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UFRRJ
ICHS
DDAS
CPDA
Aluno
Orientador
2001
ii
iii
Aluno
Orientador
Desenvolvimento, Agricultura e
em Sociedade e Agricultura
Rio de Janeiro – RJ
Fevereiro , 2002
iv
Banca Examinadora
Titulares
Suplentes
A vibração do Cosmos,
na inquietude de suas massas,
quer físicas, quer psíquicas,
sempre denuncia a
proximidade de um novo Nascimento.
Foi este estado de inquietação
que precedeu o advento da Vida
Teilhard de Chardin
Julian Huxley
Heidegger
vi
Dedicatória
Dedico esta tese à mulher que complementa meu percurso pela vida e que tanto me
faz feliz. À Martha faço esta homenagem, ilustrando o quanto sua presença ao meu lado
tem contribuído para minha satisfação sentimental, pessoal e profissional. Que nossa bela
Agradecimentos
Agradeço pela contribuição a esta tese ao meu orientador e amigo Prof. Dr. Roberto
José Moreira pelo acompanhamento da pesquisa e pelo grande entusiasmo. Espero que ela
corresponda.
CAPES.
Marandino), Curitiba (Maria Cilene F. Andrade & Zanatta) e Belo Horizonte (Mônica T.
Cândida e Juan Enrique Diaz Bordenave, assim como os irmãos João, Francisco, Verônica,
Paulo Ernesto Diaz Rocha é biólogo formado pela Universidade Santa Úrsula. Como
Lecionou Ciências para as primeiras séries assim que se formou. Fez o mestrado em
1995, participou do projeto de educação ambiental em Santarém, no Pará, onde morou por
Meio Ambiente, onde produziu uma fotonovela e trabalhou como arte-educador em Creche
SUMÁRIO
RESUMO .xvi
ABSTRACT .xvii
INTRODUÇÃO .1
Hipóteses .4
Objetivo primário .5
Objetivos secundários .6
Metodologia .6
- Seleção .7
- Entrevistas .14
CAPÍTULO I – E D U C A Ç Ã O , U N I V E R S I D A D E e S O C I E D A D E
CAPÍTULO II - A M B I E N T A L I S M O E I N S T I T U C I O N A L I Z A Ç Ã O
a. Dificuldades .167
xi
b. Complexidade .169
c. Caminhos .170
CAPÍTULO III – I N T E R D I S C I P L I N A R I D A D E
CAPÍTULO IV – P A R A D I G M A
a. Vida .283
b. Natureza .290
a. Complexidade .321
c. Transdisciplinaridade .333
CAPÍTULO V - C O N C L U S Õ E S F I N A I S .368
A N E X O S*
C. Questionário .406
L. Relação dos entrevistados por entre sete das grandes áreas. .426
curso. .433
paradigma. .436
RESUMO
áreas, sejam das áreas biológicas ou sociais. Foram selecionados quatro campos básicos na
mesmo modo, tal dinâmica parece congregar pensamentos emersos na complexidade das
nosso ver, tal questão se coloca como de fundamental importância para a sustentabilidade
planetária.
xvi
ABSTRACT
social process that needs to be better understood because its importance transcends their
questions also result in a useful contact among professionals of various backgrounds and in
a dialogue among researchers of both social and biological fields. Four program areas
offering such courses in Brazil are studied in this article: a) Ecology; b) Environment and
interviews with 28 course coordinators, teachers and students, basic information is obtained
courses of Brazilian universities. At the same time such process seems to congregate
thoughts which have emerged from the complex interaction (similarities and divergencies)
between the Biological, the Social and the Exact Sciences. In our opinion such discussion
poses itself as one of fundamental importance for the sustainability of the Earth.
INTRODUÇÃO
meio ambiente se constitui um processo social a ser compreendido. O estudo deste processo
demonstra sua importância não apenas na medida em que interfere na estrutura universitária
departamentalizada, levando ao trabalho conjunto entre unidades das mais diversas áreas
devemos reunir pelo menos duas das grandes dimensões do saber científico, as chamadas
inovador no Brasil, uma vez que tradicionalmente tais ciências são tratadas em separado,
por se defender que o ser humano é mais diferente do que igual aos demais seres da
realidade humana no que tange à sua relação com o meio ambiente, além dele mesmo, faz
pois parece refletir um modo de ser e de pensar particulares perante tanto à natureza, quanto
1
‘Disciplina’ é vista aqui como área científica distribuída em grandes áreas (segundo o CNPq), como por
exemplo: Matemática (Ciências Exatas e da Terra), Genética (Ciências Biológicas), Geotécnica
(Engenharias), Medicina (Ciências da Saúde), Agronomia (Ciências Agrárias), Direito (Ciências Sociais
Aplicadas), Filosofia (Ciências Humanas), Música (Lingüística, Letras e Artes) e outros. A palavra pode ser
vista, por outro lado, como instrução; como verbo, ensinar, educar; sujeitar[-se] à disciplina ou então fazer
obedecer ou ceder; castigar, punir (Dicionário Prático Michaelis. São Paulo: Melhoramentos, 1978). Ou seja,
apresenta significado de sistematização do conhecimento, processo educacional, imposição ou sofrimento.
2
É sempre bom frisar que no interior de cada área se encontram trabalhos interdisciplinares, reunindo temas
biológicos e humanos, como no caso das Ciências Agrárias, Florestais e Geográficas, mas também dentro de
áreas específicas como a Física, Química, Engenharia e Medicina. Não apenas a temática ambiental específica
promove a interdisciplinaridade, mas também, por exemplo, as grandes áreas da saúde e das agrárias e mesmo
as humano-sociais e engenharias incitam experiências que coadunam mais de uma área e/ou sub área do
conhecimento científico.
3
problemática ambiental emergem. Embora em princípio cada área aponte em uma direção
própria, a sociedade se encontra agora num momento de refletir sobre as diversidades entre
elas e passar a buscar não mais as suas diferenças, mas as suas igualdades. Por outro lado,
não queremos ser levianos em apontar para a possibilidade de uma unificação geral, uma
unidade universal das ciências (propositalmente no plural), já que sua diversidade e suas
diferenças internas também proporcionam sua evolução. A Ciência, portanto, é vista como
uma construção abstrata e não deve aparecer como totalitária e autoritária, porém múltipla,
complexo. Uma vez que todas as linhas divisórias precisas são arbitrárias, esta tentativa de
se seguir um caminho entre dois pólos em princípio opostos (como por exemplo, entre a
Espera-se que o resultado desta tese possa vir a ser útil na construção e reformulação
Do mesmo modo, esperamos que ela seja útil para que as agências de fomento possam
avaliar o atual estado da arte das ciências do ambiente e reconheçam os esforços dos
Hipóteses
seja nas Ciências Humanas e Sociais, seja nas Ciências da Natureza, têm sido um processo
recente e parece ter ganhado força e se expandido nos anos 90. A hipótese fundamental
as Ciências Biológicas e Humanas. Tem-se ainda por hipótese complementar que a origem,
inovação e/ou modificação curricular destes cursos universitários refletem, de algum modo,
interdisciplinar.
3
O uso das aspas simples se deve à referência de um termo ou palavra em si. Ou ainda sugerindo sua
relativização (veja exemplo ao final do item Questão Ambiental na Sociedade Capitalista no Capítulo II).
5
4. Que tipo de inserção e/ou alteração estaria ocorrendo nos currículos acadêmicos já
conhecimento?
Objetivo Primário
Objetivos Secundários
ambientais;
brasileira;
institucionalização;
interdisciplinares.
Metodologia
- Entrevistas semi-estruturadas
- Transcrição
4. Conclusões
7
- Seleção
foi basicamente uma análise qualitativa dos depoimentos de pesquisadores envolvidos com
estudo cursos strictu sensu ao nível de mestrado e/ou doutorado de quatro universidades
encontram três diferentes grupos: desde aqueles inseridos na área biológica como a
Ecologia e que inserem aspectos relacionados ao tema das áreas humanas/sociais, àqueles
que partem das áreas humanas/sociais com a inserção ambiental posterior e, finalmente,
construção das Ciências Ambientais.5 Vimos, portanto que há distinções de cursos que se
originam de uma unidade específica (Biológicas, Exatas e Humanas) daqueles que não são
4
Os dados quantitativos nos permitiram apresentar um panorama comparativo entre respostas, cursos e corpo
docente/discente, mas não optamos por uma análise estatística formal por não termos partido de uma
amostragem aleatória e numérica suficiente. Embora não tenhamos o intuito de quantificar o fértil debate que
a temática reúne, a matematização cumpre o papel de hierarquizar as diferentes abordagens expostas, visando
fornecer-nos um grau de importância de cada tema explicitado.
5
J. A. Drummond & A. Schroeder entendem por Ciências Ambientais “formas institucionalizadas de trabalho
interdisciplinar reunindo, de um lado, cientistas sociais e, de outro lado, cientistas naturais e cientistas das
áreas tecnológicas ou exatas, em torno de temas que caibam na interface sociedade humana - mundo natural”,
definição esta que assumimos. (Programas de Pós-Graduação em Ciências Ambientais e similares no Brasil -
uma listagem preliminar. Ambiente & Sociedade. Campinas: NEPAM, nº. 2, 1998, p.139).
8
mestrado e onze de doutorado em 1994/95, proporção que passa para sessenta e um e vinte
70
60
50
40
Mestrado
30 Doutorado
20
10
0
1994/1995 1996/1997 2000/2001
corpo docente é integrado por pesquisadores de diversas áreas científicas; graus de titulação
verificação dos programas dos cursos, das disciplinas e da produção acadêmica colaboram
modo, pudemos chegar próximo ao modo pelo qual a questão ambiental é formulada no
oferecida pela CAPES. Neste primeiro grupo, a maior parte envolve de algum modo a
utilizamos a relação elaborada por Drummond & Schroeder7 que listam, preliminarmente
seleção, apontamos para a possibilidade de trabalho com quatro grandes grupos de cursos,
a) Biológicas (Ecologia)
c) Humanas e Sociais
d) Ciências Ambientais
grupos.
Ciências Ambientais
6
Veja tabela em anexo (A) lista de cursos multidisciplinares aprovados pela CAPES em 2000/2001.
7
Drummond, J. A. & Schroeder, A. (op. cit.).
10
Ecologia
Quanto à seleção dos quatro cursos aqui pesquisados foram escolhidos aqueles que,
em sua formação que pareciam apresentar uma potencial complementação para a ótica
interdisciplinar.8 Ou seja, cada curso escolhido deveria contribuir com um ponto de vista
peculiar à discussão sobre o trabalho conjunto de várias áreas científicas. Dentre as áreas e
públicas (três federais e uma estadual) que representem, ao nosso ver, experiências
universidades mais antigas e os cursos que contam já com alguns anos de atividade.
que também nos serviu para a escolha foi em relação à distância do local de produção da
tese (Rio de Janeiro), uma vez que não pudemos contar com tempo e financiamento
Psicologia - UFRJ.
USP.
8
Embora se antecipe desde já que, sem dúvida alguma, os demais também tenham o que oferecer no debate
sobre interdisciplinaridade ambiental.
12
Dois deles (da UFPR e da USP) são considerados multidisciplinares pela avaliação
da CAPES em 2000/1 e obtiveram nota três (3) e quatro (4), respectivamente. Os outros
Psicologia (da UFRJ com nota quatro) e da Ecologia (da UFMG com nota cinco tanto para
o mestrado quanto para o doutorado). Além disto, dois deles (UFRJ e UFPR) têm a
resumidos serão agora apontados, visando a defesa da escolha feita. Mais à frente,
• UFMG - A pesquisa junto a esta universidade se destaca das demais, pois seu programa
dentro das Ciências Biológicas. Seu credenciamento foi no ano de 1989 (mestrado) e 1997
(doutorado). O curso foi escolhido por sua integração com o Centro de Desenvolvimento e
Planejamento Regional (CEDEPLAR). Durante sete anos (90-97), um grande projeto foi
realizado nas bacias dos rios Doce e Piracicaba, com o apoio do Programa Biodiversidade,
9
Em ordem alfabética pelo nome da universidade.
13
desenvolvimento sustentável, fez com que esta experiência tenha sido escolhida para
Tem sete dissertações defendidas (em 1999), sendo credenciado em 1993, mas tem uma
específico). Este viés principalmente de pesquisa regional vem contribuindo não apenas
para a diagnose dos problemas específicos, mas também parece colaborar para uma
ambiental para a comunidade, etc. Depois de muito debate, pretende-se reuní-los para
• UFRJ – Tendo como ponto de partida a área das Ciências Humanas, mais
Comunidades e Ecologia Social (EICOS) se mostrou de grande interesse para nós e com
um potencial inovador no trato dos problemas ambientais. Este campo pode trazer grandes
cognitivo, educacional, de relações de poder, etc. que surgem nos conflitos sócio-
interdisciplinares e seus organizadores têm investido para oferecer também o curso ao nível
(mestrado) e 1999 (doutorado), com ao menos quatro dissertações defendidas até este ano.
grande número de dissertações (trinta e oito até 1998), esta universidade foi escolhida
devido não apenas por sua importância em nível nacional e internacional, mas também por
ter evoluído a partir de uma integração com várias parcelas da universidade, procurando
unidades. Este curso foi recomendado em 1994 e teve seu credenciamento em 1998,
- Entrevistas
entrevistador e ao pesquisador.10 Para tal, os pesquisadores teriam que ter tempo para a
entrevista (cerca de uma a uma hora e meia de duração), pois evitamos o uso de correio
eletrônico (usado apenas como suporte prévio e posterior ao encontro pessoal). A escolha
dos entrevistados também foi feita procurando uma maior diversidade de profissões, pontos
de vista distintos que possam contribuir para a temática. Foram entrevistados quatro
10
Também foram entrevistados ex-coordenadores e ex-alunos que participaram do projeto no caso da UFMG.
Entrevistas de outros pesquisadores também colaboraram, mas foram utilizadas como uma comparação
qualitativa posterior, somando algumas colocações e, portanto, não entrando no cômputo geral.
15
coordenadores, doze professores e doze alunos, somando ao final vinte e oito pesquisadores
hipóteses centrais da tese, sendo que elas foram agrupadas em quatro eixos básicos que se
sociedade.
procura revelar se a criação de programas como estes confirmam ou não uma mudança
11
Segue em anexo (B) a lista de entrevistados e suas respectivas profissões. Preferimos resguardar seus
nomes, substituindo-os por ‘códigos’: a sigla da universidade, se professor (Prof) ou aluno (Alun) e uma letra
de A a D para os primeiros e de A a C para os segundos. Às vezes, nos referimos também a qual questão se
refere tal resposta, indicando com um Q seguido do número correspondente (de 1 a 12).
12
Segue em anexo (C) o questionário. A última questão foi feita com o intuito de obter um retorno à pesquisa,
pensando avaliar sua relevância. Esta pergunta contribui como um posicionamento do entrevistado perante à
perspectiva sobre o tema desta tese e será apresentada também em anexo (D).
13
Com a noção de ‘mudança paradigmática’ queremos colocar uma distinção entre uma percepção
mecanicista e dicotômica (sujeito x objeto) de uma organicista e dialética (sujeito + objeto)
16
naturais.
frase. Ou seja, houve a retirada de trechos sem importância direta para o contexto da
Do mesmo modo, foram feitas modificações estruturais nos textos sem, no entanto, alterar
o sentido dado pelo entrevistado e captado pelo entrevistador. Assim, retiramos partes
Portanto, os trechos de entrevistas que seguem aparecem com alguma modificação, não
sendo literais.14
comparativos visando tanto a uma análise geral do assunto tratado, quanto à comparação
visando a discernir facetas específicas de cada ator e grupo de atores neste processo de
14
Certamente não quisemos correr riscos de perder trechos dos depoimentos, mas tivemos que optar por este
processo devido ao grande volume de informação obtida.
17
com o formato da questão feita, isto é, buscamos retirar informações tanto qualitativas
respostas que esta tese busca responder, optamos por enquadrar as questões nos eixos
básicos, já descritos.
15
Como resultado quantitativo geral das entrevistas, das 336 perguntas pretendidas (doze questões x vinte e
oito entrevistados), apenas trinta ficaram sem resposta (8.9%), abstenções estas divididas igualmente entre
alunos e professores.
18
CAPÍTULO I
Conclusões preliminares
19
E. Morin
saber e da busca da verdade. Sua vitalidade talvez possa ser creditada à capacidade de
diálogo entre antigo e novo, clássico e moderno, consagrado e emergente, mesmo com
tamanha tensão, tanto interna quanto externa a ela, que dificulta tal conversa. Neste sentido,
tanto rever o passado quanto avaliar o presente e pensar no futuro fazem parte do currículo
universitário, que procura investigar a fundo as realidades que conformam nossa sociedade.
Sendo um local onde se encontram jovens e adultos com intuito de aprender e ensinar, a
universidade promove uma integração única como instituição social. Uma questão
primordial que caracteriza sua múltipla essência e que exige um trabalho integrado é
16
Morais, Regis de. Campinas: UNICAMP, 1995, p. 45. Veja também a obra de B. R. Clark Places of
Inquiry. U. California Press, 1995 e The Higher Educational System: academic organization in cross-national
perspective. Bekley, 1983.
20
transecular”, dispondo de autonomia para promover uma conservação ‘fértil’ (que salva o
passado contra as “potentes forças de desintegração cultural” deste século) e não ‘estéril’
(quando dogmática, fixa e rígida). C. Buarque18 coloca ainda que ela tem a missão de
participar da realização do processo civilizatório, não apenas através do saber técnico, mas
também estético e ético, o que nos remete à devida importância da inserção da problemática
inclusive a Deus. Com o advento da ciência experimental no século XVI, ela teve que
17
Morin, E. De la reforma universitária. In: Trabajo social. México: UNAM, p.49-55, 1997. Tradução
própria.
18
Buarque, C. A desordem do progresso: o fim da era dos economistas e a construção do futuro. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 3a ed., 1990.
19
In: Teixeira, Anísio. A universidade de ontem e de hoje. Rio de Janeiro: UERJ. Prefácio, p.11, 1998. Contra
a “acelerada midiatização”, F. Guattari sugere uma “era pós-mídia”, cuja evolução tecnológica seja possível
“para fins não capitalísticos”. (As três ecologias. Campinas: Papirus, p.47, 1990).
21
XVII, a universidade tem sido criticada por seu isolamento do mundo e por uma erudição
monástica, sendo sua porção funcionalista fruto de uma doutrina política desagregadora.
Industrial houve o cuidado com a transmissão deste saber, “pois a massa maior de
assistência social.21
Somente nos fins do século XIX começaram a surgir exemplos de instituições que
prezavam o caráter prático do saber das pesquisas aplicadas, contrastando com a mera
20
Morais, R., op. cit., p. 68.
21
Segundo M. Coutinho (pessoalmente), o conceito de extensão universitária só começara com as research
university após o século XIX.
22
Buarque lembra que a partir da tecnologização do projeto humano, a universidade passou a ficar
marginalizada da inovação técnica, perdendo por algum tempo o destino, uma vez que as buscas de novos
conhecimentos se faziam cada vez mais em laboratórios particulares de grandes empresas.
23
Teixeira, A., op. cit., p. 47, 1998.
22
trabalho numa única instituição acadêmica. Entretanto, com uma eficiência superada,
somada à explosão demográfica do início do século, a qualidade dos estudos se fez perder
pela quantidade de pessoas que a procuram, promovendo uma infinidade de pesquisas que
se empoeiram nas estantes, sem grandes aplicações. Como cita Sousa Santos: “Ao homem
muito um mecânico”.24
naturais. Para Andrés Bansart em seu artigo Education mutua para um desarrollo
reflexivo – educar-se e também no plural, uma vez que toda educação é mútua. Seus
objetivos primordiais seriam, para este autor, o de “conhecer o mundo, reconhecer-se nele e
defende a inserção da questão ambiental não somente para o ambiente, mas desde o
24
Sousa Santos, B. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez, 3a.ed.,
p.49, 1997.
25
In D’Ávila Neto, M. I. (org.) Desenvolvimento Social: desafios e estratégias. Rio de Janeiro: UNESCO/
FINEP/UFRJ-EICOS, vol. II, p. 183-202, 1995. Segundo Bansart, conhecer vem de cum-nascere: engendrar-
se na mesma dinâmica do objeto estudado.
23
participar das transformações sociais – afinal, “uma expressão da época”. Para Teixeira,
“em nenhum tempo da história viu-se a universidade tão fortemente solicitada para dar a
somente (...) na segunda metade do século XX, [que] a ciência faz-se em verdade
preocupação central dos governos” que passa a contribuir com os objetivos perenes da
26
Bansart, A., op. cit., p. 185.
27
Teixeira, op. cit., p. 62-3.
24
Assim, no século XXI, o espírito acadêmico universitário, embora tenha perdido seu
caráter revolucionário que marcou grandes conflitos sócio-culturais dos anos 60-70 no
mundo, parece ter que enfrentar as mudanças estruturais, mas também ideológicas na busca
pela interpretação e solução do que tem se mostrado urgente pela sua abrangência e
profissional do aluno. Uma vez que o contato com problemas de ordem planetária (como o
caso da mudança climática, por exemplo) nos coloca questões antes impensadas, cria-se a
e seus objetivos, sua relação com a sociedade, suas crises e possíveis soluções.
e externo e entre o antigo e o novo na academia são de suma importância. A relação dada
28
E de campos novos que sequer podem ser caracterizados como disciplinas nos velhos padrões, mas
funcionam academicamente como tais: se obtem mestrados e doutorados e há carreiras nestes novos
“campos”.
25
a prática, sempre foi motivo de discussões e críticas, sejam dentro e fora de seus muros,
tese da associação dos estudos teóricos com o trabalho produtivo constitui não somente a
interessante das suas análises das questões da educação e do ensino”. Marx, pensando no
operário fabril do século XIX, pensava numa proposta pedagógica que romperia com o
“modo de trabalho que repousa sobre uma especialização extrema e que tem no emprego
das instâncias de concepção e execução”.30 A posição deste pensador era a de que, embora
movimento das suas contradições internas”, esta evolução não é natural, mas é representada
dimensão técnica)”, desenvolvido a partir da luta política da classe operária pelo acesso à
cultura. Ele, segundo a autora, defendia que os limites da mera execução na intervenção da
29
Segundo Morais, a “palavra teoria, que no grego guarda significado de contemplação, não está
originariamente eivada de ascetismos místicos. Teoria, no grego, aponta para um momento de concentração e
pensamento em nós motivado por exigências emergidas do cotidiano e que deve terminar com a possibilidade
de uma ação melhor sobre a vida prática”. (op. cit., p. 43).
30
Nogueira, Maria Alice. São Paulo: Cortez, 1993, p. 207. Posição esta apoiada por T. Adorno em Educação
e emancipação (Rio de Janeiro: Paz e Terra, p. 164, 1995), quando comenta sobre a falência da cultura: “Ela
dividiu os homens. A divisão mais importante é aquela entre trabalho físico e intelectual. Deste modo ela
subtraiu aos homens a confiança em si e na própria cultura”.
26
realidade pelos trabalhadores atentavam “contra a sua integridade física e psíquica, contra o
Para Marx, a união entre cientistas e técnicos, num modelo de ensino que vise a uma
seria preparatório do rodízio entre gestão, supervisão, trabalhos braçais, etc., objetivando a
causadora de uma desalienação do ser humano com o acesso dos trabalhadores ao controle
politecnicismo”.33 Evidentemente, Nogueira acaba por revelar que Marx sempre tecia
lógicas, empíricas e teóricas, conduzidas em termos racionais com desejos utópicos”. Seria
este tipo de visão a ser incorporado pela academia atual, num processo fecundo de
tratando da questão dos recursos naturais e/ou dos problemas sócio-ambientais? É evidente
que o enciclopedismo é impossível, mas um saber amplo e engajado se faz cada vez mais
31
Ibid., p. 209. Buarque, a partir de Luis Borges, confere três gestos para a realização da aventura humana
através da universidade, única com vocação para exercê-los: os gestos técnico, epistemológico e poético. (op.
cit., p. 123, 1990).
32
Nogueira, M. A., op. cit., p.209.
33
Ibid., p.211.
27
A crise que vivenciamos, segundo o autor e confirmada por Morin e Minogue, decorre da
cingida entre clássica e técnica. Para o autor, a solução aponta para uma escola única que
especializado nas questões concretas de administração das atividades práticas essenciais das
humanista ou de cultura geral, deveria inserir os jovens na atividade social, logo após a “um
autonomia na orientação e na iniciativa”. Ela buscaria dar início a novas relações entre o
trabalho intelectual e o industrial na vida social, entre a alta cultura e a vida, entre os
mundo - e passam a ver os processos naturais como leis objetivas, mas rebeldes, que devem
educativo se baseia no conceito de trabalho, mas deve equilibrar ordem social e ordem
34
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 7aed., capítulos: A organização da Escola e da Cultura e Para a
Investigação do Princípio Educativo, p.117-39, 1989.
35
Ibid., p.119.
28
“espaço de crítica”, para além dos acanhados limites da reprodução do conhecimento. Este
sociólogo era a favor da organização dos professores universitários que possa reacender o
“deve ser um fórum onde se debatam as grandes questões inerentes às disciplinas ensinadas
na universidade e não uma arena medíocre onde medíocres dela se valem para a divulgação
deve ser a favor ou contra o Estado, pois não são inculcadoras de valores morais absolutos,
36
Ibid., p.136.
37
Weber, M. Sobre a Universidade: o poder do Estado e a dignidade da profissão acadêmica. São Paulo: Edit.
Cortez, 1989. Capítulo Introdução ao leitor brasileiro.
38
Ibid., p.16
39
Ibid., p.13.
40
Ibid., p.70.
41
Ibid., p.15.
29
Ele defende ainda que o clima de debate intelectual seja suficientemente vivo para
da criatividade a uma ética do trabalho”.42 Deste modo, ele indica a idéia da capacidade e
nos descreve que a instituição se vê duplamente desafiada (pela sociedade e pelo Estado) e
como missão eterna, a universidade, segundo ele, é o lugar onde por concessão do Estado e
própria”44 na busca pela verdade. Seus objetivos são investigar (porque o âmbito da verdade
é muito maior que o da ciência), ser um centro de cultura (para a educação do homem no
seu todo) e ensino (transmitir conhecimento para a formação integral). O autor enumera os
do produtivismo. Segundo o autor, relatórios mais recentes (1987) distinguem até dez
42
Ibid, p.17.
43
Sousa Santos, op. cit., p.187. De acordo com C. Buarque, o medo e ódio irracional às idéias novas eram
chamados por Carl Jung de ‘misoneísmo’, ou então ‘neofobia’.
44
Ibid., p.188.
30
definição e avaliação e ainda competem entre si. Em geral, a investigação colide com o
dispersão” são então utilizados para se controlar tais tensões sendo que sua gestão falha nas
encerrando uma crise institucional. Para Sousa Santos, esta tríplice crise universitária,
eclodida nos últimos vinte anos, criticando ou legitimando o status quo, é mais latente do
prática na universidade parece ter desaparecido: “esta infiltração da atitude prática nos
escaninhos mais remotos da contemplação aumentou grandemente nosso poder atual, mas
“enfraquecimento intelectual”, porém crê que há uma indevida presunção de que pesquisa é
como um processo mecanicista do que como uma aventura individual é atacado pelo autor,
pois para ele, deve haver uma redução na tradicional diferença entre treinamento
Minogue diverge da posição funcionalista, uma vez que a universidade moderna congrega
45
Ibid., p.189.
46
Distrito Federal: UnB, 1986.
31
verdadeira identidade das universidades está enterrada por “fidelidades morais, doutrinas
mudar a totalidade da natureza da existência humana”.48 Ele defende que se deve distinguir
Deste modo, podemos dizer que há uma grande profusão de idéias a respeito da
instituição universitária e que, talvez por isto, ela está em constante dinâmica, apesar de seu
aspecto sólido e estável e de seu caráter tradicionalista. Tem havido sempre um repensar
sobre ela que atrai e repele sugestões inovadoras, mas a universidade se mostra cada vez
mais ativa e participante na sociedade e permite, portanto, consistir-se num local de grande
potencial, apesar de polêmicas e conflitos permanentes. Podemos perceber ainda que uma
das grandes contradições da universidade e inclusive vista como virtude é a respeito de seu
contato com o externo, uma vez que há uma tendência oposta entre um saber acadêmico,
Ambientais traz em si uma crítica e ao mesmo tempo uma busca por alternativas ao saber
47
Ibid., p. 11.
48
Ibid., p. 167. Neste ponto contrariamos o autor por crer que tais aspirações são legítimas, mesmo assumindo
um viés biologicista. Ou seja, a natureza humana decorre tanto de sua biologia quanto de sua cultura.
49
De cum-prehendere: abraçar, levar a consciência, entender (segundo Bansart, op. cit., p. 184).
32
colaboração entre institutos, departamentos e cursos, mas também uma maior aproximação
unidos para que haja melhor reciprocidade entre as duas faces universitárias, interna e
externa. Há dificuldades claras neste meio termo entre abertura e fechamento, mas muitos
para a dissolução de tais obstáculos. Fronteiras50 vulneráveis, uma vez que existem ‘poros’
Para Buarque, “os próximos anos serão ou de formação de uma nova universidade ou
como são feitas as escolhas dos problemas aos quais se dedica.53 A situação universitária
50
A noção de fronteira, parede, individualidade, unicidade pode ser relativizada, pois o limite de cada ente é
sempre mutável. Há, portanto, sempre confronto e inerência entre parte e todo: todo ‘um’ constitui-se de
pormenores. Por outro lado, todo horizonte ou borda é ponto de apoio, eixo de alavanca, pressuposto
epistemológico, pedagógico, estrutura concreta onde apoiamos o pensamento para definir, qualificar,
enquadrar, conceituar, nomear objetos. Dissolver divisas nos leva a um amálgama multiforme e/ou aforme
que não colabora muito com a compreensão das partes. Perde-se por um lado e ganha-se por outro. Resta
saber se esta ‘nova’ e crescente perspectiva anti-reducionista (holística, multi, inter, trans disciplinar) seria
suficiente ou complementar.
51
Comunicação é o processo de interação social pelo qual intercambiamos informações, idéias e emoções,
influenciando reciprocamente significados e comportamentos. Todos nosso atos comunicativos se localizam
em algum ponto do contínuo entre informação e diálogo e todos participam na vida da sociedade: mas ambas
não devem ser entendidas como simples transmissão ou difusão e sim como um processo de relação entre
pessoas (Bordenave, J. D. Comunicação pessoal).
52
C. Buarque, p. 102.
53
Fernandes complementa que o que dá grandeza às universidades não é precisamente o quê elas produzem,
mas “é o que se faz com o quê elas produzem”.
33
sociais, locais, comunitários e práticos, de interesse mais imediato, mas nem por isto
passageiro. Esta aparente dicotomia é demonstrada pela oposição entre uma cultura erudita,
epistemologia escolar.54 Isto, porém não inibe a atuação em ambas as vertentes, em vista da
diversidade de instituições espalhadas pelo mundo, mas que, em geral, são criticadas pelo
um lado a cultura das humanidades - que nutre a inteligência geral, que revitaliza o passado
as disciplinas, valoriza mais o presente e consagra a teoria -, faltando uma adaptação mais
conciliadora, que vise rediscutir a primazia da verdade sobre a utilidade, ou seja, a “ética do
54
Forquin, J. C. Escola e cultura: as bases sociais e epistemológicas do conhecimento escolar. Porto Alegre:
Artes Médicas, p. 11, 1993.
55
Por outro lado, segundo a coordenadora do projeto “A extensão das atividades de ensino nas instituições
brasileiras de ensino superior públicas e privadas”, Eunice R. Durham, o atendimento à população realizado
por estas instituições é muito superior ao que é normalmente admitido nas análises realizadas através das
estatísticas oficiais sobre o Ensino Superior, que se restringem à graduação regular e à pós-graduação strictu
sensu.(informações obtidas através da página da NUPES - Núcleo de Pesquisas Sobre Ensino Superior – USP:
http://www.usp.br/nupes)
34
disciplinas das outras e não relacioná-las, a qual acaba por passar por relações
mecanicista. Tais relações terminam por dissolver e/ou ocultar o que é subjetivo, afetivo e
cega, inconsciente e irresponsável. Segundo ele, a rigidez da lógica clássica deve ser
corrigida por uma dialógica capaz de conceber noções ao mesmo tempo complementares e
antagônicas, ao nosso ver questão fundamental nesta tese. A reforma da universidade tem
de inseparabilidade entre todo o fenômeno, seu contexto local e até planetário. Assim, para
Morin, deve-se pensar forma e conteúdo como unívocos, como se pode aferir das
Piaget e diversos outros autores (como Briggs e Michaud) apontam para a extrema
56
Morin, op. cit., 1997.
35
estreita união entre eles e sustentando que a indissociabilidade entre tais funções é condição
arte de ensinar deveria consistir na arte de fazer descobrir”57 ou então na arte de “aprender a
aprender”. Porém, para autores como Teixeira, esta aproximação entre ensino e pesquisa
ainda existe muita dificuldade na dedicação a outras atividades, vista como falta de
seriedade, desperdício de tempo, dispersão. Cita ainda que o desprezo pelas demais áreas,
por exemplo, a História, faz parte da visão fragmentada e alienada, o que dificulta o
de pesquisa, mas também crê que há a necessidade, para este intuito, de uma “nova
esta última e que deve ser redefinida e ampliada para algo como “Promoção da
Comunidade”:
57
Apud Lins Filho, J.B.C. Primeiro ciclo das universidades brasileiras e interdisciplinaridade. Rio de
Janeiro: PUC, dissertação em Educação, p.31, 1979.
58
Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago, 1976.
36
com estes autores, aquela parte das seguintes idéias: a) só conhecemos bem aquilo que
realidade.
Teorização
REALIDADE
59
Petrópolis: Vozes, 14a edição, p.12, 1994.
37
Os autores comentam que a estrutura do ensino, por conseguinte, deve ser reformada.
de rebrotar:
Para a reforma da instituição, Morin crê que se deve reformar também as mentes de
60
Ibid., p. 103. Isto corrobora com as sugestões de aplicação das disciplinas por grandes temas da atualidade
apontados por pelo menos dois entrevistados.
61
Op. cit., p. 17. ‘Econologia’ seria para o autor, uma mistura de ética como propósito, ecologia como objeto
global de análise e economia como racionalidade do processo.
38
defende que, a fim de instalar e ramificar um modo de pensamento complexo que permita a
como:
• a relação cosmo-físi-bio-antropos;
62
Morin, E., op. cit., p.53.
39
dependência e solidariedade entre humanos. Para ele, “a universidade deve superar-se para
substituída pela intenção transdisciplinar principalmente nos países centrais onde a primeira
assistencialismo e elitismo, acostumada a não dar devidas atenções para o mundo prático,
apontado por P. Freire63, não deveria ser voltado ao interior ou exterior, mas a ambos,
de que deve acontecer muito maior aproximação entre a universidade e o cotidiano sócio-
63
Freire, P. Educação e mudança. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
40
comunitário; mas (...) não pode ser confundida com diluição de identidade - ou simples
pelo autor nesta interatividade: trocar a prática acadêmica pela militância partidária; o
vistas quantitativamente; um saber maior na academia e menor fora dela. Tudo se passa
uma coisa ligando-se à outra pela aplicação. “Na verdade, meio social geral e meio
Em oposição a Teixeira, Sousa Santos crê que uma crise de hegemonia, que já se
iniciava desde finais do século XIX (período do capitalismo liberal) em “dessintonia com
as exigências sociais”, confirma-se com a cultura de massas do pós IIa. Guerra Mundial nas
polaridades: alta cultura – cultura popular, educação – trabalho e teoria - prática. No embate
mesmo com a deselitização da ‘aristocracia’ que via a instituição como “produto do projeto
64
Op. cit., p.40.
65
Op. cit., p.44. Grifo inserido.
66
Op. cit., p.194.
41
educacionais distintos e, portanto, novas, menores e mais flexíveis instituições têm surgido,
pois a universidade tradicional não tem dado conta da educação profissional. Devido às
da verdade”.
saberes) segue a reboque da crise de hegemonia (popularização x elitização), uma vez que
as classes baixas buscam trabalho (prática) e as altas buscam educação (teoria) e, portanto a
universidade tem tentado incorporar, com grande dificuldade, ambos pólos. Ambas crises
67
Ibid., p.198.
68
OCDE. University under scrutinity. Paris, 1987. Apud Sousa Santos, ibid., p. 198.
42
da irredutibilidade daquele a este, já que muitas teses não significam eficiência. Porém, “a
produção acadêmica.
homem sobre si mesmo”, E. Cassirer (apud Morais) compara a quantidade de dados sobre o
ser humano ao de seu desconhecimento, uma vez que o número de estudos não corresponde
ao grau de articulação:
cientificismo dos séculos XVIII e XIX) à “iconoclastia pura e simples, num gosto
orgiástico pela demolição”.71 Na outra, tanto uma defesa triunfalista do tipo “templo do
saber” e “celeiro do futuro”, quanto acusações levianas resultantes “de sérias distorções
69
Ibid., p.214. Para Simon Schwartzman (Ciência, universidade e ideologia: a política do conhecimento. Rio
de Janeiro: Zahar, 166 p., 1984), a universidade passa por crises do ideal de democratização, da educação
funcional, da qualidade e da universidade científica e crítica.
70
Ibid., p. 217.
71
Op. cit., p. 18.
43
reflexão de conjunto são, para o autor, as nossas carências e, portanto, ele concordaria
conosco perante a necessidade de uma maior integração interdisciplinar que possa deflagrar
ações inovadoras. 72
discernindo que o primeiro termo pode ter sido usado para os que viam extensão como o
“que começa dos portões da universidade para fora”.73 Decorrente desta situação, o autor
aponta para a crise de identidade universitária: carência de tradição histórica, descaso dos
distanciadas.
constitui. Cremos que, a partir da busca interdisciplinar de uma síntese dinâmica, possa
72
Segundo Freire (op. cit., p.32), “a educação é mais autêntica quanto mais desenvolve este ímpeto
ontológico de criar”.
73
Morais, op. cit., p.67.
44
subculturas, desde uma espécie de vila industrial, a multiversidade americana passou a ter
menos propósitos comuns, mas com mais possibilidades. A pesquisa se tornou a mais
importante das funções, embora a maioria dos cientistas também seja professores e
consultores. Segundo Teixeira, isto só foi possível com a confiança de que o ser humano
age melhor em liberdade (de ensinar e de aprender), revendo e reconstruindo sua ação,
Os papéis por excelência das universidades, para Sousa Santos, são “as condutas de
estruturação mais palpável das personalidades dos educandos”75 e para tanto, deve-se
pensar integralmente universidade ‘na’ sociedade e não ‘e’. Morais76 indica três
prestado à sociedade: fertilização recíproca entre instituição e seu meio. Isto se daria
buscando-se compatibilizar vida universitária e vida social ampla e mudar a vida docente e
74
Teixeira cita que “a indústria do conhecimento é hoje (...) o fator central no crescimento nacional dos
Estados Unidos.” (p. 65)
75
Sousa Santos, op. cit., p.26.
76
Morais, op. cit., p.75.
45
importantes ao público. O autor indica duas opções: montar e dinamizar grande centro de
descentralizado geográfica e administrativamente. Mas como a maior parte dos autores aqui
citados indica, a nem uma das opções é dada tanta importância quanto ao ensino e à
Buarque considera que ao longo dos seis séculos da história da universidade, tanto no
universidade, pois “as massas despossuídas a ignoram, os quadros de classe média deixam
de vê-la como um passaporte à riqueza, os capitalistas optam por institutos isolados”. Mas a
crise maior, para ele, está na perda de uma razão epistemológica e ética: novos campos do
perde o sentido para um mundo melhor. Ele relaciona passos para a universidade “navegar
as mudanças” e não sofrê-las; lidar com rupturas não apenas de ajustes teóricos no
conhecimento e nos métodos, mas no modo de se ver e se estar num mundo em transição,
entendendo tais mudanças e educando-se para o futuro. Ele denomina “universidade sem
77
Buarque cita uma única reforma real na Universidade de Sussex em 1961 que buscou a
multidisciplinaridade. “A estrutura interdisciplinar é feita possibilitando aos estudantes adquirirem um amplo
horizonte acadêmico estudando tópicos além daqueles diretamente aliados ao assunto principal, promovendo
assim uma fertilização cruzada do conhecimento entre os temas.” (texto obtido da página da internet da
University of Sussex: http://www.uwsp.edu/cnr/waee/Events/midwest.htm, com livre tradução).
78
C. Buarque, op. cit., p. 33-51.
46
Concordando com Buarque, Morais e Sousa Santos, acreditamos que, sem perder sua
função investigativa e transmissora e até mesmo pela sua função social de atuação perante à
realidade de quem ali convive diretamente, o trabalho de pesquisa e ação através de núcleos
como em ações mais locais, não deveriam ser contraditórias, mas complementares,
Segundo Maria da Graça C. Lisboa79, a universidade moderna pode ser pensada como
79
Lisboa, M. G. C. Primórdios da idéia de universidade no Brasil. Rio de Janeiro: UGF. Tese de doutorado
em Filosofia, 1988.
47
levaram ao iluminismo europeu no século seguinte. Esta autora cita ainda que um “saber
época da vinda da Corte no século XIX, quando foram fundadas as primeiras escolas
a sua plena realização no campo científico e social”. Com esta miríade de influências, a
autora conclui que não poderia mesmo existir alguma homogeneidade no pensamento da
elite brasileira com respeito à organização acadêmica do ensino superior e que haveria
preferência tanto por escolas isoladas quanto por universidades. Portanto, sua instalação no
de duas primeiras universidades (em São Paulo e em Olinda), mas a decisão de se criar
século.
Chile e a Argentina no XVII, situação esta que, para Buarque, fez com que a universidade
80
Mauro Santayana, no prefácio do livro de Cristovam Buarque, lembra que o conservadorismo e uma
“arrogante presunção” foram também herdados da origem ibérica da universidade.
81
Lisboa, op. cit., p.217.
48
brasileira se desenvolvesse nos moldes dos países desenvolvidos que exigiam eficiência de
cada faculdade independente. No Brasil, contou-se com um ensino incipiente, pois desde o
início do século XIX, as escolas eram raras e elitistas. O interesse em trazer estrangeiros
universitária brasileira tem cerca de 80 anos e, neste sentido, podemos perceber como se
país, buscando quebrar ou pelo menos reduzir esta citada independência entre faculdades
ensino superior, mas tem copiado as idéias de outrora e distantes ou absorvido “idéias fora
formulavam a partir de Coimbra, as quais, por sua vez, eram ainda reflexos das origens
e Letras dentre outras, procurando ampliar o quadro universitário, porém estas se tornaram
nós, nunca foi humanística nem de pesquisa científica, mas simplesmente profissional, à
82
Schwarz, R. Ao vencedor as batatas: forma literária e processo social nos inícios do romance brasileiro.
São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1977.
49
com substrato português, ibérico. Assim, demonstra-se que, desde então, o isolamento de
cada uma (até mesmo entre medicina, farmácia e odontologia), “revive a estrutura
corporativa medieval”, uma vez que a própria reunião sob forma de universidade fez-se
com visível resistência: “No Brasil temos uma série de oligarquias (congregações) isoladas
e independentes, unidas por uma reivindicação em torno do orçamento, que é federal e feito
... nenhuma outra instituição parece tão natural como esta e evolui, como as
coisas naturais, por leis próprias ou sem lei nenhuma. Deixa-se levar e, deste
modo, se transforma, sem saber bem como se está transformando. ...As nossas
escolas superiores deixam-se ir e se vão, assim mudando, aos trancos e
barrancos, e de repente, se vêem diferentes...84
frustrada do Brasil85, nos conta que a partir da IIa. Guerra Mundial, se tornou evidente a
profunda relação dos poderes econômico, industrial e militar, “o que levaria indiretamente à
elemento participante das estruturas de poder ao nível mundial. Assim, de acordo com
econômicos e políticos, fazendo com que a ciência e a tecnologia sejam fatores importantes
83
Teixeira, op. cit., p.73. Grifos inseridos. A ditadura proporcionou ainda a proliferação de faculdades
isoladas sem tradição de pesquisa.
84
Ibid., p.75. Rubem Alves (Conversas com quem gosta de ensinar. São Paulo: Cortez, p.79, 1984) compara a
situação dos cientistas e educadores à de remadores de uma galera: todos se congratulam com a velocidade do
barco, mas não sabem e nem querem saber para onde ele está indo. O debate interdisciplinar levanta tais
questões: para onde vai o barco e para onde queremos que ele siga?
85
In: Furtado, C. et al. Brasil: tempos modernos. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2a edição, 1977.
50
da ciência tem sido promovido por uma quantidade reduzida de cientistas que nem sempre
educação no Brasil ainda é questão de privilégio, resultado de uma tardia fundação das
escolas de ensino superior mal estruturadas em universidades e que “... não estimulam a
1951 criou-se o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq) permitindo que cientistas possam
empresas, estas não têm interesse em estimular os centros de pesquisa pública, fazendo
surgir uma conjugação de interesses de grupos dominantes “que está longe de favorecer o
comunidade científica não deve ficar ausente das questões sobre a importação passiva de
estrangeiros e produzem pouco que seja original”. Portanto, para ele, não basta apontar o
“traço estetizante ou mimético da vida cultural brasileira”: é preciso olhar para a história da
86
Ibid., p.142. Nos parece que a maior parte dos cursos pesquisados contribui com um componente
sociológico crítico-reflexivo primordial em nossa sociedade.
87
Ibid., p.150.
51
inteligência brasileira, “... que tem sido um longuíssimo episódio de submissões”.88 Deste
ponta uma “de corpo”, mais rudimentar, mas mais urgente a um povo, encontrando um
básica”, um aspecto ético além dos corporativismos, permissividades e jogos escusos. Ele
Como é evidente, isso exige ampla visão dos seus administradores, como,
destes mesmos, uma especial criatividade administrativa. Se tal for impossível,
as instituições acadêmicas se destinarão a ser melancólicas empresas pobres ou,
no dizer popular, ‘fábricas (de diplomas) sem chaminé’.90
comercial’ acaba por transformar-se numa ‘distorção institucional’”. Assim, segundo Sousa
Santos, se explica o “declínio das humanidades e das ciências sociais, áreas de menor
88
Isto parace ser outro fator que indica a forte presença do corpo de pesquisadores entrevistados exigindo um
campo multi e interdisciplinar.
89
Morais, op. cit., p.21.
90
Ibid., p.31. Nos EUA, existem universidades que são parcialmente custeadas por cadeias de supermercados,
de cooperativas ou de lojas de departamentos.
91
Sousa Santos, op. cit., p.204.
52
Porém, de acordo com Morais, ao contrário das ameaças sociais dos ativismos
qual a tradição deve ser apreciada e preservada em seus aspectos frutíferos e positivos, mas
obra de H. Carrier, o autor crê que a reafirmação do valor da afetividade, o amor pela
esperança de justiça social e igualdade são as principais expressões culturais que pedem
crítica ao cientificismo de uma crítica ‘descalibrada’ à razão como tal, que leva ao
92
Ibid., p.208.
93
“A UnB, a partir de 1985, iniciou um processo de reforma, através da implantação do que se chamou de
‘universidade tridimensional’, onde cada universitário participa não só de seu departamento, mas também de
um núcleo temático e de um Núcleo Cultural”, embora apenas uma parte dos alunos participe integralmente.
(Buarque, op. cit., p.97).
94
Morais, op. cit., p.22.
95
Dos cinco pontos indicados, o último é o que parece mais expressado nas entrevistas, embora algo seja
esboçado quanto à afetividade e ao amor pela natureza.
96
Na pós-graduação, em se tratando de profissionais, não são novatos, não apresentando, portanto, em geral,
tais tendências.
53
saber se faz combater com o fator primacial para o século XXI - a educação (posição esta
Por outro lado, de acordo com Regis de Morais, para um país que até a década de
1920 não contava com nenhuma universidade, o Brasil apresenta hoje números
importantes, uma vez que até 1987 já contávamos com 79 universidades (sendo, entre
contávamos com 768. “Em pouco mais de 60 anos, algumas universidades - sobretudo do
sudeste e do sul - ergueram seu prestígio no país e nas relações internacionais de ensino e
pesquisa”. Segundo o autor, nos anos 60, o Ministério da Educação e da Cultura e o Banco
Mundial (USAID) esforçaram-se para que nossas instituições acadêmicas fossem cópias
dos piores modelos norte-americanos, resultado da reforma de 1968 e do AI-5, cujo arbítrio
ele, o principal eixo em torno do qual se deve repensar o papel das universidades é o
antropológico:
...os meios acadêmicos têm que se desalojar dos seus velhos e cômodos hábitos,
aceitando o desafio de flexibilizar-se no atendimento às novas expressões
culturais e subtrair-se aos pragmatismos empresariais e consumistas e voltar a
interessar-se pela recuperação do sentido humano na sociedade científico-
tecnológica de consumo, além de viver o contexto da região em termos de
intercâmbios e serviços. (...) Trata-se de fazer o discurso acadêmico o mais
audível e inteligível para a sociedade, tirando-lhe a aura de um reduto de
excêntricos inacessíveis.97
conhecer, como lembrado por Teixeira: as Ciências Biológicas se aproximam das Médicas,
97
Ibid., p.34. Grifo próprio. Veja capítulo sobre um aparente ‘ecletismo’ nacional.
54
as escolas politécnicas podem dar origem aos institutos tecnológicos, a Física acaba por
acabam por integrar as escolas de Agricultura. Não apenas meras expansões quantitativas,
não logrou total êxito, a universidade moderna brasileira organizada para a pesquisa apenas
começa e os serviços voltados aos problemas práticos comunitários são exemplos ínfimos.
As mudanças esbarram nos medos de novidade, na “resistência nacional a tudo o que possa
mesmo remotamente constituir-se fator de mudança social”.98 Ele crê que ela se agita, não
problemas. Uma possível previsão surpreendente feita pelo autor, uma vez que escrito em
1964 quando mal se falava em interdisciplinaridade – o que deve seguramente estar sendo
também o mundo, sendo um país raro, pois, embora tenha integrado parte da população à
social, percebe que dispõe de uma massa crítica de pensadores capazes de formular
alternativas. Ele defende que um novo método exige transgressão, praticando-se a dúvida,
98
Teixeira, op. cit., p.78.
55
crise do ensino a partir de um ponto de vista otimista, embora realista. Crê que nossas
instituições têm vitalidade, são plásticas ao novo, suscetíveis e em processo e, portanto com
muitos erros. Mas, se procuramos responsáveis, seus males são transitórios e provocados
por todos nós, e, sob nosso ponto de vista, estão sendo sanados, como podem ser
interdisciplinares com projeção também para além dos muros acadêmicos. Segundo ele:
individual tem que ser em escala social, pois a construção de uma “inovação com
fundamento racional” em consulta com a realidade social, seria uma solução coletiva.
Porém, o sistema escolar não se entrosa com seu meio e com os novos tipos de organização
social que o cercam e mantêm. A estrutura deve ser flexível para acompanhar os avanços
99
São Paulo: Dominus/USP, 1974.
100
Ibid., p.115.
56
progresso social, mas deve começar pela valorização social do professor, que passa “por
elas produzem, mas “é o que se faz com o quê elas produzem”, pois há pouco intercâmbio
tanto, necessita-se de “mudanças radicais de mentalidade (...) fora dos chamados círculos
chamados por ele de “controles reativos” ou indiretos. O autor defende que deve se “inserir
de instituições que concorrem, de forma autônoma, mas coordenada, para a satisfação das
necessidades sociais”.
Para Regis de Morais, “há uma ambígua relação de fascínio e estranheza, atração e
talvez pela falta de tradição de sua valorização, por que elas existem há apenas poucas
101
Ibid., p.122.
102
Ibid., p.206.
103
Ibid., p.9.
57
quatro séculos”. Pode ser também devido a uma “fragmentação desnorteante do cotidiano”
(classes sociais, divisão de trabalho, espaços) que repercute na vida escolar e daí um:
... pauperismo ético caracterizador de uma sociocultura na qual é cada vez mais
difícil conviver, na qual as pessoas cada vez mais ansiosamente competem.
Todo individualismo é fator de degenerescência e pressuposto da indigência
ética, indispondo todos com todos na exata medida em que o outro deixa de
aparecer ante mim como companheiro (cunpane) e passa a ser sentido como
ameaça.
nele. Para Morais, a anomia de nossos tempos traduz a crise moral que promove a falta de
Portanto, para este autor, deve haver nas universidades “condições para que se
104
Morais, ibid., p.12. Para Bansart, a afirmação do Eu não significa a negação do outro, mas ao contrário: é
no jogo de encontro entre ambos que eles se auto afirmam num enriquecimento mútuo, cooperativo e
complementar. (op. cit., p. 194).
105
Morais, op. cit., p.51.
58
responsabilidade social”106, uma vez que o indivíduo em si não passa de uma formidável
abstração assim como o coletivo - o que há de concreto no tecido da vida relacional é o ser
humano com o ser humano. Para ele, no Brasil, e não só neste país, as universidades ainda
não perceberam sua verdadeira natureza (ou proposta) e suas tarefas, já que elas ainda
constituem como arquipélagos, nos quais os institutos e faculdades são ilhas às vezes
mesquinhas:
E isto parece ocorrer, embora existam inúmeras exceções, principalmente dentre aqueles
menos especialistas (ou mesmo entre estes). Profissionais de grande rigor científico e
profundidade teórica trazem consigo, muitas vezes, uma mistura de solidão, curiosidade e
miscigenações raras, porém promissoras como no caso de vários ramos em contato com a
106
Ibid., p.52. Grifos inseridos.
107
Ibid., p.27-8. Grifos inseridos.
59
há aproximações das áreas que resultam em híbridos (porém férteis) como a Sociobiologia,
exemplo. Parece haver, num panorama geral (mas também arriscado) da sociedade
generalismo útil e fecundo, não holisticamente reducionista (veremos isto mais à frente na
os frutos daquela devem ser revertidos a esta; mas isso é algo mais complexo e mais a
médio prazo do que uma simples prestação de serviços assistenciais. Para Morais, estes
últimos têm grande mérito e devem existir, mas não podem esgotar a razão de ser do
esconder sua irrelevância. Em oposição, “teoria da vida” seria aquele trabalho solidário que
Como os frutos de nossas investigações poderão ser oferecidos, de forma direta ou indireta,
à sociedade? Em que medida enriqueceremos nossa docência e a nós mesmos como pessoas
se obter o primeiro, Morais delata que se fazem concessões inadmissíveis que distanciam a
108
Ibid., p.46.
109
Ibid., p.47.
60
transformações após a reforma de 1968, quando foi extinta a cátedra111, que era a unidade
união entre teoria e prática e a segmentação entre departamentos e cursos promoveu “um
enquanto o aluno sofreu o regime de créditos, que, de acordo com o autor, configurou-se
num dilaceramento, sem turma única e num curso sem articulação orgânica. Pode ter
110
Campinas: UNICAMP, Debates, 2a ed., 1985.
111
A reforma ocorreu um mês antes de ser sancionado o Ato Institucional no 5 pelo regime ditatorial e no
período pós Maio de 1968 em Paris, quando estourou o movimento estudantil responsável por inúmeras
manifestações político-ideológicas em todo o mundo (apud Paoli).
112
Ibid., p.13.
113
Ibid., p.14.
61
exigidos pelo governo e para as dificuldades de recuperação de um teor mais crítico pelo
conservadorismo. O poder, segundo ele, não pode ser encarado apenas por um “mecanismo
nosso passado colonial e escravagista. O autor indica, por fim, a necessidade de se manter a
capacidade de indignação não apenas coletiva, mas individual, de alcance imediato, direto.
aula? Por isso o governo brasileiro tem chegado à conclusão de que é preciso distinguir
deverão investir na integração entre ensino, pesquisa e extensão. Esta idéia pragmática e de
curto prazo é inevitável, mas certamente não é solução para a qualidade de ensino. Isto
62
porque a maioria dos universitários brasileiros, segundo esta perspectiva, ficará presa a
inferiorizado. Mesmo nas instituições que deverão integrar ensino, pesquisa e extensão,
cientistas de primeira categoria, na pesquisa básica ou pura, que não oferece resultados e
interdisciplinar nos primeiros anos dos cursos de graduação, uma vez que as pessoas com
formação mais flexível enfrentam melhor a disputa por oportunidades. Deste modo, ele crê
que uma maior flexibilidade curricular, dando maior espaço para se incorporar disciplinas
de outras áreas será vantajosa e cujas mudanças dependerão muito dos próprios
114
Veja artigos relacionados de M. Chauí (A universidade operacional. Folha de São Paulo, 9 de maio de
1999, Revista Mais) e de L. Paraguassú (Universidade pública poderá cobrar taxas. Jornal Correio
Braziliense, 11 de junho de 1999).
115
Publicado no jornal O Estado de São Paulo, 4 de novembro e no Boletim da UFMG em dez. de 1999.
116
Currículos são resultados de fatores internos e externos que formam mudanças nas disciplinas. É reflexo de
forças prático-utilitárias, abstratas, saberes populares e tendências da sociedade. Desenvolve-se a partir da
regulação social imprimida por: lutas de poder e prestígio entre profissionais, interesses pessoais, forças,
rituais, dominação entre classe e gênero, antigos (veteranos) e novatos (calouros). O ideal para a educação
acaba por ser relegado a grupos locais, disputas internas que conformam a realidade acadêmica. Se o currículo
63
são forçados para a especialização precoce, ao contrário do que ocorre nos EUA, onde a
(bastante em acordo com os debates que têm ultimamente surgido sobre o tema). Mas a
investimento visa maior retorno e mais rápido possível. A educação sempre esteve
basicamente a reboque da economia, porém ela apresenta um papel político e social maior e
deveria não apenas ser capaz de possibilitar a democracia, mas também de torná-la
essencial.
universidade: de que o saber científico e técnico é neutro, crítico e superior, que o papel da
universidade é produzir e transmitir o saber técnico e que ela atende aos interesses da
sociedade. Como nosso interesse aqui é a respeito da interdisciplinaridade, iremos nos ater
aos aspectos circunscritos a esta temática. Para ele, a inspiração disciplinar da tradição
não se altera, demonstra origem de grupos definidos, solidificados, dominantes e com disciplinas estanques,
contrários ao currículo integrado e flexível. Seu discurso pedagógico é regulativo, fruto de uma escola
reprodutora que não recontextualiza-se no confronto com a dinâmica do real: a dimensão Normativa (versus a
Emancipatória) do conhecimento.
117
Moreira, R. J. Sociedade e universidade: cinco teses equivocadas. Rio de Janeiro: UFRRJ/CPDA. Revista
Estudos, no. 3, nov., p.124-34, 1994.
118
Ibid., p.127.
64
para detectar nuances da totalidade. Assim, partimos para uma análise crítica do
conhecimento científico, uma vez que o não estudo das questões complexas e
autor defende que uma mudança na grade curricular poderia favorecer o desenvolvimento
1. a especialidade não deve ser rígida e o sistema curricular deve ser misto;
3. a crítica se faz através de debates atuais e pela compreensão dos processos sociais da
formação profissional;
4. a visão crítica deve se dar sobre a perspectiva das relações sociais da profissão;
119
Moreira, R. J. Formação profissional das ciências agrárias: questões da atualidade. Anais do XXXIV
Cong. Bras. de Econ. e Soc. Rural, vol. 3, 1996.
65
interdisciplinaridades.
120
Algumas destas questões serão levantadas em caráter de hipóteses de trabalho e serão examinadas nos
capítulos seguintes. Outras serão levantadas apenas para apontar campos de tensões, não sendo objeto desta
pesquisa, como por exemplo, financiamento e suporte dos programas etc.
66
Vistas algumas das complexas relações intra e extra universitárias, sua ontologia – a
científico, ensino e pesquisa e com a sociedade abrangente. Neste item, para complementar
nas respectivas páginas eletrônicas. Nosso objetivo é o de procurar identificar algumas das
depoimentos.
foi, por sua vez, iniciado em 1997. O curso mantém cooperação mútua com os demais
121
Em anexo (E), encontra-se uma tabela resumindo as características gerais de cada curso.
67
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, Fundo Mundial para a Natureza -
apoio com a Fundação Biodiversitas juntamente com o Serviço de Fauna e Pesca dos
Estados Unidos (US Fish and Wildlife Service), sendo que este patrocina parte dos recursos
desde o ano em que foi implantado, mantendo a qualidade. O programa tem recebido boa
doutorado em uma área que pode ser amplamente definida como “Ecologia, Conservação e
ter bases ecológicas necessárias para atuar em ensino, pesquisa, conservação, manejo e
pesquisa variam bastante e, embora tenha o viés bastante restrito às Ciências Biológicas, o
I, sendo que as optativas abrangem assuntos, dentre outros, como legislação brasileira,
conservação.
CEDEPLAR/FACE. Este projeto visou à criação de uma nova linha de ensino e pesquisa,
Minas Gerais.
122
Em anexo (F), dispomos a lista completa de linhas de pesquisa, disciplinas optativas, dissertações e
bibliografia recomendada para a seleção.
69
programa de formação, pesquisa e extensão na área das Ciências Ambientais, com enfoque
experiência que viabilizou a criação de uma estrutura destinada a coordenar esta iniciativa.
A evolução deste projeto no âmbito da UFPR foi polêmica, marcado por debates
Paris VII, Bordeaux II e a École de Hautes Études en Sciences Sociales), além do próprio
NIMAD. O Programa está hoje vinculado à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós Graduação e foi
objetivo mais realista é capacitar profissionais que já possuem uma especialização, para um
natureza e sociedade.123
123
Além do curso interdisciplinar em Meio Ambiente e Desenvolvimento e o de Engenharia e Ciências dos
Materiais do Setor de Tecnologia no Centro Politécnico, a universidade oferece um curso de pós-graduação
intersetorial na área de Tecnologia e Exatas: Métodos Numéricos em Engenharia Mecânica Computacional -
Programação Matemática.
71
UNICAMP, USP, UEM, UEL, UFSC, UFRS, Université d`Orleans - França, etc.
de sua tese. Nesse caso, o aluno tanto poderá cursar disciplinas no Programa de Doutorado
programa publica uma série de cadernos “Desenvolvimento e Meio Ambiente” desde 1994.
124
Em anexo (G), seguem detalhes de cada módulo do curso, temáticas das linhas de pesquisa e as teses
defendidas.
72
UFRJ. Este Programa tem em seu quadro onze professores permanentes, um visitante e
doutorado, o EICOS, seguindo uma direção interdisciplinar, tem por objetivos a formação
de doutorado foi também aprovada, sendo iniciado em 1999. Quanto ao perfil, atuação e
trajetória dos alunos, tanto o curso de mestrado como o de doutorado congregam alunos
125
Tem ainda representantes da Física, da Antropologia e da Oceanografia.
73
- EIXO II: Estudos sobre Gênero, Meio Ambiente e Desenvolvimento. Linhas: Modelos
A UNESCO Chair on Sustainable Development and Gender Issues faz parte de uma
diversos municípios, participação esta que demonstra sua tendência ao viés extensionista.
Humanas, versando assuntos desde internet e análise do discurso até cultura brasileira,
gênero, racismo, saúde, produção rural familiar, turismo, desenvolvimento social, consumo,
cidadania, psicoterapia, direitos humanos, drogas, família, exclusão social. Por outro lado,
indicamos alguns dos temas pesquisados relacionados mais diretamente com as Ciências
normas ambientais, conceito de meio ambiente etc. Alguns dos exemplos de produção
126
Em anexo (H), ao final da tese, seguem dados sobre as disciplinas oferecidas, títulos de dissertações
defendidas e exemplos de produção intelectual docente e discente.
75
curso tem contado com participação do corpo discente. O corpo docente é composto de
integração.
Biociências. A bibliografia indicada nas disciplinas básicas também versa por um amplo
aspecto de assuntos ligados ao meio ambiente, diretamente ou não, como nos seguintes
127
Segue em anexo (I) o total de disciplinas oferecidas, uma lista de bibliografia indicada para as disciplinas
básicas e títulos de algumas dissertações defendidas.
76
complicado. De um lado, agrega membros dos corpos docente e discente de programas que
não têm ligação e sociabilidade estreita entre si. Esta agregação é um artefato desta
pesquisa que tenta levantar a possível formação de uma comunidade acadêmica voltada à
um número bem restrito de entrevistas, por várias razões, dentre elas tempo e suporte
natureza, cultura, interdisciplinaridade e meio ambiente de uma tal forma que as falas de
cada entrevistado não deixam de estar referidas e formadas por este referencial, bem como
pelo referencial mais direto e cotidiano de sua sociabilidade acadêmica em seu programa de
mesmo tempo, algo sobre o global e algo sobre cada um dos particulares, demonstrando
uma visão das questões e das visões sobre a questão interdisciplinar em Ciências
ser descritas através dos inúmeros periódicos recentes que envolvem mais de uma das
128
Coutinho, M. Ecology and Environmental Science in Brazilian Higher Education: graduate programs,
research and intellectual identity. São Paulo: NUPES - USP, documento de trabalho, 46 p., 1996.
129
Ibid., p. 10. Esse aparente ecletismo citado por Coutinho é confirmado pela análise das trajetórias de cada
entrevistado. Embora tenhamos obtido uma grande variedade de profissionais nos quatro cursos pesquisados,
78
confirmando o dito por Coutinho, que, na maior parte das vezes, suas carreiras seguiram
seus respectivos campos de atuação, este resultado aponta para um maior interesse em
abranger novos campos de estudos, ampliando sua visão sobre uma realidade problemática
mais acessível seu conhecimento teórico específico. Deste resultado, pode-se apontar para o
colaborar com uma abordagem mais complexa e completa das multifacetadas realidades
sócio-ambientais.
percebendo a forte distância na visão de mundo de cada uma: uma vertente mais
a maioria era de biólogos, mas não identificam seu trabalho como ‘ecológico’, mas sim como uma das muitas
alternativas das chamadas Ciências Ambientais.
130
Tabela com origem, trajetória e resultante profissional dos entrevistados de acordo com o relatado.
79
reciprocamente nas mais vastas ‘anastomoses acadêmicas’131, já que existem, por exemplo,
biológica.132 Dos vinte e oito entrevistados, dez são das Ciências Exatas, nove das
Humanas e nove das Biológicas, sendo as primeiras com maior diversidade interna
(seis).133 Tal sistema de classificação já não é mais utilizado na maioria das instituições
acadêmicas, substituído por oito áreas temáticas,134 dadas pela CAPES e pelo CNPq,
embora haja cada vez mais abertura para um novo campo: Ciências Agrárias, Ciências
Destas oito grandes áreas, o corpo de entrevistados somente não é representado pela
de Lingüística, Letras e Artes. Das áreas representadas pela graduação dos entrevistados,
131
Utilizo este termo oriundo da histologia e que remete à faculdade de conexão entre capilares que formam
redes entre artérias e veias, típico de órgãos de alto metabolismo e imprescindíveis para o intercâmbio celular.
132
Esta atitude é discutível, pois a partir da História Natural pode-se seguir carreira em diversas áreas, como
Geologia, por exemplo. Mas não foi o caso dos aqui entrevistados: dois seguiram a profissão de biólogos e
um de sociólogo. Portanto, houve equilíbrio, mesmo contando este como das Ciências Humanas.
133
Tabela em anexo (K).
134
Há discrepâncias em relação à sub área da Lingüística, Letras e Artes como sendo da área das Ciências
Humanas ou se perfaz uma nova área. E ainda um nono grupo 'outros’. Em anexo (L), quadro listando-a.
80
Natural), seguido pelos das Ciências Humanas, Exatas, Sociais, Agrárias, da Saúde e
Engenharias.
Este resultado, embora a amostragem não tenha sido totalmente aleatória, pode
demonstrar uma maior atratividade destes cursos interdisciplinares em meio ambiente para
profissionais das áreas biológicas. É possível que este resultado seja reflexo do processo de
internacionais (sobressaindo a França como local mais referido, seguida por Alemanha,
Inglaterra, EUA e Japão) quanto regionais (Norte: quatro e Centro-Oeste: três). Uma boa
parte dos entrevistados se auto intitula interdisciplinar, atuam como consultores, foram ou
denominaram como sua área de atuação ‘impacto~’ (5), outros ‘educação~’ (4), ‘gestão~’
(2), ‘conflito sócio~’ (1) e ‘planejamento~’ (1), o que é provável que caracterize
135
Das 103 áreas na divisão feita pelo CNPq, dezenove foram representadas, totalizando cerca de 25%, se
contarmos também com as áreas de especialização dos pesquisadores (tabela em anexo - M).
136
Isto, é claro, se relaciona com a amostragem dos cursos, pois seria bastante diverso se fossem outros os
escolhidos, resultado este que poderá ser confirmado com mais pesquisas futuras.
137
Tabela em anexo (N).
81
a educação ambiental tenha sido referida por uma variedade de profissões (sociólogo,
pelo menos quatro pesquisadores, enquanto que temas também de extrema relevância como
mas procurando inserir-se em um contexto mais geral, como por exemplo “naturalmente
Podemos perceber também que a militância política foi citada apenas duas vezes,
embora possa haver outros exemplos que não tenham sido declarados pelos
engajamento pessoal não apenas quanto às políticas públicas, mas quanto à crítica ao
sustentabilidade). Ou seja, apesar de não ser visível uma militância pretérita em termos
138
Será que isto corresponde a certo alheamento das questões políticas pelo corpo docente, mais voltado para
as políticas internas? Deixamos a questão para pesquisas futuras. Outro dado periférico interessante é o fato
de haver mais de uma menção de um bom relacionamento entre corpo docente e discente, abertura, processo
de ensino e aprendizagem recíproco.
82
O biólogo, ele pode apontar as alternativas, a sociedade é que tem que decidir
se vai ou não acatar ela. A gente dá um parecer técnico. (UFMGAlunA)
da cada curso, foi sugerida uma divisão ‘arbitrária’, de acordo com o descrito por cada
iniciativa, ou seja, deram uma maior colaboração, receberam o número 1 - o que, segundo
segunda nota foi dada para uma participação mediana (2), quando houve uma dedicação
parcial. E uma menor atuação e, portanto maior distância junto ao curso, recebeu o número
três. Comparando o resultado, houve treze entrevistados com nota um, nove com nota dois
e apenas seis com nota três, o que não pode ser definitivo e conclusivo absolutamente, pois
a escolha dos entrevistados se deu pela disponibilidade. Mas de qualquer modo, parece ser
a tônica destes cursos que tanto alunos quanto professores se dediquem a participar de
institucionalização, pelo menos nesta fase inicial. E nem sempre houve um processo fácil e
tranqüilo:
relativa:
embora apenas uma única vez tenha se declarado como consultor, ter participação
política e ser interdisciplinar. Por outro lado, todos pesquisam a questão da metodologia
• USP: há uma boa parte das citações em participação política e a metade daqueles que
Conclusões preliminares
resultante de uma complexa relação interna e externa, sendo influenciados por uma
gigantesca gama de fatores políticos, econômicos, sociais, enfim, conjunturais. Suas crises
nacionais.
interpessoal. Ao mesmo tempo, se mostraram compatíveis com uma nova ordem mundial
não competitiva, uma nova percepção da realidade perante o modus vivendi degradante do
veremos a seguir.
Apontamos agora, algumas das características de cada curso reveladas a partir dos
A Universidade Federal de Minas Gerais, com sua experiência junto ao PADCT que
uma vasta bacia hidrográfica, nos traz uma perspectiva esperançosa de adequação destas
sofre o risco de ter se mantido somente na pesquisa, não reformulando, todavia a estrutura
população e economia, parece ter imposto apenas até certo ponto questões, ao nosso ver
ensino, novas disciplinas internas ao programa de Ecologia não foram citadas nas
manejo, de conservação etc. Ou seja, uma relação limitada com as Ciências Sociais e
Humanas, conferida pelo fato de docentes de áreas humanas e exatas não serem
transformações:
139
Este docente é do grupo de entrevistados que ficaram a parte das análises gerais dos cursos, uma vez que
buscamos homogeneizar o número de pesquisadores.
140
Para futuras pesquisas seria interessante saber quais os principais usuários dos conhecimentos obtidos e as
aplicações práticas adquiridas pelas comunidades envolvidas em cursos disciplinares e interdisciplinares.
87
Por outro lado, demonstrando inserção social, algumas interações com a sociedade
são apontadas por um membro do corpo docente da Ecologia, parecendo que projetos de
pudéssemos dizer que o ‘ambientalismo’ que emerge de suas relações tenha o viés
multidisciplinar interno ao campo biológico, mesmo que haja iniciativas contrárias, como
Então talvez fosse bom ter espaços interdisciplinares. Não uma nova
estruturação física da universidade, mas deve existir a possibilidade de um
espaço de busca da interdisciplinaridade. Sou favorável à criação de uma
Associação. (UFMGProfAQ3)
Hoje há demanda crescente pela interdisciplinaridade, uma certa consciência ao
nível de discurso pelo menos. Mas não é o que encontramos nas escolas, é um
recrudescimento, corporativismo e disciplinarismo... É uma resistência imensa.
(UFMGProfDQ3)
Portanto, apontamos para as difíceis mas necessárias parcerias futuras entre ECMVS
e extensão. Este Centro pode vir a cumprir um papel imprescindível no trato do manejo e
da conservação da vida silvestre, uma vez que busca se adaptar ao trabalho interdisciplinar
Desenvolvimento, executando com perfeita convicção o lema “pensar global e fazer local”,
regionais documentadas em suas teses. Dos cinco cursos indicados pela CAPES neste
campo, somente este coloca ‘meio ambiente’ à frente de ‘desenvolvimento’, fato que pode
Podemos apontar, no entanto, uma distinção básica do curso há pouco descrito. É possível
que o MAD, por estar localizado recentemente no Setor de Ciências Agrárias e distante do
Setor de Ciências Biológicas (embora já tenha sido do Centro de Estudos do Mar), receba
uma menor atenção da vertente conservacionista oriunda destas últimas. Embora questões
delas reúnem fundamentos das ciências da natureza, história da Ecologia, idéia de natureza,
ética e conhecimento da natureza, mas muitas são voltadas às teorias das Ciências Humanas
antropização, análise de impactos, cultura e energia etc. Segue parecer de membro do corpo
Ele está aqui por uma razão de disponibilidade de espaço. Não há vinculação
orgânica ao setor, mas a existência aqui facilitou os contatos pessoais com
outros cursos de pós-graduação ...acontecendo um processo de aproximação, de
valorização desta proximidade com os departamentos. Está havendo uma
natural aproximação de docentes e discentes, não só no sentido de assistirem
curso, mas de participarem das oficinas, dos encontros. A Biologia fica longe, o
Centro Politécnico fica na BR-277 e há muito pouco contato. (UFPRProfBQ3)
conferida, do mesmo modo, se observados os títulos das teses defendidas, pois reúnem
uma falha no diálogo com as Ciências Naturais. Com isto não queremos desprestigiar o
programa, mas apenas destacar tal paralelo com a UFMG. Fato este que já tinha sido
universidades do país. Suas idéias parecem ter sido inspiradas fundamentalmente por
141
Escrevemos sobre isto mais a frente.
91
indicar implicações próprias do curso, oriundo dos inúmeros confrontos anteriores a sua
Com base nas discussões e reflexões [de encontros prévios], partiu-se para a
operacionalização desta idéia tomando diversas atitudes mais ou menos
polêmicas, entre elas o fato de se abrir o curso apenas em nível de doutorado.
Foi um conceito instrumental, pois não era idéia formar especialistas em meio
ambiente, mas criar ambiente intelectual para a interação de pessoal que já
tenha atuação na área, mestres ou pesquisadores, técnicos de secretarias ou da
própria universidade que já tivessem formação disciplinar mais ou menos sólida
e que encontrasse neste programa um ambiente, um espaço intelectual, mais de
interação do que de formação. (UFPRProfB)
cada experiência em particular, neste caso, permitiu uma aplicação social, ao nosso ver,
mais direta. Em contraste, a baixa avaliação da CAPES para este curso (três) nos
membros:
Essa é outra questão séria que significa que aquela fase não foi superada do
ponto de vista institucional. Significa um redobrar de esforços e atividades. E
agora com essa avaliação (GED142) que exige 8 horas aula... Além disso, como
é um curso sui generis, a interdisciplinaridade implica acompanhar diversas
instâncias, níveis de desenvolvimento de atividades. Não é um curso
tradicional. Temos semanalmente reuniões do comitê científico... Mas estamos
articulando a possibilidade do doutorado ter quadros próprios, que se constitua
uma autarquia para que possa reivindicar vagas, ter um pessoal permanente.
(UFPRProfCQ2)
142
Gratificação de Ensino ao Docente oferecido pelo MEC àqueles de maior participação acadêmica e
produção intelectual.
92
diálogo interdisciplinar, embora tenha culminado, por enquanto, na distinção entre o curso
A universidade não tem ainda um instituto, um espaço próprio para abrigar este
tipo de iniciativa. É o caso do NIMAD, do programa de doutorado e era o caso
do Centro de Estudos do Mar. Não temos no organograma um espaço
adequado... O programa historicamente se dissociou do NIMAD por razões
acadêmicas e agora está havendo uma confluência, na tentativa de criação de
um Instituto. O NIMAD não tem cursos próprios. Todos os professores são
vinculados a outros departamentos. Achamos bom, porque trazemos as
competências e não é intenção ainda que o programa tenha uma conotação
própria e funcione como uma unidade alheia à vida acadêmica.
(UFPRProfBQ3)
Estamos numa fase de discussão sobre a possibilidade de criação do instituto de
meio ambiente. Aí com um número mínimo de vagas, com uma estrutura mais
ampla, com a possibilidade de criar unidades de pesquisa e extensão.
(UFPRProfAQ2)
O NIMAD, que atualmente faz projetos de extensão, pesquisas de curta
duração, capacitação, educação ambiental para a comunidade, continuará com
essa atividade. (UFPRProfCQ6)
como todos os outros, aparece com um inigualável potencial, uma vez que a Psicologia,
profissional desta área integrando uma equipe interdisciplinar nos faz crer que possa
interdisciplinar, mas tem as Ciências Humanas como campo fundamental sem uma
abertura para a área biológica, o que deve representar entraves para os alunos de diversas
formações que buscam neste curso elementos das Ciências Naturais. Observando tanto a
a distância das ciências da natureza, mesmo que tenhamos exemplos contrários que buscam
143
Ao mesmo tempo, não cremos que a aproximação acadêmica deva ser vista como ‘terapia de grupo’ no
sentido de se ter uma responsabilidade em resolver as dificuldades pessoais dos participantes.
144
Este termo, segundo a entrevistada, “tem talvez (...) uma tradição americana (...), porque a Escola de
Chicago utilizou preferencialmente Ecologia Humana... Há muitos trabalhos que utilizam a expressão na
Alemanha e Áustria, diversos institutos, centros de pesquisa nas mais diversas vertentes: Economia,
Sociologia, História etc... Nesta busca epistemológica, meu conhecimento se restringe a estas experiências.
Muitas vezes o que chamo de Ecologia Social, a Escola de Chicago chama de Ecologia Humana e outros de
Psicologia Sócio-ambiental ou ainda de Sociologia Sócio-ambiental, são rótulos”.
94
As interações acadêmicas deste Programa com a sociedade se dão com destaque para
portanto se legitima - na interação com a comunidade, bem como pode refletir uma
Acho que a universidade não está buscando trabalhar com projeto porque ele
obriga a pensar no objetivo e busca todas as formas de chegar lá, ainda que
estas formas demandem ter outro profissional. Porque é extensão, pesquisa e
ensino: a extensão é totalmente marginal na universidade. Não pode separar. O
GED não dá conta da extensão, porque não é comum. Você não tem como
trabalhar meio ambiente sem extensão, [pois] as coisas acontecem fora da
universidade: o meio ambiente não é teórico, é pragmático... numa visão
estratégica de curso, tem que ter uma práxis de campo, engajamento e
cooperativa, trabalhar com atores locais: dar ao aluno uma vivência prática; ele
sai da universidade totalmente fora da realidade. Essa visão pragmática do meio
ambiente é um negócio, não quero ficar discutindo as teorias que estão atrás dos
conceitos, até que tem gente que faz isso bem; alguns têm esse papel. Mas não
vai estar contribuindo se ficar na discussão conceitual. (UFRJProfBQ4)
[Sobre paradigma] a gente não sabe se realmente vai ter um aporte
transformador, se a transformação vai desembocar numa mudança de fato ou se
vai ser mais uma questão reformista: ajeitar mais ou menos, fingir que está
fazendo interdisciplinaridade, pesquisa de extensão, que realmente a
universidade esteja chegando até a sociedade para trabalhar junto ou se
realmente vai conseguir uma forma mais potente, que resolva de fato, uma
coisa voltada mais para resolução de problemas. (UFRJAlunBQ9)
Sobre o “ambientalismo” que emerge destas relações, podemos dizer que do mesmo
modo que o curso precedente, ele tende à perspectiva antropocêntrica, deixando de lado,
seguinte relato:
95
vários departamentos e institutos, conferindo uma experiência de alto nível e com possíveis
empecilhos ao exercício da interdisciplinaridade mais difusa e que uma das saídas foi a de
criar uma ‘entidade’ inovadora que promova a interação entre as diferentes unidades.
A participação do corpo discente parece demonstrar, assim como nos demais cursos,
uma ampla democracia. Embora não tenha sido objeto desta pesquisa, esta abertura foi
também para o aluno. As linhas de pesquisa apontadas indicam vastas perspectivas como
perfazem uma tentativa de articular as diversas áreas do conhecimento mesmo sendo seus
discente:
O programa ocorre em sede própria utilizando também as estruturas das unidades que
dissertações com temas que se equilibram entre o estudo das Ciências Naturais, Exatas e
O centro que cuida do curso não é ligado a institutos, quase sempre existe
algum contratado diretamente pelo próprio programa e também existe uma
contratação dupla. Já tivemos algumas pessoas, que tinham liberação oficial,
mas atualmente não. Isso dificulta bastante, na prática fazemos um voluntariado
porque tem uma obrigatoriedade de horas de aula no instituto e as de lá não são
contadas. Várias pessoas oferecem disciplina no próprio Instituto, tenho duas,
com reconhecimento de carga horária aqui e ficando mais fácil o apoio
institucional. (USPProfBQ2)
97
extensionista, assim como nos demais cursos pesquisados, não parecem fazer parte da
maioria das pesquisas feitas. Entretanto, inúmeros resultados práticos para a promoção da
sustentabilidade podem ser indicados, em cada caso, a partir das conclusões acadêmicas.
Isto pode ser chamado de um ‘extensionismo indireto’, bastante eficazes em contextos que
coloca a questão:
sentido de intercâmbio por igual de cada uma das três grandes áreas do conhecimento. No
interdisciplinar, mas parecem não ser eficientes e nem suficientes, comprovados por terem
98
apenas duas unidades de créditos contra as outras quatro que somam trinta e oito, além de
de nos referir, podemos ver que, embora o conflito seja uma constante na integração de tão
pessoal coloca com pertinência que o trabalho faz parte de um longo processo de
organização tanto institucional quanto individual, mas que parece render bons frutos.
A não radicalidade das posições perante uma pseudo dicotomia entre especialização e
ideal e real deste campo ambiental interdisciplinar. O enorme guarda-chuva que caracteriza
esta nova área das chamadas Ciências Ambientais145 parece colocar em órbita (ou resultado
de) uma nova ordem mundial de quebra de paradoxos, ao mesmo tempo relativista e
145
Aqui, questionamos o fato da USP ter utilizado o termo no singular, conferindo (mais) uma única ciência:
“um programa de pós-graduação em ‘ciências ambientais’ se fundamentaria na premissa teórica de que as
ciências já existentes dão conta do tratamento de desafios como a poluição, erosão, eliminação de florestas,
aquecimento global e tantos outros. Já um programa de pós-graduação em Ciência Ambiental parte do
princípio de que as atuais especialidades disciplinares são insuficientes para enfrentar estas questões.”
Segundo o prospecto do PROCAM (1999), as demais ciências são obrigadas, para o trato ambiental, a
reformular muitas vezes princípios decisivos de sua organização interna (até que ponto?) e, embora não
almeje qualquer totalidade, seus organizadores parecem querer circunscrever um campo específico, fechando
fronteiras. A questão é saber se iria num sentido contra, e portanto enfraquecedora, da tendência centrífuga da
evolução da disciplina ecológica, como será apontado por M. Coutinho logo mais.
99
profissional estar apto para atuação em diversas vertentes, porém sempre sofre o perigo do
tendo sido citadas poucas vezes uma militância explícita (no sentido de engajamento em
casualmente, uma relativa homogeneidade, com representantes de cada uma das três
área biológica do que os de humanas, exatas, agrárias e engenharias. Isto pode ser devido
Ciências Naturais e à expansão mais recente pelas áreas de estudos sociais. E/ou ainda a
novas experimentações. Esperamos que novas pesquisas esclareçam pontos como estes.
100
institucional, intra e extra curso. Nos quatro cursos, no geral, seus profissionais se
interdisciplinaridade (lato sensu) entre elas. Pretendemos explicitar que a questão ambiental
AMBIENTALISMO E INSTITUCIONALIZAÇÃO
a. Dificuldades
b. Complexidade
c. Caminhos
d. Necessidade de Espaço
e. Participação e Extensão
Conclusões preliminares
102
repercussão nas mais vastas áreas do fazer humano. Uma vez que inerentemente a
humanidade utiliza recursos naturais e a pressão sobre eles segue até hoje em crescimento
ambiental. De qualquer modo, temos pela frente, nesta passagem de milênio, um sério
duelo de forças que nos obriga a nos posicionar em relação à possibilidade de extinção da
espécie sobre o planeta. A relação sociedade-natureza se mostra então complexa por sermos
ao mesmo tempo sua dependente e sua consumidora. De muita valia é a contribuição dada
por Marx, quando descreve a relação de trabalho entre o ser humano e a natureza:
1
K. Marx citado por Goldmann, L. (A origem da Dialética: a comunidade humana e o universo em Kant. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, p.9, 1948). Marx era um pensador que observava os fenômenos sociais de ponto de
vista amplo, percebendo o inevitável uso da interdisciplinaridade para se entender a complexidade da
realidade humana.
103
Para efeitos didáticos, no entanto, podemos distinguir o lento ritmo do vasto período
da história humana sobre o planeta desde nosso surgimento há cerca de 35 mil anos,
comparado à tamanha velocidade imprimida nas recentes décadas da relação do ser humano
na evolução histórica dos seres humanos, demarcamos o presente momento com o fator
‘natural’ nos faz abordar tanto elementos científicos (o que são as coisas?), quanto morais
(que atitudes perante o mundo?) e religiosos (é o todo ou obra de deus?). Para ele, sempre
houve diálogo entre sociedade e natureza, mas o ser humano passou a falar demais, sem
escutá-la. Desde antes da Idade Média, via-se “...tudo porque tudo interessa, fica-se no
espírito com cada pormenor da cena”. Cada pormenor era amado por ele mesmo, concebido
como um todo. Por isto, mesmo sabendo menos, pensava-se mais sobre os objetos,
aproveitando melhor sua intimidade, seu caráter imediato e sensível versus as estatísticas,
os balanços, as percentagens atuais. A herança do século XII foi a Escolástica que dominou
a época inspirada pelas artes - a presença qualitativa contra a quantitativa. No século XVI,
o ser humano “cansa-se de si mesmo e torna-se mais dócil perante os fatos”3, procurando
2
Lenoble, J. Rio de Janeiro: Ed. 70, 1969.
3
Ibid., p.205.
104
movimento foi um antinaturalismo, desprezando a natureza, pois ela não seria mediadora
entre deus e seres humanos, o que tornaria mais fácil a passagem da economia medieval
para uma nova. Para Castoriadis, refletindo sobre estes tempos de grandes transformações:
Esta imagem, mais tarde, segundo A. M. de Almeida, foi conformada pela percepção
científica do século XVII, eleito como fundamental na pesquisa das Ciências Exatas e
com a ‘flecha do tempo’, estava envolvido nas discussões sobre a interação dialética e não
4
Castoriadis, C. As encruzilhadas do labirinto I. Rio de Janeiro: Paz e Terra, p.144-5, 1978.
5
Almeida, A. M. M. 1996. Temas sobre o mundo rural: campo e cidade como imagens. Rio de Janeiro:
CPDA, apostila de curso, p.2.
105
noção de progresso, o autor distingue uma “forma explícita” como juízo de valor (moral),
mundo industrial. Segundo Le Goff8, na segunda metade do século XX, esta ‘modernidade’
dos mais diversos países. Foi assim que a conseqüente degradação ambiental chegou ao
patamar de urgente problemática mundial, uma vez que o interesse humano não se
6
Le Goff, J. Progresso e reação. In: Enciclopédia Eunaudi, pp.338-392. s.d. Dialética, segundo o Novo
Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa (2a ed. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1986), na Filosofia, é a
arte do diálogo ou da discussão, quer num sentido laudativo, como força de argumentação, quer num sentido
pejorativo, como excessivo emprego de sutilezas. Ou também, o desenvolvimento de processos gerados por
oposições que provisoriamente se resolvem em unidades.
7
Le Goff, p.339
8
Ibid.., Antigo/moderno, p.370. Grifo próprio.
9
Madrid: Ed. Labor, 1984.
106
da mercadoria no modus operandi capitalista industrial - o tal “pacto com o diabo” que,
segundo ele, desde a Idade Média nos envolve com o mito central de domínio da natureza.
desenvolvimento econômico de alguns países, foi de certo modo abalado pelos estudos do
examinar uma concepção mais sistêmica de nossa realidade. Este processo possibilita
sensu) não deveria ser encarado oposto a nossa própria natureza (um humanismo strictu
10
Baudrillard, J. A sociedade de consumo. Rio de Janeiro: Elfos ed., p.203, 1995.
11
Meadows, D.H. et al. The limits to growth: a report for the club of rome’s project on the predicament of
mankind. NY: Universe, 1972. O Clube de Roma, recuperando as idéias de Malthus sobre a explosão
demográfica e a eminente queda da qualidade de vida, propôs medidas de limite ao crescimento econômico.
12
Utilizo este termo buscando englobar os demais termos tais como ecologismo, preservacionismo,
conservacionismo etc., embora existam diferenças.
107
sensu), mas ser elevada ao latu sensu de uma natureza única, embora multifacetada e
carregada de desafios.
Entretanto, como uma outra face da mesma moeda, estamos sofrendo um fenômeno
condições de vida tanto de povoados marginais ao mercado quanto daqueles que nele se
obra braçal, têm demonstrado o lado perverso e desequilibrado deste processo em franca
boom demográfico deste período.14 A extraordinária aceleração nas comunicações tem uma
aparência paradoxal, pois aumenta o atraso relativo daquelas partes do mundo sem acesso à
13
Segundo Hobsbawm, o desenvolvimento do mercado mundial é precondição crucial e característica da
sociedade capitalista (op. cit., p.75). Para Morin (op. cit., p.55, 1997), a ciência econômica é a ciência humana
mais sofisticada e mais formalizada. Entretanto, os economistas são incapazes de colocar-se em acordo sobre
suas predições, porque têm se isolado de outras dimensões humanas e sociais e porque são incapazes de
encarar o que não é quantificável, ou seja, as paixões e as necessidades humanas. Assim, a Economia é a
ciência mais avançada matematicamente e a mais atrasada humanamente.
14
Os importantes avanços da medicina preventiva e curativa, atuando decisivamente para uma maior
expectativa de longevidade em quase todo o mundo, têm contribuído para este cenário, assim como as
técnicas agrícolas mecanizadas têm possibilitado alimentar tamanha proliferação humana, apesar dos castigos
sofridos ao meio natural.
108
humanidade, tem sido reformulado, pois a ilusão de sua onipotência permitiu os absurdos
...mal utilizado (ou utilizado para o mal) [que aspira pelo] (...) controle total, a
subordinação de todos os objetos e de todas as circunstâncias à vontade e ao
desejo. (...) O aumento do ‘poder’ constitui também, ipso facto, aumento de
impotência, ou mesmo de ‘antipoder’, poder de fazer surgir o contrário daquilo
que se visava; e quem calculará o balanço líquido, em que termos, com base em
quais hipóteses, para qual horizonte temporal?15
Portanto, neste século XXI, podemos perceber que este tipo de tendência ao
Entretanto, nestas três últimas décadas têm surgido (ou ressurgido), nos meios
era), idéias sobre a interdependência humana dos demais seres vivos, os riscos do domínio
Foi principalmente neste período pós IIa. Guerra Mundial, com o crescente
15
Castoriadis, op. cit., p.154. Grifos próprios.
16
Capra, F. O ponto de mutação. São Paulo: Cultrix, 1982.
17
Lovelock, J. Gaia.. Nova York: Oxford University, 1979.
18
Veja em J.D.Hughes La Ecologia en las civilizaciones antiguas. México: Fondo de Cultura Economica,
s.d.; J. Opie Renaissance origins of the environment crisis. Environmental Review. Oregon: Oregon State
Univ., vol.11, n.1, 1987.
109
várias instâncias políticas e acadêmicas começou-se a discutir uma educação voltada para o
social e não somente físico-biológica da natureza. Porém, mesmo assim, desde Estocolmo
(1972) ainda se tratava de controlar prejuízos ambientais e qualidade de vida, sem interferir
mas pouco se acertou sobre uma possível e necessária alteração do rumo devastador do
‘interdisciplinaridade’ são dois conceitos que têm recebido grande relevância nos últimos
anos, marcados não apenas por crises políticas, econômicas e ecológicas mundiais, mas
19
Ver em Moreira, Roberto José. Economia Política da Sustentabilidade: uma perspectiva neomarxista. In:
Luiz Flávio Carvalho Costa, Regina Bruno e Roberto José Moreira (orgs.) Mundo Rural e Tempo Presente.
Rio de Janeiro: Mauad, 1999.
110
(vide a noção de paradigmas em Kuhn), como também no meio universitário, como o caso
P. Acot, em seu livro sobre a História da Ecologia22, nos declara que esta história não
pode ser simplesmente separada de uma reflexão sobre a natureza do homem, pois quem
lida com esta ciência pode reencontrar sua própria genealogia. Portanto, há uma forte
atração entre Biologia e História - que se fecundam entre si formando uma História
Ambiental e/ou a Etnobiologia -, pois não podemos distinguir um objeto ou ser atual sem
20
Uso estas aspas para relativizar o termo, já que não se trata de uma contradição direta e sim de alternativas
diferentes, mas possivelmente includentes.
21
Margalef, R. Ecología. Barcelona: Planeta, p.21, 1981.
22
Rio de Janeiro: Campus, 2a. ed., 1990.
111
e transformação através do tempo e do espaço.23 A Biologia, ciência que estuda a vida, que
procura discernir a especificidade dos seres viventes e a evolução que neles ocorrem, nos
remete afinal à eterna busca sobre o porquê do mundo, origem, presente e destino, nem tão
estático, nem tão aleatório, mas um equilíbrio dinâmico, auto renovador e auto
século, pode vir projetar luz intensa e colaborar com os demais ramos das Ciências Exatas e
problemático e promissor.
Ao nosso ver, este auxílio pode ir mais além, uma vez que o estudo da
interdependência entre os seres vivos e entre estes e seu micro e macro habitat pode levar o
cientista social e das demais áreas a uma interdisciplinaridade mais ampla em suas
pesquisas, visando integrar diversos ramos das ciências, o que iria pela contramão do
23
Como se estudássemos o cume de um iceberg, montanha ou árvore, sem levar em consideração todo o
montante que faz com que este cume se erga sobre mares, vales e solos; o topo só se ergue devido à existência
de uma base ou raízes mantenedoras. Ou seja, nossa permanente poiesis natural, biológica é inevitável e
imprescindível.
24
Evolução, em Biologia, é o complexo processo no qual os organismos vivos originados na Terra têm se
diversificado e modificado através de alterações permanentes na forma e na função. É resultado de
sucessivas radiações de novos tipos de organismos, muitos dos quais se extinguiram, mas alguns se
desenvolveram até as presentes fauna e flora do planeta. Extinção e diversificação mantêm-se operando
atualmente.
25
Drummond, J. A. Ciência sócio-ambiental: notas sobre uma abordagem necessariamente eclética. In:
Rolim, Rivail Carvalho et alli (orgs.) História, espaço e meio Ambiente. Maringá: ANPUH - PR, p.11-42,
2000.
112
paradigm) aos fatores da natureza. Nele, cada sociedade e a cultura humana em geral são
Em seu conciso, porém valioso livro sobre o assunto, A. Lago & J. A. Pádua28
como ‘mentalidade’ surja já no século XVI, nasceu como disciplina há mais de 130 anos.
Ela acabou por se transformar em um movimento político e social neste século, inclusive
Ecologia Política, por exemplo, onde são utilizados elementos dos mais diversos campos:
pessoas e países estão passando a questionar seu modo de vida; nas ciências há um
provocante e fértil debate sobre suas bases epistemológicas e valores filosóficos. Segundo
26
Drummond, J. A. A história ambiental: temas, fontes, e linhas de pesquisa. Estudos históricos, Rio de
Janeiro, n.8, p.180, 1991. Nos termos de E. Durkheim, fatos sociais só podem ser explicados por outros fatos
sociais.
27
Apud Lago, A. & Pádua, J. A. O que é ecologia. São Paulo: ed. Brasiliense, Coleção Primeiros Passos, n.º
116, 1984. O fato de nos referirmos ao Ocidente enquanto civilização, e, por conseguinte imaginar também
uma oriental, não constitui um paradoxo ao ponto defendido do continuum biológico ao início do capítulo:
nos referimos a uma ‘consangüinidade’, pelo menos entre os humanos, conferida pelos poucos tipos
sanguíneos existentes e pela alta proximidade genética com demais primatas.
28
Op. Cit.
113
os autores, percebe-se claramente a origem científica deste movimento que passa a ser
contra a ciência aliada à tecnologia devastadora no final do século XX. Esta transformação
paradigma ‘irracional’ do ser humano perante a natureza: um papel ambíguo da razão e, por
Acot, por sua vez, traça a linha evolutiva desta ciência relativamente recente
acompanhando seu desenvolvimento desde Carl von Linne (Lineu) no século XVIII com
sua idéia de natureza ainda providencialista e finalista dos moldes medievais. A partir daí,
das relações vitais externas dos organismos ou ciência do habitat ou da biocenose.29 Mais
tarde, esta definição se alarga para uma totalidade das relações do organismo com o meio
ambiente (biótico ou não), compreendendo todas as condições para sua existência. Aqui
surge uma alteração básica de conceitos: do estudo de situações de espécies fixas, já dadas,
com o darwinismo, passamos a estudar processos a partir das adaptações dos seres a novas
29
Acot cita que este termo foi inventado por K. Möbius em 1877: “pela primeira vez na história, um conceito
científico permite pensar uma entidade biológica integrando elementos pertencentes a dois Reinos diferentes”.
Ibid., p.78. Segundo E. F. Neto (Dicionário prático de ecologia. DF: Alhambra, 1992), embora seja
intrinsecamente dependente ao biótopo, refere-se aos elementos vivos daquele ecossistema. Segundo este
mesmo autor, “ecologia” foi inicialmente um termo da botânica (!) e que, por analogia, “foi transplantado
para a biologia animal, daí para a antropologia e a sociologia”. (p.69)
114
condições do meio externo (onde estariam os humanos). Deste modo, muitas pesquisas
ocorridas nos seres viventes, antes de uma mais completa descrição da hereditariedade. No
‘caloria’, servindo para medir fatores tanto bióticos quanto abióticos, se prolonga nas
As análises dos ciclos de relações tróficas indicam que uma comunidade biótica
não pode ser claramente diferenciada do seu meio ambiente abiótico: a partir
disso o ecossistema deve ser considerado como unidade ecológica mais
fundamental.31
que, ainda hoje, muitos de nós tenhamos uma concepção de ser vivo funcionando como
Acot:
30
Já o termo ‘ecossistema’ foi cunhado por A. G. Tansley somente em 1935, entrevendo que os vínculos
existentes entre o ser vivo e o inorgânico são estruturados de maneira circular e não linear. Ambos termos
podem ser vistos como um início da concepção interdisciplinar da realidade natural observada pela ciência.
31
R. Lindeman apud Acot, ibid., p.88 (grifos inseridos). Ao mesmo tempo em que se percebe uma interação
entre ciências a princípio desconexas, este autor confere a este processo como contribuinte para fixar a ciência
ecológica na corrente reducionista em Biologia.
32
Ibid., p.90.
115
hierarquia que submete o ser humano à natureza. Porém, como obstáculo fundamental ao
nascimento da Ecologia Humana, o homem biológico, por ser igualmente social, escapa em
uma espécie, escapa a análise puramente cultural. Em 1922, esta nova área científica parte
para uma concepção mais engajada através de uma ‘humanização da ecologia’, não
somente pelos estudos empíricos das relações humanas, mas também por uma tendência a
uma Ecologia aplicada, ligada de maneira particular ou estreita a questões que tratam da
jornalistas, procuraram desde então tal aproximação, porém consideraram a cidade como
“meio externo natural”, ao mesmo tempo que reconhecem seu caráter altamente artificial.
Esta contradição é resolvida parcialmente com a idéia de que as cidades são o ‘habitat
natural’ de se viver em cidades. Através de metáforas biológicas num jogo de palavras, esta
33
Ibid., p.91. Grifos próprios.
34
Acot relata que em 1935, houve a crítica ao ensino de Biologia, que desenvolvia insuficiente
reconhecimento da dimensão social e comunitária, retardando a integração das Ciências Biológicas e das
Ciências Sociais.
116
dependente energeticamente de outros.35 Esta área é marcada então por um forte paradoxo
que se reflete nas grandes oposições ideológicas, mais natural ou mais social: o biologismo
como essenciais em cada caso, mesmo procurando conciliá-los, numa aparente oposição
científico-ideológica:
transformarmos o ambiente que nos cerca? Não seria do mesmo modo da nossa essência
termos a capacidade mental de impor condições para que esta ‘natureza externa’ seja
primeiro caso, no de auto desenvolvimento sem um apelo duradouro, sendo que apenas
mundial, resultado da intensificação deste duelo de forças. Se há mais ênfase nas práticas
35
Para nós, o exemplo coloca, por outro lado, a problemática do conceito, embora como já dito,
imprescindível para a Ecologia. Os ecossistemas muitas vezes não apresentam limites rígidos e representa
interações com ecossistemas vizinhos, resultando em circunscrições maleáveis.
36
Ibid., p.124. Contudo, essas relações unilaterais não são colocadas mecanicamente. Segundo Acot, o
historiador Karl Ritter define a história como conseqüência e causa da presença humana sobre a Terra,
enquanto F. Braudel e E. Le Roy procuram integrar o meio ambiente em suas pesquisas. Acot cita ainda os
trabalhos de L. Febvre, M. Sorre e M. Mauss.
117
Deste modo, os defensores da unidade material do mundo (que faz subordinar às leis
especificidade humana, caindo mais uma vez num dualismo - o eterno problema filosófico
de nossa identidade.38 Por outro lado, defendendo-se a autonomia soberana do ser humano,
metafísica. Acot cita Darwin, Lyell, Marx, Engels e Spencer como os pensadores
37
Ibid.., p.132. Longe da oposição entre nostalgia e otimismo generalizados, queremos crer numa composição
entre o arque e o neo, entre uma sabedoria milenar e um orgulho altruísta, ciente de uma ‘nova’ aliança (ver I.
Prigogine).
38
A busca pela auto-explicação humana não nos parece apenas um fenômeno moderno e científico, mas
perpassa a história das mentalidades e da própria filosofia.
118
A Ecologia vista latu sensu como derivando nas Ciências Ambientais, essencialmente
interdisciplinar, busca integrar uma síntese coerente entre as diversas áreas das Ciências
objeto a ser pesquisado pelas diferentes áreas do saber científico, neste ínterim, é
portanto construir uma Ecologia Humana, uma Socioecologia ou uma Biologia Social39 que
atinjam um equilíbrio, processo este que também parece ser perseguido, até certo ponto,
pelos cursos pesquisados. Mas cremos numa síntese dinâmica, onde um ‘biologicismo’ não
Já como movimento cultural, segundo Lago & Pádua, “a idéia central do ecologismo
é de que a resolução da atual crise ecológica não poderá ser concretizada apenas com
39
Nos EUA, a Escola de Chicago se tornou famosa por contribuições essenciais neste campo. No Brasil, o
principal representante é o professor D. Hogan da UNICAMP. A Socioecologia é um tema tratado através da
psicologia no curso EICOS aqui pesquisado. A Sociobiologia é originaria das idéias de E. O. Wilson nos anos
70 e pode também ser vista nas obras de M. Ruse Sociobiolgia: senso ou contra-senso (Belo Horizonte:
Itatiaia, 1983) e de G. O. da Silva O que é Sociobiologia (São Paulo: Brasiliense, 1993). Existe ainda a área
da Antropologia Ecológica , título do livro de W. Neves (São Paulo: Cortez, 1996).
40
Marcuse, H. El hombre unidimensional. Barcelona: Seix Barral, 1968. N. M. Unger (O encantamento
do humano: ecologia e espiritualidade. RJ: Loyola, p. 56, 1991) utiliza o termo
‘reencantamento do mundo’ de M. Berman, resposta ao escrito por M. Weber sobre o
processo histórico de secularização e o conseqüente ‘desencantamento do mundo’. Em O
Poder do Mito, Joseph Campbell (São Paulo: Palas Athene, 1979) assinala o grave e o constante (como a bela
e a fera) no sofrimento humano, tema principal da mitologia clássica. A causa secreta de todo sofrimento seria
nossa própria mortalidade, condição primordial da vida: “Quando se trata de afirmar a Vida, a mortalidade
não pode ser negada”. A outra ‘face’ do mesmo tema, segundo o autor, é dada pelo mito do herói que luta
pela superação das “paixões tenebrosas”, simbolizando nossa capacidade em controlar o “selvagem
irracional” dentro de nós. Nós e Campbell dividimos o mesmo lamento: do “fracasso em admitir, dentro de
nós, o enfebrecimento carnal, lúbrico, endêmico à natureza humana, não como um ato de coragem, mas de
auto-descoberta” (p.37).
119
Ao nosso ver, haveria aqui a necessidade de uma reflexão a nível mental, psicológico
até ignorar a dicotomia entre os pólos uma vez vista a inerente interdependência entre
Platão, Tomás de Aquino, Hegel e Spencer (para este, uma real analogia pode ser
De acordo com Acot, somente em 1901, a palavra ‘ecologia’ apareceu pela primeira
vegetal defende que “conceitos operatórios para se pensar plantas individuais são
pode-se construir analogias estruturais no plano das relações existentes entre as partes que
constituem o todo:
Além de conferir caráter científico à análise social, esse ponto de vista permite
pensar a unidade material do mundo sem se atolar nas problemáticas dualistas
41
Op. cit., p.15.
42
Ibid., p.37. Lago e Pádua citam autores de pensamento anarquista (P. Proudhon, P. Kropotkin, P.
Goodmman), pacifista (H. D. Thoureau, L. Tolstoi, M. Gandhi, M. Luther King), liberais humanistas (K.
Lorenz, L. Munford, R. Dubos), marxista (H. Marcuse, A. Gorz, R. Bahro), críticos independentes da
sociedade (I. Illich e V. Packard) e defensores da libertação social e psicológica dos homens (W. Reich, A.
Watts, I. Sachs, T. Roszack): “são educadores, médicos, físicos, filósofos, economistas, artistas, engenheiros,
etc., todos envolvidos na busca de novos caminhos, de novas estratégias de vida” (Ibid., p.41).
43
Op. cit., p.146.
120
organismos, que apresentam processos internos como funções metabólicas. Uma certa
Química. Entretanto, uma analogia não significa identidade, portanto não há uma
transferência direta, embora confirme a “unidade ontológica do ser vivo”. Para Acot:
‘naturalista’, quanto da dimensão biológica sob um ângulo antropocêntrico tem nos levado
a descobrir o papel complementar de cada fator, evitando posições redutoras (sem dúvida,
44
Ibid., p.147.
45
Ibid., p.152.
46
De acordo com Lago e Pádua (op. cit., p.27), quanto às necessidades, “o Homem não é exceção, pois o que
sempre esteve em jogo nos diversos modos de produção surgidos ao longo da história foi sempre o como
produzir e o para quem destinar os frutos da produção. [Portanto.] ...a Economia deveria ser considerada um
capítulo apenas da Ecologia”.
121
Humana fornecem base de modelo teórico de imprescindível importância, mas não decorre
A Ecologia Humana tem procurado uma abordagem sistêmica do mundo vendo a fusão
nova metodologia científica. Caminho este que nos parece também almejado, em algum
sentido não reducionista, pelas equipes de pesquisadores entrevistados, embora sem esta
denominação.
Segundo Lago & Pádua, uma “contraprodutividade” surge, pois chega ao limite de
eficiência de uma estrutura que passa a gerar menos energia e a consumir mais para sua
auto manutenção. Acot interpreta este conjunto de posições ambientalistas através de uma
via da síntese ecossistêmica e citando E. Odum, defende que “...a gestão dos ecossistemas e
a ecologia humana aplicada (...) tornam-se novas tarefas que exigem a confluência de uma
independente umas das outras”.48 A reflexão ecológica nos permite discernir novas relações
47
Acot P., op. cit., p.160.
48
Ibid., p.176. Grifos inseridos.
122
história das mentalidades, para Acot, parece vir confirmar a presença de um pensamento
na interface de duas ordens de realidade bem distintas”:50 entre a vida concreta e a ideal,
seja técnico, institucional e mental, uma vez que a ciência é tanto oriunda quanto
inspiradora das demandas sociais. Por outro lado, o autor demonstra certo paradoxo ao
defender uma “ruptura com o caráter separador do procedimento clássico”, pois ao mesmo
Nosso ponto de vista coaduna-se com alguns autores dialéticos que percebem a
unidade geral concreta. Para Lukács, por exemplo, em Para a Ontologia do Ser Social51,
que desenvolve seu texto procurando discorrer sobre ser social e ser geral, há uma
liberdade, entre o “puro conhecimento da natureza” e a “pura moral”. Citando autores como
49
Ibid.., p.193, nota 3.
50
Ibid., p.189. Grifo próprio.
51
Tradução do original em alemão Zur Ontologie des gesellschaftlichen Seins. Darmstadt: Luchterhand,
1984, por Mário Duayer, Professor Titular do Departamento de Economia da Universidade Federal
Fluminense. Versão preliminar (Maio 96). Introdução da parte I. A Situação Atual do Problema.
123
formal”. O autor critica o positivismo como a corrente de pensamento que concordaria com
“mandato social” (“em geral não expresso, raramente formulável e na maioria das vezes
...as necessidades vitais da práxis humana (...) estão em interação com visões
teóricas dos homens; (...) a práxis é determinada pelo ser social que é mediado
pela natureza, [resultando] da totalidade das atividades vitais um contexto pleno
de sentido.53
Embora não seja intenção imediata tratar diretamente destas questões nos cursos
52
Já o biólogo G. Bateson, idealizador da ‘ecologia da mente’ e do ‘padrão que nos conecta’, defende em seu
texto Los hombres son hierba: la metáfora y el mundo del processo mental (In: Thompson, W. I. Gaia:
implicaciones de la nueva biologia. Barcelona: Kayrós, p. 38, 1989.) que a epistemologia, as teorias da mente
e as da evolução são quase a mesma coisa, sendo a primeira um termo mais geral que abarca as demais.
Veremos mais adiante suas idéias através de outros autores.
53
Lukács, G. Ibid., p.4. Veremos mais adiante, principalmente na questão sobre paradigma, se os
profissionais das Ciências Ambientais pesquisados corroboram com estas idéias que se resumem na noção
marxiana de ser natural humano – como ser possuidor de objetividades e subjetividades abertas –
confirmando uma “unidade geral” ou “ontologia geral” e “suas próprias categorias específicas”. (p.2)
124
‘naturalista’ que concebe uma preferência ou uma maior ponderação dos elementos
‘primitivos’, básicos, essenciais na existência humana que dizem respeito aos valores
ambientais que nos cerca e nutre. Cremos que o movimento ambiental inteligente prega não
própria vida (o que também não é suficiente para resolver a complexidade da natureza
humana).
tragédias ambientais dos últimos tempos (guerras mundiais, bombas atômicas, desastres
com metais pesados etc), incluindo as mais recentes e urgentes problemáticas de ordem
humana mundial. A partir daí, a busca por alternativas se tornou premente em grande
percepção de que há um real perigo de extermínio até mesmo da espécie humana, fez com
sociedade e natureza.
reuniu, pela primeira vez na história mundial, representantes de 113 países, como resultado
da crítica à visão antropocêntrica que percebe a Terra apenas como fonte infinita de
Mas um dos mais importantes foros de debate desta educação preservacionista ocorreu em
Neste encontro, o termo meio ambiente foi definitivamente ampliado, passando a incluir as
dimensões antrópicas, éticas, estéticas, históricas etc. Esta conferência foi reiterada pela
1987), assim como pela Agenda 21, emanada da Conferência das Nações Unidas sobre
pensamento ecológico, que tem influenciado diversos campos científicos, parece procurar
mais legitimadora que transformadora dos desequilíbrios crassos de nossa atual realidade,
principalmente em países como o Brasil. Dentre os desníveis sociais apontados por Odum54
estão os da renda entre ricos e pobres, do alimento entre nutridos e subnutridos, dos valores
54
Odum, E. P., op. cit.
126
entre o mercado e o que está fora dele e, enfim, o do sistema de ensino, entre aqueles
como base o pensamento crítico e inovador, em seus modos formal, não formal e informal,
educacional:
problemas sócio-ambientais voltado para estratégias locais, embora também contemple uma
orientação sexual e a pluralidade cultural) como tema transversal dos currículos escolares,
55
Fórum Internacional de Organizações Não-Governamentais, Conselho Internacional de Educação de
Adultos, São Paulo, 1992. Grifos próprios.
127
Sem dúvida, este procedimento representa um relevante esforço para se estabelecer através
da educação formal, uma relação mais equilibrada do ser humano com a natureza e
promoção da Educação Ambiental como uma das obrigações do poder público em todos os
ambiente, bem como na concepção e aplicação de decisões que afetam a qualidade do meio
natural e sócio-cultural.
56
Brasil. Secretaria de Educação. Parâmetros Curriculares Nacionais: meio ambiente, saúde. Brasília: SEF,
p.15, 1997.
128
de técnicos e educadores que atuam nos órgãos de meio ambiente e de educação e ao apoio à
políticas para o meio ambiente, bem como na concepção e aplicação de decisões que afetam
disciplinas com o intuito de dar conta da complexidade dos fenômenos humanos e naturais.
57
Dados obtidos na página oficial do IBAMA: http://www2.ibama.gov.br
129
realidade sócio-ambiental. Neste sentido, parecem ser necessárias equipes formadas por
comunitariamente.58
de uma maior integração entre as disciplinas e áreas acadêmicas, refletida num currículo ao
mesmo tempo mais coeso e diversificado. A recente e cada vez mais crescente discussão
multifacetado e por isto complexo. Uma vez que todas as linhas divisórias precisas são
arbitrárias, esta tentativa de se seguir um caminho entre dois pólos a princípio opostos
58
Além disto, esta dinâmica de aproximação de disciplinas pode vir a fecundar novos
terrenos do intelecto quando em contato com outros saberes: o senso comum, as artes, a
religião, a filosofia, a ética e os demais valores culturais da sociedade. Uma
‘transdisciplinaridade’, como se tem defendido entre educadores ambientais, se daria num
passo além das disciplinas, na construção de novas abordagens ‘supra disciplinares’.
130
(como por exemplo, entre a Ecologia e a Economia que originou a Economia ambiental),
possa vir auxiliar em nossa auto explicação. Sem um apelo profético ou surreal, mas
iniciou o atual debate sobre a questão ambiental em todo o mundo, por volta das décadas de
1960 e 1970. É claro que a comunicação entre as disciplinas sempre houve antes disto, mas
59
Giddens, A. As Conseqüências da Modernidade. São Paulo: Ed. UNESP, 1990.
60
Ao mesmo tempo, não estamos perfeitamente convictos se teremos que passar por maiores privações
sócias, econômicas e ecológicas, para que realmente possamos nos engajar nesta transformação. Ou seja, não
descortinamos se, para atingirmos planetariamente tal conscientização ecológica, deveremos chegar a uma
radicalidade existencial ao invés de uma simples reforma progressiva no comportamento humano.
131
requer uma atitude de cooperação entre as mais diversas áreas do conhecimento humano.61
dia são mais de 100 universidades oferecendo tais programas de forma que aquelas que não
optaram por não sediarem tais cursos na graduação, oferecem os mesmos a nível de
especializam em meio ambiente, o fazem em áreas bem específicas. Desta forma, ao invés
visão mais ou menos detalhada de diversos aspectos do meio ambiente (nos parece que
61
Seria interessante saber principalmente dos profissionais de Geografia se há algum consenso em respeito à
interdisciplinaridade, uma vez que esta área acaba por estudar diversas dimensões da relação humana com a
natureza: desde a geografia humana, regional, física, econômica, política e o estudo das paisagens.
62
Meio Ambiente: Um tema de valor estratégico para a universidade brasileira. Texto apresentado durante a
Conferência Virtual Meio Ambiente 99 (http://meioambiente99.realworld.de). Este biólogo brasileiro recém
lançou o periódico britânico “International Journal of Sustainability in Higher Education” (IJSHE), que
aborda a questão do desenvolvimento sustentável e conservação ambiental em universidades.
132
ou biólogo) que se especializa em determinada área do meio ambiente com maior precisão,
como por exemplo, a qualidade do ar, emissões industriais ou direito ambiental (nos parece
graduação em Ciências Ambientais, Leal Filho aponta para alguns elementos: realidade de
tese de que a ênfase no tema oferece à universidade brasileira a chance de capitalizar com o
em uma área cuja importância para a região já se revela como uma área chave.
63
Informações obtidas na página http://www.unesco.com
133
(1972) e sob condução da ONU: o Programa para o Meio Ambiente (PNUMA) e para a
de Formação Ambiental para América Latina e Caribe, apoiado pelo PNUMA. Hoje, a
sustentável.
64
Ibid.
134
comunidades.
posta em prática pela Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA) em 1986, foi
aprofundamento da problemática ambiental em todo o mundo e que sua solução exige uma
• Programas interdisciplinares;
65
Informe Final, 1986.
135
autonomia sobre suas linhas de ação, maior participação na política nacional do meio
banco de dados de programas interdisciplinares, o que nos parece não ter sido executado
unidades como centros ou núcleos com integração de docentes, visando ministrar aulas
as experiências populares, conduzindo-as para dentro do saber científico, através dos seus
houve maior ênfase na discussão das bases epistemológicas da temática, observando assim
uma preocupação mais teórica que pragmática do último encontro. Do mesmo modo, surge
com maior clareza a dimensão política, principalmente no trato da elaboração dos relatórios
66
Ibid., p. 30.
136
de impacto ambiental feitos pelas universidades. Neste sentido, este autor cita que ocorreu
certa polêmica nestes dois tipos de recortes: o pragmatismo que menosprezava o debate
teórico-metodológicos e práticos.
Nos anos seguintes, este seminário foi repetido, sendo também replicado em
Impacto Ambiental e seu Relatório, este tema se tornou obrigatório nos mais variados
tema. Houve muitas críticas e interpretações em relação aos estudos e sua portaria, por ser
genérica e pela falta de conhecimento exato sobre o assunto. De qualquer modo, a medida
veio tentar mitigar as ações espoliativas sobre os recursos naturais, como nas áreas de
mineração, rodovias e distritos industriais. Para tanto, mesmo havendo dúvidas entre multi
67
O pragmatismo se mostrou bastante convicto no discurso de um docente da UFRJ (B), enquanto o
tecnicismo pareceu com mais força no discurso de um discente da UFMG (A). De um modo geral, nos demais
relatos, houve um certo equilíbrio entre os dois recortes.
68
I Simpósio Estadual sobre Meio Ambiente e Educação Universitária – área de Ciências Ambientais.
Informe geral. São Paulo: Governo do Estado, SEMA. 1988.
137
segundo o secretário Dr. Jorge Wilheim que apontou, como necessidade, para um trabalho
também de “humildade” neste enfrentamento da questão, recém iniciada no país. Ele ainda
ou departamento. Dr. Zatz, presidente da mesa nesta ocasião, declarou que o meio ambiente
anti-natural”, pois cada vez que se pratica a cultura, afeta-se a natureza, com o que não
concordamos inteiramente, ele considerou que o desenvolvimento nacional não pode ser
apenas econômico e que a complexidade do fator ambiental na sua relação com o fator
humano deve ser tratado coletivamente. A profa. Marisa P. Lajolo lembrou que existem,
natureza, quanto seu apropriamento como fonte de renda e de lucro; tanto paisagem quanto
tratando de educação, ela considera um ponto crucial: como “... pensarmos que uma
instituição tão frágil quanto a escola [ou universidade], vai ter o poder de se opor e de
essa é uma política formalmente, oficialmente aceita por uma sociedade como a
respondida por Santos. O eminente geógrafo Milton Santos, buscando definir a Educação
69
Ponto destacado na dissertação da aluna da UFRJ (B), sobre os pesquisadores ambientais deste estado
(citada mais à frente).
138
Ambiental, deduz seu caráter ideológico e lembra que a Geografia sempre tratou da questão
Educação Ambiental busca aumentar o grau de cidadania das pessoas, este autor frisa a
(1988), algumas das considerações genéricas resultantes foram: a unanimidade das críticas
Inúmeras foram as considerações dos grupos de trabalho, divididos nos temas relativos aos
explicitado que a interdisciplinaridade não pode ser criada por decreto, valorizando-se
então modelos organizacionais flexíveis, onde haja uma vivência comum de pesquisa,
Universidade, para o trato da questão ambiental e que possam servir de referência para o
70
IBAMA/Min. do Interior. Documento Final. Brasília, p. 19, 1988.
71
Ibid., p. 19. Veremos a seguir que a departamentalização universitária foi bastante criticada pelos
entrevistados e que também apontaram para o problema da falta de costume de diálogo para o trabalho
interdisciplinar.
72
Ibid., p. 24.
139
Archimedes Perez Filho, Myriam Krasilchik, André Francisco Pilon, Jorge Madeira
para o passado humano do que para seu futuro e ainda excessivamente com função de
uma vez que a concepção construtivista impõe a busca de outras entidades curriculares que
73
Seria interessante conhecer e promover trocas de publicações entre aquelas instituições que participaram
das diversas experiências interdisciplinares principalmente envolvidas no PADCT.
74
SEMAA. Documento final, 1989.
140
procurou considerar inicialmente o perfil ideal do profissional a ser formado: que tenha
capacidade de reflexão das diversas variáveis físicas, humanas e biológicas que da questão
emerge, lembrando ainda que o profissional deve estar a par dos “valores e demandas de
projetos integrados.75
brasileira. Em seus textos básicos, fazendo um apanhado geral dos encontros prévios, o
geógrafo Antonio Carlos de Moraes, apontou para três posturas que dificultam o debate e a
ambiental no ensino de pós-graduação” foi abordada por palestra de H. Sobral, que lembrou
com as atividades humanas e a necessidade de se reverem conceitos básicos. Cita que além
75
Ibid., p.182. Este ponto é incluído no exame dos depoimentos justamente na questão que indaga sobre o
perfil de cada entrevistado e onde poderemos perceber um valioso engajamento profissional e ético de
trabalhos coletivos experienciados.
76
IV Seminário Nacional sobre Universidade e Meio Ambiente - Textos básicos. 1990.
77
Neste caso, podemos apontar também para um pleno equilíbrio na disputa entre estas três tendências junto
aos cursos pesquisados. Tanto o cientificismo positivista dos engenheiros, quanto o naturalismo
conservacionista dos biólogos e o romantismo humanista dos sociólogos (como exemplos) parecem se
pactuarem junto aos programas interdisciplinares em Ciências Ambientais.
141
clássicas e quantitativistas desta ciência, resgatando a idéia de que o tema ambiental está
modo, defende a referida palestrante, que o uso do conceito de ‘meio’ deve ser evoluído
para o de ‘espaço’, porquanto este compreende o “produto das relações que se estabelecem
entre ele e a sociedade...”.78 Cita ainda as iniciativas da USP, UFRJ, UFPA, UnB, UFSC,
UFPR, UFJF, UFMG, UNESP e PUC-SP que apresentaram o intuito de se criarem cursos
que abordem o tema ambiental interdisciplinarmente, mas ainda não colocados em prática.
entraves mais sérios como a orientação setorial dos enfoques em meio ambiente e a
...é certo que o conhecimento setorizado, que não ultrapassa a barreira das
disciplinas estanques, jamais poderá atender a este apelo [de prover o
conhecimento ambiental]. Isto passa, necessariamente, pela adoção de um
modelo epistemológico transdisciplinar.79
Carlos Walter P. Gonçalves, neste quarto encontro, proferiu palestra sobre extensão
universitária frisando a difícil relação entre saber e fazer. Conferindo a extrema importância
desta interface universidade e sociedade civil, o palestrante percebe a diferença lógica entre
78
Ibid., p.164. O conceito de meio ambiente não é trabalhado nas entrevistas, embora seja assunto de muitas
controvérsias, principalmente dentre os geógrafos. Em geral, as respostas trouxeram à tona a complexidade da
questão, percebendo-se as inúmeras facetas (sócio, político, econômico cultural, ambiental) que ela provoca.
Na Biologia, o meio compreende fatores não apenas bióticos e abióticos, mas também antrópicos,
principalmente na Ecologia.
79
Ibid., p.167. Como será apontada no capítulo sobre paradigmas, uma nova epistemologia é vislumbrada por
inúmeros entrevistados, uma vez que o mero conhecimento disciplinar tradicional não tem dado conta da
multi dimensionalidade da questão ambiental. Três respostas na questão referente a paradigmas, conferem um
necessário “enfrentamento” e uma liberdade de “escolha” que a comunidade científica possa se conferir.
Citam ainda o trabalho de Bachelard e Morin como potencializadores da temática.
142
questão ambiental “... exige um outro paradigma que seja capaz de dar conta da
complexidade histórico-natural”, frisando que homem e natureza não são mundos à parte:
Neste sentido, ele acredita que o Brasil, por um lado, por sofrer de uma “síndrome do
sem levar em consideração seu potencial natural e, por outro, a falta de uma tradição
universitária promove bacharelismo e elitismo fora do real cotidiano de sua porção extra
acadêmica.
Assim, aponta o ‘nó górdio’ da questão das formas de organização universitária visando dar
sociedade civil.81 A universidade como lócus privilegiado de produção de saberes deve ser
80
Gonçalves, C. W. P. Extensão universitária e meio ambiente: a difícil relação entre o saber e o fazer. Ibid.,
p.192. Do mesmo modo que a citação prévia, a temática sócio-ambiental como reflexo de um novo paradigma
é apontado pela maioria dos entrevistados (60%).
81
As formas de organização universitária pesquisada foram basicamente duas: o antigo modelo
departamental, porém com abertura para iniciativas interdisciplinares com áreas conexas e a de formação de
um núcleo ou centro isolado, mas composto por representantes de diferentes unidades e suas respectivas áreas
científicas (estes mais recentes e buscando realmente atingir não apenas pesquisa e ensino interdisciplinar,
mas também, até certo ponto, extensão). Os dois cursos levantados estão conectados com a vice-reitoria
acadêmica.
143
capaz de construir as pontes necessárias, sabendo lidar com os perigos, apontados pelo
referido professor, o lucro e a solução imediatos. Por fim, ele vê que a extensão
alavanca para a elaboração e a institucionalização de diversos cursos pelo país afora que
interdisciplinaridade a partir das áreas humanas e exatas, na área biológica, a Ecologia, tem
Nesta tendência atual em se ‘construir pontes’ entre disciplinas, muitas questões têm
sido tratadas por pensadores com intuito de se conhecer como tem se dado o processo de
que permeiam a Sociologia da Ciência nesta área têm seguido a conjuntura internacional.
dificuldades nas tentativas de trabalhos transdisciplinares. Cita esta autora que a Ecologia é
vista como uma das disciplinas peculiares do “novo Renascimento” nas ciências,
contra a expectativa de que ela se tornaria cada vez mais unificada teoricamente, a
144
Ecologia, segundo a autora, tem se mostrado ainda mais heterogênea no período pós IIa.
centrífuga”, construindo laços com as demais áreas. Pode ser percebida como um ‘buraco
conhecimento. Ela carrega ainda uma clara tendência, de acordo com a pesquisadora, de
desenvolve, segundo a autora citada, uma forte interação com discursos não científicos,
redução da biodiversidade, etc).83 Neste sentido, Coutinho aponta para duas alternativas em
que se encontra o campo político: num impasse histórico cultural, o que se tem chamado de
mais moderada, de que tal crise é típica e passageira (discurso tecnocrático sustentabilista
82
Ibid., p.3. Livre tradução.
83
Coutinho refere-se, como característica básica neste período renascentista, o amálgama dos discursos
políticos e científicos e a participação não apenas de partidos ambientalistas, mas também de organizações
não-governamentais ou da sociedade civil.
84
No confronto entre estes dois pólos, embora haja todo um leque de possibilidades, cremos que os cursos se
enquadram na vertente mais radical, embora os pesquisadores apresentem ainda muitas dúvidas e não perdem
o antropocentrismo na defesa da sobrevivência e da qualidade de vidas humanas.
145
que em sua área limitada. Coutinho se refere à passagem, embora não substitutiva, de um
Quanto à diversificação institucional no que se refere ao Brasil, ela indica que não existe
CAPES85 tem exigido dos diferentes institutos, níveis de qualificação mínima (cujas notas
superior do que em outros grupos de pesquisa, sendo a maior parte concentrada na região
sudeste. Seguindo uma primeira fase na década de 70/80, uma segunda onda se deu a partir
85
Esta agência de fomento à pesquisa tem sido primordial para o desenvolvimento científico do país e é
responsável por uma nova onda de institucionalização com a criação de um campo multidisciplinar em sua
estrutura de avaliação de cursos.
146
de 1988 que se configura numa tendência à transdisciplinaridade, assim como uma intensa
No início dos anos 90, apenas 4 cursos de doutorado eram oferecidos no país (dois do
como stritu sensu em Ecologia (INPA, UnB, UNICAMP, UFRGS). Os demais, já surgidos
nos anos 90, já apresentam uma tendência mais forte na busca pela inter/
Meio Ambiente da UFS. De acordo com os gráficos no trabalho citado, houve quatro
momentos de institucionalização dos cursos, 1976 e 77, 1980 a 83, de 1988 a 91 e de 1992
86
Ao nosso ver, nos parece exagerada a tendência transdisciplinar referida, pois percebemos, todavia como
iniciativas multi ou no máximo interdisciplinares as experiências já concretizadas e pouco tendentes à trans,
conferido a partir de nosso uso de interdisciplinaridade: articulação entre as três grandes áreas, biológicas,
exatas e humanas.
87
Curso analisado nesta pesquisa.
88
Curso analisado nesta pesquisa.
147
departamentais, enquanto nos demais, houve clara tendência ao relacionamento entre áreas
e subáreas diferentes.
Coutinho lembra que o curso da UFMG é diferenciado dos demais, pois houve uma
forte socialização com as tradições científicas internacionais (o que ela classifica como
local, mas também nacional. Este curso, embora seja denominado de Ecologia, é
sucesso, o quadro geral das universidades no Brasil não segue esta linha de difusão da
as áreas do conhecimento que mais peso têm são Geografia, Oceanografia e Engenharia
Sanitária, sendo que Zoologia e Ecologia aparecem somente em sétimo e oitavo lugares,
respectivamente e Biologia Geral décimo sexto. Para ela, o ambiente na área de pesquisa se
Portanto, ela conclui que a viabilidade do desenvolvimento de locais para estas iniciativas é
cientistas sociais frente a tão recentes temas. O estado da arte da Ciência Ambiental no país
desenvolvido pelos autores revelou comparações bastante úteis sobre a inserção desta
embora apontem para a pouca mobilização de pesquisadores das áreas sociais dirigindo-se a
este campo. Dos livros mais adotados nos programas, poucos são de autores nacionais
estudos da chamada ‘questão ambiental’, conotação esta que também identificamos nos três
cursos, excluindo o de Ecologia) ou Físicas, sendo que há uma grande dispersão de tópicos
(‘desenvolvimento sustentável’ como conceito-chave foi o principal, dentre 61) e raro uso
dos temas ‘relações entre sociedade (ou cultura) e natureza’91 e ‘metodologia’, lembrando
que esta é também tradicionalmente fraca no ensino de Ciências Sociais (resultado este
também encontrado na presente pesquisa). Quanto ao aspecto pedagógico, citam que vários
89
Drummond, J. A. & Barros, L. R “O ensino de temas sócio-ambientais nas universidades brasileiras: uma
amostra comentada de programas de disciplinas.” Campinas: Ambiente e Sociedade, número 6/7, 2001.
Os programas dos cursos pesquisados não foram comparados, mas este trabalho permite focalizar o que se
tem feito no interior das salas de aula e os caminhos das Ciências Ambientais.
90
Por outro lado, “nenhum dos programas faz referências a ou apresenta estímulos ao uso de recursos da
Internet” (p.59).
91
De acordo com os autores, levado à categoria de lei, nestas relações, o “paradigma da isenção humana”
negaria a transversalidade inerente ao tema ambiental e abstrairia o “estranhamento” entre cultura e natureza,
o que justamente trouxe à tona problemática de tamanha grandeza.
149
tem desenvolvido diretrizes curriculares para os cursos de graduação, cujos princípios mais
• Incentivar uma sólida formação geral, necessária para que o futuro graduado possa vir
um mesmo programa;
92
Ibid., p.59.
150
brasileiras (ForGRAD) tem dado prioridade ao debate sobre um projeto pedagógico para os
Tecnologia. Durante dois dias, cerca de cem profissionais das mais diversas disciplinas
(engenharia civil, filosofia, sociologia, biologia, economia etc), instituições (UFAL, UFSC,
93
Fórum de Pró-Reitores de Graduação das Universidades Brasileiras. Diretrizes Curriculares para os Cursos
de Graduação ForGRAD, 2000.
94
CNPq. Subprograma de Ciências Ambientais. Documento Básico, 1989. Grifos inseridos.
151
para boa parte dos problemas sócio-ambientais do novo milênio, o encontro teve também o
propósito de contribuir “para o avanço de se operar uma ciência e uma tecnologia que
possibilidade de trabalho conjunto em duas vertentes universitárias que parecem ser pouco
ambientais, se daria num passo além das disciplinas, na construção de novas abordagens
‘supra disciplinares’.
Humanas, embora não possa ser visto como um ‘mero’ somatório, relegando a apenas uma
multi ou pluridisciplinaridade.
95
Phillipi Jr., A., et alli (eds.). A Interdisciplinaridade na Formulação e Desenvolvimento de Projetos em
Ciência e Tecnologia. Brasília: MCT/PADCT/CIAMB, 2000.
96
Moraes, A. C. R. Meio ambiente e Ciências humanas. São Paulo: HUCITEC, 2ª ed., p.85, 1997.
152
modo, levantamos também a questão, como ocorre com a educação ambiental inserida
como disciplina ou como eixo transversal nas escolas, da comparação entre um curso
seguir.
97
Apenas os representantes do curso da UFMG não responderam a esta questão, pois se trata de um curso
‘disciplinar’ (embora a Ecologia apresente um amplo leque de possibilidades) que travou contato com outro
também disciplinar (do mesmo modo, a Economia se ramifica por uma miríade de temas conexos). O projeto
resultante é que foi uma forte experiência interdisciplinar (por ser entre grandes áreas como aqui definimos),
não havendo, portanto a institucionalização.
153
quanto a credenciamento e financiamento feita nos quatro cursos pesquisados foi mais
Mesmo assim, as respostas dos demais entrevistados, seja aluno ou professor, foram úteis
entrevistados da UFMG não responderam a esta questão por não se tratar de um programa
Para a análise desta questão, organizamos as respostas de acordo com o relato feito,
Assim, selecionamos os principais elogios (E), críticas (C) e sugestões (S) de todos aqueles
que responderam a esta pergunta, dividida pelos cursos correspondentes e entre alunos e
professores. Alguns relatos estão no meio termo entre crítica e sugestão e crítica e auto-
elogio. Do mesmo modo, alguns depoimentos se mostram mais como constatações (Co),
nem elogios, nem críticas, nem sugestões, algo mais como declarações apreendidas durante
a experiência do curso. É claro que tais categorias dependem daquilo que é objeto de
elogio, crítica e sugestão e também da visão de mundo e dos valores de cada entrevistado.
Ou seja, uma menção elogiosa para um pode não ser para outro, como, por exemplo, ver as
154
Ciências Naturais como privilegiadas no trato sócio-ambiental. A análise através deste tipo
de classificação nos é relevante por possibilitar obtermos um amplo aspecto da opinião dos
e recuperando o discurso argumentativo. Sob uma perspectiva por ora quantitativa, como
total da relação entre elogios, críticas e sugestões (E/C/S), obtivemos a seguinte proporção:
Como total geral entre professores e alunos dos quatro cursos, somamos vinte e três
elogios, cinqüenta e cinco críticas e dez sugestões, além de nove comentários. Por ser um
processo recente e inovador, nos parece compreensível o elevado número de críticas, uma
participantes. Isto faz com que muitas vezes o processo seja obrigado a passar por
obstáculos iniciais.
Deste quadro geral, passamos e trabalhar cada item separadamente para a análise
Elogios
• Inovador, pensar objeto comum, mesma realidade sob vários olhares, visão global.
Caminho promissor, formação mais sólida, mais competente para ensinar, entende
mais o contexto, visão apaixonada. Origem a partir de pessoa com visão estratégica.
- Comentários
O aspecto inovador da iniciativa interdisciplinar é evidente uma vez que tais cursos
no país datam da última década do século XX. Pelo número de elogios e críticas
dito, a menor quantidade de elogios é devido às dificuldades encontradas frente aos moldes
interdisciplinaridade deve existir, sem dúvida alguma, o respeito ao outro e uma dialógica
como poderemos ver no próximo item. De qualquer maneira, é bom constar que foi referido
este aspecto positivo, mesmo que não contemple toda a universidade. O ponto sobre
“reforma curricular na graduação: disciplina eletiva” parece ser uma constatação, mas na
verdade se deu na forma de elogio, pois demonstra que houve abertura na graduação e que
esta já pode começar a colocar questões pertinentes a temas interdisciplinares nos cursos
profissionalizantes.
Críticas
Ainda assusta, difícil de assimilar, não se consegue agregar outras áreas, houve
pessoa x equipe => diálogo. Difícil na academia (áreas estanques), mas promissor no
98
Klein (Interdisciplinarity: history, theory and practice. Detroit: Wayne Univ. Press, p. 125, 1990) coloca
algumas das características importantes em líderes (bridge scientists que correm riscos fora de sua disciplina
específica) cujo estilo pode ter demanda variada no decorrer do processo: status como pessoa estabelecida e
respeitada, experiência prévia, sensibilidade por diferentes paradigmas e epistemologias disciplinares,
compromisso em resolver problemas, ser moderador das relações internas e externas ao grupo, muita energia
e paciência (p.131).
99
Ver sobre linguagem no trecho sobre o III Seminário Nacional sobre Universidade e Meio Ambiente e
sobre metodologia no trecho sobre Ecologia Humana, no subcapítulo História da Ecologia.
157
Professores sem preparo x demanda de alunos. Maioria dos professores sem área de
interface. Dificuldade inicial com a linguagem, processo lento. Início confuso. Muita
resistência: lato x stritu sensu, duração limitada. Pouca divulgação, curso não
conhecido.
Muitas mulheres.
carga horária e alocação formal: duplo vínculo. Sem dedicação exclusiva, sem quadros
permite ser tão amplo. Nomear curso: coisa híbrida, causa estranheza. GED complica:
positivo pela cobrança de produção. Trabalho em núcleo é difícil, pois avaliação é via
departamento.
cooperação França, UNESCO, CNPq, CAPES (PADCT). CNPq mais rígido: lobby de
• Convocação rápida dos institutos. Confusão grande, muita gente. Depois diminuiu, a
relação com CAPES que tem determinado modelo e não se adapta muito.
• Há uma mudança nos alunos em grande parte são profissionais já atuantes, mais
unidade. Não há um apego, interesse. É um corpo credenciado, mas são poucos que
lecionam. Acaba tendo dupla função. Quase uma clandestinidade. Sem retorno salarial
- Comentários
inúmeros debates, conflitos, resistências, uma vez que a comunidade acadêmica não tem
entrevistados, não apenas nesta questão, mas também naquela sobre desenvolvimento
sustentável, demonstram que a prática ainda não foi verdadeiramente incorporada pelo
discurso, se tornando mera retórica, propaganda enganosa. Mesmo assim, ela permanece
como meta e que se coloca a posteriori por não haver ainda métodos claros para executá-la.
Algumas críticas se detiveram no problema dos professores não terem uma devida
específicos em sua área de origem e conseguirem uma abrangência maior pelas demais
áreas. Ao mesmo tempo, parece haver consenso, em dois dos cursos pesquisados (UFPR e
USP), de que o corpo docente tem conseguido até certo ponto concatenar tais atribuições
Uma das críticas principais foi o problema de se trabalhar em equipe, não apenas
lutas pelo poder normais em qualquer aproximação entre pessoas que não têm costume de
trabalho coletivo. Apesar das dificuldades iniciais, na maioria das entrevistas pode se ver
que há tendência a se pacificar os ânimos (ou então haver ruptura radical) e fazer com que o
‘jogo das vaidades’ sejam amainados e que a humildade e a abertura para o diálogo sejam
incorporados no fazer científico cotidiano. Por outro lado, pelo menos dois entrevistados
(um com grande ênfase), demonstraram que a política de avaliação docente da CAPES
disputas internas. Em alguns cursos houve um número grande de interessados e que trouxe
sejam abordadas na próxima questão, nesta também surgiram muitos relatos sobre a
da equipe proponente e sua disposição física foi descrita por um número razoável de
Algumas áreas são mais fáceis que outras: na área biológica é mais difícil, pois
fica circunscrito a um aspecto de um problema. O cientista social, arquiteto,
engenheiro já trabalha, de algum modo, a interface. (USPProfCQ5)
e como praticá-la. Como já referido antes, a CAPES foi criticada pela aplicação do GED,
embora por uma parcela menor dos entrevistados. A captação de recursos para cursos
avaliação da CAPES, que, como vimos, é um processo demorado. De qualquer modo, com
ao programa, sem um vínculo formal. Por outro lado, muitos têm conseguido, após o
liberados da sua unidade, pois não optam por ter dupla função. Por outro lado, um
Quanto aos alunos, tanto na USP quanto na UFPR, muitos são profissionais atuantes,
doutorado. Alguns relatos da USP apontaram problemas com prazos, devido a pouca
Sugestões
• Criação, formação de Instituto. Constituir autarquia para ter vagas próprias, pessoal
demonstram carência. Tem que haver mais concessões. Questão ambiental é área de
• A problemática deveria ser menor, não tão macro; uma sub-bacia, por exemplo.
- Comentários
alunos das mais variadas formações foi citada como grande força impulsionadora da
interdisciplinaridade, fazendo com que ela atinja também a prática acadêmica e não
foi feita uma observação sugerindo um trabalho mais pormenorizado, mais localizado para
que o número de problemas a serem resolvidos seja mais facilmente levantado e mais
também na graduação, embora este item não estar de acordo com a maioria. Podemos supor
que estas respostas reflitam críticas aos próprios cursos de formação freqüentados pelos
horária e não careceria de ter vínculo não remunerado. Ter identificação, estar disponível
para se integrar em atividades permanentes, foi apontado pelo menos uma vez e reflete a
necessidade de um trabalho coletivo freqüente, juntando quem tem maior engajamento para
o trabalho interdisciplinar.
Críticas-Elogios
Críticas-Auto-Elogio
• Alunos autodidatas.
Auto-Elogio
Constatações
• Irreverência.
• É um programa dirigido mais à ciência do que à intervenção, mas também deve ser
- Comentários
medida em que surgem e seus envolvidos devem estar prontos para se debruçarem sobre
tanto docente quanto discente, permitindo e que sejam permitidos sugestões e críticas
166
(diálogo) e que os egos possam ser controlados, sem querer um sobressair-se aos demais. A
refletindo a percepção de que não se pode permanecer numa mesma estrutura concreta,
sólida e imutável e devendo ter impulso para promover novidades e romper a tendência à
vista das áreas participantes de acordo com a colaboração do professorado. O item sobre o
curso voltar-se mais à ciência do que à intervenção, mas também tendo aplicação prática,
nos parece vital, pois é grande a dificuldade em se atingir este meio termo em toda a
universidade e sua relação com a sociedade. Embora não queiramos entrar na questão sobre
a distinção entre pesquisa pura e aplicada, declaradamente ambas necessárias, vemos que
estes cursos podem em muito contribuir para a parcela extensionista dentre as inúmeras
funções acadêmicas.
pós-graduação voltado para o meio ambiente. Com base nas entrevistas, reunimos os
a. Dificuldades
especialistas ainda tinham uma formação de ciência humanista, reunindo vários interesses e
fazendo professores e alunos terem desenvoltura em outras áreas. A ciência de outrora era
fenômenos. O desenvolvimento científico não perfaz um caminho linear, uma vez que seu
relativamente independentes, por isto as mais antigas têm grande resistência ao trabalho
interdisciplinar. Há uma tentativa de isenção disciplinar, mas não ocorre com facilidade,
pois cada um tem uma língua, filosofia própria, provocando também um excesso de
hegemonia da própria área. Mas há um salto enorme entre teoria e prática e percebeu-se que
não havia como abrir mão do ponto de vista de cada um. Portanto, opta-se em geral por
matematização de dados que não se consegue prevenir, nem presumir acontecimentos: não
168
principalmente os da área natural, por perceberem-na já como uma ciência que busca as
interações. Deste modo, ela é vista como uma etapa fundamental no desenvolvimento
mais receptivas inicialmente e somente depois as Sociais -, embora aquelas são também
As questões de poder são apontadas por muitos dos entrevistados como a principal
dificuldade já que indivíduos brigando por seus espaços são totalmente contrários à
trabalho há necessidade de um voluntarismo inicial, uma vez que não se tem abertura para
atuar em setores não disciplinarizados. O discurso existe, mas ainda não funciona e quando
há diálogo, são apenas pontuais. A escola não deve ser corporativista, a ponto de evitar este
tipo de iniciativa, mas voltar-se para fora. Nesse ‘afrouxamento’ dos laços, é importante
disciplina”, tentando uma visão mais macro e entendendo a complexidade dos fenômenos
colaboradores alheios. Mas esta aproximação apenas parcial pode deflagrar numa mera
169
interdepartamental.
b. Complexidade
Para alguns dos entrevistados, a razão desta crise é devido ao esgotamento das
pelo menos por um dos entrevistados, que percebe e sugere sua inserção. Este, nos parece, é
um ponto crucial e, embora tenha sido citado por poucos, se percebe que o tratamento da
saber.
Muitos dos alunos, segundo uma entrevista, estão preocupados com a questão do
claramente com o corpo de professores que tem mais prevalência dos aspectos técnicos.
170
Assim, esta virada radical parece confirmar uma teoria da complexidade que resguarda uma
c. Caminhos
de árdua tarefa inicial, um avanço na qualidade pelo trabalhar com o outro, para
formal da reitoria, mas nem sempre terminam com o voluntarismo. Em outros, já se tentou
projetos maiores. Por essência, percebem a dificuldade, mas vêem como primordial o
atingir tal ideal, ou seja, que todas as partes do sistema saibam tratar as diferenças. Por um
fragmentando as ciências. Mas por outro lado, ocorre uma aproximação entre ciências
percebendo a complexidade dos fenômenos. A troca é essencial, pois não se pode mais
trabalhar isoladamente, já que o trato com fenômenos humanos exige um olhar múltiplo,
DisciplinaridadeÎMultidisciplinaridadeÎInterdisciplinaridadeÎTransdisciplinaridade.
d. Necessidade de Espaço
diferentes tendências de trabalho conjunto são apontados com uma das saídas para tais
dificuldades: local onde se possa discutir pontos de confluência. Sede própria que reúna
aqueles que não trabalham apenas em uma área especifica, mas que vêem um contexto mais
aos impactos da ciência moderna e contribuindo para a sustentabilidade das culturas e dos
contribuem para uma visão macro dos problemas. Muitos dos entrevistados indicam que os
centro independente. Por um lado, fornece base ou estrutura institucional para lidar com
problemas mais complexos que requer um grande montante de recursos físicos e humanos,
universidade. Por outro, nem toda universidade pode garantir os recursos de tal
organização, que sofre com financiamentos variáveis; seu status “quase departamental”
pode vir a criar uma classe de pesquisadores de segunda categoria, como uma
centro pode não ter a possibilidade de reunir profissionais adequados para o trato
J. Habermas101, para esta discussão, nos oferece aspectos que parecem relevantes
100
Op. cit., p. 125.
101
Habermas, J. Mudança estrutural da esfera pública: investigações quanto a uma categoria da sociedade
burguesa. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984.
173
cerimonial das hierarquias sendo substituído pela polidez da igualdade, numa aparente
tornar um local como esse, onde haja uma integração de quem ali trabalha, vive e/ou
estuda, se conjugando sabedoria, pesquisas, ensino e também criatividade e lazer, num local
e. Participação e Extensão
A extensão, embora não tenha sido consensualmente colocada, parece ser a saída
tipo de curso depende muito da conjugação das pessoas envolvidas, sendo necessário haver
este é um trabalho quase voluntário. Devem existir interesses pessoais definidos para se
comprometer e tem que ser um processo de crescimento, com uma melhoria do ponto de
102
Ibid., p.49, 1984.
103
Ibid., p.50.
104
Ibid., p.51.
174
Uma ciência fechada nela mesma não se suporta, pois não resolve as questões sociais,
já que o não vínculo entre estudo e sociedade se reflete na crise. A estrutura universitária
rígida e tradicional deforma uma tendência natural do aluno de perceber seu ambiente com
uma visão múltipla. Houve, portanto uma mudança de postura, até mesmo filosófica, que
não apenas entre as ilhas disciplinares do arquipélago universitário, mas também dos muros
que isolam a academia do meio ambiente que a cerca, próximo ou não. Eles não serão
destruídos, mas devemos perceber os interstícios, brechas, fendas já existentes que, de certo
universitária.
geral:
18 2 4 3 1
Numa análise geral, a resposta positiva dada pela grande maioria dos entrevistados já
outro lado, parece que muitos não chegaram a imaginar uma universidade fora destes
moldes, uma vez que a estrutura em divisão procura tornar eficiente cada parcela. Portanto,
uma resposta mais amena, levando em conta aspectos positivos e negativos desta realidade,
deveria ser mais bem trabalhada. No entanto, os entrevistados percebem as dificuldades que
responderam quanto a um meio termo (ambas). Por outro lado, se mostraram conscientes da
abaixo, a alternativa é dada pelo trabalho conjunto entre uma unidade interdisciplinar não
Algumas respostas seguiram por este caminho problematizador e não por se declarar
professores de cada instituição (tabela em anexo), podemos perceber uma certa simetria
entre os cursos e mesmo entre o corpo docente e discente de cada exemplo. As duas únicas
resultados ‘sem resposta’ e ‘outra resposta’ se devem a não definição clara das declarações
com foco central voltado ao meio ambiente em contraste com a questão difusa em cada
objetivando coletar dados quantitativos que facilitem a comparação entre cursos e entre
corpo docente/discente, optamos por pontuar cinco alternativas de respostas, de acordo com
descritas por cada pesquisador. Em seguida, distinguimos alguns vieses diferenciais dentro
de cada alternativa, escolhendo trechos das entrevistas que exemplifique tal diversidade. No
computo geral, tivemos oito respostas que deram a entender a preferência pela via
centralizada, isto é, que a questão ambiental seja tratada num âmbito específico da
105
Por outro lado, temos consciência de que há pontos de vistas não totalmente convergentes dentro de uma
mesma resposta.
178
alternativa intermediária entre ambas, setes entrevistados responderam que preferem que
haja não apenas uma instância de estudos do meio ambiente na universidade, mas que se
trabalhe também em cada unidade. Nos demais casos, dois pesquisadores responderam com
Neste sentido, podemos perceber que não há resultados díspares, uma vez que as três
respostas principais não variaram muito. Por outro lado, podemos fazer uma leitura
vemos um equilíbrio entre alunos e professores e entre as respostas, embora não se veja um
meio termo entre ‘centralizada’ e ‘difusa’ (ambas). Já na UFPR, não obtivemos como
‘ambas’ (A) sejam contempladas, dentre os professores, mesmo que o curso MAD (e
também o núcleo NIMAD)106 faça convergir o assunto para seu campo de ação. Do mesmo
modo, na UFRJ, a resposta foi também maior para ‘ambas’, mesmo não havendo, nesta
universidade, uma unidade específica que centralize a questão, o que realmente faz bastante
PROCAM acabe por, pelo menos parcialmente, centralizar o assunto no campus, mesmo
que haja inúmeras outras iniciativas de estudos ambientais nas demais unidades (como o
106
A relação entre ambos, curso e núcleo, ainda não está concretizada, porquanto ainda parece haver o intuito
de reuni-los. Uma vez que surgiram juntos, unificados ou pelo menos em intrínseca parceria, poderão
promover ações que cumpram realmente o papel utópico e revolucionário da existência universitária:
apreender pela observação investigativa (curiosidade e sabedoria), trocar conhecimentos e saberes
(comunicação e democracia), multiplicar idéias e ações (participação e ética).
179
no tema em questão, já que tanto uma estrutura que centralize quanto o trabalho sócio-
ambiental nas demais unidades universitárias perfazem uma ampla gama de atuações a
serem desenvolvidas. Num caso, há maior chance de interação entre diferentes atores
Centralizada
Nesta resposta encontramos dois tipos de idéias: aquelas que parecem defender uma
Ainda tende a ser disciplinar por causa dos departamentos. Uma reestruturação
da universidade vai modificar. Os cursos são muito fechados; é difícil romper.
Não existe esta dinâmica. Agora com a flexibilização deve aumentar. Na pós-
graduação, se consegue um pouco onde não existe tradição de graduação. Mas
nessas profissões consolidadas ainda existe. Internamente, um curso optativo
certamente vai atrair, apesar de ser uma área difícil (...) Mas estamos no
começo, é pouco expressivo, ainda em construção. (UFMGProfD)
Há pressão de ser cada vez mais rápido o curso. Não sei é factível cobrar tanta
coisa, querer cursos interdisciplinares. Têm que aprender por sua conta. Mas
não tem jeito. Até dá, mas é difícil porque isso vem de cima. Não tenho opinião
formada. Depois vai começar a vida profissional e pode ter pretensões em fazer
coisas fora do seu objeto exato, procurar a interdisciplinaridade.
(UFMGAlunA)
Vários departamentos podem trabalhar a mesma questão. Só que a abordagem é
diferente. (...) Novas disciplinas são criadas. Já tem um diálogo. O professor é
um eterno aprendiz. Esta humildade é a grande dificuldade em todas
universidades. Mas há endogenias. A interdisciplinaridade pode trazer esta
180
departamentos:
Difusa
trechos das entrevistas aqui transcritos demonstram que, embora se queira divulgar a
pesquisa por projetos que reuniriam diversos pareceres, difundindo a problemática pelo
campus. Na USP, um entrevistado acha difícil formular uma disciplina geral em cada
unidade por haver especificidades. A questão seguramente se encontra inconclusa, uma vez
que cada instituição tem uma fórmula própria e se adequa diferentemente aos seus
Ambos
dos esforços é plenamente possível, arregimentando de cada lado tentativas de expor aos
Outra resposta
Embora as respostas aqui não estejam enquadradas na pergunta, elas apontam para
Conclusões preliminares
profundo impacto nos mais diversos patamares da vida humana. Embora seja apontada por
poucos como modismo, nos parece que há uma real transformação na relação com o
apenas perante a natureza que nos envolve e nos engendra, mas perante sua própria psique.
ambientais nos ecossistemas naturais, parece ter contribuído para que o pensamento
fatores edáficos e climáticos perfazem assim, a partir de então, a complexa teia de relações
recente ciência: a Ecologia, como visto, fez surgir (macro) conceitos que vislumbram
conhecimento humano parecem sofrer mudanças em seu cerne, conferindo uma necessária
completude entre os diferentes modos de se perceber o mundo que nos cerca. A chamada
questão ambiental, portanto, com a expansão do olhar antropocêntrico ao bio e até mesmo
transformação que nos faz perceber a inextrincável relação entre a qualidade de vida
186
expandiu de modo único, envolvendo toda uma nova ambientação do ser humano até
ou não governamental, para crianças, jovens e adultos, prática e/ou teórica, é resultado da
urgência e do forte apelo emotivo e vital para a sobrevivência humana. Mesmo que
inicialmente a questão era salvar os ecossistemas e não a própria espécie – uma biogênese
ambiental” no meio acadêmico parece vir atender a uma demanda mundial de configuração
teoricistas, filosóficas.
Para nós, a grande procura pela Educação Ambiental permite expor um tipo de
cai no campo sociológico, ou seja, quando pesquisadores das Ciências Humanas e Sociais
tratam dos processos de interação sócio-ambiental, parecem expor certa cautela em não se
pensar ‘reduzido’, como ‘apenas’ um ser biológico. Esta reação natural ou conceito prévio
demonstra claramente pelo menos duas posições: que muitos autores neoliberais se
187
constante perante as inúmeras forças que estão em jogo no caldo (caos) das relações sociais
(locais, regionais, globais; físicas, psíquicas e afetivas). Suas análises de cunho histórico,
antropológico, econômico, político, educacional etc são fundamentais para que cada
estudante e profissional capte sua situação perante seu meio social (ambiental) e promova a
Ao nosso ver, a Biologia, pela Ecologia ou não, pode, do mesmo modo, contribuir
com a idéia de dependência recíproca entre ser vivo e ambiente e, por conseguinte, entre
sociedade e natureza (na verdade quase todas sub-áreas revelam dados do meio onde
qualquer ser se encontra, mesmo que ali o tenham para exterminá-lo).107 A diversidade
planeta, já que a vida pode ser encarada como uma ‘mera’, complicada e inteligente
elementar (água, oxigênio, carbono, hidrogênio, cálcio, nitrogênio) nos seus infinitos
suficiente para nos imaginarmos e sentirmos como parte integrante do todo orgânico
107
A manipulação biológica é inevitável, por mais que se fale em bioética. Os desequilíbrios sociais são
tantos que a ética se transforma em tática: “do vale tudo”, “do salve-se quem puder”, “do sai da frente que eu
vi primeiro”, quando percebem o limite orgânico planetário. Esperanças há em Dom Quixotes?
108
Locais ocupados por diferentes biocenoses (como referido por P. Acot), formando uma comunidade
biológica (habitats + seres vivos).
188
planetário e até mesmo como sua massa encefálica (como a noção antropomórfica e a de
Gaia, apontado por K. Lovelock). Mas cremos que não a ponto de nos sujeitarmos a
abandonar nossa própria sabedoria e nos abdicarmos em lutar contra injustiças, tanto
cada vez mais atenção, embora o projeto da interdisciplinaridade ambiental venha colhendo
frutos com maior ênfase na ultima década. Diferentes agências governamentais como
CAPES, MCT, MEC, CNPq, ForGrad têm percebido sua relevância e procurado dar
Ao nosso ver, o ser humano tem agora pela frente a responsabilidade de promover
uma nova alçada da consciência, um crescer em maturidade que se mascara também como
um retorno (uma volta aos clássicos?112). Cremos não ser contraditório que o abraço à causa
ambiental deva ser também um cuidado à causa humana e social, interagindo as múltiplas
condições que a vida na face terrestre requer para seu pleno desenvolvimento. Um breve
109
Inclusive contra o duelo territorial entre poderes que não negam armas para conseguir e manter domínio. A
tempestade de idéias (brain storm) do ato interdisciplinar não deveria se transformar numa tempestade em
copo d’água, mas numa tribuna livre (correlação com os antigos salões da época pós-nobreza palaciana e pré-
burguesia mundana como vistos em J. Habermas).
110
Nos países desenvolvidos industrialmente a questão ambiental se faz com ênfase maior nos recursos
naturais, enquanto, segundo Moreira (op. cit), nos países ditos periféricos a questão se debruça com maior
tendência sobre a questão social.
111
Diferente do citado em alguns depoimentos, programas como o PADCT reforça o desenvolvimento da
interdisciplinaridade ambiental e não nos parece que esta agência de fomento imponha necessariamente um
trabalho acadêmico interdisciplinar “de cima” , mesmo que possamos concordar que há alguma ‘pressão’ de
financiamentos externos.
112
Como apontado por J. Alexander quando trata do desenvolvimento das Ciências Sociais: “um estado
contínuo de profundo desacordo e de revolução teórica”. (La centralidad de los clássicos. In: Giddens, A. et
al. La teoria social hoy. Madrid: Alianza, 1990).
189
enovelamento interdisciplinar:
grandes desafios, mas também inúmeras possibilidades, uma vez que tal institucionalização
apontou para a elevada importância de um curso específico que centralize a questão sócio-
ambiental no campus, embora percebam que não deveria haver conflito na difusão desta
INTERDISCIPLINARIDADE
1. Articulação disciplinar:
a. Diversas histórias
b. Buscando conceitos
c. Possíveis razões
d. Muitas dificuldades
e. Algumas exigências
2. Depoimentos
2.1 Interdisciplinaridade
Conclusões preliminares
191
Neste item, discorreremos sobre o que tem sido escrito sobre o sentido da
conformado e a procura por conceitos unificadores que articulem as mais diferentes áreas
período da segunda metade do século XX, assim como as inúmeras dificuldades surgidas
a. Diversas Histórias
num vasto campo de miscigenação dos saberes ocorrentes desde há muitos séculos ou então
enquadrá-la apenas num movimento recente na metade final do século XX. Segundo
1
Op. cit., p. 75.
192
Klein2, diversos autores antigos foram descritos como interdisciplinares, como Platão,
Aristóteles, Rabelais, Kant e Hegel, embora muitos outros a vejam como um fenômeno
inteiramente atual, diferindo o termo das idéias básicas. O conceito surge no discurso
do conhecimento.3
ainda influenciada por um monismo primitivo e arquetípico que visava a síntese e não a
análise, a totalidade e não a parte, a complexidade indissolúvel embora frágil do real e não
pressupostos científicos:
Mas quem, pois, teria respondido sem dúvida a quem tivesse se espantado com
o seu estado de espírito - quem, pois, aprendeu bastante para deixar de duvidar?
E como afirmar, e porquê afirmar! Quantos homens afirmam violentamente,
implacavelmente, tendo como supremo argumento o punho armado? Não nos
encolhamos assim. Sejamos curiosos. Agarremos com ambas as mãos. Entre
tantas delícias que devemos à nossa curiosidade, evitemos escolher,
estritamente, como fanáticos.4
seus estudos envolvem não apenas História e Psicologia, mas também Sociologia, Biologia
interdisciplinar, uma vez que “as grandes descobertas têm lugar nas próprias fronteiras das
2
Op. cit., p. 20.
3
Ibid., p. 21. De acordo com a autora citada, ‘disciplina’ surge na Idade Média sendo aplicada nas áreas de
teologia, artes, direito e medicina com o esboço da formação de uma “sociedade científica”.
4
Febvre, L. O problema da descrença no século XVI - a religião de Rabelais. Lx, Ed. Início, p.459, s.d.
(traduzido por Ângela M. de Almeida, 1990). Grifo próprio.
5
Ibid. Combates pela história. Lisboa: Presença, p.205, 1989.
193
ciências”. Ou seja, para ele, as ciências percorrem muitos caminhos e são sempre mutáveis,
tecnológicos. Deste modo, uma educação universal visando uma formação integral do
aluno esbarrou e ainda esbarra com a estrutura organizacional das universidades, a política
generalizáveis.
levar a absurdos imprevisíveis (ao nosso ver exemplificado pela bomba atômica). Segundo
especialidades nas Ciências Sociais e Naturais acabou também por provocar a cooperação
6
Klein, op. cit., p. 23.
194
para a formação de uma cultura geral e liberal, não especializante, com pontos de vista e
valores comuns.
na época pós IIa. Guerra Mundial cuja crise de identidade geral provocada pode ser vista
populacional, moradia, bem estar social e criminalidade foram, de acordo com Klein,
uma reforma do pensamento num sentido mais integrativo. Assim, disciplinas híbridas
foram surgindo, embora neste primeiro momento haja um maior empréstimo de métodos
quantitativos das Ciências Naturais pelas Sociais, sem haver uma real alteração no status
movimento interdisciplinar é aqui apontado por Klein, principalmente nas Ciências Sociais
que buscaram integrar cursos, departamentos, não apenas no nível instrumental, mas
novas categorias integrativas e convergências teóricas, embora tenha havido também muita
sintéticas surgiram como Marxismo, Estruturalismo, Teoria Geral dos Sistemas e a Teoria
Nas Ciências Naturais, a metáfora entre máquina e vida levou à aproximação entre
entre as hard e soft sciences. O trabalho de Kuhn colocando as dimensões sociais, culturais
alterar a estrutura universitária é mais o nível intelectual do que político e financeiro, pelo
resolver problemas específicos tem recebido financiamento, mas resulta em pouca efetiva
7
Klein se refere às ciências hifenadas que surgiram neste contexto como, por exemplo, biofísica, bioquímica
e engenharia biomédica.
8
Ibid., p.35.
196
trabalho em grupo.
auge do movimento cultural dos anos 60, principalmente na França e na Itália, como reação
ao sistema capitalista IIa. Guerra Mundial. Este processo levou a críticas internas do
que daí surgiu reivindicou uma maior participação acadêmica nos problemas sociais e
universidades européias, segundo R. Follari.9 De um modo geral, a busca a todo custo pela
tremendo abalo com as irrupções por um modelo social mais justo e um equilíbrio entre
especialização profissional.
ou seja, trazia a idéia de que a ciência ainda podia trazer a solução dos problemas sociais,
9
Follari, R. A. Interdisciplina e dialética: sobre um mal-entendido. Em Jantsch, A. P. & Bianchetti, L. (orgs.)
Interdisciplinaridade para além da filosofia do sujeito. Petrópolis: Vozes, p.127, 1995. No Brasil, a Reforma
Universitária se deu em pleno Regime Militar em 1968.
197
exibindo uma “nova conquista face à crítica a que a submetiam os estudantes”.10 Por outro
torno do desenvolvimento sustentável, por exemplo. Assim, pode-se perceber toda uma
1980 – Busca pela explicitação das contradições internas a partir de uma diretriz
1990 – Procura de uma nova epistemologia como projeto antropológico, visando a uma
teoria própria.
com o intuito de se atingir uma unidade nas Ciências Humanas e a diminuição da distância
10
Ibid., p.130-1.
11
Fazenda, I.C.A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. São Paulo: Papirus, 1994.
198
vista como fator capaz de exercer reflexão profunda, crítica e salutar na universidade,
cada vez mais. No Brasil, para Fazenda, no “tempo de silêncio” dos anos de repressão
Nesta época, houve um inicial movimento, mas que passou a ser uma reflexão séria com
Na década de 80, após uma reflexão inicial que revelou a necessidade de se pensar o
concordando com demais autores (como Apostel, Morin, Gusdorf, Eliade e Dufrenne), que
não havia corrente filosófica capaz de unificar o conhecimento, sendo que a própria
Somente nesta época, após tempos de ditadura militar, os educadores puderam realmente se
pronunciar.
Nos anos 90, nota-se a exigência generalizada pela construção de uma nova
trabalho em sala de aula, confirmada pelo crescente número de projetos de vários níveis e
199
acordo com a autora, houve uma evolução da filosofia do debate interdisciplinar, passando
pela Sociologia e finalmente pela Antropologia, o que talvez demonstre uma direção
sócio-ambiental, o que pode ser devido ao fato da abrangência desta área sobre o tema,
independentes,
das disciplinas.
12
Ibid., p.35.
13
Wilson, E. Consciliency. Cambridge: Harvard, 1985.
200
Para este zoólogo, esta etapa constitui um teste da verdade de uma teoria, como no
caso da inter-relação entre Física e Química e que colaborou em muito para o crescimento
conhecimento, profundamente mantidos distantes por mais de dois séculos entre uma
ciência chamada natural e outra humana e social, são agora considerados como ramos de
uma mesma árvore e, em cujo espaço intermediário, existe, não apenas uma linha ou
fronteira artificial, mas um vasto e inexplorado domínio a espera de uma rica cooperação de
complemento dela conectando-se com disciplinas e áreas vizinhas, como por exemplo, no
estudo das relações entre a evolução genética e a cultural. Tal iniciativa possibilita construir
férteis hipóteses nas Ciências Humanas com a soma de preceitos biológicos e permite ver a
14
As trocas entre ciências e áreas sempre foram comuns, mas devemos ter certa cautela em promover
analogias que proferem uma total transferência de um método ou conceito de uma área para outra. Ou seja, é
preciso discernir muito bem cada caso.
201
b. Buscando Conceitos
eles:
15
L’interdisciplinarité: problèmes d’enseignements et de recherche dans lês universités. Paris: OCDE, 1972.
16
Berger, C. Opinions et Realités. In: OCDE, ibid., p.23.
17
Heckhausen, H. Discipline et interdisciplinarité, p. 83-90. In: OCDE, ibid..
202
problemas histórico-sociais”, mas sem uma real interação, apenas uma “aglomeração”
(exemplo, Urbanismo);
parcial superposição com uma interação apenas nas regiões fronteiriças (exemplo,
Psicolingüística e Sociolingüística) e
Talvez as Ciências Ambientais possam ser encaradas como uma modalidade mista, já
que pode compreender um pouco de cada uma das alternativas apresentadas e algo mais,
pois iria além da integração de valores, métodos e zonas fronteiriças, uma vez que necessita
mas não unifica) dos mais variados campos, como Ecologia, Sociologia, Geografia,
Antropologia, etc, sendo já uma ponte para a transdisciplinaridade, embora não seja
macro problemas, sem interação, apenas aglomeração, já parece ser feita mesmo fora do
âmbito dos cursos interdisciplinaridade em Ciências Ambientais e nos parece mais uma
conceitos como denominadores comuns também costuma ser utilizada, assim como
métodos de disciplinas alheias. A partir dos quatro cursos pesquisados parece que o
indicam a interação dos objetos, podendo ser fenômenos legalizados, quando são
existente entre os objetos ou entre seus símbolos. Este autor, a partir da definição de
disciplina que reúne os dois tipos de fenômenos citados, aponta três tipos de
fenômeno bruto de uma disciplina é explicado por uma lei de outra, sendo esta lei
gerar novas leis e, portanto, promove o surgimento de uma disciplina original não redutível.
concretos, onde cada uma coopera, mas sem interação (não há reciprocidade entre os
ambiental do tipo daquela que foi levantada nesta tese, num plano geral, é, por enquanto, a
que Boisot chama de restritiva, já que as articulações entre disciplinas e grandes áreas do
conhecimento ainda é praticada com uma frágil aproximação e fraco intercambio. Por outro
lado, podemos perceber que parte do grupo de pesquisadores entrevistados almeja uma
18
Boisot, M. Discipline et interdisciplinarité. In: OCDE, ibid., p.90-7.
204
seguinte quadro:
Podemos aqui distinguir algumas correlações com os cursos, sendo que as duas
primeiras não estariam representadas: a disciplinaridade cruzada pode ser representada pelo
19
Jantsch, E. Towards interdisciplinarity and transdisciplinarity in education innovation. In: OCDE, ibid.,
p.108-9.
205
múltiplos.
eliminação de fronteiras estáveis entre disciplinas”). H. Japiassu21 ainda completa que uma
interdisciplinaridade (unificadora para Heckhausen e estrutural para Boisot), pois ela deve
capaz de promover enriquecimento mútuo. Mas será que isto realmente ocorre? Muitos
restritiva, citada por Boisot, parece, pelo menos por enquanto, ser a tendência dos novos
cursos em Ciências Ambientais no Brasil, já que não ocorre, todavia, uma forte
reciprocidade entre as áreas. Veremos mais à frente como os cursos pesquisados são
20
Piaget, J. The epistemology of interdisciplinary relationships. In: OCDE, ibid., p.141-44.
21
Op. cit., p. 47.
206
Esta lista de princípios nos parece pertinaz no intuito de construirmos uma eficiente
cujo tema foi ‘Que Universidade para o Amanhã?’23 foi apontada a necessidade
por diversas disciplinas ao mesmo tempo. O objeto em questão sairá, assim, enriquecido
22
Wallner, F. Sete princípios da interdisciplinaridade no realismo construtivista. Em Jantsch, A. P. &
Bianchetti, L. (orgs.), op. cit, p.85-96.
23
CIRET-UNESCO. Síntese do documento. Monte Verità, Locarno, Suíça, 1997.
207
tempo entre, através e além das disciplinas. Sua finalidade é a compreensão do mundo atual
disciplinar, embora sendo complementar a ela, já que esta diz respeito a um único ou a
pela dinâmica gerada pelos diversos níveis de realidade ao mesmo tempo. A descoberta
pesquisa disciplinar, que, por sua vez, é clareada de uma maneira nova e fecunda pelo
conhecimento transdisciplinar.24
distinção como absoluta, pois com isso a transdisciplinaridade seria esvaziada de todo o seu
conteúdo e a eficácia de sua ação seria reduzida a nada. Porém, os poucos departamentos
EUA, conduziram, na maioria dos casos, a uma simples justaposição passiva, não
interdisciplinaridade: ela “...nos parece hoje mais processo do que produto”26, sendo
portanto fundamental o acompanhamento criterioso de cada momento, uma vez que procura
formar nova disciplina, ou seja, ela não ultrapassa a lógica disciplinar. Vemos então que há
24
Nicolescu, B. Aspectos Gödelianos da Natureza e do Conhecimento. Ibid. Veremos num próximo capítulo
as tendências à transdisciplinaridade.
25
Monteiro, R. C. Parâmetros Psicológicos na Pesquisa Ambiental Transdisciplinar. Anais da XXVIII
Reunião Anual de Psicologia (resumo/curso) Ribeirão Preto: SBP, p.75, 1998.
26
Fazenda, op. cit., p.25.
209
necessária para mediar a comunicação entre os cientistas e entre eles e o mundo do senso
Não existe uma definição única de interdisciplinaridade, mas muitos autores como
conhecimentos ao longo de eixos conectados entre si, invisíveis nas disciplinas com suas
novas ênfases no modo de se ensinar, uma vez que indaga, problematiza e não resulta numa
centralização unificada ou num fenômeno discreto, mas em geral sua utilização insiste
numa síntese.
vez que não se adquirem conceitos comuns, orgânicos entre elas. Para Follari, são casos
subdisciplinares ou apenas uma saída marginal, sem resultados satisfatórios. Ele acredita
27
Ciência, interdisciplinaridade e educação. In: Jantsch, A. P. & Bianchetti, L. (orgs.) op. cit., p.74.
28
Vickers, Jill. Comparing disciplinary and interdisciplinary claims: how much discipline? Canadá:
Association for Canadian Studies, Working Document on Interdisciplinarity, p.5-41, 1992.
210
especificidade de cada disciplina para se construir o que está ‘por fora’ e além de cada uma
delas, num construto comum, porém não uma unidade, mesmo que dialética.29 A. J.
que seria novo, atualmente, não é a polaridade, diluição ou equilíbrio instável entre ambas,
mas uma “necessária convivialidade”: o ser é uno e múltiplo ao mesmo tempo. Ele lembra
que o saber não se situa apenas na lógica conceitual ou formal, mas envolve questões de
natureza ética e política, ou seja, “o saber tem também a ver com o poder e não apenas com
paradigma interdisciplinar, Jantsch & Bianchetti lembram que devemos pensar que, por
mais “totalizante” que seja, o paradigma não deveria se tornar “totalitário”. Os autores
cuidam de alertar, citando o caso da hegemonia católica durante a Idade Média e demais
ou ainda personalismos, que se reduzem à filosofia do sujeito. Para eles, “...o problema
tema jamais se esgota nos pólos sujeito ou objeto. O eixo de investigação situa-se na
relação destes pólos”31, lembrando que isto não corresponde a não necessidade de
autores compreendem que nem sujeito nem objeto são autônomos e excludentes, mas se
29
Follari, R. A., op. cit., p.132/3. Opinião esta que nos parece acertada.
30
Severino, J. A. O uno e o múltiplo: o sentido antropológico do interdisciplinar. Em Jantsch, A. P. &
Bianchetti, L., op. cit., p.160.
31
Jantsch, A. P. & Bianchetti, L. Imanência, história e interdisciplinaridade. In: Jantsch, A. P. & Bianchetti,
L. (orgs.), op. cit. p.182. Apontam para autores como Hegel, Marx e Piaget aqueles que pesavam
interdisciplinarmente e que o construtivismo seria uma das sínteses sobre o tema.
211
formam perante a relação mútua entre ambos (perspectiva construtivista). Assim, defendem
generalista, o filósofo e o educador com o especialista onde se deve buscar pontos de união,
polêmicas vivida pela ciência atual se situa entre o discurso científico e a existência
cotidiana (objetividade X subjetividade), dicotomia que a autora indica como devendo ser
profundas”.34 Para tanto, ela aponta para a imprescindível releitura da Filosofia em seus
conhecimento. Porém, Fazenda percebe que se anuncia tal superação em alguns segmentos
32
Jantsch, A. P. & Bianchetti, L. Universidade e interdisciplinaridade. In: Jantsch, A. P. & Bianchetti, L.
(orgs.), op. cit., p.197.
33
Fazenda, Ivani C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. São Paulo: Papirus, 1994.
34
Ibid.., p.14.
35
Ibid.., p.17.
212
ordem mais ética do que lógica, uma vez que exige uma postura de responsabilidade do
pesquisador-professor perante aquilo com que lida. Para sua adoção no ensino universitário,
c. Possíveis Razões
levando em conta a preocupação entre o todo e a parte, indicando que a unidade, almejada
pela escola cosmológica do pensamento grego (pré-aristotélico), foi substituída pela ênfase
no fragmento, reforçada pelo método cartesiano reducionista até seu auge no século XIX
Administração, etc.36 Neste sentido, eles lembram que o caráter imanente e histórico da
na lógica deste objeto/problema, para poder com ele dialogar adequadamente e estabelecer
existem limites.
36
Op. cit. Lembram ainda que a igreja católica também buscou a unidade em sua pretensa universalização e
que a ênfase na especialização não é cria do capitalismo como muitos afirmam. Segundo A. Koyré (Do
mundo do “mais ou menos” ao universo da precisão. In: Galileu e Platão. Gradiva, s.d., p.61), a cosmogonia
aristotélica criou o abismo entre o real (qualitativo) e o abstrato (quantitativo), hierarquizada pela ordem
celeste e o caos terrestre do ‘mais ou menos’, formando uma dualidade radical.
37
Ibid.., p.178.
213
evolução interna das ciências e não de possíveis pressões externas de contexto social, ou
seja, ela é uma conseqüência natural da percepção e busca de explicação dos fenômenos
epistemológico de certas ciências...”, que incitava o aluno a olhar numa única, restrita e
limitada direção e cujo destino seria uma ciência multipartida e assim a falência do
conhecimento.38
uma vasta extensão do mundo (a metáfora do mirante citada por M. Lövy39) e que tem sido
exigida tanto por fatores internos da evolução do conhecimento científico quanto por
aspectos sociais e não apenas simples modismo. Ela é uma ultrapassagem nas fronteiras
históricas das disciplinas com intuito de se formarem pessoas com uma visão mais larga da
realidade, sendo ou não através da matemática (por possuir linguagem e unidade definidas).
Do mesmo modo, H. Japiassú40 salienta que esta é uma situação patológica do saber e
uma interpretação global de nossa existência, o autor explicita que esta cura é uma
38
Piaget, J., op. cit., p. 19.
39
Lövy, M. Ideologias e Ciência Social: elementos para uma análise marxista. São Paulo: PUC/Cortez,
11ªed., 1996.
40
Japiassu, H. op. cit.
214
da convergência dos diversos campos visando a ação. Para Jantsch, vendo a ciência como
delimitadas.
A primeira seria pelo próprio desenvolvimento da ciência, por pressões estudantis contra a
criatividade a partir de maior ênfase nos conceitos e nos métodos do que nos conteúdos),
melhor comunicação interna e com a sociedade, aproximando saber e real). Quanto aos
funcionando não apenas como “uma crítica interna do saber”, mas também política,
sociedade”. Isto acarreta, segundo este autor, uma nova concepção de universidade, uma
vez que almeja resolver as necessidades dos alunos e da sociedade e se volta menos para a
41
Berger, G., op. cit., p. 50-4.
215
atividades em equipes. Para eles, num mundo em transformação constante, o aluno deve
Gusdorf43 crê que nas Ciências Humanas, a própria realidade ontológica de ser humano
42
Ladrière, J. et al. Les finalité de l’université. In: OCDE, op. cit., p.31.
43
Gusfdorf, G. A interdisciplinaridade. Ciências Humanas. Rio de Janeiro, 1(2):13-22, jul.set., 1977
216
problemas conjugados.
Entretanto, para N. Etges, que propõe uma visão construtivista nos diversos ramos do
saber, cada construto humano é independente dos outros, pois eles não surgiram de maneira
sociólogo da UFSC, as ciências podem ter elementos comuns, mas não é esta a base para
ações propriamente interdisciplinares, uma vez que se trata do método empregado em cada
ciência o que determina sua especificidade. Ao absolutizar uma ciência e seu método, a
para um fim prático e imediato – é insuficiente e equivocada, assim como quando ocorre
44
Lins Filho, J.B.C. Primeiro ciclo das universidades brasileiras e interdisciplinaridade. Rio de Janeiro:
PUC, dissertação em Educação, p.25, 1979. A posição de se trabalhar com grandes temas ao redor das quais
várias áreas se reúnam para a pesquisa interdisciplinar é defendida por pelo menos três entrevistados (assim
como os autores Scurati & Damiano, Japiassu, Etges, Antiseri e Fazenda), que indicam o objeto de estudo
como direcionador e aglutinador dos interesses da comunidade acadêmica.
45
Pelo menos um entrevistado se mostrou bastante enfático com a posição pragmática do trabalho
interdisciplinar universitário: “Não estão preparados e não têm visão pragmática nenhuma, é um curso
teórico. (...) O curso fica internado. Para os alunos era fundamental ter uma disciplina pragmática, uma
operacionalização de conceitos ambientais, como funcionam as ONGs, fazer interligação entre conceitos e
217
metodológicos dos campos científicos: uma especialidade serve apenas como meio para o
fim de outra, em função de um saber dominante. Ou seja, para o autor, apenas uma
execução meramente técnica, jamais uma atividade interdisciplinar. Neste sentido, aponta
também Severino46 comentando que a convergência entre meios e fins, a integração das
consolidado”, uma exigência intrínseca e não uma circunstância aleatória; “...é a face
disciplinas” e portanto eclética mas não leviana. O autor concorda que a passagem deste
‘ecletismo’ interdisciplinar entre seus colegas cientistas sociais se faz mais penoso do que
entre os da área natural, uma vez que houve um “pioneirismo” destes em abordagens
disciplina que se mostra sócio-cêntrica, já que as questões sociais para ele só podem ser
práticas, não tem outro jeito de trabalhar ecologia em comunidade, trabalhar interdisciplinaridade na visão
pragmática e esse curso tem um tremendo potencial”. (UFRJProfBQ2)
46
Op. cit., p.171.
47
Drummond, J. A., op. cit. Este autor e A. Schroeder entendem por ciências ambientais “formas
institucionalizadas de trabalho interdisciplinar reunindo, de um lado, cientistas sociais e, de outro lado,
cientistas naturais e cientistas das áreas tecnológicas ou exatas, em torno de temas que caibam na interface
sociedade humana - mundo natural” (Drummond, J. A. & Schroeder, Andréia. Programas de Pós-Graduação
em Ciências Ambientais e similares no Brasil - uma listagem preliminar. Ambiente & Sociedade. Campinas:
NEPAM, nº. 2, p.139, 1998).
218
explicadas pelo próprio estudo do social, mas no caso de sua inserção na problemática
demais áreas. Neste caso, as Ciências Sociais podem contribuir com métodos e temas de
grande valor para esta nova área interdisciplinar, como, por exemplo, nos estudos sobre
população, relação entre tecnologia e nível de vida e valores como conjunto de símbolos. O
autor defende que, no estudo ambiental, os cientistas naturais também podem contribuir
sua interferência na dinâmica local. Com o intuito de sugerir uma “...leitura social da
paisagem natural” através do diálogo interdisciplinar, Drummond lembra que a maior parte
pelo exercício do diálogo constante com os registros das experiências vividas. O registro
dos momentos perfaz um segundo fundamento, o da memória vivida, sendo que dentre as
atitudes necessárias para tal prática, deve-se prezar: a espera, a reciprocidade, a humildade,
subtrair e adicionar, separar e juntar e, enfim, mania de ver no todo a parte e vice-versa.
48
Fazenda, op. cit., p.82.
219
autora ainda indica a necessidade de respeito ao modo de ser de cada um, partindo para a
locais de pesquisa coletiva (formada por um tema nuclear somado a assuntos satélites),
entrevistados. Alguns parecem apontar para a tendência natural da ciência em caminhar sua
acadêmica do corpo docente e discente, pelo menos no que se refere ao Brasil. Ainda outros
49
Ibid., p.86.
220
d. Muitas Dificuldades
comunicação;
especialidades;
tradições.
comum e certa ordem linear), buscando instruí-las, Piaget aponta para o caráter não
hierárquico das múltiplas condutas humanas e sua irredutibilidade, que obriga cada
especialista interdisciplinar a olhar para além das fronteiras da sua disciplina particular.
Deste modo, o autor percebe a imposição da natureza do objeto complexo, que reforça a
se tratando das Ciências Biológicas, diversos autores indicam que não é possível reduzir o
fenômeno vital aos processos físico-químicos, embora queiram escapar de uma concepção
vitalista, sem uma total explicação, mesmo com as novas descobertas entre o inanimado e a
matéria viva. Nas Ciências Sociais, mais especificamente na Sociologia, o problema central
para Piaget é considerar a sociedade como totalidade ou a partir das relações entre
221
Piaget não queria reduzir uma disciplina à outra, mas demonstrar que, apesar dos fatores
inextricáveis no estudo das culturas humanas, existem problemas comuns cuja confrontação
aplicada, numa ordem científica ou numa ‘ciência das ciências’, ao invés de propor novos
voltada não apenas para a ação, mas também para a reflexão, fazendo com que cada
que deve haver um período de gestação (“nidação”), quando as dúvidas se tornam desafios
pesquisador sua marca pessoal, movimento de ação bidirecional, de dentro pra fora e vice-
versa (“confronto entre a ação praticada e a ação vivida”).52 A autora reflete ainda que toda
pesquisa em educação deve conter ação, pois a produção teórica deve nascer da práxis da
pesquisa e esta da vontade, desejo e até necessidade de dividir o respeito e a espera, o que
sensibilidade.
textos. Determinando a estrutura do método dialético, ele aponta que toda verdade é parcial,
mas tem significado no conjunto das ciências, em uma relação intrínseca entre as partes e o
segundo, sua complexidade e seu caráter histórico. O limite mais sério para a prática do
52
Fazenda, op. cit., p.115-6.
53
Goldmann, L. Le dieu caché. Paris: Gallimard, p. 9, 1959. (Tradução de Ângela. M. de Almeida, 1990.
Capítulo O todo e as partes).
54
A interdisciplinaridade como necessidade e como problema nas Ciências Sociais (In: Jantsch, A.P. &
Bianchetti, L. (orgs.), op. cit., p.25-50). Nesta mesma publicação, R. A. Follari (Interdisciplina e dialética:
sobre um mal-entendido) lembra da idéia errônea da unidade dialética que busca substituir a complexidade
dos discursos científicos por “alguma homogeneidade” que levaria a simplificação e o retroceder do
conhecimento científico (p.133). Para Frigotto, “uma noção homogênea do mundo está hoje superada, quer se
apele à dialética, à teoria de sistemas ou ao racionalismo positivista rejuvenescido”. (p.36)
223
adquiridas” (os mandarinatos) e uma rigidez das estruturas mentais, além de um alto custo
aprendizado de indivíduos aptos a uma rápida e fácil integração a ela. Neste sentido, os
custos de se reunir muitos professores pode ser compensado por: a) uma melhor motivação
A filosofia positivista proposta por A. Comte é apontada como responsável por esta
Severino e Japiassu. Comte, porém, também era contra o acúmulo de fatos desconexos e
incoerentes por uma ciência que busca as causas essenciais, ocultas e inacessíveis da
realidade, mas que ela deveria consistir na descoberta de normas que enunciassem as
55
Michaud, G. Conclusions générales. In: OCDE, op. cit., p. 298-9.
224
relações constantes dos fenômenos observados: o estabelecimento das leis dos fenômenos
sociológica).
“... à análise dos dados observados, eximindo-se assim de buscar as causas dos
parece instrutiva, uma vez que promove a dissipação de preconceitos, ao mesmo tempo em
fenômenos estudados”.58
naturais invariáveis da sociedade humana; os métodos para seu estudo são os mesmos da
historicismo veio trazer certo relativismo ao estudo dos fenômenos sociais por determinar a
56
Este estado positivo e otimista da humanidade é que não deveria ser ultrapassado com a ideologia da crítica
ao status quo, seja cultural, político, social e/ou ambiental.
57
Comte, A. Discurso sobre o espírito positivo. Porto Alegre: Globo/Edusp, p.95, 1976.
58
Piaget, op. cit., p.16.
59
Lövy, op. cit.,p.35.
225
dimensão dialética dos fenômenos, principalmente no que se refere à relação entre classes e
Ao nosso ver, é possível enxergar perspectivas apropriadas nas três análises, pois
tanto é necessário perseguir uma objetividade para a realização de uma verdadeira ciência
que traga aplicabilidade e previsibilidade e que não seja mero instrumento de ideologia
dinâmica, mas que procure somar aspectos que a direcionem a fins relevantes à sociedade -
fins estes que, sob nosso ponto de vista, deve contribuir para uma melhor sobrevivência do
ser humano no que concerne à sua relação saudável consigo mesmo, com os demais
relacionados é a chave para a sociedade humana”60, pois surge do bem estar individual,
60
Citado por Nascimento Jr., A. F. A Sociobiologia. In: I Encontro Paulista de Etologia, Jaboticabal: AZESP/
FCAVJ/FUNEP. Anais, out. , p.96, 1983.
226
...permite ver a realidade como uma atividade objetiva (...) em seu vir-a-ser, não
como um objeto estático, (...) o que acaba por ruir o determinismo biológico,
[pois] o homem é capaz de fazer sua própria história e dar luz a si mesmo no
decurso dela [e] o fator essencial deste processo de autocriação da raça humana
está na sua relação com a natureza.63
paralelo à distinção entre uma ciência (por exemplo, a biologia) funcional, que se preocupa
preocupada com o ‘porquê’ dos fatos e que utiliza métodos como a analogia e a observação,
mais holísticos e qualitativos? Não seriam necessárias ambas abordagens para um melhor
e. Algumas Exigências
61
Ibid.., p.98.
62
Ibid.., p.101.
63
Ibid.., p.102
227
dados ou instrumentos” das demais áreas. Portanto, ele aponta para a necessidade de
formação de uma nova espécie de cientista, baseado em nova consciência, nova pedagogia,
concordam, por percebê-la como um estado de espírito que exige uma atitude de
indicam ainda a necessidade de haver opções de estudo que dêem caminho às aspirações
64
Lins Filho, op. cit., p.29.
65
Gusdorf, G., op. cit., p.15.
66
Antiseri, D. I Fondamenti epistemologici Del lavoro interdisciplinare. Roma: Armando, p.70-1, 1972.
67
Briggs, A. & Michaud, G. Problèmes et solutions. In: OCDE, op. cit., p.202.
68
A universidade precisaria, segundo Buarque (op. cit.), se especializar pelos problemas reais da sociedade,
como a fome, a energia, o analfabetismo e o meio ambiente e não somente por categorias do conhecimento,
como nutrição, engenharia, educação e ecologia, inserindo, em seu meio, a dimensão humanista do
pensamento.
69
Scurati, C. & Damiano, E. Interdisciplinaridad y Didactica. In: OCDE, op. cit., p.55.
228
conhecimento só será efetiva quando forem rompidas as relações sociais que fornecem sua
exclusão, ou seja, lutando pela superação da sociedade de classe. Deste modo, sugere:
Por outro lado, Follari lembra que há uma “ilusão teoricista” que supõe a resolução
que “não é possível, (...) modificar radicalmente a posição da ciência em relação ao poder,
seu lugar político: isto seria pedir da interdisciplinaridade o que ela não pode dar por si
mesma”.71 Acredita o autor ainda que uma indispensável modéstia deva ser praticada, uma
vez que o trabalho científico não tem parentesco com os movimentos sociais e assim não
faz parte da queda dos grandes paradigmas, demonstrando que tal utopia deva ser
moderada. Follari lembra, por outro lado, da exagerada expectativa sobre o trabalho
interdisciplinar como solução dos problemas educacionais e dos perigos ideológicos que
70
Op. cit., p. 37.
71
Follari, op. cit., p.133.
72
Follari, R. Algumas considerações práticas sobre interdisciplinaridade. Em Jantsch, A. P. & Bianchetti L.,
op. cit., p.107.
229
Quanto a isto, acreditamos, nesta tese, que uma modificação estrutural e funcional no
modo de ser universitário, com a grande influência que exerce em tantos jovens e adultos,
com o autor de que não deve haver apenas pesquisa aplicada em contraposição à básica e
que a interdisciplinaridade por si só não poderia consistir-se numa ‘tábua de salvação’ dos
exemplo, o que tem sido feito pelo terceiro segmento da sociedade (mas também deve ser
(ONGs) com cada vez maior participação nos diversos campos e na ação como também na
com um melhor ou mais adequado modo de se pensar (e de agir) nossa relação com as
esferas que nos circundam (bio, geo, atmo, técno), chamando isto de novo paradigma ou
não.
Para se atingir tal democracia, Etges, na mesma publicação, defende que para se
73
Este tipo de estratégia, segundo depoimentos, é realizado no programa da UFPR, quando ocorre uma
desconstrução do ponto de vista específico do aluno (e dos professores), para uma reabertura dos horizontes
conceituais e metodológicos perante novas áreas do fazer científico; depois há uma reconstrução em novos
patamares epistemológicos. Detalhes a seguir.
230
esclarecedoras (educação problematizadora). Este autor crê que, através de uma visão
construtivista, não se busca um elemento unitário comum entre os construtos postos, mas a
supera e não substitui o antigo, construindo uma “terceira linguagem”, uma nova teoria: a
este autor, ela eleva a capacidade de cooperação (como num jogo cooperativo), impondo a
tolerância e aumentando a liberdade efetiva dos homens frente ao mundo. Etges encerra
este artigo comentando sobre a possibilidade de uma nova universidade, mais articulada,
Quanto aos alunos, devem ter uma formação séria, mas não bitolada a uma única atividade
sociedade.77
disciplinas; deve-se dar tempo fora de aula para planejamento em conjunto; discutir
74
Etges, op. cit., p.73-4.
75
Cremos que este pensamento é também expresso nos discursos pesquisados e trazem contribuições
imprescindíveis ao debate entre vitalistas e mecanicistas. A seguir.
76
Ibid., p.82.
77
Posição em acordo com B. Freitag no artigo Aspectos filosóficos e sócio-antropológicos do construtivismo
pós-piagetiano (In: Grossi, E. P. & Bordin, J. Construtivismo pós-piagetiano: um paradigma sobre
aprendizagem. Petrópolis: Vozes, p.27, 1993). Nesta tese, queremos ressaltar a necessidade de estudos em
pedagogias interdisciplinares.
231
evitando o discurso apologético extremado. Ou seja, para o autor, não há unidade dialética
da ordem conceitual”.78
projetos de pesquisa-ação.
78
Follari, op. cit., p.139. Para o autor, Kuhn e citando ainda Stegmuller e Moulines, há continuidade e
progresso científico no terreno das aplicações empíricas, mas não no da compreensão teórica.
79
Siebeneichler, F. B. Encontros e desencontros no caminho da interdisciplinaridade. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, n.98, p.153-80, 1989.
232
demais especialistas.
Será que os especialistas mais extremos dariam conta de uma intervenção mais
Veremos se esta tese, através da análise das entrevistas, pode vir em auxílio na resposta a
tais indagações, mesmo sabendo que a interdisciplinaridade suscita mais perguntas que
respostas, não apenas por suas infinitas possibilidades, mas pela dificuldade em estabelecer
limites.
Buscando concluir, pode-se dizer que a interdisciplinaridade deve ser encarada como
mais além do que a justaposição multi ou pluridisciplinar. De acordo com a maioria dos
pesquisadores citados, pode haver uma tentativa de ‘concerto’ dos problemas complexos da
interdisciplinaridade”.80
passou a ser o maior objetivo nesta nova visão das ‘ciências da complexidade’, como
diversos pesquisadores têm observado. Desde meados da década de 80, vários encontros
pontos:
80
Lins Filho, op. cit., p.40.
81
UNESCO/Fundação Giorgio Cini. Comunicado Final. 1986.
234
Constatou-se, ao mesmo tempo, uma defasagem nociva entre a nova visão do mundo
que emerge do estudo dos sistemas naturais e os valores que ainda predominam na
aparecimento de uma nova visão da humanidade, até mesmo num novo racionalismo que
82
Estudos transdisciplinares têm sido cada vez mais empregados em situações com grande número de fatores
como é o caso, por exemplo, da saúde, reportado no texto do Dr. M. Chaves, Complexidade e
transdisciplinaridade: uma abordagem multidimensional do setor saúde (Rio de Janeiro: Revista Brasileira de
Educação Médica, v.22, jan., 1998). As Ciências Naturais como área de origem deste pensamento
transdisciplinar é confirmado por muitos dos pesquisadores entrevistados.
235
genética, etc., mostram a responsabilidade social dos cientistas no que diz respeito à
Transdisciplinares para o século XXI (Paris, UNESCO, 1991)83, em seu comunicado final
particularmente da Física quântica, fazendo com que a antiga visão da realidade, seus
político e econômico, fossem reavaliados. Assim, uma nova lógica corresponde, em muitos
83
Comitê de redação: René Berger, Michel Cazenave, Roberto Juarroz, Lima de Freitas e Basarab Nicolescu.
236
façam sair de sua unidade, respeitando diferenças e apoiando-se numa nova concepção da
natureza.
5. Uma especialização sempre crescente levou à separação entre ciência e cultura e fez
pesquisadores animados por uma atitude transdisciplinar. Eles só podem se apoiar nas
84
Segundo Niels Bohr em Física atômica e conhecimento humano (Rio de Janeiro: Contraponto, 1995) a
divisão cartesiana entre sujeito e objeto, dominadora da mente humana nos últimos três séculos, passa neste
século XX a sofrer influência de uma nova matriz no nosso conhecimento sobre a natureza. Veremos mais no
capítulo sobre epistemologia.
237
os que são desprovidos dele, engendrando assim desigualdades crescentes no seio dos
por Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu, compuseram as declarações finais
deste encontro:
confrontação das disciplinas dados novos que as articulam entre si e oferece-nos uma nova
várias outras disciplinas, mas a abertura delas àquilo que as atravessa e as ultrapassa.
operativa das acepções através e além das disciplinas. Ela pressupõe uma racionalidade
aberta por um novo olhar sobre a relatividade das noções de ‘definição’ e ‘objetividade’. O
- A visão transdisciplinar é aberta, pois ultrapassa o domínio das Ciências Exatas por
seu diálogo e reconciliação não somente com as Ciências Humanas [e Biológicas], mas
- A ética transdisciplinar recusa toda atitude que recusa o diálogo e a discussão, seja
qual for sua origem - de ordem ideológica, científica, religiosa, econômica, política ou
filosófica.
Transdiciplinar da Universidade’, cujo tema foi Que Universidade para o Amanhã? (Monte
foi composto por Edgar Morin, Michel Camus e o brasileiro Ubiratan d’Ambrósio
Educação Para o Século XXI junto à UNESCO e sua finalidade é fazer com que a
Universidade evolua para a sua missão de “estudo do universal” e cuja idéia central é a de
distinção entre pluri, inter e transdisciplinaridade, uma vez que o crescimento dos saberes
ação - um líder - deveria poder dialogar com os demais. Três são os pontos do sistema de
86
O Relatório Delors ressalta nitidamente os quatro pilares de um novo tipo de educação: aprender a
conhecer, aprender a fazer, aprender a viver junto e aprender a ser. A universidade é o lugar privilegiado para
uma formação apropriada às exigências de nosso tempo. A universidade poderá, portanto, tornar-se o lugar
ideal para o aprendizado da atitude transcultural, transreligiosa, transpolítica e transnacional, para o diálogo
entre a cultura científica e artística, dando lugar a um novo tipo de humanismo.
239
referência a ser modificado na educação apontadas neste documento, visando a gerar uma
• Considerar cada problema não mais a partir de um único nível de realidade, mas
pragmática, com grande prudência e rigor, tomando como finalidade imediata a formação
transdisciplinar faz com que não possa haver evolução transdisciplinar e nem mesmo
87
Um meio termo entre ‘coisas’: não temos apenas ponto ou vírgula, mas também ponto e vírgula (. + , = ;).
Moreira utiliza o símbolo & representando “a unidade inseparável entre dois elementos”. Diferente do autor,
que confere a inseparabilidade corpo & mente, utilizo o e (em itálico) para frisar a união, mas não o concebo
sem o ou. Isto é, são separáveis e não são separáveis. (op. cit. , p.250, 1999).
88
Há aqui uma semelhança com o pensamento oriental. Segundo Bohr, “para uma descrição objetiva (...) em
quase todos os campos do conhecimento, [necessita-se] prestar atenção às circunstâncias em como os dados
são obtidos”. São estes “problemas epistemológicos com que já se confrontavam pensadores como Buda e
Lao Tsé, ao tentarem harmonizar nossas posições de espectadores e atores no grande drama da vida” (p.25-6).
240
dos maiores eixos da nova educação, visando à reunificação das duas culturas, pela sua
seguintes:
89
Esta relação entre corpo docente e discente é colocada por alguns entrevistados, indicando a importância
desta aproximação.
90
Dr. Basarab Nicolescu é professor de física na Universidade "Pierre et Marie Curie", Paris, pesquisador da
C.N.R.S. e presidente do Centro Internacional de Pesquisas e Estudos Transdisciplinares.
241
universalidade e à redefinição dos valores que governam sua própria existência. Por um
científica a custo da negação do sujeito e do declínio do sentido. Deve-se reunir essas duas
culturas de forma que possam transpor para uma cultura transdisciplinar. A universidade
não só está ameaçada pela ausência de sentido, mas também pela recusa de compartilhar
abrangência deste fenômeno ‘revolucionário’ que busca não apenas integrar disciplinas,
mas saberes extra acadêmicos. Podemos ver sua importância como resposta ao isolamento
desenfreada por qualquer totalidade que cremos inatingível. Evidentemente será de grande
colaboração para diminuir abismos crassos da modernidade: ricos e pobres, instruídos e não
instruídos, sociedade e natureza. Porém, temos que nos prevenir de um holismo exagerado
que deve ser conscientemente dosado, pois crer na interdisciplinaridade como panacéia
geral, que possa trazer paz ao mundo, nos parece utópico em demasia. Ou seja, reivindicar
humanidade, por mais gradual que seja, nos parece excessivamente idealista, embora possa
242
colaborar para dar exemplo aos demais setores da sociedade. Por outro lado, cremos que o
grau de parentesco que o trabalho científico deva adquirir com os movimentos sociais,
nestas mudanças. Mesmo assim, indicam a ressalva feita quanto à dispersão de uma
crítica que se apóia nas chamadas ciências da complexidade e que, no fundo, são ciências
que refletem o momento de indagação, dúvida, auto-reflexão do ser humano perante o que
correlações binárias. Com isto queremos confirmar a inevitabilidade das diferenças, porém
espírito que nega, pois tudo merece sucumbir, faz com que as revoluções que provocam
alternâncias de paradigmas sejam percebidas como imanentes à(s) realidade(s) que nos
envolvem e completam.
Neste sentido, cremos ser útil discutir a analogia entre propriedades emergentes e a
oposição imanência e transcendência, uma vez que a visão dialética, no sentido de Hegel e
Marx, nos leva a questionar o processo de transição dos fenômenos naturais e sociais,
emergentes são descritas por Fleibleman em 1954 e pesquisadas por diversos autores, como
Salt (1979), Simon (1973) e Laszlo (1972), segundo o renomado ecólogo E. Odum.92 De
acordo com este autor, uma conseqüência importante da organização hierárquica, que
seguinte, elas nunca explicam a totalidade dos fenômenos que ocorrem no nível seguinte, o
qual precisa ser estudado, por sua vez, para [se tentar] completar o quadro.93
91
De acordo com Japiassú, H. & Marcondes, D. (Dicionário básico de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
p. 72, 1989), o processo do movimento histórico visto pela dialética de Engels e Marx considera a Natureza
como um todo coerente em que os fenômenos se condicionam reciprocamente, como um estado de mudança e
de movimento, como um lugar onde o processo de crescimento das mudanças quantitativas gera, por
acumulação e por saltos, mutações de ordem qualitativa e como sede das contradições internas, seus
fenômenos tendo um lado positivo e outro negativo, um passado e um futuro, donde a luta das tendências
contrárias gera o progresso.
92
Odum, E. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
93
Ibid., p.3. Para exemplificar tal princípio, Odum oferece-nos dois casos: a formação da água, líquido que
surge com a união entre os gases hidrogênio e oxigênio e os corais, que se desenvolveram a partir do trabalho
conjunto de algas e celenterados.
244
a partir de uma epistemologia conveniente aos aspectos da grande complexidade dos fatos
descontinuidade na evolução do universo uma vez que a constância é permeada por uma
modo:
etapas que se coadunam a um acréscimo a partir da união entre partes isoladas; uma espécie
de altruísmo, talvez surgido a partir da competição. Do mesmo modo, cremos que uma
simbiose entre as diversas áreas do conhecimento (e seus promotores) poderá nos fornecer
idéias fecundas que nos permitam tratar de questões básicas, como a degradação sócio-
por meio de uma “comunicação em circuito” entre as diversas ciências. Como pensado
94
Novikoff, A. B. The concept of integrative levels in biology. Science 101:209-15, 1945.
95
Op. cit., p.3.
96
Rio de Janeiro: Ed. Bertrand, 1998. Cap. 7, parte I.
245
antropossocial” na esfera biológica, assim como a esfera viva na physis, criando-se, deste
modo, possibilidades de aproximação entre as ciências. Segue Morin97: “Será que podemos
substituir a lógica bivalente, dita aristotélica, por lógicas polivalentes” como ponto de
Neste segundo capítulo da tese, reunimos as questões cinco, seis e sete, que tratam
subjetiva e qualitativa.
2.1 Interdisciplinaridade
Sociais e se seria possível um diálogo entre elas. E, se assim fosse, de que tipo seria, se
97
Ibid., p.187.
246
entrevistados. A partir daí, identificamos algumas categorias do discurso com intuito de não
acaba por atingir, abordando assuntos desde criatividade e subjetividade até pessimismo e
final das categorias, totalizando cento e trinta indicações. Nesta tabela, em ordem
98
Temos plena consciência de que, embora tenhamos evitado o discurso repetitivo no processamento das
respostas, este método é limitado, já que cada entrevistado pode expor uma idéia utilizando vários termos
diferentes e, ao mesmo tempo, interpretá-la de diversas maneiras. Mesmo assim, cremos útil tal abordagem
por apontar e organizar os diferentes campos.
247
colocando as cinco primeiras categorias num único bloco (que somam quase 50% das
que pode supostamente é discutível, que uma maior presença de uma palavra-categoria nas
processos vividos pelos pesquisadores entrevistados e relatados pelo discurso. Dentro desta
perspectiva, oposta ao uso cotidiano dos números, a quantidade aqui procura indicar as
entendimento entre unidades distintas, se mostra, portanto, o ponto mais frágil e urgente da
Buscar pontos de tangência mesmo. Uma experiência boa (PADCT) que podia
ser explorada mais: o diálogo, não no papel e no trabalho isolado, mas no
seminário, no confronto, se expor para levantar problemas. Nos seminários se
via que de fato avançava, descobria pontos de contato. (UFMGProfD)
Nem sempre fácil por causa do diálogo. As coisas são muito herméticas. O
linguajar entre áreas diferentes é a grande questão; traçar um território comum
de entendimento. (UFMGAlunA)
O diálogo entre os departamentos, entre as disciplinas leva a uma proximidade.
Isolados vai ter uma realidade distorcida por que vai estar incorporando somente
as peculiaridades de cada disciplina. O caminho para chegar mais próximo da
compreensão desta realidade. (UFMGAlunC)
É possível uma certa re–aproximação, mas não significa integrar as áreas, mas
preservar a especificidade de cada uma, havendo diálogo, buscar elementos que
possam estabelecer uma ponte, aprofundando a área de conhecimento.
(UFPRProfA)
Tende a quebrar um pouco a visão reducionista. É um procedimento essencial
para que as pessoas tenham modéstia para o diálogo e a interação com
profissionais de outras áreas. (UFPRProfB)
Tentamos estabelecer diálogo. Ele avança porque, num primeiro momento, é
sobre os campos disciplinares, depois se aborda a problemática de uma situação
real e complexa por várias disciplinas e vai se aprofundando a maneira de se
trabalhar conjuntamente. (UFPRProfC)
No diálogo, fronteiras são desbloqueadas, interpenetração, aprofundando
questão levantada na leitura do mundo. Circular e conversar com especialistas.
(UFRJProfC)
No mercado, em empresas de consultoria ou qualquer área de intervenção,
unidades de conservação, educação ambiental, EIA-RIMA, zoneamento
ecológico e econômico, se fazem equipes interdisciplinares e aí há diálogo.
(UFRJAlunC)
Os professores têm muito claro a idéia do diálogo entre ciências. Mas a
dificuldade é que nem todos são abertos. Existe uma predisposição para permitir
esse diálogo. (USPAlunC)
acadêmico, o que se relaciona com a difícil questão da relação entre teoria e prática (o
Ainda neste sentido se situa a terceira categoria do discurso mais comentada, que foi
ver a interdisciplinaridade como problema, desafio a ser superado, geralmente uma visão ao
mesmo tempo otimista e idealista, mas também realista pela necessidade intrínseca que a
temática levanta (embora durante as entrevistas tenha sido colocado, mais de uma vez, que
O conhecimento moderno foi dividido nas grandes áreas, são blocos que têm
um papel didático também. Mas desenvolveram seu próprio jargão,
metodologias que são as barreiras. Fomos treinados a pensar na área que a gente
nasceu e cresceu. E o desafio é inegável. A Biologia tem uma abrangência
enorme, pois perpassa tudo. Mas igualmente importante é a Física, porque as
leis da natureza são rígidas. Interdisciplinaridade é como é que vamos, sem
apagar o disciplinar, trazer para um discurso comum. Deve ser tentado,
exercitado. (UFMGProfA)
Conhecimento, problema, pessoas, mas os três separados. Para juntar têm
conflitos de interesses de cada um. Um meio termo é muito difícil, porque ele é
político, na maioria das vezes deixou a esfera técnica. Andamos pouco.
(UFMGAlunB)
Ainda está em construção, existe muito discurso. Uma conexão a partir de sua
visão com outro conhecimento, fazendo a sua própria síntese, mas não
interagindo. Um grande desafio fazer sua leitura a luz de seu conhecimento, e
vai haver áreas de interface aonde podem dialogar. (UFPRProfA)
250
pessimismo: embora não pareçam estar conectadas, demonstram que o trabalho conjunto e a
busca por uma visão mais abrangente da realidade que se coadune ao processo científico de
Mesmo que o embate entre cooperativismo e individualismo seja constante (em nosso
caso, foram citados no mesmo número) e que o otimismo tenha sido inferior ao seu oposto,
nos parece que as questões relativas ao trabalho coletivo provocam tanto conflitos quanto
profissionais e áreas acadêmicas. O aparente pessimismo pode ser resultado de uma reação
Este mesmo resultado foi obtido para as categorias pesquisa e ensino, o que nos faz
imaginar que há uma falta de discussão sobre os temas no que toca às iniciativas
interdisciplinares na universidade. Cremos que o assunto mereça maior destaque, pois são,
na maioria das vezes, os principais motores do modo de ser da instituição. Assim, podemos
graduação tem o poder de relacionar, pela atividade pedagógica, a teoria em contato com a
Pesquisa sim, ensino não, porque a grade curricular tem disciplinas das Ciências
Humanas e das Ciências Naturais, mantemos a especificidade dos saberes. A
unicidade e não unificação, se dá na construção de uma problemática comum,
guardando os tempos de cada disciplina que tem sua função específica. Elas vão
sendo informadas pelos outros campos, olhares que informarão, a cada objeto
das suas respectivas disciplinas, outras questões que deverão incorporar quando
exercitarem o seu saber disciplinar. (UFPRProfC)
A articulação, a visão de conjunto tem que ser constante e no ensino não é feita.
Isso serve para pesquisa de campo. Mas exige esforço brutal na academia,
porque é contrária, não no discurso, mas no fazer. (UFRJProfC)
Se a preocupação vai além da constatação, o objetivo é o meio ambiente no
sentido da melhoria, preservação ou conservação. Impossível não procurar
analisar as origens da poluição sem entrar em consideração sobre outros
aspectos determinantes. Fatalmente o pesquisador vai se deparar com questões
que ultrapassam sua especialidade e as quais ele não pode ignorar, como fatores
econômicos, sociais etc. (UFRJAlunA)
Num quinto bloco de respostas, pode-se perceber que ética, graduação, objetividade,
Também o último bloco, cujas palavras foram citadas uma única vez, não deve ser
menosprezado, uma vez que corpo docente, relação com o Estado (governo) e as relações
do mesmo modo que a falta e a busca por melhores resultados, a melhor adequação entre
como os demais, a falta de teoria e prática comuns que alcancem maiores resultados
interdisciplinares.
contexto que do assunto emerge. Embora categorias como governo, temas e fragmentação
tenham sido pouco exploradas nas respostas, elas ressurgem em diversas outras,
deve atentar para melhorá-la e talvez ainda por um resquício da forte departamentalização e
mesmo modo, aparece a busca por resultados mais efetivos, talvez não um resultado único,
mas mais integrado num mesmo patamar de objetividade. Isto seria uma questão a ser
enfrentada e que terá que esbarrar na conjugação de teoria e prática, através de um método
dos entrevistados (mais de quatro quintos) reconheceu ser necessário um meio termo entre
(a pesquisa mais abrangente) na análise de seu objeto de estudo através do diálogo. Estes
pólos. Na sua grande maioria, a comunidade acadêmica pesquisada demonstrou, mais uma
vez, ver a interdisciplinaridade como um grande desafio, às vezes ainda confuso, na busca
de se equacionar tanto problemas mais pontuais, quanto mais amplos. Ao mesmo tempo,
confessam que esta possibilidade é por enquanto mais teórica e ao nível de discurso que
prática concreta, pois ainda não consegue desenvolver-se plenamente na maioria dos casos.
levando a uma imprescindível reciprocidade entre áreas. Indicaram ainda que há momentos
difíceis, de tensões entre as áreas de ciências ditas hard e soft, mas uma maioria de
256
pesquisadores se sente realmente engajado nesta tarefa, buscando ir além de sua formação
original.
acadêmico, fazendo com que deixem de se fechar em si mesmos e busquem novos campos
Se você fosse conversar, por exemplo, com um taxonomista, isso é uma heresia,
é o grupo, a espécie ou a família que trabalha. Ele não está necessariamente,
tecnicamente falando interessado na interdisciplinaridade, porque ele nem pode
estar, ele quer ver uma questão específica. Agora se for fazer taxonomia
ecológica, ele dá chance a outros não-taxonomistas entendam o que eles falam e
escutem um pouco mais o que os ecólogos também falam. (UFMGProfA)
Por exemplo, o desenvolvimento da Matemática ocidental durante muito tempo
ficou emperrada, porque foi inventada pelos gregos e não tinha o conceito de
zero, de conjunto vazio, tinham horror ao vácuo, todo o universo estava
preenchido de alguma coisa, quando não sabiam, diziam que era éter. O
conceito de zero, o nada, veio dos budistas. Enquanto a Matemática não
incorporou esse conceito, que é oriental, não conseguiu avançar. Isto é, o
conhecimento exige na verdade uma espécie de abertura para o universal,
realmente sem preconceito. (UFMGProfC)
257
Eles apontam para a necessidade dessa formação mais generalista como base da
concordam que uma forte disciplina é condição sine qua non para uma boa
relacionamento entre participantes, uma vez que a arrogância impede a parceria objetivando
demonstrando que é a questão das relações humanas, de visão de mundo de cada um que
abertura e fechamento cognitivo. Ambos partiram mais para uma defesa das
decisão radical. Muitos não aceitam ser generalistas, mas sim ser especialista capaz de se
abrir, concordando que “todo bom especialista é mais do que apenas especialista”. Aceitam
simples, mais operacional, já que reduz o universo, ficando mais fácil trabalhar. A área de
Não sei, a gente não pode dar conta de tudo. Adoraria conhecer mais
Antropologia, mais Sociologia, mas não dá. Então sou psicóloga, meus
interesses são em Psicologia e vou começando a buscar de outros lugares. Não
vou saber grandes filosofias ou toda a Antropologia. (UFRJAlunA)
Acho ruim aquele que entende muito de muito pouco e se arvora de entender
muito de muito. (UFMGProfB)
Todas as descobertas foram feitas pelo reducionismo, tem que reduzir as
variáveis para entender algumas coisas. A especialização não dá para abandonar,
mas não pode perder as visões das coisas. Fazer perguntas e responder mais ou
menos amplamente. O papel da ciência é responder perguntas e por isso tem que
saber fazer boas perguntas. Só faz boas perguntas quem entende o trabalho e se
for especialista. Senão vai ficar falando coisas óbvias. (UFMGAlunA)
Também se lembrou da importância da ética no fazer científico, que faria com que os
A gente tem que estar sabendo fazer isso em equipe, sabendo trocar, sabendo o
porquê, qual a utilidade daquilo ali. Mesmo que a gente não saiba se vai ter
utilidade, é assim mesmo, ciência tem que se investir, às vezes não vai dar em
nada, mas às vezes também dá alguma coisa. Não pode é se perder e ficar só
naquilo, dessa coisa de se distanciar do porquê daquilo, a gente tem que ter um
motivo. O cara que faz ciência pura tem que ter um outro tipo de consciência, de
abertura e do porquê aquilo; tem que estar claro que tem alguém pagando pra
fazer isso, uma questão ideológica, a ciência não é neutra, estou a serviço de
alguém. Isso não pode, de maneira alguma, deixar de ser colocado na
universidade, quando a gente está se formando. (UFRJAlunB)
coaduna ao que era tido antigamente como História Natural. Ao mesmo tempo, o trabalho
de aproximação entre áreas exige maturidade do próprio campo que está sendo construído,
para avançar numa área específica e ao mesmo tempo nas áreas de contato. Essa perda de
especificidade, de se encantar num saber novo é declarada como uma certa infantilidade do
campo que ainda não definiu seu objeto com clareza, seus marcos teóricos. Dois
Existe uma tradição hoje soterrada de uma visão de Ciência mais ampla. Essa
especialização excessiva meio nefasta é muito recente; uns 100-150 anos atrás,
até a avalanche positivista, as Ciências eram muito mais integradas. Tínhamos
260
Uma vez que sujeito e objeto se coligam de modo intrínseco e inevitável, compreende-se a
paradoxo sujeito-observador/objeto observado. Para isto, duas fases são apontadas como
disciplinar”, como que retirando referenciais e, depois, reconstruindo sua disciplina nas
metodologia calcada na montagem de projetos conjuntos onde cada tese responde por um
contribuinte para uma crítica ao reducionismo e colabora para um efetivo trabalho prático.
duas pessoas alertaram para a tendência da interdisciplinaridade passar por crises. O CNPq
e a CAPES e mesmo a FAPESP são criticadas por não darem tanto valor à questão
pesquisa sem uma área definida. O Projeto Nacional de Excelência (PRONEX) também foi
citado com a intenção de indicar o privilégio de grupos antigos, mas também criticado pelas
Na hora de escrever o projeto e pedir bolsa para a FAPESP, não sabe a área.
Então acaba optando a área do orientador ou dos pareceristas de determinada
área mais propensos a aceitar essa diversidade, isso é uma certa dificuldade que
os alunos enfrentam também. (USPAlunC)
O GED é elemento altamente perigoso; o positivo é a qualidade e o negativo a
pontuação. Começa a briga pelo aluno melhor. A CAPES está transformando o
programa em uma colcha de retalhos, não afetando só aqui, mas todas as pós
graduações. (UFRJProfB)
262
Por outro lado, uma generalização excessiva é também criticada, por trazer o risco de não
Sociólogo que trabalha com saúde começa a interpretar todos os fatos de saúde
e dá as suas explicações superficiais, porque não trabalha em colaboração com
sanitarista ou profissional de saúde. Se trabalhar questões do ponto de vista
sociológico, aprofundasse e colocasse questões para os outros profissionais,
desse diálogo nasceria uma interdisciplinaridade muito mais proveitosa. (ex.
biólogo e ciências sociais na utilização de espécies). Precisa dialogar. E, que
medida poderia sugerir que fosse mais adequada para essa comunidade, essa
sociedade mudar seus hábitos ancestrais, etc., que às vezes são da própria
sobrevivência e que preciso mudar em prol de uma preservação que pode ter a
sua necessidade. Mas não vou mudar sem a colaboração dessa população.
(UFPRAlunB)
Com os alunos foi igual com os professores: os das Ciências Naturais vieram
mais dispostos (maior feelling) para o conhecimento dos fenômenos sociais do
que vice-versa. As Ciências Sociais consideravam problemas ecossistêmicos
como detalhes, um posteriori ou de simples solução (resquício de visão
mecanicista da natureza num cientista social). Enfatizar processos ecológicos de
difícil apreensão, observação, que são limitantes para a sociedade.
(UFPRAlunC)
[Um aluno] veio da Biologia, não conhecia nada das Ciências Sociais, das
humanas, aquilo era uma caixa preta... Ai já não é um trabalho interdisciplinar,
mas a interdisciplinaridade dentro da própria pessoa que já vai lidando com
umas e outras questões. (UFRJProfA)
263
disciplina ou curso, matéria, cadeira; aquela que o professor se encarrega de construir para
como área disciplinar ou área de conhecimento científico, mas mesmo assim foi útil na
análise de suas idéias referentes ao contato entre pensamentos diferentes. Apenas uma
Na sétima questão, perguntamos como, de modo geral, ciências com tendências mais
uma real dicotomia e se tais discussões têm ocorrido durante o curso.99 Para analisarmos
contempladas.
• Dificuldades: indica que não segue uma solução fácil e não define a resposta.
99
Sabemos que tais estereótipos não se conferem rigidamente, havendo vertentes mais ou menos positivistas
em cada uma delas. De qualquer modo, cremos que existe divergências epistemológicas entre as diferentes
ciências, principalmente entre as humanas e as naturais, distinções tais aqui pesquisadas.
264
• CN => CS: semelhante ao prévio, mas se referindo à maior facilidade das Ciências
Esta quantificação a partir dos diferentes pontos de vista dos pesquisadores é usada
aqui visando revelar até que ponto, para o efetivo trabalho interdisciplinar, é possível se
‘ambas’ resultaram em vinte (sendo que duas respostas colocam uma posição reforçadora
do qualitativo e uma destas ainda apontam, mesmo assim, dificuldades); as ‘Não resposta’
foram três; os que apontaram dificuldades e um discurso mais quantitativo foram dois e as
Vendo este panorama final, podemos presumir que os entrevistados não percebem
uma completa dicotomia que traga dificuldades ao trabalho interdisciplinar no que se refere
às análises qualitativa e quantitativa da realidade sócio-ambiental, uma vez que uma grande
maioria indicou como necessário lidar com ambas as tendências. Os exemplos aqui
Não tem absorvido. Nem há tendência. Brasil não produz, valores éticos,
filosóficos. EUA, nova dimensão saber prever riscos e impactos gerados;
acelera e não muda de rumo. Não subjetividade, qualitativa. (UFRJAlunC)
Não se perde o rigor científico. Uma aproximação se aprende a ver melhor a
partir de outros pontos de vista. Mas a metodologia científica, a avaliação
realmente científica tem cunho de validade. (USPProfB)
indicando principalmente uma tendência a ver as Ciências Naturais como mais preparadas
Conclusões preliminares
Nas últimas décadas do século XX, parecem ter vindo à tona correntes ao mesmo
mundial, com o início e o fim da chamada Guerra Fria, o declínio do welfare state europeu
que fez com que se promovessem fortes transformações nos mais amplos níveis da
resultante não apenas da reação contra as guerras mundiais e o poder bélico das super
economicista e espoliadora das riquezas tanto sociais quanto naturais. Este processo de
revolução cultural nos parece marcar uma guinada de extrema importância na concepção
A contra corrente meramente disciplinar que se irrompe a partir daí, nos parece que
articulação disciplinar tenha sido usada como possível ideologia dominante (no sentido de
perspectiva alienante atomística e positivista que percebe a parte como trivial e fonte de
todo e qualquer saber sobre os meios físico, biológico e social – um movimento anti-
conhecimento sobre nossa existência terrena. A busca por novos conceitos, termos, atitudes
e filosofias parece confirmar as eternas crises por que passa a humanidade no contato com
contraditórios.
conflitos que brotam da tripla relação universitária (ensino, pesquisa e extensão). Neste
sentido, percebemos que tais questões conformam problemas essenciais do modo de ser
concebe uma perspectiva mais humanista e/ou tecnicista (e neste sentido, mais inclinado ao
disciplinar como barreira aos espaços interdisciplinares possíveis e que resume o atrito
inter ou transdisciplinares. A problemática ambiental como objeto de estudo não apenas nos
faz perceber que deve ser tratada interdisciplinarmente, como também nos faz deparar com
estudo científico do ‘espaço’ ocupado e transformado pela ação humana sempre foi tema
100
Lembramos que algumas destas questões serão levantadas apenas em caráter de hipóteses de trabalho e
serão examinadas nos demais capítulos. Outras serão levantadas apenas para apontar campos de tensões, não
sendo objetos desta pesquisa, como, por exemplo, a questão do financiamento e do suporte dos programas, a
influência de reitorias e sub-reitorias etc.
270
Engenharias Medicina
Ambiente
Psicologia
Geografia/logia
Antropologia
pesquisa pura, que não têm aplicação imediata. Assim, vemos que a função meramente
entre os campos científicos tanto diferem. Um menor hermetismo pelo lado da ciência,
se esvaecem e os pólos se esbarram, mas sem perder unidade, devendo corresponder a uma
verdadeira universidade dos saberes com um componente democratizante ativo. Isto é, uma
porção social do fazer científico que seja promissor em termos de combate tanto a
101
As organizações não governamentais, como resultado do enfraquecimento do Estado e/ou como ganho de
poder de cidadania, têm cumprido este papel de modo cada vez mais fértil, escapando à inatividade de órgãos
públicos, mas que devem promover parcerias para sua plena eficácia. Como relatado por um entrevistado, as
parcerias ONG-Empresas-Universidade são bastante promissoras.
271
Para tanto, será preciso que cada participante se auto perceba como integrante de um
fortalecedor de autonomias, ponto nevrálgico da questão interdisciplinar (uma vez que nos
esforçamos também por afirmar campos restritos de poder – sobre nós mesmos, família,
mesmo tempo uma submissão ao fazer conjunto e a manutenção das ‘partes’ constituintes,
Por outro lado, percebe-se que a tendência interdisciplinar acaba por promover um ir
102
Apontamos também para a necessidade, na formação da equipe interdisciplinar, que o critério deva ser
espontâneo, uma vez que a tentativa de se reunir pessoas sem qualquer vínculo emocional ou profissional
tende a esbarrar em atritos prejudiciais à coletividade. Isto parece reforçar a perspectiva sociológica de Kuhn.
103
Na dissertação Da lógica dicotomizante à busca de novos paradigmas: o discurso de pesquisas ambientais
do Rio de Janeiro, Mônica A. Serrão (UFRJ-EICOS, Instituto de Psicologia, 138 p., 1995) descreve diversos
pontos coincidentes como os já apontados: o desafio do caráter interdisciplinar na pesquisa ambiental, as
dificuldades quanto ao relacionamento entre sujeitos (cooperação, diálogo, disputa de poder, vaidade e
especialização), o abismo teoria-prática e a falta da extensão como modo de ser universitário, o papel das
ONGs como intermediadoras da relação entre os saberes acadêmico e popular, a ambigüidade do “imaginário
272
disciplinar, sendo este resultado bastante homogêneo entre os cursos. A maioria dos
PARADIGMA
a. Vida
b. Natureza
c. Natureza humana
1.2 Paradigma
a. Mudança paradigmática
a. Complexidade
b. Abordagem sistêmica
c. Transdisciplinaridade
2. Desenvolvimento sustentável
Conclusões preliminares
274
A teoria em si e por si
para nada serve se não nos faz crer
na conexão dos fenômenos.
Goethe
Inicialmente, utilizamos o estudo de alguns conceitos que parecem dar base à idéia de
debate filosófico sobre tais termos nos faz aprofundar o que parece como ‘novo’ na
com a natureza. Deste eterno ‘conflito’ relacional, podemos inferir a temática de maior
275
ambiental, nos parece vital para a plena concretização da pesquisa sócio-ambiental nas
fazer científico e sobre nossa postura frente à realidade natural e cultural de um mundo em
constante revolução.
mundo, o que tem sido chamado também de Pós-Modernidade (A. Giddens2, J. F. Lyotard3,
G. Bachelard4). Estas alterações parecem estar diretamente ligadas com, por um lado, as
Descartes e Newton - o que leva seguramente ao fim da noção de natureza como máquina e
seu determinismo teleológico.6 Por outro lado e corroborando esta expectativa, nos
1
Do mesmo modo, encontramos uma discussão cada vez maior em torno da ‘educação para a
sustentabilidade’: ela “visa re-clarificar crenças, valores e ações através da reconstrução do nosso
entendimento sobre o modo como o mundo funciona” (Hall, S; Geld, D. & McGrew, T. Modernity and its
future. NY: The open Universitty, Polity Press, 1992).
2
As conseqüências da Modernidade. São Paulo: UNESP, 1990.
3
O Pós-Moderno. Rio de Janeiro: José Olympio, 2a ed., p.99, 1986.
4
Op. cit., 1971. Para o autor um resultado de “descontinuidade”.
5
C. Castoriadis (op. cit., p.216) escreve sobre a lógica conjuntista ou identitária, cuja definição de conjunto
(coleção de objetos/elementos definidos e distintos da intuição ou do pensamento) é questionada. Ou seja, a
lógica matemática exige que se distinga os objetos através de propriedades que conformam classes definidas,
vindo corroborar com a distinção básica com o sujeito. Atualmente, lógicas polivalentes colocam ainda o
indeterminado ou o indecidível (lógica intuicionista).
6
Com isto, parece que toda dimensão linear e calculável do mundo perceptível foi reavaliada com a idéia de
não barreiras entre matéria e energia e de que o átomo não teria nenhuma unidade básica constituinte.
276
Como também percebida pelos críticos do trabalho de Kuhn, ‘paradigma’ pode ser
lido então por várias perspectivas, como visão, dogma, moral, lógica ou ética, enfim, um
modelo ou consenso que reúne pensadores (no caso da academia), por longo tempo.
indígena, autóctone, local. Podemos também crer num paradigma masculino contrário e
‘paradigma’ vem refletir, não apenas a tendência ao novo, mas também a ambição por
transformações apenas camufladas por discursos vazios de ação. Mas também, o tema
parece decorrer de verdadeiras, mas graduais alterações nas crenças e nas atitudes humanas
sobre a Terra. Assim, por um lado queremos crer e lutar por um ‘novo’ “paradigma sócio-
ambiental”, mas por outro, percebemos que os moinhos de vento resistem às ainda débeis
diretamente relacionada com as novas dificuldades que estas colocações impõem e que elas
promovem um pensar, uma filosofia, uma epistemologia mais abrangente para se conseguir
quanto à grande dúvida se somos realmente capazes de decidir sobre nosso próprio futuro,
nos dar uma concreta base teórico-filosófica, visando introduzir assunto de tão grande
relevância na atualidade.
reunir rigor e acaso, leis absolutistas oriundas da ciência clássica com mecânica relativista e
conhecido, não distinguindo alma e corpo. R. Blanché8, assim como G. Bachelard (op. cit.)
8
Blanché, R. A epistemologia. Lisboa: Presença, 1983.
278
epistemologia aponta também para a ruptura das ciências com o conhecimento comum,
e junções, enfim, o caráter pouco rígido e mutável de cada ciência, sem lugar exato e
baseado na quantidade, pode ser conduzido, segundo estes autores, para um quadro geral
crítica), mas, buscando rigor, procura transferir a discussão filosófica para a objetividade
perfeitamente objetiva, uma vez que o cientista já se compromete com sua pesquisa: a
escolha compreende caráter filosófico, sendo óbvio que de cada ato psicológico de
9
Piaget, J. et al. Construcion y validacion de las teorias cientificas: contribuicion de la epistemologia
genetica. Genebra: PAIDOS, 1980.
10
O limite do conhecimento científico, de acordo com Bachelard, não significa pensamento limitado, pois o
espírito científico traça fronteiras e já as ultrapassam, uma vez que são zonas de pensamentos ativos, domínio
de assimilação, paragem momentânea do pensamento.
279
ou hábitos intelectuais. Segundo ele, o espírito científico se forma contra a natureza, pois
uma ciência imóvel, socializada e isolada, desligada das observações iniciais, se mostra
como antiphysis. Piaget, a partir daí, defende uma lógica natural ou das significações, pois
implicações entre ação e significado. Neste ponto, Blanché concorda que uma ciência
inteiramente positivista, sem controvérsias, não existe, sendo apenas um ideal, já que há um
corpo ‘isolado’ como centro de irradiação, pretexto de pensamento, a relação e não o objeto
concreto discernível por leis absolutas, objetivas, racionais da ciência clássica - invertendo-
quântica), ao invés da idéia de totalidade vaga, obscura e não aplicável ao real. Para tanto,
Bachelard confere que toda cultura científica deve começar por uma catarse intelectual e
razões para evoluir. Ao mesmo tempo em que este autor aponta contra a noção continuísta
possível irracionalismo.
tempo em que percebe limites e avanços do próprio saber: segundo Lyotard, uma
Assim, a utilização de idéias gerais, visões amplas e evolução dos conceitos já que o
‘real’ sempre se altera e a condição tautológica nos parece inevitável, é abordado por
Piaget, que procura, do mesmo modo, conciliar com o empirismo científico. Para tanto, ele,
assim como Coimbra, advogam uma epistemologia relacional, variável e não inatista,
11
Ibid.., p. 104. A busca de melhor performance levanta inconsistência de controle do sistema como nas
burocracias estatais que promovem exemplos de feedbacks negativos, já que a precisão é limitada pela
natureza da matéria e não somente pelo custo.
281
criatividade para entender tal interação. Ele confere a possibilidade de um in media res
mental, revisão contínua e necessidade de estabilidade. Para tanto, ele crê que o
considerado como virtual, mas possível como contínua criação - diferença esta que se
Neste sentido, este autor descreve um círculo tautológico, pois todo sistema de
12
A Psicologia busca explicar a formação de conhecimentos, inclusive os matemáticos, portanto há uma
dupla direção do pensamento científico, já que ao mesmo tempo as Ciências Humanas se apóiam nas demais.
282
seres vivos não humanos e humanos, numa tentativa de substituir a explicação pela
pois não enxerga a técnica científica como continuação dos fenômenos naturais, ou seja,
uma origem não biológica da razão. Entretanto, queremos suscitar tal conflito com as idéias
porém não de modo reducionista e limitante.13 Do mesmo modo, queremos reunir aqui a
vida, natureza e de natureza humana que inspiram o ensino e a pesquisa em seu programa
Assim, há duas direções simultâneas e complementares, quando a ciência assimila segue direção idealista e
realista, subordinando espírito à realidade e vice-versa e reduzindo sujeito objeto e objeto sujeito. Mas ela não
pode antecipar resultados, pois permanece em aberto, já que o progresso em cada direção não se equivale.
13
Neste sentido, optamos por uma posição relativista, já que ao mesmo tempo em que somos biológicos e de
algum modo participantes da evolução filogenética, temos capacidade de ir além e transcender, para nossa
sorte e infortúnio, ao modo de ser natural.
283
de pós-graduação, se, estas noções seriam relevantes para o curso e como são tratadas.
a. Vida
componente humano, não havendo em geral campo para uma noção mais ampla de vida,
embora o primeiro levante uma maior abrangência em suas análises. Concebe-se, portanto o
ser humano como único referencial, apresentando características como “normas de vida”,
“vida cotidiana”, “costume de vida” e/ou “transformação da vida social”. Já para o biólogo
temos dúvida de que, apesar da evolução cultural, sofremos também as ações das forças
14
Kuhn, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1994. Souza Santos (p.132)
lembra que sua importância se deve mais ao esforço de síntese de idéias passadas e não tanto a originalidade,
uma vez que o trabalho de A. Koyré (Les Études Galiléennes) em muito o influenciou.
15
La filosofia de la ciência y la Biologia. México: Plural de Excélsior, no.269, p.12-46, 1994.
16
Barbosa, W.V. Sobre a Idéia de Natureza Apostila do Curso Teoria e Práxis do Meio Ambiente. Rio de
Janeiro: ISER, 30 p., 1995.
17
Bohr, N. Física atômica e conhecimento humano. Rio de Janeiro: Contraponto, 129 págs., 1995.
284
acabam por promover o reconsiderar de novo ponto de vista filosófico, o que leva à crise da
que vem mostrar a incapacidade de compreensão das funções biológicas pela análise
científica somente pela Física ou Química. A nova Física dos processos de não-equilíbrio,
visto como mera resposta do genótipo. Para ele, a adaptabilidade depende tanto da
18
I. Prigogine. O fim das certezas. São Paulo: UNESP, 1982.
19
Apud Blanc, M. La genetica según Gregory Bateson: outra logica de lo vivente e Coutlée, G. La ecologia
de la accion coletiva. Em Winkin, I. (org.) Bateson: primer inventario de uma herencia. Buenos Aires: Nueva
Vision. Coleção Desarrollos Sistemicos, Coloquio de Cerisy, parte II: Bateson: diálogos com la genética, la
fisica y la cibernetica, 1982.
20
Guattari (op. cit., p.19) chama de “ritornelo” (ou ladainha, análoga à música, formador da subjetividade,
segundo nota do redator).
285
racional e a lógica.
Assim como Piaget e Bateson, a Biologia Molecular, que pretende decifrar todo
código da vida na pretensão de manipula-la, é criticada por Araújo Jorge.21 Ela permanece
causa (arqué), pois há recorrências; não um eterno retorno, mas um recomeço, somando
epistemologia complexa é tida como uma revolução pela autora, porquanto novas
percepções sobre a visão de mundo passam a ser “revistas por cima”, um quadro de
referência mais amplo, como a noção de auto-organização, misto de ordem e desordem. Dá-
autora aponta para uma lacuna de ordem metodológico-teórica na Biologia: a falta de uma
teoria sobre a organização das relações entre vida, informação e conhecimento (uma
e regulações cruzadas nas disciplinas científicas, para ela, geram diversidade e novas
21
Araújo Jorge, M. O objeto apesar do sujeito. In: Morin, E. Problemas de uma epistemologia complexa.
Lisboa: Biblioteca Universitária, no 38, págs. 79 a 94, 1996.
22
Ver Maturana, H. & Varela, F. El árbol del conocimiento: las bases biológicas del entendimiento humano.
Santiago: Editorial Universitaria, 1976 e Autopoiesis and cognition. Boston: D. Reidel, 1980.
286
nos ao vitalismo, que concebe um elemento adicional e não apenas o programa genético,
também são caracteres distintivos dos seres, fazendo com que o essencialismo platônico
seja substituído pelo darwinismo de indivíduos únicos, mas com coesão social interna. A
que ela se divide em funcional: das causas proximais, o “como?” (para decifrar a
evolucionária: das causas últimas, busca o “porquê?” (da história genética, antigas
descontinuidades também naturais. Segundo este pesquisador, cada nível que percebemos
23
Op. cit., p.14.
24
Para o autor e para E. Mayr (O desenvolvimento do pensamento biológico. Brasília, DF: UnB, 1998), esta
ciência é distinta por não procurar leis definitivas, mas apenas teorias e generalizações de aplicação limitada.
Segundo este autor (p.54), há somente uma ‘lei’ universal na Biologia: “todas as leis biológicas têm
exceções” (inclusive esta, numa tautologia inescapável).
25
Odum, E. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
287
está integrado ou interdependente com outros, não havendo linhas divisórias abruptas, num
sentido funcional, entre organismo e população.26 Alguns exemplos citados por Odum são a
celenterados e entre algas e fungos) e o caso das bactérias viventes no interior de cupins,
uma espécie de altruísmo, mesmo que haja competição num estágio inicial.
vitais são caracterizados por seu “propósito vital”, uma determinação dirigida por um fim
(meta ou télos), propositalmente orientado: uma ação direcionada que parece uma
26
Neste sentido, fazemos uma inversão do lema nacionalista “Independência ou morte” declarando seu
inverso – “Dependência e vida!”, referindo à inevitável reciprocidade entre seres e entre estes e o ambiente.
27
Utilizamos o termo melhoria, mas isto seria análogo a uma adaptação do organismo emergente ao ambiente
específico e não propriamente uma característica comparada aos demais seres, pois ambos podem passar a
subsistir no mesmo local, porém em nichos ecológicos paralelos.
28
Lorenz, K. The Foundation of Ethology NY: Springer-Verlag, 1981.
29
Ibid., p.25.
288
havendo disputa ontológica entre parte e todo. A diferença, como uma essência nova, não é
resultado de uma super imposição, mas uma combinação de inúmeros fatores, não existindo
redução, já que qualquer detalhe de forma e função é resultante do tempo. Segundo o autor,
a progressão histórica é, portanto determinada por infinitas cadeias causais, rota esta que
pode ser reconstruída, mas não o que a determina. A Biologia explica as funções a partir
das estruturas, mas estas são definidas pela função, ou seja, ela utiliza as perspectivas
estática e evolutiva, buscando o que são e como o sistema atinge tal estágio e não outro.
Lorenz confere que, na seleção, dados sobre o ambiente alcançam o genoma e são
estocados como instruções, uma concentração de informação ambiental, sendo que esta
“para quê” serve tal estrutura não significa que há uma orientação da evolução e do
evitando assim uma interpretação lamarckista, que responde o “para quê” com um sentido
A filosofia biológica nos parece então um pano de fundo que pode demonstrar o grau
percebendo o quanto a Biologia tem para contribuir na visão sistêmica. Embora esta ciência
tenha absorvido muitos elementos das ciências positivistas com intuito de fornecer leis
30
De acordo com Lorenz, o sentido de propósito de preservação significa, portanto uma “teleonomia” já que
todas as características influenciam na seleção e são teleonômicas.
289
gerais e verdades, muitos dos autores descritos puderam colocar algumas dificuldades
conflituosa da sociedade com o meio natural, este percebido como desligado somente sob
ambiente.
- Depoimentos
Para a análise desta oitava questão como um todo, distinguimos as opções possíveis
de respostas para preparar um quadro geral visando observar resumidamente o tema. Como
resultado final, tivemos dezenove respostas afirmando a relevância da questão, contra uma
negando, uma com resposta fora de propósito direto do tema e ainda sete abstenções.
cada um entende pelos conceitos. De qualquer modo, algumas respostas obtidas puderam
Para a noção de ‘vida’, com poucas respostas a respeito, dois entrevistados apontaram
boa parte dos entrevistados sejam das Ciências Naturais, infelizmente houve pouco retorno
290
à indagação sobre o significado de vida, o que parece refletir a pouca atenção dada ao
estudo teórico na Biologia e sua imbricação nos estudos das Ciências Ambientais.31
b. Natureza
problemáticas inerentes ao humano que não sejam apenas materialistas, mas também
31
Ver artigo Definindo vida de Emmeche, C. & El-Hani, C. N. (In: El-Hani, C. N. & Videira, A. A. P. O que
é vida?: para entender a biologia do século XXI. Rio de Janeiro: Relume Dumará, p.31-58, 2000).
291
segundo Barbosa, a situar-se no vértice da cisão entre homem e natureza, conferindo uma
suposta origem extra-biológica da razão que promove a lógica disjuntiva e cujas derivações
social sobre o comportamento perante à natureza é vista por A. Coimbra33 como método
sem uma visão pragmática da vida. Havia, portanto, uma apreensão simpática, comunitária,
gênese da filosofia grega do séc. VII ao IV a.C. e que animam toda a imaginação teórica
dos pensadores ocidentais pós-modernos. Porém, para ele e concordamos, é errôneo supor
32
Não seria o princípio ontológico que anima a physis o mesmo que a psique? Enquanto a ontologia forneceu
suporte à epistemologia, esta não teria proporcionado subsídios à metafísica?
33
O outro lado do meio ambiente. São Paulo: CETESB, 1985.
34
Barbosa, op. cit., p.2.
292
Já Platão, segundo este autor, concebe a natureza como segunda ordem, imagem
obscuro da realidade. Para Aristóteles, a natureza “é a essência das coisas que possuem em
si mesmas, como tais, uma origem de movimento” - a physis deixa de ser a totalidade
teleologicamente ordenados a partir das relações entre forma e matéria. Mas já os atomistas
Natureza para os modernos é vista como criatura e obra de Deus, tendo ordem e o
natureza além do corpo e da alma, revelando também o natural como a grande tentadora,
inimiga do homem, mal absoluto. No séc. XVII, segundo Barbosa, a natureza não é
considerada eterna, apenas uma coisa nas mãos hábeis do ‘Grande Artesão’. O ser humano
passa a não ser submetido às condições gerais do cosmos (ao Fatum), mas sim diante dele.
pensador medieval e para “natureza máquina” nos sécs. XVII e XVIII. Desde então o
homem ocidental vive, segundo o autor, o tormento próprio da alma moderna: ou ele
35
Ibid., p.7.
36
Ibid., p.11.
293
encontra outros caminhos que não o da ciência e o da filosofia que o elevem até Deus e o
faça situar-se num plano metafísico ou então deverá buscar em si mesmo o princípio de
contemplação, mas sim como fabricação e utilização, quebrando o “tabu do natural” que
supõe todo fenômeno natural como sagrado. A verdade da natureza passou a residir no que
sua autonomia relativa não corresponde a um vitalismo metafísico que ultrapasse as leis
físico-químicas.
Por sua vez, Lyotard ressalta que ver a natureza como algo constante e indiferente,
não astuta e apartada de nós e, por conseguinte, as Ciências da Natureza distintas das
Humanas, não deve confirmar o sentido oposto, já que o ser humano é a referência, e,
portanto ela deve ser vista como parceira de estratégia mista resultante de um
“comportamento agonístico”.38
37
Op. cit., p.37.
38
Op. cit., p. 104.
294
Das três racionalidades apontadas por Weber, H. Leff39 coloca que, diferentemente
comportamento de atores sociais frente à natureza. Esta racionalidade, para o autor, tem o
N. Bohr concorda que a divisão cartesiana entre sujeito e objeto, dominadora nos
últimos três séculos, é modificado no século XX por uma nova matriz no conhecimento da
diferentes objetos, separados de nós, mas em grupos de diferentes interações que incluem o
Física agora é a de formular componentes para o diálogo com a Química, com o mundo
dualismo que nos determinava como estrangeiros à natureza passa a ser substituído por uma
39
Sociologia e ambiente: sobre o conceito de racionalidade ambiental e as transformações do
conhecimento.In: Vieira, P. F. & Maimon, D. (orgs.). As Ciências Sociais e a questão ambiental: rumo à
interdisciplinaridade. Rio de Janeiro: APED/NAEA, p.95-130, 1994.
40
Op. cit., p. 14.
295
- Depoimentos
concordar que há uma mudança na sua concepção, quando se torna digna de direitos
jurídicos, quando ganha valor financeiro, quando se percebe os demais seres vivos com
olhos menos separatistas. Do mesmo modo, obtivemos somente uma resposta colocando
Percebemos com isto que há controvérsias em termos de natureza com fim pragmático ou
ambígua.
A natureza não humana com certeza na academia [muda]. Não dos empresários,
do mundo lá fora, do produtor rural. Definitivamente a visão de natureza como
recurso, meramente a ser utilizado, já acabou. Tivemos visões do direito francês
(M. Serres), da natureza como sujeito do direito, isto é uma revolução de
pensamento, que o elemento da natureza possa ir a justiça reclamar um direito.
(UFPRAlunC)
Desperta para o valor econômico, patrimonial da natureza. Mas há problema ou
entrave ao desenvolvimento. Não mais romântico, mas seu valor. Exemplo,
áreas ecológicas ganham ICMS ecológico... As mega-tendências dizem ser de
retorno do homem à sua própria essência; espiritualidade, laser, natureza,
silêncio, ócio, perdida pelo homem urbanizado, modernizado. Por isso o
ecoturismo cresce. Aprovando redução da jornada de trabalho, mais tempo para
investir nele mesmo. O bem de consumo vai ser do acesso ao mundo natural.
Talvez por isso sustentável. (UFRJProfB)
‘Natureza’ há distinção com ‘meio ambiente’, mas uso como termos
intercambiáveis; para facilitar o raciocínio. É a biosfera sem contato humano,
que podemos diferenciar pela capacidade de abstração que ele desenvolveu... e
pelo domínio da técnica. Mas animais também produzem cultura, como relação
entre fauna e natureza, alguma abstração. Espécies têm padrões culturais
296
c. Natureza Humana
Com ‘essência humana’ não buscamos alcançar algum essencialismo preciso do que é
o ser humano, mas levantar a questão da difícil arte de auto-definição. Estas conjecturas
podem ser relacionadas com o ato primordial da filosofia de se pensar sobre a existência da
humanidade sobre a face terrestre: o que somos, de onde viemos e para onde vamos? G.
besta. Esta concepção não se reduz a um “laissez-faire naturalista”, mas exige intervenção e
arcos: segundo ele, nesta peça teatral, o texto não está totalmente escrito e a interpretação
não é prevista, sendo uma contingência do mundo, efeito conjunto de miopia e auto-
Bateson, o protagonismo humano pode ser visto como “extra-regulador” por promover o
41
G. Coutlée, op. cit., p.125.
297
para Bateson, seria então resultado do desdobramento regulado por estas forças centrífugas
epistêmico e práxico, ambos conformam nossa visão do mundo – para ele, uma definição
de paradigma mais amplo que o de T. Kuhn, pois percebe dois regimes imbricados, uma
vez que compreender já remete uma maneira de ser e, por conseguinte de atuar. A ação
humana pela esfera do político (social), se aproximando das idéias de Leff, acima citadas.
positivismo lógico através dos mesmos métodos utilizados na área natural, objetivos,
neutros, sem valores morais, visões de mundo e ideologias. Entretanto, para L. von
guerras e autodestruição não se reduzem a uma simples luta pela sobrevivência, mas são
nos à decadência moral, conseqüência de se ver a ação humana como reles variedade da
42
Stengers, I. Quem tem medo da Ciência? Ciências e poderes. São Paulo: Siciliano, 1990.
43
Bertalanffy, L. von. Perspectivas en la Teoria General de Sistemas: estudios científico-filosóficos. Madri:
Alianza, 1956.
44
Feyerabend, P. Consolando o especialista. Em Lakatos, I. & Musgrave, A. A crítica e o desenvolvimento do
conhecimento. São Paulo: Cultrix/Edusp, p.244-84, 1979. Do mesmo modo como nos sistemas naturais,
podemos fazer uma analogia com o ‘ecossistema universitário’. Na relação entre especialistas e generalistas,
não existem diferenças adaptativas consideráveis, já que ambos podem ter suas vantagens monopolizando um
298
fechadas.
ver organismos como nada mais que matéria demonstra a limitação do reducionismo
igualdade jurídica, pois implicam na ruptura de laços entre indivíduos, comunidade humana
serem estudadas, mas não têm relação viva com o sujeito, com o ser vivo, humano. Este
quadro de englobamento faz, segundo Giddens47, ao mesmo tempo, confirmar uma nova
nicho ou vagando ‘livremente’ – depende das ‘inconstantes’ alternativas ambientais. No caso acadêmico, as
modificações profissionais se dão tanto pelas flutuações no mercado de trabalho internacional, ditadas pela
pós-modernidade e pela globalização, quanto por fatores mais locais e regionais de gestão ambiental.
45
Op. cit., p.18.
46
Goldmann, L. A origem da Dialética: a comunidade humana e o universo em Kant. Ed. Paz e Terra, 1948.
47
Op. cit., capítulo V: Conduzindo o Carro de Jagrená, p. 151-77. Há dificuldade de validação da teoria da
evolução biológica, já que não é verificável experimentalmente e se tornou um dogma por motivações
sociológicas, como resultado da penetração de idéias mecânico-utilitaristas. Além disto, semelhanças ou
isomorfismos dos sistemas psicológicos e sociológicos com o estritamente biológico são ainda especulações e
exigem a convergência de esforços teóricos.
299
para o mundo e buscando a razão das coisas. Há uma natureza paradoxal da inteligência
humana que se depara tanto com potenciais quanto com limites: “o Homem é um fenômeno
próprio íntimo”.49 Esta ambigüidade corrobora com as distinções entre as áreas que
é de difícil acordo, pois uma síntese se mostra impossível. Por outro lado, o diálogo com
espírito aberto pode formar uma epistemologia que facilite o funcionamento da ciência –
como uma autocrítica. A multivisão necessária que permita uma conjugação de olhares e
e distintas, porém humanas e, portanto flexíveis. Mesmo apontando para uma impossível
novo humanismo, já que abrange as relações inter-humanas, visto o meio ambiente como
48
Um ‘evolucionismo social’ poderia ser aventado se percebermos a história da sociedade humana como
participante da evolução da biosfera (cada vez mais), já que a seqüência de fenômenos tanto naturais quanto
sociais permanece em aberto.
49
Op. cit., p. 160.
300
mesmo tempo em que reforça exigências distintas dos campos humanos e naturais. Para ele,
não há mundo em si, somente para si, criticando o saber positivo e as linhas demarcatórias
que negam o mistério das coisas e impedem uma articulação profícua entre campos. A
De acordo com N. Bohr, Física e Química se tornam cada vez mais unidas, sendo as
confere, por conseguinte, a estas mudanças um grande impacto em todas as áreas, sejam
ainda que o caráter simples dos problemas atômicos é útil para campos amplos, como no
(wholeness): sistemas não são resultados de meras somas das partes.51 Por outro lado, ele
explicita que se deve evitar a incoerência da complementaridade, uma vez que a Biologia
pode ser descrita parcialmente pela Física e pela Química e, ao mesmo tempo, qualquer
Piaget). Para ele, então, é impossível a distinção nítida entre filosofia natural e cultura
encontrar uma definição que distinguisse seres humanos e animais. Há, portanto, uma
50
Castoriadis, C., op. cit.
51
Op. cit., p.28.
301
Para nós, neste debate conflituoso entre o natural e o humano, a certa tendência de
influência, Darwin não parece ter defendido algo a respeito e, ao nosso ver, suas idéias são
também validas, até certo ponto, à espécie humana. Porém, a evolução cultural, através de
tendo sua gênese biológica, não nos remete ao primitivismo, convocando a instintos
e não redução do humano ao natural é utópico, visto a tecnologização do planeta, mas real
- Depoimentos
52
Para E. O. Wilson em entrevista para o Le Monde (O indivíduo. São Paulo: Ática, p.113-9,1989), natureza
humana é um conjunto de tendências fundamentais, de propensões comuns, perceptíveis em todas as
categorias de comportamentos... muitas vezes – mas nem sempre – ligadas aos condicionamentos genéticos
que se exercem sobre o desenvolvimento mental. Ver os trabalhos de M. Ruse (Sociobiologia: senso ou
contra-senso? Belo Horizonte: Itatiaia, 1983) e Gláucia O. da Silva (Sociobiologia. São Paulo: Brasiliense,
1993).
302
Doze é o número de respostas referentes ao termo ‘natureza humana’, sendo dos mais
variados feitios. Para alguns entrevistados, ele passa por uma alteração no pós-modernismo,
humana de nossa ‘natureza’. Mesmo que haja controvérsias quanto a Ecologia tratar de
concordar que a humanidade passa por uma espécie de ganho de consciência sobre seu
1.2 Paradigma
para uma concepção sistêmico-complexa das mesmas. Também questionamos de que modo
a. Mudança Paradigmática53
sistema confirma seu aspecto instável, embora um caráter determinado possa existir
53
Veja em anexo (T) exemplos de divisões de paradigmas dados por diversos autores.
304
momentaneamente, mas apenas relativo ao local e não tendendo à estabilização. Assim, ele
demonstram que as chances de controle total serem mínimas, pois revelam apenas “ilhas de
catastrófica, não retificável, paradoxal, fazendo mudar o sentido do saber já que produz o
desconhecido.54 Ele crê numa ciência como campo aberto, pragmática e centrada nos
nisto um novo modelo de legitimação, que se faz pela diferença, uma “paralogia” útil para
gerar idéias, mas distinta de inovação, pois não é dirigida e usada pelo sistema, mas
antigas legitimações, embora um consenso universal através do discurso não seja possível,
processo cumulativo e contínuo, já que o princípio organizador não é puro e lógico, mas
ciência. A convivência com diferentes cientistas fez com que Kuhn abordasse os
firmes ou permanentes do que as Sociais. Ele revelou assim que uma metafísica criadora ou
54
Op. cit., p.107.
305
atraem a comunidade, enquanto o fracasso repetido pode induzir à crise. Assim, para ele,
monólogo entre cientistas, sendo a escolha não apenas científica. Mesmo assim, o
para uma audiência seleta, não se preocupando com outro grupo e passando a resolver
solução. O progresso científico seria então causa e não efeito das relações entre atividade
autor: preocupações com problemas de detalhe da natureza não meramente pessoais, mas
soluções aceitas por muitos, distinção entre condições teóricas e não teóricas, fatores
não admite interferências externas, pois deve ser árbitro exclusivo, fazendo congregar
únicos conhecedores das regras do jogo ou critério para julgamentos inequívocos. Para
“autoconfirmação”, pois se mostra eficaz na solução de problemas, embora o novo deva ser
306
Suas atitudes filosóficas foram percebidas com certo ceticismo, como por exemplo,
por M. Masterman56 que aponta para as múltiplas definições khunianas de paradigma, mas
também para a originalidade de sua noção sociológica que pode funcionar sem teorias e a
noção de paradigma não percebida como metafísica. Outro crítico, P. Feyerabend (op.cit.)
com uma posição anarquista contra o método, defende que a ciência normal não é
novas teorias nem sempre são tão ricas para lidar com todos os problemas da predecessora,
ou seja, a substituição envolve tanto perdas quanto ganhos. Há uma interação entre
vê a educação restrita ao pensamento, ação e moção, fazendo falta múltiplos talentos. Ele é
contra a idéia de ciência madura, pois falha ao não perceber que a proliferação precede a
revolução.
55
Op. cit., p.213.
56
A natureza do paradigma. In: Lakatos e Musgrave, op. cit., p.72-108.
307
“matriz disciplinar” ou o que é partilhado por comunidade que colabora com soluções de
problemas. Ele propõe então alterar para “exemplar”, mas não muda o processo de
transforma o que contamina. Ele percebe o confronto no colapso da comunicação por meio
completamente eficazes.
que a complexificação do mundo é a mesma coisa que o visto pela Física só que mais
complicada é tida como regressão intelectual por I. Stengers.58 A identidade científica como
poder que julga e organiza, procura ser refeita colocando as ciências na história, embora
elas criem seu próprio contexto formando imposição abstrata – o desafio de colocar
fenômenos ativos participantes na história não apenas humana, mas que emaranhe com as
coisas, ou seja, colocar as idéias sob risco delas. A autora critica a modalidade experimental
57
Kuhn, T.S. Reflexões sobre os meus críticos. In: Lakatos & Musgrave, op. cit., p.329.
58
Stengers, I. Quem tem medo da Ciência? Ciências e poderes. São Paulo: Siciliano, 1990.
308
paradigma além da lingüística e incerta de Kuhn, vendo o termo como um tipo de relação
conhecimento em disciplinas não comunicantes, Morin difere três níveis não redutíveis,
mágica) tão necessário quanto o material (da esfera racional-empírico) que sustentam a
identidade comum. Para ele, este exemplo tem relação com ideologias, ao mesmo tempo
imaginativa e real, lógicas e abstratas, mas que atuam objetivamente, advogando então uma
nova ciência do espírito, dos mitos e das idéias – a noologia. Esta traria a soma da lógica e
59
Morin, E. O problema epistemológico da complexidade. Lisboa: Biblioteca Universitária, no 38, p. 13,
1996.
309
grandes contradições internas. Assim como apontado por Kuhn, argumentos não empíricos
e filosóficos influenciam também as áreas exatas e portanto a Ciência Social não pode ser
voluntário e permanente, mas a Sociologia é marcada pelo dissenso, uma rotina de crises de
um conflito saudável para Alexander, que busca combinar compromissos racionais com
uma interpretação moderada entre ambas tendências: uma teoria geral, sintética, objetiva e
normativa junto a uma teoria da cultura, ponte que evita degenerar em idealismo,
60
Lövy, op. cit., p.35, 1996.
61
Bourdieu, P. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: DIFEL/Bertrand, 1989.
62
Alexander, J. C. O novo movimento teórico. In: ANPOCS: Revista Brasileira de Ciências Sociais, n.4,
vol.2, junho de 1987.
310
da lógica única. Embora ele seja contra a racionalidade econômica de forças cegas do
possibilidade de uma lógica ambiental geral. Apesar do confronto entre as lógicas opostas
63
Op. cit., p.103.
311
estabilidade. ‘Paradigma’ seria então reflexo da crise que altera a visão de mundo, a
concepção de natureza e o nosso lugar e postura diante disto. A razão subjetiva se confronta
objeto. Para ele, Kant foi quem apresentou a idéia de “sujeito transcendental” atuante,
processo social como pleno de interação entre consciências, onde há ação recíproca e se
desenvolvimento científico.
- Depoimentos
64
In: Brandão, Z. A crise dos paradigmas e a educação. São Paulo: Cortez, p. 14-29, 1995.
65
Esta posição se mostra oposta a de A. P. Jantsch que procura ir além da filosofia do sujeito na construção
da interdisciplinaridade.
312
não é visto como único e o momento atual de crise da eficiência, com a admissão da
mudança de postura para se rediscutir a sociedade. Por outro lado, um entrevistado não
concorda com esta postura, crendo ser a discussão muito recente, não havendo ainda uma
teoria e/ou uma pesquisa normal. Dentre os alunos entrevistados desta universidade, dois
não havendo retorno ou síntese. Talvez haja, segundo ele, uma vontade, mas não um
exemplo, modelo ou visão. Outro ponto indicado é para a possibilidade desta tendência ser
puramente disciplinar.
Sim. E de nós como parte dela. É uma tentativa de avanço para um mais
complexo, sistêmico, talvez holístico (dependendo do que a gente entenda por
holístico). Acho que a sociedade humana é muito prepotente. Quase todos os
sistemas, o que ele vai fazer depende dos seus interesses e não necessariamente
os interesses da natureza. E isso me parece um contra-senso, porque nós somos
inteligentes o suficiente para perceber que nós dependemos 100% desta
natureza. As coisas artificiais que nós estamos produzindo podem ser boas para
uma série de coisas, mas numa visão totalmente tecnicista, numa visão
imediatista. (UFMGProfA)
Sim. Sem dúvida, os nossos paradigmas da ciência moderna e do conhecimento
inclusive das humanidades modernas e etc estão certamente “em cheque”, se
não completamente desmontados. As grandes verdades, o legado do projeto
iluminista todo, a ciência entendida como capaz de dar respostas absolutas e
verdadeiras tudo isto está em jogo. É muito difícil você separar o joio do trigo
pelo momento de transição, mas passar por um projeto também de centralização
313
partir da complexidade da questão ambiental, surgindo uma nova lógica, um novo olhar -
ligado à(s) ciência(s), mas uma opção de docentes e discentes quanto ao eixo da pesquisa.
Por outro lado, um professor apontou para uma relativização da noção de paradigma,
mesmo paradigma. Do mesmo modo, ele concorda que o novo seria uma outra
interdisciplinar demonstra um avanço que traz mudanças tanto a nível local quanto
dificuldades pela formação disciplinar, já que ocorrem retornos aos campos de origem
(após projeto), se mostrando ainda especialistas, mesmo com outra visão, ainda tentando
entrevistados apresenta dúvida sobre a tendência mundial, pois há um uso exagerado, como
abertura que as Ciências Sociais para este novo fazer científico – como o processo natural
do ambientalismo.
É um novo paradigma. Agora ele tem, muitas vezes, sido utilizado de forma
bastante oportunista para se ocupar ou não se perder espaços, adequar
temporariamente e por verniz interdisciplinar, mas no fundo está ali a força
disciplinar. Mas apesar disto a tendência está aumentando. (UFPRAlunA)
Junto aos professores do curso carioca, obtivemos um empate entre aqueles que
provocando crise econômica e instabilidade social, faz com que o fechamento acadêmico
seja perturbado. Há, portanto uma mudança na sociedade e no Brasil, ocorrendo o aumento
sustentável. Embora indiquem que ‘paradigma’ como conceito seja uma utopia, na
academia ocorre lentamente, não de modo espontâneo, mas por recursos (como indicado na
UFMG). Por outro lado, colocou-se que foi a partir de uma pessoa com visão estratégica
poder, globalização. Isto faz ver o processo como imprevisível, embora aponte para o
mostram também contra o termo por trazer um discurso vazio: novo paradigma é visto
como blefe. Contra o discurso, um entrevistado indica que deve haver luta pela ciência de
tem dado conta e resultou na crise epistemológica, que não rompe, mas vai surgindo como
resolução de problemas, através de uma ciência mais crítica e não conformista, trazendo
para a academia a relação pessoal com o mundo. Um outro pesquisador apresenta dúvidas
quanto a idéia da competição ser substituída pela cooperação sem conflito, mesmo vendo, a
Algo novo está surgindo, que algo tem que mudar, que a ciência não está dando
conta e isto refletiria numa crise e que se estaria construindo algo diferente.
Não acaba um para começar outro, este vai surgindo dentro do paradigma
antigo, ultrapassado. Vejo paradigma como uma visão ampla, não só em ciência
e sim num estilo de vida, porque ciência é um desdobramento da sociedade, é
fruto de uma cultura, ideologia. Passamos por uma crise de civilização, de
valores. Idéias e práticas que não estão mais funcionando. Por isso está
surgindo outro paradigma ou outras fórmulas de fazer ciência e pesquisa,
vemos gente fazendo pesquisa voltada para isso, engajada. Não sabemos se
vamos ter um aporte transformador, se vai desembocar numa mudança de fato.
Ou se é mais uma questão reformista: ajeitar, fingir a interdisciplinaridade,
pesquisa de extensão, a universidade chegando até a sociedade para trabalhar
junto ou se realmente vai conseguir uma forma mais potente, que resolva de
fato, voltada mais para resolução de problemas. Mas também desenvolver uma
ciência que traga a questão crítica mais à tona, não conformista. Existem duas
coisas pulsando no mundo e na academia, reflexos dessa inovação
transformadora: na forma de pesquisar, de relacionar com o mundo e na de
316
relacionar com o colega, com o aluno. Ainda tem conservadores, que ainda é
hegemônico, preponderando no mundo. Dois tipos de discurso que em algum
momento são conflitantes e excludentes. Podem até existir os dois, mas um vai
ter que inteirar e, de acordo com quem está inteirando, é que o mundo vai
caminhar. Num temos mais esperança de melhoras e outro vai em direção ao
desespero, destruição, solidão, miséria. Por mais que tenha tecnologia ou se
invista em ambiente, se a lógica é a mesma, isto vai estar acontecendo. Isso
tudo como conseqüência desse sistema e não causa. Tem gente pensando nisso
há muito tempo, vozes que nunca foram ouvidas. Só agora porque tem mais
gente no mundo e as pessoas têm mais sensibilidade, então as idéias começam a
repercutir mais. E por causa de toda uma situação crítica e mais tragédias
acontecendo, tanto no nível social quanto no natural e aponta para algo errado.
É por aí o descontentamento. Se tivesse tudo legal, não tinha necessidade de ter
uma proposta tão radical. Talvez você adaptasse uma coisa ali, outra ali, para ir
aperfeiçoando. Mas são lógicas excludentes, “ou isso, ou aquilo”, coisa muito
grave está acontecendo. (UFRJAlunosB)
Não li Kuhn. Não tenho certeza do que é paradigma, mas pelo Capra, as forças
competitivas vão sendo substituídas pelas cooperativas, de forma natural, sem
conflito, um movimento de substituição. Questiono isso. Não existe cenário
onde só existam forças competitivas ou só cooperativas. Qualquer tipo de
sociedade sempre tem oscilação. O mercado é competitivo, o Estado não mais
supre e pede para a sociedade ser cooperativa e ela de fato reage um pouco. As
cooperativas renascem na crise, na competição forte. Faço uma análise mais
ideológica: são forças opostas, em conflito, em disputa de poder. Então não
pode ser uma transição natural. Temos válvulas de escape. Existe uma força
dominante que às vezes precisa que a contra-hegemônica aflore um pouco para
poder ser captada e evitar que isso se transforme. Cada vez mais vejo só
movimentos reformistas e não revolucionários. Não sei quem está em crise:
paradigma ou capitalismo. Os riscos ameaçam a democracia já que quem tem
voz absoluta é o técnico, tecnocrata, especialista, diz se é aceitável ou
previsível. A voz do cientista é uma, mas cada vez mais a do técnico apaga as
outras, está ganhando poder. Paradigma é uma questão de valores:
antropocentrismo x biocentrismo, competição x cooperação, racionalismo x
emotividade, individualismo x coletivo, são os valores fundantes de uma
organização social. Os valores capitalistas ganham terreno. Estão sendo
questionados, mas por uma pequena elite. Não sei se podemos chamar de
questionamento. Temos que estar atentos porque se houver uma transição é a
longo prazo, fruto de embates não tranqüilos. (UFRJAlunosC)
que nega e outro que relativiza. Os primeiros indicam que, apesar do oportunismo
difícil. Lembram a Agenda 21 mas ainda tem se mostrado restrita, caindo num embate entre
professor que nega coloca que, por enquanto, existe muito discurso e pouca realidade,
entre tendências. Para ele, a Ecologia tanto influencia quanto é influenciada, tendo o
privilégio de pensar em vários fatores ao mesmo tempo, sendo uma saída necessária para a
transformação intelectual pelas circunstâncias mundiais. Por outro lado, ele coloca que isto
não é um debate excepcional, pois ocorre a longo prazo e não garante a total mudança da
economia. Dentre os alunos, houve uma maior negação do que confirmação, crendo ser o
novo paradigma sinônimo de se jogar fora o que já se tem, defendendo que não há uma
fator interdisciplinar. Porém, este não reflete algo novo, mas apenas uma reformulação. Já o
aluno que pareceu confirmar, defende que a busca pela pesquisa sistêmica, relativista é feita
explanações. Cinco relatos indicam a negação e no geral defenderam uma não radicalidade
relativizaram o debate, de acordo com suas diferentes justificativas, sendo ainda que houve
uma abstenção. Neste sentido, podemos conferir que, embora seja de extrema relevância, o
debate é bastante vago dentre os entrevistados, mesmo com a pequena maioria definindo a
movimento que busca alterações de amplo espectro, tais como sociais, políticos,
econômicos e filosóficos.
319
também a relevância destes conceitos para o curso. O grau de relevância levantado através
das entrevistas foi mediano, uma vez que dos vinte e oito, apenas treze responderam
afirmativamente e dois negativamente, mesmo que ainda treze não tenham respondido à
questão.
conceito, teórica e empiricamente. Pela explanação geral do que entendem pelo assunto e
sua relevância, obtivemos uma grande variedade de apontamentos. A resposta dada por um
professor da UFMG foi que os termos são relevantes e legitimados, mas não são
um tenha declarado que a formação oferecida é ainda bastante tradicional, outro percebe
que alguns professores têm visão flexível, mas os pressupostos rígidos, mecanicistas apenas
lentamente estão sendo relativizados. Para ele, não há consenso, ainda imperando um difícil
Sim, com limitações, não são centrais. Não temos espaços para essas questões
que muitas vezes são orientadoras e centrais para que cada um se manifeste.
Isto tem maior receptividade entre os alunos, coisas que aparecem ainda como
heterodoxas, vistas com certas restrições, mas já legitimadas, não causam mais
frisson, surpresas que causaram 10 anos atrás... Mas ainda é limitado e difícil,
por enquanto não encontra legitimidade: o sujeito que faz esta passagem têm
um certo receio em termos de mercado de trabalho, de ficar meio híbrido, sem
320
espaço pra voltar para academia, questões pessoais, medo de deslocamento e ter
mercado de trabalho muito restrito o que é uma verdade. (UFMGProfC)
deflagrar um espaço de invenção, onde a associação é negociada, mas não uma super nova
ciência.
Sim são discutidas e uma das razões de ser do curso. Exatamente porque não
são compreensíveis, perceptíveis se aborda ferramentas disciplinares, elas têm
que ser tratadas e discutidas num espaço interdisciplinar. E já se manifestaram
em algumas teses. (UFPRProfB)
Estes termos são parte de um glossário que acompanha a elaboração teórica e
prática do curso,embora os eixos norteadores sejam a dimensão ambiental e a
do desenvolvimento. (UFPRProfC)
modo, um entrevistado colocou dificuldades, mas garante sua importância. Para ele, são
na área de um (arquitetura e urbanismo) não existe essa reflexão ainda sobre “uma sinergia
entre disciplinas”, já que não há discussão interna no curso. Para outro entrevistado, a
321
mudança é baseada nesses conceitos que têm que ser assimilados também nos topos da
hierarquia econômica, apesar de não achar provável uma mudança muito grande no jeito de
a. Complexidade
teoria da informação, não vendo como sinônimo de complicação, mas apontando para o
palavras, o conceito. Portanto, ele a percebe, na modernidade, como resposta à crise dos
relativa liberdade teológica, política e econômica é colocado por Morin, indicando o elo
“epistemologia complexa”, uma vez que conhecer, para Morin, é aventura incerta, frágil,
difícil, trágica.66 As idéias não são sintéticas nem harmoniosas, mas há dificuldades entre
determinações psíquicas e sociais e por isto deve se fazer encontros e trocas entre
da ciência, razão, progresso contribui para a “desrazão” que coabita com a razão o coração
da universidade.
Para I. Stengers (op. cit.), complexidade é uma noção perigosa que promove grandes
discursos, podendo indicar que apenas a ciência chega à verdade (do mesmo modo que foi
apontado por Follari em relação à origem da interdisciplinaridade). Mesmo assim, ela faz
66
Op. cit., p.33
323
fundamentais por um observador ideal, já que uma complexidade pertinente impõe nova
maneira de interrogar e possibilita outras situações. Mais do que obstáculos, nova visão ou
teoria, a complexidade é prática: “...se coloca quando um encontro empírico (...) impõe um
interrogação prática que tal conceito ocultava”67, não como um retorno ao empirismo, mas
questão que traz à tona a relação entre poder, risco e pertinência, sem grandes discursos
Leff com a percepção de um real dinâmico que nos engendra e reunindo disciplinas em
torno de um saber ambiental cada vez mais emergente. Para ele, somente dando atenção à
racionalidade social aberta, oposta a qualquer unificação.68 Mas ele ponta para as
resistências das Ciências Sociais que têm internalizado muito pouco os princípios
ambientais por sua rigidez e apriorismo, não percebendo a potencial colaboração para uma
vez que é um processo político e social que passa por confrontos e acertos de interesses
67
Op. cit., p.171.
68
Op. cit., p. 103.
324
A. Marques (op. cit.) interroga se é possível sintetizar áreas disciplinares sem ser
ciências buscam dar conta de múltiplas determinações com menor número possível de
idéias convencionais e não verdades analíticas, mesmo tendo função reguladora da razão.69
complexidade é fator limitante da consagração definitiva dos saberes como busca de uma
verdade concreta. Diferente das Ciências Exatas, as ciências ‘inexatas’ foram muitas vezes
desconsideradas como ciências. Porém, de acordo com P. Tamayo (op. cit.), qualquer
unidade é descartada, uma vez que há uma irredutível heterogeneidade entre matéria inerte
e viva. A Biologia muitas vezes não se adequa à abordagem reducionista porque poucas leis
Há também complexidade no meio físico, como por exemplo, o clima, mas a diferença é
quantitativa para o autor, já que evolução e emergência de propriedades são funções não
69
Op. cit., p. 38.
325
evolução biológica, coloca que um novo conjunto de elementos acaba por provocar a
propriedades não são reduzíveis à soma das partes.70 Deste modo, as descobertas dum nível
ajudam no nível seguinte, mas não explicam sua totalidade, resumindo o que chama de
ele difere da Física por esta utilizar métodos de redução generalizante com intuito de
desvelar leis universais de sistemas super ordenados.71 Embora a Biologia também use a
leis gerais e específicas revela a contradição. A rede de variáveis interatuantes por causa e
para além da entropia faz com que, de acordo com L. von Bertalanffy (op. cit.), a
70
Op. cit., p.3. Do mesmo modo, podemos pensar a cultura também como propriedade emergente (Rocha,
P.E.D. Seria a cultura natural? IV Congresso Aberto aos Estudantes de Biologia. Campinas: UNICAMP.
Resumos, p.237. 1999).
71
Op. cit., p. 15.
326
divinizando.72
- Depoimentos
professores e alunos dos quatro cursos. Na UFMG, dois professores colocaram que é uma
teoria que interpenetra desde a Física, Matemática até a Biologia e que corresponde a um
72
Op. cit., p. 104. Ele a compara com as descobertas da pólvora e da bomba atômica, frutos de uma filosofia
que percebe o mundo e sua crescente complexidade como “nada mais que” decorrência simples e direta de
unidades básicas e concretas da matéria.
327
algumas noções, mas mais como uma informação geral. Dentre os alunos, colocou-se que a
não entra na discussão, mesmo conferindo que a visão interdisciplinar aborda melhor a
complexidade da realidade:
complexo optando por vê-lo como dificultador, porque se mostra como de difícil
interpretação, afastando o diálogo. Para ele, uma “taxonomia da ciência” é complicada, pois
totalidade. Segundo eles, de modo geral, esta questão traz a impossibilidade do pensamento
instituto, mas percebe alterações, inclusive na sua área, a Educação. Dois alunos conferiram
tudo a ver” e 2) tem que ser introduzida como um instrumento e a importância de se estudá-
la.
Tem uma série de pesquisadores como Morin com a abordagem mais sistêmica,
da complexidade, Prigogine, que estão introduzindo temas, questões, que a
gente está começando. Por que a interdisciplinaridade ou o chamado
pensamento complexo, toda esta discussão, é um recurso muito recente. Sem
dúvida está sendo inserido na USP em vários cursos, não só no PROCAM. Se
em cada instituto, não sei, mas estou sabendo, sentindo. Na educação um
pouco... Mas não digo que tem um agregador geral. Tentaremos ser mais
abertos um pouquinho... Tem esta idéia de visão integrada, quem trabalha com
impacto ambiental. Tanta gente que tem esta característica, que permita estar
agregando alunos. Porque é um projeto que não é demandado; está sendo
concebido, então não é induzido, é concebido sem demanda; então é uma
construção. (USPProfA)
329
b. Abordagem Sistêmica
até certo ponto estão discutindo necessidades e vantagens dela, embora um dos autores
mais citados, apesar de criticado, é L. von Bertalanffy. Este biólogo dos anos 30 é defensor
teoria, prevendo uma unificação futura, sem formalismo preciso. A unidade, para ele, deve
uma meta, o que concorda com a perspectiva vitalista. Entretanto, seu enfoque organísmico
Assim como para Morin, a construção epistemológica é vista por G. Bateson a partir
73
Op. cit., p. 155. Aqui se confere a dúvida sobre se o chamado “novo paradigma” se refere à inter ou à
transdisciplinaridade como vislumbrado por Morin, dentre outros.
330
correlação radical entre forma e função: etapas de um mesmo processo, onde pensamento
genético que dispõe”, influindo no comportamento. Suas idéias são radicalmente anti-
lamarckismo, confere poder aos ajustes somáticos nas alterações genéticas, como para
como tecido, matriz das diferenças, o que permite perceber uma integração original.
sua “natureza ubíqua”, o que leva à intersecção entre Biologia e Filosofia, formando a
disciplina Biontologia que estuda o ser. Porém, ele confere que esta dubiedade não aponta
para uma teoria geral ontológica, mas para uma classe especial de sistemas concretos - os
próprias. Suas fronteiras não são fechadas, pois permitem trocas, mas são limitadas, uma
ou seja, são sistemas evoluentes, embora ‘evolução’ seja também um termo ubíquo, ao
74
Op. cit., p.120.
331
mesmo tempo científico e ontológico. Ou seja, para Brito da Cunha, nenhuma propriedade
básica isolada é apenas biológica, mas o conjunto e as relações entre propriedades é que
formam o organismo vivo. Portanto, seu processo histórico e sua organização são próprios:
redução, assim como do físico para o químico e do biológico para o sociológico. Esta
Depoimentos
Dentre os vinte e oito entrevistados, apenas oito responderam com sua impressão
parte da ciência normal e que alunos já trabalham nele, sendo que o outro confere esta
75
Op. cit., p.96.
332
No Rio de Janeiro, um professor colocou que a abordagem sistêmica não pode ser
única, mas tem potencial de esclarecer relações entre conjuntos interagentes, confirmando o
Visão, abordagem sistêmica não tenho preconceito. Só não existe por si só,
senão é reducionista, mas para esclarecer e começar a pensar mais é genial.
Sofro críticas por conta disso. Vamos complexificar o sistema porque nenhum é
isolado, nem simples, nem elementar; todo sistema é um conjunto de outros
sistemas, pelo menos dentro das nossas limitações de percepção e leitura do
mundo. Uma visão sistêmica ajuda bastante a pensar sobre isso, tentando
sistematizar a idéia do Sol como fornecedor básico de energia e complexificar a
idéia de quatro esferas mais a sociosfera, uma complexificação fundamental.
Permite pensar no significado da entropia e em termos mais particulares de um
subsistema na idéia de lixo que é lixo e que não é lixo. E a idéia de lixo
cultural, de entropia cultural. (UFRJProfC)
realidade, citando pensadores que procuram fundamentar tal debate, como Morin e
Prigogine, questões estas que estão apenas começando a se integrar ao modo de vida
c. Transdisciplinaridade
simplicidade, surge como uma distância cada vez maior entre o ser humano e a realidade,
então “uma totalidade”, como referido por Monteiro76, valorizando sempre o processo
construtivo e dialógico.
tendência à transdisciplinaridade, assim como uma intensa dinâmica inter institucional. Nos
anos 90, de acordo com a autora os cursos oferecidos no país já apresentam uma tendência
76
Op. cit., p.75.
77
Coutinho, M., op. cit.
334
coordenadas sob ponto de vista comum, sendo que apresenta múltiplos níveis e inúmeros
objetivos, possuindo uma coordenação que vise uma finalidade geral. J. Piaget79 distingue a
epistemológico transdisciplinar.80
- Depoimentos
geral, para um descrédito desta perspectiva por se mostrar muito além do cotidiano
acadêmico, embora alguns pesquisadores indiquem uma evolução da ‘inter’ à ‘trans’, e até
um reducionismo ao avesso.
Percebe-se que está em processo uma construção lenta de algo entre as fronteiras
78
E. Jantsch, op. cit., p.108-9.
79
Piaget, J. The epistemology of interdisciplinary relationships. In: OCDE, ibid., p.141-44.
80
Op. cit., p.167.
335
idéia, segundo ele, é perseguida no curso, mas no atual estado, ainda está para ser
conciliado.
que não há busca pela transdisciplinaridade, não crendo em uma meta ou mega disciplina.
Embora o curso dê noções, informação sobre o assunto e possa levar a uma nova
requerendo as etapas disciplinar e interdisciplinar, foi abandonada por não se revelar útil e
Dois dos alunos entrevistados colocaram que a trans só ocorre quando um determinado
tema é de interesse comum a várias disciplinas, comportando uma análise a partir da fusão
337
Desde a graduação trato destas questões... A vida inteira discuti inter, multi,
transdisciplinar e durante muito tempo fiquei com a inter e com a multi, achava
a trans muito ousada. Hoje pela internet a trans está ai. Penso mais numa
intertranscultural, no sentido de ser interdisciplinar, mas que possa ser um
conhecimento transcultural: um Norte dialogando com o Sul perceber realmente
esta condição de sub... Transdisciplinaridade na universidade existe, de uma
certa maneira. Todo ano temos professores de fora. Algo como transcender as
disciplinas. Não existe ainda é uma produção, no sentido de projetos que
tenham produção comum. Não se tem ainda o resultado. Os resultados das
Ciências Humanas demoram, mas até 2005 acontecerá este trabalho conjunto.
Não temos dinheiro, recursos, porque não ganhamos PRONEX. Quem não
entrou está sem condições... (UFRJProfA)
Método como meta a ser alcançada... A trans é uma ousadia necessária, para
que nunca estejamos satisfeitos com os resultados. No ensino e pesquisa
baseado na disciplinaridade, é totalmente inviável, assim como a inter também.
É pouco conhecida para ser proposta num curso. (UFRJAlunB)
tida também como importante e necessária, confluindo para uma nova ciência e “não
generalismos.
Mas seria a criação; uma fusão de conceitos da filosofia. É importante, mas não
sei se é discutida no curso. Multi, inter se ouve como bandeira, mas trans não.
Uma etapa que fatalmente vai passar, não tem jeito. No futuro não muito
distante, a tendência vai ser formar, talvez, novas disciplinas englobando um
número de coisas compatíveis. Somos treinados para analisar pedaços, juntar
pedaços e fazer um. Mas quando conseguir, tirar a essência, tenderia à trans.
Seria mais interessante. (USPProfD)
É mais complexo, fica difícil na graduação começar desta forma. É legal ter
noções, mas precisa de formação básica para não ficar muito solto. Não dá para
tirar o mérito da especialização. (USPAlunB)
338
2. Desenvolvimento sustentável
cursos. Deste modo, elaboramos esta décima primeira questão buscando perceber como é
que traria melhorias na escoação de produtos e desenvolvimento regional, mas, por outro
ambientais. O citado exemplo, dentre tantos, é colocado para captar qual seria a posição do
dominação política autoritária, da terra, da água, dos recursos naturais, completada por um
participação política. A experiência das últimas décadas nos tem ensinado que o
“nebulosa ambientalista” por se mostrar ainda imprecisa, ele concorda que sua análise
exige a ressignificação de conceitos tais como natureza e ser humano. Um novo significado
assim como nossa percepção de uma autonomia relativa perante o todo que nos compõe.
O chamado desenvolvimento sustentável tem sido rebatido por trazer ainda uma
noção desenvolvimentista e poder dar a idéia de sustentabilidade de lucros. Este termo tem
sido substituído pela idéia de formação de sociedades sustentáveis, que conduziriam a uma
naturais. Odum traz à discussão se a proteção ambiental se daria pelo resguardo de áreas
81
Moreira, R. J., op. cit., p.248, 1999.
82
Odum, op. cit., p.312.
340
I. Sachs, em seu artigo Sociedade, cultura e meio ambiente83, discorre sobre o termo
sugerindo um “desenvolvimento sem adjetivos”, visando evitar ter que dizer as vertentes,
Para ele, há três critérios essenciais do desenvolvimento, apontados desde sua inicial
quanto aos fluxos entrópicos de energia e materiais, o autor citado pesquisa sobre como a
economia poderá ter condições de encaixe nos ecossistemas e a valoração dos serviços
83
Sachs, Ignacy. In: Mundo & Vida: alternativas em estudos ambientais, n.1, jan.-dez. Niterói: UFF-PGCA,
p.7-14, 2000.
84
Ibid., pág. 8.
85
Alier, J.M. De la economia ecológica al ecologismo popular. Madrid: Nordan-Comunidad e Içaria, 1995.
86
Rogério Cézar de Cerqueira Leite (UNICAMP), Luiz Pinguelli Rosa (UFRJ) e Aziz Ab’Saber (USP), a
partir de artigo no caderno Mais! jornal Folha de São Paulo, dia 27 de outubro de 1997.
341
por exemplo). Tais questões permeiam cada vez mais a crescente polêmica entre
Parece também conter filosofias de vida que abrangem uma interpretação evolutiva do ser
humano frente a indagações históricas sobre sua natureza original, seu lugar no mundo e
seu futuro próximo e distante. Parece que há duas tendências básicas ao se tentar entender a
para se buscar minorar os riscos de incertezas futuras. O autor propõe que a Ecologia
tentativa de ‘internalização’ não ter sido convincente por não contabilizar os aspectos de
ações atuais sobre as gerações futuras, como o efeito estufa, a contaminação pela energia
nuclear, etc, consideração esta de difícil análise prévia.88 O autor ressalta a não
energia e materiais em direção única. Para ele, isto deve ser considerado na Economia
Ecológica, que deve ser limitada pela capacidade intrínseca dos ecossistemas de renovação
de recursos e outros efeitos irreversíveis dado pela superprodução de capital e que impede
contradição do capital e que iria promover uma “ética do bote de salva-vidas”89, como o
privada, dos fundamentos da questão da espoliação e da distribuição dos recursos etc. Para
89
Ibid., p.56. Veja em anexo artigo que trata de exclusão e darwinismo.
90
Ibid., p.61
91
Op. cit., p.241.
343
De acordo com o Informe Brundtland de 1987, podemos ver que o estudo da pobreza
como causa da degradação do meio ambiente está mais em voga do que o estudo da riqueza
como principal ameaça humana ao meio ambiente: a chamada ‘economia de rapina’.92 Por
outro lado, denota que também a racionalidade unicamente ecológica fracassa, pois para
comparar custos e benefícios, faz falta uma atribuição de valores que é dependente da
política.
Acreditamos ser, este momento atual, uma resposta liberal e natural ao Estado forte
ortodoxo. A busca desenfreada do lucro carece ser controlada pelas taxas de juros por um
Estado e uma população que procurem redimir as injustiças sociais e ecológicas históricas.
Cremos que a ganância por lucros deve ser estabelecida nos moldes dos ecossistemas, pois
se fosse respeitado uma margem segura e sustentável, somada ao incentivo máximo para a
reciclagem dos materiais dispersos e da energia, poderíamos atingir uma real combinação
92
Ibid., p.62. Grifos próprios. Segundo I. Wallerstein em Ecology and Capitalist Costs of Production: No
Exit, há dois aspectos elementares do capitalismo histórico: a necessidade imperativa de expansão em termos
de produção total (junto com a expansão geográfica para manter seu objetivo principal, o acúmulo infinito de
capital) e elemento essencial na acumulação de grandes capitalistas – não pagar suas contas. É isto o que ele
chama de “dirty secret” do capitalismo.
344
mundial.
- Depoimentos
Para a análise desta questão, devido ao seu aspecto multidimensional, que traz
campo de visão de nossa análise, apresentaremos um aspecto geral das respostas dadas, e,
tema.93 Novamente como em outra questão, pressupomos, que a presença de uma palavra-
chave revela algum grau da sensibilidade adquirida a partir dos processos vivenciados pelos
Como resultado prévio, podemos dizer, a partir de uma análise superficial da leitura
93
Assumimos, aqui, como no todo da tese, o risco de má interpretação dos relatos, já nos resguardando de um
possível deslize em nossas leituras e representações.
94
Do mesmo modo, como no item precedente e como veremos na leitura das transcrições das entrevistas, as
respostas podem esboçar um misto entre uma crítica pejorativa não utópica e uma crítica construtiva no
sentido otimista quanto à viabilidade de um desenvolvimento bio-sócio-economicamente equilibrado.
345
significar sua importância relativa a cada uma delas. Este tema em relação a
abrangendo as dimensões social, ambiental, etc. Por outro lado, também parecem apontar
para uma não necessária contradição entre desenvolvimento e sustentabilidade, embora haja
introdutórios. Os temas acabam por se imbricar, já que compõem este ‘super conceito’ do
de esperançosos na construção de uma ideologia, de uma prática através dos diversos atores
346
Para eles, em geral, a idéia e não o termo em si é importante, tem que dizer suas
implicações e tem que estar presente nos mais variados contextos da cotidianidade humana.
Como tema central dos cursos, a sustentabilidade acaba por abranger questões urgentes e
possível uma economia solidária, popular, que preservar pode significar renda e que as
questões locais não podem ser sobrepujadas pelas globais, contribuindo para a formação de
sociedades sustentáveis, nas quais as próximas gerações possam usufruir sabiamente dos
imediato, já que nossa própria mentalidade seria imediatista. Alguns percebem que as
dimensões ambiental, econômica e social muitas vezes não são compatíveis, sendo
mercado.
349
nas discussões de interesse geral, fazendo suscitar a questão política, ética e até mesmo
aos atores comunitários e locais o papel central, não apenas do ponto de vista teórico, mas
sustentabilidade planetária, para eles, pode dar origem a soluções para os atuais e urgentes
que a globalização é inerente a uma lógica que usufrui a insustentabilidade (de regiões
através da sustentabilidade, fator “atenuador” deste “mal estar”. Conferem-na assim como
uma luta política a ser engajada, não adquirida naturalmente, mas a partir de uma crescente
propostas para atenuar tal processo, visando construir uma sustentabilidade planetária.
É uma luta política que vai ter que ser carregada para frente, não vem
naturalmente, apesar de existir uma consciência crescente, principalmente nos
níveis de decisão ligados ao capital e trabalho, tem que ser mais enfatizado, não
dá para relaxar... Isso através da reprodução é fundamental, se consegue uma
situação à la Chico Mendes onde as duas coisas se casam, a reprodução
depende da sustentabilidade. Mas em termos capitalistas é praticamente
impossível. Destroem todo o espaço de produção e preservem o espaço de
reprodução. (UFMGProfD)
A globalização a partir de sua lógica inerente a um sistema capitalista. Os
indicadores nos mostram que é uma lógica que nos leva a insustentabilidade.
Dentro disto, temos proposta que visa atenuar, de uma certa forma, este
processo. Em termos de sistema, a busca de uma sustentabilidade planetária
está para ser construída. E na medida que vai sendo construída, é preciso
enfrentar a lógica perversa do sistema globalizado. A sustentabilidade é um
atenuador deste mal estar... Não adianta ter uma natureza sendo gerida
sustentavelmente e uma organização social cuja lógica é insustentável.
(UFPRProfA)
sustentável não apenas como uma idéia geral, mas também referentes ao seu contexto no
‘Brasil’, buscando fazer críticas a sua viabilidade num país como o nosso. Perante à
depoimento, deve servir ao homem, sendo este não reles admirador e mantenedor de um
alguns, temos um próspero caminho, embora ainda não sejam as tônicas políticas e sociais
A turma trabalhou com o conceito e não apenas com uma idéia de alinhamento
restrito a este conceito e às idéias de desenvolvimento sustentável no Brasil,
mas também para fazer uma reflexão critica da sua aplicabilidade,
funcionalidade, praticidade e legitimidade como algo que possa lastrear o
desenvolvimento num país como o Brasil. (UFPRProfB)
Quando se coloca o contexto político e econômico que o Brasil se insere nesta
globalização, de competitividade, do mercado exigindo produtos de alta
qualidade, aí torna estas relações muito mais complexas. E quando o Estado
tenta intervir muitas vezes é parcial, até porque tem instituições de pesquisa
agrícola que privilegiam a parte produtiva e tem grupos econômicos com
interesses, tem as relações sociais. Todas estas variáveis tornam a discussão da
sustentabilidade bastante complexa e mostram que a maioria das discussões até
agora é parcial. (UFPRAlunA)
Temos que pensar no homem e na natureza servindo ao homem e não como o
adorador da natureza. Não o Brasil intocável e deixar morrer de fome e também
não vender as florestas. Foi o nosso discurso em Estocolmo: o que interessa é
recurso, meio ambiente temos bastante. Não é também ‘salve a nossa
Amazônia, nosso Pantanal’. Mas colocar ao serviço do homem de várias
formas: o fazendeiro não pode desmatar, mas tem que cuidar da fauna, mesmo
caçando. (UFRJProfA)
O Brasil tem que evoluir na interdisciplinaridade, pesquisar, mas tem que
evoluir também no engajamento da sociedade civil na tomada de decisões,
senão as questões ambientais vão ser sempre periféricas. Muito provavelmente
353
nunca na ordem do dia. Nos grandes projetos se exige educação ambiental, mas
começa só no final, não há finalidade de programa assim! Tem que ser a
primeira coisa. Essas coisas são muito óbvias, por causa desse envolvimento,
mas tem um longo caminho. Tem muitos passos dados e ainda a dar; mas não
aparecem, não vêm na mídia. (UFRJProfB)
O grande problema do Brasil é não taxar grande fortunas, prender gente rica, ex
presidente etc. Isso é uma questão, no sentido extenso e não formal, que se deve
ter de educação. (UFRJProfC)
A globalização é mais um fator, é a mesma questão. A relação Norte-Sul, as
diferenças, se complexificam mais. O Brasil quer desenvolvimento sustentável,
mas a que preço? Sustentável para quem? Quando o discurso vem do Norte,
eles querem que a gente os sustente, um desenvolvimento sustentável para eles,
que nosso patrimônio esteja garantido para virem patentear. A questão de uma
democracia ‘mais planetária’, de ter o país informado, conhecendo seus
potenciais, genético, etc, não temos acesso. Fica mais difícil ainda quando se
coloca o contexto da lógica da exclusão, já mais para a Ciência Social.
(UFRJAlunB)
alguns, devido ao sistema econômico neo-liberal apoiado no consumo. A ideologia por trás
de consumo. Declarou-se também que o mercado não deveria ser manipulador, mas deve
haver uma regulação social cujo projeto de sustentabilidade possa manter a atividade
econômica. São necessários mais estudo e participação locais e regionais para depois
atingir o global (diferentes de respostas mais a frente que relativizam isto). O terceiro setor
passa, então, a deixar de ser mero coadjuvante através do fortalecimento de laços de união
questão do ‘consumo’:
Não ter o mercado como regulador, mas uma forma qualquer de regulação
social. Sustentabilidade como processo de regulação da atividade econômica,
354
esclarecer qual desenvolvimento optamos por implantar. Por outro lado, o discurso da
geração de emprego e de renda nos grandes projetos é combatido por não haver a
pode ser, segundo os depoimentos abaixo, vantajosa ou não, podendo funcionar ao inverso
do esperado. Por isto, eles revelam cautela com as idéias abrangentes, analisando e
olhar, compara, provoca auto conhecimento etc. Mas também enfraquece o país com o
enorme poder do capital externo, já que a competição não colabora para uma sociedade
global não traz soluções concretas. A regionalização, que valoriza a idéia de ‘sociedade
local tem direito ao desenvolvimento econômico, mas deve evitar a degradação inclusive da
cultura local. Um discurso apontou para a autonomia local perante os recursos, posição esta
que precisa ser refletida já que há sempre dependência externa. Seguem alguns comentários
a respeito de ‘globalização’:
Porém vejo problema conceitual muito complicado porque pode ser qualquer
coisa. Exatamente o que aconteceu com a Ecologia quando começou a ser
divulgada e o que acontece com a globalização. Um problema conceitual que
necessita de muito estudo, de práticas que demonstrem como pode ser
realmente empregado que não comprometam a renovação dos recursos naturais
das próximas gerações. Isto é extremamente complicado e pode servir tanto
para o bem quanto para o mal. Temos que examinar com cuidado conceitos
abrangentes e examinar a pré-consistência, em que base foram formulados,
quais as intenções, ou seja, é necessário uma análise do discurso para ver quem
e como é que está interessado em usar. Muita cautela e com muita necessidade
de discussão. Desenvolvimento sustentável é uma matéria de estudo
interdisciplinar genuinamente, não tenho a menor dúvida. (UFMGProfB)
É uma questão central, mas às vezes funciona de maneira perversa quando
usada como discurso de governo ou de organismos internacionais.
Sustentabilidade pra quê e para quem? Pensar global-local é insuficiente,
356
de uma economia local e voltada para sua auto gestão e sobrevivência. Mas a
ele puder realmente dar garantia à reprodução da sociedade e dos ecossistemas atuais,
permitindo o bem estar de gerações futuras, mas deve corresponder a uma prática real. Em
podem revelar a lógica econômica maquiada pela questão ecológica e social. Abaixo,
Fico com o termo Ecologia Social. Pode ser até uma sustentabilidade de outra
forma, um novo contrato social. Penso muito nisso, mas o que quero é uma
ecologia social com este desenvolvimento posto como valores e ideologias,
éticas sobretudo. (UFRJProfA)
A consciência, como já dito por outros, tem aumentado como luta política e por
ambiental é preciso expressar suas vontades, pois é uma questão política que clama por
problema, depende muito do papel governamental que pouco se preocupa e não contribui
‘educação ambiental’:
Vejo com muito cuidado, tem que estar numa outra lógica, dentro dos
princípios democráticos explícitos e com a sociedade aparelhada, ter acesso a
educação para poder optar, uma consciência mínima. (UFRJAlunB)
A esperança é que a gente continue funcionando mesmo com a degradação,
mas, justamente pelo princípio de precaução, em cada situação concreta tem
que fazer o possível. São reformas de sociedade que se tem que fazer para ter
um pouco mais de justiça, participação na decisão. Acredito numa sociedade
participativa e organizada, as forças acabam se organizando o melhor possível,
talvez não o ótimo. Mas nesse país, evidentemente, entramos num círculo
vicioso, porque para conseguir este nível, precisa de educação e isto depende
muito ainda do papel do governo que não está preocupado. Parece parte de
grande plano maquiavélico, como o ensino de segundo grau foi mudando para
jogar fora tudo que faz a pessoa realmente ser um cidadão: o latim, a filosofia, o
raciocínio matemático, a física. ‘Não temos que ter raciocínio crítico e ser capaz
de desenvolver, os americanos fazem tudo’. É isto que está acontecendo. De
novo aquele jargão: o problema, antes de mais nada, é educação. (UFPRAlunC)
2.1 Exemplo
Tal projeto no Pantanal é visto, em geral, como absurdo, assim como demais mega
projetos, decididos pelo poder político e financeiro e com discussão popular, quando há,
políticas públicas. Neste ponto, também os próprios ambientalistas são criticados. Mas
educação e a educação ambiental são citadas como salvação, do mesmo modo que a
participação cidadã. Por outro lado, citam que a decisão popular é independente de uma
falando do projeto da hidrovia, sempre defendi, mas hoje não sei qual é o
impacto. Prefiro calar sobre este assunto. Quero um relatório sério do impacto
total. Não posso te responder seriamente como pesquisadora. Teria que fazer
um trabalho muito sério. (UFRJProfA)
Esses grandes projetos: hidrovia, transposição de rio, etc. não são transparentes;
não são decididos pelo poder público, fingem que tem uma instância de
discussão, mas é marginal. Não é para ser decidido em 5, 10 anos, mas em 15,
20. A população tem que estar preparada para discutir e para responder. E tem
situações em que esses projetos não são recomendáveis. Por exemplo, o
Pantanal é um sistema extremamente frágil. Não há interdisciplinaridade em
todas as escalas do governo, mas conflitos de políticas públicas é uma coisa
séria. Na mesma área pode haver implantação de unidade de conservação e do
outro lado o INCRA estimulando o desmatamento. Esses grandes projetos são
projetos da sociedade, não de governo, nem de segmentos. Se a sociedade de
forma transparente, participativa, decide abrir mão do Pantanal para ter a
Hidrovia, é uma decisão. Hoje ela não participa. Nos grandes projetos se exige
educação ambiental, mas começa só no final, não há finalidade de programa
assim! Tem que ser a primeira coisa. Essas coisas são muito óbvias, por causa
desse envolvimento, mas tem um longo caminho. Tem muitos passos dados e
ainda a dar; mas não aparecem, não vêm na mídia. (UFRJProfB)
Melhoria da escoação da produção agrícola significa o que? Capital? Como é
que a gente passaria para empregos? O blefe do emprego é um negócio que
reina na boca de político. Os próprios ambientalistas também têm tido visão
fechada. Ex.: populações comendo peixe com mercúrio, absurdo é a
contaminação. Peixe traria mais emprego que a soja, melhoria da situação
econômica. Vamos ter que pesar isso, ver o que é que significa. (UFRJProfC)
Extremamente complicado. Não sei responder precisamente, é muito complexo
e é o tipo de assunto que tem que sentar uns 10, abrir mão de seus orgulhos e
conversar. E ter um representante da comunidade para opinar também.
(USPProfD)
Como conclusão final desta questão sobre sustentabilidade, podemos perceber que os
temas mais debatidos e criticados são o modo de produção econômica clássica (de certo
modo, como reação, provocadora do discurso), incentivados por quem desenvolve políticas
que visam o acúmulo de capital. A geração de riqueza e o estímulo ao consumo são bases
95
Op. cit., p.12.
362
um planeta vivo, existindo como sujeito ativo e não apenas como objeto manipulável.
também suscita debates, já que alguns vêem a natureza como serva do homem visando
aplacar a fome de tamanho contingente populacional. Mas por outro lado, também
defendem a proteção dos recursos, do meio ambiente, num meio termo complexo e
que do engajamento da sociedade civil na tomada de decisões para coibir mega problemas
como a distribuição de renda, por exemplo. Conclui-se, muitas vezes, ser a solução uma
questão de educação num sentido lato (mídia, governo etc) e não meramente formal. O
desenvolvimento sustentável no país deve ser cauteloso pelo contexto mundial, pois pode
vir a ser discurso ideológico de países industrializados para que o patrimônio nacional
exclusão, apesar do lado positivo da regionalização local que se abre para o mundo,
provocando inovações culturais. Mas, na verdade, existem muitas dúvidas, porque o tema
363
do desenvolvimento sustentável ainda parece ser uma incógnita até mesmo para quem
Conclusões preliminares
embora pareça confirmar novas tendências. Entretanto, não seria bastante típico ou até
mesmo da essência (natureza) humana e até mesmo biológica a busca constante de ‘novos’
caminhos, descobertas, enfim, padrões, modelos? Podemos supor que a busca por
de nossa condição natural quanto social, tanto visando ao desvelamento do real quanto
complexidade.
interdisciplinar) parecem convergir para uma maior sensibilização dos processos sociais ao
exigir o protagonismo das pessoas. Um novo paradigma parece procurar desenvolver uma
visão mais integral e integrada do ser humano, composta por suas relações com as várias
dimensões que constituem sua natureza: a relação consigo mesmo, com as demais pessoas,
com a natureza e até mesmo com o mundo transcendente. Isto faria com que a primitiva
união inconsciente com o mundo se faça mais presente do que a alienação reinante das
ultimas décadas. Portanto, há uma crise que assinala os limites do projeto moderno: a dos
marcam esta nossa era, já definida como a era das incertezas por se fundar na crise da
96
Veja o livro O paradigma educacional emergente de M. C. Moraes (Campinas: Papirus, 1997).
365
como simples resultante da soma dos objetos da percepção representada por leis.
Parece ocorrer, nesta passagem de milênio, uma biologização das ciências, tanto ao
nível filosófico, quanto sócio-cultural e até mesmo moral.97 A era pós-darwinista e pós-
hitlerista nos parece que leva a humanidade a uma condição única no planeta: a da
sobrevivência (the turning point). Por um lado, temos uma verdadeira ‘corrida de ratos’ –
no sentido de abandonar o navio – daqueles adeptos ao darwinismo social que não vêem
maiores parcelas possíveis de riqueza, seja bélica, política, econômica.98 De outro (para
colocarmos apenas dois pontos de vista numa série de possibilidades), temos aqueles que
dependência orgânica da vida terrestre e, por conseguinte, humana do ambiente que nos
completude.
suficientemente, reavaliar nossos atos, utilizando o formidável intelecto humano para uma
97
Sobre o livro Império de M. Hardt e A. Negri (Record, 2001), Peter P. Peelbart escreve: “Quando o poder
se torna inteiramente biopolítico, o conjunto do corpo social é abraçado pela máquina do poder, integrando
suas múltiplas dimensões e atingindo o próprio bios social... o único ponto de partida possível é o espaço
biopolítico (e não público) da multidão, considerado do ponto de vista do desejo, da produção, do coletivo
humano em ação.” (O império contra-ataca. Rio de Janeiro: Jornal do Brasil, caderno Idéias, 4 ago., p.1,
2001)
98
Eles parecem obedecer a uma lógica do descarte, do aborto, na qual o motor social é produzir mais, para
consumir muito, para jogar no lixo o imprestável, sejam matérias ou vidas, em troca do acúmulo de lucro.
366
missão mais nobre do que pensar apenas em si mesmo, confirma uma real distância com os
natureza e sobre o próprio ser humano. As relações humanas, não apenas, são sujeitas às
que estão em busca de auto-explicação. Esperamos que relações mais altruístas, a partir de
rumo de investida contra o meio natural e que possa ser base para uma real mudança de
Neste sentido, nos adentramos nos estudos críticos dos princípios, hipóteses e
como uma teoria da ciência ou do conhecimento. No momento de crise científica pela qual
passamos, não apenas fruto desta “renaturalização” do ser humano, mas também pela queda
inúmeros fatores que possibilitam a vida como a conhecemos, do que chamamos ‘natureza’
- uma ‘totalidade mágica’ que nos envolve e testa o discernimento de nossa própria
99
Ética: do grego ethos, significou hábito, mas também morada no sentido da ambiência própria ao homem.
Agora a ética é eclipsada pela eficácia.
367
controle.
aparentemente respostas a inúmeras perguntas que surgem com a crise de identidade por
nosso ver, os termos refletem, ao mesmo tempo, o fator utópico de esperança na alteração
do modo desenfreado e nocivo de privatização das riquezas mundiais. Para nós, o debate
embora imprevisível, entre uma perspectiva objetiva e subjetiva de todo fazer humano e
principalmente científico. Parece-nos que ambos paradigmas são insuficientes para uma
A discussão cada vez mais presente em torno da sustentabilidade concorre para um sentido
ambíguo que configura a presença humana em sua existência biológica e social no planeta:
satisfeito, sempre carente por novidades. A distinção entre um ser social e um ser geral
CAPÍTULO V
CONCLUSÕES FINAIS
éticas. Esperamos, portanto que esta tese contribua para um melhor discernimento destes
369
possíveis paradoxos e desejamos que ela possa abrir novos caminhos aos cursos
pesquisados e aos demais que têm surgido visando a contribuir para esta importante e
A longa e infindável história da educação nos reporta não apenas aos inúmeros
problemas que surgem desta plena atividade social, como também coloca a extrema
nacional atual da educação demonstra que o país, apesar das mazelas do serviço público e a
crescente pressão das universidades particulares, tem dado seriedade crescente a esta linha
departamental universitária. Por outro lado, nos parece que a relevância do trabalho
disciplinar, uma vez que se constitui necessidade fundamental para as novas tendências de
comparando com os demais países latino-americanos e ainda mais os europeus, nas últimas
décadas demos um salto qualitativo-quantitativo formidável, o que nos faz supor que há um
1
No sentido de vivenciar, mais do que experimentar.
370
em princípio na, da e para toda a sociedade. Sua estrutura e seus objetivos multifacetados
revelam crises de identidade, mas sempre fruto de uma dada cultura em processo e semente
revelam uma ainda maior distância, embora o quadro atual aponte para uma tímida
Nos cursos pesquisados, a criação de um pólo inovador (no caso da USP e da UFPR),
mesmo não científico, perfaz um compromisso e uma responsabilidade sem igual no meio
acadêmico, uma vez que encara a dura tarefa de reunir tendências distantes ou mesmo
produção acadêmica. Este novo locus universitário, quer seja multi, inter ou
2
Embora inúmeros exemplos reforcem uma ou outra das primeiras tendências e quase nunca a terceira
possibilidade. Mas, por outro lado, como sermos eficientes nessas três grandes vertentes que exprimem forças
quase sempre antagônicas (disputa por recursos, por exemplo)?
371
mundo.
dominância etc. Assim, percebemos que há uma certa cautela na “fetichização da medida”,
parcelizador” desta totalidade. Isto é, segundo J. A. Paula, uma dialética parte-todo a partir
3
Ver Paula, J. A. de. (coord.) Biodiversidade, população e economia: uma região de Mata Atlântica. BH:
UFMG; PADCT/CIAMB, 1997.
372
revelar o rio em seu momento natural (teórica), atual e possível (futuro). A metodologia
para se adequar aos diversos contextos uma vez que pretende alguma universalidade. Ela
integra as matrizes referidas junto à síntese evolutiva das três fases do rio e, embora não
resulte num índice geral de qualidade ambiental, aponta para a possibilidade de sua
construção.
sustentável rural (na região portuária do estado, Paranaguá), urbano (no caso da própria
cidade de Curitiba) e, por último, resolveu-se não um recorte espacial, mas temático,
373
socializar o conhecimento para consolidar uma cidadania plena. Sem dúvida alguma,
dificuldade no trato da questão ambiental, uma vez que nem sempre ela está inserida
acadêmica no país.
uma ausência de linhas específicas em relação às grandes áreas, embora seus organizadores
374
tenham vieses próprios. Há, embora tenhamos detectado uma aparente menor participação
das unidades das biociências, um grande esforço em não permanecer limitado a um ou mais
demonstra também a abrangência cada vez maior destas questões pelo mundo e no país.
Muitos são os campos abrangidos pelas Ciências Ambientais, já que as pesquisas surgem de
áreas como saúde, higiene e saneamento; impacto, antropização e manejo ambientais; além
militância apesar do baixo número de declarações, pode estar revelando uma tensão teoria-
prática, já que as pesquisas têm grande proximidade nas atividades sociais e ambientais,
ONGs, por outro lado, parecem ser uma forte tônica dentre os entrevistados, trabalhando
não apenas com a biodiversidade, mas também com a sócio diversidade. Há pesquisas em
enquanto relativamente poucas, embora tais campos surjam como imprescindíveis para o
4
Podemos ver isto como uma falta de interação entre o fazer político extra-acadêmico e o intra, além da
distância entre o fazer técnico e o fazer cidadão? Ou ainda, entre o fazer ‘econômico’ e o cultural, social e
ético? Ou então, o que nos parece acertado, seria resultado da dificuldade em sustentar a carreira de educador,
pensador e militante, assim como ocorre entre artistas?
375
sustentabilidade.
processo lento e aberto, já que recebe inúmeras influências tanto internas quanto externas,
variando pelo tipo de integrantes e número de disciplinas participantes. Por isto mesmo,
seus membros devem se esforçar por contribuir para a conexão de idéias, reunindo uma rica
social global. Mesmo havendo uma forte organização alternativa, o “time” deve manter-se
alerta para evitar hostilidade e individualismo. Por outro lado, desacordos na carreira
individual, nos estilos profissionais e nas epistemologias acabam por ser empecilhos
comuns, quebrando as ilusões de consenso. Outro fator é a variação com o tempo e com o
grau de participação efetiva dos integrantes, sendo a equipe dominada por pessoa ou
com freqüência.6 Uma clara divisão de trabalho interno e balanço entre as influências
5
Klein. J. T., op. cit., p. 127. A autora se refere a quatro tipos de modelos de organização social e intelectual:
grupo comum de aprendizado, integração através de modelo, negociação entre especialistas e integração por
um líder.
6
Do mesmo modo, ocorrem gestos de solidariedade, respeito, atenção etc
376
das ciências. Ou seja, como a Ecologia é a ciência das relações recíprocas de organismos
manutenção da biosfera apta para nosso sustento. Deste modo, a questão ambiental no meio
que reflete este ponto de indagação e construção em que nos encontramos. A educação
voltada para o meio ambiente natural e social vem se expandindo por todo o planeta,
dos males sociais, mas precisa ser levada a sério por todos os atores sociais na
assistência material, humana e social, também por parte de atores e diretores sociais7,
7
Atores inicialmente seriam aqueles ‘governados’ por diretores, mas cremos que tanto um quanto o outro se
377
competição. Isto faz depender muito do perfil de cada participante para que não haja perda
do eixo conceitual conjunto. O fator emocional foi mencionado em duas vertentes: sendo
estrutura universitária foi apontada como grande problemática por promover atritos entre
formal de pessoal etc, fruto de culturas institucionais diferentes, somente resumida após
vez que esta permanece com sua estrutura fragmentada em unidades administrativas, de
fundem na relação dominador-dominado, fazendo com que aqueles também dirijam e estes sucumbam a
outrem.
8
Segundo Klein, projetos independentes não afiliados com uma instituição ou departamento constitui a forma
inicial mais comum de colaboração interdisciplinar antes da institucionalização especializada na universidade.
Este tipo de cooperação que emerge espontaneamente permite um ambiente de maior liberdade.
378
de acordo com Klein, há grande número de adversidades como competição por captação de
outro lado, as vantagens são muitas: facilita a troca de metodologias, instrumentos, técnicas
é visto como não sendo um paradoxo, já que ambas conjecturas se mostram possíveis. Por
um lado, pesquisas departamentais tendem a seguir sua própria linha disciplinar mesmo que
esteja apta e aberta para o trabalho de colaboração científica. Por outro, muitas estruturas
podemos perceber que, mesmo havendo conflito permanente entre empiricistas e teóricos,
vertentes poderão se entrosar se houver uma real vontade e muito estímulo para tal.
9
Ibid., p.61. Do mesmo modo, a autora lembra que coordenadores que ‘amarram’ demais as funções dos
participantes não permitem a necessária criatividade que emerge de uma estrutura mais flexível de
funcionamento, o que proporciona uma atmosfera ideal de relacionamento e de troca informal de idéias.
379
Interdisciplinaridade se mostra, desde sua origem nos anos movediços da década de 70, um
termo ambíguo por relacionar, para alguns autores, não apenas a justaposição entre
disciplinas (mais uma multidisciplinaridade), mas também uma idéia geral de unificação
Diversos autores descreveram suas perspectivas, mas parece não haver consenso na
definição do termo. Talvez ele não seja ainda definível já que é um processo em
construção, variando bastante em cada situação particular em seu leque mono, pluri/multi,
ciências como o caso das Ciências Ambientais, da Terra e da Saúde. Porém existem
alunos. A principal nos parece ser um campo de diálogo democrático propício para a
da área de origem e conseqüente superficialidade. Por outro lado, muitos conferem a real
possibilidade em se lidar com o próprio campo de estudos, expandindo sua perspectiva para
e econômicas. Mas pelo caminhar do conjunto geo-bio-psico-social, nos parece que se faz
necessário uma quebra de paradigma, natural ou induzida, que provoque uma reação para a
gerais da história do saber humano. Por isto mesmo, demonstra a ambigüidade de nossa
colocada não apenas pela queda do atomismo quântico, mas também e talvez
e agir em acordo com esta inevitável simbiose que se equivale às trocas das relações
humanas, talvez possamos crer que se trata de um novo paradigma. De qualquer modo,
10
Utilizo o termo de K. Lorenz (em Popper, K. & Lorenz, K. El porvenir esta abierto. Barcelona: Tusquets
ed., coleção Metatemas 28, p.18, 1992) no sentido sócio-biológico dado pelo autor de “aparição de uma coisa
totalmente nova... condição sine qua non que determina o ritmo da evolução”.
11
Uma boa sugestão para pesquisas futuras.
381
pensamos advir (talvez fruto de um componente mitológico enraizante) nos traz a questão
do devir.
filosófico, mas também no histórico e social. Não podemos perder de vista que nenhuma
discussão é dada por si só, mas é resultado de conflitos e contradições em muitos níveis
possíveis. Por exemplo, a clivagem profunda, mas real do modo de vida de aborígines
Se cada lado perceber como boa (ou má) a mudança de paradigma, não podemos acreditar
numa real transformação, uma vez que a sustentabilidade exige uma ‘eco-nomos-logização’
funcionamento global (tanto geofísico quanto bio-social) não será remédio contra os males
natureza, cada vez mais provável que o grande elemento esclarecedor de nossa condição de
criador ou criatura na face terrestre somente aflore com a radicalidade de uma situação eco-
catastrófica.
Pelo indicado nas entrevistas, a vida passa a ganhar valor, sentimental e/ou
financeiro, perdendo seu caráter exclusivo de matéria prima, contrariando as tendências que
entrevistado, deixa de ser mero coadjuvante passando a integrar de algum modo a natureza
humana, ganhando poder jurídico e econômico perante a sociedade. Esta, por sua vez,
capital, mas também é referida como perigosa por esconder interesses e por ter sido
absorvida pelos ‘donos’ da economia internacional, pela mídia e pela população em geral,
perdendo seu viés revolucionário. A complexidade também é vista de modo vago, embora
tenha uma preferência pelo tratamento, da maioria, mesmo que ainda não clara sua
plano, mas parecem apontar para caminhos omissos pela ciência tradicional e que trazem
tempo em que o tema encerra questões fundamentais para a sobrevivência humana, ele é
acertada.12 Pelo conferido nos relatos dos entrevistados, a origem, a inovação e/ou a
para uma concepção sistêmico-complexa destes termos, demonstrada pelo relato dos
pesquisadores entrevistados, confere uma real e também ideal mudança paradigmática. Por
12
Mesmo que possamos levantar dúvidas quanto à preferência, por exemplo, de geógrafos (dentre outros),
uma vez que sua área já de antemão reúne elementos de diversas outras disciplinas.
383
outro lado, o debate em torno de paradigma é fragilizado, já que não há uma total
Cremos que os cursos pesquisados são ótimas amostras da recente inovação no ambiente
parceria não apenas interna a uma área ou campus, mas, do mesmo modo, com a
resultado completo de articulação profissional entre teoria e prática, quando há retorno para
sintético, embora num difícil terreno analítico. Daí a necessidade em se adequar ambas
perspectivas. As novas idéias sobre vida, natureza e natureza humana parecem adequar-se
ambiental. As diferenças entre os cursos são claras: dois resultaram numa nova estrutura
13
Pelo menos duas publicações de grande porte foram lançados: os cadernos semestrais do NEPAN,
UNICAMP – SP Ambiente & Sociedade desde 1997 e os cadernos anuais da UFPR/GRID Desenvolvimento e
Meio Ambiente desde 1994, ambos com cerca de 200 páginas.
384
vez que corpo docente e discente, disciplinas oferecidas e pesquisas formam um amplo
caso do MAD - UFPR, houve um processo tecido a partir de eixos temáticos para
pesquisas é amplo. Quanto aos outros dois, o EICOS - UFRJ desenvolve ao nosso ver,
almejar novo vôos, como disciplinas, cursos em parceria e até mesmo um centro
interdisciplinar.
colaborar na promoção de novas experiências pelo país, como parece estar acontecendo.14
14
Exemplos como a Pós-graduação strictu sensu em Meio Ambiente e Desenvolvimento da UFPA, da UFAL,
da UnB e da UFSE e em Ciências Ambientais da UFF e da Universidade Estadual de Maringá – PR.
385
inovação, cujo sentido parece seguir, em alguns casos, além da mera execução acadêmica.
Esperamos poder contribuir, com esta pesquisa, para o incremento do debate em torno da
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C. Questionário
7. Ao seu ver, como uma ciência com tendência positivista, objetiva e quantitativa
(natural, exata) tem absorvido questões subjetivas e qualitativas como as éticas,
filosóficas (Ciências Humanas e Sociais)? Há uma dicotomia? Tais discussões têm
ocorrido durante o curso? Como?
8. Se for possível, indique quais as noções de vida, natureza e de natureza humana que
inspiram o ensino e a pesquisa neste programa? Ao seu ver, estas noções são relevantes
para este curso? Como?
9. A origem, inovação e/ou modificação curricular deste curso universitário reflete(m), de
algum modo, mudanças paradigmáticas de uma tradicional concepção mecânico-
reducionista de natureza e de vida para uma concepção sistêmico-complexa dos
mesmos? Como estas questões são tratadas neste curso?
10. A questão ambiental promove o surgimento de noções tais como complexidade,
abordagem sistêmica e transdisciplinaridade? Como o(a) Sr(a). definiria cada um deste
termos? Estas noções são relevantes para este curso?
11. O estudo da sustentabilidade em geral é objetivada nestes cursos. Como o(a) Sr(a). vê
esta busca de se diminuir a degradação ambiental e melhorar condições de vida no
planeta? Ou seja, há uma dicotomia desenvolvimento X conservação? Por exemplo: no
caso da hidrovia no Pantanal mato-grossense que, por um lado, traria melhorias na
escoação da produção agrícola e desenvolvimento para a região e, por outro, poderia
afetar todo o regime hídrico do ecossistema e trazer inúmeras conseqüências ambientais
para fauna e flora. Qual seria sua posição?
12. Buscando um retorno para este trabalho de tese, qual a sua percepção sobre a
realização desta pesquisa?
E as sugestões:
Avaliar exigirá capacidade enorme para entender. Boa sorte aos avaliadores, um negócio
complicado. Mas precisa ser feito, botar no papel o que se sabe, o que se quer, como vai permitir
avanço do pensamento. Capítulo fundamental: perspectivas, como usar as idéias para avançar? Será
que através da interdisciplinaridade vamos melhorar a visão do ambiente? (A)
Palpite de conclusões: muito poucas pesquisas, ainda incipientes e multidisciplinar. Há desejo, mas
não sabem direito o que é. Algo em construção. (B)
Cada processo é singular, não tem regras, receita. Vai depender das circunstâncias institucionais, das
pessoas, da subjetividade. A participação, o grau de integração, idiossincrasia das pessoas, maior ou
menor grau de compromisso, empenho, egoísmo, individualismo variam. Depende da pessoa
responsável em particular com capacidade de ouvir. É uma questão básica, não adianta ter bom
projeto, pessoas competentes, mas também circunstâncias que não se escolhe, não se controla: boa
vontade, abertura, pessoa exata. Todo processo de interação interdisciplinar é subjetivo e é isto é
decisivo. (C)
Acontece com freqüência, práticas criativas não conseguem discursar a respeito da própria prática e
usam de forma inadequada, jargões e conceitos. Não têm discurso que costure, problema de
linguagem, são opostas. Tem que encontrar um mediador, alguém que seja como a gente; existe um
ponto em comum que contribui enormemente para essa compreensão. Analisar as experiências e
construção do discurso, desde especificação de termos até mesmo a construção de uma linguagem que
costure. (D)
Os alunos desta instituição colocaram os seguintes elogios:
Fundamental, vai costurar a colcha. Tem que ter gente assim dentro da universidade, conversar
com todo mundo. E tem que convencer as pessoas a fazerem alguma coisa, inclusive para poder pegar
o resultado, para poder extrapolar para outras coisas, senão vai fazer coisa muito específica, impossível
extrapolar. O cara que costura é o ‘pedreiro’, que vai colocando um tijolo em cima do outro,
arrumando. Alguém que costure uma quantidade de informações enorme. (A)
Bastante interessante avaliar um tipo de situação, experiência nova. Importante que, já no início de
um processo, fazer avaliação prévia, inicial, inclusive para outras pessoas, a posterior, reavaliarem em
função de processo mais amplo. Uma tese vendo esse processo é importante. Avaliar é imprescindível,
principalmente para as agências que financiam, para rever o programa. (B)
É extremamente interessante este trabalho. Como elas se aproximam? Tratar da estrutura inter de
cada uma, entre elas, como elas se conversam, como se chegou a esta tentativa em vários centros,
como está pesquisando, em que se assemelham, potencialidades de conversas, há um padrão comum?
É de uma certa forma o check up do estado da arte. E propor uma síntese. (D)
Críticas:
A parte do diálogo é a mais difícil. Mas não pode ter só quem costure, tem que ter o ‘soldado’.
Colocar o tijolo no muro do tamanho exato que precisava para poder responder aquela questão do
problema maior. Quando se faz uma coisa interdisciplinar é um mar de confusões. Parece que não vai
chegar a lugar nenhum. (A)
Temos que trabalhar em conjunto, com a globalização, computadores em rede, todo mundo quer ficar
ligado, mas continuam no seu espaço, sala, computador. É importante que comecem a ver isso com
outros olhos, uma visão sintetizadora. Ou as pessoas vão e voltam e continuam pensando igual,
momentos de euforia e de depressão? De individualismo e de comunidade. Depende, a questão é
pressão. Se pressão funciona, alguma coisa escrita funciona melhor ainda. E o local onde foi feito, os
objetivos, alguma coisa realmente mudou? As próprias agências devem cobrar. Anos depois, qual é o
reflexo disso hoje? Existiu uma mudança de postura? Ou continuou igual, só foi uma avaliação local,
uma melhoria temporária. (B)
Há várias tentativas e tipos de análise em cada uma delas. São ainda tentativas. Chega a um
resultado, mas não é uma organicidade. (D)
Sugestões:
As pessoas devem ter visões totalmente distintas, umas totalmente deslumbradas, outras que
vão metralhar o processo, se pode criar novas perspectivas e até novos e bons direcionamentos onde já
elimina problemas prévios. Avaliar criticamente, com método científico é importantíssimo, uma coisa
409
que possa ser replicável. Como é que posso replicar sua percepção, o que você transforma em
informação quantificada, agora passa para as pessoas. A idéia funciona realmente? Quem está pagando
são nossos impostos? É interessante para a comunidade como um todo? A população vai viver melhor?
Se não, continua individual. É muito mais prático. Se tem problemas macros, precisa de muito para
resolver. (B)
Sugestões:
Carecia de metodologias que me permitissem entender esse todo. Busquei esse curso porque
senti a necessidade de entender essas relações com rigor científico. (A)
atual, provavelmente em cima de questões temáticas ou conceituais que exigem uma abordagem
integrada. (C)
Conceito 5 3 4 4
Instituto, Instituto de Ciências Pró-Reitoria de Departamento de Coordenado pela
Departa- Biológicas Pesquisa e Pós- Psicologia Social Comissão de Pós-
mento ou (departamentos de Graduação Graduação
Centro Biologia Geral,
Botânica e Zoologia)
Área de Ecologia, Conservação Meio Ambiente e Psicossociologia de Ciências Humanas,
Concen- e Manejo da Vida Desenvolvimento Comunidade e da Vida, da Terra,
tração Silvestre Ecologia Social Exatas e Aplicadas.
Linhas de Agroecologia, Meio Ambiente e Eixos: Conservação da
pesquisa Avaliação de impactos Desenvolvimento Desenvolvimento Natureza; Biologia
em ecossistemas Rural; Meio Ambiente Cultural, da Conservação;
aquáticos, e Desenvolvimento Comunidades e Manejo de Fauna e
Biodiversidade e Urbano e Teoria e Ecologia Social; Áreas Silvestres;
conservação de Metodologia do Meio Estudos de Gênero, Proteção da
ecossistemas, Biologia Ambiente e Meio Ambiente e Biodiversidade;
da conservação e Desenvolvimento Desenvolvimento; Avaliação de
manejo da fauna, etc. Epistemologia e Ética Impactos
em Estudos de Ambientais;
Comunidades e de Biodiversidade e
Desenvolvimento renovação das
terras; Agricultura
Biodinâmica e
Orgânica; etc
MD/ID/TD (PADCT) ID MD ID
Cátedra N S S N
UNESCO
Corpo Permanentes: 18 40 alunos, 12 11 professores 37 professores
docente Participantes: 2 professores doutores permanentes, 1 credenciados
Orientadores externos: visitante e 4
4 colaboradores
Produção 41 dissertações desde 7 teses defendidas 4 dissertações 38 dissertações de
Científica 91 1994 a 1998
Estrutura Interdepartamental Administração superior, Departamental Curso
acadêmica comissões de docentes interunidades,
de 18 diferentes institutos,
departamentos e de faculdades, escolas.
instituições francesas,
além do NIMAD.
Disciplinas optativas
A Fauna e a Flora na Legislação Brasileira Florística e Fitosociologia
Administração de Parques Genética de Populações
Agroecologia Geomorf. Aplic a Áreas de Preservação
Análise de Dados em Ecologia Interações Microorganismos/Planta
Bases Morfofunc. da Reprod. de Vertebr. Interações Inseto-Planta
Biologia Floral Limnologia Geral
Climatologia da Camada Limite Manejo e Conservação de Fauna
Comportamento de Insetos Manejo e Conserv. de Peixes de Água Doce
Comportamento e Manejo de Fauna Manejo e Conservação de Recursos Hídricos
Ecofisiologia de Algas de Água Doce Mét. e Téc. Cart. Aplic. a Áreas Preservação
Ecologia de Processos Métodos em Limnologia
Ecologia de Vetores de Doenças Tropicais Morfologia Comparada de Cordados
Ecologia do Cerrado População e Meio Ambiente
Ecologia e Manejo de Vida Silvestre II Princípios de Bioestatística
Ecologia Quantitativa Recuperação de Áreas Degradadas
Estratégias Adaptativas em Vegetais Reprodução de Peixes Neotropicais
Uso e Conservação dos Solos Tópicos em ECMVS
67
414
Dissertações
Ecologia Aquática
- Ciclo reprodutivo e fator de condição de Triportheus guentheri, (Osteichthyes,
Characidae) na represa de Três Marias e descrição de novo método de determinação do
tamanho de primeira maturação sexual.
- Dinâmica populacional de Melanoides tuberculata (Prosobranchia: Thiaridae) no
reservatório da Pampulha, Belo Horizonte, MG, Brasil.
- Análise de características reprodutivas de peixes brasileiros de água doce, com ênfase no
local de desova.
- Estrutura de comunidade e aspectos da alimentação e reprodução dos peixes em dois lagos
do médio rio Doce, MG.
- Taxas de crescimento de Salvinia molesta Mitchell e sua entomofauna associada em um
lago de planalto de Lagoa Santa, MG.
- Avaliação dos impactos do plantio de Eucalyptus spp., sobre dois lagos naturais do
sistema do Médio Rio Doce-MG: Propostas de mitigação e manejo.
- Alterações na comunidade fitoplanctônica de dois lagos naturais do médio rio Doce,
induzidas pela monocultura de Eucalyptus spp.
- Influência da manipulação artificial da época de enchimento na produtividade
ictiofaunística em um reservatório de médio porte - UHE-Cajuru, rio Pará (MG): uma
proposta de manejo.
- Produção e consumo de carbono orgânico na comunidade planctônica da represa da
Pampulha - Belo Horizonte - MG.
- Estrutura da comunidade de peixes e de seus habitats na região litorânea de dois lagos no
médio rio Doce, MG.
- Interação tróficas na comunidade planctônica da Lagoa Olhos D'Água, Lagoa Santa-MG.
- Determinação da produção de Eichhornia crassipes (Mart.) Solms. na represa da
Pampulha BH/MG, através dos métodos tradicional e demográfico.
Ecologia e Comportamento de Insetos
- A importância Waltheria indica L. (Sterculiaceae) para as comunidades de abelhas e
vespas (HYMENOPTERA-ACULEATA).
- Ecologia de populações de uma abelha solitária especialista Diadasina distincta
(Holmberg, 1903): variação na razão sexual e no uso de pólen.
Interação Inseto/Planta
- Interação do térmita arborícola Microcerotermes sp, (Isoptera, termitidae) com a
vegetação de cerrado, em Sete Lagoas, MG.
- Distribuição de insetos herbívoros em cerrados e campos rupestres na serra do Cipó: O
papel de compostos fenólicos em plantas esclerófilas.
- Diversidade de insetos galhadores: teste de hipótese na região tropical.
- Diversidade e distribuição de formigas (Hymenoptera:Formicidae) ao longo de um
gradiente de altitude.
- Padrões de ataque de Neopelma baccharidis ( Homoptera: Psyllidae) em Baccharis
dracunculifolia (Asteraceae): um teste da Hipótese do Vigor.
Ecologia de Vertebrados e Manejo de Fauna
- Estrutura de comunidades de pequenos mamíferos em áreas secundárias de M. Atlântica.
- Padrões de forrageamento do tamanduá-Bandeira (Myrmecophaga tridactyla) no Parque
Nacional da Serra da Canastra: dieta, comportamento alimentar e efeito de queimadas.
415
Módulos e disciplinas
Temáticas
Dissertações
Dissertações
Produção intelectual
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Incertezas de Sustentabilidade na Globalização, Unicamp.
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Tufts University/Center for Environmental Management (Enviromental Seminar, São
Paulo, 16-20 de março, Workshop).
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World Resources Institute, 1998 - World Resources 1998-1999. Washington, WRI.
Outros Lingüística,
Administração Hospitalar Desenho Administração Rural Letras e Artes
Decoração de Moda Carreira Militar Desenho de Projetos Lingüística
Carreira Religiosa Diplomacia Ciências Letras
Engenharia Agrimensura Biomedicina Engenharia Artes
Cartográfica Ciências Atuariais Engenharia
de Armamentos Ciências Sociais Engenharia
Mecatrônica Engenharia Têxtil Estudos
Sociais
História Natural Química Industrial Relações
428
UFMGProfessores Categoria
Papel didático Ensino
Metodologias e linguagem Método,Comunicação
Desafio. Desafio
Discurso comum + disciplinar Comunicação
Qualidade ambiental Resultado
Subjetividade: consciência, mobilização, associativismo da população e dos Subjetividade
pesquisadores
Estado Governo
Falta de referencial teórico Teoria
Objeto múltiplo Objeto
Falta elemento articulador. Comunicação
Diálogo Comunicação
UFMGAlunos
Diálogo difícil Comunicação
Linguagem Comunicação
Território comum Comunicação
Cada especialista Individualismo
Esforço não coletivo Individualismo
Alguém em cima junta [hierarquia] Hierarquia
Buscar consenso Método
Escala de estudo como problema. Método
Maior visão e capacidade de discussão Resultado
Boas idéias Resultado
Métodos Método
Avaliação, financiamento Desafio
Teoria x prática Teoria x prática
Ecologia x Economia Desafio
Sem participação Individualismo
Técnicos e público distantes [ext.]: conhecimento, problema, pessoas separados Teoria x prática
Conflito de interesses Desafio
Esfera técnica x política Teoria x prática
Produção acadêmica (apanhado geral) x propostas efetivas Teoria x prática
Possível resultado mais unificado, integrado Resultados
Otimismo Otimismo
Resultado mais integrado Resultado
Paradigma ambiental Paradigma ambiental
Diálogo entre departamentos e disciplinas. Comunicação
UFPRProfessores
Considerar e valorizar o outro: atuar em conjunto Cooperação
Reaproximar, reaprender ≠ junção, integrar, interagir: preservar especificidades Desafio
Diálogo (ponte, conexão, áreas de interface) Comunicação
Desafio da síntese própria. Desafio
Disputas: hierarquia. Hierarquia
Ciências Sociais: relações de poder. Poder
Diagnóstico coletivo e teses que se completem. Método,Resultado
Prática x discurso. Comunicação,Prática
Quebrar reducionismo. Holismo
Modéstia para diálogo. Comunicação
Programa/resultado comum com teses articuladas. Resultado
Conhecimento unificado. Resultado
ID em pesquisa ≠ ensino. Pesquisa, Ensino
431
Avanço na teoria com olhar múltiplo diferenças x Ideologia de padrão universal Teoria
(relação causal, linear).
ID: ver coisa maior. Holismo
Mercado x Academia. Teoria,Prática
Diálogo x vaidades, poder, hierarquia. Comunicação,Hierarquia
Técnica x humanidade. Teoria,Prática, Ética
USPProfessores
Nova atitude: conhecimento + ética, justiça social, equidade. Ética
Faltam projetos maiores. Método
Pouca interação: muita resistência. Desafio
Difícil, esforço, trabalhar em conjunto. Individualismo,Desafio
ID concreta. Teoria,Prática
ID: depende do olhar. Absorver/incorporar discursos condicionando solução. Método
Biologia pouco ID. Biologia
Juntar para resultado integrado contemplando partes. Resultado
USPalunos
Técnico x Administração: conhecimento diversificado. Teoria,Prática
Mercado exige. Prática
Otimista. Otimismo
Nova visão [paradigma]. Paradigma ambiental
MD não tem interação. Multidisciplinaridade
Difícil ouvir, aprender. Desafio
Professores também aprendem. Docente
Iniciar na graduação. Graduação
Predisposição para diálogo. Comunicação,
Mais Ciências Naturais que Humanas. Subjetividade
Ciências Naturais/Sociais
1
Lima, L. Oliveira. Escola secundaria moderna. Petrópolis: Vozes, 1973.
434
mais antropológica, descreve a pesquisa de Gilgen & Cho na qualificação dos paradigmas
ocidentais e orientais, apresentando a seguinte tabela, colocando um suposto paradigma
cartesiano oposto ao um paradigma da complexidade:
OCIDENTE ORIENTE
Análise Impessoal Síntese Pessoal
Generalização Legal Totalidade Moral
Diferenciação Assertivo Integração Não
discurso
Indução Poder Dedução Associativo
Objetivo Ordem Subjetivo Êxtase
Intelectual Racional Dogmático Irracional
Razão Crítico Intuição Imaginativo
Ciência Anti-ciência
2
Gilgen, A. R. & Cho, J. H. 1979. Questionnaire to measure Eastern and Western thought. Psychological
Reports, 44, pp. 835-41. In: Campbell, Colin. A orientalização do ocidente: reflexões sobre uma nova
teodicéia para um novo milênio. Religião & Sociedade, v.18, n.1, p.5-22, 1997.
3
Krus, D. J. & Blackman, H. S. Contributions to psycohistory: Eats-West dimensions of ideology measured
by transtemporal cognitive matching. In: Psychological Reports, 47, p. 947-55, 1980.
4
Santos Filho, J. C. Pesquisa quantitativa versus pesquisa qualitativa: o desafio paradigmático. In: Santos
Filho, J. C. & Gamboa, S. S. (org.) Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. São Paulo: Cortez, p.13-59,
1997.
435
HABERMAS POPKEWITZ HOSHMAND
- Empírico-analítico (mundo físico) (educação) - Naturalístico-
- Histórico-hermenêutico (eventos - Empírico etnográfico
históricos) analítico - Fenomenológico-
- Crítico (expor condições de - Ciência simbólica hermenêutico
opressão e dominação) - C crítica - Cibernético
BURREL e T. HUSÉN SOLTIS BERSTEIN
MORGAN - Científico (neopositivista)
(educação) - Empírico
- Funcionalista- - Idealista (Dilthey) - Empírico - Fenomenológico
Interpretativo - Humanista - Interpretativo - Crítico
- Humanista radical - Fenomenológico - Crítico
- Estruturalista radical - Crítico (neomarxista) - Normativo
Santos Filho & Gamboa5 colocam algumas possíveis relações entre paradigmas,
quanto a visão do mundo ou premissas subjacentes, relação sujeito-objeto, relação fatos-
valores, objetivo da pesquisa, abordagem, foco, método, papel da pesquisa e principais
critério da pesquisa. Na tabela abaixo, colocamos as principais características das teses da
diversidade incompatível, da diversidade compatível ou complementar e da unidade ou
integração, oriundos de filósofos de inúmeras vertentes.
5
Santos Filho, J. C. & Gamboa, S. S. (org.) Pesquisa educacional: quantidade-qualidade. São Paulo: Cortez,
1997.
436
D C D R
UFRJ Prof Alunos USP Prof Alunos
A R A - A C A N
B C B C B N B N
C R C R C C C C
D C D R
Introdução
Metodologia: quantitativo-qualitativa
- Entrevistas: semi-estruturadas com 4 professores e 3 alunos de cada
curso.
- Questionário: doze perguntas agrupadas em quatro eixos/capítulos.
- Seleção: cursos strictu sensu (mestrado e/ou doutorado) de
universidades públicas.
• Características: tempo de implementação, número de
dissertações e/ou teses; origem; corpo docente, disciplinas;
avaliação e/ou credenciamento; reconhecimento internacional;
contribuição para interdisciplinaridade; proximidade geográfica.
Ecologia
UFMG - Ecologia, Conservação e Manejo de Vida Silvestre – ECMVS:
nota cinco, + CEDEPLAR: PADCT – CIAMB do Ministério de Ciência
e Tecnologia.
Ciências Ambientais
USP - Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental - PROCAM:
multidisciplinar, nota quatro.
ALGUNS ASPECTOS DOS CURSOS ANALISADOS
Interdisciplinaridade ambiental:
Potencial de reformulação interna e trabalho em equipe.
Desafios incluem questões filosóficas, epistemológicas e éticas.
Profissionais ‘subvertem’ estrutura departamental.
Embate ensino, pesquisa e extensão.
Pólo ID inovador, sintetiza áreas, perfaz compromisso e
responsabilidade de reunir tendências, concatena lideranças e
transcende dificuldades, promissor como somatório.
Novo locus universitário: possibilidade de convívio da
diversidade X desafio em congregar experiências, metodologias,
percepções de mundo.
Institucionalização Interdisciplinaridade
Entre Ciências Biológicas e Humanas alterações nas ciências e
no manejo ambiental.
Concepção mecânico-reducionista de natureza e de vida
sistêmico-complexa: mudança paradigmática X debate fragilizado,
não há total transformação nas atitudes, valores e concepções.
Currículo se limita a ensino e pesquisa X extensão.
Cursos
Representam inovação acadêmica, construção das Ciências
Ambientais.
Parceria interna e com comunidade, indiretamente.
Teoria e prática retorno social.
Buscam adequação e articulação disciplinar, favorecendo
constituição de paradigma integrador e sintético.
Tendências acadêmicas
Reais e ideais de mudança de paradigmas desafio da prática
universitária de inovação além da mera execução acadêmica
pedagogia, pesquisa e extensão interdisciplinares.