Você está na página 1de 297

Copyright © 2016 by Christopher Colfer

Título original: The Land of Stories: A Treasury of Classic Fairy Tales


Copyright de arte de capa e de ilustrações © Brandon Dorman
Esta edição foi publicada mediante acordo com Little, Brown and
Company, Nova York, Nova York, EUA.
Todos os direitos reservados.

Tradução das rimas Pedro Sette-Câmara


Preparação Luiza Thebas
Revisão Laila Guilherme e Tulio Kawata
Capa adaptada do projeto original
Projeto gráfico Sasha Illingworth
Imagem das aberturas © emo_O/Shutterstock.com
Impressão e acabamento

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


Angélica Ilacqua CRB-8/7057

Colfer, Chris
Terra de histórias : um tesouro de contos de fadas clássicos / Chris Colfer ;
ilustrações de Brandon Dorman ; tradução de Priscila Catão. -- São Paulo : Benvirá,
2018.
336 p. : il.

ISBN: 978-85-5717-265-4
Título original: Land of Stories: A Treasury of Classic
Fairy Tales

1. Literatura infantojuvenil 2. Contos de fadas I. Título II. Dorman,


Brandon III. Catão, Priscila

CDD 028.5
18-0977
CDU 028.5

Índices para catálogo sistemático:


1. Literatura infantojuvenil

1a edição, agosto de 2018


Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por
qualquer meio ou forma sem a prévia autorização da Saraiva
Educação. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na
lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.

Todos os direitos reservados à Benvirá, um selo da Saraiva


Educação, parte do grupo Somos Educação.
Av. das Nações Unidas, 7221, 1º Andar, Setor B
Pinheiros – São Paulo – SP – CEP: 05425-902

Edição digital: decembro 2018

Arquivo ePub produzido pela Simplíssimo Livros


Para minha mãe.

Obrigado por me apresentar aos contos de fadas

e estimular minha curiosidade infinita

sobre os personagens e suas motivações.

Amo você e sempre sentirei sua falta.


Introdução

Contos de fadas clássicos


Cinderela

João e Maria

Cachinhos Dourados e os Três Ursos

João e o Pé de Feijão

Chapeuzinho Vermelho

Branca de Neve

Os Três Porquinhos

Rumpelstiltskin

Os Elfos e o Sapateiro

A Bela e a Fera

O Menino que Gritou Lobo

Bela Adormecida

A Princesa e a Ervilha

Rapunzel

Henny Penny

A Pequena Sereia

Os Três Cabritinhos
A Rainha da Neve

O Príncipe Sapo

O Gato de Botas

Polegarzinha

O Homem-Biscoito

O Patinho Feio

Pinóquio

As rimas da Mamãe Ganso

A Pequena Bo Peep

A Pequena Miss Muffet

João sem Espanto

A Velhinha que Vivia Dentro de um Sapato

Humpty Dumpty

Sem Eira nem Beira

Três Ratos Ceguinhos

Béé, Béé, Negra Ovelhinha

Jorge Porquinho

Festa no Mato

É Hora do Bolo

Jack e Jill
João Destreza

O guia de sobrevivência dos contos de fadas da Mamãe Ganso

Sobre os autores

Agradecimentos
Imagine um mundo com mágica. Agora, imagine que esse lugar é o
lar de tudo e de todos que, de acordo com o que lhe disseram, não
são “reais”. Imagine que lá existem fadas e bruxas, sereias e
unicórnios, gigantes e dragões, ogros e duendes. Imagine que eles
moram em lugares como florestas encantadas, casas de biscoito de
gengibre, reinos subaquáticos ou castelos no céu.
Pessoalmente, sei que esse lugar existe porque é de lá que eu
sou. Esse mundo mágico não é tão distante quanto você imagina.
Na verdade, você já esteve lá diversas vezes. Você viaja para lá
toda vez que escuta as palavras “era uma vez”. É outro universo; é
onde moram todos os seus personagens preferidos de contos de
fadas e cantigas infantis. No seu mundo, nós o chamamos de Terra
de Histórias.
Para aqueles familiarizados com contos de fadas, eu sou
conhecida como Fada Madrinha. Sou mais lembrada por ter
transformado as roupas esfarrapadas da Cinderela em um belo
vestido para o baile do príncipe − mas não vou contar mais nada,
para o caso de você não ter lido a história. Ela é a primeira a
aparecer neste tesouro − você vai adorar!
Entendo que tudo isso possa ser surpreendente. Não é todo dia
que você descobre que um lugar como a Terra de Histórias existe
para além da sua imaginação. Contudo, se você parar e pensar um
pouco, não é tão chocante assim; afinal, se a ficção é inspirada na
mitologia, e os mitos são apenas lendas floreadas, e lendas são
uma história exagerada, então todas as histórias de ficção teriam
um elemento de verdade. E garanto que o mundo dos contos de
fadas é tão real quanto o livro que você está segurando.
Você deve estar se perguntando como as histórias do mundo
dos contos de fadas se tornaram tão prestigiadas no seu mundo.
Permita-me explicar, pois a culpa é toda minha.
Muitos séculos atrás, descobri o seu mundo por acidente. Depois
de uma longa e maravilhosa carreira ajudando pessoas (como a
Cinderela) a alcançarem seus sonhos, eu queria fazer mais. Então,
um dia fechei os olhos, brandi minha varinha mágica e disse: “Quero
ir para um lugar onde as pessoas precisem ainda mais de mim”.
Quando abri os olhos, eu não estava mais na Terra de Histórias.
Quando cheguei, o seu mundo estava passando por uma época
conhecida como Idade das Trevas, e a descrição não poderia ser
melhor. Foi um período tomado pela pobreza, pela peste e pela
guerra. As pessoas sofriam, passavam fome e duvidavam que as
condições pudessem melhorar.
Fiz o que o que estava ao meu alcance para ajudar as pessoas
que encontrei: tratei os enfermos, alimentei os famintos e até tentei
acabar com a violência. Infelizmente, nada do que fiz impediu os
males e a miséria de se espalharem.
Porém, o seu mundo não estava precisando de interação, e sim
de inspiração. Num mundo dominado por reis e líderes militares
cruéis, ninguém conhecia as ideias de autoestima e
autoempoderamento. Então comecei a contar histórias do meu
mundo para entreter e animar os outros, especialmente as pobres
criancinhas. Mal sabia eu que aquilo se tornaria a maior contribuição
da minha vida.
Contei histórias de covardes que se transformavam em heróis,
de camponeses que se tornavam poderosos e de pessoas solitárias
que encontravam o amor. As histórias ensinavam muitas lições, mas
o que elas ensinavam de mais importante ao mundo era sonhar. A
capacidade de sonhar era uma introdução muito necessária à
esperança, que se espalhou como uma forte epidemia. Famílias
transmitiram as histórias de geração a geração, e ao longo dos anos
observei a compaixão e a coragem delas mudar o mundo.
Recrutei outras fadas para me ajudar a espalhar os contos da
Terra de Histórias pelo mundo, e as histórias ficaram conhecidas
como contos de fadas. Com o passar do tempo, pedimos para
escritores, como Irmãos Grimm, Hans Christian Andersen e Charles
Perrault, publicarem as histórias, assim elas viveriam para sempre.
Durante essa época, percebi como contar histórias é importante.
Enquan-to a filosofia e a ciência nos ajudam a aprimorar nossa
mente e nosso corpo, contar histórias estimula nosso espírito. É
algo que expande nossa imaginação, ensina lições valiosas, mostra
que as coisas nem sempre são o que parecem e nos encoraja a
atingir nosso máximo potencial.
Tendo dito isso, tenho um favor para pedir a cada um que estiver
lendo isso: Torne-se um contador de histórias! Leia para os outros
os contos de fadas deste livro. Leia para as pessoas histórias de
outro livro. Se puder, crie suas próprias histórias e compartilhe-as.
Ao transmitir a arte de contar histórias para a sua família e seus
amigos, você torna o mundo um lugar melhor.
Ao inspirar alguém, você estimula a criatividade dessa pessoa; e,
quando alguém tem o dom da criatividade, ele ou ela possui
inerentemente a fonte do progresso e da prosperidade. A
criatividade é a habilidade simples − mas poderosa − de criar algo a
partir do nada, e, por coincidência, criar algo a partir do nada
também é a definição de mágica.
Torne-se um contador de histórias e nos ajude a manter vivos os
contos de fadas. Mesmo que as pessoas não acreditem em mágica,
nunca deixe o mundo esquecer o que ela representa. Onde quer
que haja um contador de histórias, haverá esperança.
Obrigada, e que vocês todos tenham o seu felizes-para-sempre!

Com amor,

Fada Madrinha
Eraerauma vez uma garotinha encantadora chamada Cinderela. Ela
tão bonita quanto bondosa e tratava a todos com compaixão e
respeito, desde os lordes e damas que moravam no seu vilarejo até
os ratinhos que viviam no seu jardim. Cinderela tinha um coração de
ouro e era amada por todos que a conheciam.
Cinderela morava numa bela casa com seu pai e sua mãe, e
eram tão felizes como uma família pode ser, até o pesaroso dia em
que sua mãe faleceu.
Com medo de que Cinderela crescesse triste sem uma mãe, seu
pai logo se casou com uma viúva do vilarejo que tinha duas filhas.
Sua madrasta não era tão afetuosa ou meiga quanto a mãe de
Cinderela, e suas meias-irmãs não eram muito bondosas, mas
Cinderela as amava como a família que esperava que se tornassem.
Infelizmente, logo após o casamento, o pai de Cinderela também
morreu, deixando-a sozinha com sua madrasta e suas meias-irmãs.
Foi então que a verdadeira natureza de sua nova família se revelou.
Elas removeram da casa tudo que fora dos pais de Cinderela e a
encheram com seus próprios pertences. As meias-irmãs tomaram o
quarto de Cinderela e a obrigaram a dormir numa pilha de feno no
porão. A madrasta pegou os vestidos de Cinderela e lhe deu roupas
esfarrapadas para usar.
− Se quiser continuar morando aqui, vai precisar trabalhar − disse
a madrasta.
A partir daquele momento, Cinderela deixou de ser tratada como
uma irmã ou uma filha e passou a ser tratada como uma criada. Sua
madrasta e suas meias-irmãs lhe davam afazeres penosos e tarefas
frívolas e a obrigavam a obedecer a seus mandos e desmandos
enquanto aproveitavam a casa nova.
Com o passar do tempo, Cinderela cresceu e se tornou uma bela
jovem, despertando a inveja de suas duas meias-irmãs. Como
castigo por sua beleza, elas aumentaram os afazeres dela até que
ficasse coberta de sujeira o tempo inteiro, e assim Cinderela
esqueceu que era bonita.
Apesar de seu infortúnio, Cinderela continuou sendo uma pessoa
boa e compassiva. Ela sabia que a madrasta e as meias-irmãs
jamais poderiam tomar dela seu coração de ouro, e isso bastava
para alegrá-la nos dias mais melancólicos. Cinderela podia gastar
seu tempo trabalhando para as três, mas as noites eram suas para
sonhar com uma vida melhor, e esses sonhos davam-lhe a
esperança de que boas coisas aconteceriam.
Um dia, convites reais foram enviados para o reino inteiro,
convidando todas as jovens da região para um baile especial que o
rei e a rainha dariam no palácio. No baile, o belíssimo Príncipe
Encantado dançaria com todas as jovens presentes e escolheria sua
futura noiva.
Era a notícia mais empolgante no reino em anos, e a casa de
Cinderela vibrava de ansiedade. Nas semanas que antecederam o
baile, a madrasta e suas filhas não falavam de outra coisa. As meias-
irmãs de Cinderela se revezavam fantasiando como seria dançar
com o príncipe e aceitar seu pedido de casamento. Elas compraram
tecidos elegantes e ordenaram que Cinderela fizesse vestidos para a
ocasião.
Enquanto escutava os devaneios das meias-irmãs e cosia seus
vestidos, Cinderela também sonhava com o baile. Ela jamais tinha
ido ao palácio e queria mais do que tudo comparecer ao evento com
as outras jovens do reino. Quando pequena, ela adorava escutar as
histórias de seu pai sobre visitas ao palácio em ocasiões especiais.
Ele prometera levá-la um dia quando ela fosse mais velha, mas,
agora que ele tinha partido, o baile parecia a única chance de
Cinderela.
A garota trabalhou sem descanso nos vestidos de suas meias-
irmãs na esperança de terminar a tempo de costurar algo para si
mesma. Logo chegou a noite do baile, mas Cinderela não teve tempo
para nada além de remendar os buracos e rasgos de sua roupa
esfarrapada.
Uma carruagem chegou para levar a madrasta e as meias-irmãs
para o palácio, e Cinderela as acompanhou até lá fora.
− Aonde você pensa que vai? − perguntou a madrasta.
− Para o baile, é claro − respondeu Cinderela.
− Você não pode ir ao palácio vestindo esses trapos horrendos −
disse a madrasta.
− Ah, por favor, Madrasta, permita que eu vá − implorou
Cinderela. − Não quero dançar com o príncipe, quero apenas ver o
palácio. Eu fico bem no fundo, onde ninguém possa me ver.
− De maneira alguma! − disse a madrasta. − As pessoas no
palácio vão rir de você. Nós ficaríamos tão envergonhadas que
nunca mais poderíamos aparecer em eventos sociais. Confie em
mim, Cinderela, estou lhe fazendo um favor.
E, assim, a madrasta e as meias-irmãs subiram na carruagem e
seguiram para o baile. Cinderela caiu de joelhos e chorou mais do
que tinha chorado em toda a sua vida.
− Ah, mamãe e papai − rezou Cinderela −, por favor, me perdoem
por estar tão chateada. Me esforço muito para ter um coração feliz,
mas isso é difícil quando ele está partido.
De repente, uma rajada de vento cercou Cinderela, e uma
senhora se materializou no ar. Ela vestia um manto reluzente e tinha
um sorriso bondoso. Enxugou as lágrimas de Cinderela e acariciou
seu cabelo.
− Está tudo bem, minha criança − disse a senhora. − Uma pessoa
tão encantadora quanto você não devia estar tão triste.
− Quem é você? − perguntou Cinderela assustada, pois ela
jamais vira aquela mulher.
− Sou sua Fada Madrinha − respondeu a mulher. − Estou aqui
para ajudá-la.
− De todas as pessoas no mundo, por que me ajudar? −
perguntou Cinderela.
− Eu tenho observado você, minha criança − disse a Fada
Madrinha. − Você é tão bondosa com todos, mesmo quando não é
tratada com bondade.
Você é compassiva, apesar da pouca compaixão que recebe dos
outros. Você celebra o lado bom da vida, mesmo quando a vida não
é boa com você. Você tem uma alma rara e especial, então vai ser
uma honra ajudá-la a comparecer ao baile hoje.
− Como você pode me ajudar? − perguntou Cinderela. − Estou
imunda e não tenho o que vestir. E, sem uma carruagem, o baile terá
acabado até eu chegar ao palácio a pé.
− A sua situação parece desanimadora, sem dúvida nenhuma −
disse a Fada Madrinha. − Mas não é nada que um pouco de mágica
não possa resolver!
A Fada Madrinha puxou uma longa varinha de cristal de dentro do
seu manto. Ela brandiu-a na direção de uma abóbora que crescia no
jardim e a transformou magicamente numa enorme carruagem
dourada. A transformação assustou seis ratos minúsculos, que
saíram correndo.
− Ah, esplêndido − disse a Fada Madrinha ao ver os ratos. − Você
vai precisar de cavalos e de alguém para guiar a carruagem!
Ela apontou a varinha para os ratos, que magicamente se
transformaram em quatro cavalos, um cocheiro e um lacaio.
− E, agora, algo para vestir − disse a Fada Madrinha.
Ela brandiu a varinha sobre Cinderela. Suas roupas esfarrapadas
foram transformadas no vestido de baile mais lindo e elegante que a
garota já tinha visto, e sapatos de cristal apareceram em seus
minúsculos pés. Nem em seus sonhos Cinderela imaginara que
poderia ficar tão bonita.
− Agora você deve ir logo para o baile, antes que seja tarde
demais − disse a Fada Madrinha. − Você precisa voltar para casa
antes de o relógio soar as doze badaladas, pois o feitiço acaba à
meia-noite.
Cinderela agradeceu à Fada Madrinha, e o lacaio a ajudou a subir
na carruagem dourada. O cocheiro segurou as rédeas dos cavalos e
eles seguiram pela estrada em direção ao palácio.
Quando Cinderela chegou ao magnífico palácio, o baile já estava
no auge. Ela subiu rapidamente os degraus da entrada, desesperada
para se aproximar da música e das risadas que vinham lá de dentro.
Ao adentrar o salão de baile, Cinderela sentiu como se tivesse
entrado num sonho. Havia homens e mulheres dançando ao seu
redor, com as roupas mais elegantes de todo o reino. Havia espelhos
e obras de arte nas paredes, pilares dourados e um incrível lustre
iluminando todo o ambiente.
Quando os convidados do baile viram Cinderela, a festividade
ficou suspensa por um instante. Ela era a visão mais espetacular que
todos já haviam tido.
Cinderela avistou sua madrasta e suas meias-irmãs do outro lado
do salão, mas ela estava tão bonita que não foi reconhecida por elas.
Elas a encararam deslumbradas, assim como todos os outros.
Cinderela cativou até mesmo o rei e a rainha, que se levantaram de
seus tronos para vê-la melhor.
A princípio, os olhares preocuparam Cinderela. Será que eles
sabiam que ela não pertencia àquele lugar? Será que alguém pediria
para ela se retirar do baile? Seus medos foram silenciados quando
um homem incrivelmente bonito se aproximou e estendeu-lhe a mão.
− Posso convidá-la para dançar? − perguntou ele.
Cinderela não queria ser rude, então segurou a mão dele, e os
dois valsaram pelo salão. Apesar de ela ter certeza de que eles
nunca tinham se visto antes, havia algo de muito familiar naquele
rapaz, como se eles tivessem se conhecido num sonho. Enquanto
olhava os rostos perplexos ao seu redor no salão, ela rapidamente
percebeu com quem estava dançando.
− Você é o príncipe, não é? − perguntou Cinderela.
− Sim − disse ele, sorrindo. − E quem é você?
− Eu sou… eu sou… − começou Cinderela, e olhou o relógio. −
Desculpe, mas eu preciso ir embora!
Era quase meia-noite! Cinderela perdera completamente a noção
da hora enquanto dançava com o príncipe. Tinha apenas alguns
instantes antes de o feitiço acabar. Cinderela saiu correndo do salão
com a maior velocidade que seus sapatos de cristal permitiam.
− Não, espere! − chamou o príncipe. − Volte, por favor!
Cinderela não queria abandoná-lo, mas não podia deixar que o
príncipe a visse se transformar numa criada. Ela desceu correndo os
degraus em frente ao palácio, e o príncipe foi atrás dela. Um sapato
de cristal escorregou do seu pé, mas ela não teve tempo de pegá-lo
de volta.
O lacaio ajudou Cinderela a subir na carruagem dourada e eles
dispararam para casa. Chegaram no gramado da frente da casa na
última badalada da meia-noite. O vestido de Cinderela se
transformou novamente em sua roupa esfarrapada, a carruagem
voltou a ser uma abóbora, e o lacaio, o cocheiro e os cavalos
voltaram a ser os ratos do jardim.
− Nem sei como agradecer pela ajuda de hoje − disse Cinderela
enquanto acariciava com gratidão os ratos. − Vou me lembrar disso
para sempre!
Quando a madrasta e as meias-irmãs voltaram algumas horas
depois, elas só conseguiam falar sobre a mulher misteriosa com
quem o príncipe dançara no baile. Enquanto Cinderela as ajudava a
se arrumar para dormir, as três tentavam adivinhar quem era a
mulher e de onde ela tinha vindo, sem se dar conta de que aquela
moça estava bem na frente delas.
Na manhã seguinte, o reino acordou com uma notícia
maravilhosa. Depois de dançar com todas as jovens do local, o
príncipe escolhera sua noiva. Havia apenas um problema: ninguém
sabia quem ela era, nem de onde tinha vindo. A única pista que o
príncipe tinha era o sapatinho de cristal que ela deixara para trás.
Então, o príncipe iniciou uma busca atrás da mulher que
conhecera no baile. Ele procurou durante semanas, testando o
sapato nos pés de princesas, duquesas e todas as filhas das famílias
aristocráticas, mas não encontrou nem um sinal da moça. Então ele
pediu que todas as jovens sem título ou linhagem real do reino
testassem o sapato de cristal. Como era para um pé muito pequeno
e delicado, o sapato não cabia em ninguém.
A parada final do príncipe foi a casa de Cinderela. As meias-irmãs
brigaram para decidir qual delas seria a primeira a provar o sapato
de cristal, certas de que enganariam o príncipe para que ele
pensasse que pertencia a alguma delas.
A primeira irmã empurrou o pé para dentro do sapato com tanta
força que ele quase quebrou. A segunda espremeu o pé dentro do
sapato, e ele ficou tão apertado que começou a sangrar.
− Temo que a moça que você está procurando não esteja aqui −
disse a madrasta. − Mas qualquer uma das minhas filhas seria uma
esposa maravilhosa, Sua Alteza.
− Espere − disse o príncipe. − E ela?
Cinderela tinha acabado de subir do porão, cheia de lenha nos
braços, quando viu o príncipe.
− A Cinderela? − disse a madrasta com uma risada. − Ela é
apenas uma criada, Sua Alteza. É impossível que seja a mulher que
está procurando.
Porém, diferentemente da madrasta e das meias-irmãs, o
príncipe conseguiu enxergar além dos farrapos e da pele suja de
Cinderela. Ele sabia que aquela criada tinha algo de especial e
precisava que ela provasse o sapato para ter certeza.
− Por favor, eu insisto − disse o príncipe.
Cinderela sentou-se, e o príncipe calçou o sapatinho de cristal em
seu pé. Para a surpresa de todos (menos de Cinderela, é claro), ele
coube perfeitamente! O príncipe beijou a bochecha de Cinderela e a
pediu em casamento bem ali.
Inicialmente, Cinderela não soube o que responder. Tinha visto o
príncipe apenas uma vez, mas pensara nele todos os dias desde o
baile. Valsar pelo salão fora a experiência mais feliz de sua vida, e,
depois de anos de lembranças desagradáveis, Cinderela estava
pronta para criar novas recordações.
− Sim, Sua Alteza − disse Cinderela. − Eu aceito me casar com
você.

Apesar dos anos de tratamento cruel, Cinderela perdoou a


madrasta e as meias-irmãs e convidou-as para o casamento.
Infelizmente, elas não compareceram. Assim como a madrasta
previra, Cinderela as envergonhara tanto que elas jamais
apareceram de novo em eventos sociais.
Cinderela e o príncipe se casaram na semana seguinte, numa
enorme celebração no palácio. Os sinos das igrejas soaram
alegremente pelo reino, e Cinderela foi recebida de braços abertos
pela família real. Ela e o príncipe tiveram um casamento maravilhoso
e viveram felizes para sempre.

Fim
Eramoravam
uma vez um irmão e uma irmã chamados João e Maria. Eles
com o pai e a madrasta numa pequena casa de campo,
na extremidade da floresta. O pai deles era um homem bom e que
amava os filhos mais do que tudo no mundo. Sua esposa, contudo,
era uma mulher malvada e egoísta que sentia ciúmes do afeto que o
marido demonstrava pelos filhos.
O pai de João e Maria era lenhador e fazia o possível para
sustentar a família, mas eram tempos difíceis para os camponeses
do reino devido à fome que se espalhava pela região. A comida era
escassa, e muitos se preocupavam com como sobreviveriam ao
inverno que se aproximava.
− Se não fizermos nada, vamos passar fome! − disse a esposa
para o lenhador uma noite, antes de dormir. − Nós mal temos comida
suficiente para nós dois. Você precisa se livrar do João e da Maria
para nós sobrevivermos.
− Eu nunca me livraria dos meus filhos − disse o lenhador. − Eles
são tudo para mim!
− Vai ser fácil − respondeu a esposa, que já elaborara um plano.
− Amanhã, nós levaremos João e Maria bem para o meio da floresta
e os deixaremos lá. Eles são tão novos que não conseguirão voltar
para casa. Perdidos, alguma alcateia de lobos famintos os
encontrará. Nunca mais precisaremos nos preocupar em alimentá-
los.
− Prefiro passar fome a abandonar meus filhos − disse o
lenhador. − Não quero escutar nem mais uma palavra sobre isso.
Encontraremos outra maneira de enfrentar o inverno.
Apesar da vontade do marido, a esposa estava convencida de
que seu plano era a única solução. Por sorte, João e Maria ainda
estavam acordados e escutaram a conversa do pai com a madrasta
pelas finas paredes da casa.
− O que fazemos, João? − perguntou Maria para o irmão. −
Nossa madrasta certamente vai tentar nos abandonar na floresta
enquanto o papai estiver fora cortando lenha amanhã.
− Não se preocupe, Maria − disse João. − Agora à noite,
enquanto eles estiverem dormindo, vou juntar pedrinhas brancas,
assim podemos criar um rastro para seguir de volta até a nossa
casa.
João saiu escondido enquanto o pai e a madrasta dormiam e
juntou todas as pedras brancas que encontrou. Na manhã seguinte,
depois que o lenhador saiu para cortar árvores, sua esposa levou as
crianças para a floresta.
− Aonde nós vamos? − perguntou Maria.
− Pegar lenha − disse a madrasta. − Agora fique quieta e me
siga.
Ela os levou para o coração da floresta; João e Maria nunca
tinham ido tão longe. De tempo em tempo, João soltava uma
pedrinha, criando um rastro atrás deles. Eles caminharam o dia
inteiro e pararam apenas quando o sol começou a se pôr.
− Agora deem uma olhada por aí e me ajudem a catar lenha −
disse a madrasta.
Porém, antes de terminar a frase, ela saiu correndo em direção à
trilha pela qual haviam chegado, deixando os enteados
completamente sozinhos na floresta.
João e Maria começaram a seguir o rastro de pedras brancas que
os levaria até em casa. Ao anoitecer, a floresta ficou tão escura que
as pedrinhas brancas eram as únicas coisas que eles conseguiam
enxergar. Quando chegaram, encontraram o pai preocupadíssimo.
− Graças a Deus vocês estão bem − disse o lenhador, e abraçou
fortemente os filhos. − Onde está sua madrasta?
Para a surpresa de João e Maria, eles tinham chegado antes
dela. Sem o rastro de pedras, a esposa do lenhador teve dificuldade
em se orientar na floresta e chegou apenas várias horas depois dos
enteados. Ela ficou furiosa ao ver que João e Maria tinham
encontrado o caminho de volta para casa.
− O que aconteceu? − perguntou o lenhador para a esposa.
− Fomos buscar lenha − respondeu a esposa. − Eu me virei por
um segundo, e eles tinham sumido.
− Espero que não aconteça de novo − disse o lenhador.
− Não se preocupe, não vai − retrucou a esposa, e encarou os
enteados furiosamente quando o marido não estava olhando.
Naquela noite, a madrasta trancou João e Maria no quarto para
que as crianças não pudessem sair escondidas e juntar mais
pedrinhas brancas.
− Ah, João, o que faremos agora? − perguntou Maria para o
irmão. − Com certeza nossa madrasta vai tentar nos abandonar de
novo amanhã.
− Não se preocupe, Maria − disse João. − Amanhã cedo, vamos
guardar as migalhas de pão do café da manhã para marcar o nosso
caminho.
Como haviam previsto, assim que o pai saiu na manhã seguinte,
a madrasta levou João e Maria de volta para a floresta. Eles
caminharam ainda mais dessa vez, embrenhando-se por entre as
árvores. João foi jogando atrás deles as migalhas de pão, que já
estavam quase acabando quando eles pararam.
− Agora, vão recolher madeira − disse a madrasta.
Mais uma vez, ela saiu correndo na direção de casa e deixou
João e Maria sozinhos. Estava tão tarde que os irmãos decidiram
dormir na floresta e esperar o amanhecer para seguir as migalhas
até a casa. Infelizmente, ao acordarem, viram que os pássaros
matutinos tinham comido todo o pão!
João e Maria caminharam pela floresta torcendo para estarem na
direção certa, mas, com tantas árvores, era impossível saber. Eles
andaram por horas e horas, sem encontrar nenhuma parte familiar.
Então encontraram um amigável pássaro branco e o seguiram
pela floresta, na esperança de que ele os guiasse para casa. Quanto
mais seguiam o pássaro, mais um cheiro maravilhoso se espalhava
pelo ar. Era um aroma adocicado, como se algo delicioso estivesse
assando em algum forno ali perto.
João e Maria chegaram a uma clareira no meio das árvores e se
encantaram ao avistar, no centro do descampado, uma casa toda
feita de comida. As paredes eram de biscoito de gengibre, a cerca,
de bengalas doces e os arbustos do jardim, de jujubas. O telhado
tinha uma camada de cobertura, e as janelas eram feitas de vidro
falso de açúcar.
− Nunca vi nada tão apetitoso! − exclamou Maria.
Ela e o irmão foram correndo até a casa e começaram a comê-la.
Eles estavam com tanta fome e tão exaustos da jornada que nem
pensaram em pedir permissão ao residente do local. De repente, a
porta da casa se abriu e uma senhora de aparência bondosa saiu.
− Quem está aí? − perguntou a senhora. − O que estão fazendo
com a minha casa?
− Por favor, perdoe-nos − pediu João. − Estávamos com fome e
perdidos na floresta quando achamos a sua casa.
A senhora sorriu para eles, mostrando os dentes podres por trás
dos lábios enrugados.
− Não tinha percebido que vocês eram crianças − disse ela
alegremente. − Não precisa se desculpar, querido. Eu construí uma
casa de comida justamente para crianças como vocês. Por favor,
comam quanto quiserem!
João e Maria tinham certeza de que a senhora só podia ser um
anjo disfarçado. Eles comeram a cerca de bengalas doces e os
arbustos de jujubas. Comeram as janelas de açúcar e lamberam toda
a cobertura do telhado. Os dois tinham comido tudo, menos as
paredes de biscoito de gengibre, quando enfim ficaram
empanturrados.
− Agora entrem aqui para descansar, meus queridos − disse a
senhora. − Tem mais guloseimas e camas macias esperando por
vocês.
João e Maria obedeceram prontamente, sabendo que precisavam
descansar depois da jornada na floresta. Porém, quando entraram,
não viram guloseimas nem camas, e sim uma grande gaiola e um
forno gigantesco.
A senhora jogou João e Maria na gaiola e trancou a porta. Ela
removeu a máscara de idosa e as crianças viram que o resto dela
estava tão apodrecido quanto seus dentes. Ela não era uma
senhorinha meiga, e sim uma bruxa velha e feia!
− Um de vocês vai ser o meu jantar, e o outro vai ser meu
escravo! − disse a bruxa gargalhando. − Isso vai ensiná-los a não
andar pela floresta sozinhos!
A bruxa arrancou Maria da gaiola e entregou-lhe uma vassoura.
− Varra a casa, menina! − ordenou. − Quero a casa limpa antes
da minha refeição.
Sem ter escolha, Maria varreu a casa até ficar impecável. A bruxa
acendeu o fogão e depois tirou João da gaiola.
− Você não deveria me comer! − implorou João. − Estou magro e
fraco demais para servir de refeição, mas, se você continuar me
alimentando, logo vou virar um banquete!
A bruxa coçou os pelos no seu queixo e refletiu.
− Que ideia excelente! − disse a bruxa. − Vou alimentá-lo até
você ficar grande demais para a gaiola, então você será a minha
primeira refeição do inverno!
Durante várias semanas, a bruxa obrigou João a comer doces
deliciosos enquanto Maria era forçada a limpar o interior e o exterior
da casa. No final de cada dia, a bruxa examinava a gaiola,
semicerrando os olhos para João.
− Já está fofinho e apetitoso? − perguntou a bruxa.
João presumiu que a bruxa não enxergava bem. Caso contrário,
ela certamente teria notado que as roupas dele estavam bem mais
apertadas do que antes e que ele ficava mais cheinho a cada dia.
Rapidamente, ele pensou em uma maneira de usar a vista ruim da
bruxa para salvar sua vida.
− Eu já daria um bom petisco, mas não o suficiente para
satisfazer o seu apetite − mentiu João.
A bruxa bufou e ordenou que Maria preparasse um cozido de rato
para ela.
No dia seguinte, quando varria as folhas do lado de fora da casa,
Maria guardou dois gravetos no bolso. À noite, ela os colocou dentro
da gaiola de João um pouco antes de a bruxa ir checar o garoto.
− Já ficou mais rechonchudinho? − perguntou a bruxa.
− Ele está mais magro do que nunca − disse Maria. − João,
estenda sua mão para a bruxa sentir o seu dedo ossudo.
Maria apontou a cabeça para os gravetos que dera para o irmão,
e João percebeu o que devia fazer. Ele estendeu um graveto como
se fosse parte de sua mão, e a bruxa o tateou. Ela gemeu e grunhiu,
depois ordenou que Maria preparasse sopa de aranhas para o seu
jantar.
João e Maria não sabiam por quanto tempo mais conseguiriam
enganar a bruxa. Eles perceberam que ela estava ficando
impaciente, pois no dia seguinte foi averiguar a gaiola antes mesmo
de o sol se pôr.
− Será que você finalmente está gordo? − perguntou ela.
− Eu até daria um ótimo lanche, mas como uma refeição
completa não a satisfaria − mentiu João de novo.
Ele estendeu um graveto assim como fizera na noite anterior. A
bruxa tateou o graveto, e seu rosto ficou todo vermelho.
− Já esperei o bastante! − gritou a bruxa. − Gordo ou não, vou
comê-lo esta noite! Prepare o fogão, garota!
Maria escancarou a porta do fogão e o encheu de lenha. Ela
acendeu um fósforo, e uma forte chama cresceu lá dentro. Então a
bruxa parou ao lado dela, com um sorriso sinistro no seu rosto feio.
− Agora quero que você teste o fogo para ver se está quente −
disse a bruxa.
Maria sabia que a bruxa estava tentando enganá-la. Ela iria jantar
os dois!
− Mas eu não sei como fazer isso − respondeu Maria, pensando
rapidamente. − Você pode me mostrar o que devo fazer?
− Garota estúpida! − exclamou a bruxa. − Afaste-se que eu
mostro. É muito simples, é só se aproximar do fogo assim e encostar
nas chamas com a sua… AAAAHHH!
Maria empurrou a bruxa para dentro do forno com toda a sua
força e trancou a porta. A bruxa berrou até torrar. Quando seus gritos
finalmente pararam, Maria libertou João da gaiola. Antes de eles
fugirem da casa, João encontrou um vaso cheio de rubis e diamantes
que a bruxa guardava numa prateleira. Ele e Maria encheram os
bolsos com as joias e correram floresta adentro.
Correram para bem longe da casa de biscoito de gengibre da
bruxa, sem jamais olhar para trás. Algum tempo depois, chegaram à
extremidade da floresta e avistaram uma casa de campo muito
familiar.
− Maria, olhe! Estamos em casa! − exclamou João.
O lenhador escutou os filhos e correu até fora de casa para
cumprimentálos. Ele ficou tão feliz ao vê-los que lágrimas brotaram
em seus olhos e escorreram por seu rosto. João e Maria deram uma
olhada pela casa, mas a esposa do lenhador não estava em lugar
algum.
− Papai, o que aconteceu com nossa madrasta? − perguntou
Maria.
− No dia em que vocês desapareceram, ela se perdeu na floresta
e uma alcateia de lobos a encontrou − respondeu ele. − Fiquei
preocupado de que o mesmo pudesse ter acontecido com vocês,
mas os dois estão bem e vivos, então está tudo certo no mundo!
O lenhador abraçou os filhos e nunca mais os perdeu de vista.
Usaram as joias para comprar uma casa nova, bem perto do vilarejo
mais próximo, e João e Maria comeram todos os doces que queriam
sem ter medo de bruxas. A família sobreviveu ao inverno e viveu feliz
para sempre.

Fim
EraApesar
uma vez um Papai Urso, uma Mamãe Urso e um Bebê Urso.
de a maioria dos ursos preferir viver isolados em
cavernas, essa família morava em uma peculiar casa na árvore no
meio da floresta. A casa era um tanto pequena para ursos daquele
tamanho, mas eles a consideravam perfeitamente acolhedora.
Como na maioria das famílias, cada urso era diferente e tinha
sua própria noção de bem-estar.
Na sala da casa, cada urso tinha uma cadeira especial. O Papai
Urso sentava-se numa cadeira de balanço perto da lareira. A
Mamãe Urso desfrutava de uma poltrona almofadada perto da
janela. O Bebê Urso tinha uma cadeirinha do seu tamanho perto do
seu enorme baú de brinquedos.
À noite, os ursos dormiam em três camas diferentes. O Papai
Urso tinha uma cama grande de colchão firme. A Mamãe Urso
gostava de dormir numa cama média com muitos travesseiros de
pena. O Bebê Urso dormia numa cama menor, perfeita para sua
altura e sua largura.
Certa manhã, o Papai Urso fez mingau para a família comer no
café da manhã. Ele serviu o mingau em três tigelas, e os ursos
sentaram-se à mesa da cozinha para apreciá-lo. Era raro a família
concordar com alguma coisa, mas, assim que provaram a comida,
todos acharam que estava quente demais.
− Por que não damos uma caminhada lá fora enquanto
esperamos o mingau esfriar? − sugeriu o Papai Urso. − Faz tempo
que não fazemos um passeio em família.
A Mamãe Urso e o Bebê Urso acharam a ideia excelente, então
a família foi dar uma breve caminhada pela floresta enquanto a
comida esfriava. Naquele dia, também havia uma garotinha
caminhando pela floresta; ela morava num vilarejo próximo. Seu
nome era Cachinhos Dourados por causa dos seus belos cachos
loiros.
Por muito pouco Cachinhos Dourados não encontrou os ursos,
pois ela se deparou com a casa na árvore logo depois que os ursos
saíram. Ela jamais vira uma casa daquelas. Cachinhos Dourados
era uma garotinha muito curiosa, então bateu à porta para perguntar
se poderia entrar.
Bateu com força e, para sua surpresa, a porta se escancarou. Os
ursos tinham esquecido de trancá-la ao sair de casa.
− Olá? Tem alguém em casa? − perguntou Cachinhos Dourados
para dentro da casa vazia, mas tudo que escutou foi o eco da
própria voz.
Como ninguém respondeu, Cachinhos Dourados decidiu explorar
a casa. O cheiro de mingau fresco a levou até a cozinha, e ela viu
as três tigelas na mesa.

− Mingau! Minha comida preferida! − exclamou Cachinhos


Dourados.
A garotinha ficara com tanta fome enquanto caminhava pela
floresta que se esqueceu das boas maneiras. Pegou uma colher e
provou o mingau do Papai Urso mesmo sem pedir permissão.
Estava tão quente que ela queimou a língua.
− Este mingau está quente demais − disse Cachinhos Dourados.
Ela então provou o mingau da Mamãe Urso. O pote estava tão
perto da janela e esfriara tanto que nem tinha mais gosto de mingau.
− Este mingau está frio demais − disse Cachinhos Dourados.
Em seguida, ela deslizou para o próximo assento e provou o
mingau do Bebê Urso. A garotinha sorriu: na sua opinião, era
exatamente aquele gosto que um mingau deveria ter.
− Este mingau está simplesmente perfeito! − disse Cachinhos
Dourados. Ela comeu o mingau do Bebê Urso até a tigela ficar
vazia. Depois de terminar, procurou um lugar para se sentar
enquanto sua barriga digeria a comida. Foi até a sala de estar e
acomodou-se na cadeira de balanço do Papai Urso. Era tão dura
que seu bumbum doeu só de sentar nela.
− Esta cadeira de balanço é dura demais − disse Cachinhos
Dourados.
Ela saltou da cadeira e se sentou na poltrona da Mamãe Urso.
Era tão macia que a garota afundou no meio dela.
− Esta poltrona é macia demais − disse Cachinhos Dourados.
Ela levou um instante para conseguir sair da poltrona. Então
sentou-se na cadeira do Bebê Urso. Era exatamente o que
Cachinhos Dourados procurava.
− Esta cadeira é simplesmente perfeita! − exclamou ela
alegremente.
Cachinhos Dourados encostou-se na cadeira, que, de repente,
desmoronou embaixo dela. Antes que se desse conta, estava no
chão. Cachinhos Dourados nunca tinha quebrado uma cadeira
antes, então foi um belo susto.
− Devo ter comido mais mingau do que imaginei − disse ela.
Como não gostou de nenhuma das cadeiras, Cachinhos
Dourados decidiu descansar numa cama. Além disso, depois de um
longo dia caminhando pela floresta e explorando casas de
desconhecidos, estava precisando de um cochilo. Então entrou no
quarto dos ursos e se deitou na cama do Papai Urso.
− Esta cama é firme demais − disse Cachinhos Dourados.
Ela saltou da cama e foi testar a cama da Mamãe Urso. Assim
como a poltrona, a cama era tão macia que Cachinhos Dourados
afundou nela e teve dificuldades para se levantar.
− Esta cama é irregular demais − disse Cachinhos Dourados.
Assim, sobrou no quarto apenas a cama do Bebê Urso. Primeiro,
ela se sentou para garantir que a cama aguentaria o seu peso.
Depois de perceber que parecia resistente, Cachinhos Dourados se
deitou debaixo das cobertas e se acomodou.
− Esta cama é simplesmente perfeita… − concluiu a garotinha,
bocejando.
No instante em que fechou os olhos, Cachinhos Dourados caiu
num sono profundo.
Logo a família de ursos voltou para casa após a caminhada na
floresta. Os ursos estavam contentes até perceberem que a porta da
casa estava escancarada.
− Que estranho. Não me lembro de deixar a porta aberta − disse
a Mamãe Urso.
− Deve ter algum invasor! − grunhiu o Papai Urso.
Os ursos entraram apressadamente na casa para encontrar o
intruso. Eles procuraram primeiro na cozinha, mas não acharam
nada de anormal além da tigela vazia de mingau.
− Alguém comeu meu café da manhã! − disse o Bebê Urso.
Os três ursos olharam a sala de estar em seguida, e tudo que
encontraram foi a cadeira quebrada.
− Alguém quebrou minha cadeira! − disse o Bebê Urso,
fungando.
Faltava apenas um lugar para procurar. Com as patas erguidas,
Papai Urso foi o primeiro a entrar no quarto, seguido pela família,
que não sabia o que ou quem encontraria.
− Tem alguém dormindo na minha cama! − exclamou o Bebê
Urso. − E é uma garota!
Os ursos ficaram surpresos ao perceber que uma pequena
garotinha era a responsável por tamanha bagunça. Eles se reuniram
ao redor da cama e encararam a criança adormecida. Ao sentir que
estava sendo observada, Cachinhos Dourados acordou e viu os
ursos ao seu redor. Ela soltou um grito tão agudo que os três
precisaram cobrir as orelhas.
Cachinhos Dourados saiu correndo do quarto, passou pela sala
e pela cozinha e saiu pela porta o mais rápido possível. Os três
ursos perseguiram a garotinha pela floresta até terem certeza de
que ela nunca mais voltaria para a casa deles.
A garotinha aprendera lições valiosas da maneira mais difícil. Ela
nunca mais comeu o mingau dos outros, nem se sentou na cadeira
dos outros, tampouco dormiu na cama dos outros nem entrou na
casa dos outros sem permissão.

Fim
Eraviúva
uma vez uma pobre viúva que tinha um filho chamado João. A
era uma boa mulher, mas ela se tornara triste e ranzinza
depois de uma vida difícil. João era um garoto curioso e audacioso.
Ele sempre tivera a cabeça nas nuvens, sonhando com uma vida
cheia de aventuras e emoções.
Eles moravam em um minúsculo casebre, em uma pequena
fazenda em que nada brotava. A única coisa que tinham para se
alimentar era o leite de uma vaca que chamavam de Branquinha. Um
dia, o leite da vaca secou, então a mãe de João mandou o garoto ir
até a cidade e vendê-la.
− Mamãe, não podemos vender a Branquinha! − disse João. −
Ela é como família para nós!
− Não teremos uma família se morrermos de fome − disse a mãe.
− A vida é cheia de escolhas difíceis, João. Às vezes precisamos
fazer coisas de que não gostamos para sobreviver, mas no fim elas
nos ajudam a amadurecer. Agora leve a vaca até o vilarejo, venda-a
por um bom preço e pegue um pedaço de pão no caminho de volta.
João obedeceu, mas com um aperto no coração. Ele levou
Branquinha pelo bosque na direção do vilarejo mais próximo, mas
parou ao encontrar um senhor.
− Boa tarde, menino − disse o homem.
Ele era um velhote estranho, de barba longa e roupas
esfarrapadas.
− Boa tarde, senhor − respondeu João.
− Posso perguntar para onde está levando este belo animal? −
questionou o senhor.
− Vou levá-la até o vilarejo para vendê-la − retrucou João.
− Meu garoto, hoje é seu dia de sorte! − disse o senhor. − Por
acaso eu estou querendo comprar uma vaca.
− Quer comprar a Branquinha? − perguntou João.
− Temo não ter nem um tostão, mas ficaria muito contente em
propor uma troca − disse o senhor.
− Não sei se minha mãe aprovaria uma troca. Ela disse que devo
vender a vaca e levar um pedaço de pão para o jantar.
− Meu garoto, o que eu ofereço em troca vale mais do que todos
os pães do reino! − disse o senhor.
O comerciante tinha despertado o interesse de João, mas o
garoto ainda não estava seguro de que sua mãe aprovaria o acordo.
− O que você tem para trocar? − perguntou João.
O senhor colocou a mão no casaco esfarrapado e tirou dele um
punhado de feijões.
− Feijões? − perguntou João. − Com certeza a minha vaca vale
mais do que feijões.
− Mas não são feijões comuns − disse o senhor com os olhos
brilhando. − São feijões mágicos! Eles realizam o maior desejo do
seu coração.
João arregalou os olhos e imaginou as possibilidades que os
feijões poderiam lhe trazer.
− Tem certeza de que eles são mágicos? − perguntou João.
− Juro por tudo que é mais sagrado! − garantiu o senhor. − E
cruzou os dois indicadores em xis em frente aos lábios e os beijou.
João pegou os feijões das mãos do senhor e entregou-lhe as
rédeas de Branquinha. Ele estava tão animado que foi correndo para
casa, sem nem mesmo se despedir do comerciante.
− Mãe! Mãe! − exclamou João ao chegar em casa. − Troquei a
Branquinha por feijões mágicos! O homem no bosque disse que eles
vão realizar o maior desejo do meu coração!
Ele despejou alegremente os feijões nas mãos abertas da mãe.
Ela deu uma olhada nos grãos e seu rosto ficou vermelho.
− Garoto burro! − disse a mãe. − Você foi enganado! Estes feijões
não têm nada de mágico! Agora é que vamos passar fome mesmo!
Zangada, a viúva arremessou os feijões pela janela e caiu em
prantos. Trancou-se em seu quarto e passou a noite inteira chorando
pela tolice do filho. João também foi dormir furioso consigo mesmo.
Ele não conseguia acreditar que havia sido enganado tão facilmente.
Tinha tanta esperança de ter uma vida melhor que deixou que isso
atrapalhasse o seu bom senso.
Na manhã seguinte, João acordou com um grito terrível. Ele
saltou da cama e encontrou a mãe em pânico do lado de fora da
casa.
− Veja, João! − exclamou ela, e apontou para o céu. − Enquanto
a gente dormia, cresceu um pé de feijão!
Do chão saía um gigantesco pé de feijão. Era tão alto que se
estendia até o céu e desaparecia acima das nuvens.
− Os feijões! Eles devem ter crescido depois que você os atirou
pela janela! − gritou João triunfantemente. − Eles eram mesmo
mágicos!
− Agora me ajude a pegar algumas folhas, quero preparar um
belo cozido de feijão − disse a viúva.
João ignorou o pedido da mãe e começou imediatamente a
escalar o pé de feijão.
− João, desça! − ordenou a viúva. − Você vai se machucar!
João ignorou-a novamente. Era inevitável; aquilo era a coisa mais
empolgante que tinha acontecido na vida dele. Passara anos
esperando encontrar alguma aventura, e agora uma aventura o
encontrara.
Quanto mais subia, melhor ficava a vista do terreno ao seu redor.
Ele subiu tanto que conseguia avistar o reino inteiro − e até mesmo
os reinos além. Quando alcançou as nuvens, estava tão alto que sua
casa era apenas um ponto minúsculo lá embaixo e o garoto já não
conseguia escutar os gritos de sua mãe implorando para que
descesse. João acariciou as nuvens e ficou contente ao descobrir
que elas eram tão macias e fofas quanto sempre imaginara.
O pé de feijão atravessava as nuvens, e João continuou subindo.
Ele queria saber até onde o pé chegava. Subiu nas nuvens e chegou
num mundo que lhe parecia completamente diferente. Era um mar de
colinas brancas e fofas que se estendiam a seu redor até o
horizonte.
Para a surpresa de João, havia um caminho pavimentado
pairando acima das nuvens. Ele saltou do pé de feijão e seguiu a
rota sinuosa pelo abismo de nuvens. Enquanto percorria o trajeto,
João escutou uma bela voz cantando cada vez mais alto. Ele nunca
escutara um som tão bonito e queria descobrir sua origem.
Bem no fim do caminho, João encontrou um castelo gigantesco.
Era tão grande que a seu lado, o garoto parecia ter o tamanho de um
rato. Imaginou que deveria ser o lar de uma criatura imensa e, como
sempre fora mais curioso do que medroso, João se esgueirou pela
fresta debaixo da enorme porta de madeira para olhar o que havia lá
dentro.
O castelo tinha os maiores objetos que João já vira na vida. Os
móveis eram tão grandes que ele conseguia andar embaixo da mesa
e das cadeiras sem bater a cabeça. A lareira era tão enorme que sua
casa inteira caberia dentro dela.
Para onde quer que olhasse, havia pilhas de moedas de ouro do
tamanho de pires. João não era de maneira alguma um ladrão, mas
havia tanto ouro ali e ele e sua mãe tinham tão pouco que o garoto
imaginou que não haveria mal em levar algumas moedas para casa.
Então, encheu uma grande bolsa com a maior quantidade de ouro
que cabia dentro dela e a jogou por cima do ombro.
Quando estava prestes a sair do castelo, escutou a bela voz
cantando mais uma vez, e João podia jurar ter visto uma mulher
dourada em cima da imensa mesa. Mais uma vez, sua curiosidade
falou mais alto, e o garoto se aproximou para olhar melhor.
Ele escalou a perna da cadeira, subiu no assento e então se
ergueu até o topo da mesa. Não era uma mulher dourada, mas uma
harpa mágica dourada, com braços e rosto. Ela cantava uma música
enquanto as cordas às suas costas tocavam magicamente.

Muitos anos precisei esperar; meu herói já está a tardar.


Cantei músicas de afeição, mas não recebi nenhuma proteção.
Será que meus salvadores já morreram? Será que eles se
esqueceram?
É um fardo resgatar, e só com uma coisa podemos contar:
As princesas não se favorecem quando seus príncipes não se
comprometem.
Algumas damas em apuros vão permanecer, pois interesse não
vai haver.

A harpa arfou ao ver João se aproximando.


− Uma pessoa! − disse ela. − Ah, graças aos céus! Finalmente
alguém veio me resgatar do gigante!
− Que gigante? − perguntou João.
− O gigante que mora neste castelo, é claro − respondeu a harpa.
− É uma criatura terrível e cruel! Ele me obriga a cantar músicas
horríveis para ele todos os dias! Por favor, me leve com você!
De repente, passos estrondosos soaram do alto, fazendo o
castelo inteiro estremecer.
− Ah, não − disse a harpa. − Ele acordou! Você precisa se
esconder, senão ele vai comê-lo vivo!
João desceu apressadamente da mesa e se escondeu no forno
do gigante. Poucos momentos depois, um gigante assustador
desceu a enorme escada ruidosamente. Ele era tão grande que o
imenso castelo parecia pequeno demais para ele.
− Fá-fi-fo-fum, estou sentindo o cheiro de sangue de um
jovenzinho − grunhiu o gigante. − Não importa se vou pegá-lo com
vida ou não, seus ossos vou moer para fazer meu pão!
O gigante procurou João por todo o castelo. Ele olhou em todos
os armários e gavetas, mas não pensou em verificar o forno. Depois
de um tempo, cansou da busca e se sentou à mesa.
− Cante uma música para mim! − ordenou o gigante.
A harpa começou uma música, e João percebeu que ela não
queria cantar.

Maldade! Maldade! Maldade na cidade!


Por seus pés cada casa será destruída!
Maldade! Maldade! Maldade na cidade!
Promova o terror e roube toda a sua comida!

Conforme a harpa cantava, as pálpebras do gigante se fechavam.


Ele apoiou a cabeça na mesa e adormeceu. Seus roncos pareciam o
grunhido de cem ursos. João saiu do forno e disparou em direção à
porta, com sua bolsa cheia de moedas de ouro.
− Por favor, não me abandone! − implorou a harpa em desespero.
− Não aguento viver mais um dia neste castelo!
João hesitou ao pensar em resgatar a harpa, mas não seria muito
cortês abandoná-la ali. Ele escalou novamente a perna da cadeira e
foi silenciosamente até a mesa.
O vento que saía das narinas do gigante era tão forte que João
quase foi derrubado. Os olhos do gigante começaram a se abrir,
então a harpa voltou a cantar, para que ele relaxasse e pegasse
novamente no sono.

Maldade! Maldade! Maldade na cidade!


Sob suas botas cada fazenda será arrasada!
Maldade! Maldade! Maldade na cidade!
Coma os cavalos, até que reste só sua gargalhada

João ergueu a harpa e a carregou até a extremidade da mesa.


Eles estavam bem debaixo do nariz do gigante quando ele inspirou
profundamente e sentiu o cheiro de João. Então seu nariz se
contorceu e o gigante acordou.
− Fá-fi-fo-fum, estou sentindo o cheiro de sangue de um
JOVENZINHO! − rugiu o gigante.
Ele rugiu de novo ao ver que João estava tentando resgatar sua
harpa.
João saltou da mesa com a harpa nos braços e aterrissou no pé
do gigante.
− AAAAHHHH! − gritou o gigante, segurando os dedos
machucados e saltando pelo castelo num pé só.
João continuou segurando a harpa num braço e agarrou a bolsa
de moedas com o outro. Ele correu até a porta com a maior rapidez
que suas pernas permitiam, engatinhou por debaixo da porta e saiu
em disparada pelo caminho pavimentado até o pé de feijão.
Bem na hora em que João chegou ao pé de feijão, o gigante saiu
do castelo e correu atrás dele. João desceu pelo pé de feijão
apressadamente, mas o gigante o seguiu, sacudindo a planta entre
as nuvens.
Lá de baixo, a mãe de João escutou a confusão e saiu correndo
de casa para ver o que estava acontecendo. Ela ficou tão assustada
ao ver o filho sendo perseguido por um gigante que precisou de
alguns momentos para encontrar a voz.
− João! Em que você se meteu? − gritou ela para o filho.
− Mãe, pegue o machado para mim! Preciso cortar o pé de feijão
antes que o gigante chegue ao chão! − disse João.
A viúva correu para dentro de casa e voltou com o machado.
João chegou ao chão e tomou o machado das mãos da mãe. Com
um único e vigoroso movimento, João partiu em dois o pé de feijão,
que balançou e caiu com o gigante, que morreu na queda.
− João, sabe quão preocupada eu estava com você? − gritou a
viúva.
− Desculpe por ter deixado você assim, mãe − disse João. − Mas
prometo que nunca mais vai precisar se preocupar. Veja só o que eu
trouxe para casa!
João esvaziou a bolsa com as moedas de ouro que ele juntara no
castelo do gigante e mostrou-as para a mãe. A viúva ficou tão feliz
que seus olhos se encheram de lágrimas. Ela abraçou o filho e beijou
sua bochecha.
− Meu menino corajoso! − disse ela. − Você nos salvou! Nunca
mais vamos passar fome!
João e a viúva usaram as moedas para construir uma casa nova
e uma fazenda em que a colheita era tão farta que eles nem sabiam
o que fazer com tudo aquilo. Comiam três refeições por dia, e a
harpa cantava belas canções todas as noites antes de dormirem.
A promessa do senhor era mesmo verdadeira: os feijões mágicos
realizaram os maiores desejos do coração de João. Porém, a
verdadeira mágica estava dentro de João. Se ele não tivesse tanta
certeza do que queria da vida, os feijões não teriam sabido o que
fazer.
A história de João ensina uma grande lição para todos que a
escutam: quando a vida lhe der feijões, cultive um pé de feijão!
Fim
Eraàs uma vez uma garotinha que morava com os pais num vilarejo
margens de um bosque. Ela era conhecida como
Chapeuzinho Vermelho por causa do manto escarlate que usava
sobre os ombros. O manto tinha sido um presente de sua vovó, que
ela amava muito.
Um dia, a mãe de Chapeuzinho recebeu uma carta da avó da
garotinha. A querida velhinha estava sofrendo de um terrível
resfriado e não conseguia sair de casa, que ficava um pouco mais
para o interior do bosque. A mãe de Chapeuzinho montou uma
cesta de guloseimas e pediu para a garota seguir o caminho até a
casa da avó para entregá-la.
− Tome cuidado no bosque, Chapeuzinho − disse sua mãe. −
Não saia do caminho, não perca tempo e jamais fale com estranhos.
Chapeuzinho pegou a cesta e foi saltitando pelo caminho que
levava até a casa de sua vovó, tentando seguir as instruções de sua
mãe. No entanto, a garota estava no bosque havia apenas alguns
instantes quando se distraiu com um campo de flores silvestres.
− Puxa, que flores mais lindas! − disse Chapeuzinho. − Mamãe
certamente não vai se importar se eu fizer um buquê para a vovó.
Flores fazem as pessoas doentes se sentirem melhor.
Ela estava convencida de que uma rápida parada não faria mal
nenhum e se sentou no campo. Chapeuzinho escolheu as flores
mais lindas e criou para si mesma uma coroa de flores, um colar de
flores e duas pulseiras de flores. Quando terminou, não havia mais
nenhuma flor para fazer um buquê para sua vovó.
− Ah, que pena − disse Chapeuzinho. − Mas sei que, para a
vovó, me receber é como receber um buquê de flores.
Chapeuzinho voltou para a trilha, mas logo se distraiu
novamente. Dessa vez, um arbusto com mirtilos vibrantes chamou
sua atenção.
− Ah, essas frutinhas parecem deliciosas − disse Chapeuzinho. −
Mamãe certamente não vai se importar se eu colher algumas para a
vovó. Doces sempre animam as pessoas indispostas.
Então, Chapeuzinho parou para colher alguns mirtilos para sua
vovozinha. Ela provou um para garantir que estavam doces. E
provou um segundo, para garantir que o primeiro não tinha sido um
golpe de sorte. O terceiro e o quarto mirtilos foram apenas uma
pequena recompensa que ela deu a si mesma por ser tão prestativa.
Os mirtilos estavam tão deliciosos que Chapeuzinho não
conseguia parar de comê-los. Quando lembrou que queria pegar
alguns para sua vovó, a garota já tinha comido todos.
− Ah, que pena − disse Chapeuzinho. − Mas sei que, para a
vovó, minha companhia é doce como um punhado de frutinhas.
Chapeuzinho não queria perder mais tempo, então decidiu não
sair mais do caminho até chegar à casa da vovó. Quando estava
mais ou menos no meio do trajeto, Chapeuzinho levou um grande
susto. Um lobo preto e selvagem, de orelhas grandes e dentes
afiados, estava parado na sua frente.
− Oi, garotinha − rugiu o lobo.
− Oi − respondeu Chapeuzinho, sem querer ser mal-educada,
mas logo cobriu a boca. − Xi… prometi para minha mãe que não
falaria com estranhos.
− Ah, mas eu não sou um estranho − disse o lobo, sorrindo. −
Estou observando você desde o instante em que entrou no bosque.
Vi quando pegou as flores no campo e quando comeu todos os
mirtilos no arbusto. Então, está vendo? Já nos conhecemos muito
bem.
Chapeuzinho sorriu.
− Ah, que alívio − disse ela. − Estava com medo de ter
desobedecido minha mãe.
− O que a traz até o bosque, garotinha? − perguntou o lobo.
− Estou indo visitar minha vovó − disse Chapeuzinho. − Ela está
muito resfriada, então vou levar uma cesta de guloseimas para
alegrá-la.
− Que neta maravilhosa você é − disse o lobo. − Onde mora a
sua vovó?
− É só seguir por este caminho mais um pouco − disse
Chapeuzinho. − Na verdade, é melhor eu ir logo para conseguir
voltar para casa a tempo do jantar.
Chapeuzinho despediu-se do lobo e continuou sua jornada. Sem
que ela percebesse, o lobo saiu em disparada entre as árvores ao
lado da trilha e chegou à casa da vovó antes da garota. Graças às
indicações de Chapeuzinho, o lobo teria duas refeições hoje!
Ele encontrou a velhinha dormindo na cama e a devorou de uma
só vez. Quando Chapeuzinho chegou, o lobo estava deitado na
cama da vovó, vestindo as roupas da velhinha.
− Vovó, é a Chapeuzinho − disse a menina batendo à porta. −
Trouxe uma cesta de guloseimas para a senhora!
− Entre, minha filha − respondeu o lobo, fingindo ser a vovó de
Chapeuzinho.
Chapeuzinho imaginou que sua vovó devia estar mais doente do
que imaginara, pois sua voz estava quase irreconhecível. Ela foi
para o lado da cama da vovó e a observou melhor. Sua aparência
também estava quase irreconhecível.
− Puxa, que orelhas grandes você tem − disse Chapeuzinho.
− É para ouvi-la melhor, minha querida − respondeu o lobo.
− Puxa, que nariz grande você tem − disse Chapeuzinho.
− É para cheirá-la melhor, minha querida.
− Puxa, que dentes afiados você tem.
− É PARA DEVORÁ-LA MELHOR, MINHA QUERIDA!
O lobo saltou de debaixo das cobertas, e Chapeuzinho soltou um
berro. Com um único bote ele engoliu a garotinha, e ela se juntou à
sua vovó na barriga da criatura. Depois de comer duas refeições de
uma vez, o lobo estava tão cheio que mal conseguia se mexer. Ele
se deitou na cama para esperar a digestão da garotinha e da
senhora.
Para a sorte de Chapeuzinho e de sua vovó, um lenhador local
estava trabalhando no bosque ali perto e escutou o grito de
Chapeuzinho. Chegou à casa da vovó e viu que a porta da frente
ainda estava aberta, então entrou.
O lenhador se deparou com o lobo deitado na cama. Ele nunca
vira um animal com uma barriga tão grande e não demorou a
perceber o que tinha acontecido. Com uma única machadada, ele
matou o lobo e tirou Chapeuzinho e sua vovó da barriga da fera.
− Muito obrigada, senhor Lenhador − disse a vovó. −
Chapeuzinho, o que você deve dizer para esse homem tão gentil?
Chapeuzinho não disse nada − ela aprendera bem a lição sobre
falar com estranhos. A menina saiu correndo pela porta e pelo
caminho, até estar em segurança dentro de casa. Chapeuzinho
nunca mais desobedeceu à mãe e, assim, viveu feliz para sempre.

Fim
Eraqueuma vez, num reino frio e invernal, uma rainha jovem e bela
estava grávida pela primeira vez. Ela estava sentindo todo o
entusiasmo, toda a angústia e todo o medo que uma futura mãe
sente antes de o bebê nascer. Então, toda noite antes de dormir, a
rainha fazia tricô perto da janela para se acalmar.
Certa noite, enquanto admirava pela janela o terreno nevado ao
redor do castelo, a rainha acidentalmente furou o dedo com a agulha
de tricô. Três gotas de sangue pingaram na neve sob sua janela. Ao
olhar o sangue, a rainha foi tomada por uma sombria premonição:
seu bebê nasceria em três dias, mas ela morreria no parto.
De fato, três dias depois, a jovem rainha entrou em trabalho de
parto e deu à luz uma menina. Com a pouca força que lhe restava, a
rainha deu à princesa o nome de Branca de Neve e então morreu,
assim como previra.
Em vez de encarar seu luto, o rei logo se casou novamente para
se distrair. Sua nova esposa era uma mulher vaidosa e reservada.
Seu pertence mais precioso era um misterioso Espelho Mágico.
Todos os dias, a nova rainha parava na frente do espelho e dizia:
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
A silhueta de um homem aparecia no espelho e respondia:
− A sua beleza é encantadora de verdade. Não há no reino
ninguém mais bela do que Vossa Majestade.
Essa conversa deu à nova rainha a sua maior alegria, pois ela
sabia que o Espelho Mágico só dizia a verdade.
A esposa anterior do rei tinha sido tão amada que a nova rainha
não foi bem recebida no reino. Logo o castelo inteiro ficou sabendo
de sua vaidade e, depois, o reino todo. Com o passar do tempo, a
insatisfação da nova rainha com tudo relacionado à sua aparência se
tornou mais e mais evidente, e as pessoas começaram a chamá-la
de Rainha Má.
Para a tristeza do reino, a saúde do rei começou a se deteriorar
rapidamente. Depois de anos reprimindo o luto pela falecida esposa,
o coração do rei estava envenenado pelo sofrimento, e ele morreu.
Branca de Neve cresceu como uma princesa órfã e se tornou
uma bela jovem de pele branca como a neve, lábios vermelhos como
o sangue e cabelos negros como o ébano. A jovem princesa se
parecia com sua falecida mãe e era amada por todos no reino. Eles
ansiavam pelo dia em que ela tomaria o trono de sua madrasta.
A beleza crescente da enteada começou a preocupar a Rainha
Má. Seu ressentimento alcançou novos níveis no dia em que ela
parou diante do Espelho Mágico e perguntou:
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
O homem dentro do espelho apareceu e respondeu:
− Sua beleza é encantadora e inegável, mas a beleza de Branca
de Neve é insuperável.
A Rainha Má achava que era impossível sua beleza ser
superada. Enfurecida de inveja, ela convocou seu Caçador mais leal
imediatamente.
− Ordeno que leve a princesa para o bosque e a mate − disse a
Rainha Má.
− Mas, Sua Majestade, não posso fazer isso − respondeu o
Caçador.
Até ele tinha se encantado com o charme de Branca de Neve.
− Vai fazer o que estou ordenando, ou você também morrerá −
disse a Rainha Má. − E, quando terminar, quero que traga o coração
dela numa bandeja para que eu saiba que está tudo feito.
Temendo a própria execução, o Caçador foi obrigado a acatar as
ordens da rainha. Na manhã seguinte, levou a jovem princesa até o
coração da floresta para matá-la, assim como a rainha ordenara.
Quando ele ergueu o punhal, a jovem princesa caiu de joelhos.
− Por favor, Caçador, não me mate − implorou ela.
− Não sou eu que quero lhe causar mal, princesa, e sim a rainha
− explicou o Caçador. − Ela sente uma inveja mortal de você, e só
vai parar quando tiver o seu coração numa bandeja!
− Se me deixar viver, eu corro pela floresta e não volto nunca
mais! − prometeu Branca de Neve.
O Caçador presumiu que Branca de Neve provavelmente
morreria sozinha na floresta, então deixou a jovem partir. A princesa
saiu correndo entre as árvores, sem jamais olhar para trás.
O Caçador abateu um porco e entregou o coração do animal para
a Rainha Má. Enganada pelo coração falso, a rainha ficou felicíssima
por achar que a enteada tinha morrido. Ela ordenou que seus criados
cozinhassem o coração e o comeu no jantar. Depois, a rainha parou
em frente ao Espelho Mágico e perguntou:
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
Àquela altura, Branca de Neve já tinha saído havia bastante
tempo do domínio do Espelho Mágico, então ele não pôde vê-la
correndo pela floresta. Pela primeira vez em muito tempo, o espelho
respondeu:
− A sua beleza é encantadora de verdade. Não há no reino
ninguém mais bela do que Vossa Majestade.
A Rainha Má gargalhou de satisfação.
Branca de Neve correu mais e mais pela floresta. Correu até seus
pés sangrarem e se encherem de bolhas e ela não poder mais andar.
Desabou no chão e caiu em prantos, temendo que alguma criatura
selvagem a atacasse.
− Ó pai, onde quer que você esteja, por favor, me guie até um
local seguro − rezou Branca de Neve.
Ao olhar para cima, a princesa avistou uma pitoresca casinha no
meio das árvores. Era pequena, com portas e janelas minúsculas,
como se fosse para crianças. Branca de Neve entrou e descobriu
que todos os móveis também eram pequeninos.
− Que diferente − disse ela.
Branca de Neve explorou a pequenina casa e encontrou um
quarto com sete caminhas. A princesa estava tão cansada que
deitou atravessada por cima de todas elas sem hesitar e pegou no
sono imediatamente.
Ali não moravam sete crianças, e sim sete anões que
trabalhavam nas minas locais, mas a princesa não sabia disso. Eles
voltaram para casa naquela noite e encontraram a princesa
aconchegada em suas camas. Porém, ela estava tão linda dormindo
que nenhum dos anões se alarmou com sua presença.
− Que jovem encantadora − disse o anão mais velho.
De repente, Branca de Neve acordou e saltou da cama,
assustada ao ver os sete anões a seu redor.
− Por favor, perdoem a minha intrusão − desculpou-se Branca de
Neve. − Eu não tinha para onde ir e estava com medo de ficar
sozinha na floresta.
− Está tudo bem, garota − disse o anão mais novo. − O que você
está fazendo sozinha aqui no meio da floresta?
Branca de Neve contou para os anões que era uma princesa e
que morava no castelo do pai, do outro lado da floresta. Disse-lhes
que sua madrasta tinha inveja dela e que mandara o Caçador matá-
la. Após escutar a história, os anões viraram seus protetores.
− Você deveria morar com a gente, aqui é seguro − disse o mais
velho, e todos os seus seis irmãos concordaram. − Você está no
território dos anões, e é muito raro recebermos visitas de membros
da realeza.
Branca de Neve ficou comovida com a bondade dos anões. Ela
ficou com eles durante vários meses, e se tornaram uma família.
Eles tinham se esquecido completamente da Rainha Má, mas, para
azar de Branca de Neve, a madrasta não tinha se esquecido dela.
Àquela altura, o Espelho Mágico aumentara o seu conhecimento
sobre o mundo que refletia e, assim, descobriu o paradeiro de
Branca de Neve. Em certa noite, a Rainha Má parou diante do
espelho e perguntou:
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
E o espelho respondeu:
− Sua beleza é encantadora e inegável, mas a beleza de Branca
de Neve é insuperável.
A Rainha Má não conseguia acreditar no que estava ouvindo.
− Como isso é possível? − perguntou ela. − Eu recebi o coração
dela numa bandeja!
− O que você consumiu não foi o coração da princesa, e sim o de
um leitão. Branca de Neve mora numa casa como uma camponesa,
com anões que trabalham na mineração.
A Rainha Má foi tomada pela raiva. Ela imediatamente elaborou
outro plano para se livrar da enteada de uma vez por todas. Porém
agora, em vez de entregar a tarefa nas mãos de outra pessoa, a
própria Rainha Má daria cabo daquele assunto.
Na manhã seguinte, a rainha invejosa se vestiu como uma velha
pedinte e encheu uma cesta com os acessórios mais elegantes de
seu armário. Ela foi até a floresta e encontrou a casa dos anões. A
Rainha Má esperou os sete anões saírem para as minas e bateu à
porta.
− Olá, posso ajudá-la? − perguntou Branca de Neve ao abrir a
porta.
Ela ficou surpresa por ver outra pessoa naquela parte da floresta.
− Boa tarde, minha querida − disse a Rainha Má, fazendo uma
voz diferente da sua. − Sou uma velha comerciante e tenho muitas
coisas bonitas para vender, se você tiver interesse.
− Que tipo de coisas? − questionou Branca de Neve.
− Lenços e seda, rendas e espartilhos e muito mais − disse ela. −
Tudo que uma jovem como você adora.
− Eu queria poder comprar alguns de seus belos itens, mas
infelizmente não tenho nem uma moeda − disse Branca de Neve.
A princesa começou a fechar a porta, mas a Rainha Má a
bloqueou com o pé.
− Provar não custa nada − disse ela. − Por favor, eu insisto.
Ela abriu a cesta e mostrou para Branca de Neve todos os
acessórios coloridos que estavam dentro dela. A jovem ficou
encantada com as cores e os tecidos e não resistiu a deixar a
senhora entrar na casa.
A Rainha Má ajudou Branca de Neve a vestir um espartilho e o
amarrou nas suas costas. Ela o apertou mais e mais. Quando Branca
de Neve demonstrou dificuldade para respirar, a Rainha Má apertou-
o ainda mais. A moça ficou azul e caiu no chão como se estivesse
morta.
A Rainha Má soltou uma risada.
− Agora serei a mais bela outra vez!
Ela saiu da casa e voltou apressadamente para o castelo,
ansiosa para ouvir a confirmação do Espelho Mágico.
Pouco depois, os sete anões voltaram das minas e encontraram
Branca de Neve no chão. Eles imediatamente perceberam o
espartilho apertado, e então o mais velho deles o rasgou com sua
faca. Branca de Neve arfou e recobrou a consciência.
− Quem fez isso com você? − perguntou ele.
Branca de Neve contou para os anões sobre a velha comerciante
que vendia acessórios. Temendo que fosse a Rainha Má disfarçada,
os anões pediram que Branca de Neve nunca mais abrisse a porta
para aquela mulher.
Enquanto isso, a Rainha Má voltou para o castelo e parou diante
do seu Espelho Mágico:
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
Para o seu espanto, o espelho respondeu:
− Sua beleza é encantadora e inegável, mas a beleza de Branca
de Neve é insuperável.
− Não! − gritou a Rainha Má. − Eu esmaguei as costelas dela
com o espartilho e ainda assim ela está viva!
Furiosa, a rainha percebeu que precisaria se esforçar mais para
que Branca de Neve morresse de vez. Ela entrou numa câmara
secreta do castelo e elaborou seu próximo plano. A câmara era
repleta de caldeirões e poções e muitos outros itens usados para
bruxaria. Lá dentro, a Rainha Má pegou uma escova e a envenenou.
No dia seguinte, a Rainha Má se disfarçou como outra velhinha e
foi mais uma vez até a casa dos anões. Esperou que eles saíssem
para as minas e bateu à porta.
Pensando que era uma mulher completamente diferente da
anterior, Branca de Neve abriu a porta.
− Olá, posso ajudá-la? − perguntou ela.
− Olá, querida. Sou uma esteticista − disse a Rainha Má com
uma voz diferente da que tinha usado antes. − Estou vendendo
muitos truques e segredos de beleza que com certeza atrairão o
homem dos seus sonhos.
− Eu adoraria aprender o que você tem a me ensinar − disse
Branca de Neve. − Mas não tenho nem uma moeda sequer.
A Rainha Má passou os dedos pelas madeixas negras de Branca
de Neve.
− Um cabelo tão lindo como o seu não deve ficar descuidado −
disse ela. − Deixe eu escová-lo para você, não cobrarei nada por
isso!
Branca de Neve achou a oferta generosa demais para recusar,
então deixou a velhinha esteticista entrar na casa. A Rainha Má
penteou o cabelo de Branca de Neve com a escova envenenada e a
pressionou no couro cabeludo da princesa. Poucos instantes depois,
o veneno fez efeito e Branca de Neve caiu no chão como se
estivesse morta.
− Agora, eu serei a mais bela de novo!
A Rainha Má soltou uma risada e correu para o castelo antes que
os anões voltassem.
Quando os anões chegaram, eles encontraram Branca de Neve
caída no chão, assim como no dia anterior. O anão mais novo tirou a
escova do cabelo de Branca de Neve. Depois que o efeito do veneno
passou, a princesa acordou e se sentou.
− Quem fez isso com você? − perguntou o anão mais novo.
Branca de Neve contou para os anões sobre a velhinha
esteticista, mas garantiu que não era a mesma mulher do dia
anterior. Ficando ainda mais preocupados, os anões a fizeram
prometer que nunca mais abriria a porta para estranhos.
Depois de voltar para o castelo, a Rainha Má livrou-se do disfarce
triunfantemente e parou em frente ao Espelho Mágico.
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
O espelho respondeu:
− Sua beleza é encantadora e inegável, mas a beleza de Branca
de Neve é insuperável.
− Mas como? − gritou a Rainha Má. − Eu a envenenei com uma
escova e ainda assim ela está viva!
Furiosíssima, a rainha irrompeu novamente na câmara de
bruxaria e elaborou outro plano para matar a princesa. Ela fabricou
um veneno duas vezes mais forte do que o anterior e embebeu uma
maçã no líquido.
No dia seguinte, a Rainha Má disfarçou-se como uma terceira
velhinha, dessa vez uma vendedora de maçãs, e voltou para a casa
dos anões. Assim como das outras vezes, esperou que eles
deixassem a casa antes de bater à porta. Porém, ninguém abriu.
− Maçãs à venda! − gritou a Rainha Má para dentro da casa. −
Maçãs frescas e suculentas! O lanchinho perfeito para uma donzela!
Branca de Neve olhou a senhora pela janela.
− Não, obrigada − disse ela. − Não devo abrir a porta para quem
não conheço.
− Ah, claro, minha jovem − disse a Rainha Má. − Eu nunca
causaria nenhum mal a uma moça tão bonita como você. Por favor,
aceite esta maçã como um pedido de desculpas pelo incômodo.
Branca de Neve ficou encantada com a bondade da velhinha e
aceitou pela janela a maçã envenenada da Rainha Má. Branca de
Neve deu uma mordida na fruta e começou a engasgar. A princesa
caiu no chão, certamente morta.
Dessa vez, a Rainha Má esperou para garantir que Branca de
Neve não acordaria. Ela observou atentamente a princesa por horas,
mas não vislumbrou um único movimento. Tinha certeza de que a
enteada estava morta.
− Agora serei a mais bela para sempre! − comemorou, rindo, a
Rainha Má.
Ela voltou apressadamente para o castelo, pouco antes de os
anões voltarem das minas. A Rainha Má parou em frente ao Espelho
Mágico e perguntou:
− Espelho, espelho meu, existe no reino alguém mais bela do que
eu?
Para sua alegria, o espelho respondeu:
− A sua beleza é encantadora de verdade. Não há no reino
ninguém mais bela do que Vossa Majestade.
Finalmente sua enteada estava morta. A Rainha Má comemorou
sozinha até altas horas da madrugada.
Os anões encontraram Branca de Neve no chão, ainda
segurando a maçã envenenada. Eles tentaram ressuscitá-la usando
todos os remédios que conheciam, mas a princesa não despertou.
Ao que tudo indicava, Branca de Neve estava realmente morta.
As semanas seguintes foram as mais tristes da vida dos sete
anões. Eles não tiveram coragem de enterrar a bela princesa, então
fizeram um caixão de vidro com joias das minas e o colocaram numa
colina ao lado da casa deles. Eles se revezavam para guardar o
caixão dia e noite.
Branca de Neve passou muito tempo no caixão, mas sua beleza
nunca desapareceu. Sua pele continuou branca como a neve, seus
lábios, vermelhos como o sangue e seu cabelo, preto como o ébano.
Para todos que a viam, ela parecia estar apenas dormindo.
Um dia, um belo príncipe de um reino vizinho estava passando
pela floresta. O grupo que o acompanhava decidiu parar e
descansar, e o rapaz encontrou o caixão na colina. O príncipe se
apaixonou pela princesa à primeira vista, pois ele nunca tinha visto
uma pessoa tão bonita em sua vida.
− Quem é esta donzela? − perguntou o príncipe para os anões.
Os anões contaram tudo sobre Branca de Neve para o príncipe −
que ela era filha de um rei e que tinha sido envenenada por sua
madrasta invejosa.
− Por favor, posso ficar com este caixão? − pediu o príncipe. −
Vou cuidar muito bem dela no meu palácio. Agora que vi sua beleza,
nunca mais quero ficar sem ela.
Os anões tiveram pena do jovem príncipe e deixaram que ele
levasse o caixão para seu reino. Contudo, quando o grupo estava
voltando para o palácio, a carroça que levava o caixão de Branca de
Neve passou por cima da raiz de uma árvore e o solavanco fez um
pequeno pedaço da maçã envenenada sair da boca de Branca de
Neve, e a princesa acordou. No final das contas, a maçã não matara
a princesa, mas ficara presa em sua garganta, fazendo-a entrar num
sono profundo.
− Onde estou? − perguntou Branca de Neve.
O príncipe ficou emocionado ao ver que a moça estava viva.
Contou que a encontrara na floresta e que os anões o deixaram levá-
la para que ele nunca mais ficasse sem ela. Branca de Neve também
se apaixonou à primeira vista pelo príncipe e aceitou se casar com
ele.
Com ajuda do exército do príncipe, Branca de Neve retornou para
seu castelo e tomou da cruel madrasta o trono que pertencia a seu
pai. A Rainha Má foi trancada numa masmorra sem nenhum espelho,
sendo obrigada a envelhecer sem o conforto de poder ver um reflexo
seu.
Os anões foram nomeados cavaleiros e receberam um convite
para morar no castelo. Branca de Neve tornou-se a rainha do reino
de sua família, ela e o príncipe se casaram e viveram felizes para
sempre.

Fim
Eraa mãe
uma vez três porquinhos. Como já não eram mais leitõezinhos,
deles decidiu que era hora de os filhos saírem do chiqueiro
e criarem os próprios lares. Então, ela preparou um saco de comida
para cada um e os mandou embora.
Pode parecer uma decisão cruel para uma mãe, mas o chiqueiro
estava tão lotado que os irmãos ficaram felizes em partir.
O Primeiro Porquinho construiu sua casa com palha. Ele achou
uma ideia sábia, pois a palha era fácil de carregar e montar. O
Porquinho demorou apenas um dia para terminar a casa de palha.
Era uma estrutura frágil, mas ele ficou orgulhoso de si mesmo por ter
terminado seu lar tão rapidamente.
O Segundo Porquinho construiu sua casa com gravetos. Os
gravetos não eram tão fáceis de carregar e de montar como a palha,
mas eram bem mais firmes. A casa de gravetos era muito mais
resistente do que a de palha de seu irmão, e ele demorou apenas
uma semana para construí-la, então o Segundo Porquinho achou
que tinha tomado uma decisão inteligente.
O Terceiro Porquinho construiu sua casa com tijolos, que eram
tão pesados que seus cascos só conseguiam carregar dois por vez,
mas o Terceiro Porquinho sabia que os tijolos deixariam sua casa
muito mais resistente do que palha ou gravetos.
Todo dia, quando caminhava até o oleiro, o Terceiro Porquinho
passava pelas casas dos irmãos, que o provocavam impiedosamente
por estar fazendo algo tão trabalhoso.
− Você jamais terminará a sua casa! − disse o Segundo
Porquinho.
− Seus braços vão cair de tanto carregar esses tijolos para cima e
para baixo! − zombou o Primeiro Porquinho.
Apesar dos comentários maldosos dos irmãos, o Terceiro
Porquinho sabia que estava fazendo a coisa certa.
− Vocês podem rir agora, mas esta região é cheia de criaturas
perigosas, e as casas de vocês não os protegerão delas − disse o
Terceiro Porquinho.
Depois de um mês extenuante, a casa de tijolos finalmente ficou
pronta.
Assim como o Terceiro Porquinho tinha previsto, logo o Lobo Mau
chegou à região em busca de sua próxima refeição. Ele se deparou
com as casas dos três Porquinhos e presumiu que eles seriam
presas fáceis. Então, o lobo foi até a casa de palha e bateu à porta.
− Porquinho, Porquinho, deixe-me entrar! − exclamou o lobo para
o porco lá dentro.
− Nem que a vaca tussa! − respondeu o Primeiro Porquinho.
− Então eu vou soprar e soprar, até sua casa voar!
O lobo respirou fundo e assoprou. A casa de palha foi pelos ares
e o lobo avançou e devorou o Primeiro Porquinho.
Quando sentiu fome novamente, o lobo foi até a casa de gravetos
e bateu à porta.
− Porquinho, Porquinho, deixe-me entrar!
− Nem que a vaca tussa! − respondeu o Segundo Porquinho.
− Então eu vou soprar e soprar, até sua casa voar!
Assim como da primeira vez, o lobo respirou fundo e assoprou a
casa de gravetos, que foi pelos ares. Ele foi para cima do Segundo
Porquinho e o devorou.
Pouco depois, o lobo recobrou o apetite e foi até a casa feita de
tijolos.
− Porquinho, Porquinho, deixe-me entrar!
− Nem que a vaca tussa! − respondeu o Terceiro Porquinho.
− Então eu vou soprar e soprar, até sua casa voar!
− Será um prazer vê-lo tentar − desafiou o Terceiro Porquinho,
rindo.
O lobo não gostava de ser zombado pela própria comida e ficou
muito zangado. Ele respirou fundo e assoprou na direção da casa.
No entanto, diferentemente das casas feitas de palha e de gravetos,
a casa de tijolos continuou inteira.
O lobo respirou ainda mais fundo e soprou ainda mais forte. A
casa de tijolos, porém, permaneceu intacta. O lobo tentou mais uma
vez, respirando o mais fundo possível e soprando com toda a sua
força. Mas, para sua infelicidade, a casa de tijolos continuou em pé.
Ele estava tão sem fôlego que caiu de joelhos, tossindo e ofegando.
− Eu vou entrar na sua casa e comê-lo, Porquinho, mesmo que
seja a última coisa que eu faça!
− Ah, não! − disse o Terceiro Porquinho. − Só espero que você
não entre pela porta dos fundos!
O lobo achou que o porco tinha sido tolo por lhe dar uma ideia tão
boa. Ele marchou até a parte de trás da casa de tijolos e abriu a
porta. Porém, esta não era uma entrada para a casa, e sim para um
cômodo onde o Terceiro Porquinho guardava sua lenha. As toras
caíram e soterraram o lobo.
O Terceiro Porquinho riu histericamente de dentro da casa ao ver
o lobo naquela situação. O lobo saiu de debaixo da pilha de lenha e
se levantou enfurecido.
− Pode rir quanto quiser, Porquinho − disse ele. − Vou descobrir
uma maneira de entrar nessa casa e comê-lo, assim como devorei
os seus irmãos!
− Ah, não! − exclamou o Terceiro Porquinho. − Só espero que
você não cave um buraco debaixo da casa!
O lobo sabia o que o porco estava fazendo e não seria enganado
de novo. Ele não iria por debaixo da casa, como o porco sugerira −
ele iria por cima, desceria pela chaminé!
O lobo pegou uma escada, subiu no telhado da casa de tijolos e
deslizou rapidamente pela chaminé antes que o porco conseguisse
escutá-lo.
− Aí vou eu! − grunhiu o lobo.
Porém, novamente o Terceiro Porquinho tinha sido mais esperto.
Sob a chaminé, uma grande panela de água fervente aguardava o
lobo, que caiu dentro dela e morreu.
O Terceiro Porquinho adicionou aipo e cenouras na panela e
preparou para si mesmo um delicioso cozido de lobo. Graças às
suas sábias decisões, o Terceiro Porquinho viveu uma vida longa e
feliz na casa de tijolos e permaneceu protegido de todos os outros
lobos que apareceram no seu caminho.

Fim
Erade uma vez uma jovem donzela que era a fiandeira mais talentosa
sua aldeia. Ela morava com o pai, que trabalhava como
moleiro. O pai tinha tanto orgulho da filha que só falava dela. Alguns
dos aldeões já tinham até se cansado de ouvi-lo se gabar da garota.
Uma noite, enquanto bebia com amigos numa taverna, o moleiro
falou sem parar sobre o talento da filha. Depois de ser servido de
bebida muitas vezes, o homem começou a fazer declarações
exageradas, as quais não faria se estivesse sóbrio.
− Minha filha é uma fiandeira tão brilhante que ela poderia
transformar feno em ouro! − disse ele.
Os outros homens na taverna riram e ergueram seus copos em
homenagem ao moleiro e à jovem. Apesar de toda aquela empáfia,
era encantador ver um pai que apoiava tanto a filha.
Porém, o que o moleiro nunca imaginara era que aqueles elogios
poderiam representar um risco para sua filha. Por azar, um dos
soldados reais também estava bebendo na taverna naquela noite. O
soldado, assim como o rei, não tinha senso de humor e, ao escutar
que a moça poderia transformar feno em ouro, levou aquela
afirmação muito a sério. Como o reino estava passando por sua pior
crise financeira desde a Idade das Trevas, o soldado achou que a
jovem fiandeira era a solução que eles estavam procurando.
Ele voltou correndo para o castelo e acordou o rei para lhe dar a
boa notícia.
− Majestade, aconteceu algo maravilhoso. Há uma moça na
aldeia que foi abençoada com o poder de fiar feno e transformá-lo
em ouro!
− Ela deve ser uma bruxa! − exclamou o rei. − Precisamos
prendê-la imediatamente e queimá-la na estaca!
− Na verdade, Vossa Majestade − falou o soldado −, acredito que
uma jovem como ela possa ser útil para o reino num momento como
este. Se ela transformar feno suficiente em ouro, nós nos tornaremos
a nação mais rica do mundo!
− Você tem toda a razão − disse o rei. − Ordeno que você
encontre essa fiandeira e a traga já para o castelo! Vamos fazê-la
trabalhar imediatamente!
O soldado organizou um pelotão, que avançou até a aldeia. Eles
bateram à porta do moleiro e capturaram sua filha, conduzindo-a até
o castelo, onde a trancaram numa torre em que havia apenas um
tear e uma pilha de feno.
A jovem não poderia estar mais assustada e confusa. O rei entrou
na torre, e ela se curvou diante dele e perguntou:
− Perdão, Majestade, mas o que está acontecendo?
− Ficamos sabendo de sua habilidade. Você deveria ser punida
por esconder de nós um dom como esse. Apesar disso, trouxemos
você até aqui para se redimir.
− Perdão, senhor, mas de que habilidade está falando?
− Você foi abençoada com o poder de fiar feno e transformá-lo
em ouro − respondeu-lhe o rei. − E agora você fará isso para mim.
− Majestade, acredito que cometeram um erro. Sou uma fiandeira
muito talentosa, mas eu certamente não consigo fiar feno e…
− Não minta para mim! Foi seu próprio pai quem falou isso! Você
vai transformar o feno que está nesta torre em ouro até o sol nascer
amanhã, caso contrário cortaremos sua cabeça.
O rei virou-se bruscamente e foi embora, deixando a donzela
trancada sozinha na torre. A fiandeira desabou no chão e chorou
histericamente. Era como se estivesse vivendo um pesadelo; ela
jamais conseguiria fazer o que o rei ordenara; aquilo era impossível.
Quando a fiandeira já estava quase certa de que perderia a
cabeça, um pequeno turbilhão surgiu ao redor da torre e um anão
apareceu magicamente.
− Olá, linda donzela − disse o anão. − Parece que você está em
apuros.
− Quem é você? − perguntou ela.
− A pergunta não é quem, mas o quê.
− Então o que você é?
− Eu posso ser a sua salvação − respondeu ele. − O rei espera
que você fie todo esse feno na torre para transformá-lo em ouro até o
nascer do sol, certo?
− Sim, mas ele está enganado − disse a fiandeira. − Eu nunca fiz
isso. Ele deve ter entendido errado o que meu pai disse. Amanhã,
quando o rei encontrar a torre cheia de feno, vão cortar minha
cabeça.
O anão esfregou as mãos alegremente.
− Para sua sorte, fiar feno para transformá-lo em ouro é uma das
minhas especialidades. Estou disposto a ajudá-la, se você quiser −
disse ele.
− Sim, claro! Eu ficaria muito grata!
− Mas eu não faço nada de graça − retrucou o anão. − Só fiarei o
feno se pudermos negociar algo em troca.
Ela não tinha muito a oferecer, mas negociaria qualquer coisa
para salvar a própria vida.
O anão fitou-a dos pés à cabeça e disse:
− Posso fiar esse feno em ouro em troca do seu anel.
− Mas o anel era da minha mãe… Eu jamais poderia me desfazer
dele.
− É o anel ou a sua cabeça… O que prefere?
A escolha foi fácil. A jovem prontamente tirou o anel do dedo e o
entregou para o anão, que bateu os pés no ar, saltitando
alegremente. Nada o deixava mais contente do que uma negociação.
Ele sentou-se na frente do tear e começou a trabalhar.
A donzela observou perplexa enquanto o anão fazia o impossível.
Em apenas algumas horas, todo o feno tinha sido transformado
numa pilha reluzente de ouro.
− Muito obrigada! − agradeceu a moça. − Você não me disse seu
nome.
Em vez de responder, o anão estalou os dedos e desapareceu da
torre. Assim que o sol nasceu, o rei chegou apressadamente ao
aposento para conferir o progresso de sua prisioneira. Ele olhou ao
redor, fascinado. Apesar de ele mesmo ter dado a ordem, ficou
impressionado ao constatar que ela realmente tinha sido cumprida.
− Fiei o feno para que virasse ouro, assim como o senhor
ordenou − disse a donzela. − Posso voltar para casa agora, por
favor?
O rei não respondeu. Os soldados seguraram a donzela e a
levaram até uma grande câmara no castelo. O aposento era quatro
vezes maior do que a torre, e nele havia apenas um tear e inúmeras
pilhas de feno.
− Agora você deve fiar todo esse feno em ouro até o nascer do
sol. Do contrário, cortarei sua cabeça − disse o rei.
Com as novas ordens dadas, ele e seus soldados deixaram a
câmara, trancando lá dentro a pobre fiandeira, que ficou devastada
de tristeza. Como ela transformaria todo aquele feno em ouro?
Aquilo seria um desafio, mesmo que ela possuísse tal capacidade.
Por sorte, novamente um turbilhão girou ao redor da câmara e o
anão mágico apareceu.
− Aconteceu de novo, pelo que estou vendo − disse ele, dando
uma piscadela.
− Você poderia me ajudar a transformar esse feno em ouro outra
vez? − implorou a moça. − Se não me ajudar, eu certamente perderei
a cabeça quando o sol nascer amanhã.
− Mas eu nunca faço nada de graça, especialmente se for algo
que já fiz antes. Ajudarei com prazer, se chegarmos a um acordo.
Mais uma vez, o anão a observou dos pés à cabeça e propôs:
− Posso fazer isso em troca do seu colar.
− Mas esse colar pertencia à minha avó. Eu jamais poderia abrir
mão dele.
− Vai ser difícil usar um colar sem ter a cabeça − observou o
anão.
− Tem razão…
Ela entregou-lhe o colar da avó, e o anão começou a trabalhar
para transformar o feno em ouro. No dia seguinte, quando o sol
começou a despontar, a câmara estava repleta de pilhas reluzentes
de ouro.
− Obrigada! − agradeceu a donzela. − Mas espere… ainda não
sei seu nome…
Em vez de responder, o anão balançou as orelhas e
desapareceu. Assim que o sol nasceu, o rei e seus soldados
irromperam na câmara; eles ficaram extasiados com o que viram.
− Transformei o feno em ouro, assim como o senhor pediu −
disse a fiandeira. − Agora pode me deixar voltar para casa, por
favor?
O rei não respondeu. Os soldados agarraram os braços da
donzela e a fizeram descer uma escadaria escura até a masmorra do
castelo, que estava abarrotada de feno do chão até o teto.
− Se você transformar esse feno em ouro até o nascer do sol,
nosso reino será o mais rico do mundo e eu a tornarei a minha rainha
− disse o rei. − Caso contrário, você perderá a cabeça.
O rei e seus soldados deixaram a masmorra, trancando lá dentro
a jovem, que foi tomada pelo pavor. A tarefa parecia impossível.
Mesmo que o anão aparecesse de novo, ele certamente não
conseguiria transformar todo aquele feno da masmorra em ouro
antes do amanhecer.
Mais uma vez, o turbilhão girou ao redor dela e o anão apareceu
na masmorra.
− Precisamos parar de nos encontrar assim − disse ele.
− Estou começando a achar que o rei simplesmente quer me ver
morta. Não há tempo suficiente para transformar todo esse feno em
ouro, mesmo para você!
− Ah, mas quanto melhor o negócio, mais rápido eu trabalho.
− Mas eu não tenho mais nada para dar − respondeu a donzela.
− Por ora − falou o anão, os olhos brilhando. − Mas se você me
der o seu primogênito, eu posso transformar todo esse feno em ouro
antes do amanhecer.
Aquela era a ideia mais imoral que ela já escutara. Se um dia
tivesse um filho, jamais o entregaria para o anão.
− Que coisa cruel de sugerir! − objetou ela.
− É o filho ou o machado do carrasco − disse o anão. − É pegar
ou largar.
A fiandeira estava tão cansada que não conseguia pensar direito.
Ela queria apenas que aquele pesadelo acabasse.
− Tudo bem… Se você fiar todo esse feno para transformá-lo em
ouro, eu lhe darei o meu primogênito − concordou ela.
O anão gargalhou freneticamente e deu estrelas pela masmorra.
Até o momento, aquele tinha sido o melhor negócio que já fizera. Ele
sentou-se atrás do tear e começou a fiar. Quanto mais trabalhava,
mais rápido fiava. Logo a masmorra inteira estava cheia de pilhas
reluzentes de ouro.
− Você salvou minha vida de novo! − disse a jovem. − E eu ainda
não sei seu nome.
Em vez de responder, ele franziu o nariz e desapareceu da
masmorra. O rei e seus soldados voltaram ao amanhecer e ficaram
chocados ao ver todo aquele ouro na masmorra. Nem mesmo o rei
acreditava que aquela tarefa fosse possível.
− Peço desculpas por ter ameaçado a sua vida, mas estávamos
desesperados com a nossa dívida! − exclamou o rei. − Mas agora,
graças a você, somos o reino mais rico do mundo! Por favor,
governe-o comigo como minha rainha.
Como as circunstâncias eram muito pitorescas, a jovem precisava
pensar a respeito: ou ela voltaria para um pai que quase provocara
sua morte, ou se casaria com um homem que quase ordenara sua
morte. Nas duas alternativas, seu futuro seria complicado. Porém, ao
comparar a vida de uma rainha com a vida da filha de um moleiro, a
escolha pareceu fácil.
Graças à nova fortuna do reino, o rei e a fiandeira tiveram um
extravagante casamento real. Ao tornar-se rainha, a donzela nunca
mais foi obrigada a fiar nada. Ela desfrutava tanto de sua nova vida
que se esqueceu completamente do anão mágico e de sua dívida
com ele.
Após um ano, a rainha engravidou, e o bebê seria o herdeiro do
trono. Ela deu à luz uma bela princesa, e o reino comemorou. Para a
infelicidade da rainha, o anão não se esquecera do acordo. Ele
voltou ao castelo, pronto para cobrar o que lhe era devido.
− A princesa é minha! − disse ele.
− Não! Você não pode levá-la! − retorquiu a rainha.
− Acordo é acordo! − disse o anão. − Você não seria rainha se
não fosse por mim! Agora, entregue-me a criança ou contarei ao rei
quem transformou todo aquele feno em ouro.
− Por favor, deve haver outra coisa que eu possa lhe oferecer.
Posso lhe dar mais dinheiro e joias do que você pode imaginar!
Posso lhe dar um terreno e um título! Posso transformá-lo em um
cavaleiro, um lorde ou um duque!
− Eu só estou interessado na criança. No entanto, se você
conseguir adivinhar o meu nome, permitirei que você fique com ela.
A rainha tentou todos os nomes que conhecia.
− É João, Miguel ou Guilherme? − perguntou ela.
− Não.
− Que tal Roberto, Haroldo ou Davi?
− Não chegou nem perto!
A rainha tentou todos os nomes, de Adão a Zacarias, mas
nenhum era o correto. O anão gritava em regozijo vendo o
sofrimento dela.
− Você jamais adivinhará! − disse ele. − Entregue-me a criança!
− Espere! Deixe-me ficar com ela pelo menos até o fim da
semana − implorou a rainha. − Só mais uma semana, então eu lhe
entrego minha filha.
O anão estava certo de que ela jamais adivinharia o nome dele e,
como adorava vê-la consternada, concordou com a semana a mais.
Assim que ele partiu, a rainha chamou seu guarda real.
− Sim, Majestade? − perguntou o guarda.
− Tenho uma tarefa muito importante para você, sobre a qual o rei
jamais deverá saber − instruiu ela. − Há um anão perigoso morando
no reino, e ele está tentando tomar a princesa. Quero que o encontre
e descubra seu nome. Se descobrirmos como ele se chama, a
princesa estará a salvo.
Durante todos os seus anos de trabalho no castelo, o guarda
nunca recebera uma tarefa tão esquisita. Ele passou a semana
inteira procurando o anão pelo reino, perguntando a todos, de jovens
a idosos, se eles conheciam alguém assim. Finalmente, lhe
indicaram o estranho bosque onde o anão morava. O guarda
encontrou o excêntrico homenzinho cantando e dançando ao redor
de uma grande fogueira.
− A rainha nunca vencerá o desafio, não adivinhará o nome
Rumpelstiltskin nem por desvario! − cantava o anão alegremente.
− Rumpelstiltskin − disse o guarda. − É isso! Esse é o nome dele!
O guarda voltou correndo até o castelo e contou à rainha o que
tinha visto e escutado no bosque. No fim da semana, o anão voltou
para o castelo, sorrindo de orelha a orelha, certo de que levaria a
jovem princesa consigo.
− Hoje é sua última chance, Vossa Majestade − disse ele.
A rainha sabia que não devia adivinhar de cara o nome do anão,
então disse os nomes mais ridículos que conseguia imaginar, para
que seu êxito parecesse o mais genuíno possível.
− É Piclento, Manteigoso ou Malhadinho?
− Não, não, não! − cantarolou o anão.
− É Abelhudo, Belelete ou Fofinho?
− Errado, errado, errado! − ele respondeu, rindo.
− E que tal Crostudo, Docinho de Coco ou Patonildo?
O anão deu uma gargalhada triunfal. Pelo andar da carruagem, já
podia cantar vitória.
− Você jamais vai conseguir acertar − disse ele. − Agora desista e
me entregue a princesa!
− Espere, dê-me uma última chance − pediu a rainha. − Só mais
uma tentativa, e a princesa será sua.
− Tá bom, tá bom, tá bom. Mais uma tentativa, e você me entrega
a criança.
− É Rumpelstiltskin? − perguntou a rainha.
O anão ficou boquiaberto. Ele não podia acreditar que a rainha
tinha acertado seu nome − ninguém jamais adivinhara seu nome. Ele
saltou de ódio pelo castelo e então desapareceu.
A rainha criou a filha em paz no castelo, e Rumpelstiltskin jamais
foi visto novamente.

Fim
Erapequena
uma vez um velho sapateiro que trabalhava e morava numa
loja numa minúscula aldeia. Ele era conhecido na cidade
como um homem generoso e bondoso; fazia questão de ajudar os
famintos e os necessitados que encontrava, acreditando com todo o
seu coração que eles passavam no seu caminho por algum motivo.
Depois de uma série de infortúnios, o sapateiro viu-se em um
momento de dificuldade. Ele tornara-se muito pobre e mal tinha
dinheiro para comprar comida para si e sua esposa. Tudo que tinha
era um pedaço de couro, o suficiente para fazer um último par de
sapatos.
Se não conseguisse vender os sapatos, ele e sua esposa
perderiam a loja e morariam na rua. Com o frio do inverno se
aproximando rapidamente, o sapateiro não sabia como
sobreviveriam.
Ele estava tão exausto de preocupação que decidiu ir dormir
cedo. Então cortou o couro em pedaços e os dispôs em sua mesa de
trabalho, planejando confeccionar os sapatos assim que acordasse.
No dia seguinte, o senhor acordou cedo, ansioso para começar a
fazer os sapatos. Para sua surpresa, um par de sapatos de couro
perfeitamente costurados o aguardava em sua mesa de trabalho;
alguém o confeccionara para ele!
O homem examinou os sapatos milimetricamente. Cada pedaço
de couro tinha sido costurado de maneira impecável. Eram bem
melhores do que os sapatos que ele fazia, talvez o par mais bonito
que ele vira na vida.
− Querida, venha ver isso! − ele gritou, chamando a esposa.
− Que belo par de sapatos você fez! − disse ela afetuosamente.
− Mas não fui eu que fiz. Deixei os pedaços de couro na mesa
ontem à noite, e, quando acordei hoje de manhã, eles estavam
prontos.
− Seu velho tolo! − A esposa beliscou a bochecha do sapateiro. −
Vai precisar se esforçar mais para me enganar.
Ele não insistiu no assunto; no lugar dela, ele provavelmente
também não acreditaria. Os sapatos eram tanto um milagre quanto
um mistério, e o bondoso senhor queria apenas saber para onde
direcionar sua gratidão.
Ele colocou os sapatos de couro na vitrine de sua loja, e eles
chamaram a atenção do primeiro homem que passou na frente dela.
O homem ficou tão fascinado pelos sapatos que entrou para
perguntar sobre eles.
− Como foi que fez sapatos tão bonitos? − perguntou o homem. −
Nunca vi uma costura tão bem-feita na minha vida!
− Quem me dera saber − respondeu o sapateiro, dando de
ombros.
− Admiro quem não revela os segredos de seu negócio. Pode
dizer o preço. Eu simplesmente preciso desses sapatos.
O homem deu ao sapateiro dinheiro suficiente para que ele
sobrevivesse por mais uma semana e comprasse couro para fazer
mais dois pares de sapatos.
Sem esperar que o milagre acontecesse outra vez, o sapateiro
cortou o couro em pedaços e começou a trabalhar neles. Suas
velhas mãos já não eram o que costumavam ser, e suas articulações
doíam por causa da artrite. Então o sapateiro foi dormir, planejando
voltar ao projeto pela manhã.
Mas, no dia seguinte, o sapateiro entrou na sua loja e descobriu
que mais um milagre misterioso acontecera enquanto dormia. Dois
pares de sapatos de couro impecavelmente costurados tinham sido
confeccionados.
− Querida, venha ver isso!
− Que belos pares de sapatos. São tão bonitos quanto o par que
você fez antes.
− É isso que estou tentando contar. Não fui eu quem fez esses
sapatos, e certamente não fui eu quem fez o par da noite anterior!
A esposa sabia quanto tempo o marido demorava para fazer um
único par de sapatos. Era improvável que ele conseguisse fazer um
par da noite para o dia, muito menos dois.
− Só porque você é um cachorro velho não quer dizer que não
possa aprender truques novos − convenceu-se ela. − Agora, pare de
me provocar com essa tolice, ou vou levá-lo ao médico.
− Vá por mim, se pudéssemos pagar um médico, eu já teria ido.
Ele colocou os sapatos na vitrine da loja, e os dois pares foram
vendidos por preços ainda melhores do que o do dia anterior. O
sapateiro tinha dinheiro suficiente para se alimentar por mais uma
semana e comprar couro para quatro pares de sapatos.
As coisas melhoraram tanto que o sapateiro estava começando a
se sentir culpado. Ele ainda não fazia ideia de quem ou o que o
ajudava.
Naquela noite, ele cortou o couro em pedaços para fazer quatro
pares de sapatos. Seu negócio estava indo tão bem que ele não
tinha pressa para finalizá-los, então foi se deitar assim que terminou
o jantar.
Era de esperar que, àquela altura, o sapateiro já tivesse se
acostumado, mas, na manhã seguinte, ele ficou igualmente surpreso
ao encontrar quatro pares de sapatos novos na sua mesa de
trabalho.
− Querida, venha ver isso! E dessa vez você vai ter que acreditar
em mim!
A esposa do sapateiro tinha ido se deitar muito mais tarde do que
o marido na noite anterior. Ela vira com os próprios olhos os pedaços
de couro na mesa e sabia que ele não podia ter feito os sapatos.
− Que bênção! − disse a esposa. − Quem poderia ter feito isso?
− Não sei, mas precisamos descobrir para que eu possa
agradecer.
Depois que os novos sapatos foram vendidos, o sapateiro
comprou couro suficiente para fazer oito pares de sapatos. Naquela
noite, ele cortou o couro em pedaços e os dispôs em sua mesa de
trabalho. Ele e a esposa se esconderam atrás da porta e esperaram
ansiosamente que a ajuda chegasse.
Eles esperaram e esperaram, mas nada aconteceu.
− Talvez hoje seja a noite de folga − sugeriu o sapateiro.
Naquele instante, os pedaços de couro começaram a se mover
sozinhos pela mesa. Era como se duas mãos invisíveis estivessem
costurando os sapatos.
− É um espírito! − sussurrou o sapateiro para a esposa.
− Não é um espírito, os sapatos estão sendo feitos por elfos! −
afirmou a esposa. − Sua vista não é mais como antes. Tome meus
óculos e veja com seus próprios olhos.
A esposa do sapateiro entregou seus óculos para o marido. Havia
dois elfos fazendo os sapatos na sua mesa de trabalho, e eles eram
tão pequeninos que ele não conseguia enxergá-los da porta sem os
óculos. Usando o corpo inteiro, cada elfo fazia o trabalho de uma
mão humana. E eles estavam completamente nus.
− Coitadinhos − disse a esposa do sapateiro. − Eles devem estar
congelando! Amanhã, vou costurar roupas para o dois como forma
de agradecimento.
No dia seguinte, os oito pares de sapatos de couro foram
vendidos ainda mais rapidamente do que os anteriores. O sapateiro
não precisaria se preocupar com pobreza por um bom tempo.
Naquela noite, em vez de pedaços de couro, a esposa do
sapateiro deixou sobre a mesa dois minúsculos chapéus, dois
cachecóis, duas calças, dois pares de meias e dois suéteres que ela
havia tricotado durante o dia. O sapateiro até fez dois pares de botas
minúsculas para os elfos calçarem.
O casal se escondeu novamente atrás da porta, esperando os
elfos chegarem. Quando eles apareceram na mesa de trabalho, o
sapateiro e sua esposa ficaram incrédulos. Contra todas as
expectativas, os elfos não vestiram as roupas. Em vez disso, eles
andaram ressabiados, pé ante pé ao redor das roupas, como se
estivessem com medo delas.
− Podem provar − disse o sapateiro. − Nós as fizemos para
vocês. Não temos como agradecer pelo tanto que nos ajudaram.
Os elfos se assustaram ao perceber que o sapateiro e sua
esposa os estavam observando.
− Então é um presente? − perguntou o primeiro elfo.
− Claro − disse a esposa do sapateiro. − Não conheço mais
ninguém em quem essas roupas serviriam.
− Mas dar uma peça de roupa para um elfo é lhe dar sua
liberdade − disse o segundo elfo. − Nós nunca mais precisaríamos
confeccionar outro par de sapatos para vocês.
O sapateiro e a esposa não faziam ideia de que aquele simples
gesto significava tanto, mas, como era a coisa certa a fazer, eles não
hesitaram.
− Vocês já fizeram muito por nós dois − disse o velho sapateiro. −
Será uma alegria conceder liberdade a vocês.
Os elfos começaram a soltar gritinhos estridentes em
comemoração. Eles tinham sido escravos da humanidade a vida
inteira e achavam que aquele dia nunca chegaria.
− Mas antes uma pergunta: por que vocês começaram a me
ajudar? − perguntou o sapateiro para os elfos.
− Nós pertencíamos a outro homem na aldeia, alguém que você
ajudou há muito tempo − disse o primeiro elfo. − Quando ele morreu,
pediu que cuidássemos de você.
− Puxa! − exclamou a esposa. − A bondade é recompensada,
mesmo que não imediatamente.
Os elfos vestiram suas novas roupas quentinhas e deixaram a
loja. O sapateiro e a esposa jamais os viram novamente.
Anos depois, o velho sapateiro passou por dificuldades mais uma
vez. Ele ficou sem dinheiro e temia que ele e a esposa fossem morar
na rua.
Apesar de suas mãos doerem muito pela artrite, o velho sapateiro
cortou os pedaços de couro para fazer um par de sapatos com o
resto de material que tinha. Era tudo que suas pobres mãos
conseguiriam fazer naquela noite, então ele foi se deitar cedo.
Quando o sapateiro acordou no dia seguinte, ele encontrou, como
um milagre, um par de sapatos perfeitamente costurados à sua
espera. Apesar de estarem livres, os elfos sentiam-se tão gratos pela
bondade do sapateiro e de sua esposa que voltavam para ajudá-lo
toda vez que ele precisava.
Os elfos desfrutaram de sua liberdade, cuidaram do casal, e o
sapateiro e a esposa viveram felizes para sempre.

Fim
Eraexportação.
uma vez um rico mercador, proprietário de uma empresa de
Apesar de ter sido abençoado com o sucesso, o
mercador não era tão bom nos negócios. Fizera muitos
investimentos terríveis ao longo dos anos e acabara se
arrependendo.
Ele morava num belíssimo palácio com suas três filhas. As duas
mais velhas tinham se acostumado ao estilo de vida privilegiado e
tornaram-se mimadas, esnobes e desagradáveis. Apesar de terem
tudo que queriam, as duas reclamavam sempre que podiam.
A filha mais nova, em compensação, tinha compaixão e elegância
por todas as três. Ela era a preferida do pai e muito mais bonita do
que suas irmãs, que se ressentiam dela por isso. Todos chamavam a
garota de Bela, pois ela era bela por dentro e por fora.
Numa fatídica noite, uma tempestade brutal destruiu três barcos
do mercador que navegavam de volta para casa. Os danos foram
catastróficos, e o mercador foi à falência. A família perdeu tudo e foi
obrigada a vender o palácio e se mudar para uma pequena fazenda
no interior.
Após perderem o lar luxuoso, as irmãs mais velhas ficaram tão
perturbadas que passaram a viver trancadas no quarto, chorando
sem parar. Bela e o pai faziam todo o trabalho da fazenda, para que
a família pudesse sobreviver.
Bela, no entanto, não se incomodava em trabalhar na fazenda.
Assim, ela ficava longe de suas terríveis irmãs e podia passar um
tempo ao ar livre com os animais.
Um dia, boas notícias chegaram à fazenda. Uma das
embarcações do mercador na verdade tinha sobrevivido à
tempestade e atracara em segurança no porto. O mercador celebrou
com as filhas, achando que seus dias de pobreza tinham chegado ao
fim.
Antes de sair para verificar a embarcação, ele lhes perguntou o
que queriam de presente para comemorar a fortuna recuperada.
− Eu quero um colar de diamantes! − pediu a irmã mais velha.
− Eu quero um par de brincos de pérolas! − pediu a irmã do meio.
Sem querer causar nenhum incômodo, Bela disse:
− Eu quero a rosa mais bonita que o senhor encontrar.
As irmãs riram daquele pedido simplório, mas o coração de seu
pai se alegrou.
O mercador pôs a sela em seu cavalo e partiu. Ele viajou por
vários dias até o porto, mas ao chegar lá descobriu que sua jornada
havia sido em vão. A carga de sua embarcação tinha sido tomada
para pagar as dívidas que ele negligenciara ao longo dos anos. Sua
família continuava pobre.
O mercador, então, rumou de volta para casa, arrasado pela triste
notícia que teria de dar para as filhas. Em seu desespero, deixou de
prestar atenção na estrada, perdendo-se em um enorme bosque.
Sem saber, acabou atravessando a fronteira de um reino havia muito
esquecido.
Uma chuva torrencial caía na floresta, e o mercador buscou um
lugar onde pudesse passar a noite. Ele procurou uma aldeia por
quilômetros, mas não havia nenhuma.
Algum tempo depois, o homem encontrou um enorme castelo
escondido na floresta. Ele não sabia que aquele lugar existia, mas
ficou feliz ao vê-lo, pois a tempestade estava cada vez pior. A
princípio, teve receio de o castelo estar abandonado, mas então viu
fumaça saindo de uma chaminé.
O mercador guardou o cavalo no estábulo e bateu à porta do
castelo. Como ninguém respondeu, ele bateu novamente.
− Por gentileza, poderiam abrigar um idoso dessa terrível
tempestade? − gritou ele à porta.
Para seu alívio, a porta se abriu e o mercador pôde entrar.
Curiosamente, ninguém o aguardava do lado de dentro. A porta
então se fechou com uma batida, como se tivesse sido aberta e
fechada por um fantasma.
− Olá? − chamou o mercador. − Tem alguém aqui?
Ele procurou algum residente pelo castelo, mas este parecia
vazio.
Era um lar encantador, com muitos cômodos espaçosos e
inúmeras obras de arte expostas. O mercador encontrou uma sala de
estar com uma lareira acesa, mas não havia vivalma no aposento, o
que o deixou ainda mais intrigado.
Na sala de jantar, o mercador viu que a mesa tinha sido posta
para uma pessoa e havia travessas de comida quente.
− Talvez todos tenham saído às pressas − conjecturou ele.
Como estava faminto e não queria que a comida fosse
desperdiçada, sentou-se à mesa e jantou. Depois de satisfeito, foi
vencido pelo cansaço e saiu em busca de um lugar onde dormir.
No andar de cima, o mercador encontrou uma câmara que estava
preparada para um hóspede, como se o castelo o estivesse
aguardando. Acomodou-se na cama quentinha e desfrutou de uma
boa noite de sono.
Na manhã seguinte, continuou sem encontrar o lorde ou a dama
daquele castelo, então deixou um bilhete expressando sua gratidão.
Ele pegou seu cavalo no estábulo e rumou para a saída. No
caminho, avistou um belo jardim na lateral do castelo, no qual
floresciam as rosas vermelhas mais lindas que ele já vira.
− Se eu levar uma rosa para Bela, talvez a minha viagem não
tenha sido uma completa perda de tempo − disse ele. − Vou
conseguir alegrar pelo menos uma das minhas filhas.
O mercador foi até o jardim e arrancou uma rosa do arbusto. De
repente, um rugido ensurdecedor estrondeou de dentro do castelo.
As portas se escancararam e uma criatura horrenda irrompeu na
direção do idoso.
A Fera, que tinha juba de leão, rosto de urso, chifres de bode e
garras de lobo, arrancou o mercador do cavalo e o arremessou no
chão.
− Eu fui generoso o bastante para lhe dar comida e abrigo por
uma noite, e você retribui roubando minhas flores! − berrou a Fera. −
Você não merece a minha bondade e pagará por isso!
− Perdão! − disse o mercador. − Eu sou muito grato a você! Eu
jamais pegaria uma rosa se soubesse que elas eram tão valiosas!
− Roubar lhe custará a sua vida! − berrou a Fera. − Você jamais
sairá deste castelo!
A Fera agarrou o homem pelo colarinho e o arrastou até o
castelo.
− Não, por favor, tenha compaixão! − disse o mercador. − Sou pai
de três jovens! Elas não sobreviverão sem mim! A rosa era apenas
um presente para a mais nova, Bela!
A Fera o soltou e falou:
− Você disse Bela? Por que ela é chamada de Bela?
− Porque ela tem o coração e o rosto de um anjo.
A Fera pensou por um instante no mercador e na filha dele.
− Pode voltar para suas filhas − disse a Fera. − Mas, em troca,
Bela deve ser mandada para morar no castelo.
− Não! − exclamou o mercador.
− Não me obedeça, e eu vou atrás de você e de todas as suas
filhas! − berrou a Fera. − Agora vá!
A Fera lançou o mercador sobre o lombo de seu cavalo e o
mandou embora. O homem estava muito preocupado em contar para
as filhas sobre o encontro com a Fera. Ele temia que a família
tivesse de se mudar para muito longe, onde a criatura jamais os
encontrasse.
Ao chegar em casa, as filhas mais velhas ficaram tão aborrecidas
pelo pai não ter trazido presentes que se trancaram no quarto e não
saíram mais. Já Bela percebeu o medo nos olhos do pai.
− Pai, o que está incomodando você? − perguntou Bela.
Ele lhe contou que as mercadorias da embarcação tinham sido
tomadas para cobrir suas dívidas e explicou que ficou tão atordoado
que se perdeu na floresta e encontrou o misterioso castelo. Então
contou à filha o que acontecera ao apanhar uma rosa para ela no
jardim da Fera.
− Fui eu quem pediu uma rosa, e sou eu quem deve pagar o
preço − disse Bela. − Vou morar com a Fera no castelo para poupar
você e minhas irmãs.
− De maneira alguma! − recusou o mercador. − Eu não
conseguiria viver comigo mesmo sabendo que você está morando
com aquela criatura! Amanhã, juntaremos nossas coisas e iremos
para longe daqui.
Bela sabia bem que era inútil discutir com o pai. Em vez de brigar
com ele, tratou de descobrir onde ficava o castelo da Fera e como
chegar lá. Na manhã seguinte, ao acordar, o mercador percebeu que
a filha tinha partido. Contra a vontade dele, a caçula fora morar no
castelo da Fera.
Bela percorreu o trajeto pela floresta e entrou no reino esquecido.
O castelo ficava tão embrenhado na floresta que ela duvidou que o
encontraria. Finalmente, acima da copa das árvores ao longe, ela
avistou as imensas torres do castelo.
Era uma visão assustadora. O castelo era muito maior do que
Bela imaginara. Ela não sabia o que esperar do terrível monstro que
a aguardava lá dentro.
Quando a jovem chegou, a Fera estava na entrada do castelo. A
criatura pareceu contente ao vê-la, e Bela não a achou tão
amedrontadora quanto seu pai dissera; na verdade, achou até que
parecia bondosa.
A beleza da moça era bem maior do que a Fera esperava,
deixando-a sem fôlego. A criatura ajoelhou-se, beijou a mão de Bela
e disse:
− Agora, este castelo é a sua casa. Espero que seja feliz aqui.
Então conduziu-a para dentro. Bela ficou boquiaberta. O castelo
era o lugar mais requintado que ela já vira. Lembrava o palácio que
sua família perdera, porém ainda mais imponente.
A Fera acompanhou a jovem até a sala de jantar, onde um
delicioso banquete os aguardava. Ao fim da refeição, a louça e a
prataria foram removidas magicamente da mesa, como se tivessem
sido levadas por criados invisíveis.
− O castelo é encantado e habitado pela alma daqueles que já
trabalharam aqui − explicou a Fera. − Desculpe se isso for
assustador, mas você se acostumará.
− Por que as almas ainda estão aqui? − perguntou Bela.
− Por causa de uma maldição − respondeu a criatura, e mudou
rapidamente de assunto. − Agora, vou lhe mostrar o seu quarto.
A Fera ofereceu o braço à jovem e a conduziu até o andar
superior por uma imponente escada. Uma câmara encantadora havia
sido preparada para Bela − até aquele momento, o monstro tinha
sido um anfitrião maravilhoso.
Com o tempo, Bela descobriu que a Fera não parecia em nada
com o ser cruel que ela imaginara. Ao contrário, quanto mais tempo
passava com seu anfitrião, mais gostava dele.
Todas as manhãs, eles faziam longas caminhadas pelo jardim e
conversavam. Todas as noites, sentavam na sala de estar e liam um
para o outro até a hora de dormir. Em ocasiões especiais, os criados
invisíveis tocavam instrumentos no salão, e Bela e a Fera dançavam.
Quanto mais tempo Bela passava no castelo encantado, mais
curiosa ficava sobre o passado da Fera. Havia retratos de um belo
jovem pendurados em muitas das paredes, e ela se perguntava
quem ele seria.
− Quem é o rapaz em todos os retratos? − perguntou Bela certa
noite, durante o jantar. − Ele morava no castelo?
− Sim, ele era o príncipe − respondeu a Fera. − Ele já não mora
aqui há muitos anos.
Bela, com medo de descobrir o que acontecera com o rapaz, não
perguntou mais nada. Não queria pensar que a Fera, a quem
considerava um amigo, pudesse ter machucado o príncipe de
alguma maneira.
A amizade dos dois aumentava, e Bela desconfiava que os
sentimentos da Fera por ela estavam se transformando em algo
muito maior. Sua suspeita revelou-se verdadeira na noite em que a
criatura entrou em seu aposento e sentou-se na beira de sua cama.
− Bela, quer casar comigo? − perguntou a Fera.
Bela, sabendo que sua resposta apenas magoaria a Fera, não
sabia o que dizer.
− Tenho muito apreço por você, mas não podemos nos casar −
respondeu ela.
A Fera assentiu e saiu do quarto. Eles continuaram suas rotinas
diárias, e a Fera não disse mais uma palavra sobre esse assunto por
semanas. Então, uma noite, assim como da outra vez, a criatura
entrou no quarto de Bela e sentou-se na beira de sua cama.
− Bela, quer casar comigo? − perguntou a Fera.
− Tenho muito apreço por você, mas não podemos nos casar.
− Você acha que algum dia eu a farei feliz?
− Eu gosto do tempo que passamos juntos, mas é muito difícil ser
feliz aqui − respondeu Bela. − Cada dia que passa, sinto mais
saudade da minha família. Eu faria tudo para vê-los novamente.
− E se houvesse uma maneira de você vê-los sem que eles a
vissem? Isso a deixaria feliz?
− Ah, sim, muitíssimo!
A Fera saiu do quarto e voltou com um pequeno espelho de mão.
Era um espelho mágico; quando Bela olhava para ele, via o pai e as
irmãs na fazenda. Àquela altura, suas irmãs tinham se casado, e seu
pai estava bem mais grisalho.
− Meu pai está bem mais velho − disse Bela. − Mas fico muito
contente por ver que todos estão bem.
A Fera ficou satisfeita por ter deixado Bela tão feliz. A jovem
olhava para o espelho toda vez que sentia falta da família, mas vê-
los só aumentava sua saudade. Ela queria muito falar com eles,
abraçá-los.
Um dia, Bela viu que o pai tinha ficado muito doente. As irmãs e
seus maridos praticamente não cuidavam dele, e a moça ficou
preocupada que o pai piorasse se ela não o ajudasse.
− Bela, por que você parece tão triste? − perguntou a Fera. − O
espelho não está funcionando mais?
− Meu pai está muito doente − disse Bela. − Eu faria qualquer
coisa para voltar para casa e cuidar dele.
A Fera sabia que se arrependeria do que estava prestes a dizer,
mas estava tão apaixonado por Bela que não conseguia vê-la triste.
− Se eu deixá-la voltar para casa, você promete que voltará para
mim depois?
− Ah, sim! Prometo voltar assim que meu pai melhorar!
A Fera removeu um anel de sua garra e o entregou a Bela.
− Este anel é mágico − disse. − Quando estiver pronta para voltar,
só precisa colocá-lo no dedo e girar o diamante três vezes e, assim,
retornará ao castelo.
Bela ficou tão grata que beijou a bochecha da Fera. Então saiu do
castelo, dirigindo-se apressadamente à fazenda. Ao chegar, seu pai
e suas irmãs não acreditaram no que estavam vendo. Eles achavam
que nunca mais a veriam − na verdade, suas irmãs torciam para
nunca mais vê-la.
− A Fera deixou que eu voltasse para casa para cuidar de você,
pai! − disse Bela.
− Aquele monstro deixou você voltar? − perguntou seu pai.
− Prometi que voltaria para o castelo depois que você
melhorasse. Ele não é tão ruim quanto parece. Na verdade, passei a
gostar muito dele.
Bela contou à família sobre sua vida com a Fera e sobre todas as
coisas divertidas que os dois faziam juntos. Ao descobrir que a filha
não estava levando uma vida de sofrimentos, o coração do mercador
se encheu de alívio, e sua saúde começou a melhorar
imediatamente.
As irmãs de Bela, no entanto, não ficaram nada felizes por ela. A
jovem parecia ter uma vida muito melhor com a Fera do que as duas
levavam com os respectivos maridos, o que as deixou cheias de
inveja. Então elas bolaram um plano para enfurecer a Fera e sabotar
a felicidade da irmã mais nova.
Quando o pai melhorou, Bela já ansiava por retornar ao castelo.
Sentia a falta da Fera muito mais do que imaginara e queria voltar
para as caminhadas no jardim, as leituras na sala de estar e as
danças no salão.
Porém, depois que o pai se recuperou, as irmãs insistiram para
que Bela ficasse na fazenda por mais uma semana. Ela havia
deixado claro que prometera à Fera que voltaria assim que o pai
estivesse saudável novamente, mas as irmãs foram tão insistentes
que Bela concordou em ficar por mais alguns dias.
O que Bela não sabia era que, naquele exato momento, a Fera
estava vendo tudo pelo espelho mágico. Ver Bela quebrar a
promessa partiu o coração da criatura, que soube então que Bela
jamais a amaria como ela a amava.
Quando enfim chegou o momento de deixar a fazenda, Bela
colocou o anel mágico no dedo e girou o diamante três vezes. Ela foi
transportada magicamente de volta para o castelo e suspirou
aliviada. Agora, sentia que o castelo parecia mais seu lar do que a
fazenda.
− Estou de volta! − anunciou Bela pelos corredores, mas não
encontrou a Fera em lugar nenhum. − Onde você está?
Bela passou diante de uma janela e soltou um berro. No jardim,
avistou a Fera, que jazia no chão sob uma roseira, inerte como uma
pedra, a pata cerrada sobre o peito. A Fera parecia ter morrido de
coração partido enquanto esperava a volta de sua amada.
A jovem disparou até o jardim e se jogou em cima da Fera,
apoiando a cabeça em seu peito, as lágrimas escorrendo pelo rosto.
− Por favor, não morra! Enquanto estava longe, percebi quanto
gosto de você! Eu o amo com todo o meu coração! Nada me deixaria
mais feliz do que me casar com você!
Uma rajada de vento os cercou repentinamente. Bela olhou para
cima, tentando entender o que estava acontecendo. Quando voltou a
olhar para baixo, viu que a Fera tinha desaparecido e um belo rapaz
tomara seu lugar.
− Bela, você voltou! − disse o homem.
Ela o reconheceu: era o príncipe dos retratos espalhados pelo
castelo.
− Você é o príncipe! − exclamou ela. − Mas onde está a Fera?
− Eu sou a Fera − disse o príncipe alegremente. − Muitos anos
atrás, uma Feiticeira má achou que eu era vaidoso demais e
precisava aprender uma lição. Ela me amaldiçoou, para que eu
adquirisse a forma de uma fera, e amaldiçoou as almas dos meus
criados, para que ficassem presas no castelo. A única maneira de
acabar com a maldição era ser amado por alguém de verdadeira
beleza!
Com o fim da maldição, as almas dos criados se libertaram. Bela
e o príncipe se casaram e se tornaram os governantes do reino
esquecido. O mercador juntou-se a eles no castelo, deixando para
trás as filhas egoístas, e todos viveram felizes para sempre.

Fim
Erafazenda.
uma vez um garotinho que morava com sua família em uma
Eles eram organizados, e cada membro da família
realizava determinadas tarefas para manter a propriedade
funcionando.
O pai do garotinho cuidava de todas as colheitas e as vendia na
aldeia local. A mãe cozinhava, limpava e se certificava de que todos
estivessem fazendo sua parte. Seus irmãos alimentavam as galinhas
e os porcos e limpavam chiqueiros e galinheiros. Suas irmãs
ordenhavam as vacas e as cabras e tomavam cuidado para distinguir
um leite do outro.
Por ser o mais novo da família, o garotinho recebeu a tarefa mais
simples da fazenda: todos os dias, levava o rebanho de ovelhas até
um campo próximo e cuidava dos animais enquanto eles pastavam.
À noite, quando sua mãe tocava o sino indicando a hora de jantar,
ele acompanhava as ovelhas de volta até o curral e, no dia seguinte,
fazia tudo novamente.
A tarefa era tão simples que o garotinho passava boa parte do dia
inquieto e entediado. Mesmo com sua imaginação fértil, era difícil se
manter entretido no campo.
Ele praticou equilibrar o chapéu de palha na ponta de seu cajado,
mas uma hora se cansou da brincadeira. Procurou formigueiros para
pisotear até todas as formigas saírem, mas logo enjoou disso
também. Fez construções com pedras, mas em pouco tempo as
pedras acabaram.
Uma tarde, depois de fazer tudo que conseguia imaginar para
passar o tempo, o menino decidiu pregar uma peça em sua família.
− Lobo! − gritou ele. − Tem um lobo no campo!
Seu pai e seus irmãos saíram correndo rapidamente da fazenda,
erguendo machados e forcados. Sua mãe e suas irmãs também
correram em seu auxílio, sacudindo rolos de massa e facas de
trinchar. Porém, quando eles chegaram ao campo, não havia lobo
nenhum.
O garotinho caiu na gargalhada.
− Enganei vocês! − riu ele. − Não tem nenhum lobo aqui! Deviam
ter visto a cara que fizeram!
Seus irmãos reviraram os olhos e voltaram para a fazenda. Seus
pais balançaram a cabeça e lhe lançaram um olhar de reprovação. O
garotinho pensou que devia ser o único na família que tinha senso de
humor.
No dia seguinte, o menino encontrava-se de novo no campo,
cuidando do rebanho de ovelhas, como de costume. Estava tão
entediado que não sabia mais o que fazer.
Ele praticou rodopiar o cajado, mas sempre acabava acertando a
própria cabeça. Deitou-se na grama e ficou observando o formato
das nuvens, mas naquele dia havia apenas uma ou duas nuvens no
céu. Tentou ensinar truques para as ovelhas, como rolar e se
fingirem de mortas, mas elas não estavam interessadas em
aprender.
Então ele foi ficando tão ansioso por alguma animação que
decidiu pregar outra peça na família.
− Lobo! − gritou ele. − Tem um lobo no campo!
Assim como no dia anterior, a família saiu correndo até o campo,
erguendo forcados, machados, rolos de massa e facas. Porém, antes
que eles chegassem ao campo, o garotinho caiu no chão, rolando de
tanto rir.
− Enganei vocês de novo!
Seus pais e seus irmãos estavam cansados daquilo. Até as
ovelhas ficaram irritadas, pois o garotinho as assustava toda vez que
gritava.
− Que bom que está contente, pois nós certamente não estamos!
− disse o pai. − Se nos assustar assim de novo, vai levar chicotadas.
O menino estava tão feliz consigo mesmo que riu até a hora do
jantar. Mas, para seu azar, no dia seguinte a travessura se virou
contra ele.
Como de costume, estava no campo observando as ovelhas. Ele
caminhava, procurando alguma coisa para fazer, quando viu, de
canto de olho, algo assustador. Na extremidade do campo, havia
uma alcateia de lobos enormes.
Eles tinham uma pelagem grossa e eriçada, garras longas e
dentes afiadíssimos. Suas bocas salivavam, e eles lambiam o beiço
ao observar o garoto e seu rebanho.
As ovelhas avistaram a alcateia e rapidamente dispararam pelo
campo, fugindo em debandada. O garotinho ficou completamente
sozinho, e os lobos começaram a cercá-lo. Seu medo era tamanho
que ficou paralisado e precisou de alguns momentos para conseguir
emitir algum barulho.
− Lobos! Tem lobos no campo!
Porém, sua família não veio.
− Lobos! − gritou ainda mais alto. − Tem lobos no campo! Uma
alcateia inteira!
Mesmo assim, ninguém da fazenda veio salvá-lo.
− LOBOS! − gritou o garotinho o mais alto possível. − Corram!
Antes que eles me devorem!
Os membros da família escutaram seus gritos, mas acharam que
ele estava apenas tentando enganá-los mais uma vez. Balançaram a
cabeça e seguiram realizando suas tarefas.
Os lobos atacaram o garoto e o devoraram. Seus familiares só
perceberam o que tinha acontecido mais tarde, quando ele não
voltou na hora do jantar, então foram até o campo para ver o que
estava acontecendo, mas tudo que restara da criança eram seu
cajado e seu chapéu de palha.
Naturalmente, a família e todos os aldeões que conheciam o
menino ficaram arrasados. Com a permissão da família, a aldeia
construiu um monumento no centro da cidade em homenagem ao
garotinho. Assim, as outras crianças da aldeia se lembrariam da
importância da honestidade e de ter uma reputação honrosa.
Até mesmo mentirinhas inofensivas podem causar grandes
problemas.

Fim
Erapodia
uma vez, numa terra longínqua, uma triste rainha que não
ter filhos. Apesar de ter todos os luxos imagináveis, o que
ela mais desejava era um filho entre os braços. Todas as noites,
chorava até dormir, sabendo que jamais seria mãe. O rei fazia de
tudo para deixar a esposa feliz, mas nada amenizava a angústia da
rainha.
Uma tarde, para se distrair daquela tristeza, a rainha saiu para
caminhar perto de um rio. Ela parou ao ver algo estranho: às
margens, havia um grande peixe se debatendo. Apesar de partido,
seu coração ainda era bondoso, então a rainha ajudou o pobre peixe
a voltar para a água. Para sua surpresa, o peixe colocou a cabeça
para fora da água e disse:
− Muito obrigado por me colocar de volta no rio. Eu saltei para
fora da água para escapar de um predador, mas, se não fosse você,
eu teria morrido sufocado.
− Puxa! Você sabe falar? − perguntou a rainha.
− Sim, sou um peixe mágico. Sou muito grato por você ter
salvado minha vida. Eu gostaria de agradecer-lhe concedendo um
desejo, se você permitir. Mas com certeza uma rainha tão bela
quanto você não precisa de muita coisa.
A princípio, a rainha achou que devia estar passando mal ou
sonhando. Ela jamais ouvira falar de peixes falantes na vida, muito
menos de um que poderia magicamente realizar desejos. Porém, por
desencargo de consciência, a triste rainha contou para o peixe o
maior desejo de seu coração:
− Desejo ter um bebê. Mas se um bebê for um desejo grande
demais para um peixe conceder, eu vou entender.
O peixe piscou os dois olhos para ela, e o desejo foi concedido.
− Daqui a nove meses, você será abençoada com um bebê −
disse ele, e saiu nadando para longe.
De fato, nove meses depois, a rainha deu à luz uma menininha.
Foi um milagre tão grande que o rei fez uma grande celebração de
boas-vindas para a filha e convidou todos do reino.
Houve desfiles e fogos, cantos e danças, fantasias e jogos.
Governantes de terras próximas e distantes vieram participar das
festividades. Fadas visitaram o castelo para presentear a princesa
bebê.
Uma fada abençoou a princesa com beleza. Outra fada a
abençoou com saúde. A princesa também foi abençoada com
talento, inteligência e graça. Enfim chegou a vez da bênção da
menor de todas as fadas. Ela voou até o berço e estendeu sua
varinha.
− Princesinha meiga, eu gostaria de a abençoar com…
Porém, antes de a fada menor terminar sua bênção, ela foi
interrompida. Uma Feiticeira má invadiu o castelo, deixando a
celebração em suspenso.
A Feiticeira era uma mulher terrível e cruel. Ela era a única
pessoa do reino que não havia sido convidada e, ao descobrir isso,
perdeu a cabeça de tanta raiva.
− Aqui não é o seu lugar! − gritou o rei. − Saia imediatamente!
− Sair? − disse a Feiticeira. − Eu não vim até aqui à toa. Eu
também tenho um presente para a bebê.
Todos os convidados arfaram, pois sabiam que o presente da
Feiticeira para a princesa seria muito desagradável.
− Por favor, não, eu imploro − disse a rainha. − Ela é nossa única
filha!
Porém, antes que a rainha conseguisse convencê-la do contrário,
a Feiticeira má já tinha começado. Em vez de abençoar a princesa
bebê, ela lançou-lhe uma terrível maldição.
− A criança realmente crescerá bonita, sábia e graciosa −
anunciou a Feiticeira. − Porém, daqui a dezesseis anos, ela furará o
dedo no fuso de uma roca e morrerá!
A Feiticeira riu histericamente e desapareceu numa nuvem densa
de fumaça. O rei e a rainha ficaram arrasados. Eles seguraram a
filha recém-nascida no colo e choraram. Tudo parecia perdido, até
que uma minúscula mão cutucou o ombro do rei.
− Majestade, eu ainda não abençoei a princesa − disse a menor
das fadas.
− Você consegue reverter a maldição? − perguntou o rei em
desespero.
A fadinha balançou negativamente a cabeça.
− A Feiticeira é poderosa demais para que eu consiga reverter a
maldição, mas talvez eu possa transformá-la em algo um pouco
menos sombrio.
A fadinha brandiu sua varinha sobre a bebê e fez o que podia
para alterar a maldição da Feiticeira.
− Daqui a dezesseis anos, a jovem não morrerá ao furar o dedo
no fuso de uma roca, mas cairá num sono profundo − disse ela. −
Um sono que só será interrompido pelo beijo do amor verdadeiro.
Ao saberem que a maldição não mataria sua filha mas que
somente a faria adormecer, o rei e a rainha puderam dormir mais
tranquilos naquela noite. Mesmo assim, eles fizeram de tudo para
impedir que a profecia se tornasse realidade. O rei ordenou que
todas as rocas do reino fossem destruídas imediatamente, então
todas elas foram reunidas pelos soldados, levadas até o pátio do
castelo e queimadas.
Conforme a princesa crescia, seus pais prestavam muita atenção
nela. A menina não podia sair do castelo, nem mesmo visitar certas
áreas dele. Porém, como ninguém nunca lhe contou sobre a
maldição, ela começou a ficar contrariada com os pais por serem tão
rigorosos.
Uma vida tão protegida fez com que a princesa se tornasse uma
criança curiosa e travessa. Todas as noites, depois que todos no
castelo estavam dormindo, ela costumava sair escondida de sua
cama e explorar as partes do castelo aonde não podia ir.
Na véspera do seu décimo sexto aniversário, enquanto seus pais
e os criados do castelo dormiam tranquilamente em suas camas, a
princesa saiu escondida do quarto e encontrou uma escada caracol
que jamais tinha visto. A escada levava à torre mais alta do castelo −
tão alta que ela só conseguiu chegar ao topo na manhã seguinte.
Para a infelicidade da princesa, ninguém nunca pensara em
conferir se havia uma roca naquela torre. E, como a maldição da
Feiticeira tinha previsto, uma roca esperava pela jovem lá dentro.
− Meu Deus, o que será isso? − indagou a princesa.
Como nunca tinha visto aquele objeto e não sabia o perigo que
representava para ela, começou a brincar com a roca. Pouco depois,
a princesa descobriu como funcionava e passou a usá-la com
destreza. Porém, assim que se sentiu mais à vontade com o artefato,
sua mão escorregou no fuso e a agulha furou seu dedo.
A jovem caiu imediatamente no sono mais profundo de sua vida.
A emenda à maldição funcionara! Porém, a maldição era muito mais
poderosa do que a fada imaginara. Não foi apenas a princesa que
adormeceu − o reino inteiro entrou num sono profundo junto com ela.
Os criados do castelo adormeceram em pé enquanto realizavam
suas tarefas matinais. Os jardineiros pegaram no sono enquanto
cuidavam das plantas nos jardins. Sapateiros, açougueiros, padeiros
e fazendeiros de todas as aldeias do reino também dormiram. Até
mesmo o rei e a rainha adormeceram em seus tronos.
As fadas voltaram para tomar conta do reino e acomodaram
melhor as pessoas que dormiam. Elas procuraram no mundo inteiro
por alguém para acabar com a maldição, mas nenhum dos
pretendentes que levaram ao castelo conseguiu acordar a princesa
com um beijo.
Para piorar a situação, a Feiticeira amaldiçoou o reino
novamente, dessa vez com videiras e espinheiros. As plantas
cresceram pelo terreno até praticamente escondê-lo, impedindo que
fosse notado por quem passasse pela região. Quanto mais o tempo
passava, mais as fadas iam perdendo as esperanças de que a
maldição fosse quebrada.
O reino dormiu por mais de cem anos. Sua existência
desapareceu da história e se tornou uma fábula. Algum tempo
depois, a fábula foi reduzida a um mito. Logo, até o mito foi
completamente esquecido. Bem, quase completamente.
No centésimo primeiro ano da maldição, um jovem e aventureiro
príncipe viajava pelo bosque quando se deparou com o reino
perdido.
− Que lugar estranho − disse ele.
Com a espada, o príncipe cortou as plantas que cobriam o reino e
encontrou uma estrada que passava entre as aldeias adormecidas.
Ele ficou surpreso com a quantidade de pessoas que viu dormindo
tranquilamente. Tocava seus ombros, cutucava seus braços e
estalava os dedos na frente de seus rostos, mas nada era capaz de
despertá-las.
− Este deve ser o Reino Adormecido! − exclamou o príncipe
animadamente. − Meu avô me contou sobre este lugar quando eu
era criança, mas achei que era apenas uma lenda.
Ele seguiu pela estrada até o castelo e começou a explorá-lo
ansiosamente. Todos os criados e soldados adormecidos em seu
interior pareciam estar congelados no tempo.
Enfim o príncipe encontrou a escada caracol que levava à torre
mais alta do castelo e a subiu, esperando ter uma vista melhor do
misterioso reino. Quando finalmente chegou ao topo, descobriu a
princesa adormecida deitada numa enorme cama.
− Que garota linda − disse ele para si mesmo.
O avô do príncipe lhe contara sobre a princesa do Reino
Adormecido, mas ele ficou tão encantado com a beleza dela que por
um momento se esqueceu da história. Naquele instante, ela era
apenas uma bela garota condenada a dormir por toda a eternidade
por causa de uma maldição.
Como se estivesse sendo controlado por algo muito maior do que
ele, o príncipe parou ao lado da cama, inclinou-se e beijou os lábios
da jovem.
De repente, a princesa sentou-se, confusa.
− Onde estou? − perguntou ela. − Quem é você?
O barulho das pessoas acordando pelo castelo ecoou pela torre.
Então o príncipe se lembrou da história e percebeu que estava ao
lado da famosa princesa. Tinha sido o beijo dele que quebrara a
maldição. Ele fora levado até ali pelo destino.
− Se a história é real, então devo ser o seu amor verdadeiro −
disse o príncipe.
A princesa ficou ruborizada; ela jamais vira um homem tão bonito
quanto o príncipe.
A notícia do despertar do reino espalhou-se pelo mundo, e as
fadas viajaram até lá para ver com os próprios olhos. Aos poucos, o
reino inteiro acordou da maldição do sono. As plantas que tinham
crescido demais foram podadas, e, algum tempo depois (quando
todos conseguiram parar de bocejar), o reino voltou a ser o que era.
Quanto ao príncipe e à princesa, o beijo realmente era de um
amor verdadeiro, porque eles se casaram e viveram felizes para
sempre.

Fim
Eraprincesa
uma vez um belo príncipe que estava aflito para arranjar uma
com quem se casar. Seu pai, o rei, estava envelhecendo
e, antes de morrer, queria que o filho tivesse um herdeiro. Então, o
príncipe viajou o mundo inteiro em busca da noiva ideal.
Havia apenas um problema: todas as princesas já tinham se
casado.
− Meu querido filho, se não é possível encontrar uma princesa,
por que não aceita alguma bela duquesa ou condessa? − perguntou
a rainha para o príncipe.
− Não, preciso me casar com uma princesa; uma princesa de
verdade − insistiu o príncipe. − Meu pai quer deixar uma linhagem
genuinamente real quando morrer. É a única maneira de fazê-lo feliz.
Ansioso para agradar ao pai, o príncipe continuou sua
extenuante empreitada. Ele viajou mais longe do que qualquer outro
príncipe, mas, para seu desalento, sempre retornava ao castelo de
mãos vazias.
− Acho que nunca encontrarei uma princesa de verdade para
casar comigo − disse o príncipe. − Meu pai morrerá pensando que
fracassei.
− Não se preocupe, meu filho − disse a rainha. − Nós
encontraremos uma princesa, prometo. Você precisa ser paciente.
Por força do destino, o reino foi tomado pelo boato de que uma
princesa de uma terra longínqua estava desaparecida. A rainha
colocou o castelo em alerta máximo para procurá-la, esperando que
a princesa desaparecida fosse a chave para a felicidade de seu filho
e de seu marido.
À medida que o tempo passava, o velho rei ficava cada vez mais
doente. Temendo que os últimos dias do pai estivessem se
aproximando, o príncipe começou a perder as esperanças de
encontrar a tempo uma princesa com quem se casar.
− Não tenho outra escolha, terei de me casar com uma duquesa
− disse o príncipe para a mãe. − Vou me reunir com as damas da
corte amanhã e escolher uma esposa.
Naturalmente, o príncipe estava desolado, mas a rainha ainda
não tinha desistido.
Naquela mesma noite, a maior tempestade em décadas assolou
o reino. Alguém bateu suavemente à porta do castelo, e um criado a
abriu. Era uma jovem donzela, completamente encharcada e
tremendo de frio.
− Por favor, será que eu poderia me abrigar aqui esta noite? −
perguntou ela. − Estou andando há dias e não tenho onde me
proteger dessa tempestade terrível.
O criado se compadeceu da jovem:
− Claro, minha querida. Por favor, entre. Saia dessa chuva.
− Obrigada! Nunca me esquecerei da sua generosidade.
O criado levou a jovem até a cozinha e acomodou-a perto da
lareira, para que se aquecesse.
− De onde você é, senhorita? − perguntou ele.
− Eu adoraria saber − disse ela. − Mas acho que perdi a
memória. Estou viajando de reino em reino na esperança de
encontrar algo familiar, mas, por enquanto, não tive sorte.
O coração do criado começou a acelerar. Será que aquela jovem
era a princesa desaparecida? Ele imediatamente informou a rainha
sobre a visitante.
− Interessante − disse a rainha. − É possível que ela seja a
princesa desaparecida, mas, com ela sem memória, é impossível ter
certeza. − Ela pensou por um instante e elaborou um plano. − Já sei
o que fazer. Vamos oferecer uma cama para a jovem dormir esta
noite, com doze colchões empilhados, e colocaremos uma ervilha
embaixo do colchão. Se ela tiver problemas para dormir, saberemos
que ela de fato é a princesa desaparecida; somente uma verdadeira
princesa sentiria uma pequena ervilha sob uma dúzia de colchões!
Seguindo as instruções da rainha, o criado montou a cama com
doze colchões para a moça.
− Que cama estranha − disse ela. − Mas estou tão cansada que
aceito qualquer coisa.
O criado buscou uma escada para que a donzela pudesse
alcançar o topo da cama. Depois, assoprou as velas do aposento e
a deixou sozinha para dormir.
Na manhã seguinte, o castelo inteiro já estava a par do plano da
rainha. Todos os criados, a rainha e o príncipe aguardavam
ansiosamente na porta do quarto da jovem, curiosos para saber
como ela dormira.
Quando ela abriu a porta, tinha olheiras profundas e bocejava
sem parar.
− Como você dormiu, querida? − perguntou a rainha.
− Infelizmente não muito bem − respondeu a jovem. − Fico muito
grata pela sua bondade, mas eu me revirei na cama a noite inteira.
− É um milagre! − exclamou o príncipe. − Encontramos a
princesa desaparecida!
A multidão no corredor começou a comemorar com gritos e
aplausos. A donzela ficou confusa com a celebração repentina:
− Perdão… O que você disse que eu sou?
− Lamento que você não tenha dormido bem, minha querida −
disse a rainha. − Nós escondemos uma ervilha sob os colchões da
sua cama. Somente uma verdadeira princesa seria capaz de senti-
la!
A donzela ficou muito contente ao saber que era uma princesa, o
que lhe permitiu retomar o contato com sua família em um reino
distante.
O príncipe e a princesa se casaram e tiveram muitos filhos antes
do falecimento do rei. Ambos conseguiram exatamente o que
desejavam: o príncipe finalmente encontrou uma esposa, a princesa
enfim encontrou uma vida, e eles encontraram um ao outro e
viveram felizes para sempre.

Fim
Erasuaumapadaria,
vez um padeiro e sua esposa. O casal morava em cima de
num pequeno vilarejo, e era vizinho de uma
misteriosa horta. A horta era cercada por grossos muros de tijolos,
para protegê-la de pestes.
Desde que passaram a morar sobre a padaria, o padeiro e sua
esposa jamais tinham conhecido o dono da horta; também nunca
tinham visto ninguém entrar ou sair dela. No entanto, da janela do
quarto, o casal conseguia enxergar a plantação e ficava boquiaberto
com as safras apetitosas que cresciam do outro lado do muro.
Os tomates eram bem vermelhos e maduros, os repolhos,
volumosos e saudáveis e os cogumelos, carnudos e suculentos.
Mas, infelizmente, ninguém jamais parecia desfrutar daqueles
cultivos; as safras sempre apodreciam sem serem consumidas.
O padeiro e sua esposa, no entanto, tinham coisas bem mais
importantes a fazer do que se preocupar com uma horta
negligenciada: eles estavam esperando seu primeiro filho.
Durante a gravidez, a esposa estava sentindo os desejos mais
fortes de sua vida. Por ser um bom marido, o padeiro sempre ia
buscar tudo que ela desejava comer.
Um dia, porém, o olhar faminto da esposa avistou a alface da
horta do vizinho; a mais suculenta que ela já tinha visto. Dia e noite,
a mulher sonhava em preparar uma salada ou um cozido com
aquelas folhas. O desejo da esposa pela alface crescia dia após dia,
até que ela quase morreu de desejo.
− Oh, querido! Não há nada que eu deseje mais do que comer um
pouco daquela deliciosa alface da horta do vizinho… Você pularia o
muro para pegar um maço para mim?
− Quer que eu roube o nosso vizinho, querida? − perguntou o
padeiro.
− Se não comermos, vai estragar. Além disso, nunca vimos nem
um rato na casa ao lado! Ninguém vai ficar sabendo.
O padeiro, a princípio, hesitou, mas estava disposto a qualquer
coisa para ser um bom marido e um bom pai. Ele imaginou que um
pequeno furto não prejudicaria ninguém.
Assim que o sol se pôs, o homem escalou o muro, entrou na
horta do vizinho e pegou um pé de alface. Sua esposa cozinhou as
folhas, e o casal jantou feliz e despreocupadamente. O que não
podiam imaginar era que roubar aquela alface tinha sido o maior erro
de suas vidas.
O casal não sabia que a horta pertencia a uma bruxa terrível, que
percebeu o desaparecimento do pé de alface assim que ele foi
roubado. Ela invadiu a casa dos vizinhos e flagrou o padeiro e sua
esposa comendo as folhas.
− Ladrões! − gritou a bruxa. − Como vocês se atrevem a roubar
de mim? Vou amaldiçoá-los por isso!
O padeiro e a esposa caíram de joelhos, implorando perdão.
− Perdoe-nos! − pediu o padeiro. − Nunca vimos ninguém colher
nada da sua horta!
− Não sabíamos que a alface faria falta! − disse a esposa.
− Tolos! − grunhiu a bruxa. − As verduras da minha horta não
servem para comer, elas servem para preparar poções! A alface que
você roubou de mim é chamada de rapunzel. Quando preparada
corretamente, ela faz o cabelo dos carecas crescer e os cegos
enxergarem!
− Por favor, leve algo nosso em troca − disse o padeiro.
− Sim, qualquer coisa que quiser! Mas, por favor, não nos
amaldiçoe! − implorou a esposa.
A bruxa estava ansiosa para amaldiçoar a casa, mas a oferta
deles era muito intrigante.
− Vocês disseram “qualquer coisa”? − perguntou ela.
− Sim, qualquer coisa! − disseram em uníssono o padeiro e a
esposa.
A bruxa olhou ao redor da pequena casa e não achou nada
interessante, até que avistou a barriga saliente da mulher. Uma
criança era algo que a bruxa jamais tivera, então a decisão foi fácil.
− Voltarei quando você der à luz, e o seu bebê será meu! −
declarou a bruxa.
− Não! − implorou o padeiro. − Qualquer coisa, menos o nosso
bebê!
− Não discuta comigo! − alertou a bruxa. − Vocês me entregarão
o bebê ou eu os amaldiçoarei!
Dois meses depois, a mulher deu à luz uma menina linda e
saudável. Ela estava nos braços da mãe havia apenas alguns
instantes quando a bruxa voltou. Embora cada fibra de seu corpo lhe
pedisse para que não o fizesse, o padeiro entregou a filha recém-
nascida para a bruxa.

− Ela se chamará Rapunzel, dessa forma, o que vocês roubaram


e aquilo que foi roubado de vocês será sempre a mesma coisa −
disse a bruxa.
Ela desapareceu com a bebê, e o padeiro e a esposa jamais
viram a filha de novo.
A bruxa levou a bebê para o meio da floresta e a trancou no
aposento de uma torre altíssima, onde ninguém a alcançaria. Não
havia portas nem escadas na torre, havia apenas uma única
janelinha; a bruxa precisava escalar a torre tijolo por tijolo todos os
dias para ver a criança.
À medida que a bruxa envelhecia, essa tarefa ficava cada vez
mais difícil. Porém, quando Rapunzel se tornou uma jovem, um
método alternativo surgiu.
Graças à mágica da alface que sua mãe consumira quando
estava grávida, o cabelo de Rapunzel crescia mais, mais rápido e
mais forte do que os cabelos de todas as outras donzelas da região
juntas. Para subir até o topo da torre para ver a garota, a bruxa
gritava lá de baixo:
− Rapunzel, Rapunzel, jogue suas tranças!
A jovem lançava as longas tranças para fora da janela e a bruxa
usava o cabelo como uma corda para chegar ao topo da torre.
Como não conhecera outra mãe, Rapunzel acreditava ser filha da
bruxa. Todos os dias, durante a visita da velha, a jovem lhe fazia a
mesma pergunta:
− Mãe, um dia, quando eu for mais velha e mais sábia, você me
deixará descer da torre para explorar o mundo?
− De maneira alguma. O mundo é um lugar sombrio e cruel,
minha querida. É muito melhor você ficar aqui, em segurança.
− Mas eu me sinto tão solitária aqui nesta torre…
− Minha querida, o seu problema é ganância, não solidão.
Existem donzelas neste mundo que têm bem menos do que você e
que ficariam muito contentes se tivessem a proteção desta torre. Não
vou mais dar atenção a esse tipo de baboseira; você deveria se
sentir agradecida pela vida que eu lhe dei.
Apesar do que a bruxa dizia, essa conversa diária não fazia
Rapunzel se sentir mais grata, e sim mais curiosa. Ela não
acreditava que o mundo era tão ruim quanto a bruxa dizia e passava
o dia inteiro observando a floresta a seu redor, sonhando com o que
havia fora da torre.
Rapunzel rezava todos os dias, pedindo para encontrar uma
maneira de sair da torre e alguém que a levasse dali. Não demorou
para que suas preces fossem atendidas − entretanto não foi
Rapunzel que encontrou a salvação: foi a salvação que a encontrou.
Um belo jovem estava perambulando pela floresta quando avistou
a torre de Rapunzel. Curioso, ele deu a volta na torre, tentando
encontrar a entrada.
A bruxa chegou para fazer sua visita diária, e o jovem se
escondeu atrás de um espinheiro, de onde pôde ver a bruxa chamar
ao pé da torre:
− Rapunzel, Rapunzel, jogue suas tranças!
Rapunzel apareceu na janela e lançou as tranças para a bruxa
subir. O rapaz sentiu o coração disparar ao ver Rapunzel; ele nunca
tinha visto uma moça tão linda, e tudo que mais desejava era subir
na torre para conhecê-la.
Ele esperou do lado de fora da torre e escutou a conversa da
bruxa com a bela jovem. Era a mesma de todos os dias: Rapunzel
pedia para sair da torre e a bruxa negava, encerrando o assunto e
lembrando o quão ingrata a moça era por fazer tal pedido.
O jovem se sentiu impelido a salvar a pobre garota da torre e da
bruxa. No dia seguinte, ele voltou à torre, planejando conhecer
Rapunzel. Esperou a bruxa chegar e se escondeu quando ela
chamou:
− Rapunzel, Rapunzel, jogue suas tranças!
O cabelo foi lançado pela janela e a bruxa escalou a torre. A
bruxa e a jovem tiveram a mesma conversa de sempre, e então a
velha bruxa desceu pelo cabelo de Rapunzel e foi embora em
direção à sua casa na vila.
O rapaz esperou até ter certeza de que a bruxa estava longe o
suficiente, foi ao pé da torre e chamou:
− Rapunzel, Rapunzel, jogue suas tranças!
A bruxa nunca tinha visitado Rapunzel duas vezes no mesmo dia.
Com medo de que houvesse algo errado, a jovem rapidamente
lançou suas tranças para a pessoa que a chamava. Ela jamais tinha
recebido ninguém além da bruxa, então se assustou ao ver o rapaz
entrar pela janela.
− Quem é você? − perguntou ela.
− Não se preocupe, não vou machucá-la. Peço desculpas, mas
eu a vi ontem e precisava conhecê-la.
− De onde você é? − quis saber Rapunzel.
− De uma vila nos limites da floresta.
− Existe uma vila nos limites da floresta? − perguntou Rapunzel,
os olhos arregalados. − Por favor, você precisa me contar sobre ela!
O jovem contou para Rapunzel tudo sobre a vila. Contou sobre as
ruas, as lojas, os mercados, as casas e as escolas. Contou sobre
sua família, seus amigos e como todos se tratavam de maneira muito
diferente da que a bruxa a tratava.
− Que maravilha! − disse Rapunzel, suspirando desejosamente.
− Tem muitas outras coisas que eu adoraria contar para você.
Posso visitá-la novamente amanhã?
− Eu adoraria!
A partir de então, todos os dias, depois que a bruxa deixava a
torre, o jovem subia pelo cabelo de Rapunzel para visitá-la. Todos os
dias, levava coisas novas sobre o mundo para mostrar à donzela:
mapas da vila, da floresta, do reino e do mundo conhecido. Ele levou
livros e pergaminhos para que Rapunzel pudesse ler tudo sobre
lugares e pessoas que ela nem sabia que existiam.
− Ah, se eu pudesse sair desta torre e ver o mundo com meus
próprios olhos… − disse Rapunzel angustiadamente.
− Se eu ajudá-la a sair, poderemos viajar o mundo juntos.
− Mas e minha mãe? Ela vai ficar arrasada se eu for embora.
− Uma mãe de verdade não deixa a filha trancafiada numa torre;
uma mãe de verdade gostaria que você saísse e tivesse suas
experiências. Gostaria que você vivesse, aprendesse e amasse.
E então o jovem beijou Rapunzel. Pela primeira vez em sua vida,
Rapunzel se sentiu uma pessoa, e não uma prisioneira. Ela decidiu
deixar a torre, ainda que esta fosse a última coisa que fizesse.
− Mas como vou descer sem minha mãe notar? − questionou ela.
− Deixe comigo. Vou pensar em alguma coisa para que ela não
perceba.
A partir daquele dia, toda vez que visitava a torre, o rapaz levava
para Rapunzel punhados de barbante da mesma cor do cabelo dela.
Ela trançava o barbante para formar uma corda e depois a prendia
no próprio cabelo, para que a bruxa não percebesse. Quando a
corda estivesse com o mesmo comprimento de seu cabelo, Rapunzel
a usaria para descer da torre e se libertar.
Até então, parecia o plano perfeito. Quanto mais longa a corda
ficava, mais animados Rapunzel e o jovem se tornavam.
Porém, o entusiasmo os deixou descuidados, e, numa tarde, o
jovem cometeu o erro de esquecer um dos seus mapas na torre.
A bruxa encontrou o objeto e gritou com Rapunzel:
− Diga agora quem tem visitado você!
− Não! − disse Rapunzel, com o queixo trêmulo.
− Conte agora ou amaldiçoarei a pessoa quando descobrir quem
ela é!
− É somente um jovem da vila nos limites da floresta − disse
Rapunzel. − É tão errado assim ter um amigo?
Rapunzel desabou no chão, aos prantos. A bruxa nunca a vira tão
triste. Foi a primeira vez que sentiu compaixão pela garota e se
ajoelhou para consolá-la. Porém, a culpa da bruxa desapareceu em
um instante, ao acariciar o cabelo de Rapunzel e encontrar nele o
barbante entrançado.
− Sua garota horrível e ingrata! − berrou a bruxa. − Depois de
tudo que fiz por você, ia abandonar a torre e fugir com aquele patife!
Vocês nunca mais vão se ver, isso eu garanto!
A bruxa saiu da torre e voltou com um machado e uma escada de
corda. Ela cortou o cabelo de Rapunzel com o machado e a obrigou
a descer da torre pela escada. A bruxa arrastou a garota pela floresta
e a abandonou em um local tão embrenhado entre as árvores que a
pobre garota jamais conseguiria encontrar o caminho de volta.
A velha voltou para a torre, jogou a escada e o machado nos
espinheiros lá embaixo e esperou a chegada do jovem no dia
seguinte.
O rapaz achava que logo Rapunzel estaria livre, então estava
mais animado do que de costume. Ele parou na base da torre e
chamou:
− Rapunzel, Rapunzel, jogue suas tranças!
A bruxa lançou o cabelo de Rapunzel para que o jovem subisse.
Quando ele chegou ao topo da torre, a velha arrancou os cabelos
das mãos do rapaz e o derrubou da janela.
O espinheiro amorteceu a queda do jovem, mas os espinhos
furaram seus olhos e o cegaram. O jovem seguiu pela mata, sem
saber em que direção estava indo.
Sem poder enxergar, ele vagou pela floresta durante meses. Dia
após dia, berrava pedindo ajuda até ficar rouco, mas ninguém jamais
o escutava.
Por um milagre, o jovem e Rapunzel se encontraram no meio da
floresta, mas ela não estava sozinha. Enquanto eles estavam
separados, Rapunzel dera à luz gêmeos.
− Você é pai − disse ela. − Agora poderemos ser uma família.
O rapaz chorou de alegria e de dor. Ele estava feliz por ter uma
família, mas sabia que jamais poderia ver Rapunzel e seus filhos.
Rapunzel apoiou a cabeça do rapaz em seu colo e chorou com ele.
Suas lágrimas escorreram de seu rosto e caíram nos olhos do
amado.
Mais uma vez, a mágica da alface rapunzel se mostrou útil, pois
as lágrimas de Rapunzel devolveram a visão ao rapaz, e a primeira
coisa que ele viu foram seus belos filhos.
Agora reconhecendo a floresta ao redor, o jovem levou Rapunzel
e as crianças até sua vila. Depois de reencontrar sua antiga família,
ele e Rapunzel se casaram e deram continuidade à própria família.
Quanto à bruxa, ela ironicamente também ficou cega, mas de
raiva. Estava tão determinada a castigar Rapunzel e o jovem pela
traição que se esquecera de providenciar para si mesma uma
maneira de descer da torre, e ficou presa lá por anos e anos, até sua
morte.
Sem a bruxa em sua vida e cercada por familiares e amigos,
Rapunzel e seu marido enfim viveram felizes para sempre em casas
com muitas portas e janelas.

Fim
Eramaioria
uma vez uma estranha galinha chamada Henny Penny. A
das pessoas evitava Henny Penny ao vê-la se aproximar,
porque ela era uma ave muito excêntrica e nervosa. Tinha a
imaginação muito fértil e costumava fazer tempestade em copo
d’água até mesmo pelas menores questões.
Certa manhã, Henny Penny saiu do seu galinheiro e uma
pequena bolota caiu de um carvalho, atingindo sua cabeça. Ela olhou
para cima, mas, ao ver somente a árvore, chegou a uma conclusão
absurda:
− Ó, meu Deus! O céu está caindo! Preciso avisar o rei!
E lá foi ela, bamboleando pelo campo para falar com o rei. No
caminho, passou por um amigo, um galo chamado Cocky Locky, que
a cumprimentou:
− Bom dia, Henny Penny. Aonde você vai?
− Vou avisar o rei que o céu está caindo! − disse Henny Penny.
− Parece romântico − cacarejou Cocky Locky. − Posso ir
também?
− Claro, Cocky Locky! Melhor duas aves do que uma só!
Henny Penny e Cocky Locky formavam um par peculiar, pois o
galo era completamente apaixonado por Henny Penny e acreditava
em tudo que ela dizia.
E lá foram as duas aves, bamboleando pelo campo para falar
com o rei. No caminho, eles passaram por uma amiga, a pata-real
Ducky Lucky, que os cumprimentou:
− Bom dia, Henny Penny e Cocky Locky. Aonde vocês vão?
− Vamos avisar o rei que o céu está caindo − disse Henny Penny.
− Parece uma ótima oportunidade social − grasnou Ducky Lucky.
− Posso ir com vocês?
− Claro, Ducky Lucky − cacarejou Henny Penny. − Melhor três
aves do que uma só!
Com Ducky Lucky, o grupo foi transformado em um trio
problemático, pois a pata era tão carente que faria qualquer coisa
para estar perto de outras aves.
E lá foram os três, bamboleando pelo campo para falar com o rei.
No caminho, eles passaram por uma amiga, a gansa Goosey
Loosey.
− Bom dia, Henny Penny, Cocky Locky e Ducky Lucky − disse
Goosey Loosey. − O que vocês três estão fazendo?
− Vamos avisar o rei que o céu está caindo − disse Henny Penny.
− Que respeitável − grasnou Goosey Loosey. − Posso ir com
vocês?
− Claro, Goosey Loosey − cacarejou Henny Penny. − Melhor
quatro aves do que uma só!
Com Goosey Loosey, o grupo foi transformado em um quarteto
preocupante, pois a gansa era tão fascinada pela realeza que faria
qualquer coisa para conhecer o rei.
E lá foram as quatro aves, bamboleando pelo campo para falar
com o rei. No caminho, passaram por outro amigo, o peru chamado
Turkey Lurkey.
− Bom dia, Henny Penny, Cocky Locky, Ducky Lucky e Goosey
Loosey − disse Turkey Lurkey. − Aonde vocês vão?
− Vamos contar para o rei que o céu está caindo − disse Henny
Penny.
− Parece algo que tomará muito tempo… − gorgolejou Turkey
Lurkey. − Posso ir com vocês?
− Claro, Turkey Lurkey − cacarejou Henny Penny. − Melhor cinco
aves do que uma só!
Com Turkey Lurkey, o grupo foi transformado em um quinteto um
tanto questionável, pois o peru faria qualquer coisa para escapar de
sua esposa, a Sra. Turkey Lurkey.
E lá foram as cinco aves, bamboleando pelo campo para falar
com o rei. De repente, elas estancaram: uma enorme raposa
chamada Foxy Loxy saltou do meio dos arbustos e parou na frente
delas.
− Bom dia, Henny Penny, Cocky Locky, Ducky Lucky, Goosey
Loosey e Turkey Lurkey − disse Foxy Loxy. − Aonde essas cinco
belas aves estão indo?
− Vamos avisar o rei que o céu está caindo − disse Henny Penny.
− E o céu está realmente caindo? − perguntou Foxy Loxy.
Turkey Lurkey olhou para Goosey Loosey, Goosey Loosey olhou
para Ducky Lucky, Ducky Lucky olhou para Cocky Locky e Cocky
Locky olhou para Henny Penny, pois ninguém além de Henny Penny
tinha visto o céu caindo. Talvez eles devessem ter perguntado isso
antes de partirem.
− Claro que está! − cacarejou Henny Penny. − Caiu um pedaço
do céu na minha cabeça agora de manhã!
Cocky Locky, Ducky Lucky, Goosey Loosey e Turkey Lurkey
suspiraram aliviados. Eles ficaram contentes por saber que aquela
jornada não era uma perda de tempo.
− Então permitam que eu os acompanhe até o rei − disse Foxy
Loxy.
− Claro, Foxy Loxy − cacarejou Henny Penny. − Melhor uma
raposa e cinco aves do que uma ave só!
Com Foxy Loxy, o grupo foi transformado em um sexteto pateta,
pois ninguém jamais tinha visto uma raposa viajando com cinco
aves.
Então Henny Penny, Cocky Locky, Ducky Lucky, Goosey Loosey
e Turkey Lurkey seguiram Foxy Loxy pelo campo para falar com o
rei. Porém, Foxy Loxy fez o grupo mudar de caminho e levou as aves
até um buraco escuro no chão.
− Esse não é o caminho certo até o rei − cacarejou Henny Penny.
− É um atalho − rosnou Foxy Loxy.
De repente, Foxy Loxy agarrou Cocky Locky pelo pescoço e
Ducky Lucky pelo bico e lançou-os no buraco. Em seguida, agarrou
Goosey Loosey pela asa e Turkey Lurkey pela papada e também os
lançou para dentro do buraco.
− Obrigado pelo lanchinho, Henny Penny! − rosnou Foxy Loxy.
Henny Penny correu para casa e jamais viu Cocky Locky, Ducky
Lucky, Goosey Loosey ou Turkey Lurkey novamente. O céu
continuou perfeitamente intacto. A partir daquele dia, a galinha nunca
mais envolveu os amigos nos seus assuntos.

Fim
Eramaravilhoso
uma vez, nas profundezas das águas gélidas do oceano, o
reino do Povo do Mar. O reino ficava tão abaixo da
superfície que era completamente desconhecido pela humanidade. O
Povo do Mar era uma sociedade orgulhosa que vivia num enorme
palácio subaquático com paredes de coral e jardins de algas
marinhas.
O Reino do Mar era governado pelo poderoso Rei do Mar, que
tinha seis belas filhas. A mãe das sereias, a Rainha do Mar, morrera
tragicamente no parto de sua filha mais nova, e as princesas eram
criadas pela avó.
Como era de esperar, as princesas sereias ficavam tão
fascinadas com as histórias do nosso mundo quanto as nossas
crianças ficam encantadas com as histórias sobre o mundo das
águas. Apesar de a avó achar esse interesse gracioso, ensinava às
netas que elas tinham o necessário em casa, no palácio subaquático.
− Eu sei que o mundo da superfície pode parecer atraente; eu
também achava isso quando tinha a idade de vocês − disse ela. −
Confiem em mim, meninas, lá em cima só tem um monte de terra e
de ar.
A avó sabia que as princesas jamais se satisfariam com o que ela
dizia, então permitia que cada uma das netas, ao completar quinze
anos, nadasse até a superfície para ver esse outro mundo com os
próprios olhos.
A princesa mais nova, que era chamada de Pequena Sereia por
ser a menor de todas, era a mais curiosa para conhecer o mundo da
superfície. Era um sofrimento ter de esperar até seu aniversário de
quinze anos, e uma tortura ver cada uma de suas irmãs ter essa
oportunidade antes dela.
− Eu vi uma luz fortíssima no céu − disse a irmã mais velha ao
voltar de sua visita à superfície. − Nunca vi nada tão brilhante!
− Isso é o sol, minha querida − explicou a avó. − É ele que
ilumina as criaturas que vivem em cima da água e debaixo dela.
− Senti uma onda de ar quando cheguei à superfície! − anunciou
a segunda irmã mais velha.
− Isso é o vento, minha querida − disse a avó. − Tem muito vento
lá em cima.
− Eu vi um peixe esquisito que cantava e nadava no ar! Ele tinha
escamas longas e uma boca pontuda, parecia uma lula − falou a
terceira princesa mais velha.
− Isso é um pássaro, minha querida − esclareceu a avó. − E
pássaros não nadam no ar, eles voam.
− Eu vi uma bolacha-da-praia no céu e, atrás dela, milhares de
luzes piscando − disse a quarta princesa mais velha.
− O que você viu foi a lua e as estrelas − falou a avó.
− Eu vi uma pequena baleia feita de madeira boiando na
superfície! − disse a segunda sereia mais jovem.
De repente, a ternura da avó pelas aventuras das netas foi
substituída pelo medo e por uma extrema preocupação:
− Vocês precisam prestar muita atenção no que vou lhes dizer.
Ninguém mais tem autorização para chegar perto da superfície
novamente! Entenderam? A baleia de madeira que você viu é um
navio; e navios transportam humanos. Se os humanos virem uma de
vocês, a sequestrarão e levarão para longe!
A Pequena Sereia ficou desolada. Ela passara a vida inteira
esperando sua vez de nadar até a superfície e agora tinha sido
proibida. Os perigos alertados pela avó não importavam para ela; a
garota tinha certeza de que morreria de curiosidade se não visse a
superfície com os próprios olhos.
Então, no seu aniversário de quinze anos, a Pequena Sereia
nadou até a superfície contra a vontade da avó.
Quanto mais para cima nadava, mais quente e clara a água
ficava. Ela estava chegando cada vez mais perto de um teto
ondulante e deduziu que aquilo era a superfície. Finalmente a
Pequena Sereia colocou a cabeça para fora da água e viu o mundo
da superfície com os próprios olhos.
Não se parecia em nada com o que ela esperava. Não havia sol,
nem lua, nem estrelas, nem pássaros no céu, apenas nuvens
espessas. No entanto, sua avó tinha razão a respeito de uma coisa:
havia muito vento, um vento fortíssimo! Ele assoprava a água do
oceano em muitas direções diferentes.
Ao longe, a Pequena Sereia viu uma grande estrutura de madeira
com amplas velas. Devia ser um navio, como o que a irmã tinha
visto. Ela nadou para mais perto, querendo enxergar melhor, e
avistou dezenas de humanos correndo pelo convés, em pânico.
− A tempestade vai nos afundar! Abandonem o navio! − gritou um
dos homens. − Levem o príncipe para um lugar seguro!
Um belo jovem foi acompanhado até um barco na lateral do
navio. A Pequena Sereia nunca tinha visto alguém tão bonito. Ele
tinha pele bronzeada, cabelos negros e olhos castanhos; era
completamente diferente dos sereios pálidos que ela costumava ver.
Assim que o príncipe pisou no barco, uma enorme onda veio do
lado norte do navio e derrubou o jovem na água. O rapaz lutou
contra a água com todas as suas forças, mas as ondas insistiam em
afundá-lo.
− Ah, não! − disse a Pequena Sereia. − Preciso salvá-lo antes
que ele se afogue!
A Princesa do Mar mergulhou em busca do príncipe. Como
àquela altura o navio já estava naufragando, avistar o príncipe entre
os destroços se tornou uma tarefa difícil. Finalmente ela o encontrou
e envolveu o corpo do jovem com os braços, carregando-o até a
superfície.
Quando a Pequena Sereia chegou a terra firme com o príncipe, a
tempestade tinha passado e o Sol tinha aparecido. Como o Povo do
Mar não tinha permissão para sair da água, ela deitou o corpo
debilitado do rapaz na areia e fugiu antes que ele acordasse. A
Princesa do Mar ficou a uma pequena distância da praia, observando
o jovem se recuperar.
O príncipe estava muito cansado e confuso e não se lembrava de
muita coisa da tempestade. Um pescador e sua esposa o
encontraram enquanto caminhavam pela praia.
− Vossa Alteza − disseram eles, fazendo uma reverência. − O que
houve?
− Meu navio foi surpreendido por uma tempestade terrível − disse
o príncipe. − A última coisa de que me lembro é de ter sido
derrubado no mar. Quase me afoguei.
− E quem o salvou? − perguntou o pescador.
O príncipe encarou o oceano, aturdido, e respondeu:
− Eu não sei. Deve ter sido um anjo.
Naquele instante, a Pequena Sereia se apaixonou pelo príncipe.
Desse momento em diante, ela só conseguia pensar no jovem cuja
vida tinha salvado. Era como se seu coração não pertencesse mais a
ela mesma e batesse somente para o príncipe.
Pensar em viver sem ele era algo devastador, contudo, sendo
uma sereia, ela sabia que jamais poderia viver com o príncipe em
terra firme; para isso, ela precisaria virar uma humana. E, para a
infelicidade da princesa, apenas uma criatura poderia ajudá-la.
A Pequena Sereia nadou até a parte mais profunda e escura do
oceano, chegando à caverna onde morava a infame Bruxa do Mar,
uma criatura terrível, metade humana e metade crustáceo, que tinha
cabelo de alga marinha. Ela era temida no oceano inteiro, mas o
amor da Pequena Sereia pelo príncipe deu à jovem a coragem
necessária para enfrentar a feiticeira.
− Por que veio até aqui, menina? − rosnou a bruxa.
− Quero virar humana para poder viver em terra firme com o
príncipe.
− Mudar a sua forma para sempre é um comprometimento e
tanto. Tem certeza de que é com o príncipe que você quer ficar?
− Nunca tive tanta certeza na minha vida.
Um sorriso ganancioso se abriu no rosto da Bruxa do Mar,
deixando à mostra seus dentes podres. A Pequena Sereia era seu
tipo preferido de cliente.
− Um feitiço tão forte custará caro − disse a bruxa.
− O que vai me custar? − perguntou a Pequena Sereia.
− Uma troca. Eu lhe darei pernas em troca da sua língua.
− Minha língua? − perguntou a Pequena Sereia, chocada. − E
como vou falar com o príncipe e dizer que o amo?
− Se o amor for verdadeiro, você não precisará de palavras −
sussurrou a Bruxa do Mar. − Mas saiba: se o príncipe não a amar da
mesma forma que você o ama, assim que voltar para o oceano, você
virará espuma do mar… e deixará de existir.
A Pequena Sereia nunca pensou que seu desejo poderia custar
tão caro, mas não conseguia imaginar nada mais doloroso do que
viver sem o príncipe, então concordou com a troca.
A Bruxa do Mar decepou a língua da Pequena Sereia com uma
faca afiada. Depois, agarrou a cauda da sereia e a dividiu bem no
meio, magicamente transformando suas nadadeiras em pés; suas
escamas se transformaram em pele; e duas maravilhosas pernas
surgiram em seu corpo.
A Pequena Sereia − que não era mais uma sereia − quase se
afogou na caverna da Bruxa do Mar. Antes que fosse tarde demais,
ela nadou até a superfície do oceano e foi para o exato local da praia
onde tinha deixado o príncipe.
Por sorte, o príncipe voltava lá todos os dias, na esperança de
encontrar respostas sobre o seu salvamento misterioso. Ele
encontrou a Pequena Sereia e a ajudou a se levantar. Como jamais
tinha andado antes, ela imediatamente caiu no chão.
− O que aconteceu com você? − perguntou o príncipe.
A Pequena Sereia tentou responder, mas, sem a língua, ela só
conseguiu murmurar.
− Como você se chama? − perguntou ele.
Mais uma vez, a Pequena Sereia tentou responder, mas ele não
entendeu.
− Você não é de falar muito, não é? − comentou o príncipe,
sorrindo. − Por que não vem comigo até o meu castelo para se
recuperar?
A Pequena Sereia assentiu com a cabeça e seus olhos se
encheram de lágrimas. Ela não conseguia imaginar nada mais
maravilhoso do que aquilo. A jovem passou vários meses com o
príncipe, que cuidou muito bem dela.
Ele a ensinou a andar, correr e dançar. E eles passaram a dançar
todas as noites antes de dormir, valsando cada vez mais perto um do
outro, até ficarem próximos o suficiente para ela poder apoiar a
cabeça no peito dele e eles se balançarem como se fossem apenas
um.
A Pequena Sereia estava convencida de que o príncipe a amava
tanto quanto ela o amava. A transformação tinha valido todo o
sofrimento.
Um dia, uma bela jovem chegou ao castelo acompanhada pelo
som de trompetes e dos aplausos da multidão. Pela expressão no
rosto da Pequena Sereia, o príncipe percebeu que ela não estava
reconhecendo a jovem e lhe explicou:
− Ela é uma princesa de outro reino, e minha noiva. Vamos nos
casar no fim da semana.
A Pequena Sereia desabou no chão. Ouvir aquilo foi como ter seu
coração partido em vários pedacinhos.
− Desculpe, achei que você soubesse − disse o príncipe. − Achei
que o reino inteiro soubesse.
A Pequena Sereia saiu correndo do castelo, aos prantos. Saber
que o príncipe amava outra pessoa foi a maior dor de sua vida. Ela
foi em direção ao oceano e caiu de joelhos na areia.
Quando a Pequena Sereia estava prestes a encostar o dedo do
pé na água e se tornar espuma do mar, suas cinco irmãs apareceram
na superfície.
− Querida irmã, estávamos procurando você por toda parte! −
disse a mais velha.
Tinha algo diferente nas Princesas do Mar. Quando a Pequena
Sereia olhou melhor, percebeu que todas tinham tido seus belos
cabelos cortados.
− O que aconteceu com o cabelo de vocês? − murmurou ela.
Felizmente, suas irmãs conseguiram compreendê-la.
− Nós demos nosso cabelo para a Bruxa do Mar; fizemos uma
troca, na esperança de que você pudesse voltar a ser uma sereia −
falou a segunda mais velha. − Ela nos deu essa adaga e disse que,
se você quiser voltar para o mar, precisa apunhalar o coração do
príncipe e deixá-lo sangrar a seus pés.
A segunda irmã mais velha colocou a adaga, que tinha lâmina
feita de vidro do mar e cabo feito de coral, aos pés da Pequena
Sereia.
Então, a ex-sereia voltou para o castelo na noite do casamento
do príncipe. Passou sorrateiramente pelos corredores e entrou nos
aposentos dos recém-casados. Ela parou ao lado do príncipe, que
dormia tranquilamente ao lado de sua esposa, e ergueu a adaga
acima do coração dele.
Quando estava prestes a golpeá-lo, a Pequena Sereia ficou
paralisada. Ela olhou o príncipe e percebeu que jamais seria capaz
de feri-lo. Apesar de o amor do príncipe não ser seu, ela ainda o
amava muito.
A Pequena Sereia voltou para a praia e jogou a adaga no oceano.
Ela entrou no mar, seguindo em direção à lua cheia.
Gostaria de dizer que a Pequena Sereia viveu feliz para sempre,
mas seu corpo se transformou em espuma do mar, assim como a
bruxa disse.
Porém, ela não deixou de existir. O espírito da Pequena Sereia
continua vivo, percorrendo o oceano para ajudar quem necessita e
orientar os jovens para que não cometam erros parecidos com o seu.

Fim
EraOsuma vez uma família de três cabritos que morava num campo.
cabritos eram irmãos e tinham idades e tamanhos diferentes.
O mais novo era o menor e tinha apenas um leve indício de chifres
nascendo na cabeça. O cabrito do meio era maior e tinha chifres
médios. O irmão mais velho era o maior cabrito da família e tinha um
par imponente de chifres.
Um dia, a família de cabritos ficou sem pasto no campo, mas,
como do outro lado do rio havia outro pasto gramado, aquilo não
parecia um problema. Então, os cabritos percorreram a margem do
rio até achar uma pequena ponte de pedra.
O cabrito mais novo foi o primeiro a atravessar a ponte. Porém,
antes que ele chegasse do outro lado, um ogro terrível saltou de
debaixo da ponte e bloqueou sua passagem, berrando:
− Como você se atreve a atravessar minha ponte sem pagar o
pedágio?
− Desculpe, senhor Ogro − respondeu o pequeno cabrito,
tremendo. − Mas sou apenas um cabrito e não tenho moedas de
ouro.
− Então você será o meu jantar! − berrou o ogro, e avançou para
cima do cabritinho assustado.
− Espere! Eu seria apenas um petisco para você. É melhor você
esperar meu irmão mais velho atravessar a ponte. Ele, sim, seria
uma refeição que o deixaria realmente satisfeito!
O ogro não conseguia acreditar que o cabritinho era capaz de
fazer aquilo com o próprio irmão, mas o animal tinha razão. Então
deixou-o passar e esperou o irmão atravessar a ponte.
− Como você se atreve a atravessar minha ponte sem pagar o
pedágio? − berrou o ogro.
− Desculpe, senhor! − disse o cabrito do meio. − Mas sou apenas
um simples cabrito e não tenho dinheiro para lhe dar.
− Então você será o meu jantar!
− Espere! − disse o cabrito. − Eu não passaria de uma boquinha
para você, mas se esperar o meu irmão mais velho atravessar a sua
ponte, terá um banquete maravilhoso!
Aqueles cabritos eram a família mais desequilibrada que o ogro já
tinha visto. Porém, ele estava com tanta fome que ficou feliz por
perceber que um era capaz de se virar contra o outro. Então deixou
o irmão do meio passar e esperou o cabrito mais velho atravessar a
ponte.
− Como você se atreve a atravessar minha ponte sem pagar o
pedágio?
O cabrito mais velho riu, pois ele era muito maior do que o ogro.
O ogro tentou fugir, mas o cabrito avançou com seus chifres contra
ele, derrubando-o dentro do rio.

Os três cabritos chegaram em segurança ao outro campo, onde


havia bastante grama para pastar. O rio levou o ogro até o outro lado
do reino, e ele definitivamente aprendeu a não ter o olho maior que a
barriga.

Fim
EraGerda.
uma vez um garotinho chamado Kay e uma garotinha chamada
Eles eram vizinhos e, apesar de não serem parentes,
amavam-se como se fossem irmãos.
Moravam numa cidade tão grande e lotada que não havia espaço
nem mesmo para um pátio ou um jardim. Por esse motivo, quando
queriam brincar, as crianças precisavam ir até uma floresta perto dali.
As casas de Kay e Gerda eram muito próximas, tão próximas que,
pelas janelas, eles conseguiam apertar a mão um do outro.
Como os telhados das duas casas ficavam a apenas um salto de
distância, quando o clima estava quente, Kay e Gerda subiam e
passavam a maior parte do dia observando a cidade movimentada.
Lá em cima, eles mantinham um pequeno jardim onde cultivavam
uma roseira.
À noite, a avó de Kay o colocava para dormir e lhe contava
histórias. O menino deixava a janela aberta, assim como Gerda, e,
dessa forma, os dois escutavam as histórias juntos.
− Era uma vez um demoniozinho terrível que adorava trazer
sofrimento para o mundo − contou certa vez a avó de Kay. − Ele
criou um espelho mágico que refletia tudo de maneira horrível.
Lindas mulheres, ao se olharem no espelho, se enxergavam como
velhas corocas. Homens bonitos encaravam o espelho e
enxergavam velhotes repugnantes. Até mesmo a paisagem mais
agradável parecia um horroroso terreno baldio quando refletida
naquele espelho.
“Por ter criado algo tão abominável, o demônio tornou-se muito
popular na escola de demônios. Seus amigos o ajudaram a levar o
espelho pelo mundo inteiro, na esperança de arruinar o espírito da
humanidade.
“Um dia, os demônios decidiram levar o espelho até o céu, para
aborrecer Deus e os anjos. Enquanto voavam para o céu com o
objeto, o mal dentro do espelho começou a gargalhar de entusiasmo.
E ele riu tanto que, antes que os demônios chegassem perto dos
portões celestiais, o espelho explodiu em milhares e milhares de
pedacinhos.
“Os cacos de vidro despencaram como chuva sobre a Terra. A
maior parte deles era menor do que um grão de areia, quase
invisível. O vidro caiu nos olhos e no coração das pessoas, fazendo-
as enxergar e sentir somente o que o mundo tinha de pior.”
− Vovó, por que está nos contando uma história dessas? −
perguntou Kay.
− Para que, da próxima vez que estiver triste ou só conseguir se
concentrar nas coisas ruins do mundo, você se lembre de verificar se
não tem nos seus olhos ou no seu coração um caco do espelho
mágico do demônio − respondeu a avó.

Ao fim da história, a avó beijou a testa do neto e soprou um beijo


para Gerda. Quando foi fechar a janela, percebeu que havia uma
camada de gelo no vidro.
− Parece que o inverno está chegando − disse a avó. − Ou então
a Rainha da Neve veio visitá-lo.
− Quem é a Rainha da Neve? − Gerda perguntou de sua casa.
− Quem é a Rainha da Neve? − perguntou a avó com um tom
brincalhão. − Está dizendo que não sabe quem é a Rainha da Neve?
Mas que tipo de coisa andam ensinando para as crianças na escola
hoje em dia?
As duas crianças deram de ombros, mas a idosa sabia que tinha
conseguido a atenção delas e instigou-as perguntando:
− Vocês nunca se questionaram por que as crianças não podem
passar muito tempo no frio ou brincando na neve?
− Por quê? − perguntaram Gerda e Kay juntos.
− Porque a Rainha da Neve pode pegá-las! − disse a avó,
gesticulando como um monstro aterrorizante. − Ela é uma bruxa do
clima e anda no meio das nuvens no seu trenó gigantesco puxado
por ursos-polares! Ela lança tempestades de abelhas da neve contra
suas vítimas! E, quando as criancinhas desobedecem aos pais e
ficam no frio sozinhas, a bruxa voa até perto delas e as captura!
Ouvir sobre a Rainha da Neve fez Kay e Gerda puxarem as
cobertas para perto dos olhos.
− Que assustador! − disse Kay.
− É para ser assustador mesmo − respondeu a avó. − Se fosse
uma história feliz, não haveria nada para aprender com ela. Bem, já
basta de histórias por hoje. Descansem, e até amanhã.
A avó estendeu o braço e fechou a janela de Gerda e depois a de
Kay. As crianças adormeceram, mas tiveram pesadelos em que a
Rainha da Neve as observava.
Com o inverno chegando, Kay e Gerda passavam cada vez
menos tempo no telhado de suas casas. Quando a primeira neve
caísse, o telhado ficaria escorregadio demais, e seus pais os
obrigariam a ficar dentro de casa ou brincar na floresta. Apesar de
sempre sentirem falta da vista da cidade durante o inverno, em vez
de reclamar, os dois amigos conversaram sobre todas as atividades
de inverno que queriam fazer.
− Mal posso esperar para fazer um boneco de neve na rua −
disse Gerda.
− Mal posso esperar para andar de trenó na floresta − disse Kay.
Eles estavam animados com os planos para o inverno. Kay olhou
para cima, esperando ver o primeiro floco de neve da estação cair do
céu. Bem naquele instante, um pequeno caco de vidro do espelho
mágico do demônio flutuou no ar e caiu no olho do garoto.
Sem que Kay compreendesse o porquê, seu jeito animado mudou
de repente. O garoto ficou sisudo; nada no mundo o alegrava.
− Kay, o que houve? − perguntou Gerda.
− Nada. Eu odeio o inverno.
− Que mentira, seu bobo. Você acabou de dizer que mal pode
esperar para andar de trenó.
− Eu sei o que eu disse, mas qualquer pessoa pode mudar de
ideia! − retrucou ele. − Você está esquecendo que o inverno também
faz as plantas morrerem e deixa o vento gélido! No fim das contas,
vai ver que o inverno não é uma coisa boa!
Kay abandonou Gerda no telhado e entrou rapidamente em casa,
batendo a porta. Gerda nunca o tinha visto tão aborrecido e não
sabia o que fazer. Ela jamais poderia esperar que o mau humor do
amigo durasse até o dia seguinte, mas, quando foi até a casa de
Kay, ele não saiu do seu quarto.
− Vá embora! − gritou Kay do outro lado da porta. − Não quero
vê-la!
− Kay, fale comigo, o que está acontecendo? − pediu Gerda. − Eu
disse algo que o chateou?
− Está me chateando agora por não me deixar em paz! −
respondeu Kay.
Ser tratada daquela maneira deixou a pobre garota arrasada. E,
para sua tristeza, a situação só piorou. Kay não quis sair para brincar
com ela durante semanas e permaneceu trancado no quarto. Algum
tempo depois, seus pais o obrigaram a sair para tomar um pouco de
ar fresco, e ele arrastou de má vontade seu trenó até a floresta.
− Quer a companhia de uma amiga? − perguntou Gerda. − Eu
adoraria andar de trenó com você.
Kay ignorou-a e seguiu sem dizer nada, o que fez a pobre garota
voltar para casa aos prantos. Ela sabia que havia algo de errado com
ele, mas não conseguia descobrir o que era.
O garoto angustiado foi andar de trenó sozinho na floresta, mas
não se alegrou em nenhum instante. Ele estava tão deprimido que
achava que nunca mais conseguiria gostar de nada. Perto dele havia
outras crianças, que brincavam, riam, gritavam e se divertiam na
neve. Kay incomodou-se por elas estarem tão felizes e se afastou,
embrenhando-se mais na floresta.
Anoiteceu bem antes do esperado, e o garoto percebeu que
estava perdido no frio. Exausto, sentou-se no seu trenó ao lado da
trilha, esperando que alguém aparecesse e o ajudasse a voltar para
casa.
Era muito tarde, e Kay adormeceu enquanto esperava ser
encontrado. Ao abrir os olhos, o garoto percebeu que estava em
movimento. Seu trenó estava sendo puxado por outro, branco e
gigantesco, que passava a uma velocidade enorme por entre os
montes nevados.
Surpreendentemente, não havia nada conectando os dois trenós.
Era como se eles estivessem amarrados por uma corda invisível.
Kay olhou para baixo e viu que o trenó não estava em uma
estrada, mas sim em um rio, que tinha suas águas magicamente
congeladas à medida que o trenó se movimentava. Ele gritou o mais
alto possível, e o trenó parou bruscamente. A condutora levantou-se
e se virou para ele.
Era a mulher mais alta que ele já vira, tinha a pele muito branca e
olhos azuis. Ela usava uma coroa que lembrava um floco de neve e
um enorme casaco branco de pele. Kay nem precisava ser
apresentado, pois sabia que estava encarando a Rainha da Neve.
− Pobrezinho, você deve estar congelando − disse ela. − Sente
aqui ao meu lado, se aqueça sob o meu casaco.
A Rainha da Neve ergueu Kay e o acomodou ao lado dela.
Dois gigantescos ursos-polares puxavam o trenó, assim como na
história que sua avó contara. A Rainha da Neve chicoteou os ursos,
que os puxaram com ainda mais vigor. O trenozinho de Kay se soltou
e afundou no rio.
A Rainha da Neve colocou o casaco ao redor dos ombros do
garoto, mas ele não sentiu nenhum calor. Ao contrário, o casaco o
fez sentir ainda mais frio e estremecer.
− Por favor, me deixe voltar para casa − pediu Kay. − Minha
família vai ficar preocupada comigo.
− Mas eu estou levando você para casa, menino − disse ela. −
Para a sua nova casa, comigo.
A Rainha da Neve beijou a bochecha de Kay, e o coração do
menino se cobriu de gelo. O feitiço tornou o frio muito mais tolerável,
e o garotinho se sentiu plenamente satisfeito com o ar gélido.
− Minha família vai sentir falta de mim − falou Kay. −
Especialmente Gerda.
− Ah, não falemos mais do passado − disse a Rainha da Neve. −
Você não vai precisar das suas lembranças no lugar para onde
estamos indo.
A Rainha da Neve beijou novamente a bochecha de Kay, que
perdeu todas as suas lembranças. Todas as memórias sobre seus
pais, sua avó e Gerda foram apagadas de sua mente.
A Rainha da Neve olhou para cima, e um assobio ensurdecedor
irrompeu de seus lábios. Grandes pássaros nevados, com penas
feitas de flocos de neve, desceram do céu e cercaram o trenó. Então
as aves ergueram o trenó acima das nuvens, e a Rainha da Neve
desapareceu da floresta com Kay a seu lado.

Quando o menino não voltou para casa naquela noite, sua família
presumiu o pior. Eles reuniram um grupo e foram procurar por ele na
floresta. Depois de buscar a noite inteira, ninguém encontrou
nenhum sinal de Kay.
Aquela tinha sido a noite mais fria daquele inverno, e muitos
achavam que era improvável que o menino tivesse sobrevivido
sozinho. Na manhã seguinte, quando o trenó de Kay foi encontrado
no rio, as pessoas acreditaram que ele tivesse morrido.
Apesar do que os adultos diziam, Gerda recusava-se a acreditar
que Kay estava morto. Ela ainda conseguia senti-lo no seu coração;
sabia que ele estava vivo em algum lugar.
A garota decidiu continuar procurando o amigo sozinha e refazer
o caminho que ele poderia ter feito na floresta. Sua busca a levou até
um rio gélido.
− Deve ter sido neste rio que eles acharam o trenó − disse Gerda.
− Talvez ele tenha perdido o trenó ao tentar atravessar o rio. Vou dar
uma olhada lá.
A garotinha encontrou um barco à margem do rio e tentou remar
até o outro lado. Uma vez na água, ela se deu conta de quão ruim
era aquela ideia. A correnteza estava forte demais para seus
minúsculos braços conseguirem remar contra. Então o barco foi
levado pelo rio a uma velocidade assustadora.
Gerda foi se afastando cada vez mais, para muito além da cidade
e da área que ela conhecia da floresta. No fim do rio, o barco parou
num lugar muito pitoresco.
No meio da floresta nevada, havia uma clareira ensolarada, com
grama verde e belas flores. Havia pássaros voando, e todas as
árvores ainda tinham folhas. Era como se aquele pedaço da floresta
não tivesse se rendido ao inverno e tivesse permanecido no verão.
No centro da clareira, havia uma pequena casa de campo. Gerda
saiu do barco com cuidado e bateu à porta da casa. O clima ali era
tão agradável que ela tirou o casaco e o cachecol. Uma senhora
baixinha usando um vestido colorido e um grande chapéu abriu a
porta.
− Olá, menina. Em que posso ajudá-la? Está perdida?
− Queria saber se você viu meu amigo − respondeu Gerda. − O
nome dele é Kay, é um garoto da minha idade.
− Faz muito tempo que não vejo uma criança por aqui. Mas por
que você não entra? Assim pensamos juntas para onde ele pode ter
ido.
Gerda aceitou o convite alegremente. Ela sentou-se à mesa, e a
senhora preparou-lhe uma xícara de chá. A garotinha deu uma
olhada na casa e percebeu que as janelas eram diferentes de todas
as janelas da cidade; elas tinham formatos estranhos e vidro
colorido.
− A sua casa tem janelas estranhas − disse Gerda.
− É preciso ter muito cuidado com todo aquele vidro do espelho
mágico do demônio voando por aí − disse a senhora. − E eu gosto
de enxergar o mundo pelo meu próprio ponto de vista.
− Como na história? − perguntou Gerda. − Você está dizendo que
o espelho mágico e os demônios existiram?
− Ah, minha querida, não é uma história − disse ela. − Dizem isso
apenas para que crianças como você não se assustem.
Gerda lembrou-se da história e da parte em que os cacos caem
na Terra.
− Será que era por isso que Kay estava tão triste antes de
desaparecer? − falou Gerda. − Talvez um caco de vidro tenha caído
no olho dele.
− Se for esse o caso, é melhor retirar o caco do olho do seu
amigo o quanto antes. O inverno parece ser duas vezes mais frio
quando a pessoa não tem felicidade no coração.
− Queria tanto saber o que aconteceu ontem à noite… Ele foi à
floresta para brincar com o trenó e não voltou mais. Ele estava tão
triste quando partiu… estou muito preocupada com ele!
− É perigoso um garotinho andar sozinho na floresta à noite,
especialmente no inverno. Eu não ficaria surpresa se ele tivesse sido
raptado pela Rainha da Neve.
− A senhora já ouviu falar sobre a Rainha da Neve?
− Claro − respondeu ela. − Ela é minha irmã.
Gerda não conseguia acreditar em quão tola tinha sido. Claro que
a área ensolarada no meio da floresta havia sido criada por magia.
Ela fora parar na casa de outra bruxa!
− Você também é uma bruxa? − perguntou Gerda com medo.
− Sou − disse a senhora. − Mas não precisa ter medo, querida.
Sou a Bruxa do Verão e uma feiticeira do sol. Não vou machucá-la.
Porém, como todas as bruxas, eu me sinto sozinha de vez em
quando, então espero que possa ficar comigo mais um pouquinho.
A Bruxa do Verão beijou a bochecha de Gerda, e a garotinha
perdeu a memória. Ela esqueceu tudo que sabia sobre sua casa na
cidade, sua busca por Kay e como tinha encontrado aquela casa. A
bruxa beijou-a novamente, e o coração de Gerda passou a sentir
apenas calor e felicidade.
A garotinha morou com a Bruxa do Verão por um bom tempo. Ela
a ajudava a cuidar do jardim e de todos os animais da floresta que
apareciam naquela área querendo escapar do frio.
Um dia, enquanto ajudava a bruxa a regar as flores, Gerda
encontrou uma pequena roseira, igual à que ela e Kay tinham no
jardim do telhado. De repente, todas as lembranças de Gerda
voltaram com a mesma velocidade do rio que a levara até ali. Ela
lembrou-se de sua família, do desaparecimento de Kay e do quanto
queria encontrá-lo.
− Meu Deus − disse Gerda. − Kay! Preciso encontrá-lo!
A Bruxa do Verão tinha subestimado o amor da garotinha pelo
amigo. Somente um amor verdadeiro era capaz de quebrar o feitiço.
Gerda fugiu dali e retornou ao inverno rigoroso. Voltou a procurar
Kay por toda a floresta, mas não encontrou nenhum sinal dele ou de
seu sequestro pela Rainha da Neve.
A única coisa que a garotinha conseguiu distinguir na floresta foi
um corvo, pois suas penas pretas se destacavam na brancura da
neve. Ela deduziu que o pássaro estava machucado, pois ele batia
as asas e não conseguia sair do chão.
Ao se aproximar, Gerda viu um grande espinho perfurando a asa
do pobre pássaro, então a menina se ajoelhou e o removeu.
− Obrigado, minha dama − crocitou o corvo.
Gerda ficou surpresa ao ver que o corvo falava, mas, depois de
tudo que tinha visto na floresta, o susto não foi tão grande como teria
sido antes de sua jornada.
− Por favor, senhor Corvo, estou procurando meu amigo Kay −
disse Gerda. − Você viu algum garotinho perdido na floresta?
− Vi, sim. Vi um garotinho perdido puxando um trenó nessa
região, e não faz muito tempo.
Gerda bateu palmas e exclamou:
− Deve ser ele! Pode me mostrar em que direção ele foi?
− Infelizmente não vi para onde ele foi, mas talvez seu amigo
tenha sido levado pela Rainha da Neve.
Gerda caiu aos prantos. Se a Rainha da Neve tivesse mesmo
levado Kay, talvez ela nunca mais o visse.
− Não chore, garotinha − disse o corvo. − Nem tudo está perdido;
eu sei onde a Rainha da Neve mora. Posso levá-la até lá se você
realmente quiser encontrar seu amigo.
Gerda concordou com a cabeça com tamanho vigor que as
lágrimas voaram de seu rosto. Ela então seguiu o corvo por muitos e
muitos quilômetros no meio da floresta, indo bem além de todos os
lugares sobre os quais já tinha ouvido falar.
Finalmente, na superfície de um grande lago congelado, Gerda
avistou um imenso palácio feito de gelo. Parecia ser o lugar mais frio
da Terra; só de vê-lo, a garota estremeceu. Porém, se Kay estava lá
dentro, ela daria um jeito de tirá-lo de lá.
− Eu só posso chegar até aqui − disse o corvo. − Tome cuidado,
pequenina, e boa sorte no resgate do seu amigo.
Gerda agradeceu ao corvo e depois atravessou o lago congelado
com cuidado até o palácio. Os ursos-polares da Rainha da Neve
estavam dormindo na entrada, e a garotinha passou pé ante pé por
eles.
Ela entrou no castelo e procurou Kay em todos os quartos. Algum
tempo depois, encontrou o amigo em uma imensa sala do trono na
companhia da própria Rainha da Neve. Kay estava tão gelado que
seus lábios estavam azuis e sua pele estava branca como a neve.
Gerda ficou espiando silenciosamente atrás da porta.
Quando a Rainha da Neve deixou a sala do trono, Gerda correu
até Kay e o abraçou. Ela ficou felicíssima por reencontrar o amigo
desaparecido.
− Kay, senti tanto sua falta! − disse ela.
Kay tentou se desvencilhar do abraço, mas Gerda sabia que o
amigo só estava agindo daquela maneira por causa do caco de vidro
em seu olho. Então, ela apertou ainda mais o abraço. Lágrimas de
alegria escorreram pelo rosto da garota e caíram no peito de Kay,
aquecendo o coração dele e derretendo o gelo que a Rainha da
Neve tinha colocado ao seu redor.
De repente, a cor da pele de Kay voltou ao normal, e as
lembranças começaram a ressurgir em sua mente. Ele se deu conta
de quanto tinha sentido falta de Gerda, e seus olhos se encheram de
lágrimas, que rolaram por seu rosto, expulsando o caco de vidro que
estava em seu olho.
Kay finalmente voltou a ser quem era. Ele tomou as mãos de
Gerda e os dois dançaram de alegria pela sala do trono da Rainha
da Neve.
Muito tempo depois, quando a Rainha da Neve voltou para a sala
do trono para dar uma olhada no garoto, não encontrou ninguém.
Kay e Gerda percorreram a floresta nevada até a cidade. Quando
chegaram, o inverno já tinha sido substituído pela primavera. Ao
entrarem na casa de Kay, os dois amigos encontraram a avó do
garoto sentada perto da lareira.
A felicidade por ver que eles estavam vivos e bem foi tamanha
que a idosa saltou da cadeira e os abraçou com força, a ponto de
deixá-los sem ar.
− Estávamos mortos de preocupação! − disse a avó de Kay. −
Onde vocês se meteram?
Gerda e Kay sorriram.
− Vovó, agora somos nós que temos uma história para contar
para você!

Fim
Eradeslumbrante.
uma vez duas princesas que moravam num castelo
Apesar de terem os mesmos pais, a mesma casa e
uma vida semelhante, as irmãs não poderiam ser mais diferentes
entre si.
A irmã mais velha era uma garota maldosa e egoísta. Ela xingava
os criados do castelo e tinha ataques toda vez que não conseguia o
que queria. Já a irmã mais nova era meiga, bondosa, tinha um
coração enorme e era gentil com todos que conhecia.
Um dia, a irmã mais velha saiu para dar uma volta pelos jardins
do castelo sozinha, levando consigo seu brinquedo favorito: uma
pequena bola de ouro puro. A princesa lançava a bola para cima e a
pegava no ar, até que, acidentalmente, derrubou-a num pequeno
lago.
− Ah, não! Nunca vou conseguir pegá-la de volta!
Bem na hora em que a princesa se virou para voltar ao castelo,
um sapo saltou do lago com a bola dourada na boca.
− Olá, princesa − disse ele. − Creio que isso lhe pertence.
− Que gentileza a sua. Posso retribuir de alguma maneira? Quer
uma macia vitória-régia para se deitar ou um belo jarro com moscas?
− Na verdade, tem algo que você poderia me dar, algo que desejo
muito − disse o sapo. − Eu adoraria receber um beijo.
A princesa ficou indignada com o perturbador pedido e, para
ensinar uma lição ao sapo, a garota ergueu o animal pela perna e o
jogou contra o muro de tijolos do jardim.
− Como se atreve a pedir uma coisa dessas a uma princesa? −
perguntou ela, e se afastou.
A princesa mais nova, que estava vendo tudo da torre, saiu em
disparada para ver se o sapo estava machucado.
− Pobrezinho − disse a princesa mais nova. − Lamento muito pelo
que minha irmã fez com você. Você vai ficar bem?
− Ah, sim, vou ficar perfeitamente bem.
− Minha irmã sabe ser cruel… Talvez eu possa compensar o que
ela fez. Seria um prazer lhe dar um beijo.
A princesa mais nova acomodou o sapo na palma das mãos e o
ergueu. Ela beijou os lábios do sapo e o colocou de volta no chão.
− Pronto − disse ela. − Espero que você tenha um lindo…
De repente, o sapo começou a se contorcer, tremer e se debater.
Seu corpo aumentou dez vezes de tamanho, e sua pele verde se
descascou. O sapo transformou-se magicamente no homem mais
lindo que a princesa já vira.
− Meu Deus! − disse a princesa, boquiaberta. − Você é um
homem?
− Sou, sim − disse ele. − Já fui príncipe de um poderoso reino,
até que uma bruxa má me amaldiçoou e me transformou num sapo.
Ela disse que o feitiço só poderia ser quebrado com o beijo de uma
princesa.
A jovem princesa e o príncipe viajaram até o reino dele, que se
alegrou com sua volta. Os dois se casaram e, algum tempo depois,
tornaram-se rei e rainha.
A princesa mais velha permaneceu em casa e passou o resto da
vida beijando todos os sapos que encontrava pela frente. Porém,
nenhum deles se transformou num belo príncipe. Ela jamais
encontrou um marido, mas ganhou muitas verrugas.

Fim
Eramorrer,
uma vez um moleiro que tinha três filhos. Pouco antes de
o moleiro escreveu um testamento para que não houvesse
nenhuma confusão sobre o futuro que desejava para suas posses.
O filho mais velho recebeu o moinho para poder dar continuidade
ao trabalho do pai. O filho do meio recebeu todos os cavalos e
animais para poder começar a própria fazenda. O filho mais novo,
que se chamava João, herdou o gato do pai.
A princípio, a herança fez João sentir-se desprezado. Ele amava
muito o pai e sempre o tratara muito bem, então não entendeu por
que seus irmãos receberam tanto e ele, tão pouco.
O que João ainda não sabia era que, dos bens do pai, o gato era
o mais valioso. O pai sabia que o filho mais novo e o gato
conquistariam muitas coisas juntos.
O felino em questão chamava-se Gato. Era um gato malhado
marrom, com listras pretas e olhos verdes. Ele era um animalzinho
muito calculista e, de longe, o gato mais inteligente da região.
− Pelo jeito, vou ter que ficar com você, gatinho − suspirou João.
− Também não estou muito animado com isso − disse Gato. −
Depois de todos os ratos que peguei e de todo o carinho que dei
para o seu pai, não acredito que ele me deixou com você.
− Você fala? − surpreendeu-se João.
− Eu sempre falei, você que nunca me escutou. Agora ouça: seu
pai obviamente nos uniu por algum motivo. Então vamos tirar o
proveito que conseguirmos disso. Elaborei um plano que vai nos
deixar ricos!
O gato sem dúvida conseguira a atenção de João.
− Qual é o seu plano, Gato?
− Parte do meu plano é jamais falar sobre o meu plano. Mas
preciso que você confie totalmente em mim e coopere comigo para
que dê certo.
João não tinha nada melhor para fazer e imaginou que qualquer
plano seria melhor do que plano nenhum.
− Estou aqui para o que você precisar.
− Ótimo. Primeiro, preciso que você me leve até a cidade para
comprar roupas novas. Preciso estar muito bem-vestido para a
primeira parte do plano.
João e o Gato foram até a cidade e fizeram compras nas lojas
mais luxuosas. O Gato comprou botas de couro, uma capa, um
elegante chapéu com uma pena e uma longa espada prateada. Tudo
isso custou a João todo o seu dinheiro.
− Tem certeza de que precisa de coisas tão requintadas? −
questionou João. − Há opções bem mais baratas.
− Às vezes, você precisa gastar para poder ganhar − justificou o
Gato. − Além disso, preciso estar apresentável para o rei.
− O rei? Você não me disse que o seu plano envolvia o rei!
− Você nunca perguntou. Agora, precisamos pegar algumas
cenouras e ir para a floresta.
Eles roubaram cenouras da horta de um fazendeiro e foram até a
floresta. Lá, colocaram as cenouras no chão e aguardaram atrás de
uma árvore.
− O que estamos fazendo? − perguntou João.
− Segunda etapa do plano: caçar − respondeu o Gato.
Bem naquele momento, um coelho rechonchudo saltou de sua
toca no chão e começou a comer as cenouras. O Gato
sorrateiramente se aproximou por trás dele e quebrou seu pescoço.
No dia seguinte, o Gato viajou até o castelo do rei com suas
roupas novas. Um gato falante de botas e chapéu era algo tão
inusitado que nenhum dos homens do rei o impediu de entrar. O
Gato foi diretamente até a sala do trono e colocou o coelho aos pés
do rei.
− Vossa Majestade, trouxe um presente do meu mestre − disse o
Gato, fazendo uma reverência.
O rei ficou tão surpreso quanto todos os que se deparavam com o
felino.
− Você fala?!
− Claro que falo − disse o Gato. − Imagino que a maioria dos
animais fica sem palavras perto de Vossa Majestade.
A resposta deixou o rei muito satisfeito, e ele sorriu para o
encantador felino.
− Quem você disse que enviou o presente? − perguntou o rei.
− Meu mestre, o grande Marquês de Carabás. Um rei tão viajado
quanto Vossa Majestade certamente o conhece.
O rei não se lembrava do Marquês de Carabás, mas, com medo
de se constranger na frente de sua corte, fingiu conhecê-lo. Além
disso, ele tinha sido apresentado a tantas pessoas do reino que era
bem possível que realmente o conhecesse.
− Claro, o Marquês de Carabás. Por favor, agradeça
imensamente a seu mestre por mim.
O Gato fez outra reverência e foi embora. Com a terceira etapa
do plano bem-sucedida, era hora de seguir para a quarta.
Todos os domingos à tarde, o rei fazia um passeio de carruagem
pelo reino com sua filha, a princesa. O Gato estava bem a par dessa
rotina do rei e planejava se aproveitar dela. Ele levou João para um
lago perto da estrada por onde sabia que a carruagem do rei
passaria.
− Agora, tire todas as suas roupas e entre no lago − disse o Gato.
− O quê? − exclamou João. − Como é que isso vai nos deixar
ricos?
− Não temos tempo de discutir; o rei está a caminho! Rápido, tire
a roupa e entre no lago.
João estava começando a desconfiar que seguir o plano do Gato
tinha sido uma ideia terrível. Ele despiu-se e pulou na água gélida do
lago. O Gato escondeu as roupas de João atrás de uma grande
rocha para que ninguém as visse.
− Agora, comece a se debater, como se estivesse se afogando.
− Mas o lago nem é tão fundo…
− Apenas faça o que estou dizendo!
Contrariando o próprio bom senso, João debateu-se na água,
como se estivesse em apuros.
Logo, a carruagem do rei passou pela estrada ao lado do lago. O
Gato correu até a frente do veículo e, balançando as patas no ar, fez
o cocheiro parar.
O rei colocou a cabeça para fora e perguntou:
− O que está acontecendo?
− Graças a Deus o senhor está aqui, Majestade! − disse o Gato. −
Meu mestre, o Marquês de Carabás, foi assaltado! O ladrão roubou
suas roupas, empurrou-o no lago e levou sua carruagem! Ele se
afogará se não o ajudarmos!
O rei se sobressaltou.
− Guardas, salvem o homem no lago imediatamente!
Os guardas do rei jogaram uma corda para João e o puxaram
para fora da água. Quando foi resgatado, João estava com tanto frio
que tremia intensamente e seu corpo estava azul. Os guardas o
cobriram com seus casacos e o puseram sentado no interior da
carruagem com o rei e a princesa, onde estava mais quente.
João não conseguia acreditar que estava perto da realeza. Ele
temia que o plano do Gato fosse ter um final terrível se ele não
soubesse o que estava fazendo.
− Você está bem, meu rapaz? − perguntou o rei.
− Graças a Vossa Majestade − disse João. − Não sei nem como
agradecer por vocês terem parado para me ajudar.
− Que coisa terrível roubarem suas roupas e o empurrarem no
lago! − disse o rei.
− Hum… − disse João, sem saber que era essa a versão que
havia sido contada ao rei. − Pois é, foi um dia difícil.
A princesa ficou muito encantada com João, que estava sentado
à sua frente. Ela corou, deu uma risadinha e perguntou:
− Pai, podemos levar o Marquês de Carabás até a casa dele?
Seria um martírio para ele ter que andar depois de tudo que passou.
− Claro que podemos − disse o rei. − Onde fica sua propriedade?
− Minha o quê? − perguntou João, com os olhos arregalados.
− Pobre mestre, esqueceu o juízo no lago − interveio rapidamente
o Gato. − A propriedade dele fica um pouco mais adiante, do outro
lado da vila. Permitam que eu vá na frente para prepará-la para a
chegada do rei.
O Gato correu o mais rápido possível pela estrada. Ao chegar à
vila, avisou a todos os cidadãos que a carruagem do rei passaria em
breve.
− Povo de bem, o rei está chegando com o Marquês de Carabás
− alertou ele. − Eles são amigos muito próximos! Respeitem o
marquês, caso contrário o rei os punirá!
Sem jamais terem ouvido falar de um gato de botas
perambulando pela cidade antes, todos os aldeões saíram para vê-
lo. Devidamente avisados sobre a amizade entre o suposto marquês
e o rei, reverenciaram e celebraram quando a carruagem do rei
passou.
− Que Deus abençoe o Marquês de Carabás! − gritou uma
mulher.
− Vida longa ao Marquês de Carabás! − bradou um homem.
Apesar de ninguém jamais ter dito esse tipo de coisa para ele
antes, João estava quase começando a acreditar que realmente era
o Marquês de Carabás.
− As pessoas gostam muito de você por aqui − disse o rei.
− É o que parece − disse João.
Enquanto a cidade louvava seu dono, o Gato chegou a um
enorme solar nos limites da vila, mas ali não era a casa de um
marquês. O solar era a casa de um terrível ogro que era temido pelo
reino inteiro.
O Gato ficou intimidado com a casa. Aquela era a etapa final do
seu plano. Se tudo desse certo, ele e João ficariam ricos para
sempre; caso contrário, os dois provavelmente morreriam antes do
anoitecer.
Reunindo toda a coragem, o Gato invadiu o solar pela porta da
frente.
− Prepare-se para morrer, ogro horrendo! − declarou o Gato,
sacando a espada.
O ogro estava sentado perto da lareira. Era imenso, até mesmo
para um ogro. Conforme se levantava, a diferença de tamanho dele
para o felino se agigantava; ele era quase vinte vezes maior do que o
Gato.
− Como se atreve a me perturbar? − gritou o ogro. − Vai pagar
por isso!
Bem diante dos olhos do Gato, o ogro transformou-se
magicamente num leão feroz. Ele rugiu tão alto que o Gato quase
caiu para trás.
− Você tem poder suficiente para se transformar em um leão, mas
isso não me impressiona! − disse o Gato, rindo. − Aposto que não
consegue reduzir seu tamanho.
− Eu posso me transformar no que eu quiser − disse o ogro.
− Então prove! − desafiou o Gato. − Transforme-se num rato!
O ogro nunca rejeitava um desafio. Só para provar que o gato
estava errado, o ogro se transformou num pequeno rato-do-campo.
− Ha, ha! − O ogro riu. − Como está vendo, sou muito mais
poderoso do que você… AHHH!
O gato atacou e devorou o ogro antes que este pudesse se
transformar em outra coisa. O felino tinha agido bem a tempo: a
carruagem do rei havia acabado de chegar.
− Seja bem-vindo, meu mestre − disse o Gato. − Acabei de
acender a lareira para vocês.
O felino acompanhou João, o rei e a princesa para o interior do
solar e serviu chá para eles.
− Que casa maravilhosa! − disse o rei para João. − Há quanto
tempo mora aqui?
João engoliu em seco.
− Foi uma mudança recente − disse ele.
− O lugar pertencia a um ogro terrível até meu dono matá-lo −
disse o Gato.
O rei ficou tão impressionado com o Marquês de Carabás que lhe
ofereceu a mão da filha em casamento. Eles se casaram e viveram
felizes para sempre no solar. O Gato também desfrutou de uma vida
muito privilegiada com João e a princesa, e a história de sua bravura
e sabedoria manteve-se viva por eras.
Muitos anos mais tarde, quando João já era um velhinho, seus
netos perguntaram sobre a história da família. João abriu um largo
sorriso no rosto enrugado e disse:
− Bem, tudo começou com um Gato de Botas…

Fim
Eramorrera
uma vez uma velha viúva que vivia sozinha. Seu marido
fazia muito tempo, e seus filhos já eram adultos e tinham
suas próprias famílias, então a viúva se tornara muito solitária na
velhice.
Certa noite, durante uma terrível tempestade, alguém bateu à
porta da casa da viúva. Ela a abriu muito esperançosa, desejando
que fosse um dos filhos lhe fazendo uma visita. No entanto,
encontrou uma anciã tremendo sob a chuva.
− A senhora faria a gentileza de abrigar uma idosa dessa
tempestade? − perguntou a senhora.
A viúva tinha um grande coração e não hesitou em deixar a anciã
entrar. Então preparou uma refeição para a senhora e a acomodou
perto da lareira, para que se aquecesse.
− Muito obrigada − agradeceu a anciã. − Eu bati em muitas portas
hoje, mas você foi a única pessoa que me deixou entrar.
− As pessoas não são mais tão gentis quanto antigamente −
disse a viúva. − Nós, mulheres de idade, precisamos nos ajudar.
A anciã meteu a mão em um bolso e colocou quatro sementes na
mão da viúva.
− Por favor, aceite essas sementes de cevada como uma prova
da minha gratidão.
− Você não precisa retribuir − disse a viúva, tentando devolver as
sementes ao perceber que a anciã possuía tão pouco. − Eu gostei da
sua companhia.
− Não, eu insisto. Essas não são sementes quaisquer, elas são
mágicas e trazem sorte. Mas, se quiser que a mágica dê certo, as
sementes não podem ser comidas nem plantadas no meio do
campo, elas precisam ser colocadas num vaso de flores só delas.
A viúva julgou que a anciã fosse apenas uma velha tola, mas,
para agradar a hóspede, plantou as sementes em um pequeno vaso
de flores e o colocou perto da janela.
Na manhã seguinte, a anciã foi embora, e a solidão da viúva
começou a voltar à tona. Somente uma das quatro sementes de
cevada começou a brotar, e, por ser a única coisa viva na casa além
dela mesma, a viúva conversava com a plantinha todos os dias,
como se fosse uma pessoa.
− Bom dia, querida − dizia a viúva no começo de cada dia. −
Caramba, como você cresceu de ontem para hoje! Deve estar com
sede. Vou pegar um pouco de água para você.
Quanto mais a viúva conversava com a planta, mais rápido ela
crescia. Era como se sua voz a estimulasse tanto quanto o sol. Não
demorou muito para um botão de flor surgir no topo da haste da
cevada.
− Nunca vi uma flor de cevada antes − disse a viúva. − Mal posso
esperar para a primeira flor desabrochar.
Mais ou menos uma semana depois, a flor desabrochou. A viúva
ficou maravilhada; a flor, além de ser linda, tinha uma minúscula
jovem, do tamanho de um polegar, dentro dela.
− Olá − cumprimentou a jovem.
− Meu Deus! − disse a viúva, boquiaberta. − Como foi que você
entrou aí, garota?
− Eu cresci junto com a flor, claro.
− Qual é o seu nome?
− Eu não tenho nome. Poderia me dar um?
A viúva pensou até o nome perfeito surgir em sua cabeça.
− Que tal Polegarzinha? − sugeriu.
− Adorei!
− Existem outras pessoas como você? Nunca vi ninguém do seu
tamanho antes.
− Não sei… Acho que você será a pessoa mais próxima de uma
mãe que vou ter. Posso chamá-la de mãe?
− Ah, querida, eu adoraria.
A viúva ficou felicíssima por ter alguém de quem cuidar, e tratava
Polegarzinha como se fosse sua filha. Ela fez uma cama para a
garota com uma caixa de joias e um vestido com um lenço.
Convenientemente, a garotinha cabia no bolso da viúva, então ela
a acompanhava em todos os seus compromissos cotidianos. À noite,
elas sentavam juntas em frente à lareira, e a viúva lia para
Polegarzinha as histórias que costumava ler para os filhos quando
eles ainda eram crianças. Assim como os filhos no passado,
Polegarzinha sempre pegava no sono escutando as histórias.
Infelizmente, enquanto a viúva e Polegarzinha caminhavam pela
cidade certo dia, a garotinha chamou a atenção de uma sapa feia e
imensa que, por acaso, estava procurando alguém como
Polegarzinha. Então uma noite, enquanto a viúva e Polegarzinha
dormiam, a sapa entrou escondida na casa por um buraco na
parede. Ela fechou a caixa de joias, prendendo Polegarzinha dentro
dela, e a levou embora.
− Socorro! − gritou Polegarzinha. − Mãe, me ajude!
A súplica da garota foi abafada pela caixa. A sapa arrastou-a
casa afora e a levou até uma área pantanosa próxima a um riacho.
Lá moravam muitos sapos, rãs e outras criaturas do tipo, uma mais
grotesca do que a outra.
− Filho! Oi, filhinho! − coaxou a sapa. − Mamãe voltou!
O filho era tão grande e medonho quanto a mãe, e, quando os
dois ficavam lado a lado, era difícil distingui-los.
− Mamãe, o que é isso que está carregando? − perguntou o sapo.
− Eu encontrei uma esposa para você! Estava procurando a noiva
ideal em todo canto, e esta é a criatura mais linda que já vi. Vocês
dois terão filhos lindos!
A sapa abriu a caixa de joias para que o filho visse Polegarzinha
com os próprios olhos. A grande boca do sapo abriu-se ainda mais
ao vê-la.
− Mamãe, ela é linda! − disse o sapo, aproximando-se para beijar
a pequena menina.
− Não me toque! − exclamou Polegarzinha, afastando o rosto
pegajoso dele. − Leve-me de volta para minha mãe imediatamente!
− Oh, pequenina − falou a sapa. − O seu lugar não é com uma
humana. O seu lugar é aqui, com criaturas do seu tamanho!
− Posso ser do seu tamanho, mas aqui não é o meu lugar! −
retrucou Polegarzinha. − Eu não sou um anfíbio!
− Então o que você é? − perguntou o filho.
Polegarzinha não sabia a resposta e emudeceu. Ela saiu da caixa
de joias e tentou fugir correndo para a casa da mãe, mas, antes que
conseguisse ir muito longe, sua cintura foi envolvida pela língua da
sapa e a ela foi puxada de volta.
− Pare com essa besteira − coaxou a sapa. − Não importa o que
você é, pois viverá no pântano com a gente e se casará com o meu
filho.
A sapa colocou Polegarzinha no topo de um nenúfar que boiava
no riacho. O nenúfar estava longe demais da margem para que
Polegarzinha saltasse, e a água corria rápido demais para que ela
nadasse, então a garota não tinha o que fazer.
− Agora, preciso preparar o casamento! − disse a sapa. − Que
festa maravilhosa teremos!
Polegarzinha sentou-se no nenúfar e chorou. Passar o resto da
vida casada com um sapo pegajoso era o pior destino que ela
conseguia imaginar. Por sorte, dois peixes tinham testemunhado
tudo e se compadeceram da pequena menina.
− Não se preocupe − sussurrou um dos peixes para ela. − Vamos
mastigar o caule submerso do nenúfar, assim você ficará livre!
− Ah, por favor! − disse Polegarzinha.
O peixe mergulhou e mastigou o caule do nenúfar até ele se
desprender; e Polegarzinha saiu boiando pelo riacho, desaparecendo
da vista dos sapos sem que estes percebessem.
Polegarzinha ficou aliviada por escapar deles, mas começou a se
preocupar novamente, à medida que o nenúfar acelerava mais e
mais. Logo à frente, ela viu que o riacho desembocava numa
cachoeira e começou a entrar em pânico. Era uma queda pequena,
mas uma altura assustadora para alguém do tamanho dela.
− Ah, não! − exclamou ela. − Socorro! Alguém me ajude, por
favor!
Um grande besouro estava sobrevoando o córrego naquele exato
momento. Ao olhar para baixo e ver a garotinha, imaginou que ela
era algum inseto estranho. Ele voou para baixo e ergueu
Polegarzinha do nenúfar bem quando a planta estava prestes a cair
na queda-d’água.
− Muito obrigada por me salvar! − agradeceu Polegarzinha.
− De nada − disse o besouro. − O córrego pode ser um lugar
perigoso para insetos como nós. Vou levá-la para casa, para que
você fique em segurança até de manhã.
O besouro voou com Polegarzinha até os galhos da árvore onde
ele morava com muitos outros insetos e bichinhos. Havia borboletas
e libélulas, joaninhas e percevejos, louva-a-deus e aranhas. Todos
saíram para ver a criatura estranha que o besouro trouxera.
− Olá − a garota cumprimentou os insetos. − Meu nome é
Polegarzinha.
− Que tipo de inseto ela é? − perguntou uma borboleta.
− Ela não tem asas nem antenas! − disse um louva-a-deus.
− E só tem dois olhos e duas pernas! − constatou uma aranha.
− Ah, não sou um inseto − disse Polegarzinha.
− Se não é um inseto, o que você é? − perguntou o percevejo.
Polegarzinha não respondeu, pois ela continuava sem saber.
− O que quer que ela seja, é a coisa mais feia que já vi! − disse a
joaninha.
Todos os insetos começaram a insultar Polegarzinha por ela ser
diferente deles. Eles a chamaram de nomes horríveis até lágrimas
brotarem dos olhos dela.
− Desculpe ter trazido você até aqui à toa, mas a nossa árvore é
somente para insetos − falou o besouro. − Infelizmente, vou ter que
pedir para você ir embora.
Banida da árvore, Polegarzinha foi levada pelo besouro até o
chão. Ela olhou ao redor para tentar descobrir como chegar à casa
da viúva, mas não reconheceu nada.
Polegarzinha perambulou pela grama, entre as flores e as
árvores, mas não achou a casa da mãe. A pequena ficou perdida por
tanto tempo que as estações começaram a mudar. As folhas das
árvores se soltaram dos galhos e a neve começou a cair.
Polegarzinha precisava ficar de olho no céu o tempo inteiro, para
garantir que nada cairia em cima dela, e se enrolou em uma folha
murcha para se aquecer.
No caminho, ela encontrou no chão um pardal de lindas penas
azuis. Ele tremia por causa do frio e gemia de dor.
− Pobre pássaro, o que houve com você? − perguntou
Polegarzinha.
− Quebrei a asa e não consegui voar com minha família para
passar o inverno no sul − disse o pássaro, erguendo a asa para
mostrar que a ponta estava encurvada. − Agora, eu certamente
morrerei de frio.
− Também estou sem minha família − disse Polegarzinha. − Não
se preocupe, eu ficarei com você até que se recupere.
Polegarzinha fez uma tala com um graveto e a prendeu com
capim à asa do pássaro, para imobilizá-la. Depois, cobriu-o de folhas
para aquecê-lo e apoiou a cabeça da ave num cogumelo. Ela cuidou
do pardal até que sua asa ficasse curada e ele pudesse voar
novamente.
− Você é a criatura mais bondosa que já conheci − disse ele. − O
que você é?
A garotinha ainda não sabia o que responder. Mesmo depois de
todas as suas viagens, ela continuava sem saber.
− É melhor você ir embora, caso contrário não alcançará sua
família − disse Polegarzinha.
O pardal agradeceu novamente e voou em direção ao sul.
Para a infelicidade da pequena, a pior parte do inverno ainda
estava por chegar. A neve passou a cair com mais força e o ar ficou
ainda mais gélido. As condições ficaram tão rigorosas que
Polegarzinha começou a se preocupar, achando que não
sobreviveria até a primavera. Ela bateu à porta da primeira casa que
encontrou para pedir abrigo. Era a toca subterrânea de uma meiga
ratinha.
− Posso ajudá-la? − perguntou a rata.
− Por favor, estou congelando e não tenho para onde ir. Posso
entrar para me aquecer?
− Pobrezinha… Claro que pode.
A rata tinha uma alma bondosa e acolheu Polegarzinha. Ela
deixou a garota ficar na sua casa durante o período mais rigoroso do
inverno, e as duas logo se tornaram amigas. Em troca da
acomodação, Polegarzinha ajudava com a limpeza da casa. À noite,
antes de dormir, a rata gostava de escutar Polegarzinha recitar todas
as histórias que a viúva lhe contara.
A rata percebia que Polegarzinha sentia muito a falta da mãe.
Porém, como parecia improvável que a menina reencontrasse a
viúva, a rata pensou em outra solução para a solidão da amiga.
Na noite seguinte, convidou para o jantar a toupeira que morava
ao lado. Era um velho rude que dizia apenas que odiava a luz do sol.
Apesar de Polegarzinha discordar completamente dele, foi muito
educada e escutou a toupeira, que ficou encantada com ela.
A garota viu o animal sussurrando no ouvido da rata diversas
vezes. Mais tarde, quando Polegarzinha e a rata estavam sozinhas,
ela descobriu o que os dois estavam aprontando.
− A toupeira quer se casar com você − disse a rata, sorrindo.
− Quanta gentileza, mas não posso me casar com uma toupeira −
disse Polegarzinha.
− Por que não? Ele está tão solitário quanto você, e o buraco da
toca dele é enorme, tem muitos quartos.
− Mas eu não sou uma toupeira.
− Então o que exatamente você é?
− Não sei o que sou, mas certamente não sou uma criatura que
gosta de morar num buraco escuro.
A rata cruzou os braços e a fulminou com os olhos. Polegarzinha
sabia que sem querer havia magoado a amiga. A menina tinha
abusado da receptividade da rata, e era hora de partir.
Quando Polegarzinha deixou a casa subterrânea da rata, o
inverno havia terminado e os primeiros dias da primavera tinham
chegado. Todos os pássaros haviam voltado do sul, e Polegarzinha
distinguiu um rosto familiar rodeando-a no ar.
− Polegarzinha! − disse o pardal. − Eu encontrei! Encontrei a sua
casa! Eu a sobrevoei quando estava voltando do sul!
O coração de Polegarzinha disparou de alegria.
− Estou com tanta saudade da minha mãe! Você poderia me levar
até lá, por favor?
− Claro, eu adoraria!
O pardal pousou ao lado dela, e Polegarzinha subiu nas suas
costas. Ele voou na direção do sul por muitos e muitos quilômetros.
A menina não fazia ideia de que tinha se afastado tanto de casa.
− Lá está! − disse o pardal. − Seja bem-vinda à sua casa,
Polegarzinha.
Mas o pássaro não pousou na janela da sua casa, como ela
esperava. Em vez disso, ele desceu até um jardim encantado,
repleto de milhares de lindas flores.
Para a surpresa de Polegarzinha, no centro do jardim havia um
minúsculo reino feito de residências e outras construções do
tamanho de casas de pássaros. Era povoado por homens, mulheres
e crianças do tamanho dela. A única diferença entre eles e
Polegarzinha era que todos do reino tinham asas.
− Que lugar é esse? − perguntou Polegarzinha.
− Você nunca esteve aqui antes? − perguntou o pardal. − Assim
que vi esse reino, tive certeza de que era o seu lugar.
Era a primeira vez que Polegarzinha via pessoas parecidas com
ela; e era fascinante descobrir que não estava sozinha. Então, um
homenzinho veio cumprimentar Polegarzinha e o pardal. Ele era
muito bonito e usava uma coroa de pétalas de margarida.
− Olá − disse ele. − Posso ajudá-los?
− Sim, poderia me dizer onde estamos? − perguntou
Polegarzinha.
− Você está no Reino das Fadas − respondeu ele.
− Então devo ser uma fada − disse Polegarzinha.
− Quer dizer que não sabia disso? − questionou o homem.
Polegarzinha contou que tinha nascido na casa da viúva e vivido
lá até ser raptada. O homenzinho ficou encantado com as aventuras
que a menina havia vivido tentando voltar para casa. Ele era um
príncipe-fada e apresentou o reino a ela.
− Mas, se eu sou uma fada, onde estão minhas asas? −
perguntou ela.
− As asas não nascem com você; é preciso conquistá-las − disse
o príncipe. − Mas, depois da jornada pela qual passou, acho que
você merece um par.
Ele deu a Polegarzinha um par de asas, que se prendeu
magicamente às costas da garota, e então ensinou-a a voar. Algum
tempo depois, os dois se apaixonaram e o príncipe pediu
Polegarzinha em casamento.
Os dois casaram-se no jardim, e Polegarzinha foi coroada
princesa-fada. Apesar de estar com o seu povo, o Reino das Fadas
não parecia ser o seu lar sem a mãe por perto. Então Polegarzinha e
o príncipe encontraram a viúva e a convidaram para morar com as
fadas. A idosa mudou-se para o jardim para ficar perto da filha, e
nem ela nem Polegarzinha se sentiram solitárias novamente.
Fim
Eravilarejo.
uma vez um talentoso padeiro que morava em um pequeno
Ele e a esposa tinham a própria padaria, que era famosa
por produzir os melhores quitutes da cidade. Todas as manhãs, os
aldeões faziam fila na porta da padaria para comprar pães, bolinhos
e pães doces recém-saídos do forno.
Apesar de nunca terem reclamado da seleção de guloseimas, o
padeiro achou que era hora de oferecer mais variedade aos clientes.
Ele encontrou uma receita de biscoitos de gengibre, comprou os
ingredientes necessários, levou-os até a padaria e preparou a
massa. Então cortou a massa em forma de homenzinhos e os
espalhou pela bandeja. Com glacê, ele pintou olhos, bocas, coletes,
botões, calças e sapatinhos nos biscoitos e colocou a bandeja no
forno.
Logo a cidade inteira foi tomada pelo aroma adocicado dos
biscoitos de gengibre assando, e, de repente, uma fila de aldeões
famintos já havia se formado à porta da padaria.
O que o padeiro não sabia era que, acidentalmente, ele comprara
uma farinha com uma pitada de mágica. Assim, quando os biscoitos
terminaram de assar e ele abriu o forno… um Homem-Biscoito saltou
da bandeja e saiu correndo pela padaria.
− Corra, corra, é hora de ser afoito! Não vai conseguir me
alcançar. Eu sou o Homem-Biscoito! − cantarolou o biscoito.
O padeiro fez a maior bagunça na cozinha tentando capturar o
biscoito encantado, mas o homenzinho era rápido demais. O
Homem-Biscoito saiu em disparada pela porta e correu pela cidade,
rindo histericamente.
− Corra, corra, é hora de ser afoito! Não vai conseguir me
alcançar. Eu sou o Homem-Biscoito! − cantarolou ele para provocar
os aldeões.
O biscoito parecia tão delicioso que todos saíram em seu
encalço, com o padeiro na frente. Mas o Homem-Biscoito era mais
rápido do que todos eles.
Ele correu pelo interior, passando por vários moinhos e fazendas.
Os animais das fazendas sentiram seu cheiro a quilômetros de
distância e o encararam com olhos famintos.
− Corra, corra, é hora de ser afoito! Não vai conseguir me
alcançar. Eu sou o Homem-Biscoito! − cantarolou ele para atiçar os
animais.
Os animais da fazenda saltaram por cima dos cercados para sair
dos currais e também partiram em disparada atrás do Homem-
Biscoito. Eles se juntaram aos aldeões e ao padeiro, criando uma
imensa turba. O biscoito continuava correndo com mais velocidade
do que todos e ria de alegria.
O Homem-Biscoito passou correndo por um castelo e chamou a
atenção do rei e de seus soldados.
− Corra, corra, é hora de ser afoito! Não vai conseguir me
alcançar. Eu sou o Homem-Biscoito! − cantarolou ele para
atormentar o rei.
O rei ficou insultado com a música zombeteira do Homem-
Biscoito e ordenou que seus soldados capturassem o biscoito
insolente. Os homens do rei montaram em seus cavalos e se
juntaram à turba de animais e aldeões. Porém, o Homem-Biscoito
continuava sendo muito mais veloz; parecia improvável que alguém
pudesse alcançá-lo.
De repente, a jornada do Homem-Biscoito foi interrompida às
margens do rio que cortava o reino. Feito de farinha, ele sabia que
desmancharia se tentasse nadar até o outro lado.
− Ah, não! O que vou fazer agora? − perguntou-se ele.
− Não se preocupe, biscoitinho − disse uma raposa que apareceu
a seu lado. − Sei como é ser perseguido e caçado. Vou nadar para o
outro lado do rio, e você pode ir nas minhas costas!
O Homem-Biscoito ficou muito contente com a ajuda. Ele subiu
nas costas da raposa bem na hora em que todos os soldados do rei,
os animais da fazenda, os aldeões e o padeiro alcançaram o rio.
Todos se deram conta de que jamais conseguiriam pegar o biscoito
depois daquilo.
O biscoito encantado cantou e dançou ao ver todos aqueles
rostos desapontados:
− Corra, corra, é hora de ser afoito! Não vai conseguir me
alcançar. Eu sou o…
Antes que ele pudesse concluir sua canção, a raposa devorou o
Homem-Biscoito.
− Parabéns ao padeiro! − disse a raposa, lambendo os lábios.
Os soldados do rei retornaram ao castelo, os animais retornaram
à fazenda, os aldeões retornaram ao vilarejo, o padeiro retornou à
padaria, e todos retornaram à sua vida normal.
E o padeiro aprendeu uma valiosíssima lição de negócios:
sempre pense bem nos ingredientes quando for tentar algo novo. Se
você acrescentar pernas a alguma coisa, pode ser que ela
simplesmente se levante e saia correndo.

Fim
Eraperfeitos.
uma vez uma pata que se tornou mãe ao botar seis ovos
Ela era muito protetora em relação a seus ovos e só os
deixava sozinhos uma vez por dia, quando ia tomar café da manhã.
Porém, certa vez ela voltou para o viveiro e encontrou não seis, mas
sete ovos no seu ninho.
− Oh, devo ter contado errado − disse a pata, e não pensou mais
sobre o assunto.
Um mês depois, os ovos racharam e seis lindos patinhos
nasceram. No entanto, a criatura que nasceu do sétimo ovo só
poderia ser descrita, com muita bondade, como um patinho feio.
Enquanto os seis patinhos tinham plumas amarelas e macias, as
plumas do sétimo eram acinzentadas e opacas. Os seis patinhos
tinham bico pequeno e alaranjado, e o do sétimo era preto e enorme.
Na hora de comer, os seis patinhos grasnavam graciosamente para a
mãe, mas o sétimo berrava, ferindo os ouvidos dos irmãos.
Desde o minuto em que nasceram, os patinhos reconheceram
que o sétimo irmão era muito diferente deles. E, como a diferença é
algo que sempre assusta criaturas de mente limitada, o Patinho Feio
era provocado e atormentado impiedosamente por seus irmãos e
irmãs.
Quando iam passear com a mãe pela fazenda, eles sempre
obrigavam o Patinho Feio a caminhar um metro atrás deles. Quando
iam nadar, os irmãos enganavam o Patinho Feio, fazendo a
brincadeira de “quem consegue prender a respiração debaixo da
água por mais tempo”, e então o abandonavam quando ele
mergulhava. Quando eram pegos por uma tempestade, os patinhos
fechavam a porta do viveiro antes que o Patinho Feio pudesse entrar,
deixando-o no meio do aguaceiro.
Para piorar, as provocações não vinham somente dos seus
irmãos. Nenhum dos animais da fazenda resistia a atormentar o
filhotinho de ave.
− Talvez a mãe dele não tenha chocado o ovo por tempo
suficiente − zombou uma vaca.
− Ou talvez ela tenha chocado por tempo demais − emendou um
porco, rindo.
Por fim, o Patinho Feio cansou-se de ser tão maltratado e
abandonou a fazenda. Ele encontrou uma lagoa um pouco mais
adiante na estrada e conheceu uma família de gansos que morava
lá.
− Vocês se incomodariam em ter outra ave por perto? −
perguntou o Patinho Feio.

− Desde que você seja capaz de se virar sozinho… − disse o


ganso no comando. − Ninguém vai te dar nada mastigado por aqui.
O Patinho Feio tivera de aprender a se virar sozinho na fazenda,
então não achou que isso seria um problema. Os gansos não eram
afetuosos com ele, mas também não o perturbavam, então o filhote
ficou contente por poder viver com eles.
No entanto, a vida fora da segurança da fazenda apresentava
perigos que o Patinho Feio não conhecia.
Caçadores foram até o lago e assustaram os gansos, que
tentaram fugir voando, mas acabaram abatidos. Como suas asas
ainda não tinham crescido, o Patinho Feio permaneceu no chão e se
escondeu no meio da grama até os caçadores irem embora.
Então o Patinho Feio foi obrigado a desbravar o mundo para
encontrar um novo lar. No meio da floresta, passou por uma
encantadora casinha que pertencia a uma velhinha. A senhora
estava sentada numa cadeira de balanço na varanda, quando viu o
pequeno bamboleando em frente à casa e o convidou para entrar:
− Pobre avezinha, deve estar perdida… Por favor, entre. Eu
cuidarei de você.
A velhinha era bondosa e o alimentou com muitas sementes e
transformou uma caixa de madeira numa bela cama para ele. Mas o
Patinho Feio não era seu único bicho de estimação. A senhora
também tinha um gato rechonchudo, dono de um apetite voraz.
O gato observava diariamente a pequena ave andar pela casa. O
felino lambia os beiços e contraía as garras, afligindo o Patinho Feio,
que achava que seria atacado pelo felino se demorasse demais a
sair dali. Até que a avezinha não aguentou mais viver naquela
ansiedade e partiu para encontrar outro lugar onde morar.
O Patinho Feio encontrou um bando de cisnes descansando em
um riacho. Aquelas eram as criaturas mais majestosas que ele já
tinha visto, e ficou com inveja de suas penas brancas e de seu
pescoço fino e longo. Ele tentou se aproximar o mais rápido que
pôde dos cisnes para perguntar se poderia viver com eles, mas os
belos pássaros abriram suas longas asas e voaram para o sul antes
que o patinho os alcançasse.
Todas as aves, menos o Patinho Feio, sabiam que o inverno se
aproximava. Logo, a região cobriu-se de neve e foi tomada por
ventos gélidos. Todas as lagoas e lagos congelaram, e o Patinho
Feio não tinha para onde ir.
Um fazendeiro encontrou-o tremendo no frio e se compadeceu do
pobre pássaro. Ele enrolou o patinho em um pano e o levou para
casa.
− Coitadinho, vou levá-lo para um lugar quente − disse ele.
A casa do fazendeiro era um encantador e aconchegante refúgio
do frio. Ele e a esposa foram bondosos com o Patinho Feio, e o casal
não tinha nenhum outro bicho de estimação para amedrontar o
patinho. Porém, seus dois filhos eram muito travessos, o que se
tornou um problema para o patinho.
As crianças tratavam o Patinho Feio como um brinquedo. Faziam-
no de gato e sapato, puxavam suas penas e o vestiam com roupas
de boneca. Os maus-tratos eram tantos que o patinho achou que era
melhor viver no frio, então abandonou a casa do fazendeiro.
O Patinho Feio encontrou uma pequena caverna próxima a um
lago congelado e passou o resto do inverno ali, sozinho. Foi
desalentador; depois de tantas jornadas, ele ainda não tinha um lar,
nem uma família; havia se tornado um patinho solitário − e não há
nada pior do que isso no mundo das aves.
Algum tempo depois, a primavera chegou, derretendo o gelo que
cobria o lago. O Patinho Feio crescera tanto na caverna que quase
não conseguiu sair de dentro dela. Ele nadou pelo lago e esticou
suas asas, quando escutou uma voz chamá-lo:
− Ei, você! Olá! − disse a voz. − Você deve estar nos procurando!
Ao virar-se em direção à voz, o Patinho Feio viu que o bando de
cisnes tinha retornado para a primavera.
− Junte-se a nós aqui − completou o cisne.
− Vocês querem que eu me junte a vocês? − perguntou o Patinho
Feio.
− Claro que sim − respondeu o cisne. − Afinal, você é um de nós.
O Patinho Feio olhou para a água e ficou chocado ao ver o
próprio reflexo. Suas penas eram brancas como a neve, e agora ele
tinha um pescoço longo e curvo − crescera e se transformara em um
belo cisne!
− Eu fui tão feio a vida inteira… − disse ele. − Como isso é
possível?
− Todos nós temos uma fase esquisita quando somos mais novos
− disse o cisne. − Mas é o que possibilita que a gente desenvolva as
nossas asas.
O cisne que antes era conhecido como Patinho Feio viveu com os
outros cisnes pelo resto da vida. No fim de cada ano, quando sua
nova família voava em direção ao sul para passar o inverno, ele fazia
questão de sobrevoar sua antiga fazenda para que todos os animais
o vissem. O Patinho Feio que eles tanto destratavam podia agora
voar a uma altura que nenhum deles jamais alcançaria.

Fim
Eratalentoso
uma vez um homem bondoso chamado Gepeto. Ele era um
escultor de madeira e passara a vida inteira fazendo
criações maravilhosas. Lamentavelmente, ele nunca tivera tempo de
começar uma família. Sem esposa nem filhos, o pobre homem
tornou-se muito solitário e triste, então, para preencher o vazio no
seu coração, ele construiu uma marionete do tamanho de uma
criança e passou a tratá-la como a um filho.
− Vou chamá-lo de Pinóquio − disse Gepeto.
Nada no mundo dava mais alegria a Gepeto do que o menino de
madeira. De manhã, ele sentava a marionete à mesa e conversava
com ela enquanto tomava seu café da manhã. À tarde, levava
Pinóquio consigo para resolver seus assuntos pela cidade. À noite,
Gepeto colocava Pinóquio para dormir na sua própria cama e lia
histórias para ele. O homem amava e cuidava tanto do boneco que,
um dia, a marionete magicamente ganhou vida!
Gepeto observou, deslumbrado, o menino de madeira se levantar
sozinho e sorrir para ele. Achou que era apenas sua imaginação, até
que o boneco falou:
− Olá! Quem é você?
− Sou seu pai.
− E quem sou eu?
− Você é meu filho, Pinóquio! E você é um milagre!
Assim como todos os pais, agora que seu filho andava e falava,
Gepeto passou a encontrar muito mais dificuldades para criá-lo. Um
dia, Pinóquio passou muito tempo brincando na rua e voltou para
casa coberto de cupins. Gepeto removeu os insetos cuidadosamente
do corpo do filho um a um e lixou as marcas de mordida. Em outra
ocasião, Pinóquio cochilou perto do forno e, ao acordar, viu que seus
pés tinham sido queimados. Gepeto esculpiu um novo par de
sapatos para o garoto e o alertou sobre os perigos do fogo.
Por ter a cabeça oca, Pinóquio tinha muito o que aprender. Ele
fazia centenas de perguntas para o pai todos os dias e amava
aprender sobre o mundo em que viviam. Havia apenas uma pergunta
que Gepeto não sabia responder.
− Papai, eu sou um menino de verdade?
− Bem, não exatamente.
− Será que um dia eu serei um menino de verdade?
Essa pergunta deixava Gepeto desconcertado, pois Pinóquio era
o único boneco vivo que ele conhecia. Como Gepeto nunca tinha
ouvido falar de algo não humano se tornando humano, era muito
improvável que isso fosse acontecer com Pinóquio. Porém, não
querendo magoar o menino, Gepeto respondia:
− Talvez um dia. Se você for à escola e receber uma boa
educação, talvez se torne um menino de verdade. Aqui, pegue esse
dinheiro e vá comprar livros didáticos. Você pode começar a
frequentar a escola amanhã.
Pinóquio pegou alegremente as cinco moedas do pai e foi até a
cidade comprar seus livros didáticos. Porém, no meio do caminho, o
dinheiro nas suas mãos chamou a atenção de um gato perverso e de
uma raposa. Os dois animais eram vigaristas e acharam que
Pinóquio seria um alvo fácil.
− Boa tarde, meu garoto − disse a raposa. − Posso perguntar
aonde vai com essas moedas?
− Estou indo até a livraria − disse Pinóquio. − Vou começar a ir
para a escola, assim vou receber uma boa educação e me tornarei
um menino de verdade!
− Livros? − sibilou o gato. − Qualquer menino de verdade sabe
que a escola já não é mais um bom investimento. Se eu fosse você,
levaria o dinheiro para o Campo dos Milagres! Quando as moedas
são plantadas no solo desse campo, cresce uma árvore de dinheiro
da qual brotam centenas de moedas.
− Puxa! − exclamou Pinóquio. − Gepeto ficaria tão orgulhoso se
eu voltasse para casa com centenas de moedas! Como chego ao
Campo dos Milagres?
− Basta seguir por este caminho, entrar na floresta e ir até o
campo − disse a raposa. − Você o reconhecerá pelas árvores de
dinheiro crescendo ali.
O menino de madeira desviou animadamente de seu caminho e
tomou a direção do Campo de Milagres do qual o gato e a raposa
tinham falado. Porém, ele não sabia que os animais o seguiam por
trás das árvores que ladeavam o caminho. Pinóquio andou e andou,
mas não achou nenhum campo. Algum tempo depois, o sol se pôs e
a floresta ficou tão escura que ele mal conseguia enxergar a trilha à
sua frente.
− Tenho certeza de que eu já deveria ter chegado ao Campo dos
Milagres − disse ele.
De repente, o gato e a raposa saltaram de trás das árvores e
roubaram as moedas de Pinóquio − ele caíra numa armadilha.
− Agora, vamos pendurá-lo em uma árvore − disse a raposa. −
Quando alguém o encontrar, ele já terá morrido, e nós estaremos
bem longe daqui.
Amarraram uma corda na cintura de Pinóquio e o ergueram até
os galhos de uma árvore. O gato e a raposa contaram as moedas e
uivaram de tanto gargalhar pelo sucesso do plano. Eles
abandonaram o garoto de madeira sozinho na floresta.
− Socorro! − gritou Pinóquio. − Alguém me ajude, por favor!
Gritar pedindo socorro parecia inútil. Ele estava tão embrenhado
na floresta que achava que ninguém o escutaria. Mas, para sua
sorte, uma bela fada que morava ali perto escutou seus gritos e foi
ajudá-lo. Uma dúzia de azulões a ergueram e a colocaram
delicadamente no galho em que Pinóquio estava pendurado.
− Pobre bonequinho − disse a fada. − Como veio parar aqui?
Pinóquio, com vergonha de contar à fada o que realmente tinha
acontecido, inventou uma história:
− Subi na árvore para salvar um filhote de passarinho que estava
caindo do ninho. Mas escorreguei e fiquei preso nesta corda.
Para a surpresa da marionete, seu nariz dobrou de tamanho. Era
algo estranho de ver, mas ainda mais estranho de sentir.
− Está me contando uma mentira? − perguntou a fada, colocando
as mãos nos quadris.
− Não, é a mais pura verdade! − disse Pinóquio.
O nariz de Pinóquio cresceu mais trinta centímetros.
− O que está acontecendo comigo? − quis saber Pinóquio.
− Você foi abençoado com um coração honesto, então o seu nariz
cresce toda vez que você mente − explicou-lhe a fada. − Vou lhe dar
uma última chance de me contar a verdade. Se mentir novamente,
voltarei para casa e o deixarei aqui.
Pinóquio contou para a fada que Gepeto lhe dera cinco moedas
de ouro para comprar livros didáticos, mas que fora enganado por
um gato e uma raposa que lhe falaram sobre um Campo de Milagres
e que os animais o penduraram na árvore e o abandonaram ali.
− Vou ajudá-lo a descer, mas só se você me prometer que vai
contar a verdade para o seu pai quando chegar em casa − falou a
fada. − E você deve ir para a escola amanhã, assim como ele pediu.
− Prometo! − disse Pinóquio.
A fada sabia que ele estava contando a verdade, pois o nariz do
boneco continuou do mesmo tamanho. Ela balançou a varinha e um
bando de pica-paus vindos de todos os lados da floresta apareceu.
Eles esculpiram o nariz de Pinóquio para que voltasse ao tamanho
original e bicaram a corda até ela se romper e a marionete cair no
chão.
− Muito obrigado − agradeceu Pinóquio à fada.
O menino de madeira voltou correndo pela trilha em direção à
cidade e só parou ao chegar em casa. Na oficina de Gepeto, o
boneco caiu em prantos e contou ao pai tudo que tinha acontecido.
− Calma, calma, Pinóquio − disse Gepeto. − Cometer erros faz
parte de ser um menino de verdade. Vou lhe dar mais cinco moedas
para que amanhã você compre os livros.
No dia seguinte, o escultor colocou cinco moedas de ouro na mão
do menino de madeira e se despediu dele. No caminho, uma grande
carruagem parou na lateral da estrada, impedindo que Pinóquio
avançasse. A carruagem estava lotada com dezenas de meninos
travessos do tamanho de Pinóquio.
− Quer vir conosco? − perguntou o cocheiro.
− Aonde vocês vão? − quis saber Pinóquio.
− À Ilha dos Prazeres − respondeu o cocheiro. − É o paraíso de
todo menino! Estou cobrando apenas cinco moedas por pessoa para
o transporte.
− Desculpe, senhor − disse Pinóquio. − Mas estou indo até a
livraria comprar livros didáticos para poder me tornar um menino de
verdade.
− Mas você só poderá se tornar um menino de verdade se souber
se divertir como um menino de verdade.
Pinóquio não precisava ouvir mais nada. Ele entregou as moedas
para o cocheiro e se juntou aos outros garotos na traseira da
carruagem. Eles eram barulhentos e indisciplinados; brigavam, se
empurravam e puxavam o cabelo um do outro enquanto se
distanciavam da cidade.
A carruagem levou o dia inteiro para chegar ao litoral, onde
embarcou num enorme navio. O navio atravessou o oceano durante
dois dias e chegou à Ilha dos Prazeres. O lugar não era nada
parecido com o que Pinóquio esperava.
Havia garotinhos correndo descontrolados por toda parte,
destruindo coisas com bastões e martelos, chutando cachorrinhos,
amarrando o rabo de um gato no de outro e apanhando borboletas
apenas para rasgar as asas delas.
− Se isso é diversão de verdade, então eu não quero me divertir −
disse Pinóquio.
− Ei, vejam só este menino! − disse um garoto, apontando para
Pinóquio. − Ele é feito de madeira! Vamos quebrá-lo e fazer uma
fogueira com ele!
Os garotos indomáveis perseguiram Pinóquio pela ilha inteira.
Graças a suas pernas de madeira, ele conseguiu ser mais rápido do
que eles e se escondeu na praia.
− Eu devia ter obedecido ao meu pai e à fada − Pinóquio pensou
em voz alta. − Se eu simplesmente tivesse ido até a loja, em vez de
entrar na carruagem, não estaria nessa confusão. Agora jamais serei
um menino de verdade!
Felizmente, a fada que ele conhecera na floresta desconfiou que
o boneco se meteria em mais encrenca e resolveu ficar de olho nele.
Uma dúzia de gaivotas a carregou sobre o oceano e a colocou ao
lado de Pinóquio na praia.
− Está em apuros de novo, eu sabia… − disse ela.
− Oh, fada, por favor, me ajude a sair desta ilha − pediu Pinóquio.
− Como você veio parar aqui? − perguntou ela.
Mais uma vez, Pinóquio ficou envergonhado demais para contar a
verdade, então inventou outra história:
− Fui sequestrado por ladrões que me trouxeram até aqui!
Assim como antes, o nariz de Pinóquio dobrou de tamanho.
− Ora, ora, mentir não o levará a lugar nenhum − disse a fada,
balançando o dedo para ele. − Eu posso ajudá-lo uma última vez,
mas só se me contar a verdade.
Pinóquio contou à fada que se deparara com a carruagem que
levava os meninos para a Ilha dos Prazeres quando estava a
caminho da livraria e que acreditou que, se ele se divertisse de
verdade, como o cocheiro descrevera, ficaria mais perto de se tornar
um menino de verdade.
− Ser um menino de verdade nem sempre tem a ver com
diversão; às vezes é uma questão de fazer boas escolhas − disse a
fada. − Se me prometer que vai para a escola como seu pai pediu,
eu o levarei para casa.
− Eu prometo! − disse Pinóquio.
A fada sabia que ele estava dizendo a verdade, pois o nariz do
menino de madeira não cresceu mais. Ela balançou a varinha e um
enxame de besouros apareceu no meio da areia e mastigou o nariz
de Pinóquio até ele voltar ao tamanho normal. Os insetos o
seguraram pelos braços, carregando-o sobre o oceano, e o deixaram
à porta da oficina de Gepeto.
Pinóquio entrou correndo na oficina, mas Gepeto não estava lá.
Ele procurou pela cidade, mas não encontrou o pai em lugar algum.
Por fim, foi até a casa da senhora que morava ao lado e perguntou
se ela tinha visto Gepeto.
− Ah, pobrezinho, você não soube? − perguntou a mulher.
O menino de madeira balançou a cabeça oca.
− Gepeto ficou sabendo que você foi para a Ilha dos Prazeres,
então ele pegou um barco emprestado e foi procurá-lo no mar −
disse a vizinha. − Mas o barco dele foi engolido por uma baleia
terrível.
− Oh, não! − disse Pinóquio. − Preciso encontrá-lo e salvá-lo,
assim como a fada me salvou!
Ele não queria descumprir a promessa que fizera para a fada,
mas faria qualquer coisa para salvar o pai. Pinóquio voltou para o
litoral e mergulhou na água. O menino de madeira flutuava nas
ondas, o que o ajudou a nadar. Então Pinóquio nadou e nadou, mas
não encontrou a baleia − foi ela quem o encontrou.
A baleia engoliu Pinóquio de uma só vez, e ele deslizou por sua
garganta e foi parar em sua barriga. Lá dentro era muito escuro e
frio. Pinóquio não conseguia enxergar nada, e duvidava que o pai
tivesse sobrevivido. Quando estava prestes a perder as esperanças,
algo cutucou seu ombro e ele escutou uma voz familiar.
− Pinóquio, o que está fazendo aqui? − perguntou Gepeto.
− Papai, você está vivo! − Pinóquio disse, e o abraçou.
− Estou contente em vê-lo, filho, mas você não deveria ter vindo
até aqui! − repreendeu Gepeto. − Agora nós dois viraremos refeição
de baleia!
De repente, a baleia começou a tossir. Pinóquio espetara a
garganta dela com suas farpas, o que a irritou profundamente. Com
um forte espasmo, a baleia lançou o escultor e o boneco de volta ao
oceano. Se Pinóquio não estivesse lá, Gepeto teria se afogado, mas
o escultor usou o filho como boia e nadou até o litoral.
Ao chegarem à oficina, pai e filho estavam exaustos e
ensopados, além de federem a peixe. Para a surpresa dos dois, a
fada os aguardava lá dentro.
− Desculpe por eu ter descumprido a promessa! − disse Pinóquio
para a fada. − Eu queria ir para a escola e me tornar um menino de
verdade, mas seria inútil ser um menino de verdade se eu não
tivesse um pai me esperando em casa.
Gepeto e a fada ficaram muito comovidos com as palavras do
menino.
− Foi exatamente por isso que vim até aqui, Pinóquio − disse a
fada. − Você pode ter a cabeça oca, mas tem um coração de ouro.
Como eu disse, ser um menino de verdade tem a ver com fazer boas
escolhas, e escolher salvar o seu pai foi uma escolha muito corajosa.
Eu ficarei honrada em transformá-lo em um menino de verdade.
A fada balançou a varinha e o corpo de madeira de Pinóquio foi
transformado em carne e osso. Agora ele era um menino de
verdade!
Pinóquio pulou de tanta alegria. Gepeto balançou o filho no ar e o
abraçou. O sonho da marionete e do escultor tinha se tornado
realidade, e os dois viveram felizes para sempre como dois meninos
de verdade.

Fim
A PEQUENA BO PEEP
A Pequena Bo Peep perdeu seus cabritos
Não sabe onde eles foram parar.
Não se preocupe, pois abanando os rabichos
Seus bichos logo voltam para o lar.
A PEQUENA MISS MUFFET
A pequena Miss Muffet
Sentou no tapete,
Para coalhada comer;
Uma aranha chegou,
Do seu lado ficou,
E Miss Muffet pôs-se a correr.
JOÃO SEM ESPANTO
João sem Espanto
Sentou-se num canto,
Comendo a torta de Natal.
Meteu o dedo na massa
Caçou uma uva-passa
E disse: “Sou mesmo o maioral!”.
A VELHINHA QUE VIVIA DENTRO DE UM
SAPATO
Vivia dentro de um sapato uma velhinha.
Vivia tonta, de tantos filhos que tinha.
Caldo a alguns ela dava, mas não dava pão,
Depois gritava com todos, que dormiam então.
HUMPTY DUMPTY
Humpty Dumpty trepou no muro,
Humpty Dumpty caiu no chão duro,
Os homens do rei com seus cavalos e estandartes
Não puderam reunir suas partes.
SEM EIRA NEM BEIRA
Sem eira nem beira
Sem eira nem beira.
Três homens numa banheira?
O padeiro, o açougueiro e o castiçaleiro
Muito faceiros indo para a feira.
TRÊS RATOS CEGUINHOS
Os ratos ceguinhos, que eram três,
Correram atrás
Da mulher do camponês
Até que a cauda deles ela cortou sem dó
Com sua faca afiada com a pedra mó.
E você já viu alguma vez
Ratos ceguinhos, ainda mais três?
BÉÉ, BÉÉ, NEGRA OVELHINHA
Béé, béé, negra ovelhinha,
Tens lã para mim?
Sim, senhor, tenho, sim,
Três sacas cheias assim.
Uma para o mestre
E para a senhora também,
E outra para o garotinho
Que mora mais além.
JORGE PORQUINHO
Jorge Porquinho, pudim e manjar,
As meninas beijava e as punha a chorar,
Mas quando os meninos vinham se juntar,
Jorge corria e não queria brincar.
FESTA NO MATO
As coisas estão fora de lugar
O gato sapeca tocando rabeca
A vaca num pulo alcançando o luar
O prato para o mato fugiu com a colher
E o cachorrinho riu:
Seja o que Deus quiser!
É HORA DO BOLO
É hora do bolo,
Não é, seu padeiro?
Pois eu quero um bolo,
Feito bem ligeiro.
Mexa a massa e bata bem direitinho,
No topo ponha a letra B com carinho,
Então traga o bolo prontinho enfim
Para agradar o meu bebê e a mim.
JACK E JILL
Jack e Jill subiram o monte,
Para pegar um balde de água;
Jack tropeçou e quebrou a fronte,
Enquanto Jill quebrou a cara.
Jack se ergueu e saiu correndo
Levando sua cuca para o remendo
Quem o curou foi o doutor Louco
Usando vinagre e bala de coco.
JOÃO DESTREZA
João destreza,
João leveza,
Quero ver você pular
A vela sobre a mesa.
Você percebeu algo de curioso no seu Tesouro? As páginas
começaram a cintilar em momentos aleatórios e se tornaram
mais brilhantes a cada dia que passava? Esse brilho era seguido de
um zumbido estranho mas convidativo? Você se aproximou demais
do livro e acabou indo parar em outra dimensão? Então está com
sorte, pois este guia de sobrevivência é para você!
Ao comprar este livro, retirá-lo na biblioteca ou pegá-lo
“emprestado” de um amigo, você provavelmente não esperava ser
transportado para um mundo em que os contos de fadas são reais.
A vida é cheia de surpresas; às vezes chove quando deveria estar
ensolarado, e, às vezes, os livros infantis são portais para outras
dimensões. Relaxe; essas coisas acontecem.
Então, se você estiver no meio de um conto de fadas, não
precisa entrar em pânico. O mundo dos contos de fadas pode ser
um lugar bastante perigoso, mas, se você seguir minhas instruções
com cuidado, conseguirá voltar para o próprio mundo antes que
possa dizer “e todos viveram felizes para sempre”. (Confie em mim:
se tem uma coisa em que sou boa é sobreviver. Você está em boas
mãos.)

REGRA Nº 1: NÃO ENTRE EM PÂNICO. COLOQUE PARA FORA.


A primeira viagem é sempre um pouco chocante. Não deixe o susto,
o terror e a confusão se acumularem dentro de você, pois assim
acabará entrando em pânico. Dê um bom grito, uma bela chorada
ou coloque os fluidos corporais para fora. Porém, seja rápido. Não é
bom atrair atenção indesejada de criaturas maliciosas da floresta.

REGRA Nº 2: NÃO SE CULPE.


Lembre-se de que nada disso é culpa sua. Não importa quão
cuidadoso ou responsável você é, a vod atinge a todos nós. (Ah, e
vod significa Viagem para Outras Dimensões − eu mesma criei esse
termo.) Sim, você poderia ter chamado a polícia quando o livro
começou a brilhar. Não, você não precisava ter se aproximado tanto
do livro a ponto de se desequilibrar e cair dentro dele. Mas ninguém
nunca chegou a lugar nenhum sem sair da zona de conforto; é só
perguntar para os irmãos Wright.

REGRA Nº 3: AVALIE EM QUE TIPO DE CONTO DE FADAS


VOCÊ ESTÁ.
Dê uma olhada ao redor. O que você está vendo? É um jardim
colorido com fadas e unicórnios? Está vendo belos cavaleiros
cavalgando na direção do pôr do sol acompanhados por lindas
donzelas? Ótimo! Você está dentro de uma inofensiva história de
ninar. Sinta-se à vontade para dar uma olhada por aí e bater
algumas fotos.
Você está cercado por uma floresta densa e assustadora? Está
no meio de uma enorme caverna enfumaçada? Então saia correndo
− você está numa lição de moral! Alguma coisa está prestes a fazer
de você um exemplo ou uma refeição! Só pare quando seus
arredores tiverem a descrição do parágrafo anterior.

REGRA Nº 4: SE GARRAS TIVER, SIGA A LEI QUE QUISER.


A cadeia alimentar se aplica a todos os animais, mesmo que ele
fale. Não é só porque algo sabe se comunicar que você parecerá
menos apetitoso para ele. Nunca diga a um lobo aonde você está
indo, não invada a casa de ursos e não peça indicações a uma
raposa! Isso deveria ser uma questão de puro bom senso, mas,
depois de ler o Tesouro (especialmente as rimas sobre os idiotas
que eu conheço), você perceberá que bom senso não é algo muito
comum no mundo dos contos de fadas.

REGRA Nº 5: NUNCA CONFIE EM PESSOAS DE IDADE.


O mundo dos contos de fadas é cheio de idosos que querem se
vingar dos mais jovens (excluindo eu, obviamente). Jamais negocie
com um coroa; você terminará com um gigantesco pé de feijão no
quintal. Jamais aceite presentes de uma anciã; você acabará tendo
que criar uma filha do tamanho de uma xicrinha de café.
Porém, nunca negue nada a pessoas de idade! Se uma senhora
bater à sua porta no meio da noite pedindo abrigo, dê a ela um
quarto com uma bela vista! Se um velho mendigo o parar no meio
da estrada e pedir comida, cozinhe um banquete para ele! O que
quer que você faça, não irrite os mais velhos, caso contrário será
amaldiçoado e virará uma fera ou um sapo!

REGRA Nº 6: EVITE CONSTRUÇÕES DUVIDOSAS.


Não estou nem aí se parece interessante de longe − se você vir algo
que parece estranhamente posicionado ou construído, não se
aproxime! Isso só lhe causará problemas.
Por exemplo, se encontrar uma torre no meio da floresta, saia de
perto − ela pertence a uma bruxa! Caso você se depare com uma
ponte sobre um riacho, lembre-se de que é melhor molhar os
sapatos do que virar o almoço de um ogro esfomeado que mora
debaixo dela!

REGRA Nº 7: SE ALGO PARECE BOM DEMAIS PARA SER


VERDADE, É PORQUE É BOM DEMAIS PARA SER VERDADE!
No mundo dos contos de fadas, as coincidências costumam ter
suas consequências. Se você estiver em uma situação difícil e se
deparar com uma solução milagrosa capaz de resolver todos os
seus problemas, é muito provável que esteja sendo enganado e
acabe em uma situação ainda pior!
Por exemplo, se você estiver perdido no meio de uma terrível
tempestade e o único abrigo à vista for um magnífico castelo com
quartos enormes e espaçosos, é provável que haja uma fera o
aguardando lá dentro. Se você estiver faminto e vagando sem rumo
pela floresta, aquela casa de biscoito de gengibre que apareceu
bem no seu caminho provavelmente foi construída para atrair tolos
esfomeados como você. Lembre-se de que, no mundo dos contos
de fadas, as armadilhas têm todos os tipos de formas, tamanhos e
sabores.

REGRA Nº 8: NÃO SEJA UM BABACA.


Eis uma ótima dica! Por mais difícil que seja, tente manter uma
atitude positiva durante a sua visita. O mundo dos contos de fadas
tende a recompensar os generosos e punir os egoístas. Seja
bondoso e trate a todos com respeito, e assim você verá quanto isso
faz diferença. Além disso, muitas fadas e bruxas gostam de se
disfarçar, então é bom tomar cuidado com quem você aborrece.

REGRA Nº 9: QUANDO EM DÚVIDA, ENCONTRE UMA FADA.


Se não estiver a fim de ficar no local e passear, a maneira mais
rápida de voltar para casa é encontrando uma fada. Conte para ela
sobre o seu livro, sobre como ele brilhou, zuniu e o transportou para
o mundo dos contos de fadas, e então ela deve ajudá-lo. A maioria
das fadas conhece a vod e é capaz de levá-lo de volta para casa.
Porém, não diga às fadas que fui eu que o enviei até elas. Não
sou muito popular entre as fadas hoje em dia. Na verdade, é melhor
nem mencionar o meu nome; caso contrário, quando elas forem
deixá-lo em casa, você pode acabar sendo deixado em uma ilha
deserta no Triângulo das Bermudas… É uma longa história!

Bem, espero que este guia tenha sido útil! Muitas pessoas acharam
que era bobagem escrevê-lo, mas, se este livro estivesse nas
minhas mãos, eu gostaria de estar preparada para o que ia
encontrar. Se um dia você se vir no mundo dos contos de fadas, não
se esqueça de me visitar para dar um oi. Estarei em um pub no
Reino Encantado chamado A Madrasta com um grande ganso
chamado Lester. É só seguir as penas…

Até mais!

Mamãe Ganso
SOBRE OS AUTORES
OS IRMÃOS GRIMM
Jacob (1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859) nasceram na
Alemanha no fim do século xviii. No começo do século xix, enquanto
estudavam na Universidade de Marburgo, eles se apaixonaram
pelos contos populares e pelo estudo deles. Em 1812, publicaram
sua primeira coleção de contos populares, Children’s and Household
Tales, que foi republicado e revisado muitas vezes até 1857.
Quando morreram, os Irmãos Grimm já tinham publicado mais de
duzentos contos de fadas baseados nas mitologias alemã e
escandinava. Desde então, suas histórias já foram traduzidas para
mais de cem línguas. Até hoje, os Irmãos Grimm são considerados
os pais dos contos de fadas.

HANS CHRISTIAN ANDERSEN (1805-1875)


Hans Christian Andersen foi um romancista, dramaturgo e poeta
dinamarquês. Ele começou a escrever contos de fadas no início do
século xix, publicou os dois primeiros volumes de sua coleção em
1835 e continuou escrevendo até 1872. Embora a princípio os
contos de fadas de Andersen não tenham sido muito bem recebidos,
à época de sua morte ele já era mais conhecido por eles. Até hoje,
suas histórias são traduzidas para mais de 125 línguas, e Andersen
tornou-se um Tesouro Nacional Dinamarquês.

CHARLES PERRAULT (1628-1703)


Charles Perrault foi um autor francês do século xvii. Apesar de ele
ter tido muitas profissões no governo francês e ter publicado muitas
obras, a primeira sobre contos de fadas foi publicada em 1697 e se
chamava Contos da Mamãe Gansa. Seus contos de fadas tornaram-
se muito populares na sociedade francesa e são conhecidos até
hoje da maneira como ele os escreveu. Muitos atribuem a ele a
criação do gênero conto de fadas.
JEANNE-MARIE LEPRINCE DE BEAUMONT (1711-1780)
Jeanne-Marie Leprince de Beaumont foi uma professora e
romancista francesa do século xviii. Em algum momento após 1746,
enquanto trabalhava na Inglaterra como tutora, ela escreveu o livro
Beauty and the Beast and Other Classic French Fairy Tales. A
publicação fez tanto sucesso que ela pôde deixar de lecionar e focar
a sua carreira de escritora. Ela é uma das únicas mulheres
consideradas fundadoras dos contos de fadas e foi uma das
primeiras pessoas a escrever contos de fadas voltados para
crianças.

CARLO COLLODI (1826-1890)


Carlo Collodi nasceu em Florença, Itália. Entre suas muitas
credenciais como autor, foi dramaturgo e escreveu artigos e sátiras
para jornais. Sua introdução aos contos de fadas foi em 1875,
quando publicou I racconti delle fate, uma tradução italiana da obra
de Charles Perrault. Em 1880, ele escreveu a obra pela qual é mais
lembrado até hoje, As aventuras de Pinóquio.

ASBJØRNSEN & MOE


Peter Christen Asbjørnsen (1812-1885) e Jørgen Engebretsen Moe
(1813-1883) foram autores noruegueses do século xix. Eram amigos
havia mais de uma década quando publicaram sua primeira coleção
de contos populares noruegueses, em 1841. Eles se inspiraram
bastante nos Irmãos Grimm e publicaram mais de cem contos de
fadas ao longo de suas carreiras.
CHRIS COLFER é um autor norte-americano nascido no século xx.
Ele recebeu seu primeiro tesouro de contos de fadas em 1994 e não
o largou desde então. Graças a uma imaginação excessivamente
fértil e uma introdução precoce à cafeína, ele tinha muitas perguntas
sobre os personagens dos contos de fadas. Mais tarde, essas
perguntas o levaram a escrever a série Terra de Histórias. Ele sente-
se honrado em compartilhar as histórias dos Irmãos Grimm, Hans
Christian Andersen, Charles Perrault, Jeanne-Marie Leprince de
Beaumont, Carlo Collodi e Asbjørnsen & Moe com novos leitores do
mundo inteiro.

BRANDON DORMAN mora perto de Wylie, Texas, com a esposa e


quatro filhos. Como ilustrador, ele criou imagens mágicas para
centenas de capas de livros e cerca de 21 livros e meio ilustrados,
dois dos quais ele mesmo escreveu, Pirates of the Sea! e Santa’s
Stowaway. Você pode visitar Brandon em brandondorman.com.
AGRADECIMENTOS
Agradeço imensamente a Rob Weisbach, Alvina Ling,

Alla Plotkin, Melanie Chang, Derek Kroeger, Heather Manzutto,

Rachel Karten, Bethany Strout, Nikki Garcia, Sasha Illingworth,

Megan Tingley e Andrew Smith. Um agradecimento especial a Will,

Ashley, Pam, Hannah, meu pai, minha avó, meus outros amigos

e familiares e ao incrível Brandon Dorman.

Você também pode gostar