Você está na página 1de 72

GATA EM TELHADO DE ZINCO QUENTE

Tennessee Williams

Com introdução de Edward Albee

Índice
Introdução de Edward Albee 7
Créditos de produção 12
Notas para o Cenógrafo 15
Gata em Telhado de Zinco Quente 17
“Balançando uma Gata” por Brian Parker 175
“Autor e Diretor: Uma Situação Delicada” por Tennessee Williams 187
Cronologia 193

Introdução
de Edward Albee

Existe uma estória muito engraçada sobre George Bernard Shaw – e espero que seja
verdade! – que quando estivesse gentilmente entrando nos noventa anos, ele iria reler
uma de suas peças, ou talvez assistir uma montagem, e teria problemas para acompanhar
o que estava acontecendo. Estas complexidades – a estória continua – o incomodavam
por que, na sua cabeça, elas indicavam que as peças eram muito complexas – muito
difíceis de entender, talvez – para uma absorção adequada e que era melhor que ele as
simplificasse: antes tarde do que nunca.
Não ocorreu a Shaw que o problema era ele e não as peças e seus editores
tiveram que tomar o trabalho dele antes que ele o reduzisse a um material consumível
apropriado para alguém na primeira ou segunda infância.
Alguém escreveu que um trabalho criativo nunca é concluído, mas abandonado e
a sugestão serve como advertência, mesmo que não seja esta a intenção. Eruditos e
entrevistadores frequentemente me perguntam se vou retornar a uma peça anos depois
de a ter concluído (ou abandonado) – revisar, repensar.
Eu digo que não e explico que a pessoa que escreveu O Sonho Americano,
digamos, lá em 1959, não é exatamente a mesma pessoa uns 40 e poucos anos depois,
que os erros (sejam quais forem) naquela peça são os entusiasmos da juventude e que
enquanto uma avaliação sóbria possa deixar uma pessoa um pouco embaraçada por
causa dos excessos (novamente, sejam quais forem), estas duas “pessoas” não estão em
contato útil, mesmo que amigável.
Pegue O Jardim Zoológico, de 1958, como exemplo. A única mudança que me
permiti nessa peça foi a atualização de algumas questões específicas – valores em dólar,
por exemplo, ou a identidade de escritores “populares” da época. Esta é uma peça
ambientada “no presente” e não deve possuir anacronismos.
Também não pude resistir à tentação de cortar um momento em forma de ária na
peça: Jerry está morrendo, uma faca enterrada fundo na barriga, provavelmente fatiando
a aorta. Então ele oferece meia página de um trabalho muito bom, mas eu mesmo passei
a faca nela e reduzi para duas frases apropriadas.
Fiz a mesma coisa com uma ária de 11 minutos em Alice Minúscula, a qual John
Gielgud recusou em 1962 quando eu estava certo que cada palavra que tinha escrito era
tanto sacrossanta quanto adequada. O tempo e o ofício me ensinaram que John Gielgud
estava certo, e se ele quisesse fazer a peça novamente, no céu ou em qualquer outro
lugar, ele teria um terceiro ato muito melhor para encenar.
Tenho certeza que se tivesse que reler uma das minhas peças escrita anos atrás e
decidisse que não concordava mais com seu tema, eu iria proibir sua encenação ou, mais
provavelmente, iria simplesmente deixá-la como estava. Com certeza não iria
reescrever.
Duvido que terei o mesmo problema que George Bernard Shaw já que minhas
peças são bastante simples e imagino que ainda vou entendê-las quando atingir idade
maior.
Gata em Telhado de Zinco Quente, de Tennessee Williams, é quase tão famosa
por suas revisões quanto pelo seu texto final. Sabendo que Tennessee era bem
conhecido por fazer pequenas melhorias nas suas peças, em geral bem depois de
escrevê-las, e que ele gostava excessivamente da sugestão de quase qualquer pessoa
durante o processo de ensaio, não fico surpreso se houver vários textos de Gata em
Telhado de Zinco Quente, a peça que Tennessee escreveu em 1955, a versão que Elia
Kaza o persuadiu a fazer para a produção da Broadway daquele mesmo ano e a famosa
“solução” na qual Tennessee manteve algumas das “melhorias” de Kazan e rejeitou
outras. A maioria das ideias de Kazan era boa – elas melhoraram a peça estruturalmente
e a tornaram mais dramaticamente “para frente”. Algumas – aquelas que Williams por
fim rejeitou – eram um pouco “comerciais”, uma tentativa de deixar a peça... bem, mais
comercial. Kazan podia ser tão insensível quanto qualquer pessoa e ele estava sempre
interessado na própria carreira quanto na de qualquer outra pessoa.
É uma ótima peça – especialmente na versão final – e se uma pessoa pode
discordar de alguns dos seus gestos operísticos e se alguns dos seus personagens
parecem menores que a vida, ou talvez mais rudimentares, o feito de Williams é, assim
como ocorre em todos seus melhores trabalhos, altamente romântico e difícil ao mesmo
tempo, sua prosa capaz de vôos elevados ainda quie permanecendo acorrentada à
realidade e – mais importante – à capacidade de acreditar.
Tennessee Williams foi um poeta romântico do teatro – muito parecido com
Lorca – ainda que a força de condução fosse menos metafórica que a atualidade. Suas
peças são lidas lindamente e – em encenações precisas – funcionam lindamente
também.
A pressão para que os dramaturgos revisem seu trabalho para produção – com
muita frequência para detrimento do trabalho – merece um ensaio próprio. É suficiente
dizer aqui que pressões comerciais para entregar peças banguelas (e assim sem sentido)
estão crescendo enquanto o financiamento do teatro torna-se cada vez mais
incapacitante. O vai e vem entre Kazan e Williams era uma brincadeira inocente quando
comparado a isso. Além disso, muitas das ideias de Kazan (especialmente o
resurgimento de Papai no último ato) foram úteis para a coerência dramática da peça e o
restabelecimento da ironia e ambigüidade que Tennessee criou nos momentos finais da
peça foi uma ideia igualmente sábia.
É uma pena que Kazan tenha enveredado exclusivamente para o trabalho no
cimena antes que eu e ele tivéssemos a possibilidade de trabalhar juntos. Considerando
tudo que sei das suas relaçõs criativas com Tennessee Williams e Arthur Miller, tenho
certeza que teria adorado o jogo de puxa-empurra.

Nova York, 2004

Para Maria

Gata em Telhado de Zinco Quente foi originalmente apresentada no Morosco Theatre,


em Nova York, em 24 de março de 1955, tendo no elenco Barbara Bel Geddes, Ben
Gazzara, Mildred Dunnock e Burl Ives, com direção de Elia Kazan. Aquela versão da
peça e a variação do terceiro ato foram publicadas em Teatro de Tennessee Williams,
Volume III, da New Directions.

Em 10 de julho de 1974, Gata em Telhado de Zinco Quente foi reencenada pela


American Shakespeare Theatre, em Stratford, Connecticut, com o terceiro ato reescrito,
além de outras revisões substanciais. Aquela versão da peça, impressa aqui, reestreou
em Nova York, em 24 de setembro de 1974, no ANTA Theatre. As duas produções de
1974 foram dirigidas por Michael Kahn; cenário de John Conklin, iluminação de Marc
B. Weiss e figurino de Jane Greenwood. O elenco foi o seguinte:

Margaret Elizabeth Ashley


Brick Keir Dullea
Dixie, garotinha Deborah Grove
Mae, às vezes chamada de Irmã Joan Pape
Gooper, às vezes chamada de Irmão Charles Siebert
Mamãe Kate Reid
Sookey, serviçal negro Saraellen
Papai Fred Gwyne
Reverendo Tooker Wyman Pendleton
Doutor Baugh, pronunciado “Bó” William Larsen
Lacey, serviçal negro* Thomas Anderson
Crianças* Jeb Brown
Chris Browning
Betsy Spivak
Susannah Brown

* Na produção de Nova York, o papel de Lacey não foi incluído e o número de crianças
foi reduzido para três, representadas por Jeb Brown, Sukie Brown e Amy Borress.

E o senhor, meu pai, lá na altura triste,


Me amaldiçoe, me abençoe agora com suas lágrimas violentas, eu rogo.
Não seja gentil nesta boa noite.
Enfureça-se, enfureça-se contra a morte da luz.

Dylan Thomas

NOTAS PARA O CENÓGRAFO

O cenário é um quarto de uma casa de fazenda de plantação no Delta do Mississippi. Ela


fica ao longo de uma sacada no primeiro andar que provavelmente se estende ao redor
de toda a casa; há dois pares de portas muito largas que se abrem sobre a sacada,
mostrando uma balaustrada branca em oposição a um céu de verão limpo que
desaparece com o crepúsculo e início da noite durante o curso da peça, que leva
precisamente o tempo da encenação, exceto, é claro, pelos 15 minutos de intervalo.

Talvez o estilo do quarto não seja o que se espera na casa do maior plantador de algodão
do Delta. É Victoriano com um toque dos países do leste asiático. Ele não mudou muito
desde que era ocupado pelos proprietários originais da fazenda, Jack Straw e Peter
Ochello, dois solteirões velhos que juntos dividiram este quarto a vida toda. Em outras
palavras, o quarto deve evocar alguns fantasmas; ele é gentil e poeticamente
assombrado por um relacionamento que deve ter envolvido uma ternura incomum. Isto
pode ser irrelevante ou desnecessário, mas uma vez vi uma reprodução de uma
fotografia amarelada da varanda da casa de Robert Louis Stevenson nas Ilhas Samoa
onde ele passou seus últimos anos e havia uma qualidade de luz delicada na madeira
desgastada, tal como um móvel de varanda feito de bambu e vime, exposto ao sol e
chuva tropicais, o qual veio à mente quando pensei no cenário para esta peça, trazendo
também à mente a graça e o conforto da luz, a tranquilidade que ela traz, em um fim de
tarde ensolarado no verão, o modo como não importa o que, até mesmo o medo da
morte é gentilmente tocado e consolado por ela. O cenário é o pano de fundo para uma
peça que trata de extremidades humanas de emoção e precisa desta suavidade no fundo.

A porta do banheiro, mostrando somente o azulejo azul claro e suportes de toalha prata,
fica em uma parede lateral; a porta do corredor na parede oposta. Dois itens de mobília
precisam ser mencionados: uma cama de casal grande a qual, durante encenação, deve
tornar-se uma peça funcional do cenário o mais frequentemente possível, cuja superfície
deve estar levemente desarrumada para fazer com que as figuras sobre ela sejam mais
facilmente vistas; e contra o espaço da parede entre as duas enormes portas duplas na
parte superior do palco: uma monstruosidade monumental peculiar para nossos tempos,
uma enorme combinação de console de rádio e fonógrafo [hi-fi com três alto falantes]
aparelho de TV e bar, contendo muitos copos e garrafas, todos em uma peça, numa
composição de tons prata suavizados e os tons opalescentes dos reflexos dos copos, uma
conexão cromática, esta coisa, entre os tons de sépia [amarelo fulvo] do interior e os
tons frios [branco e azul] da sacada e do céu. Este móvel [?!], este monumento, é um
santuariozinho muito completo e compacto para virtualmente todos os confortos e
ilusões atrás do qual nos escondemos de coisas como aquelas que os personagens da
peça têm que enfrentar.

O cenário deve ser muito menos realista do que até o momento sugeri nesta descrição.
Acho que as paredes abaixo do teto devem se dissolver misteriosamente no ar; o cenário
deve ter como teto o céu; estrelas e a lua sugeridas por traços de palidez leitosa como se
fossem observadas através de uma lente de telescópio fora de foco.

Mais alguma coisa que consigo me lembrar? Ah, claro, pequenas janelas ovais [janelas
ovais em forma de leque de vidro aberto] acima de todas as portas no cenário, com
vidraças azuis e âmbar, e mais importante, o cenógrafo deve se esforçar ao máximo para
proporcionar espaço livre para que os atores se movimentem livremente [para mostrar
sua agitação, paixão por libertação] como se fosse um cenário de balé.

Uma noite de verão. A ação é contínua com dois intervalos.

O pano sobe, a porta do banheiro está entreaberta e alguém toma uma ducha. Uma
jovem bonita, com traços de ansiedade no rosto, cruza o quarto até a porta do
banheiro.

MARGARET [gritando sobre o barulho da água]: Um daqueles monstros sem pescoço


me atirou um pão doce e tenho que me trocar! [A voz de Margaret é rápida e arrastada.
Nas longas falas ela faz meneios vocais como um padre num canto litúrgico, as falas
são quase cantadas, ultrapassam a respiração e ela tem que tomar folego. Às vezes ela
intercala as falas com uma canção sem letra, tal como “Da-da-daaa!” O chuveiro é
desligado e Brick fala alto, ainda sem ser visto. Um tom de interesse educadamente
dissimulado, mascarando a indiferença, ou pior, caracterísa sua fala com Margaret].

BRICK: O que, Margaret? Não ouvi por causa do chuveiro...

MARGARET: Bom eu! – só comentei que um dos monstros sem pescoço manchou
meu lindo vestido de renda e tenho que – tro-ca-r... [Ela abre as gavetas da cômoda e
fecha com um chute].

BRICK: Por que chama os filhos de Gooper de monstros sem pescoço?

MARGARET: Por que eles nao têm pescoço! Não basta?


BRICK: Eles não têm pescoço?

MARGARET: Visível não. Cabecinhas gordas grudadas em corpinhos gordos sem


nenhuma conexão.

BRICK: Que horror!

MARGARET: É, um horror mesmo por que não dá pra torcer o pescoço de quem não
tem! Não é, meu bem? [Ela solta o vestido e fica numa combinação branca de seda e
renda]. É, são monstros sem pescoço, todas as pessoas sem pescoço são monstros...
[Gritos de criança embaixo]. Ouviu? Ouviu os gritos? Não sei onde estão as cordas
vocais se eles não têm pescoço. Fiquei tão nervosa no jantar que achei que fosse gritar
tão alto que iriam ouvir além da fronteira do Arkansas, partes de Louisiana e Tennessee.
Falei para sua adorável cunhada: “Mae, querida, não da pra servir essas lindezas numa
mesa separada com uma toalha de plástico? Eles fazem tanta bagunça e a toalha de
renda é tão bonita!” Ela arregalou os olhos e disse: “Ah, nãoooooo! Não no aniversário
do Paizão? Ele jamais me perdoaria!” Se quer saber, ele não ficou na mesa nem dois
minutos com aqueles cinco monstros sem pescoço babando na comida, jogou o garfo e
gritou: “Pelo amor de Deus, Gooper, por que não coloca esses porcos num chiqueiro na
cozinha?” – Quase morri, juro! Pensa bem, Brick, eles têm cinco filhos e o sexto está
vindo. Trouxeram o bando todo como gado pra expor numa feira. Pedem para as
crianças fazerem gracinhas o tempo todo! “Junior, mostra ao Paizão como você faz isso,
como faz aquilo, recita pra ele aquele versinho, maninha. Mostra as covinhas, docinho!”
Planta bananeira pro Paizão ver, maninho!”– o tempo todo, comentários e indiretas
sobre não termos filhos, sem filhos, portanto sem utilidade! – Claro que é engraçado,
mas desagradável também já que é óbvio o que pretendem!

BRICK [Desinteressado]: O que eles pretendem, Maggie?

MARGARET: Ora, você sabe o que pretendem!

BRICK [Aparecendo]: Não sei não. [Em pé à porta do banheiro ele seca o cabelo com
uma toalha e apóia-se no suporte de toalha por que um tornozelo está quebrado,
engessado e amarrado. Ele ainda é magro e firme como um garoto. A bebida ainda não
começou a estragar sua aparência. Ele possui o encanto adicional daquele ar fresco de
indiferença das pessoas que desistiram de lutar. Mas às vezes, quando incomodado,
algo brilha por trás disso, como um raio em um céu límpido, mostrando que em algum
nível mais profundo ele está distante da tranqüilidade. Talvez sob uma luz mais forte,
ele mostre sinais de decadência, mas a luz fraca, ainda quente, da sacada o trata
gentilmente].

MARGARET: Vou dizer o que pretendem, meu querido! Eles pretendem tirar você da
herança do teu pai e... [Ela congela momentaneamente antes do próximo comentário.
Sua voz cai como se fosse uma constatação um tanto quanto constrangedora] – Agora a
gente sabe que Paizão está morrendo de - câncer... [Ouve-se vozes no jardim embaixo:
gritos longos à distância. Margaret levanta seus lindos braços desnudos e passa talco
nas axilas com um leve suspiro. Ela ajusta o ângulo de um espelho de aumento para
arrumar os cílios, depois se ergue inquieta dizendo]: Tem muita luz nesse quarto...

BRICK [suave mas bruscamente]: A gente sabe?

MARGARET: O que?
BRICK: Que o Paizão tá morrendo de câncer?

MARGARET: O laudo chegou hoje.

BRICK: Ah.

BRICK: Ah... [Abaixa as venezianas de bambu que projetam longas sombras douradas
em relevo sobre o quarto]: É, o laudo acabou de chegar... não foi surpresa pra mim, meu
bem. [Sua voz tem variação e música; às vezes fica grave como a de um menino e você
de repente a imagina brincando com um menino]. Reconheci os sintomas logo que
chegamos aqui na primavera e aposto que teu Irmão e a esposa certeza também. Isso
explica bem por que desistiram da migração de verão habitual à Great Smokies para
ficrem – pingando aqui com a tribo infernal! Por isso tantas alusões a Rainbow Hill
ultimamente. Sabe o que é Rainbow Hill? Um lugar famoso pra tratamento de alcolotras
e drogados do cinema!

BRICK: Não sou do cinema.

MARGARET: Não, e não usa drogas também. Se não, seria um candidato perfeito pra
Rainbow Hill, meu bem, e é para lá que querem te mandar - só por cima do meu
cadáver! É, por cima do meu cadáver internam você lá, mas nada os deixaria mais
felizes! Aí teu irmão põe a mão na grana e nos manda um salário, talvez consiga uma
procuração para assinar cheques por nos e corte nosso crédito onde e quando quiser!
Filho da puta! Que acha, meu bem? Bom, voce está fazendo tudo que pode pra isso
acontecer, o possível e imaginável pra ajudar e incitar o esquema desses dois! Parando
de trabalhar, se dedicando ao ofício de beber! - Quebrou o tornozelo ontem à noite na
pista de atletismo do colegio: fazendo o que? Saltando obstáculos? As duas ou três da
manhã? Simplesmente fantástico! Saiu no jornal. O Clarksdale Register publicou uma
notinha simpática, estória de interesse humano sobre ex-atleta famoso participando de
prova sem adversário na pista de atletismo da Glorious Hill ontem à noite, mas como
estava um pouquinho fora de forma não superou o primeiro obstáculo! Seu irmão
Gooper alega que usou sua influência para impedir que saísse na AP ou na UP ou na
“PQP”. Mas, Brick, voce ainda tem uma grande vantagem! [Durante esse fluxo rápido
de palavras Brick em contraponto reclina-se despreocupado sobre a superfície alva da
cama e vira cauteloso de lado ou de bruço].

BRICK [ironicamente]: Disse alguma coisa, Maggie?

MARGARET: Big Daddy adora voce, meu amor. E não suporta teu irmão e a mulher
dele, aquele monstro de fertilidade, Mae. Sabe como eu sei? Por pequenas caretas que
tremem no rosto dele quando aquela mulher fala sem parar um de seus assuntos
favoritos... como ela recusou a sedação! No parto dos gêmeos! Por que ela acha que a
maternidade é uma experiencia que uma mulher deve experimentar na sua plenitude!
pra poder apreciar totalmente a maravilha e a beleza de ser mae! HAH! - e como fez teu
irmão ficar ao lado dela na sala de parto pra não perder a “maravilha e beleza” dessa
experiência também! - Produzindo aqueles monstrinhos sem pescoço... [Um discurso
deste tipo seria repugnante vindo de qualquer pessoa, exceto Margaret; ela o torna
estranhamente engraçado por que sues olhos constantemente cintilam e sua voz treme
com a risada que é basicamente indulgente]. – Big Daddy adora minha atitude em
relação aqueles dois! Quanto a mim, bom, de vez em quando rio dele e ele me tolera.
Na verdade, - às vezes suspeito que Big Daddy meio sem saber sente tesão por mim...
BRICK: Por que acha que ele sente tesão por voce?

MARGARET: Pelo jeito que ele olha meu corpo quando estou falando com ele. Olha
meus peitos e fica lambendo os beiços! Ha-ha!

BRICK: Que conversa nojenta.

MARGARET: Alguém ja disse que voce é um puritano de merda, Brick? Acho


maravilhoso que aquele velho, com o pé na cova, ainda olhe pro meu corpo com o
apreço que acho merecido! Quer saber de mais uma coisa? Teu pai não sabia quantos
filhos Mae e Gooper geraram! “Quantos filhos voces têm?”, ele perguntou na mesa,
como se simplesmente não conhecesse teu irmão e a mulher dele! Big Mama disse que
ele estava brincando, mas, por Deus, que aquele garotão não estava não! E quando
disseram que já tinham cinco e esperando o sexto! – parece que a notícia veio como um
tipo de surpresa desagradável... [Criangas berram embaixo] Gritem, seus monstros!
[Vira-se para Brick com um repentino sorriso alegre e charmoso que desaparece assim
que ela percebe que ele não está olhando para ela, mas para o espaço dourado
desvanecendo com uma expressao atormentada. É a rejeição constante que torna seu
humor péssimo]. É, você deveria estar na mesa de jantar, querido. [Sempre que ela o
chama de “querido” a palavra é um carinho suave]. Sabe, Big Daddy, Deus abençoe
sua velha boa alma, ele é a coisa mais querida do mundo, mas ele debruça-se sobre a
comida como se preferisse não ver nada mais. Bom, Mae e Gooper estavam sentados
juntos na mesa, bem na frente dele, olhando o rosto dele como gaviões enquanto
tagarelavam e matraqueavam sobre beleza e inteligência dos monstros sem pescoço!
[Ela ri com uma mão tremulando pelo pescoço e peito e com o pescoço arqueado. Vem
até o proscênio e recria a cena com voz e gesto]. E os monstros sem pescoço estavam
sentados ao redor da mesa, alguns em cadeiras altas e alguns em cima dos Livros do
Conhecimento, todos com chapeuzinhos de papel por causa do aniversário do Big
Daddy, e durante todo o jantar, bom, quero que saiba que seu irmao e a sócia dele não
pararam um minuto de se cutucar, beliscar, chutar e trocar sinais! – Ora, pareciam dois
trapaceiros depenando um otário. – Até Big Mama, Deus abençoe sua doce e velha
alma, que nao ée a coisa mais esperta e rápida desse mundo, por fim percebeu e falou
pro Gooper: “Gooper, por que você e Mae estão fazendo esses sinais um pro outro? –
“Juro por Deus, quase engasguei com o frango! [Margaret, de volta à penteadeira,
ainda não vê Brick. Ele olha para ela com um olhar bastante indefinível:
Divertindo-se? Chocado?Desprezivo? – um pouco disso e um pouco de algo a mais].
Sabe - seu irmão ainda nutre a ilusão de que deu um passo enorme na escalada social
quando casou com Miss Mae Flynn dos Flynns de Memphis. Mas tenho uma notícia
boa pro Gooper, os Flynns só tinham dinheiro nesse mundo e perderam, não eram nada
senão uns alpinistas sociais. Certeza que Mae Flynn debutou em Memphis oito anos
antes de meu debut em Nashville, mas eu tinha amigos em Ward-Belmont que vieram
de Memphis e eles vinham me visitar e eu ia visitá-los nas férias da primavera e no
Natal, por isso sei quem é quem na sociedade em Memphis. Ora, você sabe, o velho
Papa Flynn, por pouco escapou de cumprir pena na Penitenciária Federal por
manipulações suspeitas na bolsa quando sua rede de lojas quebrou, e quanto a Mae ter
sido a rainha da festa do algodão, como eles adoram nos lembrar toda hora para que a
gente nao esqueça, bem, isso é uma honra que não invejo! - Ficar sentada num trono de
lata num carro alegórico desfilando na Main Street, sorrindo, fazendo reverência e
jogando beijinho pra todo lixo da rua... [Ela apanha um par de sapatos cobertos de
jóias e corre para a penteadeira]. Ora, dois anos atrás, quando Susan McPheeters foi
indicada para essa honra, sabe o que aconteceu com ela? Sabe o que aconteceu com a
coitadinha da Susan McPheeters?
BRICK [Ausente]: Não. O que aconteceu?

MARGARET: Alguém cuspiu suco de tabaco na cara dela.

BRICK- [aéreo]: Alguém cuspiu suco de tabaco na cara dela?

MARGARET: Isso mesmo, um velho bêbado botou a cabeça fora da janela do Hotel
Gayoso e gritou: “Ei, rainha, rainha!” Coitadinha da Susie, olhou pra cima, deu um
sorriso radiante e ele deu uma cusparada de fumo bem na cara dela.

BRICK:- Como sabe disso?

MARGARET [alegremente]: Como sei? Eu tava la, eu vi.

BRICK [ausente]: Deve ter sido engraçado.

MARGARET: Susie não achou. Ficou histérica, gritava como uma demônia, tiveram
que parar o desfile, tirar ela do trono e continuar com... [Margaret percebe Brick
olhando pro espelho, arqueja levemente, vira-se para fitá-lo e conta até dez]. Por que
está me olhando assim?

BRICK [assoviando baixinho: Assim como, Margaret?

MARGARET [intensamente amedrontada]: Do jeito que estava me olhando agora,


antes de eu te ver pelo espelho e voce começar a assoviar. Não sei explicar, mas gelou
meu sangue. Já peguei você me olhando desse jeito muitas vezes ultimamente. No que
você pensa quando me olha assim?

BRICK: Nem percebi que estava olhando pra você, Margaret.

MARGARET: Bom, mas eu percebi! Estava pensando no que?

BRICK: Margaret, não me lembro de pensar em nada.

MARGARET: Você não acha que eu sei que...? Você nao... acha que eu sei que...?

BRICK [frio]: Sabe o que, Margaret?

MARGARET [lutando pela expressão]: Que passei por essa - transformação -


horrorosa, me tornei dura, histérica! [Acrescenta quase afetuosa] ... cruel! E isso que
você está notando em mim ultimamente. Como voce ia deixar de ver isso? Está certo.
Eu não sou sensível mais, não posso me dar ao luxo de ser sensível mais. [Começa a
recuperar a força] - Mas Brick? Brick?

BRICK: O que disse?

MARGARET: Eu ia dizer: que me sinto... só. Muito só!

BRICK: Todo mundo sente...

MARGARET: Viver com alguém que se ama pode ser mais solitário que viver
completamente sozinha! - se a pessoa que você ama não ama você... [Pausa. Brick
manca até o proscênio e pergunta sem olhar para ela].
BRICK: Gostaria de viver sozinha, Margaret? [Outra pausa: então – depois de tomar
um fôlego rápido e dolorido].

MARGARET: Não! - Por Deus! [Respira novamente arquejando. Ela forçosamente


controla o que deve ter sido um impulso de choro. Nós a vemos deliberada e
forçosamente voltando o caminho todo até o mundo onde se pode falar sobre assuntos
banais] O banho estava bom?

BRICK: Uh-huh.

MARGARET: A água tava fria?

BRICK: Não.

MARGARET: Mas te refrescou, né?

BRICK: Refrescou mais...

MARGARET: Sei o que ia te refrescar mais ainda!

BRICK: O que?

MARGARET: Uma massagem com álcool. Ou colônia, uma massagem com colônia!

BRICK: Isso é bom depois de treinar, mas não estou treinando, Margaret.

MARGARET - Mesmo assim ainda está em boa forma.

BRICK [indiferente]: Acha mesmo?

MARGARET: Sempre pensei que os homens que bebem perdiam a beleza, mas eu
estava completamente enganada.

BRICK: Ora, obrigado, Margaret.

MARGARET: Você é o único homem que eu conheço que bebe e não engorda.

BRICK: Estou ficando flácido, Margaret.

MARGARET: Bom, mais cedo ou mais tarde a bebida ia te deixar flácido. Já estava
começando a acontecer com o Skiper quando [Para abruptamente] Desculpa, nunca
deixo de colocar o dedo na ferida. Gostaria que ficasse feio. Se ficasse, o martírio da
Santa Margaret seria um pouco mais tolerável. Mas que sorte que nada! Acho que você
ficou ainda mais bonito depois que começou a beber. É, quem nao te conhece pensa que
você nunca teve um nervo tenso no corpo ou um músculo cansado. [Sons de Croquet no
gramado embaixo: barulho dos tacos, vozes próximas e distantes]. Claro, você sempre
teve essa qualidade ímpar como se estivesse jogando um jogo sem muita preocupação
em ganhar ou perde, e agora que perdeu o jogo, perdeu não, mas simplesmente parou de
jogar, voce têm aquele tipo de charme raro normalmente visto em pessoas muito velhas
ou em estado terminal, o charme dos derrotados. - Você parece tão calmo, tão calmo,
que dá inveja.
REVERENDO TOOKER [Coxia à direita]: Agora olha aqui, rapaz, vou te mostrar
como sair dessa!

MARGARET: Estão jogando croquet. A lua já saiu e está branca, começando a ficar
um pouco amarela... Voce era um amante maravilhoso... Uma pessoa maravilhosa pra ir
pra cama, acho que muito porque na verdade você era indiferente a isso. Não é verdade?
Não tinha nenhuma ansiedade, fazia naturalmente, fácil, devagar, com absoluta
confiança e perfeita calma, parecia mais que estava brindo a porta para uma senhora ou
puxando a cadeira à mesa do que expressando qualquer desejo por ela. Sua indiferença o
tornava maravilhoso durante o amor - estranho? Mas verdadeiro...

REVERENDO TOOKER: Aí! Beleza.

DOUTOR BAUGH: É. Não tem como escapar.

MARGARET: Sabe, se eu achasse que voce nunca, nunca, nunca mais faria amor
comigo de novo, eu ia descer até a cozinha, pegar a faca mais comprida e mais afiada
que eu pudesse achar e enfiar bem no meu coração. Juro que eu enfiava.

REVERENDO TOOKER: Cuidado, vai errar.

DOUTOR BAUGH: Você não me conhece, rapaz!

MARGARET: Mas uma coisa que não tenho é o charme dos derrotados, ainda não
desisti, e estou determinada a vencer! [Som de tacos de croquet atingindo as bolas].

REVERENDO TOOKER: Você é muito liso.

MARGARET: - Qual é a vit[oria de uma gata num telhado de zinco quente? Se eu


soubesse... Só ficando lá, eu acho, o máximo que ela aguentar...

DOUTOR BAUGH: Exatamente como uma enguia, exatamente como uma enguia!
[Mais sons de croquet].

MARGARET: Hoje à noite mais tarde vou dizer que te amo e talvez você já esteja
bêbado o suficiente pra acreditar em mim. É, eles estão jogando croquet. Teu pai
morrendo de câncer... No que estava pensando quando peguei você me olhando daquele
jeito? Estava pensando no Skipper? [Brick pega a muleta e levanta-se] Ah! desculpa,
me perdoa, mas as leis do silêncio não funcionam! Não, as leis do silêncio não
funcionam... [Brick vai até o bar, dá um trago rápido e esfrega a cabeça com uma
toalha]. As leis do silêncio não funcionam... Quando uma coisá esta infernizando sua
memória ou imaginação, as leis do silêncio não funcionam, é como fechar uma porta e
trancar numa casa pegando fogo na esperança de esquecer que a casa está pegando fogo.
Mas não enxergar o incêndio, não o apaga. O silêncio só aumenta o problema. O
problema cresce e fica envenenado no silêncio, se torna maligno... [Deixa cair a
muleta].

BRICK: Pega minha muleta [Ele parou de secar o cabelo, mas continua segurando no
suporte de toalha no robe atoalhado branco].

MARGARET: Se apoia em mim.

BRICK: Não, pega minha muleta.


MARGARET: Segura no meu ombro.

BRICK: Eu não quero seu ombro, eu quero minha muleta! [Isto é falado como um raio
repentino]. Vai me dar a muleta ou vou ter que me ajoelhar no chão e...

MARGARET: Aqui, aqui, toma! [Joga a muleta para ele]

BRICK [Afasta-se mancando]: Obrigado.

MARGARET: A gente ãao pode gritar um com o outro, as paredes dessa casa têm
ouvidos... [Ele manca diretamente até o bar para preparar outra bebida] Mas é a
primeira vez em muito tempo que ouço você levantar a voz, Brick. Está perdendo a
compostura? Acho que isso é um bom sinal... sinal de atrevimento num jogador na
defesa! [Brick vira-se e sorri pra ela friamente sobre sua bebida].

BRICK: Não aconteceu ainda, Margaret.

MARGARET: O que?

BRICK: O estalo dentro da minha cabeça quando já bebi o bastante pra ficar em paz...
Me faz um favor?

MARGARET: Talvez. Que favor?

BRICK: Fale baixinho!

MARGARET [Num sussurro rouco]: Vou fazer esse favor, vou sussurrar, ou fechar a
boca completamente se você me fizer o favor de tomar só mais esse drinque até acabar a
festa.

BRICK: Que festa?

MARGARET: A festa de aniversário do teu pai.

BRICK: É aniversário do velho?

MARGARET: Voce sabe que é.

BRICK: Não sei, tinha esquecido.

MARGARET: Bem, lembrei pra você... [Ambos falam tão esbaforidos com duas
crianças depois de uma briga, respirando fundo e olhando um para o outro com olhos
distantes, tremendo e ofegando juntos como se tivessem se separado de uma luta
violenta].

BRICK: Ponto pra você, Margaret.

MARGARET: Você só precisa escrever alguma coisa nesse cartão.

BRICK: Escreve você, Margaret.

MARGARET: Tem que ser sua letra; é o seu presente, já dei o meu, tem que ser sua
letra. [A tensão entre eles cresce de novo, as vozes ficam esganiçadas mais uma vez].

BRICK: Não comprei presente nenhum pra ele.

MARGARET: Eu comprei.

BRICK: Tudo bem, então você escreve o cartão.

MARGARET: E deixar ele perceber que você não se lembrou do aniversário dele?

BRICK: Eu não me lembrei do aniversário dele.

MARGARET: Você não precisa mostrar que não lembrou.

BRICK: Não quero enganá-lo.

MARGARET: Só escreva “Com amor, Brick!” Pelo amor de...

BRICK: Não.

MARGARET: Você tem que escrever!

BRICK: Não tenho que fazer nada que eu não quero. Você sempre se esquece das
condições que eu impus pra continuar vivendo com você.

MARGARET [Sem perceber]: Não estou vivendo com você. Nós ocupamos a mesma
gaiola.

BRICK: Você tem que se lembrar das condições combinadas.

FILHO [Fora do palco]: Mãe, me dá. Eu peguei primeiro.

MAE: Fica quieto.

MARGARET - Elas são condições impossíveis!

BRICK: Então, por que você não-?

FILHO: Eu quero, eu quero!

MAE: Vai embora!

MARGARET - PSSSIII!!! Quem está aí? Tem alguém aí na porta? [Passos no


corredor].

MAE [De fora]: Posso entrar?

MARGARET: Ah, você! Claro, entra, Mae. [Mae entra com um arco suspenso no ar]

MAE: Brick, isso é seu?

MARGARET: Irmãzinha - este é o meu trofeu de Diana. Ganhei no campeonato


intercolegial de arco e flecha no campus Ole Miss.
MAE- É muito perigoso deixar isso exposto numa casa cheia de crianças normais
arteiras atraídas por armas.

MARGARET – “Crianças normais arteiras atraídas por armas” deveriam ser ensinadas
a não botar as mãos em coisas que não pertencem a elas.

MAE- Margaret, minha querida, se tivesse filhos, você acharia muita graça nesse
comentário. Pode trancar isso e esconder a chave?

MARGARET - Irmãzinha, ninguém tá tramando a destruição dos seus filhinhos. -Brick


e eu ainda temos nossa licençaa especial de arqueiros. Vamos caçar veado em Moon
Lake logo que a temporada comecar. Adoro correr com cachorros pelos bosques frios,
correr, correr, pular obstáculos- [Guarda o arco no armário].

MAE- Como está o tornozelo, Brick?

BRICK - Nao doi. Só coça.

MAE- Puxa vida! Brick - Brick, você devia ter ficado lá embaixo depois do jantar! As
crianças deram um show. Polly tocou piano, Buster e Sonny tocaram bateria e depois
apagaram as luzes e Dixie e Trixie dançaram na ponta vestidas de fadas com velas
[sparkles]! Papai vibrou! Simplesmente vibrou!

MARGARET – [do closet com uma risada ríspida]: Aposto que sim. Estou arrasada
por termos perdido! [Entra]. Mas, Mae por que coloca nome de cachorro nos seus
filhinhos?

MAE: Nome de cachorro?

MARGARET [Doce]: Dixie, Trixie, Buster, Sonny, Polly! Parecem quatro cachorros e
um papagaio...

MAE: Margaret? [Margaret se volta com um sorriso]: Por que você é tão malvada?

MARGARET: Por que sou uma gata! E por que não aceita uma piada, irmãzinha?

MAE: Nada me agrada mais do que uma piada engraçada. Você sabe os nomes
verdadeiros de nossos filhinhos. O nome verdadeiro de Buster é Robert, o de Sonny é
Saunders, o de Trixie e Marlene e o de Dixie- [Gooper a chama lá de baixo: “Ei,
Mae!.O intervalo acabou. - Ela corre ate a porta, dizendo]. Acabou o intervalo. Até
logo!

MARGARET: Qual é o nome verdadeiro da Dixie?

BRICK: Margaret, essa maldade não melhora as coisas -

MARGARET: Eu sei! POR QUE - sou tão malvada? -Por que estou consumida pela
inveja e devorada pelo desejo? –Brick, vou separar seu lindo terno italiano de seda
shantung e uma de suas camisas de seda com monograma. Vou colocar suas abotoaduras
nela, aquelas lindas estrelas de safira que raramente faço você usar.

BRICK: Não consigo vestir calça com esse gesso.


MARGARET: Consegue sim, eu ajudo.

BRICK: Não vou me vestir, Margaret.

MARGARET: Vai só vestir o pijama de seda branco?

BRICK: É, vou vestir o pijama, Margaret.

MARGARET: Obrigada, muito obrigada!

BRICK: Não tem de que.

MARGARET: Ah, Brick! Quanto tempo isso vai durar? Essa punição? Já não cumpri
meu tempo, não cumpri minha sentença, será que não posso pedir... perdão?

BRICK: Margaret, você está estragando minha bebida. Ultimamente você sempre fala
como se estivesse subindo as escadas correndo para alertar que a casa está pegando
fogo!

MARGARET: Bom, não é de estranhar mesmo! Brick, sabe como me sinto? O tempo
todo me sinto uma gata num telhado de zinco quente.

BRICK: Entao pula do telhado, pula! Gatos podem pular de telhados e cair no chão
sem se machucar.

MARGARET: Ah, claro!

BRICK: Faz isso, pelo amor de Deus, faz.

MARGARET: Fazer o que?

BRICK: Arrume um amante!

MARGARET: Sóconsigo olhar para você! Mesmo de olhos fechados, só vejo voce!
Por que voce nao fica feio, Brick, por que, por favor, não engorda e fica feio para eu
suportar melhor isso? [Corre até a porta, abre e escuta]. O concerto não acabou! Bravo,
seu sem pescoço, bravo! [Bate a porta e tranca furiosa].

BRICK: Por que trancou a porta?

MARGARET: Pra gente ter um pouco de privacidade.

BRICK: Você sabe que isso não é verdade, Margaret!

MARGARET: Não, não sei. [Ela corre até as portas da galeria, puxa as cortinas de
seda de rosas].

BRICK: Não se faça de boba!

MARGARET: Não me importo de me fazer de boba por causa de você!

BRICK - Eu me importo, Margaret. Me sinto constrangido por você!


MARGARET: Constrangido? Mas não continue minha tortura. Não posso continuar
vivendo assim.

BRICK: Você concordou em-

MARGARET: Eu sei, mas-

BRICK - -aceitar essa condição!

MARGARET: NÃO CONSIGO! NÃO CONSIGO! NÃO CONSIGO! [Ela segura os


ombros dele].

BRICK: Solta! [Ele se livra dela, pega uma cadeirinha de quarto e levanta como um
domador de leão enfrentando um grande felino de circo. Contagem até cinco. Ela o fita
com a mão fechada apertando a boca, depois solta uma gargalhada estridente quase
histérica. Ele continua sério um tempo, então dá um riso forçado e coloca a cadeira no
chao. Ouve-se a voz da Mamãe pela porta fechada].

MAMÃE: Filho? Filho? Filho?

BRICK: O que é, Mamãe?

MAMÃE [De fora]: Ah, filho! Recebemos a notícia mais maravilhosa sobre o Papai!
Tive que correr aqui pra te contar imediatamente- [Ela mexe na maçaneta]. -Por que
essa porta está fechada? Vocês acham que tem ladrão em casa?

MARGARET: Mamãe, Brick está se vestindo, não está pronto ainda.

MAMÃE: Tudo bem, não vai ser a primeira vez vejo Brick sem roupa. Vai, abre a
porta. [Margaret com uma careta destranca e abre a porta enquanto Brick manca
rapidamente até o banheiro e fecha a porta com um chute. Mamãe sumiu do corredor].

MARGARET: Mamãe?

MAMÃE [Mamãe aparece pelas portas do lado oposto da galeria atrás de Margaret,
bufando e lufando como um buldogue velho. Ela é uma mulher baixa e corpulenta; seus
sessenta anos e 85 quilos a deixaram um tanto quanto sem fôlego a maior parte do
tempo; está sempre tensa como um boxeador, ou melhor, um lutador japonês. Sua
“família” talvez fosse um pouco superior à de Papai, mas não muito. Ela usa um
vestido de renda preto ou prata e pelo menos meio milhão de joias espalhafatosas. Ela é
muito sincera. Falando alto, assustando Margaret]: Aqui, vim pela porta da varanda do
Gooper e da Mae. Cadê o Brick? Brick- sai rápido daí filho, só tenho um minuto e quero
te dar a notícia sobre o Papai. -Detesto portas trancadas numa casa.

MARGARET [Com leveza afetada]: Já percebi, Mamãe, mas as pessoas precisam de


um pouco de privacidade, não é?

MAMÃE: Não, senhora, não na minha casa. [Sem pausa] Por que trocou de roupa?
Aquele vestidinho de renda estava tão bonito, querida.

MARGARET: Também acho, mas um dos meus coleguinhas de mesa usou como
guardanapo então-!
MAMÃE [Pegando meias no chão]: O que?

MARGARET: Sabe, Mamãe, Mae e Gooper são tão melindrosos por causa daquelas
crianças! - Obrigado, Mamãe... [Mamãe joga as meias recolhidas na mão de Margaret
com um grunhido] -que ninguém se atreve a sugerir que eles podem melhorar -

MAMÃE: Rápido, Brick! Que chato, Margaret, você simplesmente não gosta de
criança.

MARGARET: Eu gosto muito de criança! Adoro! Criança educada!

MAMÃE [Gentil, amável]: Então, por que não tem uma e educa bem em vez de ficar
infernizando as do Gooper e da Mae?

GOOPER [Gritando na escada]: Ei, Mamãe! Betsy e Hugh vão embora. Estão só
esperando pra se despedir!

MAMÃE: Fala pra esperar um pouquinho que desço num minuto!

GOOPER: Sim, senhora! [Ela se vira para a porta do banheiro e grita].

MAMÃE: Filho? Está me ouvindo? [Resposta indistinta]. Acabamos de receber o


exame completo do laboratório da Clínica Ochsner, completamente negativo, filho, tudo
negativo, sem exceção! Nao tem nada de errado com ele, só uma coisa chamada cólon
espástico. Filho, está me ouvindo?

MARGARET: Está sim, Mamãe.

MAMÃE: Entao por que não diz nada? Pelo amor de Deus, uma notícia dessa ele devia
gritar! Eu gritei, estou dizendo. Gritei, chorei e caí de joelhos! Olha! [Ela levanta a
saia]. Está vendo o machucado onde bati o joelho? Foi preciso dois médicos para me
levantar! [Ela ri – sempre ri como louca]. Papai ficou furioso comigo! Mas não é uma
noticia maravilhosa? [Olhando para o banheiro novamente, ela continua]. Depois
angústia que passamos, receber uma notícia dessa no dia do aniversário do papai? Papai
tentou esconder o peso que a notícia tirou da cabeça dele, mas ele não me engana. Ele
mesmo quase chorou! [Ouvem-se despedidas e ela corre até a porta].

GOOPER: Mamãe!

MAMÃE: Segura esse povo aí, não deixa ir embora! Agora se veste, Brick, todo
mundo vai subir pra cá pra festa de aniversário do Papai por causa do seu tornozelo.
Como está o tornozelo dele, Margaret?

MARGARET: Bom , está quebrado, mamãe.

MAMÃE: Eu sei que está quebrado. [O telefone toca no corredor. Um negro atende:
Residência de Mr. Polly]. Estou perguntando se ainda dói muito.

MARGARET: Infelizmente não sei dizer, Mamãe. Vai ter que perguntar pro Brick.

SOOKEY [No corredor]: É de Memphis, Miss Polly, é Miss Sally de Memphis.


MAMÃE: Está bem, Sookey. [Mamãe corre para o corredor e ouve-se ela gritar ao
telefone]: Alô, Miss Sally. Como está, Miss Sally?- É, bom, já ia te ligar. Droga.

MARGARET: Brick, não! [Mamãe levanta a voz]: Miss Sally? Nunca mais me ligue
do hall do Gayoso, muita conversa no hall desse hotel, não é surpresa que você não me
ouve. Agora escuta, Miss Sally. Não tem nada sério com o Papai. Acabamos de receber
o laudo, nada errado só uma coisa chamada cólon – espástico! ESPÁSTICO! [Ela
aparece no corredor e chama Margare]. Maggie, vem aqui fala com essa idiota no
telefone. Estou sem ar de tanto gritar.

MARGARET: [Sai e fala suavemente ao telefone]: Miss Sally? Sou eu, Margaret, a
esposa de Brick. Que bom ouvir tua voz. Está ouvindo a minha? Que bom! -Mamãe só
queria que você soubesse que chegou o laudo da Clínica Ochsner e o que Papai tem é
cólon espástico. É, cólon espástico, Miss Sally. Isso, cólon espástico. Tchau, Miss Sally,
espero vê-la logo! [Desliga um pouco antes que Miss Sally provavelmente estava
pronta para terminar a conversa. Ela retorna pela porta do corredor]. Ela me ouviu
perfeitamente. Descobri que com surdos o negócio é não gritar, é só pronunciar
claramente. Minha tia Cornelia é velha e rica e surda como uma porta, mas eu fazia ela
me ouvir só dizendo cada palavra lentamente, distintamente, perto do ouvido. Eu lia o
Commercial Appeal toda noite, até os classificados e ela nunca perdeu uma palavra.
Mas era uma velha mesquinha! Sabe o que ganhei quando ela morreu? Assinaturas de
cinco revistas e do Clube do Livro do Mês e uma BIBLIOTECA cheia dos livros mais
chatos já escritos! O resto foi pra megera de uma irmã... mais mesquinha que ela!
[Mamãe está arrumando as coisas no quarto durante sua fala].

MAMÃE: [Fechando a porta do closet sobre as roupas jogadas]: Miss Sally é um caso
sério! Papai diz que ela está sempre pedindo alguma coisa! E ele está certo, aquela
pobre coitada está sempre pedindo alguma coisa. Acho que Papai não dá tanto quanto
devia pra ela.

GOOPER: Mamãe! Vem logo! Betsy e Hugn não podem esperar mais!

MAMÃE [Gritando]: Já estou indo! [Ela anda até a porta do corredor, vira-se e
balança um dedo primeiro na direção da porta do banheiro, depois para o bar,
significando: “Brick está bebendo?” Margaret finge não entender, inclina a cabeça,
levanta a sobrancelha como se a pantomima fosse completamente confusa para ela.
Mamãe corre de volta até Margaret]: Merda! Para de bancar a idiota!... Quero saber se
ele anda bebendo muito ainda.

MARGARET: [Com um sorrisinho]: Ah! Acho que ele tomou um uísque depois do
jantar.

MAMÃE: Nao ria! Tem homem solteiro que para de beber quando casa, outros
começam! Brick nunca tocou numa bebida antes de-!

MARGARET: [Gritando]: ISSO NÃO É JUSTO!

MAMÃE: Justo ou não, quero te perguntar uma coisa, só uma coisa: voce faz o Brick
feliz na cama?

MARGARET: Por que não pergunta se ele me faz feliz na cama?

MAMÃE: Por que sei que-


MARGARET: Isso serve pros dois.

MAMÃE: Alguma coisa está errada! Vocês nao têm filho e meu filho bebe.

GOOPER: Vem logo, Mamãe! [Gooper chamou lá de baixo e ela corre até a porta na
fala acima. Ela vira-se à porta e aponta para a cama]: - Quando o casamento fracassa,
o fracasso começou ali, bem ali!

MARGARET: Isso não- [Mamãe sai do quarto correndo e bate a porta] é – justo...
[Margaret está sozinha, completamente sozinha e sente isso. Ela se recolhe, encolhe os
ombros, levanta os braços com os punhos cerrados, fecha os olhos bem apertado como
uma criança prestes a ser atingida por uma agulha de vacina. Quando ela os abre
novamene, o que ela vê é o espelho longo e oval e corre direto até ele, o fita com uma
careta e diz: “Quem é voce?” – Então ela agacha um pouco e responde pra si num tom
de voz diferente, alto, fino, debochado: “Eu sou Maggie, a Gata”. - Recompõe-se
rapidamente quando a porta do banheiro se abre um pouco e Brick a chama].

BRICK: Mamãe já foi?

MARGARET: Já. [Ele abre a porta do banheiro e manca com o copo agora vazio
direto para o bar. Assovia suavemente. Margaret gira a cabeça sobre seu longo pescoço
delgado para observá-lo. Ela levanta uma mão indecisa até a garganta como se fosse
difícil engolir antes de falar]. Sabe, nossa vida sexual não murchou da maneira normal,
foi cortada abruptamente, muito antes do prazo normal pra acabar e vai reviver
novamente, tão repentinamente como acabou. Estou me mantendo atraente pra isso. Pro
dia que você vai me olhar novamente como os outros homens me olham. É, como os
outros homens me olham. Eles ainda me olham, Brick, e gostam do que veem. Alguns
dariam- Olha, Brick! [Ela fica em pé diante do do longo espelho oval, toca os seios e
depois os quadris com as duas mãos]. Como meu corpo está tudo em cima! Nada caído-
nadinha... [Sua voz é suave e trêmula: a súplica de uma criança. Neste momento ele
vira-se para olhar para ela – um olhar como se um um jogador estivesse passando a
bola para outro, terceiro ataque e sem poder avançar – ela tem que capturar a plateia
em uma dominação tão forte que possa segurá-la até o primeiro intervalo sem qualquer
lapso de atenção]. Os outros homens ainda me querem. Meu rosto parece tenso às
vezes, mas mantive minha aparência tão boa quanto você manteve a sua e os homens a
admiram. Eu ainda viro cabeças na rua. Ora, semana passada em Memphis, todo lugar
que eu ia, os olhares dos homens queimava e faziam buracos na minha roupa, no clube
de campo, nos restaurantes e nas lojas de departamentos não havia um homem que eu
visse ou passasse por mim que nao me comesse com os olhos e não se virasse quando eu
passava e olhava para mim. Na festa que Alice deu pros primos de Nova York, o homem
mais bonito de todos - me seguiu até o segundo andar e tentou me agarrar no banheiro,
me seguiu até a porta e tentou entrar!

BRICK: Por que não deixou o cara entrar, Maggie?

MARGARET: Por que não sou tão ordinária. Não que não tenha ficado tentada. Quer
saber quem era? Foi o Sonny Boy Maxwell, ele mesmo!

BRICK? Ah, tá, Sonny Boy Maxwell, era um bom atacante, mas machucou as costas e
teve que parar.

MARGARET: Mas ele nao está mais machucado, não tem mulher e ainda tem tesão
por mim.

BRICK: Nesse caso não vejo por que o evitou no banheiro.

MARGARET: E ser pega no flagra? Não sou tão idiota assim. Ah, eu poderia um dia
trair você com alguém já que está com tanta vontade que eu faça isso! Mas se fizer,
pode ter certeza que será num lugar e numa hora onde ninguém vai saber exceto eu e o
homem. Não vou dar nenhuma desculpa pra voce se divorciar de mim por infidelidade
ou coisa parecida...

BRICK: Maggie, nunca vou divorciar de você por infidelidade. Não sabe disso?
Inferno. Seria um alívio saber que você arrumou um amante.

MARGARET: Bom, não vou arriscar! Não, prefiro ficar neste telhado de zinco quente.

BRICK: Um telhado de zinco quente não é um lugar confortável [Começa a assoviar


suavemente].

MARGARET: É, mas posso ficar nele o tempo que for preciso.

BRICK: Maggie, você podia me deixar. [Ele para de assoviar. Ela se vira e olha para
ele].

MARGARET: Não quero e não vou! Além do que, se eu te deixasse, você não tem um
centavo para pensão só o que Papai te dá e ele está morrendo de câncer! [Pela primeira
vez a percepção do fim do Papai parece penetrar a consciência de Brick, visivelmente, e
ele olha para Margaret].

BRICK: Mamãe acabou de dizer que ele não está morrendo, que o diagnóstico foi bom.

MARGARET: É o que ela pensa por que ouviu a mesma estória que contaram pro
Papai. E ela aceitou exatamente como ele, coitadinhos... Mas hoje à noite eles vão
contar a verdade pra ela. Quando o Papai for pra cama, vão contar pra ela que ele está
morrendo de câncer. [Ela bate a gaveta da cômoda]. É maligno e terminal.

BRICK: Papai sabe?

MARGARET: Inferno, alguma vez o doente sabe? Ninguém diz: “Você está
morrendo”. Você tem que enganá-los. Eles têm que se enganar.

BRICK: Por que?

MARGARET: Por que? Por que os seres humanos sonham com a vida eterna, é por
isso! Mas a maioria quer isso aqui na terra e não no céu. [Ele dá uma risada curta e
dura com o humor dela]. Bem... [Ela toca sua máscara]. Assim é que é, no fim das
contas... [Ela olha ao redor] Onde deixei meu cigarro? Não quero queimar a casa pelo
menos não com Mae e Gooper e os cinco monstros dentro! [Ela encontra o cigarro e
traga vorazmente. Sopra a fumaa e continua\]. Então este é o último aniversário do teu
Papai. E a Mae e o Gooper sabem disso, com certeza. Foram os primeiros a ser
informados pela Clínica Ochsner. Por isso correram pra cá com os monstrinhos sem
pescoço. Sabe de uma coisa? Papai não fez testamento? Papai nunca fez nenhum
testamento na vida, por isso esta campanha em andamento pra impressioná-lo com o
fato de que você bebe e eu não tenho filhos! [Ele continua a fitá-la, depois murmura
alguma coisa cortante, mas não audível e manca bem rápido para a galeria comprida
na luz dourada se esvaindo].

MARGARET: Você sabe bem que eu gosto muito do Papai. Eu realmente gosto muito
daquele velho, você sabe...

BRICK [fraco, vagamente]: É, eu sei que é...

MARGARET: Sempre o admirei apesar da grosseria, os palavrões, etc. Porque ele é o


que é e diz claramente o que pensa. Ele não virou um fazendeiro cavalheiro, ainda é um
caipira do Mississipi, tão caipira quanto deve ter sido quando era capataz aqui na
fazenda do Jack Straw e do Peter Ochello. Mas ele comprou a terra e formou a melhor
plantação do Delta. - Sempre gostei do Papai... [Ela cruza até o proscênio]. Bom, é o
último aniversário de Papai. Sinto muito. Mas estou encarando os fatos. Custa dinheiro
tomar conta de um bêbado e fui eleita para este cargo ultimamente.

BRICK: Você não precisa tomar conta de mim.

MARGARET: Preciso sim. Duas pessoas no mesmo barco têm que tomar conta uma da
outra. No mínimo você quer dinheiro para comprar mais Echo Spring quando o seu
estoque acabar ou vai ficar satisfeito com uma cerveja barata? A Mae e o Gooper estão
planejando nos excluir da herança do Papai porque você bebe e eu não tenho filhos. Mas
podemos acabar com esse plano. Nós vamos acabar com ele! Brick, sabe, eu fui tão
miseravelmente pobre a minha vida inteira! - Essa é a verdade, Brick!

BRICK: Não estou dizendo que não é.

MARGARET: Sempre tive que puxar o saco das pessoas que não suportava porque
tinham dinheiro e eu pobre feito Jó. Você não sabe o que é isso. Bom vou te contar, é
como se sentir milhas de distância da sua Echo Spring! E tivesse que voltar para ela de
tornozelo quebrado... sem muleta! Isso é ser pobre feito Jó e ter que puxar o saco de
parentes que você odeia porque são ricos e tudo que você tem são roupas doadas e
alguns bônus velhos de três centavos do governo. Meu pai adorava bebida, ele se
apaixonou pela bebida do mesmo jeito que você se apaixonou pela Echo Spring! –E a
coitada da minha mãe tendo que manter algum traço de posição social, manter as
aparências, com uma renda de cento e cinquenta dólares por mês daqueles antigos bônus
do governo! Quando fui apresentada à sociedade, no ano que debutei, eu só tinha dois
vestidos de gala! Um mamãe fez de um modelo da Vogue, o outro ganhei de uma prima
rica que eu odiava! –O vestido que casei com você foi o vestido de casamento da minha
avó... Por isso que sou uma gata num telhado de zinco quente! [Brick ainda está na
sacada. Alguém embaixo o chama com uma voz de Negro: “Ei, Mister Brick, como está
se sentindo?” Brick levanta o copo de vidro como resposta à pergunta].

MARGARET: Você pode ser jovem sem dinheiro, mas não pode ser velho sem ele.
Você tem que ser velho com dinheiro por que ser velho sem dinheiro é simplesmente
terrível, você tem que ser uma coisa ou outra, ou jovem ou com dinheiro, você não pode
ser velho e sem dinheiro. –A verdade é essa, Brick, [Brick assovia suave e vagamente].
Bom, agora já me vesti, estou toda vestida, não tenho mais nada pra fazer.
[Desesperado, quase temeroso]. Me vesti, estou pronta, nada mais pra fazer... [Ela se
movimenta agitada, a esmo, e fala como que para si]. O que eu – sou? Ah! minhas
pulseiras... [Ela começa a colocar uma porção de pulseiras no pulso, aproximadamente
seis em cada, enquanto fala]. Pensei muito nisso e agora sei quando errei. É, eu errei
quando contei pra você o que aconteceu comigo e o Skipper. Nunca devia ter
confessado, um erro fatal, te contar aquilo com o Skipper.

BRICK: Maggie, para de falar do Skipper. Falo sério, Maggie, você tem que parar de
falar do Skipper!

MARGARET: Você tem que entender que Skipper e eu-

BRICK: Acha que não estou falando sério, Maggie? Está enganada só por que estou
falando isso calmamente? Olha, Maggie. Você está brincando com fogo.Você está- você
está- está brincando com uma coisa que - ninguém devia brincar.

MARGARET: Desta vez vou terminar o que tenho pra dizer. Skipper e eu fizemos, se
é que pode chamar aquilo de amor, por que isso fez a gente se sentir mais próximo de
você. Está vendo, seu filho da puta, você exigiu muito das pessoas, de mim, dele, de
todos os pobres infelizes filhos da puta que por acaso amam você, e havia muita gente,
é, muita gente mesmo além de mim e do Skipper, você pediu demais das pessoas que
amavam você, você... seu ser superior! Um deus! –E fizemos amor para sonhar que era
você, eu e ele! É, é, é! Verdade, verdade! O que tem de horrível nisso? Eu gosto, acho
que a verdade é- ! Não devia ter contado pra você...

BRICK: [Segurando a cabeça artificialmente e um pouco inclinada para cima]: Quem


me contou foi o Skipper. Nã você, Maggie.

MARGARET: Eu contei pra você!

BRICK: Depois que ele me contou.

MARGARET: Que importância-?

DIXIE: Peguei seu taco, peguei seu taco.

TRIXIE: Me dá, me dá. É meu. [Brick vira-se repentinamente sobre a sacada e grita].

BRICK: Menina! Hei, menina!

MENINA [De longe]: Que foi, tio Brick?

BRICK: Pede pro pessoal subir aqui! -Traz todo mundo aqui para cima!

TRIXIE: É meu. É meu

MARGARET: Não consigo parar! Continuaria contando pra você na frente deles todos
se precisasse!

BRICK: Menina! Vai, vai, por favor! Faz o que eu mandei, chama todo mundo!

DIXIE: Está bem!

MARGARET: Isso tem que ser dito e você, você! –você nunca deixa! [Ela soluça,
depois se controla e continua quase calmamente]. Foi uma dessas coisas bonitas, ideais
que eles contam nas lendas gregas, nem podia ser de outro jeito, você sendo você, e foi
isso que a tornou tão triste, foi isso que a tornou tão horrível, por que era amor que
nunca podia ser levado a nada satisfatório ou mesmo falado abertamente.
BRICK: Maggie, pare com isso.

MARGARET: Brick, te digo, você precisa acreditar em mim, Brick. Entendo tudo
sobre isso! Eu- eu acho que foi- nobre. Não consegue ver que estou sendo sincera
quando eu digo que respeito? Minha questão, a única questão que acho é que tem que
deixar a vida continuar mesmo depois que o sonho da vida tenha- se- acabado
completamente... [Brick está sem muleta. Apoiando na mobília, ele cruza para pegar a
muleta enquanto continua como se estivesse possuída por um desejo externo à ela]. Me
lembro quando namoramos na escola, Gladys Fitzgerald e eu, você e o Skipper, mais
parecia um namoro entre vocês e o Skipper. Gladys e eu meio que só estávamos de
intrusas como se fosse necessário cuidar de vocês! – para causar uma boa impressão
pública-

BRICK [Vira-se para fitá-la, levantando um pouco a muleta]: Maggie, quer que eu
bata em você com essa muleta? Não vê que eu posso te matar com essa muleta?

MARGARET: Deus do céu, acha que eu ia me importar se você me matasse?

BRICK: Um homem tem uma grande coisa boa e verdadeira. Uma grande coisa boa
que é verdadeira! -Eu era amigo do Skipper. -Você está dizendo que era sujo.

MARGARET: Não estou dizendo que era sujo. Estou dizendo que era bonito.

BRICK: Não o amor por você, Maggie, mas a amizade com Skipper era uma grande
coisa verdadeira e você está dizendo que era sujo!

MARGARET: Então você não ouviu direito, não entendeu o que eu disse. Estou
dizendo que foi tão bonito que matou o coitado do Skipper! -Vocês dois tinham algo
que tinha que ser guardado no gelo, é, incorruptível, é! -E a morte foi a única geladeira
onde vocês podiam guardar isso...

BRICK: Casei com você, Maggie. Por que eu ia casar com você se eu fosse-?

MARGARET: Brick, me deixa terminar! Eu sei, pode acreditar que eu sei, que só o
Skipper tinha nutrido qualquer desejo inconsciente por qualquer coisa que não fosse
perfeitamente pura entre vocês dois! –Agora me deixa explicar. Você se casou comigo
no início do verão que nos formamos no Ole Miss, e éramos felizes, nao éramos,
érmoas bem-aventurados, é, chegávamos no céu juntos toda vez que fazíamos amor!
Mas naquele outono, você e o Skipper recusaram ofertas de trabalho maravilhosas para
continuarem sendo herois no futebol – heróis do futebol profissional. Vocês fundaram o
Dixie Stars naquele outono para que pudessem continuar sendo companheiros de time
para sempre! Mas algo estava errado naquilo! -Incluindo eu! –entre vocês. O Skipper
começou a encher o caneco... você machucou a coluna - não pode jogar a partida de
Ação de Graças em Chicago, assistiu pela TV numa cama ortopédica em Toledo.
Encontrei Skipper. O Dixie Stars perdeu por que o coitado do Skipper estava bêbado.
Nós bebemos a noite toda juntos no bar do Blackstone e quando o dia frio começou a
amanhecer sobre o Lago e estávamos saindo bêbados para dar uma olhada tonta nele,
eu disse: “SKIPPER! PARA DE AMAR MEU MARIDO OU ENTÃO DIZ PRA ELE
QUE ELE TEM QUE DEIXAR VOCÊ CONFESSAR PRA ELE!”- uma coisa ou
outra! ELE BATEU COM FORÇA NA MINHA BOCA! –Depois se virou e correu sem
parar uma vez se quer, eu tenho certeza, todo o caminho de volta até o quarto no
Blackstone... - Quando fui ao quarto dele aquela noite, raspando de leve a porta como
uma ratinha tímida, ele fez aquela tentativa inútil e lamentável para provar que o que eu
tinha dito não era verdade... [Brick bate nela com a muleta, uma batida que quebra o
abajur em forma de gema em cima da mesa]. Deste modo, eu o destruí, contando uma
verdade que ele e o mundo onde ele nasceu e foi criado, o seu e o dele, disseram a ele
que não podia ser contada? - Daí pra frente, Skipper não foi nada senão um recipiente
de bebidas e drogas.
- Quem matou o pisco? Eu com... [Ela joga a cabeça para trás com os olhos fechados] -
meu arco misericordioso!” [Brick bate nela e erra]. Errou! –Desculpa, -não estou
tentando esconder meu comportamento, por Deus, não! Brick, eu não sou boa. Não sei
por que as pessoas têm que fingir que são boas, ninguém é bom. Os ricos ou os
bem-sucedidos se dão ao luxo de respeitar padrões morais, padrões morais
convencionais, mas eu nunca pude, é, mas - sou honesta! Me dê crédito só por isso, por
favor. -Nasci pobre, criada pobre, espero morrer pobre a não ser que consiga alguma
coisa do que Papai deixar quando ele morrer de câncer! Mas Brick?! -Skipper morreu!
Eu estou viva! Maggie a gata está- [Brick salta desajeitado para frente e bate nela de
novo com a muleta]. -viva! Eu estou viva, viva! Estou... [Ele joga a muleta nela através
da cama, ela se esconde atrás dela e se joga no chão enquanto conclui a fala] -viva!
[Uma garotinha, Dixie, irrompe no quarto, vestindo um boné de guerra de índio e
disparando um revólver de espoleta em Margaret e gritando POU-POU-POU! Risadas
da parte debaixo entram pela porta do corredor aberta. Margaret agachou-se na cama
ofegante na entrada da criança. Ela levanta-se e fala com fúria gélida]. Menininha, sua
mãe ou alguém deveria te ensinar- [ofegante] -a bater na porta antes de entrar num
quarto. Senão as pessoas poderão pensar que você – não tem – boa eduação.

DIXIE: Tá, tá, tá O que tio Brick está fazendo no chão?

BRICK: Tentei matar sua tia Maggie, mas não consegui - e caí. Menina, pega a minha
muleta pra eu poder lavantar.

MARGARET: É, dá a muleta pra ele, ele é um aleijado, querida, quebrou o tornozelo


ontem à noite saltando obstáculos na pista de atletismo do ginásio.

DIXIE: Por que estava saltando obstáculos, tio Brick?

BRICK: Por que eu costumava saltar e as pessoas gostam de fazer o que costumavam
de fazer, mesmo quando não poderem mais...

MARGARET: É isso, respondeu sua pergunta, agora vai embora, garotinha! [Dixie
atira em Margaret com o revólver de espoleta três vezes]. Para, para com isso, seu
monstro! Seu monstrinho sem pescoço [ela pega o revólver de espoleta e joga pela
porta da sacada].

DIXIE [com um instinto precoce da coisa mais cruel: Você é invejosa! -Você é invejosa
por que você nao pode ter filho! [Ela mostra a língua para Margaret enquanto passa
por ela requebrando com a barriga projetada até a sacada. Margaret bate a porta da
sacada e debruça-se sobre ela arquejante. Pausa. Brick repôs a bebida derramada e
senta-se, distante, na cama grande de quatro mastros].

MARGARET: Viu? -Eles riem da nossa desgraça de não ter filhos até na frente dos
cinco monstrinhos sem pescoço! [Pausa. Vozes se aproximam na escada]. Brick? -Eu
fui a um médico em Memphis –um ginecologista... Ele me examinou todinha e não tem
motivo nenhum pra não termos filho quando a gente quiser. E pelo calendário esta é o
momento para engravidar. Está me ouvindo? Está? Está me OUVINDO?
BRICK: Estou. Estou te ouvindo, Maggie. [Sua atenção se volta para o rosto
inflamado dela]. –Mas como diabos você imagina – que vai ter um filho de um homem
que não suporta você?

MARGARET: Este é um problema que vou ter que resolver. [Ela se vira para fitar a
porta do corredor].

MAE [Fora do palco à esquerda]: Vamos, Papai. Vamos todos subir pro quarto do
Brick. [Vozes de fora do palco à esquerda: Reverendo Tooker, Doutor Baugh, Mae].

MARGARET: Eles estão vindo! [A luz cai].

CORTINA

ATO DOIS

Passagem de tempo. Margaret e Brick estão nas mesmas posições ocupadas no fim do
Ato I.

MARGARET [Na porta]: Eles estão vindo! [Papai aparece primeiro, um homem alto
com um olhar ameaçador e ansioso, se movimentando cuidadosamente para não trair
sua fraqueza até mesmo, ou especialmente, para si mesmo].

GOOPER: Li no Register que você vai ganhar uma nova janela memorial. [Algumas
das pessoas estão se aproximando pelo corredor, outras ao longo da sacada: vozes
chegam das duas direções. Gooper e Reverendo Tooker aparecem fora das portas da
sacada e suas vozes entram claramente. Eles param do lado de fora enquanto Gooper
acende um cigarro].

REVERENDO TOOKER [animado]: Ah, mas St. Paul’s em Granada tem três janelas
memoriais e a mais recente é uma janela de vidro colorido Tiffany que custam duzentos
e cinquenta dólares, um quadro de Cristo, o Bom Pastor, com uma Ovelha nos Braços.

MARGARET: Papai.

PAPAI: E aí, Brick.

BRICK: Oi, Papai. -Parabéns...

PAPAI: -Merda... [Todos vão aparecendo por todos os cantos. Gooper acende o
charuto, Mae conversa com o doutor Baugh, o médico da família].

GOOPER: Quem dá essa janela, Reverendo?

REVERENDO TOOKER: A viúva de Clyde Fletcher. Também presenteou a St. Paul’s


com uma fonte batismal.

GOOPER: Sabe o que alguém deveria dar para sua igreja é uma sistema de
resfriamento, Reverendo.

MAE [quase religiosamente]: -Vamos ver agora, eles tomam vacinas de tifo, vacinas de
tétano, vacinas de difteria, vacinas de hepatite e vacinas de pólio, eles tomam estas
vacinas todo mês de maio a setembro e- Gooper? Ei! Goope! – As crianças foram
vacinadas para que?

REVERENDO TOOKER: Sim, senhor, Bob! E sabe o que a família de Gus Hamma
doou à igreja em sua memória em Two Rivers? Uma paróquia nova de pedra completa
com quadra de basquete no porão e um-

PAPAI [dando uma alta risada como latido que não tem nada de verdadeiramente
hilária]: Ei, Reverendo! Que é essa conversa toda sobre memoriais, Reverendo? Acha
que alguém está prestes a bater as botas por aqui? É isso? [Espantado por esta
interjeição, Reverendo Tooker decide rir da pergunta quase tão alto quanto consegue.
Como ele iria responder a pergunta nunca saberemos, já que foi poupado desta
vergonha pela voz da esposa de Gooper, Mae, subindo alta e clara enquanto ela
aparece com “Doc” Baugh, o médico da família, pela porta do corredor].

MARGARET [Sobrepondo um pouco]: Brick, liga a vitrola! Um pouco de música pra


começar a festa!

BRICK: Liga você, Maggie. [A conversa se torna tão general que o quarto parece um
grande aviário de pássaros tagarelando. Somente Brick permanece afastado, debruçado
sobre o bar com seu sorriso distante, um cubo de gelo num guardanapo de papel com o
qual ele passa na testa de vez em quando. Ele não obedece ao comando de Margaret.
Ela avança e inclina-se sobre o painel do aparelho do console].

GOOPER: Nós demos aquela coisa pra eles como presente de três anos de casamento.
Tem três alto falantes [De repente, o quarto é tomado pelo clímax de uma ópera de
Wagner ou sinfonia de Beethoven].

PAPAI: Desliga esse inferno! [Silêncio quase imediato, quase instantaneamente


quebrado pela carga de gritos de Mamãe entrando pela porta do corredor como um
rinoceronte em ataque].

MAMÃE - Onde está meu Brick, onde est[a meu beb”e adorado!!

PAPAI: Desculpa! Liga de novo! [Todos riem muito alto. Papai é famoso por suas
piadas às custas de Mamãe e ninguém ri mais alto destas piadas que a própria Mamãe,
embora às vezes elas sejam muito crueis e Mamãe tem que pegar ou mexer em alguma
coisa para esconder a dor que a risada alta nem sempre esconde. Nesta ocasião, uma
ocasião feliz por que o horror no seu coração também foi aliviado pelo falso
diagnóstico sobre a condição do Papai, ela ri afetada, grotescamente, tímida, na
direção de Papai e apoia-se sobre Brick, tudo muito rápido e vivo].

MAMÃE: Aqui está ele, aqui está meu bebê adorado! O que é isso na sua mão? Larga
essa bebida, filho, sua mão foi feita pra segurar coisa melhors que isso!

GOOPER: Olha Brick largando o corpo! [Brick obedeceu Mamãe secando o copo e
entregando para ela. Todos riem novamente, alguns alto, outros baixo].

MAMÃE: Ah, menino levado, você é meu menininho levado. Dá um beijo na mamãe,
seu menino levado, seu! -Olha como ele fica envergonhado! Brick nunca gostou de ou
de carinho. Acho que é por que sempre teve muito! Filho, desliga essa coisa. [Brick
ligou a TV]. Não suporto televisão, rádio já era ruim, mas televisão é muito melhor.
Quer dizer -[Estatela ofegante na cadeira] muito pior-. Por que estou sentando aqui?
Quero me sentar perto do meu amor no sofá, segurar as mãos dele e namorar com ele
um pouquinho. [Mamãe está usando um chiffon estampado branco e preto. Os padrões
irregulares grandes, como marcas em um animal enorme, o lustre dos seus diamantes
grandes e muitas pérolas, os brilhantes colocados nas armações de prata dos seus
óculos, sua voz descomedida, risada estrondosa, dominaram o quarto desde sua
entrada. Papai está olhando para ela com uma careta contínua de contrariedade
crônica.

MAMÃE [ainda mais alto]: Reverendo, Reverendo, ei, Reverendo! Me dá a mão e me


ajuda a levantar desta cadeira!

REVERENDO TOOKER: Não é mais uma das suas brincadeiras, Mamãe!

MAMÃE: Que brincadeira? Me dá a mão para eu levantar- [Reverendo Tooker estende


a mão. Ela agarra e o puxa para o colo dela com uma risada estridente que alcança
uma oitava em duas notas]. Já viram um pregador no colo de uma velha gorda? Ei, Ei,
pessoal! Já viram um pregador no colo de uma velha gorda? [Mamãe é conhecida por
este tipo de brincadeira estúpida e deselegante. Margaret assiste com humor
indulgente, bebericando Dubonnet com gelo e observando Brick, mas Mae e Gooper
trocam sinais de ansiedade sem humor sobre esta palhaçada, o tipo de comportamento
que Mae acha que pode ser responsável pelo seu fracasso em atrapalhar o jovem mais
esperto casado em Memphis, apesar de tudo. Um dos negros, Lacy ou Sookey, espia,
cacarejando. Eles estão esperando um sinal para trazer o bolo e o champanhe. Mas
Papai não está contente. Ele não entende porque, apesar do alívio mental infinito
recebido com o laudo do médico, ele ainda sente aquela mesma sensação estranha
antiga na barriga: “Essa condição espástica é outra coisa”, fala para si e urra alto
com Mamãe].

PAPAI:- MAMÃE, QUER PARAR COM ESSA BESTEIRA! Você está muito velha e
gorda para essas brincadeiras malucas de criança e ainda por cima uma mulher com
pressão alta – chegou a vinte na primavera passada! – está sujeita a um derrame quando
brinca desse jeito...

MAMÃE: Olha o aniversário do Papai! [Negros vestindo paletós brancos entram com
um enorme bolo de aniversário iluminado por velas e carregando baldes de champagne
com fitas de cetim em volta dos gargalos. Mae e Gooper começam a cantar e todos,
inclusive os Negros e as Crianças, os seguem. Somente Brick permanece distante].

TODOS: PARABÉNS PRA VOCÊ, NESTA DATA QUERIDA... [Alguém canta


“Papai é um bom companheiro...”] MUITAS FELICIDADES, MUITOS ANOS DE
VIDA. [Alguém canta? “How old are you”] [Mae chama as crianças para o centro e
as arruma como um coro. Conta de modo quase inaudível um, dois, três e elas
começam a cantar desafinadas nova música].

CRIANÇAS: Música

[Todos juntos viram-se para o Papai]. É o Papai!

[Eles viram-se para frente como um coro de comédia musical].

Música

[Mae vira-se para a Mamãe]. Mamãe também! [Mamãe cai em prantos. Os Negros
saem].

PAPAI: Ida, que diabos deu em você?

MAE: Ela só está feliz.

MAMÃE: Estou tão feliz, Papai, que tenho que chorar, sei lá. [Repentinamente e alto
no silêncio] Brick, soube da notícia maravilhosa que o doutor Baugh trouxe da clínica
sobre o Papai? Papai está cem por cento.

MARGARET: Não é uma maravilha?

MAMÃE: Está cem por cento. Passou na prova fácil, fácil. Agora que sabemos que não
tem nada de errado com ele, só esse cólon espástico, posso contar uma coisa. Estava
apavorada, louca de medo que o Papai pudesse ter uma coisa como- [Margaret corta
sua fala dando um pulinho e uma exclamação esganiçada].

MARGARET: Brick, meu amor, não vai dar o teu presente pro Papai? [Ao passar por
ele tira o copo da mão. Pega um pacote com embrulho extravagante]. Olha Papai, este
é do Brick!

MAMÃE: Essa foi a maior festa de aniversário que Papai já teve, centenas de presentes
e telegramas de-

MAE [ao mesmo tempo]: O que é isso, Brick?

GOOPER: Aposto quinhentos contra cinquenta que o Brick não sabe.

MAMÃE: O divertido de presente é não saber até abrir o pacote. Abre seu presente,
Papai.

PAPAI: Abre você. Quero perguntar uma coisa pro Brick! Vem cá, Brick.

MARGARET: Papai está chamando, Brick. [Ela abre o embrulho].

BRICK: Fala pro Papai que estou aleijado.

PAPAI: Já vi que está. Quero saber como ficou aleijado.

MARGARET [usando táticas de distração]: Olha, olha, nossa, é um robe de


caxemira! [Ela levanta o robe pra todos verem].

MAE: Você parece surpresa, Maggie.

MARGARET: Nunca tinha visto um antes.

MAE: Que engraçado – Hah!

MARGARET [virando-se para ela ferozmente com um sorriso brilhante]: Que tem de
engraçado? Tudo que minha família tinha era a família – e luxos com robes de caxemira
ainda me surpreendem.

PAPAI [ameaçador]: Cala a boca!


MAE [desatenta na sua fúria]: Não sei como está tão surpresa se foi você mesma quem
comprou na Loewenstein’s em Memphis sábado passado. Sabe como eu sei?

PAPAI: Eu disse pra calar a boca.

MAE: -Eu sei porque a moça que vendeu pra você me atendeu e falou: “Ah, Mrs.
Pollitt, sua cunhada acabou de comprar um robe de caxemira pro seu sogro!

MARGARET: Irmã! Você está desperdiçando seu talento como como mãe e dona de
casa. Você devia ser agente do FBI ou...

PAPAI: QUIETAS! [Os reflexos do Reverendo Tooker são mais lentos que os dos
outros. Ele conclui uma frase depois do urro].

REVERENDO TOOKER [Para Doutor Baugh]: -o Stork e o Reaper estão correndo


pescoço a pescoço! [Ele começa a rir alegremente ao perceber o silêncio e o olhar
penetrante de Papai. Seu riso morre falsamente].

PAPAI: Orador, espero não estar me intrometendo em mais uma conversa sobre janelas
de vidro colorido de memorial, estou, Orador? [Reverendo Tooker ri frágil, depois tosse
seco no silêncio constrangedor]. Reverendo?

MAMÃE: Papai, para de atormentar o Reverendo!

PAPAI [Levantando a voz]: Já ouviu aquela expressão “Fala muito e não faz nada”?
você me faz lembrar dessa expressão com essa tosse seca, fala muito e não faz nada... [A
pausa é quebrada somente por uma risada curta espantada de Margaret, a única lá
consciente e que se diverte com o grotesco].

MAE [Levantando os braços e retinindo os braceletes]: Será que os mosquitos estão


trabalhando hoje à noite?

PAPAI: O que foi, Mamãezinha? Fez algum comentário?

MAE: Fiz, estava perguntando será que os mosquitos vão nos comer vivos se formos
pra varanda um pouco.

PAPAI: Bom, se comerem, vou usar seus ossos como fertilizante!

MAMÃE [rapidamente]: Semana passada um avião pulverizou a região e acho que deu
resultado, pelo menos não tive...

PAPAI [cortando a fala dela]: Brick, me contaram, se é que é verdade, que você
estava saltando ontem à noite na pista do colégio.

MAMÃE: Brick, Papai está falando com você, filho.

BRICK [sorriso vagamente sobre a bebida]: O que foi, Papai?

PAPAI: Disseram que você estava saltando na pista de atletismo da escola ontem à
noite
BRICK: Foi o que me disseram também,

PAPAI: Você estava pulando ou trepando lá? O que você estava fazendo lá às três da
manha, deitando com uma mulher na pista?

MAMÃE: Papai, agora você passou dos limites e não vou desculpar você falando
coisas-

PAPAI: Cala a boca!

MAMÃE –indecentes na frente do Reverendo e-

PAPAI: CALA A BOCA! –Te pergunto, Brick, se você tava dando um tiro na coruja
ontem à noite lá na pista. Pensei que talvez estivesse ca;ando perseguida e trope;ou em
alguma coisa no calor da corrida – foi isso? [Gooper ri alto e falso, outros
nervosamente o seguem. Mamãe bate o pé e cerra os l[abios, cruzando até Mae e
sussura alguma coisa para ela enquanto Brick encontra o olhar duro, concentrado com
um riso for;ado do pai com um sorriso lento e vago que ele oferece a todas as
situa;’oes detr[as da cortina da bebida].

BRICK: Não, senhor, acho que não...

MAE [ao mesmo tempo, doce]: Reverendo Tooker, vamos dar uma volta na varanda.
[Ela e o Reverendo saem para a sacada enquanto Papai diz].

PAPAI: Que diabos então você tava fazendo lá às três da manhã?

BRICK: Saltando obstáculos, Papai, correndo e saltando obstáculos, mas os obstáculos


altos ficaram muito altos pra mim agora.

PAPAI: Por que estava bêbado?

BRICK [seu sorriso vago se desmancha um pouco]: Sóbrio eu não teria tentado saltar
nem os baixos...

MAMÃE [rapidamente]: Papai, apaga as velas no bolo.

MARGARET [ao mesmo tempo]: Quero propor um brinde ao Papai pelo seu
aniversário de sessenta e cinco anos, o maior plantador de algodão em-

PAPAI [urrando com fúria e nojo]: Já disse para vocês pararem com isso, agora
chega, chega-!

MAM’AE [se aproximando de Papai com o bolo]: Papai, não permito que você fale
assim nem mesmo no seu aniversário, eu-

PAPAI – Vou falar do jeito que eu quiser no meu aniversário, Ida, ou qualquer outro
inferno de dia do ano e quem não gostar já sabe o que fazer!

MAMÃE: Você não está falando sério!

PAPAI: Por que não? [Neste meio tempo vários sinais discretos foram trocados e
Gooper também saiu para a sacada].
MAMÃE: Eu sei que não está.

PAPAI: Você não sabe de inferno nenhum e nunca soube!

MAMÃE: Papai, você não quis dizer isso.

PAPAI: Ah, quis sim. Falo sério! Aguentei um monte de merda aqui porque pensei que
ia morrer. E você também pensou que eu ia morrer e começou a assumir o controle de
tudo. Bom, pode parar de controlar tudo, Ida, porque não vou morrer. Pode parar agora
com este negócio de tomar posse de tudo porque não vai e eu não vou morrer. Fui
examinado pelo laboratório e passei pela operação exploratória e não tem nada errado
comigo a não ser o cólon espástico. E não vou morrer de câncer como você pensou. Não
é? Você não achou que eu ia morrer de câncer, Ida? [Quase todos saem para sacada, os
dois velhos ficam se olhando através do bolo iluminado. O peito de Mamãe arqeuja e
ela pressiona um punho fechado na boca. Papai continua, rouco]. Não foi assim, Ida?
Você não achou que eu ia morrer de câncer e agora ia tomar posse deste lugar e de tudo?
Tive essa impressão, parece que tive essa impressão. Sua voz alta em tudo quanto é
lugar, seu corpo velho e gordo se intrometendo em tudo quanto é lado.

MAMÃE: Chega! Olha o Reverendo!

PAPAI: Foda-se o diabo do Reverendo! [Mamãe arqueja alto e senta-se no sofá que é
quase muito pequeno para ela]. Ouviu o que eu disse? Eu disse foda- se o reverendo!
[Alguém fecha as portas da sacada de fora exatamente quando fogos de artifício e
gritos agitados das crianças são ouvidos].

MAMÃE: Nunca vi você assim antes e não sei o que deu em você!

PAPAI: Passei por todos aqueles exames e pela operação só para saber quem é o chefe
aqui, eu ou você! Bom, agora sabemos que sou eu, não você – e esse é meu presente de
aniversário – e meu bolo e champagne! – por que nos últimos três anos você vem aos
poucos tomando posse de tudo. Mandando. Falando. Rebolando seu corpo velho e
gordo por esta casa que eu construí! Eu construí essa casa! Fui capataz na plantação do
velho Straw e do Ochello. Saí da escola com dez anos! Tinha dez anos quando larguei a
escola e fui trabalhar feito um negro nos campos. Cheguei a capataz da plantação do
Straw e do Ochello. O velho Straw morreu e fiquei sócio do Ochello e a fazenda cresceu
e cresceu e cresceu e cresceu! Fiz tudo sozinho sem inferno nenhum de ajuda sua e
agora você acha que está prestes a tomar posse de tudo. Bom, te digo que você não vai
tomar posse, você não vai tomar posse de inferno nenhum. Está claro, Ida? Está muito
claro pra você agora? Entendeu bem? Fiz exames de A a Z no laboratório. Fizeram o
inferno da operação de exploração não tenho nada de errado a não ser o colos espástico
– ficou espástico, acho que de desgosto! Por causa de todas os demônios de mentiras e
mentirosos que tive que aguentar e todo inferno de hipocrisia que vivi nesses quarenta
anos que estamos juntos. Ei, Ida!! Apague as velas do bolo de aniversário! Aperta os
lábios respira fundo e sopre o inferno das velas no bolo!

MAMÃE: Ah, Papai! Ah, Papai!

PAPAI: Qual o problema?

MAMÃE: Nesses anos todos você nunca acreditou que eu amei você?
PAPAI: Huh?

MAMÃE: Mas amei, amei muito, amei de verdade! –Papai, amei até seu ódio e sua
grossura. [Ela soluça e corre desajeitada para sacada].

PAPAI [para si]: Não seria engraçado se fosse verdade... [Pausa seguida das luzes no
céu dos fogos de artificio]. Brick! Ei, BRICK! [Ele fica em pé em frente ao bolo de
aniversário iluminado. Depois de alguns segundos, Brick volta mancando com a
muleta, segurando o copo. Margaret o segue com um sorriso ansioso e brilhante]. Não
chamei você, Margaret. Chamei o Brick.

MARGARET: Só so vim trazê-lo pra você. [Ela beija Brick na boca que
imediatamente limpa com a mão. Ela sai graciosa como uma garotinha. Brick e o pai
ficam sozinhos].

PAPAI: Por que fez isso?

BRICK: O que?

PAPAI: Limpou o beijo dela da boca como se ela tivesse cuspido em você.

BRICK: Não sei. Nem percebi.

PAPAI: Sua mulher é mais bonita do que a do Gooper, mas de um jeito ou de outro elas
se parecem.

BRICK: Se parecem em que, Papai?

PAPAI: Não se explicar, mas se parecem.

BRICK: Elas não parecem muito calmas, não é?

PAPAI: Não, claro que não.

BRICK: Parecem nervosas como gatas?

PAPAI: Isso mesmo, parecem nervosas como gatas.

BRICK: Nervosas como duas gatas num telhado de zinco quente?

PAPAI: Isso mesmo, filho, elas parecem duas gatas num telhado de zinco quente.
Engraçado é que você e o Gooper são tão diferentes e escolheram o mesmo tipo de
mulher.

BRICK: Nos casamos na sociedade, Papai.

PAPAI: Merda... O que seré que deixa as duas daquele jeito?

BRICK: Bom, elas estão sentadas no meio de uma grande pedaço de terra, Papai, vinte
e oito mil acres é um pedaço de terra muito grande e elas estão brigando por causa
disso, cada uma determinada a pegar um pedaço maior do que a outra, assim que você
deixar.
PAPAI: Tenho uma surpresa pra essas mulhres. Não vou deixar tão cedo se é isso que
estão esperando.

BRICK: Está certo, Papai. Senta e deixa as duas arranharem o olho uma da outra...

PAPAI: Pode apostar sua vida que vou sentar e esperar as duas filhas da puta
arranharem o olho uma da outra, ha-ha-ha... Mas a mulher do Gooper é boa parideira,
você tem que admitir que ela é fertil. Inferno, no jantar hoje à noite ela colocou todos na
mesa e tiveram que aumentar a mesa pra arrumar espaço para eles. Ela tem cinco e está
esperando outro.

BRICK: O sexto está chegando.

PAPAI: Seis, inferno, ela provavelmente vai parir uma ninhada da próxima vez. Brick,
sabe, juro por Deus, não sei como isso acontece.

BRICK: Como acontece o que, Papai?

PAPAI: Você compra uma terra, do jeito que for, e as coisas começam a crescer nela, as
coisas começam a acumular e a primeira coisa que você percebe é que tudo está
completamente fora de controle, completamente fora de controle.

BRICK: Bem, dizem que a natureza detesta o vazio, Papai.

PAPAI: Pode ser, mas às vezes acho que o vazio é bem melhor do que as coisas que a
natureza coloca no lugar. Tem alguem lá na porta?

GOOPER: Ei Mae.

BRICK: Tem.

PAPAI: Quem? [abaixou a voz].

BRICK: Alguém interessado na nossa conversa.

PAPAI: Gooper? – GOOPER!... [depois de uma pausa discreta, Mae aparece na porta
da sacada].

MAE: Chamou o Gooper, Papai?

PAPAI: Ah, era você!

MAE: Quer falar com o Gooper, Papai?

PAPAI: Não, e nem com você. Quero um pouco de privacidade aqui, enquanto tenha
uma conversa confidencial com meu filho Brick. Está muito quente aqui pra fechar as
portas, mas se tiver que fechar essas portas de merda pra ter uma conversa particular
com meu filho Brick eu vou fechar. Porque odeio bisbilhoteiro. Não suporto gente
sorrateira e bisbilhoteira.

MAE: Ora, Papai-

PAPAI: Você ficou do lado errado da lua e a sua sombra apareceu!


MAE: Eu só estava-

PAPAI: Estava fazendo nada a não ser espionar e sabe disso!

MAE [começa a fungar e chorar]: Ah, Papai, por algum motivo você é tão cruel com
as pessoas que realmente amam você.

PAPAI: Cala a boca, cala a boca, cala a boca! Vou tirar você e o Gooper do quarto ao
lado desse! Não é da conta de vocês o que acontece aqui à noite entre o Brick e a
Maggie. Vocês ficam ouvindo à noite pelo buraco da fechadura como dois espiões de
bosta e passam um relatório de tudo que ouviram pra Mamãe e ela vem e me conta e diz
que eles falaram isso, isso e aquilo aquilo, sobre o que ouviram da conversa do Brick e
da Maggie e, Jesus, isso me deixa doente. Vou mudar você e o Gooper daquele quarto.
Não suporto gente sorrateira e bisbilhoteira, me dá nojo [Mae joga a cabeça pro céu e
rola os olhos para o céu e estende os braços como que invocando a piedade de Deus
por este martírio injusto. Depois esfrega o nariz com um lenço e sai do quarto com um
zunido alto da saia].

BRICK [agora no bar]: Eles ouvem, não é?

PAPAI: Ouvem. Ouvem e passam relatório para Mamãe sobre o que acontece aqui entre
você e Maggie. Dizem que- [Para como que envergonhado] – você não dorme com ela,
que você dorme no sofá. É verdade ou não? Se não gosta da Maggie, se livra dela! -O
que ta fazendo agora?

BRICK: Preparando meu drinque.

PAPAI: Filho, você sabe que está com problema de bebida?

BRICK: Sei, senhor, sei, sim.

PAPAI: Por isso parou de trabalhar com anúncio esportivo? Por causa da bebida?

BRICK: Sim, senhor, acho que foi [Ele sorri vaga e amigavelmente para o pai através
da sua bebida reabastecida].

PAPAI: Filho, não ache nada, isso é muito importante.

BRICK [vagamente]: Sim, senhor.

PAPAI: E me escuta, para de olhar pro diabo do candelabro... [Pausa. A voz de Papai é
áspera]. Outra coisa que compramos numa liquidação de queima total na Europa.
[Outra pausa]. A vida é importante. Não tem nada mais pra se agarrar. Um homem que
bebe está jogando a vida fora. Não faça isso, agarre-se à vida. Não há nada mais para se
agarrar... Senta aqui pra gente não precisar levantar a voz. As paredes dessa casa têm
ouvidos.

BRICK [mancando para se sentar no sofá ao lado dele]: Está bem, Papai.

PAPAI: Para! Como começou? Alguma decepção?

BRICK: Não sei. Você sabe?


PAPAI: Estou te perguntando, inferno! Como diabos vou saber se você não sabe?

BRICK: Só sei que fui lá e descobri que estava com a boca cheia de algodão. Eu estava
sempre dois ou três tempos atrás do que estava acontecendo no campo e então eu-

PAPAI: Para!

BRICK [amigavelmente]: Certo, para.

PAPAI: Filho?

BRICK: Huh?

PAPAI [Inala o charuto alto e profundamente, depois se curva repentinamente um


pouco para frente, exalando alto e levando a mão à testa] –Ufa! –Ha ha! Traguei muita
fumaça, fiquei meio tonto... [O relógio da lareira bate]. Por que e tão difícil para as
pessoas falarem?

BRICK: É... [O relógio continua batendo suavemente até completar as dez batidas].
–Barulho bom do relógio de paz. Gosto de ficar ouvindo a noite toda. [Ele afunda
confortavelmente no sofá. Papal fica sentado ereto e rígido com uma ansiedade não
falada. Seus gestos são tensos e espasmódicos quando fala. Ele resfolega e arfa e funga
durante sua fala nervosa, olhando rápida e timidamente de vez em quando para o
filho].

PAPAI: Compramos esse relógio no verão em que fomos pra Europa, eu e Mamãe
naquela maldita excursão do Cook, nunca tive tanto desgosto na minha vida, te digo,
filho. Aqueles asiáticos lá, arrancam os olhos da cara naqueles hoteis enormes. E
Mamãe comprou mais coisas do que dá para carregar em dois vagões, isso não é
mentira. Todo lugar que ela foi nessa viagem furacão ela comprava, comprava e
comprava. Ora, metade do que ela comprou ainda está encaixotada no porão, embaixo
da água na primavera passada. [Ele ri]. Aquela Europa não passa de um grande leilão,
só isso, aquele monte de lugares velhos e decadentes. É uma liquidação de queima total,
a merda toda, e Mamãe ficou louca, ora, você não conseguia segurar aquela mulher nem
com rédea de mula! Comprava, comprava, comprava! – Sorte eu ser rico, sim senhor,
Bob, e metade daquela porcaria está mofando no porão. Sorte eu ser rico, sorte mesmo,
bom, sou rico, Brick, é, sou um homem rico. [Seus olhos brilham por um momento].
Sabe quanto eu tenho? Adivinha, Brick! Adivinha! Adivinha quanto eu tenho! [Brick
sorri vagamente diante da bebida]. Perto de dez milhões em dinheiro e ações, sem
contar, adivinha, vinte e oito mil acres da terra mais rica desse lado do vale Nilo! Mas
um homem não pode comprar a vida com esse dinheiro, não pode comprar a vida de
volta quando ela passou, isso é uma coisa que não se oferece na queima total da Europa
ou nos mercados americanos ou em qualquer mercado no mundo. Um homem não pode
comprar sua vida com dinheiro, não pode comprar a vida quando ela já acabou... É um
pensamento sério, um pensamento muito sério e foi este pensamento que ficou
martelando na minha cabeça, martelando, martelando, martelando – até hoje... Fiquei
mais sábio e mais triste, Brick, depois desta do que passei. Há outra coisa que me
lembro da Europa.

BRICK: O que, Papai?

PAPAI: As colinas ao redor de Barcelona na Espanha e as crianças correndo descaças


naquelas colinas nuas, mendigando como cachorros famintos, uivando e chiando, e
como os padres são gordos nas ruas de Barcelona, muitos deles e tão gordos e tão
simpáticos, ha-ha! - Sabe que eu podia alimentar aquele país? Tenho dinheiro suficiente
pra alimentar aquele inferno de país, mas o animal humano é uma besta egoísta e não
acho que o dinheiro que dei praquelas crianças uivantes nas colinas ao redor de
Barcelona ia dar pra forrar as cadeiras deste quarto, quer dizer pagar para colocar forro
novo nesta cadeira! Inferno, eu jogava dinheiro pra eles como se joga milho pras
galinhas, jogava dinheiro só pra me livrar deles tempo suficiente pra voltar pro carro e –
ir embora... E depois no Marrocos, aqueles árabes, ora, me lembro um dia em
Marraquesh, aquela velha cidade árabe cercada por muros, me sentei num muro
guebrado pra fumar um charuto, estava quente de dar medo lá uma árabe ficou em pé
na estrada me olhando até eu ficar sem graça. Ela ficou parada ainda na estrada quente
cheia de poeira e olhou para mim até eu ficar sem graça. Mas escuta. Ela estava com
uma criança nua, uma menininha nua, mal conseguia andar, e depois de um tempo ela
sentou a criança no chão e deu um empurrão e sussurrou uma coisa para ela. Ela veio
até mim, mal conseguia andar, veio cambaleando até mim e- Jesus, me dá nojo lembrar
uma coisa dessa! Ela esticou a mão e tentou desabotoar minha calça! Aquela criança
não tinha cinco anos ainda! Acredita? Ou acha que estou inventando? Voltei pro hotel e
disse pra Mamãe: “Arruma as malas! Vamos sumir desse país...”

BRICK: Papai, você está falando muito hoje à noite.

PAPAI [ignorandoo comentário]: Sim, senhor, é assim, o animal humano é uma besta
que morre, mas o fato de estar morrendo não o faz sentir pena dos outros, não, senhor,
é- Você falou alguma coisa?

BRICK: Falei.

PAPAI: O que?

BRICK: Me passa a muleta pra eu levantar.

PAPAI: Onde você vai?

BRICK: Vou dar uma passadinha no Echo Spring. [Dá a muleta pra Brick].

PAPAI: Onde?

BRICK: O bar...

PAPAI: Sim, senhor, rapaz- [Ele entrega a muleta para o Brick].

PAPAI: - o animal humano é uma besta que morre se tiver dinheiro ele compra,
compra e compra e acho que compra tudo que pode por que no fundo da consciência
ele tem a esperança maluca de que uma dessas compras vai durar para sempre! - Que
nunca acontece... O animal humano é uma besta que-

BRICK: Papai, você hoje está com a língua solta [Pausa e vozes são ouvidas lá fora].

PAPAI: Fiquei calado por aqui ultimamente, não disse uma palavra, só sentado,
olhando pro nada. Tinha uma coisa pesada na minha cabeça, mas hoje tirei aquele
fardo. Por isso estou falando. – O céu esté diferente pra mim.
BRICK: Sabe o que mais gosto de ouvir?

PAPAI: O que?

BRICK: O silêncio sólido. Silêncio perfeito contínuo.

PAPAI: Por que?

BRICK: Por que traz mais paz.

PAPAI: Rapaz, você vai ouvir muito silêncio no túmulo. [Ele ri consentindo].

BRICK: Terminou de falar comigo?

PAPAI: Por que quer tanto que eu cale a boca?

BRICK: Bom, senhor, o senhor sempre me diz: “Brick, quero falar com você, mas
quando a gente conversa, a coisa não acontece. Nada é dito. Você se senta na cadeira e
fala isso e aquilo e parece que estou ouvindo, mas não estou, não muito. A comunicação
entre as pessoas é... terrivelmente difícil... e de alguma forma entre nós dois, ela
simplesmente não – acontece.

PAPAI: Já sentiu medo? Quer dizer já sentiu terror completo de uma cois?
[Levanta-se]. Um minuto. [Ele desvia o olhar como se fosse contar um segredo
importante]. Brick?

BRICK: O que?

PAPAI: Filho, eu pensei que tinha!

BRICK: Tinha o que? Tinha o que, Papai?


PAPAI: Câncer.

BRICK: Ah...

PAPAI: Achei que o velho feito de osso tivesse colocado a mão pesada e fria dele no
meu ombro.

BRICK: Bom, Papai, você nunca falou nisso.

PAPAI: Um porco guincha. Um homem fecha a boca sobre isso apesar do homem não
ter a vantagem do porco.

BRICK: Que vantagem?

PAPAI: Ignorância - da mortalidade – é um conforto. Um homem não tem esse


conforto, ele é o unico ser vivo que tem ideia da morte, que sabe o que é. Os outros
passam a vida sem saber, que é e o que devia acontecer a toda criatura viva, passar a
vida sem saber, sem ter conhecimento disso e ainda assim um porco guincha, mas um
homem às vezes mantém a boca fecha sobre o assunto. Às vezes ele- [Há uma profunda
ferocidade ardente no velho]. – mantém a boca fechada sobre o assunto. Me pergunto
se-
BRICK: O que, Papai?

PAPAI: Um copo de uísque vai piorar minha convulsão?

BRICK: Não, senhor, vai ser bom.

PAPAI [de repente sorri, ferozmente]: Jesus, nem te conto! O céu está aberto! Jesus,
está aberto de novo, está aberto, rapaz, está aberto. [Brick olha sua bebida].

BRICK: Está melhor, Papai?

PAPAI: Melhor? Diabo! Estou respirando. Minha vida inteira eu fiquei com os punhos
cerrados... [Serve uma bebida] -batendo, estraçalhando, derrubando! - agora vou relaxar
esses punhos cerrados e tocar as coisas delicadamente com as mãos... [Ele estica as
mãos como se acarinhasse o ar]. Sabe no que estou pensando?

BRICK [vagamente] Não, senhor. No que está pensando?

PAPAI: Ha ha! Prazer! – prazer com as mulheres. [O sorriso de Brick relutantemente


se desmancha um pouco]. É, garoto. Vou te contar uma coisa que você não consegue
adivinhar. Ainda sinto desejo por mulher e estou fazendo sessenta e cinco anos.

BRICK: Acho isso extraordinário, Papai.

PAPAI: Extraordinário?

BRICK: Extraordinário, Papai.

PAPAI: Tem razão, extraordiário e admirável, as duas coisas. Agora percebo que nunca
tive o suficiente. Deixei muitas oportunidades escaparem por escrúpulos, convenção –
merda... Tudo isso é bobagem! - Foi preciso a sombra da morte para me fazer ver isso.
Agora que a sombra se foi, vou relaxar e, como eles chamam, transar.

BRICK: Transar, hein?

PAPAI: Isso mesmo, transar, transar. Inferno! - Dormi com Mamãe, vamos ver, até
cinco anos atrás, até os sessenta anos e ela cinquenta e oito e nunca gostei dela, nunca.
[O telefone toca no corredor. Mamãe entra, exclamando]:

MAMÃE: Vocês dois não estão ouvindo o telefone tocar? Eu ouvi lá da varanda.

PAPAI: Tem cinco cômodos na sacada da frente pra você passar. Por que passa por
aqui? [Mamãe faz uma cara engraçada enquanto sai rapidamente pela porta do
corredor] Hunh! – Ora, quando Mamãe sai de um cômodo, nem me lembro de como ela
é–

MAMÃE: Alô.

PAPAI: - Mas quando ela retorna, garoto, então eu vejo com o que ela é e preferia não
ver. [Curva-se de rir com a piada até sentir dor na barriga e endireita-se com uma
careta. O riso acalma-se até um risinho enquanto ele coloca o copo de bebida na mesa
desconfiado].
MAMÃE: Alô, Miss Sally. [Brick se levanta e manca até as portas da sacada].

PAPAI: Ei! Onde vai?

BRICK: Lá fora para respirar.

PAPAI: Ainda, não. Fica aqui até a gente acabar essa conversa, mocinho.

BRICK: Achei que já tinha acabado, Papai.

PAPAI: Nem começou.

BRICK: Me enganei. Desculpa. Só queria sentir a brisa do rio.

PAPAI: Senta de novo naquela cadeira. [Mamãe eleva a voz, cobrindo o corredor].

MAMÃE - Miss Sally, você é uma figura! Você é engraçada, Missa Sally.

PAPAI: Jesus, ela está conversando com a minha irmã solteirona de novo.

MAMÃE: Por que não me dá a chance de explicar.

PAPAI: Brick, esse troço está me queimando.

MAMÃE - Então, até logo, Miss Sally. Vem aqui logo que puder. Papai está morrendo
de vontade de te ver.

PAPAI: Merda.

MAMÃE: Issooo, tchau, Miss Sally. [Ela desliga e urra de alegria. Papai resmunga e
tapa os ouvidos enquanto quando ela se aproxima. Surpreendendo-o]. Papai, era sua
irmã ligando de Memphis de novo. Sabe o que ela fez, Papai? Ligou pro médico dela
em Memphis pra perguntar o que essa coisa espástica. Ha-HAAAAA! - E me ligou pra
contar como estava aliviada – Ei, me deixa entrar! [Papai esta segurando a porta meio
fechada contra ela].

PAPAI: Não deixo, não. Disse pra você não passar por esse quarto. Volta e passa pelos
outrs cinco quartos.

MAMÃE: Papai? Papai? Ah, Papai! - Você não falou sério quando me disse aquelas
coisas, né? [Ele fecha a porta firmemente contra ela, mas ela continua a chamar].
Querido? Querido? Papai? Você não falou s[erio quando disse aquelas coisas horriveis,
ne? - Eu sei que não. Eu sei que não falou aquelas coisas do fundo do seu coração...
[Sua voz infantil esvanece num soluço e seus passos pesados recuam pelo corredor.
Brick se levanta mais uma vez com sua muleta e caminha na direção da varanda
novamente].

PAPAI: Tudo que peço pra essa mulher é pra me deixar em paz. Mas ela não admite
que me dá nojo. Nojo de ter dormido com ela tantos anos. Devia ter parado muito antes,
mas essa velha nunca ficava satisfeita - e eu era bom de cama. Nunca devia ter gastado
tanta energia com ela... Dizem que você tem tantas e cada um tem um número. Bom,
sobraram poucas pra mim, poucas, e vou escolher uma boa pra gastar minha energia
com ela. Vou escolher a melhor pra mim, não importa quanto vai custar, vou cobri-la de
peçe – de vison! Ha ha! Vou deixá-la nua e cobrir de pele de vison e diamantes! Ha ha!
Vou arrancar a roupa dela e cobrir de diamantes e envolver com pele de vison e trepar
com ela do inferno até o café da manhã. Ha ha ha!

MAE [alegre na porta]: Quem está rindo ai?

GOOPER: É o Papai que está rindo?

PAPAI: Merda! – esses dois – chatos .. [Ele avança e toca o ombro de Brick] É, filho.
Brick, meu filho. – Estou – feliz! Estou feliz, filho, estou feliz! [Ele engasga um pouco e
morde o lábio inferior, pressionando a cabeça rápida e timidamente contra a cabeça do
filho e depois tosse de vergonha e caminha incerto até a mesa onde colocou o copo.
Bebe e faz uma careta como se o estômago queimasse. Brick suspira e se levanta com
dificuldade] Por que está tão inquieto? Está com formiga na calça?

BRICK: Sim, senhor...

PAPAI: Por que?

BRICK: - Uma coisa – não - aconteceu...

PAPAI: É? O que?

BRICK [triste]: - o estalo...

PAPAI: Estalo?

BRICK: É, estalo.

PAPAI: Que estalo?

BRICK: O estalo na cabeça que me deixa em paz.

PAPAI: Inferno, não estou entendendo nada do que você ta falando, mas estou ficando
preocupado.

BRICK: É só uma coisa mecânica.

PAPAI: O que?

BRICK: Esse estalo que tenho na cabçe que me deixa em paz. Tenho que beber até ter o
estalo. É só uma coisa mecânica como um – como – como um-

PAPAI: Como um-

BRICK: Botão que desliga na minha cabeça, apaga a luz quente e liga a noite fria e-
[Ele levanta o olhar, sorrindo triste] - de repente existe – paz.

PAPAI [assovio longo e suave de espanto. Ele volta até Brick e aperta os dois ombros
do filho]. Jesus! Não sabia que você estava tão mal. Ora, rapaz, você é um – alcoólatra.

BRICK: Verdade, Papai. Sou um alcóolatra.


PAPAI: Isso mostra até onde deixei as coisas chegarem!

BRICK: Tenho que ouvir esse estalinho na minha cabeça que me deixa em paz.
Normalmente, escuto muito mais rápido que hoje. Às vezes até o meio-dia até, mas –
hoje está – demorando - ainda não estou com o nível de álcool ideal no meu sangue.
[Sua última fala é dada com energia enquanto enquanto prepara mais uma bebida].

PAPAI: Uh-huh! A espera da morte me deixou cego. Não fazia ideia que um filho meu
tava virando bêbado debaixo do meu nariz.

BRICK [gentilmente]: Bom, Papai, agora sabe, a notícia vazou.

PAPAI: Uh-huh, [e, agora eu sei, a notícia – vazou.

BRICK: Então, se o senhor me der licença-

PAPAI: Não dou licença não.

BRICK: Melhor ficar sentado sozinho até ouvir o estalo na minha cabeça, é só uma
coisa mecânica, mas nãao acontece enquanto não fico sozinho ou conversando com
ninguém...

PAPAI: Você tem muito, muito tempo pra ficar sentado parado, rapaz, e conversar com
ninguém, mas agora está conversando comigo. Pelo menos estou conversando com
você. Você senta aí e escuta até eu dizer que a conversa acabou.

BRICK: Mas essa conversa é como todas as outras que já tivemos na vida. Não leva a
nada, lugar nenhum! – É – é – dolorosa, Papai...

PAPAI: Pois bem, que seja dolorosa, mas não saia dessa cadeira! – Vou tirar essa
muleta... [Ele pega a muleta e joga do outro lado do quarto].

BRICK: Eu consigo pular num pé e se eu cair, consigo me arrastar!

PAPAI: Se não tomar cuidado, vai se arrastar para fora dessa plantação e aí, por Deus,
vai ter que implorar sua bebida na Skid Row.

BRICK: Pode acontecer, Papai.

PAPAI: Não, não vai. Você é meu filho e vou endireitar você. Agora que me endireitei,
vou endireitar você.

BRICK: É?

PAPAI: O laudo chegou hoje da Clínica Ochsner. Sabe o que me disseram? [Seu rosto
se ilumina em triunfo]. A única coisa que detectaram com todos os instrumentos da
ciência naquele excelente hospital é uma condição espástica do cólon. E os nervos em
frangalhos de toda aquela preocupação. [Uma garotinha irrompe no quarto com uma
vela incandescente em cada mão, pula e guincha como um macaco enlouquecido e sai
correndo novamente quando Papai bate nela. Silêncio. Os dois se fitam. Uma mulher ri
alegre lá fora]. Quero que saiba que dei um suspiro de alívio quase tão forte como
tomado Vicksburg! [Há uma risada lá fora, passos correndo, o som e luz suaves e
extravagantes dos rojões explodindo. Brick o fita sobriamente por um longo tempo,
depois faz uma espécie de som de surpresa nas narinas e levanta-se de repente em um
pé e pula pelo quarto para pegar a muleta, balançando-se nos móveis para apoio. Ele
pega a muleta e foge como que horrorizado para a sacada. Seu pai o agarra pela
manga do pijama de seda branco]. Fica aqui, seu filho da puta! Até eu falar pra ir.

BRICK: Não posso.

PAPAI: Vai ficar sim, inferno.

BRICK: Não, não posso. A gente fala, você fala, em – círculos! A gente não chega a
lugar nenhum, lugar nenhum. É sempre a mesma coisa, você diz que quer falar comigo
e não tem porra nenhuma pra me dizer.

PAPAI: Nada pra dizer quando estou dizendo que vou viver quando pensei que estava
morrendo?!?

BRICK: Ah – isso!. –É isso que você tem pra me dizer?

PAPAI: Ora, seu filho da puta! Isso não – é importante?

BRICK: Bom, você disse, está dito, e agora eu-

PAPAI: Agora senta de novo.

BRICK: Você está todo confuso, você...

PAPAI: Não estou confuso!

BRICK: Está, está todo confuso.

PAPAI: Não diga como estou, seu filhote bêbado! Vou rasgar a manga desse casaco se
você não sentar!

BRICK: Papai-

PAPAI: Faz o que eu mandei. Sou o chefe aqui agora! Saiba que voltei para o banco do
motorista agora. [Mamãe entra correndo, segurando o peito fervilhante].

MAMÃE: Papai!

PAPAI: Que inferno você quer aqui, Mamãe?

MAMÃE: Ah, Papai! Por que está gritando assim? Não agueeeeeeento – isso...

PAPAI [levantando a costa da mão acima da cabeça]: SAI – DAQUI! [Ela sai
correndo, chorando].

BRICK [suave e triste] Cristo...

PAPAI [feroz]: É! Cristo! – está certo... [Brick se solta e manca até a sacada. Papai
puxa a muleta debaixo de Brick e ele pisa com tornozelo machucado. Ele dá um grito
sibilante de angústia, pega um cadeira e puxa sobre ele no chão]: Filho de uma – leitoa
roliça gorda...
BRICK: Papai! Me dá a muleta. [Papai joga a muleta longe do alcance] Me dá essa
muleta, Papai.

PAPAI: Por que você bebe?

BRICK: Não sei, me dá minha muleta!

PAPAI: Melhor pensar porque bebe ou parar de beber.

BRICK: Pode me dar minha muleta pra eu levantar do chão.

PAPAI: Primeiro responde minha pergunta. Por que você bebe? Por que está jogando a
vida fora, rapaz, como uma coisa nojenta que você pegou na rua?

BRICK [ficando de joelhos]? Papai, está doendo. Eu pisei com esse pé.

PAPAI: Ótimo! Estou contente que n’ao esteja muito entorpecido pela bebida para
sentir um pouco de dor!

BRICK: Você – derramou minha – bebida...

PAPAI: Vou fazer um trato com você. Me diz porque bebe e preparo uma. Eu mesmo
preparo e dou pra você.

BRICK: Por que eu bebo?

PAPAI: É! Por que?

BRICK: Me dá uma bebida e eu digo.

PAPAI: Fala antes!

BRICK: Digo em uma palavra.

PAPAI: Qual?

BRICK: NOJO! [O relógio bate suave e docemente. Papai olha rapidamente


horrorizado] E a minha bebida?

PAPAI: Tem nojo do que? Primeiro tem que me dizer. Do contrário, isso não faz
sentido nenhum.

BRICK: Me dá muleta.

PAPAI: Você ouviu. Tem que responder primeiro.

BRICK: Já disse. Pra matar meu nojo.

PAPAI: NOJO DO QUE?

BRICK: Você fez um trato difícil.


PAPAI: Você tem nojo do que? Aí dou a bebida.

BRICK: Consigo pular num pé e se eu cair, posso me arrastar.

PAPAI: Você precisa tanto assim?

BRICK [se arrastando para subir na cama, segurando na cabeceira]: É, assim.

PAPAI: Se eu te der a bebida, você me diz do que tem nojo?

BRICK: Sim, senhor. Vou tentar. [O velho prepara uma bebida e passa solenemente a
ele. Silêncio enquanto Brick bebe]. Já ouviu a palavra desonestidade?

PAPAI: Claro. Desonestidade é uma palavra barata que políticos baratos gostam de se
acusar.

BRICK: Sabe o que significa?

PAPAI: Não quer dizer mentir e mentirosos?

BRICK: Sim, senhor, mentir e mentirosos.

PAPAI: Alguém está mentindo pra você?

CRIANÇAS [cantando em coro fora do palco]: Queremos o Papai! Queremos o Papai!


[Gooper aparece na porta da sacada].

GOOPER: Papai, as crianças estão chamando o senhor lá fora.

PAPAI [feroz]: Fora, Gooper!!!

GOOPER: Desculpa! [Papai bate a porta quando Gooper sai].

PAPAI: Quem está mentindo pra você? Margaret está mentindo pra você? Sua mulher
ta mentindo pra você, Brick?

BRICK: Ela não. Não teria importância.

PAPAI: Então quem está mentindo e sobre o que?

BRICK: Ninguém em particular e nenhuma mentira...

PAPAI: O que, então? O que, pelo amor de Deus?

BRICK: - A coisa toda, a coisa...

PAPAI: Por que está esfregando a cabeça? Está com dor de cabeça?

BRICK: Não, estou tentando-

PAPAI: -se concentrar, mas não consegue, por que a cabega está encharcada de bebida,
esse é o problema? Cérebro encharcado! [Ele arranca o copo da mão de Brick]. O que
você sabe sobre desonestidade? Inferno! Eu podia escrever um livro sobre isso. Sabia?
Podia escrever um livro e ainda não dava pra esgotar o assunto. Isso, eu podia, podia
escrever um maldito livro sobre falsidade e ainda não chegava perto de concluir o
assunto!! – Pense em todas as mentiras que tenho que aguentar! - Fingimentos! Isso não
é desonestidade? Ter que fingir coisas que você não acha, não sente, não faz a ideia do
que é. Por exemplo, fingir que gosto da Mamãe! - Não suporto ver, ouvir ou sentir o
cheiro dessa mulher há mais de quarenta anos! - mesmo quando eu deitava com ela!
Regular como um pistão... Fingir que amo esse filho da puta do Gooper e a mulher dele
Mae e aqueles cinco moleques infernizando como papagaios na floresta? Jesus. Não
consigo olhar pra eles! A igreja! Me enche o saco, mas eu vou! – Vou e fico sentado
escutando aquele pastor idiota, Clubes! – Elks! Maçonaria! Rotary! – merda! [Um
espasmo de dor faz com que ele aperte a barriga. Ele afunda em uma cadeira e sua voz
fica mais suave e mais rouca]. De você eu gosto muito por algum motivo, sempre tive
um tipo de sentimento por – afeto – respeito – é sempre... Você o meu sucesso como
fazendeiro são tudo que sempre tive devoção na minha vida toda! – Essa é a verdade...
Não sei por que, mas é. Sempre convivi com a desonestidade! – Por que você não pode?
Inferno, você tem que viver com ela, não existe mais nada para se conviver exceto a
desonestidade, existe?

BRICK: Sim, senhor. Sim senhor existe outra coisa com que a gente pode viver!

PAPAI: O que?

BRICK [levantando o copo] Isso! – bebida...

PAPAI: Isso não é viver, é jogar a vida fora.

BRICK: Eu quero jogar a minha fora.

PAPAI: Então porque não se mata, rapaz?

BRICK: Gosto de beber...

PAPAI: Ah, meu Deus, não consigo falar com você...

BRICK: Sinto muito, Papai.

PAPAI: Não mais do que eu. Vou te dizer uma coisa. Tempos atrás quando pensei que
meu tempo tinha acabado - [Esta fala deve ter um ritmo torrencial e fúria] – antes de
descobrir que era só este – cólon – espástico. Pensei em você. Eu devia ou não, se a
coisa desandasse, deixar essa fazenda pra você quando eu morrer – já que detesto o
Gooper e a Mae e sei que eles me odeiam e j[a que todos os cincos macaquinhos s’ao
miniaturas deles. -E eu pensei, não! – Depois eu pensei, sim! Não conseguia me decidir.
Odeio o Gooper e seus cinco macaquinhos e vagabunda da Mae! Por que eu deveria
deixar mais de vinte e oito mil acres da terra mais rica desse lado do Vale Nilo para
quem não [e da minha estirpe? – Mas por que diabos, por outro lado, Brick, eu devia
subsidiar a bebida de um maldito idiota? - gostando dele ou não, bom, até mesmo,
amando! - Por que devia fazer isso? Sustentar comportamento inútil? Podridão?
Corrupção?

BRICK [sorrindo]: Entendo.

PAPAI: Bom, se entende, você é mais esperto que eu, maldição, por que não entendo. E
te digo com sinceridade. Não me decidi absolutamente sobre esta questão e atá hoje não
fiz meu testamento! – Bom, agora não preciso fazer. A pressão acabou. Posso esperar
pra ver se você se endireita ou não.

BRICK: Está certo, Papai.

PAPAI: Você fala como se eu estivesse brincando.

BRICK: Não, senhor, sei que não está brincando.

PAPAI: Mas não se importa - ?

BRICK [pulando na direção da porta da sacada]: Não, senhor, não me importo. [Ele
fica em pé da porta da sacada enquanto o céu noturno fica rosa e verde e dourado com
sucessivos flashes de luz].

PAPAI: ESPERA! – Brick... [Sua voz abaixa. De repente há algo de tímido, quase
terno em seu gesto de contenção]. Não vamos – deixar assim, como as outras conversas
que tivemos, nós sempre – falamos de coisas, nós – só falávamos sobre as coisas por
algum motivo, não sei o que, sempre como se alguma coisa não fosse falada, fosse
evitada por que nenhum de nós dois foi honesto suficiente com o – outro...

BRICK: Nnunca menti para você, Papai.

PAPAI: Eu menti pra você alguma vez?

BRICK: Não, senhor...

PAPAI: Então pelo menos tem duas pessoas que nunca mentiram uma pra outra.

BRICK: Mas nunca falamos um com o outro.

PAPAI: Agora a gente pode.

BRICK: Papai, parece que não tem muito pra falar.

PAPAI: Você diz que bebe pra matar teu nojo da mentira.

BRICK: Você disse para te dar um motivo

PAPAI: Bebida é a única coisa que pode matar esse nojo?

BRICK: Agora é.

PAPAI: Mas antes não, né?

BRICK: Não quando eu ainda era jovem e acreditava nas coisas. Um bêbado é um
homem que quer esquecer que não é mais jovem e não acredita mais.

PAPAI: Acredita em que?

BRICK [teimosamente evasivo] Acredita...

PAPAI: Não sei que inferno você quer dizer com acreditar e acho que não sabe
também, mas se ainda tem o esporte no sangue, volte a ser comentarista esportivo e-

BRICK: Ficar sentado numa cabine de vidro vendo jogos que não posso jogar?
Descrevendo o que não posso fazer enquanto outros fazem? Tolerar o nojo e confusão
deles em disputas paa as quais não estou preparado? Bebendo meio bourbon com
coca-cola pra aguentar? Não funciona mais, não adianta - o tempo me ultrapassou,
Papai – chegou lá primeiro...

PAPAI: Acho que você jogando a culpa nos outros.

BRICK: Conhece muitos homens que bebem?

PAPAI [com um leve sorriso charmoso]? Conheci um bom número dessa espécie.

BRICK: Algum conseguiu dizer por que bebia?

PAPAI: Sim, você continua jogando a culpa em coisas como o tempo e nojo da
“desonestidade” e – merda! -Se você tiver que usar esse tipo de linguagem sobre uma
coisa, é pura conversa fiada, não acretido em nada.

BRICK: Eu tinha que dar um motivo pra conseguir uma bebida.

PAPAI: Você comecou a beber quando seu amigo Skipper morreu. [Silêncio durante 5
tempos. Depois Brick faz um movimento surpreso e pega a muleta].

BRICK: Está insinuando o que?

PAPAI: Não estou insinuando nada. [Brick esfrega e bate o pé no chão enquanto manca
rapidamente para longe da atenção grave e contínua do pai]. – Mas Gooper e a Mae
insinuaram que tinha uma coisa errad na sua -

BRICK [parando de repente no proscênio como que encurralado a uma parede]:


“Errada”?

PAPAI: Bom, não exatamente normal na sua amizade com-

BRICK: Eles insinuaram isso tamb[em? Achei que fosse insinua;’ao da Maggie. ]A
indiferen;a de Brick finalmente [e rompida. Seu cora;’ao est[a acelerado/ gotas de suor
na sua testa/ sua respira;’ao acelera e sua voz fica rouca. A coisa que eles est’ao
discutindo t[imida e dolorosamente por parte de Papai, feroz e violentamente por parte
de Brick, [e a coisa inadmiss[ivel que Skipper morreu para renegar entre eles. O fato de
que se ela existisse, tinha que ser negada para ~fazer face~ no mundo em que viviam,
pode estar no cora;’ao da ~desonestidade~ que Brick bebe para matar seu nojo. Pode
ser a raiz do seu colapso. Ou talvez seja somente uma manifesta;’ao [única dela, nem
mesmo a mais importante. O p[assaro que pretendo pegar no ninho desta pe;a n’ao [e a
solu;’ao do problema psicol[ogico de um homem. Estou tentando pegar a qualidade
verdadeira da experi”encia em um grupo de pessoas, aquela intera;’ao nublada,
tremeluzente, evanescente – ferozmente carregada! – de seres humanos vivos na nuvem
pesada de uma crise comum. Um pouco de mist[erio deve ser deixado na revela;’ao da
personagem em uma pe;a, assim como uma grande quantidade de mist[erio [e sempre
deixado na revela;’ao da personagem na vida, mesmo do pr[opria personagem consigo
mesma. Isto n’ao absolve o autor do seu dever de observar e investigar o mais claro e
profundo que ele legitimamente conseguir? Mas ele deve se afastar de conclus’oes
~superficiais~, defini;’oes med[iocres que tornam uma pe;a simplesmente uma pe;a,
n’ao uma armadilha de para a verdade da experi”encia humana. A cena a seguir deve
ser realizada com grande concentra;’ao, com a maior parte da energia presa, mas
palp[avel naquilo deixado sem falar\. De quem mais [e essa insinua;’ao, sua? Quem
mais pensou que eu e Skipper [éramos-

PAPAI [gentilmente]/ Calma aí, um minuto, meu filho. - Eu fui um vagabundo no meu
tempo.

BRICK: O que isso tem a ver com-

PAPAI: Eu disse “Espera!” Rodei, rodei este país até-

BRICK: Quem insinuou, quem mais?

PAPAI: Dormi em abrigos de vagabundo e pátios de manobra e albergues em todas as


antes de-

BRICK: Ah, você tambem acha, você me chama de filho e de bicha. Ah, foi por isso
que você botou Maggie e eu neste quarto que era do Jack Straw e do Peter Ochello,
onde aquelas duas tias velhas dormiam em cama de casal onde os dois morreram.

PAPAI: Agora para de jogar pedras- [De repente Reverendo Tooker aparece nas portas
da sacada e enfia a cabeça levemente, de modo brincalhão e tolo, com um sorriso
prático de clérigo, sincero como um chamado de pássaro soprado em um apito de
caçador, a corporificação viva da devota e convencional mentira. Papai arqueja um
pouco diante da sua aparição perfeitamente cronometrada, mas incongruente]. – Está
procurando o que, Pastor?

REVERENDO TOOKER: O banheiro masculino, ha há! – heh, heh...

PAPAI [com cortesia forçada]: -Volta e desce até o fim da sacada, Reverendo Tooker, e
use o banheiro que dá no meu quarto e se não conseguir encontrar, pergunta pra eles
onde é!

REVERENDO TOOKER: Ah, obrigado. [Ele sai com um sorrisinho de desculpa].

PAPAI: Difícil conversar nessa casa...

BRICK: Filho da- !

PAPAI [deixando muita coisa não dita]: Vi de tudo e entendi um bocado até 1910.
Jesus, o ano que - eu não tinha mais sapatos, tinha penhorado – saltava de trem de carga
perto da estrada, dormia em carro de algodão do lado de fora da usina – aí Jack e Peter
Ochello me chamaram. Me contrataram pra administrar este lugar que virou isso aqui. -
Quando Jack morreu – ora, o coitado do Peter Ochello parou de comer como cachorro
faz quando o dono morre e morreu também.

BRICK: Cristo!

PAPAI: Só estou dizendo que entendo...

BRICK [violentamente]: Skipper morreu e eu não parei de comer!


PAPAI: Não, mas começou a beber. [Brick gira sobre a muleta e joga o copo através do
quarto gritando].

BRICK: Você TAMBÉM ACHA? [Passos correndo na sacada. Ouve-se mulheres


chamando. Papai vai até a porta. Brick está transformado como se uma montanha
silenciosa de repente soprasse chama vulcânica].

BRICK: Você também acha isso? acha? acha que eu e Skipper fazia, - sodomia!
juntos?

PAPAI: Espera aí!!!

BRICK: É isso que você-

PAPAI: - um – minuto!

BRICK: Você acha que a gente fazia coisas sujas, Skipper e-

PAPAI: Por que está gritando assim? Por que está-

BRICK: -eu, é isos que pensa de Skipper, é isso-

PAPAI: - tão nervoso? Não acho nada, Não sei nada. Só estou dizendo que-

BRICK: Acha que Skipper e eu éramos dois velhos sujos?

PAPAI: Agora chega-

BRICK: Straw? Ochello? Um casal de-

PAPAI: Agora só-

BRICK: bichinhasViados? [E isso que você-

PAPAI: Psssiii.

BRICK: - acha? [Ele perde o equilfbrio e cai de joelhos sem perceber a dor. Segura na
cama e levanta se arrastando].

PAPAI: Jesus! – Segura minha mão.

BRICK: Não, não quero sua mão...

PAPAI: Mas eu quero a sua. Levanta! [Ele levanta o filho, põe um braço em volta dele
com preocupação e afeto]. Você está molhado de suor. Está suando como se tivesse
corrido-

BRICK [livrando-se do abraço do pai]: Eu estou chocado com você, Papai, você,
você- me espanta! Falando tão- [Afasta-se do pai] naturalmente! – sobre uma coisa
dessas – Não vê como a gente se sente com uma coisa assim? Como as pessoas têm
nojo dessas coisas? Ora, no Ole Miss quando descobriram que um membro da nossa
fraternidade, da minha e do Skipper, fez uma, tentou fazer uma coisa errada dessa- a
gente não só parou de falar com ele, como também mandamos ele sumir do campus, e
ele saiu, sumiu! – Foi embora pra - [Ele para ofegante].

PAPAI: Onde?

BRICK: África do Norte, última vez que fiquei sabendo.

PAPAI: Bom, estou voltando de muito mais longe que a África, acabei de retornar do
outro lado da lua, do país da morte, meu filho, e nada mais me surpreende com
facilidade. [Ele vem para o proscênio e olha para frente]. De alguma forma, sempre
vivi com muito muito espaço ao meu redor para me deixar infectar pelas ideias dos
utros. Uma coisa mais importante que algodão que você pode crescer num lugar grande
– é a tolerância – Cultivei tolerância. [Ele volta para Brick].

BRICK: Por que uma amizade excepcional, real, real, profunda, profunda, entre dois
homens não pode ser respeitada como uma coisa limpa e decente sem ser considerada-

PAPAI: Claro que pode, pelo amor de Deus, e é.

BRICK: Bichas... [Ao pronunciar esta palavra, nós podemos mensurar o alcance
profundo e amplo da moral convencional que ele recebeu do mundo que o coroou com o
louros precocemente].

PAPAI: Eu falei pra Mae e pro Gooper-

BRICK: Foda-se Mae e Gooper, foda-se todas as mentiras e os mentirosos! Skipper e


eu tínhamos uma coisa verdadeira e limpa - uma amizade limpa, durante quase toda
nossa vida, até Maggie cismar com essa ideia que o senhor ta falando. Normal? Não.
Era muito rara pra ser normal. Qualquer coisa verdadeira entre duas pessoas é muito
rara para ser normal. De vez em quando, ele colocava a mão no meu ombro ou eu
colocava a minha no dele, ou mesmo quando a gente viajava pelo país no campeonato
profissioal e dividíamos o mesmo quarto, a esticava as mãos entre as duas camas e dava
as mãos pra dizer boa noite, é, fizemos algumas vezes-

PAPAI: Brick, todo mundo acham isso normal!

BRICK: Bom, estão errados. Não era. Era puro e verdadeiro e isso não é normal.

MAE [Da coxia]: Papai, começaram os fogos. [Os dois se fitam durante um bom
tempo. A tensão se quebra e ambos se viram cansados].

PAPAI: É – é difícil – falar...

BRICK: Certo, então deixa – deixa pra lá...

PAPAI: Por que Skipper se destruiu? Por que você está se destruindo? [Brick olha para
seu pai novamente. Ele já se decidiu, sem saber que tomou esta decisão, que vai dizer
ao seu pai que está morrendo de câncer. Somente isso poderia empatar o placar entre
eles: uma coisa inadmissível pela outra].

BRICK [abominavelmente]: Certo. Você pediu, Papai. Finalmente vamos ter aquela
conversa verdadeira que você queria. Agora é tarde demais pra parar, agora temos que
continuar e falar tudo. [Manca até o bar] Uh-huh. [Abre o balde de gelo e pega o
pegador de prata com admiração do seu brilho gelado]. Maggie diz que Skipper e eu
fomos pro futebol profissional quando saímos do Ole Miss por que a gente tinha medo
de crescer... [Ele avança para o proscênio o arrastar e barulho de um aleijado com
muleta. Assim como Margaret fez quando sua fala se tornou “recitativa”, ele olha para
a casa, comandando sua atenção através do seu olhar direto e concentrado – uma
figura machucada “tragicamente elegante” contando tanto quanto sabe da “Verdade”]
– a gente queria – dando aqueles – passes longos, longos – e altos que não podiam ser
interceptados senão pelo tempo, o ataque aéreo que nos tornou famosos! E foi o
fizemos, conseguimos manter durante uma temporada, aquele ataque aéreo, bem alto”
É, mas – naquele verão Maggie me deu um ultimato, disse, é agora ou nunca e eu me
casei com ela.

PAPAI: Como era Maggie na cama?

BRICK: Ótima. A melhor. [Papai balança a cabeça como se pensasse assim]. Ela
pegou a estrada naquele outono com o Dixie Stars. Ah, ela deixou claro que era a pessoa
com melhor espírito esportivo do mundo. Vestia um – vestia um – chapéu alto de pele
de urso! É chamado de shako, um casaco de pele de toupeira tingido, uma casaco de
pele de toupeira tingido de vermelho! – uma palhaça maluca! Alugava salões de baile
dos hotéis pra comemorar as vitórias, nem cancelava quando – a gente perdia...
MAGGIE, A GATA! Ha-há! [Papai balança a cabeça]. Mas Skipper teve uma febre
que voltou e que nenhum médico conseguiu explicar e eu me machuquei – que acabou
virando um sombra no raio X – e um pouco de bursite... Fiquei na cama do hospital, via
nossos jogos na TV e vi a Maggie no banco perto do Skipper quando ele foi tirado do
jogo por erros e deixar cair a bola muitas vezes! Me ferveu o jeito que ela segurou no
braço dele! Sabe, acho que Maggie sempre se sentiu meio que desprezada nós dois
nunca conseguimos ser mais íntimos do que duas pessoas que conseguem na cama, o
que não é muito mais próximo do que dois gatos trepando no telhando... Aí, ela
aproveitou essa ocasião para fazer a cabeça do coitado do burro do Skipper. Ele era um
aluno abaixo da média no Ole Misscolegio, sabe, não é? - Ela encheu a cabeça dele com
a ideia suja e falsa que éramos, eu e ele, um caso frustrado igual das duas bichas que
viviam neste quarto, o Jack Straw e o Peter Ochello! – O pobre Skipper foi pra cama
com a Maggie pra provar que não era verdade e quando não conseguiu, ele achou que
era verdade - Skipper partiu ao meio como um graveto podre – ninguém caiu na
bebedeira tão rápido assim – ou morreu tão rápido de bebida... – Est[a satisfeito agora?

PAPAI: E você es[a satisfeito?

BRICK: Com o que?

PAPAI: Com essa est[oria mal contada.

BRICK: Que tem de mal contado a[i?

PAPAI: Tem alguma coisa faltando nessa hist[oria. O que você escondeu? [O telefone
toca no corredor].

GOOPER ]Na coxia\? Al”o. ]Como se isso o lembrasse de algo, Brick de repente olha
na dire;’ao do som e diz| .

BRICK: [E! – Esqueci de um interurbano que recebi do Skipper.

GOOPER? [E ele, pode falar.


BRICK? Onde ele b”ebado me confessou e eu desliguei.

GOOPER? N’ao.

BRICK? – Foi a [ultima vez que nos falamos...

GOOPER? N’ao senhor.

PAPAI: Você deve ter falado alguma coisa pra ele antes de desligar.

BRICK? O que eu poderia dizer?

PAPAI? Qualquer coisa. Alguma coisa.

BRICK? Nada.

PAPAI? S[o desligou?

BRICK: S[o desliguei.

PAPAI: Uh-huh, Bom, de qualquer jeito – chegamos na mentira que você tem tanto
nojo e por isso est[a bebendo pra matar o nojo, Brick. Você est[a culpando os outros.
Esse nojo com desonestidade [e nojo de você mesmo. Você! - cavou a cova do seu
amigo e jogou ele dentro! – antes de encarar a verdade com ele.

BRICK: A verdade dele, não a minha.

PAPAI: Que seja a dele! Mas você não encarou com ele.

BRICK: Quem consegue encarar a verdade? Você consegue?

PAPAI: Não passa a responsabilidade pros outros de novo, rapaz.

BRICK: E esses cumprimentos pelo aniversário, esses muitos e muitos anos de vida
quando todo mundo sabe que não vai acontecer exceto você! [Gooper que atendeu o
telefone no corredor, dá uma risada alta e esganiçada; ouve-se ele dizer: Não, não,
você entendeu errado! De cabeça pra baixo! Está louco? De repente Brick prende a
respiração ao perceber que fez uma revelação surpreendente. Manca alguns passos,
depois congela e sem olhar o rosto chocado do pai, diz: Vamos, vamos – lá fora – ver os
fogos. Vamos, Papai. [De repente Papai avança e agarra a muleta como se fosse uma
arma pela qual estavam brigando].

PAPAI: Ah, não, não! Ninguém vai sair. O que começou a dizer?

BRICK: Não me lembro.

PAPAI: “Muitos anos de vida que não vão acontecer”.

BRICK: Que inferno, Papai, esquece! Vamos pra sacada olhar os fogos estourando em
sua homenagem...

PAPAI: Primeiro termine o comentário que estava fazendo. “Muitos anos de vida que
não vão acontecer?” – Não foi o que disse?

BRICK: Olha aqui. Eu posso me locomover sem a muleta se for necessário, mas seria
muito melhor para a mobilia e para os vidros se eu não tivesse que ficar saltando como
Tarzan da-

PAPAI: TERMINA! O QUE ESTAVA DIZENDO! [Um brilho verde horripilante


aparece no céu atras dele].

BRICK [chupando o gelo do copo, a fala se torna difícil]: Deixa a fazenda pro Gooper,
pra Mae e pros cinco macaquinhos deles. Só quero é-

PAPAI: VOCÊ DISSE “DEIXAR A FAZENDA”?

BRICK [vagamente]: Todos os vinte e oito mil acres da terra mais rica deste lado do
vale Nilo.

PAPAI: Quem disse que “vou deixar a fazenda” pro Gooper ou pra quem quer que seja?
Estou fazendo sessenta e cinco anos! Vou viver mais quinze ou vinte. Você vai morrer
antes de mim! Vou enterrar você e ainda terei que pagar o caixão!

BRICK: Claro. Muitos anos de vida. Agora vamos olhar os fogos, vamos-

PAPAI: Será que estão mentindo? Sobre o diagnóstico – da clínica? Será que
encontraram – alguma coisa? - Câncer? Talvez?

BRICK: Vivemos no sistema da desonestidade. A bebida e a morte são as únicas


saídas... [Pega a muleta das mãos de Papai e sai para a varanda deixando as portas
abertas. Ouve-se a música “Pick a Bale of Cotton].

MAE [Aparecendo na porta]: Ah, Papai, os ajudantes de campo estão cantando pro
senhor!

BRICK: Desculpa, Papai. Minha cabeça não está boa e é dificil pra mim entender
como alguém pode se importar se vai viver, morrer ou estivessemorrendo ou se
importasse com qualquer coisa que não seja se ainda existe bebida na garra e aí eu disse
o que disse sem pensar. De várias maneiras não sou melhor que os outros, às vezes pior
por que estou menos vivo. Talvez eles mintam por que estão vivos e estar quase morto
me acidentalmente verdadeiro – não sei mas – de qualquer forma – somos amigos – e
amigos dizem a verdade um pro outro... [Pausa] Você me contou coisas! Eu contei
coisas!

PAPAl [devagar e com paixão]: CRISTO – MALDIÇÃO

GOOPER [Na coxia]: Solta ela! [Fogos na coxia da direita].

PAPAI: - TODOS - FILHOS DA PUTA – MENTIROSOS! [Ele se arruma e cruza até


a porta de dentro. Na porta e se vira e olha para trás como se tivesse uma pergunta
desesperada que não conseguisse colocar em palavras. Depois balança a cabeça
reflexivamente e diz com voz rouca]: Isso, todos mentirosos, todos mentirosos, malditos
mentirosos. [Isto é dito lentamente, lentamente, com uma repugnância feroz. Ele sai]. –
Mentira! Maldição! Mentirosos! [Brick permanece imóvel num canto enquanto cai e a
cortina fecha].
CORTINA

ATO III

Não há lapso de tempo. Papai é visto saindo como no fim do ATO II.

PAPAI: TODOS MENTINDO – ESTOU MORRENDO! MENTIROSOS!


MENTIROSOS! – MENTIROSOS! [Margaret entra].

MARGARET: Brick, que diabos está acontecendo aqui? [Dixie e Trixie entram pela
porta e ficam em volta de Margaret gritando. Mae entra da janela inferior da sacada].

MAE: Dixie, Trixie, parem com isso! [Gooper entra pela porta]. Gooper, por favor,
leva as crianças para cama agora!

GOOPER: Mae, viu Mamãe?

MAE: Ainda não [Gooper e as crianças saem pela porta. Reverendo Tooker entra pela
janela].

REVERENDO TOOKER: Estas crianças são tão cheias de vitalidade. Acho que vou
voltar pra cidade.

MAE: Ainda não, Pastor. Sabe que o consideramos um membro desta família, um dois
mais próximos e mais queridos, então tem que estar conosco quando Dr. Baugh contar a
verdade a Mamãe sobre o laudo da clínica.

MARGARET: Onde pensa que vai?

BRICK: Lá fora respirar.

MARGARET: Por que Papai estava gritando “Mentirosos”?

MAE: Papai foi pra cama, Brick?

GOOPER [Entrando]: Onde está a velha?

REVERENDO TOOKER: Vou procurar. [Ele sai para a sacada].

MAE: Não a encontrou, Gooper?

GOOPER: Ela está evitando essa conversa.

MAE: Acho que pressente alguma coisa.

MARGARET: Brick, eles vão contar pra Mamãe a verdade sobre Papai e ela vai
precisar de você.

DR. BAUGH: Vai ser doloroso.

MAE: Não dá pra evitar coisas dolorosas sempre.


REVERENDO TOOKER: Mamãe vem vindo.

GOOPER: Mamãe, vem aqui.

MAE: Cala a boca, Gooper, não grita.

MAMÃE [Entrando]: Muito fumaça dos fogos meu embrulha o estômago. – Cadê
Papai?

MAE: É o que eu quero saber, onde Papai foi?

MAMÃE: Deve ter se recolhido, acho que foi deitar...

GOOPER: Bom, então, agora a gente pode conversar.

MAMÃE: Que conversa é essa, conversar o que? [Margaret aparece na sacada,


conversando com o Doutor Baugh].

MARGARET [Musicalmente]: Minha família libertou os escravos dez anos da


abolição. Meu tataravô libertou seus escravos cinco anos do início da Guerra de
Secessão!

MAE: Ah, pelo amor de Deus! A Maggie subiu na árvore da família dela.

MARGARET [Docemente]: O que, Mae? [O ritmo deve ser muito rápido: grande
animação sulista].

MAMAE [Se referindo a todos]: Acho que Papai estava esgotado. Ele ama a família,
adora as pessoas em volta dele, mas é um desgaste pros nervos. Ele não estava em si
hoje à noite, Papai não estava em si, dava pra ver que estava esgotado.

REVERENDO TOOKER: Eu o acho admirável.

MAMÃE: É! Simplesmente admirável. Vocês todos viram como comeu? Vocês todos
viram a janta que ele guardou? Nossa, ele comeu como um cavalo.

GOOPER: Espero que não se arrependa.

MAMÃE: O que? Ora, aquele homem – comeu um pedaço enorme de pão com melaço!
Repetiu risoto duas vezes.

MARGARET: Papai adora risoto. – Comemos um jantar do campo de verdade.

MAMÃE [Sobrepondo Margaret]: É, ele simplesmente adora! Doce de batata doce?


Filho? Aquele homem guardou comida suficiente na mesa para encher um ajudante de
campo!

GOOPER [Com um toque carrancudo]: Espero que ele não sofra depois...

MAMÃAE [Feroz]: Que é isso, Gooper?

MAE: Gooper só está dizendo que espera que Papai não sofra hoje à noite.
MAMÃE: Ah, que inferno, Gooper está dizendo. Por que Papai iria sofrer só por
satisfazer um apetite normal? Não tem nada de errado com esse homem, só os nervos,
ele está saudável como um dólar. E agora sabe que está bem e é por isso comeu tanto na
ceia. Ele tirou um peso da cabeça, sabendo que não estava condenado a – aquilo que
pensou que estava condenado a...

MARGARET [triste e doce]: Deus abençoe sua velha alma doce...

MAMÃE [vagamente]: Isso, Deus abençoe seu coração, onde esta Brick?

MAE: Lá fora.

GOOPER: -Bebendo...

MAMÃE: Eu sei que ele está bebendo. Sera que não consigo ver que ele está bebendo
sem você me dizer que aquele menino está bebendo o tempo todo?

MARGARET: É isso aí, Mamãe! [Ela aplaude].

MAMÃE: Tem gente que bebe, bebeu e vai beber enquanto eles colocarem aquela coisa
nas garrafas.

MARGARET: É verdade. Nunca confiei em um homem que não bebe.

GOOPER: Sera que a gente não vai conseguirfalar?

MAMÃE: Brick? Brick!

MARGARET: Ele ainda está na sacada. Vou trazê-lo pra gente poder conversar.

MAMÃE [Preocupada]: Não sei pra que essa conferência de família misteriosa!
[Silêncio embaraçoso. Mamãe olha todos os rostos, depois arrota levemente e
resmunga: “Desculpa...”. Ela abre um leque ornamental suspenso em seu pescoço. Um
leque de renda preta que combina com seu vestido de renda preta e abana seu buquê
murcho, funga nervosa e olha todos os rostos no silêncio desconfortável enquanto
Margaret chama “Brick?” e Brick canta para a lua na sacada].

MARGARET: Brick, eles vão contar a verdade pra Mamãe e ela vai precisar de você.

MAMÃE: Não sei o que está acontecendo aqui, vocês estão muito carrancudos! Abre
aquela porta do corredor e deixa o ar circular, por favor, Gooper!

MAE: Acho que seria melhor deixar a porta fechada, Mamãe, até depois da conversa.

MARGARET: Brick

MAMÃE: Reverendo Tooker, pode abrir aquela porta, por favor?

MAE? Sóo achei que a gente não deveria dar nenhuma chance do Papai ouvir nenhuma
palavra desta discussão.

MAMÃE: Que absurdo! Nada vai ser dito na casa do Papai que ele não possa ouvir se
não quiser!
GOOPER: Bom, Mamãe, é que... [Mae o cutuca duro e rapidamente para ele
calar-se. Ele a encara enquanto ela anda em círculo diante dele como uma bailarina
burlesca, levantando seus braços desnudos magros sobre a cabeça, retinindo os
braceletes e exclamando]:

MAMÃE: Uma brisa! Uma brisa!

REVERENDO TOOKER: Acho esta casa a mais fria do Delta – Sabiam que a viúva
do Halsey Banks colocou ar condicionado na igreja e na casa paroquial de Friar’s Point
em memória do Halsey? [Conversa geral recomeça; todos estão falando de modo que o
palco parece uma gaiola].

GOOPER: Que ruim que ninguém resfria sua igreja. Aposto que o senhor sua naquele
púlpito nestes domingos quentes, Reverendo Tooker.

REVERENDO TOOKER: É, minhas roupas ficam encharcadas. Domingo passado o


ouro na minha casula desapareceu no roxo.

GOOPER: Reverendo, o senhor deve ter orado no fogo do inferno domingo passado.

MAE: O senhor acha que aquelas injeções de vitamina B12 são tão boas quanto se
divulga, doutor Baugh?

DOUTOR BAUGH: Bom, se você quer se viciar em alguma coisa, acho que elas são
tão boas pra viciar quanto qualquer outra coisa.

MAMÃE: Maggie, Maggie, você não vem com o Brick?

MAE [Repentinamente e alto, criando um silêncio]: Estou com uma sensação estranha.

MAMÃE [Virando da sacada]: Que sensação?

MAE: Que aquele Brick falou alguma coisa que não deveria pro Papai.

MAMÃE: Que diabos o Brick poderia dizer pro Papai que não deveria?

GOOPER: Mamãe, tem uma coisa-

MAE: AGORA, ESPERA! [Ela corre até Mamãe e dá um abraço rápido e beijo nela.
Mamãe a empurra impaciente].

DOUTOR BAUGH: Na minha época havia o que eles chamam de cura de Keeley para
alcóolatras.

MAMÃE: Inferno!

DOUTOR BAUGH: Mas agora entendo que eles só tomam um tipo de comprimido.

GOOPER: Eles chamam de comprimidos “Annie Bust”.

MAMÃE: Brick não precisa tomar nada. [Brick e Margaret aparecem nas portas da
sacada, Mamãe sem perceber sua presença atrás dela]. Aquele menino só está desolado
com a morte do Skipper. Vocês sabem como o coitado do Skipper morreu. Deram uma
dose muito grande daquela coisa de sódio amital na casa dele e depois chamaram a
ambulância e deram outra dose muito grande no hospital e isso mais todo o álcool no
corpo de meses e meses acabou sendo muito pro coração dele... Tenho medo de
agulhas! Tenho mais medo de agulhas do que faca... Acho que mais pessoas partiram
deste mundo por causa de agulhas do que- [Ela para abruptamente e vira]. Ah – o Brick
chegou. Meu bebê adorado... [Ela vira-se para Brick com os braços curtos e gordos
estendidos, ao mesmo tempo emitindo um soluço curto e audível, que é tanto cômico
quanto tocante. Brick sorri e faz uma leve reverência, fazendo um gesto burlesco de
galantaria para Margaret entrar na sala na sua frente. Depois manca com a muleta
diretamente até o bar e há um silêncio absoluto, com todos olhando para Brick como
todos sempre olharam para Brick quando ele falava, se movia ou aparecia. Um a um
ele coloca cubos de gelo no copo, depois de repente, mas não rapidamente, olha para
trás sobre o ombro com um sorriso irônico, charmoso e diz]:

BRICK: Ah, desculpe! Alguem quer?

MAMÃE [triste]: Não, filho. Gostaria que você não bebesse.

BRICK: Gostaria de não precisar, Mamãe, mas ainda estou esperando estalo na minha
cabeça que deixa tudo mais calmo!

MAMÃE: Ah, Brick... VOCÊ ME FAZ SOFRER!

MARGARET [ao mesmo tempo]: Brick, senta lá com a Mamãe!

MAMÃE: Eu não aguento issoooo... [Ela soluça].

MAE: Agora que estamos todos reunidos-

GOOPER: A gente pode falar...

MAMÃE: Me parte o coração...

MARGARET: Senta com a Mamãe, Brick, e segura a mão dela. [Mamãe aspira o ar
muito alto três vezes, quase como três batidas de tambor na bolsa de silêncio].

BRICK: Segura você, Maggie. Sou um aleijado inútil. Tenho que ficar aqui na minha
muleta. [Brick manca até a porta da sacada; encosta nela como se estivesse esperando.
Mae senta-se ao lado da Mamãe, enquanto Gooper avança para frente e senta-se na
ponta do sofá, fitando-a. Reverendo Tooker se move agitado pelo espaço entre eles; no
outro lado, doutor Baugh em pé olhando para nenhum ponto em especial e acende um
cigarro. Margaret se afasta].

MAMÃE: Por que vocês todos estão me cercando - assim? Por que estão todos me
olhando desse jeito e fazendo sinais um pro outro? [Reverendo Tooker afasta
assustado].

MAE: Calma, Mamãe.

MAMÃE: Calma você, você, Mae. Como posso ficar calma com todo mundo me
olhando como se poças de sangue tivesse estourado no meu rosto? O que está
acontecendo, hein? O que? [Gooper tosse e ocupa a posição central].
GOOPER: Agora, doutor.

MAE: Doutor Baugh?

GOOPER: Mamãe que saber toda verdade sobre o laudo da Clínica Ochsner.

MAE [ávida]: -sobre a doença do Papai!

GOOPER: É, sobre a doença do Papai, temos que encarar isso.

DOUTOR BAUGH: Bom...

MAMÃE [apavorada, se levantando]: Existe? Alguma coisa? Alguma coisa que eu?
Não – sei? [Nestas poucas palavras, esta pergunta assustada, muito suave, Mamãe revê
a história dos seus quarenta e cinco anos com Papai, sua enorme devoção ingênua
quase embaraçosamente honesta, que deve ter tido alguma coisa que Brick tem, que o
tornou tão amado pelo “simples expediente” de não amar sufientemente para
perturbar seu afastamento charmoso, uma vez também unido, como Brick, com a beleza
viril. Mamãe mostra dignidade neste momento; ela quase deixa de ser gorda].

DOUTOR BAUGH [Depois de uma pausa, desconfortável]: É? – Bom –

MAMÃE: Eu!!! – quero – saberrrr... [Imediatamente ela enfia o punho na boca como
se para negar esta declaração. Depois por alguma razão curiosa, ela agarra o buquê
murcho do peito e atira no chão e pisa nele com seus pés pequenos e gordos].

MAE: Senta, Mamãe, senta no sofá.

MARGARET: Brick, vai lá e senta com a Mamãe.

MAMÃE: O que é, o que é?

DOUTOR BAUGH: Em toda minha experiência nunca vi um exame mais completo do


que esse que o Papai Pollit teve na Clínica Ochsner.

GOOPER: É uma das melhores do país.

MAE: É A melhor do país – sem exceção! [Por algum motivo ela da uma cotovela
violenta em Gooper ao passar por ele. Ele dá um tapa na mão dela sem tirar os olhos
do rosto da mãe].

DOUTOR BAUGH: É claro que eles tinham 99,9% de certeza antes de começarem.

MAMÃE: Certeza do que, certeza do que, certeza – do que? – do que? [Ela recuperar
o fôlego num soluço assustado. Mae beija-a rapidamente. Ela empurra Mae ferozmente,
fitando o Médico].

MAE: Mamãe, tenha coragem!

BRICK [à porta, suavemente]: “By the light, by the light, of the silvery moon…”

GOOPER: Cala a boca, Brick.


BRICK: Desculpa. [Ele perambula pela sacada].

DOUTOR BAUGH: Mas agora, a senhora sabe, Mamãe, eles cortaram um pedaço do
tumor, uma amostra do tecido e-

MAMÃE: Tumor? Vocês disseram pro Papai-

DOUTOR BAUGH: Espera um pouco.

MAMÃE [feroz]: Vocês falaram pra mim e pro Papai que não tinha nada de errado com
ele a não ser-

MAE: Mamãe, eles sempre-

GOOPER: Deixa o doutor Baugh falar, por favor!

MAMÃE –um distúrbio espástico do- [Ela expira em um soluço].

DOUTOR BAUGH: É, foi o que dissemos ao Papai. Mas levamos este pedaço de
tecido pro laboratório e infelizmente o teste deu positivo. Bom – é – maligno... [Pausa]

MAMÃE: Câncer?! Câncer?! [O doutor Baugh afirma com a cabeça gravemente.


Mamãe dá um grito longo arfante]

MAE E GOOPER: Ora, ora, ora, Mamãe, a senhora tinha que saber...

MAMÃE: POR QUE NÃO OPERARAM? HÃ? HÃ?

DOUTOR BAUGH: Já espalhou muito, Mamãe, muitos órgãos afetados.

MAE: Mamãe, o fígado foi afetado e os rins também, os dois! Já passou do que eles
chamam de-

GOOPER: A operação era um risco.

MAMÃE: Uh-huh... [Mamãe toma fôlego como uma arfada de morte].

REVERENDO TOOKER: Tst, tst, tst, tst!

DOUTOR BAUGH: Não dá mais pra operar.

MAE: Por isso ele ficou amarelo, Mamãe.

MAMÃE: Sai de perto de mim, sai de perto de mim, Mae! [Ela levanta-se
abruptamente] Eu quero o Brick! Cadê o Brick? Cadê o meu único filho?

MAE: Mamãe! Ela disse “único filho”?

GOOPER: Então eu sou o que?

MAE: Um homem sóbrio responsável com cinco filhos preciosos! -Seis!


MAMÃE: Quero que o Brick me conte. Brick! Brick!

MARGARET [Despertando das suas reflexões num canto]: Brick estava tão
angustiado que foi lá pra fora.

MAMÃE: Brick!

MARGARET: Mamãe, deixa que eu conto!

MAMÃE: Não, não, me deixa em paz, você não tem o meu sangue!

GOOPER: Mamãe, eu sou seu filho! Me escuta!

MAE: Gooper é seu filho, ele é o mais velho!

MAMÃE: Gooper nunca gostou do Papai.

MAE [terrivelmente chocada]: Isso não é VERDADE! [Há uma pausa. O ministro tosse
e levanta-se].

REVERENDO TOOKER [Para Mae]: Acho que é melhor eu ir embora nesse


momento. [Discretamente]. Boa noite, boa noite a todos e Deus abençoe todos vocês...
nesta casa... [Ele sai. Mae tosse e aponta para Mamãe].

GOOPER: Bom, Mamãe... [Ele suspira].

MAMÃE: É tudo um engano, eu sei que é só um pesadelo.

DOUTOR BAUGH: Vamos manter Papai o mais confortável possivel...

MAMÃE: É, é só um pesadelo, só isso, um pesadelo terrível.

GOOPER: Na minha opinião Papai tá sentindo muita dor, mas não admite.

MAMÃE: Só um sonho, um sonho ruim.

DOUTOR BAUGH: É o que a maioria faz. Eles acham que se não admitirem, podem
fugir da dor.

GOOPER [com prazer]: É, eles ficam dissimulados por causa disso, muito
dissimulados.

MAE: Gooper e eu achamos-

GOOPER: Cala a boca, Mae! Mamãe, acho – que Papai deveria começar a tomar
morfina.

MAMÃE: Ninguém vai dar morfina pro Papai.

DOUTOR BAUGH: Ora, Mamãe, quando a dor bater, ela vai bater muito forte e Papai
vai precisar de uma injeção pra aguentar.

MAMÃE: Já falei que ninguém vai dar morfina pra ele.


MAE: Mamãe, você não quer ver o Papai sofrer, você sabe que... [Gooper em pé ao
lado dela dá-lhe uma cotovelada brusca].

DOUTOR BAUGH [colocando um pacote em cima da mesa]: Vou deixar esse material
aqui. Se ele tiver um ataque repentino, vocês não precisam mandar buscar.

MAE: Eu sei dar injeção.

MAMÃE: Ninguém vai dar morfina pro Papai.

GOOPER: Mae fez um curso de enfermagem durante a guerra.

MARGARET: De qualquer forma não acho que Papai vai querer que Mae dê injeção
nele.

MAE: Você acha que ele vai querer que você dê?

DOUTOR BAUGH: Bom... [Doutor Baugh levanta-se]

GOOPER: O doutor já está indo.

DOUTOR BAUGH: É, tenho que ir. Bom, mantenha o queixo levantado, Mamãe.

GOOPER [jocoso]: Ela vai manter os dois queixos levantados, não vai, Mamãe?
[Mamãe chora]. Ora, para com isso, Mamãe. [na porta com o Doutor Baugh] Bom,
doutor, agradecemos muito tudo que o senhor fez. Estou dizendo, somos muitos gratos
ao senho por - [Doutor Baugh sai sem sem olhar para ele] – Acho que o doutor tem
muitos problemas pra resolver, mas não custava nada pra ele ser mais humano...
[Mamãe chora]. Ora, tenha coragem, Mamãe.

MAMÃE: Não é verdade, eu sei que não é verdade!

GOOPER: Mamãe, estes testes são infalíveis!

MAMÃE: Por que você está tão determinado a ver seu pai morto?

MAE: Mamãe!

MARGARET [gentilmente]: Eu sei o que Mamãe quis dizer.

MAE [feroz]: Ah, sabe?

MARGARET: É, achio que sei.

MAE: Pra quem acabou de chegar na família com certeza você mostra muita
compreensão.

MARGARET: Compreensão é o que falta nessa casa.

MAE: Você deve ter precisado muita compreensão na sua familia, Maggie, com o
problema de bebida do teu pai e agora você tem o Brick com isso!
MARGARET: Brick não tem problema nenhum com bebida. Ele só é dedicado ao
Papai. Isso tudo é uma tensão terrível pra ele.

MAMÃE: Brick é o filhinho do Papai, mas ele bebe muito e isso preocupa a mim e o
Papai e, Margaret, você tem que cooperar conosco, você tem que cooperar com Papai e
comigo pra endireitar o Brick. Por que Papai vai ficar magoado se Brick não der um
jeito na vida e tomar conta das coisas.

MAE: Tomar conta do que, Mamãe?

MAMÃE: Da fazenda. [Olhar violento entre Mae e Gooper]

GOOPER: Mamãe, a senhora teve um choque.

MAE: É, todos nós ficamos chocados, mas...

GOOPER: Vamos ser realistas-

MAE: -Papai nunca, nunca seria bobo o suficiente pra-

GOOPER: - colocar a fazenda nas mãos de um irresponsável!

MAMÃE: Papai não vai deixar a fazenda nas mão de ninguém; Papai não vai morrer.
Quero que você enfiem isso na cabeça, todos vocês!

MAE: Mãezinha, mãezinha, Mamãe, temos tanta esperança e otimismo quanto a


senhora sobre as chances do Papai, temos fé na oração – mas apesar disso há certos
assuntos que devem ser discutidos e resolvidos, porque se não-

GOOPER: Eventualidades devem ser consideradas e agora é a hora... Mae, você pode
pegar minha pasta no nosso quarto?

MAE: Claro, querido. [Ela levanta-se e sai pela porta do corredor]

GOOPER [em pé atras da Mamãe]: Bom, Mamãe, o que você disse há pouco não era
verdade e você sabe disso. Sempre amei Papai do meu jeito quieto. Nunca fiquei me
exibindo e sei que Papai sempre gostou muito de mim desse jeito quieto também e
nunca ficou mostrando. [Mae volta com a pasta de Gooper].

MAE: Toma a pasta, Gooper, querido.

GOOPER [Devolvendo a pasta para ela]: Obrigado... É claro que minha relação com
Papai e diferente da do Brick.

MAE: Você é oito anos mais velho que o Brick e sempre teve que carregar uma carga
maior de responsabilidades que Brick. Ele nunca carregou nada na vida a não ser uma
bola de futebol ou um copo de uísque.

GOOPER: Mae, me deixa falar, por favor.

MAE: Claro, querido.

GOOPER: Bom, uma plantação de vinte e oito mil acres é uma coisa muito grande pra
administrar.

MAE: Quase sozinho. [Margaret saiu para a sacada e pode ser ouvida chamando Brick
suavemente].

MAMAE: Você nunca teve que administrar a fazenda! Do que está falando? É como se
Papai já estivesse morto e no túmulo e você tivesse que administrar a fazenda. Ora,
você só ajudou Papai em alguns detalhes do negócio e continuou com seu escritório ao
mesmo tempo lá em Memphis!

MAE: Ah, Mamãe, Mamãe, Mamãe! vamos ser justos.

MARGARET: Brick!

MAE: Ora, Gooper se entpregou de corpo e alma pra manter essa fazenda de pé nos
últimos cinco anos desde que a saúde do Papai começou a piorar.

MARGARET: Brick!

MAE: Gooper não vai dizer, Gooper nunca pensou nisso como obrigação, ele apenas
fez. E o que Brick fez? Brick continuou a vivendo da glória dos tempos de escola!
Ainda jogador de futebol com vinte e sete anos.

MARGARET: De quem você tá falando agora? Do Brick? Jogador de futebol? Ele não
é jogador de futebol e você sabe. Brick é comentarista esportivo na televisão e um dos
mais conhecidos do país.

MAE: Estou falando do que ele era.

MARGARET: Bom, gostaria que você simplesmente parasse de falar do meu marido.

GOOPER: Tenho todo o direito de falar do meu irmão com outros membros da
MINHA PRÓPRIA família, o que não inclui você. Por que você não vai lá fora beber
com Brick?

MARGARET: Nunca vi tanta maldade contra um irmão!

GOOPER: E a maldade dele comigo? Ora, ele não aguenta ficar no mesmo quarto que
eu!

MARGARET: Essa é uma campanha deliberada de infâmia pelo motivo mais nojento e
sórdido na terra, e eu sei o que é isso. Isso é cobiça, cobiça, ganância, ganância!

MAMÃE: Ah, eu vou gritar! Vou gritar agora se isso não parar! [Gooper avança sobre
Margaret com os punhos cerrados ao seu lado como se fosse bater nela. Mae torce o
rosto novamente em uma careta horrível nas costas de Margaret. Mamãe chora].
Margaret. Minha filha. Vem aqui. Senta perto da Mamãe.

MARGARET: Mamãe, querida, me desculpa, me desculpa, eu-! [Ela curva o pescoço


longo e gracioso para encostar a testa no ombro saliente de Mamãe sob seu chifon
preto].

MAE: Que lindo, que emocionante, esta demonstração de devoção! Sabe porque ela não
tem filhos? Não tem filhos por que seu marido atlético e lindo não vai pra cama com
ela.

GOOPER: Não vai me deixar fazer as coisas de um jeito agradável, né? Certo – não
dou a mínima se Papai gosta de mim ou não ou gostou ou nunca gostou ou se vai gostar
ou não! Só estou apelando para senso de decência comum e jogo limpo. Vou falar a
verdade para você. Fiquei magoado com a parcialidade do Papai pelo Brick desde que
ele nasceu e a forma como tenho sido tratado como se eu fosse bom só pra ser cuspido,
às vezes nem pra isso. Papai ta morrendo de câncer, e já esparramou por ele e atacou
todos seus órgãos vitais, incluindo os rins e agora está mergulhando na uremia, e todos
vocês sabem o que é uremia, é o envenamento do sistema inteiro por causa da falha do
corpo em iliminar as toxinas.

MARGARET [Para si, centro do palco, sibilando]: Veneno! Veneno! Pensamentos e


palavras venenosas! No coração e na cabeça! - Isto é veneno!

GOOPER [sobrepondo]: Estou pedindo uma divisão justa e, por Deus, espero
conseguir. Mas se não conseguir, se tiver alguma armação estranha acontecendo aqui
pelas minhas costas, bom, não sou advogado de empresa à toa, sei proteger meus
interesses. [Brick entra da sacada com um sorriso tranquilo confuso, com um copo
vazio na mão].

BRICK: Vai cair uma tempestade.

GOOPER: Ah! O atrasado chegou!

MAE: Atenção, o heroi conquistador chegou!

GOOPER: O fabuloso Brick Pollitt! Lembram-se dele? - Quem poderia esquecer?

MAE: Parece que ele se machucou num jogo!

GOOPER: É, acho que você vai esquentar banco no Sugar Bowl esse ano, Brick. [Mae
ri estridente] Ou foi no Rose Bowl que ele deu aquela famosa corrida? [Trovão].

MAE: O campeonato de ponche, querido. Foi no campeonato de ponche, nele, tigela de


ponche de vidro cortado!

GOOPER: Ah, é verdade, estou confundindo os campeonatos.

MARGARET: Por que vocês não param de ventilar sua maldade e inveja inveja contra
um rapaz doente?

MAMÃE: Cala a boca as duas, falo sério, cala a boca todos vocês!

DAISY, SOOKEY: Temporal! Vai cair um temporal! Temporal! Temporal!

LACEY: Brightie, fecha as janelas.

GOOPER: Lacey, levanta a capota do meu Cadillac, por favor?

LACEY: Sim, senhor, Mister Pollit!


GOOPER [ao mesmo tempo]: Mamãe, a senhora sabe que preciso voltar pra Memphis
de manhã para representar o espólio Parker numa ação. [Mae senta-se na cama e
arruma os papeis que tirou da pasta].

MAMÃE: É mesmo, Gooper?

MAE: É.

GOOPER: É por isso que sou obrigado a – levantar um problema que-

MAE: Uma coisa muito importante pra ser adiada.

GOOPER: Se Brick estivesse sóbrio, ele devia participar disso.

MARGARET: Brick está presente; nós estamos aqui.

GOOPER: Bem, bom. Agora vou entregar este esboço que meu sócio Tom Bullit e eu
elaboramos – uma espécie de simulação – de usufruto.

MARGARET: Ah, é isso! Você vai ficar responsável e administrar os pagamentos.

GOOPER: Fizemos isso logo que recebemos do Laboratório Ochsner o laudo sobre o
Papai. Fizemos isso, quer dizer, elaboramos esta simulação de distribuição com a
orientação e auxílio do Presidente da Diretoria do Southern Plantahs Bank e a Trust
Company em Memphis, C. C. Bellowes, um homem que administra espólios para todas
as famílias importantes na parte oeste do Tennessee e no Delta.

MAMAE: Gooper?

GOOPER [agachando da frente da Mamãe]: Agora, isso não é – definitivo, nada disso.
É uma descrição preliminar, mas ela oferece uma base – uma ideia – um plano –
possível, plausível!

MARGARET: É, aposto que é um plano. [Trovão]

MAE: É um plano pra proteger a maior propriedade do Delta da irresponsabilidade de


um-

MAMAE: Agora todo mundo me escuta, todos vocês, escuta aqui! Não quero mais
essa conversa maledicente na minha casa! E Gooper, guarda isso antes que eu arranco
da tua mão e rasgo agora! Eu não sei que inferno está escrito aí e não quero saber. Estou
falando na linguagem do Papai agora; sou a mulher dele, não a viúva, ainda sou a
mulher dele! E estou falando com vocês na língua dele e-

GOOPER: Mamãe, o que tenho aqui é-

MAE [ao mesmo tempo]: Gooper explicou que e só um plano...

MAMÃE: Não dou a mínima pro que tem aí. Guarda e não me deixa ver de novo, nem
mesmo fora do envelope. Entendeu? Base! Plano! Preliminar! Ideia! Eu digo – o que
aquilo que Papai sempre diz quando está com raiva?

BRICK [do bar]: Papai fala “merda” quando está com raiva.
MAMÃE [levantando]: Isso mesmo – MERDA! Digo MERDA também, igualzinho
Papai!

MAE: Essa linguagem grosseira parece desnecessária nesse-

GOOPER: Estou profundamente indignado por ouvir uma conversa desse tipo.

MAMÃE: Ninguém vai tomar conta de nada! - até Papai deixar – aí talvez –
possivelmente, não – nem mesmo então! Não, nem mesmo então! [trovão]

MAE: Sookey, corre e cobre os m[oveis da varanda/ quer que estrague a tinta?

GOOPER: Lacey, guarda meu carro!

LACEY: Não posso, Mister Pollitt, as chaves estão com o senhor!

GOOPER: Não, estão com você, homem. Cadê as chaves do carro, querida?

MAE: Estão no seu bolso!

BRICK: “You can always hear me singin’ this son, Show me the way to go home”.
[Trovões longe]

MAMÃE: Brick! Vem aqui, Brick, preciso de você. Hoje à noite o Brick está igualzinho
quando era criança, exatamente como fazia quando brincava lá fora e vinha para casa
quando eu gritava grosso com ele, todo suado e com as bochechas rosadas e com sono,
com – os cachinhos vermelhos brilhando... [Brick se afasta como faz de todo contato
físico e continua a música em um sussurro, abrindo o balde de gelo e colocando cubos
de gelo um a um como se estivesse misturando uma importante fórmula química. Trovão
distante]. O tempo passa tão rápido. Nada consegue superar o tempo. A morte começa
muito cedo – quase antes de você começar a conhecer a vida - você encontra a outra...
Ah, vocês sabem que temos que amar uns aos outros e ficar juntos, todos nós, o mais
juntinho que a gente puder, especialmente agora que essa nuvem negra apareceu e
entrou nessa casa sem ser convidada. [Desajeitada abraçando Brick, ela pressiona a
cabeça no ombro dele. Um cachorro uiva fora do palco]. Ah, Brick! Filho do Papai,
Papi ama tanto você. Sabe qual seria a realização do seu maior sonho? Se antes dele
morrer, se é que Papai vai morrer... [Um cachorro uiva] você desse a ele um filho seu,
um neto tão parecido com o filho dele quanto seu filho se parece com Papai.

MARGARET: Eu sei que o sonho do Papai.

MAMÃE: É o sonho dele.

MAE É uma pena que a Margaret e o Brick não possam ter.

PAPAI [direita baixa do palco na sacada]: Parece que o vento andou abusando desse
lugar.

EMPREGADO [fora do palco]: Foi mesmo, Mr. Pollitt.

MARGARET [cruzando para a porta da direita]: Papai está na sacada. [Mamãe


vira-se para a porta do corredor ao ouvir a voz do Papai na sacada].
MAMÃE: Não posso ficar aqui. Ele vai perceber algo nos meus olhos. [Papai entra no
quarto vindo da direita alta].

PAPAI: Posso entrar? [Ele coloca o charuto o cinzeiro]

MARGARET: A tempestade acordou o senhor, Papai?

PAPAI: Está falando de qual tempestade – aquela lá fora ou a algazarra daqui dentro?
[Gooper passa apertado por Papai].

GOOPER: Licença. [Mae tenta passar aperto pelo Papai para se juntar a Gooper, mas
Papai coloca o braço firmemente em torno dela].

PAPAI: Ouvi uma gritaria. Parecia que vocês tavam discutindo alguma coisa
importante. A falação era sobre o que?

MAE [perturbada]: Ora - nada, Papai...

PAPAI [cruzando para centro esquerdo extremo, levando a Mae com ele]: O que é esse
envelope de gravidez que você está guardando na pasta, Gooper?

GOOPER [no pé da cama, pego, enquanto enfia os papeis no envelope]: Isso? Nada,
não senhor - nada importante.

PAPAI: Nada? Parece muito importante! [Ele vira-se para o grupo na parte alta] Vocês
todos conhecem a estória do casal jovem-

GOOPER: Sim, senhor!

PAPAI: Oi, Brick-

BRICK: Oi, Papai. [O grupo está posicionado em um semicírculo acima do Papai,


Margaret na extrema direita, depois Mae e Gooper, depois Mamãe com Brick à
esquerda].

PAPAI: O casal jovem levou o Júnior ao zoológico num domingo, inspecionou todas as
criaturas de Deus nas jaulas, com satisfação.

GOOPER: Satisfação.

PAPAI [Cruzando para centro alto, olhando para frente]: Hoje foi uma tarde quente de
primavera e aquele elefante velho tinha algo mais na cabeça maior que amendoim.
Conhece esta estória Brick? [Gooper balança a cabeça].

BRICK: Não, senhor, não conheço.

PAPAI: Olha só, na gaiola perto deles tinha uma elefanta jovem no cio!

MAMÃE [no ombro do Papai]: Ah, Papai!

PAPAI: Qual o problema, o pastor foi embora, não foi? Ótimo. A elefanta na gaiola
vizinha estava impregnando o ambiente ao redor dela com um odor poderoso e
excitante de fertilidade feminina! Hã! Não é um jeito ótimo de colocar as coisas, Brick?

BRICK: Sim, senhor, não tem nada de errado com isso.

PAPAI: Brick falou que não tem nada de errado.

MAMÃE: Ah, Papai!

PAPAI [cruzando para o centro baixo]: Então o elefante velho ainda tinha lenha de
fornicação pra queimar. Ele levantou a tromba e deu uma cheirada na elefanta vizinha!
– começou a pisar na lama dentro da jaula e enfiar a cabeça na divisória e, de repente,
houve uma mudança óbvia no seu perfil – muito óbvia! Não estou contando a estória
numa linguagem decente, Brick?

BRICK: Sim, senhor, decente para caralho!

PAPAI: Então, o menino apontou e disse: “Papai, o que é aquilo?” A mãe dele disse:
“Ah, não – é nada!” – O pai disse: “Ele está estragado!” [Papai cruza até Brick na
esquerda]. Você não riu da estória, Brick. [Mamãe cruza para direita baixa chorando.
Margaret vai até ela. Mae e Gooper continuam no centro direito alto].

BRICK: Não, senhor, não ri da estória.

PAPAI: Que cheiro é esse nesse quarto? Está sentindo, Brick? Não sente um odor
poderoso e nojento de desonestidade neste quarto?

BRICK: Sim, senhor, acho que sim, senhor.

GOOPER: Mae, Mae...

PAPAI: Não existe nada mais poderoso. Existe, Brick?

BRICK: Não, senhor. Não, senhor, não existe nada mais nojento.

PAPAI: Brick concorda comigo. O odor da desonestidade é um odor poderoso e


nojento e a tempestade não soprou o cheiro deste quarto ainda. Está sentindo, Gooper?

GOOPER: O que, senhor?

PAPAI: E você, Mae? Percebe o odor desagradável da desonestidade nesse quarto?

MAE: Ora, Papai, nem sei o que é isso.

PAPAI: Você consegue cheirar. Inferno ele tem o cheiro da morte! [Mamãe soluça.
Papai olha para ela]. Qual o problema com aquela gorda ali, coberta de diamantes? Ei,
qual seu nome, qual seu problema?

MARGARET [cruzando até o Papai]: Ela ficou uma quedinha de pressão, Papai.

PAPAI: Melhor tomar cuidado, Mamãe. Derrame é péssimo jeito de morrer.

MARGARET [cruzando até Papai no centro]: Ah, Brick, Papai está usando o presente
que você deu, Brick, está usando o robe de cachemir, o material mais macio que já vi.
PAPAI: É, este é meu aniversário suave, Maggie... Não é minha boda de ouro nem de
prata, mas meu aniversário suave, tudo tem que ser suave pro Papai nesse aniversário
suave. [Maggie ajoeiha diante de Papai no centro].

MARGARET: Papai está usando as pantufas chinesas que dei a ele, Brick. Papai, ainda
não dei meu presente ainda, mas agora vou dar, agora é hora de eu dar meu presente pro
senhor! Tenho um anúncio a fazer!

MAE: O que? Que tipo de anúncio?

GOOPER: Um anúncio esportivo, Maggie?

MARGARET: Anúncio do início da vida! Uma criança está vindo, feita pelo Brick, e
na Maggie, a gata! Carrego o filho do Brick no meu corpo e este é o meu presente de
aniversário para o Papai neste aniversário!

[Papai olha para Brick que cruza por trás de Papai até o portal na esquerda baixa].

PAPAI: Levanta, menina, levanta, menina. [Papai ajuda Margaret a se levantar. Ele
cruza acima dela, para sua direita, morde a ponta de um charuto novo, tirado do bolso
do robe, enquanto observa Margaret]. Hã-hã, esta menina tem vida no corpo dela, isso
não é mentira!

MAMÃE: O SONHO DO PAPAI SE REALIZOU!

BRICK: Jesus!

PAPAI [cruzando para direita abaixo do bar]: Gooper, quero ver meu advogado
amanhã de manhã.

BRICK: Onde o senhor vai?

PAPAI: Filho, vou subir no telhado, até a pérgula no telhado para olhar meu reino antes
de desistir dele - vinte e oito mil acres da terra mais rica deste lado do vale Nilo! [Sai
pela porta da direita e desce para sacada].

MAMÃE [seguindo]: Querido, querido, querido – posso ir com você? [Ela sai pela
direita baixa. Margaret está no centro baixo na área do espelho. Mae se juntou a
Gooper e o cutuca ferozmente, fazendo um som sibilante e uma careta de fúria].

GOOPER [empurrando Mae para o lado]: Brick, será que você pode deixar um dose
dessa bebida pra mim?

BRICK: Ora, sirva-se, Gooper.

GOOPER: Vou mesmo.

MAE [estridente]: É claro que todos sabemos que isso – é mentira.

GOOPER: Fica quieta, Mae.

MAE: Não vou ficar quieta! Eu sei que ela inventou isso.
GOOPER: Maldição, falei cala a boca!

MARGARET: Deus do Céu! Não sabia que meu anúncio causar essa tempestade.

MAE: Essa mulher não esta grávida.

GOOPER: Quem disse que ela estava?

MAE: Ela.

GOOPER: O doutor não disse. Doutor Baugh não disse.

MARGARET: Não fui ao doutor Baugh.

GOOPER: Então quem você foi ver, Margaret?

MARGARET: Um dos melhores ginecologistas do sul.

GOOPER: Ãh-hã, ãh-hã! – entendi... [Ele pega um lápis e um caderno] –Posso saber
qual o nome dele, por favor?

MARGARET: Não, não pode, Excelentíssimo Promotor.

MAE: Ele não tem nome, ele não existe!

MARGARET: Ah, existe sim, e meu filho também, o bebê do Brick!

MAE: Você não consegue fazer um filho de um homem que não dorme com você a não
ser que pense que é- [Brick ligou o fonógrafo. Uma jazz de improviso corta a fala de
Mae].

GOOPER: Desliga isso!

MAE: Sabemos que é mentira por que ouvimos vocês aqui dentro; ele não dorme com
você, nós ouvimos! Então não pense que vai dar o golpe na gente, enganar um homem
que está morrendo com uma – [Um grito de agonia de inspiração longa e ódio enche a
casa. Margaret abaixa o fonógrafo até um sussurro. O grito é repetido].

MAE: Ouviu isso, Gooper, ouviu isso?

GOOPER: Parece que a dor atacou. Vem, vamos deixas os pombinhos juntos no ninho!
[Ele sai primeiro. Mae segue, mas vira-se na porta, contorcendo o rosto e silvando para
Margaret].

MAE: Mentirosa! [Ela bate a porta. Margaret suspira de alívio e anda um pouco
insegura para pegar o braço de Brick].

MARGARET: Obrigada – por ficar quieta...

BRICK: Não foi nada, Maggie.

MARGARET: Foi muito elegante da sua parte me livrar a cara. [Ele agora serve três
doses em uma rápida sucessão e fica em pé esperando, em silêncio. Vira-se para todos
imediatamente com um sorriso e diz]:

BRICK: Aí está!

MARGARET: O que?

BRICK: O estalo...

[Sua gratidão parece quase infinita enquanto ele manca na sacada com uma bebida.
Ouvimos sua muleta enquanto ele sai da vista balançando. Depois, a certa distância,
ele começa a cantar para si uma canção tranquila. baixinho. Margaret segura o
travesseiro grande desamparada como se fosse sua única companhia e durante algum
tempo depois joga-o na cama. Corre até o bar, pega todas as garrafas nos braços,
vira-se indecisa, depois sai do quarto correndo comelas, deixando a porta entreaberta
no corredor com luz amarela fraca. Brick pode ser ouvido mancando de volta na
sacada, cantando sua música tranquila. Ele retorna, vê o travesseiro na cama, ri de
modo leve e triste, pega o travesseiro. Ele está com ele embaixo do braço quando
Margaret volta ao quarto. Margaret suavemente fecha a porta e se encosta nela,
sorrindo suavemente para Brick].

MARGARET: Brick, eu costumava pensar que você era mais forte que eu e não queria
ser dominada por você. Mas agora, desde que você começou a beber – sabe de uma
coisa? – acho que é ruim, mas agora sou mais forte que você e consigo amar você mais
de verdade! Não mexe nesse travesseiro. Vou colocar de volta se você mexer! – Brick?
[Ela apaga todas as luzes exceto um abajur de aba de seda rosa ao lado da cama] Eu
fui realmente ao médico e sei o que fazer e – Brick? – pelas minhas contas hoje é o dia
pra engravidar.

BRICK: É, entendo, Maggie. Mas como você vai fazer um filho com um homem
apaixonado pela bebida?

MARGARET: Trancando toda a sua bebida e fazendo com que ele satisfaça meus
desejos antes de destrancar.

BRICK: Foi isso que você fez, Maggie?

MARGARET: Veja com seus olhos. O bar está vazio comparado com antes.

BRICK: Bom, quero ser um filho da – [Ele alcança a muleta, mas ela a alcança antes e
corre para a sacada, joga a muleta sobre o trilho e volta, ofegante].

MARGARET: Então, hoje à noite vamos fazer a mentira virar verdade, e quando
tivermos feito, vou trazer a bebida para cá de novo e vamos beber juntos, aqui, hoje à
noite, neste lugar onde a morte entrou... – O que diz?

BRICK: Não digo nada. Acho que não tenho nada pra dizer.

MARGARET: Ah, vocês fracos, focê fracos e lindos! – que desistem com tal encanto.
O que vocês querem é alguém que – [Ela apaga o abajur de aba de seda rosa] – abrace
vocês. – Gentilmente, gentilmente com amor devolva a vida a vocês, como uma coisa
dourada que vocês deixaram escapar.. Amo você tanto, Brick, tanto!
BRICK: Não seria engraçado se fosse verdade?

FIM

Você também pode gostar