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CVV

Uma Proposta
de Vida
CVV - Uma Proposta de Vida

Flávio Focássio
Jacques A. Conchon
Valentim Lorenzetti
2ª Edição – 2007

Nota Explicativa

Esta reedição foi possível graças aos recursos


provenientes dos direitos autorais do livro
“Mundo Sustentável”, cedidos ao CVV pelo
voluntário André Trigueiro.

O texto original deste “CVV – Uma Proposta


de Vida” foi mantido em respeito ao seu valor
histórico, e à importância do seu conteúdo para
a compreensão do espírito que, desde o início,
animou a instituição permanecendo até hoje vivo
e atuante no coração e na mente dos voluntários,
na sua missão de valorizar a vida prevenindo o
suicídio.

Comissão Nacional de Estudos


Diretoria do Programa CVV
OBJETIVOS DESTA OBRA

Registrar experiências profundamente grati-


ficantes em mais de 25 anos de trabalho no
CVV, desde suas origens até o período de grande
expansão domovimento por todo o Brasil. Este é
o objetivo essencial deste livro
Não é uma obra literária de ficção. É uma obra
que reproduz experiências, que fala de gestos,
de iniciativas, de pioneirismos vivenciados por
pessoas que marcaram profundamente a trajetória
do CVV.
Recomendamos a leitura deste livro a todos
aqueles que querem conhecer um pouco a história
do CVV, sua filosofia de respeito ao ser humano.
Recomendamo-lo, sobretudo, aos plantonistas
e àqueles que pretendem abrir novos postos de
CVV por este Brasil afora.

São Paulo, janeiro de 1989

Os autores
ÍNDICE

Flávio Focássio
A Entrevista na Relação de Ajuda 93
Voluntariado 104
Estrutura Organizacional do CVV 105
Regimento Interno do CVV 110

Jacques Conchon
A Comunicação entre Postos 26
A Filosofia do CVV 32
Vida Plena 37
Ciclo da Vida 45

Valentim Lorenzetti
Origens e Evolução do CVV 8
Como Fundar um Posto do CVV 50
Divulgação 52
Convém Saber 72
Role-Playing 75
Vivências de Plantão 77
A Reunião Geral de Plantonistas 87
A Reunião do Grupo 89
O Posto do CVV e a Entidade Jurídica 91
ORIGENS E EVOLUÇÃO DO CVV

A partir do momento em que o ser humano colocou-se em


disponibilidade para ouvir com compaixão o desabafo das angústias de
outro ser, pode-se dizer que começou o trabalho de prevenção do suicídio:
O trabalho de doação de amizade, a amizade atuante, o befriending dos
ingleses.
Entretanto, foi a partir da II Guerra Mundial que, na Europa e
Estados Unidos, começaram a se formar grupos de pessoas (profissionais
ou voluntárias) com a estrita finalidade de prevenir o suicídio. Pessoas que
se colocam à disposição dos desesperados, com o objetivo de lhes aliviar o
desespero e redespertar-lhes o valor pela vida.
De todas as entidades que se foram formando, uma delas mais tem
se projetado graças aos resultados do trabalho que vem desenvolvendo.
Trata-se de “Os Samaritanos”, fundada no início da década de 50 pelo Rev.
Chad Varah. Embora ganhando estrutura naquela ocasião, “Os Samaritanos”
começou muito antes; começou em 1936. Naquele ano, o jovem Rev. Varah,
recém-formado pela Igreja Anglicana, fora designado para proceder ao ofício
fúnebre de uma jovem de 14 anos que se suicidara porque, ao perceber os
primeiros sinais da menstruação, apavorada, achara que havia contraído uma
moléstia venérea e dera cabo à própria vida. Após fazer a encomendação do
corpo, Chad Varah voltou para casa e escreveu para um pequeno jornal de
Londres dizendo-se disponível, em sua própria casa, para “ouvir seriamente
pessoas falarem de assuntos sérios”. E, a partir daquele momento, o Rev.
Varah não mais descansou; já no dia seguinte à publicação do seu artigo,
recebia a visita de uma pessoa do Continente, isto é, alguém que atravessara
o Canal da Mancha somente para se abrir com o homem que se propunha a
ouví-la.

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Assim são os Samaritanos: pessoas disponíveis, dispostas a ouvir; pessoas
que não têm conselhos para dar, mas que têm a si mesmos para dar-se.
Pessoas que não estão preocupadas com um problema de seu próximo,
mas estão preocupadas com o próximo integralmente, como pessoa e não
como número a mais entre os numerosos problemas da humanidade. Assim,
na década Chad Varah, ajudado por alguns amigos, deu início ao plantão
central de “Os Samaritanos” de Londres, instalado no porão da Igreja de
Santo Estevão, que o próprio Varah e seus companheiros reconstruíram
parcialmente a partir dos escombros em que se havia transformado devido
aos bombardeios da II Guerra. Assim que o recinto estava preparado para
começar o trabalho, Varah achou que “Os Samaritanos” deveriam ter um
número telefônico de fácil memorização; a canto de uma pequena e escura
saleta estava um empoeirado telefone. Varah o apanha, disca para a central
telefônica, explica à telefonista os propósitos da nova entidade e lhe solicita
a concessão de um número mnemônico. A telefonista lhe informa que precisa
consultar os setores técnicos e, para tanto, pede-lhe algum tempo. “Dê-me
o número de seu telefone, para que eu me possa comunicar” – diz ela. Chad
olha para o disco do aparelho, coberto pela poeira; com a manga da camisa
limpa- o do pó e, estupefato, retoma o fio do diálogo com a telefonista. “Não
precisa, telefonista; o meu número é 9000”.
Vinte e cinco anos depois de oficialmente fundado, “Os Samaritanos”
estava com mais de 120 postos de prevenção de suicídio em toda a Inglaterra
e alguns outros países, reunindo cerca de 20 mil voluntários.

ORIGENS
Sobre as origens do CVV achamos oportuno transcrever a série de
artigos publicados em nosso Boletim de Julho de 1986 a Fevereiro de 1987,
sob o título “Há 25 anos”, escrito por Jacques Conchon.

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Julho de 1961

Tentando dissipar as névoas do passado recordamos que em


fins de junho de 1961 travamos produtiva conversa com um amigo, cujo
entusiasmo despertou-nos interesse relativamente às instituições que de
forma sistemática e organizada praticam a caridade.
Após dissertar longamente sobre um mundo até então nosso
desconhecido, sugeriu-nos, o amigo Silvestre, que visitássemos as obras
sociais em Franca, no Interior do Estado de São Paulo.
Impelidos pela curiosidade, em fins de junho de 1961, quando
entramos em férias, em companhia de um colega da escola, o Y. Shimizu,
da antiga rodoviária, tomamos o ônibus que nos levou a uma experiência
enlevante.
Em Franca tivemos a ventura de conhecer personalidades que
marcaram nossas vidas: O Dr. Agnelo Moratto e o Dr. Tomás Novelino.
Durante dois dias visitamos obras, verdadeiros monumentos de Luz, que
sintetizam o amor ao próximo, principalmente o Albergue Noturno Judas
Iscariotes, o Lar José Marques Garcia, o Instituto Pestalozzi e o Hospital
Allan Kardec.
Ao retornarmos, vivendo um agradável estado de deslumbramento,
propusemos a alguns colegas que participavam conosco de uma juventude
religiosa, a iniciarmos um trabalho em favor dos necessitados.
E, assim, caros amigos, hoje, analisando, distinguimos uma
atividade que deu início a uma fase pré-CVV. Como não tínhamos recursos
nem estrutura, limitávamos a visitar famílias pobres na região da Pedreira
(Santo Amaro) e a conversar com as pessoas.
No início, muitos jovens integraram o trabalho num clima elevado
de entusiasmo. Nos reuníamos na sede do Grupo, e , após um momento de
reflexão tomávamos o ônibus “Jardim São Luiz”, no Vale do Anhangabaú,
e íamos quase até o ponto final, onde nos espalhávamos em grupos de três
para fazermos as visitas, ao fim das quais nos reuníamos no ponto de ônibus,

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quando, felizes e agradecidos, comentávamos o valor e a satisfação de uma
conversa fraterna.
Ao fim de dez meses, por desinteresse, muitos foram abandonando
essas atividades. Em março de 1962 estava o trabalho reduzido a três
pessoas, e, com a transferência do Eddy para Santos, nas últimas visitas
fomos acompanhados do Luiz Gerbasi. Mas era hora de perseverarmos, pois
o CVV nascente requisitava de nós todos, todos os esforços.
P.S. – O Gerbasi, que todos conhecem, por incompatibilidade de horário, não participou
do início do CVV. Veio a integrar-se, no entanto, em 1965, permanecendo até 1970, quando retornou
a Jaboticabal, para após dez anos fundar o Posto do CVV nessa cidade.

Agosto de 1961

Hoje, após termos consultado um desses calendários permanentes,


válido até o ano de 2092, que qualquer agenda que se preze ostenta,
conseguimos identificar uma data importante na história do CVV, o último
sábado de julho de 1961 foi dia 28, (confiram!).
Pois bem, na tarde do dia 28 de julho de 1961, quando o trabalho
de visitas às famílias carentes completava o seu primeiro mês, recebemos
das mãos do Dr. Milton B. Jardim um envelope de papel manilha, contendo
recortes extraídos da revista, hoje extinta, “O Mundo Ilustrado”, versando
sobre Os Samaritanos, Londrinos.
Naquela época freqüentávamos as escolas da Federação Espírita
do Estado de São Paulo, onde colhemos inesquecíveis lições de amor ao
próximo e respeito aos semelhantes. A velha sede, situada à Rua Maria de
Paula, era dirigida com pulso energético do nosso Edgard Armond, cujos
exemplos de devotamento e abnegação contribuíram de forma decisiva em
nossa formação espiritual.
Armond personificava a serenidade, homem de poucas palavras
e profunda objetividade, recebia de todos o carinhoso tratamento de
Comandante, pois, além de cirurgião-dentista, (profissão que exerceu sempre
na mais absoluta gratuidade junto às pessoas pobres), era Oficial da Polícia

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Militar, desempenhando o comando de uma Unidade da Corporação quando
se reformou.
–“O Comandante mandou isso para você. Estude e depois converse
com ele”. Foram essas as palavras do nosso Milton Jardim, naquele sábado,
28 de julho de 1961.
Até então não havíamos desfrutado de uma conversa com o Armond,
o conhecíamos das aulas que nos havia ministrado com a segurança e o
equilíbrio de um mestre. Ficamos aturdidos com a proposição, e, olhando
para o envelope, lemos o manuscrito com a sua inconfundível caligrafia:
“Para quem deseja servir aqui, está uma boa oportunidade”.
Na semana seguinte, já no mês de agosto, aproveitando intervalo
entre aulas, (cursávamos, então, o segundo ano da Escola de Engenharia),
demos dois passos muito importantes:
O primeiro foi uma visita ao Departamento de Estatística do Estado
de São Paulo, para nos inteirarmos das ocorrências de suicídios na Capital
e noutras cidades. O segundo foi manter um diálogo proveitoso com o Dr.
Ary Lex, médico nosso conhecido e professor (até hoje) da Faculdade de
Medicina da USP.
Das informações estatísticas decorreu o esquema de plantões
semanais, onde voluntários se revezavam numa faixa das 16 às 22 horas, na
qual ocorria a maior incidência de suicídios e tentativas.
Da conversa com o Dr. Ary Lex surgiu um alerta com recomendações
de cautela. Sugeriu-nos que travássemos contatos com pessoas experientes
no assunto, que agendamos para o mês seguinte.
No fim de agosto de 1961 apresentamos o esboço da Campanha de
Prevenção ao Suicídio, ao nosso Armond, que o aprovando, incentivou-nos
a tomar medidas para a formação do corpo de voluntários.
À medida que nos aprofundávamos no assunto, mais nos sentíamos
envolvidos pela idéia enlevante de servir, uma vez oferecida a boa
oportunidade!

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Setembro de 1961

Uma vez sedimentada a idéia dos plantões e definido o horário de


trabalho (das 16 às 22 horas), o passo seguinte consistiria na arregimentação
de voluntários. Vários apelos foram formulados sem resultado, exceção
feita à boa receptividade encontrada nos alunos da Escola de Aprendizes do
Evangelho, da Federação Espírita.
No início de setembro de 1961 já havíamos arrolado cerca de trinta
interessados, dentre os quais o Flávio, ansiosos para iniciar os trabalhos que,
progressivamente, estavam materializando, como um projeto alvissareiro.
Entretanto, no reverso da medalha, e, na maioria esmagadora, faziam-se
presentes centenas de vozes que, em coro, classificavam a Campanha de
Prevenção do Suicídio como empreendimento absurdo e fora do propósito.
Argumentos como “quem deseja se matar não vai telefonar para
ninguém” desmontavam o grupo, acarretando desinteresse e evasões. Não
faltaram profissionais que, por antecipação, nos acusavam de invasores da
seara alheia.
Atendendo a uma sugestão do Dr. Ary Lex, fomos, numa manhã,
ao Hospital das Clínicas buscar apoio em um cirurgião endoscopista que já
havia manifestado, em épocas passadas, o desejo de desenvolver campanha
de esclarecimento público sobre os malefícios causados pela ingestão de
soda cáustica.
O Dr. Pedro Martins, o cirurgião a quem buscamos naquela
manhã, por força da sua especialidade, tinha em sua numerosa clientela
uma expressiva porcentagem de pessoas que haviam tentado o suicídio
por ingestão de corrosivos, daí a sua sensibilidade e o seu idealismo que se
traduziam no desejo de fazer alguma coisa pelas pessoas desesperadas.
Após alguns minutos de espera fomos recebidos pelo Dr. Pedro.
Nunca poderíamos imaginar que aquele instante marcaria o início de uma
profunda amizade – “amigo do peito, irmão, camarada” – como iria definir
anos mais tarde esse tipo de relacionamento, o cantor Roberto Carlos.

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Era cedo ainda: faltavam alguns minutos para as sete horas, e, assim
pudemos conversar num clima de fascinação crescente que nos envolvia.
Com inexcedível paciência explicou-nos, o Dr. Martins, o drama dos que
atentavam contra a própria vida. Falou-nos do desespero, das angústias que
os levavam à sinistra atitude. Empolgou-nos com o seu entusiasmo diante da
embrionária CVV. Recebemos naqueles minutos valiosa injeção de ânimo
que, de imediato, transformou-se na determinação de irmos adiante com o
projeto, malgrado as opiniões contrárias.
–“Enquanto me preparo para o atendimento – disse Dr. Pedro –
você pode conversar com os pacientes que estão na sala de espera. Todos
passaram pela dolorosa experiência da tentativa do suicídio e hoje, aqui,
comparecem duas vezes por semana para curativos e passagens de sondas
– um verdadeiro calvário” comentou.
Foi essa a primeira vez que nos defrontamos com os personagens
da tragédia. Pouco conversamos, pois não sabia como começar e, tampouco,
o que dizer, mas foi o suficiente para experimentarmos um estranho
sentimento jamais anteriormente experimentado, o que mais tarde viemos
saber denominar-se compaixão.
Ficamos atônitos quando fomos convidados a adentrar o gabinete no
qual se fazem os curativos e onde as sondas são aplicadas. Acompanhamos os
movimentos hábeis do Dr. Pedro. Surpreendeu-nos o carinho que dispensava
os clientes. Conversava com eles e a todos chamava pelo nome, e ainda
encontrava tempo para explicar-nos o que estava ocorrendo em cada fase do
tratamento.
Quando o último paciente deixou a mesa de aplicações, os relógios
marcavam meio-dia.
–“Venha comigo, vou mostrar-lhe outra experiência dolorosa:
pessoas que tentaram suicídio com o fogo, com as quais você poderá
conversar”.
Subimos para o décimo andar e por quase duas horas caminhamos
entre os leitos que exibiam formas humanas, cujas carnes, em extensões

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variadas, haviam sido consumidas pelo fogo. Embora em estado de choque, ou
quase isso, foi mais fácil conversar, pois o Dr. Martins ao meu lado facilitava,
iniciando com um cumprimento afável, permitia-nos a participação.
Por várias vezes não pudemos conter as lágrimas, e pensávamos:
Dante, o poeta florentino, autor da Divina Comédia, ao descrever o inferno,
vislumbrara tão-somente os portais! Nada se comparava ao sofrimento
daquela gente!
Ao deixarmos o Hospital das Clínicas recusamo-nos a tomar uma
condução. Precisávamos meditar, repassar mentalmente e com muita atenção
tudo o que presenciáramos. Descemos a Rua da Consolação e quando
consultamos o relógio, uma surpresa: já eram quatro horas da tarde e, sem
sentir o tempo passar, perdêramos todas as aulas na escola, inclusive duas
de laboratório que nos custaram alguns pontos abaixo da média do semestre,
mas “deixa pra lá”, as lições recebidas naquele dia nos valeriam por toda a
vida.
Em 1965, quando a Campanha de Valorização da Vida adquiriu
personalidade jurídica, transformando-se no Centro de Valorização da Vida,
sentimos a necessidade de entregar a presidência a uma pessoa mais adequada.
Assim, o Dr. Martins foi convidado (intimado seria o termo mais acertado),
e de intimação em intimação ficou durante vinte anos, até 1985 (ver Boletim
do CVV do mês de março de 1985), nos emprestando irrestritamente o seu
nome, o seu aval e o seu apoio.
Na verdade, para todos nós que convivemos com o Dr. Pedro, ele
continua a ser aquela figura a quem dedicamos a nossa admiração e o nosso
carinho. Em vinte anos de convivência, experimentamos milhares de eventos,
que, relatados, preencheriam as páginas de muitos e muitos Boletins.

Outubro de 1961

No início de outubro de 1961 já havíamos recrutado alguns


voluntários que aguardavam ansiosamente o toque de reunir.

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O primeiro encontro seria naquele mês, e, sem um programa definido,
havíamos convidado diversas pessoas que tinham alguma experiência em
psicologia clínica para proferirem palestras.
Em meio a uma série de pensamentos que corriam velozmente em
nossas cabeças, caminhávamos pela Rua Xavier de Toledo, driblando os
transeuntes e dando “olé” nos automóveis, difícil lembrar o que estávamos
fazendo ali, mas íamos com pressa.
O importante era manter o pensamento positivo e não permitir
esmorecimentos, diante das colocações pessimistas que insistiam em
classificar a iniciativa como descabida.
“Vocês estão mexendo em abelheira” fora o que ouvíramos há
pouco de uma autoridade policial, que completara: – “deixa isso para os
psiquiatras!”
O que, entretanto, mais nos abatera foi o parecer de um publicitário
(comunicólogo, diríamos hoje) que nos alertou sobre a propaganda que, se
mal engendrada, poderia estimular as pessoas ao suicídio.
“Vá em frente”, dizia-nos Armond, com a sua serenidade. “Não
fazem nos outros países? Então poderemos fazer aqui!” e nos convidava
a recebermos os comentários negativos não como desestímulos, mas como
mensagens de prudência.
Quando estávamos na esquina da Sete de Abril, apesar da necessidade
de esgueirar-nos dos pedestres, não pudemos evitar um encontrão com um
estouvado morenão, tipo baiano, que quase nos levou ao chão, e, vejam só,
era o Hélio, velho amigo que não escondeu a satisfação de nos encontrar.
– “Você por aqui?! Justamente eu estava à sua procura. Sabe, é
sobre aquele plantão de prevenção do suicídio, tá de pé a idéia?”
– “A idéia está, porém com um esbarrão destes quem não vai ficar
de pé sou eu.”
Então ele começou a falar com muita empolgação sobre um amigo
seu, colega de trabalho, com quem havia trocado idéias.
– “Ele disse que topa! Ficou muito interessado em trabalhar no tal

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plantão.
E, ato contínuo, passou-nos um cartão, que, neste momento que
redigimos estas linhas o temos em mãos. No cartão que o Hélio nos deu,
anotamos o nome e o ramal: Flávio Focássio, ramal 31, e, no verso: telefonar
2.ª Feira.
Seria longo demais tentar descrever o que representavam os vinte
e cinco anos de amizade que mantemos com o Flávio. Faltariam palavras e
espaço para definir o que aconteceu a partir daquela Segunda-Feira, quando,
de nossa residência, ligamos para ele, convidando-o a comparecer na
Quarta-Feira seguinte, à Rua das Carmelitas n.º 86, onde se daria a primeira
reunião.
Havia cerca de trinta pessoas no salão, e, às oito horas em ponto,
demos início a reunião, convidando os presentes a uma conversa aberta
“enquanto o congressista não chega” (a intenção era ganhar tempo).
As primeiras perguntas surgiram aos borbotões, traduzindo incerteza
e inquietação do grupo. E como respondê-las? Essa era a questão. Torcíamos
desesperadamente pela chegada do conferencista, mas os minutos passavam,
e nada...!
Eram quase oito e quarenta quando vimos no fundo da sala o
Shimizu, e por que cargas d’água ele estava ali é o que nos perguntamos
até hoje, mas foi a luz que se acendeu! Idéia! (Eureka, como diriam os
eruditos).
– “O Shimizu, vem cá um instantinho.”
E assim, tendo o Shimizu como auxiliar, como cobaia seria o mais
certo, iniciamos uma aula de Socorros Urgentes, e o que aconteceu depois,
deixamos ao Flávio o trabalho de relatar.
Na quarta-feira seguinte o conferencista apareceu! Antes tivesse
mancado, pois pretextando prudência (talvez em excesso) mostrou os perigos
de um trabalho como o em projeto. Usando terminologia técnica, descreveu
os tipos que nos procurariam e a complexidade das providências que teriam
de ser tomadas em nível de psiquiatria, psicologia e de serviço social. No fim

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do discurso tomou-nos as fichas dos inscritos e a um-a-um indagava sobre
as experiências no terreno do trato com pessoas emocionalmente abaladas,
e a profissão que exercia.Ao terminar devolveu-nos as fichas, dizendo
enfaticamente: “Você está com um material humano fraquíssimo...”
Uma coisa boa restou dessa primeira conferência: a recomendação
para lermos o livro de Menninger, “O Homem Contra Si Próprio”, cujas
páginas até hoje nos são motivos de leituras.
Na Quarta-Feira seguinte o salão da Rua das Carmelitas estava vazio,
somente catorze pessoas voltaram após a ducha fria da semana anterior.
Não nos lembramos quem teria sido o convidado a proferir a
palestra, pois, essa não houve: – o conferencista não apareceu...

Novembro de 1961

O ano de 1961 chegava ao fim e as lojas, com antecipação,


começavam a exibir os alegres adornos natalinos.
Para aquele mês havíamos convidado quatro conferencistas, dois dos
quais, a exemplo dos anteriores, não deram os ares da sua graça, entretanto,
os outros vieram e, beneficamente iriam influir no rumo da incipiente CVV,
elevando o grupo inicial a um clima de forte determinação e otimismo.
Para a primeira quarta-feira do mês havíamos convidado a Assistente
Social, Nancy Puhlmann Di Girolamo, cujas atividades no campo de amparo
à infância notabilizaram-na perante a sociedade paulistana.
Iniciou sua prelação com breves palestras a todos saudando e
recomendando a leitura do, hoje sobejamente conhecido, “A Entrevista, Seus
Princípios e Métodos”, de A. Garret, e se colocou disponível a perguntas.
Quando interpelada sobre a validade do nosso almejado projeto,
responde com sinceridade e emoção:
– “A campanha que hoje vocês iniciam, se ao longo de cem anos
tiver salvo uma vida, uma só, já estará justificada.”
Se o conteúdo global da palestra da Nancy caiu no ouvido, a frase

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acima transcrita é até hoje bem lembrada por todos nós.
A palestra da semana seguinte esteve aos cuidados do Dr. Wilson
Ferreira de Mello, renomado psiquiatra.
O Dr. Wilson foi um verdadeiro sucesso! Falou-nos sobre os biótipos
de Ernesto Kretschmer, incentivou-nos eloqüentemente a prosseguirmos,
finalizando, na sua reconhecida modéstia e humildade, com a seguinte
afirmativa:
– “Dentro de dez anos vocês estarão entendendo de desespero e
ansiedade mais do que eu.”
Conforme podemos deduzir, o mês de novembro de 1961, mesmo
com a ausência de dois expositores, foi muito importante na história do
CVV. Preenchemos as duas lacunas comentando as palavras da Nancy e
do Dr. Wilson. As primeiras apostilas estavam no prelo, com desenhos do
Nelson de Oliveira e já se cogitava trocar a designação do trabalho, pois,
segundo argumentavam alguns, Campanha de Prevenção de Suicídio não
era um nome muito adequado.

Dezembro de 1961

Segundo a nossa programação, havíamos deixado os preparativos


finais para os meses de dezembro, janeiro e parte de fevereiro, quando, em
férias, poderíamos dedicar quase tempo integral ao CVV.
Com o passar dos meses, íamos agenciando os assuntos pendentes,
tais como, elaboração de material publicitário, busca de espaço nos meios de
divulgação, preparação dos impressos de uso interno, programação das aulas
finais do curso, providenciar o local e o telefone, contatos com autoridades,
apostilas, etc.
Segundo os nossos cálculos, com dedicação plena chegaríamos ao
fim de fevereiro prontos para o início das nossas atividades.
Tudo se ajustava como uma luva. Na Escola, fecháramos em todas
as matérias, e os únicos compromissos que tínhamos para os meses seqüentes

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eram as aulas que ministrávamos no conhecido, na época, Curso Torres.
Ora, duas tardes por semana não fariam mal a ninguém.
Em fins de novembro recebêramos a encomenda de um serviço tipo
de “mãe para filho”, que viria reforçar substancialmente o nosso orçamento
– redesenhar as plantas do Instituto Caetano de Campos, o monumento da
Praça da República, onde hoje funciona a Secretaria da Educação, serviço
fácil que poderia ser realizado madrugada adentro ao som do tradicional
“Varig, dona da noite”.
Entretanto, como diria depois o nosso grande amigo e professor
José Justino Castilho, “nem sempre as coisas acontecem como nós
gostaríamos!” e assim foi, uma guinada de 180 graus nos obrigou uma série
de improvisações, e nos distanciou do grupo por todo o período, do início de
dezembro ao fim de fevereiro.
Em meados de novembro chegou aos nossos ouvidos que naquele
ano o recrutamento militar iria dispensar cinqüenta por cento do contingente.
Exultamos! Certamente ficaríamos livres de tão pesado encargo – ledo
engano.
Na primeira semana de dezembro dirigimo-nos à Rua Alfredo Pujol,
no Bairro de Santana, onde se situa o Solar das Andradas, sede até hoje do
CPOR-SP, tranqüilos, na certeza de que seríamos dispensados... Os ventos
sopravam tão favoravelmente... e um soprãozinho a mais...
Estávamos no grande pátio e conversávamos descontraidamente
quando um Oficial, o Tenente Brasil Alves, subindo num podium, falou pelo
megafone: – “Quem nasceu em mês par, comigo! Rápido!”
E não deu outra! Seguimo-lo na esperança de recebermos a dispensa,
mas ao chegarmos no almoxarifado, ganhamos um par de coturnos e dois
jogos do sétimo uniforme, (sétimo uniforme era o uniforme de serviço). Ato
contínuo à barbearia para o corte “cadete”. Em poucos minutos estávamos
transformados (e transtornados) em aluno da CPOR-SP.
O expediente na caserna ia das 6 às 18 horas, fora os serviços e
acampamentos. Foi-nos difícil aceitar essa realidade. Hoje, entretanto,

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diríamos que valeu: foi uma boa experiência, onde cultivamos extraordinárias
amizades.
E quanto ao CVV? Os contatos passaram a se limitar ao período da
noite (o serviço de desenho, já assumido, não poderia ser abandonado), e
aos sábados a tarde e domingo, quando não estávamos na escala de serviço
e nem havia acampamentos programados.
Pouco antes do Natal, havíamos convidado uma pessoa amiga para
nos falar sobre doação: – “Como dar de si?” e “O que é doação afetiva?”.
Os temas a todos empolgaram, atraindo voluntários. Fizemos de tudo para
sair mais cedo do Quartel, e às 20 horas lá estávamos na Rua das Carmelitas,
fardados, passando a palavra ao orador.
Havia nos olhares intensa expectação, mas à medida que o
expositor ia falando, sentimo-nos afundar na poltrona – afundar mesmo até
o pescoço, pois, alegando, o orador, tratar-se o CVV uma iniciativa de muita
responsabilidade, e até certo ponto perigosa, ele após alguma reflexão,
deduzira não estar à altura de ministrar a aula ao grupo.
Em pânico pensamos no que fazer! Uma outra aula de Socorros
Urgentes?... Cadê o Shimizu?
Foi quando alguém propôs que entrássemos em férias. Oh Deus!
Mas nem tínhamos começado!
É... entramos em férias! Assumimos o compromisso de nos
encontrarmos em fevereiro de 1962 para os últimos preparativos, pois
estava decidido que iniciaríamos de qualquer forma do dia 1º de março de
1962!

Janeiro de 1962

Por mais que nos esforçássemos, não conseguimos visualizar com


muita nitidez os primeiros dias de 62. A densa névoa do tempo obliterou-
nos as imagens, exceção feita aos exaustivos exercícios no quartel, às
marchas intermináveis, aos acampamentos, familiarização com mosquetões,

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metralhadoras, morteiros, minas ap (não nos pergunte o que vem a ser ap,
pois isso também ficou no passado).
De início, a caserna nos chocou e vivemos momentos angustiantes de
inadaptação perante o sistema e, o que era mais grave, perante os colegas.
Sentíamo-nos como um visitante, ou melhor, como um intruso.
A não aceitação dos colegas, da nossa parte, resultou em um perigoso
auto-isolamento.
Confessamos, caros amigos, que chegamos a experimentar revolta,
sentimento desgastante que nada constrói. Com tanto por fazer, não nos
conformávamos com o “enclausuramento”.
Aos sábados, quando éramos liberados no início da tarde, corríamos
para o velho prédio da Federação Espírita, local onde os futuros voluntários
se reuniam, para trocar idéias com aqueles que ainda lá se encontravam.
Foi no primeiro sábado de 1962 que, ao chegarmos a Federação,
um pouco antes das duas da tarde, cruzamos com o nosso Armond, a quem
pedimos uns minutos de atenção e justificamos a morosidade dos trabalhos
de implantação da Campanha, manifestamos nosso inconformismo,
desabafamos despejando sobre o bom velhinho as amarguras represadas.
Armond, após nos ter ouvido pacientemente, considerou as
vantagens da experiência militar, que procurássemos em todas as lições tirar
a parte boa e que, assim iríamos aos poucos descobrindo valores nos colegas,
nos superiores e no próprio sistema.
Certa feita, na Estação da Luz, quando armado de mosquetão,
pistola, e oito granadas de mão, caminhávamos na plataforma para tomar
o vagão militar que nos levaria aos exercícios em Jundiaí, cruzamos com o
Professor Justino Castilho (já citado) e desabafamos:
“Veja professor, o trabalho de prevenção do suicídio nos esperando,
e nós aqui aprendendo a matar!”
Ao que ele respondeu serenamente:
“Não pense assim, meu caro... imagine outra situação: você está
indo para Jundiaí para caçar patos! Veja como tudo fica mais fácil!”

22
E não é que ficou mesmo!
E assim a fórmula mágica funcionou com fascinantes
transmutações:
– Exercício de tiro no Barro Branco = esporte de gente rica;
– Desmontar e montar armas = quebra-cabeça;
– Montar uma portada para a travessia do Tietê pelas tropas de
Infantaria, em Barueri = lições valiosas de uma engenharia, para nós, até
então desconhecida;
– Acampamento = camping.
Aos poucos fomos nos “enturmando”, conquistando amizades
profundas.
Lembramo-nos com surpreendente nitidez de uma tarde enfadonha,
quando o pensamento e o coração se encontravam fora do quartel em
decorrência de assuntos pendentes do futuro CVV que reclamavam solução,
tinha chegado a nossa vez de sermos examinados na disciplina com um
número de seis dígitos.
“Muito bem 4142 (esse era o nosso número), disse-nos o Capitão
Ribeiro, pode começar!”
Fez-se um clic e o cronômetro disparou. Após o exame escrito e
os testes de tiro com a metralhadora INA-45, tínhamos que desmontá-la e
montá-la em sessenta segundos. E foi um zás-trás! Quando acabamos de
montá-la, o ponteiro do cronômetro passava sobre o zero do sessenta. Ufa!
O Cap. Ribeiro fazia algumas anotações, voltou-se para nós:
“Como é 4142, acabou?”
“Acabei!”, e aí quase desmoronamos... sobre a mesa, ao lado da
INA, jazia (deve ser este o termo certo) uma enorme mola. A recuperadora,
desgranida!
Com a pressa de montar no exíguo tempo, nos esquecemos de inserir
a mola recuperadora, (que, para informação, tinha cinqüenta centímetros).
Pânico... O Cap. Ribeiro levantara-se e ainda consultando as suas anotações
vinha à nossa mesa. Aí, de forma quase impensada, agarramos a tal mola, e,

23
vupt pela janela!
Quase não dormimos naquela noite, pois o dia seguinte estavam
programados exercícios de tiro, o que nos obrigou a chegar ao quartel às
cinco da manhã, acordar o William, o cabo armeiro, passar-lhe uma conversa
fiada, pegar a INA, procurar a mola no jardim, juntar todas as peças, e
devolvê-la ao William.
E assim transcorreu o mês de janeiro, aos trancos e barrancos,
como diz a canção popular, que se não nos enganamos, intitula-se “Cabelos
Brancos”...

Fevereiro de 1962

O mês de fevereiro surgira com amenidades. Havíamos concluído


os desenhos da Caetano de Campos, e recebêramos o anúncio que por ordem
do comandante superior do CPOR as aulas iriam até o dia 15 (alegria!).
Com ânimo redobrado enfrentamos uma violenta carga horária na primeira
quinzena de fevereiro, cientes de que nos sobrariam quase duas semanas
para resolver os pendentes do futuro CVV: local, uso do telefone 33-
3742 (emprestado pela Federação Espírita), divulgação, licenças (seriam
necessárias?), fichas, contatos, mapa de plantão, registros), etc.
Todos os voluntários foram convocados para as reuniões que
manteríamos na segunda quinzena de fevereiro, que, aliás, foram levadas a
efeito com especial dinâmica:
– a denominação do trabalho foi uma sugestão da Alice Monteiro: Campanha
de Valorização da Vida, e sigla CVV;
– o mapa do plantão foi preenchido na lousa com entusiasmo geral;
– a estrutura administrativa da Campanha seria muito simples, exigindo,
além do responsável, um tesoureiro, encargo que foi oferecido ao Flávio
(quem diria que ele iria emplacar vinte e cinco anos assinando balancetes
e cheques!!!);
– após termos consultado juristas de renome que, com toda segurança, nos

24
informaram que a CVV para funcionar dispensaria qualquer autorização
de órgãos públicos, foi confirmado o início das atividades para o dia 1.º
de março de 1962.
Nos últimos dias do mês voltamos a nos reunir visando um repasse
final. O recurso que deveria ser usado, sempre que alguém manifestasse a
idéia suicida, era propor um adiamento. Um rol expressivo de pensamentos
positivos foi distribuído (tipo: “amanhã será outro dia”, “após a tempestade
vem a bonança”, etc.) e, finalmente, foram apresentadas as fichas de registro,
o livro de ponto, e uma pequena relação de profissionais que se dispunham
a dar apoio aos voluntários.
O primeiro plantão, por ser uma quarta-feira, caberia a Misayo.
Ficamos de ligar para ela no dia 1.º pela manhã para lembrá-la do
compromisso.

25
A COMUNICAÇÃO ENTRE POSTOS

Unidade e uniformidade

Durante muitos anos após a fundação do CVV, julgávamos que


a sua tarefa estaria limitada à Capital do Estado de São Paulo, entretanto,
em 1977, com a primeira visita do Chad Varah ao Brasil, sentimos o poder
multiplicativo do trabalho e deduzimos que para os anos seqüentes muitos
Postos seriam criados, despertando-nos a preocupação com a unidade sob a
legenda do CVV.
Estávamos cientes de que a única forma de tornamos compatíveis
a quantidade com a qualidade, ou seja, a fidelidade aos princípios do CVV
diante de um crescimento rápido, só poderia ser mantida através de um
trabalho unido e uniforme.
Naquela época, além da Abolição, existiam poucos postos: Pinheiros,
Sto. André, Porto Alegre, Jundiaí, e São José dos Campos.
Com a perspectiva de uma expansão, iniciamos estudo de processos
que viessem a garantir uma intensa comunicação entre os Postos, visando o
fortalecimento, o equilíbrio e a permuta de experiências.
Até 1977 os Postos enviavam para a secretaria, à Rua Genebra, 168,
relatórios das suas atividades, já havia uma publicação mensal (Boletim do
CVV) e as RPGs eram realizadas em conjunto, às vezes com a participação
de Porto Alegre.

O mais antigo veículo de integração

O já citado “Boletim do CVV”, que sob a denominação Boletim


Trimes-tral, teve o seu primeiro número editado em julho de 1966. Naquela
época visava-se com o Boletim atingir os voluntários, associados e simpatizantes

26
do CVV.
Com a expansão ocorrida após 1979, (segunda visita do Chad
ao Brasil) o Boletim desempenhou um papel muito importante que aliás,
continua a desempenhar até o presente como valioso órgão de integração.
Movidos pelo exemplo do Boletim, outros Postos começaram a
publicar periódicos, circulando-os entre os demais Postos, fortalecendo o
papel inicialmente desempenhado pelo Boletim.

Introdução ao CVV

Em 1977, concluímos ser indispensável a elaboração de um manual


que reunisse os pontos fundamentais para a evolução do CVV, tais como:
Os princípios básicos, como iniciar um Posto, regimento interno,
como dirigir e desenvolver a propaganda, o curso de seleção de voluntários,
a elaboração do relatório mensal, etc.
O manual, que se intitulou “Introdução ao CVV”, ficou pronto em 1979, em
português e uma versão para o espanhol (naquela época o Chad insistia em
estender o nosso campo de responsabilidades administrativas para toda a
América do Sul e Central).
Hoje, transcorridos quase 10 anos, podemos sentir os efeitos
marcantes e decisivos do manual, contribuindo para um crescimento
harmônico, uniforme e unido.
Esta publicação tem por finalidade suprir o vazio causado pela
extinção da “Introdução ao CVV”, em decorrência do desmembramento
ocorrido no CN de 1987, quando mediante sorteios, as atividades atinentes
à diretoria do Centro de Valorização da Vida foram distribuídas entre os
Postos.

Fonopostal-Pioneirismo

Em 1970, com a fundação do Posto de Porto Alegre iniciávamos,

27
em atitude avançada para a época, as comunicações hoje tão usuais em fita
cassete.
Havia uma dinâmica excelente nas comunicações com uma fita por
semana.
Em 1977, inaugurávamos o “correio sonoro”, quando mensagens
aos Postos, relatos de eventos importantes, apresentação e comentários
de programa, etc., eram gravados em fita cassete que, em seguida era
reproduzida por processo de alta velocidade e encaminhada para os Postos.
A este processo, aderiram os demais Postos, que iniciavam a trocar
fono-postais com mensagens de apoio e confraternização. Houve época em
que o fono-postal foi muito utilizado, o que hoje não se observa, certamente,
em decorrência dos custos envolvidos e do equipamento requerido, entretanto,
vale a pena refletir sobre o assunto e se possível voltar à prática.

O Conselho Nacional

A primeira reunião convocando todos os Postos do Brasil, deu-se


no dia 27-08-78 e teve lugar no auditório do “Sindicato dos Trabalhadores
das Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Estado de São Paulo”. A
reunião que de início apresentava um caráter solene evoluiu para um clima
de confraternização descontraída.
Em 1979, ocasião da segunda visita do Chad ao Brasil, foram
realizadas reuniões no Hospital Gastroclínica (Parque do Ibirapuera). Em
sua finalização, no auditório nobre da Fundação Getúlio Vargas, o Chad
propunha a constituição de um conselho nacional, sugestão aprovada por
todos os presentes.
Em 1980 e 1981, foram realizados o primeiro e o segundo CNs nos
quais procurávamos definir uma diretriz para o Conselho.
Somente em 1982 é que a fórmula foi encontrada, quando o
evento teve lugar na Casa de São José, no Município de São Bernardo do
Campo, proporcionando aos presentes um saudável clima acolhedor e não

28
dispersivo.
Contudo, classificamos a consolidação do CN somente em 1984
(5.º CN), quando se decidiu pela presença obrigatória dos Coordenadores
de todos os Postos, o evento caminhava para a autenticidade, uma vez que
entendia-se o conselho nacional pelos coordenadores dos Postos.
Foi nos CNs, nas chamadas Assembléias de Coordenadores que
observamos um crescimento equilibrado do trabalho e onde assuntos de
importância vital foram discutidos e postos em prática, tais como: Vida
Plena, As Máscaras, O Homem do Futuro, Ciclo da Vida, Tópicos do CA3,
etc.
Com o 9.º CN, em 1988, podemos afirmar que o Conselho Nacional,
entre as medidas que foram tomadas no sentido da preservação da unidade e
fidelidade aos princípios, ocupa o primeiro plano.

Encontros Regionais

Os encontros regionais tiveram início em 1980, quando os


companheiros de Goiânia convidaram os voluntários de Brasília e de Belém
do Pará, para um fim de semana de estudos, surgindo, assim, a Regional
Centro-Oeste, cujos encontros até hoje são bastante concorridos.
Em janeiro de 1984 participamos de uma “reforçada” em Araraquara,
(“reforçada”, para aqueles que não sabem, é aula de reforço ministrada em
nível regional), que foi uma experiência marcante, reunindo mais de 200
voluntários de diversos Postos da região e de outras.
Em outubro de 1984, o encontro de Brodósqui, excelentemente
conduzido, consolidava, pelo que pudemos sentir, as atividades regionais,
hoje tão comuns em nosso movimento, tais como os eventos modelares de
Itaci (regional de Limeira) e Santos.
Outras regionais, movidas pelo interesse da união, já, estão,
programando atividades conjuntas, por exemplo Nordeste, Sul, Capital (já
dividida em sub-regionais) etc.

29
Visita entre Postos

Em clima de elevado entusiasmo, o sorteio e as cobranças das


visitas recíprocas têm sido o ponto alto do encerramento dos CN’s, desde o
5.º, realizado em 1984.
Foi no 5.º CN que alguém teve a brilhante idéia de sortear uma
escala de Postos que deveriam ser visitantes e visitados, prometendo que no
ano seguinte, no próximo CN, haveria a cobrança, sob aplausos ou vaias!
É indizível a expectação que ocorre minutos antes do sorteio e o
suspense na hora da cobrança.
O plano de visitas recíprocas foi um projeto que deu certo, todos
os meses dezenas de voluntários cruzam este imenso Brasil para cumprir a
visita programada, levando, e também recebendo, apoio e fraternidade.

As “andanças”

Movidos por compromissos profissionais, que nos obrigaram a


viajar constantemente, aproveitamos, os ensejos e visitamos os Postos do
CVV.
Via de regra, essas visitas giram em torno de uma conversa
descontraída e informal com os voluntários, e, em certas ocasiões, éramos
solicitados para fazer um role playing ou ministrar uma aula.
Assim nasceram as “andanças”, nome atribuído pelo companheiro
Azamar, que se dava ao trabalho de relatar as visitas nas colunas do nosso
Boletim.
Logo em seguida as “andanças” foram reforçadas pelos demais
diretores do CVV e algum tempo após, aderidas por coordenadores
regionais.
Em 1985 e 1986, 10 companheiros “andançavam” pelo nosso
grande país. Naquela época contávamos com uma colaboração da VASP
– Viação Aérea São Paulo, que de acordo com uma programação traçada no

30
começo de cada ano oferecia as passagens a titulo de cortesia.
Em 1988 fez-se uma adaptação do esquema que, infelizmente, não
funcionou: os “andadeiros” (se assim podemos chamar), cujas visitas até
então eram programadas ao final de cada ano, mediante sorteio, colocavam-
se agora disponíveis e aguardavam convites para visitar os Postos. Por
motivos que não conseguimos distinguir, o esquema não funcionou.

Conclusões

Hoje, pesando os fatos e sentindo os resultados, concluímos que o


muito já feito pela unidade nacional do CVV ainda é pouco pelo que se tem
a fazer: o CVV é um programa que sofre um crescimento acelerado, e para
que não nos percamos em desvios ou dispersões em meio à jornada, faz-se
mister envidar esforços crescentes pela unificação.

31
A FILOSOFIA DO CVV

Evolução do CVV

A evolução do CVV é uma demonstração de que em toda a natureza


manifesta-se um aperfeiçoamento constante, é a tão comentada “direção
positiva” que todo o ser (individual ou em grupo) experimenta quando se lhe
são oferecidas condições.
Recomendamos a leitura do livro “Nos Caminhos da Amizade”,
capítulos: “Uma História em Quatro Atos”; “25 Anos” e o que dá o título ao
livro.

Qual a filosofia do CVV?

Diante das constantes indagações sobre a escola ou doutrina religiosa


que teria orientado o desenvolvimento do CVV, propusemo-nos a refletir e
amadurecer, durante longos anos, a resposta para tal pergunta.
Houve certa época em que muitos voluntários do CVV afirmavam-
se rogerianos (seguidores do psicólogo humanista Carl Rogers), mas, em
verdade, quando descobrimos a primeira obra de Rogers (“Aconselhamento
e Psicoterapia”), em 1970, o voluntário do CVV já apresentava um
comportamento nitidamente não diretivo: não mais oferecia conselhos,
proporcionando à outra pessoa total liberdade para tomar decisões e, portanto,
por elas mesmas assumir a responsabilidade.
O artigo publicado no Boletim n. º 138, do mês de novembro/85,
de autoria do nosso companheiro Valetim Lorenzetti, é bastante ilustrativo,
para o qual convidamos a leitura. (O artigo se encontra à página 199, do livro
“Nos Caminhos da Amizade”, sob o título “Rogeriano, Trilogista, Freudiano,
Chadiano. E Samaritano?”).

32
Muitos insistem em afirmar que o CVV ao longo dos seus 25 anos
de trabalho formou uma escola, o que ao nosso ver é uma proposição um
pouco pretensiosa, uma vez que amar o próximo é uma lei natural, tão
natural quanto o ato de respirar.
Compreensão, fraternidade, cooperação e crescimento interior que
constituem os alicerces básicos do CVV se encontram em toda a natureza.

Os princípios básicos do CVV

Como bem esclarece a aula de reforço, os princípios fundamentais


que regem as atitudes do voluntário do CVV são:
a) compreensão empática, ou seja, compreender com a outra
pessoa;
b) aceitação: aceitar a pessoa como ela é, e não como gostaríamos
que ela fosse, segundo os nossos princípios, e valores de julgamento;
c) respeito: respeitar o indivíduo pela simples condição de ele ser,
e, não, em função dos usuais padrões que a sociedade prescreve (títulos
honoríficos ou acadêmicos, status social, condição financeira, etc.).
Estaria incompleta a enumeração dos alicerces básicos se não
incluíssemos a confiança na capacidade que tem o ser humano, de crescer,
sempre para uma condição mais aprimorada, desde que se lhe sejam
oferecidas condições.
É com freqüência, em conversas com voluntários de vários Postos,
travadas durante as nossas “andanças”, surgir a feliz imagem da semente que
tem dentro de si, todos os atributos e também os recursos para o crescimento,
entretanto, se lançada em ambiente hostil, entre espinhos ou em terreno
pedregoso, não irá se desenvolver. Ao contrário, se lhe são oferecidas todas
as condições de temperatura, umidade, iluminação, etc., ela irá evoluir sem
que, para isso, seja necessário que alguém lhe mostre o caminho, lhe sugira
a coloração de suas flores, lhe defina o sabor de seus frutos.
Assim é o ser humano, em condições inóspitas, envolvido por

33
ameaças, não encontra recursos para se superar, transpor os obstáculos,
e crescer. O contrário ocorre quando ele se vê imerso em um ambiente
acolhedor, no qual é aceito como ele é, sendo-lhe facultado falar a vontade,
sobre o que quiser, sabedor que não será alvo de censuras.

Conseqüências

Como conseqüência dos princípios básicos apontados no item


anterior, vamos identificar no voluntário do CVV uma postura profundamente
humanística em suas atitudes na vida diária.
Aos poucos desperta em seu coração, como necessidade básica, o
desejo sincero de amar o próximo. É nesse ponto que surge em sua vida o
que muitos chamam “necessidade de ser voluntário do CVV 24 horas por
dia”, ou em outras palavras, que não se limite o comportamento humanista
tão somente ao seu período de plantão.
Torna-se indispensável comentar que em conseqüência de um
comportamento altruístico, define-se no íntimo do voluntário o conceito de
disponibilidade: ser amigo todos podem e querem ser, mas nem todos estão
disponíveis nas horas mais amargas da experiência.
Acreditando convictamente na capacidade do ser de se desenvolver
num sentido sempre positivo, reconhece o voluntário aos poucos que também
ele faz parte do processo: quanto mais aceito o meu próximo, mais me
aceito; quanto mais me aceito, mais se dilata a capacidade de aceitar o meu
semelhante. Princípio válido igualmente para a compreensão e o respeito.
Surpreende-se, então, o voluntário em um processo contínuo de
renovação interior, revestido muitas vezes de sofrimento e desilusões, mas
compensador no que tange a sua integração como pessoa, trazendo-lhe como
retorno um sentimento inabalável de segurança e, o que tantos almejam, a
harmonia interior.
Gostaríamos de enfatizar que se trata de um autêntico processo de
renovação interior onde os valores cultivados e exteriorizados estão dentro

34
de cada um, tendo assim um sentido definido de dentro para fora, não se
tratando de um processo de indução (lavagem cerebral) onde a motivação e
os parâmetros vão de fora para dentro.

Um exemplo

No fim dos anos 70, cumprindo o roteiro das “andanças”, visitamos


o Posto de Belo Horizonte, hoje denominado Nova Suíça, que na época se
encontrava sobre a coordenação do nosso companheiro Waldir Anastácio.
Tínhamos tido uma reunião com os voluntários e retornávamos por
uma alameda arborizada, distraídos em um bate papo sem rumo, quando
no canteiro central uma pessoa subitamente perde os sentidos caindo sobre
o piso gramado. Sem hesitação o nosso companheiro Waldir, em passos
largos, alcançou o caído, prestou socorros imediatos até que ele voltasse a
si, colocando o num táxi, dando instruções ao motorista.
Retornando a nossa caminhada disse-nos o Waldir com certa
emoção na voz: “O CVV é uma coisa maravilhosa, há um ano atrás eu teria
passado ao largo”.

Os dois campos do CVV

Em nossas reflexões alcançamos a conclusão de que o CVV


apresenta dois belíssimos campos de atividades:
Um resume-se na disponibilidade de um amigo com quem conversar
em atmosfera de ameaça zero, ou aceitação total, portanto sem julgamentos
(censuras ou aprovações).
Outro campo, igualmente de inestimável valor social, compreende
a renovação interior do voluntário, dentro de um benéfico processo de
crescimento também dirigido ao bem e ao amor ao próximo.
É por esse motivo que não nos preocupam as evasões de voluntários,
que consistem, em certos casos, motivo de depressão dos coordenadores

35
de Postos. Na verdade, aqueles que saem são pessoas em processo de
crescimento que aonde estiverem continuarão a semear a mensagem do
CVV, no cotidiano.

Mas afinal o que é o CVV?

Já existiram abordagens, aliás, muito felizes, comparando o CVV


a uma religião, uma vez que desperta no voluntário a maior caridade: o
dar de si, contudo, na nossa forma de entender, resumiríamos, diante da
pergunta que encabeça este item, que o CVV é uma proposta de vida, uma
excelente alternativa neste mundo atormentado de conflitos, violências
e ilusões.

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VIDA PLENA

Origens

O Posto da Abolição havia programado para o ano 1983 o estudo


sistemático do livro “Tornar-se Pessoa”, de autoria de Carl Rogers, tendo
sido a sua finalização marcada para o dia 09-11, quando foi abordado o
capítulo sobre Vida Plena.
Naquele dia, a sala de reuniões da rua Genebra, 168 se encontrava
repleta. Inexplicavelmente mais de 40 pessoas, entre voluntários da Abolição
e de outros Postos da Grande São Paulo, estavam presentes.
O desenvolvimento do assunto se deu com intensa participação em
clima de crescimento e entusiasmo.
Sentia-se no ar uma atmosfera de transformação, e nos olhos dos
participantes estampava-se o sinal de descoberta.
Desse encontro nasceu a sugestão de se incluir o tema Vida Plena
no próximo CN, onde (em abril de 1984) iríamos viver o ponto de partida
para os exercícios, hoje proveitosamente praticados em todas as reuniões de
grupo.
Trata-se de um tema bastante rico que nos traz uma série de
revelações, induzindo-nos; por conseqüência, à reformulação da nossa
pauta conceitual.

As Grandes Revelações

Todo homem, em sua caminhada, delineia um estado ideal que varia


de pessoa para pessoa, para o qual se dirige, envidando todos os esforços.
Atingir o estado ideal seria, segundo pensam, ingressar na plenitude

37
da vida.
Tomemos o exemplo de um caminheiro que ao encetar a sua marcha
define um ponto de chegada. Até onde sua vista alcança, analisa a paisagem,
e, ao divisar ao longe uma elevação define o cume da montanha como ponto
a ser alcançado, munido de bom ânimo e determinação caminha disposto a
vencer todos os obstáculos.
Aos poucos, evoluindo em sua marcha, começa a entender, ao
se aproximar do alvo, que o estado ideal não é estático, pois, uma vez
alcançado transforma-se em real, ou seja, ao chegar ao cume da montanha
conquistou uma posição real e, maravilhado pela paisagem que se descortina
em sua frente, define um novo ponto de chegada que muito em breve, ao ser
alcançado, será igualmente transformado em novo ponto de partida.
Em certos momentos, no intervalo reservado ao descanso, passa a
refletir que seu ideal jamais poderá ser alcaçado, onde encontrará ele, a vida
em toda a sua grandeza e plenitude?
A resposta vem dele mesmo: Vida Plena é caminhar, e, não alcançar.
Em outras palavras poderemos entender que vida plena é um processo e não
um estado.
E assim, embora seja necessário tenhamos um ideal e que não
o percamos de vista, vamos aprendendo que a grandeza da vida não se
encontra num ponto definido, mas sim, no fato de estarmos caminhando em
sua direção.

Vida Plena

Vida Plena é uma rota ascensional onde nos extremos identificamos


de um lado a animalidade, e, no oposto, a espiritualidade, ou o homem
animal (defensivo) e o homem espiritual (aberto à experiência).
Caminhar pela rota ascensional é um processo de gratificações
intensas, no qual nos afastamos do estado defensivo e nos aproximamos da
condição de abertura.

38
Com isso, somos convidados a uma importante renovação de
conceitos:
Bom, contrariamente ao que pensávamos, não é aquele que alcançou
um elevado estado na rota ascensional, mas, aquele que está caminhando.
Logo, todos podem ser bons, independentemente do ponto em que nos
encontramos no percurso. Mais vale o habitante das trevas que se esforça
por crescer do que o arcanjo que, satisfeito com a sua posição elevada,
estaciona.
Agora confessamos aos prezados leitores que passamos a entender
com mais riqueza, o ensinamento que recebemos de um velho professor:
“quando você pára de melhorar você deixa de ser bom”.

Os Extremos da Rota

Antes de falarmos sobre a condição de abertura em todos as suas


conseqüências benéficas, vamos nos deter um pouco em comentários sobre
o estado defensivo.
Entendemos o estado defensivo, no qual identificamos, em tudo e
em todos, ameaças, como vestígio de animalidade, que, de acordo com a
teoria da evolução da espécie, teríamos herdado de nossos ancestrais.
Dispensável seria tecermos comentários sobre o comportamento,
defensiva do animal como benéfico, e, também, indispensável para a sua
sobrevivência, entretanto há cerca de 40.000 anos surgiu a homem no
cenário terrestre, tendo dentro de si, ao lado do instinto, a razão.
Com a razão aprendeu a discernir, e, discernindo, passou a assumir
a responsabilidade pelos seus atos.
Paremos um pouco para pensar e ponderemos: quão instintivo
(defensivo) é ainda o homem moderno, e chegaremos à conclusão que a
experiência da razão ainda é muita nova, deixando-se o homem muitas
vezes se conduzir para ações puramente instintivas.
É o homem animal que ainda não aprendeu a viver com todos

39
os privilégios que a natureza lhe outorgou. E, assim, ainda somos muito
defensivos.
Rotineiramente saímos às ruas protegidas por um escudo invisível
tão espesso, tão reforçado, que chega, assim como acontecia aos cavaleiros
medievais, a dificultar a locomoção e a obliterar a visão.
Tão “protegidos” estamos que mal conseguimos ver a beleza que há
no sol, nas flores, nos pássaros e também nas pessoas.
Aceitamos os fatos com reservas, segundo um critério seletivo,
admitindo somente aqueles que se identificam com os nossos padrões e os
demais são rechaçadas, consciente ou inconscientemente.
E por assim fazermos perdemos a oportunidade de viver a vida em
toda a sua riqueza e plenitude.
E então, saímos por aí falando em dia bonito e em dia feio, como se
realmente existissem dias feios.
A pior situação é a daquele indivíduo que em profunda defesa não
aceita a realidade como ela é, chegando a pretender alterá-la. É o caso de um
indivíduo que ao observar um pôr do sol acha que o fundo deveria ser mais
azulado e não tão vermelho como está aparentando.
Tão defensivos somos que diante da dúvida ou do desconhecido,
via de regra, optamos pela rejeição. Vejamos o exemplo seguinte:.
Quando, nos albores da década de 50, foram descobertas na
Cordilheira do Himalaia, as enormes pegadas de um ser desconhecido, não
hesitaram em denominá-lo “O abominável homem das neves”. .
Anos passados foi organizada uma expedição patrocinada por uma
fundação norte-americana, visando pesquisar “O Abominável” .
A equipe, antes de partir para o oriente, posou para as máquinas
fotográficas da imprensa, revelando, para o nosso espanto, caixas e caixas
de munição, metralhadoras, granadas e até um pequeno canhão.
Foi no ano de 1962, na extinta revista “O Cruzeiro”, que um colunista
fez a feliz indagação: não seria, talvez, “O Abominável” boa gente?

40
A Abertura

À medida que o processo se desenvolve em nossa rota ascensional,


nos distanciamos do estado defensivo e nos aproximamos da condição de
abertura às experiências.
Uma pessoa aberta às experiências, reconhece que os fatos são
sempre amigos, sem exceção, pois expressam a realidade e a realidade, por
sua vez, desprovida de ilusões, é sempre enriquecedora.
“E os fatos negativos?” Foi o que nos perguntaram certa feita, “São
também amigos?”
Na verdade não existem fatos negativos, todos são positivos, pois
nos ensinam, embora, possam às vezes parecer desagradáveis. E, por falar
nisso, consideremos que em termos de crescimento interior o fracasso é mais
valioso do que o sucesso, pois nos obriga a revisões, reestudos, correções,
traduzindo-se em verdadeiro aprendizado, coisa que nem sempre o sucesso
proporciona. Conclusão: os fracassos não existem!
Reconhecendo os fatos como amigos e o valor da experiência,
saímos às ruas, para a vida, de “peito aberto”, sem temores, desprezando
paulatinamente os mecanismos de rejeição inconsciente que tão caro nos
custam ao equilíbrio interior.

Uma vivência plena

Sem manipularmos os fatos, ou distorcê-los para encaixá-los no


esquema de padrões preconcebidos, aceitamos a vida como ela é, deixando-
nos conduzir pelo seu curso natural que flui harmoniosamente.
Tal como o aficionado à canoagem, esporte que se difunde agora
também no Brasil, ao ser lançado nas águas impetuosas do rio, não tenta
modificar o seu curso, e, nem tampouco, remar contra a correnteza. Deixa-
se levar, apreciando a natureza com todas as suas cores, concentrando seus
esforços para mudar o que pode ser mudado”.

41
Assim fazendo, deixando a vida fluir, aceitando os fatos sempre
como experiências enriquecedoras, passaremos a viver a vida em toda a sua
plenitude.
Desarmados de defesas, identificaremos a beleza que existe nas
pessoas, as quais passaremos a olhar livremente de rótulos ou generalizações
mas como seres diferenciados.

Limitações e Liberdades

Comentaram certa feita: ver a vida como ela é, sem ilusões, seria
uma experiência muito difícil. Não nos esqueçamos, entretanto, que em
contrapartida o contato direto com a realidade nos proporcionará uma visão
de todas as belezas até então ocultas aos nossos olhos.
Contestaram-nos, outra feita, que deixar-se levar pela correnteza
significaria anulação da nossa vontade, com o que em parte concordamos
uma vez que devemos ter “coragem para mudar o que pode ser mudado”.
Em contrapartida, permitir que a vida possa fluir desenvolve no
ser em grau superlativo, a criatividade. Tal como o canoeiro do exemplo
citado que se vê obrigado a improvisar uma série de remadas para evitar um
obstáculo ou um capotamento.
Ocorreu com um amigo nosso, que convidado a tocar música erudita
em violão, diante de um grupo seleto, no primeiro minuto teve o bordão do
instrumento rompido, fato que certamente lhe daria o direito de maldizer
a Deus e a todo mundo, e sair batendo os pés revoltado com a situação,
entretanto, usando da sua criatividade, durante quinze minutos dedilhou o
instrumento, expandindo ao máximo a sua capacidade criativa, inventando
novas posições, de modo a concluir o concerto e arrancar aplausos delirantes
da platéia, que percebera desde o início que o bordão havia estourado.
Há quem diga que ao aceitarmos a realidade, esta é tão definida que
em qualquer situação da vida teremos poucas opções. É realmente o que se
passa, temos poucas opções, mas apesar de poucas todas serão factíveis.

42
Contrariamente, a pessoa defensiva, que não consegue ter uma visão nítida
da realidade, tem muitas opções, mas nem todas exeqüíveis.
Vejamos o exemplo:
Em certa ocasião visitamos uma grande confecção situada no sul do
país, na qual estávamos realizando um serviço profissional, e, presenciamos
numa sala de passadeiras uma discussão acalorada, pois os funcionários
estavam pleiteando junto à gerência a instalação de uma nova prensa de
passar, então dizia um:
– Se ele não me der a máquina que estou pedindo, vou pegá-lo e
jogá-la dentro daquela lavadeira.
Um outro, não menos exaltado:
– E eu?... Eu jogo essa fábrica dentro do rio (realmente a fábrica
situava-se à margem de um rio).
E um terceiro aduzia de forma igualmente enfática:
– Eu solto uma bomba em cima dessa fábrica.
Aí vemos no exemplo que para o problema em questão, de imediato
apresentaram três opções, entretanto, convenhamos, nenhuma delas
exeqüível.
Foi aí que se manifestou um senhor bastante sereno. Com palavras
calmas dirigiu-se aos demais:
– Para pedirmos a nossa prensa, temos que justificá-la, com o
aumento da produção e a venda de duas prensas antigas.
Conquanto a sua visão identificasse somente uma opção era a única
viável.

O Exercício de Vida Plena

Já em 1984 começamos a fazer uma série de exercícios, os quais


eram intitulados “Vida Plena”, que consistiam em uma reunião de grupo em
clima totalmente descontraído, alguém iniciava o exercício espontaneamente
tecendo comentário sobre comportamentos defensivos, e, os outros, à medida

43
que se sentiam estimulados davam a sua participação.
Em 1985, no 6.° CN, havíamos alcançado uma condição excelente
nos grupos de vida plena: o crescimento embora nos minutos iniciais fosse
lento quase sem ação, bastava o “pontapé inicial” para que a evolução se
processasse muito rapidamente, assemelhando-se em certos casos a uma
explosão de reformulações e conquistas.

44
CICLO DA VIDA

Sugerimos, inicialmente, a leitura do capítulo do livro “Nos


Caminhos da Amizade”, de autoria do Alan (CVV-Ribeirão Preto), intitulado
“Ciclo da Vida: Sentimento, Pensamento e Ação”.

A Experiência do Sentimento

Quando Carl Rogers se propôs a uma exposição sobre o processo


terapêutico (livro “Tomar-se Pessoa”, capítulo VII do texto original),
apresentou as diversas posturas do ser em sua evolução, desde o estado de
total fixidez até a condição dinâmica de processo, diante da experiência do
sentimento: da negação até a expressão livre.
Via de regra, o homem nega a experiência do sentimento
classificando-a como sinônimo de fraqueza e vergonha, rejeitando, assim, a
possibilidade do auto-conhecimento, e sem se conhecer toma-se impossível
a auto-aceitação.
O refrão popular: “um homem não chora” exprime bem essa
realidade do mundo moderno. Colocando barreiras diante da experiência
do sentimento, reprimindo-o, não se permitindo “sentir o que está sentindo”
dificulta o seu caminhar em direção do auto-conhecimento.
Por não se conhecer, não se aceita, e, de forma consciente ou
inconsciente, faz uso das máscaras dispendendo considerável soma de
energia para manter uma aparência.
Uma pessoa que passa por experiência frustrante e se nega a sentir
a sua frustração, mantendo aparência do indivíduo bem sucedido, desvia
energias preciosas da sua vida diária para sustentar a máscara sobre a face.
No momento em que aceita a sua frustração, permitindo-se experimentá-la
e, vivê-la, chega mais perto de si mesmo, caminha para a autenticidade, e,

45
em se aceitando, remove as máscaras para ser o que realmente ele é.
É nesse momento que coloca a energia, desviada até então, para
uma finalidade nobre: a liberação de idéias criativas.

Os Ciclos da Vida

Em uma palestra proferida aos plantonistas da Abolição, a Dra.


Esther de Morais esclareceu que na natureza tudo se processa segundo
ciclos, por exemplo: ciclos biológicos, metabólicos, históricos, agrícolas,
planetários, etc. e a evolução do ser, que também faz parte da natureza,
igualmente se processa segundo ciclos.
Rotineiramente, quando nos defrontamos com um problema, a
primeira colocação quase que imediata é partirmos para a ação a fim de
neutralizá-lo. Não raro nos negamos até a pensar sobre o assunto.
Somente após várias tentativas infrutíferas é que nos reservamos o
direito de parar um pouco para pensar, e na maioria das vezes nem sequer
chegamos a viver o sentimento envolvido.
Assim agindo, estaremos percorrendo o ciclo da vida em
sentido contrário ou, segundo a Dra. Esther, estaríamos provocando um
“atropelamento”.
Na verdade o ciclo da vida se processa na seqüência harmônica:
sentimento-pensamento-ação.
O que eu estou sentindo diante do problema?
Em seguida poderíamos nos perguntar:
– O que eu penso a respeito?
E finalmente:
– O que devo fazer?

O CVV e o Ciclo da Vida

A postura do voluntário que procura, através de uma conversa, viver


os sentimentos e as emoções, naturalmente induz a outra pessoa a sentir-se,

46
em outras palavras, a viver livremente a experiência do sentimento.
Como é que você está se sentindo?
É esse o comportamento do voluntário ao se dirigir à outra pessoa
numa descontraída conversa de coração para coração, deixando-a bem
à vontade para expressar livremente através do pranto, da revolta, ou do
desapontamento o que ela está sentindo.
Nem sempre, convenhamos, o voluntário é compreendido,
pois “barreiras muito sólidas aparecem, não permitindo que a pessoa
“se sinta”. É comum, em resposta à indagação do voluntário, ouvir-se a
dissertaç/detalhada do problema em si, requerendo do voluntário uma nova
indagação:
– “Mas como é que você está se sentindo?”
Observamos que vivendo a experiência do sentimento, advém,
como conseqüência natural, por exemplo, após o pranto, uma fase benéfica
de criatividade na qual o problema é dissecado com maior clareza, reduzido
a dimensões suportáveis, para, em seguida, alcançar a esfera da ação,
quando a pessoa nos informa sobre o que ela vai fazer, significando que se
não encontrou ainda uma solução para o problema, achou a fórrmula para
com ele conviver: uma atitude de aceitação da realidade.

Conclusão

O sentimento-pensamento-ação é o que a Dra. Esther denominou


“Ciclo da Vida”, por outro lado, ação-pensamento-sentimento é o que se
chama “atropelamento”, ou seja, caminhar no sentido inverso da evolução
natural, do ciclo natural.

Um diálogo interessante

– “Para encurtar uma história longa eu vou direto ao assunto!”


Foi assim que teve início o nosso diálogo naquela noite chuvosa de

47
uma quarta-feira, logo após ele ter-se instalado na poltrona diante de mim.
– “Hoje me arruinei..., até ontem, embora não me considerasse um
homem rico, eu tinha tudo: dinheiro, propriedades, rendas, títulos e hoje
perdi tudo que tinha... tudo!”
Fez-se silêncio. Ele manifestava uma tensão crescente e contagiante,
permaneceu assim durante alguns minutos, esfregando nervosamente as
mãos, com respiração ofegante e prosseguiu:
– “Não sei o que você pode fazer por mim e também não sei o que
é que eu estou fazendo aqui, mas a verdade é uma só, hoje não tenho mais
nada, pelo contrário tenho algumas dívidas pesadas...”
O tempo passou e ele se acomodou melhor na poltrona, procurando
infrutiferamente descontrair-se.
– “Não sei se devo importuná-lo com o meu problema, e também
não gostaria muito de tocar nesse assunto porque me revolve o estômago.
Como eu lhe disse, nem sei o que estou fazendo aqui!”
– “Como é que você está se sentindo?”
– “Eu sinto que preciso de um advogado, pois o que aprontaram
para mim é passível, segundo acho, de uma abordagem jurídica”.
O nosso interlocutor se situava com nitidez no campo da ação.
Diante da pergunta: “como é que você está se sentindo?”, respondeu sem
pestanejar sobre as ações que iria tomar no dia seguinte, fazendo-nos voltar
com a indagação:
– “Diante de tudo isso, como é que você está se sentindo?”
Não foi fácil para ele remover as barreiras. Após algum tempo
declarou que se sentia vencido, trazendo sobre os ombros o peso de uma
derrota.
– “...sinto-me derrotado, falido, como alguém que não teve
suficiência para enfrentar uma batalha, um fraco!”
Foi nesse momento que o seu desespero, aos poucos, dava lugar ao
pranto.
– “Veja você a que ponto cheguei: Na frente de um homem,

48
chorando como criança!”
Sentindo-se aceito, mesmo na condição de um derrotado, discorreu,
já com certa naturalidade, sobre o que ele sentira pela manhã o desejo de
inclusive pôr fim a tudo, a vontade de acertar as contas, e a vergonha que iria
sentir ao se encon¬trar com amigos. Parou e voltou a nos perguntar:
– “O que você acha que eu devo fazer?”
– “Você já pensou sobre o assunto?”
– “Não, ainda não, foi como um furacão, não tive sequer tempo
para pensar!”
Mais alguns minutos de silêncio.
– “Agora eu consigo entender bem, mas veja, encarando os fatos
com clareza, financeiramente eu estou destruído, e volto a lhe perguntar “o
que eu devo fazer?”.
– “O que você gostaria de fazer?”
– “Agora eu vou descansar e amanhã começar tudo de novo, aliás
não é a primeira vez que recomeço a minha vida”.
Aí vemos um quadro que de início espelha o nosso comportamento
diário, diante de um grave problema: a busca para a solução sem sequer
termos parado para pensar. Identificamos a facilidade com que a outra pessoa
aceitou, embora, no início, com certa relutância, viver o seu sentimento,
reconhecer as suas limitações, sentir-se mais ele mesmo para depois pensar,
e, em seguida agir.

49
COMO FUNDAR UM POSTO DO CVV

CVV é trabalho desenvolvido somente por voluntários. Para se


começar um Posto numa cidade ou num bairro de uma grande cidade (onde
não exista outro Posto em funcionamento), é necessário o entusiasmo e
idealismo de três a quatro pessoas da comunidade. Essas pessoas formam,
então, um comitê. Esse comitê, informal a princípio, será, mais tarde, o
primeiro grupo executivo do Posto e poderá constituir a primeira diretoria
da entidade jurídica que deverá dar cobertura ao Posto.
Os membros do comitê devem: a) procurar local para funcionamento
do Posto (duas pequenas salas e instalações sanitárias, pelo menos); b) buscar
uma entidade jurídica (tipo entidade filantrópica ou de serviço) que possa
dar cobertura ao trabalho do CVV, ou, c) fundar uma entidade filantrópica,
sem fins lucrativos, para dar essa cobertura. Esta entidade não pode levar
o nome de CVV, Centro de Valorização da Vida, ou Samaritano; d) iniciar
campanha de divulgação para arregimentação de voluntários a fim de ser
ministrado o primeiro Programa de Seleção de Voluntários. Para ministrar
esse curso, o comitê pode contar com o apoio de voluntários experientes
de postos já existentes na região ou de outras cidades do país; e) adquirir,
alugar, ou obter por empréstimo, pelo menos um telefone de número de
fácil memorização. Lembramos que, por determinação da Telebrás, o final
4111, sempre que possível, deve ser entregue aos Postos do CVV.
Fundada a entidade, ou conseguida entidade já existente para dar
cobertura e ajuda de manutenção do novo Posto, o comitê transforma-se no
primeiro grupo executivo, indicando, entre seus membros, o coordenador
do novo Posto. No caso de se fundar uma nova entidade jurídica, o ideal é
ter em sua diretoria os mesmos elementos que comporão o primeiro grupo
executivo.
O comitê, desde sua constituição, terá todo apoio do Centro de

50
Valorização da Vida, de São Paulo, bem como dos Postos mais próximos.
Para tanto, o comitê, deverá contactar a Secretaria do CVV -São Paulo ou um
dos Postos da região. Quando o comitê tiver conseguido a entidade jurídica,
as instalações do Posto e estiver em andamento o curso para seleção do
primeiro grupo de voluntários, deve solicitar credenciamento à Diretoria
do Centro de Valorização da Vida, diretamente, ou através do Posto que
mais lhe tem dado apoio. O novo Posto só pode começar a funcionar, para
o público, após seu pedido de credenciamento haver sido aprovado pelo
Conselho Geral do CVV, que pode se reunir em qualquer tempo, em prazo
rápido.
Iniciado o novo posto, o coordenador obriga-se a: 1) enviar
mensalmente relatório de atividades à secretaria em São Paulo; 2) participar
- juntamente com outros plantonistas de seu posto - das reuniões regionais
programadas, com vistas a reciclagem e permuta de experiências; 3)
participar do CN (Conselho Nacional), que se reúne uma vez por ano com a
presença de coordenadores de todo o Brasil. O coordenador que não puder
participar do CN, automaticamente estará transferindo seu cargo para o vice
ou o plantonista que dele tiver participado.

51
DIVULGAÇÃO

O CVV precisa de divulgação para: 1) recrutar voluntários; 2)


informar ao público a disponibilidade do plantão.
A divulgação, portanto, é essencial. Ela deve ser objetiva e sóbria.
Deve contribuir para manter em alto padrão a imagem que o CVV construiu
até agora. Deve ser verdadeira, transparente.
Existem várias formas de se promover a divulgação do trabalho. A
seguir vamos enumerar as que consideramos mais importantes:
1. Entrevistas - Se o jornalista procurar um Posto em busca de
informações para divulgação, deve ser atendido por pessoa autorizada.
Cada Posto deve ter um plantonista encarregado de falar com a imprensa,
ou de facilitar o trabalho da imprensa. A entrevista pode ser para órgãos da
imprensa escrita, para emissoras de rádio ou para televisão. Para órgãos
da imprensa escrita, o entrevistado pode dar detalhes; rádio e TV exigem
respostas rápidas e bastante objetivas.
2. Anúncios - O CVV tem uma linha definida de anúncios que
não deve ser esquecida quando um Posto decidir fazer sua propaganda
com ajuda de alguma agência especializada. Nas páginas a seguir, damos
alguns exemplos desses anúncios, como referência. O anúncio é uma peça
informativa onde podemos “dar o nosso recado” diretamente ao público.
O importante é conseguirmos espaço gratuito para publicação do anúncio
no jornal, na revista, na revista de empresa (“house organ”), ou, mesmo no
rádio e na TV na forma de comerciais ou “spots”.
3. Cartazetes - São “pôsteres” com a mensagem do CVV que
podem ser afixados em locais de grande afluência ou circulação de público,
tipo igrejas, templos, centros espíritas, bancos, estações, hospitais, escolas,
ônibus, trens, postos de gasolina, repartições públicas etc. Também o
cartazete deve ter mensagem muito objetiva, com destaque para o número

52
do telefone e o horário de funcionamento do plantão.
4. Volantes - São pequenos papéis com rápido esclarecimento do
trabalho do CVV e o telefone e horário do plantão. Para ser distribuído ou
deixado em: bancas de jornal; salões de barbeiro, cabeleireira, manicures;
pronto-socorros; escolas; templos; etc.
5. Palestras - Deve cada posto do CVV fazer. um levantamento
de entidades e escolas da comunidade onde possam ser proferidas palestras
sobre o nosso trabalho. Cada Posto deve ter um ou mais plantonistas
treinados para essas palestras. Ao final de cada palestra pode-se deixar o
volante à disposição dos presentes.
A comunicação pessoal - via palestras ou debates - é muito
importante para credibilidade do trabalho. Mas, cuidado: quem for fazer a
palestra não deve esquecer os nossos fundamentos: respeito e aceitação à
pessoa, e não enveredar por caminhos profissionais ou técnicos. Explicar
com simplicidade a singeleza de nosso trabalho: ser amigo e nada mais.
6. Notícias - Periodicamente, o Posto do CVV pode distribuir notícias
sobre suas atividades para os órgãos de divulgação de sua comunidade.
Por exemplo: a) texto informando acerca do número de atendimentos
realizados durante o ano (ou o semestre), com alguma relação estatística
demonstrando aumento ou diminuição; b) texto informando sobre um novo
curso (programa) para seleção de voluntários; c) nota sobre a visita, ao
Posto local, de plantonistas de outros Postos, etc.

Coerência da Comunicação

A divulgação, para obter bons resultados, deve seguir sempre uma


linha. Mudar essa linha com muita freqüência causa dispersão, prejudicando
a fixação da imagem do CVV na comunidade. Por exemplo: se adotamos
como linha a informação básica “Um amigo para caminhar junto”, esse
conceito deve estar presente em todas as peças e atividades utilizadas para
divulgação - notícias, cartazete, volante, anúncio, “spot” de rádio, comercial

53
de TV, palestras etc. E esse conceito pode ser utilizado por muitos anos,
com ligeiras modificações em uma ou outra palavra.
Enfim, a comunicação deve, em pouquíssimas palavras, transmitir
a idéia daquilo que se faz no CVV. A comunicação é dirigida para “o outro”;
deve ser coerente, clara e verdadeira.

Boletim do CVV

O CVV, através de sua secretaria em São Paulo, edita uma publicação


mensal - o Boletim do CVV - com notícias enviadas pelos Postos, artigos de
interesse do trabalho e colaboração de plantonistas abordando experiências
sobre a não-diretividade. O Boletim é um bom instrumento de divulgação e
pode ser remetido para alguns líderes de opinião da comunidade onde está
instalado o Posto.
O Boletim do CVV é uma publicação aberta à participação de
todos os plantonistas. A redação do Boletim agradece a remessa de artigos,
notícias e o relato de experiências.

54
Sugestões para Divulgação
(Oferecimento de serviços)
É mais
fácil viver
quando
se tem
um amigo.

56
Em vez de fechar
os olhos
para a vida,
abra
o coração
para um
amigo.

57
Há quanto
tempo
você
não desabafa?

58
Se você não
aguenta
mais essa vida
solitária,
disque 34.2121.
Do outro lado
da linha está
o amigo que você
procura.
59
Quando você
achar que
ninguém mais
no mundo te
entende,
disque 34.2121.
Do outro lado da
linha tem alguém
que quer muito
ouvir você.

60
Mesmo que você
não dê muito
valor à sua vida,
nós damos.

61
Disque
34.2121.
Do outro lado da
linha tem alguém
que quer ouvir
você falar sobre
os seus medos,
a sua solidão e
sua angústia.

62
Disque
34-2121.
O amigo que
você procura
está do outro
lado da linha.

63
34-2121.
Quem tem
telefone
não pode
dizer
que está
sozinho.

64
Sugestões para Divulgação
(Arregimentação de Voluntários)
Você não imagina o que tem de gente triste, solitária e angustiada
nesta cidade. Para que o CVV possa ajudar essas pessoas ele
precisa de voluntários. Gente que saiba ouvir um desabafo.
Você não precisa ter nenhuma experiência. Nem precisa ter
muito tempo disponível: quatro horas e meia por semana são
mais que suficientes. A única coisa que o CVV espera de você é
compreensão, carinho e vontade de ajudar. Venha ser voluntário
do CVV. Os tristes, solitários e angustiados antecipadamente
agradecem.

CVV – LIMEIRA – Fone: 41-0147

(O quadro acima, deverá ser reproduzido ao lado de sugestões específicas de


arregimentação de Voluntários).

67
Você que é bancário, venha atender
alguém que está com saldo negativo de carinho.

Você que é engenheiro,


venha ajudar a reconstruir uma vida.

Você que é publicitário, venha criar


uma nova perspectiva para alguém que
não quer saber de promessas.

Você que é estudante,


venha compreender uma porção de coisas
que não se aprende na escola.

68
Você que é artista,
venha ajudar alguém que não sabe mais
representar o seu papel na vida.

Você que é religioso,


venha trazer um pouco de conforto a quem
não acredita mais no céu.

Você que é dona-de-casa,


venha cuidar de alguém que já
não conta com a família.

Você que é professor,


venha ao CVV
dar uma aula de bondade.

69
Você que é dentista,
venha acudir alguém que tem dores
muito piores que dor de dente.

Você que é funcionário público,


venha conhecer as emoções
de um trabalho sem rotina.

Você que é médico,


venha dar um plantão
num pronto-socorro diferente.

Você que é jornalista,


venha ajudar alguém que não consegue mais
enfrentar as más noticias.

70
Você que é executivo,
venha dar a mão para alguém que há muito tempo
deixou de fazer planos.

Você que é advogado, venha


se dedicar um pouquinho
às leis do coração.

Você que é comerciário,


venha atender alguém que não
compra mais nenhuma briga.

Você que é secretária,


venha atender os telefonemas
mais tristes da cidade.

71
CONVÉM SABER

A seguir estão algumas “dicas” que podem facilitar muito o


funcionamento de um plantão do CVV, bem como ajudar a manter o grupo
dentro das normas humanísticas que devem nortear todo o trabalho.
1. Sistemas eletrônicos - O telefone do CVV não deve ser
confundido com aqueles em que a pessoa que chama apenas ouve uma
mensagem gravada. Um dos diferenciais do CVV é gente, é a pessoa que
atende, é o plantonista.
Por isso não podemos usar fita gravada com mensagem de otimismo
ou assemelhada. O máximo que se permite é o uso de uma fita gravada
(em equipamento tipo “secretária eletrônica”) informando o horário de
funcionamento do plantão, quando o Posto não funciona as 24 horas do
dia. Ou o mesmo tipo de fita e equipamento quando, por exemplo, só há
um plantonista e o Posto possui mais de um telefone; neste caso, quando
tocam estes outros telefones, a “secretária eletrônica” deve informar que o
plantonista está atendendo uma pessoa, e, havendo outros Postos na mesma
cidade, deve dar o número telefônico desses postos.
2. Duplas de plantonistas - Quando o voluntário assume um
horário no plantão, este horário é de sua responsabilidade. Falta ao plantão é
auto-exclusão. Portanto, para evitar imprevistos (doença, acidente, viagem
fora da agenda etc.) deve o plantonista ter sempre à mão, pelo menos, um
outro colega de plantão que possa substituí-lo numa emergência. São as
duplas, que muitos Postos têm estimulado com ótimos resultados.
Exemplo: Carlos e Marcelo formam uma dupla. Carlos faz o P.
20 de 4.a-feira e Marcelo, o P. 20 de 2.ª feira. Carlos, pode eventualmente
fazer o P. 20 de segunda e Marcelo, o P.20 de quarta. Estas condições são
indispensáveis: o mesmo horário em dia diferente. Toda segunda-feira, às

72
20 horas, Carlos procura saber se Marcelo já chegou ao plantão; em caso
negativo avisa o plantonista do horário anterior que ele, Carlos, está-se
dirigindo para o plantão. O mesmo deve acontecer com Marcelo com o
plantão de quarta-feira.
Estabelece-se, entre Carlos e Marcelo, uma “conta-corrente” de
créditos e débitos de horas de plantão. Essa conta-corrente pode ser quitada,
por exemplo, nas férias, desde que haja acordo entre os dois, é claro.
3. Eleição do coordenador - Os plantonistas, divididos em grupos,
periodicamente elegem os respectivos líderes. Os líderes, constituindo o
Grupo Executivo e expressando a opinião dos liderados, elegem anualmente
o Coordenador Geral do Posto. O Coordenador Geral eleito, após haver sido
referendado pela entidade jurídica, escolhe os demais coordenadores: vice-
coordenador geral, coordenador de divulgação, coordenador de estudos,
coordenadores de departamentos etc.
O ideal é ocorrer a eleição para Coordenador Geral às vésperas da
reunião do CN - Conselho Nacional.
Caso a entidade jurídica não referendar a eleição do coordenador
geral, deve explicar suas razões. Nesta hipótese, o Grupo Executivo tenta
uma solução de consenso. Havendo dificuldade para encontro desta solução
deve entrar em contato com o Centro de Valorização da Vida, em São Paulo.
Referido contato deve ser feito via coordenador regional.
4. O Triângulo das Bermudas - Com o intuito de esclarecer que a
nossa atenção deve ser concentrada na pessoa, utilizamo-nos da figura que
foi “batizada” como “O Triângulo das Bermudas’, uma vez que navegando
no mesmo, desaparecem as ansiedades, as tensões e os “grilos”.
O atendido tem liberdade de navegar livremente entre o problema,
o indivíduo e a pessoa (o que representamos pelas setas tracejadas). O
plantonista, porém, só pode navegar no sentido das retas cheias, isto é,
centralizando sempre o assunto na pessoa.

73

Pessoa = Sentimento + Emoção


Indivíduo = (Nome, Endereço, Profissão etc.).

74
ROLE PLAYING

No CVV, a prática do role playing, tem permitido o treinamento


permanente de plantonistas, bem como a expansão do número de Postos.
O role playing é a vivência emocional de um atendimento,
experimentada por um grupo de plantonistas. Um plantonista propõe-se a
viver um atendimento (real ou não), colocando nessa vivência toda a emoção
que ele deve deixar fluir de si mesmo. Outro plantonista é escalado para
fazer o atendimento, e todos os demais do grupo - como participantes ativos
- devem procurar “vestir a pele” do atendido.
Terminado o atendimento - que não precisa ser conclusivo - é dada a
palavra ao que viveu o papel do atendido, para que expresse seus sentimentos.
A seguir, os participantes do grupo que tiverem algo a acrescentar (em termos
de “sentir”, não como um observador de fora), podem expor. Por último, dá-
se a palavra ao “plantonista”, para que ele também possa expor as emoções
que sentiu durante o atendimento.
Ninguém é fiscal de ninguém no role playing. Sua prática
permanente vai levando ao aprimoramento do plantonista, vai tornando o
plantonista mais sensível ao outro, mais respeitador, mais aceitador do outro
como pessoa.
Normalmente há certa dificuldade de o grupo entrar direto na
prática do role playing. Para tanto, utilizamos a técnica de “aquecimento”:
um plantonista expressa uma vivência emocional através da verbalização,
expressão facial ou corporal - e cada membro do grupo, por ordem, deve
traduzir a vivência apresentada. Pode-se repetir essa operação várias vezes,
até perceber-se que o grupo está “aquecido”.
Há algumas variações do role playing. A seguir enumeramos três
delas. O multi-playing, em que um dos presentes vive o papel de uma pessoa
desesperada e todos os plantonistas participam do atendimento, procurando

75
expressar compreensão ou fazer colocações visando à clarificação da
vivência emocional. O líder do grupo pode intervir, para estimular esse ou
aquele colega a uma participação maior. Pode-se fazer várias “rodadas” se
tipo de atendimento.
Auto-playing, quando o plantonista teve um atendimento real ou
viveu um caso doloroso em sua vida particular, tendo assimilado emoções
que lhe são agora pesadas, procura conversar com os demais amigos do
grupo. Essa conversa, um verdadeiro atendimento, permite o desabafo das
emoções e oferece o suporte de que ele está carente no momento.
Postal-playing, quando cópias de uma mesma carta contendo
emoções de alguém devem ser lidas por todo o grupo. Concede-se 15 a 20
minutos para cada qual formular a sua resposta; ao final cada um lê a sua
resposta, abrindo-se para comentários dos presentes.
Em qualquer caso sempre resguardando absoluto sigilo quanto a
nomes ou a quaisquer dados ou circunstâncias indicadoras.

76

VIVÊNCIAS DE PLANTÃO

Muitos perguntam como as pessoas contactam os voluntários no


plantão do CVV. “Que tipos de chamadas vocês recebem”, “o que as pessoas
falam”, “como começa o diálogo entre o plantonista e aquele que chama ou
procura o plantão” - estas são algumas questões que sempre estão presentes
quando o assunto CVV entra em pauta.
Nos quase trinta anos de experiência, reunimos alguns tipos que
consideramos mais freqüentes de contatos com O CVV. Esse material,
normalmente, é debatido no chamado “estágio probatório” depois da conclusão
do programa de seleção de voluntários. Relacionamos, a seguir, algumas
dessas vivências com breves comentários genéricos acerca do comportamento
do plantonista.

Chamadas Obscenas - Foram classificadas de acordo com a chave seguinte:

PORNOGRÁFICAS por hábito indicam hábito


por agressão ou agressão
OBSCENAS

ERÓTICAS exibicionistas indicam frustração


sedutora sexual
masturbação

As chamadas pornográficas, por sua vez, foram divididas em:


Pornográfica por hábito - na qual o atendido se utiliza de pornografia
em sua linguagem diária.
Pornográfica agressiva - quando se utiliza de palavras de baixo
calão para, de forma indireta, agredir o plantonista, devendo este manter

77
sempre atitude de aceitação, compreendendo tratar-se de um desabafo.
As chamadas eróticas, por sua vez, merecem a seguinte
classificação:
– exibicionistas - quando o atendido relata com detalhes experiências
sexuais;
– sedutoras - quando procura envolver o plantonista, exigindo de
forma velada ou declarada a sua participação;
– masturbação telefônica.
Nas chamadas obscenas, sempre que dirigimos o assunto para a
pessoa, desencadeia-se uma conversação de profundo conteúdo emocional
que se distanciará da obscenidade. A atitude de aceitação é dirigida à
pessoa, isto é, “aceitamos o ser obsceno, a pessoa obscena, sem, entretanto,
aceitarmos a obscenidade”. Resumindo: ao ser convidado a participar de
qualquer diálogo obsceno, seja pornográfico ou erótico, e frustradas as
tentativas de retomar à pessoa como centro, o plantonista poderá declinar,
esclarecendo que tal atitude se encontra fora da sua alçada.
Homossexualismo - Em decorrência da enorme pressão social
existente sobre o homossexual (a sociedade não o aceita), ele passa
igualmente a se rejeitar. Uma vez aceito em nossa relação de ajuda, ele se
sentirá valorizado e caminhará por uma auto-aceitação.
Chamadas Mudas - As chamadas mudas foram classificadas em:

Curiosidade
MUDAS Confirmação
Inibição
Eróticas

– Curiosidade - pessoas que querem saber se o CVV existe mesmo,


ao ver propaganda e anúncios.
– Confirmação - indivíduos emocionalmente perturbados que
sentem no CVV uma segurança sem, entretanto, terem dele se utilizado,

78
ou por pretenderem no futuro utilizá-lo, buscam uma confirmação através
de uma chamada muda, procurando verificar se do outro lado da linha há
realmente alguém.
– Inibição - pessoas que telefonam e não conseguem articular
palavra em decorrência do profundo estado de ansiedade.
– Eróticas - certas chamadas eróticas, principalmente tipo
masturbação, muito freqüentemente se apresentam na forma de chamadas
mudas. .
As diretrizes para chamadas mudas: aguardar por alguns segundos,
avaliar atentamente se está havendo progresso e, em caso positivo, aguardar
o tempo necessário até que a pessoa se manifeste. Caso contrário, informar
que “gostaríamos muito de conversar, que compreendemos o silêncio e
convidamos a pessoa a nos ligar assim que se sinta mais descontraída”.
Chamadas Agressivas - Classificadas de acordo com a chave
abaixo:
Em Atendimentos Pessoais sob ação
de drogas

AGRESSIVAS
AMEAÇAS Diretas
Indiretas

– Ameaças Diretas - Quando o atendido, por não ver satisfeitas as


suas imposições, agride verbalmente de diversas formas (ver Chamadas
Pornográficas Agressivas). Ameaça agredir o plantonista fisicamente, ou
mesmo o ameaça de morte. As ameaças indiretas ocorrem no caso em que
o atendido manifesta desagrado em relação ao atendimento dizendo que vai
se matar. Em ambos os casos verificou-se que o plantonista, dirigindo-se à
pessoa, trabalhando com o conteúdo emocional, pode reencetar o diálogo de
forma satisfatória.
– Em Atendimentos Pessoais - Pessoas que durante o atendimento
manifestam-se violentas, chegando a quebrar vidros e móveis do Posto. A

79
nossa experiência tem constatado que, quando tais casos ocorrem, a grande
maioria se deve ao fato de estarem sob ação de drogas.
Esgotados todos os recursos para acalmar o individuo, deve-se
solicitar o concurso de órgãos policiais, pedindo que haja discrição e ajuda
ao atendido.
Chamadas Drásticas - As Chamadas Drásticas foram subdivididas
de acordo com a chave seguinte:
Simulação
Socorro
DRÁSTICAS Solidão
Em Atendimento Pessoal

– Simulação - Registramos até agora somente um caso de


simulação, no qual uma moça, ao telefone, declarou que havia tomado
20 comprimidos de um determinado barbitúrico e se encontrava prestes
a morrer. No andamento da entrevista pediu ajuda, dando seu endereço e
telefone. O plantonista desligou e voltou a telefonar, a titulo de confirmação,
e, sendo essa positiva, dirigiu-se à Polícia Militar. - Verificou-se em seguida
tratar-se de uma brincadeira de mau gosto. Os policiais retomaram ao
plantão e fizeram com os plantonistas uma pequena mesa-redonda, a fim de
estudarem como poderiam ser evitados casos desagradáveis como esse. O
próprio oficial comandante da guarnição houve por bem concluir que, pelo
sim e pelo não, dariam atendimento normal sem se preocupar (futuramente)
com a possibilidade de ocorrerem tais brincadeiras.
– Socorro - De memória, podemos registrar três casos de pessoas
que, logo após terem atentado contra a vida, telefonaram para o CVV,
solicitando urgentemente socorro. Nesses casos, os plantonistas pediram o
auxílio da polícia, no que foram prontamente atendidos.
– Solidão - Temos conhecimento de somente 2 casos. Pessoas que
atentaram contra a vida desejando realmente a morte, mas pretendiam passar
os seus últimos momentos conversando com um amigo. Um dos casos, ao

80
fim da entrevista, solicitou socorro e foi atendido a tempo, também pela
polícia. O outro veio a falecer ou, pelo menos, essa foi a impressão obtida
pelo plantonista quando ouviu o baque surdo do corpo no chão. Lembramos
que no dia seguinte esse plantonista foi alvo das melhores manifestações de
apoio de todos os voluntários do Posto.
– Em Atendimento Pessoal - Só temos a registrar casos de indivíduos
que foram contidos pela polícia, ao tentarem atirar-se de um viaduto ou nos
trilhos do Metrô, e levados para o CVV. Tratam-se de casos delicados, nos
quais temos que deixar o indivíduo bem à vontade, fazê-lo compreender a
natureza do nosso trabalho, e deixar ao seu arbítrio: manter ou não conversa
para oferecermos amizade.
Psicopatas - Ao falarmos sobre os psicopatas, recomendamos a todos
lerem o trabalho elaborado pelo nosso companheiro Alan, de Ribeirão Preto,
intitulado “Como pode o plantonista se defender da manipulação psicopática”
(publicado no Boletim do CVV dos meses de julho, agosto e setembro de
1983). Sobre este assunto há outro trabalho, também do companheiro Alan,
do CVV-Ribeirão Preto: “DISTÚRBIOS DE PERSONALIDADE E OS
PLANTONISTAS”, publicado no nosso Boletim do CVV, n.º 168, do mês
de maio de 1988, que também merece ser lido. Recordamos a todos que os
psicopatas são refratários ao “befriending”, assim como as pessoas sob ação
de drogas. Os psicopatas são casos difíceis, pela sutileza e, sobretudo por
apresentarem total normalidade. Sobre o assunto há o seguinte esquema,
apresentado por Chad Varah numa palestra feita em Mar del Plata em 1977:

81
Dentre as características apresentadas, lembramos: indiferentes às
relações interpessoais; egocêntricos; inidôneos; falsos e insinceros; ausência
total de remorso, culpa ou vergonha (amoralidade); comportamento anti-
social; desconhecem o que vem a ser ansiedade; raramente são suicidas; são
extremamente racionais e usam da chantagem.
Como medidas para não sofrermos a manipulação dos psicopatas,
apresentamos os seguintes recursos: recorrer aos mais experientes; buscar
orientação sempre que preciso; respeito absoluto pelas normas cevevianas; e
discutir a questão com os líderes de grupo antes de agir.
Trotes - Esclarecemos que para nós os trotes não existem e para
“eliminá-los” basta melhorarmos a qualidade de nossas respostas.
Abalos Situacionais - Como, dentre os abalos situacionais, ocupam
lugar de destaque as perdas, focalizamos toda a nossa atenção sobre esse
assunto. Apresentamos a seguinte chave:


CÔNJUGE
FILHO
OBJETO PERDIDO GENITOR
IRMÃO
AMIGO
ANIMAL DE ESTIMAÇÃO (para crianças)


MORTE
CASAMENTO
TRABALHO
SERVIÇO MILITAR
MOTIVO DE PERDA ESTUDO
FORMATURA
DESAVENÇAS
DOENÇA (física ou mental)
SUICÍDIO

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Estudo - o jovem que é obrigado a morar em outra cidade para
estudar.
Formatura - perda dos colegas e do ambiente da turma.

PROVENTOS
STATUS
LAR
CASA
PERDAS DE TRABALHO (demissão / aposentadoria)
RECURSOS JUVENTUDE
DE APOIO ILUSÕES
ROTINA ESTÁVEL (promoção/ casamento/ formatura)
SAÚDE
AMPUTAÇÕES
BELEZA

Pessoas Idosas - Porquê a pessoa idosa liga para o CVV:

ENFERMIDADE
PESSOAS IDOSAS SOLIDÃO
PERDA DE RECURSOS DE APOIO

O índice de suicídio entre as pessoas idosas é muito elevado,


principalmente pela solidão que o indivíduo experimenta nessa fase da
vida.
Crianças - Quase a totalidade dos casos que atendemos decorre de
problemas no ambiente doméstico. Esses problemas domésticos são sentidos
pela criança como perda (perda do amor dos pais, de segurança etc.). Um
único caso ocorreu por perda de um animalzinho de estimação.
CVV e Serviço Social - A finalidade do Serviço Social está na
utilização plena dos recursos do indivíduo para solução dos seus problemas
de ordem material; o nosso trabalho no CVV tem por objetivo a utilização
plena dos seus recursos para a solução dos problemas emocionais (para a sua

83
adaptação psicológica)
SERVIÇO SOCIAL - Resolver os Problemas (adaptação social)
CVV - Adaptação Psicológica
CVV e Religião - A religião do CVV está no bem que podemos
fazer ao próximo e, portanto, quanto à religião dos outros temos que manter
a atitude de respeito e aceitação, indispensável para o sucesso de uma relação
de ajuda.

RELIGIÃO ACEITAÇÃO
RESPEITO

Tipos de Abordagens Telefônicas - Sob esse título apresentamos


diversas possibilidades para o início de uma chamada telefônica:

Diálogo forçado
Dirigidas à pessoa do plantonista
Superficiais
Solicitando informações
Apresentando o caso de um amigo
Reticenciosas
Diretas ao assunto
Silêncio (já comentado anteriormente)
“Trote” (já comentado anteriormente)
Pregar uma peça em alguém
“Enganos”
Solicitação de orações e mensagens

-Diálogo Forçado - quando alguém nos liga e insiste que um terceiro fale
conosco.
-Superficiais - são aquelas chamadas desprovidas de conteúdo emocional e,
se o plantonista estiver sendo solicitado naquele instante por outras ligações
telefônicas, ou pela presença de casos pessoais, deverá torná-las bastante
breves.

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-Informações - o indivíduo inicia o diálogo telefônico tal como se estivesse
pedindo informações sobre o CVV.
-Apresentação do Caso de um Amigo - ele começa a conversa expondo
suas emoções e seus problemas tal como se estivesse relatando o caso de
um amigo. Se o plantonista agir corretamente, no transcurso da entrevista,
o atendido muda naturalmente a pessoa do verbo e passa a se referir a si
mesmo.
-Reticenciosas - quando, intercalado por longos espaços de silêncios, o
atendido se mostra profundamente tenso e com dificuldades para se expor.
-Diretas ao Assunto - como o próprio nome está indicando, o atendido vai
diretamente ao assunto, sem rodeios.
-Silêncio - chamadas silenciosas já foram objeto de análise.
- “Trotes” - os trotes, igualmente, já foram abordados.
-Pregar uma Peça em um Amigo - ocorre na seguinte circunstância: numa
roda de amigos, resolvem pregar uma peça em alguém. Sem que ele saiba,
ligam para o CVV. Quando o plantonista atende eles solicitam “um minuto
por favor”, e dizem para o amigo: “telefone para você!” Quando ele vem ao
telefone, notamos um certo desconcerto ao saber que é do CVV e ao fundo
ouvimos gargalhadas dos demais.
- “Enganos” - quando o atendido simula um engano. Devemos, nesses
casos, apresentar de imediato a nossa total disponibilidade.
Para todos esses tipos de abordagem, a atitude do plantonista
é sempre de se referir à pessoa e atentar para o conteúdo emocional da
comunicação. Muitos desses tipos de abordagem são apenas pretexto para
um primeiro contato com o CVV.
Sigilo - Jamais poderemos expor o indivíduo ou, em outras palavras,
revelar que um indivíduo esteve no CVV ou estabelecer ligações entre
problema e o indivíduo.
Lembramos: o simples fato de revelar que o indivíduo esteve no
CVV consiste em grave quebra do sigilo.
Dentro do programa CVV o sigilo é absoluto.

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Na prática do “role playing” vivemos a pessoa e os problemas sem,
entretanto, revelarmos quem é o indivíduo.
Neste ponto, o regimento interno do CVV é mais restritivo do que
o do “The Samaritans”.
Em certos casos o próprio atendido não respeita as normas de sigilo,
visitando vários plantões e dizendo (inclusive aos amigos) que foi atendido
no CVV por esse ou aquele plantonista. Nesse caso a violação de sigilo
partiu do atendido e não do plantonista.
Atendimento a Pessoas Drogadas - Pessoas drogadas ou
alcoolizadas não têm condições de assimilar o “Befriending”; portanto, o
plantonista não deverá realizar o atendimento. A pessoa deverá ser convidada
a retornar em estado de sobriedade.
Casos “Crônicos” - Os princípios samaritanos estabelecem que
os casos em crise têm prioridade sobre os crônicos; entretanto, nunca nos
poderemos esquecer de que casos crônicos poderão entrar em crise.
Atentar para o perigo de rotulação e o perigo de avaliações precipitadas. Os
chamados crônicos deverão ser estudados em nível de grupo.

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A REUNIÃO GERAL DE PLANTONISTAS

Os principais objetivos das RGPs são: congraçamento,


confraternização, fortalecimento do espírito de grupo e aprendizagem.
Para que a RGP tenha pleno êxito é necessário que a mesma seja
programada com bastante antecedência, e todos tenham, antecipadamente,
uma informação sobre o programa.
O Tempo Livre funciona como intervalo para descontração e
tolerância para os eventuais retardatários.
As RGPs devem estar incluídas na programação anual (distribuída
na primeira quinzena de dezembro para todos os plantonistas). Avisos,
através de cartazes e volantes individuais, devem ser veiculados 8 dias
antes.
A palestra deverá ser sempre sobre assuntos atinentes à filosofia
do CVV, devendo fugir à superficialidade de regimento interno e assuntos
burocráticos. Para a matéria administrativa reservam-se 10 ou 15 minutos.
Jamais empregar a RGP para lançamentos de campanhas financeiras
(que poderão ser, quando muito, anunciadas); se necessário marcar reuniões
específicas para esse fim com os voluntários dispostos a ajudar.
Após ter início a abertura, as portas são fechadas não se admitindo
sob hipótese alguma o ingresso de retardatários.
Fugir sempre à discussão de assuntos pessoais que deverão ser
tratados em relacionamento líder-liderado.
Na preparação, como medida de respeito aos presentes (que
pertencem às mais diversas religiões) devemos nos limitar a um momento
de reflexão, aonde nos colocamos em contato com o Criador.
É sempre interessante, ao fim da reunião, servir chá ou café.

Ver modelo de ficha, abaixo (*).

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REUNIÃO GERAL DE PLANTONISTAS

21/04/84
Das 09h00 às 09h30 - Tempo Livre
Das 09h30 às 09h35 - Abertura
Das 09h35 às 09h40 - Avisos gerais e administrativos
Das 09h45 às 10h00 - Apresentação artística
Das 10h00 às 11h00 - Palestra proferida por Jacques A. Conchon e Flávio
Focássio – versando sobre o tema: “RGP’s”
Das 11h00 às 11h15 - Tempo reservado às perguntas
às 11h - Encerramento

Nome ...................................................
N.º.........................................RGP:..............................DATA: ......................
Unidade - Abolição
(Devolver no fim da Reunião)

(*) No verso da ficha costuma-se imprimir a música para ser cantada no Tempo Livre.

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A REUNIÃO DE GRUPO

São finalidades da reunião de grupo, pela ordem de importância:


1 . Oferecer apoio e sustentação aos voluntários
2. Confraternização entre os plantonistas
3. Aperfeiçoamento do voluntário
4. Aclaramentos das dúvidas atinentes ao trabalho
5. Consultas e informações administrativas
6. Planejamento financeiro
A) A reunião de grupo, cuja freqüência poderá ser mensal ou quinzenal,
deve ser iniciada com uma breve meditação.
B) Imediatamente após a meditação passa-se ao role playing.
C) O role playing deve começar com flashes (“passa adiante”) para,
em seguida, termos as representações de atendimentos pessoais ou
telefônicos.
D) O role playing, como já sabemos, não precisa ser conclusivo. O líder,
percebendo que algumas colocações valiosas foram feitas poderá
encerrá-lo e passar aos comentários.
E) Assim como não há necessidade de ser conclusivo, não se faz necessário
iniciarmos do princípio: poderemos pegar o “bonde andando”.
F) Concluído o role playing, que em geral tem a duraçãode 15 a 20
minutos, são tecidos os comentários pelos plantonistas; em seguida o
entrevistador relata as suas impressões e, por fim, o entrevistado (sem
sair do papel) relata os seus sentimentos.
G) Os comentários são feitos sempre com finalidades construtivas.
H) Como o erro de “um”, em geral, é o erro de “todos”, não devemos
utilizar um tratamento individualizado, dizendo: “fulano disse...”,
quando o correto seria o “plantonista disse...” .
I) Não é permitido ao plantonista justificar-se. Deverá ouvir as críticas

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serenamente procurando assimilar a parcela válida para o seu
aprimoramento.
J) Diálogo aberto
Este segmento foi assim denominado por proporcionar uma total
abertura, onde os presentes procuram relatar as tensões (conflitos,
ansiedades e aflições) vividas em atendimentos ou experimentadas
na vida diária. Trata-se de um feliz ensejo para drenar as ansiedades
acumuladas e para revisões interiores.
Sempre será facultado ao voluntário optar para tratar de assuntos
reservados diretamente com o líder, após a reunião ou em outro
qualquer horário.
L) Vida plena
Outra atividade importante da reunião: a oportunidade que cada
voluntário tem de auto-analisar-se com apoio do grupo. Tendo como
pano de fundo o conceito de “vida plena”, cada qual poderá expor o
que considera barreiras em si mesmo, que dificultam seu crescimento.
O somatório de experiências individuais vai ajudando a cada um rever-
se interiormente com menos ansiedade.
O ideal é o plantonista manter uma caderneta de anotações das
descobertas de si mesmo e das iniciativas que vem tomando para
crescer e superar-se. As anotações dessa caderneta podem ou não ser
lidas nas reuniões de grupo.
M) Consultas e Informações Administrativas
Esta é a fase final da reunião de grupo onde assuntos administrativos
são tratados tais como: consulta aos voluntários, passar informações, e
veicular campanhas financeiras.
N) Encerramento
Os minutos finais da reunião de grupo podem ser aproveitados para
confraternização através de uma conversa descontraída em tomo de
um chá ou café.
O) Generalidades
As reuniões de grupo em média têm a duração de 90 minutos.

90
O POSTO DO CVV E A ENTIDADE JURÍDICA

O sistema de trabalho no Centro de Valorização da Vida, junto às


suas coligadas, para execução do programa CVV, não estabelece qualquer
espécie de vínculo jurídico, tratando-se, apenas, de um sistema de simples
concessão para o uso de marcas nominativas e cumprimento de princípios e
normas preestabelecidos.
Daí resulta como indispensável a figura da entidade jurídica:
instituição que patrocina o programa CVV, dando-lhe cobertura jurídica.
Sem a pessoa jurídica não seria possível celebrar-se contrato de aluguel
de uma sala, escritura de compra de imóvel, ou aquisição de um aparelho
telefônico, assim como seria inexeqüível a abertura de uma conta corrente
bancária.
No decorrer dos anos foram observadas duas condições distintas:
CONDIÇÃO “A”: Os voluntários de um Posto, em implantação,
fundam a entidade jurídica:
CONDIÇÃO “B”: Os voluntários buscam instituições já existentes
para se integrarem na condição de simples departamento.
Verificou-se que as duas condições são boas e aceitáveis, entretanto,
pudemos observar que na Condição “B”, em certos casos, gerou dificuldade
de ação conjunta uniforme e cooperação mais estreita.

Normalização
1. Situação Ideal
Entende-se por situação ideal aquela retro indicada como Condição “A”,
na qual os voluntários de um Posto, em implantação, fundam a entidade,
prevendo em seus estatutos que todos os cargos da Diretoria e do Conselho
(se houver) serão necessariamente preenchidos por plantonistas do CVV.

91
2. Condição Aceitável
As normas a serem observadas para a citada Condição “B” são as
seguintes:
- A entidade é uma pessoa jurídica que tem por finalidade:
a) dar cobertura jurídica ao Posto;
b) dentro das suas possibilidades oferecer suporte material/financeiro ao
Posto.
- O Coordenador Geral (cuja eleição foi necessariamente referendada
pela entidade) é o elemento de ligação entre esta e o Posto do CVV.
- A entidade jamais poderá intervir no Posto, a não ser que este venha a
ferir os Princípios e Normas do CVV e/ou o Regimento Interno do CVV.
Neste caso, a intervenção se dará através do Centro de Valorização da
Vida, de São Paulo.
- A entidade jurídica poderá descontinuar a sua posição como tal, sempre
que lhe for de conveniência, dando comunicação imediata ao Centro de
Valorização da Vida, de São Paulo.

92
A ENTREVISTA NA RELAÇÃO DE AJUDA
AULA DE REFORÇO

Como referência básica para este tema, apontamos o livro


“Aconselhamento Psicológico” de autoria de Ruth Scheefer (Editora
Atlas, São Paulo - SP). Nesse livro, a autora apresenta um histórico geral
dos métodos de aconselhamento, chegando até ao “Não-Diretivo” que se
identifica com o filosofia do CVV.
Objetivo da Entrevista no CVV - Ao longo de todos esses
anos, apresentaram-se muitos conceitos e definições sobre esse objetivo,
mas, sem dúvida, podemos resumi-lo da seguinte forma: nosso objetivo é
ajudar o entrevistado na melhor utilização de seus próprios recursos para
a sua adaptação psicológica. É muito importante termos bem claro que, no
processo, a responsabilidade recairá sempre no entrevistado: o indivíduo
nos procura, vem conversar conosco, e nada mais fazemos que colocá-lo
à vontade, de tal forma que ele possa fazer uso de seus próprios recursos
para encontrar a solução de seus problemas interiores. Se fizermos isso,
a responsabilidade, ao longo da entrevista, recairá exclusivamente sobre
o entrevistado; nós não participamos de seus problemas, participamos da
situação emocional do indivíduo, vivemos as suas alegrias e as suas tristezas,
mas não o influenciamos de nenhuma forma, e as soluções encontradas terão
partido de seu próprio raciocínio.
Característica Fundamental da Entrevista no CVV - Mantendo-
se a responsabilidade da entrevista sobre o atendido, não se dá ensejo a
uma relação de dependência. Em todas as fases da entrevista deve existir
plena liberdade do entrevistado; este pode dizer o que e quando quiser, pode
levantar-se e ir embora; poderá voltar ou não, e poderá fazê-lo quando bem
entender, porque as decisões são inteiramente dele.

93
Se atendermos um indivíduo e notarmos que ele nos procura
freqüentemente para saber se deve fazer isto ou aquilo, é sinal de que estamos
fazendo um mal atendimento, pois estamos mantendo a responsabilidade, no
mínimo, dividida.
O que aconteceria se déssemos um conselho? Nós assumiríamos
a responsabilidade e criaríamos dependência. Chad Varah já nos diz que
é difícil resistir à tentação de dar um conselho, posto que ao assumirmos
tal atitude estamos dando vazão ao nosso orgulho; sentindo-nos dotados de
uma certa superioridade, passamos a olhar o indivíduo de cima para baixo,
aumentando enormemente a distância entre nós e ele. Um dos mais graves
erros que podemos cometer é dar um conselho.
Vamos analisar o conselho sob este ponto de vista: um indivíduo
coloca sua vida à nossa frente, seus problemas, suas dúvidas e nos diz: “Na
situação em que me encontro posso escolher a alternativa “A” ou a alternativa
“B”; qual das duas você acha que seria melhor?” Podemos cair na cilada e
responder: “Acho que a alternativa “B” é a melhor”. Em seguida, o indivíduo
nos pergunta: “Mas você não acha que a alternativa “A” é mais razoável?”
Se tivéssemos dito que a “A” era a melhor, ele sairia correndo para colocá-
la em prática, porque, na realidade, ao nos fazer a pergunta inicial, ele já
havia escolhido a alternativa, porém, desejava dividir a responsabilidade.
Recebendo um “de acordo” temos duas possibilidades: “dar certo” ou “não
dar certo”. Se der certo, estabelecemos dependência, e diante do menor
problema o indivíduo voltará a nos procurar para tomar decisões. Se não der
certo, ele virá nos cobrar, e será fácil prever as conseqüências.
Para algumas escolas, o conselho pode ser aplicado por profissionais
especializados. As escolas clássicas admitem-no e nós consideramos válido
aconselhar, se isso for aplicado por profissionais. As escolas que optam
pelos métodos diretivos usam o conselho, diagnosticam, procuram resolver
o problema: a responsabilidade é do entrevistador, existindo, portanto,
dependência. É fácil compreender que esse método está fora de nosso
alcance: não podemos diagnosticar, e a solução dos problemas assume um

94
plano secundário, porque não podemos alcançá-la.
O estabelecimento de dependência pode assumir características
muito sérias quando se trata de um relacionamento entre pessoas de sexos
opostos, ocorrendo o perigo da evolução do amor fraterno, que procuramos
doar, para o amor romântico, ou mesmo para o amor sexual. Como quem nos
procura vem em busca do amor fraterno, se oferecermos outra modalidade,
isso gerará frustrações dolorosas, conforme temos podido observar.
Quando começamos uma entrevista é possível que, nos primeiros
dez ou quinze minutos, haja uma tendência, por parte do entrevistado, em
gerar uma relação dependente, pedindo-nos conselhos insistentemente. Se
agirmos de maneira correta, trabalhando exclusivamente com o conteúdo
emocional, ele passará a nos sentir como um igual, desviando a imagem
do superprotetor, até definir-se a imagem de um companheiro, um amigo.
Chad Varah nos diz que aconselhar é a forma mais eficiente de mostrar a um
indivíduo que ele é incapaz.

O MÉTODO NÃO DIRETIVO

Esse método não admite conselhos, não diagnostica, e não se prende


a problemas. Centra-se na pessoa, não nos problemas que a envolvem.
Não há dependência, e a responsabilidade recai sempre sobre o
entrevistado.
O método foi aplicado, inicialmente em 1850, na Suíça, no campo
pedagógico, pelo grande educador Pestalozzi.
A sua evolução até a escola Rogeriana se encontra bem descrita
no livro de Ruth Scheefer, cuja leitura é indispensável para os nossos
voluntários.
Em Carl Rogers vamos encontrar uma escola humanística
baseada nos princípios de respeito ao próximo, não julgamento, aceitação,
compreensão e confiança na natureza humana.
“A cada estímulo corresponde uma resposta” – é o que nos diz

95
a escola “behaviorista”. “Contudo – replica Rogers – cada qual sente o
estímulo de uma forma distinta” – e completa – “a resposta é sempre uma
função da maneira pela qual o estímulo foi sentido”.
Assim, cai por terra o julgamento e, conseqüentemente, o diagnóstico
e a condenação; fica abolido o conceito de anormalidade.
Para julgar, explica-nos a teoria de Rogers, seria necessário ver o
mundo com os olhos do entrevistado, o que é impossível. O único julgamento
provido de fundamento justo é o autojulgamento; o resto é leviandade.
Ao nos ensinar que todo ser possui uma direção positiva, no sentido
do crescimento, da maturidade e da socialização, propõe-nos uma visão
mais equilibrada do Universo, onde todos os seres são dotados de forças
latentes para atingirem a harmonia perante si mesmo e perante os demais.
Esclarece-nos o Prof. Rogers que, para a exteriorização das
potencialidades do ser, é indispensável que se lhe ofereça condições, que
são definidas como ameaça zero (ou aceitação total).
Com aceitação total as máscaras caem e o indivíduo passa a ser o
que é “se torna pessoa”, e encontra o sentido positivo em sua marcha.
Para maior compreensão deste capítulo, é indispensável a leitura do
Capítulo 1 do livro de Rogers “Tornar-se Pessoa”.

ATITUDES DO ENTREVISTADOR

Ouvir o que a Pessoa Tem a nos Dizer - Devemos deixar


o entrevistado à vontade, diga o que quiser, como quiser e quando
quiser, respeitando até mesmo o seu direito de permanecer em silêncio.
Normalmente, num consultório terapêutico, o individuo tem limitações
de diferentes ordens, inclusive de tempo: se a entrevista deve durar tantos
minutos
(“hora marcada”), passado esse tempo ela se encerra, não importando se o
que o entrevistado quis dizer já foi dito, se ele teve tempo para dizer o que
queria. Terminou. Se quiser, deve retomar na próxima semana.

96
No CVV não há limites. O entrevistado pode repetir a sua história
quantas vezes quiser; estaremos sempre prontos a ouvi-lo com a mesma
atenção da primeira vez. Ninguém pode fazer isso a não ser num serviço
voluntário. Chad Varah nos conta uma história bastante característica e
que nos mostra a definição da Doação de Amizade (“befriending”). Foi
um dos primeiros casos que surgiram na sede dos Samaritanos. Apareceu
uma senhora, visivelmente nervosa, sentou-se. Chad Varah, ainda como
profissional, fazia aconselhamento, e os voluntários ficavam em outra sala,
recebendo os indivíduos para aguardarem o momento da entrevista. Aquela
senhora contou uma história para o Chad.
Ele não entendeu; era tão confusa, e ele vendo a quantidade de pessoas
que estava à sua espera, pediu que ela aguardasse na sala ao lado, tomasse
um café, depois de uns 30 minutos voltasse. E mandou entrar o seguinte.
Algumas horas depois, lembrou-se daquela senhora. Foi até a sala de espera
e perguntou sobre ela, sendo informado de que ela havia ido embora. Ficou
preocupado, pois era um caso muito grave, parecia tão difícil! “Ela foi embora
- disse a secretária - e quando saiu estava muito satisfeita, conversou com
aquele senhor que é motorista de ônibus.” Chad foi até a pessoa e perguntou
como fora a conversa. Foi informado de que nada dissera a não ser “hum?”,
“é mesmo?”, “ah!” e contou: “Realmente, da primeira vez ela me fez o relato
de sua vida e de seus problemas, eu não entendi absolutamente nada. De
segunda vez, interessante, se na primeira era uma massa ininteligível, na
segunda já apareciam alguns pontos objetivos como nomes próprios, nomes
de locais e datas; quando ela me contou a história pela terceira vez, pude notar
que os nomes próprios, os locais e as datas estavam ordenados logicamente.
Contou-me mais uma vez, a quarta, e o que distinguiu esta da terceira foi
que, nas entrelinhas, foram surgindo as soluções para seus problemas”.
Ouvir com Respeito - Um dos pontos fundamentais para que
possamos atingir bons resultados com o método que aplicamos é o respeito
pelo nosso semelhante. Rogers afirma que esse respeito deve ser sincero e
genuíno; em outras palavras, não podemos usar uma máscara, pois que esta,

97
mais cedo ou mais tarde, cairá, com efeitos desastrosos.
Respeitar significa respeitar a todos indistintamente, sem levarmos em
consideração saldos bancários ou títulos. Aprendemos que todos merecem
respeito pelo simples fato de serem (existirem).
Aceitação - Aceitar o indivíduo como ele é não como nós
gostaríamos que fosse, é outra norma muito importante em nosso trabalho.
Aceitar a pessoa como ela é, representa uma forma eficaz de valorizá-
la.
Aqui torna-se necessário abrirmos um parênteses para comentarmos
algo muito importante: os preconceitos, dada a nossa invigilância, podem
ser projetados na pessoa que estamos entrevistando.
Torna-se indispensável, portanto, façamos constantes revisões
interiores para que se torne possível a aceitação irrestrita.
Compreensão - Como se define a compreensão: se consultarmos
os especialistas modernos, nós vamos identificar definições bastante amplas
e complexas envolvendo empatia, compaixão, aceitação, etc. Chad Varah,
quando esteve no Brasil em 77, esclareceu-nos o problema: estávamos
procurando compreender alguém, quando na verdade devemos procurar
compreender com alguém.
Segundo o Parecer de Quinn (ver capítulo 2 - “Tornar-se Pessoa”)
no que se refere à compreensão, o mais importante é comunicar o desejo de
compreender.
Confiança - Sendo uma característica exigida do voluntário do
CVV, perguntamos: Confiança em quem? Em nós? No entrevistado? A
resposta é muito simples: confiança na natureza humana.
Todo ser humano, compartilhando dos processos naturais que
observamos às centenas todos os dias, reúne condições de superar qualquer
dificuldade, desde que lhe ofereçam condições.
O indivíduo desesperado que comparece aos nossos plantões é
sempre uma vítima das ameaças que a sociedade (meio ambiente) lhe oferece;
desde que, com a aceitação, estaremos oferecendo um clima de ameaça zero,

98
ele vai caminhar para o crescimento (autocompreensão, liberação de forças
criativas e solução dos problemas que o afligem).
Comunicação - Outra particularidade que deverá ser identificada
em nossos voluntários é a comunicação. Temos que ter a capacidade de
comunicar ao indivíduo o nosso respeito, a compreensão, a aceitação e a
confiança.
Considerações Finais - A base de nosso processo consiste em
concentrarmos a atenção no conteúdo emocional da conversa que estamos
tendo com o entrevistado, distanciando-nos dos problemas que o afligem.
Os problemas comparecem à guisa de uma ferida em fase de
cicatrização muito dolorosa, exigindo cautelas especiais, e só aquele que
está ferido pode tocá-la, pois sabe bem onde é que está doendo. Isso significa
que o entrevistado pode falar de seus problemas quando quiser; entretanto,
daremos valor não à linguagem objetiva com os problemas, mas à linguagem
subjetiva com os sentimentos e emoções.
O trabalho consiste na revelação do conteúdo emocional: somos
simples tradutores, traduzimos a linguagem objetiva para uma linguagem de
sentimento e emoção. Exemplo:
Entrevistado: “Encontro-me desesperado porque perdi meu
emprego”;
Entrevistador: “Onde você trabalhava e por que razão o
demitiram?”
Vemos acima um comportamento nitidamente diretivo, no qual os
problemas ocupam lugar de destaque.
Entrevistado: “Encontro-me desesperado porque perdi meu
emprego”;
Entrevistador: “Compreendo o seu desespero e sinto a sua
insegurança”.
Neste caso o entrevistador fugiu ao problema e traduziu a
linguagem verbal em emocional, auxiliando o entrevistado no processo de
autocompreensão.
Quando aplicamos o método de forma adequada, muitas vezes o

99
entrevistado diz: “Parece que você diz o que eu digo em outras palavras”;
“Você fala o que eu estou pensando”; “Ao conversar com você parece que
estou conversando comigo mesmo”.
Para que possamos conseguir da nossa parte um comportamento
não-diretivo é indispensável façamos exercícios diários no que se refere à
revisão dos nossos preconceitos, procurando transformá-los em conceitos,
e não desprezarmos a prática do “role-playing”, o único processo que nos
pode conduzir ao aperfeiçoamento.

AS RESPOSTAS DADAS PELO ENTREVISTADOR

Basicamente, existem seis tipos de respostas: de clarificação; de


reflexão do conteúdo; de aceitação; de apoio; inquisitivas e informativas.
Na realidade, não deveríamos falar muito sobre isso, pois corremos o risco
de nos “bitolarmos”; entretanto, para não incorrermos em erro, é bom
limitarmos os tipos de respostas.
De Clarificação - A resposta da clarificação consiste em traduzir
o que a pessoa falou para uma linguagem emocional; traduzir em termos
de emoções o que ela verbalizou. Por exemplo: uma moça ia sempre ao
médico e este dizia que ela tinha, de fato, uma disfunção orgânica e, em
conseqüência, ela passava o dia inteiro dormindo. No dia em que o médico
deu-a por curada, ela ficou completamente transtornada. Foi a um conselheiro
e fez as reclamações: o médico lhe dissera que ela não tinha nada, mas que,
apesar disso, sentia um sono terrível, precisava dormir o dia inteiro.
– “E você se sente agora preocupada, apreensiva, por que não pode
mais justificar o seu sono diário?”
Ela contou uma história objetiva e o entrevistador a traduziu em
termos subjetivos.
É isso que devemos fazer. As respostas de clarificação são as mais
empregadas, são aquelas que mais usamos. Voltamos a insistir: encontrar
o momento certo para lançar uma resposta dessa é difícil; só conseguimos
através de muito exercício de “role playing”. Para não transformarmos os

100
nossos casos em cobaias, é preferível usarmos um companheiro a usarmos
alguém que vem de fora.
Um diálogo:
– “Você é um estúpido, um cretino; pensa que estou presa a você,
mas não estou; pensa que os outros gostam de você, mas ninguém gosta;
você é um estúpido, mesmo!”
– “Então você sente por mim um ódio muito grande!”
– “Sim, não posso ver nem a sua cara, acho que nem apareço mais
aqui.”
– “Certo; você quer mostrar a sua independência.”
Percebam o tipo de resposta e como é importante aceitarmos a agressão.
De Reflexão do Conteúdo - É traduzir o que a pessoa falou, em
outras palavras; ela falou, nós não entendemos as emoções envolvidas,
buscamos repetir o que nos foi dito em outras palavras, procurando nos
aprofundarmos mais. Por exemplo: Alguém nos conta uma história, nos
diz que compartilha um apartamento com um amigo e não sabe o que
aconteceu... Nós trocamos: “Você e o amigo moram no mesmo apartamento
e está havendo algum problema”. O mesmo que a pessoa disse, estamos
dizendo em outras palavras, com o intuito de aprofundar mais e chegar a
uma clarificação.
De Aceitação - A resposta de aceitação pode ser verbal ou não.
Como pode uma resposta não ser verbal? Como podemos expressar aceitação
sem verbalizar? É simples: existem indivíduos que não conseguem falar, e
nós respeitamos seu silêncio. Há aqueles que começam a chorar; então nós
o aceitamos em silêncio deixamos que ele chore.
De Apoio - Resposta de apoio é aquela pela qual mostramos que
estamos sentindo o mesmo que a pessoa; que estamos acompanhando o seu
sofrimento. Usando outro exemplo: “Você acha que pode ser reprovado.
Isso lhe traz insegurança e uma visão obscura do futuro”. Esse tipo de
resposta não deve ser forjada; quando nós falarmos que entendemos ou que
sentimos, deve ser sentido mesmo, porque se falarmos da “boca para fora”,
o entrevistado percebe que é uma farsa, uma dramatização, e não se sente

101
valorizado.
Inquisitivas - Essas respostas são muito boas para quando o
atendido nos coloca contra a parede. Ele nos diz: “Depois disso, o que eu
devo fazer?” E nós partimos para uma inquisitiva: “O que você acha?”
Informativas - Quando a pessoa nos pergunta sobre qualquer
assunto em que ela tenha interesse; se não soubermos a resposta, nós damos;
se não soubermos, dizemos que não sabemos, não podemos responder, isto
é, respeitamos o interesse do entrevistado, não ficamos em silêncio, mas
confessamos a nossa posição de desconhecedores do assunto.

CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES

Treinamento e Voluntariado - Como vimos nos itens anteriores,


duas características fundamentais de nosso trabalho justificam-se
plenamente: o intensivo treinamento nas reuniões de “role playing” e o
trabalho voluntário.
Somente com sucessivas e periódicas realizações de “role
playing” se poderá aperfeiçoar o trabalho, sem correr o risco de ferirmos o
entrevistado. No “role playing” estamos entre nós, estamos dramatizando
uma situação, podemos errar, voltar atrás, experimentar. Nada disso pode
ocorrer no plantão. Entretanto, é importante que a atmosfera criada no “role
playing” seja a mais realística possível, pois as reações dos plantonistas
que assistem e dos que dramatizam também devem ser respeitadas e
consideradas. Quando um “role playing” é realizado sem essa característica,
ele soa falso, oco, e não cumpre a sua finalidade.
Da mesma forma, somente com um trabalho voluntário, livre de
profissionalismos, poderemos oferecer o “befriending”. Porque, para o
executarmos, necessitamos tão somente de calor humano.

ALGUMAS PERGUNTAS E RESPOSTAS

Pergunta: É sabido que um grande número de pessoas chega ao


plantão, ou nos telefona, querendo respostas, perguntando, inquirindo sobre

102
seus problemas. Como responder?
Resposta: Quando um indivíduo nos faz uma pergunta exigindo-
nos um conselho ou uma orientação, temos de dar uma resposta não-diretiva
e temos de tomar muito cuidado para usar uma especial entonação na voz, de
tal forma que as nossas colocações não apresentem um aspecto declarativo.
Por exemplo: se pretendemos clarificar um estado de revolta, dizer. Você está
revoltado, e dizer Pelo que vejo, você está bastante revoltado, são duas
formas distintas para fazer a colocação, sendo que a primeira (declarativa)
dá pouco margem de argumentação por parte do entrevistado, e a segunda
daria chance, inclusive, de ele rejeitar a colocação, informando: “Não, não é
bem revolta o que sinto”.
Suponhamos que uma pessoa me diga: “O que devo fazer?” Nós
poderíamos responder: “O que você acha? Outra, “Sinto que você se encontra
confuso”. Outra: “Me fale um pouco mais sobre você”. Outra: “Vamos
pensar juntos?”. Outra: “Você necessita realmente de uma opinião?”
Precisamos entender que o processo centrado na pessoa do
entrevistado é altamente gratificante, e, todas as vezes que nos solicitar uma
manifestação diretiva e nós voltarmos a centrar nele todos os elementos da
entrevista, ele se sentirá bem e aceitará que prossigamos não-diretivamente.

103
VOLUNTARIADO

Encontramo-nos num campo muito difícil embutido em outro mais


difícil, trabalhamos em bases voluntárias dentro da prevenção do suicídio.
O voluntariado é um campo delicado de atuação. Muitas experiências foram
feitas nesse sentido e fracassaram. A única que se apresentou vitoriosa,
produziu e cresceu é aquela que observamos dentro do Movimento Mundial
dos Samaritanos. Há basicamente dois tipos de voluntários: o 1.° é aquele que
vem para o CVV julgando que, pelo fato de estar trabalhando gratuitamente,
é merecedor de agradecimento e gestos de reconhecimento; fica à espera de
que alguém lhe diga todos os dias, ao fim do seu plantão: “Muito obrigado!”
Existe o 2.° tipo, que vê, na oportunidade de trabalhar como voluntário
no CVV, um prêmio, e reconhece que em tudo aquilo que fazemos junto
aos desesperados, os maiores beneficiados somos nós mesmos. São esses
voluntários do 2.° grupo que consolidaram o Movimento Mundial dos
Samaritanos.

104
ESTRUTURA ORGANIZACIONAL DO CVV

Em 1977, quando pudemos sentir a extraordinária capacidade de


crescimento do CVV, todos os Postos eram mantidos em regime de filiais,
(mesma razão social, mesma pessoa jurídica, mesmo CGC), e o primeiro
passo dado no intuito de garantir um crescimento livre e espontâneo foi a
descentralização.
Os Postos passavam a ser independentes, tendo os seus próprios
estatutos sociais e se utilizavam do nome CVV mediante um acordo de
concessão de marca, (franchise).
Naturalmente, com a expansão, começaram a surgir trabalhos
de apoio em nível regional. Postos de cidades vizinhas se reuniam
periodicamente para atividades conjuntas, tais como: cursos, aulas de
reforço, e confraternização.
Gerou-se, então; uma estrutura de unidades coletivas na qual um
grupo de Postos iria constituir uma regional, um conjunto de regionais
iria concretizar o Conselho Estadual, e os Conselhos Estaduais, unidos,
formariam o CN (Conselho Nacional).
O modelo de crescimento adotado na organização do CVV, em
âmbito nacional, oferece facilidades para que a expansão se processe de uma
forma natural, sem impedimentos administrativos.
Até bem pouco tempo compareciam ao Conselho Nacional os
voluntários de todos os Postos sem qualquer tipo de restrição.
Com o passar dos anos as vagas foram, naturalmente, sendo
reservadas àqueles voluntários mais antigos, vindo, finalmente,
presenciarmos no último CN o comparecimento de somente coordenadores,
vice-coordenadores e coordenadores regionais.
Com o próprio crescimento, gerando a necessidade de novos critérios,
acreditamos que a médio prazo o Conselho Nacional será constituído de
coordenadores regionais e deduzimos, por simples extrapolação, que os

105
caminhos estarão abertos para, no futuro, a longo prazo, ser o Conselho
Nacional constituído somente de coordenadores estaduais.
A constituição de uma regional é muito simples e depende de um
acordo entre os Postos vizinhos que, uma vez constituída a regional, deverão
eleger um Coordenador da mesma.
O poder soberano é atribuído ao Conselho Nacional, ao qual se
encontram afetas as atividades de reformulação de princípios e do regimento
interno.
Como o Conselho Nacional se reúne somente uma vez por ano,
foi criado em 1983, para agilizar as atividades deliberativas, o Conselho
Geral que atualmente é composto pelos membros da Diretoria Executiva do
Centro de Valorização da Vida, e representantes de 16 Postos: 8 da Grande
São Paulo e 8 do Interior do Estado de São Paulo.
O Conselho Geral se reúne sempre que necessário, cabendo ao
mesmo o credenciamento e descredenciamento de Postos, estudar alterações
do regimento interno para serem referendadas ou não pelo CN, e efetivar os
Postos experimentais.

Em dezembro de 88, existiam no Brasil 12 regionais:

1 - Regional de Marília:
Marilia
Assis
Londrina
P. Prudente
Bauru
P. Venceslau

2 - Regional Limeira:
Limeira
Piracicaba
Americana
Jundiaí
Rio Claro
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3 - Regional Rio Preto:
S. J. Rio Preto
Araçatuba
Birigui

4 - Regional Ribeirão Preto:


Ribeirão Preto
Uberaba
Jaboticabal
Franca .
São Carlos
Barretos
Araraquara
5 - Regional São Paulo - Sul:
Pinheiros
Abolição
V. Mariana
Barra Funda
Osasco
Jabaquara
Santo Amaro
Sorocaba
Umberto Primo
6 - Regional São Paulo - Leste:
V. Carrão
V. Maria
Tatuapé
Penha
S. José dos Campos
Jacareí
Guarulhos
Mogi das Cruzes

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7 - Regional-ABC - Santos:
Santo André
São Bernardo
São Caetano
Mauá
Santos
São Vicente
8 - Regional Belo Horizonte:
Nova Suíça - BH
Padre Eustáquio - BH
Vitória
Cachoeiro do Itapemirim
9 - Regional Rio de Janeiro:
Tijuca
Lapa
Copacabana
Centro
Petrópolis
10 - Regional Centro-Oeste:
Goiânia
Brasília
Belém
Taguatinga
11 - Regional Nordeste:
Natal
Recife
Fortaleza
Teresina
Campina Grande
Salvador

108
12 - Regional Sul:
Blumenau
Porto Alegre
Curitiba

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REGIMENTO INTERNO DO CVV

A disciplina tem sido a base fundamental do trabalho do CVV,


e a observância do regimento interno tem sido motivo de preocupações e
questionamentos por parte dos voluntários, principalmente daqueles que mais
recentemente adentram ao trabalho.
A experiência nos mostra que após a identificação do voluntário
com os princípios do CVV, a conscientização o leva à postura de muita
responsabilidade, dentro da qual as suas preocupações passam a se voltar
primordialmente para a pessoa humana, sendo, a partir daí, o regimento
interno uma simples conseqüência do seu grandioso desejo de servir.
Quando este livreto foi para o prelo (janeiro 89), o regimento interno
do CVV se encontrava em fase de reformulação, motivo pelo qual não está
sendo publicado aqui.
O prezado leitor poderá solicitar à secretaria do CVV, Rua Genebra,
168 - Fone (011) 37-5304 - CEP 01316 - São Paulo, SP, um exemplar do
regimento interno, se o mesmo já não estiver encartado neste seu exemplar.

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