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3° SI MP ÓS IO DE PE S QU I SA DO PP G A U -U F RN – D O U T O R A D O , M E S T R A D O A C A D Ê M I C O e M E S T R A D O P R O F I S S I O N A L

Recomendações bioclimáticas para Habitações de Interesse Social em


Natal/RN
Giovani Hudson Silva Pacheco
Contato: giovani.arquitetura@yahoo.com.br

Conforto Ambiental e Eficiência Energética

INTRODUÇÃO possuam aberturas grandes e totalmente sombreadas,


tenham paredes e coberturas leves e refletoras e façam
O consumo de energia elétrica nas edificações uso de ventilação cruzada permanente durante todo o
corresponde a cerca de 50% da energia produzida no ano.
país (ELETROBRÁS, 2012). As residências, responsáveis
pelo consumo de 23% da energia produzida (LAMBERTS, Baseado nisso está sendo desenvolvida, pelo autor, uma
2014), podem produzir uma economia que pode superar pesquisa de mestrado que visa identificar
50% do consumo quando empregam tecnologias recomendações bioclimáticas para habitações de
energeticamente eficientes desde a concepção do interesse social situadas nas diversas condições
projeto (ELETROBRÁS, 2012). climáticas do Rio Grande do Norte. Aqui se faz um
recorte dessa pesquisa, abordando os resultados da
Nesse contexto, as recomendações projetuais cidade do Natal.
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desempenham papel importante no processo decisório
de concepção das edificações, pois transferem OBJETIVO
informações obtidas em pesquisas científicas para a
prática projetual (WANG e BAY, 2008). Essas estratégias Verificar o desempenho térmico de habitações de
bioclimáticas podem conferir à edificação mecanismos interesse social frente às recomendações bioclimáticas
de condicionamento térmico passivo, reduzindo a para Natal/RN.
necessidade do uso de energia para condicionar os
ambientes (LAMBERTS, 2014). MÉTODO

Desenvolvido para informar quais estratégias A pesquisa fundamenta-se no método hipotético-


bioclimáticas são recomendadas para diferentes dedutivo ao buscar respostas para o problema proposto
condições climáticas do país, o zoneamento bioclimático e na tentativa de corroborar ou refutar as hipóteses
brasileiro divide o território nacional em oito zonas apontadas. Para tal foram adotados procedimentos do
(RORIZ, et al, 1999) e está presente na NBR 15220 método de simulação.
(ABNT, 2003). Nessa norma são sugeridos limites para
transmitância térmica, atraso térmico e Fator de Calor As simulações foram realizadas no software
Solar de coberturas e paredes. Além disso, são indicadas DesignBuilder (DESIGNBUILDER SOFTWARE LTD, 2000-
as áreas de abertura para ventilação e o sombreamento 2009), com o arquivo climático no formato EPW para a
de janelas. Por fim, são apontas estratégias bioclimáticas cidade de Natal/RN. Nos modelos foram avaliados:
que otimizem as condições térmicas das habitações.
 Ventilação
Nesse zoneamento bioclimático, o território do Rio  Fator de Calor Solari (FCS)
Grande do Norte está dividido em duas zonas  Massa térmica
bioclimáticas, a ZB 7 e ZB 8. A primeira estabelece  Sombreamento
recomendações para edificações em clima quente e
seco, e a ZB 8, para edificações situadas em clima Os modelos se basearam em tipos de habitações, que
quente e úmido (ABNT, 2003). Para cidades situadas na foram obtidos conforme o item a seguir. Uma vez
ZB 8, como Natal/RN, é recomendado que as edificações definidos os modelos e as recomendações a serem
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Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo |PPGAU/UFRN


analisadas foram realizadas diversas combinações com Quadro 1: Quadro das características dos tipos selecionados.
todos esses parâmetros, onde foi variado um parâmetro Tipo
por vez em cada caso. Tipo Alongado Tipo Compacto
Ramificado

Após a simulação dos casos, os resultados horários das


temperaturas operativas do ar interno da edificação e as
temperaturas externas eram extraídos do software e
inseridos em planilhas eletrônicas para se obterem os Referência: Referência: Referência:
Percentuais de Horas Ocupadas em Conforto (POC) de habitações habitações de recomendações
cada caso. Os limites de conforto foram estabelecidos vernaculares de conjuntos da literatura
conforme a ASHRAE Stantard 55 (2012, apud LAMBERTS, centros urbanos. habitacionais. para o clima
Formato: retangular Formato: quente e
2014). retangular
alongado, com úmido.
dimensões 5 x 12 m. levemente Formato:
Escolha dos tipos alongado, com
Implantação: ramificado
A caracterização dos modelos de simulação baseou-se dimensões 7 x 8,33
geminada nas duas Implantação:
em tipos que seriam representações de residências laterais m. livre
populares encontradas em todo o estado e que Aberturas: apenas Implantação: Aberturas: na
incorporassem, em maior ou menor grau, as estratégias nas fachadas frontal geminada em uma maioria das
e posterios. lateral faces.
de condicionamento térmico passivo. Nesse sentido foi
Área de abertura: Aberturas: nas Área de
selecionada uma edificação vernacular, comumente fachadas livres.
pequena, 10% da abertura:
encontrada em centros urbanos do século XIX (FEIJÓ, área do piso. Área de abertura: grande, 40% da
2002). Esse é o tipo alongado na Ilustração 1. média, 20% da área área do piso.
do piso.
Ilustração 1: Tipos selecionados para a confecção dos
modelos Fonte: elaborado pelo autor

DESENVOLVIMENTO

Independente do tipo de habitação, se alongado,


compacto ou ramificado, a combinação de
recomendações foram as mesmas nos melhores e piores
casos. Os melhores casos combinam ventilação,
sombreamento, massa térmica alta e FCS baixo nas
Tipo Alongado Tipo Compacto Tipo Ramificado vedações. E os piores casos são os que apresentam
Fonte: elaborado pelo autor ausência de ventilação e sombreamento, aliado com
massa térmica alta e FCS alto nas vedações.
O segundo tipo selecionado representa habitações
construídas em conjuntos habitacionais no estado. É o Na habitação alongada, os melhores casos são os que
tipo compacto na Ilustração 1. Por fim, selecionou-se um apresentam ventilação natural e FCS baixo, onde, com a
terceiro tipo, que apresenta planta ramificada, com movimentação de ar, se consegue atingir a totalidade
todas as fachadas livres, para possibilitar o máximo de das horas ocupadas em conforto (Ilustração 2). Em um
contato da edificação com o meio externo e captar dos casos foi atingida essa totalidade das horas
muita ventilação em todos os cômodos. O Quadro 1 ocupadas em conforto sem a necessidade de
apresenta um resumo das características desses tipos. movimentação de ar para o usuário, que é o caso que
alia ventilação natural, sombreamento e vedações
pesadas e com FCS baixo.

Os casos com Fator de Calor Solar alto nas vedações


apresentaram os piores resultados. Apenas aliando
ventilação, sombreamento e massa térmica alta é que se
consegue ficar sem desconforto ao calor. Nos demais, o

Programa de Pós-Graduação Mestrado Profissional em Arquitetura, Projeto e Meio Ambiente |PPMPAPM/UFRN


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desconforto ao calor está presente, sendo superior a alongado, já que são os que apresentam maiores
50% das horas quando não existe ventilação natural. aberturas, onde o sombreamento tem maior impacto.

Ilustração 2: Percentual de Horas Ocupadas em Conforto de Em todos os casos do tipo ramificado existem horas
cada caso das habitações alongadas – tipo 1 ocupadas em conforto sem a necessidade de
100% movimentação de ar no interior da edificação. Os casos
Percentual de Horas Ocupadas em Conforto

90% Tipo 1 com FCS alto nas vedações apresentam melhores


80% resultados quando aliam ventilação natural.
70%

60%
Calor Ilustração 4: Percentual de Horas Ocupadas em Conforto de
50%
Conforto com cada caso das habitações ramificadas – tipo 3
40% Movim. de Ar
Conforto 100%

Percentual de Horas Ocupadas em Conforto


30% Tipo 3
Frio 90%
20%
80%
10%
70%
0%
Ventilado 60%
VENTILAÇÃO Calor
Não Ventilado
50%
MASSA Pesada Conforto com
TÉRMICA Leve 40% Movim. de Ar
FATOR DE FCS Alto Conforto
30%
CALOR SOLAR FCS Baixo
Frio
SOMBREA- Sombreado 20%
MENTO Não Sombreado
Casos 10%

Fonte: elaborado pelo autor 0%


Ventilado
VENTILAÇÃO Não Ventilado

Ilustração 3: Percentual de Horas Ocupadas em Conforto de MASSA


TÉRMICA
Pesada
Leve
cada caso das habitações compactas – tipo 2 FATOR DE FCS Alto
CALOR SOLAR
100% SOMBREA-
FCS Baixo
Sombreado
3
Percentual de Horas Ocupadas em Conforto

Tipo 2 MENTO Não Sombreado


90% Casos
80% Fonte: elaborado pelo autor
70%

60% Calor Dentre aos três tipos, este é o que apresenta mais casos
50%
Conforto com
Movim. de Ar
com desconforto ao calor, já que possui mais aberturas
40%
Conforto envidraçadas. Em contrapartida, esses percentuais de
30%

20%
Frio desconforto ao calor não superam 50% das horas.
10%

0%
No geral, extraindo-se uma média de todos os casos, o
VENTILAÇÃO
Ventilado
Não Ventilado
tipo compacto e o ramificado foram os que
MASSA Pesada apresentaram melhor desempenho para o clima de
TÉRMICA Leve
FATOR DE FCS Alto Natal, conforme pode ser visto na Ilustração 5. Ambos
CALOR SOLAR

SOMBREA-
FCS Baixo
Sombreado
os casos apresentaram 88% das horas ocupadas em
MENTO
Casos
Não Sombreado conforto e o caso alongado apresentou 84%.
Fonte: elaborado pelo autor
Ilustração 5: Média dos Percentuais de Horas Ocupadas em
No tipo compacto (Ilustração 3) existem mais casos com Conforto de cada recomendação e tipo de habitação
horas em desconforto ao calor que no tipo anterior,
porém menos que o tipo ramificado, apresentado
abaixo. Entretanto os piores casos não apresentam
horas de desconforto tão acentuadas quanto o tipo
alongado.

Assim como no outro tipo, o FCS alto está presente nos


piores casos. Além disso, os piores casos também não
apresentam ventilação natural nem sombreamento nas
aberturas. Esse comportamento também está presente
no tipo ramificado (Ilustração 4). Isso os difere do tipo
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Fonte: elaborado pelo autor
AGRADECIMENTOS
Também na Ilustração 5 é dado o desempenho médio de
cada recomendação separadamente. Nesse gráfico
Ao CNPq pelo apoio financeiro e à equipe do Laboratório
pode-se ver que as variáveis ventilação natural e FCS
de Conforto Ambiental – Labcon/UFRN.
baixo apresentam resultados de horas ocupadas em
conforto próximos de 100% nos três tipos de habitação.
Em contrapartida, as situações sem ventilação natural e REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FCS alto apresentaram os piores resultados, com
ABNT. Desempenho térmico de edificações Parte de 1 a 3.
percentuais de conforto abaixo de 80%.
Rio de Janeiro: Associação Brasileira de Normas Técnicas,
Por fim, as situações com vedações leves tiveram NBR15220-1,2,3: 2003.
desempenho pouco superior às situações com vedações
DESIGNBUILDER SOFTWARE LTD. DesignBuilder, 2000-2009
pesadas, assim como os casos com sombreamento das
aberturas tiveram desempenho superior aos sem ELETROBRÁS. Procel Edifica. Disponível em:
sombreamento. http://www.eletrobras.com/elb/procel/main.asp?TeamID=%7
BA8468F2A-5813-4D4B-953A-1F2A5DAC9B55%7D. Acesso
CONSIDERAÇÕES FINAIS em: 19 nov. 2012.

Apesar de possuir menos superfícies externas expostas à LAMBERTS, R. et al. Eficiência Energética na Arquitetura. 3ª
radiação solar, o tipo alongado, teve desempenho ed. Disponível em: www.labeee.ufsc.br.
levemente inferior aos demais, uma vez, que com
menos aberturas, havia menor remoção das cargas RORIZ, M.; GHISI, E.; LAMBERTS, R. Uma proposta de norma
técnica brasileira sobre desempenho térmico de habitações
térmicas internas. Nos outros tipos, apesar de mais
populares. ENCAC. 1999.
aberturas e paredes expostas à radiação, conseguem
remover maiores cargas térmicas. Isso demonstra a WANG, N. e J. H. BAY. Parametric simulation and pre-
importância da ventilação natural para o clima de Natal. parametric design thinking: guidelines for socio-climatic
Também se destaca a importância do sombreamento design of high-rise-semi-open spaces. In: K. M. Zarzar e A.
das aberturas e das vedações com FCS baixo. e da Guney (Ed.). Understanding Meaningful Environments:
ventilação natural para o bom desempenho das Architectural precedents and the question of identity in
edificações analisadas. creative design. Amsterdam: IOS Press, 2008.

Vedações com FCS alto – paredes com alta transmitância NOTAS


e/ou alta absortância – quase sempre resultam em
desempenhos ruins. Apenas quando se alia a ventilação
i
natural é que a edificação apresenta bons resultados. Quociente da taxa de radiação solar transmitida através de
Sem ela, os ganhos advindos das vedações produzem um componente opaco pela taxa da radiação solar total
incidente sobre a superfície externa do mesmo (ABNT, 2003).
ambientes demasiado quentes.

Foi observado ainda que a massa térmica pode ser


empregada nas habitações em Natal, mesmo essa não
sendo uma recomendação para o condicionamento
térmico passivo de edificações no clima quente e úmido.
Os resultados dos casos que utilizaram vedações leves e
os que utilizaram vedações pesadas foram bem
semelhantes, não sendo essa variável preponderante
para o desempenho térmico das habitações analisadas.

Por fim, destaca-se a importância do sombreamento das


aberturas, das vedações com FCS baixo e da ventilação
natural para o bom desempenho das edificações
analisadas.

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