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Walter De Mulder
Universidade de
Antuérpia Anne Carlier
Universidade de Valenciennes, EA 2446

Do artigo demonstrativo ao artigo


definitivo: o caso do ce em francês
moderno

Por analogia com o ciclo de negação (Meillet 1912, Jespersen 1917, 1971),
podemos admitir que existe um ciclo que leva do demonstrativo ao definitivo?
Tal hipótese não parece incongruente. Do demonstrativo do distanciamento
latino ille, o artigo definitivo li nasceu em francês antigo. Ao mesmo tempo, a
partir das formas reforçadas do ecce ille demonstrativo e do ecce iste do latim
tardio, as formas cil e cist se desenvolvem em francês antigo, assumindo a
função demonstrativa. Seu enfraquecimento leva ao aparecimento da forma
atônica ce 1. Este enfraquecimento está novamente correlacionado com o
desenvolvimento das formas reforçadas ce N-ci e ce N-là.
Esta hipótese de um ciclo que vai do demonstrativo ao definitivo levanta
duas questões:
– Em que estágio do ciclo é o determinante em francês moderno: ele ainda é
um demonstrativo por direito próprio ou está a caminho de se tornar um
artigo definitivo?
– E quanto ao artigo o: ainda é totalmente, em todos os seus usos, um
marcador de definibilidade?
Uma resposta clara a esta dupla pergunta é proposta por Harris (1977,
1980a/b).
– Segundo ele, o artigo definido em francês moderno não é mais um
marcador de definição, mas em alguns de seus usos tem o status de
determinante não marcado, aparecendo por padrão, quando o uso

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1. Para um estudo detalhado das mudanças morfo-sintáticas que afetam o sistema demonstrativo
durante o período da França antiga e média, ver Marchello-Nizia (1995: 115-181).

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O demonstrativo em
francês
de qualquer outro artigo ou determinante é semanticamente motivado. Seu
papel seria então puramente sintáctico e consistiria em marcar as
características de gênero e número. O artigo le teria assim chegado ao
último estágio do ciclo de gramaticalização, conforme definido por
Greenberg (1978):

Etapa 0 Etapa I Etapa II Etapa III


DEMONSTRATIVO > ARTIGO DEFINIDO > ARTIGO > MARCADOR
NÃO-GERÉRICO NOMINAL

Esta análise é baseada em uma comparação do funcionamento do artigo


definido em francês antigo e em francês moderno. Do francês antigo ao
francês moderno, a eliminação da inflexão do sufixo do substantivo deu um
impulso ao desenvolvimento de artigos em geral, pois eles permitem
preservar a marcação das oposições de gênero e número, em detrimento do
grau zero de determinação (Nyrop 1925: § 118, Car- lier & Goyens 1998: 78-
79). Como resultado desta extensão, o artigo definitivo tem sido utilizado em
francês moderno em contextos reservados em francês antigo para o grau zero
de determinação, onde, de acordo com Harris, a característica de indefinição
que o caracteriza não tem lugar.
- Esta gramaticalização do artigo le definido é possível pelo fato de que o
francês tem uma expressão que pode desempenhar o papel de artigo
definido, ou seja, o determinante não-marcado de demonstração ce.
Neste estudo, analisaremos a situação deste chamado
"Examinaremos, com base em fatos lingüísticos, até que ponto a função
original do artigo definido em francês moderno, ou seja, marcar a
definibilidade, foi apropriada por esta língua.
Entretanto, é necessário considerar primeiro a perspectiva a ser adotada a
fim de abordar esta questão. Não é possível determinar se o ce em francês
moderno está em processo de se tornar um artigo definido avaliando
diretamente, de uma perspectiva sincrônica, a proximidade ou distância
semântica do ce ao artigo le definido. Ao contrário, devemos tomar como
ponto de partida a idéia de Harris de que o cessar é um artigo emergente e,
portanto, está em um estágio inicial do processo de gramaticalização que leva
ao artigo definitivo, um estágio que não implica necessariamente um
apagamento de seu significado original. Traugott & Dasher (2002) especificam
as diferentes etapas

2. Entre os contextos onde o artigo definido é introduzido sem que seu uso seja motivado por seu
senso de definição, Harris (1977) menciona o genérico. Deve-se notar, entretanto, que o artigo
definido é usado em genéricos tão cedo quanto o francês antigo (Carlier & Goyens 1998). A
hipótese, defendida por Harris (1977), de que a extensão do artigo definido para o domínio do
genérico em francês se deve ao fato de que este artigo é usado para marcar gênero e número, ao
invés do sistema anterior de gênero sufixo e inflexão numérica, é invalidado por idiomas como o
e s p a n h o l e o italiano: Embora estes idiomas mantenham a inflexão de gênero e número
sufocados e ainda façam amplo uso do grau zero de determinação, eles ainda conceituam o
genérico em termos de definição.

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O demonstrativo em
francês
A fim de orientar melhor o trabalho interpretativo do orador, cada orador
utiliza ocasionalmente formas inovadoras, tirando proveito de inferências
pragmáticas. Tais usos de estilo pessoal podem se espalhar pela comunidade
linguística, de modo que passemos da fase de inovação para a fase de
mudança. A fase de mudança em si pode ser dividida em duas etapas
sucessivas, ou seja, uma etapa pragmática e uma etapa semântica. Na fase
pragmática, o novo uso do formulário ainda depende de seu texto de uso e
não implica ainda um divórcio do significado principal do formulário. Na
etapa semântica, este novo uso é emancipado do contexto de uso para que a
mudança seja inscrita no código linguístico. É em relação a este modelo de
mudança semântica que tentaremos situar o determinante cessa como ele
funciona em francês moderno.
Nosso estudo será dividido em quatro partes. Na primeira parte, dedicada
ao artigo le, mostraremos, seguindo Löbner (1985) e Himmelmann (1997), que
este artigo apresenta usos pragmaticamente definidos e usos semanticamente
definidos em francês moderno e que este último deve ser considerado como
os usos centrais. A relevância da distinção entre definição pragmática e
semântica será apoiada pelo fato de que ela corresponde em alguns idiomas
germânicos, incluindo o alemão Fering, a dois tipos diferentes d e artigos
definidos: um artigo definido
"Na primeira parte, analisaremos o determinante 'forte' ce, que é menos
gramaticalizado e usado em contextos pragmaticamente definidos, e o
determinante 'fraco' ce, que é mais gramaticalizado e usado em contextos
semanticamente definidos. Na segunda parte, que trata do determinante ce,
faremos uma comparação entre ce como funciona em francês moderno e o
artigo "forte" definido de Fering, o que nos levará a atribuir a ce o papel de um
marcador de d e f i n i ç ã o pragmático. Esta comparação com o caso de fering
levanta a questão de saber se este papel de marcador de definição pragmática
lhe confere o status d e artigo definido. Uma comparação com o surgimento
d o artigo definido em latim tardio mostrará que este papel ainda não implica
um divórcio do significado demonstrativo primitivo e, portanto, nenhuma
mudança categórica completa. Na terceira parte, vamos examinar quais
contextos de uso permitem a passagem da definição pragmática para a
definição semântica durante o processo de gramaticalização. Finalmente,
vamos examinar o estágio de evolução do ce em relação a este processo de
gramaticalização, desde a definição pragmática até a definição semântica, e
suas chances d e sucesso: o ce é um artigo definido (em elaboração)?

3. Como Traugott e Dasher (2002) apontam, esta suposição pode ser rastreada até Meillet (1912),
que usa o termo expressividade.

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Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
1. O ARTIGO LE DEFINIDO: ENTRE A DEFINIÇÃO
SEMÂNTICA E PRAGMÁTICA

1.1. A distinção entre a definição semântica e pragmática


Com base na tipologia de usos do artigo definido apresentado em
Hawkins (1978), Löbner (1985) faz a distinção entre a definição pragmática e
semântica. A definição pragmática ocorre quando o SN introduzido pelo
artigo definido depende crucialmente da situação ou contexto específico de
seu enunciado a fim de identificar sem ambigüidade seu referente.
Assim, os seguintes aspectos estão sob uma definição pragmática
– o uso em uma situação imediata para evocar um referente que se encontra
no campo da percepção (1/2):
(1) Não derrame o balde.
(2) Viemos para pedir-lhes que parassem o barulho.
– a repetição anafórica de um referente mencionado no contexto anterior (3):
(3) Paul entrou em um estábulo. O cheiro estável do feno (Kleiber 1987b: 107).
– o uso onde o substantivo principal é seguido por um relativo postulando a
existência do referente através de um local no tempo e/ou espaço (4) :
(4) Peter não gosta do livro que lhe dei no dia de seu aniversário.
De acordo com Löbner, a definição semântica ocorre quando o SN
introduzido pelo artigo definido estabelece uma referência unívoca em
virtude de restrições mais gerais, sem envolver diretamente a situação ou
contexto de seu enunciado. Assim, em (5),
(5) Entramos numa aldeia. A igreja ficava em uma colina.
Como exemplo de anáfora associativa, o artigo definido, ao aproveitar as
relações estereotipadas entre aldeia e igreja, leva à identificação do referente
evocado pela SN l'église como único, associando-o ao referente da SN un
village introduzido no contexto anterior (Charolles 1990). Da mesma forma,
em usos situacionais amplos como o sol, o exército, o presidente e o bistrô, o
artigo definido instrui a restauração de um quadro com o qual o referente tem
uma relação estereotipada e em relação ao qual pode ser concebido como
único, sem que este quadro seja explicitado no contexto anterior. Vale a pena
mencionar aqui também o uso genérico, que não é mencionado por Hawkins
(1978) ou Löbner (1985):
(6) a. O leão é um carnívoro.
b. Os Leões são carnívoros.
No caso de (7) e (8),
(7) O Presidente dos Estados Unidos
(8) O Presidente dos Estados Unidos
Este quadro em relação ao qual o referente é considerado como único é
explicitado na forma de um adjetivo genitivo ou relacional. Finalmente, Löbner
(1985) também considera como semanticamente definitiva a utilização na
situação imediata de

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O demonstrativo em
francês
evocar um referente não diretamente acessível à percepção na situação, mas
inferível a partir dessa situação porque tem relações estereotipadas com ela,
como nos exemplos (9) e (10):
(9) Você pode fechar a porta?
(10) Cuidado com o cão.
O artigo definido não é interpretado como uma referência direta ao contexto
particular de seu enunciado, mas conduz a um quadro dentro do qual é possível
a identificação inequívoca do referente, neste caso a sala ou a casa em que se
encontra (9) ou a propriedade privada à qual se aproxima
(10). O destinatário, portanto, só é dirigido indiretamente no processo de
decodificação ao contexto da enunciação, o que, segundo Löbner (1985),
distingue este caso do uso do artigo definido que evoca uma entidade no
campo da percepção, como ilustrado pelos exemplos (1) e (2).
(1) Não derrame o balde.
(2) Viemos para pedir-lhes que parassem o barulho.
Estudos estatísticos como o Fraurud (1990) mostraram que o artigo
definido é mais freqüente e inevitável em contextos de uso semanticamente
definidos do que em contextos de uso pragmaticamente definidos. Portanto,
os usos semanticamente definidos, como o uso associativo ou uso em uma
situação ampla, são considerados mais centrais e são o ponto de partida para
uma definição unitária do artigo definido.
A relevância desta distinção entre definição semântica e pragmática pode
ser apoiada pelo fato de que ela corresponde a uma oposição formal em várias
línguas germânicas. Ilustraremos nosso ponto de vista com Fering 5, um
dialeto frísio falado em uma das ilhas do norte da Frísia, analisado em
detalhes por Ebert (1971).

1.2. Uma oposição formal entre a definição semântica e pragmática na


simulação
O fering tem dois artigos definidos, o artigo D e o artigo A, distintos do
demonstrativo. Como demonstrou Lyons (1999: 161-163), a oposição entre a
definição semântica e a definição pragmática constitui o princípio de
distribuição entre estes dois artigos definidos.
O artigo-D, na forma di / det, é usado para marcar uma definição
pragmática. Ela pode ser encontrada nos seguintes contextos de uso:

4. Em Fraurud's (1990: 405) corpus sueco, 60,9% dos SNs introduzidos pelo artigo definido estão
sob definição semântica.
5. Vários idiomas regionais alemães, incluindo Mönchengladbach (Hartmann 1982), também têm
dois artigos definidos, que estão divididos em termos da oposição entre a definição semântica e a
pragmática. Como Hartmann (1982) e Löbner (1985) apontam, a posição entre os dois tipos de
definição também tem uma reflexão formal em alemão padrão: o artigo definido pode se
tornarclítico à preposição anterior quando marca a definição semântica (por exemplo, em das > ins),
mas permanece autônomo quando marca a definição pragmática.

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Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
– na situação imediata, para se referir a uma entidade no campo da
percepção. Como Ebert (1971: 104) aponta no exemplo a seguir, o uso do
artigo-D em (11) implica necessariamente que o orador está direcionando o
olhar para o referente em questão.
(11) Smatst' mi ans det / at pokluad auer ?
"Você vai jogar o lápis em mim?"
– para uma reafirmação anafórica de um referente introduzido no contexto
anterior na forma de um SN, não apenas no caso de uma anáfora fiel (12),
mas também quando o substantivo na reafirmação anafórica difere do
antecedente (13), em particular quando o referente é reclassificado de
acordo com um critério de avaliação (14).
(12) Peetje hee jister an kü slaachtet. Jo saai, det kü wiar äi sünj.
"Peetje abateu uma vaca ontem. Eles dizem que a vaca não era saudável".
(13) Matje hee al wäler an näi bridj. Di gast kön a nöös uk wel äi fol fu.
"Matje tem uma nova namorada novamente. Este jovem não consegue se fartar
dela".
(14) Heest dü wat faan Teetje hiard? Je, di idioot hee uunrupen an saad dat hi äi
kem wul ?
"Você já ouviu alguma coisa de Teetje? Sim, aquele idiota me telefonou para
dizer que não vem".
– para a repetição anafórica de uma proposta.
(15) Um jongen me manchou malmarter... Det spal käand ik noch
äi. As crianças estavam jogando mármore.... Eu não conhecia o
jogo.
– em uso catafórico, quando o substantivo principal ao qual o artigo
definido se refere é seguido por um parente estabelecendo a existência do
referente, situando-o no tempo e/ou no espaço.
(16) Rooluf hee det klook wechsleden, wat hi faan san uatlaatj fingen hee.
"Roluf perdeu o relógio que havia recebido de seu avô.
O artigo A, na forma a / at, expressa a definição semântica. De fato, toda a
gama de usos associados a ela pode ser identificada, incluindo o uso em
situação imediata onde o referente está associado a um quadro presente na
situação de enunciação (11/17), uso em situação ampla (18), uso genérico (19),
uso em combinação com substantivos de seres únicos (20) e a anáfora asso-
ciativa (21).
(17) Um hünj como auerkeerd würden.
"O cão foi morto na estrada". (o cão pertencente a um dos dois alto-falantes
ou associado ao local de emissão)
(18) A köning kaam tu bischük.
"O rei veio para visitar".
(19) Um klesi kaater.
"Arranhão de gatos".
(20) Um presunto dräit eard dräit a san.
"A terra gira em torno do sol.
(21) Üüs wi bi det hüs uunkam, wiar diar ab seedel bi-d-a döör.

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O demonstrativo em
francês
"Quando chegamos na casa, havia uma mensagem na porta".

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Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
Em Fering, como nas outras línguas germânicas mencionadas (ver nota 5),
o artigo definido expressando uma definição pragmática instrui para
estabelecer a identidade do referente a partir da situação particular ou do
contexto do enunciado. A definição semântica definitiva do artigo, por outro
lado, assume que o referente pode ser identificado apenas a partir do
conteúdo descritivo do SN, dadas as associações estereotipadas que ele tem
com um cenário ou cenário a ser apresentado. Esta diferença leva Lyons (1999:
163) a concluir que o artigo de definição semântica é menos substantivo em seu
significado do que o artigo de definição pragmática, na medida em que não
"cria" a definição em si, mas apenas aponta que o conteúdo descritivo do SN é
suficiente para estabelecer esta definição. Ao mesmo tempo, o artigo de
definição semântica também é menos substancial que o artigo de definição
pragmática do ponto de vista fonológico: segundo Löfstedt (1964: 182), o artigo
A desenvolvido a partir do artigo D por aférese do dígito consonantal, que
ocorre inicialmente em contextos onde segue uma palavra terminada em uma
consoante6. Segundo Meillet (1912: 139) e Lehmann (1995: 126), esta perda

conjunta de substância semântica e fonológica marca uma progressão no


processo de gramaticalização e, portanto, constitui um argumento adicional a
favor da hipótese de que a definição pragmática e a definição semântica
representam etapas sucessivas de gramaticalização.

1. O DETERMINANTE CESSA COMO UM MARCADOR DE DEFINIÇÃO


PRAGMÁTICA

1.1. Ce: um artigo 'forte' definido?


Não terá escapado da atenção do leitor atento que os contextos de uso
característicos do artigo 'forte' em Fering são também aqueles em que o
chamado determinante 'demonstrativo' ce em francês 7 pode ser encontrado.

6. Esta mesma erosão fonológica, característica de uma progressão da gramaticalização, pode ser
observada nos dialetos alemães. Nos dialetos baixos alemães, o artigo "fraco" deriva do artigo
"forte", amuzindo a vogal; ver Heinrich (1954: 87-89) para um exame detalhado da etimologia do
artigo "fraco" e sua relação histórica com o artigo "forte". No alemão padrão, o artigo que marca
a definição semântica também tem a tendência de se tornar enclítico em relação à preposição
anterior (por exemplo, um dem > am), perdendo assim sua autonomia sobre o eixo sintagmático.
De acordo com Lehmann (1995: 148), tal clientelização também marca uma progressão na
gramatinização.
7. O determinante tende até a prevalecer sobre le em dois contextos pragmaticamente definidos,
ou seja, na situação imediata para evocar um referente que está no campo da percepção e para a
recuperação anáfora de um referente introduzido no contexto anterior, quer este referente seja
evocado por meio de um SN ou corresponda a uma proposição. O uso do artigo le nestas mesmas
configurações tende a ativar uma estrutura relacional contra a qual o referente pode ser
localizado univocamente, por um conjunto de instrumentos de escrita em (i) ou uma fazenda em
(ii).
(i) Você vai jogar o lápis/este lápis em mim (ver, por exemplo, (11))
(ii) Paul foi para um estábulo. O estábulo / Este estábulo cheirava a feno (Kleiber 1987b: 107) (=
ex. (3))

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O demonstrativo em
francês
– na situação imediata, para se referir a uma entidade no campo da
percepção:
(22) Olhe para esta mesa: é nogueira! [...] Bem, vejam! Vê este buraco? Você vê
estas manchas negras ao redor do buraco como vinho derramado? (P.
Magnan, La maison assassinée, citado por Jonasson 1998: 62)
– para uma reformulação anafórica de um referente introduzido no contexto
anterior como um SN, especialmente quando esta reformulação anafórica é
acompanhada por uma reclassificação:
(23) Ele estava acariciando a protuberância de uma pedra que era grande demais
para ser alinhada e que tínhamos [...] Esta pedra, ele tinha batido com a
cabeça, no dia em que seu pai... (P. Magnan, La maison assassinée, citado por
Jonasson 1998: 63)
(24) No bloco de pedra bruta, Maria se aproximou de Serafim. Ela levantou seu
braço para ele e se refugiou nesta ala (P. Magnan, La maison assassinée, citado
por Jonasson 1998: 64)
– para a repetição anafórica de uma proposta :
(25) Como havia perdido os dentes, ele não mastigava mais. Agora, durante
cinqüenta anos, esta mastigação incessante do tabaco o havia separado dos
sons do mundo, para que agora ele pudesse ouvi-los com ouvidos novinhos
em folha. (P. Magnan, La maison assassinée, citado por Jonasson 1998: 62)
– em uso catafórico, quando o substantivo principal ao qual o demônio -
trativo se refere é seguido por um relativo estabelecendo a existência do
referente, situando-o no tempo e/ou no espaço:
(26) Terei que lhe mostrar este quadro que comprei. (L. Aragon, Les beaux
quartiers, Frantext)
Jonasson (1998) aponta que isto também ocorre na presença de um parente que
não estabelece a existência do referente, mas no máximo especifica o tipo de
referente que ele é. Este uso do demonstrativo, chamado "memorial" por
Himmelman (1997), transmite a instrução para reativar o conhecimento
compartilhado entre o orador e o destinatário:
(27) Monge estava em alerta. Ele estava tendo uma daquelas noites que exigem
que você fique acordado se quiser evitar más surpresas. (P. Magnan, La maison
assassinée, p. 78, citado por Jonasson 1998: 65)
(28) Mas, finalmente, é realmente razoável vir e viver entre esses artistas que
todos consideram um pouco estranho? (G. Duhamel, Suzanne et les jeunes
hommes, Frantext)
Este uso memorial está na fronteira da definição pragmática, na medida em
que o parente não mais permite a identificação inequívoca do referente, mas
no máximo contribui para ativar o conhecimento prévio que permite a
identificação deste referente. Assim, supõe-se que a referência é, em princípio,
conhecida do destinatário (Himmelman 1997: 79).
Embora o ce apareça nos diferentes contextos de uso característicos de uma
definição pragmática, não é correto identificar sem mais o caso do ce em
francês moderno com o do artigo forte atestado em algumas línguas
germânicas e chegar à conclusão de que o ce é um artigo

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Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
definitivo. Ambas as línguas germânicas desenvolveram um artigo definido
distinto do demonstrativo, que foi mantido em sua integridade em usos
pragmaticamente definidos, mas que teria sofrido erosão semântica e
fonológica em usos semanticamente definidos, resultando em uma
diferenciação entre uma forma forte e uma forma fraca do artigo definido. O
francês, por outro lado, recrutou uma forma existente que originalmente tinha
a função de um determinante demonstrativo, para marcar uma definição
pragmática. A freqüência de uso do ce com este significado enfraquecido é
parcialmente condicionada pelo estilo do autor, observa Jonasson (1998),
revelando uma convenção imperfeita. Além disso, este novo senso
enfraquecido de ce está fortemente enraizado no contexto do discurso. Nessas
condições, podemos admitir que o cessar como um marcador de definição
pragmática já adquiriu o status de artigo definido? Tentaremos lançar alguma
luz sobre esta questão, mostrando o paralelismo com o surgimento do artigo
definitivo em latim tardio.

2.2. O surgimento do artigo definitivo em latim tardio e a definição


pragmática
No latim tardio, dois determinantes competem no processo de
gramaticalização que leva ao artigo definido, a saber, ipse, um marcador de
identidade, e ille, um demonstrador de distância. Muitas vezes assume-se que
estes determinantes funcionam como artigos definidos já no quarto ou quinto
século. Examinamos até que ponto se justifica falar do artigo definitivo em
latim tardio, estudando o chamado funcionamento "articular" do ille e do ipse
em um corpus dos séculos VII e VIII, período anterior ao divórcio entre o latim e
as línguas românicas (Banniard 1992) 9.
Neste corpus, podem ser observados os dois usos do ipse a seguir, ambos
de definição pragmática. Como reafirmação anafórica de um referente
introduzido no contexto anterior na forma de um SN, o ipse é usado no caso de
uma reafirmação idêntica (29), enquanto o ille pode ser usado para trazer uma
nova perspectiva sobre o mesmo referente, por exemplo, no caso de uma
reclassificação (30):
(29) Seu diebus et Alamanni in pago Aventicensi Ultra-Jurano hostiliter ingressivo
sunt, ipsumque pagum praedantes, Abbelinus et Herpinus comites cum
caeteris de ipso pago comitibus cum exercitu pergunt obviam Alamannis.
"Naqueles dias, os Alamans entraram no distrito de Aven- ches, em Outre-
Jura, como inimigos. Como eles estavam pilhando este mesmo distrito, os
condes Abbelin e Herpin, juntamente com os outros condes deste mesmo
distrito, lideraram com um exército contra os Alamans".
(30) Quando Deo conplacuit, Aubedo ligatarius dirictus a Chlodoueo regi
causam legationes usque ad Chrotharium regem Langobardorum, Papia

8. Frédégaire, Chronique des temps mérovingiens (Livre IV et Continuations), texto de acordo com a
ed. de J.M. Wallace-Hadrill, trans. de Olivier Devilliers e Jean Meyers, Turnhout, Brepols, 2001.
9. Para uma apresentação mais detalhada desta pesquisa, veja Carlier & De Mulder (em breve).

LÍNGUA FRANCESA 152 105


O demonstrativo em
francês
coinomento Ticino ciuitatem Aetaliae peruenisset, cernens regina, quam
sepius in legationem ueniens uiderat et ab ipsa benigne semper susceptus
fuerat fuerat fuisse retrusam, quasi iniunctum habens exinde inter citera
Chro- thario regi suggessit quod illam parentem Francorum quam reginam
habuerat, per quem etiam regnum adsumserat, non dibuisset umiliare ;
[...(Fidegarius § 71)
"Quando agradou a Deus, o embaixador Aubedo foi enviado pelo rei Clovis
em uma embaixada em Rothari, Rei dos Lombardos. Ao chegar na cidade
italiana de Pavia, chamada Ticinum, ele descobriu que a rainha, que ele
havia visto com freqüência quando entrou na embaixada e por quem
sempre havia sido recebido com cortesia, havia sido reclusa. Portanto, como
se tivesse recebido ordem para fazê-lo, entre outras coisas, ele indicou ao rei
Rothari que não deveria ter humilhado este parente dos Francos que ele
havia tido como rainha, graças a quem ele havia tomado o trono.
Também aparece ao lado de substantivos que evocam uma referência que não
foi mencionada no contexto anterior, mas cuja existência é estabelecida por
um parente. Assim, a referência correspondente aos homines ainda não foi
mencionada no contexto anterior.
(31) [...] homines illos quos Waiofarius ad defendendam ipsam ciuitatem dimiserat
clementiam sue pietatis absoluit dimissisque reuersi sunt ad propria (Con-
tinuations § 43)
"Em sua misericórdia e piedade, ele libertou os homens que Waifre havia
enviado para defender a cidade; eles foram mandados de volta para suas terras.
Um terceiro uso identificado acima como pragmaticamente definido, ou seja,
o uso em situação imediata, não é atestado no corpus, o que pode ser
explicado pelo fato de que a natureza do texto, historiográfica, não é propícia
ao aparecimento deste tipo de uso.
A definição semântica, manifestada especialmente através dos usos
característicos da anáfora associativa e do uso em uma situação ampla, é
marcada no corpus pelo grau zero de determinação.
Devemos considerar ille e ipse como artigos que funcionam em latim
tardio? É inegável que ille e ipse atuam como marcadores de definição
pragmática: o orador-escritor explora o significado primitivo desses dois
determinantes a fim de orientar o ouvinte-leitor no trabalho interpretativo de
localizar o referente no contexto de uso. O uso regular destes determinantes
neste papel discursivo leva até mesmo a uma certa automatização de seu uso,
indo de mãos dadas com um enfraquecimento do significado primitivo.
Assim, por exemplo (32), o uso repetido do ipse, um marcador de identidade,
reforça as relações anafóricas que contribuem para a identificação do
referente, sem que esta identificação seja em si mesma confusa, já que não há
outro rei mencionado no contexto anterior:
(32) Superscriptus Remistanius contra praedicto rege et Francos seu custodias
quas ipse rex in ipsas ciuitates dimiserat, nimium infestus accessit, et Bito-
riuo seu et Limoticino quod ipse rex adquisierat, praedando nimium uas-
tauit, ita ut nullus colonus terre ad laborandum tam agris quam uineis
colere non audebant. (Continuação § 50)

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Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
"O já mencionado Remistiano fez um inimigo do já mencionado rei e dos
Francos, bem como das guarnições que o mesmo rei havia deixado nas
cidades, e devastou tanto o Bago quanto o Limousin, que o mesmo rei havia
conquistado, pilhando tanto que nenhum camponês se atreveu a cultivar a
terra, nem nos campos nem nas vinhas.
Embora o processo de gramaticalização que levará ao estágio do artigo
definido já tenha começado, o fato é que o funcionamento do ille e do ipse
neste uso "articular" não implica uma ruptura com seu significado primitivo,
mas é, ao contrário, condicionado por este significado primitivo 10. Além
disso, este funcionamento "articulatório" depende do contexto de utilização.
De fato, nenhum determinante é usado nos contextos de uso característicos da
definição semântica, quando a identificação do referente não envolve
diretamente o contexto de uso. Este funcionamento "articulatório" de ille e ipse
como aparece no corpus dos séculos VII e VIII não nos parece ser uma inovação
no sistema gramatical do latim tardio, o que justifica o termo "arti- cloids"
cunhado por Aebischer (1948) para designar estes artigos emergentes.

1. CE: DA DEFINIÇÃO PRAGMÁTICA À SEMÂNTICA


Este desenvolvimento relativo ao estágio de evolução do mal no latim final
dos séculos VII e VIII nos leva a nos perguntarmos sobre o estágio de evolução
do ce no francês moderno: o ce ainda está confinado a uma definição
pragmática ou está em processo de apropriação da definição como uma
característica semântica, tornando-se assim um artigo definitivo por direito
próprio? E se esta mudança semântica está em andamento, quais são os
contextos de uso que permitem a transição da definição pragmática para a
definição semântica?
Segundo Lyons (1999: 161, 332), o demonstrativo pode ser transformado
em um artigo definitivo porque existe uma zona de sobreposição entre os
dois: ele assinala que na situação imediata e na repetição anafórica de um
referente que acaba de ser mencionado no contexto anterior, o referente é
sempre diretamente acessível e a oposição deicta entre proximidade e
distanciamento, que não tem utilidade neste caso, pode desaparecer para dar
origem a um demonstrativo deixis-neutro. Este desaparecimento da marcação
de deictic, que equivale a uma erosão semântica, vai de mãos dadas com uma
erosão fonológica (ver neste ponto Dees 1971 e Marchello-Nizia 1995). O
processo de gramaticalização é assim iniciado e o novo artigo é gerado, desde
seu uso em situações imediatas e em repetição anafórica, até outros contextos
(Lyon 1999: 332).
Entretanto, a hipótese apresentada por Lyons (1999) levanta várias questões:

10. Para uma demonstração empírica com base no Merovingian Chronicle of Frédégaire, veja
Carlier & De Mulder (em breve).

LÍNGUA FRANCESA 152 107


O demonstrativo em
francês
– De uma perspectiva tipológica, foi observado por Greenberg (1978: 61) que
na maioria das línguas que desenvolveram um artigo definido, ele vem do
demonstrativo de distância. Esta predominância do demonstrativo de
distância como fonte do artigo definitivo é surpreendente se concordarmos
com Lyons (1999) que o artigo definitivo se desenvolve a partir dos usos
do demonstrativo em situação imediata e em recuperação anafórica, dado
que estes dois usos permitem uma alternância dos demonstrativos de
proximidade e distância, como ilustrado pelo exemplo (1') para o uso em
situação imediata em francês e exemplos (33/34) para a recuperação
anafórica em latim.
(1') Não derrame este balde / aquele balde.
(33) Lucca castrum diruunt, atque funditus subvertunt, custodes illius castri
capiunt (Continuação § 25)
"Eles chegaram ao forte de Loches, que eles destruíram até o chão, e
prenderam os guardas deste forte.
(34) Radulfus haec cernens, castrum lignis monitum in quodam montem super
Vnestrude fluvio in Toringia construcens, exercitum undique quantum plus
potuit collegens, cum uxorem et liberis in hunc castrum ad se definsandum
stabilibit. (Frédégaire § 87)
"Radulf, quando soube disso, construiu um forte, protegido por uma
paliçada de madeira, sobre uma colina com vista para o Unstrut na
Turíngia; ele reuniu de todos os lugares o maior exército que pôde e se
estabeleceu neste forte com esposa e filhos, determinado a se defender".
– Se aceitarmos a hipótese de que o artigo definido se desenvolve
diretamente a partir de usos do demonstrativo onde o referente é acessível
no contexto, seja porque está presente na situação imediata ou porque
acaba de ser mencionado no contexto anterior, é difícil explicar o possível
uso do ce na primeira menção que observamos quando o ce tem um
significado "memorial".
(35) Ele é um primo [...] daquele Marquês Salluste que caiu no ano passado (V.
Hugo, Ruy Blas, Frantext)
Deve-se notar que também permite o uso da primeira menção, sem efeito
"memorial".
(36) Vi o Marquês de Jouffroy e dei-lhe um artigo no panfleto de Scudo, que é
diabolicamente superficial quando examinado de perto. (J. Barbey
d'Aurevilly, Memorando 1, Frantext)
– Nem a postulação de Lyons (1999) sobre a gênese do artigo definido
explica como se constitui a propriedade discriminatória do artigo definido
em relação ao demonstrativo: o referente não é apresentado como
diretamente acessível, mas é localizado indiretamente, através de uma
estrutura de conhecimento disponível (Himmelmann 1997: 95-98).

11. Na Crônica de Frederick e suas Continuações, o demonstrativo de proximidade hic tem uma
freqüência relativamente alta em uso anafórico.

108
Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
Seguindo Himmelman (1997), argumentaremos que o uso "memorial" do
demonstrativo, ilustrado acima por (27), (28) e (35), poderia ser o caminho
para a definição semântica característica do artigo definido. Este uso memorial
compartilha com definição semântica o fato de que o referente é suposto estar
disponível no universo do discurso, sem ter que ser mencionado no contexto
anterior ou estar presente na situação imediata. Entretanto, o que distingue o
uso memorial do cessar demonstrativo da definição semântica que pode ser
expressa pelo artigo definido é que o conhecimento que permite que o
referente seja identificado univocamente não é um conhecimento geral, mas se
refere a uma experiência compartilhada pelo orador e pelo destinatário, às
vezes resultando em um efeito de conivência (Himmelmann 1997: 60-61,
Diessel 1999: 106-107). Esta diferença desta memorialização da definição
semântica é ilustrada por Gary-Prieur (2001: 232) com os seguintes exemplos,
onde os SNs demonstrativos com um parente só são aceitáveis se este parente
puder ser interpretado como evocando uma experiência pessoal
compartilhada por ambos os palestrantes:
(37) Gosto daqueles longos charutos italianos que Clint Eastwood fuma em
spaghetti wes- terns.
(38) Eu gosto daqueles charutos que Clint Eastwood fuma.
(39) Eu gosto destes charutos que são enrolados à mão em algumas vilas cubanas.
(40) *Eu gosto destes charutos que são italianos.
(41) *Gosto destes charutos que são pequenos.
(42) Eu gosto daqueles charutos que são grandes demais para serem colocados
no bolso de um casaco.
Não é, portanto, surpreendente que os pró-nomes tu / nós / vous / on apareçam
freqüentemente em tais parentes:
(43) Você conhece aqueles pequenos bolinhos de morango que você amava? (E.
Zola, La Curée, Frantext)
(44) Também a tradição constante em todos os países, que ensina que os mortos
se mostram à noite, pela lua e neblina, ou no mato das florestas, está muito
mais próxima da verdade do que esta ficção teológica que nos separa dos
mortos e os relega a um lugar remoto. (Alain, Proposta, Frantext)
Ao utilizar o "memorial" demonstrativo, o orador pode sinalizar ao
destinatário que o conteúdo descritivo do SN não é suficiente para identificar
univocamente o referente (Auer 1980, 1981, 1984) e convida-o a mobilizar
outros conhecimentos. É nesta perspectiva que podemos entender a
ocorrência frequente de incisos como tu sais, tu te souviens, dont'ai parlé etc.
ativando a memória (Himmelman 1997: 59-61, 81, Gary-Prieur 2001: 233).
(45) Você se lembra dessas bolas de lã de todas as cores, e foi você quem segurou
a meada (C.-F. Ramuz, Aimé Pache - Peintre vaudois, Frantext)
(46) Albertine, você sabe aquela garota bonita de quem você me falou, que jogou
golfe tão bem (M. Proust, À la recherche du temps perdu, Frantext)
(47) - Aquela pessoa, sabe, a Srta. E... de quem lhe falei, com quem eu deveria
tomar chá em quinze dias no Madame Chesneau's que a conhece, bem,
soube ontem que ela tem um amante, um grande banqueiro em Paris, que
não quer se casar com ela. (Villiers de L'Isle-Adam, Correspondance générale,
Frantext)

LÍNGUA FRANCESA 152 109


O demonstrativo em
francês
A fronteira entre o uso memorial de ce e o artigo le definido é às vezes
tênue, pois os SNs introduzidos por um artigo definido também podem
incluir um parente referente a uma experiência compartilhada por ambos os
oradores.
(48) Lembro-me dos elefantes que surpreendemos no buraco de um vale (J.
Kessel, The Lion, Frantext)
(49) Você se lembra daquele oficial que pegamos em Friedland, coberto de
feridas e jogado em uma vala pelos cossacos? (P. Mérimée, Les Espagnols en
Danemarck, Frantext)
(50) Vou fazer você rir: uma noite, eu o encontrei chorando como um bezerro
num canto sobre o pequeno cobertor acolchoado que você costumava
colocar em seu violino... você sabe, o pequeno cobertor de cetim vermelho
que ele lhe havia dado quando você ainda era criança. (J. Anouilh, La
sauvage, Frantext)
Entretanto, há uma diferença entre o artigo definido e o determinante
demonstrativo nos exemplos (48)-(50). Com o artigo definido, assume-se que o
conteúdo descritivo do SN é suficiente para identificar univocamente o
referente (Kleiber 1992). No caso do determinante demonstrativo, por outro
lado, falta esta suposição e a relação intersubjetiva entre os dois interlocutores
é invocada para regular o processo de recuperação do referencial, no sentido
de que o interlocutor convida o destinatário a trazer uma experiência comum
a fim de recuperar o referencial (De Mulder 1997: 188).
Em contraste com a hipótese de Lyons (1999), a hipótese que considera o
uso memorial de ce como o local da transição da definição pragmática para a
definição semântica explica naturalmente como um demonstrativo no
processo de gramaticalização pode se apropriar da característica de definição
semântica que a faz alcançar o status do artigo definido: o uso do memo- rial
do demonstrativo permite evocar um referente que não é diretamente
acessível, mas mobiliza o conhecimento que permite identificar o referente
por associação a este conhecimento. Isto também explica porque ele pode ser
usado como uma primeira menção.
Além disso, de uma perspectiva tipológica, é possível explicar, no âmbito
desta hipótese, porque geralmente é o demonstrativo de distância que tende a
se engajar neste caminho de gramaticalização. Como demonstrado para o
alemão por Vuillaume (1980) e para o francês antigo por Kleiber (1987a), no
caso de uma oposição entre um demonstrativo(s) de proximidade e um
demonstrativo de distância O(s) demonstrativo(s) de marca(s) de proximidade
que as informações disponíveis no contexto imediato de sua ocorrência -
enunciativas ou textuais - são suficientes para identificar o referente, enquanto
o demonstrativo de distância sugere que outras informações além daquelas
disponíveis no contexto imediato de sua ocorrência contribuem para a
identificação do referente. O uso do demonstrativo de distância incentiva
assim o orador a ativar o conhecimento prévio em sua memória que contribui
para a identificação do referente, o que naturalmente o predispõe a evoluir,
através da memorização, na direção da definição semântica.

110
Do artigo demonstrativo ao artigo definitivo: o caso do ce em
francês moderno
4. CE: UM ARTIGO DEFINIDO (EM ELABORAÇÃO)?
Onde o determinante deve estar situado, em francês moderno, na escala de
gramaticalização que leva do artigo demonstrativo ao definitivo? Já chegou ao
estágio do artigo definido, como Harris (1977: 258) afirma? Os fatos
observados neste estudo nos levam a adotar uma atitude mais matizada. Isto
de fato embarcou no processo de gramaticalização que leva ao artigo definido.
Além do fato de que, como demonstrativo, perdeu o componente deictic que
nos permite opor proximidade e distância 12, apropriou-se de contextos
pragmaticamente definidos, onde o referente é acessível porque está presente
no contexto de uso, o que nos levou a compará-lo ao forte artigo definido
atestado em algumas línguas germânicas. Também é usado em uso memorial,
que está no limite da definição pragmática, e pode assim garantir a transição
para a definição semântica. O fato de que o demonstrativo é usado em sentido
memorial pode ser visto como uma indicação de uma progressão no processo
de gramaticalização. O estudo bem documentado de Laury (1997: 186-187)
sobre o surgimento do artigo definido em finlandês mostra que o
demonstrativo de distância gramaticalizando é inicialmente usado para
enfatizar referências que são diretamente acessíveis por menção prévia e
somente em uma segunda etapa é estendido a referências que são acessíveis
pelo fato de serem conhecidas pelo destinatário sem serem mencionadas no
contexto anterior. Seria interessante examinar os primeiros usos do cez na
linguagem medieval a este respeito, a fim de verificar se são observadas as
mesmas etapas evolutivas no processo de gramaticalização.
A existência deste uso memorial do demonstrativo, mesmo que constitua
um progresso no processo de gramaticalização, não é suficiente para atribuir a
este artigo o status de artigo definido. Em primeiro lugar, este memorial
permanece ancorado em seu contexto de uso, mostrando assim sua filiação a
uma definição pragmática. Como Himmelman (1997) e Gary-Prieur (1998,
2001) apontam, o uso memorial de ce está mais freqüentemente ligado à
presença de um modificador adnominal na forma de um parente. Embora este
parente não estabeleça de forma unívoca a identidade do referente, ele
contribui para ativar o conhecimento que torna possível estabelecer a
identidade deste referente. Além disso, de acordo com as observações de
Jonasson (1998), este uso do demonstrativo, sem ser marginal, é de freqüência
variável de acordo com os autores e é marcado estilisticamente em
comparação com o uso do artigo definido le no mesmo contexto. Isto significa
que o demonstrativo ainda não perdeu seu valor primitivo neste uso
memorial: ao contrário do artigo definido, ele não pressupõe que o referente
seja univocamente idêntico, mas envolve a relação intersubjetiva entre as duas
inter

12. Um estudo da evolução semântica da oposição entre o demonstrativo chamado "distância" e o


demonstrativo chamado "proximidade" é proposto por Marchello-Nizia neste volume.

LÍNGUA FRANCESA 152 111


O demonstrativo em
francês
alto-falantes para regular o processo de recuperação de referências para
identificação de referências.
Se é verdade que o cessar em francês moderno ainda não é um artigo
definitivo, quais são suas chances de adquirir esse status, seguindo o exemplo
do mal demonstrativo latino? A pergunta m e r e c e ser feita, pois o uso
memorial do demonstrativo já é atestado e m francês antigo. Assim, em (51) o
uso do demonstrativo é, segundo Buridant (2000: § 101), que retoma a análise
de Kleiber (1987a: 23-24), justificado pelo fato de ativar o conhecimento da
santa história, levando à identificação do referente em questão, ou seja, o
apóstolo Pedro. A proximidade com o artigo definido é demonstrada pelo fato
de que este artigo é adequado no mesmo contexto, sem efeito memorial (52).
(51) Por cel apostre qu'en quiert en Noiron pré.
"Por este apóstolo que procuramos nos jardins de Nero"
(Charroi de Nîmes, 279, citado por Buridant 2000: § 101)
(52) Mes par l'apostre qu'en quiert en Pré Noiron (Charroi
de Nîmes, 3451, citado por Buridant 2000: § 101)
Embora o uso memorial do demonstrativo francês seja assim há muito
estabelecido, a evolução para a definição semântica não parece seguir e as
chances de alcançar o status de artigo definido são mais reduzidas para o
demonstrativo francês do que para o demonstrativo latino. Na transição do
francês para a língua românica, ille, ao tornar-se um artigo definido, substitui
uma ausência de determinação. Entretanto, pode-se admitir que uma ausência
de marcação, correspondente a um valor semântico indiferenciado, oferece
menos resistência à extensão de uma forma concorrente do que uma marcação
explícita associada a um conteúdo semântico preciso. Enquanto o artigo
definitivo for mantido com uma substância semântica própria, o cessar
demonstrativo não pode adquirir o status de artigo definitivo. Este é
certamente o caso ainda na linguagem atual: embora o artigo definido mostre
sintomas de enfraquecimento semântico, como demonstrado, por exemplo,
pelas alternâncias do tipo avoir peur / avoir la trouille, acreditamos, ao contrário
de Harris (1977, 1980a-b), que o artigo definido le está longe de ser um simples
marcador do status nominal e das categorias morfológicas de gênero e
número associadas a ele.

Referência
s
AEBISCHER, P. (1948), "Contribution à la protohistoire des articles ille et ipse dans les langues
romanes", Cultura neolatina 8, 181-203.
AUER, J.C.P. (1980), Referenzierungssequenzen. Ein Beitrag zur Ethno-Konversationsanalyse des Referierens,
Konstanz, Fachbereich Sprachwissenschaft.
AUER, J.C.P. (1981), "Zur indexikalitätsmarkierenden Funktion der demonstrativen Artikelform in
deutschen Konversationen", em Hindelang G. & W. Zillig, eds, Sprache: Verstehen und Handeln,
Tübingen, Niemeyer, 301-311.
AUER, J.C.P. (1984), "Referential problems in conversation", Journal of Pragmatics 8, 627-648.

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