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Spanish in Miami
Sociolinguistic Dimensions of Postmodernity
Andrew Lynch
Introdução 1
DERMEVAL DA HORA, CARMEN MATZENAUER
PARTE I
Aquisição Fonológica 15
PARTE II
Variação Fonológica 157
Clara Amorim
Doutora em Linguística pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Porto,
PT. É também professora convidada na Escola Superior de Educação de Viana
do Castelo. Desenvolve pesquisa sobre a aquisição fonológica típica em crian-
ças Portuguesas e em aprendentes de Português como língua estrangeira.
Elisa Battisti
Professora Associada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS, Brasil.
Atua nas áreas de Fonologia e Sociolinguística. Doutora em Linguística pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Pós-doutorado em
Fonologia pela Vrije Universiteit-Amsterdam e Meertens Instituut, Holanda.
Pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecno
lógico (CNPq – Brasil). Coordena o banco de dados LínguaPOA (https://ufrgs.
br/linguapoa).
Larissa Cristina Berti
Professora Adjunta da Universidade Estadual Paulista, Marília, SP, Brasil, Doutora
em Linguística Unicamp, com Pós-Doutorado pela Universidade de Toronto.
Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq. Vice- Coordenadora do Labo-
ratório de Análise Articulatória e Acústica (LAAc) da UNESP. Atua nas áreas
de aquisição da linguagem oral, fonética e fonologia, análise acústica e análise
ultrassonográfica.
Leda Bisol
Professora Titular pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS, Brasil.
Aposentada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), foi pro-
fessora do curso de Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Rio
Grande do Sul. Pesquisadora 1A do CNPq-Brasil.
Silvia Figueiredo Brandão
Professora Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Doutora
em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ. Pesquisadora do
CNPq-Brasil e Cientista do Nosso Estado (FAPERJ, 2015–2018). Desenvolve e
orienta pesquisas no âmbito da Sociolinguística Variacionista e da Dialetologia.
viii Colaboradores
Dinah Callou
Professora Titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Doutora
em Letras Vernáculas – Área Língua Portuguesa, pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro, com Pós-Doutorado em Linguística (Universidade da Califor-
nia/Santa Bárbara,). Pesquisador 1-A do CNPq – Brasil. É coautora do primeiro
Atlas Linguístico Brasileiro, o APFB (Atlas Prévio dos Falares Baianos), junta-
mente com Nelson Rossi e Carlota Ferreira, publicado em 1963 pelo INL/MEC.
Raquel Chaves
Professora da Universidade Estadual do Paraná, PR, Brasil. Doutora em Linguís-
tica pela Universidade Federal de Santa Catarina. Pós-doutorado em Linguís-
tica pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Desenvolve pesquisas
especialmente dentro do quadro teórico-metodológico da Sociolinguística Varia-
cionista, concentrando-se em fenômenos de interface Fonologia/Morfologia.
Teresa Costa
Professora da Universidade da Madeira, Funchal, Portugal. Doutora em Linguís-
tica Portuguesa pela Universidade de Lisboa, Membro do Centro de Linguística
da Universidade de Lisboa (CLUL). Os seus trabalhos de investigação incidem,
particularmente, no domínio da fonologia, área de aquisição, e na linguística
educacional.
Maria João Freitas
Professora da Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal. Doutora em Letras
(Aquisição de Fonologia de Língua Materna) pela Universidade de Lisboa. Tem
Agregação pela Universidade de Lisboa em Linguística Portuguesa. É diretora
do Doutoramento em Linguística da FLUL. Desenvolve investigação sobre
aquisição da fonologia do Português Europeu.
Sónia Frota
Professora da Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal. Coordenadora científica
do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. É também directora do
Lisbon Baby Lab e editora principal do Journal of Portuguese Linguistics. A
sua investigação cruza as áreas da prosódia e da aquisição da linguagem nos
primeiros anos de vida.
Danielle Kely Gomes
Professora Adjunta da Universidade Federal do Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Doutora
em Letras Vernáculas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Dedica-
se a pesquisas em teorias fonológicas, nas interfaces aquisição da linguagem/
aprendizagem da escrita, contato linguístico e análises contrastivas entre varie-
dades do Português.
Athany Gutierres
Professora da Universidade Federal da Fronteira Sul, Chapecó, Brasil. Doutora em
Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Suas pes-
quisas concentram-se, sobretudo, na área de fonologia e variação, com vistas à
descrição das variedades de Português faladas no sul do Brasil.
Colaboradores ix
Gregory Guy
Professor da New York University, NYC, Estados Unidos da América do Norte.
Dentre seus interesses, destacam-se linguística histórica, sociolinguística, foné-
tica e fonologia. No que diz respeito à sociolinguística, tem trabalhado prin-
cipalmente com a representação da variação na teoria linguística, os aspectos
sociais da variação e mudança e as questões metodológicas da modelagem
estatística da variação.
Dermeval da Hora
Professor Titular pela Universidade Federal da Paraíba, PB, Brasil. Aposentado.
Doutor em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Realizou estágio pós-doutoral por duas vezes na Vrije Universiteit – Holland.
Pesquisador 1B CNPq – Brasil. Preside desde 2017 a Associação Internacional
de Linguística e Filologia da América Latina (ALFAL). É membro do Comitê
Internacional de Linguistas (CIPL) desde 2019. Desenvolve pesquisa nas áreas
de sociolinguística variacionista e fonologia.
Cristiane Lazzarotto-Volcão
Professora Titular da Universidade Federal de Santa Catarina, SC, Brasil. Doutora
em Letras pela Universidade Católica de Pelotas. Realizou pesquisa de pós-
doutorado no Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Desenvolve
pesquisa sobre a aquisição fonológica típica e atípica em crianças Brasileiras e
Portuguesas.
Seung Hwa Lee
Professor Adjunto da Universidade Federal de Minas Geras, MG, Brasil. Doutor
em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas. Tem pós-doutorado
em Fonologia pela University of Massachusetts at Amherst. Tem experiência
na área de Linguística, com ênfase em Fonologia, atuando principalmente nos
seguintes temas: fonologia, acento, teoria da otimalidade, interface fonologia-
morfologia e variação das vogais.
José Magalhães
Professor Titular da Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, Brasil. Dou-
tor em Linguística pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Atua na área de descrição e análise linguística, desenvolvendo pesquisas sobre
o sistema fonológico do Português. Coordenador do Projeto Teoria e Análise da
ALFAL (Associação de Linguística e Filologia da América Latina).
Carmen Matzenauer
Professora Titular pela Universidade Católica de Pelotas, RS, Brasil; Professora
Visitante da Universidade Federal do Rio Grande, RS, Brasil; Professora Colabo-
radora da Universidade Federal de Pelotas, RS, Brasil. Doutora em Letras pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. É pesquisadora 1A do
Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento (CNPq) do Brasil. Desen-
volve investigação na área de Linguística, com ênfase em Fonética e Fonologia,
atuando principalmente nos seguintes temas: aquisição da fonologia, fonologia
do Português, fonologia clínica e teoria fonológica.
x Colaboradores
Chao Zhou
Professor da Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal. Doutor em Linguística pela
Universidade de Lisboa. Investigador do Centro de Linguística da Universidade
de Lisboa (CLUL). Suas principais áreas de investigação são aquisição da lin-
guagem, fonologia, fonética, psicolinguística, métodos quantitativos.
Introdução
Movimentos da língua na aquisição e na
variação fonológica
DOI: 10.4324/9781003294344-1
2 Dermeval da Hora, Carmen Matzenauer
e, como foi dito anteriormente, os fenômenos não espelham mudança, uma vez que
mantêm mais de uma forma em paralelo.
No processo de desenvolvimento fonológico, até a inclusão do segmento /ʎ/
ao seu inventário consonantal, as crianças Brasileiras mostram, em seu espaço
fonético-fonológico, ou um zero fonético, ou outro segmento, de forma variável,
conforme registra MatzenauerHernadorena (1999, 83) e se exemplifica em (1).
(1) Formas fonéticas que ocupam, de forma variável, o espaço de /ʎ/ na aquisição
do PB: [ø] ~ [l] ~ [j] ~ [lj] ~ [li] ~ [ʎ]
Forma alvo Forma da criança
palhaço pa[ʎ]aço [pa’asʊ]
espelho espe[ʎ]o [i’pelʊ]
vermelha verme[ʎ]a [ve’mejɐ]
folha fo[ʎ]a [’foljɐ]
orelha ore[ʎ]a [o’reliɐ]
telhado te[ʎ]ado [te’ʎadU]
(2) Formas fonéticas que ocupam, de forma variável, o espaço de /ʎ/ na gramática
de falantes adultos do PB: [ʎ] ~ [lj] ~ [j] ~ [l] ~ [ø]
Forma alvo Formas em variação
orvalho orva[ʎ]o [oɾ’vaʎʊ]
orvalho orva[ʎ]o [oɣ’valjʊ]
olho o[ʎ]o [’ojʊ]
orvalho orva[ʎ]o [oɾ’valʊ]
braguilha bragui[ʎ]a [bɾa’giɐ]
Expõe Brandão (2007, 91–92) que o emprego das formas variantes da lateral pala-
tal no Brasil é bastante produtivo em comunidades rurais ou em falantes com baixo
ou nulo nível de escolaridade, sendo que, nestes grupos sociais, a frequência de
registro destas formas mostra este ordenamento: [j] > [ʎ] > [ø]. Em centros urba-
nos, o índice de frequência encontra esta hierarquia: [ʎ] > [lj] > [j], [l].
Observando-se as formas fonéticas que podem representar o segmento
fonológico /ʎ/ nos dados mostrados em (1) e em (2), verificase a similaridade
que há nos movimentos da língua na variação presente na gramática de crianças
e na gramática de adultos. Em uma análise que atribua aos traços fonológicos
que compõem a estrutura interna do segmento /ʎ/ a propriedade de autosseg-
mentos, tais movimentos de variação podem ser diferentemente interpretados na
gramática das crianças e na gramática dos adultos, caso se considere que os adul-
tos têm, em sua fonologia, a representação do segmento complexo /ʎ/, enquanto
Introdução 5
(3) (a) ao usarem a forma fonética do glide [j] no espaço de /ʎ/, os falantes des-
ligam, da estrutura interna da consoante, a articulação primária consonan-
tal, produzindo apenas o resultado da articulação secundária vocálica;
(b) ao usarem a forma fonética da lateral [l] no espaço de /ʎ/, os falantes des-
ligam, da estrutura interna da consoante, a articulação secundária vocálica,
produzindo apenas o resultado da articulação primária consonantal;
(c) ao usarem a forma fonética da sequência lateral + glide coronal [lj] no
espaço de /ʎ/, é promovido um espraiamento na estrutura interna da late
ral palatal: a articulação secundária vocálica da consoante espraia para
a estrutura da vogal subsequente (desde que não seja a vogal [i]), dando
origem a um ditongo derivado, o que favorece a variação, encontrada, por
exemplo, em orva[ʎʊ] ~ orva[ljʊ].
Ao tratar-se da(s) gramática(s) das crianças, em virtude de as representações
fonológicas estarem sendo construídas no curso de seu desenvolvimento linguís-
tico, entende-se que pode ainda não se ter formado a representação fonológica do
segmento complexo /ʎ/. Neste caso, ao se observarem as formas fonéticas [l] ~
[j] ~ [lj] ~ [li] (vejase (1)), têmse quatro tipos de ocorrência explicitadas em (4):
(4) (a) ao usarem a forma fonética do glide [j] no espaço de /ʎ/, as crianças ainda
não ligaram, à estrutura interna da consoante, a articulação primária conso-
nantal, produzindo apenas o resultado da articulação secundária vocálica;
(b) ao usarem a forma fonética da lateral [l] no espaço de /ʎ/, as crianças ainda
não ligaram, à estrutura interna da consoante, a articulação secundária
vocálica, produzindo apenas o resultado da articulação primária consonantal;
(c) ao usarem a forma fonética da sequência lateral + glide coronal [lj] no
espaço de /ʎ/, as crianças indiciam que a sua gramática fonológica já incor-
porou o segmento complexo /ʎ/, mas, mesmo assim, não há a produção
da forma [ʎ] e, como ocorre na gramática dos adultos, é promovido um
espraiamento na estrutura interna da lateral palatal: a articulação secundária
vocálica da consoante espraia para a estrutura da vogal subsequente (desde
que não seja a vogal [i]), dando origem a um ditongo derivado, o que
favorece a variação, encontrada, por exemplo, em pa[ʎa]so ~ pa[lja]so;
(d) ao usarem a forma fonética da sequência lateral + vogal coronal [li] no
espaço de /ʎ/, as crianças evidenciam que na sua gramática fonológica já
foi incorporado o segmento complexo /ʎ/, mas que, mesmo assim, é pro-
movida uma fissão na estrutura interna da lateral palatal, da qual resulta a
sequência [li], com a lateral [l], originada do nó estrutural que domina a
articulação primária consonantal, e a vogal [i], originada do nó estrutural
que domina a articulação primária consonantal.1
6 Dermeval da Hora, Carmen Matzenauer
Notas
1 Esta análise segue a proposta de Bisol (1994) para a formação de ditongos derivados no
Português e a proposta de Matzenauer-Hernandorena (1999) para o tratamento que crian-
ças Brasileiras dão às soantes palatais /ʎ/ e // no processo de aquisição fonológica.
2 Pode ocorrer o emprego de [l] no espaço de /ʎ/ diante da vogal [i], motivado por OCP,
conforme explica Matzenauer-Hernandorena (1999), o que se observa nestes exemplos:
fi[ʎ]o → fi[l]inho; abe[ʎ]a → abe[l]inha.
Referências
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Introdução 13
Aquisição Fonológica
1 Aquisição fonológica típica e atípica
Ana Vogeley, Ana Margarida Ramalho
Resumo
Este capítulo pretende descrever o desenvolvimento fonológico típico para o Português
Brasileiro (PB) e para o Português Europeu (PE), discutindo, inicialmente, fenômenos
muito tenros no módulo da compreensão, do estabelecimento de categorias fonéticas
pelo bebê, à evolução gradiente do balbucio e surgimento das primeiras palavras. Será
ainda considerada a hierarquia na emergência da aquisição segmental e prosódica,
designadamente das estruturas silábicas, e descritos os processos fonológicos comuns
à aquisição típica. O primeiro objetivo do capítulo é contribuir para a compreensão
dos diferentes níveis da fonologia, das relações entre o nível segmental e a estrutura
prosódica no processo de aquisição da fonologia em contexto típico a partir de dados do
PE e do PB. O segundo objetivo é discutir fenômenos fonológicos persistentes ou inco-
muns no curso típico de desenvolvimento que podem servir como marcadores clínicos
para diagnóstico diferencial e intervenção dos Transtornos dos Sons da Fala – TSF.
Para Vihman (2014), o primeiro ano é marcado por uma aprendizagem distribucional,
uma descoberta inconsciente das sequências fonotáticas e sintáticas e de categorias
DOI: 10.4324/9781003294344-3
18 Ana Vogeley, Ana Margarida Ramalho
Isso quer dizer que, no estágio entre 2:0–2:6, todas as plosivas estão adquiridas
juntamente com as nasais. As fricativas seguem as plosivas e as nasais, na ordem
de aquisição segmental das línguas naturais. Essa classe de sons deve ser adquirida
até, aproximadamente, aos 2:6–3 anos de idade e caracteriza-se por conter tanto
fonemas de aquisição inicial /f, v/, como fonemas de aquisição mais tardia /s, z, ʃ,
ʒ/. A aquisição das líquidas do PB é marcada por ser de domínio mais tardio. Essa
classe de consoantes sofre bastante com a aplicação de processos fonológicos. O
fato de as líquidas serem bastante complexas, especialmente a não-lateral /r/, tanto
do ponto de vista articulatório quanto do fonológico, pode justificar a aquisição
tardia, não apenas no PB, mas em outros sistemas linguísticos. Em relação ao orde-
namento de aquisição das líquidas, a lateral /l/ é a primeira líquida a ser dominada
pelas crianças, e sua aquisição é bem mais estável e inicial do que a da não-lateral
/r/. A lateral alveolar /l/ é adquirida primeiro em posição de onset absoluto, como
em /lago/, por volta de 2:8 e, apenas aos 3 anos de idade, aproximadamente, é
dominada em onset medial, como em /sala/, seguida da líquida palatal /ʎ/. A líquida
não-lateral /r/, na posição de onset simples, como em /parede/, é adquirida entre 4
anos – 4:6, sendo, portanto, um fonema de surgimento tardio no desenvolvimento
fonológico.
24 Ana Vogeley, Ana Margarida Ramalho
Plosivas
Nasais /m, n, ɲ/
Fricativas /f, v, s, z/
Fricativas /∫, ʒ/
Líquida /l/
Fricativa /h/
Líquida e tap /r/
Líquida/ʎ /
Codas2/N, L/
Coda /S/
Coda /R/
Clusters CrV
Clusters ClV
Segmentos e estruturas 3;0 3;6 3;11 4 4;6 4;11 5 5;6 5;11 6 > 6
Plosivas a,b,c3 d
Nasais a,b,c d d (/ɲ/)
Fricativas /f, v, s/ a,b,c d
Fricativas /z/ b, c a d
Fricativas /∫, Ʒ/ a,b,c d a d
Líquida lateral alveolar /l/ c a b d
Líquida lateral palatal /ʎ/ a c b d
Rótico dorsal /ʀ/ a,b,c d
Rótico alveolar /ɾ/ c a,b d
Coda /ʃ/ b, c a d
Coda /l/ b a c d
Coda /ɾ/ a, b c d
Clusters CrV a,c b d
Clusters ClV a, c d
com base em processos fonológicos (e.g. Mendes et al., 2013; Lousada et al.,
2013). Alguns dos estudos realizados para o PE (Guerreiro; Frota, 2010; Charrua,
2011; Lousada et al., 2012; Jesus et al., 2015) referem que as crianças com desen-
volvimento fonológico típico registram processos fonológicos que afetam:
O nível prosódico
1. Apagamento de consoante final – cor /ˈcoɾ/ → [ˈco]
2. Redução de cluster – braso /ˈbɾasu/ → [ˈbasu]
3. Apagamento de sílaba átona – batata /bɐˈtatɐ/ → [ˈtatɐ]
4. Metátese – creme /ˈkɾɛmɨ/ → [ˈkɛɾmi]
5. Epêntese – prato /ˈpɾatu/ → [pɨˈɾatu]
6. Monotongação – mãe /ˈmɐj/ ̃ ̃ → [ˈmɐ̃]
O nível segmental
1. Oclusão/Plosivisação – fim /ˈfĩ/ → [ˈpĩ]
2. Anteriorização – capa /ˈkapɐ/ → [ˈtapɐ]
3. Despalatalização – chapéu /ˈʃuvɐ/ → [ˈsuvɐ]
4. Palatalização – sopa /ˈsopɐ/ → [ˈʃopɐ]
5. Desvozeamento – mesa /ˈmezɐ/ → [ˈmesɐ]
6. Semivocalização de líquidas – pêra /ˈpeɾɐ/ → [ˈpejɐ]
7. Harmonização consonântica – banana /bɐˈnɐnɐ/ → [mɐˈnɐnɐ]
8. Desnasalização – nata /ˈnatɐ/ → [ˈdatɐ]
9. Substituição de vogal – creme /ˈlɛmɨ/ → [ˈlɛmi]
Aquisição fonológica típica e atípica 27
No PE, as classes que estabilizam mais tardiamente são a das fricativas e a das
líquidas. No primeiro caso, a complexidade associada ao traço [anterior] tem um
efeito que se traduz em maior complexidade para as crianças. No caso das líquidas,
observa-se um efeito associado à distribuição prosódica das líquidas, observando-
se um claro efeito de estrutura silábica, relatado para várias línguas (e.g. Lampre-
cht, 2004; Fikkert, 2007), com tendência para uma aquisição mais tardia em Coda
(Cd) e em Ataque ramificado (AR).
Os dados dos estudos realizados para o PE (Freitas; Ramalho; Gomes, in press)
em que se identifica a instabilidade da lateral /l/ reforçam a evidência relatada
sobre a complexidade associada à classe das líquidas. Apesar de a aquisição da
estrutura silábica ser fundamental para a estabilização dos segmentos, nomeada-
mente daqueles que podem ocorrer em mais do que uma posição silábica, no PE,
a lateral /l/ tem registrado comportamento diferente, revelando uma estabilização
cada vez mais tardia, mesmo em ataque simples (AS).
A perspectiva da análise fonológica não linear tem vindo a ser cada vez mais
aplicada ao PE, em estudos com crianças com desenvolvimento típico e atípico.
Nestes trabalhos, têm sido explorados aspectos segmentais e prosódicos, particular-
mente até ao domínio de palavra prosódica, que será o foco deste capítulo. Alguns
dos estudos disponíveis incluem já alguma informação sobre aquisição da estrutura
silábica, acento de palavra, posição na palavra e extensão de palavra (Freitas, 1997;
Correia, 2009; Amorim, 2014; Ramalho, 2017).
Sabe-se sobre o desenvolvimento da sílaba que, para o PE, o ataque acompanha
todo este processo, e Freitas (1997) registra a seguinte ordem de estabilização dos
constituintes silábicos: (i) Ataque não ramificado e Núcleo não ramificado (Estágio
I, onde se observa a produção dos formatos silábicos dos tipos CV e V); (ii) Rima
ramificada, com aquisição da Coda (Estágio II, sendo visíveis sílabas com formatos
do tipo CVCfricativa); (iii) Núcleo ramificado (Estágio III, onde já estabilizaram
os formatos do tipo CVG e CVClíquida; (iv) Ataque ramificado (Estágio IV, onde
são adquiridas as estruturas CCV).
No PE, a ordem de aquisição AS>>Cd>>AR para o segmento /ɾ/ foi atestada em
vários estudos (Freitas, 1997; Mendes et al., 2013; Amorim, 2014; Ramalho, 2017;
Vidal, 2019). Contudo, para /l/, relativamente à estabilização do segmento em fun-
ção da constituição silábica, colocamse dois cenários distintos: i) AS>>Cd>>AR
(Freitas, 1997; Ramalho, 2017); ii) AS>>AR>>Cd (Mendes et al., 2013; Amorim,
2014). Várias explicações têm vindo a ser propostas como justificação dos resulta-
dos obtidos, sendo todas consensuais no que diz respeito à complexidade fonológica
associada a este segmento, a que se associa o efeito de constituição silábica.
Sobre o acento, vários dos estudos para o PE que se têm centrado nesta variável
(Freitas, 1997; Correia, 2004, 2009; Freitas, 2006; Vigário; Frota; Martins, 2006,
Amorim, 2014) referem que as produções não conformes ao alvo, como omissões
ou substituições, ocorrem preferencialmente em sílaba átona, tendo sido identifi-
cado o processo de omissão de sílaba átona como um processo frequente nas cri-
anças Portuguesas com desenvolvimento típico (Nogueira, 2007; Lousada, 2012).
28 Ana Vogeley, Ana Margarida Ramalho
anos. A terapia de vocabulário central foi mais eficaz aos três anos para crianças
cometendo erros inconsistentes. Esse ECR e os achados atuais sugerem que cri-
anças pré-escolares com erros atípicos de fala podem ter prioridade no acesso à
terapia.
Uma análise descritiva comparou os erros de produção cometidos aos 4 e 7
anos por crianças inicialmente identificadas com dificuldades fonológicas e/ou
articulatórias. No geral, 42% das crianças identificadas aos 4 anos apresentavam
dificuldades de fala persistentes aos 7 anos de idade. Um número significativo não
“cresce” de um distúrbio da fala. Ao longo dos três anos entre as avaliações, dois
terços das crianças com atraso no desenvolvimento fonológico tiveram resolução
espontânea, em contraste a apenas um terço das crianças que cometeram erros
atípicos de dados normativos para o desenvolvimento da fala.
Os resultados têm implicações clínicas para a prática de avaliação e decisões
de política de serviço, bem como demonstra a necessidade de pesquisas que se
concentrem em subgrupos de transtorno de fala, em vez de terem o foco em uma
única população heterogênea.
Os estudos sobre desenvolvimento atípico e de intervenção em fonologia em
PE ainda estão a dar os primeiros passos. No entanto, os resultados disponíveis
revelam exatamente a importância e a necessidade do aumento do conhecimento
sobre a especificidade das alterações associadas aos diferentes quadros clínicos.
Encontram-se disponíveis alguns trabalhos sobre desenvolvimento fonológico
atípico, existindo dados sobre o desenvolvimento de crianças com alterações sen-
soriais, com imaturidade associada à prematuridade (Nogueira, 2007) e com alter-
ações fonológicas primárias, associadas a quadros de TDL e/ou TSF (Lousada,
2012; Baptista, 2015; Jesus et al. (2015); Ramalho, 2017; Reis, 2018; Catarino,
2019; Vidal, 2019; Faria, 2020, entre outros).
Em um estudo randomizado controlado que descreve o desenvolvimento de cri-
anças com dificuldades fonológicas e compara abordagens de intervenção, foram
encontradas diferenças significativas no grupo experimental, tratado com terapia
de consciência fonológica, relativamente ao grupo de controle, tratado com terapia
articulatória tradicional (Lousada, 2012). Jesus et al. (2015) relataram que as crianças
com TSF apresentavam uma PCC bastante inferior e um uso significativamente supe-
rior de processos fonológicos considerado típicos, mas também o uso de processos
fonológicos atípicos (e.g. omissão de consoante inicial e posteriorização, não identi-
ficados no grupo de controle), quando comparadas com o grupo de crianças típicas.
O trabalho preliminar de Ramalho; Lazzarotto-Volcão; Freitas (2017), sobre
potenciais marcadores clínicos fonológicos no PE, encontrou diferenças na ordem
de aquisição dos segmentos /l/ e /ɾ/ nas crianças com TDL (/l/ >> /ɾ/) e com TSF (/ɾ/
>> /l/), observandose que a crianças com TDL registravam valores de aquisição em
curso de /l/ (taxas de acerto acima dos 50% em várias posições silábicas) e valores
abaixo de 50% para /ɾ/, sendo registrado o inverso para a criança com TSF, que
apresentava aquisição em curso de /ɾ/, e /l/ com valores abaixo dos 50%. Catarino
(2019), no estudo realizado com crianças com PDL, identifica os Ataques rami
ficados formados por obstruinte + lateral como potenciais marcadores clínicos na
identificação da PDL no PE.
Aquisição fonológica típica e atípica 35
Considerações Finais
Neste capítulo, pretendeu-se relatar as etapas e variáveis fundamentais de aquisição
da fonologia em contexto de desenvolvimento típico e atípico nas variantes do
36 Ana Vogeley, Ana Margarida Ramalho
Notas
1 Em relação ao consenso terminológico acerca das alterações de fala, estudos mais recentes
no PB adotam o termo Transtorno dos Sons da Fala, para a categoria nosológica mais
abrangente, e o termo Transtorno Fonológico, para o subtipo com falhas de representação,
e o termo Transtornos Motores de Fala, para o subtipo com falhas no controle motor de
fala (planejamento, programação e execução). Estudos mais recentes no PE (Lousada,
2012; Jesus et al., 2015; Ramalho; Lazzarotto-Volcão; Freitas, 2017; Reis, 2018; Vidal,
2019) adotam o termo Perturbações dos Sons da Fala como categoria nosológica abran-
gente (Bowen, 2015), sendo frequentemente usado o termo Perturbações dos sons da fala
de base fonológica (Jesus et al., 2015) para designar os quadros clínicos em que existe al-
gum déficit de natureza fonológica (atraso fonológico, perturbação fonológica consistente
ou perturbação fonológica inconsistente – cf, Dodd, 2014). Na recente obra da Sociedade
Portuguesa de Terapia da Fala (in press), as secções dedicadas à Fonologia (avaliação,
intervenção e estudos de caso) são uma interface entre as secções de Linguagem e Fala,
precisamente com o objetivo de se discriminarem comportamentos que permitam diferen-
ciar práticas de avaliação, diagnóstico e intervenção nas alterações fonológicas presentes
nos diferentes quadros clínicos que envolvem alterações no módulo fonológico.
2 Apesar de, para o PB, se assumir a existência de Coda nasal, para o PE, a análise
proposta não assume a existência de uma consoante em Coda, mas, antes, a presença
de um traço flutuante [+ nasal], realizado ou não, em função da estrutura da palavra,
não possuindo, por isso, uma posição estrutural fixa. A presença de nasalidade no
núcleo resulta assim do espraiamento do traço [+nasal], constituindo o único frag-
mento preservado do Latim da consoante nasal em Coda (Mateus; Andrade, 2000;
Rodrigues, 2012).
3 Usam-se como referência os principais estudos sobre aquisição para o PE: a) Mendes
et al., 2013; b) Guimarães et al., 2014; c) Amorim (2014); d) Ramalho (2017). As setas
Aquisição fonológica típica e atípica 37
indicam que foi a última faixa etária estudada e o segmento não estava adquirido nessa
faixa etária.
4 https://phonbank.talkbank.org
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2 Padrões de aquisição de contrastes
consonantais no Português Brasileiro
e Europeu
Clara Amorim, Cristiane Lazzarotto-Volcão
Resumo
A aquisição de segmentos consonantais de uma língua é um processo gradual que
se constrói a partir do estabelecimento de contrastes, que é computado de forma
hierárquica de acordo com a posição ocupada pelos traços distintivos numa hier-
arquia (Clements, 2001, 2003, 2009; Matzenauer-Hernandorena, 1990, 2008;
Dresher, 2003, 2009; Lazzarotto-Volcão, 2009, 2012; Amorim, 2014). Ao longo do
processo de aquisição fonológica, a partir do input linguístico, os traços distintivos
pertinentes na língua-alvo vão emergindo no sistema da criança e estabelecendo
coocorrências com outros traços já presentes, de modo que os contrastes vão se
estabelecendo em direção a essa gramática-alvo. O objetivo deste capítulo é esta-
belecer uma hierarquia de contrastes consonantais do Português em duas varie-
dades: a Brasileira e a Portuguesa. A proposta encontra-se alicerçada na análise de
dados à luz dos Princípios Fonológicos baseados em Traços de Clements (2009),
em particular, do Princípio da Robustez de Traços. Estudos anteriores (Lazzarotto-
Volcão, 2009, 2019; Amorim, 2014) já apontam para especificidades no processo
de aquisição por crianças Brasileiras e Portuguesas. Neste trabalho, busca-se apro-
fundar esses aspectos, reanalisando os dados dessas pesquisas, somados à análise
de dados longitudinais de dois irmãos gêmeos Brasileiros (Marques, 2016, 2020) e
dados transversais de 56 crianças Portuguesas (Ramalho, 2017).
1 Introdução
A aquisição do sistema fonológico de uma língua é um processo complexo que
implica que a criança reconheça os sons que são contrastivos na sua língua e a
forma como se distribuem, adquirindo, portanto, não só o inventário segmental, mas
também as restrições fonotáticas e a estrutura prosódica das palavras. No entanto,
a aquisição segmental não se faz globalmente, isto é, a criança não adquire os seg-
mentos como um todo. Pelo contrário, este é um processo gradual em que a cri-
ança vai adquirindo os traços distintivos e estabelecendo as ligações necessárias até
construir a arquitetura do segmento (entre outros, Matzenauer-Hernandorena, 1990;
Dresher, 2003, 2009; Fikkert; Freitas, 2006; Fikkert, 2007; Lamprecht et al., 2004).
A ideia de que os traços distintivos estão organizados numa hierarquia remonta
já aos trabalhos de Jakobson (Jakobson, 1941/1968; Jakobson; Fant; Halle, 1952,
DOI: 10.4324/9781003294344-4
Padrões de aquisição de contrastes 43
entre outros). Com efeito, Jakobson ([1968] 1941) tentou estabelecer uma ordem
universal, com base na frequência com que ocorrem na língua. No entanto, depois
desses trabalhos iniciais, hierarquias contrastivas perderam relevância na descrição
fonológica das línguas, reaparecendo algumas décadas mais tarde nos trabalhos
de Clements, que começa por propor uma Escala de Acessibilidade, mais tarde,
uma Escala de Robustez (Clements, 2009 [2005]). Este trabalho foi a base para a
proposta de uma hierarquia de contrastes consonânticos para o Português Brasileiro
(PB) (Lazzarotto-Volcão, 2009) e para o Português Europeu (PE) (Amorim, 2014).
Neste capítulo, pretendemos revisitar essas propostas de hierarquia de aquisição
de contrastes e, à luz de novos dados (Marques, 2016, 2020; Ramalho, 2017), esta-
belecer um estado da arte para os estudos em aquisição fonológica do Português.
2 O modelo de Clements
De acordo com Clements (2009, 77–78), há três níveis representacionais nas lín-
guas: o lexical, o fonológico e o fonético. Conforme cada nível representacional há
diferentes condições de especificação de traço:
De acordo com essa proposta, todos os traços presentes no nível lexical são levados
para o nível fonológico e aqueles presentes no nível fonológico são levados para o
fonético. Já o inverso não necessariamente aconteceria, os traços presentes no nível
fonético podem ou não estar nos níveis fonológico e lexical, bem como os traços do
nível fonológico, no nível lexical.
Para determinar como se dará a entrada dos traços na representação lexical de
uma dada língua, Clements (2001, 80) propôs uma Hierarquia Universal de Aces-
sibilidade, a qual é chamada pelo autor, em trabalho posterior (2009 [2005]), de
Escala de Robustez, a qual será mais bem detalhada adiante. De acordo com essa
hierarquia, os traços dispostos na parte de cima da escala de acessibilidade são alta-
mente favorecidos na construção dos sistemas fonológicos, enquanto que, na parte
inferior da hierarquia, estão os traços que são altamente desfavorecidos.
Assim, as unidades lexicais da fala são categorizadas e diferenciadas por um con-
junto mínimo de traços (ou valores de traço) marcados, selecionados a partir da escala
universal de acessibilidade de traço. Esse conjunto mínimo é a característica princi-
pal da economia representacional, uma vez que, para o autor, deve haver evidências
empíricas explícitas para justificar a presença de entidades representacionais.
44 Clara Amorim, Cristiane Lazzarotto-Volcão
S/T. Quanto maior o index, mais a língua é “econômica”, ou seja, quanto menor o
número de traços e quanto maior o número de sons, mais econômica será a língua.
Clements (op. cit.) aponta que as línguas evoluem na direção dessa economia, no
sentido de passarem a ter contrastes estabelecidos por traços já existentes em sua
gramática e, também, no sentido de eliminarem traços responsáveis por um único
contraste.
Este terceiro princípio proposto por Clements é anunciado como uma nova aborda-
gem para o estudo dos inventários fonológicos, que substitui as formas tradicionais
de estudo sobre marcação. O autor inicia sua proposta demonstrando a interação
deste princípio com o de
Economia de Traço, segundo o qual as línguas tendem a evitar a ocorrência de
traços (ou valores de traços) marcados. Contudo, uma vez que esses traços (ou
valores de) estejam presentes, o princípio da Economia força que haja um aprovei-
tamento máximo dos contrastes possíveis com esse traço. É o que ocorre com as
fricativas sonoras, as quais são constituídas por valores marcados dos traços [voz] e
[contínuo]. Contudo, as línguas que licenciam essa possibilidade tendem a combi-
nar esses traços com mais de um traço de ponto. Assim, uma vez que haja fricativa
no sistema, haverá pelo menos duas distinções de ponto nessa classe de sons.
Clements mantém o critério utilizado em 2001 para determinar qual o traço (ou
valor de) pode ser considerado como mais marcado. Seu critério refere-se à frequên-
cia com que determinado traço é utilizado nas línguas para estabelecer contrastes.
Com isso, o autor rejeita a possibilidade de considerar como marcado o traço que
possui alguma característica articulatória ou perceptual mais complexa, em relação
a outro que não a possua. Isso se dá pelo fato de que há vários fatores envolvidos
na produção e percepção dos sons, tais como fatores neuronais, fisiológicos, aerod-
inâmicos, entre outros, os quais podem conflitar entre si ao analisar determinado
fenômeno linguístico. Em decorrência dessa posição, o autor afirma que “um valor
de traço é marcado se estiver ausente em algumas línguas, do contrário, é não mar-
cado” (Clements, 2009, 35). Dentro de uma classe de sons na qual um determinado
traço T é potencialmente distintivo, o número de sons que carrega o valor marcado
de T é menor que o número de sons que carrega o valor não marcado de T.
Esse princípio, assim como o princípio da Economia de Traços, representa uma
força e, não, uma lei estrita das línguas. Desse modo, pode não ser respeitado por uma
determinada gramática, já que aceita exceções. Esse fato o torna mais adequado que
os Universais Implicativos jakobsonianos – que determinam que a presença do mar-
cado implica necessariamente a presença do não marcado – para explicar a marcação.
d) Robustness (Robustez)
a. [±soante]
[labial]
[coronal]
[dorsal]
b. [±contínuo]
[±posterior]
c. [±voz]
[±nasal]
d. [glotal]
e. outros
e) Reforço Fonológico
2.4 apresenta as quatro etapas propostas pelo PAC, em que constam os traços mar-
cados que surgem em cada etapa, as coocorrências que se estabelecem e os con-
trastes que emergem a partir disso. É importante destacar nesse quadro que, a partir
da 4ª etapa, não há a aquisição de traços novos. Indo além, podemos ver que já na
primeira etapa do processo de aquisição, quase todos os traços (5 de 7) fazem parte
do sistema fonológico da criança. Esse fato evidencia que a complexidade do sis-
tema vaise configurando através das coocorrências que surgem a partir dos traços
adquiridos. Essas coocorrências é que fazem com que os vários contrastes surjam
no sistema, conforme já afirmava MatzenauerHernandorena (2008).
Gráfico 2.1 Comparação entre o padrão de aquisição do Gêmeo A e o padrão previsto pelo
PAC-PB. Produzido pelas autoras.
Soante x obstruintes
Gráfico 2.2 Comparação entre o padrão de aquisição do Gêmeo C e o padrão previsto pelo
PAC-PB. Produzido pelas autoras.
52 Clara Amorim, Cristiane Lazzarotto-Volcão
Quadro 2.5 Aquisição das consoantes do PE – comparação dos dados de Costa (2010) e
Amorim (2014) (adaptado de Amorim, 2014, 289)
Quadro 2.6 Etapas de aquisição do sistema consonantal do PE (adaptado de Amorim, 2014, 314)
(a) [± soante]
[soante, contínuo, coronal]
[soante, contínuo, labial]
[soante, contínuo, dorsal]
[soante, contínuo, ±voz]
[+soante, aproximante, labial]
[+soante, aproximante, coronal]
(b) [+soante, -aprox, coronal, ±ant]
[-soante, -contínuo, dorsal ±voz]
[soante, ±contínuo]
[soante, +contínuo, coronal]
[soante, +contínuo, labial]
[soante, +contínuo, labial, ±voz]
(c) [-soante, +contínuo, coronal, ±voz]
[soante, +contínuo, coronal, ±ant]
[soante, +contínuo, coronal, ant, ±voz]
[-soante, +contínuo, dorsal]
[+soante, ±aproximante]
(d) [-soante, +contínuo, coronal, +ant, ±voz]
[+soante, +aprox, ±contínuo]
[+soante, +aprox, contínuo, ±ant]
[+soante, +aprox, +contínuo, coronal]
[+soante, +aprox, +contínuo, dorsal]
não atinge valores superiores a 80% em todas as faixas etárias analisadas, sendo a
sua aquisição mais tardia do que a da lateral palatal.
Embora diferenças metodológicas possam explicar, em parte, estes resultados,
outros fatores devem ser considerados, entre os quais a variação existente no input
e diferenças dialetais.
A velarização da lateral /l/ em posição intervocálica encontra-se há muito
relatada em várias descrições fonéticas do PE (por exemplo, Strevens, 1954; Bar-
bosa, 1965; Viana, 1973). Mais recentemente, estudos articulatórios e acústicos
têm demonstrado que a velarização de /l/ não é exclusiva da coda silábica, ocor-
rendo em todas as posições na sílaba (entre outros, Andrade, 1998, 1999; Mar-
tins; Oliveira; Silva, 2010; Oliveira; Teixeira Martins, 2010; Oliveira et al., 2011).
Esses estudos sugerem que a distinção entre a lateral velarizada e não velarizada é
difícil de perceber, podendo ser influenciada por fatores como posição na palavra,
contexto vocálico e falante. Mais recentemente, em um estudo acústico, Rodrigues
et al. (2019) confirmam que a lateral é velarizada em todas as posições silábicas,
mas argumentam que essa velarização pode ser maior ou menor, dependendo da
posição silábica e do contexto vocálico. Tendo em consideração os valores de F3,
os autores sugerem que a lateral do PE é produzida num continuum, sendo mais
velarizada em posição de Coda silábica e depois das vogais recuadas [u, o, ɔ].
Apesar de ser já consensual a velarização da lateral em todas as posições
silábicas, são necessários mais estudos, com mais participantes e com falantes
de diferentes dialetos do PE, já que os trabalhos existentes baseiam-se princi-
palmente em amostras linguísticas de falantes de dialetos centro-meridionais. Com
efeito, poderá haver diferenças dialetais ainda não descritas. O fato de os dados de
Amorim (2014) provirem de falantes nativos de dialetos setentrionais, enquanto os
de Ramalho-PE são de crianças da zona de Lisboa, poderá explicar os diferentes
resultados encontrados.
Outra hipótese a considerar prende-se com a estrutura interna da consoante
/l/ em PE. Mateus; Andrade (2000) consideram este segmento subespecificado,
tal como todos os coronais, devendo-se a velarização, obrigatória em posição de
Coda, à aplicação de uma regra pós-lexical que lhe atribui um ponto de articulação
secundário dependente do nó vocálico. No entanto, poder-se-á equacionar uma rep-
resentação diferente, considerando-o um segmento complexo, com ligação ao nó
vocálico, à semelhança do que propõe Freitas (2001) para a lateral.
O Quadro 2.8 apresenta uma síntese da aquisição de traços distintivos e das
coocorrências de traços a partir da aquisição dos contrastes consonantais encontra-
dos no corpus Ramalho-PE.
Relativamente às fricativas coronais, nos dados de Ramalho-PE, as crianças
parecem começar por adquirir uma categoria genérica “fricativa coronal”. Com
efeito, a flutuação na utilização de [s] e [ʃ] evidencia a emergência do contraste rel-
ativamente às labiais, não havendo ainda, porém, o contraste entre [+ant] e [ant].
Por outro lado, a instabilidade encontrada na aquisição da lateral alveolar, bem
como o padrão de substituição encontrado para o rótico coronal (substituído princi-
palmente pela lateral coronal [+ant]), parece indicar que o primeiro contraste entre
nasais e líquidas se deve, para algumas crianças, à aquisição da lateral coronal,
Padrões de aquisição de contrastes 59
Conclusão
Neste capítulo, retoma-se a proposta de Clements (2009) acerca de a fonologia
das línguas ser formatada a partir de cinco princípios fonológicos: Limitação de
60 Clara Amorim, Cristiane Lazzarotto-Volcão
Notas
1 Amorim (2014) considera que o traço [ant] é uma subcategoria do traço coronal
(Matzenauer-Hernandorena, 1996), pelo que a criança começa por adquirir o traço [coro-
nal] e só posteriormente faz a distinção [+ant] x [ant]. Com base nos dados de Amorim
(2014), é a coronal [ʃ] que estabiliza primeiro, sendo usada como substituta das restantes
coronais.
2 Nesta etapa, parece haver uma categoria genérica fricativa coronal, não havendo contraste
entre [+ant] e [ant]. No entanto, há já o contraste entre fricativas coronais e labiais.
3 A instabilidade encontrada na aquisição da lateral alveolar, bem como o padrão de subs-
tituição encontrado para o rótico coronal (substituído principalmente pela lateral coronal
[+ant]), parece indicar que o primeiro contraste entre nasais e líquidas se deve, para al-
gumas crianças, à aquisição da lateral coronal, enquanto, para outras, a primeira líquida a
emergir é o rótico coronal.
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3 A aquisição de assimetria na gramática
fonológica do Português
O exemplo da líquida lateral /l/
Resumo
Dentre as assimetrias que os sistemas fonológicos podem apresentar, está o inventário
de segmentos licenciados para preencher os espaços como constituintes na estrutura
silábica. Presente na gramática fonológica do Português, essa assimetria responde
pela licença a todas as consoantes da língua para ocupar o Ataque simples da sílaba,
e pelas restrições para o espaço da Coda. A líquida lateral /l/ destaca-se por poder
ocupar o Ataque e a Coda de sílabas, em início, meio e fim de palavras (exs: lata,
bala, alma, anel), além de poder integrar o Ataque silábico complexo (exs: planta,
clube). As manifestações fonéticas, entretanto, são diferentes: em Ataque simples
tende a mostrar representação fonética estável, com prevalente manifestação como
alveolar anterior [l], tanto no Português Brasileiro (PB) quanto no Português Europeu
(PE); na Coda predomina a lateral dorsalizada [ɫ] no PE e a forma vocalizada [w]
no PB. Essas assimetrias são o objeto do presente estudo, no qual se desenvolve
uma reflexão sobre as suas implicações na ativação de representações fonológicas da
lateral durante o processo de aquisição fonológica por crianças Brasileiras e Portu-
guesas. A argumentação é subsidiada pelas variantes alofônicas que ocupam o espaço
fonético-fonológico da lateral /l/ em ambas as posições silábicas, nas gramáticas dos
dois grupos de crianças, até que sejam alcançadas as formas alvo.
1 Introdução
A arquitetura dos sistemas linguísticos atesta uma relação direta entre segmentos e
sílabas: os segmentos são unidades da fonologia que se organizam em sílabas, ocu-
pando seus três constituintes: Ataque, Núcleo e Coda. O licenciamento determinado
por cada sistema para o preenchimento dos constituintes marginais e/ou do pico, seg-
undo Selkirk (1984) e Clements (1990), está vinculado à noção de soância (sonority)
– esta é a propriedade que está subjacente ao algoritmo de silabação de cada língua.
Para Clements (1990), o perfil de sílaba ideal para as línguas contém uma subida
brusca de soância do Ataque para o Núcleo e uma descida leve de soância do Núcleo
DOI: 10.4324/9781003294344-5
64 Carmen Matzenauer, Maria João Freitas
para a Coda. Esse perfil prevê uma assimetria entre segmentos licenciados para os
constituintes Ataque e Coda e efetivamente os sistemas linguísticos apontam uma
tendência a que os segmentos passíveis de ocupar a posição de Coda constituam um
subconjunto daqueles a que é permitida a posição de Ataque silábico.
A fonologia do Português apresenta essa assimetria: sendo o Núcleo silábico
posição reservada a segmentos vocálicos, das dezenove consoantes do inventário
fonológico da língua, todas podem preencher o Ataque simples em sílabas mediais
de palavras, mas poucas são licenciadas para a ocupação do constituinte Coda: qua-
tro consoantes em PB – a líquida lateral, a líquida rótica, a nasal e a fricativa coro-
nal (Bisol, 2014 [1996]); três consoantes em PE – a líquida lateral, a líquida rótica
e a fricativa coronal (Mateus; D’Andrade, 2000). Com interesse nessa relação entre
segmento e constituinte silábico, o foco deste Capítulo está na líquida lateral /l/,
que se destaca por poder ocupar o Ataque e a Coda de sílabas, diferentemente da
líquida lateral palatal /ʎ/ e das líquidas róticas /ʀ/ e /ɾ/, posicionandose em Ataque
e em Coda em início, meio e fim de palavras (exs: lata, bala, alma, anel), além de
poder integrar o Ataque silábico ramificado (exs: planta, clube).
Em não havendo restrição fonológica para a presença do segmento lateral /l/
nos constituintes marginais das sílabas do Português e nas diferentes posições que
a sílaba pode ocupar na palavra, o funcionamento da língua apresenta distinções
nas suas manifestações fonéticas, evidenciando formas em variação. Estudos de
cunho variacionista sobre o Português Brasileiro apontam estabilidade fonética
na manifestação da líquida lateral /l/ em posição de Ataque de sílaba, mas revelam
a possibilidade de formas diversas na posição de Coda silábica, seja medial ou
final de palavra (Bisol, 1981; Quednau, 1993; Tasca, 1999; Espiga, 2000; Brandão,
2021). E chama a atenção o diferente tratamento que este segmento recebe no Por-
tuguês Brasileiro (PB) e no Português Europeu (PE): enquanto nas duas variedades
da língua a lateral /l/ tende a mostrar representação fonética estável na posição de
Ataque de sílaba, com prevalente manifestação como alveolar anterior [l], mostra
diferenças na posição de Coda silábica, sendo predominantes a lateral dorsalizada
[ɫ] no PE e a forma vocalizada [w] no PB (Bisol, 2014 [1996]; Mateus; D’Andrade,
2000; Collischonn; Costa, 2003; Schwindt; Wetzels, 2016).
No PB, apesar da prevalência da manifestação fonética da lateral em Coda,
tanto em sílaba medial como final de palavra, na forma [w], há estudos de cunho
variacionista que registram outras formas fonéticas, especialmente no Rio
Grande do Sul, estado que contém comunidades de colonização alemã e italiana
e que divide fronteira com dois países de língua espanhola (Uruguai e Argen-
tina). Dentre estas pesquisas, citam-se as de Quednau (1993) e de Tasca (1999),
que registraram a ocupação variável do espaço da lateral em Coda por [l] ~ [ɬ] ~
[w], e também se destaca a investigação de Espiga (2000), que identificou, em
região fronteiriça do Brasil com o Uruguai, as formas [l] ~ [lw] ~ [ɬ] ~ [w] e zero
fonético. As diferentes manifestações fonéticas da lateral em posição de Coda
silábica frente à sua estabilidade na posição de Ataque confirmam o compor-
tamento assimétrico desse segmento consonantal nas duas margens da sílaba.3
Diante dessa realidade, o objetivo da investigação aqui apresentada voltou-se
para a representação da lateral /l/, durante o processo de aquisição fonológica, na
A aquisição de assimetria na gramática fonológica do Português 65
2 Sobre a lateral no PE e no PB
Articulatoriamente (Ladefoged; Maddieson, 1996), a lateral alveolar é produzida
com oclusão na linha médio-sagital do trato vocal, com toque do ápice da língua na
zona dos alvéolos dentários do maxilar superior, movimento que determina o ponto
de articulação primário do segmento; a passagem do fluxo de ar é feita através das
zonas laterais do dorso da língua, o que conduz à classificação do seu modo de
articulação como lateral; quanto à atividade laríngea, são ativadas as pregas vocais.
O alofone velarizado é produzido com retração da zona posterior da língua, cons-
tituindo o ponto de articulação secundário do segmento, que se sobrepõe ao gesto
articulatório alveolar, de natureza primária.
Tradicionalmente (Mateus; D’Andrade, 2000), a lateral alveolar em PE tem sido
descrita como um segmento fonológico (/l/) associado a duas variantes alofônicas
([l, ɫ]): o alofone com ponto de articulação principal alveolar ([l]) ocorre em
Ataque, ramificado ou não (livro [lívɾu]; flauta [fláwtɐ]); já em Coda ([ɫ]), o
alofone assume um ponto de articulação secundário, de tipo velar (calmo [káɫmu]).
Esta visão categórica da variação alofônica associada a /l/ em PE (alveolar em
Ataque; alveolar velarizada em Coda) tem sido questionada pelos estudos fonéti-
cos, que têm demonstrado a existência de velarização também em Ataque. Porém,
os dados acústicos mostram níveis de velarização mais acentuados em Coda com-
parados com os registados em Ataque.4 A obstrução inerente ao modo de articulação
lateral é mais fraca em posição de Coda, estando atestada a possível produção de
semivogal labial neste contexto (Marques, 2010; Monteiro, 2012; Martins, 2014;
Oliveira et al., 2011; Rodrigues, 2015).
No PB, a manifestação da lateral /l/ como [w] na posição de Coda silábica
na imensa maioria dos dialetos Brasileiros, como explicam Barbosa; Madureira
66 Carmen Matzenauer, Maria João Freitas
(2015), é determinada pela perda do gesto de lâmina da língua nas laterais alveo-
lares. Tem-se, então, a indicação da literatura clássica de que o fonema lateral no
PB, na posição de Ataque silábico, seja simples ou ramificado, se manifesta como
lateral alveolar [l] (letra [létɾɐ]; placa [plákɐ]), enquanto, na posição de Coda,
é expresso majoritariamente como [w], com ocorrência reduzida como lateral
velarizada [ɫ], presente particularmente em regiões de fronteira ou de colonização
estrangeira (alma [áwmɐ] ~ [áɫmɐ]) (Camara Jr., 1970; Mateus; D’Andrade, 2000).
de crianças Portuguesas do que das Brasileiras (Freitas, 1997, 2017; Mendes et al.,
2009; Amorim, 2014; Ramalho, 2017; Mezzomo; Menezes, 2001).
Tomando-se a escala de aquisição de Yavas et al. (1991), pela qual o índice mín-
imo de sucesso é de 76% para considerar-se um segmento adquirido mas não esta-
bilizado, no PE a lateral não é adquirida nem em Ataque simples antes da idade de
6;00 anos (Ramalho, 2017; Freitas; Ramalho; Gomes, 2022); outros estudos sobre
o PE, empreendidos com base em testes de avaliação fonologicamente menos com-
plexos, apontam também para uma estabilização tardia da lateral alveolar.5 Difer-
entemente, no processo de aquisição do PB, o índice de aquisição é alcançado na
idade de 2;08, ao tratar-se de Ataque simples em início de palavra, e de 3;00, ao tra-
tar-se de Ataque simples em meio de palavra (Matzenauer-Hernandorena; Lampre-
cht, 1997). Tanto em PE como em PB, o processo de aquisição da lateral de modo
geral atende a este ordenamento: Ataque Simples > Coda > Ataque Ramificado.6
Considerando-se o percurso de estabilização fonológica da lateral no processo de
aquisição do inventário segmental da língua, os estudos referidos registram ou um
zero fonético ou o emprego de outro segmento no espaço fonético-fonológico cor-
respondente a /l/. Nos Quadros 3.1a e 3.1b,7 apresentam-se exemplos de produções
de crianças Portuguesas e Brasileiras8 em que o espaço fonético-fonológico da
lateral em posição de Ataque simples se mostra diferente do alvo.9 Nas colunas dos
quadros estão registradas: a forma escrita da palavra, a forma fonética alvo, a forma
fonética produzida pela criança e, por último, a idade em que criança produziu a
forma fonética exemplificada.
A aquisição da lateral /l/ na posição de Coda silábica também é observada mais
precocemente em crianças Brasileiras do que em crianças Portuguesas, sendo que
Quadro 3.2a Exemplos de crianças Portuguesas – produções em Coda (formas diferentes
do alvo)
(a) o processo de epêntese tem a lateral como gatilho apenas na posição de Coda
(nunca no Ataque simples) em PE e exclusivamente na Coda final de palavra;
(b) o processo de metátese tem a lateral como alvo apenas na posição de Ataque
(nunca na Coda), e, pelos dados aqui analisados, apenas na aquisição do PB;
(c) o processo de coalescência tem a lateral como alvo apenas na posição de Coda
(nunca no Ataque), exclusivamente na Coda medial de palavra, apenas na
aquisição do PB.
Estes fatos são capazes de oferecer argumentos para a reflexão traçada como obje-
tivo do estudo aqui apresentado: investigar a representação da lateral /l/ a partir da
análise de fatos do processo de aquisição fonológica por crianças falantes nativas
do PB e do PE, levando em conta as assimetrias fonéticas que a líquida lateral pode
apresentar em razão da posição silábica.
do que na aquisição do PE. Esta posição ainda encontra respaldo no fato de que o
input recebido por crianças Brasileiras, na posição de Coda com lateral, é a forma
fonética com o glide dorsal [w]. A assimetria das formas fonéticas que, na fala do
adulto, expressam a lateral no Ataque simples ([l]) e na Coda ([w]) no PB favorece
a construção de representações assimétricas para a lateral em crianças Brasileiras.
A mesma representação do segmento /l/ nos dois constituintes silábicos em PE
constitui um indicador de complexidade fonológica no processo de construção
da gramática nas crianças Portuguesas, levando a um prolongamento temporal do
processo de aquisição, que envolve a interface segmento/constituinte silábico. Por
um lado, um mesmo segmento (/l/) com distintos papéis silábicos (Ataque e Coda)
parece constituir um obstáculo substancial na aquisição do segmento em foco
neste trabalho. Por outro lado, a aquisição acontece primeiramente em Ataque
simples por ser este o constituinte silábico disponível na gramática inicial da cri-
ança, representado na estrutura universal CV; a Coda emerge mais tarde e decorre
da disponibilização de uma estrutura ramificada num domínio mais alto, a Rima.
Questiona-se também o processo de epêntese vocálica ter como gatilho a lateral
na Coda final de palavra apenas na aquisição do PE. A resposta novamente conduz
ao entendimento de que há distinção, na representação do segmento, na aquisição
fonológica de crianças Portuguesas e Brasileiras. Na aquisição do PE, como a rep-
resentação do segmento é /l/, que se manifesta foneticamente como [ɫ] em Coda,
tem natureza consonantal e, portanto, contém propriedades que habilitam o seg-
mento a ocupar o Ataque de sílaba no processo de ressilabificação, possível no
final de sintagma entoacional em PE, atendendo ao Ciclo de Soância (Clements,
1990) na construção da estrutura silábica (ex.: caraco/l/ → [kɐ.ɾɐ.ˈkɔɫ] → [kɐ.
ɾɐ.ˈkɔ.lɨ]). De maneira distinta, se na aquisição do PB a representação do segmento
da Coda tem natureza vocálica (/u/), não se constitui em adequado Ataque silábico
e, portanto, não funciona com gatilho para o processo de epêntese vocálica, o qual
implica a ressilabação em final de palavra e transmuta o segmento para o Ataque
de uma nova sílaba.
É pertinente referir que as mesmas crianças Brasileiras que não empregam o
processo de epêntese quando a palavra apresenta o alvo lateral em Coda final apli-
cam este processo na produção de palavras cujo alvo apresenta fricativas finais
(exs.: nariz → [naˈlizi]; mais → [ˈmajzi]), produções não atestadas em PE, nem
na aquisição nem na fala adulta (Freitas, 1997; Mateus; D’Andrade, 2000). Con-
sidera-se, portanto, que, conforme atestam estes exemplos de crianças Brasileiras,
a fricativa é gatilho para epêntese por estar licenciada para ser ressilabada como
Ataque simples, diferentemente do que ocorre com palavras com alvo lateral em
Coda final (anel → [aˈnɛw], *[aˈnɛwi]).
Ainda merece ser mencionado que estas mesmas crianças Brasileiras evi-
denciam também o processo de epêntese na produção de palavras cujo alvo tem
róticas finais, mesmo quando a forma fonética lateral ocupa o espaço da rótica
(exs.: lugar →[uˈgali]; colher →[kuˈlɛli]) – a lateral fonética é, portanto, também
gatilho para epêntese vocálica, estando licenciada como Ataque simples de sílaba
na aquisição do PB; esta estratégia também ocorre em PE. Ao glide dorsal, no
entanto, na gramática das crianças Brasileiras não é concedida a permissão para ser
74 Carmen Matzenauer, Maria João Freitas
gatilho do processo de epêntese, dada a sua natureza vocálica (/u/), não podendo,
assim, assumir o constituinte Ataque silábico. Nesta visão do processo de epêntese
estaria, portanto, mais uma pista para o entendimento de que as crianças Portu-
guesas têm a representação da lateral /l/ tanto para o Ataque como para a Coda da
sílaba, enquanto as crianças Brasileiras têm a representação da lateral /l/ para o
Ataque e a representação de /u/ para a Coda da sílaba.
Outra questão diz respeito ao processo de metátese que, nos dados de aquisição
do PB analisados, apenas tem como alvo a lateral em Ataque silábico (lua →[ˈulɐ]).
As crianças Brasileiras parecem tratar a lateral de Coda de sílaba, que se manifesta
como [w], como uma unidade agregada à vogal núcleo da sílaba, com ela formando
um ditongo, uma unidade que não é dela desmembrada pelo processo de metátese.
Aí se tem mais um indício da assimetria na representação que crianças Brasileiras
apresentam referentemente à lateral em diferentes constituintes silábicos: de uma
lateral /l/ no Ataque, passível de ser alvo do processo de metátese, e de um seg-
mento vocálico (/u/) na Coda.
Ainda é preciso levantar-se questionamento sobre a ocorrência do processo de
coalescência, observado apenas em Coda medial na produção de crianças Brasilei-
ras (calça →[ˈkɔsɐ]; balde →[ˈbɔdʒi]). Há coalescência ao configurarse a união
de duas unidades distintas da qual resulta uma terceira que compartilha traços com
aquelas de que se originou. No PB, no uso variável da língua, especialmente em
variedades de menor prestígio, é frequente o emprego de coalescência entre vogais
contíguas que constituem ditongos, como em autoridade →[otoɾiˈdadʒi]; europa
→[oˈɾɔpɐ], por exemplo. Embora possa haver coalescência entre segmentos con-
sonantais e vocálicos (é o que ocorre, por exemplos, nos processos de palatalização
e de labialização), a tendência é que seja promovida por sequências de segmentos
da mesma natureza, predominantemente por segmentos vocálicos.
A partir dessas concepções, voltando-se aos dados da aquisição fonológica, é
possível observar-se que, nos casos de coalescência aqui analisados, em se consi-
derando a presença de /u/ em lugar da lateral em Coda (calça →c/au/sa; balde →
b/au/de), tornase viável o entendimento da presença da vogal [ɔ] na forma [ˈkɔsɐ]
para calça e na forma [ˈbɔdʒi] para balde: a vogal [ɔ] ([dorsal/labial, alto, baixo])
resulta da coalescência de traços da vogal /a/ ([dorsal, +baixo]) e de /u/ ([dorsal/
labial, +alto]). Tal processo se faz presente apenas nos dados de crianças Brasilei-
ras porque estas, diferentemente das crianças Portuguesas, têm a representação de
um segmento de natureza vocálica na posição posvocálica, /u/, em lugar de /l/. E
lembre-se, mais uma vez, que as crianças Brasileiras recebem como input a forma
fonética [w] para a lateral alvo em Coda silábica.
Pelos argumentos apresentados, vem arguir-se a favor da interpretação de que
as crianças Portuguesas e as Brasileiras compartilham a mesma representação /l/
para a lateral em Ataque simples de sílaba, mas que, no curso do desenvolvimento
fonológico, mostram diferentes representações para a lateral em Coda: enquanto
na aquisição do PE, a representação é de uma lateral, na aquisição do PB, a
representação para o alvo lateral em Coda é um segmento vocálico, /u/. Esta assi-
metria, na gramática de crianças Brasileiras, observada na representação do alvo
lateral em diferentes constituintes silábicos, pode ser atribuída à assimetria das
A aquisição de assimetria na gramática fonológica do Português 75
6 Conclusão
No presente Capítulo, apresentouse reflexão sobre a aquisição da lateral alveolar no
Português, partindose da extrema dificuldade que as crianças Portuguesas apresen-
tam na sua aquisição, quando comparadas com as crianças Brasileiras. Observaram-se
as variantes alofônicas que ocupam o espaço fonético-fonológico da lateral /l/
nos dois grupos de crianças, até que sejam alcançadas as formas alvo. Assumiu-se
que o emprego de um segmento por outro no mesmo espaço fonético-fonológico
fornece informação sobre o conhecimento fonológico da criança, constituindo
evidência empírica para a identificação da categorização fonológica e da natureza
das representações lexicais em diferentes estágios de construção da gramática
alvo, expressa em traços distintivos que definem classes naturais específicas.
Os dados citados, disponíveis em trabalhos publicados sobre a aquisição do PB
(Matzenauer-Hernandorena; Lamprecht, 1997; Mezzomo, 2004, por exemplo) e
do PE (Freitas, 1997; Mendes et al., 2009; Amorim, 2014; Ramalho, 2017; Freitas;
Ramalho; Gomes, 2022) mostraram percursos distintos. No PE, as formas fonéticas
predominantemente empregadas para representar a lateral, tanto para Ataque simples
como para Coda, são iguais ([w, Ø, ʋ]), sendo [w] a forma mais produtiva, justificada
pela presença de velarização nas variantes alofônicas alvo, tanto em Ataque como
em Coda, documentada nos estudos acústicos citados na Seção 2. Nas crianças Bra-
sileiras, as formas fonéticas empregadas para a lateral em Ataque simples e em Coda
no PB podem divergir: enquanto no Ataque simples o espaço da lateral pode mostrar
um zero fonético ou ser ocupado pelo glide coronal (o glide dorsal aparece apenas
no contexto de vogal dorsal), na Coda o espaço da lateral pode apresentar um zero
fonético ou um processo de coalescência com a vogal núcleo da sílaba. Com base nos
dados, a análise proposta é a de que as crianças Portuguesas têm a representação da
lateral /l/ para o Ataque e para a Coda da sílaba, enquanto as crianças Brasileiras têm
a representação da lateral /l/ para o Ataque e a representação do segmento vocálico
/u/ para a Coda da sílaba. Coloca-se ainda a hipótese, a ser testada com trabalhos
futuros, de esta representação em Coda nas crianças Brasileiras vir a sofrer alterações
na sequência do seu desenvolvimento morfológico e da aquisição da escrita, que lhes
permitirá reestruturar as suas gramáticas na direção do sistema alvo.
Notas
1 Financiamento: CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tec-
nológico (Processo 306616/2018–1).
2 Financiamento FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., através do Centro de
Linguística da Universidade de Lisboa (UIBD/00214/2020).
3 A líquida lateral em Coda de sílaba, exatamente pelas manifestações fonéticas assimé-
tricas que apresenta em relação ao que é observado na posição de Ataque silábico, tem o
A aquisição de assimetria na gramática fonológica do Português 77
seu uso variável como objeto de investigação em diferentes regiões do Brasil, conforme
descrição presente no Capítulo 7 deste livro, sendo atestado o predomínio da variante
vocalizada. A análise apresentada no Capítulo 7 evidencia que o emprego de diferentes
formas fonéticas para representar a lateral em Coda, especialmente em sílaba interna
à palavra, pode ser condicionado pelos contextos precedente e seguinte, assim como
pelas variáveis gênero e faixa etária dos Brasileiros. A vocalização da lateral em Coda
é também referida, no Capítulo 11 desta obra, como motivadora da criação de diton-
gos no PB, o que se observa, por exemplo, na forma Bras[iw] por Brasil. Também no
Capítulo 11 há uma evidência da presença da lateral, na representação fonológica de
segmentos em Coda de sílaba, no fato de Brasileiros terem inibida a monotongação do
ditongo ou apenas quando este é derivado de lateral em coda (solteiro *s[o]teiro) quando
a monotongação é prevalente na língua (l[o]co louco; t[o]ca por touca; fal[o] por falou).
4 A manifestação fonética velarizada da lateral /l/ em Ataque de sílaba no PE e também
referida no Capítulo 2 deste livro.
5 Discussão sobre o processo de aquisição da lateral na posição de Ataque silábico no PB
e no PE também é encontrada no Capítulo 2.
6 Mendes et al. (2009); Amorim (2014) apresentam, para o PE, a ordem Ataque Simples >
Ataque Ramificado > Coda, diferença que pode decorrer da consideração das produções
com inserção de vogal entre as duas consoantes do Ataque ramificado como produções
conformes ao alvo ([fɨlóɾ] para flor).
7 Em todos os quadros apresentados neste capítulo, os dados são apresentados em quatro,
com este ordenamento: 1°) a forma escrita da palavra, 2°) a forma fonética alvo, 3°)
a forma fonética produzida pela criança, 4°) a idade em que criança produziu a forma
fonética exemplificada.
8 Os dados de crianças Portuguesas foram extraídos do PhonBank Portuguese Ramalho Cor-
pus (https://phonbank.talkbank.org/access/Romance/Portuguese/Ramalho.html), recolhidos
através da aplicação do instrumento Crosslinguistic Child Phonology Project – Portu-
guês Europeu (CLCP-PE), um teste de avaliação fonológica de crianças Portuguesas desen-
volvido no âmbito do projeto internacional CLCP, sedeado na University of British Columbia
(UBC) e tendo como parceiro o Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. Os da-
dos de crianças Brasileiras foram extraídos do Banco de Dados de Aquisição da Fonologia
(AQUIFONO), sedeado em duas universidades do Sul do Brasil: UFPEL e PUCRS.
9 Registraram-se aqui, na representação da lateral /l/, as formas fonéticas diferentes do alvo
que, no estudo de Freitas; Ramalho; Gomes (2022), obtiveram índice acima de 10%.
10 O emprego preferencial pelo glide [w] no espaço de /l/ por crianças Portuguesas em
Ataque de sílaba talvez possa ser decorrente da existência de determinado grau de velari-
zação da lateral nesta posição silábica em PE, atestada por estudos fonéticos, conforme
referência na Seção 2 deste capítulo.
11 A ocorrência de zero fonético no espaço fonético-fonológico de /l/ em Ataque Simples
em início de palavra é praticamente a única estratégia de reconstrução observada; há
casos esporádicos de emprego de glide coronal (lápis → [japis]).
12 Conforme já foi referido, o emprego do glide dorsal [w], por crianças Brasileiras, ocorre
apenas no contexto de vogal dorsal e em índice extremamente baixo.
13 O zero fonético no espaço fonéticofonológico de /l/ em Coda final é a única estratégia
de reconstrução observada; muito precocemente, conforme já foi aqui registrado, há o
emprego de [w] neste espaço fonéticofonológico.
14 Os exemplos integram o Banco de Textos de Aquisição da Linguagem Escrita – BATALE
(Miranda, 2001b).
15 O Capítulo 6 deste livro, cujo foco está na representação escrita da Rima silábica medial
de palavra, registra com detalhes o tratamento dado à lateral por crianças Brasileiras e
Portuguesas que frequentam o 2º ano de escolarização. Em análise detalhada, as autoras
referem que está na lateral em Coda a maior taxa de erros na escrita das crianças Brasileiras,
aí residindo o fato de maior divergência entre crianças Brasileiras e Portuguesas.
78 Carmen Matzenauer, Maria João Freitas
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4 Aquisição da Prosódia no Português
Sónia Frota, Raquel S. Santos
Resumo
Neste capítulo apresenta-se o estado da arte dos estudos em aquisição da prosódia no
Português, considerando as variedades fonológica e prosodicamente contrastantes
do Português Europeu (PE) e Português Brasileiro (PB). Partindo de uma visão
sumária das características prosódicas das duas variedades, apresenta-se evidência
empírica da aquisição do acento de palavra, da entoação e da estrutura prosódica.
Tanto dados da percepção como da produção infantil de palavras e enunciados são
considerados. A perspectiva comparativa entre PE e PB permite assinalar semel-
hanças e diferenças na aquisição. O capítulo termina com um levantamento de
questões em aberto e a identificação de áreas de investigação a desenvolver tendo
em vista o avanço do conhecimento em aquisição da prosódia, no Português e
numa perspectiva interlinguística.
DOI: 10.4324/9781003294344-6
Aquisição da Prosódia no Português 81
são tipicamente não proeminentes, não sendo acentuadas, ao contrário das pala-
vras lexicais (que veiculam conteúdo semântico). Determinantes e preposições são
exemplos de palavras funcionais (‘o’, ‘de’, ‘do’, etc.) e nomes (‘menino’, ‘dó’)
ou verbos (‘dar’, ‘correr’) são exemplos de palavras lexicais. Para além da distin-
ção quanto à proeminência, as palavras funcionais tendem a ocorrer junto a fron-
teiras de constituintes prosódicos, no caso do Português junto à fronteira inicial,
e a preceder um elemento acentuado (e.g., ‘o dó’, ‘do menino’). Assim, o sinal
de fala apresenta um conjunto de propriedades prosódicas que se correlacionam
com outras propriedades linguísticas e que podem constituir pistas para a aquisição
desses aspectos da linguagem, como no caso da distinção entre palavras funcionais
e lexicais e da identificação da ordem de palavras na língua (e.g., Christophe et al.,
2008; Cruz-Pavía; Marino; Gervain, 2021).
Aprimeira experiência linguística do bebê, ainda antes do nascimento, é prosódica
(Smith et al., 2003) e consiste na perceção do ritmo, com os seus padrões de duração
e proeminência, e da melodia, ou seja, dos padrões entoacionais. A presença de uma
sensibilidade precoce às propriedades prosódicas da linguagem está amplamente
demonstrada e caracteriza o desenvolvimento linguístico nos primeiros anos de vida
(e.g., Morgan, 1986; Mehler et al., 1988; Morgan; Demuth, 1996; Jusczyk, 1997).
Tem sido também reportada a habilidade dos bebês para utilizarem diversas proprie-
dades prosódicas na aprendizagem de outros aspectos das línguas, um mecanismo
conhecido como ‘bootstrapping’ prosódico (Gervain; Cristophe; Mazuka, 2020,
para uma revisão da literatura). Dada a sensibilidade inicial à prosódia e o papel da
prosódia na aquisição da linguagem, a aquisição da prosódia ocupa um lugar central
na compreensão do desenvolvimento linguístico, em especial nos primeiros anos de
vida. Apesar de muitos aspectos da prosódia serem de aquisição precoce, outros são
de aquisição mais tardia e não necessariamente anterior à aquisição de outros com-
ponentes gramaticais (por exemplo, estudos de produção mostram que aos 5 anos as
crianças ainda não dominam, nem a duração segmental e silábica (cf. Gama-Rossi,
2001), nem a entoação de lista (Rattanasone et al., 2021)).
Este capítulo apresenta uma síntese do estado da arte quanto à aquisição da prosó-
dia no Português, focando-se nas variedades do Português Europeu (PE) e do Portu-
guês Brasileiro (PB). Na Seção 2, resumem-se as principais características prosódicas
do PE e do PB, destacando-se os aspectos em que estas variedades do Português se
distinguem. As Seções 3, 4 e 5 são respetivamente dedicadas à aquisição do acento,
da entoação e da estrutura prosódica, contemplando as dimensões da percepção e da
produção da prosódia. Uma discussão dos principais resultados, a par da identificação
de grandes questões em aberto e direções futuras de investigação, conclui o capítulo.
3 Aquisição do acento
O acento está entre as pistas prosódicas que têm sido reportadas como facilita-
doras da aquisição da linguagem (Gervain; Cristophe; Mazuka, 2020). A percep-
ção/identificação do acento facilita a segmentação do sinal de fala em palavras
e frases, a categorização das palavras e a distinção de significados lexicais e
frásicos (e.g., Jusczyk et al., 1999; Shi et al., 2006; Curtin, 2010). Por exemplo,
crianças a adquirir o Português interpretam sequências de sons idênticas que con-
trastam apenas quanto à posição do acento como potenciais palavras diferentes
a partir dos 12 meses de idade (Frota et al., 2012) e reconhecem itens funcionais
(não acentuados) pelo menos a partir dos 13 meses de idade (Name; Corrêa,
2003; Name; Teixeira; Uchôa, 2015). Importa, pois, compreender a aquisição do
acento, desde as habilidades perceptivas no primeiro ano de vida, até à produção
das primeiras palavras no segundo ano de vida e o subsequente desenvolvimento
lexical.
O primeiro estudo sobre a perceção do acento em bebês aprendentes de Portu-
guês é Frota et al. (2020), focando-se no Português Europeu. Estudos sobre outras
línguas apontaram três fatores na língua materna que podem guiar a percepção
inicial do acento: o ritmo, a frequência dos padrões acentuais e o tipo de pistas
acústicas para o acento (cf. Frota et al., 2020, para uma revisão da literatura). O PE
possui um ritmo misto de silábico e acentual. A distribuição de padrões acentuais
não aponta para um padrão como sendo dominante, dado que o padrão trocaico (i.e.,
forte-fraco, como em casa [ˈkazɐ]) predomina no léxico, mas o padrão iâmbico
(i.e., fraco-forte, como em avó [ɐˈvɔ] ou o pé [uˈpɛ]) é predominante a nível pós
lexical. O PE possui ainda um conjunto diverso de pistas acústicas para o acento
em que a qualidade vocálica é preponderante e a duração pode não ser suficiente
para a percepção do acento. Estudos com adultos revelaram uma ‘surdez acentual’
na ausência das pistas de qualidade vocálica (Correia et al., 2015), com as pistas
prosódicas sendo processadas apenas no estado pré-atentivo (numa tarefa de ‘mis-
match negativity’, Lu et al., 2018). Estes estudos revelaram ainda uma vantagem
no processamento do padrão iâmbico. Utilizando um paradigma de olhar anteci-
patório implementado com recurso ao ‘eye-tracking’, Frota et al. (2020) mostraram
que bebês de 5–6 meses de idade são já sensíveis ao contraste entre acento trocaico
e acento iâmbico, demonstrando uma preferência pelo padrão iâmbico. Estes resul-
tados sugerem que os padrões fonológicos pós-lexicais da língua, juntamente com
os correlatos prosódicos do acento, guiam a perceção inicial do acento no Portu-
guês. Crucialmente, a meio do primeiro ano de vida, os bebês aprendentes de PE
84 Sónia Frota, Raquel S. Santos
Demuth, 1995; Patter, 1997, entre outros). A autora argumenta que, se o parâmetro
fosse inicialmente marcado à esquerda (pé trocaico), deveria ser possível encon-
trar, no início da produção, dados de crianças mudando os acentos em direção a
um pé trocaico (acento na penúltima sílaba), o que não acontece. Por outro lado,
sugerir um valor inicial de núcleo à direita levaria à expectativa de que em línguas
trocaicas as crianças inicialmente produziriam mudanças de acento à esquerda,
o que também não acontece. A autora propõe que somente assumindo que este
parâmetro não tem um valor marcado inicialmente é que é possível explicar os
dados de aquisição de línguas como o Holandês, o Inglês e o Português (na mesma
linha de Snyder, 2007). Enquanto existe consenso quanto à natureza trocaica do
Inglês e Holandês (e.g., Hayes, 1995; Fikkert, 1994), não existe consenso quanto
à natureza trocaica ou iâmbica do Português: a proposta morfológica para o acento
no Português, com a proeminência a recair na última sílaba do radical derivacional
(e.g., Pereira, 1999; Mateus; d’Andrade, 2000), sugere um padrão iâmbico; já uma
análise rítmica do acento (e.g., Bisol, 1994; Wetzels, 2000) sugere um padrão tro-
caico com proeminência na penúltima sílaba da palavra (Correia, 2009). A nível
pós-lexical, a existência de muitas palavras monossilábicas a par da natureza pro-
clítica da língua reforça o padrão iâmbico, como propõem Vigário; Martins; Frota
(2006) e Vigário; Frota; Martins (2010).
O acento proparoxítono (antepenúltimo, e.g., príncipe [pɾĩsipɪ], em PB, ou
crítica [ˈkritikɐ] em PE) é o menos encontrado no Português (com valores próxi-
mos de 4%, de acordo com Cintra (1997) para o PB e Vigário; Frota; Martins
(2010) para o PE; no PE, uma contagem de tokens aponta para um valor inferior a
2%). Em quaisquer das propostas existentes para o acento de palavra na fala adulta,
ele resulta de uma extrametricidade. Santos (2001, 2007) encontrou pouquíssimas
produções com esse padrão na fala infantil em PB, de forma que se ateve a discutir
os padrões paroxítonos e oxítonos, bem mais frequentes. Correia (2009) mostra
que, no PE, o padrão proparoxítono ainda não está adquirido no final do período em
observação (por volta dos dois anos e meio de idade). Ferreira-Gonçalves (2010)
e Vargens (2016) discutem a aquisição desse padrão no PB. Ferreira-Gonçalves,
numa análise baseada na teoria da otimalidade, argumenta que esse padrão é de
aquisição tardia porque a criança ainda não aplica a extrametricidade, e ao invés
aplica o apagamento da sílaba átona final ou coalescência das duas sílabas átonas,
privilegiando um pé trocaico (árvore >> ave, avrei; abóbora >> abobo, aboba,
abobra). Vargens chama a atenção de que, para as crianças em contato com adultos
menos escolarizados, a não produção de proparoxítonos pode decorrer do fato de
que, no input, essas palavras já são produzidas como paroxítonas.
A questão que se coloca no processo de aquisição do acento é o que desenca-
dearia, caso seja assumido um sistema paramétrico, a marcação de um parâmetro
(esquerda/trocaico ou direita/iâmbico) ou a mudança (no caso de um valor default).
Uma das hipóteses levantadas diz respeito à frequência dos padrões acentuais na
língua. Santos (2017) investiga se a frequência do padrão acentual do input em PB
poderia afetar quer a distribuição de padrões acentuais infantis, quer sua ordem de
aquisição. Para isso, a autora toma como base Cintra (1997) para o padrão adulto e
faz um levantamento da fala dirigida à criança. Os resultados encontrados mostram
86 Sónia Frota, Raquel S. Santos
Uma outra pista para a marcação paramétrica seria o padrão acentual das pala-
vras familiares (‘baby talk’). Como mencionado, a frequência dos padrões acen-
tuais poderá não explicar o padrão de emergência do acento na produção infantil,
mas parece evidente que as palavras familiares refletem o padrão mais básico da
língua alvo. Em Inglês e Holandês, por exemplo, esse tipo de palavra tem acento na
penúltima sílaba (e.g., Inglês: KItty gatinho, DOggie PUppy cachorrinho; Holan-
dês: KOssies comidinha, SLApie nanar). Em Português Brasileiro, as palavras
familiares têm sempre acento final (xiXI, coCÔ, paPÁ, neNÊ). É verdade que na
fala dirigida à criança existe o recurso frequente ao diminutivo, transformando em
paroxítonas palavras oxítonas (cafeZInho, neneZInho), mas o que mais chama a
atenção, no caso das palavras familiares, é a sua estrutura morfológica. No PB, na
maior parte das palavras terminadas em /a,e,o/, essas vogais são um sufixo marca-
dor de palavra (que pode também trazer a informação do gênero da palavra), sendo
essa vogal apagada na criação de palavras derivadas (e.g., bolo > boloeiro). No
entanto, as palavras familiares não têm essa vogal, logo nas palavras derivadas a
vogal final permanece (vejase o par: cocô >> cocozada vs. coco (fruta) >> cocada,
mas não *cocozada). Isso significa que as palavras familiares apresentam como
extensão a raiz, sem o marcador de palavra (que é extramétrico nos termos de Lee,
1995), sendo o seu acento atribuído pelo padrão menos marcado da língua (Santos;
Benevides, in press).
Finalmente, os correlatos acústicos para o acento têm também sido apontados
como pistas para o padrão acentual (Frota et al., 2020). Em consonância com a Lei
Iâmbica-Trocaica (Iambic-Trochaic Law, Hayes, 1995), o padrão trocaico é tipica-
mente marcado por pitch e intensidade elevados no primeiro elemento, enquanto o
padrão iâmbico é marcado por duração mais longa no elemento final, constituindo
estes agrupamentos tendências perceptivas tanto em adultos como em crianças
(Bion; Benavides-Varela; Nespor, 2011). Assim, os diferentes padrões acentuais
tendem a ser marcados por correlatos acústicos diferentes (por exemplo, pitch no
Inglês, em que domina o padrão trocaico, e duração no Hebraico, em que domina
o padrão iâmbico; Beckman, 1986; Segal; Kishon-Rabin, 2012; Chrabaszcz et al.,
2014). A relevância da duração como correlato acústico do acento no Português
sugere uma pista que favorece a aquisição do padrão iâmbico (Frota et al., 2020).
No que diz respeito ao uso da proeminência para otimização rítmica, Santos;
Fikkert (2007) investigaram se a proeminência das palavras adjacentes no contexto
em que uma palavra está inserida poderia afetar a realização da palavra. Se fosse
esse o caso, uma palavra alvo com acento inicial antecedida por uma palavra oxí-
tona (e.g., neNÊ GRANde), estaria sujeita à inserção de segmentos para desfazer
o encontro acentual; por outro lado, no caso de uma sequência que criasse lapsos
(isto é, várias sílabas átonas adjacentes, e.g., casa bonita), a criança tenderia a apa-
gar uma sílaba fraca para otimizar o ritmo. Os resultados mostraram que processos
como a mudança acentual, inserção e apagamento de sílabas não foram desen-
cadeados por influência do contexto, ocorrendo independentemente da tonicidade
da sílaba adjacente.
Em resumo, os dados de aquisição do acento no Português, tanto no domínio da
percepção como da produção, apontam para uma vantagem do acento iâmbico em
88 Sónia Frota, Raquel S. Santos
4 Aquisição da entoação
Tal como o acento, também a melodia da fala, e em particular a entoação, tem sido
apontada como facilitadora da aquisição da linguagem. Os bebês são particular-
mente sensíveis a mudanças nos contornos melódicos (e.g. Trehub; Bull; Thorpe,
1984) e percebem fronteiras prosódicas entoacionais ainda na primeira metade do
primeiro ano de vida (Hirsh-Pasek et al., 1987). As pistas entoacionais, como ver-
emos na Seção 6, facilitam o processamento do sinal de fala em unidades prosódi-
cas que promovem a aprendizagem das palavras e de aspectos da sintaxe (Gervain;
Cristophe; Mazuka, 2020). A anotação entoacional adotada neste capítulo segue a
abordagem autossegmental-métrica da fonologia entoacional (e.g., Ladd, 2008).
Muito poucos estudos investigaram o desenvolvimento da percepção de con-
trastes entoacionais gramaticalmente relevantes, como a distinção entre tipos de
frase/sentença ou a distinção entre foco amplo e foco estreito ou contrastivo (cf.
Frota; Butler, 2018, para uma revisão da literatura). Frota; Butler; Vigário (2014)
investigaram a percepção do contraste entre declarativas e interrogativas sim/não
em enunciados de uma única palavra prosódica em Português Europeu. O con-
traste entre os dois tipos de frase/sentença é um contraste prosódico, marcado pelo
contorno nuclear (i.e., a melodia da sílaba nuclear e sílabas subsequentes) que se
caracteriza por uma melodia descendente na sílaba nuclear (H+L*) seguida de um
contorno baixo na declarativa (L%) e de um contorno ascendente na interroga-
tiva (LH%), que constituem a melodia final do enunciado ou tom de fronteira. Na
abordagem autossegmental-métrica da entoação (Frota, 2014; Frota et al., 2015b;
Frota; Moraes, 2016), o contraste entre as duas melodias é manifestado pelo tom
de fronteira: declarativa, H+L* L% (e.g., Eles casaram.); interrogativa sim/não,
H+L* LH% (e.g., Eles casaram?). Utilizando um paradigma de habituação visual,
os autores demonstraram que tanto aos 5–6 meses como aos 8–9 meses de idade os
bebês discriminaram o contraste prosódico em contextos com variação segmental,
sendo este o primeiro estudo a reportar habilidades precoces de discriminação de
um contraste entoacional. Frota e colegas investigaram igualmente a percepção
de contrastes melódicos não nativos, usando o mesmo paradigma experimental.
O contraste prosódico entre declarativa e interrogativa do PE não foi discrimi-
nado por bebês aprendentes de Inglês, ao contrário de bebês aprendentes de Basco,
mostrando que a sensibilidade aos tons de fronteira é já dependente da língua par-
ticular aos 5 meses de idade (Sundara; Molnar; Frota, 2015). Por outro lado, os
bebês aprendentes de PE mostraram não discriminar contrastes melódicos tonais de
Chinês Mandarim, semelhantes na forma global dos contornos, mas diferentes nas
especificidades da relação entre a melodia e a cadeia segmental (Frota et al., 2016a).
Estes resultados demonstram que a percepção da entoação é não apenas precoce,
mas também específica da língua materna. Todavia, essa habilidade de discriminar
Aquisição da Prosódia no Português 89
uma criança entre os 6 e os 24 meses de idade, bem como no discurso que lhe é
dirigido pela mãe. As autoras reportam a predominância do contorno descendente
no discurso infantil ao longo de todo o período observado. No discurso dirigido à
criança, pelo contrário, predominam contornos melódicos complexos, com destaque
para o ascendente-descendente. As autoras sugerem que o discurso infantil parece
aproximar-se, desde cedo, dos padrões prosódicos alvo da língua presentes na fala
adulta e não dos contornos específicos do estilo de fala dirigido à criança. Todavia,
esta abordagem não é informativa quanto às propriedades estruturais das melodias
produzidas, não permitindo perceber o desenvolvimento de características funda-
mentais de um sistema entoacional, como os tipos de acentos tonais nucleares e
de tons de fronteira, ou as formas de alinhamento da melodia com a cadeia seg-
mental e as formas de escalonamento dos tons na tessitura tonal. Enquadrado na
abordagem autossegmental-métrica da fonologia entoacional, o estudo de Frota et
al. (2016b) examina estas questões no discurso de duas crianças entre as idades
de 1;00 e 2;04, incluindo as primeiras palavras e enunciados com mais de uma
palavra e considerando o significado e contexto de uso. Uma análise pragmática
mostrou que os enunciados declarativos dominam no discurso de ambas as crian-
ças, que globalmente produzem cerca de 10 tipos de enunciados pragmaticamente
distintos. A produção de enunciados diversos ocorre cedo, por volta de 1;04, e é
acompanhada da presença de diferentes tipos de contornos nucleares (por exem-
plo, o enunciado dá pode constituir um pedido ou uma pergunta, dependendo do
contorno entoacional com que é produzido). Os contornos nucleares declarativos,
quer no caso da declarativa neutra (de foco amplo) quer no caso da declarativa
focalizada (com foco estreito/contrastivo), respetivamente H+L* L% e H*+L L%
e o contorno imperativo associado à expressão da ordem (também H*+L L%) apre-
sentam uma escolha tonal de acordo com a língua alvo logo aos 1;04; os contor-
nos vocativos de chamamento (L+H* !H e L+H* L%) e o contorno interrogativo
(H+L* LH%) são adquiridos de seguida aos 1;06–1;07. O contorno imperativo
associado à expressão do pedido ((H) L* L%) surge posteriormente, pois os enun-
ciados pedido tendem a ser produzidos com o contorno nuclear do chamamento.
Por volta de 1;08, as crianças apresentam um uso dos contornos nucleares da lín-
gua nativa semelhante à fala adulta. Este desenvolvimento precoce da entoação,
quanto ao inventário de acentos tonais e tons de fronteira e às relações entre forma
tonal e significado, precede a emergência dos enunciados de mais de uma palavra
(Frota; Butler, 2018), bem como a aquisição das diferentes categorias de segmentos
(Costa, 2010; Rose; Almeida; Freitas, 2022) ou dos diferentes formatos de palavra
(Correia, 2009; Vigário; Martins; Frota., 2006).
Frota et al. (2016b) reportam que os aspectos mais fonéticos da entoação,
como o alinhamento e o escalonamento tonal são, contudo, desenvolvidos mais
tarde, sendo realizados de acordo com o alvo próximo do final do segundo ano
de vida. Esta diferença entre os padrões fonológicos e os aspectos fonéticos tem
sido também apontada para outras línguas (cf. Frota; Butler, 2018, para uma
revisão recente).
Num estudo sobre as respostas a perguntas confirmativas no discurso de duas
crianças entre 1;07 e 2;08, Mata; Santos (2011) mostram que pelo menos a partir
92 Sónia Frota, Raquel S. Santos
trabalhos sobre fala adulta indicaram que o alongamento das sílabas acentuada e
pós-acentuada(s) pré-fronteira e o contorno entoacional constituem pistas robustas
para a fronteira deste constituinte prosódico, sendo a pausa uma pista opcional, não
necessária (Frota, 2000; Severino, 2016). Butler; Frota (2018) examinaram o papel
da estrutura prosódica no desenvolvimento das habilidades iniciais de segmentação
de palavras, entre os 4 e os 10 meses de idade. Contrastando pseudo-palavras em
posição final de I e em posição interna (por exemplo, [elas viajavam muito de
FUL]I vs. [eles disseram FUL muitas vezes]I, os autores demonstraram que as habi-
lidades de segmentação estão presentes logo aos 4 meses, mas apenas quando a
palavra ocorre junto à fronteira prosódica final de I. Pelo contrário, a segmen-
tação em posição interna está ainda em desenvolvimento aos 10 meses de idade.
As fronteiras de I estudadas em Butler; Frota são assinaladas por uma combinação
de alongamento final, contorno entoacional descendente e pausa, que constitui a
marcação mais forte da fronteira prosódica. Severino (2016) investigou as habili-
dades de segmentação de palavra junto à fronteira prosódica de I apenas marcada
por alongamento final e movimento de pitch. A autora mostrou que crianças de 12
meses segmentam palavras nesta posição prosódica, mas não palavras em posição
interna de I, sugerindo que nesta idade a pausa não constitui uma pista necessária
para o sintagma entoacional. Em Frota et al. (2019), a sensibilidade de crianças de
9 meses a fronteiras de I sem pausa foi estudada recorrendo a um paradigma de
discriminação implementado com eye-tracking. Os resultados mostraram que as
crianças discriminam enunciados com e sem esta fronteira prosódica, indicando
que são sensíveis à estrutura prosódica em sintagmas entoacionais mesmo na
ausência de pausa. Este conjunto de estudos para o Português revela uma sensibi-
lidade precoce para o constituinte frase/sintagma entoacional.
No domínio da produção, Scarpa (1999) salienta que os primeiros enunciados
infantis são do tamanho de uma palavra e algumas análises erroneamente interpre-
tam a proeminência desses enunciados como sendo a proeminência da palavra. A
autora, analisando dados com filler-sounds, argumenta que as crianças usam esses
sons para completar o contorno entoacional, preenchendo posições silábicas áto-
nas, que portam tom baixo, e que estes contornos infantis têm sempre a proem-
inência à direita. Assim, no período em que o contorno entoacional (L) L H* L é
estendido, palavras como menino são produzidas sem apagamentos ou inserções,
palavras como livro são produzidas como [ə´livʊ], com a inserção do filler-sound
antes da palavra alvo.
Scarpa (1999) discute os tipos de preenchedores fonológicos que as crian-
ças apresentam: os preenchedores iniciais ou preenchedores entoacionais e os
preenchedores tardios ou métricos. Os primeiros apresentam várias formas: (i) a
parte segmental do enunciado é totalmente formada por segmentos vocálicos, com
o contorno entoacional abarcando toda a cadeia segmental; (ii) segmentos vocáli-
cos que ocupam parte do grupo tonal, preenchendo posições pré-nucleares, não
proeminentes. O segundo tipo, constituído por filler-sounds tardios ou métricos, dá
suporte ao ritmo. Este segundo tipo pode ocorrer de duas formas: (i) como vogais
centrais, posteriores ou anteriores combinadas com formas verbais preenchendo em
enunciados pequenos as posições prosódicas fracas (por exemplo, [afeˈso:] fechou);
94 Sónia Frota, Raquel S. Santos
(ii) ou segmentos vocálicos que aparecem juntamente com vários outros ajustes
prosódicos (falsos começos, inserção, repetição de sílabas, aumento na duração de
vogais) em enunciados mais longos (por exemplo, [xaˈada] roda). A autora conclui
que as crianças observadas projetam a estrutura métrica de domínios prosódicos
superiores (que têm sua proeminência de duração, intensidade e frequência, em
Português, à direita) sobre a regra de acento de palavra do sistema linguístico do
adulto (que tem esta proeminência em posição não final). Sílabas de tom baixo
são também computadas como fracas e sílabas entoacionalmente proeminentes
e de tom alto são interpretadas como fortes. Em Santos (2001) é defendido que
nas primeiras palavras infantis têm-se proeminências entoacionais e que as crian-
ças posteriormente reanalisam as proeminências entoacionais como proeminências
de palavra, ou seja, os primeiros enunciados infantis constituem sintagmas/frases
entoacionais. Isto é, o contorno (L) H* L é reinterpretado posteriormente como uma
palavra trissilábica paroxítona WSW. Após esta reanálise, a criança deixa de utilizar
filler-sounds e passa a permitir movimentos tonais em uma única sílaba.
Num estudo sobre o desenvolvimento da estrutura prosódica no Português
Europeu com base em evidência entoacional e duracional, Frota et al. (2016b)
examinaram a natureza prosódica de enunciados produzidos entre 1;00 e 2;04
como sintagmas entoacionais e/ou palavras prosódicas e determinaram se os ele-
mentos contidos num enunciado são agrupados no mesmo constituinte prosódico
ou fraseados separadamente em constituintes diferentes. A distribuição de acentos
tonais e a análise do contorno entoacional revelam que, nas primeiras produções
infantis, cada sílaba forma um sintagma entoacional (por exemplo, o alvo Tatá é
produzido como [ˈkɐ ˈtɐ] e cada sílaba recebe o contorno declarativo neutro H+L*
L%). Assim, no estágio inicial de desenvolvimento da estrutura prosódica no PE,
o sintagma entoacional (e a palavra) é constituído por uma sílaba. Num estágio
seguinte, este constituinte prosódico é formado por várias sílabas da mesma palavra
(ou seja, o alvo Tatá é produzido como [taˈta], com um único contorno entoacional
H+L* L%). Neste estágio, cada palavra forma um sintagma entoacional, apre-
sentando um acento tonal e um tom de fronteira e sendo seguida de pausa e de
pitch reset. No último estágio (após 1;09), várias palavras surgem integradas no
mesmo sintagma entoacional. Neste último estágio, a emergência do alongamento
pré-fronteira constitui uma pista adicional para o fraseamento dos enunciados em
sintagmas entoacionais. Num estudo detalhado dos padrões de duração como evi-
dência para o desenvolvimento da estrutura prosódica, Matos (2021) confirmou os
estágios de aquisição atrás descritos. Ao comparar a fala infantil com a fala dirigida
à criança, o autor concluiu que as características prosódicas de uma e outra são
divergentes, evoluindo a primeira no sentido de se aproximar dos padrões tempo-
rais da segunda.
É sabido que o lugar dos segmentos na estrutura prosódica pode afetar a forma
como eles são realizados, dando origem a fenômenos de sândi (e.g., Nespor; Vogel,
2007). Assim, os trabalhos sobre aquisição do sândi vocálico externo também
permitem observar a aquisição da frase ou sintagma entoacional. No Português
Brasileiro, os processos de elisão, ditongação e degeminação ocorrem opcional-
mente entre palavras (cf. Tenani, 2002; Santos, 2007) e, enquanto a ditongação
Aquisição da Prosódia no Português 95
munil é um adjetivo, que se encontra na mesma frase fonológica que dabo, não
estando, assim, em fronteira de frase fonológica. Na segunda condição, munil é um
verbo e dabo está na fronteira de uma frase fonológica. Os resultados mostraram
que somente para a condição verbo as crianças de 11 meses apresentaram uma
diferença estatisticamente significativa entre as sentenças congruente e não con-
gruente, devida às pistas prosódicas encontradas pela criança na condição verbo e
ausentes na condição adjetivo: na condição verbo, a sílaba final de dabo está em
fronteira de frase fonológica, enquanto que na condição adjetivo, a fronteira máx-
ima é de nível prosódico inferior. A autora sugere que o alinhamento entre fron-
teira sintática e fronteira de frase fonológica facilita a abstração e generalização
de dependências não adjacentes. Na mesma linha, Matsuoka (2007) investigou se
as crianças de 2 a 3 anos usam informações prosódicas para a aquisição lexical de
adjetivos. A autora criou três condições em que o adjetivo formava, com um sub-
stantivo, uma frase fonológica reestruturada: nome comum seguido de pseudopa-
lavra com função de adjetivo (peixe betujo); nome vago seguido de pseudopalavra
com função de adjetivo (uma coisa tapoja); e nome vago seguido de pseudopa-
lavra com função de adjetivo, com realce prosódico (um negócio FUPACO). A
primeira condição controlava a influência do tipo de substantivo. Os resultados
foram estatisticamente significativos para as duas últimas condições, indicando que
a ênfase prosódica na altura e na duração da pseudopalavra dava condições para um
mapeamento do adjetivo e que as crianças de 2 e 3 anos são sensíveis ao envelope
prosódico da frase fonológica.
As evidências para a frase ou sintagma fonológico no Português Europeu são
bem mais subtis do que no PB (Frota; Vigário, 2000; Tenani, 2002; Frota, 2014).
Dado o estatuto deste constituinte prosódico na fala adulta, a questão da sua
aquisição é extremamente difícil de estudar. Jordão (2009) e Jordão; Frota (2010)
investigaram o seu eventual papel na aquisição da coda, concluindo que, ao con-
trário do sintagma entoacional, o sintagma fonológico não desempenha um papel
relevante. Malho; Correia; Frota (2017) encontraram diferenças na aquisição
de sândi externo no domínio interno a I que distinguem o contexto prosódico
entre sintagma fonológico (com aquisição de sândi mais tardia) de contextos
prosódicos dentro de sintagma fonológico (onde começa a aquisição de sândi
consonântico).
Entre a frase ou sintagma fonológico e a palavra prosódica existe um nível da
hierarquia prosódica que tem merecido designações e análises divergentes na lite-
ratura: Grupo de Palavra Prosódica (Vigário, 2010; Vigário; Fernandes-Svartman,
2010), Grupo Compósito (Vogel, 2009), ou Grupo Clítico (Nespor; Vogel, 2007).
Dependendo das línguas, este nível prosódico é particularmente relevante para a
prosodização de sequências que apresentam composição morfológica ou sintática
e/ou de sequências que envolvem uma palavra prosódica e elementos clíticos (cf.,
Santos; Vigário, 2016; Vigário, 2021, para revisões da literatura recentes sobre
o Português). No que respeita aos elementos de tipo clítico, a literatura sobre
aquisição relata a ocorrência de segmentos preenchendo posições silábicas fracas
e ou os analisa como place-holders (guardadores de lugar de posições sintáticas –
cf. Peters; Menn, 1993), ou como filler-sounds (preenchedores fonológicos, cf.
98 Sónia Frota, Raquel S. Santos
Scarpa, 1999). Santos (1995), fazendo um levantamento das posições em que estes
fillers aparecem e das categorias gramaticais a que eles vêm associados no Portu-
guês Brasileiro, mostra que eles são inicialmente produzidos antes de diferentes
palavras lexicais. Em um segundo momento, alguns deles desaparecem, enquanto
outros são posteriormente reanalisados pelas crianças, deixando de ser preenche-
dores fonológicos para serem preenchedores de categorias gramaticais, de clíti-
cos fonológicos (como determinantes e pronomes) – neste segundo momento, eles
passam a preceder apenas nomes e verbos (cf. [ala’ãʒa] a laranja). No Português
Europeu, a ocorrência de fillers na produção inicial de palavras tem sido analisada
como respondendo a um formato prosódico superior ao da palavra (Freitas, 1996;
Freitas; Miguel, 1998). Estes elementos ocorrem independentemente da catego-
ria lexical da palavra (nome, verbo, advérbio, pronome) e do tamanho da palavra
na produção da criança e são opcionais, dado que produções com e sem fillers
ocorrem no mesmo estágio (por exemplo, [ɔˈbɔːtɐ] boca, [oˈɔʎɐ] olha, [ɨˈnɐ] não,
[ɐˈitu] isto – Vigário; Martins; Frota, 2006). Em estágios posteriores, é sugerido
que as posições pré-nominais evoluem para categorias morfossintácticas (deter-
minantes). Malho; Correia; Frota (2017), no seu estudo sobre aquisição de sândi
externo consonântico, verificaram que a aquisição de sândi se desenvolve inicial-
mente no contexto entre clítico e palavra, contexto que tem sido analisado no PE
como sendo interno à palavra prosódica e externo ao grupo de palavra prosódica
(Vigário, 2003). Segue-se, na ordem de aquisição, a aquisição de sândi entre pala-
vras prosódicas.
Estudos de sintaxe também podem oferecer evidência para o nível prosódico
que envolve a prosodização dos clíticos. Pedott et al. (2014) mostram, para o
PB, que crianças de 7 anos fazem pausas silenciosas significativamente diferen
tes precedendo clíticos (o que as autoras descrevem como palavras de classe
fechada: artigos, pronomes, conjunções) ou precedendo palavras prosódicas (as
palavras de classe aberta: adjetivos, verbos, advérbios). Este resultado mostra
uma fronteira maior entre grupos clíticos do que dentro de um grupo clítico (entre
o clítico e a palavra).
No que respeita à prosodização de sequências que apresentam composição
morfológica ou sintática, o estudo de Vigário; Garcia (2012) sugere alguns dados
interessantes. As autoras investigam o desenvolvimento de palavras complexas nos
primeiros estágios de aquisição do Português Europeu. Os resultados mostram que
no início da produção de palavras complexas surgem simultaneamente formas deri-
vadas, compostas e formas com sufixação zavaliativa, ao contrário do que a frequên-
cia na língua fazia prever, dado que as formas derivadas são muito mais frequentes
no input do que as restantes. A estrutura prosódica poderá ter impacto nos padrões
de desenvolvimento das palavras complexas, pois as formas compostas e com o
sufixo zavaliativo constituem um grupo de palavra prosódica (ou seja, duas pala-
vras prosódicas (w) integradas no mesmo constituinte imediatamente superior, como
guarda-chuva [ˈadɐ]w [ˈfuvɐ]w, ou chuchinha [ˈʃuʃɐ]w [ˈziɲɐ]w), facilitando este for-
mato prosódico a produção de tipos de palavra complexa menos frequentes na língua.
Como mencionado na Seção 3 deste capítulo, falar de palavra prosódica sig-
nifica falar de proeminência e de tamanho prosódico, além, é claro, de processos
Aquisição da Prosódia no Português 99
específicos deste domínio. Aqui, tratamos dos dois últimos aspectos. Alguns estu-
dos sobre aquisição fonológica argumentam que a palavra prosódica tem o seguinte
desenvolvimento quanto ao seu tamanho, decorrente de uma marcação paramé-
trica quanto a requisitos de minimalidade e maximalidade: monossílabo >> palavra
mínima (pé bimoraico) >> 1 pé dissilábico >> 2 pés >> tamanho na fala adulta
(Demuth, 1995). Os estudos sobre o Português mostram que o segundo momento
não é encontrado nesta língua (o que está de acordo com a descrição de que o Por-
tuguês não é uma língua sensível ao peso silábico).
Santos (2001, 2007) analisou a emergência de palavras na fala infantil no Por-
tuguês Brasileiro, tendo em conta os principais padrões prosódicos da fala adulta.
A interação entre a quantidade de sílabas e a posição da sílaba acentuada desenha o
desenvolvimento descrito na Tabela 4.1 (‘s’ marca a sílaba acentuada, ‘w’ a sílaba
átona; os padrões em maiúscula são os mais frequentes).
Tabela 4.1 Desenvolvimento do formato de palavra no PB, segundo Santos (2001, 2007)
Baia (2012) defende que a criança utiliza templates, padrões fonológicos para a
quantidade de sílabas, estrutura silábica e posição de acento (assim como para
aspectos segmentais, como os traços dos segmentos, que direcionariam a harmo-
nia vocálica ou consonantal), e esses padrões facilitariam a expansão do léxico
(cf. também Oliveira-Guimarães, 2012). O desenvolvimento do formato da pala-
vra prosódica foi estudado em Vigário; Martins; Frota (2006), para o Português
Europeu, em dados de três crianças. Contrariamente ao PB, as formas monossilábi-
cas CV são produzidas de acordo com o alvo logo no início da produção de palavras.
As formas CVC, pelo contrário, são reduzidas a CV. Os alvos dissilábicos, tanto
SW como WS, são maioritariamente truncados para CV, podendo, todavia, ocorrer
produções dissilábicas. Frota et al. (2016b), ao analisarem as produções dissilábicas
iniciais do ponto de vista prosódico, concluíram que estas correspondem a duas e
não a uma palavra prosódica, pois apresentam um acento tonal em cada sílaba (cf. a
descrição acima sobre a aquisição do sintagma entoacional). Estes dados reforçam
o formato CV para alvos dissilábicos no estágio inicial. Note-se que as produções
truncadas para CV perduram até estágios tardios. As palavras trissilábicas (WSW)
são incialmente reduzidas para monossílabos e num estágio seguinte para dissílabos,
tanto com formato SW como WS (com variação no formato predominante entre cri-
anças). O formato WSW é adquirido cedo no desenvolvimento fonológico (entre os
17 e os 19 meses de idade). As autoras concluem que o desenvolvimento da palavra
prosódica no PE não está sujeito a requisitos de minimalidade ou de maximalidade.
Estes padrões de desenvolvimento são confirmados em dados de cinco crianças em
100 Sónia Frota, Raquel S. Santos
Correia (2009), que sublinha a variabilidade entre crianças quanto à preferência pelo
formato SW ou WS. Constituem, assim, diferenças entre o PE e o PB o domínio de
formas monossilábicas CV no primeiro estágio de aquisição e a frequência destas
formas em estágios posteriores, a grande variabilidade nos formatos SW e WS sem
dominância clara e a aquisição precoce do formato WSW.
Além da discussão sobre evidências para os níveis da estrutura prosódica na fala
das crianças e a descrição das características de cada constituinte prosódico, uma
importante questão que se coloca é como se dá a aquisição da estrutura prosódica,
assumindo-se que os níveis prosódicos são hierarquizados. Scarpa (1997) argumenta,
a partir dos resultados dos seus estudos sobre o contorno entoacional, inserção de
preenchedores fonológicos e regras de sândi externo no Português Brasileiro, que
as crianças trabalham com os níveis prosódicos de uma maneira top-down, a partir
da frase ou sintagma entoacional em direção aos níveis mais baixos da hierarquia.
Visão contrária tem Payão (2010), para quem as crianças são atraídas em um enun-
ciado para a sílaba portadora da proeminência entoacional e daí vão desenvolvendo
os níveis prosódicos, num trabalho bottom-up. Santos (2001) também defende que
o início do processo se dá no nível entoacional, mas posteriormente, para adquirir o
acento, a criança parte para o trabalho com a sílaba e a palavra prosódica. Assim, o
início do processo seria no nível mais alto, mas não seria um caminho de ‘descida’ nos
níveis prosódicos. Frota et al. (2016b), no seu estudo sobre a aquisição da estrutura
prosódica no Português Europeu com base em evidência entoacional e duracional,
apresentam uma visão diferente. Na linha de sugestões preliminares em Frota; Vigário
(2008), Frota; Matos (2009) e Vigário; Frota; Matos (2011), os autores propõem que
o desenvolvimento da estrutura prosódica ocorre através de um processo de ‘desdo-
bramento’ de constituintes prosódicos (unfolding hypothesis). Três etapas, ou estágios
de desenvolvimento são descritos. No momento inicial, níveis prosódicos chave como
o sintagma entoacional, a palavra prosódica e a sílaba encontram-se alinhados, sendo
coincidentes (ou coextensivos). Assim, no momento inicial a unidade de produção
consiste num sintagma entoacional de uma única palavra prosódica de uma única síl-
aba. Na etapa seguinte, dá-se um desdobramento da sílaba e da palavra prosódica, que
deixam de estar alinhados, permitindo sintagmas entoacionais de uma única palavra
prosódica com mais de uma sílaba. Finalmente, dá-se um desdobramento do nível
frásico e da palavra prosódica, permitindo sintagmas entoacionais de mais de uma
palavra prosódica. Os autores sugerem que diferentes línguas podem escolher difer-
entes unidades prosódicas para o alinhamento no estádio inicial, ou incluir estágios
intermédios de ‘desdobramento’: por exemplo, em línguas como o Inglês ou Holan-
dês, o estágio inicial poderá corresponder a um sintagma entoacional de uma única
palavra prosódica de um pé (bimoraico ou dissilábico); uma outra possibilidade seria
a existência de uma etapa intermédia com o ‘desdobramento’ da sílaba e do pé. Uma
compreensão cabal do processo de aquisição da estrutura prosódica requer futuros
estudos empíricos, nomeadamente numa perspectiva interlinguística.
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5 Relação entre produção e percepção das
líquidas no Português
Dados de aquisição de L1 e L2
Resumo
A existência da relação entre produção e percepção de fala já é bem estabelecida
na literatura. Entretanto, a natureza desta relação permanece obscura. Há autores
que defendem que a habilidade de percepção antecede a produção, enquanto outros
autores advogam que a relação entre produção e percepção codesenvolve-se. O
presente capítulo abordará a relação entre a produção e a percepção de fala envolv-
endo as líquidas alveolares no Português, tanto no contexto da aquisição fonológica
atípica (L1), quanto no contexto de aquisição fonológica de L2. Dados advindos
de experimentos de produção (tarefa de nomeação) e de percepção (tarefas de dis-
criminação e de identificação) serão apresentados. Além de contribuições para o
estudo da relação entre produção e percepção da fala, também se esperam con-
tribuições para intervenções clínicas das crianças com Distúrbio Fonológico (L1) e
para questões metodológicas dos estudos sobre a aquisição fonológica de L2.
1 Introdução
Dentre as teorias sobre a percepção de fala, a Teoria Motora de Percepção de Fala
(Liberman; Mattingly, 1985; Galantucci et al., 2006) é aquela que declaradamente
explicita a relação entre produção e percepção de fala. Uma das principais ale-
gações da Teoria Motora da Percepção de Fala é a de que a produção e a percepção
envolvem um mecanismo comum no qual o sistema motor é recrutado durante o
processo de percepção de fala (Liberman; Mattingly, 1985, 238).
Na versão da Teoria Motora Revisada (Galantucci et al., 2006, 371) uma série
de evidências empíricas são apresentadas para sustentar o fato de que perceber a
fala envolve o sistema motor. Achados, sobretudo de estudos neurofisiológicos,
sobre a existência de um conjunto comum de mecanismos cerebrais que subjazem
tanto às funções da percepção quanto da produção de fala têm fortemente sugerido
a existência de um forte elo entre produção e percepção.
A maior parte desses achados diz respeito às evidências cerebrais de que a per-
cepção da fala ativa representações de ações compatíveis com o input recebido;
DOI: 10.4324/9781003294344-7
Relação entre produção e percepção das líquidas no Português 111
isso significa dizer que o sistema motor seria acessado on line durante a percepção
de fala (Galantucci et al., 2006).
Destaca-se, no entanto, que dados empíricos advindos de pesquisas tanto na
área de aquisição de L1, sobretudo no contexto atípico de desenvolvimento, ou
seja, particularmente aquelas envolvendo crianças com Distúrbio Fonológico
(DF);3 como também na área de aquisição de L2, nem sempre têm corroborado a
existência desse forte elo entre produção e percepção de fala.
Na discussão deste tema, o presente capítulo está dividido em seis seções,
incluindo-se a introdução. Primeiramente, são sintetizados os principais estudos
tanto de aquisição de L1 quanto de L2 que investigam a relação entre produção e
percepção de fala. Nas duas seções seguintes, 3 e 4, respectivamente, são apresen-
tados dois estudos sobre a relação entre produção e percepção de fala das líquidas
do Português Brasileiro (PB) e do Português Europeu (PE). Discute-se, na seção
5, as assimetrias entre a produção e a percepção das líquidas no PB e no PE e, por
fim, na seção 6, apresentamse as implicações dos resultados reportados não apenas
para os modelos teóricos sobre a percepção de fala, como também para a atuação
clínica e para os aspectos metodológicos das investigações em L2.
relativas à aquisição de L1, os dados empíricos têm apontado para uma interação
complexa e dinâmica entre duas modalidades da fala.
O Speech Learning Model (Flege, 1995) advoga que a perceção constitui um
prérequisito para a produção correta em L2. Especificamente, a produção de
um som da L2 corresponderá às propriedades especificadas na sua representação
mental, construída através da categorização perceptiva. Numa versão revisada,
O Speech Learning Model-r (Flege; Bohn, 2021) abandona a precedência entre a
perceção e a produção na aquisição das categorias sonoras de L2, mas continua a
defender que as duas modalidades da fala se codesenvolvem.
O Perceptual Assimilation Model-L2 (Best; Tyler, 2007) adota até uma visão
mais extremada, assumindo a existência da estrita correlação entre duas modali-
dades, uma vez que este modelo foi desenvolvido com base na Teoria Motora de
Percepção de fala (Liberman; Mattingly, 1985), segundo a qual os primitivos na
produção da fala (gestos articulatórios) são também extraídos a partir do input
auditivo no processo percetivo, como discutido no início desta seção.
Dois tipos de evidência a favor da especulação destes dois modelos podem-se
encontrar na literatura (veja Bohn, 2017; Thomson, 2022 para revisões). Por um lado,
as taxas de acerto obtidas por aprendentes de L2 numa tarefa perceptiva muitas vezes
correlacionam-se de forma positiva com o seu desempenho numa experiência de
produção (Bion et al., 2006; Rauber; A. Rato; Silva, 2010; Brunner et al., 2011). Por
outro lado, o ganho no treino fonético sobre uma modalidade é também evidente na
outra modalidade não treinada. Nomeadamente, a melhoria da competência percep-
tiva, depois do treino fonético que apenas se destina à percepção de L2, também leva
ao aperfeiçoamento na produção oral de L2 (Rato, 2014; Sakai; Moorman, 2017).
No entanto, um número crescente de estudos tem apresentado dados contra-
ditórios, indicando que as produções de aprendentes não nativos podem não se
espelhar no seu desempenho perceptivo (e.g. Sakai, 2016; Baese-Berk, 2019; de
Leeuw et al., 2019). Um conjunto de estudos recentes até sugere que a relação entre
a perceção e a produção pode mudar ao longo do tempo na aquisição fonológica de
L2 (Jia et al., 2006; Rallo; Romero, 2012; Nagle; Baese-Berk, 2021).
Pelo fato de ainda estar muito longe de ser clara a relação entre a percepção
a produção da fala no desenvolvimento fonológico, o presente capítulo abordará
esta questão através de estudos sobre as líquidas alveolares no Português, tanto
no contexto da aquisição fonológica atípica (L1), quanto no contexto de aquisição
fonológica de L2.
Além de contribuições para o estudo da relação entre produção e percepção da fala,
também se esperam contribuições para intervenções clínicas das crianças com Distúr-
bio Fonológico (L1) e para questões metodológicas na aquisição fonológica de L2.
Nas próximas seções (3 e 4, respectivamente), serão apresentados dados advin-
dos de dois estudos, um de L1 e outro de L2, sobre a relação entre produção e de
percepção, envolvendo as líquidas alveolares no Português.
As líquidas alveolares do Português (/l/ e /ɾ/) foram privilegiadas nos estudos
pelo fato de sua aquisição, tanto no contexto de L1, quanto no contexto de L2, rep-
resentar um verdadeiro desafio aos aprendentes, comumente resultando em proces-
sos de substituição (/ɾ/→[l] ou /l/→[ɾ]).
Relação entre produção e percepção das líquidas no Português 113
Estímulos
/ɾ/ /l/
Vera Vela
Mara Mala
Caro Calo
Puro Pulo
Cara Cala
Sara Sala
Vira vila
Vara vala
Corado colado
Cera sela
Mora mola
Marinha malinha
Mira Mila
Sarada salada
Coragem colagem
produzia cada uma das palavras e questionava a criança qual das líquidas ele tinha
produzido; 3) identificação das líquidas alveolares a partir da produção de fala da
própria criança (sessões de 07 a 10 do processo terapêutico), ou seja, solicitava-se
à criança para produzir cada uma das palavras e questionava-se qual das líquidas a
criança tinha produzido; 4) produção das líquidas alveolares (sessões de 11 a 15 do
processo terapêutico), isto é, solicitava-se à criança a produção alvo das líquidas
fornecendo pistas auditivas, visuais e proprioceptivas de acordo com a necessidade
de cada participante. A primeira e a última sessões (sessões 01 e 16, respectiva-
mente) foram utilizadas para fazer uma avaliação da produção das palavras-alvo na
condição pré e pós terapia.
A tarefa de “percepção da fala do outro”, ou seja, identificação das líquidas
alveolares a partir da fala do adulto típico consistiu na apresentação das 30 pala-
vras produzidas pelo terapeuta à criança, individualmente, e imediatamente após a
produção de cada uma das palavras era solicitado à criança que dissesse qual das
líquidas o terapeuta tinha produzido: /l/ ou /ɾ/. A apresentação dos estímulos foi
feita ao vivo, ou seja, após o sorteio de uma figura durante um jogo na sessão de
terapia; o adulto produzia a palavra correspondente à figura sorteada e perguntava
à criança se a palavra produzida envolvia o /l/ ou /ɾ/. Não foi controlado o tempo
de resposta das crianças nem o tempo de apresentação dos estímulos. Para cada
uma das palavras, o terapeuta anotava 0 quando a criança não identificava a líquida
alveolar corretamente e 1 quando a criança a identificava corretamente.
Analogamente, a tarefa de “percepção de sua própria fala”, ou seja, identificação
das líquidas alveolares a partir da produção da própria criança consistiu na produção
das 30 palavras produzidas pela criança utilizando-se uma atividade lúdica durante
a sessão de terapia, e imediatamente após a produção de cada uma das palavras era
solicitado à criança que dissesse qual das líquidas ela tinha produzido: /l/ ou /ɾ/.
A criança deveria identificar apenas o que ela havia produzido. Não foram apre-
sentados estímulos produzidos por outras crianças. Não foi controlado o tempo de
resposta das crianças nem o tempo de apresentação dos estímulos. Para cada uma
das palavras, o terapeuta anotava 0 quando a criança não identificava a líquida
alveolar corretamente de sua própria produção e 1 quando a criança a identificava
corretamente a partir de sua própria produção.
Por fim, a tarefa de produção consistiu na nomeação de figuras correspon
dentes às 30 palavras selecionadas durante uma atividade lúdica proposta na
sessão terapêutica, por cada criança individualmente. Para cada uma das pala-
vras, o terapeuta anotava 0 quando a criança não produzia a líquida alveolar
corretamente e 1 quando a criança a produzia corretamente. Embora o tempo
utilizado pela criança para a realização da tarefa de nomeação não tenha sido
controlado, não poderia ultrapassar de 40 minutos. Considerou-se, para análise,
somente a tarefa de produção da primeira e da última sessão, equivalentes aos
momentos pré e pós terapia, em que não eram fornecidas quaisquer pistas (audi-
tiva, visual e/ou proprioceptiva) que poderiam favorecer a produção alvo das
palavras pelas crianças.
Na análise, foram considerados os resultados dos testes de percepção da sessão
03, correspondente à primeira avaliação da identificação das líquidas alveolares a
116 Larissa Cristina Berti, Chao Zhou
Tabela 5.1 Taxa de acertos das líquidas nas tarefas de produção e percepção das palavras-alvo
A Tabela 5.1, a seguir, apresenta as taxas de acertos das líquidas alveolares nas
tarefas de nomeação das palavras-alvo (pré e pós-terapia), bem como nas tarefas
de identificação, a partir da fala do adulto típico (percepção do outro) e da fala da
própria criança (percepção de si).
Uma ANOVA de Medidas Repetidas foi conduzida para avaliar os efeitos das
condições da terapia (produção pré-terapia, percepção a partir da fala do adulto,
percepção e a partir da fala da própria criança e produção pós-terapia) e do tipo de
líquida (lateral e não lateral) sob a taxa de acertos. A Tabela 5.2 mostra os resulta-
dos da ANOVA de Medidas Repetidas.
Conforme a Tabela 5.2, observase um efeito significante para líquidas e con-
dições e para interação entre líquida e condições. Pelo fato de as condições da
terapia apresentarem 4 níveis (produção pré-terapia, percepção do outro, per-
cepção de si e produção pós-terapia), uma análise pós hoc foi feita, a partir do
teste de Bonferroni. A análise pós hoc mostrou que a taxa de acerto das líquidas
foi dependente das condições da terapia, ou seja, a líquida /l/ apresentou maior
taxa de acerto apenas para as habilidades de produção, tanto na condição pré-
quanto na condição pós- terapia (p<0,05). No entanto, as taxas de acerto entre
as líquidas não se diferenciaram nas habilidades de percepção, ou seja, nem
na habilidade de percepção do outro, nem na habilidade de percepção de si
(p>0,05).
empíricos revelam que a dificuldade por parte dos aprendentes chineses não se
restringe à discriminação moderada entre as duas categorias da L2. Nomeada-
mente, a produção de /l/ e de /ɾ/ depende das posições prosódicas em que estes seg-
mentos ocorrem (Zhou, 2017; Liu, 2018; Zhou; Hamann, 2020): A lateral alveolar
/l/ é produzida sempre conforme o alvo em ataque não ramificado, enquanto ela é
muitas vezes semivocalizada como [w] na posição de coda. No caso da vibrante
alveolar /ɾ/, os aprendentes chineses produzemna com maior taxa de sucesso em
coda do que em ataque simples; quando não conseguem produzir o segmento alvo,
os aprendentes utilizam apenas [l] em ataque, no entanto recorrem a várias estraté-
gias de reconstrução em coda, quer segmentais ([l], [t/d/th] e [ɻ]), quer estruturais
(epêntese e apagamento).
À luz dos modelos da aquisição fonológica de L2, que assumem uma estreita
correlação entre a percepção e a produção da fala em L2 (Flege, 1995; Best; Tyler,
2007; Flege; Bohn, 2021), pode-se colocar a hipótese de que os mesmos efeitos
prosódicos, i.e., a ordem da aquisição (/l/onset > /l/coda, /ɾ/coda > /ɾ/ataque) e as estratégias
de reconstrução que variam em função da posição silábica, vão surgir também na
percepção de L2.
Para o estudo, recrutaram-se 71 participantes, entre os quais 61 são aprendentes
chineses de Português e 10 são falantes nativos do PE. A seleção dos informantes
chineses segue os seguintes critérios: a) são falantes nativos de mandarim, ou seja,
considerando mandarim como a sua língua dominante, independentemente do dialeto
da região onde foram criados; b) não têm fluência ou uso regular de uma língua
estrangeira, exceto o inglês. Os 10 ouvintes nativos do PE, todos nascidos e crescidos
em Portugal, tinham em média 29 anos (DP =1.5). Nenhum participante tinha pertur-
bações do desenvolvimento da linguagem nem dificuldades auditiva ou articulatória.
A percepção foi testada por meio de tarefas. Foram desenhadas duas tarefas perce-
tivas, uma de discriminação AXB e uma de identificação. Na tarefa de discriminação
AXB, os participantes ouviram um item de teste correspondente a uma sequência
de 3 estímulos auditivos “A”, “X” e “B” e, depois, foram instruídos a indicar se o
segundo estímulo (“X”) é mais semelhante ao primeiro (“A”) ou ao terceiro (“B”),
pressionando a tecla correspondente à resposta. A presentação dos estímulos foi
contrabalançada entre itens de teste (AAB, ABB, BBA, BAA). Para cada item, o
intervalo interestímulo foi ajustado para 1200 ms, tendo como objetivo incentivar os
participantes a processarem os estímulos ao nível fonológico, em vez de fazerem a
comparação acústica entre estímulos (Escudero; Benders; Lipski, 2009). A tarefa é
composta por uma fase de treino com 4 itens e uma fase de teste dividida em 4 blo-
cos, 20 itens de teste e 10 distratores por cada bloco. Os itens de teste encontram-se
balanceados entre blocos, de modo que cada bloco contenha todos os tipos de estímu-
los ([ɫ]coda – [w], [ɾ]onset – [l], [ɾ]coda – [l], [ɾ]coda – [ɾə] e [ɾ]coda – [∅]). Os participantes
tinham pausas em seu próprio ritmo entre blocos para mitigar a fadiga.
Os dados prévios de produção demonstram que os aprendentes chineses pro-
duzem a vibrante do PE como [l], mas nunca inversamente (*/l/ →[ɾ]), indicando
que a dificuldade com o contraste /l/ – /ɾ/ é unidirecional (Zhou, 2017; Zhou;
Hamann, 2020). Porém, os resultados de uma tarefa de discriminação apenas
indicará se os aprendentes conseguem detectar a diferença entre dois segmentos,
Relação entre produção e percepção das líquidas no Português 119
Tabela 5.3 Taxas de acerto em relação aos cinco contrastes examinados na tarefa de dis-
criminação AXB em função do grupo de participantes
B SE p .value 95%CI
Tabela 5.5 As taxas de acerto na identificação de [l] e [ɾ] em função do grupo de participantes.
/l/ Nativo 1 0
Aprendente 0.67 0.21
/ɾ/ Nativo 1 0
Aprendente 0.67 0.22
6 Conclusão
O presente capítulo abordou a relação entre a produção e a percepção de fala
envolvendo as líquidas alveolares no Português, tanto no contexto da aquisição
fonológica atípica (L1), quanto no contexto de aquisição fonológica de L2.
Dados advindos de experimentos de produção e de percepção de fala tanto de L1
quanto de L2 não confirmaram a existência de uma relação unívoca entre produção e
percepção, contrariando as alegações da Teoria Motora de Percepção de fala (Liber-
man; Mattingly, 1985; Galantucci et al., 2006). Um modelo teórico promissor que
pode eventualmente dar conta da interação complexa e dinâmica entre duas modali-
dades da fala é o Modelo Bidirecional de Fonologia e Fonética (BiPhon; Boersma,
2011; veja Matzenauer; Quintanilha-Azevedo, 2022 para uma introdução recente
em Português), que admite não apenas a intercorrelação mas também a divergência
entre a percepção e a produção de fala. Nomeadamente, de acordo com o BiPhon,
a forma articulatória é apenas envolvida no módulo da produção, mas não em per-
cepção. Neste caso, a dificuldade em produzir certo segmento não necessariamente
implica o transtorno na sua percepção, o que vai ao encontro dos dados da aquisição
fonológica de L1 e de L2. Para além disso, as evidências empíricas apresentadas
neste capítulo também têm implicações clínicas e metodológicas.
Relação entre produção e percepção das líquidas no Português 125
Notas
1 Financiamento: CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(Processo 301735/2019–0), FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo (Processo 2020/03990–5).
2 Financiamento: Financiamento FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P.,
através do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa (UIBD/00214/2020).
3 Refere-se ao diagnóstico dado a crianças cujo desempenho de fala não está de acordo
com a idade esperada. Tratase de crianças que apresentam dificuldades na percepção,
produção e representação dos sons que impactam na inteligibilidade de fala.
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128 Larissa Cristina Berti, Chao Zhou
Resumo
Partindo da premissa de que a aquisição da fala e da escrita integram um mesmo
processo, o da aquisição da linguagem, este capítulo apresenta uma reflexão,
empiricamente fundamentada, sobre as relações que se estabelecem entre aquisição
fonológica e aprendizagem da escrita, nas variedades europeia e Brasileira do Por-
tuguês. O foco da análise incide na Rima silábica, discutindo-se os padrões encon-
trados à luz dos paradigmas de aquisição da fala e das abordagens teóricas da sílaba,
nos dois sistemas linguísticos. Os dados apontam para uma construção progres-
siva das representações subjacentes, motivada pelo contato com a alfabetização,
particularmente no que diz respeito à representação bifonêmica da nasalidade.
Globalmente, a investigação apresentada neste capítulo corrobora a importância
das escritas iniciais enquanto bases empíricas para a reflexão mais vasta sobre o
conhecimento fonológico, sobre o mapeamento entre a fonologia da criança e a
do(s) sistema(s) alvo.
1 Introdução
Neste estudo parte-se da ideia segundo a qual a aquisição da fala e a da escrita inte-
gram um mesmo processo, o da aquisição da linguagem. Entende-se, portanto, que
os padrões de desenvolvimento da fala e da escrita constituem uma base empírica
relevante para discussões relativas ao conhecimento fonológico das crianças que,
ao compreenderem os princípios do sistema alfabético, alcançam condições propí-
cias para revisitá-lo, podendo, eventualmente, redescrever suas representações.
Destaca-se que os estudos sobre aquisição da linguagem têm reivindicado um
espaço para o desenvolvimento linguístico e cognitivo, bem como para a vari-
ação e a presença de diferenças individuais, sem que seja necessário abrir mão
de estruturas universais e de padrões gerais de aquisição (Kiparsky; Menn, 1977;
KarmiloffSmith, 1992). Neste contexto, estudos sobre aquisição da escrita como
os de Miranda (2009, 2014, 2019, 2020); Miranda; Matzenauer (2010); Veloso
(2003, 2019); Costa (2020); Pachalski; Miranda (2021); Costa; Rodrigues; Freitas
DOI: 10.4324/9781003294344-8
130 Ana Ruth Moresco Miranda, Teresa Costa
2 Enquadramento teórico
A sílaba passou a ter relevância para a teoria fonológica uma década após a publi-
cação do The Sound Patterns of English (SPE) de Chomsky; Halle (1968), marco
da fonologia gerativa. Foi a partir de Liberman; Prince (1977) e de sua investigação
sobre o acento, no entanto, que a unidade sílaba ganhou proeminência nos estudos
da gramática sonora e seria com Selkirk, em 1982, que, interpretada como o lócus
syllable (=)
onset rhyme
f l peak coda
a w n s
Figura 6.1 Representação silábica – modelo Ataque-Rima
(Fonte: Selkirk [1982], 1999, 331)
A grafia de consoantes em final de sílaba no PB e no PE 131
CV
pá
˜ ˜
O R O R
N N C
k a [nasal] k a u
Mateus e Andrade (2000)
Bisol (1999)
(ilegal e inalterado); nas derivações das formas terminadas por vogal nasal acen-
tuada emerge a nasal no ataque (irmã-irmanar); nas proparoxítonas a penúltima
vogal não pode ser nasalizada. Bisol (2002) acrescenta o bloqueio do sândi como
mais um argumento favorável à subjacência /vN/ (lã amarela, mas não *lãmarela).
Bisol (2002) e Mateus; D’Andrade (2000), seguindo a tradição matosiana, argu-
mentam em favor do estatuto bifonêmico das vogais nasalizadas, embora discordem
entre si no que diz respeito à natureza do fenômeno. Enquanto para aquela a nasali-
dade fonológica é derivada de uma estrutura CVN, para estes, vogais nasalizadas
derivam da presença de um autossegmento [nasal] flutuante, sem posição esqueletal.
Costa; Freitas (2001) propõem uma visão alternativa, qual seja, a da existên-
cia de vogais nasais subjacentes, e o fazem com base em evidências dos dados
de aquisição e também do funcionamento do PE. Os autores observam, conforme
Freitas (1997), que as crianças Portuguesas, na aquisição fonológica, utilizam
estratégias de seleção no que diz respeito a palavras com estrutura CVC[fricativa],
quando ainda não são capazes de produzir tais estruturas silábicas, mas não no
caso da produção de palavras com nasal, o que é interpretado como resultado de
um processamento distinto para tais estruturas. Na sincronia, os autores constroem
a argumentação a partir de uma especificidade do PE, quando comparado ao PB: a
ausência da nasalidade na vogal tônica proveniente da assimilação do traço [nasal]
da consoante do ataque da sílaba seguinte. Conforme observado em palavras como
lama e cabana, produzidas como l[ɐ]ma e cab[ɐ]na no PE e como l[ɐ]ma ̃ e cab[ɐ]̃
na no PB. Para Costa; Freitas (2001), o fato de não haver esse tipo de nasalidade em
PE contraria a ideia de um autossegmento nasal, tal como postulada por Mateus;
D’Andrade (2000). E este seria, pois, mais um argumento em prol da existência de
vogais nasais lexicais em PE.
Já as codas lateral, fricativa e rótica não suscitam dúvidas em relação à posição
que ocupam na estrutura da sílaba, havendo concordância entre os fonólogos que
as abordam. Nessas codas, serão observadas variações no nível fonético, especial-
mente no PB, conforme explicitado na Tabela 6.2.
As róticas, cuja articulação é de um flap na variedade standard do PE (Mateus;
D’Andrade, 2000), no PB, pode deslizar de um flap para fricativas posteriores,
o que resulta em uma gama de formas variáveis em distintos dialetos [ɾ][ʀ][x]
[h] (Callou, 1987). A lateral, por sua vez, ganha uma articulação secundária velar
134 Ana Ruth Moresco Miranda, Teresa Costa
Tabela 6.2 Realização fonética das codas fricativa, lateral e rótica: PE e PB (adaptado de
Mateus; D’Andrade, 2000, 52)
PE PB
Tabela 6.3 Aspectos fonéticos, fonológicos e ortográficos das consoantes em final de sílaba
no Português (adaptado de Miranda, 2019)
Tabela 6.4 Cronologia de aquisição das consoantes nasal, fricativa e líquidas, em função do
constituinte silábico, no PB (adaptado de Lamprecht et al., 2004)
cronologia, a qual mostra que a produção dos segmentos em coda medial tende a
ser posterior à sua produção em ataque e que há diferenças relativas à produção dos
segmentos em coda medial e final, conforme ilustrado a seguir.
O primeiro aspecto que se destaca é referente à diferença na cronologia das
codas dependendo da posição, medial ou final. Notase que, à exceção da rótica,
segmento dentre todos o de aquisição mais tardia, a coda final emerge mais pre-
cocemente do que a medial. Esse padrão tem sido reportado para o PE (Freitas,
1997; Correia, 2004), sendo a saliência da posição final um dos motivos apontados
para justificar esse resultado, já que, na grande maioria dos casos, se trata de uma
posição proeminente, portadora do acento prosódico e de informação morfológica
(Freitas, 2017). O estudo de Macken (1992) abre outra frente interpretativa para
tal padrão com o argumento de que a palavra inteira direciona a aquisição inicial
e, sendo assim, a produção precoce da coda em final de palavra pode estar relacio-
nada ao modo de processamento fonológico da criança que, em estágios precoces,
processa as futuras codas como parte da palavra fonológica e não como um con-
stituinte silábico.
As relações de interdependência estabelecidas entre a aquisição dos segmentos
e os respectivos estatutos prosódicos têm sido alvo de atenção, também, na inves-
tigação realizada no PE. Os resultados desses estudos têm mostrado que, tal como
no PB, há padrões de precedência na emergência e na estabilização dos segmentos,
em função do constituinte silábico. Apesar de, por questões metodológicas, os dife-
rentes estudos não serem consentâneos quanto às faixas etárias de aquisição, sabe-
se que, em ataque não ramificado, as nasais emergem precocemente, seguindose
as fricativas e as líquidas, de aquisição mais tardia (Freitas, 1997; Costa, 2010;
Amorim, 2014). Focando especificamente a posição medial de palavra e os três
segmentos que, na descrição fonológica do PE, se consideram aptos a preencher a
posição de coda silábica, os estudos mostram que a fricativa coronal é a primeira a
estabilizar, normalmente antes dos 3 anos (Amorim, 2014; Ramalho, 2017). Segue-
se a rótica, adquirida, em diferentes estudos, numa faixa etária compreendida entre
os 4;6 e os 6 anos e, por fim, a lateral, só adquirida depois dos 5 anos em alguns
trabalhos e ainda não adquirida aos 6 anos, noutras investigações (para uma sis-
tematização das escalas etárias identificadas em diferentes estudos no PE, consulte
se Ramalho, 2017). Assim, no que diz respeito às líquidas, o PE apresenta um
percurso de aquisição inverso ao do PB, pois os dados do Brasil apontam para uma
aquisição mais precoce da lateral.
A grafia de consoantes em final de sílaba no PB e no PE 137
PE PB
A partir destes valores, é possível reconstruir uma escala do domínio escrito das
consoantes no limite direito da sílaba, para as duas amostras. Assim, no PE, a consoante
lateral é a que coloca menos dificuldades aos alunos; seguese a rótica e a fricativa e,
por fim, a nasal, que registra maior percentagem de erros. Já no PB, a consoante com
maior taxa de acerto é a rótica, seguida da fricativa, da nasal e, por fim, da lateral. Estas
sequências mostram que PE e PB diferem de maneira mais radical quanto à lateral:
trata-se do segmento que menos entraves parece colocar às crianças Portuguesas e,
inversamente, o que se evidencia como mais problemático para as crianças Brasileiras.
Estas diferenças entre PE e PB esbatem-se, no entanto, no que diz respeito à nasal, uma
vez que os dois grupos evidenciam dificuldades no registro da nasalidade pósvocálica.
No que diz respeito ao tipo e frequência dos erros, os dados de ambas as vari-
edades convergem na predominância de omissões relativas às consoantes nasal e
fricativa e são coincidentes no predomínio de erros por substituição da consoante
lateral. Relativamente à rótica, as crianças Portuguesas e Brasileiras manifestam
uma tendência comum, neste caso, para erros por metátese. Na seção seguinte,
far-se-á uma análise mais detalhada destes padrões de erro, por classe segmental.
Na amostra aqui em observação, foram identificados, no PE, 3059 tokens com nasal
pós-vocálica medial, dos quais 81% são redigidos conforme o alvo, registrando-se
596 erros. Nos textos do PB, foram identificados 1234 tokens, dos quais 77% são
produzidos em conformidade com o alvo, verificandose 285 ocorrências de erro.
Nas duas amostras, as estratégias mais utilizadas para lidar com a escrita das
consoantes nasais em fim de sílaba interna são a omissão e as trocas ortográficas,
como exemplificado em seguida.
A análise desses erros em função da vogal que antecede a consoante nasal
mostrou que a similaridade entre as duas amostras é notável, pois, em ambos os
corpora, a omissão prevalece em contextos da vogal baixa e das vogais altas (con-
textos aN, iN e uN), enquanto as trocas ortográficas afetam sobretudo contextos
com vogais médias (contextos eN, oN). Assim, a distribuição dos erros para a nasal
pós-vocálica não parece estar relacionada com a percepção da nasalidade, visto que
esta é mais reduzida nas vogais altas e mais acentuada na vogal baixa.
Procurou-se ainda averiguar se, nos casos de omissão da consoante nasal, esse
fenômeno é acompanhado de alteração da qualidade vocálica. Neste âmbito, os
PE PB
PE PB
PE PB
PE PB
No PE, foram identificados 243 tokens com coda lateral medial, dos quais 91% são
redigidos conforme o alvo, ou seja, com o grafema <l>. Já no PB, foram identifi-
cados 83 tokens para a lateral em final de sílaba interna. Contrariamente ao que se
verifica nos dados do PE, as crianças Brasileiras demonstram dificuldades acentua-
das na representação de <l> nesta posição silábica, conforme evidenciado pela taxa
de acerto bastante menor, de 59%, com 34 ocorrências de erro.
Apesar das diferenças nas taxas de acerto, os dois grupos de crianças manifestam
um comportamento semelhante em relação à categoria de erro mais frequente: em
ambos os casos, predomina a substituição, como ilustrado na tabela que se segue.
A Tabela 6.11 ilustra os dois tipos de substituição que afetam a lateral: por um
lado, a troca do grafema <l> pela vogal <u> (registrase apenas um caso de substi-
tuição por <o>, em <aomofadas> para almofadas, no PE) e, por outro, a troca por
uma consoante nasal (<m> ou <n>). A substituição pelos grafemas vocálicos é a
mais frequente em ambas as amostras, embora surja mais generalizada na escrita
das crianças Brasileiras (91% no PB e 57% no PE).
No PE, foram identificados 1444 tokens com coda rótica medial, dos quais 90%
foram representados em conformidade, ou seja, grafados com <r> nessa posição
silábica, registrando-se 142 casos de erro. Já no PB, a percentagem de acerto foi
maior para esta consoante. No conjunto de 354 tokens, a rótica foi representada
corretamente em 95% dos casos, havendo apenas 18 ocorrências de erro.
Nos dados de ambas as variedades, a omissão e a metátese são os padrões mais
frequentes. As omissões representam, no PE, 43% dos erros para a rótica e afetam
palavras como tartaruga e carnaval, grafadas como <tataroga> e <canaval>. No
PB, as omissões correspondem a 10 casos (55% dos erros) de representação gráfica
da palavra porque, escrita como <poque>.
144 Ana Ruth Moresco Miranda, Teresa Costa
PE PB
seguida, mas antes importa realçar esta constatação de que as crianças Portuguesas
e Brasileiras deste estudo registram padrões de aquisição da escrita muito simi-
lares. Essa semelhança mostra que, em etapas iniciais da aprendizagem, é maior a
proximidade do que a diferença entre os dois sistemas linguísticos.
Conforme referido no início desta seção, os achados e as questões norteadoras
deste estudo trazem à tona a discussão sobre as representações fonológicas e sobre
o papel dos dados de escrita como base empírica para a reflexão teórica. A Figura
6.6 sintetiza a forma como a relação entre a aquisição fonológica, a fonologia da
língua e a ortografia estão sendo abordadas no estudo.
A simetria observada entre os níveis representados na Figura 6.6 (input fonético,
forma fonológica e forma ortográfica), relativamente à fricativa e à rótica, parece
ser responsável pela alta performance das crianças em suas escritas iniciais, mani-
festada nos índices de acertos observados em ambas as amostras, em torno de 90%
ou mais. Nesses casos, a entrada linguística conspira para uma representação CVC
a qual, por sua vez, encontra eco na ortografia (notese que o uso do <x> é resi
dual). Já a assimetria verificada no que concerne à lateral permite algumas reflexões
sobre a construção das representações fonológicas e sobre a reestruturação que
pode decorrer da aquisição da escrita ortográfica. Ao chegarem à escola, o ponto
de partida de crianças Brasileiras e Portuguesas parece ser distinto dado o input
disponível, CV[glide] para as primeiras e CV[lateral] para as últimas. Ainda que
a velarização da lateral observada em PE possa projetar um núcleo complexo na
fonologia inicial, como postula Freitas (1997), a coda lateral se consolida a partir
da aquisição de outras codas (fricativa e rótica) e o input disponível reforça tal con-
figuração. Assim, ao compreender os princípios do sistema alfabético e começar a
acessar a estrutura interna das sílabas, as crianças falantes de PE deparam-se com
uma relação simétrica entre forma fonológica e ortográfica. Já a criança Brasileira
precisará da informação ortográfica para reestruturar a configuração da sílaba com
lateral em coda, uma vez que durante o processo de aquisição não lhe foi facultado
codas do português
ortografia <l> <s><x> <r>
fonologia VL VS VR
N C N C N C
input v w L v S v R
-
pelo input o acesso a essa informação. Assim, os dados de escrita analisados neste
estudo, ao mostrarem que a lateral pós-vocálica apresenta resultados opostos, isto
é, maior facilidade na grafia para as crianças do PE e menor para as do PB, cor-
robora a ideia de haver uma necessária pressão da ortografia, especificamente nos
casos em que há maior assimetria entre os níveis.
Quanto à nasalidade pós-vocálica, descrita como coda nas análises para o PB e
como decorrente da presença de um autossegmento em PE (cf. Figura 6.3), tem-
se que os inputs são similares em ambas as variedades.6 No entanto, a assimetria
entre input e a representação bigrafêmica na ortografia (<Vm> ou <Vn>) impacta
os registros iniciais da nasalidade nos dados dos dois grupos, como se pôde ver
nos resultados apresentados neste estudo e em outras investigações já menciona-
das. A incidência de erros é maior nas grafias das vogais nasalizadas em posição
medial (seção 4, Tabela 6.5) e variadas são as estratégias utilizadas pelas crianças
para resolverem o problema do registro dessa estrutura. Diante da mesma tarefa,
qual seja, registrar a nasalidade medial, observam-se diferentes soluções como a
segmentação nãoconvencional; a mudança na qualidade da vogal (<penseno> para
pensando, <quedo> para quando); a metátese (<getne> para gente), cujo resultado
fere a grafotática; ou ainda o uso de <ão> como em <bão di do> para bandido e <i>
como em <eicomóda> para (ele) incomoda. Tal variedade de estratégias para solu-
cionar o problema da grafia da vogal nasalizada reforça a ideia de Abaurre (1988),
segundo a qual a sequência <VN> é uma forma gráfica contraintuitiva às crianças.
Considerando-se esses aspectos relativos à nasalidade e com base nos dados que
vêm sendo analisados e cotejados como resultados da aquisição fonológica, argui-se
uma mudança representacional em decorrência do contato com a escrita alfabético-
ortográfica cujo resultado, para a fonologia, é uma representação bifonêmica.
Importa ainda aqui explorar a significação do espaço em branco deixado pelas
crianças em contexto de consoante pós-vocálica; na sua maioria, estes casos de erro
foram classificados neste estudo como fenômenos de segmentação. Apesar de não
constituírem uma categoria com elevada taxa de ocorrência (constitui 5% do total
de erros identificados na amostra do PB e 2% no PE), estas segmentações revelam
se interessantes enquanto pistas para o processamento infantil que lhes poderá estar
subjacente. Veja-se, em seguida, um texto com exemplos desse fenômeno.7
As grafias hipersegmentadas no texto são representativas dos dados de ambas as
variedades e ilustram um período de aprendizagem marcado pela hesitação e pela
experimentação. Nos dados analisados, as crianças ora grafam a consoante pós-
vocálica, mas hesitam na posição na sílaba (e.g. em bora vs e mora) e na palavra (e.g.
bos car; com pania), ora não a representam, deixando um espaço em branco no seu
lugar (e.g. gra de). Repare-se que, em alguns casos, apesar de ocorrer a segmentação,
a criança parece ter a consciência de que se trata de uma única palavra; a inserção do
hífen na forma <porque> ilustra esse conhecimento já desenvolvido. Neste quadro
de escrita inicial, os espaços em branco podem ser vistos como momentos de dúvida,
espaços de reflexão sobre vários aspectos que se cruzam na aprendizagem da escrita,
nomeadamente aqueles relativos à informação de natureza prosódica, assim como
aqueles ligados ao conhecimento sobre as letras e a representação ortográfica.
Há alguns entraves impostos pela ortografia às crianças, pois, de fato, nem todos
os erros identificados na representação da consoante pósvocálica estão associados
150 Ana Ruth Moresco Miranda, Teresa Costa
à fonologia. No que diz respeito à fricativa e à nasal, os dois segmentos que apre-
sentam ou maior opacidade na relação fonemagrafema ou grafia regulada pelo con-
texto (cf. seção 2, Tabela 6.3), uma importante fatia dos erros encontrados (29% nos
dados do PE e 36% no PB, no conjunto das duas classes consonânticas) corresponde
a trocas ortográficas, predominantemente pelo uso de <s> em vez de <x>, no caso da
sibilante e pelo uso de <m> no lugar do grafema <n>, no registro da nasalidade. É,
uma vez mais, notória a similaridade de comportamento entre as crianças das duas
amostras, não só na proximidade dos valores percentuais obtidos (cf. seção 4.3),
mas na convergência dos padrões de troca predominantes. Estas trocas parecem
resultar de um domínio ainda instável do conhecimento lexical, assim como das
regras contextuais que regulam, no caso da nasal, o uso dos grafemas <m, n> em
final de sílaba medial. Neste último caso, é interessante o fato de as crianças optarem
sobretudo pela utilização do grafema correspondente à nasal bilabial, precisamente
aquela que tem um contexto de emergência mais restritivo. Este padrão vem, assim,
corroborar um fenômeno já atestado na aquisição da língua: a complexidade ou mar-
cação de uma estrutura pode promover a sua utilização pelos falantes. Um padrão
semelhante foi identificado, por exemplo, no favorecimento da aquisição da coda
final, em detrimento da medial, conforme abordado na seção 2.2.
Outro padrão interessante identificado nos dados é o de que as substituições
ocorrem, na sua maioria, dentro da mesma classe natural. Relembre-se que os erros
por substituição ocorrem com maior relevo, nas duas amostras, na grafia da lateral.
Esta é, na maioria destes casos, trocada por um grafema vocálico, registrando-se,
no PE, trocas da lateral pela nasal. Em ambos os casos, a substituição dá-se entre
segmentos soantes. O mesmo se verifica nos erros de substituição da nasal por
vogais, reportados na seção 4.3.1.
Este estudo comparativo pôs em relevo o papel do input no percurso de aquisição
da escrita nos dois sistemas linguísticos. A importância das configurações fonéti-
cas disponibilizadas para os jovens falantes mostrou-se relevante, por exemplo,
na interpretação dos erros categorizados como fusão em estruturas <sc>, no PE.
Viuse, na seção 2.1, que as sequências de duas sibilantes como em <piscina> são
descritas no PE como heterossilábicas, ocupando a primeira fricativa a posição
de coda e a segunda a de ataque da sílaba adjacente à direita. Viu-se que o input
fonético do PE admite a produção pi[ʃs]ina e a produção pi[ʃ]ina, com redução das
duas fricativas para uma só (Costa; Rodrigues; Freitas, 2021). Os dados das crian-
ças Portuguesas neste estudo mostram que esse input tem impacto na escrita (cf.
4.3.2), pois em 52% das 85 possibilidades de ocorrência para este tipo de estrutura,
as crianças substituíram as duas consoantes por uma, prevalecendo os grafemas
que correspondem à coronal não anterior, em formas como <pixina> para piscina
ou <crechido> para crescido. Um processo similar de fusão de consoantes que par-
tilham propriedades articulatórias foi observado, nas duas amostras, para a nasal
pósvocálica, em contextos como <mb> e <nd>, reduzidos a um único grafema,
como em <tamen> e <rino> para também e rindo (cf. seção 4.3.1). Tal como nos
casos de fusão anteriores, estes erros de escrita encontram relação com o input, em
ambas as variedades, particularmente na produção de <também> e dos gerúndios,
no caso do PB.
152 Ana Ruth Moresco Miranda, Teresa Costa
5 Considerações finais
Este estudo sobre a escrita de crianças Brasileiras e Portuguesas explorou simetrias
e assimetrias entre o conhecimento fonológico demonstrado pelos jovens escre-
ventes e aspectos da fonologia das duas variedades, quer na aquisição da fala quer
nas propostas teóricas existentes para representação da Rima ramificada.
Visando contribuir para a discussão acerca da forma como os dois grupos de
crianças constroem a representação deste constituinte silábico, fez-se a análise das
taxas de acerto e de erro para cada uma das consoantes em estudo, assim como a
exploração das categorias de erro. Globalmente, esses dados evidenciaram uma
grande similaridade de padrões entre as crianças das duas variedades, que con-
fluem, por exemplo, (i) na construção gradual da representação bifonêmica da
nasalidade (uma confluência que contrasta com a existência de abordagens teóricas
distintas para a nasalidade da Rima, em cada variedade); (ii) no favorecimento da
omissão como principal estratégia de produção; (iii) na tendência para a substitui-
ção dentro da mesma classe natural; e, ainda, (iv) na interação, na base de muitos
dos erros cometidos, de motivações de ordem fonológica e ortográfica. Quanto às
diferenças encontradas entre as amostras, destaca-se a assimetria entre aquisição
da fala e da escrita, no que diz respeito à lateral, aspecto que se discute no presente
estudo com base no input de cada variedade.
Os resultados deste estudo corroboram a relevância de uma observação integrada
do funcionamento das consoantes pós-vocálicas no sistema de ambas as variedades
com os padrões observados nos dados de escrita inicial de crianças Brasileiras e
Portuguesas, o que contribui para uma maior compreensão do processo de desen-
volvimento da linguagem, especialmente do conhecimento fonológico.
Notas
1 Financiamento: CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(Processos 312387/2020–2 e 423038/2021–4).
2 Financiamento FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., através do Centro de
Linguística da Universidade de Lisboa (UIBD/00214/2020).
3 De acordo com Viaro; Guimarães-Filho (2007), em um estudo de frequência de estruturas
silábicas em Português, o percentual de rimas VCC é de 0.24%, por oposição a 75% e
21% das rimas V e VC, respectivamente.
A grafia de consoantes em final de sílaba no PB e no PE 153
4 Sugestão de leitura: Eu não vou adotar nenhum porque eu tenho / quatro gatos e uma
cadela e também a gente não tem con- / dição de ter mais bichos porque não tem / espaço
e a gente tem bicho demais e a gente não / tem dinheiro pra cuidar de mais um.
5 Freitas (1997) estende esta proposta também à rótica, diferentemente do que postula Mi-
randa (1996).
6 No PB, a presença de ponto de articulação da consoante seguinte é um dado variável entre
os dialetos do sistema, conforme Cagliari (1977); em PE há a presença apenas de vogal
nasalizada.
7 Sugestão de Leitura: O cachorro é grande / mais grande do que a minha cama / e mais
grande do que meu roupeiro.
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Veloso, João. 2008. Coda-avoiding: Some evidence from Portuguese. Romanitas, lenguas y
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Parte II
Variação Fonológica
7 Revisitando as consoantes em
coda no Português Brasileiro
Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão,
Danielle Kely Gomes
Resumo
Para traçar um panorama geral do Português Brasileiro (doravante PB) no âmbito
fonético-fonológico, focalizam-se /R/, /S/ e /L/ em coda silábica, que se prestam, por
seu polimorfismo, à caracterização de fenômenos variáveis, já registrados no Latim, na
evolução do Latim ao Português e a outras línguas românicas. Com base em estudos
nas linhas geo e sociolinguística variacionista, discutem-se, qualitativa e quantitativa-
mente, os diferentes aspectos do processo de posteriorização que atinge cada um desses
segmentos, apresentando não só a distribuição diatópica das variantes, mas também for-
necendo evidências dos fatores estruturais e sociais que as condicionam. Demonstra-se
que, embora a direcionalidade do processo seja bastante similar, trata-se de diferentes
tipos de mudança. Nos termos de Labov, a mudança do rótico poderia ser considerada
“from below”; a do /S/ “from above”, interpretação apoiada em fracas evidências; e, a
do /L/, basicamente implementada no PB, não se enquadraria em nenhuma das duas
categorias, parecendo consistir numa mudança interna, provavelmente determinada pela
ação de princípios universais. Todas essas mudanças se inserem no espaço multidimen-
sional, por sua vez histórico, social e linguístico. Conclui-se destacando que, apesar dos
diversos estudos sobre esses segmentos, ainda há muitos outros caminhos a percorrer no
sentido de uma melhor compreensão da dinâmica das variações registradas.
1 Introdução
Para traçar um panorama geral do PB no âmbito fonético-fonológico, são focaliza-
das, neste capítulo, as consoantes /R/, /S/ e /L/, que, além da nasal, podem ocupar
a coda silábica interna (curta, custa, culta) e externa (mas, mar, mal) e se prestam,
exemplarmente, por seu polimorfismo, à caracterização de fenômenos variáveis.
A perspectiva teórica tem suas bases na Teoria da Variação e Mudança de Weinre-
ich; Labov; Herzog (1968), na Sociolinguística laboviana (Labov, 1972, 1994, 2001)
e na Dialetologia Pluridimensional (Radtke; Thun, 1996; Thun, 2005; Cardoso,
2010), tendo sido utilizados programas computacionais para a análise multivari-
ada (GOLDVARB X – Sankoff et al., 2005). Esses programas pressupõem análises
DOI: 10.4324/9781003294344-10
160 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
2 /R/ em coda
Falar sobre róticos é falar sobre um tema sobre o qual se debruçam vários pesquisa-
dores, de forma sistemática, no Brasil, há mais de cinquenta anos. É relativamente
fácil enumerar os trabalhos que surgiram, de 1970 até hoje, difícil é resumir e
sistematizar todas as informações. Pretende-se aqui fornecer uma visão geral e
focalizar dois processos que envolvem os róticos, posteriorização e apagamento.
Em termos mais amplos, os róticos são conhecidos por sua considerável variabi-
lidade entre as línguas do mundo e, no que se refere à língua Portuguesa, têm sido
objeto de discussão desde o final do século XIX, no começo, de forma intuitiva e,
já na segunda metade do século XX, com base em dados reais de fala, com metodo-
logia rigorosa. O estudo dos róticos envolve a observação de processos de variação
e mudança e, no PB, as possibilidades de realização vão de uma vibrante alveolar a
uma fricativa glotal surda até o seu apagamento, em posição de coda silábica. Esse
caminho, formalizado como um processo de debucalização – que cancela os traços da
cavidade oral (Abaurre; Sândalo, 2003) – não apresenta distribuição semelhante em
todo o país e parece estar relacionado a uma tendência geral em direção a uma pos-
teriorização do segmento (Granda Gutiérrez, 1966; Martinet, 1969, entre outros). É
necessário distinguir, de antemão, entre processos históricos e processos que operam
ainda hoje nas línguas, que devem ser vistos no quadro mais amplo de tendências
universais: “replacement of lingual by uvular R in many European languages must
have taken place by discrete steps” (Weinreich; Labov; Herzog, 1968, 131).
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 161
A oposição hoje existente entre os dois segmentos não está centrada na quanti-
dade, como em latim, mas, sim, na qualidade da consoante, um segmento fraco
(uma vibrante apical) em contraste a um segmento forte (uma fricativa poste-
rior), como em Português, espanhol e, durante um tempo, em francês. Esta ‘nova’
oposição parece ter aberto caminho para múltiplas realizações.
No Português Brasileiro, o R forte é o fonema com a maior diversidade de
realizações, seja em ataque, seja em coda. A variação de ponto de articulação, de
ápicoalveolar a uvular/velar, foi observada no final do século XIX, e a articulação
posteriorizada do segmento atinge o ataque silábico (carro, rato), mas atua princi-
palmente em coda (lar, viajar, cerveja), interna e externa, em que sofre, hoje, em
geral, apagamento: gosta(R).
No PB, o processo evidencia posteriorização e também, como em muitas outras
línguas, mudanças de abertura (resistência decrescente à passagem da corrente de
ar) e sonoridade, aumento da energia acústica periódica (Lass, 1984). Em geral,
essa mudança é interpretada como lenição ou enfraquecimento, mas Hammarström
(1953, 175–176) argumenta que posteriorização não corresponde em si a um pro-
cesso de enfraquecimento e, sim, à consequência da tensão necessária à articulação
de vibrações de um R múltiplo.
Parece ser a mesma mudança de ponto de articulação registrada na área da Foné-
tica, em outras línguas, a julgar pelas ponderações de Granda Gutiérrez (1966b,
185–186) sobre variação similar no espanhol de Porto Rico, registrada também na
Venezuela, Colômbia, Trinidad, etc. e até em áreas não-românicas. Hammarström
(1953, 175), Granda Gutiérrez (1966a) e Moraes Barbosa (1962) levantam hipóte-
ses de explicação das mudanças, a saber, resultar (i) de um processo de enfraqueci-
mento – com um aumento de sonoridade – ou, no sentido contrário, (ii) de um
fortalecimento, ou poder estar no Princípio de dispersão da sonoridade (Kenstow-
icz, 1994, 283). Uma forma de resolver a questão residiria em incluir o traço tenso,
como sugerido por Hammarström (1953) e depois por Mascaró (2003), que reúne
vibrantes e fricativas como variantes [+tens], em oposição à aproximante tepe,
variante [tens]. A dificuldade de explicação, contudo, para a mudança de vibrante
→ fricativa permanece, já que ambas possuiriam o mesmo grau de sonoridade, na
nova proposta. Quando o processo de lenição é visto sob a ótica de um ranking de
complexidade, na aquisição (Jakobson, 1968), é possível observar, que o PB vai na
direção oposta de complexidade ontogênica.
variantes competirem durante todo o século XX, como ainda hoje, mas a realização
ápico-alveolar, forma padrão do rádio, teatro, até mesmo, durante algum tempo, da
televisão, ser considerada durante muito tempo a variante de prestígio; e (iv) o de o
falante não se dar conta da variante que ele próprio ou seu interlocutor produz, com
exceção da pronúncia retroflexa do chamado R caipira, que sofre estimatização.
Nas últimas décadas do século XX, surgiram vários trabalhos, sob a perspec-
tiva variacionista laboviana, com base em dados do Projeto NURC (e de outros,
como PEUL, VARSUL, para citar apenas os primeiros), envolvendo a análise de
um número considerável de dados (Callou, 1987; Callou; Leite; Moraes, 1996,
2002; Brandão; Mota; Cunha, 2003; Abaurre; Sandalo, 2003; Hora; Monaretto,
2003; Monaretto, 1997, 2010; Callou; Serra, 2012, dentre muitos outros). E, mais
recentemente, com as pesquisas dialectológicas para o Atlas Linguístico do Brasil.
O corpus básico da análise, a ser apresentada, é composto por registros mag-
netofônicos do Projeto NURC e do Projeto ALIB: entrevistas informais com falan-
tes de curso universitário completo, em cinco cidades do Brasil, no caso do NURC
– Porto Alegre (POA), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Salvador (SSA) e
Recife (RE) – e entrevistas com falantes com escolaridade maior ou menor que
nove anos, em todo o país (capitais e várias cidades do interior), no caso do ALIB.
Esses corpora permitem uma análise, em tempo real de curta duração, da década
de 70 a 90 do século XX até a primeira década do século XXI.
A análise enfoca, basicamente, dois processos, no que se refere à variabilidade
dos róticos, entre as línguas do mundo: (i) o de posteriorização – que pode estar
relacionado à mudança de realização de vibrante para fricativa e (ii) o de apaga-
mento do R, fenômeno antigo no Português, já referido nas peças de Gil Vicente
(séc. XVI) e, atualmente, quase categórico, em alguns dialetos.
As pesquisas com os dados dos anos de 1970 do NURC mostram uma linha
divisória nítida, no que se refere à pronúncia dos róticos, entre São Paulo e Porto
Alegre, em oposição ao Rio de Janeiro, a Salvador e Recife, as duas primeiras
optando pelas variantes apicais e, as três últimas, pelas variantes posteriorizadas,
preferencialmente, fricativas.
Em relação à posteriorização (em ataque ou em coda), a regra é categórica na
maior parte do país e, em relação ao processo variável de apagamento (em coda
silábica), parte-se de três hipóteses principais:
(a) o processo ser gradiente e ter relação com modo/ponto de articulação do seg-
mento, o que explicaria sua maior implementação nas cidades do Nordeste,
região em que o segmento é [vibrante] e [+posterior], em geral, uma fricativa
glotal (aspiração);
(b) os falantes da região Nordeste do país já não inibirem o processo de cancela-
mento em fronteira interna à própria palavra. Os falares da região Nordeste do
Brasil apresentam um estágio avançado no processo de cancelamento do rótico
(Farias; Oliveira, 2013). O processo, em alguns pontos, é quase categórico e
164 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
estaria de tal forma avançada que atingiria a coda silábica interna, em contra-
posição às regiões Sudeste e Sul;
(c) o fenômeno ter tido início na fala de indivíduos de baixa escolaridade (mudança
de baixo para cima, em termos labovianos).
38%
1%
100%
2%
90% 87%
83%
56%
80%
3%
70%
50%
40% 38%
40%
30%
20%
10% 7%
3% 4% 2% 3% 4% 3% 2% 3%
1% 1% 2% 1% 2% 1%
0%
POA SP RJ SSA RE
fric.vel. tepe alv. vibr.alv. vibr.uvular aspiração zero
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 165
70%
62%
60% 57%
49% 50%
50% 47%
41%
40% 37%
30%
22%
18% 17% 18%
20% 15% 14%
12%
10% 10%
10% 7%
4%
1% 2% 1% 1%
0%
POA SP RJ SSA RE
fric.vel. tepe alv. vibr.alv. vibr.uvular aspiração zero
Figuras 7.1 e 7.2 Percentual geral de distribuição das variantes por cidade, na década de 70,
em coda silábica, interna e externa.
Fonte: Callou; Leite; Moraes (1996)
Figura 7.3 Apagamento do R, em posição de coda final, na fala padrão do Rio de Janeiro,
(25–35), nas duas décadas, levando em conta classe morfológica.
Fonte: Serra e Callou (2013)
Figura 7.4 Apagamento do R em posição de coda final, na fala culta do RJ, de SSA e de POA,
na década de 70, na primeira faixa etária, de acordo com classe morfológica
Fonte: Serra; Callou (2013)
Figura 7.5 Distribuição das variantes do R em coda silábica interna em verbos e não-
verbos, em amostra do ALIB – Mapa F04 C6.
Fonte: Cardoso et al. (2014)
Figura 7.6 Distribuição do processo de apagamento em coda final em verbos – Mapa F04 C2.
Fonte: Cardoso et al. (2014)
168 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
3 /S/ em coda
No Português do Brasil, em ataque silábico, há quatro fonemas fricativos coronais
– /s z ʃ ʒ/ – cujos traços que os distinguem – [anterior] e [sonoro] – deixam de atuar
em contexto pós-vocálico, gerando um segmento não especificado quanto a esses
traços e aqui convencionalmente representado como /S/. A atribuição do traço
[± anterior] depende de fatores de ordem estrutural e extralinguística, enquanto o
traço [± sonoro] é assimilado do segmento consonantal a ele subsequente em coda
tanto interna quanto externa, como em
e realizase como [s]/[ʃ], como acima, o default, quando seguido de pausa. Diante
de vogal, costuma concretizarse como [z], com ressilabificação, registrandose,
ainda, com baixos índices e/ou em determinados itens lexicais, sua realização
como aspirada [h/ú], bem como seu apagamento:
Figura 7.8 Carta de caráter diatópico sobre o /S/ em coda silábica em 25 capitais Brasileiras
Fonte: Cardoso et al. (2014)
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 171
Esse quadro, restrito à fala das capitais e que indiretamente retrata um processo
ora de variação estável, ora de mudança em curso ou já praticamente efetivada,
não dá conta integralmente da complexidade da variação de /S/, que depende da
atuação de fatores estruturais e extralinguísticos não necessariamente coincidentes
em todas as localidades.
Tabela 7.1 Realização do /S/ na cidade do Rio de Janeiro, em tempo real, por contexto
RJ Década 70 Década 90
cada uma das 13 localidades, por três faixas etárias. A análise variacionista realizada
pela autora, que visava a observar os fatores que condicionariam a implementação
das variantes palatalizadas no Norte e Noroeste do Estado, em que predominavam as
variantes alveolares, constatou que o processo de palatalização era condicionado por
fatores de natureza tanto linguística quanto estrutural. Assim, em coda:
(a) interna, a palatalização incidiu em 30% dos dados (input .24) sendo condicio-
nado pelos contextos antecedente e subsequente, área geográfica e faixa etária;
(b) externa, a palatalização incidiu em 18% dos dados (input .21) tendo como
restrições fatores relativos ao contexto subsequente, à área geográfica, ao nível
de instrução e à tonicidade da sílaba.
Dentre essas variáveis, cabe comentar, em especial, duas delas que, direta ou indi-
retamente, sempre se têm mostrado salientes nas análises sobre a palatalização de
/S/: contexto subsequente e área geográfica.
Quanto ao modo/ponto de articulação dos segmentos consonantais que ocor-
reram após o /S/ nos 2.830 dados computados, 1.215 referem-se à coda interna e
1.615, à externa. Em coda interna, diante de [tʃ dʒ], o peso relativo atinge .91 e, em
coda externa, .93. Já antes de [t d], observamse, respectivamente, P. R. 85 e P. R.
.65, Tal tendência repete-se em outros corpora considerados neste capítulo.
Quanto à área geográfica, Rodrigues distribuiu as 13 localidades por quatro sub-
áreas, por ela caracterizadas como litorâneas e interioranas, em ambos os casos de perfil
[+ rural] e [rural]. Nas comunidades com perfil [ rural], tanto litorâneas quanto interio-
ranas, há uma maior propensão à propagação das variantes palatalizadas, ao contrário do
que ocorre nas de perfil [+rural], em que [s z], as variantes conservadoras, predominam.
Para uma melhor caracterização da variação de /S/, apresentam-se, nas duas sub-
seções seguintes, resultados de outros estudos com base em diferentes corpora
representativos da fala de áreas do Nordeste, Norte e Sul do país.
Retomando, com base na Tabela 7.2, a seguir, resultados do Projeto NURC,
agora com foco principal nas quatro outras cidades em que se desenvolveram pes-
quisas sociolinguísticas sobre o /S/ em coda, verificase o pleno predomínio das
Tabela 7.2 Realizações do S em posição medial (M) e Final (F) de sílaba na fala culta de
quatro capitais Brasileiras
M F M F M F M F
Sâo Paulo 9 5 0 0 88 91 3 3
Porto Alegre 23 2 0 0 77 96 0 1
Recife 84 54 5 7 10 34 2 5
Salvador 56 31 4 9 39 51 1 0
Fonte: Callou; Leite; Moraes (2002, 539), sem os dados referentes ao Rio de Janeiro
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 175
0.9
0.8
0.7
Pesos rela vos
0.6
0.5
0.4
0.3
0.2
0.1
0
1 2 3
faixa etária
M F
1
0.8
Pesos relavos
0.6
0.4
0.2
0
1 2 3
faixa etária
M F
(Continuado)
Figura 7.10 Atuação das variáveis gênero (M, masculino; F, feminino) e faixa etária (1: 25–35
anos; 2: 36–55 anos; 3:56 em diante) para a palatalização de /S/ na fala culta de
quatro capitais Brasileiras
Fonte: Callou; Leite; Moraes (2002, 550–552), com alterações.
176 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
1.2
1
Pesos rela˜vos
0.8
0.6
0.4
0.2
0
1 2 3
faixa etária
M F
1
0.8
Pesos relavos
0.6
0.4
0.2
0
1 2 3
faixa etária
M F
(de 1970 a 1990), uma alteração no que tange ao uso da variante palatalizada. Dados
mais recentes indicariam que a mudança em progresso delineada na Figura 7.10,
estaria sofrendo uma retração, uma vez que a variante alveolar vinha sendo restau-
rada entre os indivíduos mais jovens, aqueles que, antes, largamente lideravam o
processo, quadro que poderia ser explicado
(I) pelo status de cada uma das variantes, consideradas ou não de prestígio, a
depender da área geográfica; (II) pelo fato de existir no estado da Bahia áreas
em que o predomínio é da variante alveolar; e (III) por ter Salvador sofrido
modificações de natureza demográfica, socioeconômica e cultural que pode-
riam repercutir sobre o comportamento linguístico dos falantes. Os movi-
mentos migratórios responsáveis pelo crescimento populacional de Salvador,
migração do interior para a capital – invertendo a diferença entre a população
urbana e rural, o que já vinha ocorrendo no Sudeste desde a década de 1940 –
teriam deixado marcas linguísticas na norma de Salvador, capital que
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 177
Ainda no âmbito da região Nordeste, com base em outros corpora, cabe referir
resultados de estudos sobre o /S/ em coda com base no corpus do Projeto Vari-
ação Linguística no Estado da Paraíba (VAL-PB), na fala da comunidade de João
Pessoa, a capital do estado. Tais resultados são apresentados em Hora (2003),
quanto ao contexto medial, Ribeiro (2006), relativo ao contexto final, e em
Hora; Pedrosa (2009) que comentam os dois contextos, com base nos referidos
trabalhos.
Em João Pessoa, em contexto medial, num total de 9517 dados, sobressaem as
variantes [s z], com 65% de frequência, seguidas por [ʃ ʒ], com 28%, enquanto
o cancelamento e a variante [h] não só apresentam baixos índices percentuais,
respectivamente, 1% e 6%, mas também incidem em poucos itens lexicais, o que
levou a sua eliminação da análise variacionista que buscou determinar os fatores
que concorrem para a palatalização, com base no controle de cinco variáveis estru-
turais e três sociais.
Segundo Hora; Pedrosa (2009, 125) os fatores mais salientes entre as variáveis
que concorrem para a implementação de [ʃ ʒ] são:
Como indicam os autores, a pouca distância entre os pesos relativos dos fatores
mais salientes das duas últimas variáveis e o ponto considerado neutro (.50)
demonstram que o fator determinante do cancelamento é, na realidade, a presença
de uma coronal. Hora (2003, 82) afirma que “na comunidade de João Pessoa, a
utilização das palatais [ʃ] e [ʒ] refletem uma distribuição complementar, visto que
estão condicionadas ao aparecimento de [t] e [d]”. Tal condicionamento é comum
a outras comunidades em que a palatalização ainda é um processo incipiente, como
se viu em grande parte do Estado do Rio de Janeiro (cf. Figura 7.9, acima). Quanto
à coda final, a análise se ateve apenas ao /S/ não morfêmico em que [s z] são as
variantes mais produtivas (também com 65%), seguidas pelo cancelamento (24%),
por [h] (6%) e [ʃ ʒ] (5%). Para buscar depreender os fatores que concorriam para o
apagamento, Ribeiro (2006) considerou em conjunto os dados de manutenção de
/S/. Os fatores que se mostraram salientes para o apagamento são resumidamente
expostos a seguir, com base em Hora; Pedrosa (2009, 126):
(a) entre os itens lexicais, a conjunção mas (P. R. .71) e os verbos (P. R. 66);
(b) no contexto antecedente, a vogal alta /u/ (P. R. .72);
(c) no contexto seguinte, o [h] (P. R. 83), as coronais (P. R. .59) e as labiais (P. R.
.54);
(d) quanto ao número de sílabas, os dissílabos (P. R. 68).
178 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
As variáveis sociais desse estudo foram descritas em Brescancini (2015), que, além
de gênero, faixa etária e nível de escolaridade, controlou localidade, com base no
histórico de ocupação da cidade, considerando três distritos do município de Flori-
anópolis, no intuito “de possibilitar a verificação da influência que o grau de isola-
mento vivenciado por cada comunidade no passado exerceu no comportamento
linguístico de seus habitantes” (p. 80).
Embora com peso relativo pouco expressivo, em Barra da Lagoa, “que man-
teve certo grau de isolamento por mais tempo” (p. 80), confirmouse a hipó-
tese de que desfrutaria de “maiores condições para a manutenção da variante
fricativa palato-alveolar em posição de coda, herança Portuguesa trazida pelos
imigrantes açorianos”. Por outro lado, Florianópolis, o distrito sede, “parece
ter estimulado a maior penetração da variante alveolar” devido à “maior inter-
ação sócio-cultural-espacial com pessoas provenientes de outras localidades”
(p. 80), no que é secundado pelo Ribeirão da Ilha, que parece “acompanhar o
comportamento do distrito sede, pelo contato diário de grande parte de seus
moradores com as regiões mais urbanas da Ilha, onde exercem suas atividades
profissionais” (p. 83).
Para dar a dimensão da variação de /S/ na fala do Norte do país, Razky (2020),
partindo do banco de dados do Projeto ALiRO (Atlas Linguístico de Rondônia),5
ainda em andamento, faz um estudo comparativo com outros quatro atlas linguísticos
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 179
sendo raros casos como, por exemplo, os de Rondônia, com 99,9% de alveolares
(Razky, 2020), e de Niterói, com 100% de palato-alveolares (Aguiar, 2010).
Mesmo levando-se em conta que as análises aqui mencionadas se apoiaram
em corpora de perfis distintos (oriundas de aplicação de questionário de atlas lin-
guísticos, de entrevista sociolinguística) e não controlaram exatamente as mesmas
variáveis (e, quando o fizeram, não exatamente segundo os mesmos parâmetros),
podem-se depreender algumas tendências gerais no que se refere a restrições de
cunho estrutural para a palatalização de /S/, a seguir comentadas.
(a) /S/ em coda interna parece mais propenso à palatalização, permitindo formular
a hipótese de que o processo tenha início nessa posição, como se observa na
Figura 7.8 e indicam resultados dos estudos aqui mencionados.
(b) O contexto subsequente, embora atue diferentemente a depender do dialeto,
tem papel importante na sua ativação: (i) [t] e [d] em João Pessoa (Hora,
2003), em que se propõe ser este um caso de dissimilação; (ii) [tʃ] e [dʒ],
em CordeiroRJ (Gryner; Macedo, 2000, 44–45), que afirmam que a palatali-
zação “resulta de uma assimilação ao contexto seguinte . . . inicia-se diante de
coronal alta, expande-se gradativamente para diante de outras coronais e, por
último, diante de não coronais”, o que parece ser o caso também das comuni-
dades do Norte e Noroeste do Rio de Janeiro Tirar (cf. Figura 7.12) em que [t
ʃ], [dʒ], [t] e [d], constituem os principais ativadores do processo.
(c) No estudo realizado por Brescancini (2003a), [tʃ] e [dʒ] em contexto subse-
quente também se mostraram favorecedores do processo, embora a autora, em
outro trabalho (2003b), relativize esse resultado em função de tais segmentos
incidirem em apenas 3% da amostra e serem considerados por Pagotto (2001)
como inovadores no dialeto florianopolitano. Ela chama a atenção, no entanto,
para os índices referentes ao fator consoante dorsal em contexto subsequente
e, em especial, aos fatores vogal /a/ (também dorsal) e vogal e glide labial,
em contexto precedente, afirmando que “a variante palatoalveolar tende a ser
mais favorecida por contextos que promovam a retração do corpo da língua e
o levantamento desse articulador” (Brescancini, 2003b, 307).
4 /L/ em coda
A distribuição da consoante lateral, nos contextos pré e pós-vocálico pode ser for-
malizada de acordo com a seguinte regra:
Contudo, na mesma obra, há uma sorte de paradoxo sobre a questão das realizações
do /l/ em coda. Ao tratar da estrutura da sílaba em Português, Camara Jr. men-
ciona a possibilidade de realização vocalizada da lateral em pós-vocálica, em uma
reflexão sobre os contextos de travamento silábico. Nos termos do autor,
100 86 90 89
80 72
60 54
40 33
20 13 11 14
8 8 7 5 6
0 2 1 0 2 0
0
POA SP RJ SSA RE
vocalização alveolar velar zero
120
98 92 97
100 91
80
60 54
40
20 26
20 7 4 4 1
0 0 2 0 0 0 0 2 1
0
POA SP RJ SSA RE
vocalização alveolar velar zero
(a) a articulação da vogal precedente: quando o núcleo silábico é ocupado por [a],
a vocalização da lateral em coda é favorecida (a[w]to). A vogal posterior alta,
[u], é o contexto precedente em que a aplicação da regra é menos favorecida
(su[w]);
(b) a articulação da consoante subsequente: concorre, para a vocalização a pre-
sença de [t] no ataque da sílaba seguinte à lateral posvocálica (a[w]to); no
âmbito da realização da variante velarizada, a presença de uma consoante
velar no onset da sílaba seguinte à lateral (fo[→]gado), por força de um pro-
cesso de assimilação de traços;
(c) faixa etária e gênero do informante: homens e mulheres apresentam tendências
distintas na dinâmica da variação, em termos de frequência de uso e de dis-
tribuição etária.
120%
100% 100%
80% 76%
68%
60%
49%
40%
20%
9%
0%
1 2 3
homem mulher
100%
80% 81%
71% 72%
60% 56%
40% 42%
20%
9%
0%
1 2 3
homem mulher
Figura 7.12 Vocalização em SSA e POA, cruzamento entre as variáveis gênero e faixa
etária
Fonte: Callou; Moraes; Leite (2013, 174)
No que se refere aos estudos que relatam uma alternância mais consistente entre a
vocalização e a velarização, Quednau (1993) observa – em dados de quatro pontos
de inquéritos do VARSUL no Rio Grande do Sul (Porto Alegre, Taquara, Monte
Bérico e Santana do Livramento) – que a variante vocalizada é francamente favore-
cida nos dados da capital do estado, enquanto as localidades do interior se consti-
tuem como locus para a variante velarizada. Os pontos de inquérito do interior são
186 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
A síntese dos estudos de base variacionista apresentada na seção anterior revela que,
apesar do polimorfismo que caracteriza a realização da lateral pósvocálica – com
188 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
variantes que vão da lateral alveolar até o apagamento do segmento, passando por
realizações velarizada, vocalizada e róticos – é fato ser a vocalização um processo
mais geral, que leva a caracterizar como norma das variedades do PB a realização da
lateral em posição de coda como [w]. Conforme atestam Callou; Leite; Moraes (2002,
Callou; Moraes; Leite, 2013), provavelmente o processo de vocalização é implemen-
tado primeiramente na coda externa, e depois se espraia em direção à coda interna.
No âmbito de descrições dialectológicas, Amaral (2020 [1920]) e Marroquim
(1934) atestam – respectivamente para o dialeto caipira e para “língua do nordeste” –
que a realização da lateral como rótico e o apagamento são comuns nos dialetos
investigados. Amaral (2020 [1920], 40) afirma que
5 Outros caminhos
Duas propostas inovadoras, desenvolvidas nos últimos dez anos dizem respeito à
pesquisa dos róticos com a língua cantada (Xavier, 2016) e à correlação entre o apa-
gamento e a configuração fonológica da sílaba em que se encontra o rótico (Farias,
0.5%
11%
0.50% 18%
70%
vibrante múl˜pla anterior tepe frica˜va velar zero foné˜co frica˜va glotal
Figura 7.13 Distribuição total do R em coda silábica final, na fala cantada (1710 oco), de
1902 a 1940.
Fonte: Xavier (2016)
80% 73%
67%
70%
60%
50%
40%
30% 26% 24%
20%
9%
10% 1%
0%
erudito popular
tepe vibrante múl˜pla anterior zero foné˜co
Figura 7.14 Distribuição total do R em coda silábica final, por gênero musical erudito e
popular
Fonte: Xavier (2016)
190 Dinah Callou, Sílvia Figueiredo Brandão, Danielle Kely Gomes
2018) e merecem ser registradas. O trabalho de Xavier tem por objetivo mostrar que
a fala cantada revela a mesma tendência de variação e mudança. Com base em uma
amostra constituída de gravações musicais, no período de 1902 a 1940, a autora
analisa a pronúncia do R na fala cantada, de uma forma sistemática, com base em
um número considerável de dados e com o aporte teórico, instrumental e estatístico
de que já dispomos. O acervo sonoro utilizado faz parte de um período de tempo em
que a atividade musical inicia seu processo de expansão e popularização e o registro
de voz praticamente se restringir a gravações de disco cilíndrico.
Como já registram os Anais do Primeiro Congresso de Língua Nacional Can-
tada (1937), a vibrante ápico-alveolar seria a variante que deveria ser difundida
pelos intérpretes da música popular Brasileira. Entre as conclusões a que chega
Xavier está (i) a de que predomina, em coda final, a pronúncia como tepe, seguida
da vibrante múltipla anterior, com raras ocorrências de fricativa velar e de apa-
gamento (Figura 16) e também (ii) a de que existe uma diferenciação por gênero
musical (Figura 17).
A segunda proposta tem por objetivo dar um passo adiante na compreensão do
processo de apagamento do rótico, em coda silábica, através de uma nova perspec-
tiva de análise do fenômeno, no nível fonético e fonológico. Parte-se da hipótese
de que, quando o segmento é apagado, na fala espontânea ou lida, deixa vestígios,
possivelmente, pelo alongamento da vogal que precede o rótico. Farias (2018)
analisa 171 dados de fala espontânea, extraídos do corpus do Atlas linguístico do
Brasil (ALiB), de falantes de dois níveis de escolarização regular, oriundos de duas
cidades da região Nordeste e também 576 dados de um corpus controlado de leitura
de sentenças SVO. No momento, busca comparar os resultados da fala espon-
tânea com o de frases lidas, trabalhando com a hipótese de que esses dois tipos de
elocução apresentem resultados diferentes devido ao fato de na produção de cada
estilo estarem envolvidos processos específicos: na fala espontânea, parte do plane-
jamento é realizado ao mesmo tempo em que ocorre a produção da fala enquanto,
na leitura, o planejamento e a produção da fala não ocorrem simultaneamente.
Além de observar o fenômeno de apagamento do rótico em uma fala controlada,
buscase verificar a manutenção da unidade de tempo, por meio da medida acústica
de duração vocálica, que ainda não foi objeto de estudo sistemático, na leitura. Desse
modo, o comportamento duracional da vogal antecedente ao rótico é observado,
tanto quando há/não há a queda do segmento, em posição de coda silábica. Estudos
acústicos sobre a aquisição do constituinte coda revelam que o “alongamento com-
pensatório” é uma estratégia de reparo temporal, em que o falante alonga a vogal
que precede o segmento, com o objetivo de manter a unidade temporal da sílaba
(Mezzomo, 2003). Além disso, com um viés comparativo, é necessário observar a
duração da vogal em palavras sem coda, como em “cajá”, a fim de verificar se a
vogal apresenta duração semelhante à da vogal em contextos de queda do rótico
(“celulaØ”) ou à duração da vogal com o /R/ realizado (“celula/R/”). A tendência
geral indicou que parece haver uma gradação, em que as vogais em palavras sem
coda realizada apresentam maior duração, ou seja, um alongamento compensatório
como marca de vestígio do rótico, em coda silábica. Análise preliminar indicou que
a duração da vogal sem rótico pronunciado é 28% maior do que os casos em que o
rótico é realizado pelo falante: a média da duração da vogal com R realizado é de
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 191
0,131 s (bastante semelhante aos casos de palavras sem coda, como vatapá – 0,137
segundos) e a da vogal sem R realizado é de 0,168s.
Muito poderia ainda ser dito sobre os róticos, a partir desses e de outros cor-
pora e também sob novas perspectivas (Callou; Serra; Cunha, 2015; Oliveira et al.,
2018; Farias; Caldas; Serra, 2018; Serra et al., 2021; Battisti; Martins, 2011; Velho,
2017; Farias, 2018; Comiotto; Margotti, 2019; Schwindt, 2014, Schwindt; Chaves,
2019), mas os limites do capítulo não o permitem.
Quanto ao /S/ em coda, embora, como se verificou na seção 3, a maior parte das
pesquisas tenha se centrado na distribuição espacial e nos condicionamentos sociais
e estruturais que determinam a implementação de suas variantes, alguns estudos,
entre os quais um na área da sociofonética (Rocha; Pacheco, 2022) têm-se voltado
para questões relativas a sua percepção e avaliação, como os de Hora (2011); Lima
(2013); Henrique (2016); Melo (2012, 2017); Mendonça; Borges (2018); Hora;
Henrique; Amorim (2018); Melo; Gomes (2019). Dentre eles, destacam-se, aqui,
os de Henrique (2016) e o de Melo; Gomes (2019).
Henrique (2016) teve por objetivo analisar como falantes naturais de João Pes-
soa avaliavam as diferentes variantes de /S/ em coda medial. Com base em estu-
dos com dados de produção que apontavam a fricativa alveolar como a variante
mais frequente e a palatalizada como favorecida pelo contexto seguinte /t d/, elab-
orou três testes de percepção que demonstraram (p. 78–79) que os informantes
da pesquisa (a) atribuíam o mesmo grau de diferença para o par alveolar/palatal,
independentemente do contexto seguinte; (b) corroboraram “a hipótese de que a
principal pista acústica relevante para a distinção é o pico espectral em determi-
nadas regiões de frequência”; (c) têm “consciência do comportamento da fricativa
em coda medial no seu dialeto”; (d) deram indícios de que variante palatalizada se
estaria difundindo também diante da nasal /n/; (e) tinham “consciência do com-
portamento da variável analisada na sua comunidade de fala e na sua própria fala”
Melo; Gomes (2019), com base em resultados de teste de percepção aplicado
a 36 adolescentes, 12 jovens universitários de classes média-média e média baixa
e dois grupos de 12 adolescentes moradores de favelas, de classe baixa, mas com
diferentes graus de inserção social na comunidade de fala da cidade do Rio de
Janeiro, buscaram observar o significado social das variantes [ʃ ʒ] and [ x / ɣ ; h / ɦ]
de /S/ em coda, estas últimas avaliadas negativamente por falantes de diversas
variedades do PB. O teste consistia em correlacionar as variantes velar/glotal e pós-
alveolar produzidas por uma mulher falante da variedade carioca a três diferentes
ocupações profissionais – médica, auxiliar de enfermagem e faxineira – continuum
cujos extremos representariam, respectivamente, um maior e menor prestígio social
Os resultados demonstraram que a avaliação negativa da variante glotal apesar
de confirmada, não é compartilhada por todos os falantes da comunidade de fala:
seu estigma foi observado entre os participantes mais escolarizados (jovens uni-
versitários e moradores de favelas com maior inserção social), mas não entre os
adolescentes excluídos socialmente, uma vez que não houve diferença de avaliação
em relação às duas variantes (p. 142). Os autores verificaram ainda que
6 Considerações Finais
Nas seções precedentes, apresentou-se um quadro sintético da variação de /R/, /S/
e /L/ no PB, sobretudo com base em inúmeros estudos de cunho geo-sociolinguís-
tico. Embora os processos nelas retratados sejam bastante similares quanto a sua
direcionalidade – R > x ~ h ~ Ø; S > ʃ; L > Ɨ ~ w ~ Ø – constituem diferentes tipos
de mudança que não ocorreram ao mesmo tempo e não tiveram origem no mesmo
período temporal. Como observam Callou; Leite; Moraes (1998), enquanto os
falantes não se dão conta das mudanças por que passa o /R/, por estarem abaixo de
seu nível de consciência e terem surgido na fala de pessoas com baixa escolaridade –
pelo menos, o seu apagamento, foi registrado na fala de escravos em peças do
século XVI de Gil Vicente – as mudanças do /S/ são conscientes e costumam ser
explicadas por uma tentativa de imitação de uma pronúncia mais valorizada, a da
corte Portuguesa, ao chegar ao Rio de Janeiro, no século XIX, em falantes de esco-
laridade mais alta, embora essa hipótese se apoie em fracas evidências históricas.
Quanto ao /L/, não parece se enquadrar em nenhuma das duas categorias e tudo
indica que a vocalização consiste numa mudança interna, já registrada no Latim e
Revisitando as consoantes em coda no Português Brasileiro 193
Notas
1 O Projeto está em curso, tendo sido já publicados dois volumes (Cardoso et al., 2014).O
corpus reúne respostas a Questionários aplicados a 1.100 informantes em 250 localidades
(25 capitais Brasileiras + 225 outros pontos), de duas faixas etárias, homens e mulheres
de dois níveis de escolaridade.
2 Nas capitais Brasileiras, os dados baseiam-se na fala de 8 informantes, dois homens e
duas mulheres por nível de escolaridade (fundamental e superior). O atlas conta também
com mapas com dados distribuídos com base nessas variáveis sociais.
3 O mapa que serviu de base à Figura 2 foi copiado de https://commons.wikime-
dia.org/wiki/File:Maparj2018-Mapa_do_Estado_do_Rio_de_Janeiro_-_Brasil_-_
Regi%C3%B5es_de_Governo_e_Munic%C3%ADpios_-_2018.png?uselang=pt-br
Acesso em 07/09/2021.
4 Não foram levados em conta, na coda externa, contextos em que /S/ ocorre diante de
vogal nem diante de fricativa coronal.
5 O ALiRO está em andamento, sob a direção de Iara Maria Teles.
6 Cf., nas referências, Razky, 2004 (ALiSPA); Cruz, 2004 (ALAM); Razky; Ribeiro;
Sanches, 2017 (ALAP); Silva, 2018 (ALiTTETO).
7 Rodrigues (2020, 3357) reitera que, no Português Europeu, o “/l/ está sujeito a uma al-
ternância contextualmente condicionada, se considerarmos a existência de duas únicas
realizações da lateral: [l] em ma[l]a e [Ɨ] em sa[Ɨ]”.
8 O contraste entre /l/ e /u/ depois de vogal não deve ir ao ponto de se articular o /l/ depois
de vogal exatamente como o /l/ antes do vogal. Salvo no extremo sul do país (grifo
nosso), esta pronúncia indiferenciada soa anômala, e dá a impressão de haver um ligeiro
/i/ depois do /l/ final, de maneira que uma palavra como cal quase se confunde com cale
ou mel com mele (Camara Jr., 1986 [1977], 31).
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8 Palatalização das oclusivas alveolares
no Português Brasileiro
Variação linguística e restrições
em jogo na aquisição fonológica
Resumo
Este capítulo trata da palatalização de /t, d/ em Português Brasileiro ([t]ia~[ʧ]
ia, [d]ia~[ʤ]ia, gen[te]~gen[ʧɪ], gran[de]~gran[ʤɪ]), processo variável cuja
difusão parece iniciar-se nos centros urbanos (Noll, 2008) e distribuir-se gradativa-
mente ao interior das comunidades. Há variedades em que o processo já acarretou
mudança sonora, outras que exibem variação estruturada, decorrente da interação
de restrições linguísticas e sociais. O objetivo do capítulo é, com base na revisão
de análises fonológicas e estudos de variação linguística da palatalização no Por-
tuguês Brasileiro, esclarecer a gramática das comunidades de fala, internalizada na
aquisição da linguagem e transmitida às sucessivas gerações.
1 Introdução
A palatalização regressiva das oclusivas alveolares em Português Brasileiro
(PB), desencadeada por vocoide [+alto] seguinte ([t]ipo~[ʧ]ipo, [d]ica~[ʤ]ica,
[t]ijolo~[ʧ]ijolo, ditado~[ʤ]itado, pon[te]~pon[ʧɪ], on[de]~on[ʤɪ], [t]eatro~[ʧi]
atro, [d]elicado~[ʤi]licado), apresenta aspectos relevantes à aquisição da linguagem,
especialmente em variedades de PB de contato com línguas de imigração como as
que abordaremos aqui, a partir de estudos anteriores (Battisti; Dornelles Filho, 2009,
2010; Gutierres; Battisti; Dornelles Filho, 2018; Gutierres; Battisti, 2020).
Nessas variedades, faladas em comunidades do interior do estado do Rio Grande do
Sul (RS), a palatalização variável aplica-se moderadamente, condicionada por fatores
estruturais e sociais, o que contrasta com a capital do RS, Porto Alegre, onde a pala-
talização é praticamente categórica (Duarte, 2019). Apesar de as proporções totais de
palatalização no PB de contato serem relativamente moderadas, o processo apresenta
tendência a progredir (Battisti; Dornelles Filho, 2015) em um padrão de mudança gera-
cional (Battisti; Dornelles Filho, 2016), com incremento gradual nas proporções de
aplicação da regra de geração a geração (Labov, 1994). Neste capítulo retomaremos,
dos estudos referidos, resultados que, de um lado, esclarecem os condicionadores estru-
turais e sociais da palatalização variável, atestam o progresso da palatalização e sugerem
DOI: 10.4324/9781003294344-11
202 Elisa Battisti, Athany Gutierres
2 A palatalização em PB
Palatalização é o processo pelo qual certas consoantes adquirem articulação palatal
(o corpo da língua toca o palato duro), podendo acarretar também sua africatização
(pequeno escape de ar na articulação).
No Português Brasileiro, as consoantes afetadas pela palatalização são as oclu-
sivas alveolares /t, d/, que passam às africadas [ʧ, ʤ], geralmente por palatali-
zação regressiva. Menos frequentemente, observa-se palatalização progressiva em
PB, desencadeada pela vogal que precede as consoantes (/oito/ > [‘oʧʊ], /doido/
> [‘doʤʊ]). Este capítulo trata apenas da palatalização regressiva, observada nas
variedades de PB do sul do Brasil.
A palatalização regressiva é desencadeada por uma vogal-gatilho anterior alta
no núcleo de sílabas em que /t, d/ estão no onset, como nos dados em (1): a vogal-
gatilho fonológica /i/ pode estar em sílaba átona ou tônica (1.a); a vogalgatilho [i]
derivada de /e/ por elevação vocálica ocorre apenas em sílaba átona (1.b).
Ambos os exemplos de palatalização em (2), [ʧ]ipo e [ʤ]ica, têm vogal /i/ fonológica
ou não derivada na subjacência. Nos contextos com vogal [i] não fonológica (deri-
vada de /e/ em sílaba átona), a palatalização é alimentada pela elevação vocálica
(po[te]>[‘pɔʧɪ], on[de]>[‘õɲʤɪ]). Na experiência linguística ao longo da aquisição
da linguagem, a criança é exposta a dados gerados pelas duas regras, elevação e
palatalização. A tendência é que, inicialmente, a criança aprenda os padrões de fala
de seus pais e cuidadores, mas se afaste deles caso não se conformem à regra geral
da comunidade de fala (Labov, 2012). A relação dos vocábulos em paradigmas é o
204 Elisa Battisti, Athany Gutierres
(4) a. t i b. ˜
X X X
[coronal]
[+anterior]
3 A palatalização variável
A palatalização das oclusivas alveolares é um processo variável inovador no PB, se
comparado ao Português Europeu, além de marcador dialetal e social (Hora, 1990;
Bisol, 1991; Cristófaro-Silva, 2003; Battisti et al., 2007; Battisti; Guzzo, 2010;
Battisti; Dornelles Filho, 2015; Hora; Henrique, 2015). Os dados em (5) repetem
os dados em (1), agora com as realizações variáveis.
Tabela 8.1 Grupos de fatores selecionados na análise da palatalização variável de /t/ e /d/ no
Português falado em Flores da Cunha (RS), dados do VARSUL
Input: 0,37
Peso % N
relativo
Status da vogal alta
Vogal alta fonológica /i/ (tia) 0,63 52 2.687
Vogal alta fonética [i] (gent[i]) 0,32 27 2.023
Qualidade da consoante-alvo
Consoante desvozeada /t/ (tia) 0,59 47 2.457
Consoante vozeada /d/ (dia) 0,39 35 2.253
Faixa etária
25–39 anos 0,59 45 1.235
40–59 anos 0,49 43 2.325
60 ou mais anos 0,41 36 1.150
Sexo/Gênero
Feminino 0,78 65 2.415
Masculino 0,20 17 2.295
Fonte: Battisti; Dornelles Filho (2016), adaptado de Battisti; Dornelles Filho (2015)
Tabela 8.2 Grupos de fatores selecionados na análise da palatalização variável de /t/ e /d/ no
Português falado em Flores da Cunha (RS), dados do BDSer
Input: 0,53
Peso % N
relativo
Status da vogal alta
Vogal alta fonológica /i/ (tia) 0,61 64 1.801
Vogal alta fonética [i] (gent[i]) 0,36 35 1.433
Qualidade da consoante-alvo
Consoante desvozeada /t/ (tia) 0,57 54 1.750
Consoante vozeada /d/ (dia) 0,41 49 1.484
(Continuado)
Palatalização das oclusivas alveolares no Português Brasileiro 207
Input: 0,53
Peso % N
relativo
Faixa etária
25–39 anos 0,82 73 1.465
40–59 anos 0,21 34 821
60 ou mais anos 0,21 33 948
Sexo/Gênero
Feminino 0,62 59 1.978
Masculino 0,31 40 1.256
Fonte: Battisti; Dornelles Filho (2016), adaptado de Battisti; Dornelles Filho (2015)
(a) a proporção de realização é mais alta com /t/ e vogal alta não derivada /i/ (/ti/a →
[ʧi]a) do que com /d/ e vogal alta [i] derivada de /e/ átono (den/te/ → den[ʧi]);
*ti Atribua uma marca de violação a cada /t/ não palatalizado antes de /i/
*di Atribua uma marca de violação a cada /d/ não palatalizado antes de /i/
*t[i] Atribua uma marca de violação a cada /t/ não palatalizado antes de
[i] elevado de /e/ átono
*d[i] Atribua uma marca de violação a cada /d/ não palatalizado antes de
[i] elevado de /e/ átono
*MID]σ̆ Atribua uma marca de violação a cada vogal média em sílaba átona
IDENT (anterior) Atribua uma marca de violação a cada segmento correspondente
input-output que não tenha valores idênticos para anterioridade
IDENT (height) Atribua uma marca de violação a cada segmento correspondente
input-output que não tenha valores idênticos para altura
Fonte: Adaptado de Battisti; Dornelles Filho (2010, 83)
212 Elisa Battisti, Athany Gutierres
(b) se o processo se aplica com [i], ele também se aplica com /i/; se ocorre com /d/,
também ocorre com /t/; e
(c) o fenômeno conforma-se aos padrões 1, em que a palatalização está ausente,
e 3, em que ela se verifica apenas com /i/. A variação decorre da alternância
destes dois padrões na comunidade de fala.
30 20 10
CON(A) CON(B) CON(C) H
→ [output1] * * −40
[output2] *** −60
Fonte: as autoras
Palatalização das oclusivas alveolares no Português Brasileiro 215
subgrupos de falantes (zona urbana e zona rural, por exemplo) reage à movimentação
da restrição de Fidelidade ID(ant), que exige manutenção da identidade de traços de
anterioridade no mapeamento input-output, para a esquerda das escalas. ID (ant),
assim, domina as restrições de marcação que promoveriam a palatalização.
Uma das afirmações de Gutierres; Battisti; Dornelles Filho (2018) sobre esses resul-
tados é a de que “local de residência” parece ter efeito não somente sobre restrições de
Fidelidade, como também de Marcação, especialmente aquelas que se referem aos con-
textos /te, de/ (as restrições *t[i] e *d[i]) e, entre esses dois, ao contexto com a consoante
surda. Pode-se considerar que o fato relevante para a não palatalização, então, seja o
processo de elevação de /e/, que tende a não se aplicar no Português da comunidade.
No padrão de palatalização dos inputs /ti, di/, o peso da restrição ID(ant)
decresce. Já as restrições de Marcação *ti e *di situam-se à esquerda da escala, o
que explica as realizações com [ʧi] e [ʤi] mapeadas a /ti/ e /di/. Chama a atenção
a movimentação da restrição *MID]σ̆: seu valor de referência (peso) aumenta para
a zona urbana e diminuiu para a zona rural. A restrição *MID]σ̆ proíbe outputs
com vogais médias em fronteira de vocábulo, o que motiva a elevação vocálica e,
então, a palatalização. Fica clara, assim, a maior tendência à aplicação da regra de
elevação de /e/ pelos falantes da zona urbana do que da zona rural.
A comunidade investigada, assim como outras da antiga região de colonização
italiana, ainda mantém contato com falares italianos, principalmente nas áreas
rurais. A preservação da vogal átona /e/ no Português de contato com esses dialetos
explicase pela influência do sistema morfológico do italiano, em que a qualidade
da vogal em fronteira de palavra é distintiva (Battisti; Hermans, 2008).
A exploração do que chamamos de ‘terceira variante’, isto é, contextos de pala-
talização com vogal [i] derivada em que ocorre a elevação, mas não a palatalização
(part/e/ → part[i], t/e/atro → t[i]atro, nád/e/ga → nád[i]ga, ond/e/ → ond[i]),
revela que a palatalização, se observada, aplica-se com mais frequência em ambi-
entes com /t/ do que com /d/, conforme mostra a Tabela 8.3.
O exame desse subconjunto de dados, efetuado com a Noisy HG, fornece um
ranking com esta configuração (Figura 8.6).
As restrições *MID]σ̆ (favorece a elevação) e ID(hei) (inibe a aplicação da regra)
ocupam a mesma posição na escala da gramática da palatalização, que compreende o
140 100 87 86 85 59
par[te] * −137.625
par[ti] * * −146.531
par[ʧi] * * −147.180
on[de] * −137.625
on[di] * * −149.810
on[ʤi] * * −147.180
conjunto completo de dados. A Marcação de *ti e *di, na segunda posição mais alta
da escala, reforça a tendência à palatalização, mas não desempenha papel neste ran-
queamento, já que dados com input /i/ não estão em jogo. A alternância entre a pala-
talização de inputs /te, de/ e a seleção de outputs fiéis decorre da interação entre as
restrições de Marcação *d[i] e *t[i] (palataliza) e IDant (não palataliza). A diferença
entre os pesos numéricos dessas restrições é inferior a 1, o que ocasiona variação.
Nos tableaux seguintes (Figuras 8.7 e 8.8), verificase que as formas mais harmôni-
cas são os outputs fiéis, sem palatalização, pois possuem o menor valor (mais próximo
de zero) de harmonia. Essas realizações correspondem a 86.2% [te] e 96.6% [de].
Entretanto, quando o processo é engatilhado pela elevação vocálica, ocorre de modo
variável entre a realização de formas palatalizadas (9.2% [ʧi]) e a realização de formas
com elevação vocálica, sem palatalização (4.6% [ti]). Quando o contexto consonantal à
aplicação da regra é /d/, a variação pode ocorrer (2% [ʤi] e 1.4% [di]), mas com menor
218 Elisa Battisti, Athany Gutierres
parte *MID *ti *di *d[i] IDant *t[i] IDhei onde *MID *ti *di IDant *d[i] *t[i] IDhei
par[te] * −140.621 on[de] * −142.579
parte *MID *ti *di *t[i] *d[i] IDant IDhei onde *MID *ti *di *t[i] *d[i] IDant IDhei
par[te] * −142.147 on[de] * −142.147
par[ti] * * −144.708 on[di] * * −142.896
par[ʧi] * * −141.666 on[ʤi] * * −141.666
frequência do que em contextos /t/. Isso pode ser observado pela diferença superior a 1
entre os valores de harmonia dos candidatos em determinado momento de fala.
A competição da terceira variante com as demais pode ser melhor compreendida
ao observar-se a Figura 8.9, que destaca a movimentação da restrição de Fidelidade
IDant em diferentes possibilidades de realização linguística. Quando a restrição é
incrementada em relação a *d[i] e *t[i], geramse outputs com elevação, sem palatali-
zação (tableaux da parte superior da Figura 8.9); quando o peso de IDant decresce,
geram-se outputs plenamente palatalizados (tableaux da parte inferior da Figura 8.9).
As análises demonstraram que o processo de palatalização variável no PB de
contato é alimentado pelo alçamento de /e/ átono, já que a realização de [i] cria
contexto para a aplicação da regra. As altas taxas de preservação de /e/ e as baixas
taxas de palatalização em contextos /te, de/ átonos indicam que o processo é de
algum modo banido em ambientes com a vogal média átona, por razões que não são
apenas gramaticais. A variável “local de residência” tem efeito no processamento
da elevação e da palatalização: falantes residentes em áreas urbanas demonstram
tendência a palatalizar, falantes residentes em zonas rurais, a não palatalizar; emb-
ora em ambas as zonas a tendência seja de não elevar /e/ em sílaba átona. Se há
elevação, os falantes de zona urbana aplicam mais a regra do que os de zona rural.
As análises pela TO mostram, então, que a palatalização é um processo dirigido
pela gramática. O mapeamento input-output produz as generalizações implicacionais
expressas nos padrões quantitativos observados. As restrições de Marcação são satis-
feitas com a aplicação da regra variável, as restrições de Fidelidade, com a preservação
da forma de input. Aspectos sociais têm efeito no desempenho das restrições de Fideli-
dade (neste caso, IDant e IDhei). Seu papel, de coibir a alteração do input por elevação
e palatalização, é afetado pelo fator de ajuste, que diminui a capacidade das restrições
de Fidelidade de frear os processos. Nas gramáticas pela TO, então, adquirir a fonolo-
gia variável corresponde a internalizar não só o sistema de contrastes a partir de primi-
tivos representacionais (traços), mas também os rankings de restrições (e os processos
derivados da interação das restrições) e, especialmente, o efeito de fatores sociais nas
restrições de fidelidade, o que regula a frequência das variantes observadas.
Palatalização das oclusivas alveolares no Português Brasileiro 219
7 Considerações finais
A análise da palatalização variável das oclusivas alveolares em comunidades de
fala de PB de contato fornece evidências relevantes à aquisição da linguagem.
Diferentemente de comunidades monolíngues-Português de certas regiões Bra-
sileiras, em que a palatalização é quase categórica (como Porto Alegre, capital do
Rio Grande do Sul), as variedades de contato apresentam palatalização em menores
proporções, mas com tendência de progresso nas comunidades investigadas. As
análises revisadas mostram que as menores proporções de aplicação da palatali-
zação no PB de contato resultam do fato de a elevação da vogal /e/ em sílaba átona,
que alimenta a palatalização, ser menos frequentemente observada; mostram, tam-
bém, que as gramáticas são afetadas por fatores de ajuste (relacionados a fatores
sociais) aplicados a restrições de Fidelidade.
Esses resultados permitem pensar que, na transmissão linguística pela
aquisição da linguagem, a criança internalizaria a gramática (do adulto) a que é
exposta com algumas sutis diferenças. Vale dizer: no que se refere aos proces-
sos variáveis, os fatores de ajuste sofreriam alguma alteração ao serem adquiri-
dos. Essa alteração, por seu turno, corresponderia ao gradual decréscimo do
peso das restrições de Fidelidade. Como consequência, as formas de input,
menos “protegidas”, seriam progressivamente alteradas na transmissão lin-
guística, de que resultaria o avanço ordenado da regra na comunidade, nas
sucessivas gerações, do contexto mais favorável (alvo /t/, gatilho /i/) ao menos
favorável (alvo /d/, gatilho /e/ em sílaba átona).
Espera-se que a retomada de estudos efetuada no capítulo tenha contribuído
para mostrar que a aquisição da palatalização variável de /t, d/ no PB implica,
portanto, internalizar bem mais do que uma regra de mudança de traço. Req-
uer também assimilar a interação da palatalização com o processo de elevação
de /e/ em sílaba átona e, no que tange aos padrões quantitativos, as generali-
zações implicacionais sobre aspectos estruturais do ambiente de aplicação da
regra (natureza do segmento-alvo e da vogal-gatilho), bem como os efeitos de
fatores sociais sobre as restrições de Fidelidade. Estes últimos, em particular,
evidenciam o caráter outward bound (Labov, 2012) da capacidade humana para
a aquisição da linguagem, que se expande do ambiente familiar para a comuni-
dade de fala. É um pacote de informações processadas na percepção e produção
da fala. Esclarecer o pacote de informações e analisá-las fonologicamente é o
grande desafio.
Notas
1 No original: “an innate component of the human mind that yields a particular language
through interaction with presented experience, a device that converts experience into a
system of knowledge”. Tradução nossa.
2 Análises fonético-acústicas como a de Harrington (2006) comprovam haver mudanças
sutis na produção dos segmentos ao longo da vida adulta. No entanto, essas mudanças são
marginais e conformam-se ao padrão de fala da comunidade.
220 Elisa Battisti, Athany Gutierres
3 Como recurso heurístico que é, essa análise não deve ser tomada como método para re-
tratar fielmente a realidade investigada, mas como um dispositivo de aproximação de
realidades empiricamente inacessíveis, das quais se pode tratar apenas por hipótese.
4 Trata-se apenas de uma especulação, pois a palatalização não foi plenamente abordada no
estudo citado.
5 Optamos por apresentar as gramáticas em escalas contínuas, e não os tableaux com os
valores H dos candidatos, para melhor visualização do papel das restrições linguísticas na
variação.
Referências
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9 As vogais do Português Brasileiro
Estabilidade e variação
José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira,
Seung Hwa Lee
Resumo
O sistema vocálico do Português Brasileiro (doravante PB) constitui-se de três sub-
sistemas muito bem estabelecidos, o que tem sido aclamado não apenas sob viés
descritivo, como também em análises que incorporam dados de variação. Todas
essas investigações compreendem que esses três subsistemas, cujo comportamento
depende da posição em que se encontram com relação ao acento, concebem que
há um subsistema raramente variável e plenamente contrastivo na posição tônica,
outro notavelmente variável na posição pretônica e um terceiro com alguma vari-
ação na posição postônica. Considerando-se essas três situações, este capítulo pro-
cura, além de apresentar o estado da arte acerca das vogais do PB, tecer discussões
sobre o limite e o espaço da variação, o que envolve questionar até que ponto há
instabilidade ou estabilidade nesse sistema. Considera-se, nesse sentido, que há
pouco a se discutir quanto ao sistema postônico e, menos ainda, sobre as vogais da
sílaba tônica. Contudo, as vogais pretônicas, principalmente, apresentam instabili-
dade que emerge da variação, e, ao mesmo tempo, estabilidade, na medida em que
a variação emergente não é descontrolada. A fim de descrever e explicar estes fatos,
adotamos a noção de Sistema Adaptativo Complexo (SAC), para tratar a variação
linguística como parte da natureza da linguagem.
1 Introdução
Inúmeros estudos sobre o sistema vocálico do PB floresceram desde que Camara Jr,
em meados do século passado, apresentou, com base em elementos de natureza estru-
turalista, o mapeamento das vogais em decorrência de sua posição acentual da pala-
vra. A partir de então, investigações com diferentes abordagens se sucederam. Parte
dessas pesquisas seguiu a trilha metodológica de Labov (2008), em busca de regras
variáveis que explicassem os condicionadores para uma ou outra variante vocálica;
outras tantas investigações se valeram do sistema vocálico para testar modelos teóri-
cos de diferentes vertentes, como a Fonologia Autossegmental (Wetzels, 1992), a
Teoria da Otimidade (Bisol; Magalhães, 2004), e hipóteses de mudança linguística,
como a neogramática (Bisol, 1981) e a difusionista (Oliveira, 2003).
DOI: 10.4324/9781003294344-12
224 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
2 As vogais tônicas
Esta seção discute a estabilidade das vogais na posição tônica do PB. Como já é
bem estabelecida na literatura, a qualidade vocálica na sílaba tônica do PB apre-
senta contraste fonêmico. E o contraste entre as vogais depende do lugar onde elas
se encontram nas palavras, tendo-se em vista o acento primário. Assim, o sistema
vocálico do PB é constituído de um quadro triangular de sete vogais /a, ɛ, e, i, o, ɔ,
u/ na posição tônica da palavra (Camara Jr., 1988), onde essas vogais apresentam
oposições distintivas, como demonstram os exemplos abaixo:
(1)
b[a]la/ b[ɛ]la//v[e] /v[i]/ av[ɔ]/av[o]/ b[u]la
Já na posição pretônica, o contraste flutua entre vogais médias e vogais altas, /a, i, ɛ
~ e ~ i, o ~ ɔ ~ u, u/ (Lee; Oliveira, 2003; Oliveira; Lee, 2006); na posição postônica
não final, as vogais /a, e, i, u/ ocorrem; na posição postônica final, por último, a
vogal baixa e as vogais altas /a, i, u/ ocorrem (Camara Jr., 1970).
Mas este contraste fonêmico das vogais médias na posição tônica depende
da categoria lexical – as vogais médias na posição tônica apresentam contraste
fonêmico, enquanto este contraste é alofônico nos verbos, conforme Lee (2008).
As análises sincrônicas de estudos fonológicos do PB mostram alguns fatos
interessantes em relação ao comportamento das vogais – a vogal baixa /a/ é neutra
em termos de processos fonológicos; as vogais altas na posição tônica podem enga-
tilhar os processos fonológicos, como a harmonia vocálica de [alto] (Bisol, 1981);
as vogais médias – altas e baixas – sofrem e engatilham os processos fonológicos,
como a harmonia vocálica de [ATR] e de [Alto].
No que diz respeito às alternâncias de vogais médias na posição tônica, as vogais
médias altas somente podem engatilhar o processo fonológico de harmonia vocálica
de [ATR], enquanto as vogais médias baixas na posição tônica podem sofrer ou
engatilhar os processos fonológicos; as vogais médias abertas na sílaba tônica, em
outras palavras, apresentam mais instabilidade em relação às outras vogais.
As vogais do Português Brasileiro 225
(2)
(a) p[o]ça/p[ɔ]ça]/*p[u]ça
(b) cr[o]sta/cr[ɔ]sta/*cr[u]sta
(c) f[e]cha/f[ɛ]cha/*f[i]cha
Os exemplos acima mostram que o contraste entre as vogais médias ocorre na
sílaba tônica, mas este contraste não implica em oposição distintiva. Além disso,
este tipo de variação envolve somente as vogais médias, alta e baixa, e essa vari-
ação ocorre inter-individualmente.
As vogais médias abertas, diferentemente das outras vogais, foram introduzi-
das no Português pela perda de quantidade do latim clássico – as dez vogais do
latim reduziram-se a sete vogais, sendo que vogais médias breves mudaram para
vogais médias baixas no latim imperial (Teyssier, 1990) e no latim vulgar (Camara
Jr., 1988; Nunes, 1960). O Português contemporâneo herdou essas 7 vogais do
latim vulgar. Fonte (2014) mostra que havia instabilidade nas vogais médias na
sílaba tônica nos séculos XV e XVI, quando o contraste entre vogal média alta e
vogal média baixa não apresentava as oposições distintivas: b[e]sta ~ b[ɛ]sta, v[ɛ]
lho ~ v[e]lho, form[o]sas ~ form[ɔ]sas, m[o]do ~ m[ɔ]do, etc. Nos séculos subse-
quentes, as vogais instáveis na posição tônica se estabilizam e a variação entre elas
desaparece – b[e]sta, v[ɛ]lho, form[ɔ]sas, m[ɔ]do. Os exemplos de (3), portanto,
permitem inferir que eles são resíduos dessa instabilidade das vogais médias dos
séculos passados, que persistem até hoje – e o próprio item lexical ainda não encon-
trou o rumo das vogais médias na posição tônica.
Outro caso de variação na posição tônica está relacionado com o acento
secundário lexical. Lee (1995) argumenta que a qualidade vocálica (vogal média
baixa) e a vogal nasalizada estão preservadas na posição pretônica na formação de
diminutivo (formação produtiva), como os exemplos abaixo demonstram:
(3)
a. c[ɜ]ma/c[ɜ]minha/*c[a]minha
̃ ̃
b. b[ɔ]la/ b[ɔ]linha/*b[o]linha
c. caf[ɛ]/caf[ɛ]zinho/*caf[e]zinho
O autor trata a formação de diminutivo como um composto fonológico que contém
dois acentos primários, que explicam a presença da vogal média baixa e a vogal
nasalizada na posição pretônica. No falar mineiro, essa vogal média baixa pode
variar com a vogal alta, como os exemplos de (4) demonstram:
(4)
a. b[ɔ]linha ~ b[u]linha *b[o]linha
b. s[ɔ]zinho ~ s[u]zinho *s[o]zinho
c. caf[ɛ]zinho ~ caf[i]zinho *caf[e]zinho
226 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
Os exemplos em (4) mostram que a vogal média baixa na posição pretônica pode
variar com a vogal alta, mas ela não varia com a vogal média alta. Parece que a
presença de vogal alta é derivada pela assimilação de traço [Alto] da sílaba tônica.
No falar de Cametá/PA (Rodriguês, 2005), por último, há o caso de variação na
posição tônica entre vogal média alta e vogal alta.
(5)
(a) vou [vo] > [vu]
(b) av[o] > av[u]
(c) n[o]ite > n[u]ite
Os exemplos acima mostram que a vogal média alta na representação subjacente é
realizada como a vogal alta na posição tônica sem comprometer a oposição distin-
tiva, e a variação pode ocorrer independentemente da categoria lexical. Este tipo de
variação na posição tônica é um caso excepcional, numa localidade aparentemente
específica e raramente documentado na literatura.
Em resumo, o sistema vocálico do PB apresenta contraste e oposição distintiva
na posição tônica por séculos. A variação das vogais na posição tônica, no entanto,
pode ocorrer em alguns itens lexicais, na posição tônica de acento secundário e no
caso de alçamento de vogal média alta na posição tônica, embora a variação seja
rara na língua. Essa variação é controlada pelo fator estrutural, / Baixo, α Poste-
rior/ – as vogais na posição tônica podem variar entre [ɛ ~ e ~ i] e [o ~ ɔ ~ u], como
a variação das vogais ocorre na posição pretônica da seção 3 deste capítulo.
(6)
[ɾab]/[rab] ‘pedra/azul’
[gɾøŋ]/[grøŋ] ‘canoa/siri’
[foɾ]/[for] ‘lua/porco’
Neste caso temos, para os fones em questão, contraste e oposição distintiva.
A combinação entre contraste e oposição distintiva nos dá quatro relações pos-
síveis envolvendo pares de fones, como se pode ver a seguir:
(1) [+C/+OD]
(2) [+C/OD]
(3) [C/OD]
(4) [C/+OD]
(7)
c[ɔ]mércio ~ c[o]mércio ~ c[u]mércio
b[ɔ]neca ~ b[o]neca ~ b[u]neca
s[e]rviço ~ s[e]rviço ~ s[i]rviço
s[e]mestre ~ s[e]mestre ~ s[i]mestre
Nestes casos há contraste, mas não há mudança de significado atrelada às diferentes
vogais, num caso claro de variação linguística. Então, para o caso das vogais pretôni-
cas podemos afirmar que temos cinco pontos no espaço fonológico, sendo três deles
completamente estáveis (os pontos para os fonemas /a/, /i/ e /u/) e dois pontos que
parecem instáveis, um para a variação entre [e], [e] e [i], e outro para a variação entre
[ɔ], [o] e [u]. Notese, contudo, que essa instabilidade é apenas aparente, uma vez
que nenhum elemento desses dois conjuntos pode variar com os elementos dos três
228 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
pontos estáveis que apontamos anteriormente. Por exemplo, não podemos ter nada
como *b[a]neca, *b[i]neca, *s[a]mestre ou *s[u]mestre. Alguém poderia sugerir que
isso não se sustenta, uma vez que temos b[u]neca e s[i]mestre. Isso é verdade, mas
nesses casos as vogais altas em posição pretônica não são manifestações dos fonemas
/u/ e /i/, uma vez que esses dois fonemas não admitem a variação retratada aqui. Ou
seja, não temos nada como *p[e]poca ou *f[o]maça. Então, se é assim, como podemos
representar esses dois conjuntos que exibem variação nas vogais pretônicas? Podemos
representar esse espaço de variação como [ Baixo, α Posterior]. E é exatamente den-
tro dessas possibilidades que encontramos as realizações variáveis encontradas, ou
seja, a suposta instabilidade. Por outro lado, a estabilidade é garantida exatamente
pela representação desses dois conjuntos, [ Baixo, α Posterior], restringindose a esse
espaço. Resumindo, a variação é controlada, em termos de suas possibilidades, por
fatores internos, de natureza estrutural, [ Baixo, α Posterior], que nos mostra o que
pode (e o que não pode) acontecer. Mas nada se diz do que vai efetivamente acon-
tecer. E essa imprevisibilidade do que vai efetivamente acontecer se deve à ação de
fatores externos ao sistema vocálico, que atuam de maneira probabilística, como o
item léxico, o falante, a região, o tempo, entre outros. Dito de outra forma, falantes de
regiões diferentes se utilizarão preferencialmente de uma das variantes em detrimento
das outras; alguns itens lexicais fixarão uma das variantes enquanto outros fixarão
outra variante; falantes de uma mesma região geográfica construirão a forma fonética
dos itens lexicais de modo ligeiramente diferenciado de outros falantes, e assim por
diante. Ou seja, a variação das vogais pretônicas, assim como qualquer outro caso de
variação, tem essencialmente um caráter ecológico mostrando a busca por um ajuste
ótimo entre os organismos (os falantes) e seu nicho biocultural.
Um fato que merece ser notado aqui é que a variação envolvendo [e], [e] e [i] e [ɔ],
[o] e [u] acontece em todas as variedades regionais do PB, havendo, contudo, opções
modais diferenciadas entre esses vários dialetos. Por exemplo, nas variedades do sul
e do norte do Brasil encontramos a moda em [e] e [o], como atestam os trabalhos de
Ferreira da Silva (2009), Campos (2008), Carmo (2009), Bisol (1981), Battisti (1993)
e Schwindt (1995), entre outros, em que há uma baixa frequência das médias baixas
[ɛ] e [ɔ]. Já nas variedades do nordeste encontramos a moda em [ɛ] e [ɔ], como se vê
no trabalho de Araújo (2007), Nascimento Silva (2009) e Castro (2008), entre outros.
Resumindo, podemos dizer que:
(1) A variação se garante pela ação de fatores estruturais, sendo, portanto, sistêmi-
cos e parte da Língua-I. Assim o sistema varia sem perder sua identidade.
(2) A manifestação da variação se garante pela ação de fatores externos ao sistema
vocálico, sendo, portanto, não estruturais e parte da Língua-E.
Altas i u
Média e –
Baixa a
Anterior Central Posterior
Figura 9.1 Vogais postônicas em posição não final (Camara Jr., 1988, 44)
As vogais do Português Brasileiro 229
pêss[e]go ~ pêss[i]go
fôl[e]go ~ fôl[i]go
alfândega ~ alfând[i]ga
prótese ~ prót[i]se
Apesar dos poucos casos de alçamento da vogal anterior na pauta postônica não final,
é conclusivo que, nesta posição, as vogais médias já não mais contrastam, assim
230 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
como ocorre na posição final. Como aponta Bisol (2003), valendose dos dados
Vieira (2002), diferentemente da posição final em que, com a exceção de pontos
geográficos bem definidos ao sul do Brasil, as médias deram lugar às altas, na posição
postônica não final, os falantes ainda resistem ao uso definitivo da vogal alta.
É sabido que, no campo da variação linguística, qualquer afirmação categórica
corre sério risco de ser confrontada. Isso se aplica de modo patente ao comporta-
mento das vogais postônicas não finais do PB, até mesmo quando se refere aos
processos de que são alvo. Por exemplo, Magalhães; Silva (2011) relevam não
ser incomum, entre falantes do estado da Paraíba, a presença de vogais médias
baixas na sílaba postônica não final, como ocorre em ‘abób[ɔ]ra, fósf[ɔ]ro, cóc[ɔ]
ras, helicópt[ɛ]ro, cól[ɛ]ra e cér[ɛ]bro’, o que os autores classificam como casos de
assimilação progressiva, com espraiamento de traços de abertura à direita.
Todos esses fatos demonstram que ainda há instabilidade na pauta postônica
não final e, ao que parece, não há uma direção tão retilínea rumo ao emparelha-
mento com o subsistema átono final. Por outro lado, esta instabilidade não é ilimi-
tada, uma vez que o comportamento variável das vogais parece se sujeitar a um
espaço de movimentação que inclui como ponto de partida a vogal média e como
ponto de chegada a vogal alta, conforme se vêm em ‘fósf[o]ro ~ fósf[ɔ]ro > fósf[u]
ro’; ‘cól[e]ra ~ cól[ɛ]ra > cól[i]ra”, mas não ‘mús[i]ca > *mús[e]ca ~ mús[ɛ]ca’,
‘âng[u]lo > âng[o]lo ~ âng[ɔ]lo’.
Dentro do espaço de variação das vogais postônicas mediais, inclui-se ainda o
apagamento total do segmento, o que alcança qualquer uma das vogais que venha
ocupar essa posição. Embora o fenômeno seja constatado com dados sincrônicos, a
chamada síncope em palavras proparoxítonas não é recente. Dados documentados no
Apendix Probi (Silva Neto, 1956) demonstram que, na modalidade vulgar do latim,
o apagamento da vogal átona situada entre o acento e a sílaba final não se sustentava
como no latim clássico. É o que se vê em ‘stabulum ~ stablum, ‘frigida ~ fricda’,
‘oculus ~ oclus” e ‘tabula ~ tabla’. Também a possibilidade de apagamento da vogal
encontra-se demarcada por um limite que impõe uma dose de estabilidade ao pro-
cesso, haja vista que a estrutura fonotática do sistema tenderá a permitir o apaga-
mento apenas se a nova estrutura silábica gerada for bem formada. Abaixo, em (8), os
exemplos à esquerda ilustram novas estruturas silábicas bem formadas, portanto com
apagamento lícito, enquanto os exemplos à direita ferem princípios de boa formação
da sílaba, tornando, pois, ilícito o apagamento da vogal postônica medial:
(8)
árvore > arvre estômago > *estomgo
fósforo > fosfro relâmpago > *relampgo
ângulo > anglo cônjuge > *conjge
círculo > circlo lágrima > *lagrma
O apagamento da vogal, por vezes, não ocorre sozinho, uma vez que, para dar conta
do que demanda a estrutura silábica, sequências malformadas deverão eliminar
outros elementos para que se tornem adequadas, como em ‘relâmpago > relampo’,
‘cônjuge > conje’, estômago > estomo’, em que, além de ter eliminada a vogal,
apaga-se também onset da sílaba final. Há postulados segundo os quais a síncope
As vogais do Português Brasileiro 231
(9)
del[i] ~ de[ɫ] del[a] ~ *de[ɫ]
bol[u] ~ bo[ɫ] bol[a] ~ *bo[ɫ]
doc[i] ~ do[s] pros[a] ~ *pro[s]
praz[u] ~ pra[z] rez[a] ~ *re[z]
Os casos apresentados na primeira coluna, ilustrativos do apagamento ou não reali-
zação da vogal final, são amplamente registrados no Português falado em Minas
Gerais (GEFONO;3 Oliveira, 2006) e possivelmente em outras regiões, o que
tende a não acontecer quando a vogal final é baixa. Chama atenção o fato de que
232 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
o apagamento da vogal antecedida por uma lateral torna esta consoante velarizada
e não vocalizada, realização mais comum da lateral em posição final (Cf. ‘mal’ >
ma[w], mel > me[w], porém dele > *de[w], bolo > *bo[w]).
Em se tratando da vogal em sílabas finais no Português, é preciso ponderar
que a neutralização que resulta em três vogais enxerga apenas o final absoluto da
palavra, ou seja, a sílaba final leve. Há que se levar em consideração, também, que
sílabas átonas finais no Português podem ser fechadas por consoantes soantes e [s],
como em ‘nível, túnel, líder, menos, antes’. Em sua amostra de dados de fala dos
três estados da região sul do Brasil, Vieira (2002) constata o que se tem verificado
também nos dados de Minas Gerais, banco GEFONO, isto é, que as sílabas átonas
finais fechadas tendem a preservar a vogal média quando a consoante responsável
por fechar a sílaba for uma soante. Por outro lado, a consoante fricativa [s] não
impede a elevação da vogal. É o que se vê nos exemplos de (10), a seguir:
(10)
menos > men[u]s
antes > ant[i]s
líder > *líd[i]r
túnel > *tun[i]l
Os fatos apresentados permitem concluir que, se se pode falar em estabilidade no
sistema, entre todas as pautas átonas, certamente é na sílaba final que se encontra
uma situação mais próxima desse estado, com três vogais bem distintas, /i/, /a/, /u/,
a despeito de possíveis variações fonéticas.
6 Estabilidade e variação
Conforme se viu nas seções anteriores, as vogais átonas do PB apresentam insta-
bilidade, que emerge na variação, e, ao mesmo tempo, estabilidade, na medida em
que a variação emergente não é descontrolada, sendo restrita a um espaço clar-
amente delimitado. A variação nas átonas finais já se apresenta num estágio de
resolução, sendo sua realização fonética como [i], [a], [u], a mais utilizada, com
poucos bolsões de realização como [e], [a] e [o]. Já com relação às vogais médias
não finais a instabilidade não se reflete apenas na variação fonética encontrada, mas
também na possibilidade do apagamento da vogal. O maior problema, no entanto,
se encontra na variação observada para as vogais pretônicas, que oscilam entre as
realizações [e], [ɛ], [i], para a série anterior, e [o], [ɔ], [u] para a série posterior, com
realizações preferenciais diferenciadas por região, por item lexical e por falantes.
Diante da situação encontrada podemos nos perguntar o seguinte: (a) Qual a
teoria mais adequada para lidar com os fatos como eles são? Ou seja, que teoria
nos permite ver a situação encontrada como sendo a situação esperada? (b) Como
descrever os fatos observados?
Vamos nos concentrar na questão (a) acima. Para o caso da variação nas vogais
átonas temos, basicamente, três maneiras de ver a questão.
A primeira delas pode ser caracterizada pela abordagem variacionista clássica,
com o som como a unidade de variação e mudança, e a descrição em termos de
As vogais do Português Brasileiro 233
Por outro lado, no noroeste paulista, segundo Carmo (2013, 174), o percentual
de vogais médias pretônicas na forma média fechada é de 83.7%, ocorrendo apenas
16.3% de alçamentos (e 0% de ocorrências na forma média aberta). Esses dois
fatos colocam grandes dificuldades para uma análise variacionista clássica.
Ou seja, o que impede que a análise seja feita nos moldes tradicionais da análise
da variação é, principalmente, a inclusão de casos que são, na verdade, categóricos.
Numa análise de cunho probabilístico, a regra variável a ser escrita teria, tipica-
mente, o seguinte formato:
Uma regra variável como (i) nos diria, simplesmente, que (x) se realiza, vari-
avelmente, como y, num contexto Z, e que essa regra teria uma determinada proba-
bilidade de ocorrência a ela associada, probabilidade essa que seria dada por uma
regressão logística. Vejamos um exemplo concreto, que vou formular de modo
bastante simples:
Uma regra como (ii) nos diria que o (r) em coda, seja ele interno ou em final de
palavra, poderia ser variavelmente (mas não obrigatoriamente) cancelado. De fato
isso é verdade, se considerarmos realizações como:
Note-se que casos como os de (iii) podem ser atestados na maioria (senão em
todas) das variedades do PB. Note-se, também, que uma análise deste tipo
irá considerar o som como a unidade básica da variação e, eventualmente, da
mudança linguística. Acontece que, quando estamos coletando uma amostra para
análise, essa amostra é necessariamente limitada, temporal e espacialmente. Por
234 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
(1) Por que uma variedade de Português opta, majoritariamente, por uma das
variantes, enquanto outra variedade opta por outra? Por que algumas possibi-
lidades fonéticas simplesmente não ocorrem em algumas variedades em deter-
minadas posições?
(2) Por que algumas palavras fixam sua forma fonética em termos de uma das
variantes, enquanto outras palavras se resolvem por outra?
(3) Por que alguns falantes optam por uma das variantes, enquanto outros falantes
optam por outra em determinados itens lexicais?
A resposta a essas três questões pode ser avançada por uma proposta que podemos
resumir assim: as emergências são controladas pela interação entre um organismo
(no caso em questão, o falante) e seu nicho, ou seja, no conjunto de situações nas
quais um organismo pode exercer suas habilidades. Trata-se da dimensão ecológica
da variação, do controle das emergências reais em termos de atratores não periódicos.
Por outro lado, há um limite imposto pela própria natureza da linguagem, manifes-
tado nas coordenadas fornecidas pelo atratores periódicos, num viés etológico da
questão.
Resumindo o que foi proposto até aqui podemos dizer que:
Notas
1 A relação 4, [C/+OD] não se aplica às línguas românicas, mas se aplica às línguas ger-
mânicas. Por exemplo, Vieiraem inglês os fones [h] e [N] nunca ocorrem num mesmo
contexto ([h] só ocorre em início de sílaba enquanto [N] só ocorre em final de sílaba) e,
mesmo assim, não podem ser considerados alofones de um mesmo fonema por absoluta
falta de semelhança fonética entre eles.
2 Estamos omitindo aqui alguns detalhes que não farão falta na argumentação que se segue.
3 Grupo de pesquisa e banco de dados do Triângulo Mineiro: http://dgp.cnpq.br/dgp/
espelhogrupo/1042512570006243
4 Para maiores detalhes veja-se (Oliveira, 2014, 2015, 2016, 2018).
As vogais do Português Brasileiro 237
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238 José Magalhães, Marco Antônio de Oliveira, Seung Hwa Lee
Resumo
Este capítulo trata de alguns aspectos do ditongo no Português. A origem do ditongo
oral decrescente e seu caráter variável na variedade Brasileira são abordados inicial-
mente. Do latim ao Português, poucos ditongos primários permaneceram, e novos
foram criados por processos diversos. A monotongação é a regra variável de apli-
cação mais frequente no ditongo ou, seguido por ai e por ei. O ditongo ei apresenta
uma distribuição diferenciada entre as regiões, cuja variação é condicionada, princi-
palmente, pelo tepe e fricativa palatal em contexto precedente. A análise fonológica
detém-se na formação do ditongo, discutindo-o como sílaba pesada ou leve no form-
ato CVC, seguindo a teoria das moras. Embora o termo mora, que distingue a sílaba
por peso, figurasse desde tempos antigos com referência ao Sânscrito, só começa a
estabelecer-se como teoria sob a regência dos princípios de sonoridade e moraci-
dade com Hyman (1985) e Hayes (1991). Nessa linha, desenvolve-se este texto.
1 Introdução
Os ditongos evoluíram do latim ao Português, em geral, pelo processo fonológico
da redução. Na língua Portuguesa, processos fonológicos distintos outros atuaram.
Entre os novos ditongos que surgiram, encontram-se os ditongos decrescentes orais
[ej], [ow] e [oj], que sofrem, no estágio atual do Português Brasileiro, um processo
variável de monotongação, condicionado principalmente pelo contexto fonológico
seguinte. Alguns estudos apontam também, como motivação para monotongação,
a frequência da palavra e a classe morfológica.
Um dos objetivos deste capítulo é examinar, com base em gramáticas históricas
e pesquisas sociolinguíticas do Português Brasileiro, o comportamento variável do
ditongo decrescente em diversas regiões, para fins de generalização de resultados. Outra
meta é explicar, por meio da teoria fonológica, a constituição de ditongos e sua estrutura.
Parte-se do pressuposto de que o peso silábico é determinado por moras pós-pico,
pois sílabas leves só possuem a mora do pico. De acordo com Hyman (1985) e Hayes
(1991), não há moras disponíveis para vogais pretônicas. Todavia, o molde silábico
CVC é parametrizável, pois CVC é pesado para algumas línguas; para outras, não.
DOI: 10.4324/9781003294344-13
240 Leda Bisol, Valéria Neto de Oliveira Monaretto
Dentro do mesmo sistema, pode haver CVC pesado e CVC leve. No entanto, Gordon
(s/d), ao estudar várias línguas sob este prisma, observou uma hierarquia em que CVV
é a sílaba mais pesada, seguindose CVC [+soante], CVC [soante] e finalmente CV.
Há casos específicos, a exemplo do que ocorre em Português: em dado contexto,
o traço alto da palatal ou do tepe estende-se para esquerda, formando um glide,
a exemplo de caxa/caixa, fera/feira, pexe/peixe, (Bisol, 1992). Nesse caso, CVC
funciona como sílaba leve, pois o glide só emerge na estrutura de superfície.
Uma atenção especial é dada ao ditongo decrescente que, sem peso, traz a peculiari-
dade de apresentar um glide no onset de sílaba inicial, provocando uma discussão teórica
em função da quebra de hierarquia de sonoridade, como vemos no andamento do texto.
(a) metátese de [i] tônico com a elevação da vogal seguida pela simplificação
do ditongo sabῐa > saiba; rŭbĕu > ruivo; sapŭit > soube; januarῐu > janeiro;
passīone > paixão; primarῐu > primeiro1
(b) vocalização da primeira consoante dos grupos consonantais mediais >lacte>
leite; ŏctu > oito; mŭltu > muito; saltu > souto; regnu > rein
(c) síncope de consoantes intervocálicas, mau; lĕge > lei; crudeles > cruéis; caelu
> céu; soles > sóis
(d) desfazimento de hiato por epêntese, crēdo > creo > creio; arena > área>
areia; tela > tea > teia
Tabela 10.1 Monotongação de [ej] pelos estados Brasileiros, segundo o Atlas Linguístico
do Brasil
Autor/Ano /Local Freq. Monot. Tepe cont. Fric. Pal. Morfologia Escolar
Seguinte Cont. Seguinte Parte do sufixo baixa.
(beira) (peixe, queijo) (sapateiro)
O ditongo ei, diferente dos demais, apresenta uma distribuição que diferencia
regiões pela realização de monotongação. Observa-se, na Tabela 10.1, a seguir,
que o peso relativo de aplicação da regra mostra-se favorável na região da Bahia,
enquanto nos estados do sul do país mostra-se desfavorecedor.
Na Tabela 10.1, podemos observar a distribuição espacial de [ey] e constatar
que o ditongo é uma variante predominante nos estados do extremo sul do Brasil
e no norte, no estado do Pará, segundo fontes de Atlas Linguísticos regionais. Nas
demais regiões, predomina o caráter variável entre as duas variantes.
Os principais condicionadores para a monotongação do ditongo ei são, con-
forme dito anteriormente, o contexto seguinte tepe (beira, solteira) e fricativa pala-
tal (peixe, queijo). A baixa escolaridade também parece ter algum papel. Vejamos
alguns estudos, em diferentes regiões Brasileiras, de modo comparativo, para fins
de generalização de resultados expostos na Tabela 10.2.
O ditongo no Português Brasileiro 247
O glide, como qualquer consoante à esquerda do pico, não tem peso, (3a, c), mas
tem ao situar -se à direita do pico (1b), formando sílaba pesada. As representações
(3a, b, c) constituem as estruturas básicas de sílaba com glide. A moracidade, a
sonoridade e o molde silábico são os alicerces da silabificação.
Em termos universais, qualquer segmento sonoro pode ser PICO, todavia, em Por-
tuguês, somente a vogal, como em outras línguas neolatinas. A partir do núcleo,
formam-se demissílabas de acordo com Clements (1999), tanto à esquerda quanto à
direita, atendendo ao molde silábico. Que o glide tenha peso à direita do pico e não
tenha à esquerda é o esperado, ainda que compartilhe da mora básica em virtude de
sua sonoridade. Mas (3a) levanta um problema, ao considerarmos o caráter implica-
cional da escala de sonoridade com a qual se estabelece a sub-hierarquia de Onset/X:
Um segmento V é
Dois segmentos CV pá
VC ar
VG ai
Três segmentos CVC par
(Continuado)
O ditongo no Português Brasileiro 249
(Continuado)
VGC eis
CGV piá
Quatro segmentos CCVC cros(ta)
CVCC perspectiva
CVGC seis
CCGC claus(tro)
A sonoridade e a moracidade por si sós não dão conta das propriedades específicas
de língua particular. Daí o papel das condições fonotáticas:
i /u j/w
Vocálico + -
Consonantal - -
Todavia com respeito ao ditongo, foco deste estudo, o Português não possui uma distin-
ção robusta entre ditongo crescente e hiato, pois todo ditongo crescente está em variação
com hiato, com apenas uma exceção, facilmente enumerável, como vemos em (11).
Diferença entre maior ou menor proximidade entre glide e vogal não é pertinente
em Português:
(11) água, quais, adequar, enxaguar, quadro, quotidiano, quatorze, Paraguai, Uru-
guai e raras mais.
O ditongo crescente com alternância do hiato é regra geral. Feita essa descrição,
retomemos a questão posta em páginas precedentes quanto à hierarquia de sonor-
idade, que tomamos a liberdade de repetir: Como se justifica o glide em posição
inicial se o Português não admite nessa posição o tepe, incluído entre as líquidas?
Não são muitos os exemplos, mas existem iodo/jodo, iame~jame,
Iolanda~Jolanda, etc. Smith (2003, 3–8), que discutiu esse problema incluindo
o caso da Campidonia Sardinense, observa que há línguas que proíbem róticos ou
líquidas no onset, mas aceitam glides. O autor propõe que a restrição *Onset/X
seja explicitamente definida para ser sensível ao status mórico dos segmentos, cuja
sonoridade é avaliada, excluindo o glide dessa categoria.
(13) *ONSET/X
The leftmost pre-peak nonmoraic segment in a syllable does not have sonor-
ity level X.
(Smith, 2003, 3).
O glide à esquerda do prépico fica fora da escala de sonoridade, isto é, fica descom-
promissado com o Princípio de Sequenciamento de Sonoridade.
O ditongo no Português Brasileiro 251
Neste texto, todavia, optamos por conservar o glide com seu valor de sonori-
dade em ambas as posições, distinguindo-se sílabas ótimas de não-ótimas. Dois
são os motivos: a) o glide em Português é, na subjacência, vogal alta, diferen-
ciandose no processo de silabificação em que se consonantiza; b) o glide vai para
o pré -pico inicial somente quando não há consoante disponível, segundo Harris;
Kaisse (1999). Consequentemente, não há quebra de sequenciamento de sonori-
dade, pois, diferentemente das línguas citadas por Smith, as líquidas em Português
ocupam a posição inicial do onset, com exceção apenas de um segmento, o tepe, o
qual, por essa razão é marcado. Nas línguas do mundo, há sílabas marcadas com
respeito a sua formação, como, por exemplo, ausência de onset, V frente a CV,
assim como com respeito à gradiência de sonoridade do pico com suas margens.
A sílaba CVC contém duas partes, CV e VC, de acordo com Clements (1999),
cada parte constitui uma demissílaba. Sílabas que fogem a isso são relativamente
marcadas por um mecanismo operacional que estabelece gradações. Não entrare-
mos nesse detalhe, mas a uma vista de olhos, ressalta-se a proximidade entre vogal
alta e glide em termos da escala de sonoridade, de modo que um glide no onset
forma uma demissílaba não ótima, enquanto um glide na coda forma uma demis-
sílaba ótima, ambas pertinentes ao sistema.
Quanto maior a distância entre pré-pico e pico, melhor é a sílaba (Clements, 1999).
Nesse sentido, uma demissílaba como pja.no é ótima. Neste estudo, deixamos o
glide com seu valor escalar, pois não há pulos em se tratando do Português, uma
vez que nasais e líquidas ocorrem nesta posição, exceto o tepe.
Kaisse; Hyman (1999) sustentam a proposição de glide no onset com fartos
exemplos do espanhol da Argentina. Menos pródigo do que o espanhol da Argen-
tina, o Português também os tem, alternando com hiato: iame/jame, iodo/jodo,
suada/swada, etc.
Vale observar um caso específico: os verbos ver e vir do latim vedere, venire,
respectivamente, 2ª e 3ª conjugação, têm, na sincronia, uma base em comum,
veo, no presente do indicativo de ambos os verbos. Na silabificação, para evitar o
hiato, emergem, por harmonia concomitante, o glide e a consoante palatal que, sem
representação no input, funcionam como epêntese, distinguindo-os veo/venho, verbo
vir; veo/vejo, verbo ver, a exemplo da primeira pessoa do presente do indicativo.
(15)
v+ e+ o (ver) v+ e+ o (vir)
morfologia veo veo
epêntese vejo veño
252 Leda Bisol, Valéria Neto de Oliveira Monaretto
(16)
Português Espanhol
mƐl miel
sƐte siete
pƐdra piedra
Assim finda esta parte, generalizando em termos seguintes: o Português não dispõe
de ditongo crescente senão em alternância com o hiato.
O glide pós-pico ocupa a mesma posição que a soante. Exemplos são do tipo pai/
par, mau/mal; a segunda posição é /S/em suas duas facetas ou soante.
Vogal seguida de obstruinte coronal ou soante forma sílaba pesada, (19a); sílaba
superpesada é constituída de glide seguido de [cor + cont], (19b). Por sua vez,
as sequências rs e ls também formam sílabas superpesadas, 19c). Tais exigências
fonotáticas estão sob o controle da Condição de Coda.
O ditongo nasal decrescente em posição final tende a atrair o acento: paixão,
sermão, verão. As exceções, órfão, órgão, sótão e outras, são marcadas em relação
ao acento. Todavia, há casos em que o glide pós-pico também se alinha à mora da
base, formando uma sílaba leve, como veremos a seguir.
Por conseguinte, CVC, no caso, é uma sílaba leve, pois o glide em b) só emerge na
estrutura de superfície. Por outro lado, o ditongo /ow/ tende a tornar-se monotongo:
ouro/oro, couro/coro, pouco/poco.
Conclusão
Os ditongos no Português oferecem um vasto campo de investigação desde as
origens do fenômeno, o percurso evolutivo, o comportamento variável e a inter-
pretação fonológica. Em especial, na variedade Brasileira, diferentes análises são
propostas, mas a maior parte dos trabalhos concorda sobre a existência de ditongos
fonéticos e ditongos fonológicos.
Dentre os ditongos orais decrescentes, três sofrem a monotongação variável (ai,
ei, ou), sendo o ditongo ai o que menos sofre o processo, seguido por ei e por ou. O
ditongo ei é o que apresenta uma distribuição espacial diferenciada pelas diferentes
regiões Brasileiras no que diz respeito ao processo de redução, motivo pelo qual
talvez seja o mais estudado entre os pesquisadores.
A análise fonológica proposta aqui detém-se na formação do ditongo, dis-
cutindo-o como sílaba pesada ou leve no formato CVC, seguindo a teoria das
moras, através da qual moracidade, a sonoridade e o molde silábico são os alicerces
da silabificação. O Português não dispõe de ditongo crescente senão em alternância
com o hiato. Já o ditongo decrescente não tem hiato como contraparte, formando-
se o glide na silabificação. Em relação ao ditongo nasal, há diferentes propostas. O
256 Leda Bisol, Valéria Neto de Oliveira Monaretto
tema é complexo e rico. O ditongo nasal pode ser formado pelo traço nasal de VN
que se estende para a esquerda, formando um glide.
Apesar das diferentes abordagens de estudo, os ditongos no Português Brasileiro
carecem de investigações diacrônicas e de descrições sincrônicas mais amplas e
gerais pelo seu vasto território. Estudos em fontes primárias do Português Bra-
sileiro, com acesso digitalizado e automatizado de dados, podem contribuir para a
busca de pistas acerca da cronologia do percurso evolutivo dos ditongos e para se
compreender melhor os fenômenos de variação e mudança envolvidos.
Notas
1 William (1975, 43) observa que as consoantes que se fundem com o iode (exceto s e
ss) evitam a atração da vogal: allῐum > alho; facῐo > faço; aranĕam > aranha. O autor
comenta também que a atração ocorreu relativamente tarde com em palavras em que ai
não se tornou ei, como em sabia para saiba. Tais palavras têm sido localizadas pelo fim
do século XIII como uma tentativa de relacionar com a silabação castelhana ou por uma
origem regional, vindo ei do norte, e ai, do sul.
2 A opção entre ditongo é hiato é resolvida, na ortografia, pelo artifício do acento gráfico,
como em saída, traíra, aí, por exemplo, ou pelo uso do grafema h, como ocorre em Bahia,
por exemplo, em que há hiato. Essa letra é usado para se distinguir de baiano, com ditongo
Na tradição da escrita antiga, era comum o uso de h para demarcar o hiato em encontros
vocálicos com a, como em sahida, ahi.
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O ditongo no Português Brasileiro 257
Resumo
Neste texto, retoma-se uma pergunta clássica em linguística: processos fonológicos
variáveis podem ser morfológica e lexicalmente condicionados? A partir de uma
problematização da hipótese neogramática, segundo a qual a mudança sonora não
acessa informações gramaticais ou lexicais, empreende-se uma discussão sobre o
que se entende por condicionamento morfológico e lexical em teoria fonológica e,
em particular, em modelos que se propõem incorporar fenômenos fonológicos var-
iáveis. Nesse sentido, discutese, por um lado, o papel de morfemas específicos car-
acterizando alvos ou gatilhos de processos e classes de palavras mais suscetíveis
a determinados processos e, por outro, itens lexicais mais ou menos frequentes. O
fenômeno de apagamento de t/d em inglês americano (Labov et al., 1968; Guy, 1980,
1991, 1996; Guy; Boyd, 1990; Bybee, 2002; entre outros), que se mostra sensível à
distinção entre monomorfemas e formas verbais de passado (ex. mist ~ misø ‘névoa’;
missed ~ misø ‘esquecerpret’.), é pano de fundo da discussão, que tem como foco, em
Português Brasileiro, a redução da nasalidade de ditongos finais átonos (Votre, 1978;
Guy, 1981; Battisti, 2002; Schwindt; Bopp da Silva, 2010; Schwindt, 2012, Chaves,
2017; Schwindt; De Bona, 2017), processo que apresenta comportamento distinto
para não verbos e verbos (ex. viagem ~ viag[ɪ]; comeram ~ comer[ʊ]), interagindo,
neste último caso, com o fenômeno morfossintático de concordância na língua.
1 Introdução
A maioria dos trabalhos sobre variação fonológica inclui a investigação de vari-
áveis relacionadas à morfologia e ao léxico, como classe gramatical, localização
morfológica de alvos ou gatilhos de processos, frequência lexical etc. Para além
da demanda descritiva, a inclusão dessas variáveis veicula uma hipótese sobre
arquitetura gramatical, a de que a mudança sonora acessa informação léxico-
morfológica. Tal hipótese foi contestada pelos neogramáticos, no século XIX, e
esse entendimento se estendeu à fonologia estruturalista e aos modelos fonológicos
gerativistas. A reação a essa premissa do modelo neogramático veio inicialmente
DOI: 10.4324/9781003294344-14
260 Luiz Carlos Schwindt, Raquel Chaves, Gregory Guy
de dados de uso, contudo, impõe que se explicite o problema nessa escola. É o caso
da noção de alofonia, por exemplo, que se mostra insuficiente para dar conta de
alternâncias não categóricas, que são rotuladas como variação livre. Nesse modelo
também se fortalece a ideia de níveis de análise: a morfologia se relaciona com
a fonologia em mapeamentos morfofonêmicos – ainda que não tenham relação
necessária com a variação fonética propriamente dita.
Interpretando a visão neogramática da mudança – e essencialmente a pre-
conizada por Herman Paul (1880) – com a abordagem estruturalista em sentido
mais geral, podemos dizer que mudanças afetam fonemas, não palavras, razão
por que palavras não podem condicionar variação e consequente mudança. Isso
é assim porque, para o estruturalismo, palavras e morfemas não têm identidade
fonológica independente; são produto, a rigor, da associação de unidades com
esse estatuto, os fonemas. Palavras mudam, portanto, nessa concepção, porque
fonemas mudam.
No gerativismo, assume-se inicialmente que a linguagem humana distingue o
conhecimento internalizado da língua, sua competência, de aspectos de perfor-
mance. À competência, em oposição à performance, dizem respeito as alternâncias
predizíveis – quando não categóricas, opcionais, mas não exatamente variáveis. De
arquitetura modular, também conhecida como gramática em Y, o modelo inicial da
teoria gerativa não tem morfologia, vê o léxico como um repositório de idiossin-
crasias e concebe a fonologia como interface interpretativa.
Chomsky publica, em parceria com Morris Halle, a obra The sound pattern of
English (SPE),2 que concebe que à estrutura fonológica, ainda pós-sintática, com-
pete, como na sintaxe, mapear representações subjacentes com representações de
superfície. Nasce aí a fonologia gerativa, em geral referida como fonologia clássica
(Chomsky; Halle, 1968). O mesmo ocorre na morfologia, quando Chomsky, em
1970, publica o texto Remarks on nominalization, no qual admite que possíveis
regras específicas ao léxico e à morfologia operem num componente que precede
a sintaxe. Esse modelo baseia-se no que se convencionou chamar hipótese lexical-
ista, e funda a morfologia gerativa ou lexical.
262 Luiz Carlos Schwindt, Raquel Chaves, Gregory Guy
entidades, sob esse ou outro rótulo, seriam produto de mapeamento específico entre
cadeias fonológicas e sentido, fundadas em informação sobre frequência. Assim,
também não parece próprio se falar em condicionamento morfológico da fonologia
variável nesse modelo – ao menos não no sentido de se depender de informação
presente em primitivos a partir dos quais se decompõem as palavras.
Como vimos nesta seção, não há nas versões iniciais dos modelos formais, her-
deiros da hipótese neogramática, previsão para tratamento de fenômenos fonológi-
cos variáveis ou morfológica ou lexicalmente condicionados. Na ET, herdeira em
certa medida da hipótese da difusão lexical, o lócus da representação mental se
desloca de primitivos fonológicos e morfológicos para a palavra. Se, por um lado,
isso contribui favoravelmente para o argumento de que a fonologia variável é indis-
sociável da informação lexical, por outro configura um obstáculo para se argumen-
tar que esses processos acessam morfemas específicos.
Não é nossa intenção neste texto eleger o modelo ideal, mas problematizar a
questão do condicionamento morfológico e lexical em seu fundamento. Como
veremos na seção seguinte, há evidências de que alguns processos fonológicos
variáveis acessam efetivamente informação morfológica e lexical. Nesse sen-
tido, o que chamamos aqui de condicionamento morfológico pode se traduzir
como categoria ou contexto de aplicação de um processo fonológico variável.
Quando dizemos que determinado fenômeno se aplica a uma classe gramati-
cal particular ou que seu alvo ou gatilho é um morfema específico, ou se situa
no domínio de certo morfema, falamos de acesso à morfologia. O mesmo vale
para uma palavra ou um lexema em específico. O fato é que, numa hipótese de
gramática modular, seria impossível explicar tais processos sem se admitir que
o módulo fonético-fonológico, que abriga a variação, se comunica com outros
módulos, supostamente restritos a alternâncias categóricas. Também a referên-
cia à frequência de itens lexicais precisa estar codificada em sua entrada ou em
algum ponto da gramática e estar acessível à fonologia variável, se a condiciona
em alguma medida. Definido, assim, descritivamente o condicionamento a que
nos referimos, cabe à teoria linguística responder se as informações morfológica
e lexical são de mesma natureza se correspondem ao mesmo módulo – ou de
natureza distinta.
O apagamento de t/d em final de palavra (ex. mist ~ mis∅ ‘névoa’, missed ~ mis∅
‘perderpret’) é um processo amplamente disseminado na língua inglesa e para o
qual se relata influência de variáveis linguísticas e sociais.4 Estudos sobre o IA,
como os de Labov et al. (1968), Guy (1980, 1991, 1996), Guy; Boyd (1990), entre
outros, mostraram que o fenômeno tem acesso à morfologia interna da palavra,
isto é, que o apagamento ocorre mais quando as consoantes em questão integram
um monomorfema e menos quando fazem parte do sufixo verbal, como mostra a
Tabela 11.1, a seguir.
Tabela 11.1 Apagamento de t/d em IA por classe morfológica (corpus de Guy, 1991)
Observe-se que ler o resultado da Tabela 11.1 pela perspectiva da classe gra-
matical levaria a uma interpretação errada sobre o fenômeno, já que, como se
vê, formas verbais de passado irregular se assemelham mais a não verbos do que
a formas verbais de passado regular (Guy, 1996, 227). Daí, inclusive, ser mais
adequado neste caso referir-se a monomorfemas do que a raízes na categorização
dessa variável, já que não é tácito se, no caso de verbos irregulares, -t e -d podem
ser depreendidos da raiz a que se ligam. Aliás, essa é a provável explicação para o
resultado: o processo é mais evitado à medida que a fronteira morfológica é mais
perceptível pelos falantes/ouvintes da língua.
Na perspectiva das fronteiras preconizadas pelo SPE, Guy; Boyd (1990, 4)
propõem que a fase mais avançada desse processo resulta em formas subjacentes
com a demarcação dos limites morfológicos em (1). A resistência ao apagamento
estaria, assim, relacionada à força das fronteiras (sendo ‘#’ a fronteira mais forte).
outros, indicam que quanto mais frequente uma palavra é na língua, maior a proba-
bilidade de elisão.5 Meyers; Guy (1997), analisando dados de conversação de dois
trabalhadores da Filadélfia, constataram efeito de frequência sobre o fenômeno:
palavras de frequência mais alta apresentaram maior índice de apagamento do que
as de frequência mais baixa, confirmando a preferência por monomorfemas em
relação a verbos (nesse caso, não foi possível se distinguirem verbos semifracos,
dada a baixa ocorrência dessas formas na amostra). Bybee (2000), ao reanalisar
dados de estudo prévio sobre o apagamento de -t/-d no inglês chicano (Santa Ana,
1991), também encontra efeito relevante de frequência: palavras de alta frequência,
tanto verbos regulares quanto os irregulares duplamente marcados em termos de
flexão de passado, apresentaram cerca de 20% a mais de apagamento do que sua
contraparte de baixa frequência. Guy; Hay; Walker (2008) encontraram igualmente
privilégio de apagamento entre itens mais frequentes no inglês da Nova Zelândia,
em estudo envolvendo 19 sujeitos. Monomorfemas se apresentaram como itens de
maior frequência, seguidos, nesta ordem, de verbos semifracos e verbos fracos, e o
efeito da morfologia, apesar de mantido, se mostroumais modesto quando consid-
erada a frequência lexical.
Tabela 11.2 Redução da nasalidade no sul do Brasil por classe de palavra (Schwindt; Bopp
da Silva, 2010)8
Não é incomum que morfologia e léxico sejam tratados como sinônimos em teorias
linguísticas. Esse tratamento nem sempre tem a mesma motivação. A própria con-
trovérsia neogramática revela essa relação: de um lado, os neogramáticos propõem
que a mudança do som não acessa informação gramatical; de outro, os proponentes
da difusão lexical enfatizam que é o item lexical (a palavra) que tem sua própria
história. No estruturalismo norte-americano, em que as relações sintagmáticas
estabelecidas entre morfemas ganham centralidade, essa distinção se torna mais
clara, e léxico passa a ser visto como lista (de palavras ou morfemas), algo a ser
memorizado, opondose à mecânica responsável por flexionar e formar palavras. O
gerativismo clássico segue entendendo léxico como lista e inclui nesse repositório
todo processo afetando palavras que não seja passível de descrição sintática. É a
partir da difusão da hipótese lexicalista, como vimos, que se propõe o enquad-
ramento do léxico na gramática, considerando, muitas vezes, sua combinação à
morfologia e, mais adiante, à fonologia. Abordagens que veem a morfologia espel-
hada na sintaxe, por outro lado, como a da DM, em sua proposta básica, preser-
vam a ideia fundamental de que objetos não passíveis de processamento sintático
são armazenados em listas (uma leitura possível de léxico, ou léxicos). Salvaguar-
dado o formato da representação, essa é também a visão da ET, no sentido de que
unidades mais frequentes são mais facilmente acessadas na memória, onde estão
armazenadas (listadas), do que unidades menos frequentes.
Os dois fenômenos que discutimos neste texto – o apagamento de t/d em IA e a
redução da nasalidade em PB – apresentam evidência de acesso à estrutura interna
da palavra mais do que à palavra inteira.
Em ambos os fenômenos está em jogo aparentemente a ideia funcionalista de
distintividade contrastiva (Kiparsky, 1982a), segundo a qual determinadas porções
fonológicas das palavras seriam protegidas de apagamento para se preservar infor-
mação gramatical. Essa seria supostamente a explicação para os índices menores
de apagamento de t/d em verbos regulares do IA e de redução da nasalidade final
em verbos em PB (particularmente em verbos em que a nasal é, sozinha, marca de
número-pessoa). Guy (1996) e Schwindt (2016) contraditam a resposta funcional-
ista para tais fenômenos e propõem alternativas de formalização dos processos. A
chave para essa formalização está no reconhecimento do fato de que o falante acessa
a estrutura interna das palavras envolvidas. Em outras palavras, se há evidência de
que apagamos (em maior ou menor proporção) ou deixamos de apagar um determi-
nado som porque entendemos que uma fronteira morfológica é mais forte ou mais
fraca, a função propriamente dita desse morfema é, a rigor, informação secundária.
Como vimos, em relação ao apagamento de t/d, Guy; Boyd (1990) formalizam esse
entendimento fazendo uso de fronteiras + e #, na perspectiva do SPE, enquanto
Guy (1991) propõe o nivelamento dos processos, na perspectiva da LPM. No que
concerne à redução da nasalidade, Schwindt (2016) sugere, na perspectiva da OT,
que uma restrição de estrutura silábica que penaliza codas com nasais subespecifi-
cadas (Kager, 1999; Battisti, 2003), CodaCond, é limitada em se tratando de
verbos da língua por uma restrição que proíbe apagamento do morfema indicador
270 Luiz Carlos Schwindt, Raquel Chaves, Gregory Guy
indexadas para classes lexicais, seguindo o que propuseram Itô; Mester (1999) e
Pater (2000), na perspectiva da OT. De fato, seja qual for o modelo, essa indexação
não se confunde com efeito de frequência lexical propriamente dita, mas é uma
alternativa para formalizar aquilo que Meyers; Guy (1997) referem como excep-
cionalidade variável.
Outro aspecto que não pode ser ignorado é, como sinalizamos anteriormente,
a possibilidade de determinadas formas aparentemente variáveis representarem a
rigor mais de uma entrada lexical, isto é, de terem sido lexicalizadas como alter-
nantes subjacentes (ex. an/and, em IA, ou garage/garagem, em PB). Decidir,
porém, sobre que formas sofreram esse processo depende de medidas mais com-
plexas, como identificação de alternâncias distintas entre cada uma das formas em
competição (como pode ser o caso de -mos e -mo, marcando a 1ª pessoa do plural
em PB, como propõe Guy, 2000).
Esses fatos sugerem que se estabeleça com relativa clareza a distinção entre
léxico, lugar de armazenamento de itens/entradas que carregam informação sobre
sua respectiva frequência, e morfologia, componente da gramática responsável
pela flexão e formação de palavras. A fonologia variável é alimentada por esses
itens lexicais e interage, via gramática, com a morfologia. A morfologia, de caráter
autônomo, pode ou não interagir com frequência, razão por que, nos casos de fono-
logia variável morfologicamente condicionada, a tese de que itens mais frequentes
estão mais sujeitos a apagamentos não é generalizada. Em termos de processa-
mento e aprendizibilidade da linguagem, parece estar em jogo a prioridade de uma
ou outra das restrições (ou dos conjuntos de variáveis a elas relacionados).
5. Considerações finais
Agradecimentos
Este texto reflete em parte pesquisa desenvolvida pelos dois primeiros autores, sob
a supervisão do terceiro, em estágios realizados na New York University, fomenta-
dos, respectivamente, pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), assim discriminados: Estágio Sênior, entre 2013 e 2014,
processo BEX-18066/12–7, e Doutorado Sanduíche, em 2016, processo SWE-
201185/2015–6. A pesquisa do primeiro autor foi, ainda, fomentada pelo CNPq,
sob forma de bolsa de Produtividade em Pesquisa, processo PQ-310921/2018–0.
Agradecemos às agências mencionadas.
Notas
1 O interesse dos neogramáticos em explicar a mudança considerando famílias de lín-
guas justificou em certa medida o esforço em busca de generalizações supostamente
não sujeitas ao que consideravam exceções nessa escola. As leis fonéticas ilustram bem
esse entendimento. A Lei deVerner, por exemplo, surge, em 1877, para dar conta de
uma exceção à Lei de Grimm, proposta 50 anos antes, ou seja, para explicar por que
a correspondência entre obstruintes desvozeadas do proto-indo-europeu e fricativas
desvozeadas em proto-germânico (ex. bhráter / bróθer), às vezes falhava, permitindo a
emergência de segmentos vozeados (ex. patér / *faθér mas faðér). Ele propõe a inclusão
do contexto acentual na Lei, tendo em vista que observou que a fricativa desvozeada
estava restrita à posição postônica (e ao início de palavras). Propostas de reformulações,
sempre nesse mesmo espírito, se sucederam à Lei de Verner.
2 Nomes de teorias e alguns outros termos próprios de modelos específicos são designados
neste texto por acrônimos de seus nomes em inglês, em virtude de seu amplo uso na área
sob a forma dessas siglas.
3 Rotulamos como formais os modelos que em alguma medida opõem um componente
abstrato a um componente concreto da gramática, em alusão à dicotomia saussuriana
forma/substância, extensível à oposição chomskiana competência/performance.
4 Pesquisas sobre o inglês britânico (Tagliamonte; Temple, 2005; Baranowski; Turton,
2020; entre outros) não apresentam consenso no que diz respeito a condicionamento
morfológico no fenômeno de apagamento de t/d em final de palavra.
5 Por outro lado, em estudo sobre o fenômeno no inglês canadense, Walker (2012) não
encontra evidências que atestem o papel da frequência sobre o apagamento de t/d.
6 Do ponto de vista fonético, há casos em que a nasalidade é preservada, gerando monoton-
gos ou ditongos homorgânicos (ex. órg[ʊ̃] ~ órg[ũw̃]; garag[ɪ]̃ ~ garag[ĩj]̃ ), de difícil
diferenciação de oitiva. Tais casos em geral são considerados não aplicação do processo
na maior parte das análises, por não envolverem propriamente redução da nasalidade.
Esse fenômeno, contudo, parece estar relacionado à desnasalização. Como sinalizam
Guy (1981) e Schwindt (2015), o fato de nesses casos a vogal nuclear sempre assumir
articulação semelhante à do glide, sinaliza para um ordenamento da monotongação (ou
criação do ditongo homorgânico) antes da redução da nasalidade.
7 Os dados de Votre (1978) e Guy (1981) provêm do Projeto Competências Básicas do
Português e se referem a amostras de estudantes de etapas iniciais de um projeto de
alfabetização de adultos da época, o MOBRAL.
8 www.varsul.org.br.
9 No recorte de dados quantificados nesta tabela, estão excluídos os itens lexicais (não
verbais) homem, jovem, viagem e origem, em função da alta frequência desses dados na
amostra em exame.
276 Luiz Carlos Schwindt, Raquel Chaves, Gregory Guy
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