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CULTURA DIGITAL, TECNOLOGIAS DE INFORMAÇAO E COMUNICAÇÃO

E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

Magda Pischetola – PUC/Rio


Em 1922, John Dewey publicava um ensaio intitulado Educação como
engenharia, no qual defendia que o processo de ensino-aprendizagem tinha sido
transformado em um procedimento de construção programada, que pouco tinha
a ver com o pensamento intelectual. Dessa forma, continuava o filósofo, novas
concepções de educação não serão capazes, em si, de modificar a escola. Elas
serão úteis somente quando os significados e valores que essas concepções
incarnam já fizerem parte da realidade e da experiência cotidiana de professores
e alunos.
Cada vez mais, associa-se o conceito de inovação pedagógica às
Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC), que se apresentam como
"ferramentas de suporte" à pratica do professor, quando utilizadas como
"aliadas" por sujeitos que venceram sua "resistência" ao uso em sala de aula.
Esse capítulo pretende abordar esses discursos que permeiam o campo
da ducação no momento atual, para desvendar algumas crenças de senso
comum, que em nosso ver não facilitam a introdução de TIC no cotidiano escolar
e reforçam a ideia, contraproducente e contraditória, de que a inovação
pedagógica se deve à simples inserção de tecnologias em sala de aula. Uma vez
superados esses obstáculos iniciais, nos propomos a indicar alguns caminhos
possíveis para o uso significativo de TIC em educação. Em particular, graças a
sua função e uso prático.

O discurso das TIC como "ferramentas de suporte" à pratica do professor

Em 1964, um estudioso canadense da área de comunicação, Marshall


McLuhan, teorizou a existência em sociedade de um "ambiente" criado por cada
mídia, como uma bolha invisível que rodea os indivíduos em determinada época
histórica e lugar geográfico. A televisão, que era a mídia dominante da época em
que ele escrevia, seria segundo o autor um ambiente imersivo e muito influente
nas experiências, vivências, ideias, crenças, hábitos de todas as pessoas
sujeitas à sua agência.O autor analisa o lugar que a televisão chegou a ocupar
nas nossas casas, as práticas sociais e comunicacionais que ela engendrou, as
preferências por produtos culturais, modas, costumes que sua presença gerou.
E, a partir desses elementos, afirma que qualquer análise dos meros conteúdos
que a televisão propõe acaba perdendo de vista o impacto maior que ela traz
para a sociedade: a bolha imersiva criada pelo novo meio de comunicação. Em
um de seus mais famosos aforismas, McLuhan afirma que precisamos deixar de
se preocupar pelas mensagens e os seus efeitos, pois o aspecto mais importante
é que o meio é a mensagem. Os meios são extensões sensoriais e cognitivas do
homem e, ao mesmo tempo, motor da história.
Acreditamos que a visão de McLuhan é ainda mais relevante com as
Tecnologias da Informação e da Comunicação, ambiente imersivo e fundante de
todos os processos sociais, econômicos, políticos, relacionais, comunicacionais
e, em última análise, educacionais, do nosso tempo. Desde o começo do século
XXI, as TIC ocuparam todas as esferas culturais, tornaram-se o lugar onde os
eventos políticos são organizados ou visibilizados, o espaço hibrido entre a
esfera privada e a esfera pública dos indivíduos, a plataforma de expressão dos
pensamentos, o lugar da pesquisa, da divulgação de informação e das novas
formas de criação.
Se concordarmos em considerar as TIC e a Internet como artefatos
culturais, ambientes imersivos que modificam substancialmente as práticas,
crenças e hábitos da nossa sociedade, fica claro que não podemos defini-las
simples "ferramentas" e não podemos nos limitar a considerá-las um mero
"apoio" ou "suporte" ao professor e sua prática didática. O redimensionamento
das TIC à definição de "ferramenta" traz consigo o problema fundamental de
perder de vista a amplitude do fenômeno da cultura digital em que as novas
gerações estão imersas. Além disso, a condição de ferramentas de suporte
implica o fato de que existe uma didática instaurada e estabelecida, que não será
modificada com a presença de algumas ferramentas a mais, quaisquer elas
sejam e qualquer seja o seu aporte para a educação. Em outras palavras,
estamos pressupondo que a educação é estanque, sua proposta já está
estruturada, seu modelo está incorporado em nossos hábitos, como dizia Dewey,
ao ponto de não suscitar nenhuma incerteza, dúvida ou alternativa. As
ferramentas são um adendo à prática consolidada do professor, que agora tem
suas possibilidades ampliadas. Com esse pressuposto, a educação não se
renova e as práticas continuam exatamente iguais, somente mais digitalizadas:
o retroprojetor substitui o quadro negro, o professor não precisa escrever com o
giz, os alunos continuam sendo interlocutores passivos. Talvez atraídos pelas
luzes do computador, mas não mais interessados ou motivados.Pois as práticas
culturais às quais estão acostumados fora da escola são bem mais participativas
e motivadoras.

O discurso das TIC como "aliadas" do professor e da educação

Há um preconceito social com respeito às tecnologias, que custa aos


professores reconhecer. As TIC são associadas com o lazer, o entretenimento e
o prazer, sendo que a aprendizagem é sinônimo de esforço intelectual,
superação dos seus limites, concentração, atenção e memória. Por trás desse
discurso, nos parece, há uma convicção fundamental, que associa o
conhecimento científico - o único conhecimento considerado "verdadeiro" - com
a aprendizagem escolar. Hoje em dia, nenhum professor diria que os alunos não
aprendem com as TIC. É óbvio que aprendem, pois, toda experiência humana
traz aprendizagem. Porém, há "categorias" de aprendizagem, assim como há
categorias de conhecimentos. Portanto, as TIC são lugares de aprendizagem de
série B. Podemos sim utilizá-las para realizar algumas atividades em sala de
aula, para "motivar" os alunos com sua presença e seu brilho, mas de fato o que
vai ser mais importante é cumprir o programa, preparar os alunos para o
vestibular, ensinar conteúdo.
Dessa forma, as TIC podem ser entendidas como "aliadas" do professor.
Esse discurso esconde uma outra face da moeda: elas podem também ser
inimigas do professor. Isso acontece, por exemplo, quando o aluno escolhe
chatear no Facebook ao invés de realizar a tarefa proposta pelo professor, ou
então navegar em sites proibidos. Frente a essa falta de disciplina, os
professores se perguntam: por que o aluno escolhe gastar o seu tempo com
conteúdo que não servem para a educação formal? Por que ele não aproveita a
riqueza que as TIC providenciam, em particular com a Internet e sua infinita
quantidade de informação? A vontade do professor é ensinar ao aluno a utilizar
essas ferramentas "de forma correta". Como se não houvesse simplesmente
"usos" ou "práticas" e sim "usos bons e ruins" e "práticas boas ou ruins".
Novamente, nos parece que esse professor esquece que as tecnologias são
artefatos culturais, cujo usos dependem parcialmente de escolhas racionais, mas
que, muitas vezes, são usos que simplesmente se instauraram na sociedade e
são replicados pelos jovens usuários sem consciência crítica. Cabe ao professor
instigar o pensamento crítico com relação a certos usos, ao mesmo tempo em
que propõe alternativas, desconhecidas pelos alunos, mas que podem se tornar
mais interessantes e motivadoras dos usos atuais. O primeiro passo nessa
direção é abandonar o complexo de competição com as mídias digitais. As TIC
não substituem o professor, elas tornam ainda mais importante sua mediação.

O discurso da "resistência do professor" ao uso pedagógico de TIC

Muita literatura da área de educação responsabiliza o professor pela (não)


integração de TIC na escola. O que fundamenta essa responsabilização é a
associação, operada em nível de discurso social, entre inovação pedagógica e
tecnologias. O mundo vai para frente, dizem os trabalhos acadêmicos e os
professores por nós entrevistados nas escolas, enquanto a escola fica parada.
O mundo oferece cada tipo de recurso para inovar a didática, porém o professor
está apegado à aula tradicional e não sabe como usar as TIC com os seus
alunos. Esse sujeito resistente e tecnicamente incapaz está fadado a não inovar
nunca.
Ora, nossas pesquisas da última década em três países diferentes - Itália,
Etiópia e Brasil - nos mostraram que, no geral, não há resistência do professor
(Pischetola, 2016). Ao contrário. a maioria dos professores estão muito bem-
dispostos a inovar sua prática, alguns talvez mais preocupados de que sua
autoridade seja questionada e a gestão da sala de aula se torne mais difícil, mas
sempre curiosos e abertos para o novo. Também, é oportuno desmistificar o fato
que a idade tenha um peso negativo: nas nossas investigações, os exemplos de
inovação pedagógica mais interessantes vieram dos professores mais idosos,
ao passo que os professores mais jovens eram, muitas vezes, os menos flexíveis
com relação á sua prática (talvez ainda em construção).
Qual é, então, a explicação desse discurso sobre a resistência do
professor? Acreditamos que se trata de uma falta de visão sistêmica da
educação. Quando perguntados sobre suas dificuldades em utilizar as
tecnologias nos contextos em que trabalham, os professores relataram
diferentes tipos de problemas:(1) burocráticos (o diretor requer que cada
professor imprima e assine uma ficha declarando sua responsabilidade pela
tecnologia que irá utilizar); (2) infraestruturais (a internet não funciona, o número
de equipamento é inferior ao número de alunos, não há cabos suficientes, etc.);
(3) técnicos (não se sentem preparados para o uso pedagógico de TIC). Em
nosso ver, o que falta na análise dos professores entrevistados é uma
consideração sobre a necessidade que as TIC comportam de mudar totalmente
a estrutura da aula, em termos de metodologias, tempos e espaços. Essa
mudança não é simples, poi não se trata, como argumentamos, de inserir uma
nova ferramenta em uma prática pedagógica constituída. Ela acontece somente
após muitos tentativas e erros, com o refinamento das habilidades do professor
que, aos poucos, entende qual é a melhor forma de trabalhar com as tecnologias,
quais são as atividades que funcionam melhor com uma turma e atendem aos
objetivos pedagógicos, quais são as propostas que, ao contrário, dispersam os
alunos ou não os motivam para a aprendizagem, e assim por diante
As TIC, por serem uma cultura, desestruturam completamente o sistema
escolar ao qual estamos acostumados. E até elas não encontrarem um terreno
fértil para sua inserção efetiva na educação, elas continuarão sendo
consideradas acessórios motivacionais a uma prática pedagógica estabelecida
e resistente à mudança.

Apontamentos para um discurso cultural sobre a educação com as


TIC

Posto que as TIC são mais do que meras ferramentas e funcionam como
ambientes imersivos dos quais precisamos pesquisar e entender a força, para
podermos modificar as práticas pedagógicas, resta apreender o como dessa sua
inserção na educação escolar.
As indicações para esse caminho já nos foram dadas pelos educadores
do século XX, que se interessaram por dar respostas à crise da escola. "Como
se planeja uma nova ponte?". pergunta Dewey (1922). Através da imaginação
de alguns engenheiros, que pensam em algo que nunca foi feito antes,
aplicando seus conhecimentos matemáticos a novas condições sociais,
utilizando o conhecimento científico existente de forma diferente do usual e
com consequências desconhecidas. É preciso ousar, diz o autor, para traduzir
um pensamento te6-rico em ação. Da mesma forma que os engenheiros
tentam os caminhos da criatividade, a educação pode trabalhar com o desejo
de experimentar e de aprender dos resultados. Não sabemos quais serão
esses resultados, como os engenheiros que projetaram uma nova ponte não
sabiam o que podiam atingir.
Não se pode supor que haja realmente qualquer avanço na
educação simplesmente porque há uma melhoria técnica nas
ferramentas de gerenciamento de um esquema educacional
notável para sua formação antes do surgimento da ciência. Essa
"ciência" apenas racionaliza a educação tradicional, melhorando-a
em pequenos detalhes. Dado o equipamento intelectual
necessário, a exigência imediata é de qualidades humanas de
honestidade, coragem e invenção que permitirão avançar sem os
adereços do costume ou as pretensiosas pretensões do costume
disfarçadas na terminologia da ciência (Dewey, 1922, p. 4, tradução
nossa)'.

Nas palavras de Dewey, o professor precisa desenvolver três qualidades


principais: honestidade, coragem e invenção. Tentamos fazer o exercício de
aplicar essa sugestão à integração pedagógica de TIC. É preciso, em primeiro
lugar, de honestidade, para olhar para a cultura digital e reconhecer as práticas
culturais em constante mudança das novas gerações. A cultura digital pressupõe
rapidez, múltiplas informações acessadas ao mesmo tempo, práticas de
comunicação e acesso à informação não lineares. Sendo que a escola ainda
trabalha os assuntos em sequência, separados por disciplina e divididos em
tempos escolares. A partir dessa comparação, precisamos reconhecer que a
cultura digital nos obriga a repensar os caminhos da aprendizagem, não apenas
por uma questão de disponibilidade de conteúdos informativos on-line, mas
também pelas mudanças cognitivas que as TIC trazem para as jovens gerações.
Como aponta Magda Soares (2002), a estrutura hipertextual dos materiais
disponíveis na Internet modifica as práticas de leitura e escrita e levanta a
questão da necessidade de múltiplos letramentos: de quem é a responsabilidade
de letrar os alunos para essa nova sociedade digital, se não da escola? Em texto
publicado com Naumann em 2017, abordamos algumas questões que
sobressaem da reflexão sobre os letramentos na cultura digital:
O estudante-leitor-autor-produtor está consciente dessa
instabilidade dos textos? Ou continua tendo uma visão canônica do
texto escrito, aceitando-o como "verdade"? A reflexão sobre
letramento na escola inclui as práticas sociais de leitura e escrita
dos jovens leitores-autores? Quando abrimos esses
questionamentos, estamos querendo refletir sobre que novas
habilidades politico-sociais - e aqui incluímos a leitura e a escrita -
são exigidas pela cultura digital. [...] Trata-se de fortalecer os
sujeitos nos movimentos de ver, dizer e ouvir de lugares diferentes,
assumir outras posições, relativizar as assimetrias, sem a
pretensão descabida de eliminar as desigualdades que extrapolam
a escola, tentando não contribuir para aprofundá-las (NAUMANN;
PISCHETOLA, 2017, p. 128).

Em nosso entendimento, o letramento digital vai além das questões


meramente cognitivas, apontando para questões sociais e políticas que as TIC
levantam. Por exemplo, os algoritmos das redes sociais implicam uma restrição
de acesso a muitos conteúdos, criando filtros invisíveis e limitando as
possibilidades democráticas que a Internet podia trazer para a sociedade: a
escola vai se eximir de discutir assuntos tão importantes como o significado do
acesso à informação diversificada? E ainda, os primeiros resultados das buscas
no Google são os mais clicados, e não os mais relevantes: quem vai ensinar aos
nossos alunos o senso crítico necessário para selecionar uma fonte de
informação? Todas essas questões estão relacionadas com a cultura digital, em
que os nossos alunos se encontram imersos. A honestidade da escola consiste
em reconhecer seu papel de mediação pedagógica entre os alunos e as TIC.
Em segundo lugar, é preciso de coragem, para enfrentar os erros que
virão das tentativas de uso pedagógico das TIC, em termos de atividades que
resultem pouco significativas do ponto de vista da aprendizagem, ou pouco
interessantes/motivadoras para os alunos, ou dispersivas em termos de atenção.
Em nosso entendimento, a coragem cresce com a humildade do professor, o que
implica aceitar o fracasso como parte intrínseca e natural do processo de
aprendizagem, pois no mundo da cultura digital, precisamos lembrar que o
professor também está aprendendo a ser um novo professor, a se reinventar nas
suas propostas didáticas. A coragem vem da aceitação do "não saber" e pode
ser auxiliada pelo suporte que os mesmos alunos são capazes de dar ao
professor. Sendo que, como tentamos explicar acima, o uso de tecnologias não
depende do conhecimento técnico, mas do conhecimento pe-dagógico,
relacionado aos objetivos que a atividade realizada deveria alcançar. Quando o
professor não tiver o conhecimento técnico, pode pedir ajuda aos seus alunos,
que por serem"nativos digitais" terão todas as habilidades necessárias para
instalar um software ou abrir uma conta em algum site.
Por último, é preciso de invenção e criatividade para adaptar todas as
possibilidades existentes no mundo das TIC on-line e off-line para o seu uso
pedagógico, sem que isso signifique, porém, "pedagogizar" as TIC, tirando o
prazer que os jovens alunos associam ao seu uso. Acreditamos que os professo
res não carecem de criatividade e já sabem, inclusive, utilizar muitos recursos
tecnológicos, para o uso pessoal, como as investigações mais recentes
demonstram (Malheiros, 2017); Pischetola, 2016). Pesquisas recentes
demonstram como os professores têm amplo conhecimento de muitas
ferramentas on-line, sites, softwares, e procuram inspiração para suas aulas em
blogs de outros professores ou nas plataformas institucionais de recursos
educacionais (por ex, o RioEduca, o Portal do professor, etc.). Porém, há uma
profunda diferença entre o uso pessoal e o uso pedagógico que os professores
fazem das TIC. Apesar de conhecer muitas ferramentas, não as utilizam no dia
a dia da sala de aula. E justificam essa discrepância de usos com a falta de
método, o "não saber como". A realidade é que não existe um "como" definido
e, ao mesmo tempo, qualquer indicação prescritiva de uso das TICyna prática
didática é não somente inútil, mas também danoka, pois quem faz o
planejamento de suas aulas é o próprio professor, a partir das especificidades
do conteúdo a ser tratado, da turma, do contexto escolar, geográfico e temporal.

Algumas indicações concretas

A partir das considerações apresentadas, tentamos agora uma


aproximação à prática dos professores em busca de ideias para trabalhar com
as TIC, com algumas sugestões de método, que resumimos, a seguir, com três
palavras-chave: (1) inspiração pelos outros; (2) múltiplas linguagens e (3) apoio
do aluno.
1 - Inspiração pelos outros
A formação docente é geralmente responsabilizada pela defasagem dos
professores com relação aos usos pedagógicos de tecnologias. Concordamos
em considerar a formação inicial e continuada dos professores o núcleo central
da mudança da escola. Porém, algumas pesquisas recentes mostram que os
usos pedagógicos das TIC se desenvolvem, em muitos casos, em presença de
comunidades de práticas (Brasilino, 2017; Cabrera, 2016; Hargittai, 2002). Isso
significa que os professores aprendem muito mais através do exemplo e da troca
com os seus pares do que em cursos de formação sobre as tecnologias. Por que
isso acontece? Porque os cursos de formação com foco no uso das TIC abordam
as tecnologias de um ponto de vista meramente técnico e instrumental. O
professor não precisa de técnicas, a não ser os conhecimentos básicos que
provavelmente já tem graças ao uso pessoal de tecnologias que ele faz em seu
cotidiano. O professor precisa de indicações metodológicas, de uma formação
que dê conta de ensinar as possíveis aplicações didáticas das Tecnologias da
Informação e da Comunicação (Pischetola, 2016). A luz dessa análise, uma
primeira indicação para os professores que estejam motivados a trabalhar com
as TIC em sala de aula e não saibam como fazer é: procurar um colega com
mais experiência e pedir sugestões de atividades, ideias, ferramentas on-line e
off-line. Pode não haver nenhum exemplo próximo na mesma Instituição escolar,
mas há muitos grupos de professores que discutem práticas pedagógicas com o
uso das TIC nas redes sociais, trocando ideias e aprendendo mutuamente.
2 - Múltiplas linguagens
Uma segunda sugestão vem da nossa experiência direta em sala de aula. As
TIC se caracterizam por uma evolução muito rápida em termos de linguagens e
ferramentas. Por isso, a formação técnica não dá conta de mostrar caminhos
concretos para o professor e se torna um investimento inútil. Fazer uma lista
personalizada de sites ou softwares gratuitos disponíveis, para se pautar na
imensidade das possibilidades que a web apresenta, é muito mais interessante.
A lista pode ser ampliada a cada atualização do planejamento pedagógico,
conforme o professor for descobrir novas ferramentas, indicadas por colegas
ou alunos. Segue um exemplo de uma lista personalizada de recursos on-line
que a autora compôs, dividida por tipo de atividade:
• Repositórios online:
Imagens/ Ilustrações
Músicas sem direitos autorias
• Recursos online para criação de:
Nuvem
Caça-palavras
Webquest
Site/Blog
Wiki
Tirinhas/memes/avatares
Apresentações
Nuvem de áudio
• Softwares Gratuitos:
Baixar vídeos do youtube
Gravação/edição de áudio
Edição de vídeo
Criação de mapas mentais
É evidente que a lista de atividades deve poder responder às exigências
do professor, portanto, ela será ampliada, recortada, alterada conforme os
objetivos pedagógicos de cada aula. Porém, acreditamos que um elemento deva
sempre ser considerado preponderante, nas escolhas estratégicas do professor:
a criação e produção por parte dos alunos.
O letramento das jovens gerações passa pelo exercício de se expressar
através de inúmeras formas de criação. Alguns alunos podem encontrar sua
melhor veia criativa na produção de um audiovisual, sendo que outros preferem
gravar um au-dio ou criar a página de um site, uma tirinha, uma charge ou uma
animação. Todas essas produções podem ser avaliadas pelo professor, para
além da produção tradicional de textos escritos. A atenção do professor para as
diferentes formas de aprender de seus alunos implica, a nosso ver, a ampliação
da variedade das linguagens que o aluno encontra para formular o seu
pensamento e se expressar enquanto autor.

3 - Apoio do aluno
Uma última sugestão é de o professor trabalhar em parceria com os seus alunos.
Em nossa pesquisa de 2012 nas escolas da Bahia e de Santa Catarina sobre o
projeto Um Computador por Aluno, resultou evidente que o apoio técnico é
fundamental para o funcionamento de um projeto de inclusão digital e é,
infelizmente, o que mais falta nas escolas (Pischetola, 2015, 2016; Pischetola;
Miranda, 2015). Porém, as escolas investigadas que tinham instituído um projeto
de monitoria tiveram muito mais sucesso em termos de integração das TIC nas
práticas cotidianas. Os alunos ocupavam o papel de monitores, ficando na escola
no contra turno uma ou duas vezes por semana, e ajudavam os professores
preparando as salas com antecedência e oferecendo apoio concreto na gestão
da sala de aula. Dar aula com o uso das TIC é muito trabalhoso. A sensação do
professor é, muitas vezes, de perda de controle na gestão da sala e de dispersão
dos alunos durante a realização das atividades.
Porém, com a ajuda de um aluno monitor que cuida do apoio técnico para a
turma, o professor pode se concentrar na atuação pedagógica, na gestão dos
tempos da aula, no acompanhamento concreto das tarefas que estão sendo
desenvolvidas, para atingir os objetivos pedagógicos preestabelecidos Além
disso, trata-se para o aluno monitor de uma oportunidade extraordinária de
desenvolver algumas habilidades didáticas, comunicacionais e sociais, que não
estariam ao seu alcance no dia a dia escolar. Nas escolas pesquisadas pela
autora, havia fila de espera dos alunos que se propunham como. monitores.
E os monitores entrevistados estavam entusiasmados com seu papel de suporte
e, inclusive, muitos deles já decididos a se tornarem professores na vida adulta.

Considerações finais
A introdução das TIC na educação demanda por estratégias didáticas
capazes de promover uma variedade de processos de aprendizagem e alerta
para a urgência de uma revisão das práticas pedagógicas. Enfrentar as
implicações dessas mudanças pressupõe buscar novas metodologias para o uso
pedagógico de TIC, não apenas reproduzindo práticas tradicionais com outros
suportes, mas explorando criativamente as novas possibilidades oportunizadas
pelos novos meios.
Percebemos que o investimento das políticas públicas em infraestrutura é
importante e afeta o fazer pedagógico, mas não são os equipamentos os
principais responsáveis pela inovação na escola. Se entendermos as TIC como
artefatos culturais e percebermos que estamos imersos em uma cultura digital,
reconhecemos que a escola faz parte dessa mudança cultural e contínua, tendo
um papel crucial de mediação pedagógica.
Longe de ser substituída pelas TIC, a escola representa o lugar privilegiado para
desenvolver as habilidades que compõem hoje os novos letramentos, e para
pensarmos e discutirmos, junto com as jovens gerações, as mudanças sociais,
políticas e éticas do mundo atual.
Se aplicarmos à educação a imagem pensada por John Dewey da ponte
como construção inovadora, fruto do desenho e da criatividade de engenheiros
corajosos, teremos uma metáfora muito produtiva para o tema abordado nesse
texto. A ponte ainda vai ser construída, utilizando o conjunto de possibilidades
que as TIC apresentam para a educação: uma escola renovada em suas
práticas, tempos e sentidos. Para que isso se concretize, precisamos de
professores capazes de inventar o novo e sem medo de errar, professores
curiosos e com vontade de aprender pela prática.

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