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Trabalho de Conclusão de Curso

Curso de Relações Internacionais

TCC em Formato de Artigo Científico Conforme Definido Pelo Regulamento de TCC

Projeto Pedagógico de Curso do Curso de Relações Internacionais em Cumprimento das


DCNs do Curso de Relações Internacionais (MEC/CNE)

IDENTIDADE LATINO AMERICANA E “ANTI-LATINOAMERICANISMO”


BRASILEIRO

Nome do(a) Estudante: Giulia Caroline Ribeiro Ferreira


Nome do(a) Orientador(a): Profº Drº Fábio Luis Barbosa dos Santos
Ano de Depósito: 2021

RESUMO
Este trabalho pretende discutir a forma como se deram as origens da dificuldade de
incorporação brasileira a uma identidade comum latino-americana, sob a perspectiva
sociocultural através dos seguintes aspectos: identifica teorias acerca do conceito de
identidade, e sua importância no autoconhecimento de um Estado para definição de sua
agenda de política externa; atravessa os processos históricos do Brasil e sua sociedade,
juntamente dos reflexos da influência que os países desenvolvidos e o neoliberalismo
exerceram e ainda exercem no país; a forma como esses reflexos afetam sua relação com os
países latino-americanos, e análise dos fundamentos da dificuldade de incorporação regional
entre esses países e o Brasil; busca captar a percepção atual da sociedade brasileira sobre a
identidade e cultura latino-americana; e, por fim, rastrear caminhos para que haja maior
integração sociocultural.
2

PALAVRAS-CHAVE: Identidade Latino-Americana; Identidade Social; Representação


Social; Integração Regional; Sociedade Brasileira; América Latina.

ABSTRACT
This paper intends to discuss the nature of the difficulty of Brazilian incorporation to a
common Latin American identity, under the sociocultural perspective through the following
aspects: it identifies theories about the concept of identity, and its importance in the
self-knowledge of a State for defining its foreign policy agenda; it crosses the historical
processes of Brazil and its society, together with the reflections of the influence that
developed countries and neoliberalism exerted and still exert in the country; the way in which
these reflexes affect its relationship with Latin American countries, and analysis of the
fundamentals of the difficulty of regional incorporation between these countries and Brazil;
seeks to capture the current perception of Brazilian society about Latin American identity and
culture; and, finally, tracking paths for greater sociocultural integration.

KEYWORDS: Latin American Identity; Social Identity; Social Representation; Regional


Integration; Brazilian society; Latin America.

I. Introdução
A pesquisa de opinião pública “The Americas and the World: public opinion and
foreign policy”, realizada em 2015, demonstrou o resultado de que somente 4% dos
brasileiros participantes definiram-se como latino-americanos, tal resultado se mostra
interessante pois cada vez mais a ideologia identitária ascende como uma importante pauta
política e de auto-afirmação, além da já conhecida relevância do acesso às raízes, memória e
cultura de um povo, para que sua força e história sejam mantidas e enaltecidas. O Brasil e
seus vizinhos latino-americanos possuem diversas semelhanças em variados aspectos -
principalmente histórico e político -, mas em algum momento o afastamento do país para com
seus potenciais aliados fez com que o povo brasileiro deixasse de se identificar como um
grupo latino, e até visse o termo e tudo o que se associa a ele de maneira pejorativa.
De acordo com outras ocorrências no cenário internacional, os Estados em
desenvolvimento tendem a se destacar econômica, política e culturalmente aliando forças,
principalmente de maneira regional, ao invés de buscar acordos e cooperação com as grandes
potências mundiais, tal qual o caminho que o governo brasileiro historicamente tende a tomar.
Essa pesquisa busca entender os motivos da cisão deste grande grupo – analisando o senso de
3

desconexão do povo brasileiro para com seus vizinhos latino-americanos, através da ótica
sociocultural –, demonstrar a importância de que essa identidade seja recuperada
positivamente e sugerir caminhos para que isso ocorra.
Organizando os blocos de forma a traçar o seguinte caminho: primeiramente
apresentar a etimologia dos conceitos de identidade e representação social, entendendo sua
importância e como isso se aplica no subconsciente dos indivíduos; em seguida, analisar o
que é e como se deu a formação da chamada América Latina, bem como quem pode ser
considerado seu povo; a partir disso, compreender os fundamentos da resistência da
incorporação brasileira a uma identidade regional comum, pautando-se nos processos
históricos da região; investigar a forma como as influências neoliberais agiram e ainda agem
nesse processo. Para posteriormente interpretar como isso afeta atualmente a percepção
brasileira sobre sua própria identidade e cultura, e por fim, propõe-se buscar caminhos para
que ocorra maior integração entre as partes, principalmente nos planos social e cultural.
Esse sentimento de não pertencimento que paira sobre o povo brasileiro no que se
refere à grande comunidade latino-americana por certo tem fundamentos, e o foco aqui é
compreendê-los. Sabe-se que o processo de construção do Estado e sociedade brasileira foi
diferente, em diversos aspectos, das demais nações que dividem o continente com o Brasil.
Empreenderam-se formas diferentes de colonização e de independência – uma transição
pacífica para o modelo monárquico português no Brasil, frente aos conturbados e conflituosos
eventos no processo de independência da maioria dos países da América hispânica –, o que
fez com que se iniciasse um instinto de desconfiança mútua entre as partes. A política externa
do Brasil por décadas teve olhos apenas para as metrópoles nortistas (Estados Unidos e União
Europeia, principalmente), o que confrontava a ideologia das outras nações, visto que muitas
delas enfrentaram uma série de embates com tais metrópoles.
Além dos seguidos obstáculos encontrados ao longo da história das então “duas”
américas latinas, nos momentos em que a integração regional foi considerada, não houve
estrutura ou suporte suficientes para que se despontasse essa identificação comum
latino-americana. Alguns governos brasileiros direcionaram a atenção de suas agendas para o
fim regional, contudo esqueceram de incluir o povo nesse processo, a construção social que
prega a distância de realidades desses países está instalada muito profundamente, por isso os
processos de integração sempre foram bastante questionados pela sociedade.
O estudo aqui referido se trata de uma pesquisa teórica em que analisaremos
bibliografias referentes às relações latino-americanas e aos temas que intentamos trabalhar;
com um objetivo de estudo explicativo, em que serão identificados os fatores causadores das
4

dificuldades de incorporação regional ao longo da história, utilizando o método dialético para


abordagem do conteúdo, de forma que os fatos sociais serão interpretados principalmente sob
a ótica cultural, mas levando em consideração outras frentes relacionadas (como influência
econômica e política), a fim de enriquecimento da investigação.
Além disso, desenvolve-se como um estudo qualitativo com um plano monográfico de
estruturação, ou seja, será feito um ensaio da própria realidade para fim de coleta de dados e
interpretação dos acontecimentos, estruturado de maneira geral e buscando analisar diversos
aspectos a respeito de um tema central. O procedimento de investigação se dá no formato de
estudo de caso, pois verifica crenças e fenômenos contemporâneos da nossa sociedade atual.
Relacionamos ainda o balanço dos fatos e pesquisas empíricas acerca da maneira como os
povos latino-americanos se percebem, além de suas relações passadas e atuais, com teorias
que possam funcionar para solução da problemática em questão.

II. Os Conceito de Identidade e Representação Social


O conceito de identidade observado a partir de uma perspectiva cultural pode ser
considerado como análogo a um “sentimento de pertencimento”, seja a um povo, uma cultura,
nacionalidade, religião ou outra forma de identidade cultural, como observa Santos (2011)1.
Essa construção se dá de maneira intencional, num contexto de conformidade a um grupo e
negação do outro; no caso da “identidade latino-americana”, o termo se constitui em oposição
às identidades europeia e americana (referente à América Anglo-Saxônica).
Mesmo sendo entendido como um grande grupo cheio de similaridades, a América
Latina é uma região extensa, complexa e muito plural, assim como aponta Canclini (2008)2
“Não é fácil organizar o conhecimento vivencial de tantos grupos em tantos países, nem
sequer integrar as diversas experiências dentro de cada nação”, os indivíduos são muito
diferentes mesmo dentro de um mesmo país. O autor coloca ainda que a América Latina pode
ser entendida como um “permanente laboratório de identidades”, por comportar tanta
diversidade num mesmo espaço.
Entretanto, apesar da não homogeneidade dessas sociedades, é inegável que exista
uma região mundialmente reconhecida como América Latina, do ponto de vista geopolítico, e
que fora da região sua população seja reconhecida como latino-americana, essa colocação não

1
SANTOS, L. D, 2011, “As Identidades Culturais: proposições conceituais e teóricas”, en Rascunhos Culturais,
Coxim, vol. 2, nº 4
2
Canclini, Néstor García. Latino americanos à procura de um lugar neste século. Editora Iluminuras Ltda, 2008,
p. 30
5

impede que este grupo seja plural e flexível, e suas delimitações sejam imprecisas e
complexas. A conjuntura contemporânea de globalização intensifica essas imprecisões, por
abrir o caminho para a interconexão entre diferentes países e regiões, especialmente através
das migrações, dessa forma os espaços não permanecem tão fixos quanto costumavam ser
antes deste fenômeno, favorecendo assim processos de aculturação e, por vezes, de
homogeneização cultural, em que “observam-se transformações tanto nos grupos migrantes,
quanto no grupo dominante do país receptor (geralmente em menor intensidade).”3
Acaba sendo necessário empreender maiores esforços para que as raízes e memórias
de um povo específico sejam protegidas e semeadas através do tempo e das mudanças
sociológicas decorrentes dele; esforço este que não é visto com tanta importância quando se
trata da recuperação histórica de um povo atualmente visto como minoria social, como por
exemplo os povos escravizados (principalmente nativos indígenas e povos negros), apesar de
alguns deles serem maioria absoluta em números4. Esses povos foram marginalizados e
excluídos dos processos de socialização, por não se encaixarem nas classificações normativas
dos padrões elitistas estabelecidos pelo sistema capitalista; a limpeza étnica pela qual
passaram é dificilmente revertida, pois o processo de eliminação de grupos étnicos de
determinada região com objetivo de homogeneizá-la inclinando-se ao grupo dominante, tende
a ser bastante agressivo, tanto fisicamente (com as migrações forçadas e genocídios), quanto
histórica e socialmente (com o apagamento memorial de sua cultura); os esforços de limpeza
étnica são comumente acompanhados da destruição de impressões físicas do povo alvo, como
casas, centros sociais, monumentos e lugares de adoração, e posteriormente é implementada a
instalação de infraestruturas e subjetividades relacionadas à classe dominante no território
apropriado em questão.
No processo de categorização de identidades tende-se a se realizar certa generalização
e hiper simplificação das imagens sociais, o que constitui os estereótipos, utilizados com a
intenção de definir e limitar indivíduos principalmente quanto à sua aparência,
comportamento e naturalidade, em uma vulgarização irreal acerca de um grupo de pessoas, o

3
Berry, J. W. (2001) ‘A Psychology of Immigration’, Journal of Social Issues, 57(3): 615-631.

A convivência massiva de grupos distintos implica uma troca expressiva de experiências, de práticas e tradições,
essa troca influencia ambos os grupos mutuamente, fazendo com que absorvam fragmentos da outra cultura
mesmo quando não têm a intenção. A questão é que geralmente, quando há um grupo dominante, este possui
maior interesse e facilidade em projetar seus costumes sobre o outro grupo – principalmente ao controlar os
meios de comunicação – que se vê em posição de submissão e, muitas vezes, conformidade.
4
De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) divulgada pelo
IBGE no ano de 2016, pessoas negras e pardas representam a maioria da população brasileira com 54.9% de
indivíduos autodeclarados no grupo.
6

que levanta uma barreira entre o que, na teoria, seríamos "nós" (in-group) e o que seriam
"eles" (out-group), o grupo alvo – conceitos bastante utilizados na psicologia social. O maior
problema dos estereótipos sociais acontece quando associados à complexidade psicológica
estrutural daqueles que não pertencem ao grupo em questão, e que passam a replicar não
apenas seus preconceitos acerca do grupo alvo, como também podem chegar a tomar atitudes
violentas fundamentadas em suas ideias pré-concebidas sobre o tal, esses preconceitos
colonizam o imaginário coletivo com ideias que tendem a reforçar a marginalização das
minorias sociais. Entretanto, segundo Tajfel (1982) os estereótipos podem ser positivos no
sentido de ajudar os indivíduos na organização cognitiva do seu meio e proteção dos seus
valores, partindo da mesma ideia de in-group e out-group já apresentada, mas agora
observada por outra perspectiva “somos o que somos, porque eles não são como nós”5, além
de fazer com que os grupos se reconheçam enquanto grupo e se organizem estrategicamente
para manter suas representações sociais de forma positiva para “os de fora”, e evitar
identificações negativas sobre eles próprios.
Dessa maneira as identidades e representações sociais possuem uma relação mútua de
entendimento e construção, levando sempre em consideração a conjuntura psicossocial e
política em que se inserem:

"Alguns estudos (Bonomo, 2010; Breakwell, 1993; Cabecinhas, 2004;


Deschamps & Moliner, 2009; Howarth, 2002, Joffe, 1995; Moreno & Moons, 2002;
Souza, 2004; Vala, 1993, 1997; Vala & Castro, 2013) enfatizam a importância do uso
articulado das representações sociais com as construções identitárias e os contextos
grupais, visto que, “as representações se constroem em função das inserções sociais
dos indivíduos e, ao mesmo tempo, elas modulam as relações sociais entre esses
mesmos indivíduos” 6

Conforme Vala (1997), a articulação entre as teorias da identidade social e da


representação social podem culminar em diversas vertentes de estudos interessantes para a
construção desse imaginário coletivo, focando (A) na função que as identidades podem ter na
concepção de redes de comunicação que aprendam e moldem juntas as representações sociais;
(B) no impacto que as representações sociais já integradas estruturalmente no imaginário
social podem ter na elaboração de novas categorias identitárias; (C) na forma como o contexto

5
Tajfel, H. (1983) Grupos Humanos e Categorias Sociais II, Lisboa: Livros Horizonte. p. 388
6
PINTO-COELHO, Zara; ZAGALO, Nelson. Comunicação e Cultura. III Jornadas Doutorais, Ciências da
Comunicação e Estudos Culturais. 2014. p. 130
7

de um período pode afetar na atualização e entendimento das representações sobre um mesmo


objeto.7

III. A Identidade Latino-Americana e a Gênese de seu Estudo


Seguindo a linha sobre construção e definição identitária a partir do que não se é (ou
da perspectiva do out-group), uma das primeiras teorias acerca da composição do termo
"América Latina" pode ser apontada como forte exemplo desse modelo, seu próprio nome já
aparentava ter sido construído a partir de uma visão externa à ela, uma visão do "outro"8. Luis
Bonaparte – herdeiro de Napoleão e primeiro presidente francês eleito por voto direto – teria
designado o termo para definir o território que almejou ser seu próximo alvo de exploração9,
como um símbolo da política expansionista francesa para a região, concebendo assim uma
nomenclatura que teria se originado meramente da imagem preconcebida do dominador sobre
aquele território. Contudo, essa ideia atribui uma identidade totalmente alheia aos povos que
compunham essa sociedade antes mesmo de buscar conhecê-la, por isso é importante que
entendamos de onde vêm a cultura, a sociedade, as agendas políticas latino-americanas
principalmente através do olhar próprio de seu povo, não do que os de fora supõem que sejam
suas origens e verdades. Houve uma certa circulação cruzada nos primórdios do conceito, mas
após diversos estudos verifica-se que o termo na verdade se robustece e consagra à luz do
desenvolvimento identitário da América Central, como uma "reação política nativa à projeção
estadunidense"10, durante o século XIX, período que testemunhou os movimentos de
expansão dos Estados Unidos, inspirado fundamentalmente na ideologia do Destino
Manifesto11. Segundo a autora Mónica Quijada (1998), seriam dois os principais fatores de
firme aderência à expressão: em primeiro lugar, o sentimento de unidade que se esticou pelos

7
PINTO-COELHO, Zara; ZAGALO, Nelson. Comunicação e Cultura. III Jornadas Doutorais, Ciências da
Comunicação e Estudos Culturais. 2014. p. 131
8
O próprio nome "Latina" refere-se à genealogia linguística que seria falada nesse território posteriormente à
colonização (especificando: línguas derivadas do latim, que são a espanhola, a portuguesa e a francesa). Segundo
essa visão, Luis Bonaparte já categoriza o território americano com um "sobrenome" de referência europeia,
sabendo de pronto que aquela região pretendia ser sua.
9
ALVAREZ, Maria Luisa Ortiz. (Des) Construção da Identidade Latino-Americana: Heranças do Passado e
Desafios Futuros. p. 2
10
DOS SANTOS, Fabio Luis Barbosa. Atualidade da noção de América Latina: diálogo crítico com Leslie
Bethell. p. 6
11
Doutrina que fomentava a ideia de que seria uma designação divina a de liderança estadunidense sobre o
restante do mundo (tendo como escopo principalmente os povos da América Latina, pela proximidade territorial
e incapacidade de sujeitarem outros povos aos seus mandos), fazendo acreditar que seu expansionismo
geopolítico seria apenas uma demonstração desse desígnio.
8

países hispano-americanos frente ao avanço expansionista norte-americano, e, em segundo, a


tendência ocidental a racializar povos e categorizá-los em rótulos (enquanto superiores ou
inferiores), que surgiu ainda durante o século XIX. Essa consolidação do termo frente a uma
conjuntura submissa a outras regiões a priori não parece ter muitos pontos positivos para os
próprios então latino-americanos, mas ao pé que se definiam enquanto conjunto, também
afirmavam seus vínculos e termos próprios, remodelando suas fontes e se divulgando como
identidade comum. Precisamos descobrir quem somos nós, a partir do que conhecemos sobre
nós mesmos.
Alguns dos principais articuladores dos movimentos de edificação de identidade entre
os Estados latino-americanos, foram Simón Bolívar (1783-1830) e José Martí (1853-1898),
que buscaram o fortalecimento da identidade regional por meio de discursos de união e
reconhecimento das semelhanças dos Estados em questão. A América bolivariana cunhava-se
em um governo único que confederasse todos esses Estados que tinham "uma só origem, uma
só língua, os mesmos costumes e uma só religião" segundo ele próprio12, entretanto, para sair
do papel, a ideia dessa América precisava se sustentar em processos de independência muito
bem sucedidos e consolidação de nacionalidades deveras definidas e difundidas entre os
povos, pontos que deixaram a desejar, gerando uma base de difícil implementação para deste
ideal. Já a concepção de Martí prometia maior sucesso em sua elaboração e efetiva execução,
pois partia da premissa de afastamento latino-americano do modelo norte-americano em todos
os sentidos de dominação, e da busca pelas raízes e singularidades próprias a fim de construir
essa identidade comum.
José Martí foi mentor intelectual e organizador do Partido Revolucionário Cubano
(fundado em 1892), tinha ideais fortemente humanistas e buscava uma radicalização política
no sentido democrático, de maneira alternativa e dissociada dos moldes europeu e
estadunidense, de modo que submetesse os princípios capitalistas às proposições da sociedade
nacional, e empregando a célebre expressão Nuestra America – que objetivava desagregar sua
imagem à da América do Norte – para ilustrar seus ideais, horizontais à altura de contrapor a
utilização do argumento de raças como categoria social justificada: “El hombre no tiene
ningún derecho especial porque pertenezca a una raza o otra: dígase hombre, y ya se dicen
todos los derechos” (MARTÍ, 2000, p. 205)13. A unidade continental tinha propósitos bastante
estratégicos, de forma a juntar todos aqueles que se sentissem ameaçados pela possibilidade

12
BOLÍVAR, Simón. Carta de Jamaica. Revista de economia institucional, vol. 17, n. 33 (2015)
13
DOS SANTOS, Fabio Luis Barbosa. Atualidade da noção de América Latina: diálogo crítico com Leslie
Bethell. p. 269
9

de retorno das interferências europeias nas políticas locais, buscavam exercer suas autonomias
enquanto novos Estados soberanos, de maneira até paradoxal: aliar-se para conseguir mais
independência.
Contudo, a condição de pluralidade dos povos latino-americanos surge com força ao
debate, o que traz à tona a complexidade da análise da América Latina no âmbito de definição
de uma identidade (no singular) ao invés de assumir a diversidade de identidades que se
apresentam na região. Essa complexidade porém consegue ser bem esclarecida nas palavras
de Fernando Henrique Cardoso, sociólogo e político brasileiro, em seu artigo
"Desenvolvimento e Identidade Latino-Americana", em que traz a compreensão de que apesar
de haverem várias Américas Latinas, ainda sim há uma comunidade de heranças e desafios
comuns entre os países em questão, e uma evidência desse fato é que, mesmo que
supostamente utópica, a ideia de "unidade latino-americana" continua viva e sendo estudada
há quase dois séculos, o necessário agora seria entender sobre quais bases, valores e
aspirações atuais essa unidade identitária pode ter vigência e se desenvolver, reconhecendo a
pluralidade de suas diferenças.14
Houve um período em que a concepção de identidade esteve ligada a uma rotulação
consolidada e permanente, período em que se descrever em algumas poucas características já
parecia dar uma visão geral do que esse indivíduo seria e o que as pessoas em volta poderiam
esperar dele. Entretanto, esse conceito acabou passando por um processo de ressignificação
em alguns quesitos e os elementos que o constituem adotaram um novo formato, mais
aceitavelmente fluido e polissêmico, como aponta o autor e linguista Rajagopalan (1998), os
indivíduos não mais possuem uma identidade fixa anterior, ao invés disso passa a construí-la
em sua língua e por meio dela, em sua relação com o próximo e com o meio social em que se
insere15.
Por sua vez, a América Latina usufrui desta permissão de linguagem em que adota o
termo "identidade" para se definir e definir seu povo, mesmo reconhecendo que sua definição
é fluida e "seu povo" na verdade são vários; a pluralidade cultural latino-americana representa
um genuíno laboratório de experiências sociais, e isso não torna menos legítima sua vivência
enquanto povo unificado, muito pelo contrário, essa pode ser considerada sua maior riqueza,

14
CARDOSO, Fernando Henrique. Desenvolvimento e identidade latino-americana. Nossa América, Revista
Memorial da América Latina, n. 23, ano 2006.
15
RAJAGOPALAN, K. O conceito de identidade em Linguística: é chegada a hora de uma reconsideração
radical? p. 41
10

se constituir enquanto um microcosmo de coexistência entre diversas etnias e culturas,


podendo demonstrar sua pluralidade e sua unidade simultaneamente.
Martí percebia a miscigenação na América Latina dessa maneira, acreditava que essa
condição representa muito bem seus ideais humanistas de dissolução das discriminações,
entendendo a mestiçagem como a realização plena da igualdade humana. Evidentemente essa
metáfora não condiz com a realidade, visto que não apenas os países do Norte nos vêem com
certo desprezo e discriminação, como mesmo intra-regionalmente podem ser percebidas
várias visões negativamente estereotipadas sobre aqueles que deveriam ser considerados
"hermanos"; são diversos os possíveis motivos para que essas imagens negativas sejam tão
marcantes e inatas à subjetividade humana nessa região, mas principalmente a absorção das
noções de individualidade e competitividade que o sistema capitalista fomenta, em que não
conseguimos nos enxergar no outro, buscando ainda alcançar um espaço entre os detentores
de poder (neste caso, os países mais desenvolvidos economicamente), mesmo que isso custe a
autenticidade de seu próprio povo.
O ideal de Martí sobre uma sociedade livre de discriminações é claramente utópico,
contudo devemos sempre buscar entender o fundamento desses preconceitos e trabalhar nosso
senso crítico sobre as informações que nos são bombardeadas dia após dia, para que
possamos, por exemplo, refletir sobre os porquês de algo ser considerado interessante e outro
algo ser tido como desprezível, e para além disso entender a quem convém que consideremos
essas concepções interessantes ou desprezíveis. No caso da América Latina, precisamos
legitimar as semelhanças que possuímos, reconhecendo que esse "outro" não nos é tão
distante quanto aparenta, prestar atenção em nosso potencial enquanto unidade e fomentar
maiores riquezas em conjunto.
Em entrevista ao jornal The American Interest, publicada no mês de fevereiro de 2008,
o jornalista e político peruano, Mario Vargas Llosa condensa de forma bastante ilustrativa
esse entendimento:

"Cinco séculos após a chegada dos europeus a suas praias, serras e florestas,
os latino-americanos de descendência espanhola, portuguesa, italiana, alemã, africana,
chinesa ou japonesa são tão “nativos” ao continente quanto aqueles cujos ancestrais
foram os antigos astecas, toltecas, maias, quéchuas, aimarás ou caraíbas. E a marca
que os africanos deixaram no continente, onde vivem por cinco séculos, é
onipresente: nas pessoas, língua, música, comida e até em certas formas de se praticar
a religião. Seria um exagero dizer que alguma tradição, cultura ou raça deixou de
contribuir para o vértice fosforescente de misturas e alianças diluídas em todas as
ordens da vida latino-americana. Essa aglomeração é nosso maior patrimônio: ser um
11

continente que não possui uma só identidade porque contém todas as identidades. E,
graças aos seus criadores, continua se transformando a cada dia."16

IV. As Diferenças entre o Brasil e o Resto da América Latina


Tendo isso em mente, de que a identidade de um grupo é construída socialmente e
mutável através do tempo, precisamos repensar o nosso lugar como latino-americanos. A
sociedade brasileira ainda resiste à integração do Brasil com as demais nações da América
Latina, principalmente devido ao não reconhecimento das semelhanças socioculturais,
históricas e políticas que os unem, em muitos casos chegando ao ponto de discriminação17.
Essa resistência possui diversas origens, sendo uma delas a maneira como se desdobrou o
processo de independência de cada uma das partes (Brasil e América Hispânica).
O tal projeto de unificação política continental tomou força em uma conjuntura de
independência dos países latino-americanos – que estiveram anteriormente sob gestão
espanhola –, como forma de se fortalecerem enquanto soberanias no sistema internacional e
frente às ameaças de re-intervenção europeia. Todavia, o processo brasileiro de independência
ocorreu de outra maneira, sua configuração foi atípica e singularmente pacata, não houve nem
indício de enfrentamento militar, e o Brasil passou de colônia portuguesa para um regime
"independente" sob o comando de um príncipe português18, o que afastou qualquer risco de
intervenção, já que a governança do país mantinha seu antigo caráter conservador,
escravocrata e europeu, ainda que gozasse do título emancipatório.
O regime conservador brasileiro enxergava seus Estados vizinhos com maus olhos,
pois a mentalidade das classes mais economicamente abastadas e dos membros do governo
continuavam fortemente influenciadas pelo modo de vida tradicionalista europeu, além do
fato da circulação de informações no século XIX ser profundamente limitada, os
conhecimentos sobre os países vizinhos serem ainda mais escassos do que observamos
atualmente, e a população em sua maioria não obter esses acessos exclusivos de informação.
Assim, a imagem brasileira passada às outras repúblicas da região era a da elite e do corpo
16
ALVAREZ, Maria Luisa Ortiz. (Des) Construção da Identidade Latino-Americana: Heranças do Passado e
Desafios Futuros. p. 7
17
TANCREDI, Leticia di Maio. A dificuldade de incorporação da sociedade brasileira a uma identidade
latino-americana. Contexto Internacional, p. 13
18
Alguns anos depois da mudança da família real portuguesa ao Brasil (1808) fugida de Portugal após a invasão
de tropas francesas ao país, D. João VI – rei de Portugal na época – retorna ao seu país de origem (1821) devido
à pressão das instabilidades que ocorriam enquanto esteve distante, intitulando um de seus filhos como príncipe
regente do Brasil, Pedro de Alcântara. As Cortes Portuguesas tomaram medidas que repercutiram mal no Brasil e
alimentaram a impopularidade do regime; com a influência do Senado, de sua esposa Maria Leopoldina e de
José Bonifácio (estadista brasileiro e conselheiro de D. Pedro I), o príncipe decide romper relações com Portugal
e assumir a liderança no processo de independência do Brasil (1822).
12

imperial do país, que não tinham interesse em qualquer tipo de integração ou aproximação,
como aponta Tancredi em um trecho de seu artigo 'A dificuldade de Incorporação da
Sociedade Brasileira a uma Identidade Latino-Americana':

“O processo de independência brasileiro deu-se de forma pacífica - sendo


consentido pela metrópole, realizado pelo herdeiro do rei português (com apoio da
burguesia brasileira) e (...), consolidando o Brasil como uma monarquia. (...) Os
processos de independência da América Espanhola ocorreram de maneira diferente,
tendo sido marcados por grande instabilidade, guerras contra a metrópole e posterior
fragmentação territorial. (...) o Brasil, politicamente estável e “civilizado”,
considerava as repúblicas latino-americanas “violentas, extremamente instáveis e
‘bárbaras’” 19

Após sua independência e ao longo da história, o Brasil buscou a todo custo se aliar às
potências do Norte, em especial aos Estados Unidos, pretendendo pegar carona na sólida
projeção internacional e crescimento econômico que o país obtinha ano após ano devido às
suas políticas imperialistas, enquanto os demais Estados latino-americanos possuíam relações
tensas com o país, em função das inúmeras intervenções deste nas questões internas da região.
Através da Doutrina Monroe (1823)20, os EUA iniciam um processo de aparente aproximação
com a América Latina, a fim de estabelecer bases seguras de influência e de contenção da
ameaça comunista e europeia – no sentido de possível "re-ocupação" do território –, contudo
essa "aproximação" pode ser traduzida principalmente como "sequência de operações
militares intervencionistas" em que os interesses norte-americanos acabavam amplamente
atendidos enquanto os latinos ficavam à mercê de seu novo dominador; essa atitude
imperialista estadunidense se prolongou e prolonga até os tempos atuais, exemplo disso é o
histórico de interferências em Cuba ao longo de sua trajetória, que contemplou,
posteriormente, como um dos eventos mais nítidos dessas ideologias dos EUA, a Emenda
Platt21 (1901), que foi imposta em sua constituição a fim de conceder aos Estados Unidos
permissão para construção de suas bases militares no país, assim como também ocorrido no

19
TANCREDI, Leticia di Maio. A dificuldade de incorporação da sociedade brasileira a uma identidade
latino-americana. Contexto Internacional, p. 14
20
Doutrina instaurada por James Monroe em 1823, com a finalidade de barrar a interferência europeia nos países
americanos. Ilustrada pelo slogan "América para os americanos", a Doutrina Monroe simulava a intenção de
defender os países latinos com independência recém declarada de uma possível recolonização. Dessa forma os
Estados Unidos conseguiram se projetar mais facilmente enquanto potência política e econômica regional sobre
o território, e disseminar seu modelo liberal e incisivamente capitalista aos Estados da América Latina.
21
Instrumento constitucional norte-americano que os permitiam intervir em questões políticas e militares da ilha
de Cuba (vide a criação da base militar de Guantánamo na região), foram obrigados a assinar a emenda no ano
de 1901.
13

Panamá durante seu processo de independência (1903), em que demonstrou apoio à


emancipação do Estado, para que pudesse garantir posteriormente a construção do Canal do
Panamá que acabaria ficando sob gestão norte-americana até o ano de 1999.
O expansionismo norte-americano e sua política do Big Stick22 associavam o
desenvolvimento econômico à intervenção militar, e querer se aliar a isso não soava em bom
tom aos vizinhos fortemente afetados por essa ideologia. O general norte-americano Smedley
Butler publicou o livro War is a Racket em 1935, em que descreve o funcionamento do
complexo militar estadunidense e detalha as ações que participou durante sua carreira,
principalmente pela extensão da América Latina, o trecho abaixo relata de maneira clara o
procedimento das operações e a quem interessavam:

"[...] Foi assim que ajudei a transformar o México, especialmente Tampico,


em lugar seguro para os interesses petrolíferos americanos, em 1914. Ajudei a fazer
de Cuba e Haiti lugares decentes para que os rapazes do National City Bank
pudessem recolher os lucros. Eu ajudei a estuprar meia dúzia de repúblicas da
América Central em prol dos lucros de Wall Street [...] Ajudei a "limpar" a Nicarágua
para os interesses da casa bancária internacional dos Brown Brothers, em 1909-1912.
Trouxe a luz à República Dominicana para os interesses açucareiros norte-americanos
em 1916. Ajudei a fazer de Honduras um lugar "adequado" às companhias frutíferas
americanas, em 1903. Na China, em 1927, ajudei a fazer com que a Standard Oil
continuasse a agir sem ser molestada. [...] Voltando os olhos ao passado, acho que
poderia dar a Al Capone algumas sugestões. O melhor que ele podia fazer era operar
em três distritos urbanos. Nós, os fuzileiros navais, operávamos em três
continentes."23

Por todos esses motivos, o Brasil era tratado com desconfiança por seus vizinhos, e o
sentimento era recíproco, principalmente por suas agendas de política externa serem tão
distintas e pelo discurso da elite imperial, que se baseava na crença do funcionamento de uma
unidade brasileira estável com instituições sólidas para que se formasse uma identidade
nacional forte, simultaneamente considerando as repúblicas latino-americanas como um
grande mosaico de governos instáveis sujeitos ao risco dos protestos das massas, evento este
ilustrado pela revolução negra do Haiti24, que acabou por se tornar um símbolo de ameaça às

22
Termo utilizado para definir a política externa estadunidense no governo de Theodore Roosevelt (1901-1909),
"Big Stick" em português significa algo como "grande porrete", demonstrando uma forma de diplomacia em que
se utilizam discursos aparentemente amistosos ao mesmo tempo em que deixa claro a possibilidade de uso da
força caso necessário, basicamente na hipótese dos interesses norte-americanos não serem atendidos. Este termo
foi tirado de um provérbio originário da África Ocidental "fale com suavidade e tenha à mão um grande porrete,
assim irás longe"
23
BUTLER, Smedley Darlington. War is a Racket: The antiwar classic by America's most decorated soldier.
New York. Skyhorse Publishing, 2013. p. 16
24
A Revolução Haitiana iniciou-se em 1791, liderada por Toussaint Louverture e Jean-Jacques Dessalines foi
uma grande rebelião de pessoas escravizadas e pessoas negras libertas contra o sistema colonial escravista
francês, que levou a antiga colônia de São Domingos à independência. As rebeliões foram inspiradas pelos ideais
14

classes proprietárias dos meios de produção (FERNANDES, 2008). As lideranças


republicanas, apesar de se esforçarem por algum tempo em incluir o Brasil nos programas
regionais de liga americana, desenvolveram esse receio de integrá-lo pois seu espírito
americano se reproduzia de forma simpatizante aos modos conservadores da monarquia. Em
seu capítulo dedicado ao assunto, Tiago Coelho Fernandes (2008) traz à tona argumentos
oriundos do governo imperial que manifestavam a necessidade dos Estados Unidos
participarem da liga, visto que "suas instituições naturalmente os separavam da Europa", e a
resposta chilena de que, "pelo contrário, parecia que os Estados Unidos se uniam mais com as
potências europeias, e posto que se portassem com mais decência do que a França e a
Inglaterra, também algumas vezes nos apoquentavam"25. Aos poucos o Brasil foi sendo
excluído dos projetos integracionistas que surgiam, assim como aponta Antônio Pedro de
Carvalho Borges – diplomata encarregado de gerir os negócios no Chile – houveram
desconfianças de que o Império não seria tão estranho aos projetos de "monarquizar" a
América, e mesmo que essa insinuação tenha caído por terra, ainda não se contava com o
Brasil para integrar essa união americana, pois até o momento parecia referir-se apenas aos
países republicanos. Ainda assim, o governo imperial brasileiro parecia se importar em
manter uma relação amigável com seus vizinhos, a fim de evitar tensões desnecessárias.
De certa forma, ainda pode-se considerar os primórdios do histórico de aproximação
do Brasil com a América Latina através de um ângulo predatório – principalmente movidos
pela influência nortista, que tinha costume de exaltar a questão nacionalista em suas pautas
políticas – exemplo claro desta predação, são os feitos do barão do Rio Branco enquanto
ministro das Relações Exteriores do Brasil (de 1902 a 1912), celebrado pelo tal alinhamento
aos Estados Unidos de maneira a colocar o Brasil em posição privilegiada dentre os países
submissos, ao passo que liderava as negociações de extorsão do Acre, pertencente
anteriormente à Bolívia. O posicionamento internacional brasileiro dizia muito sobre quem o
comandava, ora em posição agressiva, ora em posição de subordinação, a depender do Estado
com o qual se relaciona.
Um panorama geral do que vimos até então a respeito das posições básicas do império
na América Latina são de que suas classes dominantes tratavam os países europeus como

da própria Revolução Francesa (1789-1799), que abordavam pautas de igualdade entre os homens e despertaram
o âmago da luta por seus direitos e liberdade. Sua independência foi proclamada em 1804, tornando o Haiti a
primeira nação independente da região caribenha e primeiro país a conquistar sua emancipação através de uma
rebelião de pessoas escravizadas.
25
FERNANDES, Tiago Coelho. Entre Bolívar e Monroe: o Brasil nas relações interamericanas. Las relaciones
interamericanas: continuidades y cambios, p. 215
15

centro-político, econômico e cultural, além de padrão a ser seguido enquanto "civilização


moderna", pois se identificavam com esses valores, o que ia de encontro com a ideologia
progressista dos regimes americanos, mais abertos a atender às manifestações de seu povo,
esse antagonismo dava o tom da relação Brasil império (que caminhava para construção de
uma nação grandiosa e estável) e as repúblicas latino-americanas (desenhadas como um
quebra-cabeça anárquico e com soberania questionável frente a pressões externas). Essa
concepção de superioridade que o Brasil tinha sobre si fundamenta sua maior identidade com
os ideais competitivos das potências do norte, circunstância que estabelecia uma noção, em
suas classes dominantes, de estar em posição de liderança natural diante dos países
sul-americanos.
A estrutura brasileira está altamente ligada aos centros imperialistas, economicamente
dependente de commodities agroexportadoras e em função de bloquear a ascensão de classes
articuladas com projetos de desenvolvimento econômico autônomo, além de abafar grandes
manifestações populares, de forma que este abafamento reduziu as possibilidades de formação
de uma identidade mais autêntica. O desinteresse brasileiro em políticas de projeção regional
e desenvolvimento de identidade genuína podia ser interpretado como a política de um
império não imperialista, como colocou o autor Tiago Fernandes, pois na maioria dos casos
(exceto na região do Prata) tendia a ater seu envolvimento apenas ao necessário em negócios
de liga continental, sem buscar o alinhamento de políticas no intuito de se projetar enquanto
potência, o que seria esperado visto sua posição de política externa. É apenas a partir do
momento em que é entendido como país latino-americano pelos Estados Unidos, em
conformidade com as políticas empregadas durante a Doutrina Monroe e suas outras
ideologias, o Brasil começa a se reconhecer como parte deste grupo regional, agora basta
entender: o que leva um país de gênese tão peculiar ao seu meio, fazer parte deste mesmo
meio?

V. O Lugar do Brasil na América Latina e suas Semelhanças

"Por um lado, recupero sucintamente a historicidade dos projetos de unidade


continental, lembrando que seu conteúdo evolui em consonância com o próprio
movimento da história latino-americana. Por outro lado, sugiro que a constatação de
que os brasileiros raramente se enxergam ou se enxergaram como parte da América
Latina não deve servir como premissa para um argumento de viés tautológico,
justificando o que se pretende explicar. Ao contrário, este distanciamento deve ser
problematizado à luz da dinâmica da luta de classes no país, endereçando, em última
16

análise, a seguinte questão: a quais brasileiros interessa construir-se como parte da


América Latina?"26

Ainda que haja insegurança mútua entre o Brasil e os demais países latino-americanos,
atualmente as semelhanças entre eles se sobressaem, mesmo que haja significativas variações
nacionais devido aos antecedentes de cada um. No que se refere aos seus processos históricos,
ambos tiveram seus povos originários subjugados, fazendo com que houvesse uma longa
trajetória de negação de suas culturas, religiões e símbolos próprios (Merian, 2000)27. A
extorsão das terras e força de trabalho indígenas eram justificadas pelo sentimento de
desprezo racial cometido contra esses povos, desprezo este que, por sua vez, nutria a
destruição de civilizações nativas e escravizadas, utilizando o discurso de que tais pessoas não
possuíam alma, suas espiritualidades foram "demonizadas" e substituídas por uma cristandade
forçada, que os ensinava sobre pecados e obediência, disseminando crenças que facilitassem o
controle dos dominadores sobre eles. Geração após geração, a catequização firmava suas
raízes e a eugenia começava a mostrar seus impactos a nível estrutural, as qualidades culturais
dos povos originários e escravizados iam se dissipando em culturas cada vez mais
miscigenadas e histórias não preservadas, pouco a pouco dificultando a busca pelas origens de
quem se interessasse, suas raízes foram sendo roubadas ao longo do caminho.
Ambos passaram por grande influência europeia, não apenas ibérica, mas também
inglesa e francesa no século XIX, posteriormente ainda se deparando com forte
intervencionismo norte-americano durante o século XX. Esse encadeamento de explorações
impôs novos formatos nos campos político, econômico, cultural e religioso, além da
importação de instituições que conjugassem com esse novo mundo – não apenas a
catequização dos povos, mas também a imposição de vestimentas específicas, do sistema de
produção e mercado de consumo, de linguagem importada e pré determinação de quais seriam
as condutas socialmente aceitas naquela conjuntura.
Ainda analisando as semelhanças intra América Latina, pode-se citar a ampla e
duradoura exploração de mão-de-obra escrava (prática herdada até hoje em alguns países,
atualmente de maneira ilegal)28, regime esse que tinha como principais alvos os povos nativos

26
DOS SANTOS, Fabio Luis Barbosa. Atualidade da noção de América Latina: diálogo crítico com Leslie
Bethell. Revista Eletrônica da ANPHLAC. p. 13
27
TANCREDI, Leticia di Maio. A dificuldade de incorporação da sociedade brasileira a uma identidade
latino-americana. Contexto Internacional, p. 13
28
A chamada "escravidão moderna" mantém formato semelhante à que estudamos, até 1888 no Brasil, ainda
implica relações exploratórias de trabalho das quais não se consegue sair em que a vítima é obrigada a exercer
uma atividade sob ameaças, violência e detenção, majoritariamente atraídas por falsas promessas de emprego.
17

e pessoas cativas do continente africano, e que se dava como sustentáculo dos sistemas de
produção que se baseavam na acumulação de capital e ativos – inicialmente a terra e tudo o
que rendesse dela. Algumas dessas repúblicas anunciaram a abolição de suas escravidões em
períodos bastante tardios – em comparação com os movimentos do restante do mundo – e
esse atraso evidentemente deixou sequelas intensamente racistas na estrutura dessas
sociedades. São poucas as gerações que não conheceram a escravidão de perto e a
normalizaram em sua rotina, e isso faz com que as representações negras e nativas
latino-americanas escravizadas ainda estejam frescas na história desses países, e que pessoas
negras e indígenas ainda não tenham suas imagens totalmente desvencilhadas dessa vivência
associada ao sofrimento e à violência de seus corpos. Essa miscigenação, ao invés de trazer
puramente a igualdade entre os povos que Martí tanto almejava, atualmente se divide entre
discriminação de um povo sobre outro, confusão de pertença em relação a uma descendência
ou outra, e um tanto desse sentimento de que "todos somos iguais" (que pode ser muito
promissor ou talvez muito perigoso, no sentido de deslegitimar a existência do racismo
claramente presente em nossas estruturas).
Os Estados latino-americanos constituem democracias recentes, que custaram a se
estabelecer e ainda cambaleiam a depender do líder que os governa, sua significativa maioria
passou por um período ditatorial entre as décadas de 60 e 80, o que demonstra o caráter tardio
de suas transições democráticas. Esse caráter de democracias jovens deixa os referidos
governos e povos suscetíveis a ataques aos seus regimes democráticos, a ideologia do
chamado "governo do povo" ainda não parece estar intrínseca o suficiente na subjetividade
dos povos dessa região para que tenhamos fora de vista os riscos da chegada de um novo
governo autoritário, e pior, com apoio do povo. Ainda no que se refere ao regime político
dessa gama regional, pode-se dizer que os Estados adotaram precocemente o modelo
liberalista em seus contextos político, eleitoral e judiciário (além de todos os outros campos
adjacentes), logo após seus processos de independência29. Isso se deu justamente por
circunstância de terem sido mais amplamente influenciados pelas metrópoles capitalistas, em

Diferentemente dos tempos coloniais, a mão de obra escrava não mais vitima apenas negros e indígenas, mas
essa nova configuração se mostra sujeita à qualquer pessoa em situação de miséria.

A fundação australiana Walk Free, em seu Índice Global de Escravidão publicado em 2016, estima que mais de
45,8 milhões de pessoas vivem em situação de escravização no mundo atualmente, sendo os principais tipos de
trabalho que empregam esse regime: a indústria da pesca, de cultivo de drogas, de exploração sexual e em
propriedades particulares.
29
ALVAREZ, Maria Luisa Ortiz. (Des) Construção da Identidade Latino-Americana: Heranças do Passado e
Desafios Futuros. p. 7
18

especial pelos Estados Unidos, que por dividirem o território do continente americano
conosco, acaba desfrutando de maior facilidade para projetar suas políticas e práticas sobre
novas soberanias, ainda mais pelo fato dessas soberanias serem tão recentes, pois se mostram
mais vulneráveis ao risco de imposições do sistema utilizado por soberanias mais antigas e
bem estruturadas, como é o caso das políticas relacionadas à Doutrina Monroe.
No campo econômico, as repúblicas latinas se assemelham por se assentarem
majoritariamente pelo capital internacional, sendo que seu papel nesse sistema integrado é o
de produção de matérias-primas para exportação (Chile com o cobre, Venezuela com o
petróleo, México e Peru com a prata, e assim por diante), fazendo com que grande parte dos
bens manufaturados sejam importados de outros Estados, e implicando uma relação de
dependência para com os países mais economicamente desenvolvidos , pois, em sua maioria,
carecem de investimentos para que consigam ampliar sua capacidade produtiva, devido à falta
de acumulação interna de capital, empregam políticas de importação de bens e serviços, o que
os faz contrair empréstimos para construção de infraestrutura e modernização de
equipamentos, como resultado disso acabam em situação de endividamento e dependência
externa30. A situação econômica foi delineada de forma bastante esclarecedora por Robert
Valls, em matéria publicada no jornal El País, em 2014:

"Historicamente, a América Latina sustentou seu crescimento quase


exclusivamente sobre a exploração de recursos naturais e isso provocou que muitos
países da região tivessem economias pouco diversificadas, e excessivamente
dependentes de suas matérias primas. Nada menos que 93% da população da América
Latina e 97% da atividade econômica da região está e se desenvolve em países
exportadores de ‘commodities’, segundo o Banco Mundial. [...] Isso coloca a região à
mercê das volatilidade dos mercados globais."31

E ainda com uma percepção desmotivadora, mas aguçada, apontada pelo antropólogo
argentino Néstor García Canclini (2008):
“(...) Globalizamo-nos como produtores culturais, como migrantes e como
devedores. A tibieza com que assumimos esses três papéis, que redundou no fracasso
de muitos projetos de integração regional (...) Assim chegaremos a 2010, quando
várias nações do continente celebrarão o segundo centenário de sua independência,
com mais sujeições do que patrimônio.”32

30
MACHADO, Luiz Toledo. A teoria da dependência na América Latina. Estudos avançados, v. 13, p. 199

31
VALLS, Robert, 2014. O ‘vício’ da América Latina pelas matérias primas, El País.

32
CANCLINI, Néstor García. Latino americanos à procura de um lugar neste século. Editora Iluminuras Ltda,
2008, p. 12
19

VI. A Influência das Propagandas na Construção das Identidades


O contexto globalizado no qual estamos inseridos, exige que nações com identidades
históricas, geográficas, culturais e econômicas similares se aproximem de forma estratégica33,
principalmente para que ganhem força como potência regional e ascendam no cenário
internacional. Com essas considerações, tudo indica que a América Latina deveria ocupar um
espaço prioritário na agenda de política externa brasileira, entretanto esse posicionamento não
se mantém de maneira consensual entre representantes políticos e membros da elite brasileira.
A personalidade das elites ainda pauta suas crenças e comportamentos em um modo
conservador de pensar e agir, no âmbito político tendem a defender algumas agendas
reacionárias, geralmente superficializando pautas sociais – isso quando se atentam a elas –, se
identificam ainda fortemente com ideologias econômica e politicamente liberais, ao mesmo
tempo que exaltam referências culturais fortemente tradicionalistas, tais traços não tendem a
se fundir ao que as especificidades latino-americanas costumam representar, que demonstram
uma identidade em formação e multifacetada, sua heterogeneidade não se encaixa nos padrões
consistentes e convencionais apreciados pelas elites econômicas.
Nas configurações de influência em que nos encontramos atualmente, os processos de
integração política regional precisam passar primeiramente pelo apoio das elites e então pela
integração das sociedades, deste modo à medida que o aval das classes dominantes é dado a
respeito dessa ideia e os meios de informação são acionados para fim de convencimento das
classes trabalhadoras sobre tal assimilação regional, é iniciado o verdadeiro processo de
integração, pois esse processo não pode apenas ser forçado econômica ou politicamente, a
integração só se torna legítima e possivelmente duradoura quando envolve todo (ou quase) o
conteúdo social (o próprio povo), quando a população também experiencia essa integração e
se sente parte, assim como ocorre em blocos econômicos e políticos com relações internas
mais aprofundadas e identidades comuns mais intrinsecamente estabelecidas34, essa noção

33
IGLECIAS, W, 2014. O que o brasileiro médio sabe da América Latina?, Carta Capital.
34
A União Europeia é o exemplo de bloco melhor sucedido e consolidado na história do Sistema Internacional,
compreende um complexo com instituições supranacionais que decidem pautas de ordem econômica, social,
ambiental e militar. O PIB de alguns de seus países detém posições de destaque diante do cenário global e sua
moeda comum de circulação superou o dólar em valor de mercado, essa prosperidade ajuda a inibir o surgimento
de conflitos intra-bloco.

Apesar de ser um case de sucesso, o bloco atualmente enfrenta diversos problemas, como as altas taxas de
desemprego, a desigualdade de infraestrutura e econômica, questões separatistas, elevada xenofobia, entre
outros. A UE influenciou a criação de outros importantes blocos econômicos, como NAFTA, MERCOSUL e
APEC.
20

subjetiva de pertencimento se constitui e mantém através do efeito spillover35, de forma


gradual e enfrentando obstáculos em sua consolidação.
Para esse fim, a burguesia – nicho economicamente dominante da nossa sociedade –
utiliza seus principais meios de indução de ideias sobre a classe trabalhadora, as grandes
mídias. Os grandes meios de comunicação (não apenas a televisão e recursos impressos, mas
também as redes sociais) pertencem à essa classe, e por esse motivo atendem aos interesses de
quem os sujeita, metaforicamente atuando como a boca da burguesia, e permitindo que
propaguem seus pensamentos e ideologias, consequentemente persuadindo a mentalidade de
quem consome os conteúdos dessa cultura. Essa forma de persuasão através dos meios de
comunicação também pode ser observada transversalmente ao fato de que a burguesia alia
posicionamentos à potências internacionais, que têm interesse em manter a América Latina o
mais dividida quanto possível, para que a chance de ganharem força no cenário internacional
enquanto unidade seja menor.
Voltando à questão das grandes mídias, precisamos ter em mente que nossos gostos
pessoais e os estereótipos sociais que carregamos conosco não são tão pessoais como
imaginamos, recebemos essas ideias do nosso meio externo e as adequamos aos princípios e
valores que aprendemos e estabelecemos durante a vida, a origem dessas informações
geralmente são os meios de comunicação que consumimos e as pessoas com as quais nos
conectamos, isso pode deixar a entender que nossas fontes são mais genuínas do que de fato
são, pois a questão chave é que a indústria da comunicação e do entretenimento atende a todos
os públicos, então mesmo que um indivíduo se encontre em uma bolha social nichada e
apartada dos conteúdos de mainstream, por exemplo, trocando experiências apenas com
pessoas "alternativas" e consumindo canais com menos alcance, a indústria cultural capta os
interesses dessa bolha e adequa seu material para que alcance também esse público em
questão. Essa adaptação de conteúdos para produção em massa configura o conceito de
Indústria Cultural.
Mas afinal, de que se trata essa indústria? Os sociólogos alemães Theodor Adorno e
Max Horkheimer, intelectuais da escola de Frankfurt, abordaram o conceito de Indústria
Cultural em sua obra "A Dialética do Esclarecimento", sua abordagem trata do fato do
"capitalismo ter tornado a cultura em mercadoria e a produção cultural em uma produção

35
O "spillover" faz parte das teorias de integração de frente neofuncionalista, e de acordo com Ernst Haas
(1970), esse processo define uma cadeia de efeitos decorrentes da integração de dada região. A consequência do
processo de integração em determinado plano, seria a integração de outros planos em seguida, e assim por
diante, em efeito cascata, que acaba intensificando gradativamente mais a cada plano os processos de integração
deste percurso.
21

industrial, de uma forma mecânica e padronizada", como afirma Thiago Torres (2021)36, essa
indústria proporciona uma forma de controle da população através das grandes mídias,
influenciando nosso modo de pensar e nos comunicar, seja, por exemplo, exaltando somente
pessoas brancas e magras na televisão, de maneira parcialmente velada, ou mesmo inundando
as propagandas de bandeiras coloridas durante o mês de Orgulho LGBTQIA+, por ser o
posicionamento que as pessoas esperam de empresas "preocupadas com pautas sociais". Nada
do que vem da grande mídia é por acaso, e ela não dá um único ponto sem nó37, os filmes
majoritariamente passados nos Estados Unidos não são simples coincidência, os reality shows
em que os participantes competem por dinheiro não possuem sempre esse formato por
coincidência e os livros e matérias de "auto ajuda" que dão a entender que acordando cedo
para trabalhar e persistindo você enriquece também não; os ideais que a burguesia quer que
repliquemos acabam se tornando intrínsecos ao nosso modo de enxergar a realidade e se
camuflam em nossa mente como aquilo que é considerado "normal", precisamos sempre
ativar nosso senso crítico e entender a quem serve que acreditemos nos discursos e
representações sociais apresentados pelas grandes mídias e nos atenhamos a isso, a quem
serve que nos acostumemos com as formas de arte oferecidas facilmente e deixemos de
buscar formas diferentes de enxergar o mundo, modalidades alternativas de vivência, que
usemos nosso tempo vago de um jeito que não nos faça refletir sobre a nossa própria
realidade. A quem serve tudo isso?
A Indústria Cultural começou a receber investimentos e atenção especial no início do
século XX, quando começaram a surgir diversas revoluções de cunho socialista, tinha por
objetivo amansar as massas e domesticá-las tanto quanto possível, atualmente os moldes
convincentes e lucrativos de fazer cultura já foram desenvolvidos, e uma das características da
indústria é seguir essa padronização das fôrmas prezando pela rentabilidade econômica,
reciclando formatos que dão certo (que vendem melhor), não pelo conteúdo em si. Esses
conteúdos nos ensinam a se contentar com o sistema e aceitar passivamente a realidade de
subversão que nos é oferecida, além de fomentar a rivalidade entre os povos
latino-americanos justamente para que sua potência como território unido se limite às
possibilidades, e não se converta em realidade, por isso é sempre interessante que
mantenhamos nosso senso crítico em alerta.

36
TORRES, Thiago (Chavoso da USP). A Indústria cultural e o Mito de que o Passado era Melhor. Youtube,
março de 2021.
37
TORRES, Thiago (Chavoso da USP). A Indústria cultural e o Mito de que o Passado era Melhor. Youtube,
março de 2021.
22

A elite brasileira parte de uma perspectiva ainda vigorosamente eurocêntrica e


alinhada a essas práticas de subordinação e conformidade, e incorpora um “complexo de
vira-lata”38 que busca se afastar não apenas de elementos latino-americanos, como também da
própria cultura brasileira, de forma a considerá-la como sendo menos digna do que a dos
países nortistas (a exemplo do funk brasileiro e das obras da Tarsila do Amaral, ambos
bastante criticados e comparados a outros tipos de arte, consideradas melhores e mais
eruditas). É aplicado um olhar que busca apartar a cultura da sociedade em geral, colocando
nossos conteúdos populares em um nicho de futilidade e desvalorização, e as artes importadas
do hemisfério norte como melhor trabalhadas e de valor benemérito, temos essa tendência a
vangloriar o que vem de fora e ignorar o que está sendo produzido dentro do nosso país e
pelos nossos semelhantes.
Na Inglaterra, Raymond Williams gerou um debate em cima dos centros
conservadores, e por vezes reacionários, que demonstrou a tradição de estudar a arte
"elevada" como forma de preservação da impressão dessa imagem de doçura da burguesia
(como a música e ballet clássico, além dos gêneros musicais contemporâneos importados),
mas na verdade toda cultura é uma produção humana, e essa noção de uma realidade
utopicamente harmônica e distante que carrega culturas de qualidade mais elevada que outras,
é uma visão elitista, conservadora e que está enraizada na maioria de nós.
A burguesia mantém controle, não apenas sobre os grandes meios midiáticos, como
também sobre os sistemas educacionais, permitindo que seja ensinado aquilo que convém e se
demonstra interessante apresentar, ou mesmo apenas aquilo que se está acostumado a
informar frentes aos modos tradicionais de ensino. Nossas escolas, assim como nossa
imprensa, possuem um amplo hiato de conhecimento acerca da América Latina, e uma vez
que isso é passado adiante trazem uma parcela de culpa na ignorância das crianças e
adolescentes médios brasileiros acerca da própria região em que habitam. O foco maior nos
estudos de história e geografia presentes nas escolas comuns é dado aos eventos históricos e
culturais europeus, a disposição de seus países e como seus conflitos e conquistas nos
afetaram e afetam ainda hoje, o enfoque de ensino sobre a região Sul do nosso continente se
dá principalmente nos períodos de colonização e embates entre o Brasil e seus vizinhos, o

38
O conceito foi criado pelo escritor brasileiro Nelson Rodrigues, em referência a um evento futebolístico em
1950, mas mostrou sua validade em diversas circunstâncias ainda atualmente. Nas próprias palavras do autor o
termo demonstra uma relação de "inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto
do mundo", dizendo ainda "[...] o brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a
verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima."
23

ensino da cultura latina, dos acontecimentos históricos e da política de seus países de maneira
individual passa praticamente despercebido.
A grade curricular das escolas deve ser elaborada de forma a despertar o interesse dos
jovens acerca de seu meio, da cultura e costumes desses países, para que tenham referências
de herois regionais também para além das figuras europeias e/ou norte-americanas, para que
se identifiquem com seu território e abranjam seu conhecimento para mais do que apenas a
rivalidade entre Brasil e Argentina no futebol. Se faz necessário um aprofundamento na
história dos povos nativos e primeiros habitantes da região – como os astecas, indígenas, incas
e maias –, a explicação das semelhanças e diferenças sobre eles em relação aos nossos povos
originários, entre seus processos históricos e os nossos, e sobre como tudo isso se
interrelaciona, até o tipo de vínculo que mantemos com as nações vizinhas atualmente. Quais
as formas de relevo da região? Como se mantém a economia desses países? Quais as suas
tendências políticas? Como se desenvolveu sua cultura e suas tradições? São exemplos de
questões importantes que precisam ser instigadas e respostas que precisam ser apresentadas
para que nossas crianças e jovens se conheçam a história de um povo um pouco mais próximo
do seu, e para que tenhamos uma visão macro do que pode-se esperar desses países,
individualmente (entendendo seus contextos) e dentro do sistema regional, no que concerne às
suas relações com o Brasil.
As aulas sobre esse tema precisam ser criativas, para que se prenda a atenção da
audiência, buscando primordialmente romper a barreira de rivalidade que surgiu ao longo da
nossa construção histórica, e despertando nos alunos melhor noção sobre sua identidade
latino-americana. Alguns analistas ainda trazem um ponto bastante pertinente, a perspectiva
de avanço possível caso houvesse uma atualização nos currículos educacionais em que se
encurta a distância linguística entre brasileiros e hispano-americanos, promovendo o ensino
da língua portuguesa em países hispanófonos e ensino do espanhol, mais ativamente, aqui no
Brasil. (CANCLINI, 2008)39
Considerando toda a argumentação apresentada vem à tona a noção de que “as
informações que chegam até as classes média e baixa pouco falam da América Latina,
fazendo com que essas classes incorporem a visão e o discurso elitista acerca desta região”40.
Não dá para se sentir parte de algo com o qual o indivíduo não se identifica e não dá para se

39
CANCLINI, Néstor García. Latino americanos à procura de um lugar neste século. 2008, p. 17
40
TANCREDI, Leticia di Maio. A dificuldade de incorporação da sociedade brasileira a uma identidade
latino-americana. Contexto Internacional, p. 16
24

identificar com algo que ele não conhece a fundo. A maioria do que se sabe (a partir da
perspectiva média brasileira) sobre América Latina se fundamenta em locais de profunda
violência e miséria, algum conhecimento esportivo, alguns destinos turísticos e os demais
estereótipos difusos socialmente.

“Quais os temas historicamente recorrentes nas nossas tevês, revistas e


jornais sobre nossos vizinhos? Copa Libertadores da América de futebol, crise
econômica argentina, o regime cubano, o comércio popular na fronteira paraguaia, o
tráfico de drogas, a Copa do Mundo de 1970 no México… e vamos parando por aí. O
brasileiro médio conhece quais personagens latino-americanos? Maradona, Fidel
Castro, Hugo Chávez e o Chaves, do SBT. E tirando este último, provavelmente odeia
os outros três. Fato é que não sabemos quase nada da região do mundo na qual
estamos inseridos.”41

VII. Caminhos para a Integração Regional


Os Estados considerados ainda em desenvolvimento (majoritariamente aqueles que
tiveram suas riquezas exploradas pelas grandes metrópoles internacionais) podem utilizar a
estratégia de aliança para que consigam conquistar espaços de destaque na política
internacional, e se desenvolver economicamente de maneira mais autônoma, em vez de voltar
suas agendas para as grandes potências e acabar às muletas, dependendo das diretrizes de
mercados já melhor desenvolvidos economicamente. Alguns governos brasileiros buscaram
essa estratégia e protagonizaram momentos de forte liderança nacional em relação ao cenário
global, mas ainda há muito a ser feito.
O Brasil sempre tendeu a dar atenção especial a Argentina, Uruguai e Paraguai, por
fazerem parte da Bacia do Prata, região de alta circulação econômica, mas foi a partir das
diretrizes de Fernando Henrique Cardoso que a relação com os demais Estados da América do
Sul começou a entrar em evidência de fato. A ampliação das relações comerciais com os
países sul-americanos implicavam ações rumo à integração regional, e FHC ressaltava a ideia
de que a região deveria se tornar um espaço integrado, um mercado ampliado pela redução
dos obstáculos comerciais e aperfeiçoamento de conexões físicas no âmbito dos transportes e
comunicações. O ex-presidente (de 1995 à 2003), salientou ainda que aquele era "o momento
de reafirmação da identidade própria da América do Sul como região onde a democracia e a

41
IGLECIAS, W, 2014, O que o brasileiro médio sabe da América Latina?, Carta Capital. Disponível em:
<https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/O-que-o-brasileiro-medio-sabe-da-Ame-rica-Latina-/6/
30216>.
25

paz abrem a perspectiva de uma integração cada vez mais intensa entre países que convivem
em um mesmo espaço de vizinhança"42.
Posteriormente, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o direcionamento da política
externa brasileira reforça a necessidade de unidade entre os países latino-americanos, ainda
que o foco dos esforços fosse a América do Sul especificamente. O novo governo do PT
(Partido dos Trabalhadores) manifestou mudanças significativas não apenas no Brasil, mas em
toda a região, dada a aliança estratégica com a Venezuela, o aprofundamento da relação com a
Argentina e o espaço atribuído à América do Sul como prioridade na agenda brasileira de
relações internacionais, não apenas no sentido político, mas também econômico, robustecendo
os intercâmbios comerciais e equilibrando a conjuntura regional. O continente tornou-se o
eixo central de atuação brasileira, buscando, a cada projeto, subir um degrau no propósito da
criação de um hemisfério mais sobrelevado e um sistema mais justo para o Sul, de forma que
deixasse de se demonstrar tão subserviente às decisões do Norte.
Entretanto, o governo petista não deixou de lado as relações com os Estados Unidos e
nem pretendia, o confronto não se mostrava ser uma opção interessante e suas boas relações
se mantiveram, ainda que com algumas contendas. Vale destacar ainda, que um dos motivos
que possibilitou a evolução dos projetos de integração regional, para além da ascensão de
governos nacionalistas na América Latina, foi o afastamento norte-americano deste território
após o ataque de setembro de 2001 às torres gêmeas, em Nova Iorque. O recuo dos Estados
Unidos acarretou um "vácuo de poder", como aponta Luiz Bandeira, que propiciou maior
autonomia às decisões e união destes Estados, esse contexto possibilitou ao Brasil a abertura
de caminhos sentido à liderança no subcontinente sul-americano, e foi esse rumo que o
governo seguiu, e obteve sucesso em alcançar uma posição mais protagônica no cenário
internacional.
Nesse sentido, apresentado o maior caso de sucesso da política internacional brasileira,
e por acaso ainda possivelmente considerada recente, caso o plano de governos posteriores
seja o de empreender uma integração regional sul-americana – ou esperançosamente
latino-americana – se faz necessária a inclusão da sociedade no processo, essa aproximação
com os vizinhos seria muito vantajosa para o Brasil, e o governo precisa instruir seu povo
sobre tais benefícios.
Notícias sobre os países latino-americanos precisam ser difundidas (para além das de
cunho desfavorável) e o conhecimento precisa ser estimulado, pois o desconhecimento sobre

42
BANDEIRA, Luiz A. de V. Moniz. Relações Internacionais e Integração Regional, Enciclopédia
Latinoamericana.
26

nossa própria região é histórico e abre espaço para um tom discriminatório. A indústria
cultural também deve agir nesse processo “importando produtos criativos da região em
detrimento da exclusividade que hoje dá às indústrias dos países nortistas”43. A riqueza
cultural da América Latina é grandiosa, e se sustenta, principalmente, em sua diversidade
representada por incontáveis tradições, costumes, variações culinárias, manifestações
artísticas e religiosas, dos diferentes povos que a compõem.
Em entrevista concedida ao projeto Escuta sobre música, arte e cultura no Brasil, Rita
Von Hunty sinaliza a questão da desvalorização brasileira a respeito de sua própria cultura
(baseada principalmente na mistura de tradições), enquanto o público de fora contempla e
admira essas manifestações:

"O brasileiro pela falta de acesso e por um processo de delapidação da


capacidade de argumentar, pensar, ligar e refletir, recebe valores – e o Roberto
Schwarz, que é um grande crítico de cultura no Brasil, vai chamar isso de "as ideias
fora do lugar" – [...] que estão em completo desalinho com a nossa vida. Então o
Brasil importa ideias liberais enquanto mantém mão-de-obra escrava, no século XIX,
um liberalismo com escravidão é uma realidade brasileira; e os valores que aqui
chegam estão em descompasso com o que aqui acontece, [...] a gente cria a pizza de
estrogonofe e o sushi frito, e isso é o que talvez faça com que a nossa expressão
artística tenha esse quê de deslumbramento para as plateias mundiais."44

A cultura é complexa assim como é a sociedade, se constitui como fragmentos da


totalidade e se apresenta em suas simbologias, à medida que seu povo consegue conservá-la e
transmiti-la, se trata de um objeto de referência fundamental para que se entenda uma
população, mas não um objeto único. O sistema de classes em que vivemos hierarquiza
também esse conteúdo, para as classes dominantes toda expressão de cultura diferente da sua
é tratada como "inferior" ou "exótica", por vezes indigna de crédito ou de respeito, esse
sistema desqualifica estéticas diferentes e é, por definição, extremamente excludente.45
A cultura latino-americana em si engloba diversas outras, e na verdade não existe
enquanto objeto unificado, possui um princípio de interculturalidade em si, que deve fluir
com a ideia de respeito mútuo acerca das diferenças. Essa cultura partilha de diversas
afinidades, troca tradições, culinárias e ritmos musicais (como o reggae na Jamaica, o blues
no Haiti, a cumbia na Colômbia, a soca em Trinidad e a bossa-nova no Brasil). Sua

43
TANCREDI, Leticia di Maio. A dificuldade de incorporação da sociedade brasileira a uma identidade
latino-americana. Contexto Internacional, p. 17
44
VON HUNTY, Rita. (Tempero Drag). Cultura em Debate. Youtube, 04 de novembro de 2021.
45
LEMOS, Maria Teresa Toribio Brittes. Fronteiras rompidas: Multiculturalismo na América Latina. p. 156
27

multietnicidade e pluralidade cultural são os atributos de sua riqueza, que está na diversidade
e intercâmbio entre elas, assim como na produção de novas culturas provenientes dessas já
existentes, observadas tanto no âmbito estético, quanto no intenso patrimônio histórico
cultural presente. O que se deve ser feito no Brasil é a abertura para que haja esse recebimento
das composições vindas desses países; deve haver um interesse em explorar, "pois se não há
interesse, não há porque divulgar, e se não há divulgação, não há interesse"46, com
conhecimento regional e interesse cultural estabelecidos, a importação de produtos de cultura
latina será abrangentemente maior.

VIII. Conclusão
O destaque que o país almeja no cenário internacional passa primeiramente pela
concepção de laços e inserção regional no campo latino-americano, e para isso é importante
que o Brasil entenda sua posição no sistema e que reitere seu lugar de evidência, assim
devendo estabelecer claramente a distinção entre “nós” e “eles” em um nível supraordenado,
se entendendo parte da gama de nações da América do Sul e Latina, e aliando-se a ela, não
àqueles que o exploraram e exploram.
A discussão acerca dos processos identitários de indivíduos latino-americanos é
necessária para que se possa seguir com políticas de integração efetivas, e esses processos
podem ser executados a partir de representações sociais trabalhando em cima da dinâmica de
pertencimento social, esses conceitos devem ser dedicados não apenas em nichos específicos
da população, mas em competências de ampla divulgação de conhecimento, portanto nas
escolas e na circulação das grandes mídias, para que assim se desperte o interesse do
brasileiro em geral em se sentir parte da identidade comum latino-americana.

46
RADUSEWSKI, Carolina Dias. Difusão da Cultura Latina no Brasil. Rio de Janeiro, 2011. p. 28
28

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