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Natal
2017
Letícia Raboud Mascarenhas de Andrade
Psicologia.
Natal
2017
iii
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas Letras
e Artes. Programa de Pós-Graduação em Psicologia, 2017.
Orientador: Prof. Dr. Jorge Tarcísio da Rocha Falcão.
Epígrafe
construtivistas.”
Bernard Charlot
vi
Dedicatória
condições de trabalho.
vii
Agradecimentos
Aos meus pais que me acompanham desde os primeiros passos e ao longo de toda a
mundo mais justo. Aos meus irmãos que estiveram sempre presentes nos bons e maus momentos
e com quem aprendi e aprendo pela convivência e afeto. Ao meu companheiro e amigo, Jaerton,
também professor, responsável por alguns dos insights que tive durante a construção do trabalho,
com quem dividi conversas, preocupações e que foi, em muitos momentos, um amparo. Aos
meus avós, com quem compartilho interesses e conversas sobre o tema da educação, histórico na
família. Aos tios e primos sempre presentes que tornaram a caminhada mais alegre.
Aos amigos extra Universidade que tornaram a jornada mais leve e alegre com encontros
mundo de forma mais ampla e ver possibilidades de fazer dele um lugar melhor e mais justo.
viii
Especialmente a Oswaldo Yamamoto, Pablo, Felipe, Joyce, Andressa e Sarah que me acolheram
Aos leitores deste trabalho, de antemão, professora Daniela Anjos e professor Pablo
À Capes pela bolsa que permitiu o andamento da pesquisa em condições mais favoráveis.
docente e me ensinou através da valorização, cuidado e responsabilidade com que tratam a tarefa
educativa.
emancipação dos horizontes e enriquecimento. Pela abertura e confiança com que permitiu a
Muito obrigada!
ix
Sumário
Resumo xiii
Abstract xv
1. Introdução 17
2. Capítulo 1 – Educação 26
4.2. Vivência 77
5. Método 80
5.1. 1ª Etapa 80
5.1.1. Amostra 80
x
5.1.2. Instrumentos 82
5.1.3. Procedimentos 84
5.1.4. Análise 85
5.2. 2ª Etapa 85
5.2.1 Participantes 85
5.2.2. Instrumento 86
5.2.3. Procedimentos 89
5.2.4. Análise 91
6. Resultados e discussão 92
a) Aspectos sociodemográficos 92
b) Aspectos de formação 93
c) Aspectos ocupacionais 94
a) Momento I – S 127
b) Momento II – S 135
a) Momento I – M 146
b) Momento II – M 159
7. Conclusão 179
8. Referências 182
Anexo A 188
Anexo B 192
Apêndice A 193
xii
Lista de Siglas
do Magistério
Resumo
“polivalente” dos anos iniciais do ensino fundamental da rede municipal de Natal (RN-Brasil) e
elementos e percepções constitutivas do trabalho docente e seu contexto de inserção, bem como a
articulação com as vivências, sua expressão e constituição. A pesquisa compreendeu uma etapa
qualitativa, baseada na técnica de Instrução ao Sósia, que permite o diálogo do trabalhador com
sua prática laboral. Foi identificado um elevado percentual de professores que se sentem
vivência.
xv
MEDIATIONS
Abstract
The democratization of education possesses contradictory interests that involve both, mechanisms
that reproduce inequalities and forces geared towards social transformation. In this context, the
precariousness of the teaching work can produce situations of alienation which influence the
work experiences. The present research focuses on the work of "polyvalent" elementary school
perspective, an approach that explores the activity subjective dimension, enabling the expansion
of consciousness and power over activity, revealing mediations and experiences. The objective of
this study is to explore and analyse the teaching work constitutive elements and perceptions, its
insertion context, as well as the articulation with the expression and constitution of experiences.
The research covered: a descriptive and inferential quantitative stage, using a socio-professional
qualitative stage, which made use of the Instruction to the Double (clinic of activity), promoting
the dialogue with professional practice. Within this research, it has been identified a high
percentile of teachers who experience loneliness at work (30.2% of the sample), as well as the
connection between this perception and feelings of dissatisfaction regarding available time,
pedagogical planning meetings and little familiarity with School's Political Pedagogical Project.
Two 1st grade municipal school teachers participated of the research clinical qualitative stage.
Different features in regard to the relation with the teaching work activity were observed: an
experience established in the logic of production and class control, revealing obstacles to action
xvi
and feelings of solitude; and another focused on student intellectual mobilization, expressing
dynamism and job satisfaction, as well as access to resources of activity enrichment. The study
concludes that it is necessary to create and reinforce working collective dimension at schools
aiming at the development and construction of activity references, besides political mobilization
Key words: teaching work; elementary school; clinic of activity; mediations; experience.
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1. Introdução
da força de trabalho para o capital (Frigotto & Ciavatta, 2003; Lopes & Caprio, 2008). Com
ensino e qualidade (ainda que este último termo carregue ambiguidades no sentido da contradição
já exposta), (Dourado & Oliveira, 2009; Oliveira, 2007), consolidada pela promulgação da
constituição de 1988, que reconhece oficialmente a educação enquanto direito de todos e dever
Lei 9.394/96, que define e regulariza a organização do sistema educativo brasileiro. A escola,
enquanto reflexo da sociedade, incorpora em si suas lutas e contradições. Para além da função de
(Asbahr, 2005).
docente pelo desinvestimento a nível financeiro e gerencial do Estado, que não garante salários e
condições satisfatórias de trabalho aos profissionais da educação nas diferentes redes (Oliveira,
trabalho dos professores, que devem lidar com realidades sociais complexas e uma lógica de
exclusão na escola, tendo em vista o maior investimento na permanência dos alunos, ajuste
idade-série e negligencia nas condições desta permanência (Paparelli, 2009). Por fim, a lógica de
18
fracasso escolar.
muitas vezes, de falta de tempo (Carlotto, 2002; Zanardi, 2009), isto apesar dos ideais veiculados
de participação e gestão democrática, trazidos pela LDB por meio dos conselhos escolares e
construção coletiva do Projeto Político Pedagógico da escola (PPP), instrumento que reflete a
características da atividade docente, como a necessidade de levar trabalho para casa, as elevadas
Charlot (2008) aponta que, para além de um simples reflexo das contradições sociais, as
aprendizagem. O autor indica o paradoxo do professor herói versus vítima, herói da pedagogia e
vítima mal paga e sempre criticada, colocando que a situação de estar preso entre discursos
dos conteúdos e regras da atividade para aplicação pelos alunos, enquanto o construtivismo foca
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na atividade do aluno e sua mobilização intelectual na busca por respostas, sendo igualmente
homem, saber científico, como coloca Vigotski (2014). Deste modo, “(...) a questão fundamental
não é saber se a professora é “tradicional” ou “construtivista”, mas como ela resolve duas tensões
inerentes ao ato de ensino e ao de educar.” (Charlot, 2008, p. 25), uma vez que “Ensinar é ao
mesmo tempo, mobilizar a atividade dos alunos para que construam saberes e transmitir-lhes um
patrimônio de saberes sistematizados legado pelas gerações anteriores de seres humanos.” (p. 25),
Sobre a constituição da consciência como produto subjetivo da atividade dos homens com
outros homens e com objetos, Leontiev (2004) traz o conceito de significação relacionado a um
produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (Saviani, 2000, p.17), sendo a
permite uma organização consciente dos processos de formação dos indivíduos (Moretti, Asbahr
& Rigon, 2011). Leontiev (2004) compreende o processo de alienação quando, na atividade
laboral, o sentido pessoal da ação se distancia do seu significado social. No trabalho docente, este
distanciamento pode traduzir-se pela execução de operações automatizadas, sem sentido para os
alienação deve ser compreendido com base nas condições objetivas e subjetivas do trabalho
população (proletariado) por outra (burguesia), ocorre pela sua compartimentalização, já não
sendo necessário saber para fazer. Planejamento e execução, trabalho manual e intelectual
tornam-se momentos separados, o trabalhador é destituído de seu saber (Asbahr, 2005). Nesse
quadro, o trabalho pedagógico apresenta particularidades, como ser não produtivo, em se tratando
da educação pública, pois não visa ao lucro. É também um trabalho não material, pois seu
(aprendizagem) e o ato de produção (ensino) não podem ser separados. Paro (1993) coloca o
aluno como objeto de trabalho, pois sobre ele incide o ofício do educador que o transforma para
além da aula, sendo igualmente sujeito ativo de seu processo de aprendizagem e co-produtor do
faz com que o Capital não exerça controle direto sobre o mesmo, fazendo-o de forma política e
Clot, permite uma leitura subjetiva da atividade e seus atravessamentos, podendo revelar
trabalhadores não dispõem de recursos para fazer frente aos impasses do real, ou meios para
doença, mas como capacidade normativa, de estabelecimento de normas de vida diante das
enrijecimento.
A clínica da atividade procura intervir junto aos trabalhadores tendo em vista a ampliação
da consciência e reflexão sobre a atividade, abordando-a sob outra ótica, de modo que a
experiência vivida possa ser ou vir a ser meio de viver outras experiências (Clot, 2001, 2008), o
autor menciona Vigotski na compreensão de que uma ação passada pelo crivo do pensamento
transforma-se em outra, por sua vez, refletida. Clot (2013) coloca ainda a perspectiva do
“trabalho bem feito” na saúde, indicado por uma tradição profissional viva (coletiva), enquanto
norte do “bem estar”. O coletivo é percebido como recurso para o desenvolvimento dos
ambiente de trabalho sempre que um coletivo profissional torna-se uma coleção de indivíduos
subjetividade através do conceito de “real da atividade” (Clot, 1999). O real da atividade envolve
os conflitos do real e inclui, além do que é feito, aquilo não se faz, que não se pode fazer, que se
busca fazer sem conseguir, que se faz sem querer fazer, etc. (Clot, Faita, Fernandez & Scheler,
2000), sendo “a fadiga, o desgaste violento, o estresse” compreendidos “tanto por aquilo que os
trabalhadores não podem fazer, quanto por aquilo que eles fazem.” (Clot, 2001, p. 5).
Clot (2013) compreende uma arquitetura da atividade de trabalho composta por quatro
instâncias que interagem de forma dinâmica: “impessoal”, relativa ao prescrito que orienta o
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à história coletiva de um grupo profissional, com suas potencialidades e contradições. Esta última
refere-se ao conceito de “gênero profissional” da atividade, que diz de uma memória coletiva
um grupo e orientando a ação (Clot, 2008). A reformulação do gênero em situação, seu ajuste
para torna-lo instrumento da ação, recebe o nome de “estilo pessoal” da atividade, envolvendo
(Clot et al., 2000). Há degradação da saúde quando a história do gênero profissional encontra-se
organização do trabalho que deixa “sem voz” face ao real.” (Clot, 2002, p.4).
constituição da subjetividade humana preenchendo uma função psicológica que “põe o sujeito à
prova de suas obrigações práticas e vitais com relação aos outros e com relação ao mundo” (Clot,
humana, estabelecido na dinâmica da relação entre o ambiente social e o lugar ocupado pelo
indivíduo, como um prisma que refrata a experiência (Veresov, 2014). O autor coloca a
compreensão de Vigotski das relações sociais enquanto fonte das funções mentais superiores pela
23
Veresov (2014) compreende a vivência enquanto fenômeno, implicando o prisma e o modo como
os indivíduos vivem situações, e também como conceito, referente à vivência dramática que
da atividade e transformação pelo confronto com a mesma e com um coletivo de trabalho, sendo
da rede municipal de Natal/RN em razão dos desafios e especificidades desta etapa e seu papel
pela qual serão trazidas algumas condições e características do ensino neste nível. Do 1º ao 5º
ano os professores são “polivalentes”, responsáveis por uma turma, lecionando diferentes
disciplinas (português, matemática, ciências, história e geografia). Com a lei federal 11.247,
promulgada em 2006, que instituiu a ampliação do ensino fundamental para a entrada de crianças
a partir dos seis anos de idade até 2010, realidade consolidada nos dias atuais, crianças de seis
anos passaram a frequentar o 1º ano, política importante tendo em vista a ampliação da oferta
2012).
Diante do esboçado, visa-se a analisar o trabalho docente dos anos iniciais do ensino
encontrar pistas de resposta para as perguntas: Que elementos, dimensões, percepções compõem
a atividade laboral e vivência do professor polivalente dos primeiros anos do ensino fundamental
Psicologia Escolar, em uma escola da rede municipal de Natal que abarcava os anos iniciais do
salários atrasados, negociação para entrada em greve, acúmulo de lixo no terreno ao lado da
constituinte dos modos de fazer do gênero profissional e como estas mediações articulavam-se na
25
O presente trabalho abarca capítulos teóricos que envolvem articulação em três blocos. O
iniciais do ensino fundamental (1º ao 5º) e implicações no trabalho docente, além do contexto
local. O segundo bloco refere-se ao trabalho docente, sua caracterização e conceito de alienação,
contradições implicadas na profissão e sua relação com a saúde. O terceiro bloco é destinado aos
ferramenta de análise e leitura dos fenômenos explorados. O capítulo dedicado aos resultados e
discussões envolve uma primeira seção destinada à primeira etapa da pesquisa (quantitativa) e
uma segunda seção para a segunda etapa (clínico-qualitativa). Relações entre as duas etapas são
2. Capítulo 1 – Educação
Vigotski, Luria e Leontiev, que tem no materialismo histórico-dialético de Marx uma de suas
o instrumento, guia das ações sobre o objeto da atividade, voltado para o exterior (domínio da
natureza), e o signo, meio de ação psicológico sobre o comportamento (próprio e dos outros),
voltado para o interior na medida em que favorece o controle do homem sobre si (Vigotski,
cultural e do pensamento (linguagem verbal, escrita, calculo, desenho, etc.) operando uma
transformação das funções psicológicas superiores (atenção voluntária, memória lógica, formação
de conceitos, etc.), de modo que são instaurados novos estágios de desenvolvimento superpostos
O homem, então, cria necessidades que visam garantir não apenas sua existência
biológica, mas principalmente sua existência cultural (Moretti et al., 2011), tendo em vista a
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construção histórica e social de sua humanidade. De acordo com Leontiev (2004), “(...) cada
indivíduo aprende a ser homem. O que a natureza lhe dá quando nasce não lhe basta para viver
em sociedade. É-lhe preciso ainda adquirir o que foi alcançado no decurso do desenvolvimento
compreendido, pela sua função, como processo de educação, (Leontiev, 2004). De acordo com
indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos
de análise, etc.). Nesse sentido, a escola enquanto local do compartilhamento formal e planejado
pois permite uma organização consciente dos processos de formação dos indivíduos (Moretti et
al., 2011).
No entanto, o processo de humanização não ocorre para todos nas mesmas condições. Em
relação à espécie humana observam-se diferenças nas condições de vida, riqueza da atividade
material, relações sociais e processo educativo que mediam seu acesso ao conhecimento
nas mãos de uma classe dominante, no contexto da sociedade capitalista, vem acompanhada de
cultura, já que a maior parte dos meios de produção e difusão cultural estão a serviço desta classe
forma histórica concreta do seu psiquismo. Ela adquire particularidades diversas segundo as
condições sociais da vida dos homens e transforma-se na sequência do desenvolvimento das suas
indivíduo.
No entanto esse processo não ocorre nas mesmas condições para todos. A educação enquanto
inserida em e constituinte de um contexto social deve ser considerada nas relações estabelecidas
com o mesmo a fim de compreender de forma mais ampla seu alcance e funcionamento. Serão
pedagogia nova e a pedagogia tecnicista, a educação aparenta possuir uma grande margem de
superação da marginalidade, constituindo “uma força homogeneizadora que tem por função
corpo social.” (Saviani, 2008, p.4). No entanto, ao invés de construir uma sociedade mais
igualitária, ao desconsiderar a relação entre sociedade e educação, tal perspectiva mascara suas
backgrounds dos alunos, seus contextos e o engajamento cognitivo que precisam para se
desenvolver. Na pedagogia nova as emoções são privilegiadas aos conteúdos, o foco passa a ser a
relação com o aluno e seus interesses, fazendo com que o compartilhamento de conhecimento
caia para segundo plano, privando os alunos que mais precisam dos instrumentos e recursos para
favorecer seu desenvolvimento. Por sua vez, a pedagogia tecnicista preocupa-se com os
superação do fracasso escolar e acentuam-no. A não consideração das relações entre escola e
sociedade e suas contradições implicam no não questionamento sobre o porquê e para quem serve
marginalidade é compreendida como fenômeno inerente à estrutura da sociedade, uma vez que o
dependente da estrutura social, cumprindo a função de reforçar e legitimar a exclusão, “sua forma
compreendida pela dominação de uma classe ou grupo sobre outro, estabelecendo uma relação de
superioridade cultural e marcando uma desigualdade que o sistema educativo reforça ao invés de
por exemplo. De acordo com Althusser, a necessidade de reprodução das condições de produção
pela repressão, e Aparelhos Ideológicos de Estado, cuja força motriz principal é a ideologia. Os
classe dominante. No entanto Althusser não rejeita a visão da escola como importante lócus da
luta de classes em seu viés ideológico (Cassin, 2003), da mesma forma Catani, Catani e Pereira
(2001) trazem que as análises de Bourdieu não se contrapõem às possibilidades de luta, mas
reprodutivista faz sua leitura remetendo-se aos condicionantes objetivos da sociedade, ou seja, a
a função da educação na reprodução da sociedade e de suas desigualdades, razão pela qual dá-se
o nome “crítico-reprodutivista” (Saviani, 2008). Nas palavras do autor, “Enquanto as teorias não-
críticas pretendem ingenuamente resolver o problema da marginalidade por meio da escola sem
Coloca-se a necessidade de pensar uma perspectiva que articule a escola aos interesses
“histórico-crítica” ou “crítico-social dos conteúdos”, que dedica um papel central à difusão dos
conteúdos escolares sem considera-los fora do contexto dos alunos, permitindo uma abordagem
crítica dos mesmos (Libâneo, 1989). Nessa perspectiva, o papel do professor enquanto mediador
do saber historicamente acumulado é essencial, da mesma forma que o aluno é reconhecido como
ativo na construção do seu conhecimento, os interesses são aproveitados para produzir outros no
sociedade mais justa onde todos tenham acesso ao saber em uma perspectiva crítica,
A educação no Brasil passou a ser reconhecida como direito de todos e dever do estado a
a escola pública não tinha capacidade de atender toda a população, restringindo suas vagas às
classes mais abastadas por meio de provas de seleção para o ingresso. No entanto, foi durante o
regime militar que iniciaram os movimentos de expansão da educação para as classes antes
O foco da exposição será a educação básica, mais particularmente o ensino fundamental, alvo
responsável pela aquisição e fixação dos conhecimentos de base que serão gradativamente
desenvolvidos.
expansão industrial, impulsionada pelo “milagre econômico”, que a educação das massas torna-se
um objetivo no sentido da produção de mão de obra com algum grau de qualificação. Nesse
período houve a junção dos quatro anos do ensino primário com os quatro do ginásio, criando um
único ciclo de oito anos que passou a ser obrigatório (Ferreira Jr. & Bittar, 2006). Essa
além de medidas que acarretaram em arrocho salarial, tendo em vista a ampliação a um menor
Essas transformações mudaram o perfil do professor primário, antes caracterizado por ser
uma categoria profissional pequena, composta por mulheres da classe média e da elite. As
medidas tomadas para a ampliação, sobretudo, do ensino fundamental deram origem a “um
processo tanto ascendente quanto descendente, pois os que tinham origem nos “de cima” se
(Ferreira Jr. & Bittar, 2006, p.1159). A proletarização da profissão ocorreu no sentido não apenas
a existência material dos trabalhadores.” (Ferreira Jr. & Bittar, 2006, p.1167).
a qual, em seu artigo 205, reconhece oficialmente a educação enquanto direito de todos e dever
lei 9.394/96, que define e regulariza a organização da educação brasileira. Está em pauta o
processo este permeado por interesses antagônicos, sendo as reformas e ações políticas
globalizado e flexível (Arelaro, 2005; Frigotto & Ciavatta, 2003). Nesse sentido, ressaltam-se os
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interesses que caracterizam a lógica neoliberal, na qual a educação volta-se para o mercado,
funcionando à sua semelhança, e torna-se produto (Lopes & Caprio, 2008). Estão também em
jogo as negociações e os interesses da sociedade civil na luta pela educação enquanto direito
sociedade de classes, com suas contradições e lutas, “Toda lei expressa uma política e encaminha
uma forma de gestão, sendo, sua versão final, resultante do embate das forças políticas que
participam desse processo” (Gracindo, 1988, como citado em Lopes & Caprio, 2008, p.10).
elaborado no âmbito de estados e municípios, que determina diretrizes, metas e estratégias para a
superior.
década de 1990. Propostas do Banco Mundial que fazem eco às medidas assumidas no Brasil,
etc. (Libâneo, 2012; Lopes & Caprio, 2008). Caracteriza a estratégia neoliberal na educação,
neoliberal a educação é percebida restrita “ao papel de reproduzir a força de trabalho para o
mercado a ser explorado comercialmente pelo setor privado” (Lopes & Caprio, 2008, p.14).
ensino fundamental.
relação aos sistemas sob sua responsabilidade favoreceu a difusão do acesso à educação, mas
as três instâncias (municípios, estados e união) também não favoreceu a aplicação da lei, dos
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precarização.
estados brasileiros tendo em vista o cenário de evasão e repetência herdado da última década do
regime militar (Oliveira, 2007; Paparelli, 2009). Com a ampliação do acesso à educação a
ensino fundamental, comprometida com modos de avaliação flexíveis e lida com problemas e
preparo das equipes e articulação das políticas, resumir-se à mera promoção automática, sem o
continuada de professores, etc.) visando a que os alunos atrasados alcancem seu grupo-nível de
pertencimento.
exclusão na escola (Oliveira, 2007; Paparelli, 2009). Oliveira (2007) observa que “(...) o lócus da
exclusão não é mais o mesmo. Isso tem profundas consequências para o sistema como um todo e
materiais aos agentes escolares (Bonamino & Sousa, 2012). Em 2005 é implantada a Prova Brasil
Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Índice que reúne em apenas um
indicador dois conceitos considerados importantes para a qualidade da educação: o fluxo escolar
e as médias de desempenho nas avaliações, tornando-se o principal indicador usado pelo Governo
Federal para traçar metas a serem alcançadas pelas escolas e redes de ensino. Passa a ser comum
planejamento de ações visando o desenvolvimento das unidades e sistemas (Bonamino & Souza,
2012). Em alguns Estados e Municípios os resultados são utilizados também como referenciais
Souza, 2012).
Dourado e Oliveira (2009) ressaltam a perspectiva polissêmica do termo, que varia de acordo
constituinte das relações humanas, suas lutas e contradições, e a escola como espaço institucional
estaduais, municipais e locais, abarcando diversas redes e normas nem sempre articuladas. A
A educação pública básica voltada ao acesso das massas antes excluídas e a orientação
da educação, tendo como consequência que os filhos das classes média e alta fossem
destino dos filhos das classes desfavorecidas. Nesse sentido e também considerando a exclusão e
segregação que ocorre dentro das próprias escolas, compreende-se a crítica de Libâneo (2012),
dualismo em que:
Apesar de ter de responder a problemas sociais, por fazerem parte do seu contexto, a
função da escola não deve ser primordialmente percebida como assistencialista. É necessária uma
base comum de conhecimentos, uma vez que não há justiça social ou cidadania sem
Nacional Comum Curricular (BNCC), cuja versão final foi entregue pelo MEC ao CNE em abril
A presente sessão visa articular a discussão das políticas educacionais e seu impacto no
trabalho do professor.
profissão docente, caracterizado pelo desinvestimento a nível financeiro e gerencial por parte do
processos educacionais (estruturas curriculares, avaliações), etc. (Fernandes & Orso, 2010;
parte do Estado contribuíram para um quadro de salas de aula com elevado número de alunos por
regularização de fluxo, já citadas, que visam ajustar o aluno pela idade a uma série, favorecendo
da escola. Apesar de representar, de certa forma, um avanço, esse processo teve impacto na
violência, e contribuindo para a precarização do trabalho docente (Paparelli, 2009). Sobre isto
Manter na escola aqueles que dela teriam sido ‘excluídos’ antigamente sem criar
condições para uma ação educativa eficaz na direção dos alunos que mais
42
dependem da escola para adquirir aquilo que ela exige, é fazer surgir dificuldades
de toda ordem próprias para deteriorar as condições de trabalho dos professores
sem melhorar realmente a situação dos alunos. (p.525).
numa lógica de ciclos de aprendizagem, sobretudo nos anos iniciais do ensino fundamental, nos
três primeiros anos, em que não deve haver reprovação, implica na convivência dos professores
promoção do desenvolvimento.
alunos com modos de socialização familiar diferentes dos padrões de referência da escola e
atribuições do professor, que deve dar conta de diversas variáveis para desenvolver seu trabalho
de educador. Oliveira (2004) menciona que muitas vezes o professor deve assumir funções de
agente público, assistente social, enfermeiro, psicólogo, entre outros, tirando o foco do “ensinar”
insucesso dos alunos pela lógica avaliativa focada nos resultados dos discentes e estabelecimento
de rankings (Gomes, Colares, Colares & Brasileiro, 2012; Silva, 2013). Com o foco na
43
professor no sentido de atender aos critérios para um bom resultado nas avaliações pode tornar-se
alvo de contradições. Estas se situam no esforço por atender o exigido pela norma e no foco sobre
progressão automática de alunos, ou o “treino” para a avaliação, ao invés da busca pela mediação
e consolidação de conteúdos.
insatisfatório, o que pode acarretar em prejuízo no contato com os pares e tempo disponível para
planejamento e estudo.
professor da educação básica nas últimas décadas, embora persistam contradições e situações de
escola.
Piso Salarial Profissional Nacional para a categoria, regulamentado em 2008 pela Lei 1.738,
destinada para a capacitação de professores e foi mantida a exigência legal de criação de Planos
do piso. No entanto, a valorização se deu mais no plano individual do que coletivo, envolvendo a
ainda na dedicação de 2/3 da carga horária para atividades com os alunos, deixando implícita a
reuniões, etc. Fator que constituiu igualmente um avanço, embora não haja garantia de sua
efetivação em todos os sistemas de ensino do país, assim como outras medidas de valorização
docente, tendo em vista que o governo de estados e municípios podem protelar sua adoção
educação básica pública, não tem caráter de lei, mas constitui uma perspectiva norteadora,
abarcando importantes aspectos que envolvem o trabalho docente. Alguns deles são: a
unidade escolar, a preferência pela jornada de 40 horas semanais compreendendo a ampliação das
Educação (CONAE, 2014), em seu eixo VI, sobre Valorização dos profissionais da educação:
estudantes por turma, assim distribuídos: 0-2 até oito crianças; 3-5 até 15 estudantes; fundamental
séries/anos iniciais até 20 estudantes; fundamental séries/anos finais até 25 estudantes; médio e
superior até 30 estudantes” (p. 98). Estes números não costumam se confirmar na prática, tendo
em vista que a demanda da educação pública costuma ultrapassar os professores disponíveis nos
modificação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB - Lei 9.394/96) para fixar
o numero máximo de alunos por professor nas turmas da educação básica ao modo do proposto
precarizada por formações aligeiradas e admissão de pessoas sem formação adequada para a
atividade tendo em vista a ampliação do ensino e necessidade de profissionais (Ferreira Jr. &
Bittar, 2006), até recentemente foi exigida formação em nível superior em área pertinente para o
presença de professores com essa formação nas redes, conforme menciona o parágrafo I do artigo
61 da LDB, que diz considerar profissionais da educação básica professores habilitados em nível
médio ou superior. Recentemente com a aprovação da lei 13.415/2017 que altera a LDB,
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formação em nível superior na área, o que representa um passo para trás na luta pela valorização
do conhecimento docente. Para garantir que os professores da educação pública básica tenham a
formação exigida pela LDB, foi elaborado o Plano Nacional de Formação de Professores da
segunda licenciatura, ou formação pedagógica, aos docentes em exercício cuja formação não se
distintas (Carissimi & Trojan, 2011). O mesmo pode-se dizer das pós-graduações, sobretudo as
de lato sensu.
renovação face aos desafios do acolhimento cada vez maior de crianças e adolescentes nos
sistemas de ensino (Gatti, 2008). A autora ressalta os interesses em jogo no campo da formação
especializada de que a formação continuada de professores seria necessária e teria como principal
função suprir as lacunas da formação inicial, enquanto outros modelos falam em sua necessidade
47
docentes de modo a superar os entraves encontrados no trabalho (Davis et al., 2011). De acordo
(direção, coordenação, corpo docente), devendo ocorrer no interior das escolas, à luz dos desafios
enfrentados. O coordenador pode ser compreendido como principal responsável pelas ações de
formação continuada nas escolas, havendo também busca por “fortalecer e legitimar a escola
como lócus de formação contínua e permanente, de modo a criar nela uma comunidade
colaborativa de aprendizagem.” (Davis et al., 2011, p. 831). Os autores trazem que poucos são os
para a atuação docente, embora possam proporcionar momentos de trocas entre os pares,
sentido transformador através da aproximação entre teoria e prática em discussões coletivas face
aos desafios do dia-a-dia de modo crítico e reflexivo (Haddad & Silva, 2012). No entanto os
ação. Como limites ao aproveitamento do momento, Haddad e Silva (2012) citam a assunção
pelo coordenador de responsabilidades que extrapolam sua ação, como a lida com os problemas
de indisciplina dos alunos, e as faltas dos professores (assumindo, por vezes, sua posição em sala
atores tem relação com o desafio da gestão democrática na escola, fruto das lutas do período da
de diretores por meio de eleição, etc. (Sousa & Silva, 2013). A LDB, em seu artigo 14, define os
superação. No entanto, tem demonstrado mais sua faceta burocrática que sua inspiração
democrática, tomado como medida isolada e descolado de uma política mais ampla e séria de
democratização da escola (Paro, 1993). A intensificação laboral também é um fator que dificulta
reservando aos professores uma posição de “dadores de aula”, “uma vez que suas condições de
trabalho não facultam sua participação na globalidade do trabalho educativo” (Sousa & Silva,
com potencial para “produzir transformações na consciência dos educadores num sentido oposto
coletivo.
etapa. O ensino fundamental divide-se em anos iniciais (1º ao 5º) e anos finais (6º ao 9º), é
antecedido pela educação infantil e precedido pelo ensino médio. A lei federal 11.274,
promulgada em 2006, ampliou o ensino fundamental no Brasil de oito para nove anos, através da
inclusão das crianças de seis anos de idade, que passaram a frequentar o 1º ano de ensino.
50
A ampliação da escolaridade às crianças de seis anos tem sido apontada como um modo
resultados negativos evidenciados nas avaliações, bem como a significativa repetência nos
primeiros anos de ensino (Mainardes & Stremel, 2012; Santos & Vieira, 2006; Silva & Cafiero,
2011). A instituição do ensino fundamental de nove anos foi uma política importante, tendo em
(Mainardes & Stremel, 2012; Santos & Vieira, 2006). Com a ampliação da escolaridade entra em
pauta a discussão acerca da utilização de um sistema de ciclos, sobretudo nos três primeiros anos
Básica, normas que orientam o planejamento curricular das escolas, discutidas e fixadas pelo
CNE, compreendem os três primeiros anos do ensino fundamental compondo um ciclo centrado
efetiva de uma política de ciclos implicaria, pode haver opção à manutenção do sistema seriado
fazendo uso de um regime de progressão continuada, em que a repetência não é colocada, “sem
Para os anos iniciais (1º ao 3º) existe a proposta de um currículo comum, embora não
meta colocada pelo documento é a alfabetização até os oito anos. O documento é considerado
51
relevante tendo em vista a premissa da importância de alfabetizar todas as crianças até os oito
criança no processo de ensino (Alferes & Mainardes, 2014). Apesar disto os autores reconhecem
que a proposta necessita ser discutida, analisada por especialistas e debatida com professores e
gestores.
Nas escolas públicas, o termo polivalente para o professor dos anos iniciais deve-se ao
fato deste assumir uma turma e ser responsável por lecionar diferentes áreas do conhecimento:
língua portuguesa, matemática, ciências, história e geografia (Lima, 2012). Nesse contexto há o
para o ensino da leitura, da escrita e das quatro operações matemáticas (Lima, 2012; Cruz &
Neto, 2012). Coloca-se, por vezes, a negligência com componentes curriculares pouco dominados
pelo professor e a possível identificação, na realidade brasileira, do professor dos anos iniciais
passado com uma única turma, facilitando conhecer o aluno e compreender suas dificuldades e
histórias de vida, retomar conteúdos não compreendidos e contribuir para sua formação integral,
trabalhadas, fazendo uso da interdisciplinaridade. Quanto aos desafios da atuação nesta etapa de
assegurar a ligação entre as disciplinas, bem como o fato de não precisar ser polivalente para
52
fazer tais conexões. Foram ressaltados também os limites do referente único na turma, podendo
dificultar a aprendizagem em casos de falta de empatia na relação professor – aluno (Cruz &
Neto, 2012). Estes autores trouxeram igualmente a dificuldade de se trabalhar com alunos em
leitura e da escrita, ressaltando a queixa por parte de professores do ciclo final dos anos iniciais
do ensino fundamental, bem como dos anos finais, em relação a receberem alunos ainda não
alfabetizados.
compõe o núcleo central das representações sociais das professoras das séries iniciais acerca da
própria profissão. A autora traz que a construção de sentido ligado ao termo associa-se à idade
das crianças e tempo de permanência com as mesmas somados à carência e ao desamparo a elas
discussão está a perspectiva da escola do acolhimento social, por vezes sobreposta à perspectiva
ocupação dos espaços de ensino pelas mulheres ao longo do século XX, graças às oportunidades
históricas aí perpetradas para este público, de obtenção de uma formação e exercício profissional
que não “escapava” tanto do perfil das responsabilidades maternas e do lar. Também, com a
que possuíam uma gama maior de oportunidades fora da docência. O conceito difundido de
53
restrição das mulheres a esta posição, aos baixos salários recebidos e às más condições de
trabalho (Rabelo & Martins, 2010), paralelo que pode ser estabelecido com o conceito de
As escolas municipais de Natal espalham-se pelas zonas norte, sul, leste e oeste, sendo as
instituições responsáveis pelo ensino fundamental I mais numerosas nas zonas norte e oeste,
atendendo, em sua grande maioria, zonas periféricas e populações menos favorecidas, como
costuma ocorrer com a educação pública básica no Brasil. Natal possui IDEB abaixo da média
O município de Natal paga seus professores de acordo com o piso nacional para a
categoria por 20 horas semanais de trabalho, ao contrário de outras localidades que acertam o
mesmo valor para uma jornada de 40 horas, o que configura uma situação um pouco melhor,
ainda que os salários continuem sendo insuficientes para uma sobrevida digna com certa margem,
capitais brasileiras, Natal está em 23ª posição quanto ao nível salarial ofertado aos professores da
educação pública básica de acordo com ranking feito pela revista Exame publicado em 18 de
Em relação ao Plano de cargos e salários, o mesmo foi instituído pela Lei Complementar
058/2004, apresentando dois níveis (I e II) e 15 classes (A - P). O nível I corresponde aos
professores com formação em curso superior de licenciatura plena com habilitação específica
54
para o magistério da educação básica, e o nível II corresponde ao mesmo acima citado somado a
ainda os níveis especiais, em extinção, para os professores cuja formação (nível médio,
licenciatura curta) não atende aos atuais critérios de ingresso na rede. As classes dizem respeito
ao tempo na profissão, desempenho e qualificação profissional. Embora seja feita uma avaliação
anual dos professores, a promoção só pode ser concedida após quatro anos na classe A (classe de
ingresso) e a cada dois anos nas demais classes. Macedo e Neto (2009) trazem críticas de uma
não promover profissionais. Os autores trazem ainda que as avaliações não levam em
Em relação à hora atividade, está previsto um dia de planejamento por semana (quatro
horas), que equivale a 20% da jornada de 20 horas semanais, o que se contrapõe à lei do Piso que
prevê dedicação de 1/3 da carga horária para atividades extraclasse. Macedo e Neto (2009)
colocam, em pesquisa feita com docentes do município de Natal, que 77,9% dizem levar
docente.
Sobre a educação inclusiva, legalmente a mesma passou a ser oficializada no Brasil pela
LDB. Menezes, Bartelmebs, Ramos e Lahn. (2016) colocam as falhas e desafios da inclusão no
sistema educacional brasileiro, não garantida apenas pela inserção do aluno na escola, trazendo os
55
receios e inseguranças que perpassam os professores na lida com o tema, além de provável
sobrecarga. A Resolução 05/2009, que fixa as normas relativas à educação das pessoas com
número mínimo de alunos (25) por turma para os anos iniciais (1º ao 5º) compreendendo o limite
de três alunos com NEE por turma, além da disponibilização, a cada vinte alunos por turno com a
coleta, a pesquisadora entrou em contato com o setor responsável pela educação especial da
Secretaria de Educação do Município de Natal e foi trazido que os auxiliares são prioritariamente
demandados para casos de alunos com autonomia reduzida, priorizando demandas ligadas a
pedagógicas. Também foi trazido que os auxiliares tratam-se muitas vezes de estagiários de
cursos de licenciatura, o que diz das possibilidades de tratamento da demanda, não possuindo
diminuição da distorção idade-série, Acelera e Se liga, promovidos pelo Instituto Ayrton Senna.
com no mínimo dois anos de distorção idade-série, enquanto o Se liga volta-se para alunos do
funcionamento, com no máximo 25 alunos por turma, sem alunos com NEE, materiais e ritmo
Coutinho (2014) colocam a falta de comunicação destes programas com a equipe gestora da
escola, enfatizando seu caráter pontual, além do funcionamento em condições específicas que não
56
do desempenho (Thiesen & Durli, 2016). Durante a coleta observou-se o caso de uma escola em
que o programa sobrecarregava outras turmas que ficavam com mais alunos especiais do que o
limite estabelecido pela legislação municipal (três alunos com NEE), além de possuírem mais de
25 alunos no total.
A respeito dos vínculos docentes de caráter temporário, Macedo e Neto (2009) enfatizam
esta forma precarizada de trabalho também presente no município de Natal, embora em menor
proporção do que em outros municípios, envolvendo menor gasto por parte do governo pelo não
pagamento de FGTS, férias e não acesso à progressão de cargos e salários, além de ratar-se de
Municipal de Educação de Natal de 580 professores afastados de suas funções, 400 por questões
19,74% por questões médicas. Número inferior, apesar de relevante, ao encontrado pela pesquisa
estados (Pará, Rio Grande do Norte, Goiás, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná e Santa
Catarina), chegando a uma média de 28% de afastamentos de sala de aula nos últimos 24 meses
através da linguagem, dos instrumentos e das relações (Asbahr, 2005), perspectiva abarcada pela
exploração de uma parte da população por outra. Uma parcela reduzida detentora dos meios de
produção e outra que necessita vender sua força de trabalho para sobreviver. O trabalho é
destituído de seu saber (Asbahr, 2005). Nesse quadro, o trabalho pedagógico apresenta
particularidades. No caso da educação pública, trata-se de trabalho não produtivo, pois como não
visa o lucro, não produz mais-valia para um empregador. É também um trabalho não material,
pois seu produto não é palpável, trata-se de um serviço. No trabalho pedagógico, o produto e o
ato de produção não podem ser separados. Sobre isto, Paro (1993) aprofunda a discussão
colocando que a aula do professor é o seu trabalho, ao passo que o produto não se restringe ao ato
De acordo com o autor, o aluno é objeto de trabalho, pois sobre ele incide o trabalho do educador
que o transforma para além do momento da aula, mas é também sujeito ativo de seu processo de
separação total entre processo produtivo e produto, o Capital não exerce controle direto no
trabalho pedagógico, mas o faz de forma política e ideológica (Asbahr, 2005). Ao enfocar o
processo de constituição da consciência enquanto produto subjetivo da atividade dos homens com
outros homens e com objetos, Leontiev (2004) compreende o processo de significação como
(p.102), pois este encontra “um sistema de significações pronto, elaborado historicamente, (...).”
sujeito na constituição de sua personalidade configura o sentido pessoal atribuído que se constrói
na vida pela atividade (Leontiev, 2004). O autor coloca que em etapas anteriores da evolução
comunhão com sua sociedade, indivíduo e grupo pouco se distinguiam. No entanto, sob o
contraditórios.
Este processo é compreendido por Leontiev como processo de alienação, que se enraiza e
manifesta no contexto da atividade. Haddad e Silva (2012) colocam que a separação entre
trabalho material e intelectual, no contexto da escola, tem produzido uma divisão entre teoria e
“Educação e Humanização”, pode ser compreendida, em sua elaboração social e histórica, como
desenvolvimento psíquico, além da formação da postura crítica do aluno, possibilitando que este
tenha acesso ao processo de produção do conhecimento. Vasconcellos (1999) é citado por Asbahr
(2005) ao falar sobre a alienação docente enquanto caracterizada pela falta de compreensão e
domínio nos vários aspectos da tarefa educativa. O autor aponta a dimensão sociológica, ou
histórico processual, referente à falta de clareza sobre a realidade em que se vive (como as coisas
chegaram ao ponto em que estão); a dimensão política e filosófica, relativa à falta de clareza
quanto à finalidade do que se faz (educação para quê, que tipo de homem e de sociedade se
deseja formar); e, por fim, a dimensão pedagógica, que corresponde à falta de clareza em relação
à ação mais específica em sala de aula. Estas dimensões envolvem a relação de sujeitos e
conteúdos, reprodução do livro didático ou espera pela passagem do tempo enquanto os alunos
também realizam atividades sem sentido (Asbahr, 2005). A autora cita Basso (1994) na
explicitando que esse fenômeno não é simplesmente subjetivo, mas produzido em condições
trabalho docente como unidade dialética.” (Asbahr, 2005, p.62). Por outro lado, Haddad e Silva
60
na relação com os outros (Lima, 2012). Tardif (2013) coloca pontos considerados importantes da
além dos mesmos. Pastré (2012) refere-se à compreensão de uma constelação de saberes
exemplo. De acordo com Nogueira (2012), o trabalho se constitui na tensão entre formação e
atuação profissional. Lima (2012) entende que ensinar é fazer escolhas constantemente em
61
interação com os alunos e cita Tardif (2002) na compreensão de que essas escolhas dependem da
traz que as condições de trabalho são muitas vezes tratadas de forma marginal e constata a lógica
(2012) compreende que “os diversos discursos produzidos acerca do trabalho do professor são
melhorias nas condições de trabalho, possuindo uma visão do trabalho separada das condições
No tocante às funções docentes, Lima (2012) faz uma síntese com base nos trabalhos de
Libâneo, Oliveira e Toschi (2003) e Tardif e Lessard (2005), estabelecendo três dimensões
principais: a relação com o ensinar, que envolve a interação com o aluno, o planejamento do
escola, na construção do PPP, conselhos de classe, associações de pais e mestres, reunião de pais,
etc.
Em relação às tensões, escolhas e desafios do ato de ensinar, Lima (2012) traz a tomada
de decisão dos professores entre avançar a turma ou ocupar-se dos alunos com dificuldades,
afastar os que perturbam ou integra-los, trabalhar no coletivo visando atingir o individual, avaliar
sem excluir, gerir as heterogeneidades da turma e sua diversidade garantindo o aprendizado, além
seu papel ativo, essencial para a aprendizagem, etc. No tocante a essas questões que envolvem a
prática docente, Charlot (2008) aponta que, para além de um simples reflexo das contradições
sociais, as contradições do trabalho docente se arraigam nas tensões inerentes ao ato de ensino-
aprendizagem. De acordo com o autor, o modo como se gerem essas tensões dependem da
trabalho do professor no atual contexto brasileiro tendo por base o trabalho de Charlot (2008),
são elas: o professor como herói ou vítima, a culpa do professor ou a culpa do aluno no fracasso
necessidade de ser autoritário ou amar os alunos e, por fim, a escola vinculada à comunidade ou a
Lima (2012) cita Nóvoa (1998) na constatação de um paradoxo vivido pelo professor de,
por um lado, ser avaliado, acusado de ser um profissional medíocre e tratado com desconfiança e,
por outro, ser alvo de discursos que o colocam como elemento essencial para a melhoria da
63
qualidade do ensino e progresso social e cultural. Trata-se do paradoxo do professor herói versus
vítima, herói da pedagogia e vítima mal paga e sempre criticada. Charlot (2008) aponta que essa
formação dos alunos, sendo as tentativas de reforma ou inovação pedagógica vistas como
perspectiva do:
Professor normal, que trabalha para ganhar um salário e sustentar sua família, que
vive situações esgotantes e, também prazeres dos quais pouco fala, que se sente
objeto de críticas, mas, afinal de contas, orgulha-se do trabalho feito, que ensina
com rotinas provadas, mas, às vezes, abre parênteses construtivistas. (p.22).
Em relação à tensão sobre em quem recai a culpa pelo fracasso escolar: professor ou
aluno, ambos são interpelados em uma lógica que nem sempre considera o contexto e lutam para
manter a própria dignidade. Cabe colocar novamente que o aprendizado requer mobilização
concorrência, onde o professor é visto como único ativo no processo, cabendo ao aluno uma
postura passiva de escutar e se comportar (Charlot, 2008), o que dificulta uma compreensão mais
construtivistas nas escolas. Charlot (2008) explica que a pedagogia tradicional caracteriza-se por
uma postura de rigor e autoridade, tendo como prática fundamental, primeiro a explicação dos
conteúdos e regras da atividade para que o aluno possa aplicá-los. Já o construtivismo põe a
64
produzido pelo homem, do saber científico, como coloca Vigotski (2014). Deste modo, “(...) a
questão fundamental não é saber se a professora é “tradicional” ou “construtivista”, mas como ela
resolve duas tensões inerentes ao ato de ensino e ao de educar.” (Charlot, 2008, p.25), uma vez
que “Ensinar é ao mesmo tempo, mobilizar a atividade dos alunos para que construam saberes e
humanos.” (p.25). O autor coloca que o importante é compreender que as aprendizagens nascem
professores se digam construtivistas, ainda que atuem basicamente de forma tradicional por
trabalharem em escolas organizadas para tais práticas, regidas por uma lógica de atribuição de
notas e avaliação externa que produzem alunos que buscam decorar conteúdos, colar, “sobreviver
numa escola que os coloca em situações que contradizem os objetivos de espírito crítico e
produz uma hierarquia escolar que legitima e prenuncia uma hierarquia social (Charlot, 2008).
Existe simultaneamente o discurso da escola democrática, universal, de que todos devem ser bem
Restaurar a autoridade e amar os alunos é mais uma tensão abordada. Nesse ponto Charlot
(2008) coloca que não há educação sem exigências, normas, autoridade, e também não há
educação sem, nas palavras do autor, simpatia antropológica dos adultos pelos jovens, que seria a
balanço/ambivalência entre autoridade e mimo, característica inerente à relação dos adultos com
sendo a cidadania outra via de restauração da autoridade. Esta possui duas compreensões: uma
acrítica que atua no sentido do adestramento, bom comportamento, sobretudo das classes
desfavorecidas, e outra ligada à concepção da existência de direitos e deveres, capaz de olhar para
Por fim, Charlot (2008) coloca a tensão da escola vinculada à comunidade e da escola
legítimos à medida que contribuem para esclarecer o mundo particular da criança singular e
ampliá-lo” (p.31). Este autor enfatiza os desafios da conciliação entre as duas ambições na
sociedade contemporânea, em que a professora compartilha cada vez menos do espaço de vida de
(...) Se espera cada vez menos da professora que ela leve os alunos ao encontro do
universal e que ela lhes proporcione as chaves de compreensão da sua vida, e cada
vez mais que ela possibilite aos nossos filhos serem aprovados no vestibular
(p.31).
padronizam o conhecimento.
66
As discussões que procuram relacionar trabalho e saúde/doença têm uma longa história na
área das ciências sociais como no campo da saúde e suas especialidades (Souza & Leite, 2011).
Na virada do século XIX para o XX, com a nova organização do trabalho inaugurada pelo
taylorismo e fordismo, que aprofundou a alienação do trabalho pela divisão mais pronunciada
entre trabalho manual e intelectual, controle rígido da gerência sobre o processo de trabalho,
intensificação laboral, dentre outros, houve aumento das discussões sobre o tema da saúde no
trabalho, embora as produções se voltassem em sua maioria para o interesse das empresas,
produção (Souza & Leite, 2011). Foi a partir dos anos de 1960, quando o próprio movimento
operário passou a criticar mais incisivamente as condições de trabalho, que a discussão ganhou
outros campos: sociologia, economia, antropologia, história, psicologia, etc., sendo marcada pela
multidisciplinaridade (Souza & Leite, 2011). Na década de 1970 ocorreram mudanças no mundo
(Harvey, 2003, como citado em Souza & Leite, 2011), caracterizado por outro nível de
outro modo de organização do trabalho inspiraram novas formas de conceber a relação entre
ambas marcadas pela interdisciplinaridade (Silva & Ramminger, 2014; Souza & Leite, 2011). A
ergonomia surgiu a partir do desafio, após a segunda guerra, de reunir profissionais de diferentes
disciplinas com o objetivo de adaptar o trabalho ao homem, e não o contrário (Silva &
de centrar-se no componente humano, como fez a tradição inglesa, estabelecendo diferenças entre
possibilidades e imprevistos diante da ação (Silva & Ramminger, 2014). A ergonomia interessa-
se pela atividade enquanto interação dinâmica entre o sujeito e sua tarefa, levando em conta o
Por sua vez, a psicopatologia do trabalho apontou para a relação entre determinadas
enquanto nociva à saúde mental dos trabalhadores (Silva & Ramminger, 2014). Souza & Leite
(2011) colocam que a perspectiva inaugurou um novo paradigma teórico de referência, cujos
invés de opostos; Por outro lado, cabe mencionar a percepção de uma dimensão dinâmica do
e seus coletivos enquanto participantes de seu processo saúde/doença e não apenas receptores
68
afetam o trabalho dos professores, cunhando o termo “mal-estar docente”, cuja maior
e em seu entorno social ao invés de isolado na sala de aula (Souza & Leite, 2011). O mal-estar
constantes exigências profissionais, violência, indisciplina, etc., que podem gerar uma crise de
Sobre a relação saúde e trabalho docente, existem diversas pesquisas que abordam o tema
Particularmente em relação a esta última o professor é uma das categorias mais estudadas e
suscetíveis, considerando que a síndrome costuma ocorrer em profissões que envolvem relações
discrepâncias entre expectativas e realidade (Souza & Leite, 2011; Cruz & Lemos, 2005;
Carlotto, 2002). O burnout designa sofrimento por exaustão física e emocional pela exposição
contínua a situações estressantes no contexto de trabalho, sendo sua definição mais aceita a
colegas, e realização profissional reduzida, relativa à auto avaliação negativa (Souza & Leite,
69
2011; Batista, Carlotto, Coutinho & Augusto, 2010; Carlotto, 2002). O burnout é um fenômeno
trabalho, este considerado para além da sala de aula e da instituição, levando em conta fatores
do trabalho de origem francesa que será mais bem explicitada e aprofundada no capítulo seguinte,
A clínica da atividade diz respeito a uma abordagem clínica do trabalho cujo principal
que se enraíza na ergonomia e psicopatologia francesas, dos estudos do italiano Ivar Oddone, da
fruto da tensão entre tarefa (prescrito) e atividade efetivamente realizada face às variabilidades
pessoais e ambientais com que o trabalhador se depara na prática (Clot, 2006). Em relação à
psicopatologia francesa, cabe sobretudo mencionar os trabalhos de Le Guillant (cf Antunes Lima,
2006); Clot identifica-se com a abordagem clínica que busca a restituição da capacidade
diminuída, além da percepção dos trabalhadores como agentes do processo saúde/doença (Clot,
relação ao conceito de saúde, que serão exploradas mais adiante. Sobre os estudos de Oddone,
Clot ressalta a importância atribuída pelo autor à participação dos próprios trabalhadores na
psicologia do trabalho.
A perspectiva teórica mais ampla que enquadra a proposição da Clínica da Atividade, tal qual
termos histórico-culturais estabelecida por Vigotski (Vigotski, 2014), que permite relacionar
71
coletivos humanos, a cultura e o conflito (Clot, 2006). Doravante serão explorados os operadores
teóricos centrais da clínica da atividade para melhor compreensão da abordagem e relação com a
perspectiva histórico-cultural.
da subjetividade humana, preenchendo uma função psicológica que “põe o sujeito à prova de suas
obrigações práticas e vitais com relação aos outros e com relação ao mundo” (Clot, 1999, p.219,
tradução nossa). Trata-se de uma atividade que requer “(...) a capacidade de realizar coisas úteis,
de estabelecer e manter engajamentos, de prever com outros e para outros algo que não tem
sujeito/coletivo e sociedade, ainda que essa conexão possa se estabelecer de forma alienada,
como visto em seção anterior. A função psicológica do trabalho entende-se por um engajamento
histórico, social, coletivo, pessoal, cognitivo e afetivo através da atividade, que tece, nessa
atividade, abarcando, para além do que deve ser feito e do que se faz efetivamente, as vivências
internas do sujeito (Clot, 1999). O real da atividade envolve os conflitos do real e inclui, além do
que é feito, aquilo não se faz, que não se pode fazer, que se busca fazer sem conseguir (os
fracassos), que se desejaria ter feito, que se deixa para depois e ainda que se faz para não fazer o
que deveria ser feito, que precisa ser refeito ou que se faz sem querer fazer (Clot et al., 2000;
72
2001; 2008). O autor refere-se a Vigotski na compreensão de que “O homem está a cada minuto
pleno de possibilidades não realizadas” (Clot, 1999, p.119 tradução nossa). As atividades
desarmônica (Clot et al., 2000). Esta compreensão da atividade, que envolve seus bastidores
e amplia o sentido do real, sendo “a fadiga, o desgaste violento, o estresse” compreendidos “tanto
por aquilo que os trabalhadores não podem fazer, quanto por aquilo que eles fazem.” (Clot, 2001,
p. 5).
de recursos para fazer frente aos impasses do real, ou meios para desenvolver estes recursos,
compreendida na perspectiva de Canguilhem (2009), não como ausência de doença, mas como
ofício, que tem base social e pode adquirir uma função psíquica interna, composta por quatro
ofício seria o resultado do confronto entre essas quatro instâncias que o constituem. A dimensão
pessoal refere-se à atividade sobre/por si mobilizada e sua expressão singular, a interpessoal diz
respeito ao fato de que toda atividade profissional é dirigida a outro (além de si mesmo), e se não
o fosse perderia o sentido (Clot, 1999; 2013). A dimensão impessoal refere-se ao prescrito para a
73
ofício para além de suas situações particulares, orientando-o e sendo também passível de
situações (Clot, 1999; 2013). Por fim, há a dimensão transpessoal referente à história coletiva de
um grupo profissional “que passou por muitas situações e dispôs de sujeitos de diferentes
gerações a responderem por ela, de uma situação a outra, de uma época a outra.” (Clot, 2013,
p.06). Essa história “(...) que forma o perímetro das ações encorajadas ou inibidas em um dado
(p.07).
tornando vivo o ofício em meio aos desequilíbrios e discordâncias criativas ou destrutivas entre
elas, o que permite formar rupturas e também novas ligações (Clot, 2013). Este autor observa que
instância aprisiona as outras e deixa de se tornar meio para o desenvolvimento destas e, portanto,
do ofício.
gênero profissional, este diz de uma memória coletiva de saberes e gestos pertencentes a um
coletivo de trabalho que marca o pertencimento a um grupo e orienta a ação (Clot et al., 2000;
2008). O gênero permite ao trabalhador o recurso a uma construção compartilhada para fazer uso
diante das situações que definem sua atividade. Trata-se de um corpo que medeia a relação entre
os sujeitos e entre eles e o objeto de trabalho, vinculando entre si os que participam de uma
situação (Clot, 1999). O gênero é uma entidade dinâmica e nunca completamente acabada capaz
74
de se desenvolver através das variações nas suas formas de utilização face às diferentes situações
pessoal da atividade (Clot et al., 2000; 1999). O estilo transcende as leis genéricas, a memória
impessoal, mantendo o benefício de beber de sua fonte e mudar a regra quando necessário. Trata-
gênero, o que está intimamente ligado à saúde. Nesse sentido, Clot (2008) coloca sua percepção
de saúde ligada à compreensão de Canguilhem (2009), em que sentir-se saudável é sentir-se mais
do que normal (no sentido assimilado a uma norma), indo além da simples adaptação ao meio. A
saúde compreende a doença como etapa a sobrepor, não anular, passível de produzir
ampliar o leque de ação, de instituir novas normas possíveis de vida diante de um desafio,
2008). O autor traz a perspectiva de Vigotski na busca para compreender, para além da doença,
como se comporta o doente, como este desenvolve sua doença. Com base nessas reflexões, Clot
(2008) coloca que existem dois destinos para as atividades desafiantes: a defesa ou a resposta de
Para Clot (2008, p.98, tradução nossa), sobre os desafios do trabalho “(...) a resposta possível
supõe sempre a elaboração do perigo vivido no seio do coletivo que pode, então, lhe dar um
sentido dentro de uma história.”. Esse posicionamento revela a importância dos coletivos de
trabalho na saúde dos sujeitos envolvidos. A emancipação representada nos estilos pessoais de
cada trabalhador, bem como seus entraves, tem potencial para alimentar o coletivo e revitalizar o
gênero, entretendo a sua saúde, desenvolvendo-o, fugindo à rigidez. Essa reelaboração constante
do gênero pelos coletivos face às situações reais tem potencial inclusive de redefinir prescrições
trabalho bem feito indicado por uma tradição profissional viva enquanto norte do “bem estar”,
com Clot (2002, p.4), “A saúde se degrada no ambiente de trabalho sempre que um coletivo
confrontado às más surpresas de uma organização do trabalho que deixa “sem voz” face ao real.”.
76
A clínica da atividade visa intervir, então, junto aos trabalhadores no sentido da busca pela
revitalização dos estilos pessoais e do gênero profissional por sujeitos e coletivos, estimulando o
olhar e a reflexão sobre a própria atividade, o confronto com a mesma e com a atividade dos
se de uma clínica que busca o desenvolvimento e a restauração da saúde por meio da ampliação
da potência de ação, do cuidado coletivo com o gênero profissional no sentido do trabalho bem
feito. Procura-se transformar para compreender, o que implica em abordar a atividade com outra
ótica, de modo que a experiência vivida possa ser ou vir a ser meio de viver outras experiências
(Clot, 2001; 2008). Clot (2008) menciona Vigotski na compreensão de que uma ação passada
pelo crivo do pensamento transforma-se em outra, por sua vez, refletida. Para compreender a
atividade, suas relações com o real e o realizado, é preciso colocá-la em movimento, provocar o
desenvolvimento de modo a compreender sua arquitetura escondida, suas leis psicológicas, como
Enquanto unidade de análise da atividade de trabalho, Clot (1999) apresenta três dimensões já
em situação real. A atividade dirige-se a três polos da ação: o outro, referindo-se à dimensão
interpessoal já mencionada; O objeto, que corresponde à tarefa, aquilo que deve ser feito,
relacionado ao prescrito para a situação; E si próprio, o que faz referência à dimensão pessoal,
direções encontra-se a dimensão transpessoal, o gênero profissional, fonte histórica e coletiva que
o sujeito utiliza para elaborar e reelaborar sua ação face ao real. Trabalhar corresponde a, de
acordo com as circunstâncias, medir as tensões entre os polos da atividade e apoiar-se em cada
77
um para se emancipar dos outros dois de modo a permanecer sujeito da situação, criativo de
4.2. Vivência
Esta seção visa aprofundar o conceito de vivência, ou perezhevanie (em russo, com grafia
diferentes nuances que adquire no contexto da teoria histórico-cultural. Para a língua espanhola e
para o português a palavra que melhor traduz o seu significado, inclusive em relação a outros
idiomas, é “vivência” (Veresov, 2014). Através de uma análise das definições dadas à
perezhevanie por estudiosos de Vigotski, Veresov (2014) enumerou diferentes ideias centrais que
compreensão e cognição.
De acordo com Veresov (2014), perezhevanie pode ser compreendida como um prisma
que refrata a experiência. A metáfora do prisma, que refrata, opõe-se à metáfora do reflexo, esta
última compreendida dentro de uma lógica de estímulo-resposta, a qual foi criticada por Vigotski
ocupado pelo indivíduo neste ambiente dinâmico, criando uma unidade indivisível em que estão
experiência em diferentes ângulos (Veresov, 2014). O autor traz ainda que a perezhevanie é
e afetivos.
Em resposta à questão “Como o social torna-se individual?” Vigotski faz menção à “lei
cultural existe primeiro enquanto relação social, e não simplesmente nas relações sociais, como
erroneamente costuma-se compreender (Veresov, 2004; 2010; 2014). Essas relações sociais
tornam-se funções mentais através de uma experiência de “drama”, representada em russo pela
perezhevanie.
desenvolvimento.
vivência. O novo olhar sobre a atividade, a confrontação com a mesma e com os pares no
79
Ainda que não seja possível garantir que a aplicação da clínica da atividade com sujeitos
e/ou grupos provoque drama e altere o curso do desenvolvimento, a abordagem é passível de pôr
possível entrever o prisma, o modo como se vivencia determinada experiência e o que isso diz de
5. Método
pesquisa tem caráter descritivo-exploratório e clínico. Foram utilizados métodos mistos de caráter
súmulas de informação (Da Rocha Falcão & Régnier, 2000) e a abordagem clínico-qualitativa
Em relação aos princípios éticos, a pesquisa foi aprovada por comitê de ética acreditado
no âmbito da UFRN.
5.1. 1ª Etapa
5.1.1. Amostra.
instrumentos de coleta de dados utilizados, foi efetuado cálculo amostral a partir de população de
(2012), totalizando 1883 docentes. Considerou-se erro amostral de 5%, nível de confiança de
95% e percentual máximo de 10%. Foi utilizado aplicativo de cálculo amostral desenvolvido por
Glauber Santos (2016) e o número encontrado foi de 129, sendo estabelecido para a pesquisa o
Embora o foco previamente estabelecido para a presente pesquisa tenha sido os docentes
fundamental como um todo (1º ao 9º ano) devido à falta de especificidade dos dados encontrados,
uma vez que as informações disponíveis referiam-se aos professores do ensino fundamental em
geral. Deste modo, o n (efetivo amostral) calculado e definido para a pesquisa respeita e mesmo
Para a aplicação dos questionários foram constituídos três grupos, tendo em vista dados
referentes ao IDEB de 2013 das escolas municipais de Natal/RN. Assim, foram estabelecidos três
professores. No decorrer da pesquisa os dados do IDEB foram atualizados para o ano de 2015,
correspondente à faixa de pontuação mais baixa (G1: 3,4 – 4,3), o segundo à faixa intermediária
(G2: 4,4 – 4,8) e o terceiro à faixa de pontuação mais alta (G3: 4,9 – 6,5). Esse cálculo foi
realizado com base na distribuição dos valores em uma curva normal, cada grupo representando
porcentagens próximas entre si das instituições avaliadas (entre 30% e 40%). O estabelecimento
profissional dos docentes em função do enquadramento das escolas conforme estabelecido pela
Houve sorteio das escolas, dentro de cada grupo de pontuação do IDEB, com o auxílio de
Apesar das críticas tecidas ao sistema de avaliação da educação pública e das escolas, o
IDEB foi considerado na coleta por representar o critério de referência atual para avaliar a
82
“qualidade” das escolas e educação. Sua inclusão na pesquisa não se isenta de uma perspectiva
5.1.2. Instrumentos.
pesquisadora, com algumas questões respondíveis através de escalas de quatro pontos tipo Likert.
realização deste cálculo que deve considerar o número de dependentes e as demais fontes de
de ensino atual, o nível e a classe em que o profissional se situa em relação ao plano de carreira
(o que indica sua faixa salarial para o cargo ocupado), o ano da turma em que leciona, seu
vínculo, o turno de trabalho, a quantidade de alunos na turma, se possui alunos com NEE,
da satisfação (em escala Likert) em relação aos processos formativos vividos. Por fim, os
aspectos pedagógicos e participativos envolvem questões de avaliação pessoal (em escala Likert)
relativas à familiaridade com o projeto político pedagógico das escolas, percepção do tempo
Considerando 1 “Insatisfeito” e 4 “Muito satisfeito”, como você se situa em relação à sua satisfação no
1-------2-------3-------4
Essas questões referem-se a aspectos da profissão que dizem das políticas e elementos
contextuais e pessoais de inserção do professor que impactam em sua atuação, além de apontarem
versão resumida aplicado no levantamento Sumer 2003 – França (DARES-DRESS, 2008) para
algumas adaptações de termos utilizados para adequação ao público alvo, bem como o acréscimo
de duas questões.
“demanda psicológica” da atividade, que implica em que medida a atividade exige em termos de
Um trabalho com alta demanda psicológica (escore acima da mediana para a dimensão) e
baixa latitude de decisão (escore abaixo da mediana para a dimensão) configura um quadro de
risco psicossocial, a presença de suporte social sendo considerada como atenuante e sua
84
falta/escassez (escore abaixo da mediana para a dimensão) como agravante para o referido
contexto. Por sua vez, uma situação de baixa demanda psicológica e alta latitude de decisão
constitui um perfil de baixo risco psicossocial. Uma situação de alta demanda psicológica e alta
trabalho passivo.
O JCQ na versão resumida possui 26 questões e dispõe de uma formula (anexo B) para
Foram acrescentadas duas questões nos moldes das empregadas no questionário: uma
discordo fortemente). No entanto estas questões não entraram no cálculo das dimensões referidas,
servindo apenas para complementar o quadro de percepções dos professores sobre o seu trabalho.
5.1.3. Procedimentos.
permissão e apoio para que, durante o intervalo, a pesquisadora divulgasse a atividade aos
consentimento livre e esclarecido (TCLE). Uma via para o professor e outra para a pesquisadora.
número de telefone dos profissionais que concordassem em fornecê-lo a fim de lembra-los com
certa antecedência, via mensagem, de seu retorno à escola no intuito de garantir mais respostas.
iniciais das escolas participantes para identificação posterior dos seus grupos de pertencimento.
professores pela assinatura ou rubrica na via do TCLE entregue à pesquisadora junto aos
à posteriori, relacionados às respostas fornecidas nos questionários pudessem ser sanados com os
5.1.4. Análise.
variáveis e teste estatístico Qui-quadrado para verificação da relação de dependência entre estas,
5.2. 2ª Etapa
5.2.1. Participantes.
A partir dos perfis gerados pela análise dos resultados da primeira etapa da pesquisa
representando perfis divergentes. Uma em situação de risco psicossocial, de acordo com o JCQ, e
(preservando seu direito ao anonimato) viabilizou uma escolha consciente dos mesmos para a
em participar das atividades propostas. A resposta foi positiva por parte de ambas as
primeiro contato para a entrega dos questionários, razão que reforçou os motivos de sua escolha.
5.2.2. Instrumento.
Foi utilizada a entrevista de Instrução ao Sósia (IaS), de caráter clínico qualitativo, que
trazido no capítulo referido, considera-se que a perspectiva seja também pertinente para
basicamente na proposta aos trabalhadores da seguinte situação fictícia: “Suponha que eu serei
seu sósia e que amanhã vou substituí-lo em seu local de trabalho. Quais instruções você deveria
me transmitir para que ninguém percebesse a substituição?”. O sósia (pesquisador) tem a função
atividade, aspectos explícitos e implícitos, até que pareça haver um esgotamento da situação. É
necessário que, antes da instrução, uma sequência de trabalho tenha sido delimitada, tratando
Uma vez que o trabalhador assume a posição de instrutor de sua própria atividade é
importante que ao referir-se a ela e ao sósia no momento da instrução, ele utilize a segunda
pessoa, “tu” ou “você”, ao invés da primeira, “eu”, por exemplo: “Então você irá descer as
escadas”, em vez de “Então eu irei descer as escadas”. Trata-se de projetar a atividade no futuro,
no sósia, em posição dialógica com um “eu” social, conforme relata Clot (1999) ao usar as
palavras de Vigotski sobre promover “um contato social consigo mesmo”. O exercício permite
que o trabalhador acesse sua atividade indiretamente, por meio do sósia, aproximando-se de
modo novo da mesma e permitindo diferentes leituras e tomadas de consciência, bem como
instrução, é importante que se questione sobre o que o exercício suscitou ao trabalhador a fim de
São usualmente propostos encontros de instrução, que devem ser gravados, seguido de
quê aconselha-se ao profissional que leve as gravações para casa, ouça-as e transcreva-as. Essa
prática permite ao trabalhador ouvir-se e realizar uma segunda elaboração reflexiva acerca da
própria atividade que deve ser compartilhada com o grupo de análise em um segundo encontro.
porquês.
Originalmente, como proposto por Clot, a IaS deve ser realizada com um coletivo de
professoras), na presente pesquisa optou-se por realizar a IaS individualmente com cada
profissional, mas ainda permite o confronto do trabalhador com sua própria atividade, o contato
5.2.3. Procedimentos.
Um dia de observação em sala de aula para familiarização com o contexto de atuação foi
agendado com as participantes, no entanto apenas uma observação foi possível devido a uma
greve dos porteiros que afetou a instituição onde lecionava uma professora no dia combinado. O
horário vago na escola com a profissional findou sendo utilizado para a realização do primeiro
momento da entrevista de IaS. Esta opção foi feita devido à possibilidade de surgimento de
outros imprevistos futuros e do prazo limitado para a finalização da coleta, o que poderia colocar
entrevista de IaS, que foi gravada, uma vez que a situação não era propícia para deixar os
exercícios nas mãos das participantes devido à rotina cheia das mesmas e ao fato de que a
atividade não partiu de uma demanda. Apesar disto, o material escrito foi enviado às professoras
com cerca de uma semana de antecedência em relação ao encontro seguinte a fim de que as
profissionais pudessem refletir e olhar novamente para a própria atividade de acordo com sua
disponibilidade.
Tendo em vista, para além do caráter clínico da IaS, seu papel enquanto instrumento na
pessoais e contextuais, a segunda parte da entrevista, que pode ser compreendida como etapa de
confrontação com a atividade pelo trabalhador, foi igualmente gravada para transcrição e análise.
Esta segunda etapa da IaS, que também corresponde ao seu encerramento na presente
levando em consideração as ênfases, repetições e diversidade dos temas abordados. Nesta fase, as
professoras participantes foram convidadas a trazer suas impressões e reflexões sobre o encontro
anterior e registro escrito enviado (apenas uma professora pôde ler). Em seguida foram
distribuídas duas cópias com os trechos selecionados, uma para a professora e outra para a
pesquisadora. As duas professoras preferiram que a pesquisadora lesse enquanto elas próprias
percepções.
Algumas perguntas foram feitas pela pesquisadora ao longo do processo, sobretudo para
esclarecer conceitos ou situações que não haviam sido bem compreendidos ou explicitados.
encontro com uma das professoras participantes cujo discurso permaneceu bastante fixo nos
entraves da atividade. Essa estratégia teve a intenção de gerar movimento, explorar diferentes
5.2.4. Análise.
da transcrição dos dois encontros da entrevista de IaS com as profissionais. Dois registros da
participante, e mais dois registros referentes à etapa de confrontação com o próprio relato, um
O material escrito foi analisado de acordo com o proposto na clínica da atividade, pela
revelando o campo do real da atividade. Buscou-se tecer relações com aspectos contextuais e
6. Resultados e discussão
Da primeira etapa da pesquisa participaram 172 professores dos anos iniciais do ensino
pertencentes ao grupo de IDEB mais baixo (3,4 – 4,3), totalizando 62 professores, sete referente
ao grupo intermediário (4,4 – 4,8), com 52 professores, e oito representando o grupo com
a) Aspectos sociodemográficos.
Verificou-se que 91,3% da amostra é composta por mulheres e 8,7% por homens, o que
tratando dos primeiros anos do ensino fundamental, em que os alunos são mais novos.
professores com 40 anos ou mais. Na faixa de 23-42 anos encontram-se 46,5% dos professores,
enquanto 53,5% estão na faixa dos 43-68 anos. Estão casados ou em união estável 59,3% dos
trabalhadores, 37,2% são solteiros ou divorciados e 3,5% viúvos. Possuem filhos 71%, enquanto
b) Aspectos de formação.
para atuação nos anos iniciais do ensino fundamental (magistério de nível médio, curso normal
superior ou licenciatura curta) e 8,7% possuem outras formações (ciências sociais, história,
diferentes, 19,2% das quais não preenchem os atuais requisitos para atuação na área, embora se
88,4% dizem-se satisfeitos, enquanto 11,6% consideraram-se pouco satisfeitos. Possuem pós-
graduação 86% dos participantes, enquanto 14% não possuem. Tratam-se predominantemente de
especializações (75,5%), das quais 51% foram realizadas em instituições públicas e 49% em
programas de formação continuada oferecidos pela rede pública, 15% dos participantes relataram
nunca terem participado dos mesmos, enquanto 85% mencionaram participação em ao menos um
embora haja diversidades, sendo a ampla maioria dos profissionais formada em pedagogia por
revelando diversidade desta modalidade de formação, bem como apropriação da demanda pelo
94
foram pouco expressivas, exceto para as especializações (20,3%), revelando mais uma vez seu
caráter diverso. A satisfação expressa com os diferentes tipos de formação mencionados mostrou-
c) Aspectos ocupacionais.
Da população pesquisada 47% estão na profissão há até 15 anos, enquanto 53% lecionam
há 16-42 anos. Atuando no mesmo local de trabalho 48,8% lecionam há até cinco anos (21,5% há
Em relação ao nível da turma, 55,2% dos participantes lecionam nos anos iniciais do
Senna, entidade sem fins lucrativos de prestação de serviços educacionais, encontram-se 6,4%
dos professores pesquisados. No tocante a turno, 54% trabalham no turno matutino, 35,5% no
vespertino, e 10,5% em ambos os turnos na mesma escola. Possuem vínculo efetivo 92,4% da
entre 15-25 alunos na sala de aula, enquanto 47,7% possuem entre 26-37 alunos. Apenas 8%
possuem até 20 alunos em sala de aula, que seria o número máximo de alunos estipulado para os
95
anos iniciais do ensino fundamental pelo documento final do Conae de 2014 e estabelecido pelo
PL 4628/2016.
Nível I, que corresponde ao nível dos professores que não possuem pós-graduação ou em que a
mesma ainda não foi contabilizada pelo sistema. Encontram-se no Nível II 46% dos professores,
o restante equivalendo aos professores temporários, que não entram no cálculo da progressão de
carreira, aos que não informaram seu nível de pertencimento e àqueles que estão em um Nível
especial por não contemplar o perfil de formação inicial exigido. Chama atenção o fato que 86%
dos participantes possuem pós-graduação e 40% encontram-se no Nível I. Este resultado pode
ocorrer devido ao número de novos ingressantes com pós-graduação que precisam esperar para
terem seus títulos atualizados no sistema ou em razão de profissionais ainda estarem cursando a
o que pode revela um fenômeno recente. Durante a coleta diversos professores queixaram-se dos
atrasos em relação à promoção, que deve ser revista a cada dois anos. Muitos profissionais
nos Níveis IA e IIA, com 39,5% do total da amostra, relativos aos níveis iniciais para a carreira,
passíveis de promoção após quatro anos. Há igualmente concentração nas quatro classes do Nível
II após a classe A (B, C, D e E), juntas representando 23,3% do total da amostra, os demais
profissionais nos Níveis IA e IIA tem relação com uma elevada taxa de professores ingressantes
Em relação aos alunos com NEE, 54% dos professores têm alunos com o perfil na turma,
revelando a necessidade e demanda da inclusão na escola, enquanto 42% não possuem e para 4%,
de acordo com os professores, os alunos não apresentam laudo. Em relação aos laudos, durante a
coleta não ficou claro se os alunos mencionados pelos professores como possuindo NEE
apresentavam-no, o que pode tornar maior a porcentagem de alunos sem laudo que constam como
apresentando NEE de acordo com os docentes. Coloca-se a necessidade de avaliação dos alunos
para a investigação de suas demandas. Sobre a presença de professor auxiliar na turma, 33,7%
dos profissionais possuem auxiliar em sala e 66,3% não possuem. O número de auxiliares é mais
baixo do que o de alunos identificados com NEE, o que provavelmente significa que, diversas
vezes, o professor deve dar conta, sozinho, de situações potencialmente desafiantes. Apesar de a
legislação municipal estabelecer o limite de 25 alunos em classes que possuam alunos com NEE,
revela-se que 50,5% dos professores que dizem possuir alunos com este perfil na turma possuem
mais de 25 alunos. Isso pode ocorrer devido a não existência de laudo para estes alunos. Aponta-
se para a necessidade da avaliação e acompanhamento por equipe competente dos alunos com
suspeita de NEE, inclusive para desfazer suposições diagnósticas formuladas capazes de afetar
72,7% trabalham, enquanto 27,3% não trabalham. Exercem cargo de professor no contraturno
55,2% dos profissionais, 10,5% são coordenadores pedagógicos e 7% apresentam outra atividade
de trabalho. Dos cargos assumidos ligados à educação e à escola, 93,5% estão na rede pública
educação. A dupla jornada de trabalho para assegurar uma melhor sobrevida material pode
melhor sobrevida material permitida por uma dupla jornada de trabalho nem sempre vem
consideração que a profissão docente necessita de tempo adicional para estudo e planejamento, o
dizem possuir familiaridade, enquanto alegam ser pouco familiares ao mesmo 47,7%. No tocante
reflexão e atuação 66,3% dos profissionais declaram-se satisfeitos e 33,7% se dizem pouco
satisfeitos, 62,2% estão satisfeitos com o tempo disponível para planejamento, enquanto 37,8%
semanais 59,3% dos professores consideram-na presente e 40,7% acreditam que a mesma é
pouco presente.
planejamento, as reuniões pedagógicas e que consideram a discussão teórica pouco presente nas
mesmas, representando mais de 1/3 dos profissionais pesquisados. Aspectos relevantes, pois se
Durante a coleta, algumas professoras mencionaram que apesar de sentirem-se insatisfeitas com
próprias, diversas atribuições, nem sempre conseguindo dar conta do favorecimento de momentos
produtivos, corroborando com o trazido por Haddad e Silva (2012) sobre a assunção pelo
98
professores faltosos, etc.). A pouca familiaridade expressa com o PPP da escola por quase metade
da amostra também se destaca, uma vez que, como já mencionado, é prevista sua construção
coletiva pelas políticas que envolvem a gestão democrática, além de ser um instrumento
responsabilidade individual pela busca e familiarização com o PPP para a efetuação do trabalho,
o que pode apontar para o enfraquecimento da perspectiva deste instrumento no trabalho coletivo,
São ou foram membro do conselho escolar 42,4% dos profissionais pesquisados contra
57,6% que nunca foram membro. Dos professores que são ou foram membro, 58% se dizem
satisfeitos com as reuniões em termos de pertinência das discussões e tratamento dos problemas,
deliberação, informações) 57,6% dos professores consideram-se pouco ativos, enquanto 42,4%
consideram-se ativos.
sindicato por acreditarem existir ambições políticas por trás das ações tomadas, ficando os
direitos da categoria em segundo plano. Outros profissionais relataram terem se sentido rejeitados
chamando atenção ao direito dos alunos de terem aulas. Havia ainda profissionais recém-
chegados no município que declararam não possuir maior ligação com o sindicato,
porcentagem (42%) de professores insatisfeitos com as reuniões do conselho escolar, o que pode
apontar para seu caráter burocrático, mais do que participativo e democrático. Durante a coleta
observou-se que dificilmente professores não membro do conselho escolar participam das
no processo.
amostra e discordam 23,3% da mesma. Sobre a satisfação no trabalho, 78% dos professores
solidão no trabalho 69,8% dos profissionais relatam não se sentirem solitários, enquanto 30,2%
avanços no sentido da gestão democrática e participação, não é possível saber que momentos são
referidos e a qualidade dos mesmos. No caso das reuniões pedagógicas, por exemplo, mais de 1/3
dos profissionais encontram-se insatisfeitos. Em relação à solidão, pouco mais de 1/3 dos
profissionais relatou sentir-se só ao realizar seu trabalho, parcela expressiva que necessita de
atenção, uma vez que, de acordo com Clot (2002, p.4), “A saúde se degrada no ambiente de
trabalho sempre que um coletivo profissional torna-se uma coleção de indivíduos expostos ao
isolamento.”. A soma dos profissionais insatisfeitos com aqueles que se sentem solitários ao
realizar o seu trabalho, subtraindo a parcela na interseção das percepções, chega ao elevado
percentil de 40,7% da amostra. Chama também a atenção o elevado número de professores que se
diz satisfeito no trabalho, apesar das insatisfações e sentimentos de solidão expressos, o que pode
100
apontar para a satisfação com a atividade docente a despeito do reconhecimento das difíceis
0,05 de o fenômeno dever-se ao acaso. Também serão evidenciadas algumas situações em que
De modo geral, salvo algumas exceções que serão apresentadas, não foi encontrada
vínculo, turno, número de alunos na turma, participação em conselho escolar, presença de alunos
com NEE, professor auxiliar, tempo na profissão e no local de trabalho, nível da turma em que
familiaridade com o PPP e o IDEB das instituições de pertencimento dos professores (p<0,018).
IDEB mediano e abaixo da média. Essa relação pode estar ligada, entre outros fatores, ao fato de
há mais tempo no local de trabalho (6-32 anos), embora essa constatação não implique em
para discussão e reflexão coletiva no ambiente de trabalho, bem como identificam maior presença
caráter pedagógico (familiarização com o PPP, discussão teórica e presença de momentos para
discussão e reflexão), embora não seja o IDEB em si o responsável por estas ações. Os
profissionais das instituições de IDEB mediano, na amostra, são os que apresentam um padrão de
profissionais das escolas com IDEB mais baixo apresentam um padrão de respostas avaliativas
que tendem ao positivo, embora de forma menos expressiva do que nas instituições de elevado
IDEB. Essa constatação revela que, na amostra, o aumento no nível do IDEB não implica
tempo no local de trabalho (p<0,000). Os professores com mais tempo no local de trabalho (6 a
32 anos) tendem a estar mais familiarizados com o PPP das instituições em relação a aqueles com
positivo em relação aos professores efetivos. É possível que este padrão deva-se à situação de
Doravante serão trazidas relações de dependência esperadas que não foram constatadas na
pesquisa, levando em conta que o que não aparece também diz do contexto.
IDEB ser um índice que visa a atestar a qualidade das escolas, o mesmo não se relacionou com a
expressão de uma maior satisfação ou menor sentimento de solidão no trabalho por parte dos
regidas pelas normas do Instituto Ayrton Senna) e a satisfação e solidão no trabalho, embora os
professores de 4o e 5o ano que se sentem solitários tenham sido mais numerosos. Não se
103
sentimento de solidão no trabalho. Também não foi encontrada relação de dependência entre a
quantidade de alunos em sala de aula, a presença de alunos com NEE, a presença de professor
graduação não revelaram igualmente relação significativa com a variável satisfação e sentimento
de solidão no trabalho. Do mesmo modo não foi encontrada relação de dependência entre a
existência de trabalho no contraturno de ensino (dupla jornada) e a satisfação com o tempo para
não sendo possível estabelecer relações entre as variáveis mencionadas de forma isolada. A
análise estatística, por si, é insuficiente para captar as nuances e mediações implicadas nas
percepções trazidas.
com o PPP (p<0,03). Professores pouco satisfeitos com as reuniões de planejamento têm mais
chances de se sentirem pouco satisfeitos no trabalho que professores satisfeitos com as reuniões
de planejamento. Profissionais com pouca familiaridade com o PPP da escola têm mais chances
de estarem pouco satisfeitos no trabalho do que profissionais que possuem familiaridade com o
que envolve o sentimento de insatisfação no trabalho, uma vez que o PPP e as reuniões de
planejamento são instrumentos de potencial produção de referenciais para a ação, sendo seus
que consideram pouca a presença de discussão teórica nas reuniões de planejamento têm mais
chances de serem profissionais insatisfeitos com as mesmas do que aqueles que consideram a
discussão teórica presente. Este resultado pode indicar o simples atravessamento de impressões
acoplada à prática, pode ser fonte de novas compreensões e desenvolvimento de formas de ação,
avaliativas tais: satisfação com o tempo de planejamento (p<0,012), satisfação com as reuniões
insatisfeitos com o tempo de planejamento e com a reunião de planejamento do que aqueles que
não se sentem solitários. Os professores que se sentem solitários no trabalho têm mais
105
laboral e de possuírem pouca familiaridade com o PPP do que aqueles que não se sentem
solitários. Por fim, os profissionais que se sentem solitários têm mais chances de estarem pouco
satisfeitos com o trabalho do que aqueles que não se sentem sozinhos ao trabalhar.
com as reuniões de planejamento, percepção de pouca presença de discussão teórica nas reuniões,
insatisfação com o trabalho pode implicar em sentimento de solidão laboral, uma vez que as
variáveis mencionadas têm relação com condições e ferramentas com potencial para a produção
de referenciais coletivos para a ação e situações de troca, sendo seus entraves ou percepção
será feita uma breve explicação da natureza e implicações da utilização deste tipo de
questionário.
Sobre a perspectiva dos fatores psicossociais no trabalho, há consenso, por alguns autores,
de sua compreensão como elementos que dizem do ambiente laboral em relação às percepções e
experiências singulares dos indivíduos, unindo aspectos da interação entre o trabalho, ambiente e
experiências, etc. (Reis, Fernandes & Gomes, 2010). As autoras colocam que a abordagem desses
106
fatores se diferencia, situando-os por vezes em um contexto histórico e social mais amplo ou
atendo-se aos seus efeitos e origens. Embora possam ser complementares, a primeira opção
aparenta estar mais comprometida com uma perspectiva crítica de transformação enquanto a
decisão sobre a própria atividade (incluindo elementos como controle sobre a mesma, recurso às
superiores. Críticas a este modelo vêm do fato de que ele não é capaz de identificar estressores
específicos do ambiente de trabalho e apenas delineia interações entre grupos de estressores, além
de não focar especificamente na interação entre indivíduo e ambiente, nem avaliar características
2010, Greco, Magnago, Prochnow, Beck e Tavares (2011), colocam que nos estudos com
docentes foi evidenciada associação entre fatores psicossociais e distúrbios psíquicos menores,
aprofundam na dinâmica das questões envolvidas no trabalho e tendem a responder a uma lógica
higienista de saúde, que visa diminuir os riscos e adaptar situações ao invés de aprofundar-se nas
mesmas buscando transformar e compreender. No entanto, de acordo com o próprio Clot (2010),
107
o JCQ avança, ainda que limitado, aproximando-se de uma lógica dinâmica de saúde que leva em
a) Latitude de decisão.
coisas novas, 99,4% acreditam que o mesmo requer criatividade e 95,3% estão de acordo com a
para além das oportunidades de aprender, desenvolver competências e ser criativo implicadas na
docência, revela-se também uma forte demanda, característica da profissão, de lidar com o novo,
para trabalhar, 95,3% da amostra está de acordo com a afirmação. Sobre ser encarregado de fazer
relação com a percepção da docência como atividade exposta a imprevistos e que não depende
repetição também diz de uma característica da profissão docente, como algumas professoras
nível de qualificação para trabalhar, sendo os poucos que discordaram, muitas vezes (conforme
Ainda que ser professor implique em estudo, planejamento, reunião de pais e gestão de
etc.), mais de 1/3 dos profissionais discordou sobre ser encarregado de fazer muitas tarefas
diferentes. Uma impressão, enquanto pesquisadora, durante a coleta, foi de que alguns
professores percebem essas atribuições como fazendo parte do “ser professor” e não enquanto
tarefas diferentes a gerenciar, embora a maior parte dos profissionais reconheça ser responsável
Em relação ao trabalho permitir muitas tomadas de decisão por conta própria, 65,7% dos
profissionais concorda com a afirmação, enquanto 34,3% discordam. Sobre a pouca liberdade
para decidir como fazer o trabalho, 16,3% concordam e 83,7% discordam da afirmação. A
respeito da possibilidade das próprias ideias serem consideradas na elaboração das políticas no
109
trabalho, 85,5% concordam com a afirmação, enquanto 14,5% discordam. As afirmações citadas
A maior parte dos profissionais sente que tem autonomia para tomar decisões por conta
restrição, conforme trouxe uma professora que discordou justificando sua escolha trazendo que as
decisões eram tomadas em equipe, focando no coletivo. Mais de 1/3 da amostra discorda que
pode tomar muitas decisões por conta própria, o que pode apontar igualmente para a dimensão
etc. A maior parte dos professores compreende que possui liberdade para decidir como fazer o
seu trabalho e que suas ideias podem ser consideradas nas políticas da escola.
b) Demanda psicológica.
tempo de realização das tarefas ser suficiente para concluí-las, 51,2% concordam com a
afirmação e 48,8% discordam. Trata-se aqui dos aspectos ligados à rapidez e quantidade de
trabalho. Os resultados mostram uma divisão na opinião dos professores em relação à rapidez
concordam com a afirmação e 60% discordam. Sobre estar livre de demandas conflitantes feitas
por outros 19,2% concordam e 80,8% discordam. A respeito da necessidade de longos períodos
de intensa concentração nas tarefas no trabalho, 79,7% estão de acordo, enquanto 20,3% não
conflitantes feitas por outros. Essa posição pode ser compreendida levando em consideração o
cidadania versus o adestramento, o desejo dos pais, as regras da escola, as demandas do sistema e
longos períodos de concentração intensa nas tarefas, o alto percentil apresentado provavelmente
das mesmas, 62,8% dos profissionais concordam com a afirmação, enquanto 37,2% não
concordam. A respeito de o trabalho ser muito perturbado, 39% dos professores concordam e
61% discordam. Em relação a ter de esperar pelo trabalho de outras pessoas, tornando mais lento
perturbações. Um número elevado de professores concordou que tem de esperar pelo trabalho de
111
outras pessoas para realizar o seu, tornando mais lento o ritmo do próprio trabalho. Essa
afirmação pode estar relacionada, dentre outras coisas, à expectativa de maior contribuição dos
atividades, o que constitui uma das principais queixas docentes. É também possível que a
c) Suporte social.
Os resultados seguintes dizem respeito ao suporte social no trabalho por parte dos
Dos profissionais, 78,5% concordam que seus superiores hierárquicos preocupam-se com
o seu bem-estar, enquanto 21,5% discordam. Concordam que seus superiores hierárquicos
prestam atenção no que dizem 87,8% dos professores, enquanto 12,2% discordam. Sentem-se
18,6% não se sentem apoiados. Sobre os superiores hierárquicos serem bem sucedidos em
promover o trabalho de equipe, 76,2% dos pesquisados concordam com a afirmação e 23,8%
discordam.
Dos professores estudados, 96% consideram seus colegas competentes na realização das
atividades. A respeito do interesse dos colegas em relação ao que acontece consigo, 75,6%
concordam com a afirmação, enquanto 24,4% discordam. No tocante aos colegas de trabalho
serem amigáveis, 96,5% dos professores concordam com a afirmação. Sobre os colegas de
principalmente, os colegas de trabalho é bem avaliado, podendo apontar para relações amigáveis
e de amparo mútuo entre a equipe, embora não seja possível dizer da existência de coletivos de
trabalho a exemplo dos mencionados pela clínica da atividade, fonte de suporte, conflito e
d) Perfis psicossociais.
encontrados na amostra.
apresentando demanda psicológica baixa e alta latitude de decisão; 27,3% são trabalhadores
ativos, possuindo elevada demanda psicológica e latitude de decisão; 22,7% são trabalhadores
passivos, apresentando baixa demanda psicológica e latitude de decisão; E, por fim, 19,2%
respondem a um perfil de risco psicossocial, com alta demanda psicológica e baixa latitude de
Figura 1
Perfil Ativo
Perfil de Baixo Risco
Perfil Passivo
Perfil de Risco
francês (ilustrado na figura 2), as medianas encontradas para as dimensões psicossociais latitude
de decisão e demanda psicológica situam a profissão docente dos anos inicias do ensino
Figura 2
Localização da amostra (em vermelho) na reprodução do gráfico de saída a partir de
dados produzidos pelo JCQ com respondentes de categorias profissionais da França (DARES-
DRESS (2008), pp. 02).
Esse resultado pode apontar tanto para possibilidades de realização profissional, através
recursos e estratégias (fazendo referência à alta latitude de decisão), quanto para desgastes em
da escola pública brasileira, com seus baixos salários, duplas/triplas jornadas de trabalho,
a percepção dos professores da necessidade de esperar pelo trabalho de outras pessoas para
poderem desenvolver o seu próprio trabalho. Os professores com mais alunos na turma (26-37
poderem desenvolver o seu próprio do que os profissionais com menos alunos na turma (15-25
trabalho de outras pessoas para poder realizar o próprio trabalho (p<0,022), a percepção de
interrupção frequente do trabalho acarretando em adiamento das atividades (p<0,032) e, por fim,
mais novos (23-42 anos) têm mais chances de perceberem a necessidade de trabalhar
rapidamente, de modo frenético, de precisarem esperar pelo trabalho do outro para conseguirem
realizar o próprio trabalho, além de perceberem mais facilmente a própria atividade como
anos).
116
É possível que estes resultados tenham relação com a experiência profissional, embora a
idade não seja sempre uma garantia de maior ou menor experiência e embora as variáveis "tempo
na profissão" e "tempo no local de trabalho", que expressam melhor a experiência, não tenham
profissionais mais velhos já tenham sido, de certa forma, selecionados pelo contexto de atuação,
continuando a atuar aqueles que ao longo da carreira não desistiram da profissão no caminho,
nem foram readaptados, ou seja, permanecendo aqueles com uma melhor adaptação e percepção
de seu trabalho em comparação à faixa etária mais nova. É também possível que os professores
mais novos estejam lidando com expectativas mais altas em relação ao trabalho e dificuldades
A variável suporte social foi criada através de cálculo efetuado com as questões relativas
Os resultados da mediana para cima foram considerados como elevado suporte social e os
instituições (p<0,019), bem como entre o suporte social e a idade dos profissionais (p<0,022). Os
professores das instituições de maior IDEB têm mais chances de reconhecerem um suporte social
elevado, sendo os professores das instituições de IDEB mediano aqueles com mais chances de
reconhecer um suporte social baixo. Quanto à idade, os professores mais velhos (43-68) têm mais
possibilidades de reconhecer um suporte social alto em relação aos professores mais novos (23-
trabalho foi discutida em parágrafo anterior. O reconhecimento de suporte social elevado nas
117
instituições de IDEB mais alto não permite estabelecer que possuir um maior IDEB implique em
um suporte social elevado, uma vez que nas instituições de IDEB mais baixo os professores
reconhecem um suporte social mais alto do que nas instituições de IDEB mediano. No entanto, é
possível que instituições mais bem organizadas e que oferecem maior suporte aos seus
profissionais tenham seus resultados refletidos no IDEB, ainda que este índice, por si, não tenha
necessariamente papel no melhor funcionamento das escolas, sendo passível, como discutido nos
professor.
das tarefas (p<0,002), de ser responsável por um volume excessivo de trabalho (p<0,007) e o
suporte social (p<0,018). Os professores temporários têm mais chances de não considerarem a
conclusão das tarefas, de não se considerarem responsáveis por um volume excessivo de trabalho
e, por fim, de reconhecerem um suporte social elevado em comparação aos professores efetivos.
Estes dados mostram, como já mencionado, que apesar dos professores temporários participarem
a uma forma mais precarizada de trabalho, estes possuem uma avaliação positiva do mesmo, o
que pode revelar cautela nas respostas em função da situação de maior vulnerabilidade.
trabalho repetitivo (p<0,018), da necessidade de ter de esperar pelo trabalho de outros para
muitas tarefas diferentes (p<0,043). Os professores que se dizem insatisfeitos no trabalho têm
esperar pelo trabalho de outros para poder realizar o próprio trabalho, de considerarem o trabalho
satisfeitos com o trabalho. Constata-se que se sentem mais insatisfeitos no trabalho profissionais
que reconhecem uma demanda psicológica maior, que lidam com impasses e contrariedades com
dificuldade.
disponível suficiente para a conclusão das tarefas (p<0,004), de ser responsável por um volume
percepção de pouca liberdade para decidir como fazer o trabalho (p<0,041). Os professores que
se sentem solitários no trabalho têm mais chances de considerar o trabalho repetitivo, percebê-lo
como perturbado, considerarem o tempo insuficiente para a conclusão das tarefas, reconhecerem-
trabalharem rapidamente e reconhecerem pouca liberdade para decidir como fazer o seu trabalho
do que os professores que não se sentem solitários. Estes resultados mostram que os profissionais
119
que se sentem solitários no ambiente laboral reconhecem uma maior demanda psicológica da
solidão no trabalho (p<0,000). Professores que percebem um elevado suporte social têm mais
solitários no trabalho do que os professores que percebem um suporte social baixo. As variáveis
implicadas envolvem ferramentas coletivas capazes de revitalizar a ação e dar suporte à mesma.
Foi observada relação de dependência entre o perfil psicossocial e a idade (p<0,028) dos
profissionais da amostra. Professores mais velhos (43-68 anos) têm mais chances de pertencerem
ao perfil passivo e de baixo risco psicossocial. Professores de perfil ativo estão mais presentes na
primeira faixa de idade (23-42 anos), enquanto o perfil de risco psicossocial está bem repartido
entre as faixas de idade. Como já observado e discutido anteriormente, professores mais velhos
tendem a perceber uma situação laboral mais positiva do que os seus pares mais novos. O
120
pertencimento aos perfis passivo e de baixo risco psicossocial envolve a percepção de uma menor
segundo lugar, no perfil de baixo risco psicossocial. A posição mais precarizada de trabalho
expressa pelo vínculo de professor temporário pode manifestar-se através de uma percepção
mais baixa. Esta última pode dever-se a uma avaliação mais cautelosa das demandas psicológicas
do trabalho, como já mencionado, ou a uma visão potencialmente mais conformada dos desafios
do trabalho docente.
instituições de IDEB mais baixo, um maior número de professores de perfil de baixo risco
psicossocial nas instituições de IDEB mais elevado e mais professores de perfil ativo nas
instituições de IDEB mediano. O perfil de risco psicossocial encontra-se mais bem distribuído, no
Uma das possíveis razões para o maior número de professores de perfil passivo estar nas
instituições de IDEB mais baixo é a constatação de que existem mais professores temporários
passivos. Embora não seja possível afirmar e nem estender a todos os casos, o trabalho passivo
e evitando maiores desgastes, o que pode estar representado pela latitude de decisão e demanda
psicológica reduzidas.
É possível que o fato de um maior número de professores com baixo risco psicossocial
estar presente nas instituições de elevado IDEB justifique-se, como já mencionado, pela
possibilidade de instituições mais bem organizadas e que oferecem maior suporte aos seus
profissionais, refletindo-se em perfis laborais de baixo risco, terem seus resultados repercutidos
no IDEB. No entanto, como trazido anteriormente, não se pode dizer que a lógica de
funcionamento das avaliações implicadas no IDEB seja responsável pelos quadros expressos,
embora possa refleti-los. É também importante relembrar que não houve, por exemplo, relação de
nas reuniões (sobretudo o perfil passivo) em relação aos professores de perfil ativo e em risco
ação, o que pode justificar sua percepção positiva maior nos perfis que reconhecem uma demanda
psicológica mais baixa, apontando para um enfrentamento mais eficaz das adversidades ou
devendo-se ainda à possível cautela nas respostas ou conformação diante das dificuldades.
122
social mais elevado, bem como uma maior satisfação no trabalho e um menor sentimento de
profissionais que se sentem solitários e que reconhecem um suporte social baixo. Na linha do
explicitado no parágrafo anterior, os perfis que reconhecem uma maior demanda psicológica
tendem a perceber um suporte social mais baixo, a possuírem menor satisfação no trabalho e a
sentirem-se mais solitários, o que pode apontar para as dificuldades na lida com as adversidades
perfis com o auxílio de ferramenta de análise estatística. Foram selecionadas 30 variáveis para
quais: IDEB das instituições de pertencimento, idade, tempo na profissão, tempo no local de
trabalho, formação, pós-graduação, vínculo, nível da turma em que leciona, presença de alunos
com NEE, presença de professor auxiliar na turma e trabalho no contraturno. Também foram
abrangente, tais que: satisfação no trabalho, sentimento de solidão no trabalho, suporte social,
discussão e reflexão coletivas no ambiente laboral, familiaridade com o PPP da instituição, além
Foram identificados dois grupos (clusters), cuja qualidade situou-se entre ruim e aceitável.
aglutinação e criação dos clusters foram as seguintes: solidão no trabalho, perfil psicossocial,
variáveis visando a descobrir as especificidades de cada grupo. O quadro a seguir revela os perfis
Quadro 1
Perfis de cluster obtidos
Perfil I Perfil II
Perfis psicossociais predominantes: Trabalho Perfis psicossociais predominantes: Trabalho
Ativo + Risco Psicossocial Passivo + Baixo Risco Psicossocial
Mais profissionais sentem-se solitários no Menos profissionais sentem-se solitários no
trabalho trabalho
Suporte social baixo Suporte social elevado
Profissionais mais novos (23-42 anos) Profissionais mais velhos (43-68 anos)
Profissionais há menos tempo na profissão Profissionais há mais tempo na profissão
(até 15 anos) (acima de 15 anos)
Menor reconhecimento da existência de Maior reconhecimento da existência de
momentos para discussão e reflexão coletiva no momentos para discussão e reflexão coletiva no
ambiente de trabalho ambiente de trabalho
Menor reconhecimento da presença de Maior reconhecimento da presença de
discussão teórica nas reuniões de planejamento discussão teórica nas reuniões de planejamento
Menor satisfação com as reuniões e tempo de Maior satisfação com as reuniões e tempo de
planejamento planejamento
Menor familiaridade com o PPP da instituição Maior familiaridade com o PPP da instituição
trabalhadores ativos e em risco psicossocial estão mais próximos deste perfil do que os passivos e
suporte, possivelmente devido à percepção de lida, muitas vezes frustrada, com situações
conforme a percepção do grupo. Profissionais mais jovens e com menos tempo na profissão
constituem o perfil I. É possível que entre os profissionais mais velhos e há mais tempo na
profissão tenha se operado uma seleção daqueles mais positivos em relação ao trabalho, como já
trazido. É também possível que a menor experiência dos mais jovens e há menos tempo na
profissão envolva maior desgaste, maiores expectativas e dificuldades para lidar com os desafios
impostos.
reflexão e discussão coletiva sobre a ação, são avaliadas positivamente. Há também maior
familiaridade com o PPP, recurso importante para a reflexão, formação continuada e elaboração
discussões e reflexões passíveis de gerar recursos para a ação. Professores mais velhos e com
mais tempo na profissão compõem este perfil, o que pode dizer do benefício do acúmulo de
experiências adquirido com a prática profissional e/ou da seleção de um grupo mais positivo em
relação ao trabalho pelo tempo. Há relação entre a percepção de maior suporte social e uma visão
positiva da atividade de trabalho, embora não seja possível dizer qual gera qual. Ambas estão
incluídas dentro de um cenário complexo e dizem do mesmo, ainda que não sejam reveladas
percepções dos profissionais que dão pistas de interações possíveis entre elementos ou de sua
Profissionais vindos de uma mesma instituição podem fazer juízos diferentes de sua vivência
quantitativa da pesquisa justifica-se como indicação para acessar diferentes vivências do trabalho,
envolvendo pontos de vista diversos sobre a profissão e dando pistas de elementos pessoais e
cluster e situando-se em quadrantes opostos de perfil psicossocial. Uma professora, que será
profissional, nomeada como M, com perfil de baixo risco psicossocial e pertencente ao perfil II
do cluster. Serão apresentados e discutidos os registros das entrevistas realizadas com cada
cluster, sente-se só e reconhece um baixo suporte social em seu trabalho. S tem 43 anos, leciona
há nove anos, trabalha em uma escola de IDEB mediano, sua turma possui cerca de 25 alunos,
127
não apresenta alunos com NEE, nem professor auxiliar, trabalha no contraturno em outra
a) Momento I – S
Inicialmente pediu-se à professora que pensasse sobre uma situação de trabalho desafiante
durante a IaS. Essa etapa foi fundamental para conhecer os pontos de vista das profissionais, além
com o poder público que joga a responsabilidade para os professores e não cuida de sua saúde
quando adoecem. A docente mencionou sua experiência inicial de trabalho no município em uma
turma de 5º ano com 38 alunos em situações de aprendizagem heterogêneas. Sobre esta situação
S relata:
S: É dilacerante a dor de você ver que você tá ali dentro pra... Pra dar uma
educação pra eles. Né? E você tem que fazer isso gritando. Minha voz, hoje, é
prejudicada, por exemplo, eu gosto muito da música, eu gosto muito de violão, eu
gosto muito de ensaiar meu violãozinho. Hoje eu canto malmente Cássia Eller,
mas eu já cantei Paula Toller, uma música mais aguda.
O trecho fala dos problemas de saúde e sofrimento vividos por S relacionados ao trabalho
enfatizando essa primeira experiência. Além da fenda nas cordas vocais, a docente refere-se a
dores nas articulações e dores de cabeça, trazendo a sensação de adoecimento ligada ao trabalho:
128
S: Eu praticava karatê, futebol de salão, musculação... Não tinha uma dor em uma
unha. Hoje eu estou com todo tipo de coisa, é tendinite, dores nas articulações, eh,
a questão de dores de cabeça constantes. O barulho, também, que é muito alto,
ensurdecedor, dentro das escolas. Então eu comecei a, a me cuidar agora,
recentemente. Depois de 10 anos vendo os prejuízos que me foram causados.
Então hoje eu não tenho mais saúde boa (...).
quatro anos, e que, segundo relata, trouxe melhoras na comparação com a experiência no 5º ano,
uma vez que nas turmas de 1º ano o limite de alunos estabelecido é de 25 por turma, embora os
resultados da etapa quantitativa tenham mostrado que isso nem sempre acontece.
A situação abordada por S e escolhida para ser explorada durante a IaS foi relacionada ao
projeto Papai Noel dos Correios nas escolas, em que as crianças devem elaborar uma carta para o
Papai Noel e fazer um pedido. As cartas são expostas nas unidades administrativas dos Correios
desmotivados, pois, de acordo com a docente, não acreditavam em Papai Noel e também não
pelas estratégias mobilizadas pela professora, no caso, dentre outras coisas, no uso da
momento de introdução da atividade que precede a escrita do modelo da carta ao Papai Noel no
quadro:
S: Depois de motivadas, quando você perceber que tem a atenção delas, você vai
escrever. Enquanto você não perceber a... Que elas estão interessadas naquilo ali,
não vai adiantar você ir pro quadro escrever. Então... Tenta, tenta, às vezes você
vai achar que estão, mas elas estão só te enganando, é só pra você não brigar mais
com elas pra elas pararem e tudo o mais. Mas você faz de conta que tá
acreditando nelas também.
(...)
S: Você faz de conta que acredita, porque senão você não faz. E você tem que
fazer de qualquer jeito. Do contrário não virão de casa com aquilo pronto não.
Ainda que você copie, corre o risco de você se decepcionar porque eles não vão
trazer aquela cópia pra passar a limpo a carta.
Esses trechos revelam o real da atividade, a subjetividade por trás da ação, aquilo que se
faz, mesmo sem se acreditar. Essa condição representa um entrave da atividade passível de
produzir sofrimento. Fazer de conta passa a ser uma condição para “conseguir” fazer a atividade,
prescrito, instância impessoal, revela-se na frase “E você tem que fazer de qualquer jeito.”, que
entra em choque com a resistência percebida dos alunos (dimensão interpessoal) e a necessidade
Uma percepção recorrente trazida por S é o seu sentimento de interpelação contínua para
S: Se você não for preparada, eles vão virar a sala de cabeça pra baixo. E vão subir
em cima de você na mesa. E vão estar plantando bananeira enquanto você atende a
um aqui, eles vão estar brigando lá do outro lado. Porque são muitos. E você tem
que estar preparada pra tudo isso. Pra observar todas as situações enquanto você é
apenas uma na sala de aula... E eles 25.
(...)
(...)
S: Então você vai ter que estar bem atenta mesmo. É uma responsabilidade muito
grande. E quanto maior é o número de crianças, maior é a responsabilidade e
maior a chance de você falhar.
como modo de manter a turma sob controle. O receio em falhar, como expresso no último trecho,
parece estar relacionado ao receio de perder o controle da situação, o que pode engendrar
e estratégia que ao mesmo tempo em que permite a atividade, pode limita-la. S também faz
referência às condições de trabalho, à quantidade elevada de alunos na turma para uma única
Alguns trechos de S sobre a necessidade de ter controle sobre a turma serão apresentados,
S: E tenha cuidado pra não levar muito tempo na atividade. Porque a criança, ela
não consegue ficar parada muito tempo. Daí você perceber que tá no momento que
precisa, por exemplo, levar pra tomar uma água. Levanta com eles, vai, toma uma
água pra eles saírem um pouco da sala. E aí eles voltam. Aí você volta, acalma
novamente, e retoma a atividade. Tudo isso é necessário.
Percebe-se que o processo de levar a turma para beber água, voltar, acalmar e retomar a
atividade tem o objetivo de manter o controle, evitar a dispersão em sala. As dimensões pessoal e
interpessoal estão mais fortemente envolvidas na situação. Trata-se de uma atividade investida
para evitar um maior desgaste (dispersão dos alunos), podendo também proporcionar uma
atenção renovada das crianças. A estratégia/estilização pode ser eficiente no sentido de poupar
energia e mesmo recentrar a turma, no entanto também pode envolver entrave para o
S: Vamos organizar. Você tem que liderar, você tem que mostrar que você é a
pessoa que está à frente da turma porque eles não têm condições de se gerenciar,
então você tem que estar à frente da turma. Se você não demonstrar liderança e
domínio, você jamais educará essas crianças. Nem pra fazer uma, a, um... As
vogais. Porque a questão da aprendizagem começa pelo estímulo, mas também,
acima de tudo, pela disciplina. Você precisa estar aberto pra receber o que o
outro vai te dar e você só se abre se você for convencido.
profissional docente, podendo envolver tanto o aprendizado das regras para viver em grupo e o
132
adestramento. O uso de palavras como domínio e convencimento tende a uma percepção passiva
S: E eles não podem retornar aleatoriamente não, porque senão eles vão correr no
espaço, vão se machucar. Você não vai ter domínio sobre toda turma, então... A
fila, ela vai prevenir acidente e vai te conceder um domínio sobre a situação. Esse
domínio do professor precisa existir, do contrário a atividade morre.
O trecho acima se refere ao uso da fila como ferramenta para manter o controle da turma,
evitar dispersões e acidentes. Mais uma vez evidencia-se a ênfase atribuída por S ao controle,
condição que envolve tanto a dimensão transpessoal, o gênero profissional, pois a gestão da
percebido como vital para a realização da atividade, no entanto, dependendo da dimensão que
S: Aí você vai retomar e você vai conseguir concluir a sua atividade, mas alguns
não vão copiar... Você vai perceber que eles estão muito atrás.
(...)
133
S: Mas você consegue fazer a atividade com mais tempo, então se eles não
concluírem você retoma no dia seguinte, e retoma no dia seguinte. E o trabalho
do professor é essa constante retomada até que... Que você consiga vencer eles
pelo cansaço. E aí você consegue fazer a produção.
atividade/produzir”; Do interpessoal, quando os alunos não copiam, ficam para trás ou esquecem
a cópia em casa (conforme trazido por S durante a entrevista); E do pessoal, que envolve essa
A impressão que a instrução passa, sobretudo no último trecho, é que trabalhar é uma
batalha que precisa ser vencida. Os alunos são vencidos pelo cansaço para produzirem. Nota-se
um aprisionamento das outras instâncias pela dimensão impessoal, o prescrito, o que importa é
fazer a atividade, trazer a cópia de casa, produzir. Trata-se de uma lógica de desempenho. Ao
invés de servir de orientação, o prescrito assume para S um papel de tirano que esvazia o sentido
de sua atividade. Ser vencido para produzir implica em uma visão passiva dos alunos que,
prática profissional, em uma turma de 5º ano, trabalhando sozinha com um número excessivo de
lhe deixou literalmente sem voz face ao real. As más condições de trabalho e a desassistência ou
envolvendo as contradições e desigualdades sociais que atravessam a escola pública podem gerar
frustrações e busca por respostas, discursos de culpabilização da família, como ocorre com S. A
docente queixa-se diversas vezes da falta de acompanhamento da família nas atividades escolares
e fala em carência de valores, embora reconheça as dificuldades da família (os pais às vezes não
pela família, existem e exigem um trabalho amplo que envolve além de um maior investimento
Isto implica no reconhecimento de que os desafios envolvendo as famílias dos alunos não se
resumem a uma questão de valores, mas envolvem respostas a um processo de exclusão social
histórico que também precisa ser levado em consideração na busca por alternativas de inclusão na
docente na escola pública, não deve resumir-se ao trabalho do professor em sala de aula, embora
o abranja, mas necessita da formação de coletivos de trabalho fortes, da criação de vínculos com
a comunidade e luta por melhores condições de trabalho, ou pode deixar sem voz face ao real,
a ser vencida) em um ambiente hostil, pode-se falar em ruptura entre significado e sentido do
em que permitem a atividade, limitam-na. O foco no controle e disciplina da turma, bem como na
produção, são expressos pela docente como uma batalha e tomam mais lugar nas instruções do
pois o trabalho é uma via de engajamento histórico, social, pessoal, subjetivo, político, cognitivo
b) Momento II – S.
Houve muita validação, por S, das instruções lidas e dificuldade para aprofundar-se nos
Quando questionada sobre o que a experiência anterior, de IaS, lhe suscitou, S falou de sua
disponibilidade e desejo de ajudar e também trouxe que se sentiu ditadora com a sósia, como se a
sósia tivesse de fazer exatamente o que lhe estava sendo dito. É possível que esse entendimento
seja um reflexo de como S percebe, lida e sente sua própria atividade, algo aprisionador. S
colocou que não teve tempo de ler a transcrição da entrevista de IaS para comentar suas
reconhecendo não ter trabalhado a responsabilidade o suficiente com as crianças ao longo do ano,
o que revela aquilo que deveria ter sido feito, mas não foi (de acordo com S). No entanto, para
além da falta de responsabilidade das crianças, o que aparece no discurso é a falta de interesse
dos alunos, que pode apontar para uma falta de sentido percebida por eles. O trecho também
escrita das crianças (gênero profissional e prescrito) e a apresentação, para o aluno, de sua
ele tem aquele up na motivação, ele se sente agraciado com o elogio, eu digo
assim, “Sua letra tá muito bonita.”.
O cuidado de S com a escrita das crianças, que compõe o gênero profissional e também o
prescrito para a atividade, foca em sua forma (escrever nas pautas e de modo legível), o que
escrita. O conceito de “escrever bem” parece estar ligado a possuir uma letra bonita.
Foram identificadas por S dimensões que norteiam sua atividade de trabalho, revelando o
favoreceria. Seguem trechos que revelam a elaboração de S acerca dos pontos centrais de sua
atividade.
S: Lá atrás, aqui na nossa gravação, eu falei sobre algumas coisas que, que são,
digamos assim, meu carro chefe. A questão da prática dos valores, aí tá, tá
vendo aqui a motivação, né, esse despertar do desejo de aprender e o cuidado
com a integridade física do aluno. Você pode, você pode perceber que ao longo
da nossa entrevista eu tô falando a mesma coisa. A palavra de respei... Eh, de
ordem é respeito, a questão da prática do valor, dos valores, a questão da
motivação na aprendizagem pra que ele sinta desejo de aprender.
(...)
138
valores e o cuidado com a integridade física dos alunos. Trata-se de elementos que constituem a
prática educativa (gênero profissional) e que estão ligados mais fortemente à gestão da turma. Em
uma análise clínica da atividade que leva em consideração sua dimensão real e subjetiva, aquilo
que não é enfatizado ou não aparece na fala de S pesa tanto quanto aquilo que sobressai. Nesse
sentido, levando em consideração os prescritos para a docência nos primeiros anos do ensino
entanto são feitas apenas menções indiretas a este processo ao longo das entrevistas. A prática de
S parece estar mais dirigida à gestão da turma, o que diz da necessidade de controle/produção
sentida diante dos desafios e dificuldades encontrados (impedimentos), limitando sua prática.
alguns conceitos trazidos, como no diálogo abaixo a respeito do “desejo de aprender” recorrente
Pssss, acalmar um pouquinho, você novamente precisa do silêncio pra você dar
sua aula.
“liderar” a motivação parece referir-se a algo extrínseco, que vai do professor para o aluno. Já,
buscar desejos para usá-los tem potencial no reconhecimento da subjetividade do aluno e no seu
envolvimento. O uso de jogos e a perspectiva de aprender brincando parecem ser usados com o
intuito de motivar, produzir momentos de prazer (excitação, ebulição), alternando com as aulas
para as quais se precisa de calma e silêncio. No entanto, sem desmerecer as iniciativas lúdicas, as
Nos trechos seguintes, S traz algumas exigências da docência e queixa-se das dificuldades
de sua profissão.
(...)
S: Então a gente tenta se desdobrar nessa, nessas aulas que a gente dá, só que a
grande dificuldade, eh, se concentra justamente, em muitas ocasiões, no número
de alunos em sala de aula, que esse é o problema princip... Seguido do, do,
seguido da falta, digamos assim, da, da, da presença da família no processo de
aprendizagem escolar, né. (...) tá me fazendo mal ser professora nessas
condições.
140
maior demanda devido à grande quantidade de alunos na turma. A docente traz o elevado número
como os principais problemas com que tem de lidar, expressando sofrimento em ser professora
desafio de gerir uma turma numerosa, dupla jornada de trabalho, deslocamentos, frustrações entre
expectativa e realidade, falta de suporte na lida com estes elementos que a deixam sem voz face
professora), a tarefa parecia difícil tendo em vista as queixas, também recorrentes, sobre a falta
S: Essa busca... Porque cada criança tem a sua peculiaridade. E você vai buscar
essa peculiaridade, esse ser peculiar, o que é que motiva, do que é que ele gosta?
Um gosta de futebol, o outro de artes marciais, o outro de desenhar. Um gosta de
jogar bola, o outro de brincar de boneca. Então você tem que partir desse
pressuposto pra você iniciar a busca pela sua estratégia em cima do que motiva
141
ele. Muito bem, vamos adiante, nem sempre isso é muito fácil porque são
muitos, devido a, novamente, a quantidade de alunos na sala de aula. E acaba não
dando tempo de você fazer essa busca, então você começa com uma busca meio
que genérica. Vai ter aquele grupo da bola e o grupo da boneca, então vamo,
vamo partir por aí. Porque não tem condições de você se aprofundar como
deveria em cada um na situação.
O trecho revela a consideração da subjetividade da criança e do que ela gosta para seu
alunos na turma (condição objetiva), partindo para uma abordagem genérica de seus interesses
perspectiva de usar os interesses das crianças pode ser uma boa alternativa para criar novos
receber um presente do Papai Noel (conforme trazido por S), o que levou a professora a fazer
S: (...) então você sempre quer mais. Então nessa busca desse mais, você, você,
você pode observar que grande parte das pessoas são interesseiras. E elas só se
movem mediante uma recompensa. No caso, o que eu tenho pra oferecer é o
prazer pela aprendizagem. E muitas coisas eu, eu, digamos assim, eu tenho uma
prática intermediária onde eu levo um pirulito, onde existe uma, um presente do
Papai Noel pra que ele conclua aquela atividade. Nós somos obrigados a
mesclar e compreender que a situação posta é que a criança está sendo instruída e
educada por essa mídia golpista que bobotiza, que nos transforma em
consumidores, em robôs.
142
Mais uma vez o real da atividade e as frustrações implicadas são expostos. A recompensa
o uso da recompensa é feito com o intuito que os alunos concluam a atividade, o que se insere na
intelectual e aprendizado.
S: E você tem que levar tudo isso em consideração pra aquele ser que chega lá
na tua sala, que tá pulando, que tá batendo, que tá furando o outro com um lápis,
que tá jogando pedrinha a cabeça do outro, que tá subindo pelos combongóis, que
tá plantando bananeira em plena aula. Que esse, que esse ser ele veio de casa, ele
levou um soco de um padrasto bêbado ou o pai e a mãe se separaram e ele passou
uns dias sem vir à escola porque não tinha o que comer na casa dele. E a mãe teve
que levar ele pra um outro lugar, de um parente, uma avó, por exemplo, pra que
ele pudesse comer. Então tudo isso machuca você como professor, como
educador. E cadê aquele aluno que tá aqui pronto pra aprender sem
problemas? Você não vai encontrar na rede par... Na rede pública de ensino.
O relato revela a complexidade do contexto social, que pode afetar professores e deixa-los
sem voz face ao real. A diferença entre expectativas e a realidade é evidenciada na percepção de
que não existem alunos ideais prontos para aprender (dimensão interpessoal). Alunos aptos para
aprender envolvem uma co-construção continua. Este processo não é simples, sobretudo em
condições adversas de trabalho, e exige o suporte de coletivos fortes, além de melhores condições
regras e inserir-se em uma lógica de aprendizagem, e isso para todas as classes sociais. Muitos
alunos do primeiro ano da escola pública não passaram por escolarização anterior ou não tem em
143
casa realidades que se aproximem do universo escolar, de modo que o desafio de inserção é
maior. No entanto, o aluno de escola pública está apto, como qualquer outro, a aprender e se
Doravante será exposta uma parte do diálogo da pesquisadora com S. Questionou-se sobre
o que fazer, que possibilidades usar no sentido da promoção da motivação dos alunos em relação
ao desejo de aprender, visto que este foi um tema considerado central por S e que, no entanto,
Pesquisadora: Aí minha questão tem a ver com isso, mesmo que não seja
possível responder, mas pra pensar. Eh, que outras formas, levando em
consideração essa atividade da carta pro Papai Noel, que outras possibilidades
você poderia ver, digamos em condições, talvez, de mais tempo, mas que
possibilidades você acha que poderiam ser postas em prática pra, eh, contribuir
nessa, nessa...
S: Produção?
S: Ah.
início, eh, digamos assim, pelo menos um mês antes, pra você ter oportunidade de
durante esse mês, você chegar ao final passando por todas as dificuldades que
puderem aparecer e o camarada estar lá, a criança estar lá com a sua carta
traduzida e passada a limpo. Né? Então uma estratégia seria o trabalho com as,
com as palavras, que envolvem os presentes, eh... O nome dos familiares que,
eh, com quem eles convivem, que eles poderiam estar colocando isso pra
enriquecer um pouco mais o texto, coisas assim.
S completa a frase “que possibilidades você acha que poderiam ser postas em prática pra
contribuir nessa...” com a palavra “produção”, ressaltando o foco neste aspecto do prescrito da
atividade. Pode ser que o fato de a atividade de carta para o Papai Noel ter um tempo limite e
produção ter tido um maior foco do que os aprendizados que poderiam ser suscitados por ela
criança para o prazer de aprender engendrou novas ideias, tais o trabalho com palavras escolhidas
pelas crianças relativas a brinquedos que gostariam de ganhar, a inclusão dos nomes dos
familiares, do lugar onde se mora e do número de pessoas com quem se vive. Trata-se de
estratégias que exploram a aprendizagem e dão sentido à carta da criança, trazendo-a para a sua
realidade e envolvendo sua participação e elaboração. Foi também trazida a demanda de mais
tempo para a atividade, a necessidade de começar mais cedo o trabalho para dedicar-se a
elementos da carta e para que a mesma esteja “traduzida e passada a limpo”, evidenciando
profissional.
S: Eh, a questão da reflexão, por exemplo, que é que eu poderia ter feito nessa
atividade. Aí me surgiu essa ideia de ter trabalhado mais o nome dos presentes,
eh, talvez eu já tivesse perguntado assim, “Eh, vocês têm sonhos?”, trabalhar a
questão dos sonhos, né? O, o que, eh... Seria uma coisa muito particular de cada
um e então a gente colocaria nomes pra esses objetos de desejo, né, que eles
gostariam. E talvez assim a gente trabalhar a questão do, do consumo mais.
Então me fez refletir sobre isso. E me levou a crer que, poxa, mediante os
presentes que foram pedidos, assim, claro que a gente orientou pra que fossem
produtos mais básicos, no entanto, os pedidos originais deles foram... Coisas,
assim, bem caras. Alguns, eh, de forma inocente, eles não sabem, eh, quanto custa.
Né, por exemplo, um notebook, tablet, um celular, eles não sabem, só sabem que
queriam aquilo. Por quê? Porque tá na televisão, pulando, “No celular, com jogos
e lá vai.”, você fica louca.
exemplo, explorar os desejos das crianças para trabalhar palavras, uma forma de envolver mais
ativamente os alunos na construção das cartas. As mesmas foram realizadas originalmente através
de um modelo escrito no quadro com lacunas a serem preenchidas. O consumismo também foi
abordado como tema de reflexão da professora, assim como o esforço para tornar os pedidos das
crianças mais acessíveis para ampliar as chances de ganharem presentes, condição que também
presente).
ampliação do poder de agir e mobilização da vivência por meio da reflexão sobre a prática.
146
M está situada no perfil de baixo risco psicossocial e pertence ao perfil II do cluster, não
se sente só e reconhece um alto suporte social em seu trabalho. M tem 51 anos, leciona há 21
anos, trabalha em uma escola de IDEB mediano, sua turma possui cerca de 22 alunos dos quais
um apresenta deficiência física não-incapacitante, não possui professor auxiliar, trabalha nos dois
profissional, devido ao seu ânimo em falar continuamente sobre a própria atividade, a fim de
aprofundar-se nos detalhes da atividade, tendo em vista que a docente estava instigada no
a) Momento I – M.
alfabetização e o letramento como os focos de sua atuação e o que gosta de fazer, o que condiz
com o esperado para o primeiro ano do ensino fundamental, revelando a dimensão do prescrito e
gênero profissional da atividade. Como desafios, M traz a indisciplina, colocando que ter um
aluno perfeito não é possível, embora considere contornar a questão razoavelmente bem, o que
leitura e do gosto das crianças em ler, falando da curiosidade própria da idade e percepção de
avidez pelo conhecimento por parte dos alunos. M também coloca que a família ajuda muito e
manifesta satisfação com o seu trabalho. Apesar dos percalços da profissão e do salário baixo, M
147
diz que se sente bem na profissão. Essa avaliação no começo da entrevista revela a satisfação de
M no sentido da percepção de um trabalho bem feito, ainda que reconheça as dificuldades de sua
profissão.
M traz que considera todos os dias de seu trabalho desafiantes, embora o momento mais
desafiante, escolhido como foco da entrevista de IaS pela professora, seja o momento após o
intervalo, devido à agitação dos alunos e à necessidade de pararem de brincar e correr para
O desafio de M é trazer as crianças à calma e, para isso, faz uso de instrumentos que
permitem aos alunos uma regulação (dimensão interpessoal), como cantar, o uso de gestos
para a realização das atividades de escrita ou leitura (prescrito e gênero profissional), criando um
M: Pra voltar pra sala, não, eles ficam aguardando. Alguns ficam aguardando na
porta da sala e uma grande parte vai lá na sala dos professores pra vir
acompanhado comigo. Entendeu? A gente não exigiu que eles fizessem uma fila
porque é um momento que tá, ainda tá todo mundo correndo na escola. Então não
dá pra fazer uma fila com eles, esperar. A não ser que eles ficassem lá no
refeitório, mas eles não ficam. Eles ficam no parquinho, correndo, brincando.
Então se eu fosse fazer uma fila, eu iria perder mais... Se você fosse fazer uma fila,
você iria perder mais tempo pra recolhê-los. Eles não iriam, eles iriam se
esconder de você porque essa prática inicial, no ano, no início do ano, já foi feita
e não deu certo.
possibilidades de atuação, como fazer uma fila, revelou elementos implícitos da atividade, o real
da atividade. No caso, a utilização da fila para voltar à sala após o intervalo havia sido feita no
início do ano, mas não promoveu bons resultados, o que levou a uma organização diferente. A
nova organização diante do impedimento revela uma exploração das possibilidades de ação. A
utilização por M do termo “a gente” ao referir-se à decisão de não exigir que fosse feita uma fila
coloca:
M: Essa técnica de relaxamento você pede pra que eles sentem e vamos, a gente
vai fazer silêncio e vamos contando, eh... Eu faço os gestos com os dedos. Você
deve fazer assim, um, aí dá uma respirada, dois, a segunda respirada, três... Isso
pausadamente pra que eles possam respirar naquele ritmo mais calmo, né? E
pra ir voltando à calma.
149
(...)
respiração e a contagem, que orientam a atenção e a consciência da criança para o próprio corpo.
Trata-se de recursos que compõem a atividade (gênero profissional) e dão suporte à prática.
reforça o porquê do relaxamento a fim de que seus alunos compreendam o que estão fazendo e os
melhor aprendizagem é levada em consideração. Aprender parece ser o que norteia a atividade,
dimensões ocultas da prática profissional que possivelmente não apareceriam em uma entrevista
comum.
M: (...) Eh, a gente tem dois alunos que demoram um pouquinho mais a entrar
na sala. Geralmente, eh, diariamente esses dois alunos ficam brincando, correndo.
Como eu não posso deixar os outros sós, então assim, eu faço o quê? O ajudante
150
do dia, eu digo “Vá lá, por favor.” Você, no caso, você vai fazer isso. Certo? Você
vai dizer a ele que vá chamar os dois coleguinhas que ainda estão lá fora. Então
ele vai, o ajudante do dia, sai, depois do relaxamento e vai chamar esses amigos
que estão lá fora. Vão, aí chama, aí volta. Geralmente ele volta com um, o outro
fica ainda correndo, né? Mas depois o outro volta.
no entanto este não é tratado como impedimento, estratégias são desenvolvidas para dar conta da
situação: o ajudante do dia vai chamar os alunos atrasados. A função de ajudante do dia revela-se
(...)
colegas, né. Então eles desrespeitam, eh, conversa-se com eles. Se essa conversa
não surtir efeito aí tem uma, uma sanção mais forte que é deixar sem intervalo.
Então você deve sempre, eu prezo por isso e você deve continuar prezando
porque, pra eles não se acostumarem com a questão da violência ser uma coisa
normal, né? Mesmo que não seja uma violência muito forte, mas violência pra
mim começa do pequeno, né? E vai se acostumando, senão...
professoras feito durante o planejamento para lidar com situações de brigas e agressões entre
alunos. O coletivo mobiliza o gênero profissional, cria novas estilizações e formas de responder à
realidade. Ele sustenta a ação e evita que os profissionais se isolem e fiquem sem voz face ao
real. Há valorização do diálogo na a resolução dos conflitos, mas também a utilização de sanções
M: (...) Então assim, agora, pedir pra ficar sentado eles sabem. Que tem o
momento de correr, de brincar e o momento de ficar sentado. Então, fez o
relaxamento, tomou água, foi ao banheiro. Deixe... Eles, eles sentam, agora vez
por outra um se levanta, pede uma borracha, pede um lápis, ou então prefere
ficar em pé fazendo a tarefa, pintando a tarefa, fazendo a atividade em pé. Desde
que ele não atrapalhe o que tá atrás dele, eu não vejo problema. Você também
não, não precisa se preocupar também com aquela sala rígida assim, todo
mundo bem quietinho, caladinho, não é isso. É uma atenção ativa, né? Aquela
atenção em que ele, ele, o corpo dele tá respondendo, né, mas ao mesmo tempo a
mente dele também tá prestando atenção ali na...
(...)
M: Eu falo sempre pra eles assim, “Olhe, gente, a gente tem que deixar, eh, na
hora que a professora tiver falando, ouvir. Aí quando eu termino de falar, você
152
quer perguntar, você quer falar alguma coisa, você levanta a mãozinha ou você
mesmo fala. Agora não pode todo mundo falar de uma vez só porque fica uma
bagunça, a gente não entende nada.” Eles já tão até muito habituados a isso,
assim, eu, eu considero que a turma tá muito boa nesse sentido, apesar de que o
ano tá terminando, as energias deles tão lá nas alturas, né. Às vezes a gente
precisa, eh... Usar de outras estratégias pra que eles não façam uma bagunça na
sala. Que essa bagunça que eu falo é de gritaria, é de atrapalhar o que a pessoa
tá falando, entendeu? Nesses momentos aí de, em que eles tão falando bem alto,
muita gente de uma vez só, aí você deve intervir, “Gente, por favor...”.
M possui uma percepção de disciplina que coloca a preocupação com a atenção do aluno
na atividade (gênero profissional) acima da exigência de ficar sentado e calado. O foco é posto na
atividade mobilizada pela criança (prescrito). O incômodo ocorre quando os alunos atrapalham os
Ao longo da instrução, saindo do foco da volta das crianças do intervalo, M trouxe que
estava trabalhando o livro “O Pequeno Príncipe” com a turma e criou estratégias para manter a
atenção dos alunos na leitura, dentre as quais o sorteio, pelos alunos, de uma pergunta sobre a
história. Questão que eles devem ler para depois responder. Sobre esta atividade, a docente
comenta:
M: Todos não sabem ler com fluência. Que, ele pega a frase aqui, a pergunta tá
aqui. Então ele lê palavrinha por palavrinha, devagar. Às vezes ele não entende
uma palavra e vem perguntar. Ou... Então eu faço a prática, “Peça a ajuda do seu
coleguinha. Escolha um pra lhe ajudar.” Né? Essa prática não é diária. Entendeu?
Eu tenho experimentado outras questões. Você, você pode usar essa daí que foi
uma das que mais deu certo, porque eles prestaram bastante atenção, né. Ficou
desafiante pra eles. Mais do que simplesmente ler e pronto. Né? Outro momento,
a gente leu e desenhou. “Olha pessoal!” O livro tem poucas imagens, mais texto,
153
né? Então eu leio o texto, “Olha a imagem aqui que o autor desenhou, que o
ilustrador fez. Do acendedor de lâmpadas.” Ele vai, olha, “Professora, como é que
pode esse homem ficar equilibrado num planeta tão pequeno?” Eles dizem assim,
“Como é que ele não cai desse planeta?” Ele acha interessante, né? Então, “É
mesmo, né gente? Não é interessante? Será que a gente não consegue desenhar?
Ele em cima desse planeta pequeno acendendo uma lâmpada.” Então assim, eu
faço essas questões bem práticas deles, do contexto deles. Trazendo pra o... Pra
a realidade deles, porque senão fica uma coisa muito desinteressante pra ele.
prestem atenção, que a atividade seja desafiante, que elas se interessem (dimensão interpessoal),
o que envolve a concepção de aluno ativo e sujeito de seu processo de aprendizagem (gênero
colocação:
M: (...) Pode ir na Direção pra fazer um favor à professora. Uma criança não
trouxe lápis, perdeu o lápis, eu não tenho no momento, eu peço pra, escrevo um
bilhetinho, o ajudante vai lá na direção e, e leva o bilhete, traz o que eu peço,
entendeu? Essas coisas assim, simples, mas que eles valorizam muito. E eu
também, porque eu acho que, no dia-a-dia, essas pequenas coisas ajudam a
gente a ter um relacionamento melhor na sala, né? Como na família. Em casa
você tem que criar os hábitos, na escola também, né. Então eu a... O que, o
conselho que eu lhe dou é esse. Valorize esse pequenos momentos, essas pequenas
coisas, né? Que vai ajudar muito, né. Até a questão do respeito do aluno por
você.
154
meio para criar um ambiente de qualidade em sala de aula, dar responsabilidades aos alunos,
gerando respeito. A docente fala em “criar hábitos” na escola (gênero profissional), o que está
da democratização da educação.
M: O ano passado só eram dois primeiros anos. Esse ano foram três. Então duas
turmas receberam livro e a minha turma não recebeu porque, como houve greve,
então, a minha turma ficou de greve. Eu fiquei de greve, né? Então não, não
trabalhei com eles. E aí, quando chegaram os livros só vieram pra duas turmas.
Minha turma ficou sem livro e até agora não chegou. Então foi outro desafio
grande. Porque, por exemplo, as meninas tem livro de História, Geografia,
Ciências... Né? Português e Matemática. Cinc... É, são três livros. Né, então, o
conteúdo delas já tá tudo praticamente pronto, planejado.
(...)
M: Eu tenho usado não só um (livro) como parâmetro. Eu uso mais de um. O que
foi anotado na escola não tem pra minha turma, nem eu tenho acesso porque
vieram poucos do professor. Então eu, eh, aqui mesmo na escola eu peguei uma
quantidade de livros e eu faço essa pesquisa. Eh, toda semana eu pesquiso que
atividades a gente vai trabalhar dentro daquele conteúdo. Entendeu?
Durante o ano de 2016, M e sua turma não tiveram acesso a livros didáticos. Por razões
ligadas ao funcionamento do sistema de distribuição dos materiais não foi encaminhado à escola
um numero suficiente de livros para o primeiro ano. Evidencia-se o lugar de prescrito do livro
155
didático, quando M traz que com ele tudo já está “praticamente pronto, planejado”. O livro
didático deve ser considerado na orientação da prática profissional docente, podendo alimentá-la,
mas também aprisioná-la, caso sua mera reprodução entrave o desenvolvimento da atividade,
M refere-se às estratégias para lidar com a situação de ausência do livro, não sem custos,
utilizando outros materiais e fazendo pesquisas a respeito do que irá trabalhar dentro dos
pessoa, como deveria implicar a IaS. Houve descuido por parte da pesquisadora, nestes
(...)
adequado pra... Pra aquele planejamento, pra aquele seu conteúdo que você
pensou, né? De preferência aquele que tenha uma interatividade maior, em que
ele possa usar o que ele sabe pra aprender o que ele não sabe. É um princípio
do... Do PNAIC, né? É... Considerar o conhecimento que ele tem, mas adquirir
o conhecimento científico, né? Fazer esse paralelo e alcançar o conhecimento
científico.
estabelecidos no quadro do PNAIC. Este recurso atua como prescrito para a atividade de M e
parece mobilizar saberes do gênero profissional em sua prática. O foco é colocado no papel ativo
do aluno, na busca por atividades mais interativas (dimensão interpessoal), por exemplo. Destaca-
aluno sabe para alcançar o que ele não sabe voltando-se à apropriação do conhecimento
conforme tratado por Vigotski) aplicados à prática que compõem o gênero profissional e ampliam
na abordagem dos diversos conteúdos. A docente relata que ocorre de deixar os alunos lerem
entre uma atividade e outra, quando alguns alunos se prolongam em uma atividade. Sobre o
1
Conceito da teoria de Vigotski relativo à ideia de uma área de desenvolvimento cognitivo potencial enquanto
distância entre o nível atual de desenvolvimento da criança, pela sua capacidade em resolver problemas
individualmente, e o nível de desenvolvimento potencial, tendo em vista a orientação de um adulto ou par mais
avançado (Fino, 2001).
157
M: Porque os livros eles não são comuns de ter em qualquer lugar. Eles têm pouco
acesso a livros na casa deles. Então eu vejo que o livro, desde que, a gente
começou a trabalhar e fez assim, muito, eh... Eles gostarem. Esse é um trabalho
desde o início do ano. Que eles vão gostando de ler, vão gostando dos livros. É
uma coisa prazerosa pra eles.
M refere-se aos livros como incomuns para os alunos, e fala do trabalho desde o início do
ano no sentido de produzir prazer em sua leitura e manuseio, a dimensão interpessoal aparece no
Destaca-se a satisfação de M com o seu trabalho, com o aprendizado dos alunos. Essa
através da atividade.
os modos de fazer docente (gênero profissional). A docente também fala de abertura para o
imprevisto e flexibilidade, características do trabalho docente, que lida com diversas variáveis. A
158
M: Nosso planejamento ele é feito com base nesses direitos. Certo? Então esse
ano, eh... Ficou um pouquinho mais complicado que a gente não teve livro
didático pra ajudar, por outro lado os livros didáticos eles ainda... Alguns ainda
não estão nessa orientação do PNAIC. Tá entendendo? Então, pra mim facilitou
um la... Uma questão de, de colocar em prática essa, esses direitos de
aprendizagem. Mas por outro dificultou porque eu tenho que pesquisar muito,
né. Atividades fora do contexto dos livros didáticos, então. Dificultou nesse
aspecto, mas por outro eu acho que num, num... Facilitou até a questão da
alfabetização, porque você não fica preso a um livro. Aquele, “Ah, eu tenho
que terminar esse programa do livro todinho aqui.” Né? Às vezes atrapalha
muito o professor essa questão.
pessoal maior. No entanto a docente refere-se ao fato de que nem todos os livros seguem as
orientações do PNAIC e que a ausência do livro, ao mesmo tempo em que dificultou seu
trabalho, facilitou sua elaboração e a concretização dos objetivos de alfabetização dos alunos.
O que foi, a princípio, uma dificuldade para M, converteu-se em algo que, embora não
sem custos, ampliou sua autonomia e permitiu seu desenvolvimento e o desenvolvimento de sua
b) Momento II – M.
certo incômodo, como com S, em relação às marcas da oralidade nas transcrições. Ao ser
questionada sobre o que a entrevista anterior (IaS) provocou, M colocou que no dia seguinte à
instrução lembrou-se do trazido e foi confirmando suas ações, considerando como boa sua
maneira de trabalhar. Sobre sua reação à leitura da transcrição M mostrou preocupação com o
relaxamento), sentindo falta da ênfase nos aspectos pedagógicos do seu trabalho, embora a
referência aos mesmos tenha perpassado toda a instrução, como se observa na seção anterior.
sua instrução.
A respeito dos dois alunos que não voltam imediatamente após o intervalo, M traz que os
desafios para trazê-los à sala de aula são maiores do que os apresentados na entrevista, o que
exige a mobilização de diferentes estratégias que afetam o seu tempo e atividade. Por exemplo,
quando o ajudante do dia é uma menina, acontece dos meninos que estão fora de sala não
ouvirem seus chamados para retornar. M também precisa, algumas vezes, sair de sala para pedir a
um adulto que chame os meninos de volta. A docente traz modificações em sua atuação feitas
ficar comigo lá na sala dos professores.”. Então eles ficaram mais cuidadosos de
não demorar mais assim.
A IaS revela seu potencial em ampliar a consciência sobre a própria atividade, podendo
uma melhor eficácia e ampliação do poder de agir. No relato, M mostra ter tomado uma atitude
M: (...) Isso se dá devido aos dois intervalos serem diferentes (um para as
crianças menores e outro para as crianças maiores). Como... Depois, depois do
primeiro intervalo eles têm que voltar pra as turmas dos maiores irem, o que é que
eles fazem? Se aproveitam que os maiores vão pra aquele momento de intervalo e
ficam no intervalo dos maiores, tá entendendo? Então é aquela ânsia de brincar
muito, que a própria escola não favorece. É, o intervalo de escola é muito
pequeno pra brincadeira nessa idade, eu acho que eles deveriam ter um
pouquinho mais de tempo pra brincadeiras. Mas como o espaço físico não
proporciona, né, essa, esse momento realmente prazeroso de, de brincadeiras, a
escola não tem como fazer, eh, 400 alunos numa escola desse tamanho, né? Um
intervalo só, ela achou esse, essa divisão. Primeiro momento de 20 minutos,
primeiro a terceiro (ano), e segundo momento de, eh, de 20 minutos também, dos
quartos e quintos anos. Pra que não haja muito choque, correria, eh, etc.
A docente traz o que ocorre por trás dos alunos que demoram a voltar do intervalo. A
participando ao intervalo dos alunos mais velhos, o espaço físico limitado para comportar todas
brincadeiras tendo em vista a idade dos seus alunos (seis anos) considerando o tempo de intervalo
atividade docente.
que brigaram ou agrediram colegas, no sentido de pedir desculpar e pensar o que fazer para
M: Desde o início do ano a gente faz assim, de... Uma professora, eh, a gente não
deixar passar em branco, mesmo que seja um... De dizer um palavrão com o
outro, né, mesmo que seja essa prática, assim, que não seja violência física, mas a
gente conversa, na sala, e sempre leva pra, pra confrontar, pra poder eles pedirem
desculpas um ao outro. Porque a gente observa que mesmo eles pequenininhos,
com seis anos, eles já têm essa... Sei lá, tipo assim, uma grande violência
reprimida, né, de chamar palavrão, de gritar com o colega, de não querer pedir
desculpas, não admitir que está errado. Então esse tipo de coisas que, muitas
vezes, em casa eles não, eles não tem esse costume de fazer. Na escola a gente
tenta fazer com que o, a desculpa, o pedido de desculpas seja um ato
importante. Entendeu? Valorizado, importante. Mesmo que seja só dizer,
‘Desculpe”, e amanhã fazer de novo. Muitas vezes eles, “Professora, ele pede
desculpas, mas amanhã faz de novo.”, aí eu digo, “E amanhã ele vai pedir
desculpas novamente.” Porque a gente tem que aprender pela palavra, não é...
Eh, todo dia a gente vai aprendendo as coisas, então se ele vai aprender, ele
precisa aprender a valorizar e a saber que “desculpa” significa que eu não vou
mais fazer aquilo. Um dia ele vai aprender.
162
parece apontar para um projeto comum, ao menos em relação à prática citada, que envolve
cidadania e valores. M coloca a percepção de que existe uma violência reprimida nas crianças e
que ocorre de a família não trabalhar com o pedido de desculpas e admissão do erro, por
exemplo. Tendo em vista esse desafio identificado, M traz a importância que isto seja trabalhado
aposta que o aluno aprenderá. A atuação mencionada sustenta a prática docente, lhe dá recursos e
sentido a despeito das dificuldades, e traz uma estilização do coletivo com raízes no gênero
M: (...) Atenção na atividade, mesmo que ele esteja de pé, mas o importante é se
ele está realmente entendendo o que tem que fazer, se ele tá aprendendo o
conteúdo. Não é só porque ele tá sentado, rígido, significa que ali eu tô
satisfeita, porque eu quero ver se ele aprendeu. Não é isso. Eh, não importa se
ele tá sentado ou em pé. Se não está atrapalhando o outro coleguinha, não tá
ficando na frente, mas se ele tá entendendo direitinho e prefere ficar em pé porque
não aguenta mais ficar sentado, então eu não tenho problema quanto a isso.
Entendeu?
interpessoal). A docente traz que sentar-se rígido na cadeira não significa que o aluno esteja
aprendendo, de modo que uma relativa agitação, como ficar em pé, que não atrapalhe os colegas,
Em relação às estratégias para fixar a atenção das crianças na leitura e trabalhar o livro “O
(...)
M: Foi um desafio bem grande pra... Pra mim, né? Porque o livro do Pequeno
Príncipe, ele é, ele é cheio de conceitos, né, de, eh, sentimentos que muitas vezes
não é, eh... Eles não têm essa vivência de, de dialogar com alguém. Geralmente
eles são mandados fazer, etc. Né? Então, como tinha muitos sentimentos e coisas
que, eh, tanto pra crianças podia ser considerado difícil pra eles entenderem, eu
sempre fazia essa história do desenho, chamava a atenção. (...) Então eu chamei a
atenção pra esses pequenos detalhes do livro. Como eu lia por capítulos ficou
mais simples deles compreenderem e relacionar, “Quantos vulcões tinham no
planeta B612 do pequeno príncipe?”.
como o fato de o livro “O Pequeno Príncipe” ser longo para crianças de seis anos, da inquietação
suscitada em apenas ouvir a história, da complexidade dos conceitos abordados e falta do hábito
de dialogar das crianças. Em função disto, do confronto com o real, M traz a estilização de sua
atividade, que certamente bebe da cultura do gênero profissional e engendra um poder de agir.
164
Ela lê o livro por capítulos e encontra formas de desenvolver a atenção e a memória das crianças
através de perguntas feitas sobre a história ou de desenhos, ou, no caso de um livro mais simples,
da sua projeção para que as crianças tenham um suporte visual. As atividades envolvem seu
engajamento pessoal norteado pelo prescrito, que também está imbuído do gênero profissional, e
das crianças.
O trecho evidencia a percepção de trabalho bem feito de M, que se reflete no fato de seus
alunos terem compreendido bem a história do Pequeno Príncipe, o significado de cativar, que é
uma palavra complexa. Apesar dos desafios, M acredita que os alunos sejam capazes de
compreender e traz mediações para tornar a tarefa possível, apoiando-se, por exemplo, em
M: Eh, eu queria acrescentar que, que o ajudante do dia é uma estratégia... Não
é nova. Eu acho que todos os professores gostam de fazer essa, essa, essa
estratégia porque assim, dá a oportunidade de todos serem ajudantes. Eles vão de
acordo com a lista de, a ordem do alfabeto, e assim, eles se sentem valorizados,
importantes, e além do que, eh... Tira de você, só, aquela história de você ser o
único detentor de tudo, né? O professor. Você divide a responsabilidade com
eles. E isso valoriza muito, e eles gostam disso aí. (...) Faltou eu complementar
isso aí, né, de, de valorizar esses pequenos gestos. Que eu chamo de pequenos,
mas que são hábitos importantes. Muitas vezes eles não têm o hábito de ajudar
a mãe em casa. Entende? Então assim, essa parte de ajudar a professora, que
eles podem levar como experiência pra vida deles. Ou trazer de casa a
experiência que eles têm em casa pra a escola, né. Algumas meninas têm a
prática de ajudar a mãe e elas já dizem. Mas raramente os meninos têm. Então as...
Do mesmo jeito que eu faço com as meninas, de ajudar, eles tamb... Os meninos
também fazem isso. Né?
M coloca o gênero profissional por trás da prática do ajudante do dia como algo
importância de criar hábitos na escola e mesmo de aproveitar hábitos que existem em casa para a
cooperação. Trata-se de uma experiência que produz autonomia e enriquece o repertório das
quem é que ia ser no dia seguinte, “Ah, vai ser fulano, dia seguinte. Se fulano não
veio, aí o seguinte da lista”, então assim, se eu não fizesse... Esquecesse algum dia
de adotar a prática do ajudante, eles mesmos me cobram. Me cobram de todo
jeito, né, “Ah, professora, hoje você não disse quem é o ajudante.”, eu digo,
“Vamos ver, quem foi ontem?”, “Foi fulano”, então a gente compara lá na
relação do qua... Do que tá na parede, a relação dos nomes, e eles dizem, “Ah,
hoje é fulano!”. Como eles já estão conseguindo ler o nome próprio deles, que é
o primeiro a... Acho que a primeira leitura, o primeiro texto que eles aprendem,
né, a ler, é o nome. Então eles fazem essa leitura e sabem já o nome dos colegas
também, que eu achei isso muito positivo também. Porque foi uma estratégia
que inicialmente não era pedagógica, mas que depois passou a ser, porque ele
vai fazer leitura, né, procurar o nome dele, procurar quem é que vai ser amanhã,
procurar quem foi ontem. Né, tem vários conteúdos envolvidos aí nesse, nessa
simples atividade do ajudante do dia.
relação com os alunos (dimensão interpessoal), adquirindo também uma função pedagógica não
M: (...) Eu trabalho não só com atividade escrita, mas a gente fez também
medição do aluno. O tamanho do aluno, o peso do aluno, né? O tamanho das
coisas da sala de aula a gente usou medição com fita métrica, com régua. Então
não foi só a atividade escrita em si. Teve a atividade prática, né? E, por exemplo,
colocar quantos litros, quantos copinhos descartáveis eu preciso pra encher, pra
despejar esse litro de água? Então a gente fez experimentos na sala que ajudou a
construir esse conceito, né, de, de medição. Porque no primeiro ano, com os
direitos de aprendizagem, eles têm que ter noções, né? Desse, desses
167
dimensão prática (gênero profissional). A docente também fala em construir conceitos, o que
gênero profissional. M alude aos direitos de aprendizagem que apresentam papel norteador
M coloca que costuma ter dois momentos na semana destinados ao contato das crianças
com os livros e que não os utiliza unicamente entre uma atividade e outra, quando os alunos estão
esperando seus colegas terminarem uma atividade, pois essa prática excluiria as crianças que
(...)
M: (...) Todas as três turmas de primeiro ano tem o acervo de livros do PNAIC, as
do segundo e terceiro, certo?
Sobre a ausência dos livros didáticos em sua turma, M traz a existência de um problema
recorrente ligado ao censo escolar que registra necessidades da escola que variam de um ano para
o outro devido ao ingresso de mais ou menos crianças, o que determina o envio pelo MEC de
M: (...) o que foi adotado na escola não veio, veio outro livro de Português, de
Matemática. Então, na verdade a gente perdeu em qualidade porque como não
foi o livro que a gente adotou, veio ou... Vieram outros. E minha turma nem esse
outro veio, né? De qualquer maneira eu achei positivo porque eu tive a
oportunidade de pesquisar em outras fontes. De usar outras, outros recursos,
pra não ficar só amarrada a um livro didático, entendeu? (...) Eh, se o livro
didático estiver dentro dessa orientação dos direitos de aprendizagem, tudo
bem, é uma ajuda, né? Mas e, como a gente, eh, escolheu um livro que tava com
essa orientação e ele não veio, veio outro que não tava com a orientação do
PNAIC, tava fora desse, dessa questão dos direitos, tava mais tradicional esse
livro, então, pra mim, foi um ganho não ter o livro. Entendeu?
169
M traz os entraves do sistema educacional quando diz que o livro escolhido pela escola
para o primeiro ano, que segue as orientações do PNAIC, não foi disponibilizado e, ao invés
disso, outro material considerado mais tradicional pela professora foi distribuído. O livro
didático, nessas condições, aparece como um potencial entrave para a atividade, ficando em
evidência seu papel de prescrição que norteia a prática, de modo que não possui-lo foi percebido
como um ganho para M. Essa situação revela a desconsideração, pelo sistema educativo, da
garantia de condições básicas para a realização do trabalho docente e autonomia dos coletivos nas
M: As professoras que estão fazendo PNAIC agora, e que tem o livro, elas tão
reclamando muito, “Ah, porque isso aqui, o PNAIC não orienta muito assim, e
o livro só quer desse jeito.”, então acaba que o pai, quando vê aquele conteúdo
do livro, ele quer que você dê conta daquele conteúdo do jeito que tá lá.
Quando você sabe que pode trabalhar mais rápido e melhor s... Eh, de outra
maneira. Tá entendendo? Então assim, é uma faca de dois gumes, você tem que
ter... Se você conhece realmente muita, mais coisa, tem mais experiência... Eu
acho que a experiência conta muito nessa hora. De você saber julgar, né, o que
é que um livro pode ajudar e quando ele atrapalha um pouquinho. Né, no meu
caso dificultou a questão da pesquisa (necessidade de pesquisar as atividades),
mas por outro lado, como eu faço o PNAIC desde 2013, há três anos que eu faço,
né? Bem direitinho, sem faltar aos encontros. Eu fiz o de língua portuguesa, fiz o
de matemática, fiz a parte de projetos, né, de, de ter um conteúdo voltado pra
questão de projetos, de sequência didática. Então me ajudou muito! Tanto que eu
nem senti muita falta do livro didático. Entendeu?
M retrata conflitos vividos por docentes de sua instituição entre diferentes prescrições de
trabalho representadas pelo livro didático ofertado à rede e pelas orientações do PNAIC, que
vista os programas ofertados à rede, como os do PNAIC, e a não disponibilização de livros pelo
MEC que sejam coerentes a esta perspectiva. A situação enseja conflitos de dimensão
interpessoal quando M refere-se a pais de alunos que pressionam no sentido da realização das
atividades do livro, enquanto considera poder trabalhar mais rápido e melhor (trabalho bem feito)
sem vínculo com um livro didático que, de acordo com a docente, não contribui para o bom
quando ele atrapalha, enfocando a autonomia docente, que implica na construção de uma base de
saberes. A docente coloca o desafio de envolver-se em uma atividade mais intensa de pesquisa
das atividades para os alunos e traz a importância dos cursos de formação do PNAIC como fonte
de orientação e suporte para a sua prática, enriquecendo o gênero profissional, permitindo maior
Doravante serão trazidas e comentadas falas de M sobre suas impressões acerca das
entrevistas realizadas.
bem feito: “assim deu certo”, “assim não deu certo”. Estas situações de colocar em comum têm
comum, o que revela o prescrito e o gênero profissional envolvido, compartilhado por um grupo.
M ressalta sua experiência e o fato de continuar aprendendo, o que reflete a relação dinâmica que
tem com sua atividade. A profissional traz a importância dos cursos do PNAIC para o
instrumentos de trabalho.
M: Então assim, Meu Deus do Céu! Eu acho que eu tenho experiência pra dar
um curso, tá entendendo? Eu nunca parei pra pensar como é interessante a
gente conversar com alguém sobre a experiência da gente. Apesar de a gente
172
discutir no PNAIC, discutir já com uma, uma orientação voltada pra aquela
questão do letramento e da alfabetização, mas me, me fez perceber isso aí. Que eu
tenho muita experiência, é uma experiência que é baseada na teoria, mas
também é muito, aprendi muito com a prática. Né, então a ponte entre teoria e
prática foi importante pra mim, mas com, com essa pesquisa me ve... Me veio
essa ideia aí, Meu Deus, eu tenho tanta experiência pra dar um curso!
Realmente, né, de alfabetização e letramento, mas ao mesmo tempo eu fico
inquieta porque eu sei que falta muita coisa ainda e, e eu gosto muito do que eu
faço.
proporcionada pelo diálogo com a mesma, próprio da clínica da atividade. M traz com espanto a
percepção de que possui experiência suficiente para dar um curso, o que pode ampliar ainda mais
seu poder de agir, ainda que a docente, ao longo das entrevistas, tenha dado mostras de
coloca sua experiência fundamentada na relação entre teoria e prática, condição de produção de
que eu falo, ganho de ver uma criança aprendendo a ler, né? Começa o ano, eu
tinha, no início do ano só tinham dois alunos que sabiam ler, que tavam
começando a leitura. No início do ano, chegaram assim já. Hoje eu saber que tem
80% já lendo, fica... Eu fico feliz demais, né, pra mim isso aí era pra ser... É um
motivo de orgulho pra mim. Tá entendendo?
No trecho acima, M traz as condições difíceis de trabalho, capazes de tirar o prazer pela
atividade, embora ela própria relate ter prazer com o que faz. A docente ressalta ganhos dos
coloca que aprende com os alunos, enfocando a dimensão interpessoal da atividade e seu
atividade docente no primeiro ano, como o de ver uma criança aprender a ler, e demonstra
satisfação tendo em vista a percepção de realização de um trabalho bem feito, considerando que
cerca de 80% dos seus alunos são capazes de ler ao final do primeiro ano.
M: Como eu consegui sem o livro didático, aí eu fico pensando assim, Meu Deus,
realmente, eu fiz um bom trabalho. Né? Pra me orgulhar. E as mães chegam
pra mim felizes da vida, e isso, eh, pra mim não tem preço, né, uma pessoa de
uma classe popular, de uma escola pública, chegar pra você e dizer, “Professora,
parabéns pelo seu trabalho.”. A mãe chegar pra mim e dizer isso... Às vezes diz
no facebook, elas tem acesso, a gente se comunica, né. E ela coloca agradecendo,
eu fico feliz demais de ver a satisfação dos pais e das crianças, saber que tão
aprendendo. Que eles dizem assim, “Tia, eu aprendi a ler com você.”, é muito
bom isso. Gratificante, então, coisas que a gente só tem na profissão da gente,
mas... Que a gente sabe que a desvalorização salarial é grande, né. E às vezes
atrapalha muito nosso trabalho. Né?
174
ao seu trabalho e percepção de fazer um trabalho bem feito apesar dos desafios. A docente coloca
o reconhecimento de familiares dos alunos e das próprias crianças sobre o seu trabalho e finaliza
sua fala trazendo à tona a desvalorização salarial dos professores, fator que dificulta o trabalho e
a vida.
encontrados, tendo em vista que estes perfis fazem aproximações entre elementos que compõem
diferentes os sujeitos. As profissionais recrutadas com base nos perfis revelaram formas distintas
diferentes perspectivas.
suporte face ao real, expressando sofrimento, além de condições clínicas, como fenda nas cordas
vocais, dores no corpo, etc. A profissional pertencente ao perfil de baixo risco psicossocial, M,
que reconheceu elevado suporte social, revelou-se satisfeita e realizada com o trabalho, trazendo
175
Sobre as condições objetivas que medeiam a atividade de trabalho, S trabalha dois turnos
em locais diferentes, ambos distantes de onde habita, tornando a conjuntura mais difícil em
diferentes. M trabalha os dois turnos no mesmo local e vive perto da escola, favorecendo seu
ensino pode implicar em familiaridade com o bairro e comunidade atendida pela escola, o que
elementos que podem ter impacto no trabalho docente. S também traz, no começo de sua história
enquanto docente, que houve lida com condições objetivas complexas de trabalho sem suporte
aparente, como o fato de lecionar para uma turma com 38 alunos em situações heterogêneas de
aprendizagem.
nos cursos do PNAIC e orientação da prática com base nos direitos de aprendizagem. Estes
norteados pela busca da realização de um trabalho bem feito. Aponta-se para a potencial
práticas e discussões em grupo, pela ponte entre teoria e prática e pela orientação com base nos
176
direitos de aprendizagem, que embora certamente precisem ser ampliados e discutidos, tendo em
vista os interesses contraditórios que perpassam a educação, têm potencial para nortear e produzir
No entanto os cursos do PNAIC não são suficientes para melhorar o contexto da educação
Natal ou no Brasil. Isto porque formar e orientar sem assegurar boas condições de trabalho aos
professores (salário, progressão, tempo para planejamento, número adequado de alunos por
desafios impostos, autonomia dos coletivos na escolha dos materiais, etc.) atravanca o
culpabilização de si, dos alunos e das famílias. Outra razão é que mesmo as propostas de
proposta norteadora para os anos inicias do ensino fundamental que, na falta de um projeto
comum, segue sendo orientado, dentre outros, pelas avaliações e defesas engendradas pela
contraditório. Exemplo disto é que a mesma rede que oferece cursos do PNAIC disponibiliza
livros didáticos que não contemplam seus princípios. Ainda sobre o PNAIC, ocorre de as
formações ocorrerem aos finais de semana, momento que muitos professores encontram para
um contexto alienante que coloca o professor como herói, mas não lhe oferece condições de
participaram na produção de uma vivência da sala de aula enquanto campo de batalha, lugar de
realização da atividade à revelia dos próprios alunos e desafios encontrados, situação paralisadora
da ação e de seu desenvolvimento, uma vez que os alunos são ativos e fundamentais na co-
Por sua vez, a vivência da atividade de M traz à tona sentimentos de satisfação e prazer
pelo trabalho. M utiliza-se de recursos ofertados pelo município, como os cursos do PNAIC, que
profissional) que lhe permitem ter voz face ao real com autonomia e criatividade no sentido de
um trabalho bem feito em que a prescrição volta-se ao aprendizado e alfabetização dos alunos.
situações e histórias que produzem vivências. Embora as entrevistas utilizadas não esgotem a
vivência da atividade dos sujeitos, elas apontam para sua forma de construção e revelam aspectos
elementos do contexto social mais amplo que se relacionam com os lugares ocupados pelas
educação pública. O adoecimento docente, por exemplo, está relacionado aos interesses
contraditórios em jogo que prescrevem o fracasso escolar, no entanto este cenário compreende
para os alunos, capaz de produzir mobilização intelectual e acesso aos instrumentos da cultura.
179
7. Conclusão
A presente pesquisa pretendeu enfocar a atividade docente nos anos iniciais do ensino
públicas, dentre outras razões, pelo percentual importante identificado de profissionais que se
encontrar-se “sem voz” face ao real, enquanto produtora de adoecimento e entraves para a
ponte teoria-prática, bem como através dos conflitos engendrados que mobilizam e gestam o
novo.
mostrou-se capaz de gerar reflexão e ampliação da consciência sobre a atividade, bem como
entrever pequenas mudanças na prática, embora o trabalho com um coletivo nas instituições
tivesse mais chances de gerar mobilização e servir ao contexto local em uma perspectiva de longo
prazo.
180
insatisfação dos docentes com as reuniões semanais (33,7%) e tempo para planejamento
pedagógico (37,8%), pouca familiaridade com o PPP da escola (47,7%) e consideração de pouca
presença de discussão teórica nas reuniões de planejamento (40,7%) e relação destas variáveis,
subjetividade dos indivíduos deve dirigir-se ao trabalho bem feito e à construção de referenciais
coletivos para a prática, o que envolve a discussão em torno do PPP da escola na construção de
No entanto, como apontado ao longo da pesquisa e trazido por Anjos (2013), há questões
de ordem estrutural que ultrapassam o poder de ação dos professores a nível local, ligadas ao
conjuntura política brasileira que tem promovido a aprovação de medidas impopulares e danosas
a trabalhadores, ferindo direitos sociais, tais a educação pública, como ocorre com a Proposta de
limite para os gastos públicos, prejudicando, por exemplo, o cumprimento das metas do Plano
dentre outros, limitando potencialmente o repasse da União aos municípios que precisam de
ampliando a situação de precarização dos trabalhadores. Nesse sentido, concordando com Anjos
(2013), ainda que o coletivo de professores possa dar suporte à ação na relação com a realidade e
diversas instâncias pela mudança das condições estruturais que compõem a atividade docente,
8. Referências
Alferes, M. A. & Mainardes, J. (2014). Um currículo para os anos iniciais? Análise preliminar do
documento “Elementos conceituais e metodológicos para definição dos direitos de
aprendizagem e desenvolvimento do ciclo de alfabetização (1º, 2º e 3º anos) do Ensino
Fundamental”. Currículo sem Fronteiras, 14 (1), 243-259.
Alves-Mazotti, A. J. (2008). Representação do trabalho do professor das séries iniciais: a
produção do sentido de “dedicação”. R. bras. Est. Pedag., 89(223), 522-534.
Anjos, D. D. (2013). A profissão docente em questão: Gênero de atividade, gênero do discurso e
habitus (tese de doutorado). Campinas: Universidade Estadual de Campinas – Faculdade
de Educação.
Anônimo (2016, 30 de Março). Natal tem 580 professores fora de sala de aula por licenças
médicas e especiais. Portal no ar.
Antunes Lima, M.E. (2006) Escritos de Louis Le Guillant: da ergoterapia à psicopatologia. Petrópolis,
Vozes.
Arelaro, L. R. G. (2005). O Ensino Fundamental no Brasil: Avanços, Perplexidades e
Tendências. Educ. Soc., 26(92), 1039-1066.
Asbahr, F. S. F. (2005). Sentido pessoal e projeto político pedagógico: Análise da atividade
pedagógica a partir da psicologia histórico-cultural (dissertação de mestrado). São
Paulo: Universidade de São Paulo.
Batista, J. B. V., Carlotto, M. S., Coutinho, A. S. & Augusto, L. G. S. (2010). Prevalência da
Síndrome de Burnout e fatores sociodemográficos e laborais em professores de escolas
municipais da cidade de João Pessoa, PB. Rev Bras Epidemiol, 13 (3), 502-512.
Bonamino, A. & Sousa, S. Z. (2012). Três gerações de avaliação da educação básica no Brasil:
interfaces com o currículo da/na escola. Educação e Pesquisa, 38 (2), 373-388.
Bourdieu, P., & Champagne, P. (1998). Os excluídos do interior. In P. Bourdieu (coord.).
Escritos de educação (pp. 217-227). Petrópolis: Vozes.
Brasil (2012). Informações estatísticas - Docentes, ensino fundamental, escola pública
municipal. Natal, RN: IBGE.
Brasil (2015). Informações estatísticas - Docentes, ensino fundamental e pré-escolar, escola
pública municipal. Natal, RN: IBGE.
Canguilhem, G. (2009). O normal e o patológico (M. T. R. C. Barrocas, Trad.). Rio de Janeiro:
Forense Universitária. (Obra original publicada em 1966).
Carissimi, A. C. V. & Trojan, R. M. (2011) A valorização do professor no Brasil no contexto das
tendências globais. Jornal de políticas educacionais, (10), 57-69.
183
ANEXO A
Em relação a cada uma das afirmações que se seguem acerca de seu trabalho, marque sua
Marque em seguida com um “x”, nos parênteses, suas avaliações para cada uma das afirmações
abaixo (para cada afirmação você deve marcar UMA ÚNICA opção):
Q4 - Seu trabalho lhe permite tomar muitas decisões por sua própria conta.
Q6 - Em seu trabalho, você tem pouca liberdade para decidir como fazê-lo.
funcionamento, etc.).
Q13 - O tempo para realização das suas tarefas é suficiente para concluí-las.
Q14 - Em seu trabalho, você está livre de demandas conflitantes feitas por outros.
Q15 - Seu trabalho exige longos períodos de intensa concentração nas tarefas.
Q16 - Suas tarefas, muitas vezes, são interrompidas antes que você possa concluí-las,
Q18 - Esperar pelo trabalho de outras pessoas, muitas vezes, torna mais lento o ritmo do
seu trabalho.
Q20 - Seu(s) superior(es) hierárquico(s) prestam atenção nas coisas que você fala.
Q21 - Você se sente apoiado/ajudado no seu trabalho pelos seus superiores hierárquicos.
equipe.
Q23 - As pessoas com quem você trabalha são competentes na realização de suas atividades.
Q24 - As pessoas com quem você trabalha interessam-se pelo que acontece com você.
Q26 - As pessoas com quem você trabalha são colaborativas na realização das atividades.
Q27 - Há momentos destinados à discussão e reflexão entre você e as pessoas com quem
trabalha. (Questão acrescentada pela pesquisadora não contabilizada para cálculo dos escores)
ANEXO B
2008).
Dimensão Fórmula
Q10+Q11+Q12+
Demanda Psicológica
(5-Q13)+Q14+Q15+Q16+Q17+Q18
4*Q4+4*(5-Q6)+4*(Q8)+2*
Latitude de Decisão
(5-Q2)+2*(Q5)+2*(Q7)+2*(Q1)+2*(Q3)+2*(Q9)
APÊNDICE A
Questionário Sócio-Profissional
pedagógicos e participativos que compõem o perfil de professores dos anos iniciais da rede municipal de
Natal.
Aspectos sócio-demográficos
Gênero:
( ) Masculino ( ) Feminino
( ) Outro (Especificar):________________
Idade:___________
Estado civil:
( ) Solteiro(a) ( ) Divorciado(a)
( )Viúvo(a)
Filhos:
( ) Sim ( ) Não
Se sim, quantos?_________
Tempo na profissão:__________
194
Aspectos de formação
( ) Licenciatura curta
( ) Graduação
( ) Outro (Especificar):_______________
superior, etc.):_________________________________________________________________________
( ) Pública ( ) Privada
Modalidade de ensino:
1-------2------3-------4
195
( ) Sim ( ) Não
Modalidade da pós-graduação:
( ) Ambas
( ) Não se aplica
( ) Pública ( ) Privada
Modalidade de ensino:
Como julga a pertinência da formação stricto sensu para a área de atuação? 1 equivalendo a
1-------2------3-------4
Área da pós-graduação lato sensu (especializações). Se possuir mais de uma, escolher a mais
( ) Pública ( ) Privada
Modalidade de ensino:
( ) Presencial ( ) À distância
Como julga a pertinência da formação lato sensu para a área de atuação? 1 equivalendo a
1-------2------3-------4
( ) Sim ( ) Não
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
Modalidade:
Como julga a contribuição dos programas para a área de atuação? 1 equivalendo a “Insatisfatória”
1-------2------3-------4
1-------2------3-------4
1-------2------3-------4
1-------2------3-------4
Aspectos ocupacionais
Em que Nível e Classe de progressão situa-se (de acordo com o plano de carreira)?
_________________________
( ) 1º ( ) 2º ( ) 3º ( ) 4º ( ) 5º
( ) Outro (Especificar):_______________
Vínculo:
( ) Efetivo ( ) Temporário
( ) 20 horas ( ) 40 horas
Turno em que leciona/trabalha na presente instituição (marcar mais de um, se for o caso):
( ) Sim ( ) Não
Se sim, quantos?_________
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
( ) Sim ( ) Não
Possui outro vínculo profissional ou realiza outra atividade para fins de complementação de renda?
( ) Sim ( ) Não
( ) Sim ( ) Não
Tipo de vínculo:
( ) Efetivo ( ) Temporário
Regime de trabalho:
( ) Outro (Especificar):_____________
Em caso de exercer outra atividade ou possuir vínculo profissional não relacionado à escola,
_____________________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________________
pedagógico da escola?
( ) Sim ( ) Não
1-------2------3-------4
200
Como avalia a quantidade de tempo disponível para planejamento das atividades de sala de aula? 1
sua escolha.
1-------2------3-------4
Como avalia a contribuição das reuniões de planejamento pedagógico para fins de reflexão e
1-------2------3-------4
Como avalia a presença de discussão, debate e reflexão de ordem teórica nas reuniões de
1--------2--------3--------4
( ) Sim ( ) Não
Com que frequência participa das atividades do Conselho Escolar (ainda que como observador) na
presente instituição?
Considerando a experiência, ainda que como observador: Como avalia os encontros do Conselho
Escolar tendo em vista a participação, qualidade e pertinência das discussões e tratamento dos
1-------2------3-------4
( ) Sim ( ) Não
Como avalia sua participação e envolvimento nas questões da categoria enquanto membro? 1
1-------2-------3-------4
Considerando 1 “Insatisfeito” e 4 “Muito satisfeito”, como você se situa em relação à sua satisfação
1-------2-------3------4