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Este meu trabalho de pesquisa está no formato de um CBA, Caderno

Brasileiro de Astrologia, publicado pela GAIA Escola de Astrologia em


dezembro de 2007.

Após encontro com colegas que pesquisam profundamente o conhecimento


astrológico me reconectei com o interesse de voltar meu olhar para este
conteúdo. Muita revisão e atualização são necessárias.

De qualquer maneira, a leitura a seguir pode auxiliar a compreensão dos


fundamentos da Astrologia e da Teoria dos Temperamentos.

Beatriz Martins Mendes Ferreira.


Novembro, 2017
A todos os guardiães do conhecimento, desejo que a clareza e o discernimento continuem
iluminando a vida de vocês.
Nicholas Culpeper
A Conciliação da Astrologia e Medicina

Agradecimentos
Prefácio
Introdução
Por que pesquisar Astrologia e Medicina
O céu por onde Culpeper passou
Assim é apresentado nos livros
Contexto Histórico
Seu Trabalho
A Herança Grega
Princípios da Medicina Holística Ocidental
Os 4 Elementos
Os 4 Temperamentos
0s 4 Humores e o Conceito de Saúde
O corpo, suas faculdades
O Calor Inato e as 4 fases da Vida e as Faculdades Secundárias
Faculdades Físicas Secundárias
Qualidades Secundárias dos 4 elementos
Medicamentos Fitoterápicos: tratamentos e diagnósticos
Sua Contribuição
Minha prática
Minhas percepções
Bibliografia
A autora
Agradecimentos

Agradeço a todos os que contribuíram para meu aprofundamento astrológico. A Luciana


Rothberg, professora de astrologia em Belo Horizonte; a Eduardo Maia, com quem tive a
oportunidade de fazer um curso de formação básica completa quando de minha temporada
no Rio de Janeiro; a Celissa Beranger e Márcia Mattos, com quem fiz pequenos cursos na
antiga escola Astrocientia ; e a Robson Papaleo, da escola Gaia de São Paulo.

Meus agradecimentos especiais a Carlos Fini, fundador da escola Hermes, que me


propiciou unir todos esses fragmentos de conhecimento e me orientou neste trabalho.

E finalmente aos autores dos inúmeros livros que utilizei como consulta, material
fundamental para a realização deste trabalho.
Prefácio

Desde cedo interessei-me em compreender o comportamento das pessoas e a


possibilidade da interferência do meio em que estavam inseridas.

Iniciei na arquitetura trabalhando com o meio físico construído, percebendo como a forma,
a cor e o tamanho do espaço poderiam afetar a vida de uma pessoa. Depois passei um
bom tempo na área de marketing e negócios, intermediando necessidades entre empresas
e observando como ocorre essa comunicação. Finalmente, parti para a busca do
conhecimento nas leis naturais e em uma maior convivência e observação do ser humamo
através do mergulho no conhecimento astrológico e em uma formação terapêutica.

Hoje consigo enxergar claramente qual era o caminho que eu buscava, mas durante o
processo muitas vezes conflitos pessoais não me permitiam compreender.

A inclusão da Astrologia em minha vida foi algo bastante trabalhado internamente até
chegar aqui nesta forma de expressão escrita.

Formada em Arquitetura e depois em Marketing, trabalhei em empresas multinacionais que


reforçaram minha convicção na época de que a Astrologia seria apenas um foco de
satisfação intelectual.

Mesmo sendo executiva de empresa e com o tempo curto, mantinha aceso o interesse pelo
conhecimento astrológico. Primeiro de uma forma autodidata, depois em escolas. Viajava
muito a trabalho, mudei de cidade e estado inúmeras vezes e mesmo assim a paixão pelo
conhecimento astrológico seguia firme dentro de mim.

Quando me dei conta do grande vazio que sentia com a vida que estava levando, decidi
mudar drasticamente, dar uma guinada enquanto ainda era tempo.
O processo de sair da vida de executiva de multinacional durou 3 anos. Curiosamente, no
momento da virada estava na minha melhor fase profissional, o que para a direção da
empresa em que trabalhava parecia algo ainda mais inconcebível. Lembro-me bem da cena
na sala da presidência. Incrédulos, diretor e presidente chegaram a me oferecer um
afastamento por um tempo, um tratamento, pois aquela decisão, para eles, parecia
proveniente de um quadro de stress – ou pura loucura.

O que você vai fazer? me perguntaram. Acho que Astrologia – respondia. Será que isto
não é um apenas um hobby seu?

Após muito trabalho pessoal percebi que aquilo não passava de projeção minha, ou seja, o
inquisidor morava bem aqui dentro. Essas perguntas era eu mesma quem me fazia.

Esse inquisidor dentro de mim foi na verdade muito benéfico, pois no final das contas me
impulsionou a pesquisar e ir atrás dos fundamentos do conhecimento astrológico ainda com
mais garra.
Hoje, a minha prática astrológica tem sido o atendimento pessoal, palestras e cursos
resultantes de meus estudos, além de workshops e trabalhos em parceria com outros
profissionais.

A Astrologia tem sido extremamente curativa para mim. Tenho uma avidez de
conhecimento, o que durante um tempo gerou muita frustração, por perceber que não
conseguiria abarcar todo o conhecimento que envolve esta ciência. Com o pensamento
transdisciplinar astrológico, consegui baixar tremendamente minha ansiedade e finalmente
posso dizer que me encontrei.

O conhecimento astrológico e também meu trabalho de autoconhecimento contribuíram


para uma compreensão mais integrada e confiante da manifestação da vida.

Esse caminho esteve sempre orientado pelo meu grande desejo, secreto durante um
período, de ser uma astróloga. E percebo isso pelo imenso prazer que sinto quando estou
trabalhando com a Astrologia. Ser uma astróloga e conviver com o conhecimento cuidado
por tantos através dos tempos é a conquista de um sonho antigo.

O trabalho que apresento a seguir faz parte desse caminho.


Introdução

Quando estive na Inglaterra em 1999, estudando na Faculty of Astrological Studies, tive a


oportunidade de conhecer mais de perto o trabalho de Nicholas Culpeper através de uma
palestra feita pelo médico Graeme Tobyn, um membro do Instituto Nacional Inglês de
Médicos Herbalistas.

O empenho em trazer para a prática e tornar acessível um conhecimento tão complexo


foi o que mais me impressionou em Nicholas Culpeper, e isso me parece ser o dia-a-dia de
todos os que enveredam pela Astrologia.

Nicholas Culpeper, herbalista inglês do século XVII, figura lendária no campo da Medicina
Naturalista, foi um dos grandes mestres da Astrologia e da Medicina. Tinha uma natureza
questionadora e inovadora, um espírito insatisfeito, inquiridor e inquieto, enfim muitos
requisitos de um cientista.

Compartilhava da visão tradicional abrangente onde mente, corpo e espírito formam uma
unidade e a saúde se define como o TODO. Foi um dos precursores do sistema energético
da Medicina ocidental e – por que não – da homeopatia e da autocura.

Tem publicações importantes nas áreas de ginecologia, pediatria e anatomia, mas sua
maior contribuição foi no campo do herbalismo, onde utilizou a simbologia astrológica para
pesquisar e explicar o uso medicinal das ervas.

Nesse trabalho pretendo clarear e demonstrar a linha que orientou o seu caminho. Além
disso, vasculho um pouco a personalidade que assumiu, uma vez que obra e sujeito não
são dissociados.

Conhecer Culpeper, seu trabalho e seus conflitos ajuda a compreender a importante


contribuição que o conhecimento astrológico oferece ao entendimento da vida, da interação
existente entre nós, humanos, e nosso meio.

Prepare-se: iremos fazer uma viagem através do tempos.


Por que pesquisar Astrologia e Medicina

Uma área do conhecimento com aproximadamente 6.000 anos de observação, estudos e


aplicação como a Astrologia, que acompanhou apogeu, declínio e queda de inúmeras
civilizações e culturas, interpretada e compreendida de inúmeras formas, solicita de nós um
espírito de restauradores para que possamos trazer a luz, a essência, a peça original.

Minha intenção é relembrar a contribuição do conhecimento astrológico para a


compreensão do comportamento humano e o imenso auxílio que a Astrologia vem
oferecendo há milênios para a compreensão da vida e do Homem, bem como de que forma
ocorre a interação homem e experiência de vida.

Os primeiros pensadores sobre a Natureza e sua forma foram os Filósofos da Natureza,


por volta do século IV, na Grécia. O conhecimento inicialmente veio através da
contemplação da natureza e da observação dos ciclos repetitivos da vida.

Não existia neste momento da História da Humanidade uma arte individualizada que
compreendesse o indivíduo, indivíduo e meio estavam inseridos em um mesmo campo de
observação. Era possível neste momento vislumbrar, compreender e aceitar a interligação
de Homem e Natureza.

A posição de alguns médicos e sofistas, seguidores da Filosofia da Natureza, era a


que não se pode entender de Medicina sem se saber o que é o Homem, como
nasceu e de que material é formado.

Médico na idéia primitiva era apenas um homem que receitava caldos e poções, mas ainda
sem um método, sem um sistema de observação e comprovação para sua aplicação. A
cura de possíveis enfermidades do ser humano estava sendo cuidada apenas pela área do
saber ligada à alimentação e à culinária.

A Medicina grega tornou-se uma arte consciente e metódica sob a ação da filosofia
jônica da Natureza, diferenciando-se como uma arte especializada e independente.
A Medicina grega só se diferenciou como profissão após receber a ajuda da
Filosofia da Natureza, que continha o olhar e pensar astrológico sobre a
manifestação da vida e o comportamento humano.

A individualização ocorreu quando se associou o empirismo a uma observação


minuciosa da cada caso concreto. A investigação da Natureza não conhecia ainda,
naquela época, a exigência da exatidão. E a Medicina é a ciência natural que
estabelece antes de nenhuma outra essa exigência.

Em 1628, com a descoberta de que a circulação do sangue provinha do coração, e que


este se comparava a uma bomba, o corpo humano passou a ser tratado como uma
máquina. E physis passou a ser tratada separada da psique.
O processo de especialização iniciado na Grécia surgiu de uma forma bastante acentuada
e o conhecimento fragmentou-se, chegando ao ponto de até hoje sermos questionados
sobre a ligação entre a vida experimentada pelo Homem e os ciclos da Natureza.

Assim, o que tem a ver minha vida com o movimento dos corpos celestes? Isto deve
ser coisa de crédulo ou misticismo...

Fica realmente difícil compreender o olhar astrológico para a vida. E através da vida de
Nicholas Culpeper demonstro a sustentação da verdade astrológica, relembrando e
clareando a visão astrológica tradicional sobre a vida e o comportamento do Homem.

O estudo natural do mundo através do qual obtemos conhecimento


para curas, está tão distante quanto as estrelas.
Nicholas Culpeper
O céu por onde Culpeper passou

( foi retirada uma parte para revisão).

Uma personalidade marcante e dominadora, identificada com a autossuficiência,


trabalhadora e tenaz. Determinada, concentrada e persistente, com necessidade de
controle.

O nível de cobrança muito alto não deixa espaço para falhas. Auto rigidez e severidade com
tendência a serem superdesenvolvidas. Desejo de realizar qualquer tarefa muito bem, o
melhor possível e sem falhas, com a possível crença, por trás, de que só através do trabalho
árduo pode ser atingido o que se almeja.

Para confirmar que a vida não é fácil, tende a direcionar o olhar para as coisas mais
trabalhosas, ingratas e duras.

Uma pessoa observadora, investigativa e analítica, que busca resultados. Enfim, prática e
realista..

Personalidade onde a busca do conhecimento e do saber seja um traço marcante,


buscando sempre um conhecimento de forma vertical e aprofundada. A expressão verbal
privilegia a comunicação direta, sem rodeios, sem a preocupação a quem irá atingir.

E nos relata sobre persistência e concentração, habilidades necessárias a um pesquisador,


como também sobre idéias bem fundamentadas, quase imutáveis, denotando também a
rigidez como traço de personalidade.

Tendência tender a fixar críticas e perdas, gerando um humor melancólico dificuldade em


acreditar e ouvir elogios. Preferindo a comunicação direta sem rodeios, não acredita em
voz mansa.

O excesso de humor melancólico pode ter auxiliado na manifestação de suas doenças


crônicas. Culpeper morreu de uma doença pulmonar crônica, o que, para a análise da
somatização de doenças, denota uma tristeza profunda.

Acreditar que uma pessoa com essas posições astrológicas teria a intenção de agradar o
outro, ou ter uma fala politicamente correta, é praticamente impossível. Trata-se, ao
contrário, de alguém obviamente sem papas na língua, como se diz por aí. Na verdade,
podemos concluir que a intenção dessa expressão verbal de Nicholas Culpeper, muito
comentada nos livros, deveria ser mesmo a de atingir os limitados mentalmente, os que não
conseguiam perceber conexões abrangentes. Ou melhor, os que deixavam de valorizar a
visão tradicional da ordem da vida.

A posição lunar a dificuldade em aceitar conselhos e suportar autoridades externas é bem


compreensível, podendo gerar uma aversão a limites, regras e normas. Esta dificuldade em
reconhecer uma autoridade externa pode levar o indivíduo ao solitário caminho autodidata.
O que, de uma certa forma, confirma o diagnóstico, pois realmente não se encontram
registros sobre Culpeper ter concluído a faculdade de Medicina e, ao que tudo indica,
aprendeu sobre farmacopeia na prática.

Como para a Astrologia não há certo ou errado, não vai aqui nenhuma crítica, apenas trata-
se de uma observação, um relato dos fatos que, a meu ver, referendam sua personalidade.

A posição dos Luminares não deixa também espaço para a possibilidade do não sei. Ela
indica que toda a área da intelectualidade fica ocupada pelo desejo do quero conhecer tudo
profundamente.

Assim, vejo que, ao mesmo tempo que possuía uma disciplina muito grande, ansiava que
a regra fosse do seu jeito. Ou seja, existia um querer ditar as normas e na sua percepção
o melhor método era o seu.

Isto por muitas vezes expressou por escrito, dizendo que o trabalho que fazia tinha muito
mais profundidade, que ele explicava muito mais e que também ele poderia formar o médico
melhor do que a universidade.

… e não fazem nada mais do que treinar os jovens noviços na Fisiologia e Escola da
Tradição, como papagaios são ensinados a falar; ..., mas no meu caso você pode vê-lo
com os olhos da razão, você pode ver uma razão em tudo o que está escrito, e pode
encontrar o próprio fundamento da Fisiologia.
Nicholas Culpeper: tradução livre

Observando a vida de Culpeper a partir da Teoria dos Temperamentos, nota-se


principalmente uma orientação para o temperamento melancólico-colérico.

De uma forma sintética, as evidências coléricas surgem em suas qualidades de inovação,


na sua coragem e destemor, como também na sua indignação perante as injustiças, no
falar por impulso, em seu espírito guerreiro e justiceiro. E a sua porção melancólica auxiliou
na produção intelectual extensa e contínua com grande consistência e profundidade, o que,
segundo evidencia suas publicações, foram sua fonte de renda principal. O seu queixar-se,
pesar e também humor cáustico também seriam provenientes de um humor melancólico.

Oferecer o conhecimento ao povo e também ao doente sobre qual seria sua enfermidade
e de que forma poderia ser curada e abrir o conhecimento e o caminho da cura para o
homem comum e para a comunidade, podemos ver também como uma qualidade
melancólica. E isto o fez com maestria.

É o que contam os livros e o que nós, profissionais da Astrologia, poderíamos interpretar


da personalidade de Nicholas Culpeper.
Assim é apresentado nos livros

Citado como herbalista, médico, astrólogo e astrônomo, Culpeper viveu na Inglaterra no


século XVII, de 1616 a 1654. Figura lendária no campo da Medicina Naturalista, foi um dos
grandes mestres da Astrologia e da Medicina.

Foi um homem do povo e um autodidata (ingressou na universidade, mas não se encontram


registros de que tenha concluído a faculdade de Medicina). Dizia possuir duas amantes:
uma, a magia; a outra, a astrologia, duas áreas em que dedicava também seus estudos.

Como aprendiz de boticário, manteve


sociedade em uma botica por vários anos,
até seu sócio ser impelido a dispensá-lo,
uma vez que seria um praticante ilegal e
também recebera uma acusação de
feitiçaria.

Por ser um homem do povo, amava estar junto a ele. E foi assim que popularizou o
conhecimento até então só acessível aos chamados homens cultos. Até Nicholas Culpeper
toda a literatura médica era escrita apenas em latim, e isso dificultava à maioria das pessoas
compreender o processo de cura.

Escreveu num estilo extremamente pessoal e acessível, de maneira direta e


descompromissada, revelando seus insights e também as dificuldades que enfrentava em
seu trabalho. Com textos de fácil leitura, apimentava-os com pitadas de humor. Com isso,
afastou-se da linguagem médica dos doutores, que queriam manter seus pacientes na
ignorância utilizando terminologias gregas e latinas. Deste modo, revelou muito seu
processo de pesquisa, bem como suas dificuldades e angústias pessoais.

Recebeu uma formação cristã puritana, e isto pode ser observado em seu trabalho. Dentro
dessa formação, acredito que os princípios que mais lhe marcaram foram a humildade e
uma abominação ao orgulho, embora apresentasse muitas vezes essa faceta. Clamava por
uma democracia para todos nos modelos da Bíblia, aproximando os humanos do reino de
Deus.

Sua forma de expressão era muitas vezes passional e demonstrava abertamente suas
ideias inovadoras e revolucionárias a respeito de assuntos políticos, utilizando-se também
de sua formação cristã, expressando seus ideais como um propósito de Deus na Terra.
Chegou a prever nos almanaques anuais de profecias astrológicas uma democracia para
todos os povos. Claro que aqui estava projetando seus anseios pessoais no Céu.

Expressava abertamente sua indignação contra os que queriam explorar, pela saúde, os
pobres, os fracos e os adoentados, motivo pelo qual não foi muito benquisto, principalmente
pela classe médica e pelos boticários, que eram os grandes mercadores e importadores de
ervas na Inglaterra daquela época.

Chame um médico à casa de um homem pobre,


que não pode pagar sua consulta,
então ele não virá e a pobre criatura por quem Cristo morreu
acabará perdendo sua vida pela avareza.
Nicholas Culpeper tradução livre

Nicholas Culpeper, um homem revolucionário, era extremamente conhecido por fazer


colocações ríspidas, desafiar as autoridades estudadas e preferir a companhia dos pobres
e doentes. Sua ambição era reformar todo o sistema médico da época. Casou-se em 1643
e passou a praticar a medicina em sua casa, na área rural.

Seu grande desejo de ajudar os pobres e necessitados da Inglaterra de uma maneira direta
e prática, não apenas como boticário, mas também como um médico, levou-o a uma prática
ilegal. Uma vez que era um ser humano, podemos aceitar que também sua irreverência
contribuiu em sua prática profissional.

Sendo um grande questionador e rebelde, pagou o preço por seus pensamentos


revolucionários e pelos princípios contrários às tradições estabelecidas naquele momento,
sendo acusado de colocar a vida das pessoas em perigo.

Suas colocações não estavam baseadas apenas na religião cristã puritana, mas também
na ética proveniente da herança do conhecimento grego. E isso veremos mais para frente.
Contexto histórico
Nos meados do século XVI, na Inglaterra, havia uma oposição muito grande entre os
boticários e o Royal College of Physicians (Conselho Médico). Os boticários tinham crescido
muito através da importação de ervas, ou seja, tornaram-se grandes mercadores de
medicamentos importados.

No ano de 1523, o Royal College ganhou a autoridade de apenas seus membros


praticarem fisiologia (o ato de cura), em um raio de 7 milhas da cidade de Londres e também
de punir os que infringissem esta ordem.

Em 1616, tentou-se a separação de boticários e mercadores, ou seja, a separação dos


farmacêuticos e dos detentores da matéria-prima importada e em 1618, o conselho médico
da época publicou uma lista de medicamentos que as boticas poderiam vender apenas com
prescrição dos fisiologistas (antiga denominação dos praticantes da medicina).

Os boticários continuaram na prática da medicina geral, tendendo ir ao encontro das


necessidades médicas de uma população muito pobre e muito numerosa para o número de
fisiologistas em Londres – registros contam que a proporção era 1 para 5.000. Entre eles
havia os cirurgiões, que formaram uma companhia independente em 1540.

Os herbalistas, as parteiras e as curandeiras formavam outro grupo de atendimento às


pessoas em suas comunidades. Com um ato do Parlamento de 1542, estavam protegidos
da perseguição dos fisiologistas e cirurgiões aqueles com “conhecimento da Natureza” que
beneficiam e ministram certas ervas, raízes e águas, desde que pratiquem o atendimento
gratuito para facilidade e conforto, ajuda e saúde dos pobres sujeitos do rei.

Com a dissolução do Parlamento Inglês, em 1640, o colégio ficou receoso e resolveu recuar
de sua decisão. Assim, Culpeper pôde manter sua loja e a prática da Medicina até 1643,
quando se casou e mudou para o campo.

Ao mesmo tempo, os textos estudados nas universidades, recebidos na Europa durante o


século XV, continham grande influência dos textos herméticos traduzidos do grego para o
latim. Um dos tradutores foi Marsílio Ficino – astrólogo, padre cristão, músico e mágico
renascentista.

Ficino acreditava que através da cura de dores e doenças poderia haver a reconciliação
entre uma prática oculta como a Astrologia e as crenças cristãs.
Até o século XVII, o estudo da Astrologia fazia parte da educação do médico e era elemento
vital no tratamento das doenças. O aspirante a médico tinha necessidade de um
conhecimento completo de Astrologia.

A Universidade de Bolonha exigia dos aspirantes a


médico o estudo de 4 anos sobre Astrologia e a
Universidade de Paris insistia em que todos os
médicos e cirurgiões possuíssem almanaques para
acompanhar os movimentos celestes que ditavam o
curso das moléstias.

1Diploma Universidade de Padua 1618

Quando o coração passou a ser equiparado a uma bomba que bombeava o sangue,
houve uma grande cisão no pensamento médico, pois o corpo passou a ser visto como
uma máquina.

Sabemos que o pensamento físico mecânico começou a ser valorizado a partir do século
XVI, pois a possibilidade de cálculos matemáticos trouxe grandes riquezas para a
Humanidade e uma amplitude de horizonte marcada principalmente pela descoberta do
mundo novo – as Américas – e do novo caminho para as Índias. Foi um grande salto para
a Humanidade em termos de acúmulo de riquezas naturais e também para a sobrevivência,
pois a capacidade de alimentos e sua conservação ampliaram-se tremendamente.

Os estudantes de Medicina naquele momento, por mais que tivessem que estudar e
compreender sobre ciclos e ritmos da Natureza e da vida (conhecer a visão astrológica),
provavelmente estavam mais interessados na dissecação, o que, na verdade, já era um
reflexo do privilégio dado ao movimento mecânico e físico também na arte da cura – isso,
não se pode negar, nos trouxe grandes descobertas e avanços no entendimento e
também na cura do corpo físico do ser humano.

Sem dúvida, também estava fortemente presente o foco no poder econômico e político.
Até chegarmos no quem sabe mais, no quem manda mais, no quem tem mais dinheiro,
enfim, isto faz parte também da nossa condição humana. É o tal do orgulho que Culpeper,
tanto abominou, embora também tenha demonstrado.

Os estudos médicos sem astrologia são como


um olho que não enxerga.
lema da escola de medicina da Universidade de Bolonha
Seu trabalho

Culpeper compartilhava da visão tradicional abrangente em que mente, corpo e espírito


formam uma unidade e a saúde define-se com o Todo.

Trabalhou no resgate e desenvolvimento desta visão integral da saúde, que era conhecida
principalmente como a Medicina Holística de Hipócrates e Galeno.

Fundamentou, pesquisou, experimentou os modelos desenvolvidos pelos gregos,


aprofundando-se na pesquisa da cura através das ervas. Para isto utilizou a Teoria dos
Temperamentos e dos Humores.

Seu foco estava na manutenção da saúde, o suporte à imunidade e não a briga contra a
doença. Essas são as duas linhas principais que ainda permanecem na Medicina
atualmente:
uma corrente foca principalmente a patologia, a doença e outra,
o organismo como um todo, buscando o equilíbrio e a imunidade.

Popularmente, Culpeper foi reconhecido como um dos "cabeças" do herbalismo, da


Medicina alternativa ou da Medicina holística ocidental e foi um dos precursores do sistema
energético da Medicina ocidental. Poderíamos também dizer que foi um precursor da
homeopatia e da autocura.

Em que fonte teria ido beber? Na Grécia antiga. No pensamento dos filósofos da natureza,
ou seja, na tradição da Astrologia. Aqui início a discorrer sobre a imensa contribuição do
pensamento transdisciplinar inserido na Astrologia.

Astrologia e Medicina estiveram unidas desde a Grécia pré-socrática até meados do século
XVII, quando ocorreu a fragmentação de todo o conhecimento adquirido pela Humanidade
até aquele momento. A separação do conhecimento em diferentes áreas acredito ser uma
etapa necessária para o desenvolvimento das faculdades mentais do ser humano.

Com olhos simplistas, vejo como a famosa guerra entre o cérebro direito e o esquerdo entre
a contemplação e a comprovação. A contemplação e observação versus a experimentação
e dissecação. Daí chegamos no dilema...

O que vamos chamar de ciência ou não? Quem será o poderoso que detém a verdade
absoluta?
A herança grega

Na Grécia de meados do século IV, os que se dedicavam intensamente à contemplação


foram denominados Filósofos da Natureza. Foram aqueles que, após muita observação,
tiveram a coragem de romper o silêncio e colocar em palavras suas percepções.

Através da contemplação e do correto questionamento, acessaram um conhecimento


superior, e com a continuidade desta atividade desenvolveram a capacidade de
compreender a ordem cósmica e, também, a linguagem traduzida e discursiva, bem como
a habilidade do raciocínio.

Esses cientistas gregos – como costumo chamá-los –


por meio da contemplação do mundo físico acessavam
verdades sobre a Natureza e tiravam substratos ou
extratos para níveis diferentes, possibilitando
transposições e analogias para todas as coisas
existentes, visíveis ou não visíveis.

A harmonia contemplada na Natureza deveria


ser manifesta e percebida no corpo humano.
A harmonia da vida, para o pensamento científico vigente no momento, era um estado que
deveria estar refletido na perfeita saúde. Existia um estado ideal de perfeita saúde e de
harmonia, esse estado alcançado quando as qualidades primárias – Fogo, Terra, Ar e
Água – estivessem perfeitamente equilibradas.

O estado de perfeita saúde é citado na obra grega Dos ventos, águas e verões, pelo termo
isomeria, cuja definição literal era o estado são e normal que dependia da proporção
idêntica entre os elementos fundamentais de um organismo e da natureza de seu conjunto.
Já a proporção dessas qualidades primárias em qualquer coisa, agindo através dos
elementos, foi denominada Temperamento do Complexo.

Esta transposição da harmonia da ordem cósmica para a harmonia do corpo surgiu do


axioma extremamente conhecido e utilizado pelos astrólogos ;
O que está embaixo é análogo ao que está em cima.
proferido após extensa observação e silêncio.
Após um período de contemplação muito grande e de debate, foi o filósofo Empédocles
(495-435 ac) concluiu que:

A Natureza era constituída de 4 elementos.

Baseado na percepção de Empédocles, primeiramente, a transposição foi levada ao


comportamento humano, formado de 4 humores, sendo que elementos e humores tinham
as suas qualidades primárias em comum, e esses elementos formariam uma ponte entre
o macrocosmo e o microcosmo.

A observação e o racional dos 4 humores foram


desenvolvidos pela escola hipocrática de Medicina
(Hipócrates-460-377aC), que se encaixaram
perfeitamente na física dos elementos e nas
qualidades ensinadas por Aristóteles. Depois foram
facilmente assimiladas pela teoria médica de
Galeno. (129-200)

Aristóteles foi um dos que defendia que todos os objetos perceptíveis, vivos ou não, eram
composições feitas de partes menores. Ao desenvolver esta ideia foi possível vislumbrar a
transposição para o corpo humano.

Parece que Aristóteles (384-322aC) pôde perceber a conexão existente entre todas as
coisas e contou de sua forma como isto ocorre.

O corpo humano pode ser dividido em cabeça, peito, tórax, abdômen e membros e mais
subdivisões puderam ser percebidas até chegar a uma pequena parte dele, como, por
exemplo, um dedo.

Para Aristóteles, todas as partes eram homogêneas. O que isso queria dizer? Por
exemplo, se um osso quebrasse poderíamos ver cada parte, e cada parte se pareceria com
a outra em sua natureza básica. O osso também seria composto dos 4 elementos, mas com
uma predominância de Terra.

A forma é que determinaria uma coisa e não outra. Vamos a outro exemplo: um chimpanzé
seria diferenciado de um ser humano pela sua forma, revelando, assim, a importância de
observar a forma para compreender comportamento, atividade e função. Este conceito de
Aristóteles a respeito da forma é importante para podermos compreender, mais à frente,
como Culpeper o aplicou nas ervas.
Para o homem grego, o verdadeiro médico era aquele que nunca separava a parte do todo,
mas o que encarava suas relações de interdependência com o conjunto.

Este sistema teórico desenvolvido pelos gregos criou a identidade entre uma ciência
humana e uma estrutura cósmica e serviu de base para a sustentação de um movimento
científico.
Que movimento científico era esse? Medicina.

A Medicina não teria desenvolvido e obtido o status de ciência se não fosse a contribuição
dos Filósofos da Natureza. Foram os filósofos jônicos os capazes de criar o primeiro
sistema.

Na Grécia, a Medicina transformou-se em representante cultural do mais alto grau


metodológico. Passou a ser também a projeção de um fim ético de caráter prático. A
atividade médica abrangia dois aspectos: um social e outro técnico.

Neste momento, a Medicina ultrapassava as fronteiras de uma simples profissão para se


converter numa força cultural de primeira ordem no povo grego. Desta forma, é uma das
maiores representantes da cultura grega.

O que seria isso?

O médico era entendido como um demiurgo. Demiurgo era aquele homem de atividade
política diferente do idiota – termo usado dentro da política na Grécia para o indivíduo
ignorante, sem conhecimento das coisas. O demiurgo teria acesso a um conhecimento
superior e era colocado numa posição de uma dignidade superior, estabelecendo-se duas
classes. Essa divisão não era apenas social, mas, também, cultural, por uma consciência
própria diferente que os homens com conhecimento teriam a respeito das coisas.

A função do médico não era apenas curar, mas também transmitir este conhecimento, e o
melhor momento para a transmissão e a iniciação de um leigo era o momento da consulta,
do atendimento. Assim, ciência e filosofia estavam juntas.

Compreendemos aqui o ponto que Culpeper lutava e se indignava: a diferenciação de


classes que já tinha se iniciado no pensamento grego.

A antiga Filosofia da Natureza trouxe o conceito de physis total, que seria a natureza do
universo. Utilizando-se da transposição do axioma O que está embaixo é análogo ao que
está em cima, mais uma vez foi possível traçar uma projeção de como deveria ser a
natureza espiritual.

Podemos compreender também o conceito que até hoje reverbera sobre nós: a de que o
indivíduo equilibrado, que come corretamente e que preferencialmente não é gordo é mais
espiritualizado que outro, por exemplo, que come carne. Sem dúvida é mais saudável.
Agora mais espiritualizado, não arriscaria afirmar.

Retomando a linha de raciocínio, por meio do modelo científico desenvolvido pelos gregos,
o sistema tradicional de Medicina intuiu uma conexão entre os 4 elementos e o estudo
médico do temperamento e a constituição do corpo humano.
A literatura médica grega foi a principal fonte de Culpeper e o exemplo mais importante de
início de uma progressiva tecnização da vida. É a diferenciação entre profissões mais
especializadas, para as quais é imprescindível uma formação especial com altas exigências
espirituais e éticas, mas só acessível a um número reduzido de pessoas.
Princípios da Medicina holística ocidental

Princípios são leis naturais e universais, assim como leis espirituais, que geram ordem.

Os princípios que ordenam a Medicina holística ocidental, prática na qual Nicholas Culpeper
foi um dos precursores, são 7

Os 4 elementos,
Os 4 temperamentos
Os 4 humores,
As faculdades do corpo,
As partes similares do corpo – anatomia,
As faculdades físicas secundárias e,
O espírito e calor inatos presentes em cada ser humano

A seguir discorro sobre esses princípios agrupados por tópicos denominados: Os 4


elementos, Os 4 temperamentos, Os 4 humores e o Conceito de saúde, O Corpo suas
faculdades e partes, Calor Inato e as 4 fases da vida e As Faculdades Secundárias. .
Os 4 elementos

Para compreender este princípio precisamos retornar aos Filósofos da Natureza. Após os
gregos passarem séculos tentando entender as manifestações e transformações do mundo
natural, Empédocles resolveu o debate, argumentando que a Natureza era composta de 4
elementos:

Tudo seria formado por essas 4 substâncias ou 4 elementos, que estariam sob a atuação
de 2 forças: o Amor e a Discórdia

Fogo, Terra, Ar e Água.

Filosofo e médico da escola ocidental grega, Empédocles foi um dos novos Filósofos da
Natureza que se apoderou da Medicina, unindo o empirismo filosófico-naturalista com a
atitude de um profeta religioso.

Sua teoria física dos quatro elementos perdurou na Medicina durante séculos sob a forma
da doutrina das 4 qualidades fundamentais – Quente, Frio, Seco e Úmido – que se
combinou de modos diversos com a teoria médica dos humores básicos.

Desta forma, as concepções físicas da Filosofia penetraram no campo da Medicina. Tudo


na natureza era composto de uma combinação diferente desses 4 elementos, e a formação
estava baseada em um equilíbrio dinâmico envolvendo a proporção certa de cada
elemento.

Muito importante ressaltar que as composições dessas substâncias não eram conhecidas
pela visibilidade desses elementos, pois não era possível enxergar os elementos em si,
mas sim suas qualidades primárias. As qualidades primárias Quente, Frio, Seco e Úmido,
denominadas por Aristóteles, poderiam ser detectadas pelos sentidos humanos, que por
sua vez poderiam inferir em sua composição elementar.
Cada elemento era associado a um par de qualidades primárias. Então a qualidade Quente
e Seco produz o Fogo, a condição ou qualidade Frio e Seco gera o elemento Terra. Ar, por
sua vez, compõe-se das qualidades Quente e Úmido e a Água surge da condição Úmida e
Fria.

Mantendo-se estável um dos elementos e alterando o outro, poderia ocorrer a


transformação de um elemento em outro. Isto sustentou a explicação para as constantes
mudanças que ocorriam no mundo físico. Como, por exemplo, para o Ar se transformar em
Água precisaria alterar-se a qualidade de quente para frio. Ao alterar a qualidade seca do
Fogo para úmido obtém-se Ar e assim por diante.

Por isso, as qualidades primárias foram consideradas os primeiros princípios da Natureza,


e como sua alteração causa uma mudança substancial nos corpos físicos eram chamados
de FORÇAS DA NATUREZA.
Os 4 temperamentos

O termo temperamento englobava a natureza básica de uma pessoa, sua psique, seu
caráter, sua personalidade e também sua estrutura física.

Podemos dizer que a Teoria dos Temperamentos foi a primeira racionalização humana a
respeito do seu próprio comportamento e formação física, a primeira concepção humana
sobre a sua própria physis e psique. Foi um movimento pioneiro e ousado do ser humano
com a intenção de conhecer-se, compreender-se e desenvolver-se.

Este movimento humano estava baseado em uma visão científica natural e foi o pilar da
Medicina praticada até o século XVII. Atualmente podemos encontrar a utilização desta
teoria principalmente na Antroposofia, filosofia de abordagem do ser humano desenvolvida
por Rudolf Steiner (1861-1925) com aplicações na área da saúde – Medicina, farmacologia
e terapia comportamental – e em diversos outros campos, como nas artes, na organização
social, na pedagogia, na agricultura. Steiner bebeu da mesma fonte!

O que dita esta teoria

Os temperamentos são em número de 4, assim como as estações do ano, que manifestam


as condições climáticas das 4 qualidades primárias. Estas qualidades, por sua vez, por sua
vez, estão inseridas nas 4 substâncias ou elementos – Fogo, Terra, Ar e Água.

Cada estação transforma não apenas o clima, o tempo e a temperatura, como também
gera influência sobre o nosso humor, nossa saúde e energia, afetando e moldando nosso
comportamento e reações de uma forma muitas vezes imperceptível. Individualmente,
baseada na teoria dos temperamentos, registramos mais acentuadamente um desses 4
ciclos da natureza, e dessa forma o expressamos mais claramente.

Por isso, algumas pessoas parecem ser sempre otimistas independente do momento pelo
qual estão passando. Outras parecem que não têm vergonha nunca e são extremamente
expansivas e autoconfiantes. Por sua vez, há as que demonstram uma grande habilidade
em organizar e separar o joio do trigo. Finalmente, ainda temos as que expressam
tranqüilamente com grande fluência a capacidade de avaliação e síntese.
As 4 manifestações de Temperamento foram nomeadas, pelos fisiologistas gregos,
Sanguínea, Colérica, Melancólica e Fleumática, nomenclatura que permanece até hoje.
Serei sintética na descrição de cada temperamento, pois seu conteúdo, bastante extenso,
daria um livro completo.

Assim como a primavera relembra a vida e o renascimento, trazendo alegria e vitalidade, o


mesmo acontece com uma pessoa predominantemente Sangüínea. O verão traz o anseio
de expansão, a extroversão, o despojamento e a comunicação, como o comportamento de
um ser humano que predomina a cólera, denominado Colérico. O outono encerra a colheita
concluindo o movimento de expansão, colocando-nos a importância da ordem e da
administração do conquistado. Desta forma, ocorre a manifestação essencial da
personalidade Melancólica. Por sua vez, uma pessoa identificada principalmente com as
condições climáticas de inverno demonstra necessidade de recolhimento para a avaliação
e síntese de todo o período, denominada Fleumática.

No temperamento Sangüíneo – primavera –, o elemento predominante é o Ar. Os que


nascem com a natureza do verão, Coléricos, apresentam predominância do Fogo. Já as
pessoas com características do outono manifestam a predominância do elemento Terra.
E as predominantemente inverno demonstram a placidez da Água.

Com isso, o humor produzido pelo organismo da personalidade Sangüínea é


predominantemente quente e úmido, como o Ar. A personalidade Colérica produz em maior
quantidade um humor quente e seco, como a condição que produz Fogo. As
personalidades Melancólica e Fleumática possuem em comum a condição fria, por isso
produzem respectivamente os humores frio e seco, como o elemento Terra, e frio e úmido,
como a condição do elemento Água.
As personalidades Sangüínea e Colérica têm em comum a condição quente, buscando
assim a extroversão e expansão, enquanto as outras 2, a partir da predominância da
condição fria, buscam a contenção e o recolhimento.

Em minha prática com esta teoria, percebo que expressamos de uma forma mais marcante
2 temperamentos, mas possuímos os 4 temperamentos em diferentes doses ou
proporções. Para os 2 temperamentos mais acentuados pode ser feita uma analogia com
a identidade e auto-imagem ou, colocando de outra maneira, a essência e a estratégia de
adaptação.

A dinâmica dos 4 humores em cada ser ou a mistura, como denominavam na Antigüidade,


gera a unicidade de cada coisa e cada ser vivo, incluindo nós, humanos.
Tudo de acordo com o ciclo de desenvolvimento da vida observado em 4 tempos
predominantes: primavera, verão, outono e inverno
Os 4 humores e o conceito de saúde

Os humores eram líquidos e fluidos do corpo produzidos pelo estômago e fígado. Os


humores e os temperamentos recebiam a mesma denominação:

Colérico, Melancólico, Sanguíneo e Fleumático.

O temperamento saudável era como um “bom mix” (eucrásia), ou seja fruto da proporção
igual dos 4 humores. Com o tempo Aristóteles trouxe o conceito do justo equilíbrio, como
uma proporção saudável adequada a cada temperamento.

O calor e o frio eram entendidos por terem um efeito na produção dos 4 humores no corpo.
A importância em manter o balanço do calor no corpo era vital para produzir uma proporção
saudável de humor, uma vez que qualquer excesso de calor ou frio era responsável por
produzir doenças causadas pelo humor.

Quando o calor era temperado, sangue era formado. Quando o calor era excessivo,
resíduos coléricos e melancólicos eram produzidos. Quando extremamente excessivo, uma
melancolia tóxica era produzida. Quando o frio era temperado, fleuma normal era
produzida, mas quando em excesso o calor inato era comprometido e a força digestiva,
enfraquecida. Assim, menos sangue e mais humor melancólico eram formados, causando
obstrução no fluxo energético do corpo.

Embora uma impureza num humor corrompido indicasse a natureza e o processo de uma
doença – e portanto deveria ser eliminada do corpo –, a unidade dos humores de um ser
vivo era mais importante do que um humor avaliado separadamente. Nisto é que se espelha
a Medicina holística tradicional, ou seja, na observação do todo, e não apenas de uma
parte.

A habilidade de um organismo funcionar como um todo é que levava à saúde. Quanto mais
conflitos, mais doenças. Ou seja, quanto mais contrário a sua natureza, mais doente o
organismo ficaria.

A alimentação era abordada dentro do mesmo conceito. Dizia-se que as pessoas saudáveis
tinham apetite por comidas das qualidades do seu temperamento. Então, uma pessoa
saudável deveria ter vontade de comer coisas que estavam de acordo com o seu
temperamento.

Nós somos o que comemos

Cada semelhante é mantido pelo seu semelhante.

Para o autor da Medicina Antiga o problema do Homem não residia no que ele é em si, mas
sim no que ele é em relação ao que ele come e ao que ele bebe.
Quando a prática da Medicina deixou de ser uma arte culinária e passou a ser techne, o
médico soube diferenciar alimentos de animais e seres humanos como também
diferenciar a alimentação do enfermo e do homem são.

O conceito de mistura e harmonia não se sabe se foi proveniente da Filosofia da Natureza


ou do pensamento médico, pois já estavam muito unidos.
O corpo - suas faculdades e partes
Aristóteles decreta que todos os objetos vivos ou não vivos são compostos por Partes
Menores.

A Astrologia era um componente-chave para a aplicação da Medicina, pois auxiliou na


correspondência entre signos e partes do corpo humano.

Desta forma, associou-se Áries à cabeça e tudo acima da primeira vértebra. Touro ao
pescoço e garganta e assim por diante, conforme tabela a seguir.

Na teoria de Galeno sobre a organização do corpo, cada órgão tinha um poder: atração,
transformação, assimilativo ou expulsivo para libertar-se dos resíduos não desejáveis. As
faculdades do corpo também seriam 4:

Transformadora, Retentiva, Digestiva, Atrativa

Na teoria médica de Galeno existe uma preocupação fundamental com aspectos dinâmicos
da realidade, considerando Função e Atividade.

Foi percebido que a essência natural de uma coisa estava relacionada com o que ela fazia.
As “forças” de um objeto para funcionar de uma determinada maneira e produzir efeitos
particulares revelavam sua natureza. Essas forças foram chamadas Virtudes ou
Faculdades.

Acreditava-se que cada órgão trabalhava por si só e contribuía para o todo, como, por
exemplo, o estômago quando atrai a comida da boca e é nutrido por ela. E o todo era
entendido como um efeito maior que a soma das partes integradas.

Os órgãos também eram entendidos como tendo qualidades ocultas. Desta maneira, ao
dissecar um fígado não poderia ser descoberta a sua faculdade, assim como a natureza de
uma pessoa, ou os 4 humores presentes no corpo. As faculdades principais dos órgãos
tinham uma existência alem de meramente física. Elas foram entendidas como entidades
metafísicas que expressavam atividades.
Os planetas são os que definem ações e por analogia foram relacionados às funções do
corpo.

Planet Parte do Corpo Qualidad Humor Virtude


a es
W Ossos, Dentes, Ouvido direito Frio & Seco MELANCÓLICO RETENTIVA

Pulmão, Fígado, Costelas, Laterais


V e Veias. Quente & Úmido SANGUÍNEO DIGESTIVA
ESPIRITO

U Vesícula Biliar e Ouvido esquerdo Quente & Seco COLÉRICO ATRATIVA

Órgãos sexuais, Rins, Seios e


t Garganta.
Frio & Úmido FLEUMÁTICO EXPULSIVA

Cérebro, especialmente parte


s racional, Língua, Mãos, Pés e
Força Locomotora.
Frio & Seco MELANCÓLICO ESPIRITO E
MENTAL

Coração e Artérias, Visão e Vista,


q Olho direito do homem e esquerdo Quente & Seco COLÉRICO
ESPIRITO VITAL
da mulher.

Volume do Cérebro, Estomago, Mistura Radical


r Vesícula, Intestino, Olho esquerdo
do homem e direito da mulher
Frio & Úmido FLEUMÁTICO
Manutenção dos
Humores

Assim, Saturno com suas qualidades fria e seca, produziria um humor melancólico e a
virtude dele seria retentiva. O planeta Júpiter, com as características quente e úmido,
estaria ligado ao humor sangüíneo e à virtude digestiva e também ao espirito. O planeta
Marte, quente e seco, estaria ligado ao humor colérico e à virtude atrativa. E, Vênus, por
sua vez, percebido pelas qualidades fria e úmida, estaria associado ao humor fleumático e
a sua virtude expulsiva. Mercúrio, frio e seco, melancólico, e teria virtude espiritual e mental.
O Sol teria uma qualidade quente e seca, um humor colérico e traria o espírito vital
Corpo e suas partes associadas aos signos

ARIES Cabeça e tudo acima 1. vértebra do pescoço

Pescoço, Garganta, voz e 7 vértebras do


TOURO
pescoço

GEMEOS Ombros, Braços, Mãos e Dedos

Peito, Seios Femininos, Estomago, Costelas,


CANCER
Fígado e Pulmão.
Coração e pericárdio, Costas, Estomago
LEÃO
Vértebras Torácicas, Diafragma
Barriga – Ventre, Intestino, Estomago,
VIRGEM
Diafragma Umbigo e Baço.

LIBRA Rins, Vesícula e Nádegas.

ESCORPIÃO Órgãos Sexuais, Vesícula, Anus e Nádegas.

SAGITARIO Quadril, Cóccix e Ossos Finos

CAPRICORNIO Joelhos

AQUARIO Pernas, Tíbia

PEIXES Pés, Tornozelo e Dedos do Pés


Calor Inato e as 4 fases da vida

O Calor Inato estava ligado a cada fase da vida e à visão integral dos 4 temperamentos.
Recebeu várias denominações: Pneuma, Prana, CHI, Vento, Sopro Divino, Ar, Inspiração
e também Espírito. Para Culpeper: Aéreo, Sutil, Rápido...

Para os fisiologistas árabes era a Mistura Radical. A Mistura Radical era a vida dentro de
nós, uma centelha de luz em nosso interior, igualada a uma substância úmida e oleosa, que
se encontrava em todos os tecidos.

Podia ser sentida no pulso e nos batimentos cardíacos e acreditava-se ser derivada do
Sol, a fonte de movimento do mundo.

A metáfora da lamparina queimando a Mistura Radical era utilizada para explicar a vida
individual, também, na medicina ocidental tradicional. Mantendo a visão integral, a vida
humana aconteceria então 4 fases: Infância, Juventude, Maturidade, Velhice.

As 4 fases refletiam as 4 estações do ano, as qualidades associadas a elas e os


temperamentos humanos.

Assim podemos compreender a infância com uma grande quantidade da mistura radical a
ser ainda “queimada”. Exatamente como a primavera, quando traz o frescor da nova vida
na natureza, com as árvores enchendo-se de flores. E o mesmo ocorre com o
temperamento humano Sangüíneo. Tremulante, a chama cresce e atinge a juventude, a
adolescência. Assim como no verão o Sol e o calor chegam ao seu ápice, da mesma
maneira ocorre com o temperamento Colérico.
Já na meia idade ou maturidade a chama se estabiliza e temos o temperamento
Melancólico, correspondente ao outono. Finalmente, a chama começa a reduzir, assim
como o calor no inverno e também o calor no temperamento Fleumático.

Dentro deste conceito, é possível compreender qual temperamento estará predominante


em cada fase da vida, considerando-se a quantidade de calor interna que estará sendo
produzida, e ministrar o tratamento médico adequado.

O óleo da lamparina era associado ao sêmen do pai. Acreditava-se que o esperma


masculino era o único responsável para dar forma e energizar a nova vida. Aristóteles
comparou a concepção de uma nova vida com o trabalho do carpinteiro, onde a mulher
trazia madeira e o homem dava forma.

Culpeper rejeitou essa noção tradicional e através da transposição de conceitos


cosmológicos dizia que ambos continham sementes. Ele dizia que as sementes
provenientes tanto do homem como da mulher formavam uma nova vida, assim como o Sol
e a Lua igualmente influenciavam na procriação.

(Assim) como a água umedece a terra, a Lua microscópica umedece a concepção do


início do embrião da vida, sendo a mulher a Lua microscópica.
Nicholas Culpeper: tradução livre
Faculdades físicas secundárias
Fisiologistas notaram que certos objetos produziam outros esforços que não podiam ser
explicados pelas qualidades primárias manifestadas pelo calor e frio, nem mesmo pela
condição seca ou úmida, assim como a força magnética, a qualidade purgativa de algumas
plantas ou o veneno de um escorpião.

Essas outras forças ou esforços foram denominadas “qualidades ocultas” ou “escondidas”


e percebeu-se que estavam presentes na forma e no Todo. Não podiam ser percebidas
pelos sentidos, somente compreendidas indiretamente pelos seus efeitos. Não podiam
aparecer nem na dissecação, assim como a natureza de uma pessoa e seus humores.

Essas qualidades também forneciam a base para as Virtudes, que comentarei a seguir.

As qualidades primárias – Quente, Frio, Seco e Úmido – possuem o que chamamos de


qualidades secundárias, com suas habilidades inerentes, ocultas ou escondidas.

Qualidades Secundárias dos 4 Elementos

ILUMINAR.QUALIDADE DE SER FINO.


Ativo
MACIEZ. ESCORREGADIO. SUAVIDADE.

SUTILIZAR. HABILIDADE DE PENETRAR.


Dispersa
QUENTE

DUREZA. SECURA. ASPEREZA


FACILMENTE ESMIGALHADO.
AR FOGO
PEGAJSO.

ÚMIDO SECO

ÁGUA TERRA

FRIO
Passiva
QUALIDADE DE SER GROSSO.
Atrai
DE DEIXAR DENSO E PESADO.

No quente está inserida a habilidade de iluminar, de tornar fino e de penetrar. O úmido


possui a habilidade de deixar escorregadio e pegajoso e produz maciez e suavidade. O frio
tem a habilidade de tornar algo mais denso, de dar peso a alguma coisa e a qualidade de
engrossar. O seco é o que forma a dureza, a secura, a aspereza e pode ser facilmente
esmigalhado.

Todas essas habilidades ainda estão divididas em princípios ativos e passivos, com as
habilidades de dispersar e de atrair, respectivamente.

Foi utilizando este conhecimento que Culpeper fez a transposição e conseguiu identificar
as habilidades das plantas ou ervas.
Medicamentos fitoterápicos: tratamentos e diagnóstico

As ervas foram classificadas pelo seu temperamento quente ou frio no seu princípio ativo,
com ou sem a qualidade de secar ou umedecer, mas outras manifestações também foram
consideradas por Culpeper, pois dizia que eram
óbvias pelos sentidos, especialmente pelo gosto e pelo cheiro, observando também a
aparência e o lugar onde brotavam.

“Porque através dos meus pensamentos pode ser que Deus não passe, mas a sua imagem
está estampada em cada erva.” Nicholas Culpeper: tradução livre

A parte sutil incorporada nas ervas, a força de vida imaterial que podia ser apenas percebida
pelos sentidos humanos, foi denominada “virtude” ou “assinatura” e estas assinaturas
estavam relacionadas com a forma. Isto é, o Princípio Ativo ditava sua formação e
determinava sua estrutura e características de sua aparência.

Função e atividade relacionadas com qualidades primárias,


detectadas através dos sentidos humanos

Observando a forma física das ervas e o seu habitat, Culpeper pôde


concluir a natureza de sua virtude interna.

As plantas eram consideradas mais ou menos potentes, dependendo do aspecto favorável


ou não que o planeta que a governava se encontrava. Então, neste momento vemos a
utilização da Astrologia Horária, desenvolvida principalmente por Willian Lilly, astrólogo
inglês que viveu entre 1602 e 1681.

Por exemplo, se fosse necessária a prescrição de uma erva sobre a regência de Vênus,
verificava-se a hora que Vênus estaria recebendo aspecto de um planeta favorável.

Para o tratamento, era muito importante o horário específico que a erva era colhida e
também sua correspondência astrológica com o tipo de doença e a parte do corpo afetada.

Com a doutrina das assinaturas, e utilizando a simbologia astrológica, Culpeper classificou


e catalogou uma quantidade enorme de ervas.

Como exemplo, o medicamento eye-bright, (Euphrasia officinalis), disponível até os nossos


dias, indicado para o restabelecimento de olhos inflamados,é uma redução de flores
brancas com uma gota de flor amarela, Culpeper atribuiu essa planta ao corpo celeste Sol,
porque o Sol governa os olhos e, sendo seu regente Leão, essa planta poderia e deveria
ser colhida durante o mês de julho e agosto, pois neste período o Sol passa pelo signo
zodiacal de Leão.

A seguir demonstro algumas ervas.


Malva é catalogada como uma planta de Vênus.

Culpeper identificou a sua habilidade de acabar não apenas


com o calor e a cólera e outros humores ofensivos,
mas também a sua habilidade de derrubar a umidade e o
humor fleumático.

Outra planta de Vênus, Orobanche rapum,


indicada para purgar a cólera, ou o excesso de
humor colérico, e que também trabalha o desequilíbrio
da fleuma, ou desequilíbrio do elemento água.
Essa planta é um tipo de mato ou matagal,
conhecido como erva-toira grande; genistão;
rabo-de-raposa ou rabo-de-zorra, indicada por
Culpeper para auxiliar na doença denominada gota,
em doenças femininas como também em mordida
de cobra e de cachorro louco.
Descreveu extensamente cada planta pela sua forma, seu habitat, pelo lugar onde teria
germinado, pelo seu cheiro e cor. Enfim toda morfologia e anatomia, incluindo as
percepções dos sentidos humanos e o momento que deveria ser colhida, de acordo com o
período de florescimento e a afetação do planeta governante. Utilizava-se da tabela horária
dos planetas para encontrar o momento de colher cada erva.

Explicou de uma maneira muito pessoal e em algumas ervas podem ser encontrados
comentários como: "Ah, essa eu não vou aborrecer nem o meu leitor nem a mim porque
todo mundo já conhece, essa aqui qualquer criança conhece".

Sua intenção era que a descrição e prescrição fossem bastante claras e a aplicação muito
prática, uma vez que estava disponibilizando o conhecimento para o leigo, para a
comunidade que naquele momento era principalmente rural.

Em seu livro, um glossário completo de plantas, existe a indicação de como e quando utilizar
chás, tinturas, extratos, xaropes. Como também o uso externo em compressas,
cataplasmas, banhos, inalações, bochechos/gargarejos, ungüentos, pomadas.

A máxima de Culpeper deitava-se sobre: sendo a causa então é a cura. Ou seja, o


principio causador da doença é o próprio agente de cura. Por exemplo, se a disfunção fosse
causada pela condição quente e seco então a cura deveria ser baseada em ervas de
qualidades quente e seca.

Na medicina de Galeno, a base do tratamento médico era contrários são curados por
contrários.

Então se a doença presente era quente e seca em qualidade, o corpo estava mais quente
e seco que o balanceamento normal. O tratamento, então, deveria ser resfriar e umedecer.
Este é o significado original da Alopatia ou Antipatia – usando palavras de Culpeper.

A posição de Graeme Tobyn na Medicina astrológica, contudo, é de que o principio mais


importante é o tratamento por Simpatia. Isto é o que se entende como Homeopatia, o
similar cura o similar.

Culpeper realizava isto com os medicamentos naturais. Para ele, usando a virtude oculta
das ervas, mudanças aconteciam pela mágica da simpatia.

A decisão do tratamento por simpatia ou antipatia, contudo, requeria um exame cuidadoso,


especialmente como era para Culpeper. Na introdução de seu Herbário, dava as seguintes
instruções:

1. Considere o planeta que está causando a doença;

2. Considere a parte do corpo que está sendo afetada pela doença; onde está
instalada na carne, no sangue, nos ossos ou nos ventrículos;

3. Considere qual o planeta regente da parte do corpo afetada;


4. Você tem as ervas neste livro .... e pode reforçar a parte do corpo com sua similar;
como o cérebro com ervas de Mercúrio, o peito e o fígado com as ervas de Júpiter,
o coração com e a vitalidade com as ervas do Sol ... e

5. Você pode opor doenças por ervas do planeta oposto ao planeta que está causando
a doença, como doenças de Júpiter com ervas de Mercúrio; doenças dos Luminares
– Sol e Lua – por ervas de Saturno e doenças de Marte por ervas de Vênus.

6. Há uma maneira de curar enfermidades algumas vezes por simpatia, assim cada
planeta cura sua própria doença, como Sol e Lua com suas ervas curam os olhos;
Saturno, o baço; Júpiter, o fígado; Marte, o fígado e doenças de cólera; e Vênus,
enfermidades que dificultam a gestação.

A doutrina das assinaturas (virtudes) era baseada na cura por iguais. A questão da
aplicação da simpatia ou antipatia na medicina de Culpeper apoiava-se fortemente no uso
da Astrologia e na correspondência oculta dos planetas e signos zodiacais, com a
determinação estabelecida pelas regras astrológicas.

Os planetas poderiam ser antipáticos entre eles de 3 maneiras:


1. Pela regência de signos: assim Vênus e Marte são antipatizados ou inimigos;
2. Pela virtude dos temperamentos opostos ou qualidades: Júpiter é um inimigo de
Saturno, por ser quente e úmido e Saturno, quente e seco.

3. Quando em condições diferentes: então existe inimizade entre Sol e Saturno


porque um ama o cortejo e o outro, o campo. Júpiter é inimigo de Marte, porque ele
ama a paz e justiça. Marte, a violência e opressão. Marte é inimigo de Vênus,
porque se regozija no campo e ela na cama. Ele ama ser público, ela fica menos
na mira.

A antipatia entre planetas era considerada pela posição no mapa natal.


DIAGNÓSTICO
De que forma era feito o diagnóstico? Como se chegava à natureza, à origem e à
localização da doença?

Aqui se utilizou da Astrologia Horária analisando o Decumbter chart, ou Mapa do


Decúmbito. Calculava o mapa da hora que o doente caía de cama, ou seja, era feito o mapa
do momento em que a pessoa iniciava com os sintomas da doença, e por meio da análise
das posições astrológicas prosseguia o diagnóstico.

Assim, o ascendente do mapa representava o paciente, a vida e a saúde. A casa 6 e


também a casa 12 e seus regentes simbolizavam a doença em si. A casa 7 também era
considerada às vezes nessa interpretação, porque estaria fazendo uma oposição ao
ascendente, uma oposição ao doente. A casa 7 também era o astrólogo e o fisiologista e
representava a pessoa que poderia auxiliar na cura. A casa 8 representava a morte, a 10 a
casa seria o tratamento requerido e a 4a casa mostrava de que forma o tratamento se
concluiria.

A posição da Lua era crucial para o julgamento da doença. Isto porque a Lua significava o
corpo. A Lua também era responsável pela manutenção de todos os humores, e o Sol
denotava o espírito, o sopro, o pneuma. Assim, se a Lua estivesse afetada por um
determinado signo, deveria ser considerado esse signo como o humor corrompido, lesado
ou enfraquecido naquela parte do corpo no qual correspondia o signo.

Por exemplo, se a Lua estivesse afetada por Saturno ou Mercúrio, o humor corrompido
seria o humor melancólico, o desbalanceamento que estaria gerando a doença seria
proveniente do humor melancólico. Se estivesse afetada por Marte, poderia se esperar uma
doença de cólera.

Para o diagnóstico, existia um check list com questões que deveriam ser respondidas
através do mapa do decúmbito.

Os gregos já possuíam a opinião de que os remédios precisavam ser trocados porque o


tecidos se acostumavam e não respondiam mais a eles remédios. Além do que a parte a
ser tratada poderia responder a um medicamento em um momento e a outro não.

Mais uma vez a Astrologia demonstrou-se extremamente valiosa com habilidade de


indicação do tratamento mais apropriado para um determinado momento.

Tudo era baseado em um método e reprodução de um sistema e tudo foi aberto por
Culpeper para ser aplicado por qualquer um que se interessasse pela cura das
enfermidades humanas.
Sua contribuição

Abriu parte do conhecimento para a utilização de ervas, demonstrou a metodologia


astrológica e todo o sistema que estava por trás disso como nenhum outro conseguiu
anteriormente.

Abriu seu conhecimento para qualquer homem comum, principalmente para os homens do
campo, e, claro, foi odiado pela classe médica de então, porque, ao ensinar as pessoas a
se curarem a si próprias, conseguiu reduzir significativamente a ida do povo aos
consultórios, e conseqüentemente os proventos dos médicos.

Culpeper fez inúmeras publicações. Além dos livros, utilizou-se


dos almanaques para transmissão do seu conhecimento. Os
almanaques ficaram mais populares no século XVII e eram
voltados basicamente para o povo rural, que na época era o
maior contingente da população européia.

Através dos Almanaques a população tomou conhecimento das


melhores épocas para o plantio, quando tomar banho, quando
casar, fazer viagem e até mesmo quando relacionar-se
sexualmente.

O aconselhamento sexual era um tópico freqüente dos


almanaques. Os astrólogos ofereciam aos casais conselhos
sobre os momentos propícios do ano para as relações sexuais.
Há registros, por exemplo, da recomendação aos leitores
masculinos para que evitassem as prostitutas nos meses de
verão, pelo perigo de contrair enfermidades graves. Outros
ofereciam receitas anticoncepcionais e afrodisíacas feitas com
ervas.

Os almanaques também eram utilizados para difundir opiniões


políticas.
Seu projeto de vida foi escrever textos médicos em inglês para
serem publicados a um preço acessível ao cidadão comum.
Seus escritos demonstravam exaustivamente a aplicação do
conhecimento astrológico e reforçava o quanto era
imprescindível a Astrologia para a prática médica. Suas
publicações abrangeram as áreas de ginecologia, maternidade,
pediatria e anatomia.

Sua maior contribuição foi no campo do herbalismo, sendo amaldiçoado pelos seus colegas
e ao mesmo tempo respeitado pela sua comunidade. Trabalhou para desmistificar o
tratamento médico, fazendo-o de fácil compreensão.
Colocando os olhos no ambiente científico em que viveu Nicholas Culpeper, podemos ter
uma idéia do valor desse trabalho da história da Astrologia.

"Minha caneta, se Deus me permitir vida e saúde, não irá parar até eu ter dado a eles - o
homem comum - todo o modelo da Medicina na língua natal".

Apesar de sua enorme importância para a cura de doenças, o julgamento dos


historiadores da Medicina dificilmente surge de uma forma gentil a respeito de Culpeper.

Aprendeu o oficio de boticário em Londres, e pela tradução e publicação do London


Dispensatory ele se tornou o inimigo dos médicos. Criticou o que considerou métodos
antinaturais de seus contemporâneos, escrevendo:

Consultei meus dois irmãos, Dr. Razão e Dr. Experiência, e fiz uma viagem para
visitar a minha mãe Natureza, que me aconselharam.
Em conjunto com a ajuda do Dr. Diligência, eu finalmente
cheguei ao meu desejo e,
sendo advertido pelo Sr. Honestidade, um estranho em nossos dias, publicá-lo ao
mundo.
Eu fiz isso.
(tradução livre a partir da Introdução do The Complete Herbal, edição 1835)

Foi preso e julgado por feitiçaria, isso pode ter ocorrido em função de sua prática ilegal de
boticário, ou talvez membros do colégio tenham feito falsas acusações. A sentença de
morte transitava no delito de feitiçaria, mas Culpeper foi absolvido da pena.

Sua colaboração como boticário era considerada


ilegal, porque já praticava mesmo antes da conclusão
de sua aprendizagem.

Em 1652, publicou seu famoso livro de ervas, The


English Physician, e antes disso escreveu o primeiro
livro em inglês sobre puericultura e parto, The English
Midwife. Na moderna biografia, Culpeper surge como
um dos mais significativos médicos de língua inglesa
do século XVII.

Na Guerra Civil, lutou pelas forças parlamentaristas


contra o rei e foi ferido com um tiro no peito. Ávido
fumante e conhecido por apreciar uma boa
quantidade de vinho, Culpeper morreu aos 38 anos
de doença respiratória – provavelmente tuberculose –
, complicada por uma crônica obstrução respiratória
proveniente do ferimento.

Atualmente, o nome Culpeper encontra-se ligado a lojas


que vendem ervas e especiarias. Existe uma cadeia de lojas na Inglaterra com este nome
e em outros lugares do mundo também podemos encontrar esta ligação.
Uma derivação do nome Culpeper conecta-o ao pepperers, comerciantes, que, no início da
Idade Média, negociavam outras formas de ervas e plantas medicinais. Mas é devido à
popularidade do The Physician Inglês, conhecido como Ervas de Culpeper, que o seu nome
tem sido, naturalmente, associado ao herbalismo.
Minhas percepções

Agrada-me bastante parte da atitude de Culpeper, como quando combate ferozmente a


idéia de que um ser humano superior cura o inferior. Sendo a superioridade baseada na
informação, no conhecimento, no estudo, cuidou de ensinar que cada um pode curar-se a
si mesmo.

Penso que de alguma forma é tarefa do astrólogo contar à pessoa em que campo de
experiências ela está inserida e quais são suas qualidades e dificuldades. Podemos falar,
como nossos antigos colegas metereologistas, das possibilidades de chuva, de turbulências
em determinados momentos, de uma safra maravilhosa, mas o ato de plantar e colher só
caberá à pessoa. E não nos cabe impeli-la a fazer, muito menos julgá-la quando não o fizer.

Mostramos em que ordem aquela pessoa está inserida, mas contribuir para esta ordem ou
não é de livre arbítrio dela. Entendo que às vezes é difícil compreender que crises pessoais,
como também guerras mundiais, fazem parte da ordem. Atualmente, prefiro confiar que
tudo caminha para a ordem, assim como os primeiros gregos confiaram na ordem
contemplada da Natureza.

O conhecimento utilizado para justificar os anseios pessoais, utilizado para satisfazer o


pequeno ego, normalmente se associa ao orgulho e à arrogância.

Parece-me que durante um tempo nós, astrólogos, seguimos por este caminho, talvez o
único possível naquele momento. Penso que toda vez que queremos que leis universais se
enquadrem nos nossos desejos pessoais, se enquadrem na nossa vontade, agimos como
crianças, batendo o pé, esperneando, fazendo birra.

Às vezes agimos assim com as posições astrológicas, desejando que se enquadrem nos
nossos desejos. Como se houvesse uma voz lá dentro dizendo: Eu quero que aconteça
agora!

Outras vezes fazemos isto para agradar clientes. Cuidado, vai passar dificuldades com
dinheiro devido a este trânsito de Saturno. Com esta direção de Júpiter, você tem que ir
para um palco, tem que receber uma promoção ou lançar um livro, e por aí afora. Até
humanizamos planetas!

Neste momento esquecemos que somos apenas intermediários, apenas pequenos


tradutores e não podemos interferir na trama da vida de cada um.

Minha percepção é que realmente não é fácil ser interpretador. Para isso, temos que nos
conhecer profundamente, deixando que a lei do livre arbítrio – no caso, do cliente – atue.

O caminho do determinismo não nos auxilia em nada, vejo como um desrespeito não
permitir a escolha individual. Ou seja, de que resolve falar para uma pessoa que se case
no dia 25 às 18 horas? Será que isto vai garantir o viveram felizes para sempre? Nesse
caso, estarei em dúvida se o casamento realmente dará certo ou estarei atuando na crença
de que casamento é para sempre?

Insistir no determinismo dificultará caba vez mais lidar com as incertezas, principal questão
humana, como coloca o sociólogo e pensador francês Edgar Morin:
O homem odeia viver na insegurança da dúvida.

A Astrologia continua sendo um importante elo entre os vários saberes, por isso é um
conhecimento transdisciplinar. É o único saber que se mantém por 6.000 anos a dizer que
Homem-Cosmo-Natureza estão ligados. Existe mesmo uma conexão, embora muitos
podem não compreendê-la, pois aos olhos humanos não foi cedido este poder de
visualização.

Enfim o conhecimento astrológico sobrevive e perdura a todo tipo de interpretação e


influência humana.

A Astrologia pode contribuir para a Ciência do Sujeito, como denomina Edgar Morin, mas
para isso penso ser necessária a interação com outras áreas do conhecimento.

Tratar o Céu zodiacal de nascimento como informação soberana sobre o comportamento


humano e considerar papel superficial informações como ADN e o Sistema Cultural da
Sociedade podem nos tirar essa possibilidade.

Aquele que tem conhecimento pode evitar muitos dos efeitos das estrelas através da
compreensão da sua natureza e preparando-se antes de tempo.
Por conseguinte, estes sinais ou causas não são de todo inevitáveis – como muitos
pensam – erro esse que é também condenado pela Igreja.
Ptolomeu
Minha prática

O estudo aprofundado das qualidades primárias ajudou-me a ter uma compreensão mais
extensa da ordem da vida e ao mesmo tempo ajudou-me a desenvolver um vocabulário
ainda mais amplo para pôr em prática na consulta astrológica individual. Auxiliou-me
também a compreender melhor a dinâmica inserida em cada pessoa.

Aplico há alguns anos a teoria dos Temperamentos em workshops e ainda sou capaz de
me surpreender com a força deste preceito. O trabalho em grupo é bastante eficiente, pois
mais rapidamente os participantes compreendem suas dinâmicas de relacionamentos com
diferentes temperamentos.

Para isto não utilizo nenhuma informação prévia, como hora e local de nascimento. Através
da exposição da Teoria dos Temperamentos, de aplicação de exercícios individuais e
dinâmicas de grupo o participante compreende seu temperamento básico e a correlação
com os outros temperamentos que experimenta em sua vida, seja nas relações familiares,
amorosas ou profissionais, seja em relações de amizade.

Na interpretação de Mapas Astrológicos utilizo também regras de Morin (de


Villefranche,1583-1656), fundamentos da neurociência e também a abordagem do
Pathwork® – metodologia contemporânea de abordagem do ser a partir de ensinamentos
psicológicos e espirituais.

E, principalmente, trabalhei e trabalho muito meu autoconhecimento para não me confundir


com os clientes, procuro estar atenta para não projetar meus anseios nos outros.
Bibliografia
A. Tavares de Sousa. Curso de História da Medicina. Fundação Calouste Gulbenkian. 1996.
Lisboa.

Annabella Kitson. History and Astrology. 1995. London.

Três iniciados O Caibalion: estudo da filosofia hermética do antigo Egito e da Grécia.


Pensamento. 1998. São Paulo.

Graeme Tobyn. Culpeper`s Medicine, Element. 1997. Shaftsbury, Dorset.

Nicholas Culpeper. Astrological Judgement of Diseases. AFA, INC.Tempe, Arizona (1655).

Nicholas Culpeper. The English Physician. 1652. Spittle-fields

Serge Hutin. História da Astrologia. Edições 70. 1970. Lisboa.

W. Jaeger. Paidéia, A Formação do Homem Grego. Martins Fontes. 1995. São Paulo

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