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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA

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Recredenciamento pelo Decreto n°17.228 de 25/11/2016
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
COORDENAÇÃO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA

XXV SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA DA UEFS


SEMANA NACIONAL DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA - 2021

A VARIAÇÃO NO USO DO ARTIGO DEFINIDO DIANTE DE


ANTROPÔNIMOS NO PORTUGUÊS FALADO EM LUANDA-ANGOLA

Matheus de Araujo Azevedo1; Silvana Silva de Farias Araújo2

1. Bolsista PIBIC/FAPESB, Graduando em Letras com Língua Inglesa, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-
mail: matheusaraujo723@gmail.com
2. Orientadora, Departamento de Letras e Artes, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail:
silvana.uefs.2014@gmail.com

PALAVRAS-CHAVE: Português Luandense; Contato Linguístico; Português


Brasileiro.

INTRODUÇÃO
Apesar de traços linguísticos que aproximem a variedade brasileira da variedade europeia
da língua portuguesa, seus aspectos são muito distantes, conforme mostram os estudos
linguísticos das últimas décadas. Todavia, ainda são poucos os trabalhos sobre a língua
portuguesa no continente africano. Assim, surge a necessidade de pesquisas que abranjam
o estudo de diferentes formas de falar português nesses espaços, considerando aspectos
históricos, sociais e linguísticos, que nos auxiliam no conhecer e no reconhecer padrões
linguísticos específicos. Nesse sentido, procuramos estudar a variação da
presença/ausência de artigos definidos diante de nomes de pessoas, também denominado
de antropônimos, no português falado em Luanda, capital de Angola, visando
compreender o que motiva essa variação de uso, e, posteriormente, comparar os
resultados alcançados com outros trabalhos que investigaram o fenômeno em foco na
variedade brasileira.
Comparar o Português Brasileiro (PB) a outras variedades do português, sobretudo
aquelas cuja formação sofreu influências das línguas africanas, permite aferir o contato
linguístico ocorrido entre as línguas dos povos que foram trazidos para o Brasil como
escravizados e o português europeu durante o período da colonização.
Assim, buscamos, através dos dados sociolinguísticos e da realidade sócio-histórica de
Angola, compreender o que pode motivar tal variação naquela comunidade de fala, quer
seja tempo de colonização, conservadorismo linguístico ou até mesmo diferenças de
contextos de uso.

MATERIAL E MÉTODOS OU METODOLOGIA (ou equivalente)


Este estudo foi realizado a partir do modelo teórico-metodológico laboviano, também
conhecido como Teoria da Variação e da Mudança Linguística, nos termos de Weinreich,
Labov e Herzog (2006). Esse é o modelo adotado em função de ser teoricamente coerente
e metodologicamente eficaz para a descrição de uma comunidade de fala numa
perspectiva de variação, cuja tese principal é que a língua é uma realidade heterogênea e
social, e essa heterogeneidade é funcional.
O presente estudo elegeu, para esta etapa, dez entrevistas sociolinguísticas do tipo DID
(diálogo entre informante e documentador), gravadas na área urbana do município de
Luanda, capital de Angola e também a capital da Província com o mesmo nome, Luanda,
no período entre 2008 e 2013 e que fazem parte do projeto “Em busca das raízes do
português brasileiro: estudos morfossintáticos”.
Uma vez que as entrevistas já haviam sido realizadas e transcritas, a primeira etapa foi o
aprofundamento na literatura referente ao caso, tanto o referencial teórico da Teoria da
Variação e Mudança como estudos e pesquisas anteriores sobre o mesmo fenômeno. O
segundo passo foi a análise das entrevistas já realizadas e que compõem o corpus desta
pesquisa.
A etapa posterior foi a codificação das ocorrências do fenômeno em questão. Por meio da
codificação atribuída, o programa estatístico forneceu os resultados quantitativos da
correlação entre a variável linguística e as variáveis extralinguísticas estabelecidas. Dessa
forma, partindo dos dados coletados, foi possível dar tratamento quantitativo aos dados
por meio do Programa Goldvarb X.
A análise qualitativa e quantitativa do fenômeno variável em questão se orientou pelos
fatores linguísticos e extralinguísticos definidos, pois eles nos permitiram buscar
explicações para a diferença entre a presença e a ausência do artigo investigada em
contextos específicos.

RESULTADOS E/OU DISCUSSÃO (ou Análise e discussão dos resultados)


Após realizarmos as etapas descritas na seção de metodologia, num conjunto total de 59
ocorrências de nomes próprios e um percentual global de aplicação do artigo definido
diante de antropônimo acima de 50%, 35 dentre 59, é interessante notar, já neste primeiro
momento, que os resultados não são assim tão categóricos. Ao menos em termos de
distribuição, parece estar havendo certo equilíbrio entre a presença (59%, 35 ocorrências)
e a ausência de artigo (41%, 24 ocorrências). Embora o número dos dados coletados não
seja expressivo para se fazer afirmações mais categóricas, buscamos descrever, nos
diferentes contextos linguísticos possíveis, as orientações sobre o uso ou a omissão do
artigo diante de nome próprio.

TABELA 01: Variação no uso de artigo definido antes de nomes próprios no português
falado em Luanda
Variantes Ocorrências/ Total Porcentagem

Ausência 24/59 40.7%

Presença 35/59 59.3%

Para uma melhor visualização das frequências apresentadas, na Tabela 01, segue o gráfico
abaixo:
59.3 %
40,7%

Ausência Presença

GRÁFICO 1 - Uso do artigo definido diante de antropônimos no português


falado em Luanda – Angola.

É notável que a variação do fenômeno em questão existe e que o número de casos onde
há ausência de artigo definido diante de antropônimos é ligeiramente menor do que onde
há presença.
Em seus estudos, Callou e Silva (1997) observaram um significativo aumento no uso de
artigo com nome próprio tanto em Portugal quanto no Brasil, sendo que no Brasil o uso
é maior que em Portugal. Com isso, as autoras chamaram a atenção para a baixa realização
do artigo na região de colonização mais antiga, o que revelaria um caso de
conservadorismo linguístico. Segundo as autoras, “quanto mais antiga a colonização,
menor o percentual de uso do artigo” (CALLOU; SILVA, 1997. p. 22). Considerando o
contexto sócio-histórico de Angola, que sofreu uma colonização onde a língua portuguesa
foi firmemente imposta como língua oficial e língua de poder, tendo Angola se libertado
do domínio imposto por Portugal apenas na metade do século XX (ARAUJO, 2016), é
possível compreender a liderança de uso do artigo definido diante de nome próprio em
Luanda, um local de colonização portuguesa mais recente, o que corrobora a hipótese de
Callou e Silva sobre esse fenômeno variável nas outras ex-colônias portuguesas.
O principal grupo de fatores linguísticos checado para se verificar em qual posição na
sentença há maior ocorrência do artigo foi a posição sintática do antropônimo. A
checagem desse grupo foi estabelecida também a partir dos estudos de Callou e Silva
(1997), que apontaram para a relevância da checagem da posição sintática do
antropônimo na oração para melhor compreensão da variação estudada. As autoras
sugerem que é a partir do século XIV que se difunde o uso do artigo definido na língua
portuguesa, a princípio diante de nome que exercia função de sujeito. No presente estudo,
no que se refere ao uso do artigo definido, o antropônimo exercendo função de sujeito
apresentou o maior percentual de realização (84%, 21 ocorrências de artigo contra 4 não-
ocorrências), inferindo maior uso do artigo neste contexto.
No conjunto de variáveis externas à língua, ou seja, nos fatores sociais e extralinguísticos,
foram consideradas as categorias sociais mais abrangentes e recorrentes nos estudos
variacionistas, em especial a proximidade com o referido. As gramáticas de Cunha e
Cintra (1985) e Bechara (2004) relacionam a presença do artigo definido diante de
antropônimo com a familiaridade ou afetividade do falante com o referido. Nossos
resultados apontam para a presença do artigo sendo a variante preferida (63%) quando os
informantes de Luanda se referem a pessoas do meio social em que vivem. Os resultados
de nossas análises sobre a comunidade de fala estudada também demonstram que o uso
do artigo definido sofre um leve desfavorecimento na ocorrência quando o falante se
refere a pessoas famosas, personagens e pessoas públicas da região. Ainda assim, o grau
de familiaridade, ou fator de intimidade, conforme apontado por gramáticas tradicionais
para explicar o uso do artigo, não garante o seu uso na fala, uma vez que os falantes do
português variam ao fazer uso do artigo, independentemente da proximidade que possuem
com o referido.

CONSIDERAÇÕES FINAIS (ou Conclusão)


O objetivo de observar se a função sintática do sintagma nominal em que se encontra o
antropônimo na sentença seria relevante quanto ao uso do artigo foi atingido, sendo a
posição de sujeito a mais favorecedora para a ocorrência deste. Além disso, o principal
questionamento, se ocorre artigo definido antes de nomes próprios no português
luandense e se sua presença é mais utilizada do que sua ausência, pôde ser analisado
através de dados estatísticos. A execução e comparação dos resultados de trabalhos como
este é fundamental para melhor compreensão acerca da dinâmica da variação e da
mudança na língua portuguesa, além de apresentar evidências dos efeitos do contato
linguístico ocorrido na formação socio-histórica na constituição do português falado em
ex-colônias de Portugal.

REFERÊNCIAS
ARAUJO, Silvana Silva de Farias. A concordância verbal nos continua sociolinguísticos
do português brasileiro e do luandense. Interdisciplinar-Revista de Estudos em Língua e
Literatura. São Cristóvão: UFS, v. 24, p. 25-46, 2016.
BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa, Rio de janeiro, Lucerna, 2004.
CALLOU, Dinah; SILVA, Giselle M. Oliveira e. O uso do artigo definido em contextos
específicos. In: HORA, Dermeval da (Org.). Diversidade Lingüística no Brasil. João
Pessoa: Idéia, 1997.
CUNHA, C. e; CINTRA, L. F. L. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
WEINREICH, Uriel; LABOV, William; HERZOG, Marvin. Fundamentos empíricos
para uma teoria da mudança lingüística. Tradução de Marcos Bagno; revisão técnica
Carlos Alberto Faraco; posfácio de Maria da Conceição Paiva e Maria Eugênia L. Duarte.
São Paulo: Parábola Editorial, 2006.

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