideias, seja de coisas materiais, supostamente de bens para uso e
consumo. Uma visão pragmática, utilitarista, que se distancia da ideia de transformação que
venho defendendo desde o início desta investigação, relacionando-a à expectativa que a
sociedade do século XXI teria da Ciência, a contribuição do conhecimento para a
transformação das desigualdades sociais, provocadas pela distribuição injusta de uma riqueza
produzida socialmente e apropriada por bem poucos, os donos dos meios de produção. Na
125

visão de Maldaner (2003) o progresso alcançado pela ciência tem resposta para os problemas
sociais, pois a atividade científica não acontece isolada da sociedade, ela é uma prática social
como a educação e está orientada para garantir a manutenção da vida e da sociedade.
Maldaner (2003, p. 114) explana o seguinte:

[...] É esta compreensão do papel da ciência na sociedade que queremos seja


trabalhada por todos os educadores para dar uma chance de mudança nas estruturas
sociais que impedem que os benefícios da ciência e da técnica cheguem às
populações que necessitam deles. Permanecendo no senso comum ingênuo, não
refletido, no obscurantismo científico ou mesmo na militância por uma ciência
neutra, ela estará sempre mais a serviço dos poderosos e dos ricos, perpetuando as
injustiças por mecanismos científicos de controle que ela mesma produz.

Estando a serviço de projetos econômicos cumulativos como um conglomerado


industrial, por exemplo, os grupos empresariais continuarão se apropriando do progresso das
ciências resultante das pesquisas, muitas vezes patrocinadas pelo próprio grande capital, e
deixando de reverter os benefícios dos conhecimentos produzidos à população excluída e
marginalizada de nossa sociedade e do resto do mundo na proporção que é esperado.
De outro lado, a ideia de transformação, solução para as questões sociais está
oculta no que falou a professora Maria Isaura, expressando sua concepção de Ciência, como
um conjunto de conhecimentos produzidos historicamente e articuladamente à sociedade em
dado momento, ao dizer que independente do contexto social em que ela é produzida, eu
penso que toda a ciência é elaborada para responder a determinadas questões sociais. Dessa
forma, a professora aponta para o perfil de profissional docente e de ensino de ciência
consoante com o contexto atual de nossa sociedade, de natureza contrária à racionalidade
técnica, mas convergindo para a epistemologia da prática (MALDANER, 2003;
CACHAPUZ, 1999). A professora explicita uma acepção mais ampla do papel da Ciência
consideradas as apreensões anteriores dos outros sujeitos analisados até o momento.
Complementaria com a visão de Morin (2005, p. 11 grifo nosso), “uma ciência empírica
privada de reflexão e uma filosofia puramente especulativa são insuficientes, consciência
sem ciência e ciência sem consciência são radicalmente mutiladas e mutilantes.”

A professora Maria Isaura suscita outra importante discussão no contexto da


Ciência, onde vai tratar da neutralidade científica, afirmando que: não existe ciência neutra,
não existe ciência pura e nem existe ciência/conhecimentos que sejam eternos. Justificando
com criticidade o processo de construção e aplicação do conhecimento, frequentemente
ocorrido sob influências internas do pesquisador e externas do meio em que é e para que é
126

produzido, dá um passo mais à frente no seu raciocínio acerca do processo de construção do


conhecimento, conforme se pode observar no trecho seguinte de sua fala: ...as necessidades
sociais são dinâmicas, a ciência é reelaborada, ressignificada para responder a essas
necessidades. Esse processo de elaboração não se dá de forma tranquila, existem as
correlações de forças para que determinadas concepções de ciência, pressupostos, sejam
validados ou não. Reforça, portanto, a questão da ausência da neutralidade científica e de
certo modo anuncia o atrelamento da produção do conhecimento a serviço de interesses para
além das necessidades sociais. Em certa medida, explicita aproxima o seu pensamento das
discussões teóricas de pesquisadores no campo das Ciências e da Educação, que caracterizam
a produção científica com tais condições que cercam o conhecimento produzido
(CACHAPUZ, 1999; MALDANER, 2003; CHASSOT, 2004; MORRIN, 2005;
CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011).

Nesta categoria, concepções de Ciência expressas pelos professores da


licenciatura em Física percebi que poderia ir mais além e considerei fundamental
compreender de que maneira a concepção que apresentavam se manifestava na prática
docente formadora e me lancei em busca desses sentidos e significados.
Desse modo, os sujeitos da pesquisa ao se manifestarem sobre a importância de
uma concepção de Ciência na formação de professores para o século XXI resgatam o sentido
que trazem consigo e o contextualiza conforme esse entendimento, deixando sobressair alguns
aspectos aos quais atribui relevância, haja vista a ênfase conferida por eles no ato da
entrevista. Destaco os aspectos que sobressaem de suas representações nos relatos a seguir:
Eu acho que não tem como a gente desenvolver uma nação se a gente
não pesquisa, se não houver interesse por parte dos pesquisadores
para começar a descobrir as coisas e fazer com que as coisas
funcionem. Tem que haver essa concepção. Então eu acho que tem
que haver esse esforço dos pesquisadores para a coisa ir em frente.
(LUÍS ROBERTO, Entrevista).

Por conta do desenvolvimento tecnológico nós precisamos ensinar ao


aluno de uma forma muito mais dinâmica visto a gama de
informação, visto a gama de equipamentos, e atualmente o aluno e até
mesmo a comunidade com a qual esse profissional uma vez formado
pelo IFMA estará em contato. Então eu acho que precisamos ser um
pouco mais objetivos e mostrar uma aplicação direta desses
conhecimentos com essa nova tecnologia (LUÍS DAVIDOVICH,
Entrevista).
127

No relato dos professores acima e de outros que não trago neste espaço, todos os
professores entrevistados concordaram ser da maior importância uma concepção de Ciência
para formar o professor de Física para atuar no presente século. Em se tratando do que é
importante na formação dos futuros professores para o século XXI, os dois interlocutores
acima destacam na sua visão de Ciência os aspectos seguintes: (i) a pesquisa, na percepção do
professor Luís Roberto e (ii) o conhecimento científico associado à tecnologia, com suas
infinitas utilidades, na ótica do professor Luis Davidovich. Partindo do pressuposto que a
educação e o ensino de Ciências na atualidade exigem do professor habilidades e competência
para além da pesquisa e do domínio das tecnologias, ou seja, uma visão crítica e totalizadora
dos problemas socias e ambientais presentes na realidade, evidencia-se mais uma vez o
distanciamento das duas visões para a docência e a educação no século XXI.
No meu modo de ver, quando os professores descrevem o que é ciência77 e a
partir da visão que possuem, a importância que atribuem na formação dos professores
reproduzem as mesmas bases epistemológicas do positivismo empirista-indutivista. Entendo,
pois, que o modelo positivista de ciência marca profundamente a visão dos professores
formadores nesta questão.
Segundo Maldaner (2003, p. 97 grifo nosso) “a visão epistemológica afeta a
nossa atividade em sala de aula”. Sinto-me provocada mediante o que foi manifestado pelos
sujeitos a fazer um convite aos professores que partilham desse modo de pensar a Ciência na
formação, para que reflitam sobre a necessidade de rever conceitos formados, opções teóricas
e orientações epistemológicas assumidas em suas práticas formadoras.
Considero importante retomar o relato do prof. Luis Davidovich apontando para
uso das tecnologias da informação e a fala de Luis Roberto sobre a pesquisa científica, para
esclarecer que reconheço a importância e o lugar de ambos os aspectos no processo da
formação de professores de Física, para este século, contudo, vale considerar outros fatores
relacionados com uso absolutos.
Com respeito à ênfase dada ao desenvolvimento tecnológico e à pesquisa me
parece suscitar intencionalidade de emprego absoluto na formação, descuidando de mencionar
as relações e implicações sociais que envolvem a produção, a comercialização no contexto

77
A questão “o que é a ciência” é a única que ainda não tem nenhuma resposta científica. É por isso que mais do
que nunca, se impõe a necessidade do autoconhecimento científico, que deve fazer parte de toda política da
ciência, como da disciplina mental do cientista. (MORIN, 2005, p.21).
128

das sociedades capitalistas e o uso das modernas tecnologias no ensino. A esse respeito
Maldaner (2003, p. 100) nos adverte da seguinte forma:
[...] Até aqui a ciência, por meio dos produtos tecnológicos, vem concentrando as
riquezas e o poder junto a indivíduos e certos países, gerando desequilíbrios
políticos, econômicos, sociais e ambientais. Novas argumentações precisam ser
produzidas em torno da produção da ciência para que ela passe a ser vista como um
bem cultural, uma conquista da humanidade, que deve ser bom para todos.

Não refuto a importância da pesquisa científica e o domínio das tecnologias para


a vida dos cidadãos e cidadãs do século XXI, consequentemente, na formação de professores.
A contribuição dos recursos tecnológicos para a organização e o processo do ensino, o uso da
internet, dos bancos de dados e portais de periódicos, para a pesquisa e tantos outros
benefícios, são ferramentas imprescindíveis na educação para a contemporaneidade, porém, é
preocupante quando se mostra como paradigma dominante.
Trago a contribuição de duas outras pesquisadoras do assunto, recomendando a
reflexão sobre o que consideram essa questão das tecnologias para a educação em contextos
variados. Peixoto; Araújo (2012) se manifestam assim:
Os discursos sobre a dimensão didático-pedagógica do computador tendem a
apresentar uma versão mais “otimista”, destacando os seus benefícios ou a
possibilidade da apropriação deste recurso tecnológico para a melhoria da qualidade
dos processos de ensinar e de aprender, segundo os textos que tratam da dimensão
político-pedagógica que apresentam uma maior diversidade de abordagens. Pode-se
observar a presença de textos que indicam a implantação de um modelo democrático
ou popular de comunicação mediada pelo computador (baseados especialmente em
Freire e Lévy), mas também aqueles que denunciam o processo de massificação e
consequente isolamento humano e cultural decorrentes da instalação de uma
sociedade tecnológica e tecnocrática (e, por conseguinte, da educação) que
massifica, oprime e acentua as diferenças sociais (baseados em estudos de Barreto,
Belloni, Castells, por exemplo). Por um lado, há estudos que afirmam a
possibilidade de instauração de uma sociedade em rede que transcenda os limites do
discurso moderno (baseados em Morin, por exemplo) e, por outro, há uma denúncia
dos vínculos entre os projetos educacionais de implantação da informática na
educação, de educação à distância e de formação de professores, e os condicionantes
econômicos impostos pelos organismos internacionais de financiamento, tendo
como base os princípios de uma economia neoliberal. (PEIXOTO; ARAÚJO, 2012,
p. 260-261)

Penso que os professores assumem posturas positivistas, empiristas e pragmáticas


com os seus posicionamentos. Muito embora as questões apontadas por eles sejam de fato
relevantes no processo da formação, não posso deixar de ressaltar a percepção reducionista
com que são abordadas, pois, é como se os professores desconsiderassem outras dimensões
implícitas à formação, ou seja, as dimensões pedagógicas, didáticas, políticas e éticas.
Insisto, pois, na necessidade de revisão das bases e orientações epistemológicas
adotadas pelos professores que manifestam essa crença sobre a qual apoiam o seu saber e
129

fazer docente (MALDANER, 2003; CACHAPUZ et al., 2005; DELIZOICOV, ANGOTTI,


PERNAMBUCO, 2011) de modo a assumir uma orientação epistemológica de natureza
crítica, emancipatória e ética, na formação de professores, consoantes com este século.
O professor Constantino Tsallis enriquece esta discussão ao admitir a importância
da Ciência na formação, mobiliza e potencializa alguns temas curriculares como fundamentais
para a formação do professor. Penso que Constantino já tem construído o alicerce
epistemológico de uma educação libertadora, emancipadora. Para um formador de professores
a postura adotada por este professor, na minha visão, significa um salto de qualidade para o
trabalho pedagógico a ser realizado no contexto da formação. Afinal, os futuros professores
de algum modo assimilam a conduta de seus formadores. Sobre a proposta de inserção da
História da Física no currículo eu tenho assinalado nesse sentido a História da Ciência.
Constantino consegue sintetizar outros aspectos relevantes dessa interface ciência-formação
de professores para este século XXI, conforme põe a seguir:
...Para a gente trabalhar no presente prevendo o futuro é importante
a gente conhecer o passado também. Então, por exemplo, algo que eu
vejo que nós temos que trabalhar muito na questão da Física é a
história. Muitos não se preocupam em falar da história da
cientificidade e tudo que norteou a ciência. Já vai ali direto para
aquele imediatismo, às vezes já vai direto para o resultado, com as
equações. Hoje eu acho que o papel da ciência é imprescindível,
principalmente, para mostrar o verdadeiro valor da ciência, do
conhecimento científico não só para a formação da pessoa, mas como
também na formação do professor, para ele ter esse entendimento que
a ciência faz parte da vida. E que isso é importante, por exemplo, a
ciência tem um papel, e hoje isso está mais claro, de mostrar mesmo o
sentido das coisas, das coisas que são criadas, que são estudadas, que
nada disso foi feito por fazer. Por exemplo, as pessoas falam por aí
que tem muitas “gias”, mas isso aí é importantíssimo para a
formação (CONSTANTINO TSALLIS, Entrevista).

A Importância da História da Física, é para o prof. Constantino aspecto fundante


na formação do professor. Ressalta a necessidade do conhecimento em sua origem, como
ponto de partida da constituição da ciência, assim como para compreender melhor a sua
evolução no presente. Disse o professor: Para a gente trabalhar no presente prevendo o
futuro é importante a gente conhecer o passado também. A valorização da história da
Ciência/conhecimento, como quer o professor Constantino que esteja presente no currículo da
licenciatura em Física, equivale ao que Andery et al. (2014), Chassot (2004) e Santos (1999)
consideram para a História da Ciência.
130

Julgando oportuno trago o olhar de Carvalho e Gil-Pérez (2011, p. 48) a respeito


das questões acima, explicando o seguinte:
[...] Convém também ter presente, em todo o planejamento das atividades, o papel
que pode desempenhar a história das Ciências, não só para contextualizar os
conhecimentos científicos e mostrar sua evolução e as interações
Ciência/Tecnologia/Sociedade[..] mas, fundamentalmente, para tornar possível uma
compreensão profunda da matéria estudada e da própria natureza da Ciência.

Ao destacar o papel da Ciência no contexto da formação reconheço um certo


avanço na visão do professor quando conecta a Ciência com a vida ao dizer que: ... não só
para a formação da pessoa, mas também na formação do professor, para ele ter esse
entendimento que a ciência faz parte da vida.
Me utilizo das reflexões de Morin (2017) para ratificar a lógica que subjaz o
pensamento do professor Constantino, que entende ter a ciência parte com a vida e portanto,
desconectá-la da dinâmica do universo implicaria a impossibilidade de compreender o mundo
em que a humanidade e a natureza convivem, assim o autor afirma que:
Trazemos, dentro de nós, o mundo físico, o mundo químico, o mundo vivo, e, ao
mesmo tempo, deles estamos separados por nosso pensamento, nossa consciência,
nossa cultura. Assim, Cosmologia, Ciências da Terra, Biologia, Ecologia permitem
situar a dupla condição humana: natural e metanatural. Conhecer o humano não é
separá-lo do Universo, mas situá-lo nele. Todo conhecimento, para ser pertinente,
deve contextualizar seu objeto. “Quem somos nós?”. É inseparável de “Onde
estamos, de onde viemos, para onde vamos?” Conhecemos hoje nosso duplo
enraizamento: no cosmo físico e na esfera viva. (MORIN, 2017, p. 37)

Destaco, por fim, na fala do professor Constantino o seu entendimento acerca da


importância das disciplinas pedagógicas, classificando-as como base teórica importante na
formação dos futuros professores. O sentido que apreendo na expressão do professor remete à
noção de que a parte pedagógica do currículo da licenciatura em Física é imprescindível à
preparação adequada ao exercício da docência. Neste quesito, me ocorre ainda que o professor
critica a visão depreciativa que algumas pessoas imputam às disciplinas da área da Educação,
pois a competência pedagógica é condição intrínseca e totalizadora de um processo de
formação de professores, devendo ser, portanto, a meu ver, valorizada pelo coletivo dos
formadores. (NARDI, CORTELA, 2015; LIBÂNEO; ALVES, 2012; PIMENTA;
ANASTASIOU, 2014; DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011; GHEDIN;
ALMEIDA; LEITE, 2008).
Foi possível perceber com a professora Maria Isaura que há entendimento de que
todo professor ao realizar sua prática está sempre embasado numa concepção de ciência. Isto
no meu entendimento se alinha à compreensão de Ciência necessária à educação para o século
XXI. A professora manifesta-se assim:
131

...Todo professor, quando ensina está embasado numa concepção de


ciência. No curso de Licenciatura em Física, as disciplinas
específicas e as disciplinas pedagógicas que têm como horizonte a
formação do professor de Física, essa concepção de ciência é de uma
forma ou de outra o que vai dar esteio, vai dar sustentação à prática
que se realiza. Às vezes a gente não tem muita consciência disso, mas
não existe nenhuma prática que se dê fora de uma concepção de
ciência, ou seja, dessa base epistemológica dos conhecimentos. Ela
tem assim uma importância fundamental no momento de você decidir
a organização metodológica... O que é ciência para mim é que vai de
certa forma dar um norte de tudo que eu vou realizar como professor.
De qualquer forma, seja para o século XXI o ensino serve para
moldar as pessoas para atuar neste século carregado de
contradições... Tem uma concepção de ciência, e para essa até a
própria concepção de ciência positivista perde se nós estamos
pensando a formação do professor para o século XXI, numa
concepção crítica emancipatória. É lógico que nós temos que assumir
outra concepção tendo uma prática libertadora (MARIA ISAURA,
Entrevista).

Maria Isaura se coloca inicialmente admitindo não haver dúvida quanto a uma
concepção de ciência, base epistemológica de toda prática docente formadora, e explica: Às
vezes a gente não tem muita consciência disso, mas não existe nenhuma prática que se dê
fora de uma concepção de ciência, ou seja, dessa base epistemológica. No contraponto ainda
destaca a importância que tem a base epistemológica para a organização metodológica do
trabalho da formação dos professores, o que implica dizer que o trabalho pedagógico da
formação depende dessas bases e estas, dos professores formadores.
Para essa discussão epistemológica é válido considerar que a visão de Ciência de
cada professor agrega algo de si, seus valores, conhecimentos, experiência que são
transferidos para a prática docente. Entendo o ponto de vista da profa. Isaura que uma certa
incapacidade de percepção pelo professor acerca do que ele faz, porque faz e como faz,
suceda da naturalização da ação docente e do fato de não ser comum o hábito da reflexão
sobre a própria prática docente. Nisto resulta práticas de ensino isoladas, descompassos
teóricos-metodológicos no trabalho da formação, orientações epistemológicas
individualizadas, comprometendo a unidade da formação no curso. Esse aspecto foi bem
marcado pela professora supracitada. Vimos com Maldaner (2000), Cachapuz (2005), Morin
(2005), a importância do espaço coletivo de professores como possibilidade para discussão
sobre as questões relacionadas com a prática formadora e suas bases teóricas e
epistemológicas no trabalho da formação, os problemas pedagógicos enfrentados na prática, a
superação do isolamento do trabalho docente, a socialização das experiências e troca de
132

saberes de modo a superar práticas docentes alicerçadas em paradigmas marcados pela


racionalidade técnica, por exemplo.
Entendo com Cachapuz et al. (2005), Maldaner (2003), Andery et al. (2014) e
Morin (2017) a urgência na superação do modelo cientifista, contraposto por um projeto de
educação científica, numa perspectiva crítica, reflexiva emancipatória que integre a dimensão
humana, social e ambiental. Isto implica um modelo que possa contribuir para as
transformações que se esperam na sociedade tais como, por exemplo: a redução das
desigualdades, mais justiça com os segmentos humanos desfavorecidos economicamente, o
respeito às diferenças, a solução para o problema da fome, o fim das agressões ao meio
ambiente, a falta de ética na ciência, na política.
Conforme dito em outro momento, a Educação em Ciência é uma prática social e
o ensino da Física o integra. Assim, há de se (re) pensar e realizar um projeto de formação de
professores de Física, assentado em bases epistemológicas críticas e reflexivas, incidindo
sobre a prática social mais ampla, partindo do contexto para a ação profissional e ao contexto
retornando de forma interventiva e reparadora das contradições como sugere a profa. Isaura.
Enfim, uma proposta curricular focada nessas e em outras questões da prática social
formadora como também da prática dos professores formadores para a educação do século
XXI.

Currículo da licenciatura em Física e a Educação para o século XXI


Com a aprovação da LDBEN 9394/96 a educação brasileira passa a ter um novo
marco legal seguido da elaboração de instrumentos regulatórios complementares à lei. Nesse
contexto, a primeira legislação produzida cuidou das reformas curriculares, direcionadas para
os cursos de nível médio, técnico e de formação de professores, orientadas pelo modelo de
competências78. Tal forma de estruturação dos currículos marcou fortemente a organização

78
De acordo com Ramos (2001) As reformas curriculares... visam re-orientar a prática pedagógica organizada em
torno da transmissão de conteúdos disciplinares para uma prática voltada para a construção de competências
(p. 125-126). A autora na obra em referência prioriza a discussão de competência com foco na educação
profissional e média, não obstante, reúne um rico referencial teórico sobre o tema, nos primeiros capítulos,
concorrendo para um expressivo aprofundamento sobre a categoria competência, cuja discussão é ampla, de
natureza complexa e interdisciplinar. No Brasil, a integração da noção de competência à reforma educacional
inicia –se legalmente com a aprovação da Lei nº 9.9394, de 20 de dezembro de 1996, nova Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB). A Formação de Professores na mesma época esteve orientada pelo
modelo de competências Resolução CNE/CP 01/2002. O paradigma das competências profissionais gerou
muitas polêmicas à época, não está de todo erradicado na educação, o próprio PPC do curso de Física do IFMA
regula-se por esse modelo, procurando avançar com seus pressupostos. Na atualidade, os cursos de licenciatura
133

das licenciaturas em geral. Mais recentemente, a LDB e outras instruções legais que
remontam à época, têm sido alvo de alterações, reflexo das mudanças céleres que ocorrem na
estrutura política, econômica, e produtiva da nossa sociedade. A área do currículo nunca foi
tão visada pela elite governante. Com características de autoritarismo, abuso de poder e
patrulhamento cultural, leis são alteradas e pareceres e decretos são baixados, sem consulta ou
participação dos segmentos da Educação.
Contraditoriamente, nesse cenário de mudanças nas últimas décadas, o debate
sobre o currículo incidiu sobre a democratização dos saberes. Paradoxalmente, os professores
permaneceram quase sempre à margem das decisões e de uma discussão na qual deveriam ser
os primeiros e os últimos a se manifestarem, haja vista tratar-se das reformas educacionais,
território de domínio teórico-prático da ação educativa dos docentes, independentemente da
natureza de suas concepções. No entanto, os debates geralmente são monopolizados por
consultores contratados pelo alto clero da gestão educacional do país e, nas audiências
públicas são raras as oportunidades de manifestação reservadas aos professores. A experiência
tem mostrado que pouco ou nada do que é proposto pela classe é acatado, cabendo à ‘suprema
corte’ do Conselho Nacional de Educação – CNE -, a palavra final nos Pareceres e
Resoluções que traduzem as Diretrizes Nacionais para a Educação no País.
O desterramento da educação e dos docentes das discussões das reformas
educacionais na prática refletem as dicotomias entre a teoria e a prática, as proposições
ideológicas nos projetos curriculares dos cursos da educação básica e superior, entre outros
eventos com feição colonialista, cada vez mais recorrentes. Usando essa metáfora, Arroyo
(2011) interpreta esse dado da realidade educacional, conforme a enxergo no momento
presente:
As políticas neoliberais, sua ênfase no treinamento e no domínio de competências e
nas avaliações e classificações de alunos e mestres por domínios de resultados
voltam a expatriar a educação dos seus territórios, as escolas, os currículos e a
docência. Nossas bandeiras de luta, desde os anos de 1980, a educação como direito
sai do discurso. Os termos direito, educação (quando ainda se usam) são reduzidos a
termos como domínio de competências ou mostram quantificação dos resultados.
Docência é reduzida a treinar nesses domínios. (ARROYO, 2011, p. 25)

do IFMA passam por uma reformulação e suas propostas curriculares estão sendo orientadas pela Resolução
CNE/CP 02/2015.
134

Com esses comentários ansiei antecipar a remissão dos professores-formadores do


curso de Física por suas representações e noções acerca do currículo da licenciatura que serão
discutidos adiante. Excluídos ou isolando-se do debate sobre a Educação, sobre o currículo de
formação e sobre o ensino de Ciências, resulta o distanciamento do professor mais ainda da
realidade social e educacional e de suas histórias de relações e determinações, colaborando
inconscientemente para a reprodução das desigualdades e injustiças sociais, temas que são
emergentes das sociedades na atualidade, não podendo estar ausentes da discussão no
currículo escolar, consequentemente da formação de professores.
Nesta categoria onde emerge a questão curricular e a educação para o século XXI,
contudo, percebi na maioria das respostas dadas pelos sujeitos desta pesquisa, representações
desconectadas das questões políticas, éticas, econômicas, ambientais, e ainda por cima,
impregnadas de um racionalismo técnico-científico remontando ao modo dominante da
ciência industrial (GIROUX, 1997; SANTOS, 1999; CONTRERAS, 2002; CARVALHO;
GIL-PÉREZ, 2011; IMBERNON, 2011; IMBERNON et al., 2011; CARVALHO;
CARVALHO, 2012; NARDI; CORTELA, 2015;).
No mundo global onde vivemos, tudo está conectado e relacionado, as fronteiras
foram rompidas pela virtualidade, um mundo onde estão consolidadas relações de
interdependência entre as suas mais diversas dimensões como por exemplo: financeiras,
culturais, políticas ambientais, científicas... cuja compreensão só é possível na conexão com
as demais. Consequentemente, tudo o que alunos e alunas aprendem mediante um modelo de
ensino e aprendizagem específico é determinado por variáveis sociais, políticas e culturais
que interagem em um determinado espaço geográfico e em um particular momento histórico
Santomé (1998, p. 29). Por essa razão é urgente a revisão crítica dos currículos acadêmicos e
escolares com a participação direta dos professores a fim de garantir as renovações dos
conhecimentos, articulados com a dimensão social; a superação de modelos conservadores e
uma aprendizagem que prepare cidadãos e cidadãs emancipados intelectualmente.
Ao serem abordados sobre como concebem a formação de professores de Física
tomando como referência o currículo atual do curso de licenciatura do IFMA, as respostas
dos professores entrevistados enquadram-se dentro de concepções de bases tradicionais
formadoras, outras oscilaram entre um certo ceticismo quanto a eficácia do curso e de outro
lado, um otimismo pedagógico ao considerarem o momento presente da reforma curricular do
curso de licenciatura. Outro aspecto evidenciado dá conta de que as reflexões dos sujeitos em
sua maioria se restringe à matriz curricular do curso, portanto uma visão que limita suas
135

análises acerca do processo da formação ao desconsiderarem os pressupostos teórico-


metodológicos e epistemológicos presentes na base do projeto pedagógico do curso de Física,
se configurando em uma visão um tanto reducionista sobre o currículo da licenciatura.

A respeito do currículo do curso de Física em correspondência com a educação


neste século XXI as críticas vieram da parte de todos os sujeitos entrevistados, com
proporções da mais contundente à mais ponderadoras. Nenhum dos professores é de opinião
que a proposta curricular em vigor atenda aos desafios da formação de docentes para uma
educação consoante com este século. A maioria dos entrevistados, ao apresentarem proposta
de um modelo curricular com esse propósito dimensionaram projetos com base no modelo
dominante da racionalidade técnica e instrumental. Alguns poucos professores apontaram
princípios e fundamentos de formação de professores com novas perspectivas para uma
Educação em Ciências, consoante com uma educação para este século.

A seguir, passo à análise e interpretação das falas dos sujeitos, utilizando-me de


teóricos que iluminarão as discussões, sentidos e significados apreendidos com os sujeitos da
pesquisa. Inicio com os discursos dos professores César Lattes, Ronni Geraldo e Luis
Davidovich que dizem o seguinte:

...Acho que a gente tem tentado melhorar, mas assim, como eu disse, é
um processo de construção. Talvez ele na construção, à época, tenha
sido o melhor que a gente imaginou. Mas ao longo do tempo as coisas
vão se tornando desatualizadas, não tem jeito! A sociedade vai
evoluindo, os alunos vão mudando, os professores vão tendo uma
outra visão, uma visão diferenciada, o mundo vai mudando. Não tem
como você fixar uma coisa e dizer que aquilo vai ser aquilo para o
resto da vida. Principalmente na área de formação de professor de
qualquer área da ciência. Ora, se a própria ciência está evoluindo o
tempo todo, como eu disse, ela está cada vez mais interagindo com
outras áreas, novas ferramentas, novos desafios, não tem como
manter um currículo de uma maneira só. Hoje eu vejo que a nossa
grade está completamente desatualizada, mas ela tem mais de dez
anos! Na verdade, não vou botar data.... porque eu falo não para a
data. Não eu acho que teve uma mudança de lá para cá. O curso não
forma bem por que está desatualizado (CÉSAR LATTES, Entrevista).

...Por isso é que eles estão fazendo essa reforma. Espero que seja,
pelo menos, o início dessa mudança. A gente pensa numa coisa, mas a
grade curricular, como já comentei, é do século XIX. As coisas
mudaram no século XXI, até o nome da disciplina que o aluno está
fazendo eu sou de acordo que mude. Os conteúdos são consequências.
136

Por exemplo, eu posso avançar a segunda Lei de Newton sem eu


precisar estar perdendo tempo ensinando a segunda Lei de Newton lá
do século XIX. Agora isso tudo passa por conscientização. A verdade
é nua e crua e eu tive a oportunidade de observar. Se há 20 anos eu
estou nessa mesma didática e penso por que eu vou mudar? Quando
você muda, você está reaprendendo. É começar a aprender tudo de
novo. Você vai mudar e o ser humano não gosta de mudança. Ele é
acomodado e isso faz parte da natureza, faz parte da primeira Lei que
é a da inércia. Que eu chamo de lei da ‘indolência cósmica’. Isso faz
parte do cosmo. Um planeta não muda se você não o provocar, ele vai
ficar naquela orbita até ele morrer. Nós professores precisamos de
ser provocados. É da prática formadora que a gente está falando.
Esse grupo de “formadores” de formadores, primeiro precisa estar
no século XXI. A primeira coisa que ele tem é que estar no século XXI
(RONNI GERALDO, Entrevista).

...Há necessidade de se ter disciplinas isoladas, por exemplo,


mecânica, eletricidade, mas precisa ainda de disciplinas onde todos
esses conteúdos precisam estar juntos. Então nesses dias de hoje,
nesse atual século, eu acho que precisa de disciplinas que possam
conversar umas com as outras....Os profissionais teriam que ter
conhecimento das novas tecnologias de informação até porque hoje a
Física não está mais dividida em dois grandes ramos, Física teórica e
experimental. Temos hoje a Física computacional que vem enriquecer
e colaborar com esse processo de ensino e aprendizagem. (LUIS
DAVIDOVICH, Entrevista).

Os três professores deixam claro que a proposta curricular atual não possibilita
formar um professor que atenda ao propósito de uma Educação para o século XXI. César
admitiu que para a época em que o currículo do curso foi construído a proposta atendia aos
propósitos da formação, mas que hoje o curso não forma bem porque está desatualizado,
disse o professor, justificando-se com as mudanças ocorridas no mundo, nos professores e nos
alunos, mas a licenciatura em Física manteve o mesmo formato curricular. Arroyo (2011) é
enfático ao discutir as mudanças no perfil dos alunos e nos desafios que os professores
enfrentam na atualidade lidando com problemas de natureza familiar, social, de valores e
interesses da juventude, para os quais também estão despreparados.
Concordando com a ideia da defasagem curricular e consequentemente da
formação dos professores, Ronni Geraldo lembrou que o projeto pedagógico do curso passa
por uma reforma, creditando a essa ação as mudanças que estão sendo exigidas. Pude
perceber que o professor compreende o trabalho de (re) construção da nova proposta de curso
dentro de uma visão restrita, cartesiana, isto é, apenas do ponto de vista da organização,
inclusão e retirada de disciplinas. Sua crítica é contundente quanto aos componentes
137

curriculares do curso. Vale dizer que quando o tema é currículo essa percepção é muito
comum da parte dos professores, estudos e pesquisas têm demonstrado essa tendência. Sobre
esse aspecto, não só ele, mas outros sujeitos da pesquisa que se manifestaram sobre a questão
deitaram sugestões de disciplina ao referirem-se ao currículo de vez que, deixaria o curso de
Física “melhor estruturado”.
Caracterizo essa visão disciplinar fragmentária, sustentada no padrão positivista
dominante da formação de professores. Com base em estudiosos como Morin (2009, 2011,
2017), Arroyo (2011), Chassot (2004, 2007), Cacahapuz et al. (2005), Maldaner (2000, 2003),
Santos (1999) e Santomé (1998), consigo identificar a concepção tradicional de currículo em
que os três professores sustentam as percepções apresentadas. Ao tempo em que propõem
inclusão e retirada de disciplinas, obedecendo a um critério puramente lógico, desarticulado
de objetivos, do contexto formativo, da sociedade, da educação escolar e de outros fatores
essenciais à formação de professores, distanciam-se de um currículo que possibilite a
educação para o século XXI.
Com a mesma visão reducionista de currículo, o professor Luís Davidovich avalia
que os componentes curriculares do curso são insuficientes e, portanto, não atenderiam ao
propósito da formação do professor, contudo, traz uma novidade em seu discurso, aproxima-
se de uma abordagem de ensino de modo interdisciplinar quando diz:...nesses dias de hoje,
nesse atual século, eu acho que precisa de disciplinas que possam conversar umas com as
outras. Roni também sugere a inserção das novas tecnologias, no afirmando que o surgimento
da física computacional se constitui, no momento, como um recurso complementar da maior
valia no processo de ensino e da aprendizagem.
Valido a importância e utilidade dos recursos da nova tecnologia para o ensino,
como pensa o professor Luís, porém, devo alertar sobre o emprego das TIC observadas as
condições que já foram discutidas em outra parte deste estudo. Ademais percebo que o
professor Luís está movido por uma visão de interdisciplinaridade que se mostra embaçada do
ponto de vista teórico, interpretando a interdisciplinaridade na forma disciplinar, a qual
contraria sua natureza epistêmica e ontológica, quando propõe a separação do uno com o
múltiplo. Pensando com os metafísicos clássicos, o ser é uno e múltiplo ao mesmo tempo. O
todo está na parte que está no todo (MORIN, 2000, 2008, 2014).
Discuto equívocos dessa natureza, trazendo o que considera Frigotto (1995, p. 38)
dizendo o seguinte:
A não atenção ao tecido histórico, dentro do qual se produz o conhecimento e as
práticas pedagógicas, tem nos levado a tratar a questão da interdisciplinaridade sob
138

uma ótica fenomênica, abstrata e arbitrária. Aparece como sendo um recurso


didático capaz de integrar, reunir as dimensões particulares dos diferentes campos
científicos ou dos diferentes saberes numa totalidade harmônica. Não há, dentro
deste prisma didatista, nenhum problema em fazer-se, no dizer de Lefevre, sopa
metodológica.

Por fim, analiso o discurso do professor Roni com destaque particular à questão
da resistência e do comodismo do professor, no enfrentamento com o novo. Nisso, residindo
por suposto, as inadequações no processo de formação de professores para uma educação
consoante com as exigências do século atual. Segundo ele, a falta de motivação dos
professores no sentido da inovação pedagógica, na perspectiva de adequar sua prática docente
às exigências trazidas com as mudanças históricas, depende de fatores externos, capaz de
estimular a vontade de mudar.
Na minha análise, vejo provável que esteja acontecendo em razão da formação
inicial dos professores, com características pedagógicas tradicionais, embaçando a percepção
dos professores em outras direções, com perspectivas inovadoras. Se reconhecendo como
autoridades sobre o conhecimento e autonomia sobre o fazer pedagógico, não admitem
interferências ou inovações externas. A esse respeito, Santos (1999) ressalta ainda que a
maioria dos professores da área das Ciências não assimila a cultura da reflexão crítica,
histórica e social, na condição de formadores.
O pensamento racional científico-técnico dominante, segundo Contreras (2002) e
Giroux (1997), limita o sujeito à atitude de reflexividade e paralisa-o em direção a umas
práxis individual ou coletiva. Assim, no âmbito da prática formadora de professores de Física,
o que poderia vir a ser uma ação de compartilhamento de experiências, antes legitima o
isolamento nos espaços da formação. Entre os benefícios da práxis coletiva ou do trabalho
coletivo, enumero alguns, quais sejam:
(i) debate democrático em torno das atividades próprias da docência,
(ii) superação de dificuldades na execução de determinadas tarefas
docentes,
(iii) reflexão crítica sobre as limitações do trabalho da formação,
(iv) planejamento conjunto das ações,
(v) projetos educacionais,
(vi) desenvolvimento de pesquisa colaborativa, e
(vii) formação continuada.
139

Trata-se de questão cuja solução não é simples porque passa pela mudança de
pensamento de grande parte dos professore que compõe o coletivo dos professores-
formadores implicando rupturas de muitas ordens, e somente pela unidade do grupo formador
as mudanças ou transformações serão possíveis.
O discurso do professor que analiso a seguir percorre outras vias para discutir a
problemática do currículo da licenciatura e a educação pensada para o século XXI. Destaca-se
dos sujeitos anteriores focando o aspecto pedagógico. Do seu modo, estabelece uma relação
entre o currículo, a prática pedagógica do professor formador, a reflexão sobre a prática e a
formação do professor propriamente. Disse o professor Jayme Tiomno, o seguinte:
...O curso ideal deveria focar realmente um curso puro, limpo, de
licenciatura em Física...é indiscutível que um professor tenha todo
embasamento teórico... como repassar isso... tem que ter também
aquela parte experimental. Juntando essas duas, o que vai faltar
agora é a metodologia e aí entra a parte pedagógica para dar a esse
professor o entendimento de como a educação evoluiu, como a
educação caminha, para que o aluno possa entender esse processo de
ensino e aprendizagem que não é uma coisa unilateral...Então, se
você passa por um processo pedagógico, por uma aprendizagem
dessas concepções pedagógicas você vai entender que o processo é
bilateral. Então, se você lança o conhecimento e alguns alunos
aprendem e outros não, você vai se questionar por que alguns alunos
não aprenderam? Será que foi a metodologia? Será que foi o
conhecimento? Como foi lançada essa informação para o aluno?
Então, o professor que tem formação pedagógica fica preocupado e
vai buscar resolver esse problema da melhor maneira possível, vai
procurar soluções e ver onde estava o erro ou onde ocorreu o impasse
para os alunos, para que parte da turma não absorvesse o conteúdo.
Então, a questão do professor passa pela questão... o conhecimento
específico não garante que ele vai transferir aquele conhecimento
porque a clientela dele é diferenciada... a parte pedagógica é
importantíssima! Não tem como haver licenciatura, professores, sem
esse conhecimento pedagógico (JAYME TIOMNO, Entrevista).

O professor Jayme Tiomno apresenta entre outras questões algo que me pareceu
preocupá-lo e que merece ser destacada pela importância que tem nesta discussão. Ao se
referir currículo da licenciatura, ele diz: eu acho que o curso ideal deveria focar realmente um
curso puro, limpo de licenciatura em Física. Ao fazer essa declaração o professor Jayme
projeta uma imagem do curso de Física do IFMA, cumprindo objetivos e funções, em certa
medida, desviados dos reais propósitos da preparação de professores. Muito embora deixe de
avançar em suas considerações, lembro que essa questão sobre o status do curso surgia com
140

muita frequência durante os encontros da Comissão para reformulação da Licenciatura, e o


professor Jayme integrava a Comissão.
Sempre que emergia o debate no grupo, os professores da Física referiam-se ao
problema como “falta de identidade do curso”. Os debates em defesa de seus pontos de vista
giravam sobre diferentes posições e a defesa se dava em torno de três propostas quais sejam:
i) ser um curso híbrido, licenciatura e bacharelado;
ii) ser exclusivamente curso de licenciatura, puro;
iii)ser um curso de ciências com opção para habilitações nos últimos períodos, em
licenciatura ou bacharelado.
A maioria dos membros da Comissão decidiu levar a discussão para apreciação da
assembleia departamental do curso de Física, na qual as opiniões se dividiram, ao final venceu
a ideia de um curso de “licenciatura puro”. O professor Jayme era um dos que se mostrava
irredutível quanto à identidade de licenciatura para o curso. Na Comissão, desde a primeira
vez que participei das discussões posicionei-me pela licenciatura “dita pura”, defendendo meu
ponto de vista considerando os objetivos da formação docente.
A argumentação de quem fazia a defesa por outra identidade de “curso híbrido”
como denominavam era a de que o estudante do curso que se interessasse pela pesquisa ou
desejasse ingressar em uma pós-graduação de imediato estaria apto a prestar os exames de
admissão. A “identidade do curso” definida foi algo decisivo para os trabalhos da Comissão,
mesmo assim, ao final da organização da matriz curricular, a predisposição para um curso nos
moldes bacharelesco ainda assombrava o currículo da licenciatura. Vale dizer que o curso a
essa altura apresentava um volume de disciplinas consideravelmente grande.
A fala do professor Jayme é enfática sobre o necessário domínio de
conhecimentos da área científica e experimental para o exercício da docência, mesmo assim
não garante o alcance dos objetivos no ensino. São os conhecimentos pedagógicos que
ganham destaque em seu discurso, chegando a descrever situações do processo didático,
caracterizando o papel do professor e a posição do aluno. Faz questão de realçar o
compromisso com o ato pedagógico ao dizer que: ...o professor que tem formação pedagógica
fica preocupado e vai buscar resolver esse problema da melhor maneira possível, vai
procurar soluções e ver onde estava o erro... Indo mais a fundo na análise desse discurso
percebo que Jayme expressa, ainda que de modo inconsciente, a reflexividade (PIMENTA;
GHEDIN, 2002), como atitude qualificativa do professor e qualificativo do processo do
141

ensino. Marcando essa importância ele comenta por fim: não tem como haver licenciatura,
sem esse conhecimento pedagógico por parte dos professores.
Apresentando posição semelhante o professor Plinio avança um pouco mais em
suas argumentações sobre os conhecimentos pedagógicos demonstrando uma visão mais
consistente acerca da formação pedagógica necessária à docência e consequentemente a boa
educação neste século. Posicionando-se na discussão sobreo currículo o professor fala o
seguinte:
...A priori o professor tem que ter as disciplinas de Física é lógico!
Ele tem que ter esse embasamento para conhecer o humano porque a
gente conhece o humano “de olhar”, não de estudo. Então, quando o
professor estuda Psicologia da Educação vai começar a entender um
pouco, e quando estuda Sociologia da Educação vai conhecer mais
ainda. Então, tem que ter esse conjunto de disciplinas. Meus alunos
daqui, que eu tenho ou que passam pelo curso de Física tem aquela
velha prática de chamar as disciplinas de humanas de “gias” e eu
sempre digo: deem importância para todas as disciplinas que estão no
elenco do curso, sejam bons em tudo, estudem Psicologia, estudem
Didática, estudem Sociologia da Educação, todas elas são
importantes para a formação de vocês. Sempre disse isso para os
meus alunos, sempre os orientei para que colocassem todas as
disciplinas como se fossem a última vez que eles as veriam, mas
sabemos que a gente sempre está revendo os conhecimentos desses
conteúdos (PLINIO DELLATORRE, Entrevista).

O professor em questão dá como obrigatórias as disciplinas científicas para a


docência em Física, mas se detém em considerações sobre os componentes curriculares
pedagógicos. O reconhecimento deste professor sobre o papel das disciplinas da área da
educação no currículo da licenciatura em Física comprova o salto epistemológico na visão
desse professor. A forma preconceituosa com que são vistos os componentes desse núcleo do
currículo na licenciatura é emblemático, não são somente os alunos a demonstrar rejeição
pelas disciplinas, no geral, os docentes da área científica chegam no limite a ponto de
verbalizar o pouco ou nenhum valor relacionado aos conhecimentos da área de humanas.
Compreendo que o professor Plinio vai muito além nas considerações sobre o
currículo reconhecendo a importância das bases pedagógicas na constituição do perfil do
futuro professor, contudo não visualiza o campo pedagógico e o campo científico integrados
na formação. Desse modo, se para os pedagogos essa unidade epistemológica é de difícil
compreensão e desenvolvimento na prática formadora é provável que o professor de Física
tenha igual dificuldade pois, prepondera nos professores da área específica uma concepção
indutivista-empiricista. Aliás, nenhum dos entrevistados apresentou tal direção para a
142

proposta do curso. Recorro a Maldaner (2003, p.118) cuja explicação auxilia a compreensão
dessa postura, nos termos seguintes:
Embora as ciências humanas e sociais se reconhecessem diferentes e, muitas vezes,
propusessem o oposto das ciências naturais, em termos epistemológicos mantiveram
a separação sujeito/objeto, portanto, dentro do mesmo paradigma da ciência
moderna. Isso se reflete, mais intensamente, na formação dos profissionais nas
universidades, onde a própria organização curricular é proposta de forma esfacelada,
com disciplinas isoladas, formações práticas e teórica separadas, formação
profissional descolada do meio em que vão atuar os profissionais.

Ao falar sobre o currículo da licenciatura e a educação para o século XXI, a


professora Maria Isaura dá destaque à dinâmica pedagógica interna do curso, protagonizada
por ela e pelos demais formadores, apresentando a relevância do ambiente coletivo no
contexto das práticas formadoras no curso de Física em interface com a proposta curricular da
licenciatura. Isaura considera que o projeto pedagógico do curso contém inovações, porém
não é suficiente para garantir a formação de professores para o século XXI. Segundo a
professora uma série de fatores precisam concorrer integradamente, coletivamente, sobretudo
a prática pedagógica dos professores que vem se dando isoladamente. As reflexões presentes
na fala de Isaura oportunizam outros enfoques teóricos e epistemológicos que considero
pertinentes para a discussão sobre o que foi apreendido. Isaura disse o seguinte:
O IFMA tem professores preparados, professores-formadores que
buscam cotidianamente a melhoria do processo formativo dos
professores de Física, como também das outras licenciaturas que o
IFMA oferta. Agora, eu vejo que são práticas que ficam muito
isoladas. Muito por conta, por exemplo, da decisão e compromisso de
professores individualmente. No máximo o que acontece é que um ou
outro conversam entre si, mas aquele processo que esteja de fato
assentado em decisões coletivas, em momentos de discussão, de
reflexão, no planejamento coletivo, no momento de avaliação, que nos
permitiria refletir melhor sobre aquilo que nós estamos fazendo e
tomar decisões, no sentido de melhorar o que se está fazendo, tendo
em vista o alcance, o direcionamento dessas concepções que
definimos, eu confesso, que eu não percebo isso. Inclusive, no nosso
projeto está definido o núcleo da prática pedagógica79, que é o
momento onde nós teríamos que trazer as questões da escola, os
problemas que as escolas e o ensino de Física enfrentam e que era
para serem discutidos, refletidos... As coisas se dão de forma isolada.
O processo de formação do professor é um processo que exige
decisões tomadas e ações realizadas coletivamente. Então, nesse
sentido eu não posso dizer que esse currículo está de fato formando
professor para o século XXI. Isto porque existe o currículo prescrito,

79
Acerca do Núcleo de Prática Pedagógica remeto o leitor à página 25 deste trabalho onde transcrevo do PPC do
curso de física as características e objetivos deste.
143

que está estruturado no projeto, onde ele pode apresentar dimensões


inovadoras, pode estar assumindo concepções inovadoras, mas o
currículo ganha vida, alcança sentido na prática cotidiana dessa
formação. Assim, se nós não temos a prática do planejamento coletivo
incorporado, a gente pode até dizer, como eu falei há pouco, alguns
professores podem estar realizando uma prática rica, interessante,
que possa estar incidindo diretamente, trazendo como consequência a
formação de professores numa concepção crítica de professor e de
educação para o século XXI... Porque é essa que eu defendo, é essa a
educação que eu defendo para o século XXI (MARIA ISAURA,
Entrevista).

Maria Isaura destaca primeiramente a preparação e o compromisso dos docentes


como aspecto positivo para as licenciaturas do IFMA. A respeito das práticas pedagógicas no
curso lamenta o isolamento dos professores, no contraponto reforça a importância de que o
processo esteja de fato assentado em decisões coletivas, em momentos de discussão, de
reflexão, no planejamento coletivo... exige decisões tomadas e ações realizadas
coletivamente. Inspiro-me na fala da professora e compreendo com Imbernón (2011),
Maldaner (2003) e Giroux (1997) que a competência pedagógica e o poder de transformação
de um professor agindo isoladamente é limitado e pragmático, portanto, não atende à
formação do professor como profissional intelectual transformador (GIROUX, 1997),
exigência do processo educativo no presente momento da nossa sociedade. A complexidade
da práxis formadora e da Educação em Ciências - porque não se desconectam - exige de
quem a desenvolve, um envolvimento integral relativo aos seguintes parâmetros:
i) pensar/refletir crítica e epistemologicamente sobre as questões do ensino, da
sociedade e do planeta;
ii) agir conforme a razão crítica, epistemológica e pedagógica no coletivo e em outros
espaços da formação;
iii) superar a concepção empiricista-positivista do conhecimento científico, da
neutralidade e da natureza da Ciência como produtora de “verdades” conduzindo o professor à
transmissão de certezas;
iv) romper com a visão instrumental do ensino que considera o professor apenas como
transmissor de conhecimentos, com consequências alienantes para a formação do professor e
para o ensino de Ciências;
v) admitir a reflexão epistemológica como base para as decisões relacionadas ao
currículo, ao processo da formação inicial e continuada, e dos conteúdos teórico-práticos para
o ensino de ciências, e
144

vi) participar interna e externamente de espaços e ações em luta por melhora das
condições e dos espaços de trabalho, e valorização da práxis docente.
O que foi provocado naquilo que foi significado pela professora Isaura conduz ao
encontro do que afirma Imbernón (2011, p.15-16) quando assegura que:
Isso implica, mediante a ruptura de tradições, inércias e ideologias impostas, formar
o professor na mudança por meio do desenvolvimento de capacidades reflexivas em
grupo, e abrir caminho para uma verdadeira autonomia profissional compartilhada,
já que a profissão docente deve compartilhar o conhecimento com o contexto. Isso
implica uma mudança nos posicionamentos e nas relações com os profissionais, já
que isolados eles se tornam mais vulneráveis ao encontro político, econômico e
social.

Com essas considerações defendo que o trabalho coletivo é condição essencial


para a qualidade da formação de professores que se pretende para este século XXI. Da práxis
individual à práxis coletiva, no âmbito da licenciatura em Física, dificuldades de várias ordens
que cercam o curso de formação de professores de Ciências do IFMA, e de outras
universidades públicas, poderão ser minimizadas. As questões ao serem colocadas no centro
das discussões criam possibilidades de serem solucionadas ou amenizadas.
Ao me reportar ao trabalho coletivo nesta pesquisa incluo outros sujeitos tais
como o coordenador do curso, o gestor do ensino superior e os alunos da licenciatura, todos
regidos pela dialogicidade sempre que as circunstâncias do processo formativo estiverem a
exigir. Respeitado o princípio democrático na prática educativa, os segmentos também podem
e devem se organizar entre si, desde que os propósitos elencados visem a qualidade da
formação de professores. Portanto, a necessidade do trabalho coletivo está justificada pela
unidade de propósitos e direção à formação de professores de Física e, por esse modo,
favorecer igualmente a formação dos outros sujeitos envolvidos nesse trabalho e a educação
consoante com o século em que se vive.
O professor Mario vai em outra direção e retoma a discussão em torno da
identidade do curso, entre outros aspectos que aborda. Mario apresenta sua visão sobre o
currículo, dimensionando a estrutura e a organização necessária ao funcionamento do curso de
licenciatura. Ele explica o seguinte:
O curso de licenciatura em Física que eu tenho em mente teria que
ser um curso que pudesse passar para os alunos de Licenciatura a
formação básica, a educação sólida (até o quarto período)
independentemente de ser um licenciando ou um bacharelando. Ele
teria que ter o conhecimento da Física e de todos os seus ramos, e a
partir do quarto até o oitavo período ele trabalharia a parte da
formação pedagógica, e aí o curso se tornaria mais “brando” nos
períodos finais. Mas, até o quarto ou quinto período ele teria que ter
145

uma boa formação independente de ser licenciado ou não teria que


ter essa formação. Do quarto ou quinto período para frente ele teria a
formação que diz respeito a como vai trabalhar o conteúdo de física
em sala de aula, ou seja, passaria a trabalhar a sua formação como
um profissional e um futuro educador (MARIO SHINBERG,
Entrevista).

Sobre este modelo de formação manifestado por Mário, assim como outros
modelos formativos, muitos educadores pesquisadores já produziram extensa literatura sobre
o tema (SANTOS, 1999; IMBERNÓN et al., 2011; CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011;
CACHAPUZ et al., 2005; NARDI, CORTELA, 2015), coincidindo em suas contribuições
teórico-críticas aos modelos formativos com formato semelhante ao pensado pelo professor
Mario. Para esses professores-pesquisadores, os estudos mostram que os profissionais
formados sob esse modelo deixam de receber a preparação adequada e coerente com a função
da docência. Não só pela fragmentação do currículo, mas, sobretudo, pela dicotomia teoria–
prática. Caracterizam essa formação como burocrática, acrítica, forjada na racionalidade
técnica.
Com esse modelo de formação, a organização curricular se dá previamente pelos
professores em descompasso com a realidade educacional sem diálogo com as escolas. As
disciplinas obedecem a uma ordenação positivista lógica, derivando desse ponto um trabalho
docente formador desarticulado interna-instituição formadora- e externamente –escolas –
descontextualizadamente em relação aos problemas da sociedade em que vivemos. Vale
destacar neste ponto o fosso na preparação do professor para a educação do século XXI.
Acrescento que se as instituições de ensino básico e superior já não conseguem acompanhar o
movimento do real, no modelo pensado pelo professor Mario essa dificuldade se eleva e o
prejuízo para a formação e a prática educativa se torna desastroso.
Modelos formativos semelhantes a estes, praticados por algum tempo e em várias
IES formadoras de professores foram alvo de críticas na década de 90, período em que
vivíamos o clima da redemocratização do país, as divergências incidiam sobre as diferentes
concepções de educação e formação de professor, em descompasso com o momento histórico
de nossa sociedade (ARAÚJO, VIANA, 2010). A partir da LDB Lei Nº 9394/96, novas
diretrizes foram elaboradas contrárias a esse formato80. Essa foi mais uma provocação

80
Nortearam as reformas curriculares regulamentares após a LDB: o Parecer CNE/CP 09/2001; Resolução
CNE/CP 01/2001; CNE/CP 28/2001CNE/CP 01/2002. Diretrizes Curriculares para os cursos de Física: Parecer
146

legítima dos movimentos acadêmicos de pesquisadores da educação, provocando avanços nas


políticas e práticas formadoras.
A professora Marina também contribuiu com a discussão sobre o currículo atual
da licenciatura e a relação com a educação para o século XXI. Com suas colocações traz uma
espécie de chamada dos formadores para um aspecto importante da Educação em Ciências
numa perspectiva contextualizada, integradora da teoria com a prática, qual seja a seguinte:
...Se as pessoas conseguirem perceber que tem física em uma mera
atitude de atravessar uma rua é interessante que as pessoas percebam
que o saber científico não é uma coisa que está presa em laboratório,
não é uma coisa que está presa em tubos de ensaio, mas é uma coisa
que reverbera lá no dia a dia, na vida prática de cada um. Eu acho
que todos os cursos, não só o curso de Física, mas o de Química, de
Biologia, e da própria Matemática deve ter esse compromisso de
ensinar ciências com sentido, com significados... Aí a gente vai
trabalhar realmente para vários séculos não só para o século XXI,
para vários séculos (MARINA VASCONCELOS, Entrevista).

A superação do modelo da racionalidade técnica pela adoção do modelo reflexivo


ou de racionalidade prática assentado sobre bases teórico-críticas e conduta reflexiva
epistemológica, conforme apontam Freire (1998), Santos (1999), Contreras (2002), Pimenta e
Ghedin (2002); Cachapuz et al. (2005); Imbernón et al. (2011), Carvalho; Gil-Pérez (2011), e
Nardi; Cortela (2015) se manifesta nas entrelinhas do discurso dessa professora. Muito
embora não tenha sido explicitada, apreendo no seu modo próprio de análise, um novo sentido
para a formação do professor consoante com a educação neste século. Por suposto, afirmaria,
uma mudança epistemológica e metodológica no curso de Física, tomando por base não só a
manifestação desta interlocutora a esse respeito, mas de alguns outros sujeitos desta pesquisa,
minimamente adequando ou renovando o currículo e a prática pedagógica da licenciatura em
Física, ao que eu concordo ser pertinente, dada a realidade discutida até o momento, na voz
dos sujeitos da pesquisa.
Vale dizer que o reducionismo nas representações dos professores não é exclusivo
do curso de Física do IFMA, posto que outras pesquisas sobre a formação inicial de
professores para o ensino de Ciências registram e discutem tal conduta epistemológica. Na
licenciatura em Física apenas se reproduz. Entendo com os autores citados que as concepções
dos professores formadores, mesmo aqueles que obtiveram licença para lecionar por meio de

CNE/CES 1.304/2001 e Resolução CNE/CES 9/2002. Na atualidade pelo Parecer CNE/CP 02/2015 e
Resolução CNE/CP 02/2015.
147

curso de licenciatura, o comportamento é o mesmo, uma vez que há que se considerar em suas
posturas positivistas, que seus formadores, por sua vez, lidavam com a mesma concepção. Na
expressão de Maldaner (2003) a forma como a ciência é concebida pelo professor caracteriza
sua ação pedagógica. Por isso há certa urgência de inovação das práticas sobre outras bases.
A visão da professora Maria Isaura, mais uma vez, traz novos elementos que se
agregam oportunamente a essa discussão e se localiza em um ponto que considero
fundamental quando trata da formação de professores e novos paradigmas na prática docente,
pensando em numa educação para o século XXI, conforme declaração feita a seguir:
Primeiro, a gente precisa pensar que tipo de curso, como deve ser
esse curso para formar esses alunos... A gente, precisa primeiro partir
de necessidades reais para que as pessoas possam pensar e
materializar esse curso. Segundo, tem que fazer parte do projeto
institucional, da formação continuada e do processo de planejamento
coletivo. Terceiro, que tudo isso tem que estar mediado, tem que está
assentado em concepção de educação, em concepção de escola, em
concepção de formação de professor, em concepção de processo
ensino-aprendizagem, em concepção de ciência, que no caso é a
Física. Que tenha essa perspectiva emancipatória para que, de fato,
dê conta da formação de professores numa perspectiva emancipatória
para o século XXI. O curso tem que ser concebido e materializado e
tem que ser avaliado permanentemente pelos sujeitos nele envolvidos,
e quando eu digo sujeitos, eu digo não só professores e alunos,
porque a prática é coletiva, mas tem que envolver professores, alunos,
e a gestão da instituição como um todo...(MARIA ISAURA,
Entrevista).

Isaura lembra, conforme discutido em vários momentos deste estudo, que a (re)
construção de uma proposta curricular visando a formação de professores inicia com a
formulação de questões pertinentes à intencionalidade da oferta do curso, implicando por isso
concepções de Educação, de sociedade, de Ciência, de formação de professor, de escola, das
necessidades concretas da formação, compondo um projeto, planejado com a participação de
todos os segmentos que formam o coletivo do curso.
Chama a atenção para o fato de que o projeto deve integrar o Plano Institucional
da IES, aspecto de fundamental importância para a viabilidade financeira e administrativa do
projeto, assim como articulá-lo à formação continuada. Neste particular, resumiria com
Pimenta (1999, p. 30 grifo nosso) que se trata de “pensar a formação do professor como um
projeto único englobando a inicial e a contínua. Nesse sentido a formação envolve um duplo
processo: o de auto-formação dos professores e o de formação nas instituições escolares
148

onde atuam.” Preocupação com foco no inacabamento e inconclusão de cada professor e do


restante do conjunto envolvido no processo da formação e da educação (FREIRE, 1998).
A prática docente na educação pelo papel social que desempenha e pela
complexidade que envolve a Educação (PIMENTA, ANASTASIOU, 2012) exige dos atores
envolvidos, continuada formação/auto-formação. A importância que atribuo à formação
contínua, situada numa proposta curricular que visa a formação de professores de Física é
dada pela sua relevância para o amadurecimento profissional dos professores e pela adequada
preparação dos estudantes. Pensando com Pimenta (1999) a formação continuada é auto-
formação, momento em que professores reelaboram seus saberes da formação inicial,
confrontando-os com as experiências imediatas do trabalho formador/educativo. A
continuidade do processo propicia de maneira progressiva a ampliação de seus
conhecimentos, de mudanças de atitudes, da inovação no processo do ensino e fortalecimento
do coletivo de professores formadores.
Por fim, Isaura coloca no centro do processo formativo a prática contínua da
avaliação, destacando o envolvimento do coletivo. A professora ressalta a natureza da
avaliação, permanente, como a entendemos a fim de cumprir a sua função. A validade e
importância da avaliação é aquela que é feita no processo; pelo professor sobre o ensino e a
aprendizagem, e da formação, sobre o conjunto das ações que constituem a ação pedagógica,
com a participação de todos os atores.
No próximo segmento prossigo com minhas análises e interpretações das
narrativas dos sujeitos, recorrendo a teóricos e pesquisadores na área das ciências e da
educação, na busca de apreender ideias e percepções que emergem de seus olhares e
experiências configurando o modelo de professor de Física e de educação para o século XXI.

Modelo de professor de Física e de prática formadora da Educação deste século

Recordo com Freire (1998) que não há docência sem discência. O ensino como
atividade básica do professor é o momento mais completo da prática educativa-formativa. No
espaço da sala de aula todos os saberes se articulam com uma única finalidade, educar: para a
docência, para o afeto, para a solidariedade, para o trabalho, para a cidadania, para a vida,
para o cuidar. Ensinar exige saberes, mas também exige intencionalidade, valores, atitudes e
procedimentos metodológicos. Para Pimenta (1999) os saberes da docência são a experiência,
o conhecimento e os saberes pedagógicos. A experiência, contabilizando todos os saberes
149

acumulados ao longo da escolaridade e os fatos que a marcaram traduzidos pelas melhores


lembranças de seus antigos mestres. Juntam-se a esses os saberes produzidos a partir da
prática cotidiana da docência nas reflexões sobre si e com seus pares no coletivo formativo.
O conhecimento, segundo essa autora, é imprescindível ser problematizado em
torno da sua função, finalidade e papel na formação do professor, específicos e pedagógicos.
Ter clara a distinção entre informação e conhecimento é ponto de partida para o segundo,
posto que se trabalha a informação na perspectiva do desenvolvimento da inteligência, da
conscientização do poder do conhecimento na promoção do bem-estar de todos, mas também
o mesmo poder pode concorrer para o contrário. Nesse meio, emergem os recursos da
comunicação, os quais exigem do educador um olhar crítico e vigilante, funcionando como
filtro e mediador, este, segundo Pimenta (1999, p. 22) para proceder à mediação entre a
sociedade da informação e os alunos, no sentido de possibilitar-lhes pelo desenvolvimento da
reflexão adquirirem a sabedoria necessária à permanente construção do humano. Nessa
perspectiva, a instituição escolar e o trabalho docente, planejado e sistemático ganham
relevância, assim como a prática formadora do professor, responsável pela modelagem, com
seus contornos sociais, políticos, éticos e estéticos. Pimenta (1999, p. 23) ressalta certos
aspectos da educação escolar nos seguintes termos:
A Educação escolar, por sua vez, está assentada fundamentalmente no trabalho dos
professores e dos alunos, cuja finalidade é contribuir com o processo de
humanização de ambos pelo trabalho coletivo e interdisciplinar destes com o
conhecimento, numa perspectiva de inserção social crítica e transformadora. Ou
seja, a sociedade civilizada, fruto e obra do trabalho humano, cujo elevado progresso
evidencia as riquezas que a condição humana pode desfrutar, revela-se também uma
sociedade contraditória, desigual, em que grande parte dos seres humanos está à
margem dessas conquistas, dos benefícios do processo civilizatório.

A prática docente formadora de professores evidencia que para ensinar não


bastam os conhecimentos específicos, pois há muito tempo superou-se, teoricamente, que
aquele que domina a sua área de conhecimento está apto para ensinar – tendência tecnicista
dominante até a década de 70. Os saberes pedagógicos e didáticos são imprescindíveis quando
se trata do processo ensino-aprendizagem. Concordo com educadores pesquisadores como
Pimenta (1999), Guarnieri (2005), Rios (2008), Libâneo e Alves (2012) ao dizerem que na
prática formadora referidos saberes têm sido trabalhados de modo desarticulado e
fragmentado, e na maioria das vezes são inseridos no currículo sem uma discussão do coletivo
acerca de sua pertinência e necessidade na formação do professor, demandadas das situações
reais da educação e da sociedade. Entendendo a educação como uma prática social afirmo
150

com Pimenta (1999, p. 25) que considerar a prática social como ponto de partida e como
ponto de chegada possibilitará uma ressignificação dos saberes na formação de professores.
Considerando que a prática possui anterioridade em relação à teoria será, portanto,
partindo das experiências na prática, com as situações educativas e com o ensino das Ciências
e refletindo sobre elas, que os saberes pedagógicos serão constituídos. À Ciência da Educação
assume competência pelos instrumentos teórico-metodológicos para compreender o que se faz
e como está sendo feito, e confrontar os saberes da pedagogia e da educação com a prática,
reelaborando-os, criando e recriando, construindo e reconstruindo os saberes pedagógicos81.
A sociedade brasileira na contemporaneidade passa a exigir saberes que vão além
do que já se consolidou teoricamente por meio das pesquisas e experiências dos educadores,
de tão diversas que são as demandas sociais. Ouço com bastante frequência dos colegas
professores que a sala de aula e os alunos são outros, e que o conhecimento deu saltos
extraordinários, porém, nós formadores, não estamos sabendo compreendê-los e ao mundo no
atual estágio. Isso abrange a violência espreitando as pessoas em cada esquina, as drogas
entrando nos lares e roubando o final da infância e da adolescência para a criminalidade
resultando na morte precoce, o desemprego de jovens e pais de família, a estupidez da injusta
e perversa desigualdade social. Com efeito, as exigências são ampliadas e a cobrança emerge
de instituições como a Família, o Estado, o mundo do Trabalho cada um com suas demandas
as mais complexas possíveis e o professor que não está sendo formado para lidar com tais
demandas se vê órfão de conhecimentos que poderiam tê-lo capacitado para a mediação das
situações da vida prática, por meio da prática acadêmica.
Nesse sentido reforço a tese nas colocações feitas pelos autores de que os saberes
pedagógicos necessários à prática formadora nas universidades e também a educativa nas
escolas devem partir da prática social mais ampla (RIOS, 2008; PIMENTA, ANASTASIOU,
2012; LIBÂNEO, ALVES, 2012) posto que são os conhecimentos específicos e pedagógicos
que subsidiam o trabalho docente ao confrontar as teorias com os complexos problemas da
educação, do ensino de ciências e da realidade rumo à compreensão e mudanças.
Complementaria com Pimenta e Anastasiou (2012, p. 15) que é da natureza da atividade

81
Os saberes pedagógicos podem colaborar com a prática. Sobretudo se forem mobilizados a partir dos
problemas que a prática coloca, entendendo, pois, a dependência da teoria em relação à prática, pois esta lhe é
anterior. (PIMENTA, 1999, p. 27).
151

docente proceder à mediação reflexiva e crítica entre as transformações sociais concretas e a


formação humana dos alunos, questionando os modos de pensar, agir e de produzir e
distribuir conhecimentos na sociedade.
Metodologicamente falando, os saberes pedagógicos são tão importantes quanto
os saberes específicos, sem estes não se consolida a formação docente, capacitando os
professores para o ensino de ciências, valendo-se da problematização, da reflexão e da análise
das situações da vida real.
Fiz essas considerações trazendo esse eixo teórico, tendo em vista a análise
discursiva desta categoria. Privilegiarei as narrativas dos sujeitos com suas representações e
experiências sentidos e significados segundo o modelo que concebem de professor e de
prática formadora consoantes com a educação para o século XXI. Com base nessas reflexões
entendo ser possível apreender das análises, expressões que signifiquem aproximações e
distanciamentos em direção ao objetivo de formar professores de Física e de ensino de
ciências focando as transformações educacionais e sociais esperadas.
Apresento a seguir algumas narrativas dos professores-formadores, interlocutores
desta pesquisa sobre a temática da formação docente ainda considerada:
Eu acho que o aluno tem que dominar a mecânica clássica, o
eletromagnetismo, a óptica, a termodinâmica porque é isso que faz
dele um profissional de Física. Agora, a maneira como isso vai ser
traduzido para ele e a maneira como ele vai trazer para a sociedade é
que tem que ser diferenciada porque hoje você tem novas
ferramentas…Existe um outro aspecto também na formação desse
nosso profissional hoje.... Ao final esse aluno que tem essa formação
de Física, como eu disse ...tem que ser tradicional, na minha cabeça
ele tem que dominar tudo isso. .... Então, a formação básica do
professor de Física é essa porque ele vai desenvolver as suas ideias,
vai dominar esse assunto, vai ter as suas ferramentas .... Então ao
longo de todas as disciplinas ou de algumas delas, ou em algumas
específicas, se trabalha o conteúdo e como se aborda os assuntos, as
ferramentas do ponto de vista da tecnologia da informação esse é um
ponto. ...A responsabilidade social é o que eu vejo sendo o nosso
grande desafio para a formação do nosso aluno... olhar a sociedade
ao seu redor e ver como pode melhor contribuir e trazer
conhecimentos que você domina para junto dessa comunidade
fazendo com que ela melhore o seu nível, o seu desenvolvimento
social, econômico, cultural (CÉSAR LATTES, Entrevista).

O professor Cesar em sua narrativa destaca o domínio do conhecimento científico


para a constituição de um modelo de profissional docente para o ensino da Física. Vem de um
passado relativamente distante o predomínio da visão de que a capacidade profissional para o
152

ensino de Ciências depende do conhecimento que o professor acumula no período de sua


formação e acumulará na prática, exercitando a docência, pensamento ainda muito comum no
meio pedagógico da área científica. Muito antes da criação dos programas de formação
docente, através das licenciaturas e, até bem poucas décadas, do critério de contratação de
docentes para atuar nas escolas centros de formação consistia no domínio de conhecimentos e
técnicas, e nas universidades o notório saber. Essa visão ainda ocupa o imaginário de
profissionais de diversas áreas e alimenta a cultura ainda vigente no setor privado da
educação.
Maldaner (2000) traz luz à essa questão e colabora para que se compreenda esse
comportamento por parte deste professor e de tantos outros, assim como dos gestores da
educação, esclarecendo que a trajetória histórica do modelo de racionalidade técnica,
atravessando séculos alcança a contemporaneidade, exercendo grande influência sobre as
práticas curriculares escolar e acadêmica, pautadas numa concepção de conhecimentos
especializados, fragmentados cumulativos e lineares. Estas são a condição para os sujeitos
participarem de forma atuante e útil nas sociedades. Além desse autor, outros professores
pesquisadores (GIROUX, 1997; PIMENTA, 1999; CONTRERAS, 2002; MORIN, 2005;
RIOS, 2008; LIBÂNEO, ALVES, 2012 e NARDI, CORTELA, 2015) ressaltam que uma
ciência (Física) não dá conta de abraçar a totalidade das dimensões que envolve o
conhecimento da realidade, da Educação em Ciências e de formar um professor com
concepções de ensino e de educação emancipatórias e cidadãs.
O professor César referido acima admite a sua postura de formador, ao dizer que a
formação do licenciando tem que ser tradicional. Desse modo, caracteriza a aprendizagem
como um bem intelectual a ser adquirido, predominando a autoridade de quem sabe mais, o
professor-formador, que transmite o saber a quem ainda nada sabe, o licenciando. Nesse
sentido, o aluno é visto como tábula rasa82. A base empirista na visão do professor nega as
experiências e os conhecimentos que o aluno traz da sua história da escolaridade anterior,
restringindo-o a mero receptor dos conteúdos das disciplinas. A transmissão dos

82
Contrariamente aos defensores do inatismo, os defensores do empirismo afirmam que a razão, a verdade e as
ideias racionais são adquiridas por nós através da experiência. Antes da experiência, dizem eles, nossa razão é
como uma folha em branco, onde nada foi escrito; uma tábula rasa, onde nada foi gravado. Somos como uma
cera sem forma e sem nada impresso nela, até que a experiência venha escrever na folha, gravar na tábula, dar
forma à cera (CHAUÍ, 1997, p.71).
153

conhecimentos científicos produzidos como verdades é repassada como “certezas” devendo


ser aceitas e reproduzidas como tal, não sendo admitida qualquer crítica por se tratar
justamente de “verdades”.
É importante destacar na fala do professor César o reconhecimento da dificuldade
enfrentada por ele e os pares formadores, em apreender da realidade, as necessidades presente
no real e garantir o diálogo do conhecimento científico com os problemas sociais na
perspectiva de atender às exigências que estão postas, ao afirmar o seguinte: A
responsabilidade social é o que eu vejo sendo o nosso grande desafio para a formação do
nosso aluno... olhar a sociedade ao seu redor e ver como pode melhor contribuir e trazer
conhecimentos que você domina para junto dessa comunidade fazendo com que ela melhore o
seu nível, o seu desenvolvimento social, econômico, cultural. Aquilo que se mostra para o
professor como um grande desafio é, sob o meu olhar, fragmentos de uma consciência social e
o produto de uma leitura ainda difusa da realidade e do papel a ser assumido pelo professor na
sua prática pedagógica formadora.
Nunca é demais lembrar com especialistas e pesquisadores que o domínio do
conhecimento científico especializado é fundamental para o exercício da docência, contudo, o
conteúdo científico por si só não garante a compreensão da totalidade social, exigindo do
professor competência filosófica e pedagógica para refletir e decidir sobre que conhecimentos
são essenciais à formação o professor (FREIRE, 1998; PIMENTA, 1999; CONTRERAS,
2002; CACHAPUZ et al, 2005; TARDIF, 2012), a seleção de conteúdos significativos para a
docência, como fazer a transposição didática do conhecimento especializado adequando-o à
preparação do professor intelectual transformador, são outras funções que cabem nesta
discussão. A análise das experiências, concepções dos sujeitos desta pesquisa, realizada até
aqui, me permite afirmar que o segmento de formadores, alinhados com esse modelo de
formação se distancia da educação consoante com o século em que estamos vivendo.
O discurso do professor César em defesa do uso das tecnologias como recurso
importante na formação do professor de Física encontra eco na fala do professor Ronni
Geraldo, sendo este, mais enfático quanto ao fato de que essa seria condição essencial à
formação do professor de Física na atualidade. Exponho o que disse o professor a seguir:
O professor em sala de aula tem que estar muito ligado nas questões
tecnológicas e para isso hoje há uma facilidade muito grande. Tem as
mídias, tem as redes sociais, enfim... A rede de informação é muito
grande. Ele não pode descartar jamais essa rede de informações. Tem
que estar todo tempo ligado nessa rede de informação porque os
alunos dele certamente estão ligados na mesma rede .... Eu espero
154

que esses professores não fiquem só na sala de aula, tem os


aplicativos, as mídias, esse é mais um trabalho que ele está fazendo
para a comunidade. (RONNI GERALDO, Entrevista).

Concordo que a realidade física e virtual em que se movimentam os jovens


estudantes nos dias de hoje transformou a tecnologia num acessório indispensável às suas
vidas, como também provocou mudanças de hábitos sociais e de comportamento na geração
mais jovem, e já exerce fascinação sobre as crianças de diversas idades, além disso, trouxe
facilidades de ordem da informação, do conhecimento e do relacionamento entre pessoas e
com o mundo suplantando fronteiras.
Tornar as aulas mais atrativas, demonstrar para o aluno o domínio da moderna
tecnologia e sua aplicação no ensino tem sido uma preocupação constante dos professores em
geral. Existe uma cobrança pessoal, institucional interna e externa, pressionando os
professores para o uso das tecnologias educacionais em sala de aula.
Entretanto, a realidade objetiva escancara o outro lado dessa situação, qual seja a
da precariedade de recursos financeiros destinados a equipar adequadamente as instituições de
ensino e fazer manutenção do arsenal tecnológico, o que resulta na maior parte das vezes em
sucateamento de equipamentos e salas se transformando em cemitério de máquinas obsoletas.
Pouca relevância é dada à educação pela elite governante, posto que há casos em que
praticamente abandonam os sistemas de ensino, que passam a manterem-se no mais alto grau
de precariedade. Escolas e universidades têm se apresentado desfalcadas de meios adequados
para o ensino.
Paradoxalmente a situação de precariedade no ensino presencial tem encontrado
na tecnologia uma alternativa viável. Nesse sentido, os laboratórios de ensino vêm sendo
substituídos por laboratórios virtuais, principalmente quando as experiências expõem a
segurança dos alunos a riscos, quando as universidades não dispõem dos insumos e mesmo de
estrutura física laboratorial para realizar atividades complementares à aprendizagem. Os
softwares e os computadores fazem esse papel chegando mesmo a realizar experimentos de
altíssima resolutividade.
O uso da tecnologia na educação básica e superior tem se mostrado como
ferramenta imprescindível e reconheço a utilidade e importância da democratização do
acesso ao conhecimento através dos e-books, sites confiáveis de consulta a periódicos, portais
de periódicos de órgãos de fomento à pesquisa como o da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no entanto, problematizo o grau de importância dada
155

aos recursos tecnológicos confrontando o papel, insubstituível ao meu ver, do professor


formador. Preocupo-me com a visão dos mais apressados sobre as TIC. O uso indiscriminado,
assistemático, sem planejamento e a incorreta relação teoria-prática pode colocar em risco a
aprendizagem significativa na formação de professores, em nome do uso desses recursos
simplesmente como ferramenta para o ensino. É preciso saber como lidar com os recursos
tecnológicos para evitar transformá-los em fins em si mesmos.
Parece que o forte apelo hoje em dia para o emprego das TIC se ressente de uma
reflexão crítica acerca do seu uso e da forma como são produzidos bem como a informação
foi organizada, como também a quem serve e interessa a indústria da comunicação, entre
outras questões pertinentes. Ademais, comungo do pensamento de autores que discutem essa
temática (RIOS, 2008, PIMENTA; ANASTASIOU, 2012, LIBÂNEO; ALVES, 2012) para os
quais os saberes especializados não dispensam a transposição didática, implicando um
trabalho docente com mais presença e mediação em sala de aula, previamente planejado com
rigor pedagógico.
O professor Luís Roberto indica o seu modelo de profissional para o ensino da
Física do século XXI, ao dizer o seguinte:
...Eu imagino que quando a gente trata de século XX comparando-o
ao século XXI ... o professor de ciências, da Física tem que ter um
perfil de acompanhamento da evolução científica em nível mundial e
das transformações que estão ocorrendo (LUIS ROBERTO,
Entrevista).

Interpretando o que diz esse sujeito da pesquisa, me parece bem claro que o
professor de Ciências deve manter-se permanentemente atento às produções e mudanças no
meio científico. Segundo Luís a atualização permanente do profissional é condição
determinante quando se trata de ser um professor de Ciências e de Física para o século XXI.
Muito embora não tenha especificado que percurso seria utilizado para essa atualização,
suponho que reconheça como vias para essa atualização eventos como: intercâmbios
profissionais através da pesquisa, a participação em congressos, a formação continuada, as
discussões com o coletivo da formação em torno dos conhecimentos científicos da atualidade
e da prática profissional, reuniões de estudo e de curso. É importante que se diga que a
formação permanente ou contínua com o objetivo de promover o desenvolvimento
profissional do professor-formador não deve restringir-se aos conhecimentos científicos
especializados, mas incluir conhecimentos pedagógicos.
156

Deve constituir objeto dos processos da profissionalização através da formação


contínua os temas da docência tais como: a realidade social e educacional brasileira,
pressupostos teóricos da formação de professores de Física e de Ciências, a epistemologia do
conhecimento científico e sua relação com a prática pedagógica formadora, atualização dos
conhecimentos científicos para o ensino de Física e de Ciências, a relação teoria e prática na
formação de professores de Física e de Ciências, o magistério, o currículo do ensino, o
processo ensino-aprendizagem, procedimentos metodológicos de ensino, pesquisa na
docência, avaliação da aprendizagem, enfoque político e econômico da educação, tendências
pedagógicas atuais. Colaborando com essa discussão Pimenta e Anastasiou (2012, p. 109)
assinalam o seguinte:
A docência universitária é profissão que tem por natureza constituir um processo
mediador entre sujeitos essencialmente diferentes, professor e alunos, no confronto e
na conquista do conhecimento. Para desenvolvê-la, é fundamental iniciar pelo
conhecimento da realidade institucional, procedendo a um diagnóstico dos
problemas presentes na realidade em questão, os quais serão considerados como
ponto de partida da discussão coletiva da proposta a ser posta em ação.

A realidade das instituições de ensino brasileiras não tem sido favorável à


profissionalização contínua dos docentes, posto que não são proporcionadas oportunidades de
formação em serviço, muito menos em outros espaços e momentos da carreira dos
professores. Isoladamente o professor vai em busca de suprir as próprias necessidades.
Entendo que essa deve ser uma bandeira a ser levantada pelo coletivo do curso de
Licenciatura em Física, como ação política de modo tal que se possa garantir
institucionalmente esse direito do profissional do ensino.
Prosseguindo com a análise destaco na fala do professor Mário, a representação
em torno do professor que forma o professor como exemplo de profissional a ser seguido.
Com sua visão suscita aspectos teórico e epistemológico que merecem reflexões, sobretudo,
pelas armadilhas ideológicas que pode suscitar semelhante ponto de vista: professor-formador
como modelo de professor. Nesse sentido afirma o seguinte:

...Eledeve atuar como sendo um exemplo a ser seguido. ...Mostrar


domínio de conteúdo e sempre buscar a melhor forma possível para o
aluno compreender o assunto e também dizer de que maneira ele pode
usar essas ferramentas no seu dia a dia. .... Eu acho que o
profissional tem que ser o melhor possível naquilo que faz, para que
seja um exemplo profissional a ser seguido mais à frente (MARIO,
SCHENBERG, Entrevista).
157

O imaginário dos sujeitos desta pesquisa está cheio de histórias referentes a outros
professores que de alguma maneira os influenciaram quando alunos, vindo mais tarde a
imitarem seus mestres admirados e inesquecíveis. Encontramos em parte significativa de
estudos que investigaram o modelo de professor ideal, apontados pelos sujeitos das
investigações, aquele professor que em algum momento da vida estudantil ou acadêmica
serviu-lhes de referência, apontando-os como modelo do “bom professor”. Afim com esse
contexto, e dizendo de outro modo, Mário enfatiza o modelo de professor que concebe, na
afirmação seguinte: Eu acho que o profissional tem que ser o melhor possível naquilo que faz,
para que seja um exemplo profissional a ser seguido mais à frente. Deixa perceber que o
melhor possível passa pelo domínio de conteúdo e o modo de transmitir o conhecimento aos
alunos.
Deixando à parte o aspecto do domínio de conteúdo, demasiado recorrente nas
falas dos sujeitos e bastante discutido neste estudo analiso a afirmativa “professor como
exemplo a ser seguido”. Mario me parece estar esclarecido acerca do seu papel no processo
do ensino e consciente da forte influência que pode exercer sobre seus alunos, contudo, não
poderá perder de vista que nessa função deve buscar permanentemente contribuir para a
independência e autonomia dos estudantes. Desse modo, o entendimento do “professor
modelo” merece reflexões profissionais maduras, de natureza política e ideológica, a fim de
que equívocos sejam evitados.
Por outro lado, compreendendo o processo de formação de professores para a
educação do século XXI pautada sobre bases teóricas e epistemológicas, críticas, reflexivas,
transformadoras, éticas e cidadãs (MALDANER, 2003; CACHAPUZ et al., 2005;
PIMENTA, ANASTASIOU, 2012; LIBANEO, ALVES, 2012), mediante formação com
expectativas paradigmáticas, soa autoritário e se mostra contrária. Com esse entendimento
absoluto vejo riscos de contrariar a construção de uma identidade profissional de professor
como intelectual transformador, de profissional que se constrói e reconstrói no cotidiano de
ser docente (GIROUX, 1997; FREIRE, 1998, 2014).
Concordo com o professor Mario que dominar o conhecimento da matéria que
ensina é muito mais que um requisito para ser professor, posto que dessa condição depende o
saber selecionar adequadamente os conteúdos que serão ensinados, considerando não só a
atualidade dos conhecimentos mas, o significado dos conteúdos alinhados com os objetivos
da formação dos professores para uma dada realidade. Vendo de outro ponto de vista cabe, no
entanto, conjecturar possibilidades adversas quando o professor-formador se investe do papel
158

de autoridade máxima do conhecimento, apto a transmiti-los como “certezas”. Nessa


perspectiva, é recomendável a ação reflexiva do coletivo da formação tendo em vista repensar
as bases teóricas, tendências e atitudes autoritárias contra toda e qualquer forma contrária ao
processo democrático na prática formadora. Pesa sobre o papel do professor na formação
princípios democráticos porque entende que o conhecimento é uma construção social,
histórica, com intenção libertadora, crítica e ética, a “mão única” do domínio do conteúdo se
mostra profundamente contraditória.
O domínio do conhecimento numa perspectiva emancipatória de caráter libertador
e contrária à perspectiva autoritária, ideológica-opressora, pode ser revisitada com Freire
(2014, p. 120) conforme se apresenta a seguir:
Nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão de mundo, ou tentar impô-la a
ele, mas dialogar com ele sobre a sua e a nossa. Temos de estar convencidos de que
a sua visão do mundo, que se manifesta nas várias formas de sua ação, reflete a sua
situação no mundo, em que se constitui. A ação educativa e política não podem
prescindir do conhecimento crítico dessa situação sob pena de se fazer “bancária” ou
de pregar no deserto.

Em contraposição ao modelo centrado na transmissão-assimilação, conforme já


foi discutida, José Leite aponta para um dos aspectos considerados fundamentais para a
concepção de formação e de prática formadora emancipatória. Esse professor diz o seguinte:

Eu creio que a gente tem que ensinar o aluno a pensar, compreender


que embora exista toda a ferramenta de cálculo, os fenômenos não
iniciam somente com cálculos, porque os cálculos não os fazem
compreensíveis. Entender que seria muito bom ensinar um
profissional de Física que esteja apto, ou melhor, a palavra certa não
é apto, mas que tenha conhecimento de Química, Biologia para que
ele possa desde cedo entender que ele sozinho não faz muita coisa...A
gente tem que ensinar o aluno a aprender a olhar os problemas, a
resolver os problemas, a resolver as coisas, mas a primeira etapa é
pensar (JOSÉ LEITE, Entrevista).

Vejo com entusiasmo no relato desse professor-formador o campo fértil para a


formação de professores como intelectuais transformadores, com consciência que se eleva no
sentido de reconhecer a historicidade do ser humano e a valorizar o que os sujeitos da
formação trazem consigo ao ingressarem no curso, e ver o sujeito com capacidade de inventar
a si mesmo porque pensa, é consciente e dono de seu pensar, um sujeito histórico que reflete
criticamente a realidade que o cerca e é capaz de intervir modificando-a ou pelo menos de
contribuir para as mudanças necessárias porque compreendeu o mundo. Esse sujeito-professor
é um ser no mundo e com o mundo. Como tal, dotado de conhecimentos, experiência, saberes,
159

adquiridos com as teorias, mas também através dos sentidos nas suas relações, através das
emoções, do olhar, do afeto, do ato da cognição, na expressão de Pimenta e Anastasiou (2012,
p. 78) conhecer é ato que mobiliza o ser humano por inteiro. Mobilizar essas várias formas
no processo de conhecer permite que não se perca a capacidade de se indignar, de
problematizar e de procurar saída para os problemas.
O sujeito nesta narrativa deixa implícito o modelo de formação que se contrapõe à
concepção bancária substituindo-o pela prática formadora problematizadora (FREIRE, 2014).
Esse tipo de formação passa pela educação que edifica a consciência mediada pela ação
pedagógica, planejada, sem hierarquia de especialistas ou docentes, resignificando
conhecimentos específicos e pedagógicos com a intenção de orientar o seu aluno não apenas
para olhar os problemas, mas, pensar sobre eles.
Certamente o professor formador orientado por esse pressuposto não vê seu aluno
como folha de papel em branco na qual serão gravados conteúdos da Ciência produzidos
como certezas, e cumulativamente. Ao contrário, o professor-formador compreende as
aprendizagens como autoaprendizagem, considera e valoriza na ação pedagógica
conhecimentos, experiências adquiridas pelo aluno-professor ao longo de sua escolaridade e
das suas relações intersubjetivas, vividas nos diversos espaços formativos.
A Licenciatura em Física como um todo precisa se converter nesse terreno fértil,
de ação-reflexão-ação gestando oportunidades de crescimento intelectual, pessoal e
profissional, de ações potencializadoras do desenvolvimento da identidade do futuro professor
como intelectual transformador da realidade educacional, contribuindo para a elevação da
consciência do aluno em torno da realidade social, educativa, do ensino, problematizando-as.
Lida-se com uma construção erguida sobre bases sólidas em torno das teorias científicas e
pedagógicas, mediadoras de suas reflexões epistemológicas, conduzindo o profissional à
práxis no futuro. A práxis... é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo.
Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-oprimidos. (FREIRE, 2014, p.
52).
Nas narrativas a seguir o modelo de professor e de prática formadora na visão dos
interlocutores desta pesquisa comparece com valores da dimensão social e afetiva com
relação ao papel de professor, anunciando pressupostos filosóficos, psicológicos e
sociológicos, conforme se pode perceber na fala dos professores Constantino Tsallis e Plínio
Della Torre, que manifestam o seguinte:
160

...Eu acho que o professor tem que ser humano e inclusivo. Mas o
inclusivo, eu acho que é ele, é ele que tem que chegar aqui e se
incluir... Do meu ponto de vista, o pessoal fica falando: a inclusão, a
inclusão, mas aí, é o aluno cego que tem que se incluir? Não! Eu que
tenho que me incluir ali e buscar metodologias, ler e tudo mais...
quando o aluno chegar lá na sala de aula precisa entender como
qualquer outro está entendendo. ...Eu acho que todo mundo tem que
comungar disso por igual... O professor é que tem que se incluir.
(CONSTANTINO TSALLIS, Entrevista).

... O professor tem que ser esse elemento humano mais próximo do
aluno, incentivando ele a crescer, a estudar. ...Seria bom se todo
professor fosse esse amigo do aluno, tanto o professor de Física
quanto o de Química, Matemática ou de Português, História,
Geografia, todos sem exceção (PLÍNIO DELLATORRE, Entrevista).

Ao me deparar com percepções como a dos professores, cresce em mim


entusiasmo ao ver que há, para além da racionalidade técnica, substratos filosóficos, éticos e
estéticos no processo de formação do professor, desvelando as dimensões afetiva, solidária e
humanizadora na ação pedagógica do processo formativo, essenciais na construção da
identidade do Professor de Física. Esses sujeitos aproximam-se da complexidade que
caracteriza a educação. Se eu estou focando a educação para este século XXI, a fala dos
professores não poderia ser mais pertinente, apontando um novo horizonte na formação dos
futuros professores. A formação de professores centrada no aspecto do humano é algo que
vem sendo discutida há algum tempo por pesquisadores de diversos campos do conhecimento.
Vou um pouco além nesse tema compartilhando o entendimento de Morin (2011, p. 47-48) na
reflexão seguinte:
A educação deverá ser o ensino primeiro e universal, centrado na condição humana.
Estamos na era planetária; uma aventura comum conduz os seres humanos, onde
quer que se encontrem. Estes devem reconhecer-se em sua humanidade comum e ao
mesmo tempo reconhecer a diversidade cultural inerente a tudo que é humano.
Conhecer o humano é, antes de mais nada, situá-lo no universo, e não o separar dele.
Todo conhecimento deve contextualizar seu objeto, para ser pertinente. “Quem
somos? ” É inseparável de “Onde estamos? ”, “De onde viemos? ”, “Para onde
vamos? ”. Interrogar nossa condição humana implica questionar primeiro nossa
posição no mundo. O fluxo de conhecimentos no final do século XX traz nova luz
sobre a situação do ser humano no universo. Os progressos concomitantes da
cosmologia, das ciências da Terra, da ecologia, da biologia, da pré-história, nos anos
60-70, modificaram as ideias sobre o Universo, a Terra, a Vida e sobre o próprio
Homem. Mas estas contribuições permanecem ainda desunidas. O humano continua
esquartejado, partido como pedaços de um quebra-cabeça ao qual falta uma peça.
Aqui se apresenta um problema epistemológico: é impossível conceber a unidade
complexa do ser humano pelo pensamento disjuntivo que concebe nossa
humanidade de maneira insular, fora do cosmos que a rodeia, da matéria física e do
espírito do qual somos constituídos, bem como pelo pensamento redutor, que
restringe a unidade humana a um substrato puramente bio-anatômico. As ciências
humanas são elas próprias fragmentadas e compartimentadas. Assim, a
161

complexidade humana torna-se invisível e o homem desvanece “como um rastro na


areia”. Além disso, o novo saber, por não ter sido religado, não é assimilado nem
integrado. Paradoxalmente, assiste-se ao agravamento da ignorância do todo,
enquanto avança o conhecimento das partes.

A complexidade do humano reflete com o autor uma questão epistemológica,


trazemos dentro de nós, o mundo físico, o mundo químico, o mundo vivo, e, ao mesmo tempo,
deles estamos separados por nosso pensamento, nossa consciência, nossa cultura (MORIN,
2011, p. 37). Essa atitude racional de dividir o indivisível conduz o professor-formador a
assumir em sala de aula, inconscientemente, na maioria das vezes, comportamentos
preconceituosos, adotar classificações arbitrárias dos alunos – os que mais sabem, os que
menos sabem e aqueles que “nunca serão capazes de aprender” -, ignorando as diferenças no
modo e ritmo próprio de cada indivíduo construir os seus saberes. Essas são atitudes, na
educação e na formação de professores que ainda são recorrentes, necessitando submeter tais
processos a reflexões no coletivo de forma planejada, sistemática, pedagógica e
epistemologicamente, apontando caminhos de superação para os descaminhos dessa prática,
até que se complete sua transformação em práxis.
Nessa reflexão há que se considerar a relação universal, indissociável do homem
com a sua essência natural, com o social, com a cultura da humanidade. A educação do século
XXI concebida com e em sua complexidade religa essas categorias a partir da prática social
mais ampla, para retornar a ela transformada pela práxis individual e coletiva dos formadores,
e dos futuros professores.
A ascendência econômica das sociedades que integram o ciclo da globalização
econômica contingencia os sentimentos, as emoções, o espírito solidário, o respeito pelas
diferenças e impõe uma cultura colonizadora do consumismo na qual essas características
humanas foram transformadas em mercadoria e o humano concebido sob bases mecanicistas.
Tais ideias influenciam a educação, refletem-se nos currículos do ensino, nos quais o humano
foi subestimado. Desde a década de 80 essa visão vem acumulando críticas rigorosas,
contudo, os resultados das pesquisas que concluem pela premência da superação dessa visão
não têm chegado com regularidade aos meios acadêmicos de formação de professores, à área
das ciências, tão pouco às escolas da educação básica, persistindo a hegemonia da
racionalidade técnica (IMBERNÓN et al, 2000; CACHAPUZ et al, 2005; CHASSOT, 2007;
CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011; MORIN, 2011).
Os professores Constantino e Plínio, resgatam a categoria do humano confiscada
pela racionalidade industrial técnica e colocam-na dentro do debate da formação de
162

professores como um campo consubstanciado por teorias da Ciência e da Educação, podendo


contribuir com as reflexões epistemológicas a esse respeito. Nesse sentido pode corroborar
para formar os professores como os intelectuais transformadores que a sociedade deste século
necessita.
Além do aspecto humano, o professor Constantino comparece com a categoria da
inclusão. O básico do que foi discutido acerca do aspecto humano na formação contempla a
análise do quesito inclusivo para o perfil docente. Um ensino humanizado e humanizador é
condição para a educação/formação inclusiva.
Há cerca de dois anos participo de um grupo de pesquisa, mencionado no início
deste estudo, que tem me ajudado a conhecer um pouco mais dessa realidade e acima de tudo
olhar com humanidade para um problema com tantas histórias de exclusão, com toda sorte de
violência, e constatar que em pleno século XXI as pessoas com deficiência vivem segregadas
e em condições que quase reproduz o cenário das sociedades da Idade Média. Apreendo a
preocupação do professor e complemento com um alerta aos que se sentirem tocados por essa
complexa questão, a de jamais fazer a leitura deste tema apartada de uma reflexão sociológica
crítica da sociedade que o vincula.
Em sociedades como a nossa, por exemplo, o padrão da “normalidade” e de
“senso comum” que orienta o imaginário da maioria das pessoas concorre para um olhar
deformado sobre as deficiências e o significado que acredito correto para a inclusão. Sigo,
pois, a mesma linha de pensamento de Carvalho (2010, p. 21) quando a autora diz o seguinte:
[...] As pessoas em situação de deficiência ficam em desvantagem no processo de
construção de suas identidades porque não se enquadram com o padrão estabelecido
como ideal e são colocadas num espaço de diferenciação, segregadas. Experimentam
a diferença de modo muito sofrido porque fogem dos parâmetros convencionais.
Sentem-se como alvos de críticas e de não reconhecimento numa espécie de
estranheza porque estão fora do socialmente esperado.

Como se não fosse o bastante é na família que, muitas vezes, o processo de


exclusão e rejeição da pessoa com deficiência tem início, extensivamente, pela discriminação
que sofre na sociedade em que vive. Contribuiu sobremaneira para o entendimento dessa
questão o modelo médico de deficiência, com suas classificações, conceitos e equívocos
históricos. Pesquisando há várias décadas essa problemática Carvalho (2010, p. 30) explica o
seguinte:

[...] São incontáveis os relatos de pais acerca da “hora da notícia”, quando tomam
conhecimento da presença de uma deficiência em seu filho recém-nascido, gerando-
lhes confusos e muito sofridos sentimento de luto – pelo “normal” que não nasceu.
Eles mencionam, também, toda a insegurança que experimentam, pois não sabem
163

como lidar com aquela “anormalidade” e indagam-se porque tal fatalidade os


escolheu. Talvez pela carência de mais informações acerca de potencialidades que se
desenvolvem, o que se constata no dia a dia é que o termo deficiência, verbalizado
na hora da notícia, por si só, já tem um caráter estigmatizante, discriminatório e
ameaçador.

Em 2001, a Organização Mundial da Saúde (OMS) coordenou e revisou a


Classificação Internacional das Deficiências, Incapacidades e Limitações (CID). Com efeito,
passou a vigorar a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde
(CIF). Uma visão mais humanizada das deficiências passou a orientar a questão das
deficiências e consequentemente da inclusão social e educacional. Pesquisadores, educadores,
militantes apoiadores e lideranças com deficiência depositam esperança em tal classificação
como subsídio legal para uma visão coerente e prospectiva das manifestações da saúde,
compartilhada com a sociedade em geral. Carvalho (2010) avalia o saldo positivo de tal
classificação uma vez que apresenta as deficiências e incapacidades não apenas como
consequências de saúde e doença, mas em decorrência de fatores do contexto físico, político e
social, pelo comportamento das pessoas frente às deficiências e também por questões de
ordem legal e da justiça social.
Acredito pelo exposto compreender o sentido do que afirma tão enfaticamente o
professor Constantino quando se refere à sua inclusão como formador: .... Eu é que tenho que
me incluir ali. Segundo ele, a inclusão tem que ser do professor, digo, do coletivo
representado pelo corpo docente e técnico do curso de licenciatura e, a partir da ruptura com a
concepção de deficiência como incapacidades e libertos de preconceitos e reducionismos
(SÁNCHES, 2005; CARVALHO, 2010) mobilizem os saberes especializados, pedagógicos e
da experiência para promover a real inclusão das pessoas “com deficiência ou não” na
Educação deste século XXI.
Finalizo minha análise nesta categoria com a professora Maria Isaura, cuja
narrativa é quase uma síntese do que deve constituir um modelo de formação de professores.
Mesmo que os aspectos por ela apontados tenham sido abordados em análises anteriores, a
relevância da narrativa dessa interlocutora está, sobretudo, na competência de mobilizar
princípios, conceitos, métodos de trabalho, reunidos em uma fala segura e bem fundamentada
de quem vivencia competentemente a teoria e a prática da formação de professores de
maneira indissociável. A professora diz o seguinte:
... Eu penso que o professor de Física deve ser como qualquer bom
professor. Eu considero que ser um bom professor: é aquele professor
que tem domínio amplo dos conhecimentos, conhecimentos que lhe
colocam na condição de ser professor. Que conhecimentos são esses?
164

Ele precisa ter domínio específico da ciência que ele ensina e também
o domínio pedagógico dos conhecimentos pedagógicos que vão lhe
dar condições não só de ensinar bem o conteúdo que ele domina com
profundidade, como também compreender a escola onde ele atua, a
escola que faz parte de um contexto social. Compreender as relações
do contexto em que se situa, e como essas relações interferem no
trabalho que ele desenvolve como professor. ...Que tenha clareza do
projeto de educação e de sociedade que ele defende. E claro que a
prática dele deve expressar essa concepção, esse posicionamento
político e pedagógico que ele tem com relação à educação. ...Isto está
articulado a outro aspecto básico do seu perfil, que tenha uma
postura ética, que esteja comprometido com um projeto social
emancipatório... Isso vai implicar também que ele seja um sujeito
capaz de estar produzindo conhecimento, que ele seja alguém que
domine o método e a metodologia da produção do conhecimento
(MARIA ISAURA, Entrevista).

As colocações dessa professora referem-se à formação do professor, e ela fala


com a propriedade de quem compreende o processo de formação e da educação em sua
complexidade, situados em um contexto social de igual complexidade, podendo ser
compreendido através dos conhecimentos pedagógicos, assim como dos conhecimentos da
história e da filosofia da ciência para pensar as relações que ocorrem em seu interior e
interferem no trabalho do professor como formador. Descreve, portanto, a prática formadora
como um tecido complexo e dinâmico conforme o compreendo com Pimenta e Anastasiou
(2012), Giroux (1997), Imbernón (2000), Morin (2008), Rios (2008), Libâneo (1997), Freire
(1998), e Libaneo e Alves (2012).
O modelo de professor construído em sua fala direciona a formação do futuro
professor para a prática de ensino emancipatória, munido dos conhecimentos de Ciência e dos
conhecimentos pedagógicos, devendo ser adequadamente articulados entre si, com a
sociedade e a escola, propiciando assim a constituição do que se diz ser o “bom professor”.
Parece que a professora tem clareza de que o domínio dos conhecimentos específicos não é o
suficiente para uma boa prática. Há que se articular na ação docente os conhecimentos
especializados, os saberes pedagógicos, os da experiência e os saberes político-sociais
(PIMENTA, 1999; LIBÂNEO, 1997) na intenção de compreender a prática social que inclui a
prática educativa, refletindo sobre ela e para ela voltar, transformando-a naquilo que se
mostrou necessário mudar.
O professor crítico é outra característica que comparece nas colocações feitas pela
professora Isaura associada ao modelo de professor ao apontar para o posicionamento político
em relação ao projeto de educação na sociedade e ao projeto pedagógico da escola,
165

caminhando com ética na defesa de ambos. Lembrando Freire (1998, p. 37) vale dizer que
não é possível pensar os seres humanos longe, sequer, da ética, quanto mais fora dela.
Abro um novo parêntese para ponderar sobre esta importante categoria, a Ética,
silenciada até então, mas que surge em momento oportuno da discussão sobre o modo de ser
do professor. Chauí (1997) afirma que as sociedades em geral instituem uma moral para tratar
dos valores culturais e sociais de um povo, uma espécie de código sobre o que é certo e
errado, bom e mal para aquela comunidade, de natureza inviolável e válida para todos os seus
membros.
Do nascimento à morte vivenciamos os costumes da sociedade à qual
pertencemos de forma tão natural que passa desapercebida a construção histórica de suas
regras de conduta, moral, costumes, sentimentos, de acordo com as circunstâncias e tempos
históricos da própria sociedade. Esse conjunto de regras e valores é vulnerável aos interesses
das classes que constituem essa sociedade. Manipulados ideologicamente a visão “embaçada”
da maioria não se dá conta do processo de dominação de determinada classe por outra, e tudo
é percebido como “natural”. Assim, deixam de perceber a manipulação ideológica. Um
exemplo clássico na história das sociedades é o da igreja através das religiões. Os demais
setores da sociedade como o político, o econômico, o educacional, de diferentes formas e
métodos exercem a sua dominação.
O campo das ciências é um exemplo similar de manipulação desses interesses.
Visado pelo capital industrial, as ciências têm sido alvos de inúmeras ações antiéticas,
conclamando a participação política do professor, a fim de trabalhar na contra-ideologia,
amparado na reflexão filosófica e epistemológica sobre as contradições evidentes e
dissimuladas. Digo com Morin (2017, p. 23) que a filosofia é, acima de tudo, uma força de
interrogação e de reflexão, dirigida para os grandes problemas do conhecimento e da
condição humana.
O cenário político, social e ambiental exige reflexões de base filosófica/ética,
científica e pedagógica nos coletivos de formadores de professores tendo em vista uma crítica
rigorosa sobre a herança natural, cultural e ética que pretendemos edificar para as próximas
gerações.
Emerge da nossa realidade prático social, ações reparadoras, mas preventivas
acima de tudo, e nesta última, a Educação em Ciências tem deixado muito a desejar,
omitindo-se, epistemologicamente e pedagogicamente (CHASSOT, 2007; CACHAPUZ et al.,
2005; CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011; MALDANER, 2003; SANTOS, 2010; MORIN,
166

2011). Me parece que a professora Isaura em sua fala, vislumbra essa realidade como a
apreendo. A emancipação que ela ressalta não se restringe à dimensão intelectual somente,
mas, social, política, econômica, ética e estética, pilares que considero completamente
adequadas e alicerçantes na formação de professores para este século XXI.
Sobre o destaque da professora acerca do conhecimento a ser produzido pelo
professor, de imediato me ocorre o professor como pesquisador da própria prática. O
professor é, por excelência, o elemento central da ação didática, daí a importância da pesquisa
sobre o que faz, como planeja, como avalia, compreender antes de tudo o real prático social,
porque o ensino é prática social e, mobilizar sua visão crítica sobre a prática do ensino que
realiza, gerando saberes pedagógicos fundamentais para a renovação do seu trabalho docente.
Pesquisa como instrumento da prática profissional do professor, realizada por ele, dizendo
com Pimenta (1997, p.22) ...considerar a pesquisa na formação dos professores como
princípio cognitivo. Isto é, quando o professor, pesquisando e refletindo sobre sua ação
docente, constrói saberes que lhe permitam aprimorar o seu fazer docente. O que possibilita
elevar cada vez mais a qualidade do ensino e da formação, consequentemente.
167

CONCLUIR É PRECISO

“A verdadeira educação consiste em pôr a descoberto o melhor


de uma pessoa. Que livro é melhor que o livro da
humanidade.”

“Deveríamos ter vergonha de repousar e tomar refeições


abundantes até o dia em que exista um só homem ou uma só
mulher sem trabalho e sem comida.’

“Se cada um trabalhasse para ganhar o próprio pão, as classes


seriam imediatamente eliminadas: ricos sempre haveria, mas
considerar-se-iam só administradores da riqueza, que deve ser
usada para o bem comum.”
(Mahatma Gandhi)

Foi uma longa caminhada até aqui, um percurso que começou com a minha
chegada ao programa de pós-graduação. Todos os dias, a partir de então, passei a ter um
objetivo em mente, responder à questão que me inquietara.
No doutorado, com o primeiro dia de aula teve a início a tessitura desta Tese. A
ponta do fio se apartou do carretel, gradativamente foi se desenrolando, primeiramente com as
reflexões sobre as bases epistemológicas para o ensino de ciências num permanente
bombardeio e implosões que favoreciam o exercício da mente no campo das ideias. A forma e
a estrutura da proposta de pesquisa que eu trouxera iniciaram a metamorfose.
Esse movimento se estendeu a outras reflexões possibilitando um processo de
criação e recriação até a conclusão da proposta de investigação ora presente. Meu projeto
inicial permaneceu em essência, mas a sua construção ganhou novas nuances no percurso,
maior solidez, mais clareza, refinamento e robustez científica até a sua finalização.
Enquanto a Tese ia se constituindo, um processo similar ia me acontecendo do
ponto de vista do amadurecimento intelectual, profissional, doutoral. Nas relações de
interação com com o conhecimento, o novo me possibilitava despertar em territórios que
ainda não visitara, e aqueles velhos conhecimentos se enriqueciam com as novidades da
Ciência, da pesquisa e de outras proposições teóricas. Um tecido intelectual complexo e
envolvente. Eu e esta Tese evoluímos no mesmo ritmo e proporção. Não tenho dúvidas do
quanto foi gratificante viver essa experiência.
A pesquisa está concluída, a Tese, finalizada, os objetivos estabelecidos foram
alcançados satisfatoriamente. Ainda assim, cada Parte desta Tese produziu indagações novas
que extrapolavam os limites desta investigação, desse modo as deixo como sugestão para
168

novas pesquisas. Pelo grau de importância que atribuo aos vários temas que foram emergindo
aponto alguns que considero da maior relevância:
 Interdisciplinaridade e contextualização nas atividades de ensino e pesquisa em
Educação em Ciências e no ensino da Física;
 A pesquisa como princípio pedagógico orientador das atividades docentes e
discentes;
 A reflexão na prática e sobre a prática docente na formação de professores.
A opção metodológica pela pesquisa narrativa na tessitura desta Tese me permitiu
caminhar com a liberdade que imaginei necessária ao percurso investigativo, na direção dos
propósitos traçados para esta investigação. Se a narrativa possibilita apreender o mundo, as
histórias contadas revelam a cultura desse mundo, permitindo que a vida das pessoas se
reproduza, subsista e se aperfeiçoe. A escolha da pesquisa narrativa, portanto, não poderia ter
sido mais apropriada a esta investigação.
Assim, fui a busca de escrever esta história da formação de professores de Física
de um modo que ainda não havia sido feito, supostamente conferindo ineditismo a este
estudo. O problema de pesquisa conduziu-me a esta abordagem narrativa, viabilizada pela
pesquisa empírica para levantamento dos dados, obtidos das histórias das experiências
formadoras de professores de Física do curso de Licenciatura do IFMA, campus Monte
Castelo. A pesquisa bibliográfica iniciada na fase de construção do projeto de pesquisa
forneceu o referencial para os estudos realizados, intensificando-se nas etapas seguintes das
análises dos dados. Nessa etapa da pesquisa utilizei procedimentos e critérios da Análise
Textual Discursiva. Com os teóricos, pesquisadores especialistas e epistemólogos da
Educação e das Ciências busquei conferir o rigor científico exigido nas análises durante o
processo da investigação. Para fundamentar a pesquisa lancei mão dos conhecimentos da
Filosofia, da História da Ciência, do Ensino da Física, da Educação e Sociedade, dos Saberes
Docentes e da Formação de Professores.
Portanto, narrativa me possibilitou metodologicamente a (re) construção da trama
da formação de professores na Licenciatura em Física. Entendi que um caminho possível seria
retomando a sua trajetória histórica, a revisão do projeto pedagógico do curso de licenciatura,
resgatando aspectos legais disciplinares previstos nas diretrizes nacionais para construção do
currículo e, sobretudo, na análise das experiências relatadas pelos professores da Licenciatura
na qual me incluo como docente/pesquisadora. Desse modo foi possível atingir o objetivo que
me propus: compreender para conhecer as concepções de Ciência, bases epistemológicas e
169

pressupostos teórico-metodológicos na prática formadora do curso de Licenciatura em Física


do IFMA para este século XXI.
A trama da formação de professores de Física está a descoberto. Após a busca
intensa e exaustiva nas etapas da pesquisa e mais detidamente nas análises realizadas sobre as
categorias que emergiram da pesquisa empírica, constato afinal a Tese de que as concepções
de Ciência e de práticas de ensino formadoras expressas pelos professores no curso de
Licenciatura em Física do IFMA implicam pressupostos teórico-metodológicos e
epistemológicos que tendem a aproximar-se e ora se distanciam da Educação para este século
XXI.
Conforme constatado por meio das análises dos discursos, os pressupostos
teórico-metodológicos e epistemológicos que orientam a prática formadora dos professores,
inseparáveis de suas concepções de ciência, apontaram para a visão clássica da ciência de
natureza positivista que entende que o conhecimento válido é o conhecimento produzido pela
Ciência que foi submetido aos métodos experimentais e comprovados. Do ponto de vista
epistemológico, nesse modo de conhecimento, a relação sujeito e objeto é neutralizada.
Na análise discursiva, essa concepção de conhecimento se mostrou dominante nas
práticas pedagógicas e de ensino dos professores da Licenciatura em Física conforme
manifestaram em seus relatos. Nesse sentido foi constatada a importância que os professores
atribuem à experimentação na formação de professores, à autoridade do conhecimento
centrada no professor, assim como à valorização do conhecimento disciplinar das ciências.
Considerando que os pressupostos positivistas se mostram contrários à formação de
professores de natureza libertadora, emancipatória, transformadora, inclusiva, crítica, política
e ética constato que a prática formadora desses professores na Licenciatura em Física se
distancia da Educação para o século XXI.
Muito embora essa visão venha sendo amplamente criticada desde as primeiras
décadas do século passado, o positivismo na versão empirista-indutivista e o empirismo
lógico não foram abolidos por completo do meio acadêmico, influenciando não só a produção
do conhecimento como também instituições sociais, como, por exemplo, a Educação. Desse
modo, compreende-se em parte o comportamento do grupo de formadores de professores no
curso de Física. Contrários a esse modelo de conhecimento a contribuição de filósofos,
cientistas e epistemólogos como Popper, Gaston Bachelard, Piaget, Kuhn, Lakatos,
Feyerabend aponta para a compreensão da produção do conhecimento oposta à racionalidade
técnica, característica da visão clássica positivista, admitindo na gênese do conhecimento a
170

participação tanto do sujeito quanto do objeto. Mesmo recebendo críticas de seus pares, a
validade das produções teóricas e de métodos desses estudiosos com suas epistemologias têm
contribuído com revoluções de pensamento, uma espécie de reforma do pensamento que
considero emergente e fundamental para o desenvolvimento de ações específicas e
pedagógicas da formação de professores.
A ausência de reflexão epistemológica na prática docente dos formadores do curso
de Licenciatura em Física parece ter ficado evidente em suas vozes. A relevância da
epistemologia da Ciência e da Educação é fundamental para o processo do ensino das
Ciências e de Física nas várias etapas de desenvolvimento das atividades de sala de aula como
formação de futuros professores destinados à educação básica, na contemporaneidade. Sendo
assim, é premente a sua articulação ao trabalho docente no curso de Licenciatura para
superação das concepções ultrapassadas de Educação e de Ciência, com enfoques positivistas
de Ciência impregnados de racionalidade técnica e experimentação, e evidentes na prática
formadora de professores de Física.
Apesar do predomínio do cientificismo no meio formativo da licenciatura foi
possível apreender concepções de Ciência numa visão menos simplificadora, apresentada por
alguns poucos professores, apontando para uma tendência favorável à formação de
professores e à Educação para o século XXI. Constataram-se pressupostos teórico-
metodológicos com tendências pedagógicas contemporâneas e epistemologias mais
emancipatórias. Esses poucos professores que se manifestaram diferenciadamente, valorizam
a participação do aluno, os conhecimentos e as experiências que eles trazem para a graduação
ao tempo em que concebem a ciência como prática humana para produção de conhecimento.
Compreendem, também, que as interações entre sujeito e objeto são imprescindíveis para a
produção e apreensão do conhecimento, do real social e educacional. A ação desses poucos
professores, portanto, aproxima-se demasiado da formação e da Educação deste século.
Nessa perspectiva, aproximam-se de uma prática pedagógica cuja formação
prepara profissionais autônomos, mediadores reflexivos, consoante com o momento histórico
de nossa sociedade, na qual o papel do professor deixa de ser o de transmissor, depositário do
conhecimento das ciências e da educação e passa à condição de mediador do desenvolvimento
intelectual e profissional do aluno. Isso me leva a crer na possibilidade do trabalho em sala de
aula na licenciatura, obedecendo aos princípios democráticos e à dialogicidade, essenciais
para a educação que se espera.
171

Conforme foi evidenciado na licenciatura, a ausência da visão epistemológica


crítica da Ciência aprisiona a prática pedagógica formadora sobre bases epistemológicas
positivistas forjadas na racionalidade técnica empirista-indutivista. Enquanto isso, a reflexão
epistemológica presente faria toda diferença nos propósitos de uma educação na atualidade,
elevando a consciência filosófica, científica, técnica e tecnológica dos professores, necessária
às atividades da docência em sua plenitude.
Nessa perspectiva, o estudo de obras de autores como Bachelard, Chalmers,
Kuhn, Feyerabend, Morin, Boaventura na formação inicial e continuada de professores, são
fundamentais e edificariam uma nova racionalidade em relação à Ciência e aos problemas que
afetam as sociedades e a realidade planetária na contemporaneidade. Esses autores colaboram
com uma reforma do pensamento, necessária aos professores da área científica, sobretudo,
mas não só, afinal os educadores professores das licenciaturas são igualmente carentes de uma
visão das ciências, considerando essa lacuna e o modelo de formação nos cursos de
Licenciatura em Pedagogia. Nestes, o currículo dos cursos passados e atuais pouco ou quase
nada privilegiam esse campo do conhecimento.
No percurso investigativo revisitei o PPC do curso de licenciatura em Física,
portanto, não tenho receio de afirmar que a proposta pedagógica deixa pouco a desejar do
ponto de vista dos referenciais teórico-metodológicos, bastando atualizações conceituais. Mas
devo ressaltar, até com a autoridade de quem viveu momentos de intensos debates
epistemológicos no interior da Comissão de professores encarregada da reformulação da
licenciatura, que neste particular há que ser feita uma discussão com o coletivo do curso a fim
de ampliar-se o debate sobre a importância da visão epistemológica das ciências. Há que se
enfrentar um pouco da resistência dos professores, uma vez que a motivação dos membros na
Comissão esteve voltada para a organização da matriz curricular, muito mais do que para a
discussão da relação teoria-prática ou do perfil de professor que precisamos formar, o tipo de
sociedade que desejamos para viver ou pensar a partir das próprias dificuldades do processo de
formação de professores para a área científica.
Vejo oportuno o momento de reformulação do curso de licenciatura em Física, e
das outras licenciaturas do IFMA, para que sejam repensadas suas propostas antes da sua
aprovação em definitivo. A visão do currículo prescrito da formação conforme atestei
apresenta avanços, contudo, é na prática que o currículo se efetiva, portanto, com base na
visão dos formadores manifestadas nas entrevistas insisto na necessidade da reflexão
epistemológica a fim de que as armadilhas do paradigma dominante do positivismo da ciência
172

moderna não arrastem os professores formadores ao pragmatismo científico. Obviamente que


o retorno ao projeto reformulado não deve isentar-se das discussões sobre a identidade do
curso como ponto polêmico que apesar de definido ainda traz dúvidas, desconfortos e
insatisfações. Considero, pois, uma discussão imbricada na outra.
A visão epistemológica de ciência e o paradigma da complexidade corroboram
com a concepção de Ciência como a possibilidade de apreender o mundo físico e social
integradamente, numa totalidade na qual tudo é parte do todo, e o aluno como sujeito
epistêmico é reconhecido na sua capacidade de conhecer, produzir e transformar o mundo. É
preciso que os professores-formadores da licenciatura em Física, na condição de educadores
da área científica de modo geral trabalhem com essa visão. Devem lembrar que as pessoas se
educam relacionando-se com outras pessoas no mundo em que vivem, que aprendem o tempo
todo e em todo lugar, com a família, no cotidiano, no relacionamento com outras pessoas de
outras culturas, na escola, na igreja, no barzinho da esquina, com os seus sentimentos, suas
frustrações, seus valores, posto que todas são aprendizagens válidas para o seu crescimento
pessoal, intelectual e profissional. Desse modo, constrói sua própria cultura e visão de mundo,
o que obriga o professor a pensar e planejar criteriosamente o currículo do curso e o conteúdo
das aulas.
A ciência deixou de ser conhecimento privado das instituições sociais como a
escola e as universidades. O acesso ao conhecimento científico facilitado pela tecnologia
revela-se um recurso a mais para o professor nas situações do ensino e da aprendizagem. Os
dados da pesquisa narrativa sobre o significado da tecnologia pelos professores da licenciatura
deixaram certa preocupação merecendo reflexão pelo coletivo do ponto de vista
epistemológico, pedagógico, político e econômico.
Os conhecimentos, informações e experiências trazidas pelos alunos para o curso
de formação de professores devem se constituir conteúdo de ensino e de reconstrução do
conhecimento, isto é, como ponto de partida para as pesquisas, diálogos, reflexões, em sala de
aula. Na instituição de ensino a educação e a formação obedecem à outra logística para a
socialização dos conhecimentos, organizando-os em torno da cultura científica, humanística e
técnica, demandando procedimentos metodológicos para sua transposição didática.
Didaticamente falando, na apropriação do conhecimento é fundamental prever tanto o produto
dos conteúdos, como conceitos, teorias, bem como o processo de sua construção.
O modelo de formação de professores revelou lacunas de natureza pedagógica na
prática docente dos formadores da área científica. Ao caracterizar o perfil do professor de
173

Física para a educação neste século mostrou a primazia dos conteúdos como aspecto
dominante entre outros caracteres que sugeriram. Destaco, porém, que, mesmo quando
assinalam o aspecto pedagógico como ideal, comparece em suas falas uma fragilidade em
torno das bases teóricas da educação na relação com a docência. Fica claro que é necessário
que os professores retomem essa ausência, recorrendo às teorias pedagógicas como
referenciais para estudos e mediações reflexivas, haja vista orientar sua prática formadora de
maneira mais consciente, sistemática, articulada com a realidade social, política e econômica,
consoante com as necessidades de formação dos professores deste século XXI. Sem essa
visão os professores ensinam o que muito sabem por que não possuem clareza pedagógica do
que poderia ser mais relevante e pertinente ensinar.
Afinal, puderam ser também apreendidos pressupostos teóricos, pedagógicos e
epistemológicos de formação do professor de Física e de Ciências que se põe nas dimensões
intelectual, crítica, reflexiva, transformadora, política, cidadã, ética e estética. Com efeito, é
possível pensar no professor-educador-formador que atenda às exigências concretas de
humanização do mundo e o cuidado com o nosso planeta, o que reforça a possibilidade da
formação do professor de Física consoante com a educação para este século XXI.
174

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