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Aplicação de Modelos Numéricos para Estudos em Áreas de Barragens

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Rafael Pimenta
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Trabalho de Conclusão de Curso
Curso Master Engenharia em Geotecnia
PUC Minas 2018
Belo Horizonte, 10 de novembro de 2018

Aplicação de Modelos Numéricos para Estudos em Áreas de


Barragens
Marina de Castro Araújo Ribeiro
PUC-MG, Belo Horizonte, marina.mcar@gmail.com

Orientador: Rafael Colombo Pimenta

RESUMO: Modelos numéricos hidrogeológicos são amplamente utilizados na mineração com


objetivos diversos, como quantificação de rebaixamento de nível d’água, avaliação de impactos em
surgências, entre outros. O presente trabalho teve como objetivo apresentar usos e aplicações de
modelos numéricos na área de barragens de terra e sintetizar em um artigo estudos possíveis para
diferentes situações e problemas. Apresenta ainda, um modelo numérico de fluxo de água subterrâneo
da área da mina abandonada Engenho D’água, à qual está sendo estudada pelo Centro de
Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN).

PALAVRAS-CHAVE: percolação, modelo, barragem de terra, modflow.

1 INTRODUÇÃO investimento seja feito.


O presente trabalho tem como objetivo
Modelos de percolação de água em barragens de apresentar como os modelos numéricos têm sido
terra são comumente utilizados para se conhecer utilizados na área de barragens de terra e
e avaliar o fluxo de água e as linhas sintetizar em um artigo alguns estudos de caso
equipotenciais no maciço construído. para diferentes situações e problemas.
Em áreas afns, como na mineração, modelos Tem como objetivo também a a realização de
numéricos hidrogeológicos complexos são um modelo numérico simplifiicado específico,
elaborados com o objetivo de dimensionar realizado com base no trabalho em andamento
rebaixamento do nível de água das cavas e do CDTN denominado “Desenvolvimento da
avaliar impactos em nascentes e bacias Tecnologia dos Traçadores Aplicados na
subjascentes às cavas, por exemplo. São Avaliação da Integridade de Barragens de
construídos, na maioria das vezes, em três Rejeitos” (Moreira, et al. 2018), visando
dimensões e, na medida em que são alimentados contribuir para o entendimento do fluxo de água
com uma quantidade e qualidade suficientes de nesta mina abandonada.
dados de observação, reproduzem de maneira
simplificada a realidade local e possibilitam 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
simulações diversas, como alocação de poços,
instalação de drenos, entre outras. 2.1 Percolação em meios porosos
|O uso de modelos numéricos tridimensionais
para barragens de rejeitos, sedimentos ou água, O fluxo de água através de um meio poroso pode
principalmente em grandes projetos, pode ser ser descrito matematicamente, através da
uma importante ferramenta para conhecimento combinação entre a equação de fluxo de Darcy e
do comportamento geral da barragem bem como uma equação de continuidade (FREEZE &
sua interação com os solos/rochas da base. Com CHERRY, 2018).
esse recurso é possível realizar simulações na Para um regime transiente em um meio
alteração da estrutura da barragem e avaliar o poroso, anisotrópico e saturado, a equação (1)
efeito das alterações previstas, antes que o considera que a taxa do fluxo de massa da água
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total em um volume unitário de controle é igual O método DF, por sua vez, proporciona maior
à taxa de variação temporal do armazenamento facilidade de manuseio ao usuário. Além disso,
da massa de água presente no interior do mesmo existe um maior número de softwares, inclusive
volume unitário de controle. de uso gratuito, que resolvem através desse
método (CLEARY, 2007).
𝜕 𝜕ℎ 𝜕 𝜕ℎ 𝜕 𝜕ℎ 𝜕ℎ
𝜕𝑥
(𝐾𝑥
𝜕𝑥
)+
𝜕𝑦
(𝐾𝑦
𝜕𝑦
)+
𝜕𝑧
(𝐾𝑧
𝜕𝑧
) + 𝑊(𝑥,𝑦,𝑧,𝑡) = 𝑆𝑠
𝜕𝑡
(1)
2.2.2 Visual ModFlow
Onde:
h = carga hidráulica [L]; O presente trabalho exemplificará o uso do
Kxx, Kyy, Kzz = valores de condutividade software Visual ModFlow, que utiliza do método
hidráulica ao longo dos eixos x, y e z, diferenças finitas para modelagem numérica de
respectivamente, [L/T]; fluxo subterrâneo (MCDONALD &
Ss = coeficiente de armazenamento HARBAUGH, 1988).
especifico, [1/L]; Desenvolvido pela USGS (United State
t = tempo, [T]; e, Geological Survey), o código é composto por
W(x,y,z,t) = fontes ou sumidouros de água, uma série de módulos para elaboração de
[L³/TL³]. modelos bi ou tridimensionais de ambientes
heterogêneos, anisotrópicos e não estacionários.
Em regimes estacionários, essa equação é Os módulos compreendem a alocação de poços,
igualada à zero, uma vez que o fator tempo, drenos, rios, recarga, evapotranspiração,
presente no último termo, deixa de existir. condutividade hidráulica, transporte de
contaminantes, entre outros recursos.
2.2 Abordagem numérica

Através da construção de modelos numéricos, é 3 ESTADO DA ARTE: TRABALHOS


possível se retratar tanto ambientes homogêneos UTILIZANDO VISUAL MODFLOW
quanto heterogêneos, isotrópicos ou
anisotrópicos, de acordo com a necessidade. 3.1 Estudo de caso: Pinto, 2016
Usualmente, adotam-se métodos resolutivos
baseados em diferenças finitas (DF) ou em Pinto (2016) trata a avaliação do transporte de
elementos finitos (EF), sendo a primeira uma contaminantes de urânio e rádio em uma antiga
metodologia mais simplificada que a segunda barragem de rejeitos em Portugal.
(CLEARY, 2007). Anteriormente ao modelo numérico, foi
elaborado um modelo conceitual, representativo
2.2.1 Diferenças Finitas vs. Elementos Finitos do sistema hidrogeológico em questão,
considerando quais os sistemas aquíferos por
Ambas as metodologias se utilizam da equação baixo da barragem existente, fraturamento das
diferencial (1), aplicada bi ou rochas, aspectos geológicos, pluviometria da
tridimensionalmente. No método DF, a equação região, resultados de estudos geofísicos, entre
é aplicada aos nós da malha atribuída, enquanto outros dados.
no EF é aplicada em uma área. Dessa maneira, pôde-se definir o sistema de
O método EF possui maior acurácia, visto que fluxo da área da barragem, sendo este a base de
a alocação de poços, piezômetros ou quaisquer conhecimento para construção do modelo
estruturas pode ser feita livremente, numérico.
independente de interpolação ou de coincidir
com um nó. Além disso, um ambiente com uma
alta variabilidade anisotrópica é mais bem
representado com EF.
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Figura 2. Resultados do modelo de fluxo após a obra para


contenção dos contaminantes.
Figura 1. Resultados do modelo de fluxo anterior à obra
para contenção dos contaminantes.
Com esse trabalho é possível visualizar que,
A Figura 1, apresenta o resultado do fluxo na em um modelo adequadamente construído, é
barragem, com as linhas equipotenciais e a possível testar a eficácia das soluções de
direção do fluxo, em situação anterior à obra para engenharia propostas para se corrigir um
contenção dos contaminantes. problema de contaminação do nível freático por
A Figura 2, apresenta a situação posterior à rejeitos tóxicos.
obra para contenção do rejeito contaminado,
onde se observa a diminuição na carga hidráulica 3.2 Estudo de caso: Almeida & Loureiro, 2008
e o direcionamento da água contaminada pelo
rejeito. O estudo trata da avaliação quantitativa e
qualitativa da disponibilidade hídrica da
Barragem de Pontal, Itabira – Minas Gerais.
Foi realizada no modelo uma calibração em
regime permanente para o período seco de 2005
que teve como objetivo determinar o nível
d’água no período seco, determinando a parcela
da água que lançada nos braços da barragem que
efetivamente infiltram no rejeito.
Na sequência foi realizada uma calibração em
regime transitório, que teve como objetivo
calibrar o modelo nas sequências de meses secos
e chuvosos, no período compreendido entre
20/set/2005 a 11/out/2007.
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Por fim, foi realizada uma simulação até para o uso, sem que seja necessário captar as
atingir a configuração final da barragem, com o reservas subterrâneas é de 275 m3/h, que
lago remanescente atingindo a cota 785 metros. infiltram na parte do colúvio, e de 118 m3/h da
A calibração em regime permanente trouxe parcela que infiltra no rejeito.
como resultado que, com um aporte médio de
1945 m3/h de rejeitos lançados no pontal e com 3.3 Estudo de caso: Lee & Panday, 2006
os valores de infiltração resultantes do modelo,
11,3% da água da polpa se infiltram pelo rejeito, A barragem de água Fordyce, localizada em
taxa menor que a esperada, possivelmente pela Sierra Nevada – California, EUA, foi construída
saturação do próprio rejeito. A Figura 3 no ano de 1873 e desde então, vem sofrendo
apresenta as linhas equipotenciais geradas na inúmeras modificações e obras para corrigir
calibração do modelo em regime permanente. problemas de infiltração.
Com mais de 40 metros de altura e 300 metros
de comprimento, a barragem possui núcleo
argiloso, camadas de enrocamento, e uma face
de concreto à montante conforme perfil
apresentado na Figura 5.

Figura 3. Resultados do modelo de fluxo após a obra para


contenção dos contaminantes.

O objetivo da calibração em regime


transitório do trabalho de Almeida & Loureiro,
2008 foi realizar o ajuste dos valores de recarga
e permeabilidade através da técnica de
retroanálise dos dados de nível d’água no rejeito
e no colúvio.

Figura 5. Representação da barragem Fordyce.

O modelo 3D foi construído baseado em um


modelo 2D anterior e permitiu a comparação
entre os resultados de ambos. Utilizou o sistema
MODHMS, baseado em MODFLOW, que inclui
vários módulos adicionais. Este código foi
utilizado para este estudo devido à sua
flexibilidade e capacidade de lidar com a física
do fluxo.
Figura 4. Resultados do modelo de fluxo após a obra para O cenário inicial modelado corresponde ao
contenção dos contaminantes. mesmo cenário do modelo anterior. As linhas
isobáricas obtidas foram semelhantes àquelas
Na sequência, conforme Figura 4, a simulação obtidas anteriormente, assim como o fluxo que
demonstrou que a água subterrânea disponível infiltra pela base, indicando que a modelagem
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anterior havia sido adequadamente executada Nuclear – CDTN – vem desenvolvendo um


(Figura 6). projeto denominado “Desenvolvimento da
Tecnologia dos Traçadores Aplicados na
Avaliação da Integridade de Barragens de
Rejeitos” (Moreira, et al. (2018). O Relatório
Técnico Parcial com data de 30/01/2018 foi
gentilmente disponibilzado pelos autores para
elaboração do presente trabalho.
Figura 6. Resultados do modelo de fluxo após a obra para Um dos objetivos do projeto é a aplicação de
contenção dos contaminantes. modelagem matemática para a interpretação dos
dados coletados em campo, para avaliar a
No entanto, tanto a modelagem em 3D quanto possibilidade de quantificação de fugas em
em 2D subestimaram muito o valor do fluxo que barragem da área de estudo proposta.
infiltra pela base da represa. Os cálculos dos O presente trabalho realizou então um modelo
modelos foram da ordem de 150 l/s de vazão, para uma análise preliminar, visando constituir
enquanto medidas em campo trouxeram valores um retrato da situação atual da região em estudo,
da ordem de 700 l/s. Análises de sensibilidade e assim, servir de base para as análises futuras,
foram elaboradas, a fim de se tentar identificar a como a quantificação de fugas citada acima.
razão de tamanha discrepância dos resultados
reais e modelados. 4.1.2 Área de estudo
Analisando-se os parâmetros utilizados na
modelagem, pôde-se observar que as duas A área de estudo está localizada em Rio Acima
maiores incertezas existentes eram as – Minas Gerais, e é conhecida como Mina do
condutividades hidráulicas da face de concreto e Engenho D’água. Atualmente, a área é gerida
do canal aluvial, cujas variações provocam pelo Governo do Estado de Minas Gerais, por
grandes amplitudes nos resultados. meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente
Outras análises foram realizadas, e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD). A
considerando por exemplo problemas estruturais mina está com suas atividades paralisadas desde
detectados no maciço do barramento e 2012, operando de 2002 a 2007 apenas por lavra
fraturamento do leito rochoso. A simulação de à céu aberto e de 2007 em diante iniciou lavra
uma lacuna, detectada em campo, entre a parede subterrânea, conforme cronologia abaixo (Figura
de concreto e o núcleo argiloso também trouxe 7):
uma resposta mais próxima da realidade. • 2002 - Cava à céu aberto estava no início
Assim, utilizando o modelo para realizar da escavação. Primeiras bancadas da pilha
várias análises distintas, foi possível detectar de estéril;
novas possibilidades para o erro e perceber quais • 2006 – Cava à céu aberto já se encontrava
parâmetros afetam mais ou menos a infiltração mais desenvolvida com formação de lago
observada. no interior. Pilha de estéril já tem maior
volume;
• 2007 – Instalação da Planta de
4 MODELO NUMÉRICO MINA DO beneficiamento, construção da Barragem
ENGENHO D’ÁGUA de Rejeitos 1;
• 2008 – Operação de Mina Subterrânea;
4.1 Compilação de dados do Relatório Técnico • 2010 – Preparação do terreno para
Parcial – CDTN construção da Barragem de Rejeitos 2;
• 2011 – Construção e operação da
4.1.1 Introdução
Barragem de Rejeitos 2;
• 2012 – Paralização das atividades e
O Centro de Desenvolvimento da Tecnologia
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abandono da área;
De acordo com o Relatório de Cumprimento
de Condicionantes (CERN, 2007), os rejeitos
gerados pelo beneficiamento do minério são
constituídos de sólidos sedimentáveis, matriz
arenosa e coloidais quimicamente ativos.
Segundo esse relatório, o rejeito é classificado
como Resíduo Perigoso Classe I, segundo a NBR
10.004/2004, daí a necessidade de entender
melhor a área para propor soluções.

Figura 7. Cronologia Mina Engenho D’água – imagens de


satélite Google Earth. Figura 8. Mapa Geológico da Região em estudo.
Fonte: retirado de Moreira, et al. (2018). Fonte: retirado de Moreira et al. (2018).

4.1.3 Geologia Regional A área de estudo compreende duas unidades


macro (ZUCCHETTI & BALTAZAR, 1998):
A área estudada encontra-se na porção centro- • Unidade Mestre Caetano – Predominam
norte do Quadrilátero Ferrífero, inserida no metagrauvacas vulcanogênicas,
contexto das sequências arqueanas intercaladas com lapilli tufos, metapelitos
vulcanossedimentares regional: o Greenstone e metassedimentos químicos (formação
Belt Rio das Velhas (Figura 8). ferrífera, carbonato, xisto). Localmente,
ocorrem metaconglomerados com
estratificação gradacional ou cruzada de
pequeno porte.
• Unidade Córrego Do Sítio – Uma das
unidades mais extensas no Quadrilátero
Ferrífero. Composta de metapelitos
bandados intercalados com
metapsamistos e xistos carbonosos.
Formação ferrífera compõe a unidade na
região de Nova Lima.

4.1.4 Pluviomentria

O regime de chuvas em Rio Acima é


dominantemente subtropical úmido, com
inverno seco e verão chuvoso. A estação chuvosa
vai de outubro a março, com transição entre os
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períodos seco e chuvoso em setembro e maio. O


índice pluviométrico regional possui média
anual variável entre 1.400 mm e 1.600 mm
(Figura 9). O mês mais seco é Agosto (10 mm de
chuva em média), e o de maior precipitação
Dezembro (304 mm de chuva em média) (CBH
RIO DAS VELHAS, 2016).

Figura 10 - Limite da Área de Interesse do Modelo


Hidrogeológico.
Fonte: retirado de Moreira et al. (2018).

Os aquíferos locais são predominantemente


fraturados, considerando a geologia regional do
município de Rio Acima, de idade Arqueana e
Figura 9. Variação pluviométrica e climática em Rio composta predominante de xistos do Supergrupo
Acima, obtidas a partir de modelagem climática (Climate Rio das Velhas. Sobre as rochas fraturadas há a
Data, 2016). ocorrência de aquífero granular freático
Fonte: retirado de Moreira et al. (2018). instalado nos solos de alteração de textura argilo-
siltosa, por vezes arenosa, e também nos
4.1.5 Domínio Hidrogeológico pequenos terraços aluvionares nas margens do
córrego do Vilela (SUPRAM CM, 2012).
Os limites do domínio hidrogeológico Beato et al. (2005) caracterizam o Sistema
estabelecido por Moreira et al. (2018) foram Aquífero Xistoso regional como um sistema
definidos por barreiras hidráulicas à sul pelo composto geralmente por aquitardos ou
córrego do Vilela e a norte pelo córrego Olhos aquicludes, fraturados, descontínuos, livres a
D’água. Na confluência entre estes dois corpos confinados. Predominam xistos variados, com
hídricos à oeste da área, fecha-se o domínio de níveis intraformacionais de formação ferrífera e
interesse nesta porção. À leste da área da mina o quartzito. O sistema é fortemente anisotrópico e
domínio é definido por uma barreira topográfica heterogêneo, com porosidade e permeabilidade
(alto do morro). Desta barreira topográfica há secundária, fruto de esforços tectônicos.
duas drenagens, uma para sul e outra para norte,
contribuindo para o Córrego do Vilela e Olhos 4.1.6 Unidades Hidroestratigráficas
D’água respectivamente, e estas drenagens
também delimitam o domínio deste modelo A Tabela 1 a seguir apresenta a caracterização
conforme visto na Figura 10. das unidades hidroestratigráficas com as
condutividades hidráulicas estimadas por Fetter
(1988). O modelo computacional buscará,
através da retroanálise, refinar estes números.
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Tabela 1 – Unidades Hidroestratigáficas e respectivas


condutividades hidráulicas.
Unidades
Descrição K (cm/s)
Hidroestratigráficas
Solo constituído
de argila siltosa,
Solo residual silte argiloso e 10-6 a 10-4
por vezes
arenoso
Rocha sã
impermeável
Xisto fraturado contendo 10-6 a 10-8
descontinuidades
abertas Figura 11 – Superfície equipotencial.
Fonte: retirado de Moreira et al. (2018).
Rocha sã
Xisto profundo 10-8 a 10-10
impermeável
Fonte: retirado de Moreira et al. (2018).
4.2 Modelo Numérico – Mina Engenho
D’água
4.1.7 Recarga
O objetivo do modelamento numérico é
O trabalho de Moreira et al. (2018) calculou que representar, de forma tão fiel quanto possível, as
a vazão na bacia do Córrego do Vilela equivale condições de fluxo de água subterrânea da área
a uma taxa de recarga entre 179,81 e 176,52 em estudo. Para tanto foram ajustados, ou
mm/ano. Na área da mina a taxa de recarga calibrados, os valores calculados pelo modelo
encontra-se bem diminuída, em torno de 70,19 com os dados de monitoramento existentes.
mm/ano, possivelmente devido ao maior A calibração é feita através do processo de
escoamento superficial na área da mina e pela retroanálise, quando são realizadas sucessivas
impermeabilização feita por geomembranas que alterações nos valores de condutividade
revestem as bacias de rejeito. O modelo hidráulica e recarga.
hidrogeológico computacional visa testar e Moreira et al. (2018) detectou que a área de
refinar esses valores com o uso da retroanálise. estudo ainda se encontra sob os efeitos das ações
antrópicas anteriores, ou seja, não há ali um
4.1.8 Superfície equipotencial equilíbrio hidrogeológico. Mesmo assim, foi
realizada uma calibração em regime permanente
Para a geração da Superfície Equipotencial e para representar a condição atual do aquífero,
vetores de fluxo, os autores utilizaram os pontos visto que não há séries históricas de
de registro da água subterrânea que tiveram a monitoramento de nível d’água nem de vazões
cota do nível de água registrados, tal como poços dos córregos disponíveis para uma calibração em
de monitoramento, poço tubular, surgências e regime transitório.
lago na cava.
Os dados foram trabalhados a fim de alimenta 4.2.1 Malha
o software SURFER 8 da Golden Software, Inc.
para a geração da superfície equipotencial O modelo foi criado sobre uma malha regular de
através de um método estatistico. O resultado linhas, colunas e camadas que compõe o
está demonstrado na Figura 11, a seguir. denominado grid do modelo. A malha horizontal
do grid do modelo é delimitada pelas
coordenadas UTM (Zona 23S) 624.750 e
627.000 metros (total de 2,25 km), na direção
Leste-Oeste, e 7.780.500 e 7.782.300 (total de
1,80 km), na direção norte-sul resultando numa
área de 4,05 km².
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O domínio horizontal do modelo foi então para a condutividade hidráulica (Kx, Ky e Kz)
dividido em uma malha regular com células de através da retroanálise. Kx, Ky e Kz representam
25 m, totalizando 90 colunas e 72 linhas. a anisotropia da condutividade hidráulica nos
Verticalmente, o grid possui o limite superior três eixos ortogonais.
definido pela superfície topográfica da região da
mina e entorno, obtido a partir do mapa Tabela 2 – Valores de condutividade hidráulica obtidos por
topográfico em arquivo .dxf. O limite inferior foi retroanálise.
definido na cota 400 m. Cor Litologia Kx (cm/s) Ky (cm/s) Kz (cm/s)
Solo arenoso 1.00E-05 1.00E-05 1.00E-05
4.2.2 Propriedades hidrodinâmicas Quartzito 3.00E-06 3.00E-06 3.00E-07
Argilossolo 8.50E-05 8.50E-05 8.50E-05
Os parâmetros hidrodinâmicos, como a
Xisto são 1.00E-06 1.00E-06 1.00E-06
condutividade hidráulica e o coeficiente de
Embasamento 1.00E-08 1.00E-08 1.00E-08
armazenamento, são determinados em função da
litotipos e estruturas encontradas na área. Essas
feições definem cinco propriedades 4.2.3 Condições de contorno
hidrodinâmicas.
A Figura 12 apresenta a distribuição vertical As condições de contorno são funções
da condutividade hidráulica para a linha 31 e a matemáticas que definem os limites de fluxo de
distribuição horizontal da condutividade água subterrânea (ou fronteiras do problema),
hidráulica na primeira camada do modelo pontos de recarga ou descarga do modelo. Estas
numérico, bem como a distribuição da malha condições de contorno podem ser físicas, tal
mencionada no item anterior. O armazenamento como a presença de rochas impermeáveis
não foi considerado por se tratar de um modelo (aquicludes ou aquífugos), contornando o
em regime estacionário. aquífero, uma grande superfície de água ou
condições hidrogeológicas, como divisores de
água subterrânea, surgências naturais ou
artificiais, etc.
Podem ser classificadas em três tipos
(CLEARY, 2007):
• Condição de contorno do tipo 1 ou de
Dirichlet: representa uma situação onde a
carga hidráulica está definida;
• Condição de contorno do tipo 2 ou
Neumann: o fluxo de água subterrânea
está definido;
• Condição do contorno do tipo 3 ou mista:
é uma condição onde se conhece a
relação entre a carga hidráulica e o fluxo
de água subterrânea.

Células inativas

Células inativas são condições de contorno do


tipo 2, pois não ocorre o fluxo de água
Figura 12 – Distribuição condutividades hidráulicas, linha
31 e camada 1 do modelo numérico. subterrânea (fluxo nulo). Representam tanto
Fonte: modelo numérico. unidades litológicas impermeáveis, quanto, em
alguns casos, o “ar” (discretização da topografia
A Tabela 2 apresenta os valores encontrados para camadas planas).
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Uma vez que definiu-se os dois cursos d’água (Figura 14).


a norte e sul da mina como sendo os principais
pontos de descarga de água subterrânea na área,
o Córrego Olhos D’água e o Córrego do Vilela
definem os limites do modelo e, por isso, as áreas
externas a eles são definidas como células
inativas (em verde), como ilustrado na Figura 13.

Figura 14 – Distribuição da recarga no modelo numérico.


Fonte: modelo numérico.

4.2.4 Parâmetros de calibração

A calibração do modelo numérico da área de


Figura 13 – Distribuição das células inativas no modelo estudo foi feita baseando-se nos dados de cota do
numérico. nível d’água, fornecidos por indicadores de nível
Fonte: modelo numérico. d’água compilados por Moreira et al. (2018)
(Tabela 3).
Cursos d’água
Tabela 3 – Indicadores de nível d’água existentes na área
Os cursos d’água dentro da área modelada em estudo.
Cotas de Pontos UTM-E UTM-N Cota NA
foram inseridos como condições de contorno do de água (m) (m) (27/9/2018)
tipo dreno (drain). Esses drenos foram inseridos PZ- 4 626038 7781112 766.5
acompanhando o talvegue dos cursos d’água. PZ-2 626015 7781114 764.6
Dreno de Fundo 625933 7781079 762.0
Drenos representam condições de contorno Fonte: dados fornecidos pelo CDTN.
do tipo 3 e atuam como pontos de descarga do
aquífero na área de estudo. Dessa forma, no 4.2.4 Calibração em regime permanente
modelo numérico da área, as condições de
contorno do tipo dreno foram utilizadas para O regime permanente, ou estacionário (steady
representar o Córrego Olhos D’água e o Córrego state), representa uma condição de equilíbrio do
do Vilela. sistema aquífero quando os valores de entrada e
saída de água do sistema se anulam, sem que haja
Recarga interferência nos valores de água armazenados
no sistema (reserva permanente ou geológica).
A recarga do modelo representa a infiltração Para um aquífero em condição estacionária o
efetiva do aquífero e, assim, representa uma tempo é infinito e, por isso, não é considerado no
porcentagem da pluviometria média da área. modelo (FREEZE & CHERRY, 2018).
No modelo da Mina Engenho D’água foi A calibração do modelo numérico em regime
utilizada uma única zona para representar a permanente remete à calibração do nível e vazão
recarga, calibrada com o valor de 180 mm/ano, de saída de água do modelo através do processo
de retroanálise, quando são modificados os
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valores de condutividade hidráulica e de recarga


até atingir uma calibração satisfatória. No
trabalho em questão, o objetivo foi apenas
calibrar os níveis d’água, uma vez que não havia
dados de vazão suficientes para comparação dos
resultados.
A retroanálise é caracterizada por um
processo contínuo de avaliação dos resultados
apresentados pelo modelo (output) frente aos
dados de entradas do modelo (input), como a
condutividade hidráulica e a recarga.
Os valores de condutividade hidráulica e
taxas de recarga foram alterados até atingir uma
configuração final que fornecesse uma boa
calibração para os parâmetros de referência
(piezômetros e indicadores de nível d’água

Resultado da calibração do nível d´água Figura 15 – Comparação entre valores calculados e


monitorados do nível d’água.
A calibração do nível d´água é feita Fonte: modelo numérico.
comparando-se as cotas do nível d´água
monitoradas com os valores de condutividade
hidráulica calculados pelo modelo numérico.
A Figura 15 apresenta um gráfico
comparando os valores monitorados (Observed
Head) e os valores calculados pelo modelo
(Calculated Head) para as cotas dos níveis
d´água encontradas nos dispositivos.
Os cálculos estatísticos, também realizados
pelo Visual MODFLOW, indicam um bom
resultado para a calibração do nível d´água, com
valores compreendidos no intervalo de 95% de
confiança, Erro Máximo Residual de 0,929
metro, e Coeficiente de Correlação de 0,999.
A Figura 16 apresenta a potenciometria com
o resultado da calibração do modelo em regime Figura 16 – Nível d’água (water table), camada 1 do
permanente, compatível com o modelo modelo numérico.
Fonte: modelo numérico.
conceitual apresentado anteriormente.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo


apresentar usos e aplicações de modelos
numéricos na área de barragens de terra e
sintetizar em um artigo alguns estudos de caso
relativos a diferentes situações e problemas.
Foi apresentado um modelo numérico de
fluxo de água subterrâneo da mina abandonada
Trabalho de Conclusão de Curso
Curso Master Engenharia em Geotecnia
PUC Minas 2018
Belo Horizonte, 10 de novembro de 2018

Engenho D’água, realizado com base no trabalho Itabira, Minas Gerais, XV Congresso Brasileiro de
em andamento do CDTN denominado Águas Subterrâneas, 18 p.
Beatto, D.A.C., Monsores, A.L.M., Bertachinni, A.C.
“Desenvolvimento da Tecnologia dos (2005). Projeto APA Sul RMBH: hidrogeologia, mapa
Traçadores Aplicados na Avaliação da hidrogeológico, escala 1:50.000 em 3 partes. Belo
Integridade de Barragens de Rejeitos” de Horizonte: SEMAD/CPRM.
Moreira, et. Al (2018). CBH Rio das Velhas (2016). Projetos de Saneamento
Os pontos d’água calibrados pelo modelo se Básico - Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas.
Maceió: DHF Consultoria e Engenharia, v. 2 - UTE
aproximaram dos monitorados, e o fluxo Águas do Gandarela - Município de Rio Acima, 183 p.
subterrâneo ficou coerente com o modelo CERN, Consultoria e Empreendimentos de Recursos
conceitual. Próximo às barragens de rejeito, que Naturais, 2007. Relatório de Cumprimento de
configuram a região de interesse, também foi Condicionantes da Mina Engenho D’água - R107919.
possível avaliar o fluxo e as cotas de nível d’água Processo Nº 00038/1994/008/2007. Rio Acima/MG.
Preparado para Mundo Mineração LTDA. Disponível
que poderão contribuir para a continuidade do em:
estudo do CDTN. http://www.siam.mg.gov.br/siam/lc/2007/0003819940
No entanto, é necessário ter cautela no uso 082007/5783432007.pdf. Acesso em: outubro 2018.
dos modelos numéricos, uma vez que eles são Cleary, R.W. (2007). Águas Subterrâneas, p. 65-106.
uma aproximação da realidade e sua precisão Fetter, C.W (1988). Applied Hydrogeology. 2ª. ed. Nova
Iorque: Macmillan Publishing, 592 p.
sempre dependerá da quantidade e Freeze, R.A. e Cherry, J.A. (2018). Água Subterrânea.
principalmente da qualidade dos dados inseridos. Tradução de Everton de Oliveira, São Paulo-SP, p. 16-
Uma das dificuldades encontradas para 90.
realização deste foi justamente a ausência de Lee, S.L.S. e Panday, S (2006). Three-Dimensional
dados mais consistentes de monitoramento de Seepage Analysis Through Fordyce Dam, 8 p.
Moreira, R. M., Pimenta, R. C. (2018) Desenvolvimento
nível d’água e vazão dos córregos, uma vez que da Tecnologia dos Traçadores Aplicados na Avaliação
a mina já se encontra abandonada há muito de Barragens. Relatório Técnico Parcial, CDTN.
tempo. Pinto, M.M.M. (2016). Evolução Espácio-Temporal das
Assim, considerando as ressalvas, esse Alterações Hidrodinâmicas e Hidroquímicas numa
modelo poderá servir como base para modelos Antiga Barragem de Rejeitados Mineiros em Resultado
de Obras de Recuperação Ambiental, Dissertação de
mais específicos de avaliação das barragens Mestrado, Faculdade de Ciências e Tecnologia,
existentes na área da Mina Engenho D’água. Universidade Nova de Lisboa, 75 p.
Supram CM (Superintendêcia Regional de Regularização
Ambiental - Central Metropolitana, 2012). Governo
AGRADECIMENTOS Estadual de Minas Gerais. Secretaria de Estado de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
Parecer único 0917772/2012. Licenciamento
Agradecimentos ao Professsor do CDTN, Dr. Ambiental Nº 00038/1994/013/2010.
Rubens Martins Moreira por ter cedido o Zuchetti, M.; Baltazar, O.F. (1998). Projeto Rio das Velhas
trabalho, ainda em andamento, para realização - Texto Explicativo do Mapa Geológico Integrado
deste artigo. Escala 1/100.000. Belo Horizonte: DNPM/CPRM. 116
p.
Ao Governo de Minas Gerais, atual gestor da
área por meio da SEMAD, que liberou a área
para estudo ao CDTN.
Ao professor Rafael Colombo Pimenta, em
especial, pelo auxílio e orientação.

REFERÊNCIAS

Almeida, D.C. e Loureiro, C.O. (2008). Disponibilidade


Hídrica Subterrânea nos Rejeitos de Beneficiamento
do Minério de Ferro – Caso da Barragem do Pontal, em

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