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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAS E EDUCAÇÃO


DISCIPLINA: INTRODUÇÃO AO PENSAMENTO GEOGRÁFICO
DOCENTE: PROF. DRA. CLAUDIANA GODOY
DISCENTE: MARCOS FELIPE OLIVEIRA RIBEIRO

CASTRO, I. E.; GOMES, P. C. C.; CORRÊA, R. L. (org.) Geografia: conceitos e temas. 6 ed.
Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003, p. 77–116.

“O texto inicia trazendo uma citação que encontra-se no décimo capítulo de “A arte da guerra,”
escrito por Sun Tzu, onde ele discute que conhecer a configuração do terreno nas batalhas é
essencial, ficando evidente a importância do espaço para atividade da guerra. O general
prussiano Carl Von Clausewitz afirma que a guerra não é simplesmente um ato político, mas
um instrumento e continuação da atividade política. Desse modo, fica evidente no decorrer da
introdução a relevância histórica e teórica do espaço como um instrumento de poder.”(p. 77-
78).

“O texto traz uma citação de Hannah Arendt, que aborda a relação entre poder, violência e
dominação. Para Arendt, o poder é a capacidade de agir em uníssono, pertencendo a um grupo,
enquanto a violência é vista como uma manifestação instrumental para manter ou recuperar o
poder. A legitimidade é fundamental para o exercício do poder, enquanto o domínio pela
violência surge quando o poder está ameaçado. Portanto o poder e a violência se opõe, onde um
domina de forma absoluta o outro encontra-se ausente.”(p. 80-81).

“O território é necessariamente um espaço definido e delimitado pelas relações de poder, e a


compreensão de quem domina e influencia esse espaço é crucial. Vale ressaltar que, apesar das
concepções do senso comum e até mesmo grande parte da literatura científica associar o
território ao Estado, limitando este conceito a uma escala nacional e a uma forma de discurso
dotada de carga ideológica (perceptível na expressão “territorial nacional”), o território é um
espaço que pode ser construído ou desconstruindo nas mais diversas escalas temporais como:
meses, dias, décadas, anos ou séculos; podendo ter um caráter de permanência ou uma
existência periódica e cíclica.” (p. 81).

1
“Com a antropologia urbana, estudos sobre diversos grupos socias ou “tribos urbanas”
contribuíram de forma a ampliar os horizontes conceituais e teóricos com relação à
territorialidade. (...) A ciência política e a geografia são os campos de estudos ligados
epistemologicamente a análise do território. As duas disciplinas, quase sempre, estiveram
dominadas por um orientação que aponta para o estado (representação do pode por excelência).
Portanto estiveram historicamente comprometidas com a elaboração de discursos legitimadores
dos interesses imperiais ou do Estado em geral (a geopolítica do Terceiro Reich é um exemplo
do comprometimento e da relação entre ciência e política). Assim, a geografia se encontrava
inteiramente fixada e vinculada aos interesses dominantes e ao recorte do “território nacional,”
ou seja, ligada à geografia política ou à geografia do estado conforme apontado por Rafestin
(1993).” (p. 82-83).

“O território surge, na tradicional Geografia Política, como o espaço concreto em si (com seus
atributos naturais e socialmente construídos), que é apropriado e ocupado por um grupo social.
A ocupação do território é vista como algo gerador de raízes e identidade 1: um grupo não pode
mais ser compreendido sem o seu território, no sentido de que a identidade sociocultural das
pessoas estaria inseparavelmente ligada aos atributos do espaço concreto (natureza, patrimônio
arquitetônico e “paisagem”). Vale lembrar que os limites do território não são imutáveis, pois
as fronteiras estão sujeitas a mudanças, geralmente pela força. De acordo com a perspectiva
lablachiana, o território nacional é um mosaico orgânico e harmônico de regiões singulares, ou
seja, o território seria composto por várias regiões. Vale ressaltar que a perceptiva do território
associado ao Estado-Nação, está ligada a uma reflexão conservadora.” (p. 84).

“Friedrich Ratzel, considerado o primeiro grande autor da Geografia Política, aborda o Estado
como uma união íntima e inseparável entre o povo e o território. Ele argumenta que essa
conexão é tão forte que o Estado e o solo se tornam um só, essencialmente indivisíveis. Ratzel
enfatiza que o solo, referido como "Boden", é fundamental para a coesão e a identidade do
Estado, servindo como o alicerce material e simbólico de sua unidade. Ratzel naturaliza a ideia
de territorialidade do Estado-Nação ao associá-la à geografia física, discutindo não apenas essa
territorialidade, mas também contextualizando em uma perspectiva onde a afetividade e a
identificação com a pátria são destacadas como características quase inerentes e universais.”(p.
85-86).

1
Identidade essa que está ligada ao poder controlador do território, ou seja, o território tem um caráter
especificamente político.

2
“Por outro lado, é apresentado no texto uma abordagem mais crítica e abrangente da
territorialidade, considerando o território como um campo de forças; uma teia ou rede complexa
de relações sociais que define tanto limites quanto identidades. Nessa visão, os territórios não
estão necessariamente enraizados em características geográficas fixas ou permanentes, como
defendido por Ratzel. Os territórios podem ser fluidos, flexíveis, instáveis, construídos e
desconstruindo, formados e dissolvidos rapidamente. Logo, apresentam um caráter de
mobilidade e são baseados mais em relações sociais do que em atributos materiais e naturais do
espaço.”(p. 86-87).

“As grandes metrópoles modernas, tanto nos países desenvolvidos quanto nos em
desenvolvimento, apresentam exemplos diversos e interessantes de "territorialidades flexíveis".
Alguns desses exemplos incluem os territórios da prostituição, que são frequentemente
encontrados em áreas urbanas próximas aos distritos comerciais centrais, são geralmente
dominados por determinados grupos durante a noite, enquanto durante o dia são ocupados por
diferentes atividades comerciais e pela população local. Outra situação é a de formação de
territórios temporários nas grandes cidades, quando ocorre a ocupação de espaços públicos por
grupos específicos em momentos específicos, como no caso dos nordestinos aos fins de semana
em determinadas praças do Rio de Janeiro, ou a ocupação de calçadas por vendedores
ambulantes. Estes casos frequentemente geram conflitos com outros usuários do espaço e
autoridades, revelando tensões sociais e políticas.”(p. 87-91).

“Um exemplo interessante de territorialidade é o tráfico de drogas no Rio de Janeiro,


caracterizado pela alta fragmentação e pela disputa por territórios entre diferentes facções. Essa
territorialidade é uma rede complexa de enclaves dispersos pelo tecido urbano, com áreas
controladas por diferentes grupos separadas por espaços neutros 2 ou dominados por rivais.
Estes territórios que estão em constante disputa, são marcados por uma complexa rede de
relações, onde a estabilidade é rara e o conflito é comum. Essas abordagens desafiam a visão
clássica de território como uma área exclusivamente controlada por um poder soberano,

2
As "áreas neutras", são aquelas que, não sendo diretamente territorializadas por nenhuma organização de
traficantes -os quais se encarregam de garantir uma certa ordem interna ao território pelo bem dos negócios (por
exemplo, punindo exemplarmente crimes comuns como estupros e furtos), se apresentam como locais
particularmente inseguros, desprotegidos, expostos.

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mostrando como os territórios podem se sobrepor e como as relações de poder podem ser mais
complexas do que a simples divisão entre Estados-Nações.” (p. 91-93).

“É discutido a formação de redes de organizações criminosas no Rio de Janeiro, sendo proposto


no texto uma ponte conceitual entre o território tradicional e a ideia de rede. É apresentado o
conceito de "território descontínuo", que é um conjunto de pontos conectados por fluxos de
bens, pessoas ou informações, representados graficamente como nós e arcos. Esse território
descontínuo articula diferentes territórios contínuos e desafia a ideia tradicional de poder
exclusivo sobre um território. Por exemplo, no contexto urbano, diferentes poderes podem
coexistir, como o poder municipal, estadual e federal, resultando em territórios sobrepostos e
complexos. Portanto, é essencial superar a visão simplificada de território como entidade única
e exclusiva de um poder.”(p. 93-96).

“Em seguida é retomado a conceituação do território dentro do contexto das relações sociais e
de poder, enfatizando a definição do território como um campo de forças espacialmente
delimitado por relações de poder, não sendo apenas um substrato material, mas um campo que
opera sobre um substrato referencial. Apesar de o texto apontar que o espaço precede o
território, a tendência de alguns autores é criticada, como a de Raffestin, de "coisificar" o
território, atribuindo-lhe características materiais. A visão de Raffestin reduz o espaço ao espaço
natural e o território ao espaço social, sem considerar outras dimensões, o que empobrece o
arsenal conceitual. Contudo, o território é resultado da territorialização do espaço através de
apropriação e transformação por parte dos atores sociais.”(p. 96-98).

“Além disso, é discutido a relação entre espaço, território e poder, afirmando que onde há
interação humana com o espaço, há territorialização., ou seja, o território não se limita apenas
a aspectos econômicos ou políticos, mas está presente em toda a espacialidade social, ao menos
enquanto houver presença humana. Além disso, são apresentados exemplos, como uma cidade-
fantasma e territórios flutuantes, para ilustrar a diferença entre substrato espacial e território.”
(p. 96-98).

“Em seguida o texto também aborda a ideia de territorialidade, sugerindo o uso do termo
"territorialismo" para designar o controle territorial e distinguindo entre territorialidade singular
e plural. Em suma, propõe-se uma abordagem plural das territorialidades, que representam
diferentes tipos de territórios conforme suas propriedades e dinâmicas. Sendo assim, o território
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é um conceito dinâmico, construído através das interações entre seres humanos e o espaço,
mediadas pelo poder, enquanto que a territorialidade refere-se à interação entre seres humanos
mediada pelo espaço.”(p. 98-99).

“A segunda seção discute a relação entre as ideias de território e desenvolvimento,


argumentando como ambas foram historicamente influenciadas por um viés "estadocêntrico,”
estando frequentemente ligadas a uma perspectiva conservadora-capitalista, o qual foram
utilizadas para legitimar o modelo civilizatório ocidental. No contexto brasileiro, há uma
simbiose entre esses conceitos, refletida em políticas de desenvolvimento que priorizam
aspectos econômicos e geopolíticos. O autor destaca que é necessário transcender e repensar
esses conceitos ampliando a concepção de território e principalmente o de desenvolvimento,
que historicamente tem sido associado apenas ao crescimento econômico, negligenciando
questões de justiça social e participação política. Em suma, critica-se a abordagem econômica
tradicional do desenvolvimento, propondo-se uma abordagem alternativa e mais abrangente
que priorize a satisfação das necessidades básicas e a participação popular (coletividade). Desse
modo, é enfatizado a importância da territorialidade autônoma, criticando (embora se reconheça
os desafios políticos inerentes a uma sociedade capitalista) o economicismo predominante na
Economia do Desenvolvimento.” (p. 99-103).

“Outra abordagem interessante é noção de modelo civilizatório como um conceito mais


abrangente do que o conceito marxista de modo de produção. Enquanto o modo de produção se
concentra nas condições materiais de uma sociedade, deixando de lado aspectos como cultura
e política, o modelo civilizatório abarca toda a sociedade instituída, incluindo seu imaginário.
Esta abordagem do modelo civilizatório busca ir além do economicismo ao considerar não
apenas as relações de produção, mas também a cultura e a política como partes integrantes do
sistema social. Logo, é importante de compreender não apenas as estruturas materiais, mas
também os aspectos simbólicos e imaginários que moldam uma civilização.” (p. 103).

“Durante a segunda seção, o texto também aborda diferentes perspectivas ideológicas sobre o
desenvolvimento econômico e social, criticando tanto o pensamento marxista quanto às teorias
convencionais do desenvolvimento. Inicialmente, menciona-se a falha dos analistas de
esquerda, incluindo os marxistas, em prever um horizonte material e técnico distinto do
capitalismo ocidental, como evidenciado pelas teorias de Rosa Luxemburgo e Lênin sobre a
industrialização na periferia como consequência da exportação de capitais dos países centrais.
5
Em seguida, critica-se a posição de Andrew Gunder Frank, representante da ala marxista da
"Teoria da Dependência", que não rompe totalmente com a visão positiva das forças produtivas
do capitalismo.” (p. 103-105).

“A autonomia (fundamental para uma reconceituação do desenvolvimento) é definida como o


poder de uma coletividade se reger por leis próprias, sendo considerada a base do
desenvolvimento como processo de auto-instituição da sociedade rumo a mais liberdade e
menos desigualdade. Uma sociedade autônoma é capaz de gerir livremente seu território e
recursos, promovendo uma identidade cultural e acesso igualitário a esses recursos. Por fim, o
território revela-se como base do poder e da autonomia; pois, mesmo em uma sociedade
autônoma, o poder não é concebível sem territorialidade. A materialidade do território é
fundamento econômico e cultural de um grupo, sendo importante a descentralização espacial e
a superação da divisão entre trabalho manual e intelectual.” (p. 105-108).

“É necessário redefinir o conceito de desenvolvimento em um contexto globalizado, onde a


cultura e a economia são dominadas por grandes empresas, enquanto a liberdade e a autonomia
são desafiadas. Para isso, deve-se compreender os limites da liberdade e da justiça social em
uma sociedade heterônoma, e propor alternativas sem concessões ao status quo. O autor enfatiza
que mesmo pequenas lutas sociais podem desencadear mudanças significativas a longo prazo,
contribuindo para o avanço da consciência crítica. O exemplo das favelas do Rio de Janeiro
ilustra como a territorialização pelo tráfico de drogas reduz a autonomia das comunidades,
evidenciando a importância do controle sobre o espaço vivido para a transformação social.” (p.
109-111).

“A título de conclusão, o capítulo aborda a importância de repensar o conceito de território,


ampliando-o além das fronteiras do Estado-Nação. Destaca-se a ideia de que o poder não se
limita ao Estado nem à violência, e, da mesma forma, o território não se restringe apenas ao
território político. O controle e a gestão territoriais são fundamentais para a organização social,
sendo essenciais para o desenvolvimento e a busca por uma maior justiça social. A autonomia
na gestão do território é vista como uma condição indispensável para uma gestão socialmente
justa dos recursos contidos nele. O texto também ressalta a importância de abordar o controle
territorial não apenas em termos de poder heterônomo, mas também em termos de autonomia,
fugindo do padrão convencional de abordagem.”(p. 111-113).

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