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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO

ROSALVA PEREIRA DE ALENCAR

ESTÁGIO CURRICULAR E PRÁXIS PEDAGÓGICA EM ESPAÇOS NÃO


ESCOLARES: A CONSTRUÇÃO DE SABERES DOCENTES NOS CURSOS DE
PEDAGOGIA DA UNEMAT

CUIABÁ-MT
2019
ROSALVA PEREIRA DE ALENCAR

ESTÁGIO CURRICULAR E PRÁXIS PEDAGÓGICA EM ESPAÇOS NÃO


ESCOLARES: A CONSTRUÇÃO DE SABERES DOCENTES NOS CURSOS DE
PEDAGOGIA DA UNEMAT

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação


do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato
Grosso como requisito parcial à obtenção do título de doutora
em Educação na Área de Concentração Educação, Linha de
Pesquisa: Organização, Formação e Práticas Pedagógicas.

Orientadora: Professora Dra. Kátia Morosov Alonso

CUIABÁ/MT
2019
Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.

A368e Alencar, Rosalva Pereira de.


ESTÁGIO CURRICULAR E PRÁXIS PEDAGÓGICA EM ESPAÇOS NÃO
ESCOLARES: A CONSTRUÇÃO DE SABERES DOCENTES NOS CURSOS DE
PEDAGOGIA DA UNEMAT / Rosalva Pereira de Alencar. -- 2019
235 f. : il. color. ; 30 cm.

Orientadora: Kátia Morosov Alonso.


Tese (doutorado) - Universidade Federal de Mato Grosso, Instituto de Educação,
Programa de Pós-Graduação em Educação, Cuiabá, 2019.
Inclui bibliografia.

1. Estágio supervisionado. 2. Práxis pedagógica. 3. Saberes docentes. 4. Espaços


não escolares. I. Título.

Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada a fonte.


Aos meus pais Raimundo e Dauria (in memorian)

Pelas lutas silenciosas e silenciadas!

A vocês todas as letras, notas e sonhos!


AGRADECIMENTOS

Apesar de ser um trabalho solitário, esta tese é fruto da colaboração, de

trocas de experiências e saberes, empenho e confiança de muitas pessoas, razão

pela qual gostaria de externar a minha gratidão, carinho e reconhecimento a

todas as pessoas que, de algum modo, contribuíram para que este trabalho se

tornasse uma realidade.

Ao meu Deus e toda a espiritualidade, pela fé, iluminação e oportunidade

de continuar a caminhada, com a certeza de chegar à realização de um sonho, que

não era apenas distante, mas, praticamente, inatingível.

Aos meus irmãos, irmãs, sobrinhos(as) e cunhados(as) que, nas atitudes

mais simples, nos encontros felizes, nas prosas, alegrias e naqueles silêncios tão

eloquentes, e às vezes necessários, fomos juntos, caminhando pela vida, sem

soltar as mãos uns dos outros, mesmo nas adversidades! Meus esteios da/na vida!

À Caroline, minha menina do coração, que preenche os meus dias com sua

atenção, carinho e companhia!

Ao Alexandre, pela paciência, atenção, companheirismo e cuidados que

tornam os meus dias mais leves e felizes!

Ao Eduardo, meu pequeno príncipe!

A minha amiga-irmã Dora, pelas mãos estendidas e carinho fraterno!

Às amigas Waghma e Reila! Anjos e bênçãos na minha vida!

A minha amiga Ana Sebastiana, pelas escutas sensíveis e palavras

encorajadoras!

Ao amigo de longas caminhadas José Ferreira, pelas inúmeras prosas,

cafés, viagens e apoio solidário!


À Ilma, por sua generosidade, pelas experiências compartilhadas e por, na

simplicidade de suas atitudes, me ajudar a encontrar o meu lugar na Unemat: o

Estágio.

Ao meu amigo Romair, pelos inúmeros gestos de afeto!

Aos meus amigos queridos Rogério e Cleusa, pela partilha de boas risadas,

músicas, cervejas e pela companhia.

Aos amigos Garcia e Vivi pela alegria dos encontros!

A minha orientadora Katia Morosov Alonso! Pelas mãos estendidas e

braços abertos na acolhida, confiança, orientação e sabedoria na condução de

meus passos!

Ao Dimas! O meu carinho e admiração pelo espírito de luta e compromisso

político com a educação!

Ao Irton, pelo carinho, admiração e por aceitar fazer parte deste

momento, em que não poderia falar de estágio sem o seu olhar.

Aos membros da banca, professores Cristiano, Terezinha, Ednar e Danilo

pelas leituras cuidadosas e apontamentos enriquecedores.

Aos professores de estágio e estagiários que me acolheram e

contribuíram com a realização desse sonho!

Ao Letecê, pela acolhida, trocas e partilha de conhecimentos,

experiências, afetos e pela leveza diária que, mesmo à distância, tornaram meus

dias menos nublados!

Ao Programa de Pós Graduação, na pessoa da professora Ozerina, que me

abriu as portas da Universidade Pública para a realização de um sonho!

À Unemat por meio do Curso de Pedagogia que contribuiu com o processo

de doutoramento.

Aos amigos e amigas de caminhada, os quais não me é possível nominá-los

nesse momento, os meus agradecimentos especiais.


RESUMO

Esta pesquisa versa sobre o Estágio Curricular Supervisionado e a práxis pedagógica em


espaços não escolares, como possibilidade de apropriação, construção e (re)construção dos
saberes docentes no curso de Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara, da Universidade do
Estado de Mato Grosso. Esse enfoque surge da seguinte situação problematizadora: Como se
constitui a articulação teoria-prática nos espaços de educação não formal? Portanto, como
objetivo geral, buscamos compreender o estágio e a práxis educativa em espaços não
escolares no contexto da formação inicial, como espaço de apropriação, construção e
reconstrução de saberes docentes que emergem da ação educativa das pessoas envolvidas
nesse processo. Nesta investigação, utilizamo-nos do referencial teórico e metodológico que
se ancora nas ideias e argumentos apresentados por Nóvoa (1995, 1998), Pimenta (2011,
2012), Pimenta e Lima (2012), Tardif (2002), Barbier (2004), Denzin (2006), Haguette
(2000), entre outros. A abordagem metodológica sustenta-se na perspectiva qualitativa, por
meio da observação participante. Participaram desta pesquisa quatro professores, sendo dois
de cada curso de Pedagogia, e cinco grupos de alunos em situação de estágio durante a
realização de suas práticas. Destes, três grupos do campus de Cáceres e outros dois grupos do
Campus de Juara. Além da observação, realizamos entrevistas com os professores e com
aqueles estagiários que se dispuseram a participar. Os resultados da pesquisa evidenciaram
três dimensões: a primeira refere-se ao processo de instrumentalização teórico-prática,
destacando-se as contribuições do estágio para a constituição da identidade profissional, a
organização do trabalho pedagógico, os aspectos teórico-práticos, o desafio da (in)existência
de espaços não escolares, o planejamento das atividades educativas, o acompanhamento de
estagiários e a avaliação do estágio. A segunda dimensão refere-se à prática pedagógica dos
estagiários, qual evidenciou a (re)construção de saberes à medida em que a realidade social e
os interesses e necessidades da comunidade propiciaram a emergência de vários saberes e o
papel do educador social como articulador desses saberes. Por fim, a terceira dimensão
apresenta as reflexões produzidas pelos estagiários nos relatórios finais de estágio, em que se
destacam as contribuições para a formação profissional e perspectivas de ampliação de campo
de atuação do pedagogo. Os resultados confirmam a tese e evidenciam que o Estágio
Curricular Supervisionado em espaços não escolares possibilita a construção e (re)construção
de saberes docentes.

Palavras-chave: Estágio supervisionado. Práxis pedagógica. Saberes docentes. Espaços não


escolares
ABSTRACT

This research deals with the Supervised Curricular Internship and the pedagogical praxis in
non-school spaces, as a possibility of appropriation, construction or not of the teaching
knowledge in the Pedagogy course of Campi de Cáceres and Juara, University of the State of
Mato Grosso. This approach arises from the following problematizing situation: How is the
articulation of theory and practice in non-formal education spaces? Therefore, as a general
objective, we seek to understand the internship and educational praxis in non-school spaces in
the context of initial formation, as a space of appropriation, construction and reconstruction of
teacher knowledge that emerge from the educational action of the people involved in this
process. In this research, we use the theoretical and methodological framework that anchors
the ideas and arguments presented by Nóvoa (1995, 1998), Pimenta (2011, 2012), Pimenta e
Lima (2012), Tardif (2002), Barbier (2006), Denzin (2006), Haguette (2000), among others.
The methodological approach is based on the qualitative perspective, through participant
observation. Four teachers participated in this research, two of each Pedagogy course, and 05
groups of students in internship activities during their practices. Of these, 03 groups of the
campus of Cáceres and other 02 groups of the Campus of Juara. In addition to the
observation, we conducted interviews with the teachers and those trainees who were willing
to participate. The research results showed three dimensions: first, it refers to the process of
theoretical-practical instrumentalization, emphasizing the contributions of the stage of the
constitution of the professional identity, organization of the pedagogical work, the theoretical-
practical aspects, the challenge of the existence or non-existence of non-school spaces,
educational activities planning, trainees' accompaniment and internship evaluation. The
dimension second refers to the pedagogical practice of the trainees, which evidenced the
reconstruction of knowledge as the social reality and the interests and needs of the community
led to the emergence of various knowledges and the role of the social educator as articulator
of these knowledges. Finally, the dimension third presents the reflections produced by the
trainees in the final reports of the traineeship, in which the contributions to the professional
formation and perspectives of extension of the pedagogue's field of action stand out. The
results confirm the thesis and show that the Supervised Curricular Internship in non-school
spaces allows the construction and reconstruction of teaching knowledge.

Keywords: Supervised internship. Pedagogical praxis. Teacher knowledge. Non-school


spaces
LISTA DE QUADROS E IMAGEM

Quadro 1 - Os saberes dos Professores ...................................................................... 32


Quadro 2 - Característica do saber experiencial ......................................................... 33
Quadro 3 - Estágio Curricular Supervisionado em espaços não escolares ................. 85
LISTA DE SIGLAS

ANFOPE – Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEE – Conselho Estadual de Educação

CNE – Conselho Nacional de Educação

CONEPE – Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão

CONSUNI – Conselho Universitário

DCN – Diretrizes Curriculares Nacionais

DCNP - Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Pedagogia

ENDIPE – Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino

LDBN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação

PPC – Projeto Pedagógico do Curso

PPE – Projeto Pedagógico de Estágio

UNEMAT – Universidade do Estado de Mato Grosso


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 13
1 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO DAS DIRETRIZES
CURRICULARES NACIONAIS .......................................................................................... 18
1.1 Os saberes constitutivos da formação DE PROFESSORES: os desafios e as articulações
necessárias ................................................................................................................................ 23
1.2 A educação não formal no contexto da legislação e do curso de pedagogia da UNEMAT35
1.3 A formação de professores reflexivos ................................................................................ 43
1.4 A formação do pedagogo na Universidade do Estado de Mato Grosso no contexto das
reformas .................................................................................................................................... 51
2 O ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISONADO DOS CURSOS DE PEDAGOGIA
DA UNEMAT: UM ESPAÇO DE CONSTITUIÇÃO DE SABERES .............................. 59
2.1 Aproximações conceituais na articulação da teoria e da prática ........................................ 59
2.2 A ação educativa no estágio curricular supervisionado noS cursoS de Pedagogia da
Unemat ..................................................................................................................................... 68
2.2.1 A constituição do Curso de Pedagogia: aspectos introdutórios ....................................... 69
2.2.2 O estágio supervisionado: aspectos históricos e conceituais ........................................... 77
2.3 O Estágio Curricular Supervisionado em espaços não escolares: produção de saberes .... 88
3 OS CAMINHOS DA PESQUISA....................................................................................... 95
3.1 A pesquisa: características e métodos ................................................................................ 96
3.2 O campo da pesquisa .......................................................................................................... 98
3.2.1 Contextualizando o Campus Universitário “Jane Vanini” .............................................. 99
3.2.2 Contextualizando o Campus Universitário de Juara...................................................... 103
3.3 Sujeitos participantes da pesquisa .................................................................................... 106
3.4 Desenvolvimento da pesquisa: procedimentos e técnicas utilizadas ................................ 106
3.4.1 O percurso da pesquisa .................................................................................................. 110
3.4.2 A participação dos sujeitos na pesquisa ........................................................................ 112
3.4.3 O processo de instrumentalização teórico-prático ......................................................... 113
3.5 Apresentação e interpretação de dados ............................................................................. 117
4 A ARTE DE APRENDER/ENSINAR A SER PROFESSOR: AS VOZES DOS
SUJEITOS DA PESQUISA ................................................................................................. 120
4.1 Espaços não escolares em Cáceres ................................................................................... 120
4.1.1 Projeto Gonçalinho ........................................................................................................ 120
4.1.2 Hospital Regional de Cáceres “Antônio Fontes” .......................................................... 125
4.1.3 Rede cidadã integração, inclusão e cidadania ............................................................... 127
4.2 Espaços não escolares em Juara ....................................................................................... 130
4.2.1 Creche Municipal Thayná Gabrielly Oliveira Moraes .................................................. 130
4.2.2 Projeto “O Protagonismo da mulher e os desafios da sociedade contemporânea”. ...... 132
4.3. Espaços de educação não formal: lugar de aprendizagem para a vida em coletivos....... 136
4.3.1 Relação institucional e o papel educativo dos espaços parceiros .................................. 136
4.4 As práticas realizadas no estágio em espaços não escolares: o que revelam as entrevistas138
4.5 O estágio em espaços não escolares: o olhar dos estudantes/estagiários de Pedagogia dos
Campi de Cáceres e Juara ....................................................................................................... 158
4.6 Dimensões Resultantes das Interpretações Analíticas dos Dados .................................... 183
4.6.1 Instrumentalização Teórico-Prática ............................................................................... 183
4.6.2 A Prática Pedagógica ..................................................................................................... 203
4.6.3. Reflexões apresentadas pelos estagiários nos relatórios finais de estágio.................... 207
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 214
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 221
APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .......... 225
APÊNDICE B - INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS ...................................... 232
13

INTRODUÇÃO

A tessitura deste texto ocorre em um período marcado por um intenso processo de


mudanças nas políticas públicas no Brasil, principalmente em torno de questões relacionadas
à educação e formação de professores. Esse processo de reordenamento do papel do Estado
corporifica-se nos embates empreendidos pelas forças políticas polarizadas entre a esquerda e
a direita, que produzem, no cenário nacional, mudanças significativas na educação, tanto do
ponto de vista da concepção quanto de alcance das políticas públicas sociais, que incidem nas
várias esferas do processo educativo.
Desse modo, a política educacional dos últimos anos, na perspectiva da formação de
professores para a Educação Básica e superior torna-se mais emblemática e personifica-se em
pareceres e resoluções que, aos poucos, vão configurando as reformas educacionais
implementadas no País e produz as alterações nos currículos dos cursos de formação de
professores.
Essas alterações e ressignificações dos cursos traduzem as contribuições de
diferentes debates e argumentações sobre a formação de professores empreendidas por meio
de representação de entidades e organizações educacionais que demarcam seus
posicionamentos na correlação de forças entre as políticas oficiais e aquelas resultantes de
estudos, pesquisas e produções teóricas socializadas nos distintos espaços de formação.
As evidências dessa correlação de forças manifestam-se nas concepções e
reformulações das políticas educacionais para o País e carregam as marcas e interesses de
grupos hegemônicos que estão no poder. Nesse sentido, ousamos afirmar que a formação de
professores está impregnada das perspectivas políticas, sociais, culturais e econômicas que
marcam determinados contextos históricos da sociedade e que foram apropriadas e
selecionadas pelos cursos de formação.
Nessa perspectiva, o curso de Pedagogia no Brasil, em sua trajetória, passou por
mudanças significativas em face dessas transformações no processo de produção da
existência, bem como da organização social e este cenário torna-se (ex)implícito sobretudo na
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDBEN que define princípios, diretrizes,
valores sobre a educação e, consequentemente, sobre a formação de professores.
O curso de Pedagogia ofertado pela Universidade do Estado de Mato Grosso -
UNEMAT passou igualmente por essas mesmas transformações. As Diretrizes Curriculares
14

Nacionais (DCN) para o Curso de Pedagogia, exemplificativamente, trouxeram várias


mudanças que dizem respeito à formação e campo de atuação do pedagogo a partir de um
conjunto de elementos que compõem o arcabouço de saberes, de habilidades, valores,
objetivos, finalidades e perfil do egresso, entre tantas outras orientações.
Dentre essas orientações, destacamos a concepção de docência e seu papel de base da
profissão. Além disso, essas diretrizes alargam o campo de formação e atuação do pedagogo
nas atividades de ensino em espaços de educação formal e não formal, participação na
organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, com vistas ao atendimento às
necessidades sociais atuais.
Desse modo, influenciados pelas configurações das Diretrizes, os cursos de
graduação em Pedagogia da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT),
objetivando atender ao disposto na legislação, dão início ao processo de pensar e ressignificar
o currículo, de modo que os vários campos de conhecimento produzam um diálogo
epistemológico e prático mais coerente e coeso com a legislação. Esse processo de
constituição do novo curso de Pedagogia, no conjunto da comunidade acadêmica, foi,
paulatinamente, construindo e reconstruindo caminhos para que a questão da articulação entre
teoria e prática no Curso de Pedagogia se tornasse uma realidade dinâmica e orgânica entre os
saberes disciplinares, acadêmicos, pedagógicos e experienciais.
No entanto, as Diretrizes e a legislação interna da UNEMAT, que definiram a
mobilidade acadêmica e a organização curricular por sistema de créditos, desencadearam
novas discussões, debates, reflexões e resultados de pesquisas sobre o processo formativo e
como os sujeitos se apropriam, produzem e ressignificam os saberes, resultando em um
projeto pedagógico com uma dinâmica interna em que o estágio curricular supervisionado
torna-se parte do processo formativo desde a terceira esfera1 de formação, respectivo terceiro
semestre.

1
O termo esfera utilizado no Projeto Pedagógico do Curso surge da concepção e arquitetura curricular
sustentada na estrutura e funcionamento do átomo e, desse modo, é compreendido como campo gravitacional
que atrai diferentes elementos para o seu núcleo e, ao mesmo tempo, imana seus efeitos para os Núcleo
Epistemológico, Núcleos de Estudos, Temas Indutores, Esferas de Formação e Temas Catalizadores, dessa
maneira, a dinâmica do currículo constitui-se, pelo menos, de dois movimentos estruturantes: a) um movimento
que parte do Núcleo em direção à órbita, provocando integrações disciplinares; que se dá sob a forma de ondas
que transpassam os Núcleos de Estudos (DCN 001/2006); e, b) outro movimento que retorna, sob a forma de
fluxos, em direção ao Objeto de Estudo da Pedagogia, plasmando-se no Núcleo epistemológico. Ressalta-se,
então, que a intensidade da instituição de esferas de formação e da produção de saberes sobre a Educação,
15

Essa nova realidade na articulação da teoria/prática que se realiza no contexto do


Estágio Curricular Supervisionado produz reflexos também nas práticas realizadas em
espaços não escolares. Nesses locais, constituídos por projetos sociais, Organizações Não
Governamentais - ONGs, hospitais, sindicatos, organizações religiosas etc., há a necessidade
do desenvolvimento de práticas ancoradas na perspectiva da educação não formal e em
dinâmicas diferentes daquelas em que os alunos estão habituados nos estágios promovidos em
espaços escolares.
Nesse contexto, em que estão situados o Estágio Curricular Supervisionado e a
práxis pedagógica em espaços não escolares, surge a seguinte situação problematizadora:
Como se constitui a relação teoria-prática nos espaços de educação não formal?
Para responder a este questionamento, que orienta esta pesquisa, tomamos como
objeto de estudo o estágio curricular supervisionado e a práxis pedagógica em espaços não
escolares dos cursos de Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara, da UNEMAT.
O delineamento desta pesquisa toma como ponto de partida a minha2 relação com o
Estágio Supervisionado com foco nos espaços não escolares, no curso de Pedagogia da
UNEMAT, onde sou professora e atuo com essa disciplina há alguns anos. Essa vivência tem
me suscitado sentimentos de prazer, reconhecimento e pertencimento, mas também tensões e
inquietações advindas da percepção dos desafios enfrentados pelos alunos no
desenvolvimento da prática docente em situação de estágio em espaços não escolares.
A minha experiência com a prática do Estágio Supervisionado em espaços não
escolares, no Curso de Pedagogia, oportuniza-me a continuidade com as reflexões sobre a
articulação da teoria e da prática, mas sob um novo olhar e do lugar de pesquisadora, o que
nos possibilita vislumbrar os modos como realizam-se, no estágio, o processo de apropriação,
construção e (re)construção dos saberes docentes no curso de Pedagogia dos Campi de
Cáceres e Juara.
Assim, a partir das inquietações advindas da constituição do currículo do curso e da
prática educativa, delimitamos para esta investigação, como objetivo geral, compreender o
estágio e a práxis educativa em espaços não escolares no contexto da formação inicial, como

enquanto objeto de estudo da Pedagogia, está diretamente ligada à força (ou à atividade) dos Temas Indutores.
Analogamente, correspondente ao que se denomina de semestre. (UNEMAT, 2015, p.9)

2
Peço licença ao leitor para utilizar a linguagem escrita na primeira pessoa do singular, com pronomes
possessivos neste e no parágrafo seguinte, para expressar as experiências individuais que vivenciei no Estágio
Curricular Supervisionado na UNEMAT.
16

espaço de apropriação, construção e (re) construção de saberes docentes que emergem da ação
educativa das pessoas envolvidas no estágio.
Como objetivos específicos, por sua vez, delimitamos: evidenciar a concepção de
formação inicial presente nos referenciais teóricos que apontam sobre a formação inicial,
profissionalidade e a constituição da identidade profissional do pedagogo, tendo a práxis
pedagógica como o elemento propulsor da formação do pedagogo; descrever analiticamente
os aspectos relativos à articulação da teoria à prática no currículo do curso de Pedagogia;
evidenciar as práticas pedagógicas e a constituição de saberes docentes que se destacam
durante a realização do Estágio; e, por fim, interpretar as manifestações de apropriação,
construção e (re)construção dos saberes docentes a partir do estágio curricular supervisionado
no curso de Pedagogia.
A partir de tais objetivos, e conscientes dos riscos que a redução que ora nos
pautamos nos impõe, buscamos, por meio de levantamento bibliográfico, nos bancos de dados
de teses e dissertações da CAPES, as pesquisas que destacam o objeto deste estudo e
encontramos uma vasta produção que versa sobre o estágio e a práxis pedagógica, no curso de
Pedagogia e em outras licenciaturas que se aproximassem desta, no entanto, ainda que
compreendam objetivos semelhantes, não encontramos nenhuma pesquisa que tivesse o
enfoque que partisse das ações educativas em espaços não escolares como possibilidade de
construção e reconstrução de saberes, tomando a prática pedagógica dos estagiários como o
mote da formação.
Para tanto, a construção da pesquisa pauta-se na abordagem qualitativa, sob a
orientação metodológica da Observação Participante, cujos instrumentos utilizados para a
investigação são a análise documental, a entrevista com professores e estudantes estagiários,
observação das práticas educativas realizadas pelos estudantes, bem como suas reflexões
registradas nos relatórios finais de estágio.
Nesse sentido, tomamos como referência para a construção do delineamento da
pesquisa, as contribuições trazidas por Denzin (2006) e Haguette (2000); em relação aos
aspectos conceituais, históricos, políticos, teóricos e práticos utilizados para o
aprofundamento e compreensão acerca do estágio Curricular Supervisionado e a práxis
pedagógica, ancoramo-nos nas ideias e argumentos de Tardif (2002), Pimenta (2011, 2012),
Schön (1997), Pérez Goméz1997), dentre outros.
Nessa direção, no primeiro capítulo apresentamos argumentos teóricos e práticos
sobre a formação de professores no contexto das Diretrizes Curriculares Nacionais,
evidenciando os aspectos relativos à constituição de saberes docentes, à educação não formal
17

na legislação e no Curso de Pedagogia. Trouxemos para o estudo a formação de professores


na perspectiva reflexiva e abordamos, também, a formação do pedagogo no contexto da
Universidade do Estado de Mato Grosso.
No capítulo II, discutimos o estágio supervisionado no curso de Pedagogia da
UNEMAT, enfocando a prática pedagógica como espaço de constituição de saberes. Também
evidenciamos os aspectos conceituais sobre a articulação da teoria/prática e a ação educativa
no Estágio Curricular Supervisionado, apresentando aspectos relativos ao que está disposto na
legislação e às ações realizadas.
No capítulo III, explicitamos os aspectos metodológicos que orientaram o
desenvolvimento e a sistematização da pesquisa. Esse estudo ancora-se na abordagem
qualitativa sob a perspectiva da observação participante. Por isso, em tal capítulo,
descrevemos o campo empírico, sujeitos participantes, instrumentos, técnicas de produção e
interpretação de dados.
No quarto e último capítulo, apresentamos os dados coletados, oriundos da etapa da
observação participante e da entrevista realizada com os professores 3 e estagiários, bem como
fazemos a caracterização dos espaços não escolares e a descrição das práticas ali
desenvolvidas, informações sobre as quais realizamos a interpretação, produzindo o diálogo
entre os dados oriundos das interações com os interlocutores e os autores que nos auxiliam na
compreensão.
Nas considerações finais, sinalizamos que o Estágio Curricular Supervisionado em
espaços não escolares no Curso de Pedagogia de Cáceres está assentado em bases da
docência, enquanto que no Curso de Pedagogia em Juara, ancora-se na perspectiva da
Extensão, justificada pela (in)existência de espaços não escolares naquela cidade e região. A
partir disso, concluindo, refletimos sobre a necessidade de articulação das atividades de
extensão educativas às ações de docência.

3
Embora consciente das implicações teóricas e políticas quanto ao uso da grafia o(s)/a(s) para uma maior
fluência do texto, assim como outros pesquisadores adoto o uso dos termos estudantes, estagiários e professores
para referir-me, respectivamente, a professores e professoras, alunos e alunas. A distinção será mantida quando
for relevante para a discussão realizada.
18

1 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO CONTEXTO DAS DIRETRIZES


CURRICULARES NACIONAIS

O curso de Pedagogia, em sua trajetória no Brasil, passou por mudanças


significativas em razão das transformações no processo de produção, decorrentes da
organização social, que legitimaram interesses e necessidades de determinados grupos que
estão no poder e produziram reformas no âmbito educacional que se refletem nas concepções
e modos de operacionalização do curso de formação no chão da universidade.
Para além disso, sabemos que as atuais mudanças ocorridas no Curso de Pedagogia
se inscrevem no “conjunto de reformas do Estado, iniciado nos anos de 1990, cujo objetivo
foi o de adaptar a Educação às novas demandas da sociedade capitalista em base neoliberal”.
Essas mudanças são pensadas e articuladas de maneira que possam atender aos interesses do
capital (EVANGELISTA, TRICHES, 2012, p.186).
Desse modo, entendemos que as Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia,
aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação em 2006 compõem parte do cenário das
reformas educacionais promovidas na referida década e colaboram para a reconfiguração do
sistema educacional. Essa nova conformação atende ao processo de reordenamento do papel
do Estado sob as orientações de organismos internacionais, em várias frentes e níveis da
educação, mas, sobretudo, no que diz respeito às propostas para formação de professores.
No entanto, segundo Santos (2004), a “luta contra a globalização neoliberal exige um
projeto de país e de universidade que resista ao modelo de globalização capitalista”. A esse
respeito, Santos (2004) chama à centralidade o papel político e social da universidade nas
reformas:

[...] A reforma tem por objectivo central responder positivamente às


demandas sociais pela democratização radical da universidade, pondo fim a
uma histórica exclusão de grupos sociais e seus saberes de que a
universidade tem sido protagonista ao longo do tempo e, portanto, desde
muito antes da actual fase de globalização capitalista (SANTOS, 2004,
p.55).

Desse modo, a UNEMAT, utilizando-se de sua autonomia didático-científica e de


seu compromisso político com a comunidade onde está inserida, formula o currículo do curso
de Pedagogia na perspectiva de reconhecer, conceber e executar “políticas que instituam
mecanismos capazes de enfrentar algumas das situações (sociais e históricas) [...]” que
excluem grande parcela da sociedade do acesso ao ensino superior. Além disso, o currículo do
19

curso de Pedagogia tem por objetivo propiciar uma formação que atenda ao mercado de
trabalho, cada vez mais complexo e exigente, bem como produzir uma intervenção no
processo formativo, para que seja capaz de minimizar as “deficiências de leitura e escrita, que
são estruturais e históricas no processo de escolarização do país” (UNEMAT, 2015, p.6).
Outra preocupação igualmente desafiadora que se evidencia na constituição do
currículo do curso de Pedagogia diz respeito ao acompanhamento do avanço célere “das
tecnologias da comunicação e da informação, cujos resultados são perversamente distribuídos,
e que têm impactado a sociedade e de modo específico, bem como a comunidade
educacional” (UNEMAT, 2015, p.6). Esse contexto, aliado à histórica exclusão de
determinados grupos sociais, desafia a universidade a aprofundar e aprimorar a formação do
pedagogo, de maneira que possa atuar “em classes que incluem diferenças acentuadas,
decorrentes de necessidades educacionais especiais apresentadas por uma parcela significativa
dos estudantes” (UNEMAT, 2015, p.6).
Nesse contexto, o curso de Pedagogia, atendendo ao que dispõem as Diretrizes
curriculares que nos indicam muitas alterações advindas das várias esferas das políticas
públicas educacionais, em especial aquelas relativas às políticas de formação docente do
licenciado em Pedagogia, também sofre essas mudanças. Dentre elas, podemos destacar seu
lineamento aos aspectos que dizem respeito à ampliação das atribuições e responsabilidades
docentes em relação ao papel a ser desempenhado, tanto em seu processo formativo quanto
em sua atuação no processo ensino-aprendizagem.
Pode-se explicar tal situação por meio da literatura e das Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Pedagogia – DCNP, instituídas pelos pareceres CNE/CP Nº
05/2005 e 03/2006 e que resultaram na Resolução MEC/CNE Nº 01/2006. Nesse sentido, a
partir da leitura do Parecer 05/2005, podemos inferir que a composição das Diretrizes é
resultante de diferentes influências, uma vez que em tal documento considerou-se o que
estava determinado na legislação vigente, o processo de consulta e de discussões com
diferentes protagonistas da área de educação, experiências e propostas que apresentavam
ideias inovadoras. Também levou-se em consideração os índices de avaliações institucionais e
as potencialidades e carências das instituições escolares.
Além disso, a referida Resolução n. 1/2006, ao se pautar pela busca do consenso
entre as correlações de forças durante o seu processo constitutivo, aponta indicativos quanto à
formação que atenda às necessidade sociais atuais, assim como perspectivas para o campo de
atuação nas atividades de ensino em espaços de educação formal e não formal. Define
20

também que a formação deve focar na participação, na organização e gestão de sistemas e


instituições de ensino, para citar sucintamente.
Dessa forma, sob distintas influências e diversas perspectivas curriculares para a
formação do pedagogo, durante o seu processo constitutivo, as discussões produzidas pela
Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação - ANFOPE ganharam
espaços no processo de elaboração e concepção de formação do curso e do perfil do
licenciado, contribuindo com o delineamento de políticas públicas educacionais que apontam
perspectivas para a configuração de formação de professores que atendam às novas
necessidades educativas postas pelas exigências sociais.
Nessa direção, trazemos à discussão a compreensão acerca da finalidade do Curso de
Pedagogia orientado pelas Diretrizes Curriculares que, em seu Art. 2º, estabelece que,

[...] à formação inicial para o exercício da docência na Educação Infantil e


nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na
modalidade Normal, e em cursos de Educação Profissional na área de
serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam
previstos conhecimentos pedagógicos (BRASIL, 2006, p.11)

Dessa forma, os cursos de Pedagogia dos Campi de Juara e Cáceres da Universidade


do Estado de Mato Grosso, em seus Projetos Pedagógicos, explicitam essa diretriz a que se
destina o curso, como o alvo a ser alcançado em sua concepção e operacionalização. Percebe-
se, ainda, que o licenciado em Pedagogia ganha com essa Resolução uma ampliação de
espaço de atuação.
O Art. 4º da Resolução 01/2006 MEC/CP (BRASIL, 2006) reitera que o curso de
Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de licenciados para exercer funções de
magistério tanto na Educação Infantil quanto nos anos iniciais do Ensino Fundamental, além
dos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e ainda a Educação Profissional na área
de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos
pedagógicos.
Assim, nesse processo de constituição da Resolução que trata das diretrizes, algumas
ideias e posicionamentos da comunidade educacional ecoaram e foram incorporados ao
contexto. Um dos aspectos mais explícitos diz respeito aos conceitos de docência, que se
constitui a base de formação do pedagogo, e os conceitos igualmente importantes de gestão e
conhecimento.
Na Resolução 01/2006 (BRASIL, 2006) em seu artigo 2º, § 1º a concepção de
docência comporta diferentes atribuições,
21

Compreende-se à docência como ação educativa e processo pedagógico


metódico e intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e
produtivas, aos quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da
Pedagogia, desenvolvendo-se na articulação entre conhecimentos científicos
e culturais, valores éticos e estéticos inerentes a processos de aprendizagem,
de socialização e de construção do conhecimento, no âmbito do diálogo
entre diferentes visões de mundo (p.11).

O conceito de docência ora explicitado evidencia um fazer pedagógico que articula o


caráter político desse processo com o formativo numa perspectiva científica e técnica que seja
capaz de produzir saberes na formação inicial oriundos da academia, em consonância com
aqueles que advêm da prática social, em estreita vinculação com as relações intersubjetivas
produtoras de saberes, nas diferentes dimensões da ação educativa em espaços de educação
escolarizada e não escolares.
Desse modo, no processo de simbiose entre a ação educativa e o processo
pedagógico, nessa perspectiva de docência, evidencia-se a questão de práxis como uma ação
produzida histórica e socialmente. A esse respeito, Ferreira (2006) nos esclarece que,

a determinação da existência humana como elaboração da realidade,


verdadeiro sentido da práxis do ser humano, que não é atividade prática
contraposta à teoria, mas a abertura deste ser humano para a realidade em
geral, cuja dimensão mais essencial é a criação da realidade humano-social
(FERREIRA, 2006, p. 1345).

A autora nos traz elementos para a reflexão de que a criação da “realidade humano
social” se dá no diálogo entre o pensar, a realidade e o agir consciente e coletivamente,
produzindo, assim, as transformações a partir dos anseios das pessoas envolvidas nesse
processo. Essa constituição requer o diálogo entre os saberes da academia e as vivências
sociais construídas nas lutas forjadas em busca de conquista de direitos e acesso aos bens
(i)materiais socialmente produzidos.
Nesse contexto, a Resolução CNE/CP n. 1/2006 amplia as atribuições relativas à
docência previstas no Artigo 4º, parágrafo único:

Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação


na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando: I -
planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de
tarefas próprias do setor da Educação; II - planejamento, execução,
coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos e experiências
educativas não escolares; III - produção e difusão do conhecimento
científico-tecnológico do campo educacional, em contextos escolares e não
escolares (BRASIL, 2006, p. 2).
22

Nessa relação educativa, a Resolução evidencia que a docência requer uma nova
compreensão da dimensão pedagógica, que envolve a gestão e a administração dos fazeres
constituídos no trabalho docente. Isso significa dizer que a docência dialoga com a teoria e a
prática de modo a atender os anseios que emergem das coletividades dos diferentes espaços
educativos.
O educador, na sua práxis pedagógica, trabalha as dimensões do ensino, pesquisa e
extensão, que devem atender às várias áreas produtoras de conhecimento que se manifestam
de maneira indissociável ao ensino. Dessa forma, efetiva-se pesquisa e também a extensão,
pois entende-se que estas são interdependentes e simultâneas. Ao dimensionar o ensino,
pressupõe-se uma compreensão da pesquisa e da extensão, assim como nos explicita Freire
(2015, p.30) “não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino”.
Nessa perspectiva, ancoramo-nos nas ideias de Freire (2011) que reitera que ensinar
exige respeito aos saberes dos educandos, “por isso mesmo, pensar certo coloca ao professor
ou, mais amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os saberes com que os educandos,
sobretudo os das classes populares, chegam a ela”, mas também, conforme evidenciou o
autor, que seja discutido com os envolvidos a importância e necessidade de determinadas
práticas em relação com o ensino do conteúdo (FREIRE, 2015, p. 31).
Para contribuir, Gohn (2009) traz uma reflexão sobre a formação de professores no
campo da Educação Não Formal, e aponta a importância do papel do educador social, no
contexto dos espaços não escolares. Quanto a sua função social, em primeiro lugar, a autora
afirma que o educador social tem um “papel ativo, propositivo e interativo” (p.33).
A prática docente, nesses espaços, deve se constituir em um processo de desafio para
todos os participantes, em busca da compreensão dos contextos nos quais estão inseridos, a
partir dos problemas e das necessidades geradas na comunidade, para que possam produzir os
saberes necessários a esta última. Por essa razão, os Educadores Sociais junto às coletividades
são protagonistas na dinamização e construção de um processo participativo em que o diálogo
tematizado constitui-se o fio condutor da formação, e deve estar pautado por metodologias e
princípios teóricos orientadores das ações educativas que priorizem os saberes produzidos nas
lutas cotidianas em confronto com a realidade social e cultural para desencadearem novos
saberes.
Gohn (2009, p.33), tomando como parâmetro a Pedagogia de Paulo Freire,
acrescenta que a ação educativa desenvolvida pelo educador social deve ser composta de três
fases distintas: “a elaboração do diagnóstico do problema e suas necessidades, a elaboração da
proposta de trabalho [...] e o desenvolvimento do processo de participação de um grupo [...]”,
23

bem como a implementação da proposta, conforme a necessidade que emerge de uma


comunidade.
Essa prática educativa realiza-se numa perspectiva de trabalho comunitário, numa via
de mão-dupla que, enquanto ensina, aprende e, ao aprender, também ensina. Nesse processo,
torna-se possível problematizar as práticas cotidianas à luz dos conhecimentos experienciais e
pedagógicos, permeados por todos os demais saberes que se fizerem necessários à
ressignificação dos saberes coletivamente produzidos.
Desse modo, o fazer pedagógico parte de temas geradores que emergem da
percepção dos sujeitos da comunidade, que não se manifestam de maneira aleatória, pois,
coletivamente, são selecionados, trabalhados e relacionam-se com a vida cotidiana. Por isso,
Gohn (2009) sugere que a prática educativa deve relacionar-se aos aspectos da cultura local e
seus modos de vida, assim como questões relativas aos interesses de determinadas “faixas
etárias, de gênero, geracionais, nacionalidades, religiões e crenças, hábitos de consumo,
práticas coletivas, divisão do trabalho no coletivo, do grupo” (GOHN, 2009, p.33).
Nesse sentido, podemos estreitar os pensamentos de Freire e de Tardif, quanto à
perspectiva da construção dos saberes plurais que emergem das práticas docentes nos
diferentes contextos educativos, sejam eles escolares e/ou não escolares.

1.1 OS SABERES CONSTITUTIVOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES: OS


DESAFIOS E AS ARTICULAÇÕES NECESSÁRIAS

É importante trazer para a discussão os argumentos apresentados por Tardif (2002) e


Pimenta (2012) acerca da formação de professores, uma vez que os autores situam suas ideias
em pesquisas sobre a prática pedagógica, enfocando os saberes docentes como os saberes
necessários à configuração da docência.
Nesse sentido, reiteramos as ideias bastante atuais de Gadotti (1983, p.57), que nos
aponta a importância do componente político no processo de formação, quando afirma que o
“[...] papel do pedagogo é um papel político. Sempre que o pedagogo deixou de ‘fazer
política’, escondido atrás de uma pseudo-neutralidade da educação, estava fazendo, com a sua
omissão, a política do mais forte”, ou seja, servindo aos interesses da política da dominação e
deixando que sua ação pedagógica perca de vista o compromisso com a aprendizagem de
todos os sujeitos oriundos das camadas populares que estão/compõem os diferentes espaços
educativos.
24

Gadotti(1983) destaca ainda que,

O educador, o filósofo, o pedagogo, o artista, o político têm e tiveram,


historicamente, um papel eminentemente crítico: o papel de inquietar, de
incomodar, de perturbar. A função do pedagogo parece ser esta: à
contradição (opressor/oprimido, por exemplo) ele acrescenta a consciência
da contradição (GADOTTI, 1983, p. 58) (grifo do autor).

Tal argumento coloca um desafio para a formação do licenciado em Pedagogia, haja


vista que, no contexto atual, a tecnologia da informação e a relativização dos saberes
produzidos na celeridade da vida moderna colocam em pauta a necessidade de reconstruir-se
um debate em que os argumentos acerca da formação do profissional da educação tenha como
um dos princípios a formação para a cidadania, concomitantemente com a educação para o
mundo do trabalho.
Contribuindo com esse entendimento, Pimenta (2012, p.15) afirma que, na sociedade
contemporânea, a formação de professores deve colocar como pauta de seu trabalho a
necessidade de mediação nos processos constitutivos da cidadania dos alunos, de modo que
possa contribuir para minimizar e/ou superar o fracasso escolar, assim como as desigualdades
existentes nas relações sociais que se expressam nas escolas.
Ferreira (2006), referindo-se à formação do profissional da
educação, afirma que sua importância se situa na responsabilidade e no compromisso das
políticas educacionais emanadas pelo Poder Público. Nesse sentido, declara,

Defendo que a verdadeira cidadania e a verdadeira formação de


profissionais da educação são indissociáveis e, por isso, ambas necessitam
acontecer à luz dos princípios constitucionais que necessitam reger as
políticas públicas educacionais de formação dos profissionais que formam
para a verdadeira cidadania – que possa superar o individualismo, imperante
e acirrado –, pautada nos ideais de solidariedade humana (Brasil, Lei n.
9.394, art. 2º, 1996), justiça social e fraternidade a fim de que se possa,
efetivamente, ‘construir uma sociedade livre, justa e solidária’ (FERREIRA,
2006, p. 1343).

Assim, temos no contexto atual a expressão da política educacional para a formação


de professores na Resolução exarada pelo CNE/CP nº 01/2006, que trata da formação
específica do licenciado em Pedagogia. Nela, em seus artigos 2º e 4º, destaca-se que a
formação inicial é voltada para a docência, mas inclui também a área de serviços e apoio
escolar, assim como a atuação nas demais áreas em que sejam previstos conhecimentos
pedagógicos e amplia, desse modo, os espaços de atuação do pedagogo.
25

Essas várias frentes constitutivas da formação profissional do pedagogo encontram


argumentos em Pimenta (2012, p.20) no que diz respeito à identidade profissional que se
constrói, pois, a partir da “significação social da profissão; da revisão das tradições. Mas
também da reafirmação das práticas consagradas culturalmente e que permanecem
significativas”. Práticas essas que resistem às inovações porque são “prenhes de saberes
válidos às necessidades da realidade”.
Constrói-se também a partir do enfrentamento que se dá entre as teorias e as práticas,
uma reflexão constante das práticas nesse contexto e que, por conseguinte, produz novas
teorias. Além disso, a identidade profissional realiza-se tomando como base os significados
atribuídos pelos sujeitos envolvidos nesse processo formativo a partir do seu envolvimento,
do seu modo de ser e se constituir enquanto professor, enquanto ator e autor. Esse modo de
situar-se no mundo a partir de suas vivências, com os outros, na sua condição de sujeito com
seus questionamentos, seus desejos, seus saberes, é que significam o ser professor. Podemos
ilustrar tais argumentos nas interações com outros professores, nos sindicatos, nos espaços
não escolares, associações, dentre outros.
Numa relação dialógica com o posicionamento de Freire, Tardif (2002), anuncia que
os saberes docentes integram os diferentes saberes com os quais os professores mantêm
diferentes relações na prática educativa. Assim, pode-se “definir o saber docente como um
saber plural” que provém da formação profissional, de saberes disciplinares, dos saberes
curriculares e dos saberes experienciais. Dessa forma, Tardif (2002) explicita cada um dos
saberes, descrevendo-os sucintamente.
Como primeiro aspecto classificatório dos saberes docentes, o autor nos define em
que consistem os Saberes Profissionais. Para ele, esses saberes são compreendidos como o
“conjunto de saberes que são transmitidos nas instituições de formação de professores [...]
Esses conhecimentos se transformam em saberes destinados à formação científica” (2002,
p.36-37). E que quando esses saberes são incorporados à prática docente podem transformar-
se em tecnologia da aprendizagem. O autor esclarece que a prática docente não se limita
apenas aos saberes científicos, pois ela constitui-se uma ação que mobiliza os diversos saberes
que podem ser denominados de saberes pedagógicos.
Pimenta (2012, p.27) produz algumas reflexões acerca da fragmentação de saberes na
formação de professores, assim como sobre a flutuação da pedagogia enquanto estatuto
epistemológico de ciência que, ao “restringir-se ao campo aplicado das demais ciências da
educação, perde seu significado de ciência da prática educacional”. Assim, apoiando-se em
Houssaye (1995), a autora aponta caminhos de superação dessa situação por meio do
26

empenho coletivo na construção dos saberes pedagógicos, a partir das necessidades


pedagógicas postas pela realidade educativa e para além das suposições advindas das ciências
da educação.
A referida autora nos informa, ainda, que a pedagogia retomará sua especificidade a
partir da compreensão de que as ciências da educação devem tomar a prática do sujeito em
formação como o ponto de partida e de chegada, o que pressupõe a necessidade de reinventar
os saberes pedagógicos, a partir da prática social da educação, de modo que sua prática seja
ressignificada, permanentemente.
Esse ressignificar, em outras palavras, ancora-se nas discussões defendidas por Freire
(2015), considerando que os sujeitos da ação levam consigo dois princípios importantes: a
intencionalidade e o inacabamento. Por quê? Em que sentido? Todo educador social educa a
partir de uma intenção, de uma finalidade, com objetivos que estão direcionados para o
atendimento das necessidades que emergem dos grupos e/ou comunidades com as quais
trabalham e, nesse sentido, esses objetivos são inesgotáveis, inacabáveis.
Dessa forma, é interessante observar que a prática pedagógica não se faz apenas dos
saberes oriundos das ciências, ela reveste-se também de diferentes saberes, conforme
contribuições de Tardif (2002). Para o autor, os Saberes Pedagógicos são constituídos de
“concepções provenientes de reflexões sobre a prática educativa no sentido amplo do termo,
reflexões racionais e normativas que conduzem a sistemas mais ou menos coerentes de
representação e de orientação da atividade educativa” (TARDIF, 2002, p.37).
Nessa linha de compreensão, Pimenta (2012, p.23), alicerçada no conceito de
conhecimento discutido por Morin (1993), afirma que “conhecimento não se reduz a
informação”. Para a autora, conhecer “significa trabalhar com as informações, classificando-
as, analisando-as e contextualizando-as”. E não apenas isso, exige também “inteligência, a
consciência ou sabedoria”. Nesse caso, inteligência significa a capacidade de estabelecer
relações entre o conhecimento e a realidade, de modo a produzir novas formas de
conhecimento, de maneira continuada. Enquanto que a “consciência e sabedoria envolvem
reflexão, isto é, a capacidade de produzir novas formas de existência, de humanização”
(PIMENTA, 2012, p.23).
A autora acrescenta ainda que é nesse processo de constituição do conhecimento que
se percebem as possíveis relações entre conhecimento e poder, considerando que o sujeito de
posse da informação possui vantagens sobre os demais e a utiliza conforme seus interesses.
Numa sociedade como a brasileira, segundo Pimenta (2012, p. 23), “o acesso às informações
não se dá igualmente para todos os cidadãos”. Desse modo, faz-se necessário informar, mas,
27

sobretudo, trabalhar as informações por meio do estímulo provocativo da inteligência, por


meio de indagações, problematizações, da contestações, dentre outros.

Um enorme poder flui do conhecimento, mas não daqueles que o produzem.


Portanto, não basta produzir o conhecimento, mas é preciso produzir as
condições de produção do conhecimento. Ou seja, conhecer significa estar
consciente do poder do conhecimento para a produção da vida material,
social e existencial da humanidade (PIMENTA, 2012, p.24).

Pimenta (2012), trabalha a concepção de conhecimento a partir dos modos em que


são produzidos esses conhecimentos, isso significa que é necessário ter a consciência do
poder do conhecimento sobre a produção material, social e existencial e não daquele que o
produz.
O poder do conhecimento estabelece-se nas interações que se manifestam nos grupos
sociais, portanto, na coletividade, e possuem uma dimensão multirreferencial advinda dos
vários saberes socialmente construídos. É nesse sentido que Tardif (2002) menciona a
necessidade de entrecruzamento dos vários modos de saberes para a formação e
desenvolvimento da prática docente.
Essa perspectiva de percepção da prática situada numa dimensão de totalidade torna-
se um elemento chave para evitar possível fragmentação dos saberes da docência (saberes da
experiência, saberes científicos e saberes pedagógicos) apontados por Houssaye (1995).
Nessas circunstâncias, a prática social deve ser entendida como o ponto de partida e de
chegada que possibilita a ressignificação dos saberes na formação de professores.
Esse movimento constitutivo da formação se dá no fazer, que é o elemento da práxis
pedagógica que conduz o formando ao saber-fazer. Pimenta (2012) afirma que “a
especificidade da formação pedagógica, tanto a inicial como a contínua não é refletir sobre o
que se vai fazer, nem sobre o que se deve fazer, mas sobre o que se faz” (PIMENTA, 2012,
p.28).
Indo um pouco além, Pimenta (2012) reitera que o contato com os saberes
produzidos sobre a educação e sobre a Pedagogia, pelos professores, possibilita a
instrumentalização para que estes se autointerroguem e ressignifiquem as suas práticas, de tal
modo que nessa relação produzam-se saberes pedagógicos.
Explanando as ideias discutidas por Pimenta (2012) sobre os saberes pedagógicos
que emergem da práxis, Azzi (2012) considera que a atividade docente constitui a “expressão
do saber pedagógico” e também que esses saberes são fundamentos e produtos da atividade
28

docente, que acontecem nos contextos educativos, com sujeitos envolvidos no processo de
ensino e aprendizagem (AZZI, 2012, p.51).
O envolvimento do educador na atividade docente gera as respostas que traduzem
sua forma de intervenção sobre os espaços educativos em que atua. Essas respostas
constituem os saberes particulares daquele professor e, por isso, não podem, nessa etapa, ser
entendidas como saber pedagógico. Isso porque este saber é construído “a partir do
conhecimento e/ou saber que o professor possui” e na relação de experiências e “vivências,
isto é, na relação teoria-prática que é a ação docente” (AZZI, 2012, p.52).
Além dos saberes até aqui explicitados, Tardif (2002) apresenta a concepção de
saberes disciplinares como aqueles que correspondem aos vários campos do conhecimento
que se encontram presentes nos cursos de formação de professores e nas instituições de
ensino, sob a forma de disciplinas. Esses saberes são socializados independentemente das
especificidades dos cursos porque são saberes que surgem das manifestações culturais dos
diferentes grupos sociais ao longo das gerações.
Os saberes disciplinares compõem o arcabouço dos saberes pedagógicos, mas
referem-se a conhecimentos disciplinares, enquanto os saberes pedagógicos são constituídos
do fazer, da práxis. E, neste campo, insere-se o Estágio Curricular Supervisionado. Podemos
ilustrá-lo da seguinte maneira: os estagiários dispõem da instrumentalização teórica para
pensar sua prática e, ao ir a campo, conhecem a realidade, que é o lócus de seu fazer. No
entanto, ao entrar em contato com o conhecimento de outrem, essas interações proporcionam
aos estagiários a elaboração do seu fazer pedagógico. Com esse fazer, eles compreendem a
ação docente como saber pedagógico.
Nesse sentido, Pimenta (2012) contribui com a compreensão do conceito de saberes
pedagógicos:
Os saberes pedagógicos podem colaborar com a prática. Sobretudo se forem
mobilizados a partir dos problemas que a prática coloca, entendendo, pois, a
dependência da teoria em relação à prática, pois esta lhe é anterior. [...] Essa
anterioridade, no entanto, longe de implicar uma contraposição absoluta em
relação à teoria, pressupõe uma íntima vinculação com ela. (PIMENTA,
2012, p.30)

A esse respeito, Libâneo (2011) atualiza-nos sobre a importância dos profissionais


serem formados nas universidades, porque “é o lócus da produção social do conhecimento, da
circulação da produção cultural em diferentes áreas do saber e do permanente exercício da
crítica histórico social” (p.48). Desse modo, a produção dos saberes disciplinares, ao se
ancorarem em pesquisas produzidas na área de formação, nas trocas institucionais e
29

profissionais, contribuem significativamente para a preparação e formação dos sujeitos em


formação que vão entender o que fazer, para que fazer, para quem fazer e o como fazer;
enfim, compreender o que significa a práxis.
Nesse processo de formação, Tardif (2002) aponta também sobre a importância e o
papel dos saberes curriculares, que estão subjacentes e correspondem aos “discursos,
objetivos, conteúdos e métodos a partir dos quais a instituição escolar categoriza e apresenta
saberes sociais por ela definidos e selecionados como modelo de cultura erudita e de
formação para a cultura erudita” (p. 38). Esses saberes encontram-se definidos nos currículos
e programas escolares com os quais os professores devem orientar sua prática educativa, nos
diferentes espaços de atuação.
Ainda para Tardif (2002), os saberes experienciais são aqueles que se desenvolvem
no exercício de suas funções e na prática de sua profissão, são específicos, baseados em seu
trabalho cotidiano e no conhecimento do seu meio. Esses saberes brotam da experiência e são
por ela validados. Eles incorporam-se à experiência individual e coletiva sob a forma de
habitus4 e de habilidades, de saber-fazer e de saber-ser.
Pimenta (2012, p.21) informa-nos que os saberes da experiência acompanham os
alunos que cursam a formação inicial desde os tempos escolares, quando se posicionam sobre
os modos de o professor ensinar, avaliando-os. Mais tarde, quando no estágio encontram-se
nos papéis de alunos e professores em formação, os estagiários apropriam-se de novas
experiências, embora normalmente não se reconheçam ainda como professores. “O desafio,
então, posto aos cursos de formação inicial é o de colaborar no processo de passagem dos
alunos de seu ver o professor como aluno e ao seu ver-se como professor”. Isto se faz
necessário como possibilidade de auxiliar na construção de sua identidade como professor.
Outro aspecto para o qual Pimenta(2012) nos chama atenção diz respeito à
compreensão de que os saberes da experiência são compostos daqueles saberes que são
produzidos pelos professores em sua prática cotidiana, “num processo permanente de reflexão
sobre sua prática, mediatizada pela de outrem” sejam eles seus colegas de trabalho, os textos
produzidos disponíveis na literatura educacional. Nesse contexto mediado pelas interações,
que ganham centralidade na “formação de professores os processos de reflexão sobre a

4
Habitus, segundo Tardif (2002, p.49), consiste em certas disposições adquiridas na e pela prática real. [...]
Podem transformar-se em um estilo de ensino, em ‘macetes’ da profissão e até mesmo traços da ‘personalidade
profissional’: eles se manifestam, então, através de um saber-ser e de um saber-fazer pessoais e profissionais
validados pelo trabalho cotidiano.
30

própria prática (SHÖN,1990) e do desenvolvimento das habilidades de pesquisa da prática


(MARTINS,1989; DEMO, 1990; LANEVE,1993; ANDRÉ,1994)” (PIMENTA, 2012, p.22).
Nesse entendimento, Tardif (2002) apresenta-nos três objetos constitutivos dos
saberes experienciais que não são objetos de conhecimento, mas estão vinculados à prática
educativa e, portanto, às condições da profissão:

a) As relações e interações que os professores estabelecem e desenvolvem


com os demais atores, no campo da prática; b) as diversas obrigações e
normas às quais o seu trabalho deve submeter-se; c) a instituição enquanto
meio organizado e composto de funções diversificadas (TARDIF, 2002,
p.50).

Desse modo, na perspectiva apresentada por Tardif (2002), é possível depreender que
os saberes experienciais surgem das práticas educativas cotidianas individuais e são por elas
validados nas diferentes situações em que se constituem as condições da profissão, sejam
essas nas interações entre os seus pares, seja durante o processo de formação, na elaboração
do projeto pedagógico ou, ainda, no atendimento às normas institucionais.
Na busca de aprofundar nossa compreensão sobre os saberes experienciais,
reportamo-nos às contribuições de Larrosa (2002) que pensa a educação a partir do par
experiência/sentido e define experiência como aquilo “que nos passa, o que nos acontece, o
que nos toca” (LARROSA, 2002, p. 21).
Em relação ao sentido, Larrosa (2002) o esclarece tomando o sujeito da experiência
como território de passagem, com uma superfície sensível que o afeta de algum modo, produz
alguns afetos, marcas, vestígios e efeitos, e, sobretudo, pela abertura de ser transformado pela
experiência, seja por um dia ou por um longo período. Afirma ainda que o “saber da
experiência se dá na relação entre o conhecimento e a vida humana, singular e concreta”
(LARROSA, 2002, p.24).
As contribuições acerca dos saberes experienciais trazidos por Larrosa (2002) e
Tardif (2002) complementam-se no diálogo produzido sobre os modos como cada ser humano
adquire ou vivencia a experiência:

Se a experiência é o que nos acontece e se o saber da experiência tem a ver


com a elaboração do sentido ou do sem-sentido do que nos acontece, trata-se
de um saber finito, ligado à existência de um indivíduo ou de uma
comunidade humana particular; ou, de um modo ainda mais explícito, trata-
se de um saber que revela ao homem concreto e singular, entendido
individual ou coletivamente, o sentido ou o sem-sentido de sua própria
existência, de sua própria finitude. Por isso, o saber da experiência é um
saber particular, subjetivo, relativo, contingente, pessoal. Se a experiência
31

não é o que acontece, mas o que nos acontece, duas pessoas, ainda que
enfrentem o mesmo acontecimento, não fazem a mesma experiência. O
acontecimento é comum, mas a experiência é para cada qual sua, singular e
de alguma maneira impossível de ser repetida. O saber da experiência é um
saber que não pode separar-se do indivíduo concreto em quem encarna. Não
está, como o conhecimento científico, fora de nós, mas somente tem sentido
no modo como configura uma personalidade, um caráter, uma sensibilidade
ou, em definitivo, uma forma humana singular de estar no mundo, que é por
sua vez uma ética (um modo de conduzir-se) e uma estética (um estilo). Por
isso, também o saber da experiência não pode beneficiar-se de qualquer
alforria, quer dizer, ninguém pode aprender da experiência de outro, a menos
que essa experiência seja de algum modo revivida e tornada própria
(LARROSA, 2002, p. 27).

As ideias e argumentos trazidos por Tardif (2002) e Larrosa (2002) traduzem a força
da relação existente entre o conhecimento e a vida humana, que mobiliza os sujeitos da
experiência nos modos como respondem aos acontecimentos de sua vida dando sentido às
situações, às coisas, e, principalmente, às formas como acontecem e produzem as
transformações em sua maneira de pensar e agir. Nesse sentido, o autor esclarece ainda que o
saber experiencial possui uma qualidade existencial pela sua relação imbricada com a vida
singular e concreta dos sujeitos.
Desse modo, utilizamos o seguinte quadro em que Tardif (2002) explicita a
pluralidade constitutiva dos saberes profissionais, situando-os nos espaços de atuação,
formação e experiências advindas das práticas educativas.
32

Quadro 1 - Os saberes dos Professores

Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição Modos de integração no


trabalho docente
Saberes pessoais; São aqueles adquiridos a partir Pela história de vida e pela
das vivências com a família, o socialização de vivências e
ambiente de vida, a educação no experiências sociais adquiridas
sentido lato etc. nos espaços de educação
informal e não formal;
Saberes provenientes da São aqueles oriundos dos estudos Se manifesta pela formação e
formação escolar anterior ainda não especializados etc. pela socialização dos saberes
(não especializada) adquiridos em ambientes pré-
profissionais.
Saberes provenientes da Os estabelecimentos de formação Pela formação e pela
formação profissional para o de professores, os estágios, os socialização das ações
magistério. cursos de formação em serviço, profissionais nas instituições de
formação continuada etc. formação de professores.
Saberes provenientes dos A utilização das ‘ferramentas” dos Pela utilização das ‘ferramentas’
programas curriculares e professores: programas, livros de trabalho, sua adaptação às
livros didáticos usados no didáticos, cadernos de exercícios, tarefas.
trabalho. fichas etc.
Saberes provenientes de sua A prática do ofício nos diferentes Pela prática do trabalho e pela
própria experiência na espaços educativos em que atua socialização profissional
profissão, nos diferentes sejam formais ou não formais, a
espaços educativos em que experiência dos pares etc.
atua.
Fonte: O quadro foi adaptado pela autora com dados extraídos do quadro originariamente elaborado
por Tardif (2002, p.63).

O quadro 1 evidencia que os saberes são produzidos coletivamente nas interações


entre os sujeitos e extrapolam àqueles saberes curriculares, disciplinares e contemplam
aqueles saberes denominados sociais que são oriundos de sua história de vida e de suas
vivências e experiências.
Outro aspecto igualmente importante, segundo Tardif (2002), diz respeito a todos os
saberes nele identificados que são realmente utilizados pelos professores no contexto de sua
profissão e dos espaços educativos escolares e não escolares onde atuam. Desse modo, Tardif
(2002) afirma que o saber profissional está, de certo modo, “na confluência entre várias fontes
33

de saberes provenientes da história de vida individual, da sociedade, da instituição escolar,


dos outros atores educativos, dos lugares formação, etc.” (TARDIF, 2002, p.64).
Retomando acerca dos saberes experienciais, Tardif (2002) esclarece-nos que a
“experiência provoca, assim, um efeito de retomada crítica (retroalimentação) dos saberes
adquiridos antes e fora da prática profissional. Ela filtra e seleciona os outros saberes,
permitindo assim aos professores reverem seus saberes, julgá-los e avaliá-los” (TARDIF,
2002, p.53).

Quadro 2 - Característica do saber experiencial

Definição de Saberes Experienciais Características


 Os saberes experienciais são definidos 1. Um saber ligado às funções dos professores
como o conjunto de saberes atualizados, 2. É um saber prático.
adquiridos e necessários no âmbito da 3. É um saber interativo, mobilizado e modelado no
profissão docente. Esses saberes não se âmbito de interações entre o professor e os outros
encontram sistematizados em doutrinas atores educativos.
ou teorias. São saberes práticos (e não da 4. É um saber sincrético e plural.
prática: eles não se superpõem à prática 5. É heterogêneo
para melhor conhecê-la, mas se integram 6. É um saber complexo, não analítico, que
a ela e dela são partes constituintes impregna tanto os comportamentos do ator, suas
enquanto prática docente). regras e seus hábitos, quanto sua consciência
discursiva.
 Os saberes experienciais formam um 7. É um saber aberto, poroso, permeável, pois
conjunto de representações a partir das integra experiências novas, conhecimentos
quais os professores interpretam, adquiridos ao longo do caminho e um saber-fazer
compreendem e orientam sua profissão e que se remodela em função das mudanças na
sua prática cotidiana em todas as suas prática, nas situações de trabalho.
dimensões. 8. É um saber personalizado.
9. É um saber existencial, pois está ligado não
somente à experiência do trabalho, mas também à
história de vida do professor.
10. É pouco formalizado. Ele é muito mais
consciência no trabalho do que consciência
sobre o trabalho.
11. E um saber temporal, evolutivo e dinâmico.
12. É um saber social construído pelo ator em
interação com diversas fontes sociais de
conhecimento, de competências, de saber-
ensinar provenientes da cultura circundante, da
organização escolar, dos atores educativos, das
universidades, etc.
Fonte: O quadro foi adaptado pela autora com dados conceituais discutidos por Tardif (2002, p.
109-110).

De acordo com as características apresentadas por Tardif (2002), os saberes


experienciais são frutos da experiência e, portanto, possuem uma relação tênue com os
“conhecimentos inspirados na técnica, na ciência positiva e nas formas dominantes do
34

trabalho material”. Para o autor, essa epistemologia tem como “objeto o ser humano e cujo
processo de realização é fundamentalmente interativo, chamando assim o trabalhador a
apresentar-se [...] com tudo que ele é”, ou seja, sua história, sua personalidade, seus recursos e
seus limites. (TARDIF, 2002, p. 111).
Tardif (2002) diz, ainda, que os “saberes experienciais surgem como núcleo vital do
saber docente, núcleo através do qual os professores tentam transformar suas relações de
exterioridade com os saberes em relações de interioridade com sua própria prática”. Para ele,
os saberes experienciais são formados de todos os demais, mas retraduzidos e ressignificados
a partir das certezas que são construídas na prática educativa e, sobretudo, na experiência
(TARDIF, 2002, p.55).
Desse modo, o professor deve estar aberto para construir os seus saberes
experienciais a partir do outro, do interlocutor (alunos), nas diferentes interações realizadas.
Portanto, não há um saber acabado. Deve-se ancorar no inacabamento. Essa compreensão
foge ao engessamento vivido pelo tecnicismo por tantos anos, presente na educação.
Finalizando, Tardif (2002) afirma que as múltiplas articulações realizadas entre a
“prática docente e os saberes, fazem dos professores um grupo social e profissional, cuja
existência depende, em grande parte, de sua capacidade de dominar, integrar e mobilizar tais
saberes enquanto condições para sua prática” (TARDIF, 2002, p.39).
Nesse contexto, os saberes da experiência compõem o arcabouço utilizado pelos
professores no processo de instrumentalização teórico-prática para a realização do estágio,
haja vista que, ao tempo em que os sujeitos revestem-se dos saberes disciplinares,
curriculares, profissionais, em seu percurso formativo, eles os ressignificam e os
reconfiguram a partir de suas vivências nos vários espaços educativos em que estão inseridos,
e também produzem os saberes pedagógicos e os saberes experienciais.
Assim, segundo Tardif (2002), “os saberes são elementos constitutivos da prática
docente. Essa dimensão da profissão docente lhe confere o status de prática erudita que se
articula, simultaneamente, com diferentes saberes” (p.39). Nessa direção, para o autor, os
saberes sociais são transformados em saberes escolares por meio dos saberes disciplinares e
curriculares, os saberes oriundos das ciências da educação, os saberes pedagógicos e os
saberes experienciais” (TARDIF, 2002, p.39). Todos esses saberes são mobilizados na
realização da prática docente e contribuem, em maior ou menor grau, de acordo com as
necessidades geradas na realidade escolar, para que o sucesso do processo ensino
aprendizagem aconteça.
35

1.2 A EDUCAÇÃO NÃO FORMAL NO CONTEXTO DA LEGISLAÇÃO E DO CURSO


DE PEDAGOGIA DA UNEMAT

A concepção de Educação Não formal, assumida neste estudo, ancora-se nas ideias e
contribuições trazidas por Gohn (2010) e “articula-se ao campo da educação cidadã [...] volta-
se para a formação dos cidadãos(as) livres, emancipados, portadores de um leque
diversificado de direitos, assim como de deveres para com o(s) outro(s)” (GOHN, 2010,
p.33).
Em consequência, a partir da concepção que toma a democratização do
conhecimento como possibilidade de emancipação dos sujeitos, este estudo está orientado
pela compreensão das práticas realizadas nos espaços não escolares, ancorada na perspectiva
da educação não formal como “um processo sociopolítico, cultural e pedagógico de formação
para a cidadania, entendendo o político como a formação do indivíduo para interagir com o
outro em sociedade” (GOHN, 2010, p.33).
A educação não formal, segundo Gohn (2010):

designa um conjunto de práticas socioculturais de aprendizagem e produção


de saberes, que envolve organizações/instituições, atividades, meios e
formas variadas, assim como uma multiplicidade de programas e projetos
sociais”. (GOHN, 2010, p.33).

A educação não formal inscreve-se nos marcos de uma teoria social crítica e
constitui-se um campo do conhecimento que costumeiramente se realiza em espaços sociais
de atendimento às comunidades ou grupos pertencentes às camadas populares que se
encontram em situações de vulnerabilidade social. Nesses espaços, as práticas de educação
não formal, segundo Gohn (2009), realizam-se “usualmente extramuros escolares, nas
organizações sociais, nos movimentos, nos programas de formação sobre direitos humanos,
cidadania, práticas identitárias, lutas contra desigualdades e exclusões sociais” (GOHN, 2009,
p.28).
Esses espaços, anteriormente assumidos, prioritariamente, pelos Movimentos
Sociais, ganham maior visibilidade no contexto atual, pela relação de proximidade e parceria
com a Universidade, nos diferentes cantos do país, o que se torna um fato importante pelas
possibilidades de trocas de saberes, mas, especialmente, pela legitimação das diferentes vozes
e manifestações em um espaço de resistência contra as políticas de segregação instaurada
pelas políticas oficiais do país.
36

Dessa forma, assumimos a perspectiva de que a educação não formal assume uma
feição eminentemente política, de compromisso com a formação e emancipação dos sujeitos,
nos diferentes contextos em que estão inseridos. Embora ela se manifeste nos espaços
lacunares, em que as políticas públicas sociais de Estado estejam ausentes ou sejam ainda
incipientes e/ou não possuam o devido reconhecimento e visibilidade social, a educação não
formal possui um alcance social muito grande.
Ousamos afirmar isso em razão de que a educação não formal atua em várias frentes,
em um processo com várias dimensões, tais como:

a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos; a


capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem de
habilidades e/ou desenvolvimento de potencialidades; a aprendizagem e
exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com
objetivos comunitários, voltadas para a solução de problemas coletivos
cotidianos; a aprendizagem de conteúdos que possibilitem aos indivíduos
fazerem uma leitura do mundo do ponto de vista de compreensão do que se
passa ao seu redor; a educação desenvolvida na mídia e pela mídia, em
especial a eletrônica etc (GOHN, 2009, p.31).

Desse olhar, é possível inferir que o processo formativo nos espaços não escolares
leva em consideração as vivências e experiências dos sujeitos envolvidos, tomando os saberes
produzidos pela comunidade como o ponto de partida e de chegada para desencadear a
produção e ressignificação dos saberes advindos dos grupos e aqueles oriundos do mundo das
ciências.
Nesse processo, a prática pedagógica desenvolvida nos espaços educativos não
escolares que se situam no campo da educação não formal, de acordo com Gohn (2009, p.
30), tem sido objeto de pesquisas, sobretudo a partir da crise da racionalidade científica,
ocasionada pelas transformações econômicas, sociais e culturais que, no contexto atual, tem
suscitado possibilidades para a emergência de novos “campos de produção de conhecimento e
áreas do saber que estavam invisíveis ou não tratadas como conhecimento ou saber
educativo”. Desse modo, torna-se imperioso para a universidade legitimar e reconhecer a
importância desses saberes no processo de desenvolvimento humano, a partir de sua inserção
e participação nesses espaços.
Daí decorre o seguinte questionamento: quais saberes compõem as práticas
pedagógicas e os processos educativos? Gohn (2009) destaca que, além daqueles saberes
oriundos das lutas empreendidas na busca de voz e direitos, existem outras dimensões da
realidade social que são igualmente produtoras de saberes, tais como “aquelas que advêm do
mundo das artes, do mundo feminino das mulheres, do corpo das pessoas, das religiões e
37

seitas, da cultura popular, das aprendizagens do cotidiano, via a educação não-formal”, que
são tecidos nos movimentos de emancipação dos sujeitos (GOHN, 2009, p.30).
Estas outras racionalidades que se realizam em diferentes projetos sociais
comunitários e organizações não governamentais também se constituem como espaços por
excelência para a formação e atuação profissional nos cursos de formação de professores,
tanto que os espaços de educação não formal foram inseridos na Resolução MEC/CP nº
01/2006, que estabelece as diretrizes para o Curso de Pedagogia.
Neste estudo, a Pedagogia é concebida como “a ciência da prática. [...] Ela se
constitui ‘a partir da prática dos educadores, tomada como referência para a construção de
saberes, no confronto com os saberes teóricos”. Portanto, a Pedagogia toma para si, “a
educação enquanto prática social”, parte da prática e a ela se dirige (PIMENTA, 2011, p.39).
Nessa direção, a relação instituída entre a universidade e a educação não formal
torna-se uma grande parceria do processo formativo do pedagogo, pelas suas características
de constituir-se como “um espaço concreto de formação com a aprendizagem de saberes para
a vida em coletivos”. A prática pedagógica desenvolvida em espaços assim constituídos, deve
considerar a produção de saberes nos vários aspectos, tais como emocionais, cognitivos,
aquisição de habilidades, atitudes e valores, de modo que estimulem e capacitem os
estagiários a produzir e ressignificar os saberes de suas vivências e experiências (GOHN,
2009, p.32-33).
Gohn (2009) apresenta como o eixo orientador do trabalho formativo nos espaços de
educação não formal a área de formação para a cidadania. Para a autora, essa área possui
vários desdobramentos, dentre eles, cita:

Educação para justiça social; educação para direitos humanos, sociais,


políticos, culturais, etc. Educação para liberdade. Educação para igualdade;
Educação para democracia. Educação contra discriminação. Educação pelo
exercício da cultura, e para a manifestação das diferenças culturais (GOHN,
2009, p. 32).

Tomando a compreensão de educação não formal a partir das ideias de Gohn,


recorremos ao enfoque dado a esse campo pela Resolução que trata sobre as diretrizes
Curriculares para o Curso de Pedagogia e que, em seu art. 4º, define as atribuições da
docência nos incisos I e III:

I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de


projetos e experiências educativas não-escolares; [...]; III - produção e
38

difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em


contextos escolares e não-escolares (BRASIL, 2006, p. 2).

Além da capacitação para as diferentes dimensões da atividade docente, o art. 5º, nos
incisos IV, IX, X, XIII e XIV que destacam aspectos relativos aos espaços não escolares,
apresentam as atribuições para as quais o egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto.
Em relação ao inciso IV5, este põe um desafio à prática educativa do educador social,
em especial, àquela desenvolvida em espaços não-escolares, considerando que, para a
realização de sua ação pedagógica, deve trazer para a discussão e reflexão os problemas e/ou
necessidades que emergem daquele coletivo. Somado a isso, os participantes desses espaços
estão em diferentes fases da vida humana, além de possuírem diferentes interesses e níveis de
formação. Essas múltiplas situações desafiam a realização de um trabalho articulado, coerente
e comprometido com os saberes ali produzidos e que são cotidianamente ressignificados pelos
envolvidos.
O inciso IX define, como mais uma das atribuições do egresso licenciado em
Pedagogia, a tarefa de identificar problemas de natureza social, cultural e educacional “com
postura investigativa, integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a
contribuir para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais,
religiosas, políticas e outras". Além disso, acrescenta o inciso X que também incumbe ao
egresso “demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza
ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais, religiões,
necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras”.
Por sua vez, o inciso XIII aponta que, além da docência, a gestão constitui-se um
trabalho do pedagogo, ao estabelecer que a este cabe “participar da gestão das instituições
planejando, executando, acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em
ambientes escolares e não-escolares”. Por fim, ao pedagogo é atribuída a função de
pesquisador que tenha suas experiências e vivências como objeto de investigação e reflexão,
conforme explicitado no inciso XIV:

Realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre


alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas
experiências não escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em

5
“Art. 5º O egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto a:
[...]
IV – trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em
diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e modalidades do processo
educativo” (BRASIL, 2006)
39

diferentes meios ambiental- ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre


organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas (BRASIL, 2006).

A orientação legal prescrita acerca da importância e necessidade de educadores


realizarem pesquisas que possibilitem conhecimentos sobre os estudantes e a realidade
histórica, social e cultural em que as suas experiências e práticas sociais são desenvolvidas
constitui-se um avanço na consolidação da educação não formal, no processo de formação
humana.
Nesse sentido, as diretrizes orientam como deve ser organizado o currículo, de modo
que contemple os saberes e fazeres próprios da atividade educativa como possibilidade de
compreender os espaços e os fenômenos em que o pedagogo atua, bem como possibilitar aos
interlocutores reconhecerem as principais demandas do trabalho educativo. Dessa forma, em
seu art. 6º, inciso I, as diretrizes estabelecem que a estrutura do curso de Pedagogia,
respeitadas a diversidade nacional e a autonomia pedagógica das instituições, constituir-se-á
de,

I - um núcleo de estudos básicos que, sem perder de vista a diversidade e a


multiculturalidade da sociedade brasileira, por meio do estudo acurado da
literatura pertinente e de realidades educacionais, assim como por meio de
reflexão e ações críticas, articulará:
b) aplicação de princípios da gestão democrática em espaços escolares e não-
escolares;
c) observação, análise, planejamento, implementação e avaliação de
processos educativos e de experiências educacionais, em ambientes escolares
e não-escolares;
e) aplicação, em práticas educativas, de conhecimentos de processos de
desenvolvimento de crianças, adolescentes, jovens e adultos, nas dimensões
física, cognitiva, afetiva, estética, cultural, lúdica, artística, ética e biossocial;
j) estudo das relações entre educação e trabalho, diversidade cultural,
cidadania, sustentabilidade, entre outras problemáticas centrais da sociedade
contemporânea;
k) atenção às questões atinentes à ética, à estética e à ludicidade, no contexto
do exercício profissional, em âmbitos escolares e não-escolares, articulando
o saber acadêmico, a pesquisa, a extensão e a prática educativa; (BRASIL,
2006, p.3).

Ainda no inciso II, acrescenta a necessidade da existência de um núcleo de


aprofundamento e diversificação de estudos voltados às áreas de atuação profissional
priorizadas pelo projeto pedagógico das instituições e que, atendendo a diferentes demandas
sociais, oportunizará, entre outras possibilidades, conforme a alínea “a”, “investigações sobre
processos educativos e gestoriais, em diferentes situações institucionais: escolares,
comunitárias, assistenciais, empresariais e outras” (BRASIL, 2006, p.3).
40

O Art. 8º, referindo-se aos termos do projeto pedagógico da instituição, prevê em


relação à integralização de estudos que esta será efetivada mediante o que preceitua os
seguintes incisos,

II - práticas de docência e gestão educacional que ensejem aos licenciandos a


observação e acompanhamento, a participação no planejamento, na execução
e na avaliação de aprendizagens, do ensino ou de projetos pedagógicos, tanto
em escolas como em outros ambientes educativos;
III - atividades complementares envolvendo o planejamento e o
desenvolvimento progressivo do Trabalho de Curso, atividades de monitoria,
de iniciação científica e de extensão, diretamente orientadas por membro do
corpo docente da instituição de educação superior decorrentes ou articuladas
às disciplinas, áreas de conhecimentos, seminários, eventos científico-
culturais, estudos curriculares, de modo a propiciar vivências em algumas
modalidades e experiências, entre outras, e opcionalmente, a educação de
pessoas com necessidades especiais, a educação do campo, a educação
indígena, a educação em remanescentes de quilombos, em organizações não-
governamentais, escolares e não-escolares públicas e privadas;
IV - estágio curricular a ser realizado, ao longo do curso, de modo a
assegurar aos graduandos experiência de exercício profissional, em
ambientes escolares e não-escolares que ampliem e fortaleçam atitudes
éticas, conhecimentos e competências: a) na Educação Infantil e nos anos
iniciais do Ensino Fundamental, prioritariamente; b) nas disciplinas
pedagógicas dos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal; c) na
Educação Profissional na área de serviços e de apoio escolar; d) na Educação
de Jovens e Adultos; e) na participação em atividades da gestão de processos
educativos, no planejamento, implementação, coordenação,
acompanhamento e avaliação de atividades e projetos educativos; f) em
reuniões de formação pedagógica.

Assim sendo, é possível perceber que a prática da atuação profissional ancora-se na


docência e na gestão educacional. A gestão, por sua vez, está implicada no âmbito
administrativo, pedagógico e nos diferentes espaços produtores de saberes. De acordo com
Ferreira (2006, p.1347), “participar da gestão, significa ação conjunta de “um fazer” que
também é conjunto e que se destina a todos, significa ação conjunta de “um fazer” que
exercita e “ensina a ser”.
Ferreira (2006) nos traz ainda a reflexão de que a “participação tem, portanto, um
caráter instrumental. Isto é, porque, ao se participar, exercita-se um direito de cidadania,
responsabiliza-se quem o faz, sobre o que faz e o que necessita ser feito”. Desse modo, nesse
trabalho coletivo, o exercício do diálogo, da valorização e do reconhecimento outro, gera a
ideia de pertencimento, de solidariedade e colaboração, além de aperfeiçoar os saberes na
relação com aquele grupo e comunidade.
Nesse sentido, segundo Ferreira (2006), a concepção de participação, portanto, não
se limita apenas a “um processo de atuação de caráter técnico. Possui um caráter e um
41

compromisso social arraigados em valores humanos que são públicos, democráticos,


solidários e não podem nem devem refletir interesses individualistas” (FERREIRA, 2006, p.
1347).
O Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia de Cáceres, orientado pelas Diretrizes,
descreve que o Curso prioriza a formação do Licenciado em Pedagogia, com vistas ao
exercício da docência na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Mas
não apenas para essas duas etapas da Educação Básica, pois também se propõe formar para a
docência na Educação de Jovens e Adultos e atuação educativa em espaços não escolares
(UNEMAT, 2015, p.5).
Igualmente, o PPC do Curso de Juara, prevê que o licenciado em pedagogia é
concebido como um profissional que seja capaz de exercer a docência na “Educação Infantil,
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental nas diferentes modalidades de ensino da atualidade,
permitindo-lhe questionar, analisar temas e práticas educacionais; propor e coordenar projetos
e pesquisas; planejar e gestar ações”, assim como também “desenvolver as atividades
educacionais em ambientes escolares e não escolares; além de atender às necessidades
educacionais da escola e da sociedade, em suas diferentes dimensões” (2013, p.11).
O PPC do Curso de Cáceres, pautado nas diretrizes emanadas da Resolução 01/2006,
parte da priorização e da compreensão da docência, delineando as principais funções que o
egresso do curso de Pedagogia deve desempenhar, nesse sentido precisa estar apto a

n) participar da gestão das instituições, planejando, executando,


acompanhando e avaliando projetos e programas educacionais, em
ambientes escolares e não-escolares;
o) realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre
alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas
experiências não escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em
diferentes meios ambiental-ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre
organização do trabalho educativo e práticas pedagógicas (UNEMAT, 2015,
p. 6).

Tomando os excertos descritos para uma leitura interpretativa, é interessante


perceber que o egresso deve ter sua formação e desenvolver suas aptidões, saberes e
habilidades para além da docência, incluindo a capacidade de gerir tanto instituições, quanto
programas e a gestão pedagógica. Nesse sentido, é possível inferir que a docência e a gestão
constituem-se o eixo da formação no curso de Pedagogia de Cáceres.
Outro aspecto igualmente importante diz respeito ao exercício da docência alicerçado
na pesquisa em que as práticas sociais desenvolvidas pelos sujeitos do processo ensino-
42

aprendizagem constituem-se objetos de investigação do fazer pedagógico, a fim de


compreender a realidade sociocultural e as manifestações de saberes produzidos nas
experiências escolares e não escolares.
O Currículo do Curso de Pedagogia de Juara objetiva promover a formação do
licenciado em Pedagogia “como profissionais da Educação, sustentado na e pela articulação
entre a prática e a teoria, com destaque nos processos de ensino e aprendizagem em espaços
escolares e não escolares”, e para que, nesse processo formativo, seja capaz “de inferir,
intervir e cooperar teórica e metodologicamente na realidade de sua inserção e atuação
profissional” (UNEMAT, 2013, p.11).
Em Juara, a organização curricular do curso de Pedagogia baseia-se nos pressupostos
que se relacionam à pesquisa, conforme explicitado:

As práticas de docência orientam os licenciados à observação, planejamento,


sistematização, implementação e avaliação da aprendizagem e da
organização do trabalho docente em ambientes escolares e não escolares. As
atividades complementares, orientadas pelos docentes, envolvem a
participação dos acadêmicos nos eventos de cunho científicos, monitorias,
iniciação científica, projetos de pesquisa e extensão junto a outras instâncias
da sociedade civil, com possibilidades de estudos envolvendo questões da
educação popular, educação especial, educação do campo, educação de
jovens e adultos, educação escolar indígena, educação ambiental,
diversidade social e cultural, relações raciais e políticas educacionais. Os
estágios curriculares deverão acontecer no decorrer do curso, garantindo aos
graduandos a atuação pedagógica nos contextos escolares e não escolares
(UNEMAT, 2013, p.12).

As informações ora apresentadas, extraídos da Resolução CNE/CP nº 01/2006 e dos


Projetos políticos dos Cursos de Cáceres e Juara, possibilitam-nos inferir que a multiplicidade
de modalidades e os vários espaços permitem ao educador social pensar uma relação
intrínseca da convivência e das experiências, valorizando os saberes oriundos das dimensões
sociais e educativas, para que esse educador possa atuar de maneira ética e comprometida
com todos aqueles que compõem a comunidade e/ou grupos sociais.
Nesse contexto, uma tarefa importante que se coloca ao educador social é o seu
pertencimento àquela coletividade, de modo que sua ação educativa seja planejada, tomando
por base essa relação. Ademais, o diálogo nas relações intersubjetivas deve ser construído
horizontalmente, de modo que a voz de todos ecoe de maneira equitativa, numa dimensão de
respeito mútuo. Essa relação menos hierárquica possibilita a escuta sensível e, ao mesmo
tempo, direciona a busca de respostas ou soluções às inquietações e necessidades oriundas
daquela coletividade.
43

Essas e tantas outras possibilidades que se colocam para a prática educativa suscitam
algumas inquietações quanto à formação e ao papel do educador, num contexto marcado pelas
diferenças sociais, culturais, religiosas e de escolarização, que são visíveis tanto em relação às
possibilidades de acesso aos saberes e aos bens imateriais socialmente produzidos, quanto ao
distanciamento que dificulta esse mesmo acesso, em função do lugar que ocupa no contexto
social.
Esse quadro demanda uma formação que esteja qualificada tecnicamente com o
domínio dos saberes profissionais, socialmente engajada e comprometida com uma parcela
significativa da sociedade que é silenciada e excluída de seus direitos. Portanto, essa é a
perspectiva de formação que o educador, para atuar nos contextos não escolares, deve estar
revestido em seu processo formativo e atuação profissional.

1.3 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES REFLEXIVOS

A necessidade em compreender a formação de professores numa perspectiva que


coloca o diálogo entre o professor, o aluno e o mundo como eixo orientador das relações
intersubjetivas, tomando a questão da práxis pedagógica como um espaço de construção de
saberes, é o ponto de partida para nosso estudo. Essas relações mediadas pelas diferentes
percepções e apreensões da realidade, situadas nas experiências dos sujeitos, devem ser
capazes de produzir uma prática docente baseada na reflexão da ação educativa, que permeia
todo o processo formativo dos sujeitos enquanto partícipes autônomos da sua aprendizagem.
Nessa direção, abordar a formação de professores implica situá-los como sujeitos
históricos, constituídos nas interações sociais estabelecidas nos diferentes espaços e
dimensões da vida humana, tais como na família, local em que se constrói saberes desde o
nascimento, na escola, nos movimentos sociais, e em outros lugares onde as pessoas tecem
suas vivências cotidianamente. Além disso, a formação também se realiza na elaboração e
reelaboração dos saberes advindos da instituição de ensino, por meio dos seus currículos,
normas, princípios pedagógicos, objetivos e finalidades educativas. Ainda existem aqueles
saberes que são adquiridos nas relações de trocas de vivências e experiências realizadas com
seus pares no campo do trabalho e nos cursos de formação.
Encontramos explicação para essas ideias em Tardif (2002), quando afirma que os
saberes profissionais não são produzidos pelos professores, pois são exteriores ao ofício de
ensinar, e surgem de lugares sociais que antecedem à profissionalização. Desse modo, “os
44

saberes profissionais estão na confluência entre várias fontes de saberes que estão ligadas à
história de vida individual, da sociedade, da instituição, de outros atores educativos, de cursos
de formação, etc.” (p.44).
Assim, Tardif (2012) traz à cena a reflexão de que os saberes que servem como base
para o ensino são aparentemente caracterizados pelo que o autor denomina de sincretismo,
definido em três concepções fundamentais. Para o autor, sincretismo “significa, em primeiro
lugar, o que seria vão, a nosso ver, procurar uma unidade teórica, ainda que superficial, nesse
conjunto de conhecimentos, de saber-fazer, de atitudes e intenções” (p.64). De acordo com o
autor, os professores possuem algumas concepções sobre o aluno, educação, ensino, gestão,
mas essas concepções não expressam uma totalidade, “um professor não possui habitualmente
uma única concepção de sua prática, mas várias concepções que utiliza em sua prática, em
função, ao mesmo tempo, de sua realidade cotidiana e biográfica e de suas necessidades,
recursos e limitações” (p.65).
Outro aspecto que diz respeito à concepção de sincretismo, segundo Tardif, significa
que a relação entre os saberes e o trabalho docente não podem ser pensados “segundo o
modelo aplicacionista seguindo a racionalidade técnica utilizados na maneira de conceber a
formação dos profissionais e no qual os saberes antecedem a prática, formando uma espécie
de repertório de conhecimentos” a priori, os quais, posteriormente, serão aplicados na ação
(2002, p.65).
O autor afirma que não há soluções prontas aos problemas que emergem da prática
docente, desse modo, torna-se impossível pensar em aplicação de modo de fazer pedagógico,
padronizados. Esses saberes-fazer constituem-se na mobilização de diferentes saberes
construídos ao longo da formação, de modo que possa responder determinadas situações de
ensino.
Por último, por sincretismo, de acordo com o teórico, entende-se que o ensino “exige
do trabalhador a capacidade de utilizar, na ação cotidiana, um vasto leque de saberes
compósitos. Ao agir, o professor se baseia em vários tipos de juízos práticos para estruturar e
orientar sua atividade profissional” (ibidem, p.66).
De tais ideias, podemos inferir que as decisões que são tomadas na prática docente
estão carregadas de valores morais, sociais e éticos que são adquiridos ao longo da vida.
Também, nesse processo, o professor utiliza-se daquelas informações que são oriundas de
saberes escolares, vivências e experiências pedagógicas e profissionais. Para Tardif, essas
vivências constituem-se “fonte viva de sentidos a partir da qual o próprio passado lhe
possibilita esclarecer o presente e antecipar o futuro” (2002, p.66). Portanto, a prática docente
45

está permeada por valores, normas, tradições e experiências vividas que, em nossa
compreensão, são os elementos nos quais são estabelecidos os critérios que servem como
parâmetros para emitir juízos profissionais.
A esse respeito, Pérez Gómez (1997) afirma que a formação de professores não pode
“considerar-se um domínio autônomo de conhecimentos e decisão. Pelo contrário, as
orientações adotadas ao longo de sua história encontram-se profundamente determinadas
pelos conceitos de escola, ensino e currículo prevalecentes em cada época” (PÉREZ GÓMEZ,
1995, p.95).
Nessa direção, Tardif (2002, p.66) afirma que os saberes do professor são
constituídos pelo “uso de raciocínios, de conhecimentos, de regras, de normas e de
procedimentos variados, decorrentes do tipo de ação nas quais o ator está concretamente
envolvido juntamente com os outros”, envolvidos na prática educativa.
A dimensão da prática educativa tecida neste estudo ancora-se na perspectiva do que
o autor denomina de epistemologia da prática profissional, que é compreendida como “o
estudo do conjunto dos saberes utilizados realmente pelos profissionais em seu espaço de
trabalho cotidiano, para desempenhar todas as suas tarefas” (TARDIF, 2002, p.255).
Também trazemos para este estudo a noção de ‘saber’ em um sentido amplo, que
“engloba os conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes, isto é,
aquilo que muitas vezes foi chamada de saber, saber-fazer e saber-ser”. Esses elementos
constituem tanto a formação quanto a atuação profissional e pressupõem uma gama de saberes
oriundos do campo científico, e aqueles constituídos na prática educativa, além de outros
resultantes de sua história de vida, de seus valores, princípios éticos, morais e sociais
(TARDIF, 2002, p.255).
A epistemologia da prática profissional, nos argumentos apresentados pelo teórico,
possui a finalidade de revelar esses saberes, compreendê-los em sua articulação e na prática
educativa desenvolvida pelos profissionais, e ainda, “como estes os incorporam, produzem,
utilizam, aplicam e transformam em função dos limites e dos recursos inerentes às suas
atividades de trabalho” (TARDIF, 2002, p.256). Mas não apenas isso, para o autor, a
epistemologia da prática profissional visa compreender a natureza dos saberes socialmente
produzidos, que envolve os aspectos pessoais, formativos e profissionais, e também objetiva
compreender o papel que esses saberes desempenham na relação de trabalho como docente e
como se manifestam na constituição de sua identidade profissional.
Assim, tomamos de empréstimo três questões apresentadas por Schön (1997) a partir
das quais é possível refletir sobre a formação de professores nessa perspectiva: a primeira
46

delas trata sobre as competências que os professores deveriam ajudar as crianças a


desenvolverem; a segunda, aborda os tipos de conhecimentos e de saber-fazer que permitem
aos professores desempenharem o seu trabalho eficazmente; e, por último, questiona os tipos
de formação mais viáveis para equipar os professores com as capacidades necessárias ao
desempenho do seu trabalho.
Atualmente, é possível perceber que os conhecimentos na educação, no Brasil,
também se reflete em outras áreas de formação profissional, ou seja, estamos mergulhados em
inseguranças quanto à formação que dê conta de atender a multiplicidade de exigências diante
de um mundo globalizado, determinista, mediado pelo avanço das tecnologias da informação
que torna o conhecimento muito volátil, relativizado e, neste contexto, coloca a necessidade
da busca de uma nova epistemologia da prática profissional que possa resgatar a possibilidade
de responder às questões que emergem da prática educativa. Dessa forma, o autor afirma que,
na educação, esta crise centra-se em um conflito entre o saber escolar e a reflexão-na-ação dos
professores e alunos.
Para isso, Schön (1997) destaca dois aspectos diferentes a serem considerados em
relação ao conhecimento, a aprendizagem e o ensino. Em primeiro lugar, deve-se ter a clareza
sobre o saber escolar, pois é um tipo de conhecimento científico ou instrucional que os
professores possuem e são carregados de normas e verdades aceitas na academia, e que
transmitem aos alunos. Esse saber também pode ser definido como molecular e categorial.
Desse modo, para o autor, a “estratégia de ensino baseada no saber escolar é análoga à
estratégia e concepção do conhecimento, implícitas na vaga atual de reformas educativas”,
considerando que “[...] quando o governo procura reformar a educação, tenta educar as
escolas, do mesmo modo que estas procuram educar as crianças” (SCHÖN, 1997, p.82).
O autor traz como segundo aspecto a visão do conhecimento e do ensino através do
exemplo dos professores que deram razão ao aluno e que reconheceram nas crianças, o que
designa

de ‘conhecimento tácito’: espontâneo, intuitivo, experimental, conhecimento


quotidiano, do tipo revelado pela criança que faz um bom jogo de
basquetebol, que conserta uma bicicleta ou uma motocicleta ou que toca
ritmos complicados no tambor, apesar de não saber fazer operações
aritméticas elementares” (SCHÖN, 1997, p.82).

Nessa perspectiva, o excerto demonstra que o professor, atento para entender as


formulações e organização cognitiva das crianças, as ajuda a articular o seu processo de
conhecimento na ação com o saber escolar. Para o autor, esse tipo de ensino é uma forma de
47

“reflexão-na-ação que exige do professor uma capacidade de individualizar, isto é, de prestar


atenção em um aluno, mesmo numa turma de trinta, tendo a noção do seu grau de
compreensão e das suas dificuldades” (p.82). O maior destaque neste caso, diz respeito à
compreensão do desenvolvimento do conhecimento do aluno que serve como parâmetro para
tomada de decisão sobre o acompanhamento individualizado da criança, valorizando, desse
modo, o conhecimento produzido por ela. A esse respeito, tomamos como exemplo sua
opinião sobre a individualização no ensino dos rudimentos da leitura:

Todos os indivíduos devem, no mais curto espaço de tempo, ser ensinados


individualmente de modo a adquirir a arte da leitura. Por isso deverá haver
um método particular para cada um deles. O que é uma dificuldade
intransponível para um, não o será para outro, e vice-versa. A um aluno que
tenha boa memória, ser-lhe-á mais fácil memorizar as sílabas do que
compreender as consoantes mudas [...]. Outro compreenderá instintivamente
a lei da combinação das palavras lendo-as na íntegra. O melhor professor
será o que tiver uma resposta pronta para a questão que preocupa o aluno.
Estas explicações dão ao professor o conhecimento do maior número
possível de métodos, a capacidade de inventar novos métodos e, acima de
tudo, não provocam uma adesão cega a um método, mas a convicção que
todos os métodos são unilaterais e que o melhor método será o que der a
melhor resposta a todas as dificuldades possíveis que o aluno tiver, quer
dizer, não um método, mas uma arte e um talento (SCHÖN, 1997, p.82-83).

Neste exemplo, podemos perceber que o processo de reflexão-na-ação, pode ser


desenvolvido em momentos distintos e exige uma prática educativa em que a percepção do
professor esteja permanentemente aguçada, de modo a captar as dificuldades, os avanços e os
modos como se articulam os saberes e retornar aos saberes disciplinares e curriculares, em um
processo contínuo de reflexão e ação, mediado pelas interações entre professor e aluno.
Nessa perspectiva, seguindo as ideias de Schön (1997), inicialmente, o
professor reflexivo é aquele que se permite ser surpreendido pelo conhecimento que o aluno
demonstra ao realizar determinada ação. Em seguida, o professor vai refletir sobre a
manifestação do conhecimento expressa pelo aluno e, ao mesmo tempo, reflete sobre o fato
surpreendente diante da produção do aluno. Posteriormente, num terceiro momento,
“reformula o problema suscitado pela situação; talvez o aluno não seja de aprendizagem lenta,
mas, pelo contrário, seja exímio no cumprimento das instruções” (SCHÖN, 1997, p. 83).
Avançando um pouco mais, o teórico trata de um momento especial em que:

[...]se efetua uma experiência, estabelecendo uma nova tarefa para testar a
sua nova hipótese, que formulou sobre o modo de pensar do aluno que
provoca no professor uma reflexão diante da ação que significou a produção
48

de conhecimento do aluno, demonstrado na realização das ações, a partir de


seu campo de vivência. Este processo de reflexão-na-ação não exige palavras
(SCHÖN, 1997, p. 83).

Diante da representação dos saberes dos alunos, é necessário perceber que não há um
saber exclusivo, único, que defina uma verdade absoluta sobre as coisas. Assim, é preciso que
os professores possibilitem a emergência de diferentes saberes individualmente produzidos,
que são socialmente válidos e que devem ser reconhecidos e encorajados, de modo a
possibilitar a reflexão sobre o ensino e os conhecimentos produzidos. E, nesse sentido,
segundo Schön (1997, p.83), refletir sobre a reflexão-na-ação é uma acção, uma observação e
uma descrição, que exige o uso de palavras”.
Nessa linha de raciocínio, Schön (1997), acrescenta que:

Uma iniciativa que ameace esta visão do conhecimento também ameaça a


escola. Quando um professor tenta ouvir os seus alunos e refletir-na-ação
sobre o que aprende, entra inevitavelmente em conflito com a burocracia da
escola. Nesta perspectiva, o desenvolvimento de uma prática reflexiva eficaz
tem que integrar o contexto institucional. O professor tem de se tornar um
navegador atento à burocracia. E os responsáveis escolares que queiram
encorajar os professores a tornarem-se profissionais reflexivos devem tentar
criar espaços de liberdade tranquila onde a reflexão-na-ação seja possível.
Estes dois lados da questão - aprender a ouvir os alunos e aprender a fazer da
escola um lugar no qual seja possível ouvir os alunos – devem ser olhados
como inseparáveis (SCHÖN, 1997, p.87).

Assim, recorremos ao questionamento proposto por Schön (1997): “o que significa,


então, tentar formar um professor para que ele se torne capaz de refletir na e sobre a sua
prática?” (p.88). A resposta que se aproxima a tal indagação é a de que o professor deve estar
aberto às manifestações de aprendizagem desencadeadas no processo educativo, fazendo a
interação dialógica com o aluno, valorizando as tradições escolares e da comunidade e,
sobretudo, o que se aprende a fazer fazendo, considerando as tentativas que os alunos
começam a esboçar na prática junto com os demais que estão na mesma situação antes mesmo
da compreensão racional do que estão fazendo.
Desse modo, segundo Schön (1997), tudo isto tem lugar num practicum que é por ele
denominado de “mundo virtual e que representa o mundo da prática” (p.89). A concepção de
mundo virtual, para Schön (1997), “é qualquer cenário que representa um mundo real, um
mundo da prática, e que nos permite fazer experiências, cometer erros, tomar consciência dos
nossos erros, e tentar de novo, de outra maneira” (SCHÖN, 1997, p.89).
49

Num practicum reflexivo, Schön (1997) exemplifica que “os alunos praticam na
presença de um tutor que os envolve num diálogo de palavras e desempenhos [...]”. Para esse
autor, o “desempenho do aluno transmite informação muito mais viável do que as suas
próprias palavras”. Por isso, um tutor pode demonstrar através do seu desempenho e convidar
os alunos a imitá-lo. A imitação é atividade criativa composta por dois elementos: o trivial e o
essencial, que na ação educativa encontram-se misturados, os quais, por meio do diálogo e da
ação, da demonstração e imitação, possibilitam aos interlocutores chegar a uma convergência
de significados (SCHÖN, 1997, p.90).
Schön (1997) esclarece-nos ainda que, no desenvolvimento de um practicum
reflexivo, é importante juntar três dimensões da reflexão sobre a prática: a primeira, concerne
aos modos como o aluno compreende a matéria e como que ele interpretou as instruções para
realizar as tarefas de aprendizagem. A segunda dimensão refere-se à interação entre o
professor e o aluno. E a terceira, focaliza a dimensão burocrática da prática e os modos como
o professor deve constituir-se no ambiente institucional e, nesse espaço, produz a prática
reflexiva, tomando como referência o fazer pedagógico realizado com os sujeitos envolvidos.
Nessa compreensão de practicum reflexivo, o processo de formação de professores
apresenta as duas grandes dificuldades. A primeira diz respeito ao conteúdo epistemológico
dominante nas instituições formadoras e, a segunda, ao seu currículo profissional normativo.
O que interessa à epistemologia da racionalidade prática não é primeiro acessar o
conhecimento científico e, posteriormente, aplicá-lo em situações práticas, mas, de fato, levar
em consideração a existência de outros espaços produtores de saberes que estão além da
escola (SCHÖN, 1997).
De acordo com Tardif (2002), “a epistemologia da prática profissional sustenta que é
preciso estudar o conjunto dos saberes mobilizados e utilizados pelos professores em todas as
suas tarefas” (p.259). Desse modo, a prática educativa não prescinde dos saberes constituídos
na sua história de vida, no processo de formação e desenvolvimento profissional. [...]. “O
estudo do ensino numa perspectiva ecológica deveria fazer emergir as construções dos saberes
docentes que refletem as categorias conceituais e práticas dos próprios professores,
constituídas no e por meio do seu trabalho no cotidiano” (TARDIF, 2002, p.259).
Pérez Gómez (1997) nos traz a concepção de reflexão numa perspectiva que “implica
a imersão consciente do homem no mundo de sua experiência, um mundo carregado de
conotações, valores, intercâmbios simbólicos, correspondências afetivas, interesses sociais e
cenários políticos” (p.103) que se manifestam a partir da constituição de sua história de vida,
assim como de seu processo formativo e profissional.
50

Para esse autor, os saberes “oriundos da academia, denominados de teóricos,


científicos ou técnicos” (p.103) serão considerados instrumentos dos processos de reflexão se
forem integrados e articulados aos modos de pensamento mais amplos, que são mobilizados
pelo indivíduo na interpretação da realidade em que vive e possibilita organizar a sua
experiência pessoal. Assim, a reflexão nessa perspectiva, constitui-se um conhecimento
perpassado e entranhado pelas circunstâncias do contexto em que está inserido e que
impregna a sua experiência (PÉREZ GÓMEZ, 1997, p.103).
Para o processo de formação de professores, necessário se faz tomar de empréstimo
três conceitos integrantes do pensamento prático, segundo Pérez Gómez (1997, p.104),
baseando-se em Schön (1983): “conhecimento-na-acção, reflexão-na-acção e reflexão sobre a
acção e sobre a reflexão-na-acção”. São conceitos que constituem o pensamento prático do
professor e com os quais ele enfrenta as situações “divergentes” da prática, numa relação de
interdependência e de complementaridade de tal modo que possa assegurar uma intervenção
prática racional.
Para Pérez Gómez (1997), “o conhecimento-na-acção (conhecimento técnico ou
solução de problemas, segundo Habermas) é o componente inteligente que orienta toda
atividade humana e se manifesta no saber fazer”. Esse autor nos revela que esse
conhecimento constitui-se do amálgama de experiências e saberes que são utilizados sempre
que uma situação problematizadora o exige.
A esse respeito, Perez Gómez (1997, p.104), esclarece que “é fácil verificar que na
vida cotidiana, frequentemente pensamos sobre o que fazemos ao mesmo tempo que atuamos.
Schön denomina este componente do pensamento prático, reflexão-na-acção” ou seja,
deliberação prática, na perspectiva de Habermas. Nesse sentido, pode-se exemplificar que,

[...] ao conhecimento de primeira ordem sobrepõem-se um conhecimento de


segunda ordem, isto é, um processo de diálogo com a situação problemática
e sobre uma interação particular que exige uma intervenção concreta. O
conhecimento de segunda ordem ou meta-conhecimento na acção encontra-
se constrangido pelas pressões espaciais e temporais e pelas solicitações
psicológicas e sociais do cenário em que se actua. É um processo de reflexão
sem rigor, a sistematização e o distanciamento requeridos pela análise
racional, mas com a riqueza da captação viva e imediata das múltiplas
variáveis intervenientes e com a grandeza da improvisação e criação. É fácil
reconhecer a impossibilidade de separar no processo de reflexão-na-acção,
os componentes racionais dos componentes emotivos ou passionais que
condicionam a acção e a reflexão (PÉREZ GÓMEZ, 1997, p.104).
51

A partir desse modo de conceber o profissional da educação como um ser constituído


de múltiplos saberes, um ser situado histórica e socialmente, que se apropria e constrói os
seus saberes nas relações que se estabelecem nas diferentes dimensões da vida humana, é
possível considerar que não é possível fragmentar esse professor em seu fazer pedagógico,
pois aquele está, irremediavelmente, imbricado pelas condicionantes que influenciam as suas
ações.
Pérez Gómez (1997) amplia conceitualmente a base do pensamento prático do
professor ao considerar que a reflexão sobre a ação e sobre a reflexão-na-ação, que pode ser
denominada de reflexão crítica, segundo Habermas, pode considerar-se como análise que o
indivíduo realiza a posteriori sobre as características e processos da sua própria ação. Esse
autor afirma também que “a reflexão na ação supõe um conhecimento de terceira ordem, que
analisa o conhecimento-na-ação e a reflexão-na-ação em relação com a situação problemática
e o seu contexto” (PÉREZ GÓMEZ, 1997, p.104).

1.4 A FORMAÇÃO DO PEDAGOGO NA UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MATO


GROSSO NO CONTEXTO DAS REFORMAS

Tomar para si as reformas que configuram o curso de Pedagogia, no contexto atual,


implica recorrer ao que Scheibe (2007, p.279), ao discutir sobre o papel das reformas
educacionais, denominou de “processo de descaracterização que o curso de Pedagogia sofreu
no início da reforma dos anos de 1990. Iniciou-se esta descaracterização já com a aprovação
da Lei de Diretrizes e Bases de 1996 (LDB/96) que, no seu artigo 62, determina que”,

a formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível


superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e
institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o
exercício do magistério da educação infantil e nas quatro primeiras séries do
ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal
(BRASIL,1996).

Nesse entendimento, destacamos que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação


Nacional –LDB 9394/96, em seu artigo 63, dispôs sobre a regulamentação dos institutos, e lhe
conferiu a tarefa de manter cursos para a formação de profissionais para a educação básica.
Nesse artigo, explicita o inciso I, que cabe ao “Curso Normal Superior, para formar docentes:
para a educação infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental”, e o inciso II
acrescenta a responsabilidade também com “programas de formação pedagógica para formar
52

diplomados no ensino superior que queiram se dedicar à educação básica”. O inciso III, por
sua vez, atribui mais uma função com relação aos “programas de educação continuada para os
profissionais da educação, de modo geral” (BRASIL, 1996).
Esse delineamento político, ao exigir que os professores da educação básica
deveriam ter formação em nível superior, favoreceu escancaradamente a ampliação da criação
de institutos com essa função, especialmente em instituições de ensino superior privadas que,
em nossa compreensão, deveria ser atribuição da Universidade pública.
Algumas alterações importantes aconteceram a partir do Decreto n. 2.306/1997, que
produziram modificações no sistema de ensino superior. Scheibe (2007) afirma que as
“instituições de ensino superior passaram, então, a ser classificadas em: Universidades,
Centros Universitários, Faculdades Integradas, Faculdades e Institutos Superiores ou Escolas
Superiores” (p.280). Nessa classificação instaurou-se uma “indesejável distinção não apenas
entre universidades de pesquisa e universidades de ensino, mas entre ensino superior
universitário e não-universitário”. Ainda dentro dessa classificação, para a formação dos
docentes “estabeleceu-se o nível mais baixo dessa hierarquia, no qual são feitas menores
exigências de qualidade para o seu funcionamento” que são aqueles oferecidos pelo Normal
Superior ou Institutos (SCHEIBE, 2007, p.280).
Outro fato que nos chama atenção em relação a esse processo diz respeito ao curso
de Pedagogia, que, segundo Scheibe (2007), “a única referência, nesta lei, ao curso de
Pedagogia, está no seu artigo 64”:

Art. 64. A formação de profissionais de educação para administração,


planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a
educação básica será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em
nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta
formação, a base comum nacional (BRASIL, 1996).

Resguardadas as proporções de fragilidades legais em relação ao delineamento de


políticas educacionais contemplando o curso de Pedagogia, em âmbito nacional,
internamente, houve, por parte da Universidade do Estado de Mato Grosso e da comunidade
acadêmica, um esforço empreendido no sentido de tornar o curso de Pedagogia referência
estadual, atendendo à formação de professores para atuar nos anos iniciais do Ensino
Fundamental, de modo a minimizar a ausência de qualificação em nível superior de um
número expressivo da categoria docente que atuava nessa etapa da Educação Básica em todo
o Estado de Mato Grosso.
53

As Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia conferem a este o


status de licenciatura, que se destina à formação de professores para o exercício da docência
na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental. Ainda traz como incumbência a
formação de professores para atuação em disciplinas pedagógicas nos cursos de nível médio,
na modalidade normal, bem como para a educação profissional, área de serviços e apoio
escolar. Além disso, essa Resolução atribui ao pedagogo a formação para as atividades,
organização e gestão educacionais administrativo, pedagógica e também para “as atividades
de produção e difusão do conhecimento científico tecnológico do campo educacional”
(SCHEIBE, 2007, p.284).
Desse modo, tomando as diretrizes como referências nacionais para pensar as
reformulações nos cursos de Pedagogia no contexto atual, a UNEMAT, também as toma para
si como cerne para reformulação do curso, seguindo as orientações expressas na referida
Resolução:

Procurando atender as orientações contidas nas Diretrizes Curriculares


Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, em 2007 foi
apresentado novo Projeto Pedagógico para o Curso de Graduação em
Pedagogia do Campus Universitário ‘Jane Vanini’ de Cáceres, sendo a
docência a base da formação oferecida (UNEMAT, 2015, p.3) (Sem grifos
no original).

Igualmente mencionada no Projeto Pedagógico do Curso de Juara, neste consta que


as diretrizes instituíram “a formação em Pedagogia como um processo de construção de
identidade de educador ativo, crítico e reflexivo” (UNEMAT, 2013, p.4). De igual modo, nos
dois cursos consta que a comunidade acadêmica busca instituir tais aspectos normativos e
legais e, ao mesmo tempo, traz para o centro das discussões e reflexões as necessidades e
interesses da comunidade em que os cursos estão inseridos.
No processo de contextualização dos cursos de Pedagogia dos campi de Juara e de
Cáceres, que compõem o corpus desta pesquisa, destacamos a grande similaridade entre os
Projetos Pedagógicos dos Cursos, considerando que o processo de constituição dos projetos
realizou-se coletivamente sob a coordenação dos Núcleos Docentes Estruturantes -NDE dos
dois campi. Assim, em comum, as discussões geradas no seio da coletividade de cada Curso
foram consideradas nas reuniões de delineamento curricular pelos NDEs, sempre tomando
como argumentos as discussões, reflexões e deliberações oriundas das assembleias docentes e
discentes de cada curso, as quais, posteriormente, retornavam aos NDEs para reelaboração.
54

No entanto, nesse processo de constituição do currículo, houve manifestações


divergentes, acirramento de ânimos, confluências e dissensos de posicionamentos teórico-
práticos, de tal maneira que a concepção do curso está marcada por essa correlação de forças
da comunidade acadêmica. Então, o Curso de Pedagogia é fruto dessa busca pela articulação
democrática. Desse modo, produziram-se os currículos, mas respeitaram-se as especificidades
de cada curso e, portanto, naqueles constam as concepções e organização didático-pedagógica
que os diferenciam.
Por isso, nesta seção, realizamos o esforço de descrever três aspectos fundamentais
para compreender a concepção de docência, de formação de pedagogo e os saberes
constitutivos desse processo formativo na relação teoria/prática, presentes no Projeto
Pedagógico de cada curso com vistas às orientações contidas na Resolução 01/2006 do
CNE/CP, que trata das diretrizes curriculares para o curso de Pedagogia.
No PPC de Juara em seu capítulo VI, que trata sobre os princípios teórico-práticos
das ações pedagógicas no âmbito da ação curricular, ao abordar a organização curricular:
concepção, fundamentos e metodologia, apresenta-se a concepção de pedagogo da seguinte
maneira:

[...] um educador com a formação crítico-reflexiva, possibilitando-lhe a


construção de conhecimentos gerais e específicos indispensáveis à
compreensão humanista, técnica e científica de um profissional pesquisador
capaz de intervir criativamente na realidade educacional com vista a
transformá-la (UNEMAT, 2013, p.11).

A partir do excerto, podemos interpretar que a concepção de educador, presente nos


PPCs de Pedagogia, tomam para si o que prescreve a Resolução supracitada, em consonância
com as orientações ali contidas. De igual modo, delineia as aptidões necessárias ao exercício
da docência, destacando que

O pedagogo é entendido como um profissional capaz de exercer a função


docente na Educação Infantil, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental nas
diferentes modalidades de ensino da atualidade, permitindo-lhe questionar,
analisar temas e práticas educacionais; propor e coordenar projetos e
pesquisas; planejar e gestar ações ou atividades educacionais em ambientes
escolares e não escolares; responder às necessidades educacionais da escola
e da sociedade (UNEMAT, 2013, p.11).

Nesse delineamento estão contidas diferentes habilidades e competências inerentes às


atividades de um educador social, que podem ser desenvolvidas nos vários espaços e
situações educativas, contemplando, além dos aspectos relativos ao ensino, as atribuições
55

inerentes à gestão. Dessa forma, o Currículo do Curso de Pedagogia do Campus de Juara


explicita que tem por finalidade a promoção dos sujeitos por meio da formação do (a)
pedagogo (a) como educador (a), ou seja, uma formação alicerçada na articulação da teoria e
da prática com ênfase nos processos de ensino e aprendizagem em espaços escolares e não
escolares, sendo “capaz de inferir, intervir e cooperar teórica e metodologicamente na
realidade de sua inserção e atuação profissional” (UNEMAT, 2013, p.11).
O curso de Pedagogia de Cáceres traz como princípios para o processo formativo
algumas categorias, tais como: a interdisciplinaridade, a contextualização, a democratização,
pertinência e relevância social, assim como a ética e a sensibilidade afetiva e estética, como
elementos indispensáveis e balizadores de articulação entre a pesquisa e a prática docente,
durante todo processo de constituição de saberes, de ensino e da aprendizagem nos diferentes
contextos educativos (UNEMAT, 2015, p. 61).
A concepção que orienta a organização curricular do curso de Pedagogia de Juara
está pautada nos seguintes pressupostos,

 Inserção de disciplinas formativas de cunho interdisciplinar, com ementas


que sinalizam para uma proposta de ação voltada ao processo de construção
do conhecimento, utilizando práticas metodológicas que privilegiem atitudes
crítico-reflexivas.
 Os seminários integradores envolvem temáticas diferenciadas em cada
fase formativa, que são abordadas pelo conjunto de disciplinas que compõe a
matriz curricular.
 As práticas de docência orientam os licenciados à observação,
planejamento, sistematização, implementação e avaliação da aprendizagem e
da organização do trabalho docente em ambientes escolares e não escolares.
 As atividades complementares, orientadas pelos docentes, envolvem a
participação dos acadêmicos nos eventos de cunho científicos, monitorias,
iniciação científica, projetos de pesquisa e extensão junto a outras instâncias
da sociedade civil, com possibilidades de estudos envolvendo questões da
educação popular, educação especial, educação do campo, educação de
jovens e adultos, educação escolar indígena, educação ambiental,
diversidade social e cultural, relações raciais e políticas educacionais.
 Os estágios curriculares deverão acontecer no decorrer do curso,
garantindo aos graduandos a atuação pedagógica nos contextos escolares e
não escolares.
 Os pressupostos teórico-metodológicos fundamentam-se nos princípios
científicos da educação na área das ciências humanas, acerca dos aspectos
históricos, psicológicos, filosóficos, antropológicos, sociológicos, culturais,
ecológicos e pedagógicos que formam a base da profissão docente, para que
o pedagogo possa atuar na educação em diferentes contextos, assim como
define a Resolução CNE/CP 1/2006 (UNEMAT, 2013, p.12).

Esses pressupostos tomam para si a necessidade de compreensão do sujeito


historicamente situado como protagonista de seu trabalho educativo, em que as ações por ele
56

desenvolvidas, seja como educador, aluno ou cidadão estejam pautadas no compromisso ético
com aqueles envolvidos no processo formativo. O fazer pedagógico constitui-se na relação
dialética em que enquanto aprende, ensina e, ao ensinar, aprende. Desse modo, abre-se espaço
para a reflexão do educador sobre a participação e colaboração na constituição dos saberes
socialmente produzidos.
O PPC de Cáceres, no que diz respeito à relação teoria/prática, traz apontamentos
sobre esse aspecto no Núcleo Epistemológico, em que descreve “como ênfases delimitadoras
para a formação do pedagogo, os aspectos relativos ao processo de produção de saberes sobre
a Educação e sobre a prática educativa vivenciada nos locais de exercício profissional”
(UNEMAT, 2015, p.61-62).
Esse documento esclarece também que essa relação manifesta-se na “práxis
educativa”; na “atitude investigativa”; e na “potência cultural”, como possibilidade de
manifestações culturais nas dimensões diversificadas das relações humanas.
Ilustramos tais argumentos com a imagem das inter-relações existentes entre os
diferentes campos do conhecimento e das disciplinas expressas no currículo do Curso de
Pedagogia de Cáceres:
Figura 1 – Esquema da Organização Curricular para Formação do Pedagogo

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia de Cáceres, 2015, p.08.


57

O curso de Pedagogia de Cáceres tem sua arquitetura organizacional curricular


baseada na perspectiva do átomo, em que o processo de ensino e aprendizagem articula-se por
meio de temas geradores, de maneira que a “catalisação provocada por esses temas se
caracteriza pela articulação, integração e síntese dos saberes, habilidades, valores e atitudes
que devem constituir as aptidões necessárias à formação inicial do pedagogo”. Nessa direção
argumentativa, a partir dessa catalisação, realiza-se a propagação dos saberes revestidos de
intencionalidades formativas que vão direcionar a ação educativa, objetivando a formação do
Pedagogo.

Nesse processo permanente, que abrange, por um lado, a indução da


produção de saberes teórico-práticos e, por outro lado, a articulação, a
integração e a síntese dos elementos formativos, quanto mais elementos
houverem a ser catalisados, mais intensa será a formação do pedagogo. Esse
processo, constitutivo da integralização curricular na (e para a) formação do
pedagogo, assenta-se na produção de saberes e na experienciação do campo
de trabalho, integrados inextricavelmente na constituição do fio condutor da
formação, que se apresenta, também, como elemento fundamental na
organização do trabalho pedagógico a ser desenvolvido (UNEMAT, 2015,
p.62).

Esse processo formativo requer a persuasão dos sujeitos para a compreensão dos
diferentes saberes que são constitutivos da prática docente, tais como os saberes profissionais,
acadêmicos, curriculares, disciplinares, pedagógicos e experienciais que integralizam a
formação, os quais devem ser sintetizados, ressignificados como novos saberes que serão
construídos no seu fazer pedagógico.
Nessa compreensão, o PPC de Juara apresenta como se manifesta a articulação
teoria/prática no currículo do curso:

A práxis é instituída como concepção nuclear do curso de Pedagogia e da


docência como eixo principal de modo a assegurar aos graduandos
experiência de exercício profissional em ambientes escolares e não
escolares, que vise ampliar e fortalecer atitudes éticas, conhecimentos,
habilidades e capacidades necessárias ao pedagogo nos diversos níveis e
modalidades da Educação Básica: Educação Infantil (em creches e pré-
escolas); nos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º, 2º e 3º anos e 4º e 5º
anos); na Educação de Jovens e Adultos (1º segmento); e nos espaços não
escolares (UNEMAT, 2013, p.14).

A concepção de práxis pedagógica presente nos PPCs dos Cursos evidencia o esforço
coletivo para consolidar a formação do pedagogo na perspectiva integradora dos campos
curriculares, disciplinares e dos saberes das vivências e experiências que se realizam pelos
estudantes e professores nos ambientes escolares e não escolares.
58

Desse modo, o estágio e a práxis pedagógica serão objeto de aprofundamento e


reflexões no próximo capítulo, com o fim de evidenciar a práxis educativa como parte central
do estudo sobre os espaços de constituição de saberes. Em suma, seguiremos, no capítulo
seguinte, tratando do Estágio Curricular Supervisionado como ambiente propício para o
exercício da práxis educativa para a construção coletiva de saberes.
59

2 O ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISONADO DOS CURSOS DE PEDAGOGIA


DA UNEMAT: UM ESPAÇO DE CONSTITUIÇÃO DE SABERES

O campo de formação de professores tem merecido, por longos anos, a atenção de


educadores e pesquisadores que se debruçam sobre a temática para investigar as políticas,
concepções e práticas, objetivando, além de compreender as peculiaridades, desafios e
entrelaçamentos teórico-práticos que subjazem a esse tema, apontar possibilidades de
contribuição para uma formação mais consequente e comprometida com o fazer docente que
atenda às necessidades oriundas do processo ensino e aprendizagem nos diferentes espaços
educativos.
Nessa direção, o estágio curricular supervisionado também desponta como objeto de
preocupação e pesquisa pela comunidade científica e acadêmica, com o propósito de
compreender suas diferentes concepções nos contextos históricos e de refletir sobre a
instrumentalização e operacionalização no campo da prática.
Assim, o estudo sobre o estágio e a práxis pedagógica, que constituem o objeto desta
investigação, parte do interesse, da preocupação e da necessidade de entendimento sobre a
temática, de modo a contribuir com as questões teórico/práticas ora realizadas nos espaços
educativos não escolares, no curso de Pedagogia, da Universidade do Estado de Mato Grosso.
Nessa perspectiva, de pensar o estágio e a práxis pedagógica como lócus da pesquisa,
explicitamos a articulação teoria/prática no estágio curricular supervisionado como espaço de
produção de saberes, ancorada nas ideias e discussões realizadas, principalmente, por Pimenta
(1999, 2011, 2012), Tardif (2002 e 2014) e Schön (1997). Recorremos, também, aos Projetos
Pedagógicos dos Cursos de Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara, como bases para leitura,
destaque e interpretação das evidências que situam a práxis pedagógica como eixo orientador
da formação inicial.

2.1 APROXIMAÇÕES CONCEITUAIS NA ARTICULAÇÃO DA TEORIA E DA


PRÁTICA

Partimos do entendimento de que o estágio curricular nos cursos de formação de


professores tem assumido diversas concepções, que atendem a determinadas perspectivas
teóricas, em diferentes contextos históricos. Dessa forma, constatamos que, por um longo
60

período, o estágio curricular foi compreendido como a parte prática da formação,


desconsiderando os aspectos teóricos, as vivências e experiências dos sujeitos.
Pensando sobre esse aspecto, Pimenta e Lima (2012) afirmam que o estágio deve ser
compreendido como “campo de conhecimento e eixo curricular central nos cursos de
formação de professores” (p.61) e, além disso, constitui-se como espaço de apreensão da
realidade educativa, capaz de contribuir com o processo de tornar-se professor e de
construção da identidade profissional. Esse processo, por sua vez, é composto pelas interações
existentes entre os sujeitos em formação com os professores, educadores sociais e demais
participantes envolvidos, os quais, revestidos nessas relações, propiciam a apropriação e
socialização de saberes vivenciados em ações educativas nos vários espaços educacionais.
Além disso, Pimenta e Lima (2012) reiteram que o estágio é um espaço que
possibilita a “reflexão sobre a construção e o fortalecimento da identidade [...] que vai sendo
construída por meio das experiências e da história pessoal, no coletivo e na sociedade” (p.62-
63). A esse respeito, apresentamos as reflexões de Milanesi (2008) que destaca que:

[...] ser professor, para um grande número de docentes, os quais


provavelmente nunca se imaginaram como tal, pode significar a certeza de
uma identidade construída a partir do cotidiano vivido nos espaços em que
as conversas apressadas, congestionadas pelos colegas que também
necessitam dividir ou mesmo somar suas incertezas implicam num processo
de autoformação em relação a todas as pessoas nele envolvidas. Essa
construção da identidade é um processo de autoformação, contendo
dispositivos que possibilitam trazer de volta e refletir sobre o passado que
produziu ‘marcas’ que ficaram registradas, levando o sujeito a buscar novos
caminhos. Nesse sentido, o sujeito tem a possibilidade de ‘olhar’ sua própria
situação, bem como aquilo que está à sua volta, permitindo a construção de
novos referenciais (p. 51).

O excerto nos mostra que a identidade profissional é constituída por meio das
interações entre os pares, nas dinâmicas internas das instituições e nas reflexões individuais e
coletivas produzidas acerca da prática pedagógica desenvolvida no estágio ou no exercício
profissional.
No mesmo caminho, Nóvoa (1995) traz alguns elementos que contribuem para a
compreensão da constituição da identidade. Para ele, a “formação não se constrói por
acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de
reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade
pessoal” (p. 25). Corroborando tal pensamento, Day (2001) afirma que “os professores não
podem ser formados (passivamente). Eles formam-se (ativamente)”.
61

Portanto, é possível depreender que a formação passa sempre pela mobilização de


vários tipos de saber: saberes de uma prática reflexiva; saberes de uma teoria especializada;
saberes de uma militância pedagógica (NÓVOA, 1995, p.28).
Nesse sentido, Pimenta e Lima (2012, p.29) registram a compreensão de estágio
como campo de conhecimento em que as ações educativas possuem uma dimensão política,
técnica, pedagógica, ética e estética, bem como habilidades e valores que possibilitam
“atribuir-lhe um estatuto epistemológico que supere sua tradicional redução à atividade
prática instrumental”, que rompe com uma perspectiva historicamente assumida pelo estágio
curricular dos cursos de formação de professores.
Relativamente a essa compreensão, a literatura nos aponta que a variação dessas
perspectivas, que ora entende que a prática deve ser uma imitação de modelos, ora deve ser
vista como instrumentalização técnica, ora como um momento da prática, são matizadas pelas
condições históricas de produção e de práticas sociais, exigidas em cada contexto.
Essa visão dicotômica entre teoria e prática, desvinculando-as também do campo de
atuação do profissional, tem demonstrado, de acordo com a literatura no campo educacional e
as vivências, que as técnicas e habilidades não são suficientes para resolver todas as
complexidades das situações dos processos educativos, uma vez que se perde de vista a
importância do papel do conhecimento científico, dos saberes das vivências para compreender
as especificidades do exercício profissional. Segundo Pimenta e Lima (2012), “a prática pela
prática e o emprego de técnicas sem a devida reflexão podem reforçar a ilusão de que há uma
prática sem teoria ou de uma teoria desvinculada da prática” (p.37).
Entendemos que, para superar a dicotomia da relação teoria e prática, é importante e
necessário compreender que o estágio produz-se nas interações realizadas nos cursos de
formação com os espaços sociais e culturais onde se desenvolvem as práticas educativas. Por
isso, nesta pesquisa, assumimos a concepção que dialoga com uma perspectiva de práxis
educativa considerando que a teoria e a prática constituem-se o centro articulador da formação
inicial do futuro educador. Nessa direção, Pimenta (2012, p.80) esclarece-nos que

Teoria e prática são indissociáveis. A prática (a análise teórica da prática) é o


ponto de partida e de chegada. A consequência disso é que ninguém se
tornará profissional apenas porque ‘sabe sobre’ os problemas da profissão,
mas sim por ter estudado algumas teorias a respeito.

A articulação teoria/prática manifesta-se no processo de apreensão da realidade na


qual o(a) professor(a) e aluno(a) atuam e possibilita a reflexão sobre as vivências e
experiências do fazer pedagógico. Nesse processo, os sujeitos devem trazer para si não
62

somente os saberes adquiridos na formação acadêmica, mas também aqueles que compõem a
sua trajetória enquanto sujeito histórico, cidadão que está imerso e embebido da realidade e
que procura, a partir dela, intervir e produzir mudanças.
A percepção dessa necessidade de construção de um currículo para o curso de
Pedagogia que busca a articulação de várias dimensões do processo ensino aprendizagem
sustentada na concepção de estágio ancora-se no tripé: ensino, pesquisa e extensão como
eixos da atividade docente:

a) ensino – estágio enquanto componente curricular do curso de


Pedagogia, em que se desenvolvem atividades de ensino-aprendizagem de
conceitos, habilidades e valores concernentes ao profissional da educação; b)
pesquisa – o estágio como espaço para a produção de conhecimentos, tanto
por parte dos docentes/orientadores quanto por parte dos alunos/estagiários,
que na efetivação das atividades do estágio tomam permanentemente o
trabalho docente e o campo de sua realização como objetos de
reflexão/investigação; c) extensão – a própria efetivação do estágio constitui-
se em processo genuíno da relação da universidade com a sociedade mais
ampla, representada pelos locais em que se realizam as atividades
(UNEMAT, 2015, p.4).

Esse entendimento de que o estágio está atravessado por ações educativas que
atendem às dimensões do ensino, pesquisa e extensão representa, em nossa compreensão, a
confluência das vivências e experiências pessoais e acadêmicas no processo de tornar-se
professor(a). O estágio, revestido dessa centralidade, possibilita ao estagiário a imersão nos
saberes adquiridos para aprimorá-los, ressignificá-los e produzir novos saberes. Mas não só.
Constitui-se, também, o espaço de reflexões acerca de suas práticas, de questionamentos e de
intervenção, de maneira comprometida, na comunidade em que atua.
Portanto, o estágio curricular supervisionado no processo de formação de professores
consiste no espaço de articulação da teoria e da prática, numa relação de interdependência em
que seu significado só faz sentido no contexto das relações que se manifestam no fazer
pedagógico. Nesse sentido, trazemos a contribuição de Fontana e Cruz (1997) que ilustram
essa compreensão com os seguintes argumentos:

Podemos dizer que as teorias foram elaboradas para descrever, explicar,


interpretar, compreender certos aspectos da realidade. E, ainda, que as
teorias constituem um corpo de conhecimentos sistematizados sobre a
realidade, uma espécie de lentes através das quais se olha o mundo. E a
prática, o que é? É a aplicação de uma teoria? [...] não nos parece correto
afirmar que a prática seja aplicação da teoria. [...]. Vivemos as práticas
cotidianas em geral irrefletidamente, só parando para pensar sobre elas
quando algum problema ou algum descompasso se manifesta. Os problemas
63

e descompassos suscitam questões que requerem explicações. Quando nos


debruçamos sobre a realidade tentando compreendê-la e explicitá-la,
estabelecemos um novo modo de relação com nossas práticas cotidianas.
Olhamos para o que fazemos e somos, analisamos e refletimos sobre o
vivido, procurando organizá-lo. Nesse processo de busca de compreensão,
vivemos outra prática cultural, a ‘prática da teorização’, produzimos um
conhecimento de natureza distinta do conhecimento baseado na vivência
cotidiana. No esforço para explicar as questões e problema surgidos no
cotidiano, nos obrigamos a ‘parar para pensar’, a olhar de longe as situações
vividas, tentando apreender seus aspectos essenciais, suas contradições, o
modo como seus elementos se articulam, as transformações por que passam.
Procuramos organizar as nossas vivências e nosso próprio processo de
reflexão sobre elas em um sistema explicativo coerente. Por tudo isso, não
dá para considerar a prática como aplicação da teoria, nem a teoria como
algo que se aplica à prática. A prática é a base da teoria (que também é uma
prática humana de produção de conhecimento). E a teoria elaborada é uma
reflexão organizada e sistematizada sobre aspectos da prática que nos
ajudam a analisá-la, problematizá-la e redefini-la. Nesse sentido, teoria e
prática articulam-se dinamicamente (FONTANA E CRUZ, 1997, p. 69-
70).

O estágio curricular supervisionado, nessa perspectiva, constitui-se o espaço, por


excelência, em que a teoria e a prática instituem-se, desenvolvem-se e constituem o ser
professor, permitindo-lhe pensar e agir de modo coeso com seu processo formativo.
Entendemos que o trabalho realizado pelos envolvidos em situação de estágio nutre-se das
possibilidades de construção e apropriação de conhecimentos, permeados pelos saberes
disciplinares, curriculares, experienciais e pedagógicos, de modo que tanto o professor quanto
o aluno ressignifiquem suas práticas a partir das reflexões e percepções que emergem da
realidade social em que o estágio é realizado.
Desse modo, a prática manifesta-se como produto da teoria, porque elaborada e
desenvolvida a partir da segunda, ao passo que as reflexões, questionamentos e análises
advindas das ações educativas, produzem mudanças tanto na prática quanto na teoria, num
processo de simbiose. Dialogando e aprofundando a compreensão dessa visão da articulação
da teoria/prática, Pimenta (2012) apresenta o seguinte argumento:

A essência da atividade (prática) do professor é o ensino-aprendizagem. Ou


seja, é o conhecimento técnico prático de como garantir que a aprendizagem
se realize como consequência de ensinar. Envolve, portanto, o conhecimento
do objeto, o estabelecimento de finalidades e a intervenção no objeto para
que a realidade (não-aprendizagem) seja transformada, enquanto realidade
social. Ou seja, a aprendizagem (ou não aprendizagem) precisa ser
compreendida enquanto determinada em uma realidade histórico-social
(PIMENTA, 2012, p. 95).
64

Nesse sentido, Pimenta incita-nos à reflexão de que a atividade de ensinar é


intencional, sistemática e científica e, portanto, revestida de finalidades que se colocam para o
conhecimento da realidade e da apropriação de elementos naturais e sociais que estão contidos
nessa mesma realidade, de modo a serem apreendidos, analisados e transformados em seus
contextos por meio da ação dos sujeitos.
Desse modo, a educação, campo no qual se realiza o processo de ensino e
aprendizagem, constitui-se uma prática social que possibilita, por meio da ação consciente e
planejada dos sujeitos, seja o professor, o aluno ou determinados grupos sociais, a produção
de saberes, apreensão e intervenção na realidade social na qual as práticas educativas são
desenvolvidas. Considerando esse movimento dinâmico de conhecer, intervir e transformar,
Pimenta define que “a atividade docente é práxis” (PIMENTA, 2012, p.95).
A partir dessa acepção, indagamos: o que torna o estágio o lugar de articulação da
teoria e da prática? O primeiro elemento é a intencionalidade de que a ação pedagógica
cumpra a função social e cultural de aprendizagem, que está revestida de compromisso ético,
político e pedagógico com a formação dos sujeitos envolvidos no processo de ensino e
aprendizagem. O segundo elemento, necessário à realização da atividade educativa
emancipadora, diz respeito à participação e ao engajamento de todos os participantes na busca
de produção, apropriação e/ou ressignificação dos saberes imanentes à formação. Por sua vez,
como terceiro elemento, temos as interações intersubjetivas que se constituem na prática
pedagógica e que requerem um sujeito consciente de sua realidade social, produtor de
reflexões acerca das necessidades educativas percebidas nos diferentes espaços e, sobretudo,
engajado politicamente com a comunidade em que atua, em busca de enfrentamento dos
problemas de toda ordem existentes na prática educativa.
Enfatizando a importância das fontes geradoras de saberes que alimentam a prática
educativa, Pimenta (2012, p. 87) traz a seguinte reflexão:

[...] o estágio vem sendo órfão da prática e da teoria [...]. Como lida
basicamente com as questões da realidade concreta da prática o aluno vai
perceber que para explicá-la e nela intervir é necessário refletir sobre a
mesma e que essa reflexão só não será vazia se alimentar-se da teoria [...]. O
bom professor, o professor comprometido, tem a obrigação de saber o que
indicar, o como indicar, o onde indicar, aí a importância das fontes.

Nesse contexto, na realização do estágio, conhecer a realidade social que o envolve


do ponto de vista das condições de existência e sociais de trabalho, no campo da teoria e da
vivência para execução das atividades docentes, constitui-se o cerne da ação educativa. Por
65

essa razão, cabe ao professor a maior responsabilidade de ser comprometido técnica, política e
pedagogicamente com as necessidades educativas que emergem dos espaços, definindo o que
trabalhar, que metodologia selecionar para atender as intencionalidades da prática educativa, e
não apenas saber o como, mas onde, com quais sujeitos e em que condições irá trabalhar.
O estágio é, portanto, fruto da dialética de três campos: o quê, o como e o onde que
darão a tônica à prática docente como a novidade da formação. Então, nessa relação de ensino
e aprendizagem, os dois principais protagonistas do processo possuem um papel importante
no que se refere à realização da ação educativa, mas cabe ao professor perceber as
fragilidades e as potencialidades apresentadas pelos(as) alunos(as), de modo que sua
orientação, seu direcionamento e acompanhamento sejam precisos, pontuais e promovam a
superação das dificuldades por eles apresentadas.
Nesse sentido, Pimenta (2012) contribui com os argumentos pertinentes a tal
contexto:

Enquanto processo de apreensão da realidade, o estágio deve indicar como o


aluno apreende, deve conduzir o ver do aluno, para que ele enxergue em
cada detalhe ‘o todo, a totalidade, o como agir’ que, somados ao ‘ver dos
outros [...] pode descortinar novos horizontes para projetos educativos mais
audaciosos’ (PIMENTA, 2012, p.27).

Essa capacidade de conduzir a prática educativa de modo que nela contemple o quê,
como e com quem os alunos desenvolvem sua prática pedagógica constitui-se a tarefa
primeira do professor orientador do estágio. Nesse processo de orientação e acompanhamento
dos estagiários, Pimenta “detalha quatro passos que deverão ser seguidos no estágio: como
fazer a leitura do EU na escola; como fazer a leitura da sala de aula, instrumentando para a
leitura da sala de aula e da escola; intervindo na sala de aula” (Ibidem, p. 27).
Tomamos como referência a escola para acrescentar a essa os espaços educativos,
sejam eles escolares ou não escolares, por considerarmos importantes os modos de o aluno
constituir-se enquanto professor naquele espaço enredado de práticas sociais, de saberes, de
experiências múltiplas, e como o aluno compreende e coloca-se como parte constitutiva
daquele ambiente e das interações ali existentes, que fundam os objetivos da educação que se
pretende para aquele grupo e/ou comunidade.
Nesse sentido, a partir das teorias de Pérez Gómez (1997), compreendemos que há a
necessidade de que a prática constitua-se o eixo orientador do currículo dos cursos de
formação dos professores, a fim de possibilitar e “provocar o desenvolvimento das
capacidades e competências implícitas no conhecimento-na-ação, próprio dessa atividade
66

profissional” (p.111). E, assim, promover uma formação consequente e comprometida com a


realidade social em que os sujeitos estão imersos.
Para o autor, fazer educação tomando como pensamento e ponto de partida a prática
do professor é propositura fundamental para compreender as dinâmicas que envolvem o
processo de ensino-aprendizagem, capazes de provocar transformações nos programas de
formação de professores, a fim de desencadear ações inovadoras na realização da atividade
docente nos espaços educativos.
O autor destaca os argumentos que agregam diferentes aproximações trazidas de
diversos autores acerca da epistemologia da prática educativa, imbuídas de suas
peculiaridades no mesmo campo conceitual correlacionado. Como primeiro aspecto a ser
considerado sobre a prática, afirma que esta “deve ser entendida como eixo central do
currículo de formação de professores” (Ibidem, p. 111). Essa compreensão contrapõe-se aos
modelos ancorados na racionalidade técnica, uma vez que a prática compõe o núcleo do
processo, o ponto de partida e de chegada da formação e da atividade docente.
Em segundo lugar, Pérez Gómez (1997) compreende que, tomando a prática como
referência, “nega-se a separação artificial entre a teoria e a prática no âmbito profissional”,
pois, “só a partir dos problemas concretos é que o conhecimento acadêmico teórico pode
tornar-se útil e significativo para o aluno-mestre” (Ibidem, p.111). Nesse contexto, para o
autor, outro argumento importante resultante dessa visão diz respeito aos conhecimentos que
são mobilizados para solucionar determinados problemas da prática, que exigem do sujeito
uma construção lenta e gradual durante seu exercício profissional, apoiado nos saberes
curriculares, disciplinares, experienciais que lhe possibilitam a reflexão na e sobre a ação
educativa.
Em terceiro lugar, o autor argumenta que “a prática deve mesmo constituir-se como
o ponto de partida do currículo de formação” (p.111). Para o autor, o processo de formação de
professores deve tomar como objeto de conhecimento e análise o ato de ensinar. E reforça que
a formação, por meio da prática educativa, deve tomar a realidade social para conhecê-la,
problematizá-la, questioná-la e transformá-la.
Em quarto lugar, Perez Gomez (1997, p.112) esclarece que a necessidade de “apoiar-
se na prática não significa que se reproduzam acriticamente os esquemas e rotinas que regem
as práticas empíricas e se transmite de geração em geração como resultado do processo de
socialização profissional”. Para ele, a prática constitui-se a base da teoria capaz de
desencadear uma reflexão sobre as ações educativas, de modo que as rotinas, as técnicas,
passando pelas teorias e valores, sejam objetos de análises e indagações.
67

Em quinto lugar, o escritor afirma que

[...] o pensamento prático do professor é uma complexa competência de


caráter holístico. É um processo que deve ser encarado como um todo, não
se restringindo à soma das partes que podem ser diferenciadas
analiticamente. O que se tenta formar através do currículo profissional é a
capacidade de intervir de forma competente e situações diversas; ora, esta
capacidade é um conjunto coerente, de caráter cognitivo e afetivo,
explicativo e normativo, de conhecimentos, capacidades, teorias, crenças e
atitudes (Ibidem, p.112).

Para o autor, a atividade docente realiza-se numa realidade complexa, carregada de


intencionalidades, de valores, de capacidades, de conhecimentos, de atitudes, conflitos, na
diversidade existente, na dimensão das relações sociais. Essa complexidade de relações deve
ser coerente com a formação dos sujeitos, com a leitura de mundo e, acima de tudo, com sua
postura de aceitação e respeito às manifestações culturais que permeiam a prática docente nos
diferentes espaços.
Em sexto lugar, o teórico traz à compreensão que a “prática é uma atividade criativa.
[...] No diálogo reflexivo que aluno-mestre mantém com a realidade problemática, cria-se
uma nova realidade, novos espaços de intercâmbios, novos marcos de referência, novos
significados e novas redes de comunicação” (p.112). O que emerge desse pensamento é o
diálogo reflexivo como componente basilar da formação problematizadora a partir da qual se
produz uma nova visão dos espaços de mudança, de novos significados e novos modos de
intervenções e interações.
Pérez Gómez (1997) instiga-nos a pensar que a novidade emerge dos olhares aos
espaços, aos territórios onde se manifestam as relações de autoaprendizagem e pertencimento,
bem como na constituição da identidade que se realiza nas interações intersubjetivas entre os
sujeitos. Há uma assimilação ou interiorização das práticas sociais e culturais que fazem com
que o estagiário reconheça-se com o outro e com o mundo vivido no interior do grupo ou
comunidade.
Partimos da compreensão de que o embrião do pertencimento é gerado no momento
em que professor e aluno, em processo de instrumentalização teórico-prática, pensam os
espaços e as práticas sociais ali existentes. São essas questões que devem ser consideradas a
partir do momento em que o estagiário escolhe o lugar de sua ação. Essa escolha pressupõe
uma intencionalidade formativa. Essa intencionalidade, por sua vez, emerge das relações
existentes na comunidade e que são os elementos que dão significados à realização da prática
pedagógica.
68

Pérez Gómez (1997) acrescenta que o “pensamento prático do professor não pode ser
ensinado, mas pode ser aprendido. Aprende-se fazendo e refletindo na e sobre a acção”
(p.112). Para ele, tomar a prática como instrumento de apoio e desenvolvimento do
pensamento prático só é possível se houver uma reflexão entre os envolvidos, seja o aluno-
professor, o professor-professor, ou aluno-aluno. Dito de outra forma, aprende-se fazendo por
meio das experiências e vivências produzidas na coletividade.
Nessa perspectiva, o autor destaca que dois aspectos emergem da interação dialógica
entre os sujeitos da ação pedagógica, o primeiro, diz respeito ao professor, enquanto
protagonista teórico-prático que se reveste da função de instrumentalização das capacidades,
habilidades, atitudes e valores que serão desenvolvidos na interação com os alunos, na
Universidade. O segundo aspecto refere-se aos alunos, pois quando estes assumem a função
de docência nos espaços educativos tornam-se os protagonistas no desenvolvimento de sua
prática pedagógica.
Assim, a presença do professor passa a ser secundária, atuando como aquele que
orienta, acompanha e supervisiona a ação pedagógica daquele que se faz professor. A
intervenção por meio da prática do professor fica em segundo plano, porque cabe, nesse
processo dialógico, o protagonismo da prática pedagógica do aluno.
Por fim, esse teórico enfatiza que [...] “é necessário garantir a presença de
professores experientes, que desenvolvam um ensino reflexivo e que se preocupem com a
inovação educativa com a sua própria auto-formação, como profissionais” (PÉREZ GÓMEZ,
1997, p.113). De acordo com o autor, esses professores devem desenvolver projetos de
“investigação-acção” que estejam comprometidos com “a aprendizagem na e sobre a acção
dos futuros professores” (Ibidem, p.113).
Desse modo, a ação educativa deve trabalhar a relação entre os sujeitos numa
perspectiva interdisciplinar, dialógica, permeando linguagens que permitam as interações
entre as áreas do conhecimento e saberes socialmente produzidos, e que levem em
consideração a ação pedagógica, no processo de constituição do tornar-se professor, em
situações de estágio curricular supervisionado, enquanto campo de atuação teórico-prática.

2.2 A AÇÃO EDUCATIVA NO ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO NOS


CURSOS DE PEDAGOGIA DA UNEMAT
69

Nesta seção, procuramos evidenciar o processo de constituição do curso de


Pedagogia para produzir reflexões acerca do estágio do ponto de vista de sua concepção
teórico/prática.

2.2.1 A constituição do Curso de Pedagogia: aspectos introdutórios

Os projetos pedagógicos dos Cursos de Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara, da


Universidade do Estado de Mato Grosso, foram constituídos sob a coordenação dos Núcleos
Docentes Estruturantes a partir das deliberações da comunidade acadêmica e buscaram
atender as normativas internas e as demandas postas pela Resolução 01/2006/MEC que
estabelece as diretrizes curriculares para o curso de Pedagogia em âmbito nacional.
Desse modo, após elaboração, deliberação e aprovação pela comunidade acadêmica,
o Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia, executado no Campus
Universitário “Jane Vanini” no município de Cáceres-MT foi aprovado pela Resolução nº
060/2015 – CONEPE (Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão), enquanto o Projeto
Pedagógico do Curso de Licenciatura em Pedagogia a ser executado no Campus Universitário
de Juara da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT passou pelo mesmo
procedimento e foi aprovado pela Resolução nº 036/2013 – ad referendum do CONEPE
(Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão).
Os referidos Projetos Pedagógicos dos Cursos foram elaborados tomando como
parâmetros as concepções e orientações descritas nas Diretrizes Curriculares Nacionais
instituídas pelo Conselho Nacional de Educação para o Curso de Graduação em Pedagogia,
licenciatura. Nestas Diretrizes estão contidas as orientações para o delineamento acerca de
princípios, condições de ensino e de aprendizagem, sobre os procedimentos que devem ser
observados para elaboração do PPC, bem como para a avaliação pelos órgãos dos sistemas de
ensino e pelas instituições de educação superior do país.
A Resolução nº 01/2006/MEC/CP, em seu artigo 2º, descreve os aspectos normativos
em relação à formação inicial, que se destina ao “exercício da docência na Educação Infantil,
nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade
Normal e em cursos de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar”. Esta
legislação amplia a formação do pedagogo para a atividade docente em outras áreas que
requeiram conhecimentos pedagógicos.
70

A UNEMAT, tomando para si a necessidade de atender as orientações contidas nas


referidas Diretrizes no Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia, explicita que:

[...] em 2007 foi apresentado novo Projeto Pedagógico para o Curso de


Graduação em Pedagogia do Campus Universitário “Jane Vanini” de
Cáceres da UNEMAT, sendo a docência a base da formação oferecida. Com
base nesse Projeto, o Curso foi reconhecido por 05 anos, através da Portaria
n. 036/09 - CEE/MT, publicada no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso,
de 28 de agosto de 2009 e, ainda, republicada no Diário Oficial do Estado de
Mato Grosso, de 14 de outubro de 2009 (UNEMAT, 2015, p. 4).

Assim, os Projetos pedagógicos dos cursos já estavam em andamento e, em 2011,


sofreram as primeiras alterações por meio da Instrução Normativa 004/2011-UNEMAT que
dispõe sobre os procedimentos de migração e revisão das matrizes curriculares dos cursos de
graduação ofertados pela Universidade do Estado de Mato Grosso para a implantação do
sistema de crédito em todas as suas modalidades (UNEMAT, 2015, p. 4).
Nesse sentido, os cursos deram início ao processo de constituição de novo Projeto de
Curso, conforme descrito no PPC (2015), no Campus de Cáceres:

Para atender as disposições contidas nessa Instrução Normativa, deflagrou-se


um processo de discussão das matrizes curriculares dos cursos de Pedagogia
da UNEMAT, sob a coordenação integrada dos Núcleos Docentes
Estruturantes (NDE’s) dos cursos de Pedagogia de Cáceres, Juara e Sinop,
em estreita e continua articulação com os conjuntos dos docentes dos
respectivos cursos. Nesse processo, levou-se em conta, além da própria
Instrução Normativa 004/2011-UNEMAT, as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia (Resolução CNE/CP nº
01/2006), as Resoluções do CONEPE/UNEMAT — Conselho de Ensino,
Pesquisa e Extensão referentes ao TCC (Resolução nº 030/2012 –
CONEPE), ao Estágio Supervisionado (Resolução nº 029/2012 – CONEPE)
e à Equivalência (Resolução nº 031/2012 – CONEPE). Além do atendimento
às normas, o processo de discussão, coordenado pelos NDE’s, abrangeu
também o processo avaliativo interno dos cursos e a consideração da
situação dos mesmos perante as avaliações do CEE/MT — Conselho
Estadual de Educação (UNEMAT, 2015, p.4).

Esse processo de reformulação da matriz curricular no Projeto Pedagógico de


Cáceres produziu mudanças e alterações que, em nosso entendimento, constituiu-se uma
imposição, na medida em que não partiu de percepções coletivas dos envolvidos no curso,
acerca de necessidades educativas do processo ensino/aprendizagem. Por conta disso,
considerando que o projeto existente no Curso de Pedagogia/Cáceres, embora não tivesse
passado ainda por uma avaliação institucional, estava funcionando adequadamente e atendia
às orientações contidas nas Diretrizes, houve muita resistência à reformulação.
71

De qualquer modo, mesmo que o curso estivesse em conformidade com as


Diretrizes, a Instrução Normativa 04/2011/UNEMAT trouxe como objetivo flexibilizar a
matriz dos cursos, de modo a possibilitar a mobilidade acadêmica entre os três cursos de
Pedagogia ofertados pela UNEMAT e demais instituições de ensino superior do país. Além
disso, acrescentou disciplinas optativas que possibilitam ao aluno escolher as disciplinas que
considera importantes a sua formação.
Na perspectiva da mobilidade acadêmica6, merece destaque seu papel social ao
possibilitar o acesso e permanência dos estudantes no ensino superior e, sobretudo, a
possibilidade de enriquecimento das experiências formativas na trajetória acadêmica.
Destacando as possibilidades interativas de aprendizagens que se fazem presentes nos três
cursos de Pedagogia, ou até mesmo em outros cursos da própria instituição, ou de outras
brasileiras ou estrangeiras, o PPC do Curso de Juara descreve que

A Universidade deve oportunizar as condições para que os limites do


conhecimento sejam ultrapassados. Estes devem ser procurados em todas as
vertentes, áreas, regiões e países. Deste modo, a Mobilidade Acadêmica da
Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT foi estruturada com
propósitos e visões globais que impulsionem ações fundamentadas no
conhecimento de outras realidades, que possam trazer não somente a
contribuição técnica, mas também a social, tão importante quanto para o
desenvolvimento do nosso Estado e de nosso país. A Universidade do Estado
de Mato Grosso, por meio da Resolução 071/2011 - CONEPE estabelece no
Art 3°, ‘que discentes vinculados à UNEMAT cursem disciplinas pertinentes
a seu curso de graduação, em outras IES, nacionais ou estrangeiras’ e coloca,
ainda, em seu Art 4º que ‘o Programa de Mobilidade Acadêmica possibilita
que discentes das IES envolvidas possam realizar mobilidade para
desenvolverem atividades vinculadas à pesquisa e/ou extensão por um
período máximo de 03 (três) meses, 06 (seis) ou 01 (um) ano’ A estrutura da
mobilidade acadêmica estabelece que todas as ações do acadêmico
realizadas em programas de mobilidade serão validadas pelo colegiado e/ou
com base em editais (UNEMAT, 2013, p.19).

Por outro lado, nesse processo de reformulação dos Projetos Pedagógicos dos Cursos
de Pedagogia, estes apresentaram alteração significativa no campo epistemológico, uma vez
que, no currículo anterior, a área de Ciências Humanas apresentava um espaço satisfatório
para as disciplinas de Sociologia, Filosofia e Psicologia e, agora, predominam as disciplinas
do campo da prática.
Conforme descrito no parágrafo 2º da Resolução nº 01/2006/MEC/CP, ao pedagogo
cabe a formação para o “exercício da docência na Educação Infantil e nos anos iniciais do

6
Essa mobilidade começou com mudança no sistema de matrícula dos alunos, acabando com o conceito de
turmas, passando a ser individualizado, matrícula por disciplina.
72

Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, e em cursos de


Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar”, assim como a atuação em outras
áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.
Somados a essa ampliação dos espaços de atuação do pedagogo, a referida Resolução
aponta no artigo 2º, § 2º, que o curso de Pedagogia deve propiciar uma formação utilizando-se
de estudos teórico-práticos, investigação e reflexão crítica que possibilitem ao estudante:

I - o planejamento, execução e avaliação de atividades educativas;


II - a aplicação ao campo da educação, de contribuições, entre outras, de
conhecimentos como o filosófico, o histórico, o antropológico, o ambiental-
ecológico, o psicológico, o linguístico, o sociológico, o político, o
econômico, o cultural (BRASIL, 2006).

A exigência de formação ampla do pedagogo para atuar em diferentes frentes, trazida


pela Resolução do CNE/CP nº 01/2006 atendendo, assim, às demandas sociais e educativas,
mobilizou a comunidade acadêmica dos Cursos de Pedagogia, da UNEMAT, em torno da
concepção e organização de um currículo levando-se em consideração o impacto dessa
Resolução na elaboração da matriz curricular, o que gerou a necessidade de criação e
supressão de disciplinas e, consequentemente, dentre os ajustes feitos, a redução de carga
horária de algumas delas, de maneira que o estudante de Pedagogia pudesse concluir a
formação inicial em 04 anos.
Essas alterações provocaram inúmeras resistências e descontentamento nas
manifestações dos docentes, considerando que, quando suprimimos disciplinas da área de
fundamentos, consequentemente retiramos pessoas de seus postos de trabalho, que investiram
em sua formação, e marcadamente agimos conforme a exigência de mercado, mas, também,
pela necessidade de atendimento às exigências legais em âmbito nacional e institucionais
para adequação à realidade do espaço geopolítico, assim como às reflexões produzidas pela
comunidade e aquelas advindas do mundo social, cultural e histórico.
A literatura no campo do currículo revela-nos que o processo de configuração e
intervenções nesse campo, sejam elas do ponto de vista do poder constituído, sejam do ponto
de vista da sociedade civil organizada e dos movimentos sociais, dentre outros lineamentos,
tem se constituído como um terreno de lutas, embates, conflitos que são travados nesse
processo e expressam interesses que são pertinentes a cada grupo ou a políticas públicas
manifestadas.
Desse modo, a existência explícita de conflitos e tensões entre diferentes projetos
sociais educativos possibilitam a emergência de novas hegemonias no campo teórico. Mas
73

não só. Esse processo reflete as contradições existentes na sociedade, que se constituíram em
espaço de luta e de conquista social que, em nosso entendimento, se tornam o fio condutor de
mudanças que ocorrem historicamente nos cursos de formação inicial e outros espaços
educativos.
Assim, a configuração do Curso representada nos Projetos pedagógicos é fruto de
posicionamentos teóricos metodológicos defendidos por determinados grupos, bem como de
suas visões de mundo acerca da realidade social, e constituem-se como um instrumento de
formação de sujeitos, capazes de atuar e de intervir nas práticas sociais produzidas na
comunidade em que vivem e atuam.
A retomada ao processo de constituição do curso possibilitou-nos produzir algumas
leituras sobre o conjunto de fatores que interferiram na realidade histórica específica que o
constitui. Essa retomada, em nosso entendimento, compõe-se da preocupação de compreender
o estágio e a práxis pedagógica no contexto de sua concepção e operacionalização.
Assim sendo, mediante as situações conflitantes, as discussões e orientações teórico-
metodológicas que deram nova configuração ao currículo do curso, as feições assumidas por
esse Projeto culminaram em um enfoque à epistemologia da prática, com especial atenção às
metodologias e didática, conforme apresenta e justifica o seguinte excerto do PPC do Curso
de Pedagogia do Campus “Jane Vanini” em Cáceres:

A partir das considerações normativas, análises, debates e deliberações


coletivas revisou-se a matriz curricular do curso de Pedagogia do Campus
Universitário ‘Jane Vanini’. Assim, formulou-se a presente proposta de
Curso que, fundamentalmente, atende mais detalhadamente as orientações
contidas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação
em Pedagogia, especialmente na definição mais precisa e na articulação dos
Núcleos de Estudos, na definição do eixo integrador da formação a partir da
articulação entre o processo da pesquisa e a imersão no campo de trabalho,
na delimitação e priorização das ênfases formativas e na reafirmação e
incorporação dos princípios fundamentais da relação teoria-prática e da
interdisciplinaridade (UNEMAT, 2015, p.4-5).

Desse processo de constituição dos cursos de Pedagogia, nos dois campi envolvidos
na pesquisa, o Curso de Cáceres assumiu a configuração da estrutura do átomo e, portanto, o
que na matriz anterior era denominado de semestres, foi substituído por esferas. Esse
delineamento curricular está apresentado no PPC do Curso de Pedagogia,

O parâmetro utilizado para definir a ‘arquitetura’ organizacional e para


orientar a dinâmica do currículo, é o modelo matemático da organização e
funcionamento do átomo, ou ‘modelo atômico’, como dizem os físicos.
Homologamente à ‘arquitetura’ organizacional do Átomo, o currículo é
74

constituído por um Núcleo Epistemológico, Temas Indutores, Núcleos de


Estudos, Esferas de Formação e Temas Catalizadores. Fazendo-se um
paralelo entre a dinâmica do currículo do Curso de Pedagogia e o
funcionamento do átomo, teríamos mais ou menos a seguinte situação:
fazendo movimento do centro para a extremidade, o núcleo epistemológico
(Didática, Estudos de Currículo e Metodologia de Ensino) libera (ou ativa)
Temas Indutores, que atingem as disciplinas, distribuídas e agrupadas no
NEB, NADE e NEI, fazendo com que essas disciplinas se desagrupem e se
desloquem, unindo-se a outras disciplinas, formando, então, novas
composições (esferas de formação/‘espaços de discussão e ação’). E,
fazendo movimento da extremidade para o centro, resultantes do processo de
trocas energéticas ocorrido nas esferas de formação, os Temas Catalizadores
da formação retornam ao Núcleo Epistemológico, de onde partem
novamente os Temas Indutores e, assim, sucessivamente (UNEMAT, 2015,
p.7).

Igualmente, ao explicitar os elementos conceituais e organizacionais que perpassam a


dinâmica de funcionamento do currículo de Pedagogia de Juara, o documento esclarece que
essa constituição “tem como finalidade promover a formação do pedagogo, como sujeito e
profissional da Educação capaz de inferir, intervir e cooperar metódica e teoricamente na
realidade de sua inserção e atuação profissional” (UNEMAT, 2013, p.11-12).
O que percebemos dos currículos do Curso, baseados na Resolução do CNE/CP nº
01/2006, é que a formação inicial do pedagogo deve pautar-se em uma perspectiva
multirreferenciada, que emerge das necessidades inerentes às suas vivências e que apresenta
as possibilidades de atuação em um amplo campo educativo, que exige conhecimentos e
saberes, tais como nas atividades de ensino em espaços de educação formal e não formal, na
participação, organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, dentre outros.
A integração dos componentes basilares do currículo manifesta-se na organização do
trabalho pedagógico que se consolida com o processo de planejamento, execução e avaliação
dos elementos curriculares referendados na Resolução 01/2006, contemplados nos três cursos
por meio das disciplinas, seminários e atividades teóricas, práticas de docência e de gestão
educacional, bem como atividades complementares, trabalho de conclusão do curso,
atividades de monitoria, iniciação científica, extensão e Estágio Curricular Supervisionado
(UNEMAT, 2015).
A composição curricular do Curso de Juara expressa as exigências que estão
dispostas na Resolução do CNE/CP nº 01/2006/ com a seguinte configuração:

2.820 horas dedicadas às atividades formativas que consistem em estudos


teóricos e práticos. a) Núcleo de estudos básicos caracterizam os
conhecimentos básicos da formação do educador, fundamentados em
conceitos científicos e teorias da educação (Aulas teóricas) que serão
75

aprofundadas e articuladas nas ementas das disciplinas e demais


componentes da matriz curricular. b) Núcleo de aprofundamento e
diversificação de estudos de enfoque teórico-práticos (Práticas de ensino)
compreende a participação na realização de pesquisas, consulta a bibliotecas
e centros de documentação, visitas às instituições educacionais e culturais,
práticas pedagógicas de diferentes naturezas, participação em grupos de
estudos, entre outras atividades de caráter educativo e investigativo. As
aplicações das práticas de docência (práticas de ensino) serão desenvolvidas
nas execuções das ementas das disciplinas, contemplando o conhecimento
teórico, a relação deste com a prática e as especificidades que desafiam a
formação do Pedagogo, observando: Formação teórica consistente,
participação na tomada de decisões, capacidade de análise e intervenção na
realidade educacional e na sociedade. Prática interdisciplinar entre as
diferentes áreas do conhecimento, proporcionando uma visão totalizadora no
campo educacional. Articulação teoria-prática, desenvolvimento da atividade
pedagógica que possibilita o movimento da ação-reflexão-ação. c) O Núcleo
de estudos integradores permeará os estudos básicos através de
aprofundamento e diversificação, assim como as práticas de ensino,
assegurando os conhecimentos básicos para a formação do professor nas
diversas modalidades e níveis de ensino. A proposição das disciplinas de
Metodologia Científica, Epistemologia da Educação e Metodologia de
Pesquisa em Educação se constituem como elementos de difusão do
conhecimento científico e tecnológico. Os Estágios Curriculares
Supervisionados promovem o resgate da profissão-professor e a dimensão do
trabalho pedagógico, envolvendo o futuro pedagogo diretamente no processo
de ensino-aprendizagem em espaços escolares e não escolares, promovendo
o caráter investigativo desses processos. As disciplinas deste núcleo se
constituem em elementos de integração e enriquecimento das demais
disciplinas, estabelecendo relações integradoras entre as demais atividades
curriculares do curso (UNEMAT, 2013, p.13-14).

Em vista disso, os PPCs dos dois Campi apontam grandes similaridades em relação
às disciplinas e suas respectivas ementas dispostas na matriz curricular, mas apontam
diferenças, destacando-se entres estas, a organização das disciplinas no currículo do curso,
durante os oito semestres. Isso porque, para o Curso de Cáceres, cada semestre denomina-se
de esfera de formação, ao passo que para o curso de Juara denomina-se de fase formativa.
Os aspectos constitutivos do currículo do curso descritos no PPC do Curso de
Cáceres, de modo geral, almejam alcançar os seguintes objetivos:

a) Promover, em cada Esfera de Formação, a integração das dimensões


da produção do conhecimento e da vivência do campo de trabalho; b)
Estabelecer princípios metodológicos que intensifiquem as relações entre as
disciplinas, na organização e realização do trabalho pedagógico e na
produção do conhecimento científico educacional; c) Traçar estratégias que
possibilitem aos alunos integrar os saberes disciplinares, a partir dos temas
geradores dos seminários interdisciplinares (UNEMAT, 2015, p. 66).

Por sua vez, o PPC do Curso de Pedagogia de Juara (2013) apresenta no capítulo II,
76

como seu objetivo principal, formar um educador comprometido com o processo de ensino-
aprendizagem em diferentes contextos, conforme o disposto na Lei 9.394/96 em seus artigos
29 e 30, que tratam da finalidade e da oferta da Educação Infantil, e o artigo 32, que trata dos
objetivos do Ensino Fundamental para:

Compreender a função social da escola, da pedagogia na Educação Infantil,


anos iniciais do Ensino Fundamental e responder profissionalmente às suas
demandas, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais e a Política
Educacional do Mato Grosso, assim como eleger as competências expressas
no Parecer CNE/CP 1/2006 de 15/05/2006 e Instrução Normativa 04/2011-
UNEMAT, que atendem ao Projeto Pedagógico do Curso. Atuar preparado
nos diferentes contextos de trabalho: escolares, não-escolares e sua
articulação interdisciplinar. Desenvolver projetos de ensino, pesquisa e
extensão educacional que possibilitem o acesso ao conhecimento
socialmente produzido e historicamente acumulado pela humanidade,
visando uma permanente produção de novos saberes pedagógicos. Atuar
como gestor da educação, considerando as dimensões da sala de aula, da
aprendizagem e da regulação da ação pedagógica de maneira geral.
Corresponder com a educação da maioria da população brasileira através de
uma prática pedagógica competente e em consonância com o respeito ao ser
humano e ao exercício de sua cidadania (UNEMAT, 2013, p.6).

Nos objetivos dos PPCs, é possível perceber a preocupação com uma formação
docente que seja capaz de articular os conhecimentos e os saberes socialmente produzidos, na
perspectiva da interação entre a teoria e a prática no contexto da formação. Também evidencia
a necessidade de articular os princípios metodológicos que favoreçam a dialogicidade entre as
disciplinas na ação educativa, de modo que o processo ensino/aprendizagem possibilite as
produções de saberes que emanam da comunidade e que a ela retornam, produzindo e
ressignificando novos saberes.
A formação do pedagogo deve mobilizar conhecimentos, saberes, capacidades,
valores e atitudes de maneira a viabilizar a preparação do aluno para atuar nos diferentes
contextos, sejam escolares ou não escolares, por meio de uma prática pedagógica que
estabeleça as relações interdisciplinares entre as diferentes dimensões do processo educativo,
que podem contribuir para sua formação qualificando para a atuação profissional.
Além disso, os PPCs apontam para uma formação que contemple a atuação como
gestor da educação, considerando as dimensões da sala de aula, dos espaços não escolares, da
aprendizagem e da regulação da ação pedagógica, de modo que o seu fazer docente seja,
política e pedagogicamente engajado com a aprendizagem de todos os alunos que estão em
formação nas ações realizadas durante o estágio em espaços não escolares.
À vista disso, um trabalho pedagógico dessa natureza deve apontar estratégias que
77

facultem aos alunos integrar os saberes disciplinares, curriculares, pedagógicos e


experienciais a partir dos temas geradores dos seminários interdisciplinares, previstos em cada
esfera ou fase formativa, durante todo o curso. A partir dessa compreensão, debruçamo-nos
sobre o estágio curricular desenvolvido na UNEMAT, fazendo as reflexões possíveis para as
dimensões teóricas, práticas e normativas do estágio no curso de Pedagogia.

2.2.2 O estágio supervisionado: aspectos históricos e conceituais

Recorremos a uma contextualização histórica do estágio na UNEMAT, a partir de


uma experiência exitosa realizada na década de 1990, cuja experiência tem seu início em 1995
no Campus de Cáceres, quando implantado um projeto piloto de Estágio Curricular
Supervisionado, elaborado e implementado por um coletivo de professores.
Esse projeto, intitulado Projeto Coletivo de Estágio – interdisciplinar, envolveu os
docentes e acadêmicos dos seis cursos de licenciaturas existentes no campus em um trabalho
que permitiu um diálogo entre várias áreas de conhecimento e experiências entre os
professores e alunos dos vários cursos, num processo contínuo de apropriação, ressignificação
e de produção de saberes. Esse projeto foi reformulado e aprovado em 1998 e em 2002 e
esteve em operacionalização até 2004, quando o Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão
(CONEPE) aprovou a Resolução n.º 040 que estabelecia novas diretrizes para o Estágio
Curricular Supervisionado.
Em 2009, novas configurações foram delineadas a partir da Resolução n.º 038 Ad
Referendum do CONEPE, na qual o estágio foi concebido da seguinte maneira:

Art. 2º [...] componente curricular do Projeto Político Pedagógico de cada


Curso regular e modalidades diferenciadas, elemento indissociável do
processo de formação docente devendo ser assumido como compromisso
coletivo (UNEMAT, 2009).

Nessa normativa, a compreensão de Estágio Curricular Supervisionado estava


explicitada na seguinte perspectiva,

Art. 3º [...] o momento de efetivar, sob a orientação e supervisão do


professor, um processo de ensino-aprendizagem que possibilitará ao
licenciando vivenciar e atuar em espaços escolares e não escolares (cujas
atividades sejam voltadas à prática de ensino), preparando-o para a futura
atuação profissional (UNEMAT, 2009).
78

Também a Resolução nº 038/2009/CONEP, naquela ocasião, estabeleceu quanto ao


desenvolvimento do estágio que esta disciplina deveria ser realizada tomando como parâmetro
as seguintes atividades,

Art. 6.º § 1.º O Estágio Curricular Supervisionado será desenvolvido em


forma de observação e análise de práticas pedagógicas, coparticipação em
atividades de ensino, regência de classe, atividades de iniciação à docência
que envolva projetos de extensão, monitoria, pesquisa, seminários temáticos
e outras possibilidades da realidade situacional da Universidade.
§ 2.º O Estágio Curricular Supervisionado será realizado de acordo com o
Projeto Político-Pedagógico de cada curso regular e modalidades
diferenciadas (UNEMAT, 2009).

Em 2012, foi assinada a Resolução n.º 001/2012 - CONEPE constituindo uma


comissão de trabalho temporário para proceder à revisão da Normatização de Estágio
Supervisionado e, dos trabalhos dessa comissão, originou-se a Resolução nº
029/2012/CONEPE que dispõe sobre o Estágio Supervisionado dos Cursos de Licenciatura da
UNEMAT e está em vigor até o momento. Nesta última, a concepção de estágio ancora-se na
seguinte perspectiva:

Art. 1º. O Estágio Curricular Supervisionado é concebido como o


componente curricular do Projeto Pedagógico de Curso – PPC, elemento
indissociável do processo de formação docente, devendo ser assumido como
compromisso coletivo (UNEMAT, 2012).

A abordagem apresentada nessa Resolução nº 029/2012 provoca a reflexão de que o


estágio possui uma função política e pedagógica integradora no currículo do curso que
demanda um compromisso de todos com a formação do pedagogo e pressupõe uma relação de
interdependência entre os vários campos do conhecimento.
Corroborando tal ideia, o Projeto Pedagógico de Estágio do Curso de Pedagogia de
Cáceres (s.d.) explicita que a tarefa de aprender a profissão docente, além da realização de
atividades práticas no âmbito do Estágio, para constituir-se como professores “é uma tarefa
teórico-prática de caráter contínuo e coletivo – ao mesmo tempo em que os acadêmicos vão
gradativamente, interagindo com outros sujeitos na Universidade, na Escola e em outros
Espaços Não-escolares” (p. 01). Esse movimento interativo em que se realizam as trocas de
experiências e saberes possibilita a apropriação e ressignificação dos saberes que são oriundos
de sua trajetória de vida e de seu processo formativo.
Por conseguinte, a perspectiva integradora e intersubjetiva assumida pela Resolução
79

nº 029/2012 em relação à articulação entre as disciplinas do Curso, assim como seus


respectivos professores, desempenha um papel importante na formação teórico-prática
(práxis) dos futuros pedagogos.
Outro aspecto igualmente importante explicitado nessa Resolução está relacionado à
compreensão de que o estágio é concebido como práxis,

Art. 8º. O Estágio Curricular Supervisionado é concebido como práxis


pedagógica com as seguintes fases:
I – orientação;
II – observação/monitoria;
III – regência.
Parágrafo Único: As atividades de orientação deverão se estender durante
todo o período de estágio (UNEMAT, 2012). (grifos do autor)

A Resolução nº 029/2012 normatiza que o estágio é concebido como práxis que se


realiza nas interfaces das suas diferentes fases. Então, a práxis, nesse contexto, manifesta-se
na dinâmica que ocorre no processo de instrumentalização teórico-prática, na fase de
observação e de intervenção pedagógica. Estes momentos são interdependentes e
complementares, constituídos, pois, dos modos de pensar as atividades de estágios em
diferentes espaços com os sujeitos, também diferentes, que estão inseridos na realidade social.
Nesse sentido, as ações educativas realizadas no Estágio Curricular Supervisionado
devem partir, em primeiro lugar, do conhecimento da realidade social do espaço em que se
pretende atuar, de maneira que as informações ali coletadas sobre o espaço, o perfil sócio
econômico dos participantes, os objetivos e perspectivas de trabalho educativo direcionado
àquele grupo contribuam para subsidiar, de forma teórica e prática, os estagiários, permitindo
que estes últimos tornem-se aptos a conceber e desenvolver uma prática educacional que
atenda às necessidades e problemáticas percebidas naquele espaço.
Isto posto, as ações desenvolvidas nos espaços não escolares devem ser voltadas ao
compromisso político e pedagógico com o ensino, a pesquisa e a extensão, de maneira que
propicie o trabalho educativo em consonância com os interesses e necessidades daquele grupo
e da comunidade. A partir do conhecimento do espaço e dos sujeitos que dele participam, o
estagiário deve elaborar uma proposta de intervenção pedagógica nos espaços educativos não
escolares, de modo que ele possa atuar crítica e coletivamente no cotidiano da comunidade em
que é realizada a ação educativa.
Outro momento constitutivo do estágio diz respeito à atividade de monitoria, que
possibilita ao estagiário intervir na realidade educativa em parceria com o outro ou, noutros
termos, possibilita àquele agir conscientemente com outro e aprender a fazer, fazendo.
80

Na Resolução 029/2012/CONEPE, a concepção do termo monitoria abordada


corresponde ao significado definido pelo Ministério do Trabalho, como podemos observar a
seguir:

São atividades que se constituem na participação dos alunos na execução de


projetos de ensino e na vida acadêmica, além de incentivar a melhoria no
processo ensino/aprendizagem fortalecendo a relação aluno/professor
(MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2014, p. 20).

Nesse sentido, o PPC do curso de Pedagogia do Campus “Jane Vanini” explicita que
a compreensão de estágio ancora-se na Resolução CNE/CP nº 1/2006 e deverá “ser realizado,
ao longo do curso, de modo a assegurar aos graduandos experiência de exercício profissional,
em ambientes escolares e não escolares, que ampliem e fortaleçam atitudes éticas,
conhecimentos e competências” (2015, p.64). Desse modo, o estágio constitui-se espaço de
formação e de construção da identidade do pedagogo, formalmente, a partir do terceiro
semestre/esfera e perdura até o oitavo semestre/esfera/fase formativa.
No PPC do Curso de Cáceres (2015), o estágio permeia o processo formativo dos
alunos em formação desde seu ingresso no curso, conforme delineado a seguir:

Nas Esferas 1 e 2, o Estágio Curricular Supervisionado caracteriza-se,


indiretamente, como interface das teorizações, questionamentos e
problematizações disciplinares e do processo de produção do conhecimento,
nos quais a educação, inclusive no âmbito escolar, é tomada como objeto
central. Na Esfera 3, o Estágio Curricular Supervisionado caracteriza-se,
fundamentalmente, pela atuação e vivência do aluno/acadêmico na Educação
Infantil I, por meio da execução das fases de orientação,
observação/monitoria e regência na creche, junto a crianças de 0 a 3 anos.
Na Esfera 4, o Estágio Curricular Supervisionado caracteriza-se,
fundamentalmente, pela atuação e vivência do aluno/acadêmico na Educação
Infantil II, por meio da execução das fases de orientação,
observação/monitoria e regência na creche, junto a crianças de 4 e 5 anos.
Na Esfera 5, o Estágio Curricular Supervisionado caracteriza-se,
fundamentalmente, pela atuação e vivência do aluno/acadêmico na
alfabetização, por meio da execução das fases de orientação,
observação/monitoria e regência no 1º, 2º ou 3º anos do Ensino
Fundamental. Na Esfera 6, o Estágio Curricular Supervisionado caracteriza-
se, fundamentalmente, pela atuação e vivência do aluno/acadêmico no
Ensino Fundamental, por meio da execução das fases de orientação,
observação/monitoria e regência no 4º e 5º anos. Na Esfera 7, o Estágio
Curricular Supervisionado caracteriza-se, fundamentalmente, pela atuação e
vivência do aluno/acadêmico na modalidade Educação de Jovens e Adultos,
por meio da execução das fases de orientação, observação/monitoria e
regência no Ensino Fundamental dessa modalidade. Na Esfera 8, o Estágio
Curricular Supervisionado caracteriza-se, fundamentalmente, pela atuação e
vivência do aluno/acadêmico em processos educativos em espaços não
escolares, por meio da execução das fases de orientação,
81

observação/monitoria e regência definidas em Plano de Trabalho elaborado e


apresentado ao Colegiado do Curso para aprovação (UNEMAT, 2015, p.64-
65).

Igualmente, no PPC do Curso de Juara (2013), o estágio é concebido como o espaço


que possibilita a articulação entre os saberes produzidos socialmente, os quais são
apropriados, ressignificados e produzidos coletivamente na ação educativa, conforme
explicita:

O Estágio Curricular Supervisionado realizado ao longo do curso assegurará


ao (a) acadêmico (a) um conhecimento do real (contexto de trabalho), numa
articulação entre o conhecimento teórico e a produção de novos sentidos e
diferentes conhecimentos para a docência, considerando a dimensão
prospectiva da prática pedagógica em suas múltiplas dimensões. A práxis é
instituída como concepção nuclear do curso de Pedagogia e a docência como
eixo principal de modo a assegurar aos graduandos experiência de exercício
profissional em ambientes escolares e não escolares, que vise ampliar e
fortalecer atitudes éticas, conhecimentos, habilidades e capacidades
necessárias ao pedagogo nos diversos níveis e modalidades da Educação
Básica: Educação Infantil (em creches e pré-escolas); nos anos iniciais do
Ensino Fundamental (1º, 2º e 3º anos e 4º e 5º anos); na Educação de Jovens
e Adultos (1.º segmento); e nos espaços não escolares. Assim, ao longo do
curso os(as) acadêmicos(as) realizarão seu trabalho pré-profissional: a) na
Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental; b) na
Educação de Jovens e Adultos (1º segmento); c) em atividades da gestão de
processos educativos, no planejamento, implementação, coordenação,
acompanhamento e avaliação de atividades e projetos educativos em espaços
escolares e não escolares; d) em reuniões de formação pedagógica (Art. 8º
inciso IV da Resolução CNE/CP 1/2006) (UNEMAT, 2013, p.14).

Esse campo de conhecimento dimensiona a prática educativa tomando como objeto o


que preceitua a Resolução CNE/CP nº 01/2006 e a reiteração contida nos PPCs dos Cursos, os
quais priorizam, igualmente, as ênfases formativas para a docência na Educação Infantil e nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental, na Educação de Jovens e Adultos, bem como a
participação em atividades da gestão de processos educativos, no planejamento,
implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos.
Ademais, tal campo de conhecimento desdobra-se em seis disciplinas distribuídas ao
longo de seis fases formativas/esferas, tornando-se o fio condutor da formação do pedagogo e
caracterizando-se como uma disciplina que possui uma estreita relação com as demais da
matriz curricular do curso de Pedagogia.
Em vista disso, a partir do projeto Pedagógico de Estágio-PPE do Curso de
Pedagogia de Cáceres (2015) que dispõe sobre o processo de desenvolvimento da disciplina,
entendemos que o Estágio Curricular Supervisionado é uma “oportunidade ímpar de o
82

estagiário vivenciar o mundo do trabalho escolar e pedagógico, assumindo, temporariamente,


a condição de profissional da educação. Por isso mesmo é um momento oportuno para a
consolidação da formação inicial do professor” (p. 02).
Além disso, o PPE do Curso de Pedagogia de Cáceres (2015) informa-nos que o
estágio constitui-se como “uma rica oportunidade para o estagiário efetivar, sob a supervisão
de um profissional mais experiente, um processo de ensino-aprendizagem que poderá tornar-
se concreto em sua futura carreira profissional”, haja vista que a prática pedagógica
desenvolvida no estágio oportuniza aos alunos, formação, experiências e vivências, bem como
o desenvolvimento da autonomia e das competências e habilidades necessárias a sua atuação
profissional.
Nesse sentido, o trabalho didático-pedagógico nesta disciplina pauta-se por um
processo de ensino-aprendizagem em que as interações vivenciadas nas dinâmicas internas da
disciplina, enquanto instrumentação teórico-prática, estabeleçam um forte vínculo com as
práticas sociais e educativas realizadas nos contextos não escolares. No campo de
desenvolvimento, o Estágio em espaços não escolares realiza-se a partir da elaboração de uma
Proposta Pedagógica realizada pelos estagiários junto às instituições interessadas, em
associações de bairros, igrejas, clubes de serviços, sindicatos de trabalhadores em educação,
sindicato de trabalhadores e trabalhadoras rurais, espaços públicos de saúde, dentre outros.
Para efetivar a formação do pedagogo, a Resolução CNE/CP nº 01/2006, no Art. 7º,
orienta que o curso de Licenciatura em Pedagogia deverá ter uma carga horária mínima de
3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico, assim distribuídas:

[...] II- 300 horas dedicadas ao Estágio Supervisionado prioritariamente em


Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, contemplando
também outras áreas específicas, se for o caso, conforme o projeto
pedagógico da instituição (BRASIL, 2006, p. 4).

De acordo com a referida Resolução, em seu art. 8º, nos termos do projeto
pedagógico da instituição, a integralização de estudos será efetivada por meio de:

IV - estágio curricular a ser realizado, ao longo do curso, de modo a


assegurar aos graduandos experiência de exercício profissional, em
ambientes escolares e não-escolares que ampliem e fortaleçam atitudes
éticas, conhecimentos e competências: a) na Educação Infantil e nos anos
iniciais do Ensino Fundamental, prioritariamente; b) nas disciplinas
pedagógicas dos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal; c) na
Educação Profissional na área de serviços e de apoio escolar; d) na Educação
de Jovens e Adultos; e) na participação em atividades da gestão de processos
educativos, no planejamento, implementação, coordenação,
83

acompanhamento e avaliação de atividades e projetos educativos; f) em


reuniões de formação pedagógica (BRASIL, 2006, p.4).

A organização curricular demonstra uma preocupação com os aspectos relativos à


formação do pedagogo, que deve ser forjada nos espaços educativos nos quais as experiências
adquiridas sejam transformadoras da realidade social. Após a contextualização do estágio no
Curso de Pedagogia, trazemos para nosso estudo e reflexão o Estágio Curricular
Supervisionado VI (60 h/a) com foco na atuação em espaços não escolares, que compõe a
oitava esfera/fase formativa e que se constitui o nosso objeto de pesquisa. Os PPCs dos
Cursos de Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara explicitam, igualmente, as finalidades
dessa disciplina conforme está descrito na ementa:

Abordagem teórica relativa aos processos de ensino, aprendizagem,


execução de atividades docentes junto à comunidade, nos espaços da
educação não-escolar, proporcionando ao estagiário o aprender a ser
professor, comprometido com a inserção social, contribuindo para a
eliminação das desigualdades sociais. Investigação para o levantamento e
inclusão de crianças e jovens que se encontram fora da escola, adultos não
alfabetizados, planejando e desenvolvendo uma proposta pedagógica que
inclua essas pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social,
educacional e cultural (UNEMAT, 2015, p.57).

A disciplina possui um caráter político e pedagogicamente engajado com o processo


formativo do aluno e vinculado às realidades sociais em que se constituem o lócus de ensino,
de extensão e de pesquisa do processo de fazer-se professor. Nessa perspectiva, o PPE do
Curso de Pedagogia de Cáceres, (2015) apresenta algumas características que são
consideradas como as dimensões fundamentais do trabalho docente universitário:

a) ensino – estágio enquanto componente curricular do curso de Pedagogia,


em que se desenvolvem atividades de ensino-aprendizagem de conceitos,
habilidades e valores concernentes ao profissional da educação. b) pesquisa
– o estágio como espaço para a produção de conhecimentos, tanto por parte
dos docentes/orientadores quanto por parte dos alunos/estagiários, que na
efetivação das atividades do estágio tomam permanentemente o trabalho
docente e o campo de sua realização como objetos de reflexão/investigação.
c) extensão – a própria efetivação do estágio constitui-se em processo
genuíno da relação da universidade com a sociedade mais ampla,
representada pelos locais em que se realizam as atividades (PPE, 2015. p. 4).

A preocupação demonstrada com a articulação entre o ensino, pesquisa e extensão no


processo de formação do pedagogo merece ser destacada em razão dos modos como está
concebido o estágio, nos Projetos Pedagógicos do Curso e Projeto Pedagógico de estágio, que
84

expressam os objetivos, interesses e preocupações formativas pelo grupo de docentes. São,


portanto, carregadas pelas diferentes visões de mundo vivido e perspectivas teóricas
assumidas por esse grupo.
Essa posição assumida pelos docentes representa, em nossa compreensão, um avanço
significativo do ponto de vista de pensar o estágio a partir das relações entre os saberes, as
culturas organizacionais, das reflexões sobre a prática e como campo de pesquisa sobre essas
mesmas práticas, tornando-o espaço por excelência de aprendizagens múltiplas e de produção
de saberes também plurais.
Reiterando tais argumentos, Zabala (1998) esclarece-nos que, por “trás das propostas
metodológicas se escondem valores e ideias em relação aos processos de ensinar e de
aprender e concepções de conhecimento e de ciência que norteiam a prática pedagógica do
professor de estágio” (ZABALA (1998) apud PIMENTA, LIMA, 2012, p.113).
Essa ação pedagógica está organizada de tal forma que as etapas do Estágio
Curricular Supervisionado em espaços não escolares do Curso de Pedagogia de Cáceres
articulam-se entre si e com as demais disciplinas e campos do conhecimento, conforme está
descrito no quadro III a seguir.
85

Quadro 3 - Estágio Curricular Supervisionado em espaços não escolares

Carga
Conteúdo e/ou Atividade
Horária
- Etapa de instrumentalização teórico-prática: fundamentação teórica; conhecimento e
discussão da normatização do estágio; definição do Espaço Não Escolar para atuação;
viabilização dos instrumentos legais: ofício de apresentação do estagiário ao Espaço Não
Escolar e celebração do termo de compromisso entre o estagiário e a Instituição 15 horas
concedente, com a interveniência da UNEMAT; orientação aos estagiários na elaboração
do planejamento e execução de uma Proposta Pedagógica em espaços não-escolares; e,
orientação para elaboração do relatório final.

- Observação e caracterização do Espaço Não Escolar selecionado para atuação. 10 horas

- Desenvolvimento de uma Proposta Pedagógica (aulas ou atividades) pelo próprio


estagiário junto a empresas ou instituições interessadas, podendo ser a execução de tal
proposta: a) em empresas ou Instituições nas quais há previsão de trabalho educacional; b)
em projetos de EJA para servidores públicos ou de associações de bairros, igrejas, clubes
de serviços, ou mesmo, atuação diretamente com analfabetos funcionais detectados nos
30 horas
bairros da cidade e comunidades rurais; c) atuação com crianças que se encontram fora da
escola nos bairros da cidade e comunidades rurais; d) atuação em projetos de extensão
apoiados/institucionalizados pela UNEMAT que comportem atividades de ensino, dentre
outros.
- Elaboração de relatório final
- Avaliação geral das atividades de estágio:
05 horas
• Com a entidade envolvida
• Na universidade
Fonte: Projeto Pedagógico de Estágio do Curso de Pedagogia de Cáceres, 2015, p.11.

O Estágio Curricular VI, na matriz atual do Curso de Pedagogia de Cáceres, dispõe


de uma carga horária de 60 horas. No entanto, no curso anterior, essa disciplina contava com
uma carga horária de 120 horas, destinadas ao processo de instrumentalização teórico-prática
e de vivências que são atividades de observação, monitoria e intervenção pedagógica nos
espaços não escolares.
Apesar da redução de carga horária, essa disciplina de estágio não sofreu um impacto
muito grande porque, nesse processo de reformulação do curso, foi criada a disciplina de
Gestão da Educação em espaços escolares e não escolares (60h) que contribui com estudos e
reflexões acerca de conceitos importantes sobre a gestão da educação em tais espaços e,
86

consequentemente, preenche parcialmente as lacunas que, por ventura, possam ocorrer no


processo de instrumentalização teórico/prática.
Entretanto, a partir dessa constatação, ousamos afirmar que seria interessante que
essa disciplina dispusesse de, pelo menos, 90 horas para conseguir, minimamente, tratar das
problemáticas que envolvem a realização dos estágios, tais como o conhecimento da
realidade, por meio do acompanhamento e da observação do espaço e das atividades ali
realizadas. Ainda, considerando que no Projeto Pedagógico de Estágio do Curso de Pedagogia
de Cáceres (2015) os conteúdos/atividades programados para as seis esferas devem ser
desenvolvidas numa visão contínua, as atividades docentes devem possibilitar a inserção do
estagiário em contextos escolarizáveis e não escolares, o que demanda trabalho e tempo
educativo com diferentes sujeitos e/ou grupos sociais.
Também, o PPE do Curso de Pedagogia de Cáceres (2015) afirma que, o Estágio
Curricular Supervisionado caminha para a concretude de ações que propiciem ao estagiário o
acesso às bases teórico-práticas para realizar uma prática educacional que contemple os
problemas e as necessidades da comunidade ou grupo, como o motor gerador das ações
educativas que minimizem tais situações. O trabalho pedagógico realizado nesse campo deve,
portanto, ancorar-se nas percepções cuidadosas dos espaços pelos sujeitos em formação, de
modo que haja um comprometimento de sua prática com o ensino, a pesquisa e a extensão.
Nesse sentido, o trabalho educativo a ser desenvolvido pelos estagiários deve ser
orientado por uma visão crítica das situações enfrentadas na coletividade, nos espaços
escolares e em espaços não escolares, realizando as propostas pedagógicas para produzir
saberes em consonância com os objetivos propostos e necessidades.
Para atingir esse objetivo, deve-se assegurar o acesso à fundamentação teórico-
prática relativa à formação de professores, bem como aos espaços que são lócus da realização
do trabalho docente, considerando a importância dos conteúdos/atividades no Estágio
Curricular Supervisionado que são oriundos das problemáticas vividas por aquele grupo ou
comunidade.
Nesse contexto, o Estágio Curricular Supervisionado VI do Curso de Pedagogia de
Cáceres deve dispor de tempo necessário às orientações teórico-práticas sobre os aspectos
conceituais e a forma de organização e realização do Estágio em espaços não escolares, uma
vez que, nesse momento, há uma definição dos possíveis espaços onde os estagiários atuarão
e como deverão realizar o processo de intervenção na realidade.
Dessa maneira, inicialmente, a atividade docente deve ser permeada por uma fase de
aprofundamento teórico, na qual serão estudados/discutidos textos que abordem aspectos
87

sobre Educação Formal, não formal, informal, pedagogia coletiva, socioeconômica solidária,
papel do educador social, exclusão/inclusão, identidades e diversidade cultural, dentre outros.
Após as orientações iniciais em relação à disciplina e formalizado pelos professores
orientadores de estágio, cada estagiário ou grupo escolhe, por afinidade, o espaço não escolar
para a realização das atividades e entra em contato com a gestão do local para a etapa de
observação. Após ter definido o espaço de atuação de forma coletiva e de ter constatado os
aspectos organizacionais e as necessidades educacionais ali existentes, os estagiários
elaboram a proposta pedagógica para a intervenção no espaço definido.
Nessa tarefa, os estagiários pensam as atividades educativas tomando como
parâmetros os conhecimentos e saberes adquiridos na trajetória acadêmica e nas vivências e
experiências advindas do mundo social, a fim de oportunizar aos participantes a inclusão de
todos aqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade social.
A culminância da atividade do Estágio Curricular Supervisionado VI ocorre com a
avaliação coletiva de todos os grupos de estagiários, momento em que se posicionam acerca
das fragilidades, potencialidades e das contribuições realizadas e, ao mesmo tempo,
adquiridas durante esta etapa acadêmica. Nessa perspectiva, o processo de avaliação será
embasado nos princípios da avaliação emancipatória, incidindo sobre as dimensões cognitivas
e socioafetivas dos estagiários, ocorrendo em cinco fases. Conforme descrito no PPE do
Curso de Pedagogia de Cáceres (2015), tais fases estão assim distribuídas:

1ª Fase - Etapa de Fundamentação Teórica:


 Envolvimento e comprometimento do estagiário nas discussões e
leituras; a produção escrita, demonstrando entendimento do assunto e
capacidade de argumentação (fundamentação e crítica), clareza e coerência.
2ª Fase - Etapa de Observação/Monitoria e Regência:
 Observação/monitoria preparação das aulas - Critérios: zelo no
tratamento das questões relativas à organização e gestão escolar e às práticas
pedagógicas em sala de aula na escola-campo; participação nas atividades de
grupo; elaboração do planejamento de ensino. Nesse momento ocorrerá
também a coleta de dados para o seminário interdisciplinar, o qual ocorrerá
ao final do semestre envolvendo as demais disciplinas da 6ª Esfera da matriz
curricular do curso de Pedagogia da Unemat.
 Regência - execução do planejamento de ensino (clareza nos
objetivos, conteúdos, recursos a serem utilizados, adequação e relevância da
metodologia de ensino e avaliação); domínio de conteúdo durante as aulas;
postura docente (comunicação e direção de classe); interação com os alunos
e capacidade de iniciativa.
3ª Fase Participação na Coleta de Dados (teóricos e de campo) e na execução
do Seminário Interdisciplinar ao final do semestre.
4ª Fase - Etapa de Elaboração do Relatório Final de Estágio: capacidade de
argumentação (fundamentação e crítica); sistematização das ações
88

desenvolvidas; contextualização e articulação de fatos e situações e; clareza


e coerência na organização do texto.
Como instrumentos de avaliação serão levados em consideração: 1)
Participação nas aulas; resumos de textos lidos; 2) execução da observação e
da regência; 3) participação na coleta de dados e execução do seminário
interdisciplinar ao final do semestre e; 4) Participação na elaboração do
relatório final de estágio (PPE, 2015. p.18) (grifo do autor).

O processo de avaliação, tomando todas as etapas de realização do estágio em


espaços não escolares como parâmetro para conhecer as dificuldades e as soluções
encontradas durante o percurso realizado, constitui-se um momento rico de aprendizagens
coletivas que orientam as tomadas de decisão quanto ao alcance e contribuições apresentadas
nesse estágio e para produzir as mudanças necessárias na condução das próximas ações.
Então, de posse desses conhecimentos da realização do estágio, obtidos nas etapas descritas
anteriormente, são atribuídas três notas aos estagiários: duas relativas às atividades de cada
etapa de estágio (Observação, Regência e Relatório de Estágio) e outra decorrente da
atividade de coleta de dados e realização do Seminário Interdisciplinar.
Todas essas ações são realizadas em espaços educativos não escolares, numa
dinâmica de funcionamento que se diferencia dos espaços escolares, considerando que as
ações não escolares desenvolvidas tomam a realidade social como o currículo a ser
trabalhado. Dessa maneira, a prática pedagógica ali desenvolvida deve partir das necessidades
e problemas que emergem dessa realidade, sendo permeada, portanto, de intencionalidades,
envolvimento e participação coletiva na busca por soluções através de intervenções
pedagógicas ancoradas nos saberes socialmente produzidos.

2.3 O ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO EM ESPAÇOS NÃO ESCOLARES:


PRODUÇÃO DE SABERES

Tomamos o Estágio Supervisionado em espaços não escolares na perspectiva de


formação e atuação profissional no campo educacional, pautado no compromisso ético,
político de que os sujeitos envolvidos sejam copartícipes de seu processo formativo.
Compreendemos que, assim, as suas vivências e experiências constituem a base do seu fazer
pedagógico e de sua aprendizagem, mediadas pelos saberes construídos, apropriados e
ressignificados ao longo da vida.
Nessa direção, entendemos, ainda, que o processo formativo vislumbra o papel do
educador como intelectual engajado política e pedagogicamente com aqueles com os quais
89

trabalha. Um sujeito situado historicamente com competências, habilidades e valores capazes


de produzir mudanças sociais e educativas naquele grupo ou comunidade que,
reconhecidamente, é um ser também histórico, social e político. Dessa relação dialógica
estabelecida entre os sujeitos e a realidade social desencadear-se-á a produção, a apropriação
e a ressignificação de novos saberes na perspectiva ontológica.
Pimenta e Lima (2012) elucidam que o Estágio Curricular Supervisionado constitui-
se o espaço educativo que promove a integração do processo de formação inicial do futuro
profissional, tomando como referência sua ação educativa, ou seja, a sua prática pedagógica
como objeto de estudo, reflexão, investigação e interpretação crítica mediada pelos saberes
curriculares, disciplinares, pedagógicos e experienciais adquiridos nas vivências de sua
trajetória acadêmica.
Assim, o Estágio Curricular Supervisionado em espaços não escolares, situado no
campo da Educação Não Formal, perspectiva teórica assumida pelo curso de Pedagogia,
constitui-se um espaço de realização da prática educativa que oportuniza a apropriação,
produção e ressignificação de saberes. O Estágio encontra ainda nesse campo de formação a
possibilidade de dar visibilidade à emergência de novos “campos de produção de
conhecimento e áreas do saber que estavam invisíveis ou não tratadas como conhecimento ou
saber educativo” (GOHN, 2009, p.3).
Assim sendo, a Educação Não Formal assume um papel importante no processo
formativo do pedagogo, pois, além de ampliar o campo de aprendizagem, também expande os
possíveis espaços de atuação profissional. E, nesse contexto, é importante destacar que esse
campo da educação não tem a devida visibilidade e reconhecimento social quanto ao trabalho
que realiza. Trabalho esse, aliás, que se insere no campo das políticas públicas sociais,
sobretudo por meio daquelas ações realizadas nos movimentos sociais e que se manifestam
em programas, projetos, organizações não governamentais e grupos sociais que atendem as
minorias em situações de risco ou vulnerabilidade.
Essa ação educativa atenua as lacunas deixadas pela ausência de política de governo
que oferta, de modo ineficiente, uma formação (in)capaz de produzir um enfrentamento de
problemas econômicos, sociais, políticos e culturais. Assim, a Educação Não Formal
contribui para desencadear novas realidades sociais que sejam mais equitativas e socialmente
igualitárias.
Nessa linha de pensamento, é possível afirmar que há um apagamento intencional
das forças advindas das ações educativas realizadas nos espaços de educação não formal,
promovidas pelas políticas públicas oficiais que, historicamente, carregam em si, os interesses
90

de determinados grupos que estão no poder e, dessa forma, encurtam e, por vezes, prejudicam
as relações entre a “educação escolar e outros modos de produção de conhecimento que
emergem das ações no campo da arte, da estética, da cultura e das experiências coletivas que
produzem a existência” e configuram a identidade de determinados grupos (ALENCAR,
ALONSO, COSTA, 2018, p. 3).
Sabemos que a Educação Não Formal constitui-se um espaço propício para a
aquisição, produção e ressignificação de saberes pelos sujeitos em formação que, por meio de
ações educativas que contemplem os anseios e necessidades que emergem de determinados
grupos, podem interferir positivamente na realidade daquela comunidade e promover ações
que contribuam não apenas com a construção da identidade dos envolvidos, mas que reflitam
sobre essa realidade e a tomem como ponto de partida para transformá-la.
Estas outras racionalidades realizam-se junto a diferentes projetos sociais,
organizações não governamentais e nos cursos de formação de professores como espaços por
excelência para a formação e a atuação profissional. Tanto assim que os espaços de Educação
Não Formal foram inseridos nas Resoluções nº 01/2006 e 02 de 2015, ambas do CNE, que
estabelecem as diretrizes para o Curso de Pedagogia e definem as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de
formação pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação
continuada, respectivamente.
Gohn (2009, p.4) explicita que os espaços não escolares são compreendidos como
“processos de autoaprendizagem e aprendizagem coletiva a partir da experiência em ações
organizadas segundo os eixos temáticos: questões étnico-raciais, gênero, geracionais, de
idade, etc”. Essas temáticas são importantes e necessárias para o processo de constituição dos
sujeitos como pessoas de direitos e contribuem para que os alunos e alunas em situação de
estágio possam tornar-se professores(as) mais próximos da realidade onde atuam, seja em
ambientes escolares ou não escolares.
Essa perspectiva de compreensão do trabalho educativo em espaços de educação não
formal pressupõe assumir metodologias, segundo Gohn (2010), que partam da “cultura dos
indivíduos e dos grupos. O método nasce a partir da problematização da vida cotidiana; os
conteúdos emergem a partir dos temas que se colocam como necessidades [...] e não são
dados a priori. São construídos no processo” (GOHN, 2010, p. 46).
Nesse sentido, “o método passa pela sistematização dos modos de agir e de pensar o
mundo que circunda as pessoas” (Ibidem, p.47) e, nessa perspectiva, carrega os sentidos e
significados atribuídos pelos participantes na ação educativa, de modo que o fazer de cada
91

envolvido permita o fortalecimento da ideia de pertencimento às atividades que foram


realizadas.
Gohn (2010) apresenta também algumas contribuições importantes acerca da
aprendizagem e saberes orientadores dos processos coletivos de formação e nas interações
entre a comunidade e instituições de ensino possibilitadas por meio da educação não formal:

1. Prática: como se organizar, como participar, como unir-se e que eixos


escolher;
2. Teórica: quais os conceitos-chave que mobilizam as orças sociais em
confronto (solidariedade, inclusão social, participação, cidadania,
emancipação etc e como adensá-los em práticas concretas;
3. Técnico-instrumental: como funcionam os órgãos governamentais, a
burocracia, seus trâmites e papéis, quais as leis que regulamentam as
questões em que atuam etc.
4. Política: quais são seus direitos e os da sua categoria, quem é quem nas
hierarquias do poder estatal governamental, quais são os obstáculos ou as
dificuldades para o exercício de seus direitos etc.
5. Cultural: quais os elementos que constroem a identidade do grupo, quais
as suas diferenças, diversidades e adversidades culturais que tem de
enfrentar, qual a cultura política do grupo (seu ponto de partida e o processo
de construção ou agregação de novos elementos a essa cultura) etc.
6. Linguística: refere-se à construção de uma linguagem comum que lhes
possibilite ler o mundo, decodificar temas e problemas, perceber/descobrir e
entender/compreender seus interesses no meio de um turbilhão de propostas
com que se defrontam e/ou confrontam. Com essa linguagem, eles criam
uma linguagem própria, com códigos e símbolos que os identificam;
7. Sobre economia: quanto custa, quais os fatores de produção, como baixar
custos, como produzir melhor e com custo mais baixo etc.
8. Simbólica: quais são as representações que existem sobre eles –
demandatários -, sobre o que demandam, como se autorrepresentam, que
representações ressignificam, que novas representações criam etc.
9. Social: como falar e ouvir em público, hábitos e comportamentos de
grupos e pessoas, como se portar em espaços diferenciados.
10. Cognitiva: a respeito de conteúdos novos, temas ou problemas que lhes
dizem respeito; é propiciada pela participação em eventos, observação,
informações transmitidas por assessorias etc.
11. Reflexiva: sobre suas práticas e experiências, geradoras de saberes;
12. Ética: a partir da vivência ou observação do outro, centrada em valores
como bem comum, solidariedade, compartilhamento. Esses valores são
fundamentais para a construção de um campo ético-político (GOHN, 2010,
p. 43-44).

Nesse sentido, os saberes demandantes dos espaços de educação não formal


requerem do estagiário um perfil de educador social para que possa ir além do trabalho de
diagnosticar os problemas e necessidades existentes, mas, elaborar uma proposta de trabalho e
executá-la de acordo com os anseios e expectativas daquele grupo ou comunidade. Além do
mais, o trabalho do educador social possui uma via de mão dupla, pois possibilita ao educador
92

momentos de aprendizagem com as vivências e as experiências dos envolvidos, e, ao mesmo


tempo, promove o acesso ao saber por meio da atividade de ensino, utilizando-se do diálogo
tematizado.
A prática pedagógica comprometida com aqueles com os quais ensinam e se educam
entre si desloca o papel de professor para o de educador que, na interação com os sujeitos em
formação, também aprende enquanto ensina. Nesse movimento, ambos são protagonistas do
processo de constituição de si e do outro na relação com a realidade social em seus espaços de
convivências, na realização das práticas sociais. Um trabalho pedagógico que leve em conta
as vivências e experiências dos sujeitos oportuniza o reconhecimento de si e do outro nas
ações educativas desenvolvidas nos espaços de educação não escolares. Dessa prática, é
possível a emergência de saberes, valores, habilidades e sentimentos positivos de identidade e
pertencimento a determinados grupos sociais e comunitários que são igualmente produtores
de saberes, assim como nos espaços escolarizáveis.
Segundo Gohn (2010), há um diferencial entre a proposta de trabalho para os espaços
de educação formal em relação à pedagogia freiriana, considerando que se recomenda que o
educador deve deter os conteúdos prévios sobre aquela realidade, mas também aqueles
saberes historicamente produzidos e acumulados pela humanidade.
Tomando as ideias de Tardif (2002), entendemos que os saberes oriundos da
realidade social são igualmente importantes e necessários como aqueles conhecimentos
produzidos pela racionalidade científica. Desse modo, o acréscimo da educação não formal
pelas Diretrizes Curriculares Nacionais nos cursos de formação do pedagogo representa um
largo passo no sentido de complementar a educação escolar com conhecimentos e saberes
plurais coletivamente produzidos, os quais contribuem de maneira significativa para a
formação dos sujeitos.
A esse respeito, Gohn (2009) possibilita compreender que a Educação não formal
não tem a intenção de substituir a educação escolar, mas de complementá-la. Assim, a partir
do diálogo entre ambas, podem ocorrer parcerias para contribuir com o processo formativo
por meio de ações educativas desenvolvidas junto às organizações sociais e não
governamentais, em diferentes espaços em que são desenvolvidos projetos sociais nas
comunidades, ampliando, desse modo, espaços de atuação no mercado de trabalho para os
profissionais da área da Educação.
A esse respeito, Cortella (2007) traz uma importante contribuição:
93

Como educação não é sinônimo de escola, dado que esta é parte daquela,
tudo o que se expande para além da formalização escolar é território
educativo a ser operado. Ademais, se essa operação compartilhante na
Educação não formal pretende a consolidação de uma sociedade com
convivência justa e equânime, a cidadania em paz é o horizonte
(CORTELLA, 2007, P. 47).

Esse olhar de que a educação não formal possui uma função social e política
comprometida com a sociedade composta por homens e mulheres, jovens e crianças que
dispõem de interesses e ou necessidades formativas, o campo da educação não formal pode,
em determinadas circunstâncias e/ou contextos, complementar a educação formal.
Libâneo (2005, p.95) afirma que a “Educação formal e não formal interpenetram-se
constantemente, uma vez que as modalidades de educação não formal não podem prescindir
da educação formal”, o que corrobora o entendimento de complementaridade, apontado por
Gohn (2010) e Cortella (2007).
Assumimos, neste estudo, a perspectiva de educação não formal, embora dialogue
com a pedagogia social, pela sua origem caritativa do Cristianismo, considerando que esta
orienta-se para o trabalho educativo voltado para as pessoas que se encontram em condições
sociais desfavoráveis, conforme descreve Gohn (2010), enquanto que a educação não formal
possui um “processo político pedagógico ancorado em dimensões como a aprendizagem dos
indivíduos como cidadão, para atuar no mundo do trabalho, por meio de práticas cidadãs”
(GOHN, 2010, p. 35).
As práticas de educação não formal desenvolvidas em ONGs e outras instituições
constituem um mercado de trabalho em construção que se descortina para ações educativas do
pedagogo em diferentes frentes. Esse aspecto, somado ao que dispõe a Resolução CNE/CP nº
01/2006, a qual acrescentou a necessidade de formação para atuação nos espaços de educação
não formal, confere centralidade na busca de estudos e reflexões sobre as contribuições desses
espaços de aprendizagem e de formação.
Nessa direção, o Estágio nos Cursos de Pedagogia da UNEMAT, dos campi de
Cáceres e Juara, adquire o status de campo dialético em que se afirma como práxis educativa,
dinamizada na articulação entre a ação (atividade educativa), reflexão (repensar a sua prática)
e voltar à ação. Esse movimento dialético educativo nos espaços de educação não formal
produz a novidade que significa não a repetição da ação, mas a transformação pelo princípio
do protagonismo criado pelos membros do grupo nos momentos de interações e de
aprendizagem.
94

Nesse contexto é que explicitamos o corpus, o campo de pesquisa e as interações


produzidas pelos interlocutores que se manifestaram nas informações coletadas para a
pesquisa e que nos permitiram vislumbrar como se articulam a relação teoria-prática no
estágio em espaços de educação não formal a partir da descrição, discussões e reflexões
apresentadas nos próximos capítulos.
95

3 OS CAMINHOS DA PESQUISA

Neste capítulo, apresentamos os caminhos percorridos na realização da pesquisa no


que diz respeito ao campo empírico, perfil dos participantes, aspectos metodológicos,
instrumentos e técnicas de produção de dados. Nessa caminhada, orientamo-nos pelas ações
investigativas, objetivando a compreensão do estágio e da práxis educativa em espaços não
escolares, no contexto da formação inicial, como espaço de apropriação, construção e (re)
construção de saberes docentes que emergem da ação educativa das pessoas envolvidas.
Além disso, envidamos esforços na busca de identificar a concepção de formação
inicial presente nas diretrizes Curriculares de 2006, que dispõem sobre a formação do
pedagogo; assim como procuramos nos referenciais teóricos elementos que nos indicassem os
enfoques e discussões apresentados sobre a formação inicial e a constituição da identidade
profissional, tendo a práxis pedagógica como o elemento propulsor da formação do pedagogo.
O resultado desse esforço, que se tornou parte do Capítulo I deste estudo, é agora
aprofundado, com os dados oriundos da observação das práticas realizadas pelos professores e
alunos em situação de estágio, nas discussões e reflexões deste capítulo.
Dessa forma, enquanto no capítulo II abordamos os aspectos relativos à articulação
da teoria e da prática no currículo do curso de Pedagogia, nesse terceiro capítulo utilizamos as
informações resultantes das etapas de observação participante das práticas educativas nos
espaços não escolares para desvelar os saberes docentes que se destacam durante a realização
do estágio.
Nesse processo de observação participante das práticas realizadas pelos professores e
estagiários em espaços não escolares, debruçamo-nos na interpretação sobre as manifestações
de apropriação, construção e (re)construção dos saberes docentes, a partir das práticas
realizadas no estágio, além da observação nos relatórios finais que foram construídos pelos
alunos. Nesse capítulo, tomando como referência os objetivos ora explicitados, explanamos
sobre a abordagem da pesquisa qualitativa e os modos de realização da observação
participante, bem como o aporte teórico-metodológico que conduziu todas as etapas do
processo de realização da pesquisa.
Apresentamos os espaços da Universidade em que se situam os cursos de Pedagogia
e, de modo sucinto, algumas aproximações históricas sobre o curso, descrevendo as
características evidenciadas durante a observação e a leitura dos relatórios finais, nos espaços
96

não escolares, que se constituíram os lócus da pesquisa, assim como os participantes e as


informações coletadas.

3.1 A PESQUISA: CARACTERÍSTICAS E MÉTODOS

Tomando como ponto de partida a afirmação de Denzin (2006, p.18) de que a


“escolha das práticas da pesquisa depende das perguntas que são feitas, e as perguntas
dependem de seu contexto”, o desenvolvimento desta pesquisa focaliza o estágio curricular
supervisionado e a práxis pedagógica em espaços não escolares, como espaço de apropriação,
construção e (re)construção dos saberes docentes no curso de Pedagogia dos Campi de
Cáceres e Juara da Universidade do Estado de Mato Grosso.
Esse enfoque surge da seguinte situação problematizadora: a articulação teoria-
prática no estágio em espaços de educação não formal permite a apropriação, construção e
(re)construção de saberes da profissão docente? Nesse sentido, este estudo ancorou-se na
abordagem qualitativa que nos possibilita mergulhar nas relações intersubjetivas de
aprendizagens, vivências e experiências produzidas pelos professores e estagiários nas
comunidades em que atuam, e, desse modo, compreender as ações dos sujeitos em sua
concretude, portanto, revestidas de significados.
Para Denzin (2006, p. 17), a pesquisa qualitativa é compreendida como “um conjunto
de práticas materiais e interpretativas que dão visibilidade ao mundo”. Nesse sentido, o autor
reitera que essas práticas transformam o mundo em uma série de representações que abrange
as várias situações vividas durante a realização do estágio.
Nessa perspectiva, a realização da investigação considerou a legislação concernente
ao estágio, já discutida anteriormente, as concepções de estágio curricular supervisionado, a
práxis pedagógica, espaços não escolares, dentre outros elementos constitutivos dos projetos
pedagógicos dos cursos de Pedagogia, bem como as práticas educativas dos participantes em
situação de estágio. A nossa opção pela abordagem qualitativa ancorou-se também nas ideias
discutidas por Minayo (1994, p.21-22), considerando que, para essa autora, tal enfoque
responde a questões muito particulares e “trabalha com o universo de significados, motivos,
aspirações, crenças, valores e atitudes” e nos proporciona compreender as interações e
aprendizagens no contexto da práxis educativa, constitutiva dos processos de formação
inicial, mediadas pela articulação da teoria e da prática.
97

Nesse sentido, a perspectiva qualitativa é a abordagem mais adequada para o


presente estudo, uma vez que nos permite vislumbrar os significados atribuídos pelos sujeitos
ao seu fazer pedagógico, enquanto espaço de apropriação, ressignificação e produção de
saberes, e, consequentemente, acerca das vivências e experiências dos participantes,
elementos fundamentais para a pesquisa.
Segundo os autores Bogdan e Biklen (1994), a pesquisa numa abordagem qualitativa:

[...] tem o ambiente natural como sua fonte de dados e o pesquisador como
seu principal instrumento; e os dados coletados são predominantemente
descritivos; a preocupação com o processo é muito maior do que com o
produto; os investigadores qualitativos tendem a analisar os dados de forma
indutiva e por último, o significado é de importância vital na abordagem
qualitativa (BOGDAN, BIKLEN, 1994, p. 47-51).

Dessa maneira, a abordagem qualitativa, aliada à observação participante, bem como


às concepções teórico-metodológicas, viabilizaram encontrar as possíveis respostas aos
questionamentos postos neste estudo e, ao mesmo tempo, propiciaram a compreensão e a
apreensão das informações oriundas desse objeto com maior aproximação possível da
realidade das práticas educativas.
Haguette (2000) destaca que a observação participante é um processo no qual o
observador, em situações cotidianas de realização de estágio curricular supervisionado,
mantém-se face a face com os observados e participa ativamente com eles de seu ambiente
natural e social de vida, coletando, nessas ocasiões, os dados de que necessita. E, nessa
relação, o observador e observado, ao mesmo tempo em que modificam o contexto de que
fazem parte, são modificados por ele.
A observação participante, por suas características e delineamento, não possui um
roteiro prévio, considerando que as ações educativas vão revelando-se à medida que se
constituem e reconstroem-se no fazer pedagógico. No entanto, delimitamos alguns aspectos
balizadores do processo de observação:
 Os modos como se constitui a relação teoria/prática nos espaços de educação
não formal possibilitam a apropriação e (re)construção de saberes da profissão docente?
 Pensando-se na questão da práxis pedagógica, há um diálogo entre o professor
orientador de estágio e o estagiário, como resultado do processo de formação que seja capaz
de produzir uma reflexão/saberes experienciais na realização do estágio?
 Que dinâmica se estabelece nos espaços educativos não formais que a
diferencia daquela desenvolvida nos espaços de educação formal?
98

Além do mais, esse processo de apreensão dos conhecimentos da realidade social e


educativa nos possibilita vislumbrar, além das informações oriundas das práticas, os valores,
as culturas e os princípios que compõem a gama de saberes que são utilizados em situações de
estágio, e produzem a elaboração e a ressignificação de novas práticas educativas.
Nesse aspecto, Schön (1997) apresenta uma importante contribuição no que diz
respeito aos instrumentos de coleta de dados,

Não é suficiente perguntar aos professores o que fazem, porque entre as


ações e as palavras há por vezes grandes divergências. Temos de chegar ao
que os professores fazem através da observação direta e registrada que
permita uma descrição detalhada do comportamento e uma reconstrução das
intenções, estratégias e pressupostos. A confrontação com os dados
diretamente observáveis produz muitas vezes um choque educacional, à
medida que os professores vão descobrindo que atuam segundo teorias de
ação diferentes daquelas que professam (p.90).

Para vislumbrar essas possibilidades é que nos utilizamos da observação das práticas
que ocorrem durante o estágio, bem como das entrevistas com docentes que atuam na referida
disciplina e com os discentes em situação de estágio. Refletindo sobre isso, Denzin (2006)
afirma que a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem interpretativa que faculta a
compreensão da análise da práxis e da sua relação com os contextos vividos, o que significa
que seus pesquisadores estudem os fatos em seus cenários naturais, tentando entender, ou
interpretar, os fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles conferem nos
espaços que estão ao seu alcance, disponíveis à pesquisa.
Portanto, consideramos que o aprofundamento da temática no Estágio por meio da
concepção qualitativa constitui-se uma prática importante, na medida em que possibilita ao
pesquisador situar-se no mundo com o outro que realiza a interlocução com o objeto de sua
práxis e com a realidade social, entendidas como práticas materiais que são construídas pelos
sujeitos e percebidas pelo pesquisador.

3.2 O CAMPO DA PESQUISA

Esta pesquisa tem como campo empírico o estágio curricular e a práxis pedagógica
com foco em espaços não escolares no curso de licenciatura em Pedagogia da Universidade
do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), nos campi universitários “Jane Vanini” em Cáceres e
em Juara.
99

Inicialmente, foi planejada para ser realizada nos três campi da Unemat que ofertam
o curso de Pedagogia, na modalidade presencial, ou seja, em Cáceres, Juara e Sinop. No
entanto, em virtude da dificuldade encontrada na obtenção de autorização formal para
pesquisa junto ao campus de Sinop e, dada a exiguidade do tempo, reorganizamos a pesquisa
delimitando seu alcance apenas aos campi de Juara e Cáceres. Dessa forma, apresentamos de
modo sucinto os referidos campi com o intuito de contextualizar o lócus de pesquisa.

3.2.1 Contextualizando o Campus Universitário “Jane Vanini”

Foto 1 – Campus “Jane Vanini” – Cáceres,

Fonte: Site da UNEMAT. Disponível em http://caceres.unemat.br/. Acesso em 15 de maio de


2018.

O Campus Universitário “Jane Vanini” 7é, ainda, um campus jovem e que nasceu,
em agosto de 1999, para atender as demandas dos cursos existentes que, à época, eram
atendidos pela administração central da Universidade. Então, sua função primeira consistiu na
descentralização das atividades de gestão da reitoria da Universidade dos cursos de Cáceres, à
qual esteve vinculado.

7
As informações sobre o breve histórico do Campus “Jane Vanini” foram extraídas do portal da
UNEMAT. Disponível em: <http://caceres.unemat.br/portal/>
100

Inicialmente, criou-se uma Assessoria da Reitoria para Coordenação do Campus de


Cáceres com a finalidade de atender às demandas políticas, administrativas e pedagógicas dos
cursos oferecidos. Posteriormente, por meio do Decreto Estadual nº 3.182, de 05 de outubro
de 2001 e publicado no Diário Oficial na mesma data, o Campus Universitário de Cáceres
passou a ser denominado de Campus Universitário “Jane Vanini”.
O campus, por sua posição estratégica política e geograficamente, possui grande
alcance social e educativo. Entre os municípios de Mato Grosso atendidos, destacamos:
Mirassol D’Oeste, São José dos Quatro Marcos, Araputanga, Rio Branco, Salto do Céu,
Glória D’Oeste, Lambari D’Oeste, Porto Esperidião e Curvelândia.
Atualmente, o Campus conta com 13 cursos de graduação, dos quais 05 (cinco) são
bacharelados e 08 (oito) são licenciaturas. Conta também com seis pós-graduações stricto
sensu: Mestrado em Educação, Linguística, Ciências Ambientais, Geografia, ProfLetras e
ProfHistória.
Dentre as várias opções existentes, a escolha pelo curso de Pedagogia como o lócus
de pesquisa ocorre em razão das vivências e experiências profissionais desenvolvidas no
Curso de Pedagogia e, sobretudo, da participação de discussões e reflexões acerca do curso, o
que nos possibilita perceber o quão complexo e instigante é o processo de articulação da
teoria e prática na atividade docente e discente, em situação de estágio.
A partir das múltiplas experiências profissionais que reforçaram o interesse e a
motivação para compreender o estágio curricular supervisionado e a práxis pedagógica em
espaços não escolares, objetivamos entender como são construídos os saberes na prática
pedagógica durante o processo formativo em situação de estágio.
Desse modo, na sequência, apresentamos uma sucinta contextualização histórica para
que, nesse processo, possamos explicitar as configurações pelas quais o curso passou para
atender às necessidades de formação de professores e contribuir com a qualificação de
pessoas que possam transformar sua realidade e suas práticas sociais e, consequentemente,
ocasionar a melhoria da qualidade de vida de parcela da classe trabalhadora que integra o
curso.

3.2.1.1 O curso de pedagogia do Campus Universitário “Jane Vanini”: aspectos históricos


introdutórios

O Projeto Pedagógico do Curso (2015) traz uma breve contextualização histórica do


101

Curso de Pedagogia e, nesta, consta que o primeiro Curso de Pedagogia de Cáceres teve sua
estrutura curricular elaborada em 1986. Esta matriz, atendendo à legislação da época, era
destinada à habilitação para Magistério das Matérias Pedagógicas do 2º Grau e Supervisão
Escolar para o exercício da docência nas escolas de 1º e 2º graus.
Posteriormente, em 1989, o curso sofreu as primeiras alterações, conforme consta no
PPC (2015). Essas alterações referem-se às ementas das disciplinas e ao processo de
integralização do currículo relativo às habilitações, as quais objetivaram organizar o currículo
para atender às necessidades para autorização do funcionamento do Curso.
Apenas três anos depois, após a constatação de vários problemas apresentados
quanto à integralização da matriz curricular, tiveram início novas discussões com o intuito de
avaliar a Matriz do Curso existente e atender a necessidade de delinear-se o perfil profissional
do pedagogo. Em 1992 as discussões foram retomadas, impulsionadas pelo trabalho de
reconhecimento do Curso (UNEMAT, 2015).
Por sua vez, em 1995, os resultados das discussões e avaliações culminaram na
proposta de Licenciatura em Pedagogia com habilitações em Magistério de 1ª a 4ª série do
Ensino de Primeiro Grau, Educação Pré-Escolar, Supervisão Escolar, Orientação Escolar,
Educação Especial e Educação de Adultos (UNEMAT, 2015).
Tomando como parâmetro a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(Lei n. 9.394/96), em 1997, tiveram início as discussões sobre o Projeto Político Pedagógico e
os elementos constitutivos do currículo nesse projeto. Dessas discussões e consensos,
redefiniu-se a disposição das disciplinas na matriz curricular, adequação das terminologias
das ementas, sua carga horária etc. Também houve redefinição da concepção de pesquisa,
prática de ensino e didática e delineamento do perfil do profissional que se pretendia formar.
Essas discussões e encaminhamentos resultaram na proposição da nova habilitação: Docência
nas séries iniciais do Ensino Fundamental, que foi autorizada pelo Conselho Estadual de
Educação, em abril de 1999, por meio da Portaria n. 196/99-SEDUC/MT (UNEMAT, 2015).
Essa etapa de reconhecimento culminou em 2001 com o reconhecimento, por três
anos, do curso, através da Portaria n. 529/00-SEDUC/MT. No entanto, no segundo semestre
de 2002, foram realizadas várias discussões com vistas à reformulação do curso, sob a
orientação da Resolução CNE/CP nº 01/02 que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura,
de graduação Plena e pela Resolução CNE/CP n° 02/02 que institui a duração e a carga
horária dos cursos de licenciaturas (UNEMAT, 2015).
Então, por conta dos resultados decorrentes dessa reformulação, o curso de
102

Licenciatura Plena em Pedagogia foi reconhecido por cinco anos, através da Portaria n.
267/04 - CEE/MT, publicada no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso. Esse curso tinha
pela frente o desafio de promover uma formação inicial que fosse comprometida política e
pedagogicamente com os sujeitos em formação, mas, sobretudo, com o desempenho dos
formados no curso, para que atendessem as necessidades de conhecimento e, ao mesmo
tempo, desenvolvessem uma postura profissional comprometida ética e politicamente com os
alunos da educação pública da comunidade.
Nesse caminhar histórico do curso, em maio de 2006, o CNE – Conselho Nacional
de Educação instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em
Pedagogia, definindo-o como licenciatura, o que provocou a necessidade de outra
reformulação para adequá-lo às novas Diretrizes. De acordo com o PPC (2015), nesta
Resolução do CNE/CP nº 01/2006, definiram-se os princípios, as condições de ensino e de
aprendizagem, além dos procedimentos a serem observados no planejamento e na avaliação
pelos órgãos dos sistemas de ensino e pelas instituições de educação superior do país. Assim,
tomando as orientações trazidas pelas Diretrizes, o Curso de Pedagogia tem entre suas
finalidades:

[...]aplicam-se à formação inicial para o exercício da docência na Educação


Infantil, nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino
Médio, na modalidade Normal e em cursos de Educação Profissional na área
de serviços e apoio escolar, bem como em outras áreas nas quais sejam
previstos conhecimentos pedagógicos (UNEMAT, 2015, p. 4).

Esta Resolução CNE/CP nº 01/2006, que estabelece as Diretrizes Curriculares


Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, orienta a ampliação de espaços
formativos e de atuação profissional do pedagogo, e é nesse processo que está instituído o
Estágio Curricular Supervisionado com foco nos espaços não escolares e a práxis pedagógica
realizada nesses espaços.
103

3.2.2 Contextualizando o Campus Universitário de Juara

Foto 2 – Campus Universitário de Juara

Fonte: Site da UNEMAT. Disponível em http://juara.unemat.br/


Acesso em 09 de maio de 2018.

O Projeto Pedagógico do Curso (2013) nos traz o histórico de que, em Juara, foi
criado e implantado em 2011 o Núcleo Pedagógico de Juara, a partir da ideia de expansão da
UNEMAT8 implementada pelo Campus de Sinop com o objetivo de atender à demanda de
formação superior na região do Vale do Arinos, assinalando seu compromisso político-
educacional e científico com a população daquela região.
Por conseguinte, a implantação do núcleo Pedagógico atendeu às necessidades de
qualificação da população juarense e da região, composta pelos municípios de Tabaporã,
Porto dos Gaúchos e Novo Horizonte do Norte. Todos os encaminhamentos que resultaram na
implantação desse Núcleo foram concebidos pelo Campus Universitário de Sinop9 em 1999, e
homologado no mesmo ano pelas instâncias deliberativas da UNEMAT.
Tal disposição político-acadêmica representou a possibilidade de atender as
necessidades de formação profissional em nível superior a uma população carente de acesso a
espaços institucionais de ensino superior, em condições diferenciadas, pois não fosse assim,
teriam pouca, ou nenhuma, condição de ingressar em uma universidade pública.
Vale ressaltar que o processo de implantação do Núcleo contou com a articulação de
parcerias entre os poderes Executivo e Legislativo de Juara que atuaram com zelo e empenho
na perspectiva de viabilizar a presença da UNEMAT na região, com destinação de verbas.

8
As informações acerca do breve histórico do Campus Universitário de Juara são oriundas do Projeto
Pedagógico do Curso de Pedagogia e do portal da UNEMAT. Disponível em http://juara.unemat.br/.
9
O Núcleo Pedagógico de Juara era um espaço pedagógico de ensino superior vinculado ao Campus
Universitário de Sinop.
104

Dessa forma, segundo o PPC (2013), as condições materiais de infraestrutura do


Núcleo e a base para a constituição do Campus foram garantidas pela “doação da Escola
Agrícola Municipal Artur Pinoti, localizada à margem da estrada Juara/Brasnorte Km 02, por
meio da Lei Municipal nº 1.368, de 28 de novembro de 2002” (p. 5). Tal exigência delimitou
as responsabilidades e condições necessárias postas pela administração regional para que a
Universidade, em sua configuração local de Campus, pudesse dispor de condições adequadas
para o seu funcionamento. Inicialmente, em 2001, “foram criados três cursos: Bacharelado em
Administração, Bacharelado em Ciências Contábeis e Licenciatura em Letras” (p.5). Os
referidos cursos inscrevem-se na denominação de modalidade de turmas especiais, “que
atendem a uma demanda específica e, quando cumprem sua função, finalizam as atividades.
Então, para os três cursos, foram ofertadas 150 vagas anuais, sendo cinquenta vagas para cada
curso” (UNEMAT, 2013, p.5).
No segundo semestre de 2002, “ingressaram, via vestibular, mais 100 alunos no
Núcleo Pedagógico, sendo cinquenta para o curso de Administração e cinquenta para o curso
de Ciências Contábeis, na mesma modalidade” (UNEMAT, 2013, p.5).
Conquanto a Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT em Juara, por
meio da implantação do Núcleo Pedagógico, tenha assumido o compromisso de propiciar à
população o acesso à educação superior, a comunidade reivindicou a implantação de um
Campus Universitário de forma a consolidar a presença da Universidade na região
(UNEMAT, 2013). No PPC do Curso de Pedagogia de Juara (2013), a importância da
universidade para aquela cidade e municípios circunvizinhos é assim descrita:

A implantação do Campus da UNEMAT em Juara sinalizou o


comprometimento da Universidade do Estado de Mato Grosso frente às
exigências de democratização do ensino superior, imprimindo alternativas de
viabilização de projetos de ensino, de extensão e de produção científica, que
podem fomentar o espírito crítico-reflexivo, proporcionar a valorização da
cidadania, a identificação dos problemas socioeconômicos da região e a
criação de alternativas de superação para os mesmos (UNEMAT, 2013, p.5-
6).

Assim, o Campus de Sinop, a quem o Núcleo de Juara estava vinculado por meio do
Colegiado Superior, em reunião realizada em junho de 2003, exarou parecer favorável à
implantação do novo Campus Universitário e realizou os encaminhamentos burocráticos para
que, em junho de 2003, houvesse a alteração na denominação de Núcleo Pedagógico para
Campus Universitário de Juara.
105

3.2.2.1 O curso de pedagogia do Campus Universitário de Juara: aspectos históricos


introdutórios

O Projeto Político Pedagógico do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia do


Campus Universitário de Juara foi aprovado no Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão de
outubro de 2003, por meio da Resolução nº 240/2003. Nesta, aprovou-se, também, o ingresso
semestral de 40 acadêmicos por meio de vestibular realizado pela UNEMAT.
Diante das necessidades de atender às demandas oriundas da comunidade acadêmica,
assim como de fazer a adequação às configurações de Campus da Universidade, em dezembro
de 2005, criou-se o Departamento de Pedagogia por meio da Resolução 005/2005 do
CONSUNI. No entanto, a abertura das atividades do curso de Pedagogia no Campus
Universitário de Juara aconteceu em agosto de 2005.
De acordo com as informações descritas no PPC de Juara (2013), a Matriz
Curricular foi reformulada, objetivando atender às necessidades educativas e aos objetivos
propostos no PPP do Curso de Pedagogia. Assim, as adequações realizadas foram aprovadas
pelas Resoluções 094/2005 CONEPE e 173/2006 CONEPE. Em 2007, foi aprovada pela
Resolução 116/2007 – CONEPE nova reestruturação do Projeto Pedagógico do Curso de
Licenciatura Plena em Pedagogia do Campus Universitário de Juara (UNEMAT, 2013, p.6).
Conforme descrito no PPC de Juara (2013), em consonância com as Diretrizes
Curriculares Nacionais para o curso de Licenciatura em Pedagogia, o curso “prioriza a
formação do Licenciado em pedagogia para o exercício da Docência na Educação Infantil e
nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental” e, também, apresenta componentes curriculares
que contribuem com o processo formativo para a docência na Educação de Jovens e Adultos e
atuação docente em espaços escolares e não escolares.
Ancorado nas orientações contidas na Resolução CNE/CP Nº 01, de 15 de maio de
2006, o PPC (2013) concebe que o curso de Pedagogia pauta-se pelo compromisso com a
formação crítico-reflexiva de um profissional pesquisador, capaz de produzir intervenções
criativas na realidade social e educacional com vistas à transformá-la. Essa formação
profissional prioriza os aportes teórico-práticos necessários para “que possa compreender a
multidimensionalidade do trabalho educativo e, ao mesmo tempo, desenvolver o perfil
profissional do futuro pedagogo comprometido com a formação humana, visando à
construção de conhecimentos e saberes” (UNEMAT, 2013, p.7), bem como para que possa
“participar, de forma integrada e cooperativa, da gestão democrática da instituição escolar”.
106

3.3 SUJEITOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

Foram selecionados para participar da pesquisa 04 (quatro) professores que atuam na


disciplina de Estágio Curricular Supervisionado, com foco em espaços não escolares, e os
alunos do oitavo semestre do curso de Pedagogia dos campi de Cáceres e Juara. A respeito do
termo semestre, esclarecemos que embora os Cursos de Cáceres e Juara utilizem,
respectivamente, esfera de formação e fase formativa, neste estudo, objetivando uniformizar o
discurso, utilizamo-nos do termo semestre.
Em cada curso de pedagogia, nos campi de Cáceres e Juara, atuam 02 (dois)
professores na disciplina de Estágio Supervisionado, com foco em espaços não escolares,
totalizando 04 (quatro) professores.
No curso de Pedagogia de Cáceres apenas 03 (três) grupos de acadêmicos(as) em
situação de estágio Supervisionado com foco em espaços não escolares participaram da
pesquisa. A delimitação desses três grupos, em Cáceres, deu-se pela forma como foi
internamente organizada a disciplina, já que toda a turma foi para a atividade campo de uma
única vez, iniciando a atividade de estágio, simultaneamente.
No Campus de Juara, por sua vez, fizeram parte da pesquisa 02 (dois) grupos,
compostos de toda a turma. Um grupo foi integrado pelos alunos que residem na cidade de
Juara e, o outro, pelos alunos residentes em Porto dos Gaúchos, Novo Horizonte do Norte e
Tabaporã. Essa composição dos grupos foi definida na coletividade de estagiários e
professores orientadores de estágio para realização das ações educativas de estágio nas
cidades de Juara e Porto dos Gaúchos.

3.4 DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA: PROCEDIMENTOS E TÉCNICAS


UTILIZADAS

A etapa de coleta e produção dos dados ancorou-se de forma articulada à análise de


documentos oficiais tais como os Projetos Pedagógicos dos Curso de Pedagogia, o Projeto
Pedagógico de estágio do Curso de Pedagogia de Cáceres, as Diretrizes Curriculares
Nacionais/DCN, Diretrizes Nacionais do Curso de Pedagogia, as Resoluções internas
referentes ao estágio e os relatórios finais de Estágio Curricular Supervisionado produzidos
pelos estagiários. E, simultaneamente, procedemos à realização da observação participante e
de entrevista com os professores orientadores de estágio e estagiários.
107

A análise documental descortinou-nos à compreensão dos aspectos legais acerca do


estágio curricular supervisionado como componente curricular obrigatório, assim como nos
permitiu uma visão ampla do curso de Pedagogia, principalmente sob a perspectiva dos
aspectos conceituais relativos à concepção de docência, práxis pedagógica, espaços de
educação não formal, educador social, dentre outros.
As possíveis leituras, interpretação e reflexões produzidas acerca dos documentos
utilizados encontram-se sistematizados no capítulo II desta tese. Nessa apreensão dos dados
levamos em consideração o que Guba e Lincoln (1981) apresentam como vantagem de que os
“documentos constituem uma fonte estável e rica”, estão disponíveis para novas consultas e
“servem de base para diferentes estudos, o que dá mais estabilidade aos resultados obtidos”
(LUDKE E ANDRE, 1986, p.39).
Nesse processo de coleta de dados utilizamo-nos também do Caderno de campo
como um instrumento em que se pudessem registrar as anotações, diariamente, acerca das
percepções decorrentes do processo de observação sobre a dinâmica dos espaços de atuação e
das práticas desenvolvidas pelos estagiários, assim como também as descrições das práticas
pedagógicas, as interações e reflexões produzidas acerca das observações e conversas
informais durante o período de estágio, as quais foram utilizadas no capítulo IV para tratar
sobre os sentidos atribuídos às vozes dos interlocutores da pesquisa.
O caderno de campo constitui-se um instrumento útil e necessário durante a
realização da pesquisa, mas, especialmente durante a observação participante, haja vista que
esta, segundo Haguette (2000, p.74) apoiando-se nas ideias de Bruyn, apresenta-se “como
uma metodologia, em termos de seus princípios e sua filosofia, como uma orientação básica
para o estudo da sociedade humana” e, dessa maneira, as ações educativas desenvolvidas
pelos participantes são carregadas de sentidos. Por isso, o uso do caderno de campo é um
elemento indispensável para registrar os detalhes forjados nas ações, nas atitudes, valores,
visão de mundo e de si como sujeitos do processo de ensino e de aprendizagem.
Nesse sentido, Haguette (2000) afirma que a observação participante está
estreitamente vinculada com a teoria que direciona a própria prática da observação
participante, dando-lhe o suporte teórico necessário possibilitando, desse modo, “a melhor
forma de captar o sentido encoberto da ação humana bem dentro da tradição de Mead,
Cooley, Thomas e Znaniecki e, por que não dizer, de Weber” (HAGUETTE, 2000, p.74).
Ampliando a compreensão sobre o tema, Haguette (2000) aponta algumas
contribuições sobre as formas de interações humanas no processo de produção das condições
108

de existência que devem ser levados em consideração na etapa de observação participante,


enquanto metodologia de pesquisa:

Esta concepção envolve também o pressuposto de que a sociedade é


construída a partir do processo interativo de indivíduos e grupos que agem
em função dos sentidos que o seu mundo circundante representa para eles.
Ela se baseia, pois, em um princípio sobre a própria natureza do homem e da
sociedade. Esta perspectiva se opõe frontalmente àquelas que concebem a
ação social como uma consequência de fatores estruturais atuantes sobre os
indivíduos e que, consequentemente, descartam ou minimizam o papel do
homem na história, ou seja, a liberdade humana. (HAGUETTE, 2000, p.74).

A observação participante constitui-se o lugar em que a pesquisadora e participantes,


por meio das interações que realizam, produzem sentidos às ações desenvolvidas que, por sua
vez, possibilitam reflexões sobre essas mesmas ações e, consequentemente, levam à produção
de novos significados.
Convergindo com este pensamento, Barbier (2002, p. 126) afirma que a observação
participante predominantemente existencial é um instrumento de pesquisa que apresenta
dimensões particulares, tais como: a observação participante periférica, a observação
participante ativa e observação participante completa. Neste estudo, optamos pela última,
porque nesta, “o pesquisador ou está implicado desde o início, porque já era membro do grupo
antes de começar a pesquisa; ou ele se torna membro do grupo por conversão, porque provém
de fora [...]” (BARBIER, 2002, p. 126). E, neste estudo, o engajamento, envolvimento e a
participação da pesquisadora nos processos de construção de saberes pelo coletivo de
estagiários durante a realização ação educativa, autorizam-nos a afirmar sobre o
reconhecimento de nosso pertencimento àquele grupo e comunidade.
Nesse entendimento, apoiamo-nos em Haguette (2000), para quem a observação
participante é um processo em que a presença do observador em situações cotidianas de
realização de Estágio Curricular Supervisionado se mantém face a face com os observados,
participando ativamente com eles de seu ambiente natural e social de vida, e, nessas
interações, é aquele que coleta dados. Assim sendo, o observador e os observados fazem parte
de um contexto que, enquanto o modificam, são modificados por ele.
Nessa etapa de coleta de dados, utilizamo-nos também do instrumento de entrevista
realizada com os professores orientadores de estágio e alunos estagiários, com o intuito de
ampliar e complementar as informações oriundas da observação das maneiras como se
realizam a prática pedagógica no Estágio Curricular Supervisionado. Nesse momento da
pesquisa, deixamos os grupos de alunos à vontade para realizar a entrevista, conforme a
109

disponibilidade e interesse de cada participante, pois, segundo Szymanski (2002), a entrevista


possibilita o contato frente a frente em situação de trocas de informações, saberes, valores que
estão em jogo nas relações intersubjetivas, nas quais se manifestam expectativas, sentimentos,
preconceitos e interpretações para os protagonistas: entrevistador e entrevistado.
A entrevista estruturada, após anuência do participante, foi realizada com gravador
de voz envolvendo alunos(as) e professores, em encontros marcados previamente, no local
considerado mais apropriado. Na realização da entrevista, fizemos a leitura prévia das
questões e deixamos os participantes à vontade para falar livremente em suas respectivas
respostas. No final, após a interpretação das informações coletadas, os arquivos das gravações
foram descartados, conforme informado aos participantes.
Outro aspecto que levamos em consideração, na realização da entrevista, diz respeito
à garantia de confidencialidade das informações coletadas. Por isso, caso o participante
sentisse a necessidade de complementação, revisão, modificação ou supressão de informações
prestadas, tais informações estariam disponíveis para tal fim.
Além disso, ainda objetivando assegurar a confidencialidade, os registros das
informações coletadas foram identificados pelas letras do alfabeto, de forma que a identidade
dos participantes fosse inteiramente resguardada.
Para além do respeito aos valores culturais, sociais, hábitos e costumes dos
participantes durante a entrevista, esta foi orientada por roteiro semiestruturado e que
possibilitou aos voluntários falarem livremente sobre suas concepções, saberes e experiências.
E, para realizar a entrevista, asseguramos aos participantes a escolha do local e horário para
que fossem ouvidos, bem como a possibilidade de interrupções, retomadas em outras
oportunidades, em caso de concordância dos entrevistados, e a desistência destes quanto à
participação. Apesar disso, durante o processo de entrevista não houve nenhum imprevisto ou
incidente que nos levasse a remarcar o encontro para tal finalidade. Para isso, mantivemos a
atenção aos sinais verbais e não verbais de desconforto que poderiam ser manifestados pelos
sujeitos, sobretudo, a fim de que, caso se verificasse tal situação, fosse rapidamente dissipada.
Nesse processo de interação humana, de acordo com Szymanski (2002), há uma
intencionalidade do pesquisador que vai além da mera busca de informações e situa-se na
perspectiva da confiabilidade entre os participantes, de modo a permitir a coleta de dados
importantes à pesquisa. No percurso do trabalho com o entrevistado, ele se dá conta que é um
sujeito de saberes que são fontes e apontam resultados para a pesquisa, bem como
compreende que todo saber tem um valor em si mesmo e podem dialogar com outros saberes
110

socialmente produzidos, em uma condição de horizontalidade ou igualdade de poder na


relação.
Outro aspecto importante da entrevista diz respeito à organização das ideias e de
(re)construção de um discurso caracterizado pelas individualidades, vivências e experiências.
Desse modo, a entrevista constituiu-se um processo de interatividade complexo que teve, em
seu princípio, a reflexão e que considera o diálogo, a troca de experiências e saberes
constituídos ao longo da vida no campo de atuação profissional como elementos centrais das
informações produzidas nas interações realizadas.

3.4.1 O percurso da pesquisa

A atividade de interpretação dos dados relativos ao campo empírico iniciou-se pela


busca, nos Projetos Pedagógicos dos Cursos, sobre o processo de constituição do curso de
Pedagogia e acerca das configurações históricas e teórico-metodológicas existentes naqueles,
que conformam a concepção de estágio e a práxis pedagógica. O intuito dessa compreensão,
no contexto em que se inscreve a concepção de estágio, objetivou perceber esse campo sob os
vários olhares da comunidade que o concebeu e o implementou.
A concepção de estágio encontrada nos PPCs dos cursos baseia-se na compreensão
de que o estágio constitui-se o eixo orientador do currículo para a formação do pedagogo, na
perspectiva de articular os diferentes campos de saberes e conhecimentos contidos nas várias
disciplinas e, também, das produções e apropriação desses saberes no processo formativo.
Em relação às informações obtidas no campo empírico, no Campus de Cáceres,
realizamos a investigação com a participação de 03 (três) grupos de sujeitos em situação de
estágio: 01 (um) grupo composto por 04(quatro) estagiários que desenvolveu a atividade de
estágio Curricular no Projeto Gonçalinho; 01 (um) grupo no setor de Educação Permanente do
Hospital Regional, composto por 02(dois) estudantes; e o terceiro, composto por 05 (cinco)
estagiárias, no Projeto Rede Cidadã, desenvolvido na base da polícia comunitária.
Por outro lado, no Campus de Juara, a turma foi dividida em dois grupos. Sendo que
01 (um ) grupo composto por 17 estagiários foi formado pelos alunos residentes na cidade de
Juara e comunidades vizinhas, enquanto que o segundo, com 05 (cinco) participantes, foi
formado pelos alunos residentes em Porto dos Gaúchos, Novo Horizonte do Norte, Tabaporã
e comunidades próximas desses municípios.
111

O grupo de estagiários de Juara optou pelo trabalho de planejamento e confecção de


um parque infantil na Creche Municipal Thayná Gabrielly Oliveira Moraes, enquanto que o
segundo optou pelo ciclo de estudos e palestras sobre o feminicídio na região, desenvolvendo
o projeto, intitulado: O protagonismo da mulher e os desafios da sociedade contemporânea.
Assumir a perspectiva da observação participante apresentou-nos a direção que
orienta nossa caminhada metodológica, mas também nos trouxe algumas preocupações
relacionadas ao papel do observador participante, conforme explicita Haguette (2000),
apoiando-se em Bruyn:

Axioma 1: o observador participante compartilha da vida ativa e dos


sentimentos das pessoas em termos de relações face a face. Corolário: o
papel do observador participante requer ao mesmo tempo desprendimento
(distanciamento) e envolvimento pessoal. Axioma 2: O observador
participante é uma parte normal da cultura e da vida das pessoas sob
observação. Corolário: O papel científico do observador participante é
interdependente com seu papel social na cultura do observado. Axioma 3: O
papel do observador participante reflete o processo social da vida em
sociedade (BRUYN, 1966, P.13-20, apud HAGUETTE, 2000, p.75).

Esses aspectos causaram preocupação com a atividade de pesquisa, sobretudo, no


curso de Cáceres, pelas relações de proximidades existentes em razão do trabalho que
realizamos como docente no Curso. No entanto, à medida que iniciamos a pesquisa,
propriamente dita e mergulhamos nas atividades dos sujeitos participantes como uma
necessidade e premissa central da metodologia selecionada, a aproximação manifestou-se
naturalmente, embora, nas interações feitas, tenhamos procurado registrar as observações com
o mínimo de interferência possível.
Dada a flexibilidade da observação participante, segundo Haguette (2000), esta
torna-se suscetível a fatores de contaminação que podem provocar distorções dos próprios
dados adquiridos, levando a interpretações errôneas sobre o fenômeno estudado. Alguns
destes fatores externos são:

1) O viés sócio cultural do observador, ou seja, o viés de partilhar a


perspectiva e valores de sua própria cultura de seu tempo e de seu meio com
o desempenho do papel de pesquisador;
2) O viés profissional/ideológico, que induz à seletividade da observação,
dependendo do quadro de referência ou do tipo de treinamento recebido pelo
pesquisador;
3) O viés interpessoal do observador que mudará, a partir de suas emoções,
defesas, etc., o que ele ‘verá’ como significativo e a maneira como ele
perceberá a interação humana;
112

4) O viés emocional do observador com relação às próprias necessidades


como pesquisador; em outras palavras, a necessidade de confirmar suas
hipóteses, de ‘estar certo’, pode leva-lo a forçar uma ‘adequação’ do real às
suas teorias prévias sobre o fenômeno;
5) O seu viés normativo acerca da natureza do comportamento humano pode
conduzi-lo a juízos de valor que prejudicarão não só sua coleta de dados
como sua análise e interpretação (HAGUETTE, 2000, p.78) (Grifo do autor).

Neste estudo, conforme dito anteriormente, optamos pela observação participante


completa, já que sou professora do curso de Pedagogia e da disciplina de Estágio Curricular
Supervisionado e tal situação nos coloca na condição de pesquisadora previamente implicada
no grupo. Essa metodologia não supõe nenhum instrumento específico para direcionar a
observação, então cabe ao observador lançar-se no contexto da pesquisa com o cuidado
epistemológico de, na relação pesquisador/pesquisado, não haver prevalência dos aspectos
pessoais e profissionais do pesquisador sobre as informações capturadas, ou seja, para que as
concepções daquele não se sobreponha às subjetividades dos outros. Assim, os sentidos
expressos pelos participantes têm suas subjetividades respeitadas na sua unicidade e
humanidade.
Corroborando tais pensamentos, Triviños (1995) reitera a dificuldade de o
pesquisador, como observador, estudar a realidade social que se está processando e definir
com clareza a sua função, já que é uma pessoa que deseja conhecer os aspectos da vida de
outras pessoas que têm seus próprios valores, os quais podem ser muito diferentes dos valores
dos pesquisadores. “Eles possuem interesses, inimizades, setores sociais constituídos por
amigos, familiares, etc., ou estão unidos pelos mesmos anseios” (TRIVIÑOS,1995, p. 142).
A etapa de observação participante possibilitou-nos perceber como se manifesta a
práxis pedagógica nos espaços de Educação não formal e, permitindo-nos, assim, vislumbrar
como as práticas pedagógicas realizam-se e produzem a ressignificação de saberes.

3.4.2 A participação dos sujeitos na pesquisa

A participação dos sujeitos no Campus de Cáceres e de Juara ocorreu nas diferentes


etapas que compõem o estágio, ou seja, durante o processo de instrumentalização teórico-
prático realizado em sala de aula pelas professoras e professores responsáveis pela disciplina
de Estágio Supervisionado VI; nas atividades campo, na etapa de observação dos espaços
113

educativos não escolares; e na etapa de intervenção pedagógica, que são descritas e discutidas
nas seções seguintes.

3.4.3 O processo de instrumentalização teórico-prático

A etapa de instrumentação teórico-prática realizada pelos professores orientadores de


estágio, nos campi de Cáceres e Juara, consiste de uma singularidade, interesse e importância
fundamental para possibilitar a compreensão da relação teoria prática como fruto da
articulação de todas as disciplinas cursadas pelos estudantes estagiários que subsidiam a
apreensão da realidade educacional, a análise, a crítica, a reflexão e a proposta de intervenção
pedagógica e de transformação dessa mesma realidade e, consequentemente, dos
conhecimentos e saberes de cada envolvido no processo de ensino e de aprendizagem.
Esse momento, como componente de trabalho pedagógico do estágio, está descrito
na seção seguinte, trazendo em primeiro lugar os elementos constitutivos da prática
pedagógica dos professores de Estágio Curricular Supervisionado do Curso de Pedagogia de
Cáceres, e, posteriormente, descrevemos as observações decorrentes das práticas dos
professores do Curso de Juara.

3.4.3.1 Campus de Cáceres

Para a realização da pesquisa, inicialmente, mantivemos contato com os professores


para solicitar que participassem do estudo, bem como autorizassem o contato com os alunos
para divulgação da investigação e para que pudéssemos convidá-los a também participar.
Assim, na sequência, agendamos a visita aos professores para levantamento do cronograma de
trabalho da disciplina, assim como a autorização para assistir as aulas e apresentar a pesquisa
aos alunos, buscando a adesão desses como sujeitos da pesquisa.
Este caminho foi trilhado de maneira que não interferisse nas atividades normais da
disciplina e as professoras atenderam prontamente a solicitação de que, a partir desse
encontro, pudéssemos participar das atividades que seriam realizadas na disciplina, no campus
de Cáceres. Paralelamente a isso, mantivemos contato com o campus de Juara, com o objetivo
de agendar uma possível data para realização da pesquisa naquele campus.
114

Assim, a convite das professoras que se colocaram à disposição, apresentamos a


pesquisa aos alunos e professores da oitava esfera e, na sequência, falamos da importância e
da contribuição dos participantes para a compreensão de nosso objeto. Nesse diálogo, houve a
manifestação afirmativa de toda a turma quanto à participação na pesquisa.
Já nessa ocasião, observamos que as professoras trouxeram reflexões e provocaram
discussões sobre os aspectos conceituais da Educação Não Formal. Nessas discussões
realizadas, apresentou-se, de modo geral, o que se denomina espaços não escolares. A turma
também foi estimulada a pensar possíveis espaços nas proximidades de seus bairros que
pudessem se tornar parceiros da Universidade na realização do estágio.
No terceiro encontro, as professoras e os alunos listaram os possíveis espaços e
compuseram os grupos, que nesta disciplina são menores que aqueles que foram constituídos
nas turmas anteriores, quando realizaram o estágio nas unidades escolares. Houve um
reordenamento dos grupos, não sem questionamentos e resistências. Mas, diante das
explicações das professoras sobre as características dos espaços não escolares, os alunos
aceitaram e acomodaram-se à nova situação.
Nesse encontro, uma egressa do curso fez o relato de experiência de seu estágio
realizado no espaço hospitalar, bem como ilustrou a experiência com fotos acerca do trabalho
realizado. Foram feitas várias indagações sobre a funcionalidade, tipo de público, as
atividades que produziram maior participação e envolvimento das crianças e assim por diante.
Assim, esse momento de resposta aos questionamentos constituiu-se uma ocasião
muito rica de trocas de experiências e de saberes. Segundo o relato da egressa, no espaço
apresentado há uma grande flutuação de participantes, uma vez que novas crianças chegam a
todo instante, enquanto outras recebem alta. Por isso, seria importante pensar atividades
interessantes, atrativas e que fossem realizadas rapidamente, de maneira a possibilitar que as
crianças pudessem “esquecer por um tempo” a condição de paciente.
Feito isso, todos os grupos foram autorizados a dar início ao estágio, nos espaços por
eles selecionados, conforme a sua afinidade por determinados locais. E assim, acompanhamos
as atividades de observação e monitoria de três grupos, simultaneamente, sendo um no
período matutino e dois outros grupos no período vespertino.
A fase de observação realizou-se em apenas três dias. Nesse período, acompanhamos
os dois grupos de estagiários em observação, no período vespertino, sendo que, no horário das
13 às 15 horas, fazia-me presente no Projeto Gonçalinho e o restante da tarde no Programa
Rede Cidadã. Terminada a fase de observação, os estagiários dispõem de uma semana para o
planejamento de uma proposta pedagógica para realizar a atividade de intervenção. No
115

entanto, por razões pessoais e de trabalho, o grupo de estagiários do Projeto Gonçalinho não
dispôs da semana para o planejamento, iniciando a realização da regência já nos dias
subsequentes à observação. Essa situação facilitou o acompanhamento da fase de regência.
Quanto a esta fase, os dados coletados por meio da observação participante serão
descritos e interpretados no capítulo seguinte.

3.4.3.2 Campus de Juara

A pesquisa realizada no Campus de Juara ocorreu de maneira diferente daquela


realizada no Campus de Cáceres. Em primeiro lugar, mantivemos contato com o Campus para
obtenção da autorização para a realização da pesquisa. Na sequência, a mesma providência foi
adotada quanto à gestão do Curso e só então, após as devidas anuências, contatamos os
professores das disciplinas de Estágio.
Nesse contato inicial, os dois professores foram solícitos e acolhedores. Expusemos a
nossa intenção quanto à pesquisa e solicitamos que aceitassem participar, o que foi
prontamente atendido. Em razão disso, na sequência, procuramos agendar a visita ao Campus
para, inicialmente, obter o cronograma de trabalho da disciplina, a autorização para assistir as
aulas, bem como apresentar a pesquisa aos professores e alunos. Contudo, apesar da
insistência, os professores não disponibilizaram as informações solicitadas, tampouco
autorizaram formalmente o acompanhamento da disciplina.
De qualquer forma, terminada a etapa de coleta de dados em Cáceres, fomos ao
Campus de Juara com o objetivo de iniciar o acompanhamento das atividades. Ao chegar lá,
no contato inicial com os professores, descobrimos que o Estágio Curricular em Espaços não
Escolares, naquele Campus, possui uma dinâmica diferenciada.
Segundo o relato do professor da disciplina, a organização do estágio foi pensada de
modo que ultrapasse a utilização de determinados espaços, que são poucos e não propiciaria
uma formação multifacetada aos alunos. Desse modo, os docentes propuseram, junto aos
alunos, realizar o estágio por meio de projetos de extensão que seriam planejados, cadastrados
na Pró-Reitoria de Extensão e executados conforme disposto em editais e resoluções internas
da Universidade. E assim o fizeram.
Para a realização das atividades, a turma foi dividida em duas equipes. A primeira,
com integrantes de Juara, após deliberação coletiva, propôs planejar e desenvolver um
projeto, amplamente discutido e construído sob direção e acompanhamento dos professores
116

durante as aulas, destinado à realização de ações pedagógicas em uma instituição de ensino da


rede pública municipal. Após essa discussão, o grupo decidiu promover a construção de
brinquedos pedagógicos para a ampliação do parque da Creche Municipal Thayná Gabrielly
Oliveira Moraes, que carece desse recurso.
A escolha da referida instituição deu-se em razão de esta situar-se em uma região da
cidade com maior incidência de vulnerabilidade socioeconômica. E, também, em razão de o
poder público municipal, segundo consta no relatório final, não garantir às creches condições
de implementação de recursos pedagógicos, como o parque, necessários ao desenvolvimento
integral da criança. Nesse sentido, a proposta teve a finalidade de construir e adequar o
parque para fins de ações pedagógicas para as crianças que frequentam este espaço de
formação.
Em relação ao segundo grupo, constituído pelos alunos residentes em Porto dos
Gaúchos, Novo Horizonte do Norte, Tabaporã e comunidades vizinhas, igualmente, após a
realização de reuniões, reflexões e discussões, optou-se pela realização de um projeto de
extensão que objetivasse promover uma noite de evento na forma de ciclo de debates, na
cidade de Porto dos Gaúchos/MT, com a temática “O Protagonismo da Mulher e os Desafios
da Sociedade Contemporânea”.
O processo de instrumentalização teórico-prática realizada pelos professores em sala
consistiu, basicamente, em orientações quanto à elaboração do projeto de extensão. Por conta
dessa metodologia, o acompanhamento desse processo ficou um pouco comprometido, uma
vez que estivemos com a turma, em sala de aula, em apenas dois encontros. Em um deles,
apresentamos a pesquisa e realizamos o convite para a participação, tanto a alunos quanto a
professores, e que foi aceito por todos. Em um segundo encontro, acompanhamos as
orientações para elaboração do projeto de extensão.
Assim como em Cáceres, esse trabalho foi realizado de modo a não interferir na
rotina da disciplina e, por tal razão, os professores autorizaram a minha participação nas
atividades que seriam realizadas. Para otimizar o tempo, agendamos as entrevistas com os
alunos, no período noturno, conforme a disponibilidade de cada um, e, paulatinamente,
coletamos as informações de que necessitávamos.
Nessa etapa de coleta de dados, foi possível acompanhar a realização de estágio por
meio da rede social WhatsApp. O professor adicionou-me aos dois grupos de estagiários,
espaço utilizado para orientações, questionamentos, para sanar as dúvidas e, sobretudo, para
marcar as atividades de estágio nos espaços selecionados. Assim, acompanhamos, à distância,
parte das atividades inerentes ao estágio.
117

Por outro lado, enquanto estávamos na cidade, pudemos acompanhar as atividades de


montagem do parquinho infantil com uso de pneus, momento em que foi possível observar a
participação coletiva do grupo na tarefa de organizar o parque.
Também presencialmente foi possível acompanhar a realização do ciclo de palestra
em Porto dos Gaúchos, evento que foi organizado pelo grupo de alunos dos municípios de
Porto do Gaúchos, Tabaporã, Novo Horizonte e comunidades vizinhas.

3.5 APRESENTAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE DADOS

A organização e apresentação dos dados, oriundos da análise documental dos


Projetos Pedagógicos dos cursos de Pedagogia, foram realizadas no capítulo II, sobretudo no
que diz respeito aos aspectos conceituais de Estágio Curricular Supervisionado que estão
descritos nos PPCs, nos dois campi, e representam a confluência da perspectiva teórica
assumida pelo curso, assim como a concepção de práxis pedagógica e de espaços não
escolares que expressam as feições teórico-metodológicas adotadas.
Em relação às identidades dos sujeitos participantes, estas foram descritas por letras
do alfabeto e numerais, de modo a garantir o sigilo das informações disponibilizadas e nos
permitir trabalhar mais livremente com os dados coletados. Exemplificativamente, os
participantes, quando alunos, foram assim identificados: E1 (estagiário 1), E2 (estagiário 2),
E3 (estagiário 3), seguindo da letra inicial do campus, C: Cáceres e J: Juara. Por sua vez, os
professores foram identificados do seguinte modo: P1 (professor 1), P2 (professor 2), P3
(professor 3), também seguido da letra inicial do nome do campus etc.
A interpretação de dados partiu da leitura interpretativa e analítica dos Projetos
Pedagógicos dos cursos, que nos possibilitaram compreender a concepção de Estágio
Curricular Supervisionado, a articulação da teoria e prática e dos espaços não escolares, nos
referidos PPCs. Das leituras decorrentes dos PPCs, foi possível compreender como está
constituída a práxis pedagógica no curso, ao mesmo tempo em que a observação das ações
educativas e a entrevista permitiram o aprofundamento dessa concepção.
Essa etapa de compreensão dos dados também baseia-se na interpretação, a partir da
concepção de que “as interpretações qualitativas são construídas” (DENZIN, 2006, p.37).
Neste estudo, a interpretação iniciou-se com a análise documental, como dito anteriormente,
e, na sequência, com a transcrição e leitura das entrevistas, além das descrições e reflexões
118

oriundas da observação participante e de fragmentos de conversas informais com os


professores e estagiários.
Segundo Denzin (2006), a “pesquisa qualitativa é infinitamente criativa e
interpretativa” (p.37) e, ao tomar para si a abordagem interpretativa, proporciona a
compreensão da análise da práxis e da sua relação com os contextos vividos, o que significa
que seus pesquisadores estudam as coisas em seus cenários naturais, tentando entender e
interpretar os fenômenos em termos dos significados que as pessoas a eles conferem nos
contextos que estão disponíveis para a pesquisa (DENZIN, 2006).
Então, nesse entendimento, tomamos de empréstimo as contribuições da
Hermenêutica Filosófica de Hans-Georg Gadamer, trazidas por Denzin (2006), procurando
compreender e interpretar os significados atribuídos pelos participantes às práticas realizadas
durante o Estágio Curricular Supervisionado, considerando que, para o autor, “a compreensão
requer o engajamento das tendenciosidades do indivíduo” (p. 198). Isto é, o processo de
compreensão leva em consideração que as práticas sociais estão constituídas na historicidade
humana, portanto, as concepções, as práticas, as reflexões são genuinamente históricas porque
os sujeitos são/estão situados em um contexto, em contínua formação. Desse modo, defende
“que nunca existe uma interpretação definitivamente correta” (p.199), porque não há uma
única interpretação, mas está em um processo aberto, contínuo de ressignificação.
A hermenêutica gadameriana faculta-nos inferir que a formação da existência se
constrói na relação com o outro, e, das trocas resultantes da experiência humana, produz os
saberes, tanto individual quanto coletivamente, os quais se manifestam nas relações
intersubjetivas. Nesse sentido, outro aspecto igualmente importante diz respeito à tradição
que, para o autor, é ‘uma força viva que penetra toda a compreensão [...] condicionando
nossas interpretações’ (DENZIN, 2006, p.199).
Minayo (1994) afirma que “há autores que entendem a ‘análise’ como descrição dos
dados e a ‘interpretação’ como a articulação dessa descrição com conhecimentos mais amplos
e que extrapolam os dados específicos da pesquisa [...]” no entanto, para a autora “a análise e
interpretação estão contidas no mesmo movimento: o de olhar atentamente para os dados da
pesquisa” (MINAYO, 1994, 68).
Assim, as várias (re)leituras realizadas nas narrativas dos professores e estagiários
mobilizaram-nos a organizar a apresentação de modo que, em primeiro lugar,
apresentássemos as narrativas dos docentes e, posteriormente, dos estagiários dos dois campi.
No processo de observação participante, tivemos especial atenção às práticas
realizadas para percebermos os modos e posturas didático-pedagógicas dos estagiários quanto
119

às necessidades que emergiram durante o processo, reconhecendo também a dinâmica de


atendimento ao que foi planejado, bem como as situações inusitadas e/ou espontâneas que se
sobressaíram na prática pedagógica realizada.
As informações decorrentes da observação participante foram complementadas por
meio das entrevistas no esforço de empreender uma leitura interpretativa, visando à
aproximação e compreensão dos dados. Posteriormente, procuramos estabelecer as relações
entre as informações que se revelaram aos nossos olhos com os autores que ancoraram a nossa
compreensão dos dados, objetivando desvelar as informações para além do que nos foi
explicitado na entrevista.
Dessa forma, o próximo passo foi trabalhar com os recortes dos excertos que
compunham as narrativas das entrevistas, os quais já se encontram marcados ou evidenciados
nas transcrições. Em seguida, organizamos os dados, agrupando os excertos de cada
participante, relativos aos aspectos conceituais e interpretativos da realidade e do seu fazer
durante o estágio.
A partir dessa organização, passamos ao processo de agrupamento das informações
coletadas de cada participante, por meio da aproximação e/ou distanciamento de sentidos
atribuídos às informações oriundas das entrevistas, e procedemos à interpretação analítica das
informações apontadas individualmente, apresentando as características que convergem ou
divergem quanto à compreensão do fenômeno educativo explicitados pelos participantes.
Portanto, a partir da leitura dessas narrativas, emergiram algumas dimensões que
contemplam, de forma mais ampla, as informações contidas nos dados, as quais foram
agrupadas em três dimensões: instrumentalização teórico-prática, a prática pedagógica e as
reflexões produzidas pelos estagiários acerca de suas vivências/experiências. Dessa forma, a
interpretação derivada das leituras e das informações coletadas, forneceram os elementos
teórico-práticos constitutivos do quarto capítulo. Nele, apresentaremos as dimensões que
emergiram a partir das leituras interpretativas dos dados e que nos possibilitaram
compreender o objeto de estudo produzido na interface com o referencial teórico utilizado.
120

4 A ARTE DE APRENDER/ENSINAR A SER PROFESSOR: AS VOZES DOS


SUJEITOS DA PESQUISA

Neste capítulo, apresentamos a práxis, oriunda da etapa da observação participante e


da entrevista realizada com os professores e estagiários. Esta tarefa consiste em uma
(re)leitura das informações observadas para, a partir delas, produzir a interpretação analítica
sobre o Estágio Curricular Supervisionado e sobre a práxis pedagógica, em espaços não
escolares.

4.1 ESPAÇOS NÃO ESCOLARES EM CÁCERES

Nesta seção, trazemos as informações relativas à caracterização, à descrição e à


interpretação das práticas pedagógicas realizadas nos espaços não formais em que foram
realizadas as atividades pedagógicas de estágio pelos estagiários dos campi de Cáceres. Em
primeiro lugar, apresentamos as informações e a caracterização do Projeto Gonçalinho, em
segundo, o Hospital Regional ‘Dr. Antônio Fontes’ e, em terceiro, o Programa Rede Cidadã,
todos pertencentes ao Campus de Cáceres.

4.1.1 Projeto Gonçalinho

O Estágio no Projeto Gonçalinho foi realizado, no período vespertino, por um grupo


composto por 4(quatro) componentes, sob a supervisão, acompanhamento e avaliação das
duas professoras responsáveis pela disciplina. O Projeto é desenvolvido desde o ano de 2001
como prática social educativa na comunidade, auxiliando as crianças de 6 a 12 anos, em grupo
formado por meninos e meninas. As atividades versam sobre cidadania, respeito ao próximo
e brincadeiras. Também nesse espaço as crianças vivenciam aprendizagens pedagógicas
diferenciadas e recreativas, a fim de que possam aprender com atividades lúdicas. Todos os
dias desfrutam de lanches oferecidos pelo Projeto.
O Projeto Gonçalinho é uma Associação Civil filantrópica e comunitária sem fins
lucrativos, cuja finalidade básica é promover a integração por meio da educação, do esporte,
da cultura, do lazer e de ações sociais. É constituída por tempo indeterminado, com sede na
Rua São Marcos, esquina com Rua dos Desenhistas, s/n, Cavalhada III, em Cáceres/MT.
121

Os principais mantenedores do projeto são a Paróquia Bonifatius e a Escola Dietrich


Bonhoeffer, ambas da Alemanha. Conta com o apoio do senhor Markus Hanh da Alemanha.
Porém, para continuar a se manter, necessita também da ajuda de cidadãos voluntários e de
parceiros como a Prefeitura Municipal de Cáceres e a UNEMAT. Para alcançar os objetivos
educativos e realizar a missão do Projeto, a Sociedade Educadora e Cultural de Integração
Brasil/Alemanha – SECIBA é responsável por organizar atividades e ações quantas forem
necessárias, desde que haja recursos disponíveis para isso ou que haja aprovação de projetos
dos governos, tanto do Brasil quanto da Alemanha.
Os educadores que participam do projeto são três voluntários da Alemanha, duas
educadoras sociais formadas em Educação Física e uma professora coordenadora do Projeto.
Os educadores sociais são responsáveis pela organização das atividades realizadas com todas
as crianças. Ainda acompanham e orientam os estagiários alemães, bem como cuidam da
parte administrativa, documental e financeira do Projeto.
Os sujeitos envolvidos no projeto são advindos da comunidade. Atualmente, o
projeto atende em média 40 crianças, sendo 20 no período matutino e 20 no período
vespertino, com faixa etária de 6 a 12 anos. Em algumas situações, são atendidas crianças
menores, pois o bairro não dispõe de creche e os pais necessitam da ajuda de alguém para
cuidar dos filhos, enquanto trabalham para o sustento da família.
A estrutura física do local é constituída por 1(uma) sala onde são guardadas algumas
cadeiras e materiais que as crianças utilizam para desenvolver as atividades diárias do projeto,
1 (uma) cozinha, 2 (dois) banheiros, 1 (uma) despensa, 1 (um) salão de convivência, campo
de areia, horta, parque e terreno amplo para o desenvolvimento de outras atividades.
Os materiais pedagógicos dos quais dispõem para trabalhar com as crianças são:
bolas, bambolê, TNT´s, tesoura, cola, pistola de cola quente, cola bastão, brinquedos de
encaixe, 2 violões, televisor, aparelho de DVD, dominó, baralho, ursinhos, bonecas,
carrinhos, livros, EVA, corda, quebra-cabeça, tabuada, jogo da memória, tapetes, quadro de
giz, giz, lápis, lápis de cor, giz de cera, durex, materiais recicláveis.
Segundo a narrativa do estagiário 1 do Grupo 1-C, no relatório final de estágio, “o
projeto busca atender o maior número de crianças, sejam elas pobres ou ricas, brancas ou
negras, tirando todas das áreas de risco e mostrando a elas os direitos e deveres que têm
dentro da sociedade”.
122

4.1.1.1 As práticas realizadas pelos estagiários no Projeto Gonçalinho

A observação feita pelo grupo esteve voltada para o conhecimento da estrutura física
e condições de funcionamento do Projeto Gonçalinho. Nessa etapa de observação, os
estagiários tiveram acesso ao Projeto político do espaço e, também, a oportunidade de, além
de conhecer a estrutura e as relações de manutenção e apoio financeiro com a Alemanha,
identificar as necessidades e possibilidades de trabalho pedagógico junto àquele espaço.
Dessa etapa de observação e monitoria resultou a proposta de intervenção
pedagógica com a seguinte nomenclatura: Projeto semeando e cultivando valores humanos
para relação harmônica. Nessa proposta pedagógica, com enfoque nos valores humanos, os
estagiários trabalharam durante toda a semana com temas que reforçam a ideia central,
desenvolvendo a cada dia um tema como solidariedade, gentileza, união, danças, respeito,
além de muitas brincadeiras.
A proposta de intervenção pedagógica delimitou como objetivos desenvolver os
valores à vida plena e à convivência nas relações de amizade, cooperação, respeito, trabalho
em equipe e compreender por meio de atividades lúdicas, a eficácia dos valores morais e
éticos para uma boa convivência. Todas as atividades propostas durante a etapa de regência
“tem por objetivos promover a interação do grupo, por meio de rodas de conversa, atividades
ao ar livre, dinâmicas de grupo, atividades artesanais, movimentos corporais, danças, jogos,
brincadeiras e aula de judô” (Grupo de estagiário do Projeto Gonçalinho).

4.1.1.2 Observação das ações realizadas pelo grupo de estagiários

Partimos da compreensão de que o estágio, segundo Pimenta (2012), não se reduz ao


simples acesso do estagiário ao espaço educativo para observar seu funcionamento e as
práticas que ali se realizam, já que essa importante e complexa ação não é suficiente para
revelar toda complexidade que permeia aquele espaço. Para a autora, “é fundamental que ele
seja levado a conhecer e refletir sobre o modo como tal realidade foi gerada, condição esta
fundamental, mas não única para que venha transformá-la pelo seu trabalho” (p.78).
E, nesse processo de conhecer a realidade em que irão atuar, Pimenta (2012) “coloca
que a leitura da realidade exige instrumental adequado que envolve observar, descrever,
registrar, interpretar e problematizar a realidade. Decorrente desse processo, surgem as
alternativas de intervenção” (p.87).
123

Desse modo, a elaboração da proposta de intervenção pedagógica no espaço


educativo Gonçalinho tomou como elementos para sua construção as condições de existência
das crianças e adolescentes que ali frequentam, bem como o contexto socioeconômico no qual
está situado o Projeto, para que as ações planejadas no Projeto “Semeando e cultivando
valores humanos para relação harmônica” pudessem contribuir para melhorar as relações
intersubjetivas daquele grupo, de suas respectivas famílias e na escola onde as crianças
estudam.
Nesse fazer pedagógico, os estagiários trataram, inicialmente, do tema valores
humanos para uma turma composta de crianças e jovens. As finalidades e objetivos do grupo
de estagiários com a temática foram por eles assim explicitados quando indagados a respeito,

E1: é muito importante trabalhar o respeito, a solidariedade entre as


crianças, a família e os amigos. Assim eles vão conviver melhor com as
pessoas onde vivem.
E2: Primeiro professora, porque é um tema que dá para trabalhar com
todas as faixas de idade, e segundo, porque quando nos propusemos discutir
essa temática, nós estamos querendo contribuir com mudanças de atitudes
deles.
E3: Bem, nós estamos pensando em uma formação que possa ajudar eles a
refletir sobre os modos como tratar os outros e se relacionar melhor com as
pessoas com quem eles convivem. (grifo nosso)

As percepções dos estagiários dialogam com os objetivos propostos pelo Projeto


Gonçalinho, ao estimular e propor atividades que despertam e intensificam as potencialidades
das crianças e adolescentes, de sorte que promovam o desenvolvimento pessoal, da família, e
dos grupos sociais dos quais fazem parte, sempre vinculados ao respeito pelos direitos
humanos.
Nestas ideias explicitadas pelos estagiários, estes apresentam indicativos de que a
prática de formação está aliada à prática social, porque revestida das manifestações de
atitudes, comportamentos, necessidades formativas e educativas tanto dos estagiários quanto
da comunidade na qual exercem a função educativa, temporária, no processo de tornarem-se
professores.
Outro aspecto, igualmente importante, que nos chamou a atenção diz respeito à
definição da metodologia para a realização do trabalho educativo. O grupo optou pela
metodologia que foi composta de roda de conversas, danças, brincadeiras orientadas e livres,
dinâmicas em grupo e jogos. Houve uma participação significativa das crianças e
adolescentes.
124

Assim, as ações educativas foram planejadas de modo que a participação coletiva


fosse o eixo da atividade docente. Tomamos como exemplo uma das atividades que se
destacou na prática pedagógica desenvolvida pelo grupo e que consistia na abordagem da
temática dança de rua. A atividade teve início com o grupo explicando sobre as manifestações
culturais que representam a dança de rua e, especialmente, sobre o Hip Hop. O grupo trouxe
uma aluna de escola pública e que se voluntariou para ensinar os primeiros passos do Hip
Hop.
No segundo momento, a turma foi redistribuída em duplas para a dança em pares,
utilizando-se a dinâmica do jornal: à medida que as duplas vão dançando, ao comando do
estagiário, vão dobrando o jornal e, assim, buscando alternativas, apoiando-se uma na outra,
para não sair da brincadeira, já que os pés não podem tocar o chão sem jornal. Essa atividade
tem por objetivo: o fortalecimento das parcerias, companheirismo, criatividade e trabalho em
equipe.
No terceiro momento, a turma é reorganizada e, assim, as crianças e adolescentes são
orientadas para se expressarem, representando quem são por meio de um ritmo muito
particular. Cada participante procurou um lugar no salão para se expressar e, então, solicitou-
se que estes fechassem os olhos e aguardassem a autorização para dançar, conforme cada um
se sentia, se percebia e se situava naquele espaço. Todos participaram.
No quarto momento, a voluntária ensaiou uns passos do Hip Hop e tentaram uma
coreografia. Alguns adolescentes não se dispuseram a realizar essa atividade.
No quinto momento, por fim, os estagiários e os participantes fizeram um círculo e
sentaram-se no chão para uma conversa avaliativa sobre as atividades realizadas. Os
estagiários pediram às crianças que falassem sobre como se sentiam em relação à atividade de
dança do Hip Hop. As crianças falaram e apontaram pontos positivos de superação da
vergonha e da timidez. A partir disso, os estagiários produziram uma reflexão sobre as
dificuldades encontradas pelos participantes e a necessidade de encarar e lutar para superar os
desafios. Nesse processo, reiteraram sobre a importância do apoio dos amigos, assim como na
dinâmica realizada. E finalizaram a atividade do dia com brincadeiras e jogos livres.
Nos demais dias, os estagiários também realizaram atividades que objetivaram
refletir sobre a importância da ética, da cooperação, tolerância, paciência, solidariedade nas
atividades cotidianas e nas relações intersubjetivas dos participantes.
Dessa observação das atividades desenvolvidas, duas situações trouxeram à tona
questões que não foram absorvidas nas práticas realizadas. Uma diz respeito às manifestações
culturais que um grupo de jovens, enquanto aguardava a organização dos demais grupos de
125

crianças, fez a partir do Hip Hop, estabelecendo conexões com práticas de religiões de matriz
africana. A conversa entre eles demonstrou bastante familiaridade com o assunto.
Outro aspecto que nos chamou a atenção também, mas que não foi evidenciado pelos
estagiários, diz respeito à familiaridade com as drogas. Com isso, não estamos afirmando que
os participantes eram usuários ou qualquer outra coisa nesse sentido, mas, enquanto
estávamos no intervalo das atividades, aqueles fizeram comentários sobre possíveis valores de
roupa e de tênis em “bocas de fumo”. Essa conversa feita pelo grupo de adolescentes não foi
percebida pelo grupo de estagiários, mas é algo muito preocupante e que nos leva a pensar a
respeito do quanto o papel social do Projeto Gonçalinho é grandioso para aquela comunidade.
Entendemos que as atividades desenvolvidas no campo da educação não formal
tomam por base a cultura dos indivíduos, as suas experiências e vivências, como ponto de
partida e de chegada, para promover a apropriação e produção de saberes para a vida em
coletividade. Assim, o planejamento das ações realizadas deve ser elaborado, cotidianamente,
a partir das percepções das vivências e necessidades que emergem das práticas sociais e
educativas desenvolvidas nos espaços, pelos estagiários e pelos participantes. Por isso, não
podem escapar às percepções dos educadores sociais (estagiários) as problemáticas que se
apresentam na realização de ações educativas.

4.1.2 Hospital Regional de Cáceres “Antônio Fontes”

O Estágio no Hospital Regional “Antônio Fontes” de Cáceres foi realizado no


período Matutino por um grupo composto por 2 componentes, sob a supervisão,
acompanhamento e avaliação das duas professoras responsáveis pela disciplina.
A estrutura da ala infantil do Hospital é consideravelmente boa. O prédio é bem
grande e espaçoso, os quartos são amplos, com leitos para bebês e crianças, contam com
cadeiras e camas para acompanhantes, e, alguns, com armários para guardar os objetos
pessoais dos pacientes. Com material necessário para o andamento das medicações, a equipe
médica do hospital procura sempre suprir as necessidades das crianças. Os estagiários de
medicina também são bem prestativos e compreensivos no tratamento das crianças. A sala de
apoio pedagógico é pequena, arejada e dispõe de mobiliários coloridos e versáteis. Nessa sala,
as crianças podem tomar seu café, assistir TV e realizar as atividades pedagógicas, propostas
pelas estagiárias.
126

O espaço destinado ao estágio, além da sala de apoio pedagógico, dispõe de um


parque infantil com vários brinquedos, que possibilita às crianças brincarem, ouvirem
histórias, imaginarem e, sobretudo, se distraírem e fugirem, temporariamente, da rotina
hospitalar.

4.1.2.1 As práticas realizadas pelas estagiárias

As atividades desenvolvidas foram planejadas a partir da elaboração do projeto de


intervenção denominado: Criando sua expressão através das Artes Visuais. Esse projeto teve
como objetivos: favorecer a construção e desenvolvimento do processo criador das crianças e
adolescentes; desenvolver a autonomia; estimular a criatividade em atividades de pinturas,
desenhos, colagem e modelagem, dentre outros.
Os conteúdos trabalhados foram divididos em três áreas: Arte visual, Linguagem oral
e escrita e Artes e integração. Para dinamizar o trabalho com as crianças e adolescentes em
situação de internação hospitalar, as estagiárias utilizaram-se de rodas de conversas, pinturas
em desenhos, dobradura e desenho livre. Também lançaram mão da contação de histórias,
utilizando-se de dedoches, leituras de gibis e outras historinhas.
Durante a ação educativa com as crianças de colo, as mães e/ou acompanhantes
vinham para a sala de apoio e de brincadeiras e participavam com as crianças.

4.1.2.2 Descrição analítica da observação das ações realizadas no Hospital

A observação das atividades realizadas na sala de apoio pedagógico do Hospital


Regional pelas estagiárias, suscitou duas reflexões importantes para o trabalho educativo
naquele espaço. A primeira, refere-se à existência de um setor denominado de Educação
Permanente que, ao nosso entendimento, pressupõe a percepção da vontade política de que é
possível realizar o trabalho educativo no hospital. A segunda, igualmente importante, diz
respeito à existência de uma sala mobiliada e de um parque infantil, bem conservado e em
local apropriado para que haja o uso desses por aqueles que se encontram em situação de
internação hospitalar.
A constatação da existência do espaço destinado à finalidade de promoção da
educação significa, em nossa compreensão, um avanço rumo à implementação de atividade
educativa contínua no espaço. No entanto, o que pudemos perceber, por ocasião do início do
127

estágio, é que a pessoa responsável pelo espaço tem como função primeira o trabalho de
enfermagem, no qual está engajada profissionalmente. Ainda assim, à medida que surge uma
brecha em seu horário de trabalho, destina a atenção às estagiárias, informando-lhes sobre o
espaço.
Por fim, durante a observação desse trabalho educativo naquele espaço, foi possível
perceber o quanto houve interações das mães, assim como das crianças com as estagiárias.
Uma relação de confiança, de apoio e de trocas. Em várias situações foi possível perceber as
mães trazendo os bebês e as crianças para que as estagiárias cuidassem, enquanto tomavam
banho, atendiam telefones ou conversavam com os médicos. Assim, entendemos que o
trabalho educativo no espaço hospitalar, além de propiciar aprendizagens múltiplas, constitui-
se um espaço de exercício de solidariedade, de trocas de saberes e de convivência social.

4.1.3 Rede cidadã integração, inclusão e cidadania

O Estágio no espaço Rede Cidadã foi realizado no período vespertino, por um grupo
composto por 5 estagiárias, sob a supervisão, acompanhamento e avaliação das duas
professoras responsáveis pela disciplina.
Entre o período de observação e de regência, as professoras orientadoras de estágio
destinam uma semana para que o grupo elabore a proposta pedagógica de intervenção no
espaço e, então, após o acompanhamento e a avaliação da proposta pelas docentes da
disciplina, os estagiários a executam, junto ao espaço não escolar, parceiro na semana
seguinte.
A Base Comunitária de Segurança Pública do Bairro Junco e Região fica localizada
na Avenida Nossa Senhora do Carmo, no Bairro Junco, sem número. A instituição oferece
aulas de artes, violão, capoeira e zumba. As atividades são gratuitas, oferecidas pelo trabalho
voluntário de parceiros do Projeto e funcionam em horários diferentes, com crianças e
adolescentes que se encontram em situação de risco ou demanda espontânea.
O programa Rede Cidadã conta com uma sala ampla para estudos, com seis
ventiladores de teto e duas mesas grandes. Possui um quadro de giz, dois banheiros pequenos,
um banheiro unissex, uma cozinha, dois depósitos, uma sala para psicólogo, uma
coordenação, e uma sala em que fica o policiamento que atende as ocorrências dos moradores
daquele bairro e região. O Programa não dispõe de recursos próprios, dependendo de doações
de lanches e de materiais de apoio pedagógico para a sua continuidade.
128

O programa Rede Cidadã é coordenado por uma pedagoga e por um policial militar.
Nesse trabalho de coordenação atendem, além das crianças nas atividades educativas, também
os pais ou responsáveis, quando os procuram naquela unidade de policiamento.
O projeto atende crianças na faixa etária de 7 aos 17 anos, no período vespertino,
com duas educadoras sociais que são alunas do Curso de Pedagogia, sendo que uma delas
exerce a atividade de modo remunerado e a outra, voluntariamente.
As atividades referentes ao Projeto Arte e Terapia são realizadas em um contexto
geral, nas segundas e quartas-feiras. Nas terças e quintas acontecem as aulas de violão que são
ministradas por um educador Soldado da Polícia Militar, com três turmas, em horários
diferenciados.

4.1.3.1 As práticas realizadas pelos estagiários

O grupo de estagiárias que realizou o estágio no Programa Rede Cidadã, Integração,


Inclusão e Cidadania, optou por desenvolver um projeto de intervenção pedagógica,
denominado de Autorretrato. Os argumentos que justificam a escolha da temática ancoram-se
na perspectiva de que
a criança e o adolescente precisam se sentir parte da sociedade em que
vivem, os primeiros anos de vida da criança são bastante intensos porque ela
está se constituindo como sujeito de direito e obrigações, está se descobrindo
parte da sociedade (Grupo 3-C).

Para o grupo, esta se constitui uma fase em que as crianças e adolescentes precisam
de um olhar que entenda seus medos, anseios e mudanças nas suas vidas. E um trabalho
pedagógico que enfoca tais perspectivas torna-se algo motivador e, ao mesmo tempo,
formativo.
Esse projeto teve como objetivos desenvolver na criança uma imagem positiva de si
mesma, com confiança, com base no respeito ao outro, por meio de atividades que
desenvolvam e utilizam suas diferentes linguagens corporal, musical, oral e escrita. Os
conteúdos trabalhados enfocaram a identidade, autoestima, afetividade, brincadeiras e
músicas. A metodologia, pautou-se em rodas de conversas, jogral, brincadeiras, apresentação
musical e atividades artesanais.
Conforme descrita no relatório “a avaliação [...] parte do interesse da criança na
realização das atividades, pela oralidade e participação comprometida com as atividades
propostas e desenvolvidas” (Grupo 3-C).
129

4.1.3.2 Observações das ações realizadas

O grupo de estagiárias que realizou o estágio no Programa Rede Cidadã, Integração,


Inclusão e Cidadania, inicialmente, demonstrou um certo estranhamento com a minha
presença no espaço. Essa postura arredia foi notada, principalmente, com duas alunas.
Nessa tarefa de acompanhar o grupo, eu aguardava ansiosa para ver os rumos que
iriam dar às atividades e, desse modo, procurava desencadear uma conversa, perguntando
sobre o que pensavam em fazer, o que tinham visto no espaço que poderia ser abordado, mas
nos dois primeiros dias, as estagiárias mostravam-se bem reticentes. Então, aos poucos fomos
nos aproximando e conversando e logo se dissipou essa situação. Quando deram início ao
trabalho educativo de intervenção, que é realizado na etapa de regência, eu já tinha me
tornado uma delas.
Outro aspecto que nos chamou a atenção diz respeito ao planejamento inicial que se
propunham realizar, que estava com marcas de processos escolares. Então, a professora
conversou com o grupo, após a etapa de observação e discutiu sobre as ações que estavam
planejando. Após, marcou uma reunião do grupo com as duas professoras orientadoras de
estágio (reunião da qual fui convidada a não participar) e, dessa orientação mais intensiva e
individualizada resultou o Projeto de Autorretrato, com características mais voltadas aos
espaços de educação não escolares.
Assim, a etapa de intervenção pedagógica resultou em um trabalho educativo com a
participação coletiva das crianças e adolescentes comprometidas com as atividades propostas.
Nessa etapa, fizeram, além das atividades formativas planejadas pelas estagiárias, uma
atividade comemorativa ao Dia das Mães, com apresentação de músicas acompanhadas ao
som de violão, tocadas pelos participantes. Foi um momento singular.
Vale destacar que, desse processo de observação do funcionamento do programa
Rede Cidadã na Base Comunitária de Segurança Pública do Bairro Junco, percebe-se um
clima amistoso, respeito e acolhimento entre a base policial e a comunidade. As relações são
baseadas numa perspectiva de humanização que se realiza entre a unidade policial, as crianças
e as famílias.
Podemos exemplificar tais argumentos em um relato sobre dois jovens que
apareceram na unidade, para exercitar aula de violão, mesmo não sendo seu dia e horário para
tal finalidade. A unidade possui uma função social muito importante para aquela comunidade
do ponto de vista da confiança, da segurança e da intervenção educativa e formativa da qual
tanto precisa.
130

4.2 ESPAÇOS NÃO ESCOLARES EM JUARA

Nesta seção, trazemos as informações relativas à caracterização, à descrição e à


interpretação das práticas pedagógicas realizadas por meio de projetos na Creche Municipal
Thayná Gabrielly Oliveira Marques e o projeto O Protagonismo da Mulher e os desafios da
sociedade contemporânea, ambos do Campus de Juara,

4.2.1 Creche Municipal Thayná Gabrielly Oliveira Moraes

A Creche Municipal Thayná Gabrielly Oliveira Moraes, situada no bairro Porto


Seguro, na cidade de Juara/MT, é uma instituição ainda jovem e que, embora atenda um
número significativo de crianças, não dispõe de parque infantil, brinquedoteca e alguns
materiais pedagógicos. Diante dessa percepção, após diversas reuniões e discussões, os alunos
decidiram, em conjunto com os professores, que no local seria realizado um projeto de
extensão para a construção de um parque infantil. Além da ausência de infraestrutura, a
escolha da creche municipal foi motivada pelo fato de a mesma estar inserida em uma região
periférica e ocupada por pessoas vulneráveis socioeconomicamente.
Nessa tarefa, os alunos tiveram algumas dificuldades para a realização do projeto, a
exemplo da obtenção de material suficientemente adequado, colaboradores, doações de
materiais como areia, pneus usados, tintas, pincéis, e outros, como enxadões, enxadas,
carrinho de mão, e assim por diante.

4.2.1.1 As práticas realizadas pelos estagiários

De acordo com relato de professores e alunos, o Estágio realizado pelo grupo de


acadêmicos de Juara foi pensado a partir da falta de um local para que todos os acadêmicos
pudessem realizar o estágio. Assim, iniciou-se uma discussão sobre a possibilidade de se
realizar um projeto que envolvesse a todos com variadas ações pedagógicas em determinado
bairro da cidade. A partir disso, o grupo pensou como poderia desenvolver atividades que
pudessem beneficiar a comunidade escolhida.
As ações educacionais aconteceram da seguinte forma: a abertura oficial do projeto
aconteceu com a apresentação de todos os colaboradores na Creche Municipal Thayná
Gabrielly Oliveira Moraes, junto com o professor Fabio; e, na sequência, começaram os
131

trabalhos de limpeza da área e escavações. Em seguida, começaram o trabalho com os pneus,


que primeiro foram colocados nos espaços a eles destinados e depois foram pintados. Aos
poucos, o parque infantil foi tomando forma.
Nesse trabalho, esteve presente a preocupação com a segurança e a saúde das
crianças, então, o uso e manuseio dos pneus foi pensada de maneira que não machucasse as
crianças, tampouco permitisse o acúmulo de água. Apesar das dificuldades, como aquelas
citadas anteriormente quanto aos materiais para a execução da atividade, o projeto, segundo
consta do relatório final, foi um sucesso, já que, de acordo com os estagiários: “alcançamos os
objetivos traçados”.

4.2.1.2 Observações das ações realizadas

As considerações decorrentes do processo de observação das práticas educativas


realizadas pelo grupo de alunos da cidade de Juara ancoram-se em dois aspectos, igualmente
importantes: o primeiro diz respeito ao papel extensionista que o estágio assumiu junto à
instituição infantil municipal. O segundo, por sua vez, baseia-se em um questionamento
inicial sobre quais práticas docentes são realizadas, quando a atividade se baseia em uma ação
voltada à prestação de serviços e que exige, sobretudo, esforço físico; e não à docência.
A Resolução do CNE/CP nº 01/2006/MEC estabelece que,

[...] a docência como ação educativa e processo pedagógico metódico e


intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas, as
quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia,
desenvolvendo-se na articulação entre conhecimentos científicos e culturais,
valores éticos e estéticos inerentes a processos de aprendizagem, de
socialização e de construção do conhecimento, no âmbito do diálogo entre
diferentes visões de mundo (BRASIL, 2006).

A partir disso, indagamos: a perspectiva de docência, nesse caso, encontra-se na


preparação do espaço para a realização do processo ensino e aprendizagem? Sabemos que a
formação inicial promovida pelo estágio, apoia-se no tripé ensino, pesquisa e extensão,
conforme delineado a seguir,

a) ensino – estágio enquanto componente curricular do curso de


Pedagogia, em que se desenvolvem atividades de ensino-aprendizagem de
conceitos, habilidades e valores concernentes ao profissional da educação; b)
pesquisa – o estágio como espaço para a produção de conhecimentos, tanto
por parte dos docentes/orientadores quanto por parte dos alunos/estagiários,
que na efetivação das atividades do estágio tomam permanentemente o
132

trabalho docente e o campo de sua realização como objetos de


reflexão/investigação; c) extensão – a própria efetivação do estágio constitui-
se em processo genuíno da relação da universidade com a sociedade mais
ampla, representada pelos locais em que se realizam as atividades
(UNEMAT, 2015, p.4).

Essa visão extensionista do estágio nos remete à compreensão de que a Universidade,


por meio do estagiário, produz uma relação de apoio e de consolidação do espaço para
promoção dos processos de formação, à medida que problematiza a realidade e reflete sobre
ela, e em vista disso, realiza ações que interferem e cooperam teórica e metodologicamente na
realidade em que atuam, de modo que propiciem condições que contribuam para o
desenvolvimento motor, cognitivo e lúdico das crianças. Por outro lado, essa perspectiva
desencadeia uma duplicidade de atividade, em razão de que, ao mesmo tempo que realizam as
atividades educativas relativas ao estágio, promovem, na mesma carga horária, eventos
e/ações que se sobrepõem e, por vezes, suplantam a atividade de docência necessária ao
processo de constituição docente.
Partindo da premissa que a docência constitui-se a base do curso de Pedagogia, de
acordo com o PPC de Juara, essa perspectiva demanda uma

[...] necessidade fomentadora emergente na formação inicial, em que os


futuros pedagogos construam conceitos que lhes permitam analisar e refletir
as realidades educacionais, cerceadas por suas políticas, no sentido de propor
ações interventivas” que possam contribuir para compreender os “contextos
locos-regionais em espaços escolares e não escolares (UNEMAT, 2013,
p.4).

Tal afirmação nos mobiliza a refletir que a ação educativa de construção de


brinquedos e de um parque infantil nasce da constatação da ausência desses instrumentos, por
ausência ou omissão de políticas públicas que atendam minimamente tais necessidades, e do
papel que desempenham as brincadeiras e atividades motoras tão necessárias ao
desenvolvimento cognitivo e lúdico das crianças. Apesar disso, sentimos que as práticas
extensionistas, neste caso, não comportaram as dimensões do processo de ensino e de
aprendizagem, também necessárias à profissão docente.

4.2.2 Projeto “O Protagonismo da mulher e os desafios da sociedade contemporânea”.


133

O projeto “O Protagonismo da mulher e os desafios da sociedade contemporânea” foi


pensado, elaborado e executado pelo grupo de alunos estagiários de Porto dos Gaúchos, Novo
Horizonte do Norte e Tabaporã, com a finalidade de discutir a violência contra a mulher.
A realização do evento foi uma proposta da turma da 8ª Fase do curso de Pedagogia,
a partir da disciplina Estágio Curricular Supervisionado VI em Ambientes Não Escolares que,
em sua ementa, propõe, entre outras coisas: a abordagem teórica relativa aos processos de
ensino, aprendizagem, execução de atividades docentes junto à comunidade, nos espaços da
educação não escolar, proporcionando ao estagiário o aprender a ser professor, comprometido
com a inserção social, contribuindo para a eliminação das desigualdades sociais (UNEMAT,
2013).
A escolha da temática partiu da constatação de que a região do Vale do Arinos tem
apresentado, nos últimos anos, altos índices de violências contra a mulher. Esta estatística
preocupante mobilizou o grupo a pensar formas de debater o assunto com a comunidade de
Porto dos Gaúchos/MT, como estratégia de sensibilização, bem como de valorização do
protagonismo da mulher na sociedade contemporânea e os desafios que enfrentam atualmente.

4.2.2.1 As práticas realizadas pelos estagiários

O evento foi concebido e realizado na forma de mesa-redonda, na Escola Municipal


Gustavo Adolfo Wilke, centro da cidade de Porto dos Gaúchos/MT. Foram parceiros da ação
a Secretaria Municipal de Educação de Porto dos Gaúchos/MT, a Secretaria Municipal de
Educação de Novo Horizonte do Norte/MT e a Secretaria Municipal de Educação de
Juara/MT.
A Secretaria Municipal de Educação de Porto dos Gaúchos/MT fomentou a
participação de professores, profissionais da educação e pais. A imprensa local divulgou o
evento reforçando a data, a hora e local para que os munícipes pudessem participar. Houve
mesa de abertura com autoridades locais e representante da UNEMAT, seguida de
apresentações artístico-culturais de alunos da educação básica.
A mesa-redonda foi composta pelo delegado de Polícia e por três mulheres
convidadas a falar sobre o tema “O Protagonismo da Mulher e os Desafios da Sociedade
Contemporânea”, tomando como enfoque as experiências e militância de cada uma. A
vereadora abordou a temática na perspectiva da autonomia feminina e o empoderamento da
mulher, com destaque ao papel da mulher na política; a policial falou na perspectiva dos
134

direitos da mulher; e a professora enfocou a questão de desigualdade de gênero e direitos


humanos. As discussões foram mediadas pelo Profº. Fábio Ludkee dos Santos.
As inscrições para participação foram realizadas na noite do evento, com o
recolhimento de 1kg de alimento não perecível para ser doado a uma instituição filantrópica
do município.
O evento foi pensado e destinado a um público alvo, como professores e
profissionais da educação básica; pais e alunos da educação básica; comunidade de Porto dos
Gaúchos/MT. Esta primeira etapa do ciclo de palestra teve como objetivos: promover a
participação da comunidade em discussões sobre o protagonismo da mulher na sociedade
contemporânea; propiciar momentos interdisciplinares de debates (relatos de experiência) de
mulheres locais; possibilitar condições de percepção para a reflexão sobre a realização pessoal
da mulher; debater sobre as violências contra a mulher e promover o envolvimento da
comunidade na proteção aos direitos e garantias da mulher.
Desse evento, o grupo descreve no relatório: “espera-se que o evento possa
sensibilizar aos presentes sobre o tema proposto, fazendo com que atuem como
multiplicadores no combate à violência contra a mulher” e, a partir das discussões feitas,
possam dar início à valorização do protagonismo feminino na sociedade contemporânea.

4.2.2.2 Observações das ações realizadas

As observações decorrentes das práticas educativas desenvolvidas pelo grupo de


alunos da cidade de Porto dos Gaúchos foram realizadas pelo acompanhamento das
discussões, orientações e mobilizações feitas, por meio do WhatsApp, no grupo “Projeto em
Ação”, que se destinava às questões pertinentes ao estágio. Nas comunicações constantes
deste grupo, havia trocas de informações sobre as demandas da organização do evento,
distribuição de tarefas, resolução de situações conflitantes e decisões que dependiam de outras
pessoas. Assim, acompanhamos toda discussão à distância e estive, presencialmente, no
evento.
Da observação das ações realizadas pelos estagiários, uma questão importante,
semelhante àquela pertinente ao outro grupo de Juara, diz respeito à execução de práticas
educativas sem que haja o processo de intervenção pedagógica em uma dada realidade social.
Embora no estágio seja admitida uma pluralidade de ações, tal situação nos inquietou, dada a
ausência de docência nas práticas desenvolvidas pelos estagiários.
135

No entanto, tal como no outro grupo de Juara, a temática para discussão surge de
uma leitura da realidade que foi provocada pelas evidências de fatos na comunidade, o que
motivou os estagiários a planejar ações coletivas e executá-las, procurando minimizar tal
realidade. Essa iniciativa constitui-se uma atitude reconhecidamente político-acadêmica,
interessante e necessária ao trabalho docente.
Nesta direção, Gohn (2010) afirma que

A educação social é um conjunto fundamentado e sistematizado de práticas


educativas não convencionais realizadas preferencialmente – ainda que não
exclusivamente – no âmbito da educação não formal, orientadas para o
desenvolvimento adequado e competente dos indivíduos, assim como para
dar respostas a seus problemas e necessidades sociais (p.26).

Para a autora, a educação social configura-se como uma possibilidade de dar


respostas às novas necessidades que emergem do mundo contemporâneo, porque ela é menos
rígida, menos hierárquica e sem formalismo. Nesta perspectiva, Gohn (2010) apresenta sua
compreensão de educação não formal que converge com a concepção de educação social:
“são as propostas que a caracteriza como sinônimo de práticas educativas desenvolvidas junto
a comunidades compostas por populações em situações de vulnerabilidade social ou algum
tipo de exclusão social” (p.26).
Para além das ações educativas formais, nos espaços de educação não formal, as
práticas ocorrem em
[...] ambientes e situações interativas construídas coletivamente, segundo
diretrizes de dados grupos’ [...] ‘ela poderá ocorrer por forças de certas
circunstâncias da vivência histórica de cada um, em seu processo de
experiência e socialização, pertencimentos adquiridos pelo ato da escolha em
dados processos ou ações coletivas (GOHN, 2010, p.18).

Daí decorre que os estagiários, tomando suas vivências e experiências, deliberaram


coletivamente para intervir na realidade social que se coloca problemática para os grupos, seja
em relação a Juara ou Porto dos Gaúchos. A literatura educacional tem nos apontado que na
educação não formal há “uma intencionalidade na ação, no ato de participar, de aprender e de
transmitir ou trocar saberes” (GHON, 2010, p.18).
A intencionalidade que orienta as ações educativas, sejam elas ligadas à docência, à
pesquisa ou à extensão, constituem-se espaços por excelência para que o estágio cumpra sua
função social e formativa de possibilitar aos alunos em formação desenvolver as “práticas de
docência que orientam os licenciados à observação, planejamento, sistematização,
implementação e avaliação da aprendizagem e da organização do trabalho docente em
136

ambientes escolares e não escolares” (UNEMAT, 2013, p.12).


As observações aos grupos de estagiários do Campus de Juara possibilitou a reflexão
sobre o processo de produção de saberes, ancorados na perspectiva de educação não formal
que, ao seu modo, contribuiu para a transformação da realidade social, por meio da atividade
extensionista de intervenção e assegurou aos envolvidos com o trabalho educativo reflexões
para a cidadania e civilidade, princípios tão necessários à sociedade atual. Não obstante,
reiteramos que tais práticas mostraram-se desprovidas do exercício da docência, essencial ao
processo de tornar-se professor.

4.3. ESPAÇOS DE EDUCAÇÃO NÃO FORMAL: LUGAR DE APRENDIZAGEM PARA


A VIDA EM COLETIVOS

Trazemos, nessa seção, a interpretação, a análise e a reflexão acerca dos espaços


físicos e sociais parceiros e seu papel constitutivo na formação do pedagogo.

4.3.1 Relação institucional e o papel educativo dos espaços parceiros

É importante destacar o papel e a importância dos cinco espaços não escolares que,
neste estudo, contribuíram para a realização da pesquisa: Projeto Gonçalinho, Hospital
Regional “Dr. Antonio Fontes”, Programa Rede Cidadã, Integração, Inclusão e Cidadania,
Creche Municipal “Thainá Gabrielly Oliveira Moraes” e o Projeto Protagonismo da mulher e
os desafios da sociedade contemporânea. Esses espaços educativos possibilitaram a realização
do Estágio Curricular Supervisionado, com foco em espaços não escolares, e deram valorosa
contribuição para a formação inicial dos estagiários do oitavo semestre do Curso de
Pedagogia, no período letivo de 2018/1, nos campi de Cáceres e Juara, na perspectiva da
docência, gestão e extensão.
Entendemos que os espaços educativos se situam para além da dimensão física e
territorial, haja vista que ali, naquele ambiente, “ocorrem aprendizagens, trocas de saberes,
valores, culturas, habilidades e processos educativos” (GOHN, 2010, p.17). Portanto, são
espaços que possibilitam ao estagiário a imersão em uma realidade social e cultural que
possui dinâmicas de organização dos processos pedagógicos diferentes daquelas realizadas
nas unidades escolares. Isso, por si só, já lhes atribui uma riqueza de possibilidades de
aprendizagens.
137

Tais argumentos encontram ancoragem nas contribuições de Gohn (2010) sobre a


concepção de espaços não escolares. O primeiro aspecto que destacamos diz respeito à
singularidade dos espaços educativos, que lhes confere características peculiares, a partir da
modalidade de educação que é oferecida naquele espaço.
Segundo Gohn (2010), na “educação formal, esses espaços são os do território das
escolas, são instituições regulamentadas por lei, certificadoras, organizadas segundo diretrizes
nacionais” (p. 17). São instituições que, historicamente, destinam-se às atividades educativas,
definidas em um currículo oficial, com processos pedagógicos próprios para o atendimento às
especificidades das etapas da Educação Básica: Educação Infantil, Ensino Fundamental e
Ensino Médio, bem como as instituições de ensino superior, entre outros.
Assim, a partir desse entendimento, os espaços educativos onde foram realizadas as
atividades de estágio não se filiam a essa modalidade de educação, embora tenha havido
atividades em uma Creche Municipal, o trabalho que fora ali realizado não se enquadra na
perspectiva da educação formal, haja vista que é uma instituição de Educação Infantil, mas as
ações desenvolvidas pelo grupo de estagiários, limitaram-se à prestação de serviços e não de
docência.
Igualmente, os projetos parceiros não se identificam na perspectiva da educação
informal, considerando que:

a educação informal tem seus espaços educativos demarcados por


referências de nacionalidade, localidade, idade, sexo, religião, etnia etc. A
casa onde se mora, a rua, o bairro, o condomínio, o clube que se frequenta, a
igreja ou o local de culto a que se vincula sua crença religiosa, o local onde
se nasceu etc. (GOHN, 2010, p.17)

Diferentemente da educação formal e informal, segundo Gohn (2010), na educação


não formal, “os espaços educativos localizam-se em territórios que acompanham as trajetórias
de vida dos grupos e indivíduos, fora das escolas, em locais informais, locais onde há
processos interativos intencionais” (p.17). Nesta concepção, a intencionalidade constitui-se
um importante elemento de diferenciação.
Desse modo, os espaços parceiros como Projeto Gonçalinho, Hospital Regional ‘Dr.
Antônio Fontes”, Programa Rede Cidadã, Integração, Inclusão e Cidadania, Creche Municipal
“Thainá Gabrielly Oliveira Moraes” e o Projeto Protagonismo da mulher e os desafios da
sociedade contemporânea, situam-se no âmbito da educação não formal. Destes, nos três
primeiros, as ações educativas realizadas pautaram-se na docência como eixo do trabalho
138

pedagógico, enquanto que, nos dois últimos, as ações foram orientadas pela extensão, sem
diálogo e ou articulação com a docência.
Os espaços onde acontecem as práticas de educação não formal, segundo Gohn
(2010):
[...] se desenvolvem usualmente extramuros escolares, nas organizações
sociais, nas associações comunitárias, nos programas de formação sobre
direitos humanos, cidadania, práticas identitárias, luta contra desigualdades e
exclusões sociais. Elas estão no centro das atividades das ONGs, nos
programas de inclusão social, especialmente no campo das artes, educação e
cultura (GOHN, 2010, p.36).

Nesse sentido, podemos inferir que os espaços de educação não formal, parceiros
para a realização de Estágio Curricular Supervisionado, inscrevem-se nas lutas e políticas para
a inclusão social, e vislumbram contribuir para a formação de cidadãos livres, autônomos e
conscientes de que são sujeitos de direitos e de deveres.
Assim sendo, os Projetos parceiros trabalham com a dimensão da inclusão social, de
acesso a conhecimentos e de construção de saberes que emergem da própria prática das
crianças, adolescentes e jovens, objetivando aprender a ler e interpretar o mundo que os cerca,
a respeitar e conviver com as diferenças, além de desenvolver a autoestima e formar atitudes e
valores adequados à convivência social.
Sobre os modos de realização do processo educativo, segundo Gohn (2010, p.39):
“[...] não delimitamos o campo da educação não formal a faixas etárias, categorias
socioeconômicas ou tipo de instituição que a oferece”. Esse critério de enturmação, seriação,
classificação, tão presente na educação formal, dilui-se na dinâmica do trabalho pedagógico
nos espaços da educação não formal, uma vez que esse campo da educação está voltado para a
formação do ser humano como um todo.
Assim, podemos resumidamente explicitar que a Resolução do CNE/CP nº 01/2006,
ao inserir os espaços de educação não formal como possibilidade formativa e campo de
atuação do pedagogo, estreitou os mecanismos institucionais entre a Universidade e as
organizações sociais como relação de compartilhamento de responsabilidades e compromisso
com a formação de sua comunidade acadêmica.

4.4 AS PRÁTICAS REALIZADAS NO ESTÁGIO EM ESPAÇOS NÃO ESCOLARES: O


QUE REVELAM AS ENTREVISTAS
139

Nesta seção, apresentamos as informações e a interpretação das narrativas contidas


na entrevista com os sujeitos da pesquisa, que foi um dos instrumentos utilizados no processo
de investigação sobre o estágio curricular supervisionado e a práxis pedagógica em espaços
não escolares, como espaço de apropriação e (re)construção dos saberes docentes no curso de
Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara da Universidade do Estado de Mato Grosso.
Na apresentação das informações, utilizamos as letras do alfabeto e numerais,
seguidos da letra “C” para Cáceres e “J” para Juara, a fim de identificar os sujeitos
participantes da pesquisa. Na primeira parte, apresentamos as ideias e reflexões feitas pelos
professores e, posteriormente, pelos estagiários, conforme os excertos explicitados a seguir:
Questão 1: Percurso profissional dos participantes;

P1-C: Então, Rosalva, deixa eu lhe passar um pouquinho da minha


formação, eu sou pedagoga, formada aqui pela Universidade do Estado do
Mato Grosso e cursei o Mestrado em Educação na UFMT. Sou professora de
rede de educação básica há 23 anos. E, como professora do ensino superior,
eu atuo na Pedagogia na UNEMAT há cerca de 12 anos. Então, a minha
experiência com o ensino superior já tem um caminho percorrido. A minha
formação foi se constituindo nesse meio entre a reflexão e a formação
composta de docência no ensino superior com as minhas inquietações na
prática pedagógica na Educação Básica. Foi nesse intermédio que eu me
constitui professora e venho me constituindo, até hoje.

A professora (P1-C) possui uma vasta experiência e vivência no campo educacional.


Isto nos motiva a pensar que as reflexões produzidas no âmbito de sua formação e atuação
profissional, entre as práticas realizadas no ensino superior e nos anos iniciais da Educação
Básica, tecem uma formação que está atenta às realidades educativas. A trajetória de vida da
professora traz elementos de comprometimento com a ação pedagógica engajada com as
realidades sociais que envolvem a sua atividade docente, que se ancora na “reflexão, entre a
formação composta de docência no ensino superior com as minhas inquietações [...]” (P1-C).
Tal afirmação permite-nos compreender que a professora enxerga os espaços
educativos como um espaço de totalização de formação humana, que continuamente fornece
elementos que demandam pensar e agir sobre a realidade social.
A esse respeito, P2-C apresenta sua história profissional alicerçadas nas seguintes
argumentações:

Bom, sou formada em Pedagogia, Mestrado em Educação e eu estou atuando


na educação do ensino superior desde 2012. Nesses anos todos, estamos
também na rede, com a educação infantil. Eu comecei trabalhando no ensino
superior, com a disciplina de Didática e Estágio, então meu período da
educação superior sempre teve a disciplina de estágio. Então, em todos os
semestres eu trabalho com estágio. Já trabalhei com o estágio da educação
140

infantil, do ensino fundamental, na educação de jovens e adultos, e há uns


quatro semestres, eu também venho trabalhando com estágio de espaços de
educação não formal. Tem sido uma experiência bem gratificante. Bem
diferente do estágio na educação formal (P2-C).

A professora P2-C descreve o estágio como parte central de sua caminhada


profissional, o que nos permite compreender que a sua formação e atuação está voltada às
práticas de ensino inerentes ao campo de atuação explicitado. Dessa forma, quando ela alia a
prática na Educação Superior à realizada na Educação Básica, evidencia que essa relação está
permeada pelos saberes construídos, (re)construídos e ressignificados pelas experiências das
práticas.
Nessa perspectiva, as práticas educativas, realizadas nos diferentes níveis e campos
de saberes, produzem o movimento de retroalimentação desses saberes que emergem das
ações pedagógicas nos espaços de atuação, suscitando novos modos de pensar e agir no
âmbito da formação docente. Diante de tais afirmações, ousamos inferir que a professora P2-
C identifica-se com as ações que se realizam nesses espaços, de modo especial, naqueles de
educação não formal. Essa leitura baseia-se nas evidências narradas pela professora quando se
refere ao estágio em espaços não escolares “tem sido uma experiência bem gratificante. Bem
diferente do estágio na educação formal” (P2-C).
O professor P3-J, de modo sucinto, narra sua trajetória no campo profissional,

Sou professor do Campus de Juara, na área de Pedagogia. Juara é uma


cidade interiorana, então nós temos algumas dificuldades que são bem
particulares de cidades interioranas. Eu trabalho com o campo da educação
não formal já faz algum tempo. No começo, com a disciplina de gestão de
ambientes não escolares, e nos últimos anos também com o estágio (P3-J).

O participante P3-J descreve as suas vivências e experiências no campo da educação


não formal, em sua trajetória profissional, de modo objetivo e informa-nos que “Juara é uma
cidade interiorana, então nós temos algumas dificuldades, que são bem particulares de cidades
interioranas” (P3-J), remetendo-nos à ideia de que a cidade dispõe de poucos espaços
destinados a essa área de atuação.
O professor P4-J, por sua vez, apresenta sua história profissional destacando os
seguintes argumentos,

Sou professor do curso de Pedagogia, e atuo no estágio em espaços não


escolares. Tenho uma pós-graduação em Educação Integral que trata sobre o
protagonismo do aluno, em que o professor deve criar as possibilidades de o
aluno construí-lo. Bom, no estágio, é a primeira vez que trabalho com essa
141

disciplina. Eu venho acompanhado sempre as ementas, tento seguir à risca o


ementário. Nesse sentido, observei que no processo de formação do
pedagogo, deve passar pela vivência nos espaços escolares e não escolares,
que em nossa cidade, hoje, é carente desses espaços (P4-J).

Nessa perspectiva, o professor P4-J revela a sua formação com foco na Educação
Integral e destaque para o protagonismo do aluno. Em sua narrativa, remete-nos à
compreensão de que o aluno se constitui o núcleo central da formação nos espaços, e cabe ao
professor a tarefa de motivá-lo a tornar-se protagonista de suas ações por meio de leituras e
problematização de sua realidade. A partir dessa compreensão da realidade, também cabe aos
professores proporem ações que passam não só pela instrumentalização teórico-prática, mas,
sobretudo, pela realização da prática pedagógica de intervenção e de transformação dessa
realidade.
As leituras das trajetórias profissionais apresentadas pelos quatro participantes
evidenciam aspectos fundamentais que emergem de suas narrativas. O primeiro diz respeito
ao papel da reflexão sobre a realidade social como parte constitutiva do processo de formação,
enquanto que, o segundo revela que há uma dialogicidade entre os campos de formação e
construção de saberes. Por conseguinte, a partir das interações entre o processo de apreensão e
intervenção na realidade dos espaços, são produzidos novos modos de pensar e agir sobre a
formação docente.
Outra evidência constatada diz respeito ao protagonismo dos alunos no processo
formativo, e o papel do professor em promover e estimular esse protagonismo, conduzindo os
estudantes, problematizando essa realidade social e produzindo discussões acerca das
reflexões sobre as várias possibilidades de intervenção e transformação desses ambientes não
escolares, por meio das ações educativas.
A trajetória profissional dos professores orientadores de Estágio Curricular
Supervisionado, esclarece, ainda, que as duas professoras que atuam no Curso de Pedagogia
do Campus de Cáceres têm formação em nível de mestrado em educação, enquanto que os
dois professores do Campus de Juara têm pós-graduação lato sensu. Quanto ao tempo de
atuação na disciplina de Estágio, três professores argumentaram que estão nesse campo há
algum tempo, e apenas um desses começou a docência nessa disciplina no primeiro semestre
de 2018.
Após o acesso à trajetória profissional dos quatro participantes, na sequência,
apresentamos as narrativas que tratam do processo de instrumentalização teórico-prática no
campo formativo dos estagiários em ambientes não escolares tratadas na questão 2: Como se
142

dá a formação dos alunos por meio da instrumentalização teórico-prática com vistas à


apropriação e (re)construção de saberes docentes?
Nessa questão, descrevemos as dimensões do processo de instrumentalização
teórico-prática narradas pelos professores participantes, constituídas de suas percepções,
vivências e experiências explicitadas em suas ações pedagógicas. Assim, apresentamos, a
seguir, a narrativa de P1-C sobre as ações que realiza para tal finalidade:

Nós seguimos de base o que nós tínhamos anteriormente, ele [o estágio] vem
organizado por rotinas, seguindo a constituição de compreensão teórica,
metodológica do espaço não escolar, com leituras dos autores que vamos
trabalhar. Que define o que é o espaço não escolar, quais são os conceitos,
onde que eles surgem, e qual é a finalidade de se trabalhar um estágio em um
espaço não escolar para vida do acadêmico. A gente faz toda essa construção
da identidade do espaço não escolar, por meio das leituras dos teóricos em
sala de aula, através de leitura coletiva, individual, debate, discussão com
relação às temáticas tratadas. Também trazemos alguns vídeos que
apresentam o espaço não escolar em outras realidades, apresentamos
também vários acadêmicos, algumas imagens que nós já tínhamos de
atividades dos semestres anteriores dos espaços que vamos trabalhar.
Trazemos também uma das nossas acadêmicas do semestre anterior para
fazer um relato com relação ao espaço não escolar. Então, são todas essas
situações de processo de aprendizagem que envolve em sala de aula, para ver
se eles conseguem construir um conceito sobre esse espaço não escolar (P1-
C).

A professora P1-C descreve didaticamente os instrumentos dos quais ela se utiliza


para o processo teórico-prática dos estudantes, com a finalidade de prepará-los para a
realização do estágio. Nesse sentido, utiliza leituras de autores e vídeos que abordam aspectos
conceituais da Educação Não Formal, promovendo reflexões geradoras de discussões e
debates sobre a temática, com vistas à percepção das dinâmicas de organização e
funcionamento dos espaços não escolares.
Também destaca os elementos de instrumentalização, as experiências adquiridas com
os alunos em semestres anteriores, utilizando-se, para tanto, da contribuição de relatos de
experiências dos egressos, visando à construção de conceitos sobre a educação Não Formal e
o seu papel na formação de professores. A partir dessa construção coletiva das atividades
pedagógicas, os alunos começam a vislumbrar possibilidades de identificação com
determinados espaços, de sua inserção e de possível atuação na realização do estágio.
Nessa mesma perspectiva, a Professora P2-C descreve como desenvolve o processo
de instrumentalização teórico-prática dos estagiários para a realização das atividades
educativas:
143

Então, nessa etapa que temos trabalhado em espaço de educação não formal,
normalmente a gente trabalha com uma colega e, antes de nós termos o
início do semestre, a gente se encontra para começar o planejamento e
definir a fundamentação teórica, os materiais que vamos usar para que os
acadêmicos tenham um entendimento teórico sobre o assunto que vamos
tratar, para que possam compreender e conceituar o que seria educação não
formal, e compreender também quando estamos falando em educação não
formal ou educação não escolar, porque às vezes, eles têm dificuldade de
conceituar o que estamos falando, então é interessante que eles possam ter
esses materiais para que eles entendam e possam discutir e dialogar sobre o
assunto e compreender melhor o que seria educação não formal, e, sobretudo
conseguir pensar o estágio em espaço não escolar, diferente do que se pensa
quando estamos em uma instituição escolar, porque quando os estudantes
vêm, eles já passaram por 5 estágios, anteriormente, o não formal é o 6,
então o estagiário já vem passando por 5 estágios e já vem com bastante
atividades que são usadas em ambientes escolar. Então, nós precisamos
trabalhar bastante o olhar que os estagiários devem ter para atividade em
educação não formal, para que eles não venham com compreensões ou com
ações que sejam de escolarizações, que não sejam essa proposta do espaço
de educação social que, neste caso, são os espaços de educação não formal
(P2-C).

A professora P2-C narra sobre o processo de instrumentalização a partir da definição


de autores que trabalham com os aspectos teórico-metodológicos na perspectiva de educação
não formal. É nesse campo de conhecimento que se situam os espaços educativos não
escolares.
A partir desse estudo, a professora promove com seus alunos reflexões que
desencadeiam a compreensão da constituição dos espaços não escolares. A busca dessa
compreensão coletiva sobre a educação não formal promove ações, debates e discussões que
delineiam os modos de pensar e conceber os espaços não escolares e, consequentemente, os
modos de pensar e agir naquele ambiente. Essas atividades envolvem, em nosso
entendimento, a articulação e interação da teoria e da prática.
Em relação ao procedimento de instrumentalização dos alunos para a realização do
estágio, o professor P3-J descreve,

Na sala, nós aproveitamos parte da carga horária teórica para tomar decisões,
e construir a escrita. Inclusive a escrita desse projeto. Na semana retrasada
nós fizemos em sala, porque a gente demorou na organização do que íamos
fazer. E, nós passamos por duas propostas, uma foi até iniciada, e eles
voltaram atrás, não dava certo, era muita coisa, enfim. Foram dois dias para
discutir, porque o evento já estava caminhando, eles já tinham ido no bairro,
já haviam visto o barracão da comunidade, era uma outra coisa diferente
deste, da creche. E aí eles resolveram mudar. Então, pegamos quatro aulas e
debatemos a questão do bairro, da creche, com os alunos e a diretora da
escola sobre essa necessidade. A partir disso, fomos organizando tudo, e
estabelecemos datas e metas a serem atingidas. Além disso, definimos como
e quando isso seria feito, se no meio da semana ou no fim de semana. Ficou
144

acordado que eles iriam passar o final de semana lá, o sábado o dia inteiro e
parte do domingo, fazendo esses brinquedos, que são os pneus do parque, os
outros em casa e não na Unemat (P3-J).

O processo de instrumentalização ocorre diferentemente das narrativas anteriores de


P1-C e P2-C. Embora no primeiro momento as ações sejam convergentes, quando a ênfase é
dada na intencionalidade da ação, no que se quer, como, onde e quando vai fazer a ação
educativa, na etapa seguinte os processos distanciam-se entre si, pois a instrumentalização
teórico-prática, segundo o participante, realiza-se na escrita de um projeto de extensão para
intervenção na realidade do ambiente não escolar.
O que nos chama a atenção nesse caso diz respeito à percepção do esforço para a
realização do planejamento das ações a serem efetuadas nos espaços definidos pelo grupo,
mas não foi possível perceber o papel da docência como elemento do fazer pedagógico, no
processo de tornar-se professor.
A respeito da forma como se dá a instrumentalização, P3-J acrescenta ainda que,

Então, esses momentos das aulas teóricas nós, basicamente fazemos isso, as
leituras de artigos, da ementa, geralmente a gente passa para eles ir fazendo a
leitura em casa. Bom, não é comum gente fazer isso antes do 8° fase
formativa, porque eles não leem. Mas na 8°, a gente meio que força um
pouco, no sentido que pensamos que eles têm que dar conta disto, porque é
uma realidade que está bem pertinho deles (P3-J).

Nesse sentido, a narrativa reitera que a instrumentação se realiza no processo de


concepção e elaboração do projeto de extensão, tendo em vista que, nesse processo,
recomenda-se a leitura de “vários textos para eles na sala, sobre creche, para eles entenderem
ou relembrarem, e servem para a fundamentação teórica. Então eles acabam lendo sobre a
educação formal” (P3-J). A narrativa não descreve sobre as reflexões que poderiam ser
produzidas nessa etapa de constituição do projeto.
O professor P4-J traz elementos do processo de organização da disciplina, como o
momento de pensar o estágio e os possíveis espaços de realização da atividade docente pelos
estagiários:

Então, em um primeiro momento fazemos um mapeamento com os alunos


dos espaços existentes: a prefeitura que atende a área esportiva, saúde,
assessoria pedagógica. E, dentro dessas aulas teóricas, trouxemos essa
proposta, primeiro momento nós tentamos fazer um projeto estilo de Cuiabá,
que é aquela ação para um bairro, e essa experiência ficou meio difícil de
realizar (P4-J).
145

O professor P4-J descreve, também, que a etapa de instrumentalização teórico-


prática se dá, inicialmente, pelo mapeamento de possíveis espaços para a realização do
estágio. E, diante da percepção das poucas opções existentes, fizeram uma tentativa de
realizar um evento que atendesse diferentes necessidades da comunidade. Nesse intento,
diante das dificuldades encontradas, delinearam novos modos de intervenção:

Diante da constatação das dificuldades em realizar um projeto grande,


conversando com a turma, surgiu uma aluna com uma ideia de fazer uma
ação transformadora de uma creche, essa aluna disse que na creche, aonde
ela trabalha, está precisando de parquinho, brinquedos... e como a gente veio
desde a 3° fase construindo materiais pedagógicos, tem essa questão do
brinquedo, da finalidade da brincadeira, então tudo isso deu suporte para
essa proposta (P4-J).

A proposta de elaboração do projeto de atendimento às necessidades de materiais


pedagógicos e de construção do parque infantil para a creche, surge da constatação oriunda da
leitura da realidade social e educacional, que nasce das vivências e experiências dos sujeitos
em formação. Desse modo, enquanto planejamento, atendem às dimensões do ensino, ao
passo que o esforço físico de construir valas para os pneus, a pintura desses e colocar areia no
parque, que foram as tarefas realizadas na construção do parque e do balanço infantil, desloca
a atividade pedagógica para a dimensão física, que é a atividade meio e não a atividade fim,
que seria o exercício da profissão docente.
Continuando as explicações sobre a etapa da instrumentalização, P4-J narra que,

Sentamos eu e o colega com os nossos acadêmicos, discutimos a respeito


dessa perspectiva de uma formação, de jogar a problemática para o aluno,
construir junto com ele e não trazer pronto, e então começamos a construir
do zero o projeto. Mostramos no site da PROEC, os vários formulários de
projetos de extensão, de ensino, e lá vimos um formulário que mais ou
menos estabelecia esse projeto, e começamos a escrever com eles, como a
sala está dividida em três cidades que é Juara, Novo Horizonte e Porto, (dos
Gaúchos). Os alunos de Novo Horizonte e Porto decidiram fazer um projeto
entre eles, para realizar lá na cidade deles, porque como são a minoria e,
sempre nos estágios, eles tinham que vir pra Juara, e agora deu certo, a
oportunidade deles fazerem lá, e nós apoiamos isso (P4-J).

A narrativa de P4-J traz o conhecimento da realidade como o ponto de partida para o


planejamento das ações de estágio e, nessa tarefa, cabe aos professores a orientação das
atividades pedagógicas oriundas das vivências e experiências nos ambientes não escolares.
Para tal, o professor orientou os acadêmicos que partissem da compreensão do mundo prático,
das constatações e não do mundo teórico que tiveram como instrumentalização durante o
curso.
146

Das narrativas de P4-J, é possível inferir que o trabalho educativo orientado pelo
professor evidencia o protagonismo do acadêmico para que, a partir de suas leituras da
realidade social, produzam caminhos para resolução dos problemas encontrados na
comunidade.
Na sequência, objetivando aprofundar a compreensão sobre o processo de
instrumentalização teórico-prático, fizemos o seguinte questionamento: (Questão 3) o que se
leva em consideração na elaboração do planejamento?
A professora P1 - C, respondendo a esta questão, apresenta os critérios para
elaboração de seu planejamento que nasce das necessidades que emergem das inquietações
apontadas pelos alunos:

O que nós percebemos no primeiro dia de aula, da disciplina de (estágio) em


espaço não escolar, quando eles chegam pra gente, eles dizem: professora,
mas o que que nós vamos fazer então, vai precisar de plano de aula, né?
porque é aberto o espaço, e não tem toda aquela organização e etc. Aí, nós
vamos colocando nosso plano de ensino, vamos falando sobre todos os
momentos, mostramos as aulas, as rotinas [...] e, a partir da primeira leitura,
eles já começam entender que não tem o mesmo ritmo que o espaço escolar,
mas que o planejamento é muito mais necessário, ou muito mais consistente,
pois ele emerge do período de observação. Então, o que eles vão conhecer,
aquele espaço, o que é que se desenvolve naquele espaço, quais são as
necessidades de intervenção naquele processo para melhoria do que já se
efetiva no espaço não escolar, então ele acaba virando bem mais denso e
necessário (P1-C).

A professora P1-C, ao iniciar a disciplina, apresenta os momentos que constituem o


processo de instrumentalização teórico-prática para realização do estágio nos ambientes não
escolares e esclarece que a elaboração do planejamento toma a realidade social como objeto
de pensar a ação educativa, para que esteja vinculada às necessidades e expectativas daquele
grupo ou comunidade:

Com isso não quis dizer que no espaço escolar, não seja necessário, mas no
espaço não escolar por emergir da situação que as crianças, os adolescentes e
as famílias vivenciam, eles precisam de um planejamento bem mais denso,
para acolher as necessidades daquele espaço e dos sujeitos que ali estão (P1-
C).

Nessa perspectiva, a professora também apresenta argumentos sobre as diferenças


existentes entre o trabalho educativo no espaço escolar e não escolar, e enfatiza o espaço não
escolar como o lugar que possibilita o protagonismo dos estudantes a partir das situações
concretas vividas por aquela comunidade.
147

P1-C, na sua narrativa, traz mais elementos sobre a importância e a necessidade de


planejamento de intervenção:

Então, com relação a esse planejamento, após esse período que nós temos de
30 horas de instrumentalização teórica-metodológica, durante esse período,
nós construímos uma rotina de atividades, ou uma rotina de ações que eles
devem se envolver no período de observação e depois na construção do
próprio planejamento de intervenção (P1-C).

Para a professora P1-C, todas essas ações são pensadas no plano de ensino com
vistas a estabelecer um fio condutor entre a etapa de instrumentalização e da observação para
que possa “criar esse olhar de pesquisador porque, normalmente, quando os estudantes vão
para o espaço, sem uma rotina ou orientação, eles acabam observando as fragilidades e não
percebendo realmente quais são os elementos importantes” (P1-C) e, assim, a partir da
compreensão dos aspectos essenciais percebidos nos espaços, possibilitar o planejamento do
processo de intervenção que atenda às demandas existentes na comunidade.
Outro aspecto que P1-C traz diz respeito ao planejamento de estágio, que leva em
conta “os elementos que contém o PPC do curso, a ementa do curso, e depois a realidade
formativa dos nossos próprios acadêmicos” (P1-C). Desse modo, na organização do trabalho
pedagógico, “nós temos acadêmicos que conseguem ter uma prospecção maior, ou uma
compreensão maior do espaço nas primeiras leituras, e nós temos alguns que acabam indo
para esse espaço sem compreender os conceitos básicos” (P1-C). Essa percepção e atenção da
professora aos modos como os estudantes assimilam o processo de instrumentalização
teórico-prático é muito importante, pois seu olhar possibilita redimensionar as ações tanto
como docente como aquelas que são desenvolvidas pelos alunos.
Nesse sentido, a professora (P1-C) narra também sobre o esforço didático-
pedagógico para a compreensão das dinâmicas de funcionamento dos espaços não escolares,
pois “apesar de todas as orientações feitas, de todas as leituras, vídeos, depoimentos,
fotografias e diálogos, eles acabam indo ainda para esse espaço com uma cabeça de espaço
escolar” (P1). Então, cabe ao professor continuar, insistentemente, com as orientações e
acompanhamento para que produzam a atividade de intervenção baseada nos princípios
metodológicos da educação não formal.
Ainda, a professora P1-C traz a reflexão sobre os desafios encontrados no
planejamento e execução das atividades educativas em espaços não escolares:

Então, esse é um dos grandes desafios, que eu vejo na organização do plano


de ensino da disciplina de estágio de espaço não escolar. Porque os
148

estagiários, uma porcentagem considerável da turma, por mais que haja todo
esse roteiro de trabalho, acaba indo para o espaço com a concepção de
escola, e ali naquele momento de observação, eles não conseguem ainda
entender o funcionamento daquele espaço no período de planejamento do
projeto de intervenção (P1-C).

Para a Professora P1-C, o que se leva em consideração, tanto para o processo de


elaboração do planejamento como para os modos de realizá-lo, parte da compreensão de
estágio em espaços não escolares contidas no PPC do curso e das necessidades apresentadas
pela realidade social observada. Nesse sentido, tais elementos são necessários para a
elaboração e execução de uma proposta pedagógica de intervenção na comunidade que
possibilite a apropriação dos saberes produzidos naquela para, a partir deles, ressignificá-los e
produzir novos saberes.
Em relação à questão que diz respeito aos aspectos considerados no processo de
elaboração do planejamento, a Professora P2-C apresentou os seguintes argumentos:

Então, nós precisamos trabalhar bastante o olhar que eles vão ter para
atividade em espaço de educação não formal, para que eles não venham com
compreensões ou com ações que sejam de escolarizações, que não sejam
essa proposta do espaço de educação social que no caso são os espaços não
formais (P2-C).

A professora P2-C demonstra preocupação com a assimilação dos aspectos


conceituais relativos à educação não formal, para que os estudantes realizem a proposta de
intervenção na comunidade de modo a atender as orientações feitas pelas docentes, mas,
sobretudo, que esteja de forma teórica e prática situada no âmbito da educação não formal.
Nesse sentido, P2-C traz, ainda, uma relação entre educação social e educação não
formal, que estão inter-relacionadas no processo de aprendizagem promovidos nos espaços
não escolares. A esse respeito, Gohn (2010) esclarece que:

Outra forma encontrada para descrever educação não formal, com


abordagem na mesma linha da educação social, são as propostas que a
caracteriza como sinônimo de práticas educativas desenvolvidas junto à
comunidade compostas por populações em situações de vulnerabilidade
social ou algum tipo de exclusão social, ressignificando o antigo termo
educação comunitária. (GOHN, 2010, p.26)

As contribuições explicitadas pela autora reportam-nos ao entendimento de que a


educação não formal, assim como a educação social têm como referência as práticas
educativas desenvolvidas nas comunidades que apresentam demandas relacionadas à
aquisição e/ou manutenção de direitos sociais, de cidadania, trabalho, entre outros. Nesse
149

sentido, Gohn (2010), citando Pérez (1999), apresenta conceitualmente educação social
ligando-a à categoria de educação não formal:

Para Pérez, a educação social é uma possibilidade de dar respostas às novas


necessidades educativas do mundo contemporâneo porque ela é menos rígida
e sem formalismo. Esse autor inclui como campo da educação social/não
formal o trabalho com educação de adultos processos de formação para o
trabalho, alguns tipos de programas educativos que incluem a animação
sociocultural, como circo, teatro, representações de memórias histórico-
culturais etc. (GOHN, 2010, p.26).

As contribuições de Pérez acerca da educação social ensejam a compreensão de que


esse campo se constitui como uma possibilidade de atender as demandas existentes em várias
frentes, tais como a formação para o trabalho com jovens e adultos e demais programas
educativos para determinados públicos que necessitam de uma formação, como no campo das
artes, esporte, teatro, dentre outras.
Nessa perspectiva, P2-C acrescenta que “[...] a gente faz um planejamento,
separamos os materiais, trazemos os conceitos, definimos os espaços que serão possíveis
parceiros para que possamos estar trabalhando com eles” [...]. Nessa tarefa de planejamento, a
P2-C explica as seguintes rotinas tomadas como referência:

Consideramos o período do desenvolvimento das atividades, nós precisamos


entender que as instituições também têm essas atividades, tem seu calendário
e quando se trata de parceria, precisamos conversar para ver se o nosso
calendário encaixa também, com as datas que as instituições tem, e, em
alguns momentos, a gente precisa repensar as datas juntos com os parceiros
que vão nos receber. Mesmo que nós já tenhamos pensado na data do
estágio, às vezes nós precisamos repensar para poder adequar às
necessidades deles, também (P2-C).

A professora P2-C apresenta, além das preocupações teórico-práticas, os aspectos


relativos às adequações que são pensadas em relação às atividades de estágio, em consonância
com o cronograma de funcionamento das instituições parceiras, a fim de garantir a
continuidade da realização do estágio.
O professor P3-J trouxe a reflexão de algumas questões que dizem respeito ao
processo de planejamento e operacionalização do estágio,

O nosso planejamento é feito a partir das percepções das necessidades dos


alunos estagiários, da comunidade que geram discussões que fazemos com
os alunos sobre o que vão, como vão fazer e onde realizar a atividade.
Assim, discutimos possíveis espaços e projetos para ser desenvolvidos. Em
seguida, vamos fazendo as orientações nas aulas de estágio (P3-J).
150

Diante dessa manifestação, sobre o planejamento e a operacionalização do estágio, o


professor P3-J descreve que o trabalho em espaço não escolar começa a partir das percepções
intuitivas sobre as necessidades das comunidades onde os estagiários irão atuar. Assim, o
participante define a ação docente nos possíveis espaços constituídos como lócus da práxis
docente, orientada pelo planejamento coletivo e pelo conhecimento das necessidades que
emergem naquela comunidade, para (re)construí-los. A partir dessa instrumentalização, os
alunos planejam suas ações educativas considerando os aspectos emergenciais da comunidade
ou grupos sociais que requerem a busca de soluções que, por sua vez, ancoram-se nas
interações do fazer, fazendo. Da prática que antecipa a ação, sustentada na teoria.
Pimenta (2012) apresenta uma importante contribuição acerca da teoria que “deverá
ser formulada e utilizada a partir das necessidades concretas da realidade educacional, à qual
busca responder através da orientação das linhas de ação” (p. 78).
A esse respeito, Gohn (2010) traz a reflexão de que o “aprendizado gerado e
compartilhado na educação não formal não é espontâneo porque os processos que o produz
tem intencionalidades e propostas” (p.16). Além do mais, seus objetivos não são dados a
priori, emergem das condições sociais daquele grupo e/ou comunidade.
Neste sentido, o Professor P3-J afirma que ele, juntamente com o professor P4-J,
acompanham o processo de organização dos alunos, de elaboração de projetos e o controle do
processo de realização das atividades propostas. Exemplificativamente, cita: “saber se o grupo
está participando, se estão providenciando as atividades, se conseguiram superar as
dificuldades encontradas e como o fizeram para chegar à solução [...]” (P3-J|). E assim, o
estágio vai se constituindo em um fazer coletivo, permeado pelas vivências e trabalho coletivo
dos estudantes e professores.
Em sua narrativa sobre o que se leva em consideração na elaboração do
planejamento, P4-J aponta dois aspectos fundamentais à elaboração do planejamento. Para
P4-J, o planejamento da disciplina partiu dos interesses, expectativas e das necessidades
apresentadas pelos alunos, através das discussões feitas em sala de aula sobre as percepções
de grupo sociais e suas realidades para, posteriormente, elaborar o projeto de intervenção
nessas realidades sociais trazidas pelos alunos:

Tanto que nessa disciplina nós já reconstruímos o planejamento duas vezes.


Viemos com a proposta do planejamento de eles buscarem esses espaços não
escolares, e aí depois mudou para aquela questão de fazer aquele projeto
para o nível bairro, ou alguma localização especifica da cidade, e agora
surgiu esse de fazer a reforma de um parquinho e da construção de
151

brinquedos pedagógicos na creche. Por mais que seja uma creche, em um


espaço sistematizado, eles irão fazer uma ação como cidadãos (P4-J).

Na narrativa do professor P4-J, fica implícito que o planejamento da disciplina se


realiza em duas dimensões, sendo que a primeira se refere às informações trazidas pelos
professores resultantes de um planejamento prévio para o coletivo de estudantes. Depois, à
medida que se estabelece o diálogo sobre o estágio nos possíveis espaços não escolares,
produzem-se mudanças no planejamento docente para contemplar as ações definidas pelo
coletivo de estudantes. Ao mesmo tempo, surge, também, o planejamento dos estudantes para
a execução das atividades de intervenção na realidade social, anteriormente observada.
Nesse contexto de planejamento, indagamos aos participantes: (Questão 4) como se
dá o processo de seleção de espaços não escolares para a realização de estágio?
A professora P1-C esclarece, em sua narrativa, que o processo de seleção dos
espaços não escolares inicia-se durante as aulas destinadas à etapa de instrumentalização
teórico-prática, em que se trabalha, além dos aspectos conceituais, as diferenças existentes
entre espaços formais e não formais de educação. Nesses momentos de discussões, interações
e orientações planejam-se os espaços e possíveis ações, conforme explicita,

Então, a partir dessa rotina, eles vão para os espaços, tendo pelo menos,
assim, um traçado de quais ações que eles precisam desenvolver no período
de observação, por exemplo que eles precisam marcar uma reunião com a
equipe gestora do espaço, que eles precisam ler os documentos que
formaliza aquele espaço, aonde as atividades de estágio vão ser
desenvolvida. E aí eles organizam uma rotina inteirinha do que precisa ser
observado naquele espaço, que não é só parte de estrutura, mas como as
interações acontecem lá dentro, então todos esses elementos são necessários
para ser desenvolvido no processo de execução da observação e de regência
(P1-C).

A professora P1-C demonstra uma postura didático-pedagógica cuidadosa no que se


refere às ações e interações que serão produzidas nos espaços parceiros, de modo que os
estudantes apreendam a dinâmica política, administrativa e pedagógica do ambiente para que,
a partir dela, possam planejar ações que contribuam com a aprendizagem dos sujeitos
envolvidos naquele espaço educativo.
A professora P2-C traz, em sua narrativa sobre o processo de seleção de espaços não
escolares para a realização de estágio, a necessidade de um conhecimento prévio dos espaços
pelos professores responsáveis pela disciplina, para possíveis realizações das ações planejadas
pelos estudantes,
152

E para a seleção dos espaços, alguns espaços nós já temos uma parceria, mas
normalmente, a gente procura uma informação, como exemplo o espaço que
eu estou agora (Rede Cidadã), a gente toma ciência de alguns espaços, como
eu tomei ciência desse espaço aqui através de algumas pessoas que
trabalham com a educação, me inteirei para saber como que ele era, o que
acontecia aqui [...]. E então nós fomos conhecer o espaço, conversamos com
a coordenação, isso tudo antes de iniciar qualquer processo de atividade de
estágio. Depois com a coordenadora pedagógica, educadores sociais que são
voluntários e as crianças que frequentam o espaço. E, assim fizemos também
em relação ao hospital [...]. Então nós conversamos e levamos as
informações sobre os espaços para os alunos, apresentamos cada espaço, os
horários de funcionamento, e as atividades que realizam, pois temos de
manhã, a tarde e à noite. Então vamos organizando os grupos conforme a
disponibilidade de cada acadêmico, porque a gente considera que o pessoal
da área de pedagogia são trabalhadores, então às vezes eles não podem estar
em um horário, mais podem em outro. Então nós tentamos organizar dessa
forma. Essa é a forma que definimos: quais são os espaços aonde nós vamos
trabalhar e como nos organizamos em cada espaço (P2-C).

A professora P2-C descreve, didaticamente, como realizam as práticas de seleção dos


espaços não escolares, trazendo elementos importantes em sua narrativa, como o
compromisso de conhecer previamente o espaço, as atividades que realizam e horário de
funcionamento para que, a partir dessas informações, possa organizar a disposição e
acompanhamento dos grupos nos vários espaços.
Outro aspecto que nos chamou a atenção diz respeito às interações entre a
Universidade e a comunidade. É importante fazer as pontes ou conexões necessárias entre
esses dois polos da gestão acadêmica. Mas o que mais se evidenciou nessa narrativa foi a
preocupação política e acadêmica com a classe trabalhadora que cursa Pedagogia no período
noturno. Este é um dado que merece uma reflexão mais aprofundada.
P3-J destaca um aspecto importante em relação ao processo de seleção de espaços
não escolares para a realização de estágio que está vinculado às percepções da realidade social
trazidas pelos estudantes.

A escolha dos espaços não escolares, é feita a partir das informações trazidas
pelos alunos sobre a realidade que eles conhecem na comunidade ou
instituições, que podem contribuir com um trabalho educativo com aquela
comunidade. Aqui em Juara, são poucos os espaços organizados que
oferecem a possibilidade de estágio, por isso optamos, coletivamente, em
elaborar projetos de intervenção em determinadas instituições ou bairros
(P3-J).

Na narrativa apresentada por P3-J, evidencia-se a atenção às necessidades de


determinados espaços e interesses dos alunos em realizar uma atividade de intervenção
naquele ambiente. A iniciativa aponta uma leitura da realidade social e de planejamento para
153

intervenção nessa realidade. Esse modo de organização do trabalho educativo pressupõe


tomar essa realidade como base para a apropriação e construção de saberes.
Nessa mesma direção, P4 evidencia os aspectos que dialogam com as narrativas de
P3-J:

Olha, professora, os espaços são selecionados a partir do que os alunos


trazem para aula, sobre o que eles percebem como necessidade, por
exemplo, o trabalho na creche, foi uma aluna que falou sobre essa
necessidade para a turma. Que depois elaborou um projeto e fizeram o
parquinho (P4-J).

A seleção dos espaços, para P4-J, também parte das necessidades de determinados
ambientes que os alunos percebem, discutem e deliberam sobre a ação de intervenção nesse
espaço. E, a partir da definição do espaço para a realização do estágio, elaboram e executam o
projeto de extensão junto àquela comunidade.
Nessa perspectiva, questionamos: (Questão 5) como são selecionados e/ou indicados
os estagiários para os espaços?
Em relação ao critério de indicação de estagiários para os espaços não escolares,
segundo as narrativas dos quatro professores participantes, esta ação ocorre após as discussões
feitas em sala de aula, sobre o que o espaço realiza, como, onde e a quem se destina. À
medida que os estudantes se identificam e se sensibilizam com determinados espaços, optam
por aquele com o qual sentiram mais afinidade. Nesse sentido, os quatro professores
afirmaram que deixam os alunos livres para a escolha do espaço de sua preferência ou
afinidade.
Após essas escolhas e a partida dos estagiários para a atividade campo, perguntamos:
(Questão 6) como tem sido feito o acompanhamento dos estagiários?
Para a professora P1-C, o acompanhamento das ações dos estagiários passa pela
orientação contínua do grupo. Essa atitude demonstra uma percepção aguçada das atividades
dos estudantes, conforme explicitado a seguir:

E agora como foram as aulas de vocês com relação à primeira infância,


como foram as aulas de literatura infantil, de jogos e brincadeiras, cadê os
cadernos de cantigas que organizaram durante o curso de pedagogia, cadê os
fantoches, assim por diante, aí elas falam a verdade, professora, aí elas já
começam a se organizar e já reestrutura aquele projeto para entender as
necessidades diárias nesse local, como é diversificado o espaço hospitalar,
nos demais locais as meninas já têm noção que o número é mais ou menos
variado das crianças que comparecem, já têm comunicação de faixa etária
(P1-C).
154

A narrativa de P1-C possibilitou-nos perceber que a professora realiza, durante o


acompanhamento do estágio, algumas orientações tomando como parâmetro as percepções
avaliativas do processo. E, ao sinal de fragilidades do grupo, ela intervém de modo a
encontrar mecanismos para superar tal situação. A exemplo dessa afirmação, descreve:

[...] eles então levam um choque inicial que aí depois eles conseguem
reestruturar toda a metodologia, revivem os conteúdos das disciplinas
anteriores e caminham ali os quatro dias para frente, conseguem finalizar
esse estágio com uma atividades mais interessantes e apreciada pelas
crianças. Com relação dos espaços nós temos alguns desafios em Cáceres
(P1-C).

Diante da narrativa da professora P1-C, evidenciam-se os resultados positivos do


acompanhamento, orientação e avaliação das ações educativas dos estudantes. Nesse
processo, os estagiários conseguem revisar e reestruturar as atividades, tomando como
referência o que lhes foi orientado em relação ao campo metodológico, aos conhecimentos e
saberes da sua trajetória acadêmica, para produzir uma prática pedagógica mais coerente e
comprometida com as necessidades daquele espaço e atrativa ao grupo com os quais os
estagiários trabalham.
Segundo a narrativa da professora P2-C, para acompanhar os acadêmicos quando
eles são encaminhados para a instituição: “nós temos um compromisso de fazer o
acompanhamento, o primeiro se dá quando vão conhecer o espaço, nós vamos com eles e
apresentamos às pessoas que coordenam os espaços” (P2-C). Nesse processo, as professoras
apresentam os espaços para os estudantes junto com a coordenação da instituição e explicam
sobre o papel do estagiário daquele espaço, durante a etapa de observação e de regência.
A professora P2-C apresenta em sua narrativa como se realizou o processo de
acompanhamento e execução do estágio pelos grupos de estagiários:

No primeiro dia, ocorre a observação e também levam os termos de


compromissos, que vão estabelecer a parceria da universidade com a
instituição. A partir desse momento, acompanhamos a etapa de observação,
depois eles voltam para a universidade e são acompanhados na elaboração
do projeto que eles vão desenvolver no período de regência. O
acompanhamento da regência é parecido com o da observação pois a gente
vem acompanhando eles nos desenvolvimentos das atividades. Diante disso,
havendo necessidades, nós nos reunimos com os grupos antes deles voltarem
para a atividade de intervenção (P2-C).

A professora participante P2-C divide o tempo do acompanhamento dos estagiários


em diversos momentos. Nessa narrativa, a professora manifesta-se acerca do primeiro acesso
155

ao espaço e das soluções burocráticas ou administrativas para a realização do estágio. Além


disso, refere-se ao momento de acompanhamento da fase de observação, de elaboração do
projeto e da etapa de regência.
Desse processo, foi possível perceber que o acompanhamento das ações realizou-se
em todas as etapas da atividade campo desenvolvidas pelos estagiários. A participante
explicita que, após a fase de observação, os estudantes, apropriados da realidade social na
qual produzirão a intervenção pedagógica, utilizam-se das informações ali coletadas como
referencial para elaboração da proposta pedagógica e da execução das atividades.
Os professores P3-J e P4-J trabalham a disciplina de estágio em espaços não
escolares juntos e definiram uma metodologia de realização e acompanhamento do estágio
baseada em projetos de extensão a serem desenvolvidos em espaços previamente definidos
pelos grupos de alunos. Nesse sentido, coube aos professores acompanharem e orientarem a
elaboração dos projetos, em sala de aula; interagir com os grupos de estagiários, respondendo
aos questionamentos e orientando o trabalho, por meio do aplicativo WhatsApp, e
acompanharem a realização do evento promovido pelos estudantes.
Nesse processo de acompanhamento e orientação, indagamos aos participantes:
(questão 7) que aspectos são considerados na observação, elaboração e execução da proposta
pedagógica no espaço educativo não escolar?
A professora P1-C revela, em sua narrativa, os caminhos a serem trabalhados pelos
alunos nos ambientes em que ocorre o estágio:

Então a partir dessa rotina, eles vão para os espaços, tendo pelo menos assim
um traçado de quais ações que eles precisam desenvolver no período de
observação, por exemplo que eles precisam marcar uma reunião com a
equipe gestora do espaço, que eles precisam ler os documentos que
formaliza aquele espaço, aonde as atividades de estágio vão ser
desenvolvida. E aí eles organizam uma rotina inteirinha do que precisa ser
observado naquele espaço, que não é só parte de estrutura né? mas como as
interações acontecem lá dentro, então todos esses elementos para ser
desenvolvido no processo de execução da observação e de regência (P1-C).

A narrativa traz elementos interessantes quanto ao modo de organização do trabalho


pedagógico baseado em rotinas, que exige a compreensão dos saberes produzidos na
comunidade para, a partir deles, ressignificá-los por meio dos saberes curriculares,
disciplinares e pedagógicos e, então, produzir coletivamente, novos saberes:

Então eles percebem a necessidade de um planejamento bem mais


estruturado, balanceado, valorizando o próprio ambiente, e de repente, as
necessidades que ainda precisam ser fortalecida ali dentro. Então eles fazem
156

essa organização desse planejamento de intervenção no campo de estágio, a


partir do período de observação, e daí eles organizam um projeto de
intervenção, normalmente esse projeto acaba atrelado às disciplinas que são
desenvolvidas na 8° esfera, ou que venha ainda trazendo os conceitos
adquiridos nas disciplinas anteriores (P1-C).

A professora destaca, ainda, a importância do conhecimento e da valorização do


espaço, a fim de realizar uma atividade pedagógica capaz de intervir e produzir mudanças
naquela realidade, de acordo com as necessidades que emergem naquele ambiente. Nessa
perspectiva, elenca algumas atividades que são resultantes das ações pensadas para o estágio.
Segundo ela, “alguns projetos caminham para constituição da cidadania, em que eles
trabalham com a diversidade e cultura, outros caminham para atividades com conceito de
ludicidades, de jogos, brincadeiras e atividades culturais e artísticas” (P1-C), trazendo a
compreensão dos espaços não escolares como o lugar do protagonismo dos estudantes na
relação pedagógica comprometida com a comunidade na qual atuam.
Em sua narrativa, P2-C discorre sobre os aspectos que orientam os estudantes na
produção, elaboração e execução da proposta pedagógica no espaço educativo não escolar e
apresenta os seguintes argumentos:

[...] ninguém vai para visita na comunidade com algo definido, pois você não
conhece a realidade. Então você vai chega lá para conhecer a realidade,
conhecer a instituição, conhecer os sujeitos, os que participam, os
educadores sociais, os educandos, enfim conhecer todos os sujeitos presentes
lá. Depois, a partir disso, de uma conversa, aí sim define uma temática.
Então o planejamento primeiro vai ser pensado na temática. Mas o porquê
essa temática? Então vai ser necessário fazer uma justificativa, vai pensar o
objetivo, as ações para cada dia, pois o tempo é muito curto, então tem que
ser muito bem pensado, para cada dia o que vai ser realizado! Então, o
estágio precisa ser desenvolvido em 4 horas, então eu tenho diariamente esse
tempo para desenvolver, então dentro do meu planejamento seguindo uma
temática, vai ter uma sequência lógica do que vai ser desenvolvido até o
ultimo dia (P2-C).

P2-C coloca em primeiro plano a necessidade de conhecimento da realidade. Afinal,


nessa realidade estão contidos os sujeitos, as pessoas que participam daquele projeto ou
grupo, os educadores sociais, os educandos; enfim, é importante que se conheçam todos os
sujeitos presentes naquele ambiente. Esse ponto de partida traz implícita a necessidade de
tomar as expectativas, as problemáticas vivenciadas, necessidades formativas, enfim, as
intencionalidades daquele grupo para, a partir dela, projetar as ações de intervenção
pedagógicas, que devem ser frutos dessa leitura de mundo vivido.
157

Em relação aos aspectos que são orientados para observar, elaborar e executar a
proposta pedagógica no espaço educativo não escolar, P3-J traz a seguinte contribuição,

[...] Em primeiro plano, deve conhecer a realidade, porque a gente


conceitualiza todo o tema, as questões atuais e locais. É necessário isso,
porque senão você não tem a participação, ou eles não se interessam, então
quando a gente joga em conta as questões locais, como modo da comunidade
ou alguma coisa assim, aí eles se interessam [...] (P3-J).

A argumentação produzida por P3-J favorece-nos o entendimento de que as


orientações passam pelo conhecimento da realidade social em que será realizada a atividade
educativa e, a partir dela, define-se a temática e elabora-se o planejamento de intervenção
nessa realidade de acordo com as necessidades educativas que emergem daquele ambiente.
Nessa direção, P4-J aponta, no decurso de sua narrativa, alguns aspectos importantes
e necessários para observação, elaboração e execução da proposta pedagógica no espaço
educativo não escolar. Argumenta que, para realizar atividade de campo, deve-se tomar as
informações da leitura da realidade feita pelos alunos para discutir possíveis ações para o
espaço selecionado. Depois disso, os alunos partem para a elaboração do projeto de extensão
que os leva a pensar uma justificativa para a realização do trabalho; definem os objetivos que
serão perseguidos; e delineiam como vão realizar as atividades, em que momento será
executada, e para qual público se destina.
Nesse sentido, P4-J traz elementos que não estão visíveis em sua narrativa, mas
encontram-se presentes no contexto das atividades desenvolvidas, as quais foram captadas no
processo de observação participante. Citamos como exemplo o evento sobre o protagonismo
da mulher e os desafios da sociedade contemporânea, que abordou a violência contra a mulher
na perspectiva dos direitos, da proteção e da emancipação política, social e de gênero da
mulher.
As discussões trazidas pelos conferencistas às comunidades de Porto dos Gaúchos,
Novo Horizonte do Norte, Tabaporã e comunidades vizinhas destacaram uma atenção
especial aos acontecimentos que envolveram atos de violência, inclusive, alguns foram
narrados naquela ocasião. Entendemos que tais manifestações ocorreram em razão do
empoderamento das pessoas ali presentes que lutam, silenciosamente, por sua libertação. Isso
significa que as atividades extensionistas, assim como as de ensino por meio da docência, têm
um caráter formativo também muito importante.
Por fim, na questão 8 perguntamos aos participantes quais as principais fontes
utilizadas para o processo de formação e instrumentalização teórico-prática?
158

Em relação a essa questão, as narrativas apresentadas pelos quatro professores


participantes não trouxeram referências específicas de autores utilizados. No decorrer da
entrevista apontaram conceitos importantes relacionados aos espaços não escolares, como
educadores sociais, realidade social, práticas educativas, projetos de intervenção. Portanto,
está nas entrelinhas das narrativas a existência dos aspectos teóricos, mas estes não foram
explicitados, conforme o enunciado acima.
Assim, trazemos como exemplo, aspectos abordados pela professora P2-C, que
aborda também como se constituiu a etapa de instrumentalização teórico-prática:

Como nossa carga horária de instrumentalização teórico-prática é de 30


horas, dividimos esse tempo entre a fundamentação teórica, a preparação dos
documentos, e momentos de relato de experiência do acadêmico egresso.
Então não dá para termos muitos materiais teóricos para leitura, mas a gente
faz uma organização dos aspectos que são fundamentais para que eles
tenham um embasamento teórico bem interessante (P2-C).

E, seguindo essa linha, a professora P2-C revela que a fundamentação teórica


permeia todas as ações realizadas durante o estágio: “Aí a gente vai cobrando a
fundamentação teórica no momento que estamos ali discursando sobre essas fontes teóricas.
Cobramos também na fase de observação, dos projetos, retomamos na fase de regência e do
relatório final”. Podemos observar, portanto, que a instrumentalização teórico-prática
acontece durante todo o processo de estágio.

4.5 O ESTÁGIO EM ESPAÇOS NÃO ESCOLARES: O OLHAR DOS


ESTUDANTES/ESTAGIÁRIOS DE PEDAGOGIA DOS CAMPI DE CÁCERES E JUARA

Essa seção compõe-se das narrativas feitas pelos estudantes sobre as suas
percepções, potencialidades e fragilidades frente ao estágio, em espaços não escolares. Nessa
direção, trazemos primeiro as informações dos grupos de alunos do curso de Pedagogia do
Campus de Cáceres e, em seguida, as informações referentes às entrevistas realizadas com os
alunos do Campus de Juara. A apresentação das narrativas dos estudantes está sistematizada
por grupos: G1-C, G2-C e G3-C, G1-J etc. O acompanhamento da letra C corresponde ao
Campus de Cáceres e a letra J, ao Campus de Juara, tanto em relação à identificação dos
grupos, quanto dos estudantes pelas letras, tais como: E1-C, E2-C e E3-C, E1-J etc.
A partir da questão um, o estudante narra sobre a constituição identitária no campo
pessoal e profissional. As narrativas apresentadas trouxeram apenas três informações acerca
159

dos participantes, um deles identificou-se da seguinte maneira: “Sou cacerense e atuo como
professor da Educação Básica na rede estadual de ensino”. E apenas dois narraram que são
servidores públicos que atuam no Conselho tutelar. Quanto aos demais, não se manifestaram a
esse respeito.
A opção por conhecer a constituição identitária dos entrevistados foi concebida
objetivando vislumbrar em que espaços atuam nossos estudantes e perceber suas perspectivas
em relação as suas futuras atuações. Essa interlocução vislumbrou, também, reconhecer se os
participantes demonstram engajamento em movimentos sociais, ou se exercem atividades
como educadores sociais em determinados espaços não escolares.
Essa interação nos possibilitaria perceber como se constituem as vivências, as
experiências, os saberes nos ambientes de educação não formal e as formas como estabelecem
as relações com as aprendizagens da vida acadêmica. Mas, as informações coletadas apontam
a realização do estágio nos ambientes não escolares como a primeira experiência nesse
campo.
A questão dois apresenta as narrativas dos estudantes sobre as percepções do
processo educativo em espaços não escolares, conforme excertos apresentados a seguir:
O grupo G1-C trouxe-nos os seguintes argumentos narrados pelo estudante E1-C:

O Estágio realizado no espaço não escolar foi mais um desafio em meu


processo de formação. No início foi um pouco difícil me adaptar ao espaço,
principalmente por estar familiarizado com os espaços escolares. Percebi,
sim, uma diferença dos espaços não escolares ao escolares principalmente no
que tange às práticas educativas, a relação com os sujeitos que fazem parte
desses espaços, o tempo, a autonomia dos sujeitos, a cultura e as expressões
individuais de cada um, se fortalecem nesses espaços (G1-C, E1-C).

O Participante E1-C, do grupo G1-C, apontou o estágio em espaços não escolares


como um desafio constitutivo de seu processo formativo. Ressaltou a diferença existente entre
os espaços de Educação formal e da educação não formal, sobretudo no que diz respeito às
práticas realizadas, às interações com os sujeitos no ambiente e à compreensão do tempo no
processo de ensino aprendizagem. Trouxe-nos argumentos sobre a percepção da autonomia
dos estudantes que se manifesta no espaço, as culturas e as expressões individuais.
Segundo Gohn (2010), as práticas educativas nos espaços de educação não formal
demandam metodologias que são desenvolvidas com alto grau de provisoriedade em razão do
dinamismo existente, em decorrência do movimento da realidade, e que provocam a
160

mudanças de acordo com o desenrolar dos acontecimentos, constituindo as marcas da


educação não formal.
O grupo G2-C trouxe-nos os seguintes argumentos narrados pelos estudantes:

Sim, porque no espaço escolar você tem uma proximidade com a criança, e
sempre com as mesmas crianças, na mesma série, e no espaço não escolar já
temos o contato até com os pais. Vemos crianças de várias idades e
trabalhamos com uma criança de uma certa idade, no outro dia já tem
crianças diferentes e com outras idades, então há sim uma grande diferença.
Essa é uma das maiores diferenças entre a unidade escolar e o espaço
hospitalar (G2-C, E1-C).

Em relação à participante E1-C, do grupo 2-C, esta dá início a sua narrativa


afirmando a existência de diferenças entre os dois espaços e destaca que no ambiente escolar
há uma relação de proximidade com a criança, pelas rotinas construídas no cotidiano escolar,
ao longo de todo o ano letivo. Enquanto que nos espaços não escolares, há contato com os
pais, com as crianças de diferentes faixas etárias, e que essa situação é muito desafiadora.
Pimenta (2012) sustenta que a “leitura da realidade exige instrumental adequado que
envolve o saber observar, descrever, registrar, interpretar e problematizar a realidade. Em
decorrência desse processo, surgem as alternativas de intervenção” (PIMENTA, 2012, p.87).
Desse modo, compreender a dinâmica do trabalho pedagógico em espaço hospitalar constitui-
se o ponto de partida para pensar ações educativas que sejam interessantes, estimuladoras de
saberes e possibilitem uma intervenção comprometida com a aprendizagem de todos aqueles
participantes, independentemente de sua idade e tempo disponível.
O grupo G3-C apresentou as narrativas dos estudantes sobre as percepções do
processo educativo em espaços não escolares com argumentos em diferentes perspectivas:
Sim. Eu percebi muita diferença, em primeiro lugar, na escola tem muro, que
depois das 13h ou 13:15, as crianças não podem sair. A estrutura também é
diferente, porque lá (espaços não escolares) as janelas não possuem grades,
como as da escola. É um espaço amplo [...]onde as crianças podiam
desenvolver as atividades, brincadeiras, dinâmicas diferenciadas, e também
não tem um limite de idade para as crianças, como tem em sala de aula. Lá,
as crianças e adolescentes interagiam e se misturam. Eles também não
precisam de uma nota, como na escola para ser aprovado no final do
bimestre ou ano (G3-C, E1-C).

Em relação ao participante E1, pertencente ao grupo 3-C, aquele destacou aspectos


interessantes que lhe chamaram a atenção, tais como a inexistência de muro, ausência de
grades nas janelas, o que, em nossa compreensão, permite maior liberdade e compromisso da
161

criança. Além disso, nos chamou a atenção a sua menção em relação à prática pedagógica que
está baseada em atividades lúdicas, jogos, brincadeiras e dinâmicas de grupos.
Nesse sentido, a prática pedagógica possui uma intencionalidade, mas não se
restringe a uma obrigatoriedade de avaliação classificatória. A participação e o envolvimento
das crianças e jovens com as atividades propostas servem como parâmetro para avaliar a ação
e tomar decisões sem, contudo, punir, excluir ou classificar o desempenho dos participantes.
Além disso, a práticas educativas nos espaços de educação não formal, segundo
Gohn (2010), são construídas no processo, tanto em relação ao conteúdo quanto ao método,
considerando que esses nascem da realidade social, por isso são sistematizados tomando os
modos de agir na produção da existência humana por determinados grupos e comunidades
como o objeto de ensino e de aprendizagem.

Percebo sim. É gritante essa diferença. A metodologia que está lá dentro do


muro da escola, é diferente do espaço não escolar. Na escola tem uma carga
horária que as crianças precisam cumprir, tem toda uma rotina, atividades e
tem todo um contexto. No espaço não escolar, as crianças precisam chegar
na hora marcada e conforme vão chegando, já vão se situando nas atividades
que estão sendo executadas, e vão se envolvendo, e não precisam estar ali até
o final do horário. Se quiserem sair, beber água, eles têm a liberdade. As
atividades são diferenciadas. A gente presa bastante as atividades de artes,
pois queremos ensinar algo que vai ter utilidade na vida daquelas crianças,
não somente igual na escola um monte de conhecimento, e tentar fazer com
que a criança aprenda aquilo porque vai servir para fazer um Enem, um
vestibular, não, o propósito dali é para que a criança consiga tirar algo para
vida, não que na escola não acontece isso, mas é que o tipo de conhecimento
é diferenciado (G2-C, E2-C).

A participante E2-C, do grupo G2-C, afirma que há uma diferença gritante entre a
educação escolar e não escolar. Destaca que, na escola, há um corpo de saberes que são
necessários para a vida social, no âmbito geral, enquanto que para os ambientes não formais
esses saberes partem da dinâmica e interesses do grupo local, isto é, da vivência daquela
coletividade e, posteriormente, são apropriados, ressignificados e (re)construídos pelos
estagiários na ação educativa com a comunidade, visando contribuir para aprimorar aspectos
da vida local, mas, também, a vida social mais ampla.
Segundo Gohn (2010) as práticas de educação não formal estão no “centro das
atividades das ONGs nos programas de inclusão social, especialmente no campo das artes,
educação e cultura”. (GOHN, 2010, p. 36). As práticas desenvolvidas nos espaços de
educação formal vislumbram a formação do sujeito para a vida cidadã, nesse sentido, são
empregadas metodologias específicas como o diálogo para propiciar trocas e construção de
saberes que produzam a interpretação crítica da realidade da qual faz parte.
162

Sim. No espaço não escolar, a educação ministrada é diferenciada porque


são feitos projetos adequados às crianças de idades diferentes que participam
lá. Então tem que ser projetos que vem de acordo com o que eles estão
fazendo nas escolas. Eu me identifiquei também naquele espaço por que
tivemos mais liberdade para conhecer cada criança. Fomos até eles, fizemos
perguntas e eles também tinham liberdade de vir nos questionar. A partir do
momento que nós vamos para um espaço, seja ele escolar ou não, nós não
vamos só para ensinar, mas também para aprender, porque eles nos ensinam
e muito. Eu gostei muito. Se eu puder participar como voluntária de outros
projetos como aquele, eu participarei (G2-C, E3-C).

A participante E3-C, do grupo G3-C, afirma que percebeu diferenças entre a


educação escolar e não escolar. Para ela, há mais possibilidades de interações entre os
educadores sociais e as crianças. Além disso, a ação educativa realiza-se com maior liberdade
e autonomia. Percebemos que a sua narrativa está marcada pela visão da escolarização e que a
ação fora dos muros escolares reduz-se ao trabalho de extensão, não demonstrando
compreender que a prática pedagógica desenvolvida nos espaços não escolares é, igualmente,
produtora de saberes.
Ao contrário, do que afirma a participante E3-C, Gohn (2010) argumenta que as
práticas educativas em espaços de educação não formal devem partir da “problematização da
vida cotidiana” (p.46) e, desse modo, os conteúdos ou temas emergem das necessidades ou
carências, desafios, expectativas ou obstáculos que necessitam ser superados por aquele grupo
ou comunidade. Daí depreendemos que independem do “que eles estão fazendo nas escolas”
(G3-C, E3-C)
Tem essa diferença que lá no espaço não escolar, não é voltado para o que
aprende lá na escola, e sim para o cotidiano de cada criança, cada
adolescente. Então, eu tenho essa visão que é para eles aprender de forma
lúdica e não ficar focado dentro da escola com as atividades diárias, as
atividades pedagógicas, de ler e escrever, lá é uma atividade educativa que
realizam brincando, interagindo e socializando (G2-C, E4-C).

A participante E4-C, do grupo G3-C, contrapõe o argumento da estagiária E3-C, em


relação ao desenvolvimento de projetos nos espaços não escolares, que são baseados em
interesses e necessidades das crianças, portanto partem de suas vivências, e não
necessariamente vinculados à escola.
E4-C apresenta em sua narrativa a diferença entre os dois espaços e menciona que o
que os diferencia está na concepção de educação e na metodologia de trabalho educativo. Em
nosso entendimento, a E4-C demonstrou a percepção do que se constitui o eixo da educação
163

não formal, que ancora sua prática educativa a partir da apreensão da realidade social, local,
para retornar aos saberes produzidos socialmente.

É totalmente diferente do espaço escolar. No último estágio que a gente vem


conhecer o espaço não escolar, cai como um choque na gente. Cai como se
fosse de paraquedas, porque a gente não tem um relacionamento teórico
como das outras vezes, então nós não tivemos aquela preparação de texto de
leitura, então quando fomos para a sala de aula estava mais preparado para
escola, então acho que essa foi a nossa dificuldade (G2-C, E5-C).

A participante E5-C, do grupo G3-C, também afirma que percebe diferença entre os
espaços, mas por não ter feito uma leitura suficiente, não conseguiu identificar a diferença
nem caracterizar os espaços, bem como a dinâmica de funcionamento. Isto a levou à
perplexidade ou ao choque de realidade. Quando ela foi à prática docente se revestiu de
saberes escolarizáveis, não conseguindo fazer uma prática em espaços não escolares como
gostaria.
Tal narrativa vai de encontro com as afirmações da professora P1-C de que, mesmo
com todo esforço empreendido no processo de instrumentalização teórico-prático, existem
“alguns alunos que vão para o espaço sem compreender os conceitos básicos” e essa
manifestação de ausência de compreensão dos aspectos conceituais ou teórico-metodológicos
que orientam o trabalho educativo nos espaços não escolares, presente na narrativa da aluna,
se encontra na contramão das narrativas de todos demais estagiários.
A esse respeito, Gohn (2010) traz algumas contribuições acerca do método e de
conteúdos que devem orientar o trabalho educativo nos espaços de educação não formal, que
devem partir da “sistematização dos modos de agir e de pensar o mundo que circunda as
pessoas” (p.47). Nesse contexto, o processo de ensino e aprendizagem deve levar em
consideração as vivências e experiências, desafios e necessidades daquela comunidade, como
elementos para problematização da vida cotidiana de modo que as interações e os diálogos
produzidos estejam carregados de significados tanto para os sujeitos daquele grupo, quanto
para os estudantes estagiários e produzam as transformações necessárias naquela realidade
social.
A leitura inicial das narrativas dos participantes nos revelaram que todos eles
perceberam diferenças do processo educativo que se realiza nos espaços de educação formal e
de educação não formal. Os argumentos, ora explicitados, demonstraram, com exceção de
uma participante, que a diferença consiste na concepção de educação, na metodologia de
trabalho educativo e nas interações que se realizam nos espaços não escolares.
164

A questão três enfoca as narrativas dos participantes de como se dá a relação


professor/aluno/prática pedagógica. Assim, na sequência, apresentamos as narrativas dos
estudantes descritas em cada grupo.
O grupo G1-C, a respeito de sua compreensão acerca da relação
professor/aluno/prática pedagógica, apresenta argumentos que evidenciam a seguinte
compreensão:
A relação professor-aluno nestes espaços juntamente com a prática
pedagógica caminham no sentido de compreensão e valorização dos sujeitos
que fazem parte desses espaços. A prática pedagógica desenvolvida nesses
espaços leva em consideração as diferenças existentes, a autonomia dos
sujeitos, a cultura e o contexto sociocultural no qual estão inseridos e, além
disso, uma relação de harmonia e afeto com todos (G1-C, E1-C).

O participante E1-C, do grupo G1-C, apresenta argumentos sobre a relação


professor/alunos no desenvolvimento da prática pedagógica, ancora-se na liberdade e na
valorização dos sujeitos, evidenciando o protagonismo desses participantes no processo de
compreensão da realidade social em que estão inseridos, buscando, a partir da
problematização desse ambiente, desencadear um trabalho educativo que tenha as vivências
sociais e culturais como propulsoras de apropriação e construção de novos saberes.
Para elucidar essa compreensão, trazemos os argumentos discutidos por Gohn (2010)
sobre a “autonomia que é um valor, para que se construa uma sociedade onde haja mudanças
e emancipação sociopolítica e cultural dos indivíduos e não a formação de redes de clientes
usuários, não emancipatórias” (GOHN, 2010, p.41).
O grupo G2-C, a respeito da referida questão, apresenta os argumentos que
evidenciam sua compreensão:

Na concepção de educação em espaços não escolares, em que a gente


trabalha com crianças em diferentes situações, achamos mais fácil trabalhar
com artes, porque ali naquele ambiente as crianças internadas, estão em
situação de fragilidade, por dificuldades físicas e psicológicas. Então
começamos trabalhar com artes, para que eles pudessem se expressar e desse
modo, trabalhamos com pinturas, músicas e contação de histórias, usando
dedoches (G2-C, E1-C).

A participante E1-C, do grupo G2-C, demonstra em sua narrativa que a opção pelo
campo de artes possibilita maior aproximação e interlocução entre os educadores sociais, as
crianças e, muitas vezes, seus acompanhantes. Demonstrou ainda que, devido às fragilidades
físicas e psicológicas em que as crianças se encontram, a arte possibilita um pouco de alívio
ao sofrimento e enfado, pela participação nas atividades pedagógicas desenvolvidas.
165

Nesse sentido, trazemos as contribuições de Miranda (2009) que afirma: “para cada
dia foram realizadas atividades diferentes, pois a rotatividade nas enfermarias exigia que
tivéssemos uma diversidade de trabalhos que iniciassem e terminassem no mesmo dia, porque
algumas crianças podiam não mais fazer parte do grupo” (MIRANDA, 2009, p.6458).
A respeito da relação professor/aluno/prática pedagógica, o G3-C apresentou as
seguintes contribuições narradas pelos estagiários:

Se dá de maneira bem espontânea. O educador social em primeiro lugar


estuda o espaço, o tipo de vida das crianças e o que ele pode contribuir para
melhorar a forma de vida dela. Então, tem que conhecer de perto a realidade
desse adolescente ou dessa criança, para poder fazer um projeto que caiba
melhorias na vida dela, então é assim, eles não chegam na escola com um
conteúdo pronto, e que as crianças precisam estudar para ter uma nota. Lá,
não. Lá (nos espaços não escolares) é mais para contribuir, para somar na
vida de uma criança, então as atividades estão voltadas para isso (G3-C, E1-
C).

A participante E1-C, do grupo G3-C destacou um elemento interessante a respeito da


necessidade de conhecer previamente o espaço e a vida das crianças que ali frequentam, para
que se possa construir projetos que produzam mudanças ou contribuam com a qualidade de
vida dessas crianças. Assim, a prática pedagógica desenvolvida nos espaços não escolares é
construída a partir da realidade daquele grupo.
Nesse sentido, destacamos algumas contribuições de Tardif (2002) sobre a atividade
docente que se realiza numa realidade social permeada pelas interações entre as pessoas em
um contexto “onde estão presentes símbolos, valores, sentimentos, atitudes que são passíveis
de interpretação e decisão” (p.50). Assim, cabe ao educador, nesse processo de interações,
criar mecanismos que possam desencadear saberes, ressignificá-los a partir dos significados
que lhes são atribuídos pelos sujeitos e, coletivamente produzir a transformação dessa
realidade.
Tomando o estágio como o momento da práxis em que a teoria e a prática se
articulam, esse campo exige do estagiário, de acordo com Pimenta (2012) “uma atitude
investigativa, que envolve reflexão e a intervenção na vida da escola” (p.34), ou no ambiente
educativo em que se realizam as práticas educativas, por meio de uma rede de interações com
os educadores, as crianças, adolescentes, jovens e adultos, ou seja, a comunidade em geral, na
qual se realiza a intervenção pedagógica.

Primeiro, não é professor que fala, é educador social. A relação é bastante


afetiva, os educadores conhecem o nome de cada aluno, sabe de quem ele é
166

filho, aonde que ele mora, sabe muito da vida da criança. Já na escola, isso
não acontece. O professor às vezes, mal sabe o nome da criança, mas ali, o
educador sabe de onde ele vem, que tipo de bairro que ele mora, e monta o
seu projeto educativo, em cima da realidade da criança. A relação é boa e
tem uma certa afetividade. As práticas pedagógicas são de acordo com a
vivência das criança e procura trabalhar com coisas que chamem a atenção e
trazem incentivo para que as crianças permaneçam ali. Nenhum deles é
obrigado a estar lá naquele horário, eles vão porque querem (G3-C, E2-C).

A participante E2-C, grupo G3-C, começa diferenciando professor de educador


social, enfatizando que este último conhece as crianças, suas famílias, suas realidades
familiares e sociais e, de posse desse conhecimento, elabora o projeto de intervenção, baseado
nas vivências das crianças, mediado por interações afetivas, incentivo e acolhimento de todos
eles, igualmente.
Nessa compreensão, trazemos a contribuição de Gohn (2010) a respeito de como se
educa em determinadas situações e contextos, a educação não formal ocorre em “ambientes e
situações interativas construídos coletivamente, segundo diretrizes de dados grupos,
usualmente a participação dos indivíduos é optativa, mas ela também poderá ocorrer por
forças de circunstâncias da vivência histórica de cada um[...] (GOHN, 2010, p.18).
Assim sendo, as práticas pedagógicas de intervenção nos espaços de educação não
formal, que levam em consideração as experiências do mundo vivido ao produzir a
socialização e interpretação das práticas sociais daquele grupo ou comunidade, geram o
sentimento de pertencimento e reconhecimento nas ações educativas realizadas, que se
manifestam na participação, na aprendizagem, na transmissão, produção e/ou troca de saberes
de todos os envolvidos.

Olha, até mesmo o nosso trabalho que foi proposto às crianças foi de muita
importância para nós e para eles. Tivemos um respaldo das crianças, um
acolhimento também pela educadora, pela estagiária e pela voluntária que
trabalha lá. Tivemos respaldos sobre o nosso projeto, as crianças vieram,
participaram e realizaram as atividades. Eu gostei (G3-C, E3-C).

A participante E3-C, do grupo G3-C, destacou a reciprocidade e as interações


existentes durante o trabalho educativo desenvolvido pelo grupo de estagiários com as
crianças e o acolhimento recebido pelas educadoras sociais. O contexto das atividades
realizadas gerou, a nosso ver, uma ideia de pertencimento àquele grupo e de reconhecimento
do seu papel enquanto educadora.
A esse respeito, Gohn (2010) afirma que nos espaços de educação não formal, os
“objetivos não são dados a priori, ele se constroem no processo interativo, gerando um
167

processo educativo” (p.19). Daí porque a necessidade e importância da mediação das


interações produzidas entre os sujeitos, para pensar o projeto educativo tomando os interesses
e necessidades daquele grupo como elemento desencadeador de novos saberes.

[...] o professor sempre deve estar acompanhando o aluno, independente se é


dentro ou fora da escola, e a prática eu acho que tem que ser trabalhada mais
o contexto deles, com conteúdos e projetos sobre drogas, projetos sobre a
violência, para tirar as crianças do meio dessa criminalidade, pois são bairros
periféricos né? são bairros assim ‘perigosos’ então o pedagogo tem que fazer
um trabalho para poder abrir a mente das crianças para que elas tenham uma
outra visão e interagir mais. Eu creio que é assim a prática do professor. Ele
está ali para contribuir com a formação das crianças G3-C, E4-C).

A estudante E4-C, do grupo G3-C, evidenciou que a prática educativa deve


problematizar a realidade social das crianças como mecanismo para possibilitar a
compreensão desse contexto e, desse modo, promover a sensibilização das crianças e jovens
sobre os riscos e apontar caminhos de superação da vulnerabilidade em que se encontram.
Para essa participante, esse deve ser o papel do professor: estar atento às circunstâncias
sociais que envolvem as crianças e jovens e, a partir delas, produzir saberes capazes de
vislumbrar mudanças.
Nesse sentido, encontramos em Pimenta (2012) argumentos que explicitam a
“atividade docente como prática social (práxis)” (p.120) que demanda preparo para o
exercício da profissão que não se esgota nos cursos de formação, embora estes contribuam
para o conhecimento do processo de ensino e de aprendizagem, enquanto possibilidade de
antever a realidade em que vai atuar, a atividade docente exige uma formação teórico-prática
que possibilite ao estagiário a capacidade de conhecer e interpretar a realidade com o fim de
intervir e produzir ou ressignificar os saberes.

Então a prática é totalmente diferente do que a gente aprende aqui na


faculdade, por que o que a gente aprende aqui, são teorias de autores
passados que não é da nossa realidade hoje, pois tudo que a gente aprende
aqui, grande parte a gente não pratica lá. Mas em questão de teóricas de
outras disciplinas, foi de extrema importância, pois a gente conseguiu
enxergar as dificuldades nas crianças, por que eles estavam ali não para ser
mais um, e sim porque eles queriam a diferença, eles queriam viver uma vida
diferente, longe do risco de criminalidade, eles estavam ali para aprender
alguma coisa que chamasse a atenção deles (G3-C, E5-C).

Em relação à estudante E5-C, pertencente ao grupo 3-C, sua narrativa não nos
permite perceber em seu discurso a compreensão do que se constitui a educação não formal,
os aspectos teórico-metodológicos que sustentam as práticas educativas nesses espaços. O que
168

nos chamou a atenção e destoa do que foi apresentado acima, está no fato de que ela
reconhece as contribuições de outras disciplinas para a realização do trabalho pedagógico com
as crianças sem, no entanto, mencionar eventual contribuição da disciplina de estágio com
foco nos espaços não escolares para a instrumentalização teórico-prática das ações a serem
desenvolvidas.
A esse respeito, ancorada na observação participante realizada durante as aulas que
conduzem o processo de instrumentalização teórico-prática na disciplina de Estágio
Curricular Supervisionado com foco nos espaços não escolares, aliada à narrativa da
Professora P1-C, em que afirma: “define o que é o espaço não escolar, quais são os conceitos,
onde que eles surgem, e qual é a finalidade de se trabalhar um estágio em um espaço não
escolar para vida do acadêmico”.
Além disso, assegura a professora P1- C, “a gente faz toda essa construção da
identidade do espaço não escolar por meio das leituras dos teóricos em sala de aula, através de
leitura coletiva, individual, debate, discussão com relação às temáticas tratadas” (P1-C).
Diante disso, ousamos afirmar que a narrativa da estagiária E5-C apresenta evidências de
ausência de leitura, participação e compromisso com os aspectos teórico-metodológicos
trabalhados pelas professoras da disciplina.
Após a compreensão dos aspectos constitutivos da relação professor/aluno/prática
pedagógica, aprofundamos o estudo buscando as evidências apresentadas na questão quatro
que aborda as narrativas dos estudantes sobre as dinâmicas realizadas nos espaços educativos
não formais.
A respeito da questão sobre as dinâmicas realizadas nos espaços educativos não
formais, o grupo G1-C, produziu os seguintes argumentos:

Os espaços escolares não formais são espaços diferenciados do formal, pois


descontrói alguns princípios do espaço formal indo além dos muros da
escola. Este ambiente incentiva o indivíduo a aprender por meio da
socialização, com suas experiências de mundo, em espaços de ambiente
espontâneos, onde a ação social vem a transformar o diálogo da atualidade,
com a construção da sua identidade e cidadania (G1-C, E1-C).

Na narrativa de E1-C, do grupo G1-C, destaca-se a diferença percebida entre os


espaços formais e não formais de educação. Para ele, os últimos realizam-se extra muros
escolares e possuem uma prática pedagógica também diferente. Incentivam a aprendizagem
dos sujeitos pela relação que estabelecem entre o mundo social em suas condições de
169

existência. Essa dinâmica propicia a apropriação e construção de saberes que contribuem com
a construção de identidade e cidadania dos estagiários.
Nesse sentido, é importante trazer as contribuições de Gohn (2010) quando destaca
que é preciso ter a capacidade de fazer uma leitura crítica do mundo que nos rodeia, no plano
local, para entender as contradições globais [...]” (GOHN,2010, p.41). Diante disso, a
narrativa apresenta importante elemento da educação não formal que é desenvolvida em
espaços não escolares no que diz respeito a liberdade, à democracia, à igualdade, que
constituem os objetivos dessa modalidade de educação.
O grupo G2-C, a respeito de tal questão, apresentou os seguintes argumentos:

Com certeza, porque ali quando você vai fazer o estágio em um ambiente
formal, você tem ali todo acompanhamento, uma professora atuando, vai
adquirindo conhecimento, vendo se você tem capacidade de trabalhar, e no
hospital no ambiente não formal, a gente ficou meio preocupada, porque ali
a gente não tinha um educador. No início, tivemos muita dificuldade para
perceber que dinâmica se realiza naquele espaço, para atuar com eles ali
dentro. Mas, aos poucos, conseguimos fazer várias atividades com os bebês
e com as crianças, como contação de histórias, dedoches, gibis, pinturas. Foi
muito interessante. Conseguimos atuar como um bom profissional (G2-C,
E1-C).

O participante E1-C, componente do grupo G2-C, afirma que há diferenças nos


espaços formais. E a não existência de um educador social no ambiente provocou insegurança
e medo de atuar em uma realidade desconhecida. Mas o participante contou que, aos poucos,
foi adquirindo autoconfiança e as atividades ocorreram conforme planejado para o ambiente
hospitalar.
Faz-se necessário destacar que trabalho em espaço hospitalar, assim como nos
demais espaços de educação não formal, não objetiva, segundo Miranda (2009), realizar “o
processo de escolarização, mas de diversificar, principalmente, através da literatura infanto-
juvenil e de jogos ludo-pedagógicos, a rotina hospitalar, proporcionando assim, o alívio de
tensões, da ansiedade, do medo da morte, entre outros” (MIRANDA, 2009, p. 6458).
Sendo assim, o planejamento para atuar no ambiente clínico precisou ser flexível,
porém, a criança/adolescente precisava ser respeitada em suas peculiaridades. Portanto, o
trabalho desenvolvido pelos profissionais das diversas áreas (saúde, educação, assistência
social) necessitava ser integrado, dinâmico, capaz de perceber as diferenças da rotina da
internação pediátrica. (MIRANDA, 2009, p. 6458-6459)
Outra questão também fundamental para o trabalho no hospital diz respeito às
questões éticas, isto é, toda a comunicação entre pacientes e profissionais das diversas áreas
170

deve ser resguardada, respeitando assim o direito de privacidade das informações de cada
paciente, bem como a confiança que o paciente deposita nas pessoas com que se relaciona.
(MIRANDA, 2009, p. 6459)
Em relação às dinâmicas realizadas nos espaços educativos não formais, o grupo G3-
C apresentou os seguintes posicionamentos:

Toda teoria e prática que nós já estudamos no Curso de Pedagogia serviu


para construir esse sujeito, esse profissional, docente, que nós estamos
engajados em ser, então todas as disciplinas que nós estudamos aqui é de
suma importância para nossa formação. Quando nós entramos no Curso de
Pedagogia a gente não sabe exatamente o que vamos fazer, a gente estuda a
criança, em vários ângulos diferentes, então todas essas matérias só vem para
somar e contribuir, então a gente vai se formando desde o 1°semestre até
chegar no 8° semestre, e ser o profissional que somos agora. Toda essa teoria
que estudamos, foi para pôr em prática nos nossos estágios. E, no estágio
não escolar, não foi diferente, porque mesmo sendo diferente da escola, tudo
o que nós aprendemos, nós podemos colocar em prática (G3-C, E1-C).

A participante E1-C, pertencente ao grupo G3-C, trouxe-nos uma narrativa que


expressa uma formação comprometida social e politicamente com a formação profissional,
quando ela narra: “Toda teoria e prática que nós já estudamos no Curso de Pedagogia, serviu
para construir esse sujeito, esse profissional docente, que nós estamos engajados em ser”. A
participante reveste-se da concepção de constituir-se educadora durante o processo de
formação, demonstrando que o curso, com seus aspectos teóricos e metodológicos, possibilita
o tornar-se professor. Em sua narrativa, o estágio é o momento da prática.
Nessa direção, Pimenta e Lima (2012) afirma que o “papel da teoria é oferecer aos
professores perspectivas de análise para compreender os contextos históricos, sociais,
culturais, organizacionais e de si mesmos como profissionais [...]” (PIMENTA, LIMA, 2012,
p.49). Essa afirmação corrobora a narrativa da estagiária, quando justifica de forma
exemplificada o estudo da criança, sob vários ângulos, o que lhe possibilita pensar a atividade
docente de intervenção na realidade ancorada na compreensão das múltiplas facetas sociais ali
existentes e, a partir dela, promover transformação dessa realidade.

Eu percebo que há uma certa dinâmica de trabalho coletivo entre a


pedagoga, a estagiária e a voluntária. Há uma dinâmica que eles seguem, um
projeto, né? E, na teoria e prática, eu acredito que tudo que acontece lá, é o
que acontece aqui, que na teoria aprendemos que o espaço não escolar, não é
uma educação padronizada, mas sim o que eu estou ensinando aqui, se vai
fazer diferença para eles. Eu acredito que a universidade contribui muito,
para mostrar que devemos olhar para o que está acontecendo na sociedade e
171

levar um projeto que vai fazer diferença na vida das crianças que estão lá
(G3-C, E2-C).

A participante E2-C, do grupo G3-C, destacou que percebeu uma dinâmica de


trabalho coletivo entre as pessoas envolvidas com o processo educativo realizado no espaço,
do ponto de vista de desenvolvimento de um projeto para aquele grupo, e de que os saberes ali
apropriados ou produzidos podem contribuir com a vida das crianças envolvidas. Outro
aspecto que a estagiária trouxe à tona diz respeito ao papel da Universidade no processo
formativo que propicia a compreensão da realidade social e, a partir dessa compreensão,
propor ações que produzam diferenças na vida das crianças.
Segundo Gohn (2010) “na educação não formal, as metodologias operadas no
processo de aprendizagem partem da cultura dos indivíduos e dos grupos” (p.46). E, nessa
perspectiva, é importante e necessário que na trajetória acadêmica, os estagiários adquiram
uma formação técnica, política e humana que lhes forneça os instrumentos básicos que dão
suporte ao trabalho educativo tomando como base a realidade social.

Naquele espaço não escolar foi impossível a gente apresentar tudo que
aprendeu. Porque no decorrer do curso, a gente aprende de uma forma, e
chega no estágio é totalmente diferente. Primeiro, porque o tempo é muito
curto para praticar o que nós aprendemos, aqui dentro da sala. (G3-C, E3-C).

A estagiária E3-C, do grupo G3-C, em sua narrativa sobre as dinâmicas que se


estabelecem nos espaços educativos não formais na relação teoria e prática, afirma que não há
convergência entre o que se estuda e o que se realiza. Também não destacou a sua percepção
sobre a diferença existente em relação à articulação entre teoria e prática desenvolvida nos
espaços educativos não formais.
Pimenta (2012) afirma que o “estágio curricular é atividade teórica de conhecimento,
fundamentação, diálogo e intervenção na realidade, esta sim, objeto da práxis” (p.45). Ou seja
é no contexto em que a prática pedagógica se realiza que a práxis se manifesta.
O espaço não escolar com o espaço escolar é bem diferente, pois no espaço
escolar você tem aquela rotina. E no espaço não escolar é bem diferente, o
tempo destinado a realização das atividades ser de 2 vezes por semana, então
é bem diferente do espaço escolar que segue aquela rotina semanal (G3-C,
E4-C).

A participante E4-C, do grupo G3-C, chamou a atenção para o fato de que o espaço
escolar dispõe de uma rotina semanal de trabalho, enquanto que nos espaços não escolares há
172

outra dimensão da temporalidade. Além disso, para a participante E4-C, a articulação


teoria/prática em determinados momentos existe, em outros, não.
As dinâmicas existentes nas instituições escolares são marcadas pela formalidade
apresentada no currículo e calendário escolar, pela regularidade de conteúdos, metodologias,
avaliação que necessitam de sequencialidade obedecendo as diretrizes e normas próprias,
enquanto que o trabalho educativo desenvolvido nos espaços de educação não formal possui
uma duração variável, e a “categoria espaço é tão importante quanto a categoria tempo, pois o
tempo da aprendizagem é flexível, respeitando-se diferenças e as capacidades de cada um”
(GADOTTI, 2005, p.2).

Antes de começar a fazer o projeto, a gente precisa pensar no objetivo que se


quer, porque não é apenas levar brincadeiras, porque brincadeiras a gente
brinca na rua. É necessário ter temas que a gente trabalhe com brincadeiras.
Qual é a nossa maior diferença que queremos levar para vida daquelas
crianças? Então, a gente não viu isso nos espaços não escolares. A gente
tentou levar daqui o que a gente viu em alguns outros estágios, mas, ali
dentro, eu não consegui ver. Porque foram só brincadeiras nesses três dias,
um foi aula de violão, no outro brincadeira, e no outro música, então foi
muito pouco tempo pra gente avaliar alguma coisa. Então você percebe que a
diferença nos espaços educativos escolares e não escolares...É muito
diferente, porque no espaço escolar, a gente tem que seguir uma rotina,
temos horários para cumprir, e tem conteúdos para passar para eles, então já
vamos preparados com aquela rotina, conteúdo e uma atividade para passar,
e já no espaço não escolar a gente é mais livre para fazer as coisas, apesar
que eu não gostei do estágio (G3-C, E5-C).

A estagiária E5-C, do grupo G3-C, abordou a importância do planejamento das


atividades e da necessidade de definição de objetivos quanto à intencionalidade das práticas
educativas. E sua narrativa expõe-nos um outro aspecto, no mínimo curioso, em relação à sua
percepção quanto às atividades lúdicas, destacando a música como uma ação que não seria
produtora de saberes nem demandaria aprendizagem. Tal posicionamento gerou-nos a
impressão de que essa participante ancora-se nas vivências e experiências dos espaços
escolares e não conseguiu demonstrar, ainda, uma compreensão sedimentada dos significados
da educação não formal.
Libâneo (2005) apresenta argumentos que contribuem para a compreensão da relação
existente entre educação formal e não formal, ao afirmar: “a educação formal e não formal
interpenetram-se constantemente[...]”, e reafirma que, nesse processo, uma não deve
prescindir da outra, considerando que os educandos participam das “várias esferas da vida
social, no trabalho, no sindicato, na política, na cultura etc.” (LIBÂNEO, 2005, p.95). E,
173

consequentemente, as aprendizagens de diferentes saberes ocorrem também em diferentes


atividades, sejam elas lúdicas, cognitivas, socioafetivas, culturais etc.
Ademais, na educação não formal, Gohn (2010, p.38) reitera tais argumentos ao
afirmar que essa poderá estar presente na “formação dos indivíduos por meio da
aprendizagem de habilidades e/ou desenvolvimento de práticas em que a ética, o respeito ao
outro - do ponto de vista de sua cultura e diversidade de formas de vida [...]”. Portanto, as
práticas sociais realizadas pelos sujeitos estão impregnadas de significados e saberes, de tal
forma que se constituem de temas que são passíveis de ressignificação e reconstrução.
Em sequência à questão sobre as dinâmicas realizadas em espaços de educação não
formal, passamos à questão cinco, que versa sobre as contribuições do Estágio Curricular
Supervisionado em espaços não escolares.
Quanto a esta questão, o grupo G1-C apresentou os seguintes argumentos:
Ao adentrar no espaço da instituição não escolar nos deparamos com
situações diversas que de início nos causou estranhamento, uma vez que se
diferenciam dos espaços escolares, mas através das observações realizadas
foi possível perceber as necessidades dos indivíduos pertencentes ao projeto.
Essa experiência de estágio possibilitou colocar em prática os conhecimentos
adquiridos no decorrer das esferas do curso de Pedagogia, refletindo sempre
sobre as constantes mudanças que devemos ter em nossa prática profissional
principalmente nesses espaços que são campos de atuação dos pedagogos.
Apesar do pouco conhecimento teórico, foi possível ter uma compreensão
acerca das especificidades que constituem esses espaços, foi uma
experiência marcante no processo de formação e construção da identidade
profissional, o Estágio supervisionado VI trouxe inúmeras contribuições para
a construção de um olhar voltado para essa prática educativa e dos sujeitos
que dela fazem parte (G1-C, E1-C).

O participante E1-C, do grupo G1-C, descreve que “a experiência de estágio


possibilitou colocar em prática os conhecimentos adquiridos no decorrer do curso, refletindo
sempre sobre as constantes mudanças que devemos ter em nossa prática profissional”. Para
E1-C, o estágio toma como parâmetro os saberes adquiridos no percurso acadêmico para
produzir reflexões sobre as ações, geradoras de mudança da prática pedagógica nesses
espaços que são campos de atuação dos pedagogos. Evidenciou, em seu argumento, a
articulação da teoria e prática e as contribuições que a experiência de estágio trouxe ao
processo de constituição de sua identidade e para a compreensão da prática educativa a partir
dos sujeitos em suas vivências.
Essa compreensão permite-nos reafirmar que o Estágio Curricular Supervisionado
com foco em espaços não escolares se constitui um espaço propício para a formação,
apropriação e produção de saberes e desse modo torna-se o chão fértil para a manifestação de
174

novos “campos de produção de conhecimento e áreas do saber que estavam invisíveis ou não
tratadas como conhecimento ou saber educativo” (GOHN, 2009, p.3).
Portanto, é possível depreender que a formação passa sempre pela mobilização de
vários tipos de saberes, sejam eles curriculares, disciplinares, pedagógicos ou experienciais,
bem como aqueles saberes denominados por Nóvoa (1995) como “saberes de uma prática
reflexiva; saberes de uma teoria especializada; saberes de uma militância pedagógica”
(Hameline, 1991, apud Nóvoa, 1995, p.28).
A respeito dessa questão, o grupo G2-C expressou os seguintes argumentos:
[...] quando você vai para o estágio, você percebe como funciona a prática,
porque a teoria e a prática andam junto. Então você tem a teoria aqui e lá.
Então você vai perceber como você vai agir, como vai praticar essa atividade
escolar (E1-C, G2-C).

Ancoradas em Pimenta (2012), encontramos argumentos que reiteram a narrativa ora


explicitada ao afirmar que a “atividade docente é práxis” (p.95), em razão de que a prática
docente tem como objeto o processo ensino-aprendizagem e necessita de conhecimento do
campo dos saberes disciplinares, curriculares, experienciais e pedagógicos de tal modo que a
articulação da teoria e prática torne efetiva a aprendizagem decorrente da ação de ensinar.
Na sequência, trouxemos a seguinte questão: Você gostaria de exercer a profissão em
espaço não escolar? A E1-C respondeu: Eu acredito que não, porque eu me identifiquei mais
com o espaço escolar. Porque você acha?
Não sei porque, ali ficou meio difícil assim, porque às vezes chega pessoas
que você não conhece, e ali os pais está vendo né, então você não está tendo
contato somente com a criança, então os adultos também percebem a nossa
prática e vai vendo, e a gente começa a ficar com medo, pensando que está
fazendo algo errado. Já na escola não é assim, pois você vai todos os dias,
com matérias planejadas, e sabendo tudo o que vai fazer, e vai interagindo
melhor, mas como você está em um espaço não escolar, como foi no
hospital, cada dia chega um e você começa ficar meio perdido, e eu acho que
o que dificultou também é porque não temos muito tempo para preparar, e eu
estava trabalhando naquele momento (G2-C, E1-C).

A E1-C, do grupo G2-C, apresentou em seus argumentos que a teoria e a prática


andam juntas e que as atividades realizadas durante o estágio possibilitaram perceber como
agir ao realizar as práticas pedagógicas. No entanto, afirmou que se identificou mais com os
espaços escolares. Ao fazer tal afirmação, a estagiária utilizou-se do argumento de que o
trabalho educativo que se realiza nos espaços de educação não formal é acompanhado pelos
pais, pelos educadores sociais e, ao possibilitar a participação de adultos, gerou insegurança.
175

A prática pedagógica em espaços não escolares constitui-se um desafio a ser


enfrentado, sob diferentes perspectivas, seja do ponto de vista da visibilidade social, da
compreensão desses espaços, como lócus de produção de saberes e conhecimentos e, ainda da
própria comunidade acadêmica, que historicamente lida com os espaços de educação
escolarizada, e, desse modo, sentem-se mais seguros. Além disso, também constitui-se um
desafio lidar com as diferentes pessoas e situações que emergem cotidianamente, com as
crianças e adolescentes internadas que demandam criatividade e adequação da proposta
pedagógica.
Para Miranda (2009, p.6452) a análise da experiência no campo do estágio aponta
para a necessidade de pensar uma proposta pedagógica que trabalhe de forma diferenciada,
levando-se em consideração as rotinas e vivências de cada espaço e que a ‘universidade pode
de fato contribuir para mudar a situação dos vários espaços onde a mesma estiver inserida’ e
aponta para a necessidade de constituir um diálogo permanente e contínuo com outros
interlocutores que possam ampliar o debate e discussões.
Respondendo a esse questionamento, o Grupo G3-C, apresentou nas narrativas os
seguintes argumentos:
Na vida pessoal me trouxe uma contribuição muito grande, pois ali você está
conhecendo a realidade de cada um, e as vezes você pensa que está passando
por algo ruim, mais aquelas criança pode está passando por uma coisa pior
que a sua, então são dificuldades que às vezes temos que observar, é... tem as
coisas boas que acontece na vida, tem toda uma bagagem, então você tem
um segundo olhar para a mesma coisa, então você vê a diferença, como um
profissional docente como eu pretendo ser tem muito a contribuir, porque lá
você aprende a ser humano, você tem um olhar diferente para cada pessoa,
tenta entender a história, porque cada pessoa age de uma maneira diferente,
mas ela tem um motivo, assim são os alunos na sala de aula, principalmente
aqueles que os professor não consegue controlar, não consegue fazer com
que eles aprendam, então esse estágio veio muito para contribuir, tanto pra
minha vida docente, como pessoal (G3-C, E1-C).

A estagiária E1-C, do grupo G3-C, iniciou sua narrativa afirmando que o estágio em
espaços não escolares “trouxe uma contribuição muito grande, na vida pessoal, pois ali você
está conhecendo a realidade de cada um, e, às vezes, você pensa que está passando por algo
ruim, mas aquelas crianças podem estar passando algo pior que você”. A argumentação
utilizada é justificada, posteriormente, na direção de que a prática pedagógica desenvolvida
nos espaços não escolares deve pautar-se na realidade dos participantes, nas dificuldades que
enfrentam, nas suas expectativas e interesses que possuem. E, nesse olhar, enxergar as pessoas
176

como elas são e do lugar onde estão, provocar mudanças que humanizam as relações e,
consequentemente, transformam as realidades vividas na prática pedagógica.
Nesse sentido, para atender à demanda educativa, tanto dos espaços de educação
escolares quanto dos não escolares, as práticas pedagógicas devem ser planejadas de modo
que ultrapassem a simples instrução ou informação, de tal maneira que propiciem a realização
de experiências visando desencadear a emergência de outros saberes provindos da voz dos
sujeitos participantes, em suas manifestações sociais, culturais e históricas, como instrumento
de apropriação e (re)elaboração de saberes que sejam frutos daquela comunidade.
Eu acho que a contribuição maior foi a que não precisa de um conteúdo em
si para ensinar alguém, você precisa ter uma meta que vai fazer a diferença,
que vai mudar algo na vida daquela criança, e que vai mudar a realidade que
ela está, e que não adianta fazer um projeto que não está de acordo com a
realidade dela. Então eu acredito que fez crescer também, porque me fez
olhar para arte de maneira diferente, e que todos os projetos que são levados
pra lá são relacionados com a arte, e isso nos faz pensar o que a arte pode
mudar a vida de uma criança (G3-C, E2-C).

A estagiária E2-C, do grupo 3-C, argumenta que não há conteúdo prévio para o
trabalho educativo nos espaços não escolares porque ele emerge das realidades da vida das
crianças e jovens. E essa percepção a fez olhar para si e vislumbrar possiblidades de trabalho
mais consistente e adequado à realidade do campo de estágio.
Nesse sentido, a prática pedagógica do estagiário em formação que se realiza no
processo de ensino aprendizagem deve ser planejada de modo que as ações tenham no diálogo
um dos princípios educativos que permeiam as relações intersubjetivas construídas nos vários
espaços de produção de saberes, sejam eles escolares ou não escolares. Assim, a atividade
docente deve levar em consideração como os interlocutores percebem a si, enquanto sujeitos,
o outro e o mundo para produzir e ressignificar as experiências sociais e culturais oriundas das
vivências daquela coletividade.
Esse último estágio veio contribuir para minha vida pessoal e profissional,
de uma forma de como eu posso trabalhar, no futuro, com as outras crianças,
até mesmo no meu ambiente familiar, como que eu posso compreender
melhor as crianças. Eu achei mais fácil, então eu me volto na primeira
pergunta que a senhora fez, eu quero me especializar em educação infantil
porque eu me identifico com crianças, eu tenho muito o que ensinar e
aprender com as crianças. Eu gostei. Como eu já disse, se eu puder trabalhar
até mesmo como voluntária, eu trabalharei. Ali teve crianças que eu me
identifiquei, na minha infância, eu me vi em várias crianças, ali e um
ambiente acolhedor, um ambiente que nós temos oportunidade de dar e
receber carinho de várias formas, de pessoas que talvez a gente só encontrou
ali naqueles dias, mas foi muito gratificante pra mim, eu espero voltar lá
outras vezes (G3-C, E3-C).
177

A estagiária E3-C, do grupo 3-C, destacou, em sua narrativa, as contribuições do


estágio supervisionado em espaços não escolares para a formação, afirmando que essa
experiência produziu mudanças em sua vida pessoal e profissional, além de permitir a
compreensão das crianças no contexto do processo de ensino aprendizagem, inclusive a
relação daquelas em família, e enfatizou que o estágio reforçou a sua afinidade pelo trabalho
com crianças, mas em contexto escolar, demonstrando interesse em especializar-se nesta
última área. Também identificou-se com o espaço em que realizou o estágio, ao demonstrar
interesse em tornar-se voluntária. E, ao que relata, ela utiliza-se do espaço não escolar como
motivação para a prática pedagógica nos espaços escolares.
A ementa da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado com foco em espaços
não escolares traz como objeto: “abordagem teórica relativa aos processos de ensino,
aprendizagem, execução de atividades docentes junto à comunidade, nos espaços da educação
não-escolar, proporcionando ao estagiário o aprender a ser professor[...]” do ponto de vista da
aprendizagem, a narrativa demonstra que houve aprendizagem quanto ao tratamento didático
pedagógico com as crianças, no entanto, não foi possível entrever nos argumentos utilizados,
também aspectos relativos à ementa quanto ao “compromisso com a inserção social,
contribuindo para a eliminação das desigualdades sociais” que compõe um dos eixos de luta
da educação não formal.
Reiterando esse ponto de vista, utilizamo-nos dos argumentos apresentados por Gohn
(2009 pp.5-6) que uma formação comprometida envolve a apreensão e (re)construção de
saberes “tanto de ordem subjetiva relativa ao plano emocional e cognitivo das pessoas, como
aprendizagem de habilidades corporais, técnicas, manuais etc., que os capacitam para o
desenvolvimento de uma atividade de criação”. Nesse sentido, podemos afirmar que, de certa
forma, o Estágio Curricular Supervisionado com foco em espaços não escolares, assegurou à
estagiária a reflexão e identificação acerca de possível atuação profissional, futuramente.
E4. Foi uma experiência e tanto! pois eu não imaginava que tinha esse
espaço para a gente fazer estágio. Eu achava que era somente nas escolas,
então foi uma contribuição a mais para o conhecimento sobre qual tipo de
conteúdo, tipo de projeto, como que a gente poderia estudar para fazer uma
metodologia para as crianças daquele ambiente, então, o estágio em espaços
não escolares contribuiu muito para a minha formação e compreensão da
dinâmica de funcionamento desses espaços (G3-C, E4-C).

A estagiária E4-C, do grupo G3-C, evidenciou a informação de que o estágio em


espaços não escolares trouxe uma contribuição muito importante para a sua formação porque,
até então, ela não o conhecia e, a partir dessa experiência, percebeu que era possível
178

desenvolver ações educativas com metodologias adequadas ao ambiente e de acordo com as


necessidades do grupo.
A estagiária E4-C, expressou em sua narrativa argumentos que convergem com a
compreensão de educação não formal trazidas por Gohn (2010) sobre a atuação dos
educadores sociais em projetos, programas e organizações não governamentais, e demais
espaços educativos, de que devem planejar e executar as práticas pedagógicas ancoradas na
problematização da realidade, de modo que os sujeitos sintam-se motivados, pertencentes e se
reconheçam como sujeitos do processo para que se efetive a formação baseada nos princípios
e saberes que orientam a vida em coletivos.
Então, eu não conhecia esse estágio, conheci agora no final do curso, então
pra mim foi um aprendizado para me licenciar naquilo que eu planejei e ser
uma professora do EJA, então com esse estágio ficou mais claro que eu
quero ser uma professora da EJA. Não me identifiquei no espaço não
escolar, mas eu consegui ter experiências e são as experiências que eu vou
levar, sejam boas ou ruins, elas me ensinaram alguma coisa (G3-C, E5-C).

A estudante E5-C, do grupo 3-C, tal como a E4-C, desconhecia a existência de


estágio em espaços não escolares. Afirma que foi um grande aprendizado para a sua formação
e reforçou o seu interesse pela Educação de Jovens e Adultos. A estudante afirma, ainda, que
não se identificou com o trabalho nos espaços não escolares, mas a fez refletir sobre as
experiências adquiridas.
A narrativa da estagiária E5-C encontra respaldo nas afirmações de Gohn (2010) de
que esta modalidade de educação não se contrapõe à educação formal, ao contrário, a
complementa. Ela se manifesta como políticas públicas de inclusão nos espaços em que o
poder público não tem conseguido dar conta de atender às diversas demandas educativas
provenientes das classes sociais desfavorecidas, bem como pela diversidade cultural e étnica
existentes nos diferentes espaços sociais.
Assim, a contribuição trazida por esse estágio acerca do processo de ensino e de
aprendizagem em espaços de educação não formal possibilitou à estagiária a constituição
identitária com a Educação de Jovens e Adultos-EJA que poderá desencadear um
aperfeiçoamento em sua formação de modo a aprofundar os saberes para atender as
especificidades da modalidade de EJA.
As entrevistas realizadas com os dois grupos do Campus de Juara, pela dinâmica
adotada pelos professores para aquela turma, que trabalham com a perspectiva extensionista e,
por ocasião da visita àquele campus, estavam na etapa inicial do estágio, pautaram-se em dois
aspectos principais: o primeiro refere-se às impressões que eles tinham sobre o estágio em
179

espaços não escolares e, o segundo ateve-se à percepção das diferenças existentes entre o
estágio em espaços escolares e não escolares.
Portanto, apresentamos a seguir as informações contidas nas narrativas dos
estudantes que, naquele momento, dispuseram-se a realizar a entrevista. Diante da situação de
início das atividades pertinentes ao estágio, mudamos o roteiro de questões e focamos sobre
as impressões iniciais do estágio supervisionado em espaços não escolares.
O grupo G1-J, apresentou as seguintes narrativas feitas pelos estudantes:
Bom, a princípio foi proposto pra gente realizar um projeto numa creche.
Esse é o nosso primeiro contato com o projeto a ser realizado em espaços
não escolares, então nós estamos buscando o que precisa para ser realizado
esse projeto, no que precisa ser investido e tudo mais, porque até então o
nosso estágio foi sempre atuar em sala de aula, mais com observação e
intervenção mais com práticas pedagógicas, e esse é o primeiro contato com
o projeto mesmo em ambientes não escolares, então nós ainda estamos
percebendo como é realizar um projeto também em ambientes não
escolares...(G1-J, E1-J)

O grupo G1-J iniciou sua narrativa afirmando que esse era o primeiro momento que
tiveram contato com projetos em espaços não escolares, e que suas experiências anteriores se
limitavam aos espaços escolares. Estavam, portanto, na etapa de levantamento do que
precisariam e de como elaborar o projeto. Tais afirmações mobilizaram-nos a entender que a
instrumentalização teórico-prática realiza-se no contexto da elaboração do projeto.
O grupo G2-J, composto pelos estudantes de Porto dos Gaúchos, apresentou os
seguintes argumentos:
Então, professora, a princípio, nós estávamos muito ansiosos para fazer em
delegacias, o nosso grupo estava pensando em fazer em um projeto que
atende crianças carentes, e que é um projeto não governamental, porque
normalmente os alunos aqui da UNEMAT, eles vão estagiar lá nesse projeto,
a princípio seria isso, só que nem todos da sala concordaram em fazer lá esse
projeto, só que na verdade queria fazer esse projeto que fosse levado para
comunidade, igual ao ‘Viva seu bairro’ que tem lá em Cuiabá, corte de
cabelo, fazer unha, então eles queriam fazer para que beneficiasse a
população (G2-J, E1-J).

O estagiário E1-J, do grupo 2-J, apresentou preocupação e ansiedade sobre a


definição de possível espaço para trabalhar o estágio em espaços não escolares e exemplificou
com ações dessa natureza, realizadas em outras cidades e com outras finalidades.
[...] quando o professor vem na sala e explica pra gente, o que seria o estágio
em espaço não escolar, e que é pra gente aprender a trabalhar fora da escola
em ações educativas e sociais, em ambientes como CRAS, em OGNS, em
outros espaços, com ações educativas que possam melhorar as condições de
vida daquele pessoal que está naquela região. Em discussão na sala, todos os
alunos em acordo, pensaram na possibilidade de se criar um evento, uma
ação educativa. (G2-J, E2-J).
180

O estagiário E2-J, do grupo 2-J, demonstrou que o seu conhecimento acerca do


estágio em espaços não escolares deu-se a partir das discussões em sala, mediadas pelos
professores e que, a partir delas, aos poucos, foram pensando e delineando as possibilidades
de estágio em espaços como CRAS, ONGS e outros. Assim, a partir das discussões, o grupo
de Porto dos Gaúchos optou por realizar uma atividade educativa naquela cidade com a
participação dos colegas residentes em Tabaporã e Novo Horizonte do Norte.
Bom, até então, nosso projeto é focado mais na questão da independência da
mulher, e assim a gente quer chamar a atenção, como a mulher evoluiu
através dos tempos e como ela está conquistando o espaço e como também
sofre com isso. A gente chegou a esse tema com discussão no grupo, cada
um começou a ter uma ideia, até que saiu essa da gente falar sobre a mulher,
pois está ocorrendo muito caso de assassinato, e aí a gente foi comentando, e
foi encaixando as coisas até chegar nessa ideia, e não falar só de coisas ruins,
mas falar também de coisa boas... (G2-J, E3-J).

O estagiário E3-J, do grupo 2-J, após a definição da temática, que versa,


inicialmente, sobre a independência da mulher, afirma que, coletivamente, foram delimitando
a temática até que deliberaram pelo protagonismo da mulher.
A discussão sobre a possibilidade de definição de temas parte da problematização da
realidade social, em nossa compreensão, ancorada numa perspectiva de currículo que toma a
prática social daquele grupo como objeto de intervenção e, assim, os sentidos do conceito de
currículo formal é substituído pelo currículo vivido, haja vista as necessidades que emergem
daquela coletividade e que se tornam o conteúdo a ser problematizado e ressignificado.
Nesse entendimento, o currículo direcionou as pessoas naquilo que foram
manifestados na sua parcialidade da vida social.

[...]Somos de três municípios diferentes na mesma turma, nós pensamos de


fazer um único evento só que nos três municípios, aí seriam três dias. Mas o
pessoal de Juara não quis. Então pensamos na cidade de Porto dos Gaúchos
que atendesse o Porto e Novo Horizonte, por conta do grupo ser formado por
pessoas dos dois municípios. Começamos a pensar sobre o tema. Pensamos
na mulher, a princípio, sobre feminicídio, depois em algumas reuniões e
conversas, decidimos mudar para questão do protagonismo da mulher, das
dificuldades que as mulheres enfrentam (G2-J, E4-J).

O estagiário E4-J, do grupo 2-J, tal como E3-J, apresentou em sua narrativa o
processo pelo qual se deu a definição da temática com possíveis colaboradores que atuam e
vivenciam situações da comunidade. E, nessa direção, foram pensando quais conferencistas
poderiam contribuir com a temática, possíveis espaços de realização, formas de divulgação,
de organização e divisão do trabalho no grupo.
181

Outra questão que precisamos evidenciar diz respeito às diferenças percebidas pelos
estagiários acerca da educação formal e não formal.
Respondendo a essa questão, o grupo G1-J, apresentou as ideias descritas em sua
narrativa, conforme relato a seguir:
Sim. A creche é recém inaugurada, ainda não tem um parque nessa creche, e
não há investimentos governamentais na creche, então surgiu essa
oportunidade da gente estar fazendo esse projeto e melhorar um pouco a
condição da creche. As crianças precisam de brinquedos para interagir fora
da sala de aula, então essa é uma oportunidade da gente ajudar a escola e os
alunos que vão ser principalmente privilegiados nesse projeto. A creche é
um ambiente lúdico, mas sem ter nenhum tipo de material. Então o parque
foi criado pensando como um benefício e pra nós como uma experiência, de
uma atividade não escolar, e vai ser uma experiência vencedora, a educação
não acontece somente em sala de aula, mas também fora dela. Desse modo,
então, [...] esse projeto tem um envolvimento da coordenação, da secretaria,
e não apenas do professor, com a população, com a direção, com todo
mundo envolvido para fazer o parquinho das crianças (G1-J, E1-J).

O estagiário E1-J, do grupo G1-J, afirmou que sim, percebe as diferenças. E


esclareceu sobre a contribuição do estágio na montagem de um parque infantil e elaboração
de brinquedos pedagógicos para que as crianças disponham de espaços que possibilitem, por
meio da ludicidade, o desenvolvimento motor e socioafetivo. Também, nesse estágio,
segundo o participante, há uma maior interação com as pessoas envolvidas na educação
infantil e a população, de modo geral.

Para Tardif, (2002, p.264-65):

Os saberes profissionais são personalizados e situados. Por isso, o estudo dos


saberes profissionais não podem ser reduzidos ao estudo da cognição ou do
pensamento dos professores. Os professores dispõem, evidentemente, de um
sistema cognitivo, mas eles não são somente sistemas cognitivos, coisa que
muitas vezes esquecidas! Um professor tem uma história de vida, é um ator
social, tem emoções, um corpo, poderes, uma personalidade, uma cultura, ou
mesmo culturas, e seus pensamentos e ações carregam as marcas dos
contextos nos quais se inserem.

Tal narrativa, segundo Tardif (2002) descreve aspectos que situam-se no campo dos
saberes experienciais considerando que a confecção do parque infantil na referida creche
pressupõe, por parte dos estagiários, conhecimento prévio acerca de que as práticas educativas
para a Educação Infantil necessitam de determinadas condições para que a aprendizagem se
realize e, ainda, que as interações entre os seus pares seja durante o processo de formação ou
na elaboração do parque, mesmo que sem a presença da docência nas atividades
desenvolvidas, contribuem de alguma maneira para a formação do pedagogo.
182

Corroborando tais argumentos, Larrosa (2002) afirma que o “saber da experiência se


dá na relação entre o conhecimento e a vida humana, singular e concreta” (LARROSA, 2002,
p.24).
Em relação à mesma questão, o grupo G2-J, explicitou os seguintes argumentos:
Sim. [...]normalmente, no dia das mulheres fala muito sobre o feminicídio, o
professor falou: vamos fazer alguma coisa relacionado à mulher, pois está
acontecendo feminicídio na região, então ao invés de ser feminicídio vamos
colocar o protagonismo da mulher, a gente chama as autoridades, chama as
vereadoras que elas vão colocar a história de vida delas, o que elas têm que
fazer para chegar onde estão hoje, os avanços que as mulheres tiveram ao
longo de suas trajetórias de vida. Então estamos montando esse projeto, e
não está sendo fácil, porque é Porto e Novo Horizonte. Queríamos algo que
fosse levado para a comunidade em questão das mulheres, na questão de
higiene, de se cuidar, se arrumar, questão de se valorizar, a autoestima das
mulheres, e já pensamos na psicóloga pra levar para essa noite estar
conversando com as mulheres, já conseguimos o ambiente que será no
barracão de uma escola, mas a gente quer algo diferente, não que só fique
ali, queremos algo que elas levem pra casa, e que mude as histórias delas,
queríamos uma noite diferente com elas. E, ou a gente senta aqui na
UNEMAT aqueles pouquinho de tempo, mas a maior parte do tempo a gente
vai falando pelo grupo do WhatsApp, ou vai mandando no e-mail, e sempre
assim (G2-J, E1-J).

O estagiário E1-J, do grupo 2-J, afirmou que há uma diferença, e que o estágio em
espaço não escolar permite trabalhar com temas ou ações ligadas à vida da comunidade. Para
esse estudante, é importante trabalhar os acontecimentos sobre a violência que ocorrem na
comunidade, e são temas que não são, costumeiramente, trabalhados no currículo escolar.
Os argumentos utilizados pelo Estagiário E1-J, encontra ancoragem na perspectiva
de educação não formal discutida por Gohn (2010), em que o processo educativo em espaços
não escolares se distancia dos modos de conhecimentos produzidos pela racionalidade técnica
e científica, considerando que as ações realizadas no campo da educação não formal garantem
a manifestação de outros conhecimentos e saberes que emergem de olhares que vão além do
liberalismo e do capitalismo emergente e pragmático. Em tal contexto, o currículo nasce das
vivências dos indivíduos a partir do protagonismo daquela coletividade.
Por fim, destacamos que os diferentes saberes manifestos nas narrativas feitas pelos
estagiários fazem parte do arcabouço cultural evidenciados nas práticas educativas realizadas
e são tão necessários e importantes quanto os conhecimentos produzidos pela racionalidade
científica. Em suma, a inserção do Estágio Curricular Supervisionado com foco nos espaços
nos cursos de formação do pedagogo, dos Campi de Cáceres e Juara, constitui-se um avanço
significativo enquanto possibilidade de aprendizagem e de atuação profissional. Além do
183

mais, não possui a intenção de substituir a educação escolar, antes, complementa-a,


produzindo conhecimentos e saberes plurais.

4.6 DIMENSÕES RESULTANTES DAS INTERPRETAÇÕES ANALÍTICAS DOS


DADOS

Nesta seção, apresentamos os resultados da compreensão oriunda das informações


coletadas na pesquisa, os quais evidenciaram três dimensões que emergiram da interpretação
analítica dos dados do campo empírico.
As interpretações relativas aos dados dos professores são apresentadas,
individualmente, e lançamos mão de excertos e fragmentos de suas narrativas. No entanto, em
relação aos estagiários, como já foi anteriormente feita uma interpretação preliminar, logo
após a apresentação das narrativas, então, nesta seção, trabalhamos com a interpretação dos
seus dados, relativos a cada questão, implicitamente às narrativas dos docentes investigados.
A primeira dimensão refere-se às evidências decorrentes do processo de
instrumentalização teórico-prática, explicitados pelos professores participantes em suas
múltiplas interfaces do processo pedagógico, tais como: a) a constituição da identidade
profissional dos professores; b) a organização do trabalho pedagógico no processo de
instrumentalização teórico-prática; c) aspectos teórico-práticos advindos da
instrumentalização no Estágio Supervisionado; d) os espaços não escolares como campo de
Estágio Supervisionado; e) o planejamento das atividades educativas; f) o acompanhamento
aos estagiários; e g) a avaliação do estágio.
A segunda dimensão enfoca a prática pedagógica realizada pelos estagiários em suas
interfaces com a realidade social e os saberes adquiridos e produzidos na trajetória acadêmica,
advindos dos vários campos do conhecimento, experiências e vivências.
A terceira, aborda as reflexões produzidas pelos estagiários nos relatórios finais de
estágio quanto às contribuições trazidas para sua formação pela experiência do estágio em
espaços não escolares.

4.6.1 Instrumentalização Teórico-Prática

Esta dimensão toma como ponto de partida as contribuições trazidas por Pimenta
(2012, p.107) de que “a teoria e a prática são indissociáveis como práxis”. E, nesse
184

entendimento, a etapa de instrumentalização teórica descrita nas narrativas dos professores


participantes aponta vários elementos que são levados em consideração nesse processo, como,
por exemplo, a constituição da identidade profissional, aspectos teóricos metodológicos,
avaliação das ações educativas que compõem o arcabouço teórico prático do processo de
ensino e aprendizagem, dentre outras.
Por conseguinte, o processo de instrumentalização teórico-prática possui uma
singularidade e importância para a ação educativa de estágio, considerando que, nesta etapa,
discutem-se os objetivos para a disciplina, os possíveis espaços de atuação, autores que
explicitam os aspectos teórico-práticos do estágio, bem como orientam-se possíveis caminhos
e procedimentos que possibilitem o conhecimento da realidade social, “os conteúdos
educativos, habilidades e posturas científicas, sociais, afetivas e humanas” (PIMENTA, 2012,
42).
Tais passos são necessários porque o estágio é compreendido “não como uma
atividade prática, mas teórica, instrumentalizadora da práxis docente, entendida esta como
atividade de transformação da realidade” (PIMENTA, 2012, p.45). Logo, cabe aos
professores a tarefa de criar mecanismos tais para que o estágio se torne o eixo articulador de
todas as disciplinas do curso e contribua para a formação dos professores.
Trazemos, para contribuir sobre a importância do processo de instrumentalização
teórico-prática, os argumentos de Parente e Matos (2015, p.66):
No entanto, não se pode achar que a simples assinatura do termo de
cooperação formalizado entre universidades e secretarias de educação
traduza desejos e intencionalidades no que se refere à formação e à
atuação dos profissionais da educação. Após isso, há um longo
caminho a percorrer. Não basta que os alunos em formação escolham
as escolas onde queiram atuar, levem as cartas de apresentação e
iniciem suas observações e regências. Isso é simplificar demais todo
um processo rico que pode ser construído; é jogar fora a oportunidade
de construir coletivamente uma real proposta de estágio.

Os autores trazem uma reflexão interessante no sentido de que o processo de


instrumentalização teórico/prática no Estágio Curricular Supervisionado constitui-se de um
momento que está para além das atividades meio, pois embrenha-se nas dimensões teórico-
práticas do fazer pedagógico, que se entrecruzam nos estudos, nas discussões, nas análises,
nas interpretações oriundas da realidade social, de maneira que, ao mesmo tempo em que se
realiza o aprofundamento teórico, a prática reveste-se de todos esses saberes,
retroalimentando a teoria.
185

Avançando um pouco mais sobre o estágio, Parente e Matos (2015) apresentam


argumentos sobre as contribuições produzidas no campo das relações institucionais para a
promoção de possibilidades de aprendizagens:
Diz respeito à possibilidade do processo de interação com a prática de
sala de aula. Nessa ação conjunta e colaborativa, o estágio vai se
configurando como articulador da organização curricular e das
práticas pedagógicas como elemento mediador de práticas, o estágio
permite ser também um canal entre a instituição de ensino superior e a
educação básica, reconhecendo, por um lado, a distância existente
entre esses dois tipos de instituição, e, por outro, evidenciando e
acolhendo a contribuição que cada uma das instituições dentro de sua
especificidade, pode oferecer à função da outra nos cursos de
formação. (PARENTE, MATOS, 2015, p.65).

As reflexões produzidas a partir das contribuições dos referidos autores apontam para
o estágio como campo de conhecimento que comporta a confluência dos diferentes
conhecimentos e saberes, mas, também, constitui-se como fio condutor entre os polos
institucionais constitutivos do processo formativo.
Assim, o Estágio Curricular Supervisionado coloca como necessidade ao educador
social, segundo Pimenta e Lima (2012), “além de saber os conhecimentos sobre determinada
área da realidade, que se converterá no conteúdo de ensino [...] o domínio de recursos teóricos
e metodológicos para transmissão, partilha e socialização” (PIMENTA, LIMA, 2012, p.65)
dos conhecimentos e saberes e, nesse processo de aprendizagem de tornar-se professor, deve-
se ter e almejar também para os estudantes, “uma visão crítica dos princípios que
fundamentam sua prática, dos objetivos por ela visados, dos compromissos por ela
requeridos” (PIMENTA, LIMA, 2012, p.65-66).

a) A constituição da Identidade profissional dos professores

Os quatro professores participantes da pesquisa que atuam na disciplina de estágio


Curricular Supervisionado com foco em espaços não escolares têm graduação em Pedagogia e
são egressos da UNEMAT. As duas professoras do Campus de Cáceres têm mestrado em
Educação na UFMT e UNEMAT, respectivamente. Os professores que atuam no Campus de
Juara têm pós-graduação lato sensu. Nos dois Campi, os professores orientadores de estágio
trabalham a disciplina em duplas para atender às atividades teórico-práticas relativas ao
Estágio.
Nesse processo constitutivo de identidade profissional em que tanto os professores
quanto os estagiários se deparam com uma gama de situações que estão para além da
186

aquisição de conhecimentos e saberes oriundos da formação e demandam soluções,


atividades, atitudes e ações comprometidas ética e politicamente com determinados
acontecimentos, cabe aos professores, segundo Pimenta (2012), “refletir com os estagiários
sobre como estão se construindo Professores. O que significa ser professor? Quais os
professores que marcaram sua(s) caminhada(s)?” (p.66). Tais indagações podem desencadear
reflexões coletivas sobre a formação identitária dos envolvidos, ao tempo em que promove
momentos singulares para pensar sobre as experiências e vislumbrar possibilidades de carreira
profissional.
Pimenta (2012) chama a atenção, também, para pensar sobre os fatos,
acontecimentos e oportunidades que os conduziram a optar por tornar-se professor, por
entender que “a identidade profissional vai sendo construída por meio das experiências e a
história pessoal, no coletivo e na sociedade” (p.63).
A esse respeito, Pimenta (2012) traz as contribuições ancoradas em Dubar (1997):
[...] a identidade humana não é dada, de uma vez por todas, no ato do
nascimento: constrói-se na infância e deve reconstruir-se ao longo da vida. O
indivíduo nunca constrói [sua identidade] sozinho: depende tanto dos
julgamentos dos outros, como das suas próprias orientações e autodefinições.
[Assim] a identidade é produto de sucessivas socializações (DUBAR, 1997,
p.13, apud PIMENTA, 2012, p.63).

Nessas contribuições, três aspectos importantes destacam-se na constituição da


identidade profissional. A primeira refere-se às múltiplas experiências adquiridas ao longo da
vida; a segunda, na relação com o outro e como esse outro o avalia como profissional e
contribui com esse processo constitutivo; por último, nas projeções de si, enquanto sujeito e
profissional, nas diferentes interações que se realizam nos espaços sociais em que se
reconhece e atua.
Nesse sentido, ilustramos esses argumentos utilizando-nos das narrativas das
professoras da disciplina de Estágio Curricular Supervisionado: a professora P1-C assim
afirma quanto à formação de sua identidade profissional:
A minha formação foi se constituindo nesse meio entre a reflexão e a
formação composta de docência no ensino superior com as minhas
inquietações na prática pedagógica na Educação Básica. Foi nesse
intermédio que eu me constitui professora e venho me constituindo, até hoje
(P1-C).

Outros elementos são acrescidos à constituição da identidade pela Professora P1-C,


no que diz respeito às inquietações e reflexões produzidas na realização da prática
pedagógica. Sintetizando, Pimenta (2012) afirma ainda que vários elementos configuram a
187

construção da identidade profissional, tais como o curso do qual faz parte, o Estágio
Curricular Supervisionado, as aprendizagens derivadas das demais disciplinas, assim como as
experiências e vivências, dentro e fora da Universidade, ajudam a construir a identidade
docente.
Nesse entendimento, trazemos a narrativa da professora P2-C como exemplo de
como as interações entre o mundo do trabalho, as vivências e experiências contribuem para a
constituição da identidade profissional, nos diálogos e questionamentos produzidos entre os
dois níveis de ensino: “estou atuando na educação do ensino superior desde 2012. Nesses
anos todos, estamos também na rede, com a educação infantil” (P2-C). Desse modo, a busca
pela compreensão das complexidades que envolvem a prática pedagógica, enquanto atividade
situada no contexto social mais amplo, estabelece o desafio da necessidade de
aperfeiçoamento de sua formação.
As narrativas docentes, tanto de P1 e P2, ambas do Campus de Cáceres, permitem
compreender que os estudos realizados para o aprofundamento teórico-prático, as análises e as
reflexões produzidas acerca das práticas pedagógicas que ocorrem nos espaços educativos não
escolares, a partir dos referenciais assumidos e/ou ressignificados pelos sujeitos, contribuem
para a construção da identidade profissional dos professores.
Nesse sentido, podemos interpretar que devemos levar em consideração os aspectos
“subjetivos da profissão, que dizem da identificação e da adesão dos sujeitos a ela, para que
os candidatos a essa profissão, digam para si, que querem ser professores” (PIMENTA, 2012,
p. 63-64). E, nessa direção, os professores orientadores de estágio devem promover situações
que suscitem nos estagiários análises e reflexões sobre o reconhecimento de si e o desejo de
tornar-se professor.
Nessa perspectiva, o processo de instrumentalização teórico-prática torna-se o fio
condutor na preparação dos estudantes para os processos de ensino e aprendizagem por meio
de ações educativas que demandam um tratamento didático-pedagógico do conhecimento de
tal modo que possibilite aos estudantes estagiários “o estudo, a análise, a problematização, a
reflexão e a proposição de soluções às situações de ensinar e aprender” (PIMENTA, LIMA
2012, p.55).
Nesse sentido, a realização do trabalho educativo deve ser feita de forma articulada e
coletiva entre professores, estagiários e comunidade, a fim de que possa propiciar uma
formação inicial que promova ações comprometidas qualitativamente com os sujeitos, com as
instituições parceiras situadas em determinados contextos históricos, sociais e culturais e que
contribuirão para a formação política, técnica, humana e social de todos os envolvidos.
188

Considerando que as ações educativas desenvolvidas nos espaços não escolares são
realizadas pelo educador social, esse deve ter sua proposta de intervenção na realidade numa
perspectiva “socioeducativa, de produção de saberes a partir da tradução de culturas locais
existentes e da reconstrução e ressignificação de alguns eixos valorativos, tematizados
segundo o que existe, em confronto com o novo que se incorpora” (GOHN 2010, p. 55).
Assim, tomando o estágio como campo, por excelência, que pode desencadear a
reflexão sobre a construção e o fortalecimento da identidade, apoiamo-nos nas contribuições
de Pimenta e Lima (2012) que define o estágio como “lugar onde são tecidos os fundamentos
e as bases identitárias da profissão docente” (p. 62). Para as autoras(2012), “O estágio é o
lócus onde a identidade profissional é gerada, construída e referida; volta-se para o
desenvolvimento de uma ação vivenciada, reflexiva e crítica e, por isso, deve ser planejado
gradativa e sistematicamente com essa finalidade” (PIMENTA, LIMA, 2012, P.62)
A partir desse olhar, encontramos na narrativa do Professor (P3-J) argumentos que
convergem com a perspectiva trazida por Pimenta e Lima (2012), quando comenta: “observei
que no processo de formação do pedagogo, deve passar pela vivência nos espaços escolares e
não escolares[...] (P3-J). A narrativa do professor P3-J traz as contribuições das vivências e
experiências na sua trajetória e constituição identitária: “Eu trabalho com o campo da
educação não formal, já faz algum tempo. No começo, com a disciplina de gestão de
ambientes não escolares, e nos últimos anos também com o estágio” (P3-J).
Nesse sentido, as narrativas dos professores apresentam aspectos relativos às análises
e reflexões sobre a profissão que encontram ancoragem em Pimenta e Lima (2012):
[...] no confronto com as representações e as demandas sociais que a
identidade construída durante o processo de formação será reconhecida, para
o qual serão necessários os conhecimentos, os saberes, as habilidades, as
posturas, e o compromisso profissional. Trata-se, pois, de nos estágios se
trabalhar a identidade em formação, definida pelos saberes, e não ainda pelas
atividades docentes (PIMENTA, LIMA, 2012, p.64).

A nossa percepção de Estágio Curricular Supervisionado em espaços de educação


não formal como o espaço propício de confluência de saberes e conhecimentos histórica e
socialmente produzidos por determinada coletividade produz novos e ressignifica outros
conhecimentos e saberes a partir da realidade social, das práticas realizadas pelo grupo.
Assim, a partir da apreensão das necessidades, interesses e desejos, o Estágio não apenas
contribui com o processo formativo, mas constitui-se um lócus propício à construção da
identidade dos sujeitos envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem.
189

Nesse sentido, segundo Pimenta e Lima (2012), “a nossa identidade se constrói a


partir da intersecção das circunstâncias que nos cercam com os desejos que trazemos” (p.65).
E, complementando, as autoras acrescentam ainda que: “[...] O corpo docente ganhará sua
identidade – marca peculiar – no exercício competente de seu oficio, com o espírito alerta da
crítica para a construção conjunta da sociedade de/para todos”. (PIMENTA, LIMA 2012,
p.65).

b) A Organização do trabalho pedagógico no processo de instrumentalização


teórico-prática

Partimos da compreensão do processo de instrumentalização teórico-prática


ancorados nas contribuições de Pimenta e Lima (2012, p. 45) de que o “estágio curricular é
atividade teórica de conhecimento, fundamentação, diálogo e intervenção na realidade, esta,
sim, objeto da práxis”. Então, o trabalho educativo realizado nos espaços de educação não
formal, aliado às necessidades e interesses da sociedade, nos diferentes grupos sociais da
comunidade em que se realizam as atividades de estágio, demanda pensar o processo de
instrumentalização teórico-prático considerando vários aspectos descritos na narrativa da
Professora P1-C:
Nós seguimos de base o que nós tínhamos anteriormente, ele vem
organizado por rotinas, seguindo a constituição de compreensão teórica,
metodológica do espaço não escolar com leituras dos autores que vamos
trabalhar. Que define o que é o espaço não escolar, quais são os conceitos,
onde que eles surgem, e qual é a finalidade de se trabalhar um estágio em um
espaço não escolar para a vida do acadêmico (P1 – C).

Além disso, a professora P1-C, apresenta os modos como direciona o estudo e a


orientação para a atividade docente de estágio, ao explicitar que: “a gente faz toda essa
construção da identidade do espaço não escolar, por meio das leituras dos teóricos em sala de
aula, através de leitura coletiva, individual, debate, discussão das temáticas tratadas” (P1-C).
Nesse sentido, segundo Pimenta e Lima (2012), “os saberes teóricos propositivos se
articulam, pois, aos saberes da ação dos professores e da prática institucional, ressignificando-
os e sendo por eles ressignificados” (p.49). Portanto, ao tempo em que os saberes curriculares,
disciplinares, pedagógicos e experienciais se articulam na preparação dos estagiários, estes
também são (re)significados a partir do confronto com a realidade social com a qual
trabalham.
190

Nesse processo de preparação e formação para atuação nos espaços, a Professora P1-
C acrescenta ainda que “também trazemos alguns vídeos que apresentam o espaço não escolar
em outras realidades. Apresentamos também algumas imagens que nós já tínhamos de
atividades dos semestre anteriores dos espaços que nós vamos trabalhar” (P1 – C).
Igualmente, a Professora P2-C, em sua narrativa, apresenta a organização do trabalho
pedagógico no processo de instrumentalização teórico-prática, para a realização do estágio da
seguinte maneira:
[...] a gente se encontra para começar o planejamento e definir a
fundamentação teórica, os materiais que vamos usar para que os acadêmicos
tenham um entendimento teórico sobre o assunto que vamos está tratando,
para que possam compreender e conceituar o que seria educação não formal,
e compreender também quando nós estamos falando em educação não
formal ou educação não escolar, porque às vezes eles têm dificuldade de
conceituar o que estamos falando (P2-C).

A narrativa expõe a preocupação com os aspectos conceituais sobre educação não


formal e o que a diferencia da educação formal, apontando que essa distinção é muito
importante para pensar a prática pedagógica nos espaços não escolares. Nesse sentido, a
professora P2-C acrescenta: “é interessante que eles [estagiários] tenham esses materiais para
que eles entendam, discutam e dialoguem e compreendam melhor o que seria educação não
formal, e, sobretudo, conseguir pensar o estágio em espaço não escolar” (P2-C).
A narrativa da Professora P2-C encontra em Pimenta (2012) os argumentos que
destacam o papel do docente, no sentido de que devem se empenhar em “construir os saberes
pedagógicos a partir das necessidades pedagógicas postas pelo real [...]” (p.27), para que a
comunidade se reconheça nas ações que nascem dos interesses e necessidades.
A narrativa do Professor P3-J diferencia-se daquelas apresentadas pelas professoras
P1-C e P2-C, pois, enquanto estas argumentaram sobre os aspectos teóricos e práticos, aquele
argumenta sobre a parte prática de operacionalização da disciplina, conforme explicitado:
Nós aproveitamos parte da carga horária teórica para tomar decisões e
construir a escrita. Inclusive a escrita desse projeto. Na semana retrasada nós
fizemos em sala, porque a gente demorou na organização do que íamos
fazer. E nós passamos por duas propostas, uma foi até iniciada, e eles
voltaram atrás, não dava certo, era muita coisa enfim (P3-J).

No entanto, no que diz respeito às questões relativas aos espaços não escolares, há
convergência com as demais professoras quanto à percepção e seleção desses espaços: “[...]
debatemos a questão do bairro, da creche, com os alunos e a diretora da escola sobre essa
necessidade. A partir disso, fomos organizando tudo e estabelecemos datas e metas a serem
atingidas” (P3-J).
191

A narrativa do Professor P3-J possibilitou-nos entrever que o processo de


instrumentalização teórico-prática quanto aos aspectos teórico/metodológicos relativos ao
campo da educação não formal como um momento constitutivo de preparação dos estagiários
para a realização das atividades de campo é realizado em casa pelos estagiários. Outro aspecto
que nos chamou a atenção refere-se à organização da disciplina de Estágio Curricular
Supervisionado que, em nossa compreensão, incorre na duplicidade do fazer pedagógico.
Igualmente, o professor P4-J afirma que: “em um primeiro momento fazemos um
mapeamento com os alunos dos espaços existentes: a prefeitura que atende a área esportiva,
saúde, assessoria pedagógica. E, dentro dessas aulas teóricas, trouxemos essa proposta” (P.4-
J). O que percebemos na narrativa está relacionado à preocupação com os possíveis espaços
educativos para realização do estágio. A respeito disso, Imbernón (2011) traz uma importante
contribuição sob a perspectiva das práticas, pois para o autor, estas “devem servir de estímulo
às propostas teórico-práticas formais, de maneira que os alunos interpretem, reinterpretem e
sistematizem sua experiência passada e presente, tanto intuitiva como empírica”.
(IMBERNÓN, 2011, p.67).
No entanto, a prevalência da perspectiva da prática sobre a teoria, como evidenciado
nos discursos dos professores P3-J e P4-J, demarca uma lacuna no processo formativo, haja
vista que, segundo Pimenta e Lima (2012), o papel da “teoria é oferecer aos professores
perspectivas de análise para compreender os contextos históricos, sociais, culturais,
organizacionais e de si mesmos como profissionais, nos quais se dá sua atividade docente,
para neles intervir, transformando-os.” (PIMENTA, LIMA, 2012, P.49). Sendo assim,
entendemos que os aspectos relativos à teoria e prática devem ser tratados com consistência,
coerência e igualdade de atenção conforme exige a formação do pedagogo.
Nesse sentido, embora P4-J descreva que: “esses momentos das aulas teóricas nós,
basicamente fazemos isso (elaboração de projetos de extensão)” e que “as leituras de artigos,
da ementa, geralmente a gente passa para eles ir fazendo a leitura em casa”, a
instrumentalização teórico-prática reveste-se de extrema importância para o aprofundamento
teórico, conhecimento da realidade e para as possibilidades de intervenção nesta última.
Assim, reafirmamos a relevância do Estágio Curricular Supervisionado em espaços
não escolares como campo de formação, aprendizagem, partilha de saberes, vivências e
experiências entre professores, alunos e comunidade, a fim de que as ações educativas sejam
articuladas de forma teórica e prática com o intuito de que os diferentes saberes socialmente
produzidos possam ser (re)significados e transformados pelos sujeitos em formação.
192

Nesse processo de instrumentalização teórico-prática de preparação dos estagiários


para a atividade campo, evidenciamos o protagonismo do papel do professor que promove
com seus alunos estagiários, estudos, discussões, análises, conhecimento da realidade social
que preparam os estudantes para um desempenho adequado, de adquirir, produzir e
ressignificar os saberes, tanto de sua trajetória acadêmica quanto daqueles que, aliados aos
saberes oriundos das vivências e experiências, contribuem para um processo de ensino e
aprendizagem, política, ética, técnica e socialmente comprometido com a comunidade em que
vão atuar.

c) Aspectos teórico-práticos advindos da instrumentalização no Estágio


Supervisionado

Neste item trazemos as contribuições evidenciadas nas narrativas dos professores


participantes sobre os elementos que compõem a instrumentalização teórico-prática. A
primeira constatação diz respeito à diferença entre educação formal e não formal.
As professoras P1-C e P2-C explicitam, em suas narrativas, a necessidade de os
estagiários disporem de conhecimento dos aspectos conceituais de educação formal e
educação não formal, objetivando, a partir dessa diferenciação, pensarem possíveis formas de
intervenção pedagógica nos espaços onde realizam o estágio. Ainda que de maneira mais
tímida, os professores P3-J e P4-J também compartilharam dessa percepção.
Com base em tais argumentos, destacamos um aspecto importante para a
compreensão da diferenciação conceitual acima indicada, que diz respeito ao alcance da
educação não formal, pois, conforme explicita Gohn (2010), esta não se contrapõe a outras
categorias de educação, na medida em que se preocupa mais com “os processos de
aprendizagens e produção de saberes na sociedade como um todo” (p.32).
Enquanto perspectiva teórico-prática, o professor P4-J aborda em sua narrativa
“sobre o protagonismo do aluno, em que o professor deve criar as possibilidades de o aluno
construí-lo” (P4-J). Esse olhar é muito importante porque desloca o papel do processo de
ensino e aprendizagem para os estagiários, dando a estes a possibilidade de conhecer, pensar e
refletir sobre as perspectivas de aprendizagens em espaços não escolares, validando a
autonomia estudantil.
A professora P2-C, falando acerca dos aspectos teórico-práticos, descreve
exemplificativamente em sua narrativa que “[...] definem a fundamentação teórica, os
193

materiais [...] objetivando conceituar o que seria educação não formal, e compreender também
quando estamos falando em educação não formal ou educação não escolar[...]” (P2-C).
A esse respeito, faz-se necessário tomar para nosso entendimento as importantes
contribuições de Gohn (2010):
[...] a educação não formal tem campo próprio, tem intencionalidades, seu
eixo deve ser formar para cidadania e emancipação social dos indivíduos.
Sabemos que a escola também tem intencionalidades, assim como deve
também cuidar de formar para a cidadania, tendo como uma de suas tarefas
fundamentais desenvolver a capacidade de aprender mediante ‘pleno
domínio da leitura, da escrita e do cálculo’, conforme prevê o artigo 32, I, da
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB – Lei nº 9.9394/96)
(GOHN, 2010, pp33-34).

Essa diferença conceitual entre educação não formal e educação formal ganha mais
evidência na categoria intencionalidade, embora, para Gohn (2010), a diferença existente na
“[...] intencionalidade não é o único marco diferencial entre a educação formal e a não formal,
porque existe nas duas, mas é ela que demarca um objetivo específico na educação não formal
– formar para a cidadania” (GOHN, 2010, p.34).
Nessa perspectiva, a organização do trabalho pedagógico deve ancorar-se em
dimensões educativas que envolvem, segundo Gohn (2010):
a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos como cidadãos, ou
aprendizagem para a cidadania, aprendizagem dos indivíduos para atuarem
no mundo do trabalho, por meio da aprendizagem de habilidades e/ou
desenvolvimento de potencialidades em oficinas e laboratórios” (GOHN,
2010, p.35).

Essas dimensões encontram sentidos nas ações educativas quando estas se realizam
tomando a leitura da realidade social, as práticas sociais dos indivíduos de determinada
comunidades, aliadas aos saberes e conhecimentos trazidos pelos professores e estagiários em
situações problematizadoras.
Assim, utilizamo-nos da narrativa do professor P4-J sobre como, coletivamente,
pensaram as ações educativas:

Diante da constatação das dificuldades em realizar um projeto grande,


conversando com a turma, surgiu uma aluna com uma ideia de fazer uma
ação transformadora de uma creche, essa aluna disse que na creche aonde ela
trabalha, está precisando de parquinho, brinquedos... e como a gente veio
desde a 3° fase construindo materiais pedagógicos, tem essa questão do
brinquedo, da finalidade da brincadeira, então tudo isso deu suporte para
essa proposta (P4-J).
194

Conquanto as ideias descritas sejam socialmente válidas para aquele grupo de


professores e alunos, de acordo com Gohn (2010), é importante distinguir as “práticas cidadãs
de outras que consideram os indivíduos apenas como mão de obra para realizar ações que o
Estado não realiza, ou para gerar renda em trabalhos sem direitos sociais regulamentados”
(GOHN, 2010, P.35).
Além do mais, a atividade desenvolvida não apresenta vínculo com a docência,
apenas com a extensão. Embora a extensão Universitária seja importante por se constituir no
“processo educativo, cultural e científico, que articula o ensino e a pesquisa de forma
indissociável e viabiliza a relação transformadora entre a Universidade e a sociedade"
(FORPROEXT - Extensão Universitária: Organização e Sistematização, 2007 p.17)10 esta não
atende, por si só, a essência do Estágio Curricular Supervisionado.
Isto posto, a extensão universitária, quando articulada ao ensino e à pesquisa
possibilita a troca de saberes por meio do diálogo entre os saberes disciplinares e curriculares
com a realidade social e propicia a participação efetiva da Universidade na comunidade,
contribuindo com a formação dos estagiários por meio de uma visão integrada entre
Universidade e comunidade.

d) Os espaços não escolares como campo de Estágio Supervisionado

Em relação ao processo de instrumentalização teórico-prática na disciplina de


Estágio Curricular Supervisionado em espaços não escolares, os quatro professores
participantes demonstraram preocupação quanto à pouca opção de espaços disponíveis para
realização do estágio. Essa afirmação é um tanto frágil porque existem muitas crianças e
adultos analfabetos ou semianalfabetos nos bairros e até mesmo em instituições públicas
precisando de ensino e aprendizagem.
A narrativa do professor P3-J descreve que “Juara é uma cidade interiorana, então
nós temos algumas dificuldades que são bem particulares de cidades interioranas (P3-J). É
esse conhecimento da cidade e das possibilidades educativas existentes nos espaços sociais
que mobilizam os professores e alunos daquele campus, segundo justificaram, a realizar o
estágio como atividade de extensão.

10
Disponível em: <http://portal.unemat.br/?pg=site&i=proec&m=extensao-na-unemat>. Acesso em: 15 de jan.
de 2019.
195

Igualmente, o professor P4-J narra que “em nossa cidade, hoje, é carente desses
espaços” (P4-J). A alegação, explicitada pelos dois professores P3-J e P4-J, evidencia a saída
encontrada pelo coletivo de professores e alunos estagiários para realização do estágio, não
obstante a ausência de docência nas atividades realizadas.
Destacamos a importância social da realização de ações extensionistas que
contribuem de maneira objetiva para o fortalecimento das relações entre universidade e
sociedade por meio das instituições educativas não escolares. Consideramos esse aspecto um
avanço significativo, mas tomamos a liberdade de externalizar alguns pontos que podem
contribuir para a relação de interdependência entre ensino e extensão, na realização do
estágio:
 Possibilidade de retorno à comunidade a partir das ações extensionistas,
formativas contanto que promovam a troca de saberes e conhecimentos produzidos nas
vivências e experiências daquela comunidade;
 Possibilidade de produção de materiais educativos, como cartilhas, manuais,
relatórios, revistas, jornais locais tomando como fundamento e base da elaboração os saberes
produzidos por aquela coletividade;
 Realização de palestras, oficinas, laboratórios, cursos, feiras, exposições entre
outras, em que os professores orientadores de estágio e estagiários promovam intercâmbio de
saberes e partilhem práticas e experiências comprometidas com aquele grupo ou comunidade;
 Promoção de levantamentos de necessidades, anseios e dificuldades daquela
comunidade e, juntos, realizarem ações que possam minimizar tais situações, aliando
atividades de docência à extensão;
 Promoção de excursões a diferentes espaços que apresentem possibilidades de
aprendizagens, com objetivos e roteiros previamente definidos;
 Participação, organização e incentivo ao grupo a promover encontros para
estudos e reflexões acerca de temáticas de interesse coletivo;
 Promoção de eventos culturais que acolham as manifestações culturais
presentes naquele grupo social ou comunidade, destacando aspectos relativos às diferenças
culturais existentes;
 Ciclos de diálogos sobre temas relevantes socialmente;
 Promoção de cursos de formação aos educadores sociais sobre o trabalho
didático-pedagógico e gestão dos espaços não escolares.
Como se vê, são inúmeras as possibilidades de trabalhos extensionistas que
envolvem a atividade de docência. Neste estudo, listamos apenas algumas, para exemplificar.
196

Assim, entendemos que a ausência de espaços não pode constituir-se um elemento limitador
de possibilidades educativas.
Em relação a (in)existência dos espaços não escolares, a professora P1-C expressa a
preocupação e compromisso com aqueles espaços parceiros no sentido de continuidade da
parceria. Nessa mesma direção, a professora P2-C enfatiza o compromisso e respeito para
com a dinâmica e funcionamento dos espaços, de modo que as ações de estágio produzam a
menor interferência possível no trabalho realizado. Tomamos como exemplo a narrativa da
Professora P2-C no seguinte sentido: “nós conversamos e levamos as informações sobre os
espaços para os alunos, apresentamos cada espaço, os horários de funcionamento e as
atividades que realizam[...]” (P2-C).
Segundo Gohn (2010), “a educação não formal [...] não é herdada, é adquirida. Ela
capacita os indivíduos a se tornarem cidadãos do mundo, no mundo. Sua finalidade é abrir
janelas de conhecimentos sobre o mundo que circunda os indivíduos” (p.19), como sujeitos
situados historicamente e revestido de suas relações sociais.
A professora de Estágio P2-C afirma, em sua narrativa, que há uma constante busca
por ambientes educativos não formais: “[...] procuro me informar a respeito de espaço, como
este que estou agora (Rede Cidadã), [...] tomo ciência [...] através de algumas pessoas e
procuro me inteirar para saber como que ele era, o que acontecia aqui [...]” (P2-C) e, então, à
medida em que descobrem novos espaços, vão formalizando as relações institucionais para
atender a demanda para a realização de estágio em espaços não escolares.
A esse respeito, atentamos ao fato de que, às vezes, há uma expectativa de que os
espaços não escolares para a realização do estágio já estejam prontos, mas os espaços também
podem ser criados, por exemplo: fazer o levantamento de crianças que estão fora da escola
num bairro e desenvolver uma proposta pedagógica com elas...
É importante lembrar que os objetivos da educação não formal, segundo Gohn
(2010), “não são dados a priori”(p.19), haja vista que eles emergem no processo resultante
das interações entre os sujeitos para gerar um processo educativo, tomando os interesses e as
necessidades dos que participam. Por isso, estar atento aos modos de organização da
sociedade e da comunidade, por meio de seus diferentes grupos, constitui-se uma atitude
necessária para que outras possibilidades de espaços possam emergir desse olhar.
Em relação à seleção de espaços não escolares, portanto, os quatro professores
participantes afirmaram em suas narrativas que dão liberdade para que os alunos escolham o
ambiente com o qual mais se identificam com as atividades que são realizadas.
197

e) O Planejamento das atividades educativas

Neste item, trazemos as evidências apresentadas nas narrativas dos professores


participantes sobre o planejamento como um dos elementos da etapa do processo de
instrumentalização teórico-prática.
Segundo Vasconcellos (2000), o planejamento é um ato político-pedagógico porque
revela intenções, finalidades, metas e objetivos a serem atingidos. De acordo com o autor,
Planejar é elaborar o plano de intervenção na realidade, aliando às
exigências de intencionalidade de colocação em ação, é um processo mental,
de reflexão, de decisão, que por sua vez, não se constitui uma reflexão
qualquer, mas grávida de intenções para uma intervenção consciente na
realidade (VASCONCELLOS, 2000, p.43).

Para Vasconcellos (2000), “o planejamento deve ser compreendido como um


instrumento capaz de intervir em uma situação real para transformá-la” (p.42). Nesse sentido,
o ato de planejar constitui-se uma atividade teórica que possibilita, nessa ação, o
conhecimento da realidade e, ao mesmo tempo, definir as finalidades para sua transformação,
que se realiza por meio da atividade prática. (PIMENTA, 2012)
Desse modo, o planejamento deve ter explicitado o que fazer, ou seja, quais
conteúdos ou temáticas emergem das práticas sociais daquele grupo ou comunidade e
atendem aos interesses e necessidades daquela coletividade. Também deve-se levar em
consideração a pergunta para quê, a fim de explicitar os objetivos e metas que se pretende
alcançar, e os modos como e/ou caminhos estratégicos para chegar a tal fim. Após a definição
metodológica de como fazer, faz-se necessário planejar respondendo à questão quando fazer
etc.
Nesse entendimento, trazemos as narrativas dos professores participantes acerca da
compreensão do planejamento realizado por eles, individualmente:
O que nós percebemos no primeiro dia de aula da disciplina de Estágio em
espaço não escolar, quando eles chegam pra gente, eles dizem: professora
mas o que que nós vamos fazer então? Vai precisar de plano de aula, né?
Porque é aberto o espaço, e não tem toda aquela organização e etc. Aí, nós
vamos colocando nosso plano de ensino, vamos falando sobre todos os
momentos, mostramos as aulas, as rotinas [...] (P1-C).

Segundo Libâneo (2003) o “planejamento consiste em ações e procedimentos para


tomada de decisões a respeito de objetivos e de atividades a ser realizadas em razão desses
objetivos” (p.345). Assim, a professora P1-C apresenta, além da importância do plano de
ensino e de aula para a realização das atividades, a funcionalidade desse instrumento na
condução do trabalho pedagógico.
198

Planejar significa pensar o processo de conhecimento e de análise da realidade social


em suas condições concretas para, a partir do acesso a essa informação, pensar ações de
intervenções para assegurar aos estagiários as transformações de seus saberes e
conhecimentos, ao transformarem para melhor a vida das pessoas que eles atendem. Segundo
P1-C, “no espaço não escolar, por emergir da situação que as crianças, adolescentes e jovens,
assim como as experiências que as famílias vivenciam, os estagiários precisam de um
planejamento bem mais denso” (P1-C), que atenda às necessidades e interesses dos sujeitos
daqueles espaços não escolares em que atuam.
No planejamento, deve-se considerar, segundo Gohn (2010, p.45), a “definição de
funções e objetivos de educação não formal”, assim como a “construção de metodologias que
possibilitem o acompanhamento do trabalho realizado”, conforme a professora P1-C explicita
em sua narrativa, quando afirma: “nós construímos uma rotina de atividades, ou uma rotina de
ações que eles devem se envolver no período de observação e, depois, na construção do
próprio planejamento de intervenção” (P1-C).
Nessa mesma direção, a professora P2-C apresenta as informações anteriores sobre
planejamentos com os seguintes argumentos: “precisamos conversar para ver se o nosso
calendário encaixa também, com as datas que as instituições têm, e, em alguns momentos, a
gente precisa repensar as datas junto com os parceiros que vão nos receber” (P2-C); essa
narrativa aponta para a necessidade de atender ao critério de quando realizar a atividade, de
modo que interfira o mínimo possível na rotina das instituições parceiras.
Outro aspecto igualmente importante sobre planejamento diz respeito à seguinte
narrativa do professor P3-J: “nosso planejamento é feito a partir da percepção das
necessidades dos alunos estagiários, da comunidade que geram discussões que fazemos com
os alunos sobre o quê, como fazer e onde vão realizar a atividade” (P3-J).
Nessa oportunidade de construção do planejamento, segundo o Professor P3-J,
também “discutimos possíveis espaços e projetos para serem desenvolvidos. Em seguida,
vamos fazendo as orientações nas aulas de estágio” (P3-J). Esse argumento encontra
ancoragem nas contribuições trazidas por Gohn (2010): “na educação não formal, as
metodologias operadas no processo de aprendizagem partem da cultura dos indivíduos e dos
grupos” (p.46).
Ainda sobre o planejamento, o professor P4-J aponta que, “[...] nessa disciplina já
reconstituímos o planejamento duas vezes [até que] surgiu esse de fazer a reforma de um
parquinho e da construção de brinquedos pedagógicos na creche” (P4-J). Há, nessa narrativa,
a reelaboração do planejamento à medida em que foi surgindo a necessidade de reformulação.
199

Tal situação denota que o planejamento se constitui um instrumento vivo, que se faz e refaz
no processo. É construído nas dimensões do ensinar e do aprender.
O ponto convergente entre as quatro narrativas, em relação ao planejamento,
portanto, diz respeito à concepção de que as ações educativas em espaços de educação não
formal devem partir do conhecimento da realidade social, das necessidades e interesses da
coletividade para, a partir desse conhecimento, elaborar a proposta de intervenção pedagógica
no ambiente.
Diferentemente, nas narrativas dos quatro professores participantes, dois aspectos se
revelaram divergentes quanto ao plano de ensino e de aula. O primeiro relaciona-se à
diferença quanto ao enfoque dado ao trabalho educativo, pois, enquanto as professoras P1-C e
P2-C enfatizam as ações educativas na perspectiva da docência, os professores P3-J e P4-J
trabalham na perspectiva da extensão, mais alinhados à dimensão da prática. O segundo
aspecto diz respeito à articulação da teoria à prática que as professoras P1-C e P2-C a tomam
como prospecção de uma prática educativa que seja bem fundamentada teórica e
praticamente. Isto é, que esteja comprometida ética, política e pedagogicamente com a
aprendizagem daquele grupo a que se destina. Já para os professores P3-J e P4-J, pela
concepção e operacionalização de Estágio assumida pelos professores e alunos, evidencia-se a
prevalência do aspecto prático sobre o teórico.
Em suma, em um processo de planejamento, algumas inquietações importantes
devem ser consideradas a respeito do currículo a ser desenvolvido nesses espaços não
escolares, como por exemplo: quais saberes devem ser ensinados e/ou produzidos nos espaços
de educação não formal? Qual saber deve prevalecer e qual deve ser excluído? Vejamos que
há seleção de saberes, conhecimentos a serem desenvolvidos nesses espaços educativos por
meio do currículo ali desenvolvido. Os indicativos de respostas para esses questionamentos
assumem diferentes perspectivas, pois devem sempre partir da realidade social, dos interesses
e necessidades daquele coletivo de sujeitos naqueles contextos históricos e sociais nos quais
são produzidos. Portanto, a seleção ou escolha dos conteúdos não são dados à priori, mas
construídos no processo. “Eles emergem das condições sociais, econômicas, culturais da
coletividade que luta e reivindica novos conhecimentos e saberes e ressignificam outros”
(ALENCAR, FERREIRA, 2017, p.6).
Nessa perspectiva, tanto os conteúdos quanto os aspectos metodológicos são
produzidos nas condições objetivas e subjetivas de existência daquelas comunidades
atendidas, a fim de permitir o desenvolvimento de atividades de criação e recriação de saberes
200

produzidos na sua relação com o mundo, que resulta em saberes e conhecimentos, frutos do
trabalho realizado nos espaços sociais em que vivem.
Nesse visão, assumimos as ideias e argumentos de Tardif (2002) que afirma que os
saberes carregam uma carga histórica de vivências e experiências dos sujeitos e reafirmamos
que estes saberes se ressignificam e se transformam no diálogo com outras vivências. Assim,
podemos problematizar, a partir das narrativas dos professores, que, nesse contexto, os
conteúdos e as ações realizadas nos estágios em espaços não escolares são constituídas dos
saberes adquiridos ao longo da vida e no cotidiano de todos os participantes do processo de
formação.
Nessa perspectiva, o educador social assume o papel de orientador dos estagiários
para a realização dos estágios, mas, nesse caso, o educador não é simplesmente aquele que
ensina, mas aquele que é capaz de aprender enquanto ensina, conforme Freire (1993). E, desse
modo, enquanto o educador ultrapassa os limites das atribuições docentes em relação ao
conteúdo e saberá ouvir e orientar aqueles conteúdos que partem daqueles que querem
aprender.
Segundo Ghon (2010), o educador social vai além do aspecto pedagógico, da
disciplina, da metodologia e passa a ser um animador cultural e do grupo porque, a partir do
momento que ele se dispõe a ensinar, é ensinado e pertencido. Nesse pertencimento, ele tem
as condições de orientar as reflexões para alcançar as transformações sociais da comunidade.
A dialogicidade que ocorre nos espaços de educação não formal está para além de
uma conversa informal porque, na relação horizontal entre educador e educando, o diálogo se
constitui no fio condutor da formação na comunidade. O diálogo espontâneo cria o espaço, o
tempo e o lugar, mas não é tudo que pertence ao campo da educação porque pressupõe a
existência de princípios, métodos e metodologias do trabalho educativo. (ALENCAR,
FERREIRA, 2017).
O trabalho educativo do educador social parte de três premissas básicas, segundo
Freire (1993): a elaboração do diagnóstico do problema e suas necessidades, a elaboração
preliminar da proposta de trabalho e o desenvolvimento e complementação do processo de
participação dos membros da comunidade na implementação da proposta.
Por fim, assumimos a compreensão da perspectiva de educação não formal como
aquela que tem como objeto a formação para cidadania e eixo orientador da atividade docente
associada à ideia de cultura, que “consiste em recriar e não repetir. O homem pode fazê-lo
porque tem uma consciência capaz de captar o mundo e transformá-lo”. (Freire, 2007, p. 31).
Portanto, constitui-se um campo rico para desencadear novas e diferentes aprendizagens.
201

f) O Acompanhamento aos estagiários

Neste item, trazemos os argumentos apresentados nas narrativas dos professores


participantes sobre os modos como eles realizam o acompanhamento aos estagiários que estão
na etapa de atividade teórico-prática nos espaços não escolares.
Segundo a narrativa da Professora P1-C, esta etapa constitui-se de vários momentos:
Então, eu acompanho os estagiários desde o primeiro dia que vão a campo.
Apresento eles aos coordenadores ou responsáveis pelo espaço e os deixo no
ambiente, observando toda dinâmica que acontece naquele espaço. [...] Por
ocasião da etapa de regência, eu faço acompanhamento todos os dias.
Observo, converso, oriento o grupo, se percebo algumas dificuldades, e faço
reuniões com aqueles grupos na Universidade para discutir e sugerir outros
modos de agir (P1-C).

Nessa narrativa, a professora P1-C evidencia o cuidado epistemológico da ação


realizada pelos alunos durante o estágio. Um olhar atento de orientação e avaliação do
desempenho acadêmico sem, contudo, interferir imediatamente na tomada de decisão,
alterando o fazer pedagógico. A professora produz uma orientação para uma adequação
coerente da atividade de estágio em relação à articulação teoria e prática, conforme as
necessidades percebidas naquela realidade.
A narrativa de P2-C, igualmente, acompanha a mesma perspectiva apresentada pela
Professora P1-C, conforme excerto a seguir:

[...] acompanhamos a etapa de observação, depois eles [os estagiários]


voltam para a universidade e são acompanhados na elaboração do projeto
que eles vão desenvolver no período de regência. O acompanhamento da
regência é parecido com o da observação, pois a gente vem acompanhando
eles no desenvolvimento das atividades. Diante disso, havendo necessidades,
nós nos reunimos com os grupos antes deles voltarem para a atividade de
intervenção (P2-C).

Nessa narrativa, a professora deixa bem preciso que o acompanhamento da atividade


de estágio constitui-se um instrumento importante e necessário para aferir as potencialidades e
fragilidades apresentadas pelo grupo e, sobretudo, orientar as práticas quando estas
demonstram necessidades de aprimoramento e/ou mudanças conforme a leitura da realidade e
exigências da comunidade.
Nessa mesma perspectiva de acompanhamento das atividades de estágio, as
narrativas de P3-J e P4-J indicam que, diante do trabalho de estágio em espaços não
escolares, optaram por uma metodologia que enfatizava o acompanhamento com base na
202

elaboração e execução dos projetos de extensão. Diante disso, os professores acompanharam e


orientaram a elaboração dos projetos em sala de aula, e também pelo aplicativo WhatsApp,
para orientar os grupos de estagiários.

g) A Avaliação do estágio

A avaliação das ações educativas de estágio, segundo os quatro professores


participantes da pesquisa, acontece durante todas as etapas de realização das ações educativas,
como por exemplo, quando percebem que determinados membros do grupo apresentam
inseguranças ou dificuldades na elaboração da proposta de intervenção pedagógica no espaço
não escolar e, ainda, quando as temáticas planejadas não motivam a participação coletiva das
pessoas atendidas, entre outros aspectos.
Além disso, ao término das atividades no campo do estágio, é feita uma roda de
conversa em que cada aluno expõe seus avanços, fragilidades e percepções acerca da
dinâmica de funcionamento do espaço estagiado, além de trazer argumentos sobre as
contribuições do estágio em espaços não escolares para a formação de cada um dos alunos
estagiários.
É importante trazer, para dialogar com as informações evidenciadas pelos
professores, algumas contribuições acerca dos resultados esperados na realização de um
trabalho educativo, em espaços não escolares, conforme descreve sinteticamente, Gohn
(2010). Para a autora, a educação não formal poderá desenvolver, como resultados, uma série
de processos, tais como:
 Consciência e organização de como agir em grupos coletivos.
 A construção e reconstrução de concepção(ões) de mundo e sobre o
mundo.
 Contribuição para um sentimento de identidade com cada comunidade.
 Formar o indivíduo para a vida e suas adversidades (e não apenas os
capacita para entrar no mercado de trabalho).
 Quando presente em programas com crianças ou jovens adolescentes, a
educação não formal resgata o sentimento de valorização de si próprio [...]
ou seja, dá condições aos indivíduos para desenvolverem sentimentos de
autovalorização, de rejeição de preconceitos que lhe são dirigidos, o desejo
de lutarem para serem reconhecidos como iguais (como seres humanos),
dentro de suas diferenças (raciais, étnicas, religiosas, culturais etc.)
 Os indivíduos adquirem conhecimentos a partir de sua própria prática, os
indivíduos aprendem a ler e interpretar o mundo que os cerca.
 Desenvolver a cultura política do grupo (GOHN, 2010, p. 21).
203

As contribuições apresentadas por Gohn (2010) pontuam alguns aspectos que podem
auxiliar no processo de avaliação das atividades de estágio. Elas estão ligadas aos objetivos,
conteúdos, metodologia e participação qualitativa nas ações oriundas daquele grupo ou
comunidade.

4.6.2 A Prática Pedagógica

Na segunda dimensão, trazemos as contribuições evidenciadas nas narrativas dos


alunos estagiários sobre os elementos que compõem a prática pedagógica que diz respeito à
diferença entre a educação formal e educação não formal na realização do estágio Curricular
VI com foco nos espaços não escolares. Algumas questões quanto à percepção dessas
diferenças existentes entre os espaços estão descritas a seguir.
Todos os estagiários afirmaram, categoricamente, que percebem diferença entre os
espaços e apresentaram vários aspectos em que consistem essas diferenças.
O primeiro deles diz respeito à prática pedagógica, uma vez que, enquanto na
educação formal há uma sequência curricular, nos espaços não escolares, a prática pedagógica
nasce das necessidades e interesses da comunidade e são desenvolvidas por meio de
atividades lúdicas, brincadeiras, dinâmicas diferenciadas, entre outras.
O segundo refere-se às relações intersubjetivas, manifestam-se mais livremente,
numa relação horizontal entre os sujeitos, sem a preocupação com hierarquia e poder, porém
com respeito mútuo, pautado no diálogo entre os envolvidos nos espaços de educação não
formal.
O terceiro diz respeito à questão do tempo destinado à realização das atividades e de
aprendizagens dos sujeitos, já que em espaços de educação não escolares o tempo é destinado
conforme a necessidade da atividade realizada na relação cooperativa de todas as pessoas
envolvidas. Nesta perspectiva das práticas pedagógicas, a atividade teórica/prática que
possibilita de modo indissociável o conhecimento da realidade e o estabelecimento de
finalidades para sua transformação, pois, para “produzir tal transformação não é suficiente a
atividade teórica; é preciso atuar praticamente” (PIMENTA, 2012, P.105).
Em quarto, destaca-se a diferença existente quanto à autonomia dos sujeitos. Essa
evidência é considerada um aspecto muito importante para a realização da prática pedagógica
que toma por base a autonomia dos sujeitos envolvidos no processo de ensinar e de aprender.
No trabalho educativo em espaços não escolares, a autonomia passa pelos modos como os
204

estagiários percebem a realidade e articulam ações que vão ao encontro das expectativas e
interesses daquela comunidade, em diferentes frentes de atuação.
A esse respeito, Gohn (2010), traz uma significativa contribuição:
[...] um dos grandes desafios, na era da Globalização, é a construção e
implementação de processos educativos no interior dos grupos, associações,
movimentos sociais etc. que contemplem a autonomia, que explicitem as
diferenças entre ocupar os espaços públicos somente, e ocupá-los com uma
visão crítica de mundo. É necessário deixar de ser dependente de práticas
políticas do passado. A autonomia deve capacitá-los a inserir-se no contexto
social e a compreender as circunstâncias da existência social, econômica,
cultural e ética da globalização (GOHN, 2010, p.41).

O quinto aspecto diferenciador refere-se às manifestações culturais coletivas e


individuais existentes nos espaços. Esse aspecto considera a necessidade de atenção aos
significados atribuídos às práticas pelos sujeitos porque, às vezes, em espaços rurais e do
campo, as práticas culturais são evidentes e tradicionais, enquanto que na cidade há dispersão
dos grupos, o que pode provocar o apagamento subliminar das manifestações. Por isso, torna-
se necessário reforçar e valorizar as práticas culturais existentes nos diferentes contextos.
O sexto elemento dessa distinção relaciona-se à ausência de avaliação classificatória.
Esta constatação presente na narrativa redimensiona a prática pedagógica, de modo que esta
possa ser entendida como uma avaliação processual em que se destaca o aspecto qualitativo
das aprendizagens, das participações nas ações realizadas por aquela coletividade, mas,
sobretudo, como as aprendizagens produzem mudanças ou transformações na qualidade de
vida dos sujeitos que recebem a ação educativa ali desenvolvida.
A esse respeito, utilizamo-nos das contribuições de Gohn (2010):
[...]o processo político-pedagógico de aprendizagem e produção de saberes
da educação não formal possui várias dimensões, tais como: a aprendizagem
política dos direitos dos indivíduos como cidadãos, ou aprendizagem para a
cidadania; aprendizagem dos indivíduos para atuarem no mundo do trabalho,
por meio da aprendizagem de habilidades e/ou potencialidades em oficinas e
laboratórios (GOHN, 2010, p.35).

Nesses argumentos, Gohn (2010) remete a todos os demais aspectos anteriormente


mencionados, considerando que a prática pedagógica constitui-se um processo político-
pedagógico que coloca os sujeitos no centro das ações, como sujeitos de direitos, ativos,
propositivos e participativos da vida social na sustentação da comunidade.
Por último, essa percepção distintiva entre os ambientes educativos relaciona-se aos
modos de organização e funcionamento dos espaços não escolares. As narrativas apresentam
explicitamente e simbolicamente as diferenças entre os aspectos físicos e estruturais das
instituições escolares e dos espaços não escolares, em que o primeiro possui muros altos,
205

grades nas janelas, rotinas de aprendizagem sequenciadas baseadas no currículo oficial,


enquanto que, no segundo, a organização do trabalho está baseada também na
intencionalidade, mas funciona sob os princípios da igualdade e liberdade entre os sujeitos das
ações ali realizadas.
Ademais, a educação não formal possui algumas características assumidas como
metas que complementam os argumentos e ideias anteriormente explicitadas por Gohn
(2010), das quais listamos as quatro principais:
1. Aprendizado quanto a diferenças – aprende-se a conviver com o outro e
com a diversidade. Socializa-se o respeito mútuo.
2. Adaptação do grupo a diferentes culturas, do indivíduo em relação ao
outro, trabalha o ‘estranhamento’.
3. Construção da identidade coletiva de um grupo;
4. Balizamento de regras éticas relativas às condutas aceitáveis socialmente
(GOHN, 2010, p.44).

Em suma, a diferença entre educação formal e não formal, apontada nas narrativas
dos estagiários, carrega as marcas que caracterizam os saberes concebidos nas vivências e
experiências dos indivíduos nos espaços de educação não formal. As práticas sociais
desenvolvidas naquela coletividade estão carregadas de significados para os sujeitos, portanto,
uma prática político-pedagógica realizada pelos estagiários deve ser revestida do
reconhecimento e do pertencimento naquele grupo social, para que promova uma
aprendizagem comprometida com as expectativas, intenções e relações culturais.
Por fim, para Gohn (2010), será ideal que a educação não formal seja complementar,
não somente no sentido de fazer o que a escola deveria fazer e não o faz, mas ampliar as ações
no sentido de possibilitar o desenvolvimento dos campos de aprendizagens e saberes que lhe
são específicos. Desse modo, o trabalho educativo nos espaços de educação não formal pode,
e deve, ser realizado em conjunto com as escolas.

4.6.2.1 O educador social como articulador de saberes

O educador social é aquele que, enquanto ensina, aprende; e, nesse processo, ele não
é simplesmente um professor, mas orientador, animador, pertencente e pertencido ao grupo
social do qual faz parte.
A sua prática pedagógica está revestida de uma proposta situada na reflexão, ação
das vivências e experiências da comunidade, de modo que os objetivos daquele grupo social
sejam de todos. Portanto, a prática pedagógica torna-se uma prática política e social na
206

medida em que lida com discussões sobre conquistas e garantias de direitos sociais, com
ações cidadãs de formação para o exercício da cidadania, e que traduzam os significados das
práticas culturais.
Nesse sentido, ancorados nas contribuições sobre aprendizagem de conteúdos,
trazidas por Gohn(2010), cabe ao educador social orientar os indivíduos para fazerem a leitura
de mundo do ponto de vista de compreensão do que se passa ao seu redor. É fundamental na
educação não formal, “[...]que a aprendizagem seja o exercício de práticas que capacitam os
indivíduos a se organizarem com objetivos comunitários” (GOHN, 2010, p.35).
Além disso, a prática pedagógica dos alunos estagiários, como educadores sociais,
deve ser voltada para a solução de problemas cotidianos, tais como aqueles que são
levantados no âmbito da participação coletiva nas associações, movimentos sociais e nos
conselhos, de modo que todos os cidadãos pertencentes ao grupo possam fazer uma leitura de
mundo, saber “quem é quem, que projetos e quais interesses cada um defende, quais são os
interesses da maioria que deveriam ser defendidos, quais são as práticas cidadãs e
emancipatórias” (GOHN, 2010, p.35).
Também cabe ao educador social realizar ações que promovam a aprendizagem e
que tenham como enfoque as práticas culturais que possibilitem aos indivíduos fazerem uma
leitura do mundo por meio do “acesso a recursos culturais como museus, bibliotecas, shows,
palestras etc.” (GONH, 2010, p.35).
Em suma, os estagiários, nesse papel de educador social, ao planejarem e executarem
as ações de intervenção pedagógica nos espaços de educação não formal, tiveram o cuidado
de partir da realidade social, dos interesses e necessidades dos grupos sociais e comunidades
onde atuaram para que as práticas, ali desenvolvidas, tivessem o engajamento e participação
daquela comunidade. Nesse sentido, enfocaram ações que envolveram aspectos culturais, tais
como: atividades pedagógicas com datas comemorativas, temáticas sobre afetividade,
agressividade, respeito mútuo, violência social, preconceitos, bullyng, discriminação quanto à
raça, gênero, social, entre outros.
Podemos citar, como exemplo, a temática sobre a violência, em que trataram sobre o
feminicídio na região do Vale do Arinos. Essa atividade, que contou com a participação de
representantes da Polícia e da Câmara Municipal, teve por fim discutir aspectos conceituais
sobre violência doméstica, bem como expor palavras e exemplos de incentivo e valorização
do papel social da mulher nas várias esferas da vida pública. A realização desse evento
demonstra implicitamente a busca, por parte dos estagiários, de respostas quanto ao empenho
do papel do Estado no trato com a política de segurança pública para aquela região, assim
207

como a percepção da necessidade de estimular a manifestação da voz da mulher na busca de


seus direitos.
Do mesmo modo, a criação do parque infantil pelos estagiários na Creche Municipal
Thayná Gabrielly Oliveira Moraes parte da percepção de ausência de políticas públicas
educacionais para o atendimento de necessidades pedagógicas e a omissão do Estado quanto
ao suprimento de tais recursos, o que motivou o grupo de estagiários a realizar um trabalho
voluntário destinado a atender, minimamente, as necessidades das crianças da creche.

4.6.3. Reflexões apresentadas pelos estagiários nos relatórios finais de estágio

As reflexões apresentadas nesta seção constituem-se o resultado do esforço para


perceber e sistematizar os olhares que os estagiários expressaram nos relatórios finais,
envolvendo as experiências e contribuições trazidas ao seu processo formativo por meio do
Estágio Curricular Supervisionado em espaços não escolares.
A sistematização das descrições interpretativas das informações coletadas foi
realizada a partir das considerações trazidas pelos grupos de estagiários, considerando que os
relatórios finais do Curso de Pedagogia do Campus de Cáceres foram produzidos
coletivamente pelos grupos, enquanto que os relatórios relativos ao Campus de Juara foram
produzidos individualmente, embora o estágio também tenha sido feito em grupos, conforme
explicitado a seguir.
As compreensões produzidas pelo grupo de estagiários do Projeto Gonçalinho – G1-
C apontam três aspectos fundamentais na perspectiva das contribuições do estágio. A primeira
refere-se a “uma experiência desafiadora que possibilitou desenvolver um trabalho
diferenciado voltado à construção do conhecimento e que valorizassem os saberes dos
educandos” (G1-C). A segunda elenca que “todas as discussões em sala de aula, leituras de
teóricos foram essenciais no desenvolvimento das atividades de estágio, o que possibilitou
desenvolver uma prática pedagógica baseada nas especificidades e singularidades daquele
grupo” (G1-C). E por fim, “todas as experiências vividas durante [...]o Estágio, contribuíram
significativamente para a nossa formação, cada etapa é um aprendizado novo, é um
amadurecimento pessoal e profissional que adquirimos durante esse processo [...]” (G1-C).
As narrativas destacam o desafio de uma prática pedagógica sob a perspectiva da
produção de conhecimentos e de valorização dos saberes produzidos pelos sujeitos que
participam do projeto; a importância do processo de instrumentalização teórico-prática como
possibilidade de aprendizagem e de pensar práticas pedagógicas alinhadas às necessidades e
208

interesses daquele grupo; e que as vivências e experiências propiciadas pela realização do


estágio em espaços não escolares contribuíram para a formação profissional daqueles
estagiários em formação.
Pimenta (2012) traz argumentos que contribuem com as percepções sobre o estágio
e, sobretudo, sobre as manifestações de conhecimentos expressas nas narrativas, ao afirmar
que o estágio deve ser entendido como um “processo de apreensão da realidade concreta, que
se dá através de observação e experiências, no desenvolvimento de uma atitude
interdisciplinar” (p.87).
A narrativa sobre a experiência desafiadora da prática pedagógica encontra
argumentos em Pimenta (2012, p. 85), para quem a “prática não se restringe ao fazer, ela se
constitui numa atividade de reflexão que enriquece a teoria que lhe deu suporte. O estágio é
um processo criador, de investigação, explicação, interpretação e intervenção”. Desse modo, o
desafio estabelecido para o processo de apreensão e intervenção na realidade torna o trabalho
educativo enriquecedor, mais dinâmico, instigante, que não está pronto, dado ao estagiário,
mas é construído no esforço de apreender e intervir nessa realidade.
As reflexões produzidas pelo grupo de estagiários do Hospital Regional Dr. Antônio
Fontes - G2-C apontam dois aspectos fundamentais na perspectiva das contribuições do
estágio em espaço hospitalar. O primeiro aspecto relaciona-se às possibilidades trazidas pela
realização desse estágio, pois conforme expresso na narrativa trata-se de: “um espaço de
aprendizagem mutual, pois a cada atividade percebíamos a importância da atividade lúdica
pedagógica no ambiente hospitalar”. Em segundo lugar, as estagiárias evidenciaram a
valorização da prática, explicitando, que: “apesar de algumas dificuldades encontradas,
avançamos na concepção de prática ser mais abrangente que a teoria, pois compreendemos a
interrelação entre elas, nos dando subsídios para o nosso processo de formação e
aperfeiçoamento”.
Em relação à percepção da necessidade de uma prática pedagógica que envolve a
brincadeira, a ludicidade, as contribuições de Miranda (2009, p.6458) vão ao encontro das
perspectivas apresentadas pelas estagiárias:
a importância da criatividade e a responsabilidade do pedagogo para atender
individualmente cada criança e/ou adolescente escolar hospitalizado em
variadas idades e condições de saúde exigiu um planejamento diário das
atividades a serem propostas bem como o cuidado na escolha do material e
na forma como ele é utilizado para obter de cada um os melhores resultados
possíveis (MIRANDA, 2009, p.6458).
209

É interessante notar que a prática pedagógica desenvolvida no espaço pedagógico


hospitalar desafia o educador social a pensar ações que, ao tempo em que sejam instigantes,
motivadoras e criativas, também possam “auxiliar no desenvolvimento psicológico,
intelectual, cultural, social e emocional das crianças e adolescentes hospitalizados, bem como
na recuperação mais rápida de sua saúde” (MIRANDA, 2009, p.6458).
O grupo G2 - C ao trazer a narrativa de que “[...]avançamos na concepção de
prática ser mais abrangente que a teoria [...]”, nos impulsiona a produzir uma reflexão acerca
de tal afirmação, considerando que, segundo Vásquez (1968):
A dependência da teoria em relação à prática, e a existência dessa como
últimos fundamentos e finalidades da teoria, evidenciam que a prática –
concebida como uma práxis humana total – tem a primazia sobre a teoria;
mas esse primado, longe de implicar uma contraposição absoluta à teoria,
pressupõe uma íntima vinculação com ela (VÁSQUEZ, 1968, p. 234).

A narrativa apresenta uma ideia de prática que, em nossa compreensão, se manifesta


lacunar, considerando os argumentos de Pimenta (2012) de que “a prática não fala por si
mesma. Exige uma relação teórica com ela (p.106)”. Portanto, a escolha das temáticas
trabalhadas, as metodologias utilizadas, os brinquedos e brincadeiras selecionadas para
realização do estágio pressupõem um suporte teórico para tal finalidade.
Miranda (2009) traz uma significativa contribuição acerca da prática pedagógica em
espaço hospitalar. Para ele,
a metodologia utilizada para o trabalho com as crianças enfermas,
necessariamente, precisava ser variada, porque todos os dias crianças entram
e saem das enfermarias pediátricas, isto é, algumas crianças ficavam um
tempo mais longo de internação, enquanto outras, muitas vezes passavam
pouco tempo no hospital. Todo processo de hospitalização depende da
doença da criança e de seu quadro clínico, além de que, elas têm idades
variadas (MIRANDA, 2009, p.6459).

Nesse sentido, o trabalho educativo em espaço hospitalar contribui para a formação


do pedagogo ao possibilitar diferentes atividades que atendam às necessidades daquelas
crianças e jovens em situação de internação, ou, conforme explicitado pelas estagiárias, o
estágio colabora “dando subsídios para o nosso processo de formação e aperfeiçoamento (G2-
C)”.
As reflexões produzidas pelo grupo de estagiários do Programa Rede Cidadã – G3-C,
por sua vez, apontam três aspectos fundamentais na perspectiva das contribuições do estágio.
As reflexões estão voltadas para a percepção da educação não formal como espaço de
humanização das relações intersubjetivas e de apoio social e cultural, conforme a narrativa a
seguir: “O estágio em espaço não escolar possibilitou um olhar mais sensível para essa
210

modalidade de ensino. As crianças que fazem parte do Programa Rede Cidadã traz consigo
inúmeros desafios que ali no projeto eles encontram forças para superar” (G3-C).
Outro aspecto ao qual atentamos diz respeito ao papel e às contribuições que o
estágio traz para a vida dos estagiários, o que se extrai do seguinte excerto “[...] o estágio se
constitui uma oportunidade de crescermos como seres humanos e profissionalmente e, ainda,
contribuir na formação de vida de cada criança que faz parte do projeto”.
A valorização do espaço de educação não formal fica evidente nessa narrativa: “o
Projeto Rede Cidadã se torna um instrumento de mudança na vida das crianças, para
compreender a realidade em que vivem, despertando o senso crítico [...] e contribuir para
transformar a vida delas e a nossa sociedade”.
A esse respeito, Gohn (2010) apresenta uma importante contribuição acerca do papel
da educação não formal na vida dos sujeitos, uma vez que aquela se constitui na historicidade
humana. De acordo com a autora, “ela capacita os indivíduos a se tornarem cidadãos do
mundo, no mundo. Sua finalidade é abrir janelas de conhecimentos sobre o mundo que
circunda os indivíduos e suas relações sociais” (GOHN, 2010, p.19).
Após a leitura cuidadosa das reflexões produzidas pelo grupo de estagiários da
Creche Municipal Thayná Gabrielly Oliveira Moraes - G1-J também foi possível abstrair
alguns aspectos fundamentais quanto às contribuições do estágio. Quanto à importância do
trabalho em equipe, os estagiários E1-J, E5-J, E6-J e E9-J revelaram que o trabalho em equipe
possibilita aprendizagens e, além disso, auxilia a instituição no desempenho de seu trabalho
pedagógico, ao propiciar a oferta de atividades lúdicas e brincadeiras às crianças que utilizam
a Creche.
Outro aspecto que se evidenciou nas narrativas relaciona-se com as contribuições
do estágio para o crescimento pessoal e profissional, destacado pelo estagiário (E1-J) em sua
narrativa. As questões descritas quanto à dimensão pessoal de tornar-se professor também
atraíram nossa atenção; os estagiários E3-J e E4-J destacam a visão de que o estágio
possibilitou-lhes a reflexão sobre o papel do pedagogo, a responsabilidade social com a
comunidade e sobre a importância dos materiais para as ações educativas.
Em relação à criação e preparação do ambiente pedagógico, considerando o parque
infantil como um espaço de ação pedagógica, os estagiários E7-J e E11-J argumentaram em
suas narrativas que o estágio em espaços não escolares possibilitou que “contribuíssemos de
maneira significativa à instituição e às crianças que ali estudam, por meio de planejamento
que aconteceu em grupo e por todo conhecimento adquirido da realidade da creche” (E7-J).
211

Também apareceu a perspectiva do voluntariado pelos estagiários, uma vez que E8-J
sinalizou que por meio dessas ações “nos tornamos mais humanos. É um momento de
experiência que levamos para nossas vidas, pois através delas podemos nos envolver com
crianças, jovens e idosos que precisam de atenção e um pouco do nosso tempo” (E8-J).
Quanto ao aspecto relativo à articulação entre a teoria e a prática, este foi
apresentado pelo estagiário E10-J, ao abordar a importância de “conhecer as teorias
relacionadas ao desenvolvimento infantil, pois são fundamentais para embasar nossas práticas
pedagógicas[...]” (E 10-J). Tal percepção converge com o entendimento de que, na educação
infantil, o educador social é constantemente desafiado a ampliar seu conhecimento a respeito
de si mesmo, dos outros e do mundo ao seu redor quanto às questões ligadas à infância.
Por fim, os estagiários (E12-J, E13-J) destacaram a importância dos vários espaços
educativos, sejam eles formais ou não formais, pois, segundo o sujeito E12-J, o papel do
educador social “não é só estar em sala de aula, mas sim desempenhar seu papel em qualquer
espaço [...] no qual há um intuito de aprendizagem” (E.12-J). No mesmo sentido, o estagiário
(E13) trouxe a reflexão de que as ações educativas realizadas nos espaços de educação não
formal “complementam a educação escolar, pois os/as envolvidos/as tem a possibilidade de
participar e agir nesse contexto social, no sentido de utilizar e refletir sobre os conhecimentos
adquiridos e transformar a realidade” (E13-J).
Desse modo, o conjunto de reflexões apresentadas nas narrativas dos estagiários, que
atuaram na Creche Municipal Thayná Gabrielly Oliveira Moraes, trazem muitas contribuições
acerca da percepção do papel do estágio e dos processos de ensino e de aprendizagens. No
entanto, mesmo apontando as contribuições e a riqueza das experiências adquiridas durante
esse processo, sentimos a ausência de narrativas que apontam a docência como base da
formação do professor.
Nesse sentido, destacamos que as ações educativas em espaços de educação não
formal devem ser permeadas por práticas pedagógicas que dialoguem com o exercício de
práticas cidadãs, mas que, também, contribuam para um trabalho educativo que tenha na
docência o eixo constitutivo da formação para o processo de tornar-se professor. Assim,
consideramos louvável a atitude do grupo em contribuir com o ambiente da Creche, por meio
da elaboração do parque infantil, utilizando-se de pneus, tintas, madeiras e outras ferramentas,
porém, tal prática não se configura como a atividade fundamental do Estágio Curricular
Supervisionado, mas como um trabalho voluntário.
Finalmente, apresentamos as reflexões produzidas pelo grupo 2–J, de estagiários que
desenvolveram o Projeto “O Protagonismo da mulher e os desafios da sociedade
212

contemporânea”. Neste trabalho educativo, de organização do evento para a cidade de Porto


dos Gaúchos e demais comunidades circunvizinhas, as reflexões produzidas pelo grupo
apontam três aspectos fundamentais na perspectiva das contribuições do estágio.
Em primeiro lugar, na narrativa destacam-se os aspectos vinculados à questão de
gestão administrativa de processos sociais e educacionais, tais como a melhoria da
compreensão sobre o aperfeiçoamento dos processos de aprendizagem por meio de “uma
visão mais crítica sobre uma formação acadêmica vinculada às funções exercidas no cenário
educacional, e aquisição de uma ampla visão sobre cultura organizacional”, em razão da
organização do evento que teve como eixo de discussões e debates a questão do feminicídio
na região. Tal afirmação pode ser ilustrada com a narrativa sobre o dinamismo e interações
produzidas entre os membros do grupo, pois, segundo eles: “aprendemos a conviver em uma
equipe com metas claras e bem estabelecidas, [...] inclusive a lidar com situações inesperadas,
já que o ritmo de trabalho era intenso e as decisões tinham que ser tomadas rapidamente”
(G2-J).
O grupo trouxe em suas reflexões as contribuições que orientaram as ações
educativas realizadas na organização do evento, citando, para tanto, Hernandez e Ventura
(2011), os quais defendem “que os projetos são possibilidades metodológicas que, por meio
de relações significativas, exploram temas diversos buscando a resolução de problemas, de
dificuldades e de necessidades”. (HERNANDEZ E VENTURA, 2011, p.56).
Além do mais, afirmaram que o estágio oportunizou a complementação e o
aperfeiçoamento da formação acadêmica, “adquirir experiências profissionais e pessoais. [...]
e vivenciar os resultados apontados no projeto e o quanto isso foi gratificante” (G2-J).
As narrativas pontuaram aspectos considerados importantes para o campo da
educação não formal que encontram ancoragem nas contribuições e argumentos de
Gohn(2010), tais como:
 Consciência e organização de como agir em grupos coletivos.
 A construção e reconstrução de concepção(ões) de mundo e sobre o
mundo.
 Contribuição para um sentimento de identidade com cada comunidade.
 Forma o indivíduo para a vida e suas adversidades (e não apenas os
capacita para entrar no mercado de trabalho).
 Quando presente em programas com crianças ou jovens adolescentes, a
educação não formal resgata o sentimento de valorização de si próprio [...]
ou seja, dá condições aos indivíduos para desenvolverem sentimentos de
autovalorização, de rejeição de preconceitos que lhe são dirigidos, o desejo
de lutarem para serem reconhecidos como iguais (como seres humanos),
dentro de suas diferenças (raciais, étnicas, religiosas, culturais etc.)
 Os indivíduos adquirem conhecimentos a partir de sua própria prática, os
indivíduos aprendem a ler e interpretar o mundo que os cerca.
213

 Desenvolver a cultura política do grupo (GOHN, 2010, 20-21).

Em suma, as leituras, interpretações e análises feitas constituem-se de algumas


possibilidades para compreensão do objeto de pesquisa e ponto de partida para desencadear
novas investigações sobre o Estágio Curricular Supervisionado como o lugar, por excelência,
de realização da práxis pedagógica.
214

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na realização desta pesquisa sobre o Estágio Curricular Supervisionado e a práxis


pedagógica em espaços não escolares como possibilidade de apropriação e (re)construção dos
saberes docentes nos cursos de Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara, da Universidade do
Estado de Mato Grosso, tomamos como fio condutor a seguinte situação problematizadora: os
modos como se constitui a relação teoria/prática nos espaços de educação não formal,
possibilitam a apropriação e (re)construção de saberes da profissão docente?
A partir de tal questão, apresentamos as contribuições advindas das leituras de
autores que produziram o diálogo com as informações oriundas da análise documental, da
observação participante e das entrevistas realizadas com os professores e alunos,
acompanhadas de nossas inferências ancoradas nas leituras de mundo, trabalho e vida
derivadas de nossas vivências e experiências, para as conclusões que ora chegamos.
Nessa caminhada, algumas preocupações emergiram no contexto da investigação,
assim como apontamentos sugestivos de outras possibilidades no campo de realização do
estágio, as quais possibilitam aliar ações educativas ancoradas na docência com atividades na
perspectiva extensionista. Somos cientes de que as proposições, interpretações e reflexões
foram produzidas tomando, pelo todo, recortes de uma realidade e que, em razão disso,
podem apresentar-se limitadas pela delimitação do contexto espaço-temporal a que pertencem
e pelas lentes e perspectivas teóricas assumidas.
A preocupação inicial esteve relacionada à opção teórico metodológica baseada na
observação participante, sobretudo, no curso de Cáceres, pelas relações de proximidades
existentes em razão do trabalho que realizamos como docente no Curso. No entanto, à medida
que iniciamos a pesquisa propriamente dita e mergulhamos nas atividades dos sujeitos
participantes como uma necessidade e premissa central da metodologia selecionada, a
aproximação manifestou-se naturalmente, embora, nas interações feitas, tenhamos procurado
registrar as observações com o mínimo de interferência possível.
O Curso de Pedagogia da UNEMAT/Campus de Cáceres registra uma experiência de
Estágio Curricular Supervisionado em sua existência desde o ano de 1986, enquanto que o
Curso de Juara, desde 2003. Entretanto, as inferências feitas em relação ao Estágio Curricular
Supervisionado em espaços não escolares e à práxis pedagógica, no que se refere às linhas
gerais de concepções, orientações e legislações específicas internas relacionadas a essas
práticas, limitam-se à disciplina mencionada, no conjunto dos dois cursos de Pedagogia da
215

UNEMAT, no Projeto Pedagógico atual, como consequência da reformulação curricular do


Curso nos campi de Cáceres e Juara conforme preceitos da Resolução CNE/CP nº 01/2006.
A disciplina de Estágio Curricular Supervisionado com foco em espaços não
escolares, no atual projeto pedagógico do Curso de Pedagogia, dispõe de uma carga horária de
60 horas, em razão de ter ocorrido uma redução de 60 horas, em relação ao curso anterior,
para se adequar às exigências contidas na Resolução do CNE/CP, nº 01/2006, que institui as
diretrizes nacionais para o Curso de Pedagogia, compondo o conjunto de disciplinas e campos
de conhecimento dispostos na atual matriz curricular.
Embora tenha sido criada a disciplina de Gestão da Educação em Espaços Escolares
e Não Escolares, no PPC atual, a redução de carga horária de estágio, em nosso entendimento,
contribuiu para o empobrecimento de possibilidades de aprendizagens, vivências e
experiências acerca da educação em espaços não escolares.
Assim, a intencionalidade dessa pesquisa em compreender o estágio e a práxis
educativa em espaços não escolares no contexto da formação inicial de professores, como
espaço de apropriação e (re) construção de saberes docentes que emergem da ação educativa
das pessoas envolvidas no estágio, permitiu-nos vislumbrar vários aspectos fundamentais:
 O fortalecimento das relações entre Universidade e as instituições educativas
não escolares, de maneira que as ações educativas se consolidem como
possibilidade de aprendizagens e de ampliação de campo de atuação do
pedagogo;
 O reconhecimento de que o estágio se constitui como o campo que faculta a
confluência dos vários saberes das diferentes áreas de conhecimentos e das
disciplinas que compõem o Curso;
 Possibilidade de acesso e realização de ações educativas em que parte da
problematização da realidade social de determinados grupos sociais e/ou
comunidades, aliadas às experiências e vivências dos sujeitos, oportunizam a
aquisição, a produção e a ressignificação de saberes aos envolvidos no
processo de ensino e de aprendizagem;
 A atividade docente na perspectiva da formação para a cidadania ampliou a
maneira como os estagiários enxergam o modo como os grupos sociais e
comunidade se organizam, participam, unem-se em torno de objetivos e
interesses comuns e, sobretudo como lutam para alcançar tais objetivos;
216

 Possibilidade de percepção e participação dos estagiários em outras formas de


conceber, organizar e executar as práticas pedagógicas que enfocam
conhecimentos e saberes oriundos do mundo vivido dos sujeitos.
 Aprendizagens na perspectiva do acesso e garantia de direitos sociais, justiça e
equidade como instrumento de luta e promoção humana que se constitui como
componente basilar da vida daquele grupo;
 Metodologias que se pautam no diálogo como propulsor de aprendizagens
coletivas;
 Campos de conhecimento que contribuem com a formação inicial e preparação
para o exercício profissional docente.
 Articulação da teoria/prática de ações educativas.

Por outro lado, nessa investigação foi possível perceber algumas lacunas e/ou
fragilidades nas práticas pedagógicas de estágio:
 Ausência ou pouca oferta de Espaços não escolares disponíveis para a
realização de estágio;
 Ausência de retorno formal da Universidade aos espaços não escolares com
disponibilidade de monitores e/ou estagiários em parceria temporária ou
permanente, de modo a contribuir com as ações educativas desenvolvidas por
instituições, como é o caso de hospitais;
 Ausência de promoção de cursos de formação para os educadores sociais que
atuam nos espaços parceiros;
 Não disponibilidade de cursos, oficinas e laboratório que produzam o acesso
e a socialização de saberes, tais como: aprendizagem musical, pintura,
artesanato, uso da internet e equipamentos, programas e aplicativos
eletrônicos, construção de blogs, dentre outros, ao longo do ano letivo;
 Inexistência de produção e sistematização de materiais (in)formativos sobre
possíveis práticas realizadas em espaços de educação não formal que possam
contribuir e desencadear novos saberes;
 Ampliação das atribuições para o pedagogo na Resolução do CNE/CP nº
01/2006 que ocasiona uma demanda de campos de conhecimento ao Curso de
Pedagogia que dificulta o aprofundamento dos estudos, sobretudo no que diz
respeito aos espaços de educação não formal.
217

Outro fato que igualmente nos instigou refere-se à percepção da necessidade de


discutir no âmbito da Universidade do Estado de Mato Grosso uma parceria institucional, no
sentido de ocupar o espaço com estagiários bolsistas durante o ano letivo. Esses são caminhos
que vislumbram desencadear novas parcerias e trabalhos coletivos em prol das crianças,
adolescentes e jovens hospitalizados e que, em tal situação, possam ter garantido o acesso à
educação, sem prejuízo de sua vida escolar.
As evidências sobre a concepção de formação inicial do pedagogo, oriundas das
Diretrizes Curriculares de 2006, apresentam-se da seguinte maneira:
O Curso de Pedagogia é concebido como licenciatura.
O Art. 4º da Resolução do CNE/CP nº 01/2006 reitera que o curso de Licenciatura
em Pedagogia destina-se à formação de licenciados para
exercer funções de magistério tanto na Educação Infantil quanto nos anos
iniciais do Ensino Fundamental, além dos cursos de Ensino Médio, na
modalidade Normal, e ainda, a Educação Profissional na área de serviços e
apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos
pedagógicos (BRASIL, 2006).

Outro aspecto que se destaca está vinculado à concepção de docência:


como ação educativa e processo pedagógico metódico e intencional,
construído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas, aos quais
influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia, desenvolvendo-
se na articulação entre conhecimentos científicos e culturais, valores éticos e
estéticos inerentes a processos de aprendizagem, de socialização e de
construção do conhecimento, no âmbito do diálogo entre diferentes visões de
mundo (BRASIL, 2006).

A concepção de docência explicitada tanto na Resolução do CNE/CP nº 01/2006


quantos nos PPCs dos Cursos de Pedagogia de Cáceres e de Juara evidencia um fazer
pedagógico que articula o caráter político do processo de ensino e de aprendizagem com o
formativo numa perspectiva científica e técnica que seja capaz de produzir saberes na
formação inicial oriundos da academia, em consonância com aqueles que advêm da prática
social, em estreita vinculação com as relações intersubjetivas produtoras de saberes, nas
diferentes dimensões da ação educativa em espaços de educação formal e não formal.
Desse modo, no processo de simbiose entre a ação educativa e o processo
pedagógico, nessa perspectiva de docência, evidencia-se a questão de práxis como uma
ação produzida histórica e socialmente.
Entre as evidências encontradas nos referenciais teóricos em relação à formação
inicial, profissionalidade e a constituição da identidade profissional, tendo a práxis
218

pedagógica como o elemento propulsor da formação do pedagogo, destacam-se os pontos


elencados na sequência.
A Resolução do CNE/CP nº 01/2006 evidencia que a docência requer uma nova
compreensão da dimensão pedagógica, que envolve a gestão e a administração dos fazeres
constituídos no trabalho docente. Isso significa dizer que a docência dialoga com a teoria e
a prática, de modo a atender os anseios que emergem das coletividades dos diferentes
espaços educativos.
O educador social, na sua práxis pedagógica, trabalha as dimensões do ensino,
pesquisa e extensão, que atendem às várias áreas produtoras de conhecimento, que se
manifestam de maneira indissociável ao ensino. Dessa forma, efetiva-se a pesquisa e
também a extensão, pois entende-se que estas são interdependentes e simultâneas. Ao
dimensionar o ensino, pressupõe-se uma compreensão da pesquisa e da extensão, assim
como nos explicita Freire (2015, p.30): “não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem
ensino”.
As evidências encontradas sobre as práticas pedagógicas e a constituição de saberes
docentes que se destacam durante a realização do Estágio foram:
 A prática docente, nos espaços não escolares, constitui-se um processo de
desafio para todos os participantes, em busca da compreensão dos contextos
em que estão inseridos, a partir dos problemas e das necessidades geradas na
comunidade, para que possam produzir os saberes necessários a esta última.
Por essa razão, os Educadores Sociais junto às coletividades são protagonistas
na dinamização e construção de um processo participativo em que o diálogo
tematizado constitui-se o fio condutor da formação, e deve estar pautado por
metodologias e princípios teóricos orientadores das ações educativas que
priorizem os saberes produzidos nas lutas cotidianas no contexto da realidade
social e cultural para desencadearem novos saberes;
 A prática educativa realiza-se numa perspectiva de trabalho comunitário,
numa via de mão-dupla que, enquanto ensina, aprende e, ao aprender,
também ensina. Nesse processo, torna-se possível problematizar as práticas
cotidianas à luz dos conhecimentos experienciais e pedagógicos, permeados
por todos os demais saberes que se fizerem necessários à ressignificação dos
saberes coletivamente produzidos;
 O fazer pedagógico parte de temas geradores que emergem da percepção dos
sujeitos da comunidade que não se manifestam de maneira aleatória, pois,
219

coletivamente, são selecionados, trabalhados e relacionam-se com a vida


cotidiana.
A descrição analítica acerca dos aspectos relativos à articulação da teoria à prática no
currículo do curso de Pedagogia apontam para os seguintes aspectos:
 A articulação da teoria à prática constrói-se a partir do enfrentamento que se
dá entre as teorias e as práticas e, desse enfrentamento, resulta uma reflexão
constante das práticas nesse contexto e que, por conseguinte, produz novas
teorias;
 A identidade profissional realiza-se tomando como base os significados
atribuídos pelos sujeitos envolvidos no processo formativo a partir do seu
envolvimento, do seu modo de ser e se constituir enquanto professor,
enquanto ator e autor. Esse modo de situar-se no mundo a partir de suas
vivências com os outros, na sua condição de sujeito com seus
questionamentos, seus desejos, seus saberes é que significam o ser professor.
Podemos ilustrar tais argumentos nas interações com outros professores, nos
sindicatos, nos espaços não escolares, associações, dentre outros.
A interpretação das manifestações de apropriação e (re)construção dos saberes
docentes a partir do estágio curricular supervisionado no curso de Pedagogia apresentaram-se
da seguinte maneira:
 Os saberes docentes são concebidos como saberes plurais e integram os
diferentes saberes com os quais os docentes mantêm diferentes relações na
prática educativa, sejam eles provenientes da formação profissional, de
saberes disciplinares, dos saberes curriculares ou dos saberes experienciais;
 Os saberes são produzidos coletivamente nas interações entre os sujeitos,
extrapolam aqueles saberes curriculares, disciplinares e contemplam aqueles
saberes denominados sociais que são oriundos de sua história de vida e de
suas vivências e experiências.
Assumimos, neste estudo, a perspectiva de democratização do conhecimento nos
vários grupos sociais e comunidade como possibilidade de emancipação dos sujeitos. Assim,
ancoramos a nossa compreensão das práticas realizadas nos espaços não escolares na
perspectiva da educação não formal como “um processo sociopolítico, cultural e pedagógico
de formação para a cidadania, entendendo o político como a formação do indivíduo para
interagir com o outro em sociedade” (GOHN, 2010, p.33).
220

Tais argumentos ancoram-se nas reflexões produzidas pelos professores e estagiários


sobre as contribuições trazidas pelas vivências e experiências na realização do estágio em
espaços não escolares como novos aprendizados, percepções e reflexões que os auxiliaram no
processo de constituição do tornar-se professor.
Em suma, a investigação nos possibilitou compreender que o Estágio Curricular
Supervisionado nos espaços de educação não formal constitui-se o campo e lugar em que é
possível articular a teoria e a prática, por meio da construção de saberes docentes, realizados
pelos estudantes, por meio de sua prática educativa em situações de estágio e, além disso,
oportuniza, por meio da práxis pedagógica, a apropriação e (re)construção de saberes da
profissão docente.
Concluindo, encaminhamo-nos para a finalização desta tese com a clareza de que os
caminhos percorridos na realização da pesquisa, por meio das leituras, interpretações e
análises aqui apresentadas acerca do Estágio Curricular Supervisionado em espaços não
escolares nos Cursos de Pedagogia da UNEMAT/Campus de Cáceres e Juara não são, nem
pretendem ser respostas fechadas, mas um caminho para possíveis diálogos com outras
interpretações e outros olhares sobre o tema.
221

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UNEMAT. Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia, a ser


executado no Campus Universitário “Jane Vanini” no município de Cáceres-MT

UNEMAT. Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Pedagogia, Campus


Universitário de Juara da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT.

UNEMAT. Projeto Pedagógico de Estágio do Curso de Licenciatura Plena em


Pedagogia, do Campus Universitário “Jane Vanini” no município de Cáceres-MT

VASCONCELLOS, C. S. Planejamento: projeto de ensino-aprendizagem e projeto político


pedagógico. 9 ed. São Paulo: Libertad, 2000.

ZABALA, Antoni. A prática educativa: como ensinar. Porto Alegre: Artmed, 1998.
Tradução Ernani F da F. Rosa)
225

APÊNDICE A - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO


INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA: ORGANIZAÇÃO, FORMAÇÃO E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Você está sendo convidado (a) para participar, como voluntário (a), em uma
pesquisa. Após ser informado (a) e, no caso de aceitar, assine ao final deste documento, que
está em duas vias. Uma delas é sua e a outra da pesquisadora. Em caso de recusa você não
terá nenhum prejuízo, tampouco sofrerá penalizações.

INFORMAÇÕES SOBRE A PESQUISA:


Tema do projeto: ESTÁGIO CURRICULAR E PRÁXIS PEDAGÓGICA EM
ESPAÇOS NÃO ESCOLARES: A CONSTRUÇÃO DE SABERES DOCENTES NOS
CURSOS DE PEDAGOGIA DA UNEMAT
Pesquisadora responsável: Rosalva Pereira de Alencar – Doutoranda do Programa
de Pós Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT),
telefone nº (65) 9 9606-9463, e-mail: rosalvalencar@gmail.com
O Projeto de Pesquisa ESTÁGIO CURRICULAR E PRÁXIS PEDAGÓGICA EM
ESPAÇOS NÃO ESCOLARES: A CONSTRUÇÃO DE SABERES DOCENTES NOS
CURSOS DE PEDAGOGIA DA UNEMAT é uma proposta do doutoramento em educação,
na Universidade Federal de Mato Grosso, na Linha de Pesquisa: Organização, Formação e
Práticas Pedagógicas sob a Orientação da Professora Dra. Kátia Morosov Alonso.
Justificativa da pesquisa: Esta pesquisa tem como objeto de estudo o estágio
curricular supervisionado e a práxis pedagógica em espaços não escolares, como espaço de
apropriação, construção e (re)construção dos saberes docentes no curso de Pedagogia dos
Campi de Cáceres e Juara, da Universidade do Estado de Mato Grosso. Esse enfoque surge da
seguinte situação problematizadora: a relação teoria-prática diferencia-se e constitui-se de
outra maneira nos espaços de educação não formal?
226

Partimos da compreensão de que o Estágio Supervisionado constitui um campo de


(re)construção de saber que integra o processo de formação do aluno, futuro profissional, e
que toma os espaços educativos não formais como objeto de análise, de investigação e de
interpretação crítica da realidade, a partir dos nexos com as disciplinas do curso.
Objetivo da pesquisa: Compreender o estágio e a práxis educativa em espaços não
escolares no contexto da formação inicial, como espaço de apropriação, construção e (re)
construção de saberes docentes que emergem da ação educativa das pessoas envolvidas no
estágio.
Esclarecimento sobre a pesquisa:
• A abordagem metodológica sustenta-se na perspectiva qualitativa, aqui entendida
como uma prática que possibilita ao pesquisador situar-se no mundo com o outro que
será o seu interlocutor e considera que as manifestações, saberes, valores,
habilidades, culturas consistem em práticas materiais que são construídas pelos
sujeitos e percebidas pelo pesquisador;
• Utilizaremos da observação participante com os professores e alunos em situação de
estágio durante a realização de suas práticas, e também de entrevistas com os 04
professores que atuam na disciplina de Estágio Curricular Supervisionado com foco
em espaços não escolares, sendo 2 professores de cada curso/campus, bem como
com os alunos, com intuito de complementar as observações e dar maior evidência às
suas percepções da atividade docente no estágio;
• Neste processo, utilizaremos anotações de campo, fotografias e de gravações de
áudios, com a finalidade de compreender a constituição do fazer pedagógico, bem
como o que há de comum e diferente ou inovador entre os cursos e práticas;
• A entrevista será realizada com gravador de voz com os alunos(as) e professores, em
encontros marcados previamente, no local considerado mais apropriados pelos
interlocutores. No final, os arquivos das gravações não serão armazenados.
• À medida que for realizada a interpretação dos dados, poderá ocorrer a necessidade
de novas conversas a fim de completar informações.
• As informações coletadas por meio da observação participante e das entrevistas,
serão publicadas na pesquisa, em eventos científicos, revistas, bem como no relatório
final da pesquisa.
Desconfortos e riscos: A Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, em
suas diretrizes e normas para pesquisa com seres humanos indica: "V - Toda pesquisa com
seres humanos envolve risco em tipos e gradações variados".
227

Assim, considerando o procedimento de coleta de dados, há os seguintes riscos,


ainda que mínimos:
• invasão de privacidade;
• quebra da confidencialidade das informações coletadas;
• alteração em relação às concepções de mundo e de comportamentos em razão de
reflexões eventualmente realizadas;
• desconforto, cansaço, constrangimento e alterações comportamentais durante a coleta
de informações;
• interferências na rotina dos participantes;
• danos aos documentos elaborados pelos participantes (plano de ensino, proposta
pedagógica, relatório final de estágio, texto do seminário integrador etc.);

Mitigação de riscos e desconfortos: Com o intuito de evitar possíveis riscos/danos,


serão adotadas as seguintes providências e cuidados éticos:
• será garantida a confidencialidade das informações coletadas e, em caso de
necessidade, tais dados poderão ser retornadas aos entrevistados, de modo que lhe
sejam assegurados o direito de ler, de discordar ou modificar as informações
prestadas;
• o registro das informações coletadas serão identificadas por letras do alfabeto, de
forma que a identidade dos interlocutores seja inteiramente resguardada;
• para além do respeito a valores culturais, sociais, hábitos e costumes dos
participantes, a entrevista será orientada por roteiro semiestruturado e que
possibilitará àqueles falarem livremente sobre suas concepções, saberes e
experiências;
• será assegurado aos participantes a escolha do local e horário para que sejam
ouvidos, bem como a possibilidade de interrupções, retomadas em outras
oportunidades, em caso de concordância dos entrevistados, e a desistência destes
quanto à participação;
• a pesquisadora estará atenta aos sinais verbais e não verbais de desconforto
manifestados pelos sujeitos, a fim de que esta situação rapidamente seja dissipada;
• proteção da imagem (fotografias), garantindo a não utilização de tais registros em
prejuízo das pessoas e/ou dos grupos de estagiários, inclusive em termos de
autoestima, de prestígio social ou intelectual. Destacamos que as imagens referir-se-
ão aos espaços físicos e aos estagiários durante o desenvolvimento da prática
228

pedagógica, excluindo-se dos registros os participantes dos espaços não escolares,


em especial os menores de idade;
• a observação participante será feita de modo que o respeito às diferentes
manifestações dos sujeitos em relação às concepções de educação, saberes, práxis
pedagógicas dentre outras ações educativas, sejam asseguradas;
• não violação e respeito à integridade de eventuais documentos (danos físicos, cópias,
rasuras) elaborados pelos participantes, tais como plano de ensino, proposta
pedagógica, relatório final de estágio, texto do seminário integrador, de modo que as
informações neles contidas sejam utilizadas sem prejuízos às ideias originais;
• a pesquisadora manterá, nos limites do objetivo da pesquisa e sem o intuito de
provocar quaisquer influências, um contato prévio com as turmas para a criação de
uma amistosidade, relação de confiança e credibilidade, de maneira que sejam
minimizados riscos de desconfortos, constrangimentos ou alterações de
comportamento, sobretudo durante as gravações de áudio;
• não serão adotados pela pesquisadora comportamentos e ações que criem,
mantenham ou ampliem situações de risco, constrangimentos ou danos para os
participantes, tampouco que propiciem ou acentuem situações ou circunstâncias que
evidenciem estigma, preconceito ou discriminação.

Ressarcimento e indenização: A participação no estudo não acarretará custos


para você e, desse modo, não implicará qualquer compensação financeira. Todavia, em casos
de danos, comprovadamente decorrentes da participação na pesquisa, o participante poderá
pleitear o recebimento de indenização.
Benefícios: Considerados os objetivos do estudo, poderão não existir ou serem de
pouca expressividade os benefícios diretos aos participantes da pesquisa. Todavia, o
conhecimento gerado propiciará, de modo indireto e a longo prazo, benefícios que superam,
potencialmente, possíveis desconfortos causados pela pesquisa.
O estudo poderá propiciar reflexões; a criação de grupos de estudos, pesquisa e
extensão; produções bibliográficas e seu posterior acesso pela comunidade; contribuir para a
formação e produção de saberes pelos professores que atuam no campo do Estágio
supervisionado, bem como para o fortalecimento da relação da educação não formal e a
educação escolarizada produzidas no âmbito da Universidade do Estado de Mato Grosso e nos
vários espaços educativos.
229

Os saberes produzidos nesta pesquisa poderão, ainda, fornecer, de forma direta e


indireta, dados e informações imprescindíveis para novas pesquisas no campo do estágio
Supervisionado, bem como para a formação inicial e continuada de professores.
Informações sobre o TCLE e liberdade de recusa: O presente documento tem por
objetivo assegurar o mais completo esclarecimento sobre a pesquisa, de modo que a anuência
para a participação seja voluntária e livre de vícios (simulação, fraude ou erro). Por isso, você
poderá recusar-se a participar, retirar seu consentimento ou interromper a participação a
qualquer momento. A recusa ou a interrupção da participação na pesquisa não acarretarão
quaisquer penalidades ou prejuízos.
Em caso de aceitação do convite, todas as páginas do TCLE serão rubricadas pela
pesquisadora responsável e por você em duas vias iguais. Após, uma via ficará com a
pesquisadora e a outra com você. Guarde cuidadosamente a sua via, pois esse documento traz
importantes informações de contato e garante seus direitos como participante da pesquisa.
Dúvidas e garantia de esclarecimento: você tem o direito de receber esclarecimentos
sobre quaisquer aspectos da pesquisa. Em caso de dúvidas quanto ao estudo ou quanto a sua
condução ética, você poderá contatar: a pesquisadora pelo telefone (65) 9 9606-9463 e pelo e-
mail: rosalvalencar@gmail.com; o Programa de Pós Graduação em Educação da
Universidade Federal de Mato Grosso, situado na Av. Fernando Corrêa da Costa, nº 2.367,
Bairro Boa Esperança, Cuiabá/MT, telefone (65) 3615-8431; o Comitê de Ética em
Pesquisa/Humanidades/UFMT, coordenado pela Profa. Dra. Rosangela Kátia Sanches
Mazzorana Ribeiro, situado na Av. Fernando Corrêa da Costa, nº 2.367 – Instituto de
Educação, 1º Andar – Sala 31, Cidade Universitária, Bairro Boa Esperança, Cuiabá/MT, CEP
78060-900, com horário de funcionamento das 14:00 às 18:00 horas, telefone: (65) 3615-
8935, e-mail: cephumanas@ufmt.br; e/ou a Comissão Nacional de Ética em
Pesquisa/CONEP, situada no endereço SRNTV 701, Via W 5 Norte – Edifício PO 700, 3º
Andar, Asa Norte, Brasília/DF, CEP 70.719-049, com horário de funcionamento das 08:00 às
18:00 horas, telefone (61) 3315-5877, e-mail: conep@saude.gov.br
O Comitê de Ética é um órgão colegiado interdisciplinar e independente, de relevância
pública, de caráter consultivo, deliberativo e educativo, que tem por objetivo defender os
interesses dos participantes da pesquisa em sua integridade e dignidade e contribuir para o
desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos.
A CONEP, por sua vez, é uma instância colegiada, de natureza consultiva,
deliberativa, normativa, educativa e independente, vinculada ao Conselho Nacional de
Saúde/MS e que tem, entre outras funções, examinar os aspectos éticos da pesquisa
230

envolvendo seres humanos, analisando, quando pertinente, os respectivos protocolos e sobre


eles emitindo pareceres.

Consentimento do participante da pesquisa

Eu ________________________________________________________concordo
em participar da pesquisa “ESTÁGIO CURRICULAR E PRÁXIS PEDAGÓGICA EM
ESPAÇOS NÃO ESCOLARES: A CONSTRUÇÃO DE SABERES DOCENTES NOS
CURSOS DE PEDAGOGIA DA UNEMAT”. Como participante da pesquisa entendo que
terei garantia de confidencialidade, ou seja, que apenas dados consolidados serão divulgados.
Entendo, também, que tenho direito de receber informações adicionais sobre o estudo a
qualquer momento, mantendo contato com a pesquisadora principal. Fui informado, ainda,
que a minha participação é voluntária e que se eu preferir não participar ou deixar de
participar deste estudo em qualquer momento, isso não me acarretará qualquer tipo de
penalidade.
Após o conhecimento do teor da pesquisa e concordância em responder as perguntas a
mim formuladas, autorizo a pesquisadora, regularmente vinculada a este estudo, a fazer uso
científico das informações obtidas. Ademais, quanto às imagens para ilustrar a prática
pedagógica:

Autorizo o uso da minha imagem;

Não autorizo o uso da minha imagem.

Assim, compreendendo tudo que me foi explicado sobre o estudo a que se refere este
documento, concordo em participar da pesquisa e declaro que assinei duas vias deste termo,
ficando com uma delas em meu poder.
.
Assinatura dermatoglifo
Assinatura do participante:__________________________________________

A pesquisadora responsável, que também assina esse documento, assegura ter


cumprido as exigências da Resolução CNS nº 466/2012 e complementares na elaboração do
protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Assegura,
também, ter explicado e fornecido uma cópia deste documento ao participante e informa que o
231

estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado e pela CONEP, quando
pertinente. Comprometo-me, por fim, a utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa
exclusivamente para as finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento
dado pelo participante, conduzindo a pesquisa de acordo com o que preconiza a Resolução
acima indicada.

Assinatura do Pesquisador Principal


(Coordenador do Projeto de
Pesquisa):______________________________________

Observações complementares:____________________________________________

_____________________________, _________ de ___________________ de 2018.


232

APÊNDICE B - INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

1. INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

1.1 . ENTREVISTA COM ACADÊMICOS(AS)

A entrevista possui um delineamento semi-estruturado e possibilitará aos participantes


manifestar-se livremente na relação intersubjetiva, em um clima de confiança e liberdade.
Será realizada com 02 grupos de alunos regularmente matriculados e que cursam a
disciplina de Estágio Curricular Supervisionado em espaço não escolares, dos cursos de
Pedagogia dos Campi de Cáceres e Juara, abrangendo ao todo, uma amostragem de quatro
grupos, que serão totalizado o número de participantes por ocasião da realização do estágio.
Será composta de questões abertas que possibilitam aos interlocutores produzir um diálogo
tranquilo, acerca das concepções de estágio, práxis pedagógica e saberes docentes.
Desse modo, a entrevista enfocará os seguintes aspectos:
1.IDENTIFICAÇÃO: nome, data de nascimento, lugar onde nasceu, onde reside e onde
trabalha, (opcional)

2. ATUAÇÃO PROFISSIONAL: área que atua, e/ou pretende atuar;

3. NARRATIVAS SOBRE AS PERCEPÇÕES DO PROCESSO EDUCATIVO EM


ESPAÇOS NÃO ESCOLARES

 Você percebe diferença do processo educativo em espaços escolares e não


escolares? Se você percebe, em que sentido?
 Como se dá a relação professor/aluno/prática pedagógica?
 Que dinâmica se estabelece nos espaços educativos não formais em relação teoria
e prática? Há diferença nos espaços educativos formais e não formais?
 Argumente sobre as contribuições do estágio supervisionado em espaços não
escolares para a formação, considerando os vários saberes educativos?
233

1.2. ENTREVISTA COM PROFESSORES(AS)

A entrevista possui um delineamento semi-estruturado e possibilitará aos participantes


manifestar-se livremente na relação intersubjetiva, em um clima de confiança e liberdade.
Será realizada com 02 professores(as) que ministram a disciplina de Estágio
Curricular Supervisionado em espaço não escolares, dos cursos de Pedagogia dos Campi de
Cáceres e Juara, abrangendo ao todo, uma amostragem de quatro professores(as). Será
composta de questões abertas que possibilitam aos interlocutores produzir um diálogo
tranquilo, acerca das concepções de estágio, práxis pedagógica e saberes docentes.
Desse modo, a entrevista, enfocará os seguintes aspectos:
I – Identificação;
II – Formação;
III – Tempo de Magistério (um pequeno histórico de seu percurso profissional);
IV – organização do trabalho pedagógico:
Como se dá a formação dos alunos por meio da instrumentalização teórico-prática
com vista a apropriação, construção e (re)construção de saberes docentes;
O que se leva em consideração na elaboração do planejamento?
Como é feito o planejamento de estágio, considerando a constituição e construção de
saberes nos vários espaços educativos?
Como se dá o processo de seleção de espaços não escolares para a realização de
estágio?
Como tem sido feito o acompanhamento dos estagiários?
Como são selecionados e/ou indicados os estagiários para os espaços?
Que aspectos são considerados na observação, elaboração e execução da proposta
pedagógica no espaço educativo não escolar?
Quais as principais fontes utilizadas para o processo de formação e
instrumentalização teórico-prática?
234

2. ROTEIRO PRELIMINAR PARA OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

A observação participante, por suas características e delineamento, não possui um roteiro


prévio, considerando que as ações educativas vão se revelando à medida em que vão se
constituindo e se reconstruindo no fazer pedagógico. No entanto, delimitamos alguns aspectos
balizadores do processo de observação:

a) Será que a relação teoria-prática se diferencia e se constitui de maneira diferente no


espaço de educação não formal do formal?
b) Pensando-se na questão da práxis pedagógica, há um diálogo entre o professor e o
aluno, como resultado do processo de formação que seja capaz de produzir uma
reflexão/saberes experienciais na realização do estágio?
c) Que dinâmica se estabelece nos espaços educativos não formais que apoiem a relação
teoria prática na constituição de saberes que seja diferente da educação formal?

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