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Família Wings

08/2023
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A Série

Série The Aces’ Sons

Nicole Jacquelyn
Sinopse

Michael Hawthorne sabe o que quer da vida desde os


quatorze anos de idade.
Uma Harley, ingressar no Aces Motorcycle Club e se
casar com Emilia Robertson.
Quando ele completou dezoito anos, essas três coisas
pareciam ao seu alcance... até que Emilia e seus pais
desapareceram sem uma palavra.
Três anos depois, Emilia aparece na porta de Michael -
mais velha, bonita e mãe de uma criança que se parece com
Michael.
Ele não sabe se pode confiar nela.
Ela não sabe se pode contar com ele.
Ele ainda está apaixonado por ela.
Ela nunca deixou de amá-lo.
Tudo o que Michael sempre quis está ao seu alcance
novamente, mas para conseguir isso ele terá que encontrar
uma maneira de perdoar a garota que o quebrou.
Prologo

MICHAEL

— Ei , linda, —, murmurei, um sorriso puxando meus


lábios quando abri meu armário. Porra, eu estava tão pronto
para parar de carregar livros por aí. Se não fosse por minha
mãe, que havia ameaçado me desmembrar se eu não
terminasse o ensino médio, já teria desistido.
O cabelo de Emilia caiu em seu rosto enquanto ela
inclinava a cabeça para baixo. — Você é impossível.
— Não sou bom em me esconder, — eu concordo,
pegando os livros que precisaria naquela noite. — Não sei por
que estamos.
— Você sabe exatamente por que, — ela respondeu,
fechando o armário ao lado do meu. — Meus pais teriam
vários ataques cardíacos se imaginassem que há algo
acontecendo entre...
— Você quer dizer que não posso contar ao seu pai
sobre a maneira como você subiu no meu colo e...
— Michael, — ela retrucou, batendo no meu braço. —
Não.
— Tudo bem, — eu murmurei com um suspiro. Jogando
minha mochila no ombro, fiz um gesto para que ela
andasse. — Depois de você.
— Sua mãe está em casa hoje? — ela perguntou, caindo
ao meu lado enquanto caminhávamos em direção à frente da
escola. Os corredores estavam lotados, mas, como sempre, as
pessoas abriam caminho enquanto passávamos por
eles. Podemos não ter tornado nosso relacionamento público,
mas todos sabiam que Emilia pertencia aos Hawthornes.
— Deveria estar. — Eu olhei para ela. Porra, ela era
bonita. Ela era menor do que a maioria das meninas da
nossa escola, até mesmo as calouras, o que nos tornava um
casal meio estranho, já que eu era tão grande, mas de
alguma forma nós funcionávamos. — Ora, você espera um
pouco de tempo para nós?
— Minha mãe provavelmente vai ligar para saber como
está, — ela respondeu, torcendo o nariz. — Vai ser melhor se
sua mãe estiver lá.
— Eu não sei como diabos seus pais ainda acham que
você está me ensinando, — eu disse com uma risada, abrindo
a porta para ela. A mudança da iluminação fluorescente do
corredor para o sol brilhante me faz franzir o rosto, e colocar
meus óculos escuros. — Achei que eles teriam entendido
depois de quase um ano.
— Acho que eles se sentem mais à vontade assumindo
que você não é tão inteligente quanto eu. — Ela olhou para
mim se desculpando. — Porque se eles fizeram tudo deveriam
viver suas vidas inteiras...
— Então, como diabos uma criança que cresceu
brincando na entrada de cascalho de um moto clube pode ser
tão inteligente quanto sua preciosa filha?
— Você sabe como eles são.
— Infelizmente, eu sei, — murmurei, atirando-lhe um
pequeno sorriso para que ela soubesse que ainda estávamos
bem. As opiniões de seus pais sobre o clube, minha família e
eu especificamente não eram novidade. Fomos amigos a vida
inteira, passamos todos os anos na mesma classe na escola e,
ainda assim, eles viam minha família como lixo branco
criminosos.
Provavelmente começou quando minha mãe me deixou
no jardim de infância com a cabeça meio raspada, o resto do
cabelo de um azul vívido e um anel de septo combinando. Ela
não era exatamente a imagem de uma mãe perfeita. No
entanto, poderia ter começado na primeira vez que meu pai
me pegou na garupa de sua motocicleta. De qualquer
maneira, a opinião deles sobre mim estava gravada em pedra.
— Vocês podem se apressar? — meu irmãozinho Rumi
gritou do outro lado do estacionamento. Ele estava sentado
na traseira da minha caminhonete, com a mochila no chão a
seus pés. — Vocês sempre levam o dobro do tempo que todo
mundo leva para dar o fora de lá.
— Oh, me desculpe, — eu gritei de volta quando
chegamos mais perto. — Com pressa para chegar em casa?
— Eu prefiro não ficar mais tempo do que o necessário,
— ele reclamou, puxando seu longo cabelo para trás em um
rabo de cavalo.
— O ônibus saiu há cinco minutos, — eu o lembrei,
pegando sua mochila quando chegamos a caminhonete e
jogando-a na traseira com a minha. — Você já poderia ter ido
embora.
— Eu não vou andar de ônibus, — ele resmungou,
pulando para baixo. — Prefiro caminhar.
— Ninguém está te impedindo.
— Ei, Rumi, — Emilia disse, interrompendo nossa
discussão com um sorriso.
— Ei, Emmy Lou Who, — ele murmurou, jogando o
braço em volta dos ombros dela, puxando-a até que o rosto
dela batesse contra o peito dele. Ele tirou a mochila do seu
ombro. — Como você está, duende?
— Muito bem desde que você me viu no almoço, — ela
respondeu, rindo enquanto o empurrava.
— Você é a melhor parte do meu dia, — Rumi anunciou
dramaticamente, abrindo os braços, a mochila pendurada em
uma das mãos.
— Você poderia parar de flertar com a minha
namorada? — Eu reclamei, agarrando a mão de Emilia para
que pudesse rebocá-la até a porta do lado do motorista.
— Não posso, — Rumi disse, guardando a mochila com
a nossa. — Ela é boa demais para você, Mick. Eu vou roubá-
la.
Eu zombei quando Emilia riu. Era um argumento
familiar que nenhum de nós levava a sério. A chance de meu
irmão tentar atacar minha garota era tão provável quanto ser
morto por um meteoro caindo.
— Então, não há prática hoje? — Rumi perguntou
enquanto voltávamos para casa. Meu irmão era irritante, mas
na verdade eu gostava quando ele andava conosco porque
isso significava que Emilia se sentava no banco do meio,
encostada em mim do ombro à coxa.
— É uma pausa rara, — respondeu ela, inclinando a
cabeça contra o meu braço. — Apenas uma semana, no
entanto.
— Droga, garota, — disse Rumi, baixando a janela. —
Você trabalha demais.
— Não acenda aqui, cara, — eu ordenei enquanto ele
enfiava a mão no bolso. — Ela não pode ir para casa
cheirando a maconha.
— Eu abaixei a janela!
— Você está sentado ao lado dela, merda.
— Ok.
— Estamos quase em casa de qualquer maneira, — eu
disse, parando em nossa garagem. — Vá para trás e fume.
— Mamãe tem um nariz de sabujo, — Rumi resmungou,
usando as duas mãos para afastar o cabelo do rosto. — Ela
me pegou umas sete vezes.
— Talvez você devesse parar de fumar? — Emilia
perguntou sarcasticamente.
— Nunca, — ele rebateu. Ele saltou da caminhonete no
minuto em que parei.
— Ele é um pé no saco.
— Ele é adorável, — Emilia respondeu, me dando uma
leve cotovelada no lado. — Ele é como um golden retriever.
— Oh sim? — Eu perguntei, colocando a caminhonete
no estacionamento. — O que eu sou?
Ela inclinou a cabeça para o lado e olhou para mim. —
Um buldogue, — ela disse finalmente, seus lábios se
contraindo.
— Ai! — Abri as fivelas de nossos cintos de segurança e
estendi a mão para ela, cravando meus dedos em suas
costelas do jeito que eu sabia que a faria pular de susto.
— Michael, — ela gritou, empurrando minhas mãos. Seu
corpo inteiro tremeu de tanto rir. — Não foi uma ofensa!
— Estou ofendido . — Eu a persigo pelo assento
enquanto ela luta para escapar.
— Você é musculoso, — ela gritou. — Seus ombros são
enormes!
— Bem, — eu disse, fazendo uma pausa. — Eu gosto
para onde isso está indo. — Fiz uma careta para ela,
empurrando meu maxilar inferior para frente para que
parecesse que eu tinha uma mandíbula forte.
— Oh, meu Deus, — ela disse, ofegante. — Pare com
isso.
— Por quê? — Eu perguntei, cuspindo um pouco
enquanto segurava minha mandíbula para frente. — Eu sou
um buldogue.
— Você é um lunático, — ela argumentou, torcendo o
nariz. — Mas eu te amo de qualquer maneira.
— Bom, — eu disse, sorrindo para ela. — Porque eu sou
louco por você.
— Ou talvez apenas louco?
— Nah, é tudo por você, doçura.
— Michael Asa Hawthorne, — minha mãe disse, batendo
na janela atrás de mim. — Pare de molestar essa garota na
garagem e venha me ajudar com as compras.
— Oi, Sra. Hawthorne, — Emilia disse, inclinando-se ao
meu redor para que pudesse sorrir para minha mãe.
— Emmy, se você não me chamar de Heather, vou
começar a obriga-la a fazer tarefas, — minha mãe
respondeu. — Está bem, querida. Amei o cabelo.
— Sim? — disse Emilia, estendendo a mão para ajeitar a
franja que acabara de cortar na noite anterior. — Eu não
tinha certeza...
— Não, combina com o seu rosto. Muito bonitinho.
— Obrigada, — Emilia disse alegremente.
Sentei-me e puxei Emilia comigo enquanto minha mãe
abria minha porta. — Não tenho certeza se você deveria
seguir conselhos de cabelo de alguém que regularmente corta
o dela em um moicano, — eu disse brincando, desviando da
minha mãe enquanto ela tentava me beliscar.
— Sim, certo, — Emilia disse enquanto ela saía atrás de
mim. — Sua mãe sempre parece incrível.
— Eu gosto dela, — minha mãe me disse. — Certifique-
se de não estragar tudo. — Emília riu.
— Por que eu iria estragar tudo? — Eu perguntei
enquanto as seguia em direção à van da minha mãe. —
Talvez seja Emmy.
— Ah! — minha mãe disse, passando o braço em volta
da cintura de Emilia. — Emmy é um anjo.
Emilia olhou para mim por cima do ombro e mostrou a
língua.
Resmunguei enquanto pegava sacolas de compras na
parte de trás da van, mas não estava realmente bravo. Na
verdade, eu adorava que Emilia se desse tão bem com minha
família. Não foi uma surpresa, ela se dava bem com todo
mundo e sempre foi querida por todos, mas havia algo
diferente em como minha família a tratava. Eles a
amavam. Não dependia de estarmos ou não juntos, tivemos
alguns rompimentos, especialmente no começo, antes de
começarmos a coisa toda de “tutoria” e não podíamos sair
muito - mas a tratavam da mesma forma, quer estivéssemos
juntos ou não.
A casa de Emilia não era como a nossa. Seus pais a
amavam e não acho que eles a negligenciavam ou a
machucavam ou algo assim... eles apenas esperavam
muito. Quando não conseguiam o que queriam ou ela os
desapontava, eles a ignoravam. Eu sempre sabia quando isso
acontecia. Ela aparecia na escola mais quieta do que o
normal ou brigava comigo por algo que achou engraçado no
dia anterior, ou como esta manhã, ela aparecia com um novo
penteado que ela mesma havia feito. Eu sempre podia dizer,
no entanto. Era impossível para ela esconder alguma coisa de
mim, nós nos conhecíamos muito bem.
— Otto ficou em casa com dor de cabeça hoje, — disse
minha mãe quando entramos em casa. — Então, atenção, ele
está na sala da família.
— Coitado, — Emilia disse calmamente. — Vamos ficar
em silêncio.
— Ele só está assistindo TV, querida, — disse mamãe,
colocando as sacolas no balcão. — Você não precisa ficar em
silencio.
— Ele tem dificuldade para dormir, — expliquei, olhando
em volta. — Onde diabos está Rumi? Por que ele não está
ajudando?
— Eu não o vi, então achei que ele estava no ônibus? —
minha mãe disse em confusão.
— Ele veio conosco, — respondi.
— Aquele merdinha, — minha mãe disse, estreitando os
olhos. — Aposto que ele está lá atrás.
Ela correu para a porta dos fundos e eu a segui,
segurando a porta aberta enquanto ela tentava fechá-la na
minha cara.
— A mamãe está indo, Rum, — eu gritei, rindo quando
ela me deu um tapa na barriga. — O peixe voa à meia-
noite! Abortar a missão! Abortar!
Eu ainda estava rindo quando fechei a porta e me virei
para encarar Emilia. — O peixe voa à meia-noite? — ela
perguntou divertida.
— Era uma das nossas frases em código quando éramos
pequenos, — expliquei, desempacotando e guardando as
coisas na despensa. — Havia também, “a lua azul brilha pela
manhã e o arqueiro atira na escuridão”'.
— Vocês eram estranhos, — disse ela, jogando-me uma
caixa de cereal.
— Você já sabia disso, — eu disse com um encolher de
ombros. — Você ainda quer pular em mim.
— O tempo todo, — ela disse, copiando meu encolher de
ombros enquanto jogava outra caixa na minha direção.
— Você quer sair um pouco mais cedo esta noite? —
perguntei, baixando a voz para que Otto não me ouvisse na
sala de estar.
— Se continuarmos estacionando na parte de trás da
propriedade no clube do seu pai, eles vão saber que estamos
lá fora fazendo coisas, — ela disse, arregalando os olhos para
mim.
Ela parecia tão fofa e envergonhada que não tive
coragem de lhe dizer que todo mundo sabia exatamente o que
estávamos fazendo quando estacionávamos na propriedade
do clube. Tínhamos que fazer o check-in na porra do portão
quando chegávamos lá, eles sabiam exatamente quando
chegávamos e saíamos. Não faltaram conselhos, provocações
e advertências disparadas em minha direção.
— Sempre podemos descer até o rio, — eu disse,
pegando mais algumas coisas para guardar. — Mas é mais
provável que encontremos pessoas lá.
— Posso pensar sobre isso? — ela perguntou, mordendo
o interior de sua bochecha.
— Claro, — eu disse, parando para beijá-la. — Não
precisamos.
— Quero dizer, eu sempre quero, — disse ela, sorrindo
para mim. — Mas um de nós tem que ter um pouco de
cautela.
— Você sabe o que gosto de fazer com cautela? — Eu
perguntei, minhas mãos deslizando por seus lados para sua
bunda. — Jogar ao vento.
— Sim, eu sei, — ela disse com uma risada.
— Pare de brincar de agarrar o traseiro, — Rumi disse,
irrompendo pela porta sem fôlego. — E obrigado pelo aviso.
— Onde está a mãe?
— Ela me perseguiu pelo quintal e eu a tranquei na
garagem.
— Você fez o quê? — Emilia perguntou alarmada.
— Ela consegue sair, — Rumi disse com um sorriso
enquanto corria pela cozinha. — Mas quando fizer isso, terei
escondido meu estoque em algum lugar que ela não possa
encontrar.
— Ela vai te matar, — disse Emilia enquanto o
observávamos correr pelo corredor.
— Absolutamente, — eu concordei, deixando minhas
mãos caírem de sua bunda. — Vamos lá, podemos ir lá para
fora assim que eu terminar isso.
— Você é um bom filho, — Emilia disse enquanto me
ajudava. — Aqui desempacotando mantimentos enquanto um
de seus irmãos está deitado no sofá e o outro escondendo
drogas de seus pais.
Eu sorri. — Eu não me importo de ajudar quando posso,
— eu disse, abrindo a geladeira. — Rumi é um idiota, mas
Otto provavelmente está exausto. Ele fica com muita insônia
e às vezes não dorme a noite toda. É isso que causa as dores
de cabeça. Ele acaba dormindo o dia todo.
— Oh. — Emília franziu o cenho. — Por que eu não
sabia disso?
— Ele não gosta quando fazemos uma grande algazarra
sobre isso, então não fazemos, — eu disse, inclinando-me
para a geladeira para tentar organizar os milhões de
recipientes aleatórios de sobras, molho picante e comida. —
Os médicos disseram que ele provavelmente vai crescer com
isso.
— Ele acha que não vou encontrar, — disse minha mãe,
entrando calmamente pela porta da cozinha. — Ele acha que
vou esquecer. Mas o que eu sempre digo, Mick?
— Você vai se lembrar por muito mais tempo do que
nós.
— Isso mesmo, — disse ela sombriamente, olhando para
Emilia. — Eu sempre lembro.
— A que horas Titus e Myla vão chegar em casa? — Eu
perguntei a ela, tentando distraí-la. — Você vai pegá-los?
— Eles estão no ônibus hoje, — respondeu a mãe. — E
aleluia por isso. Eu dirigi o dia todo.
— O que você teve que fazer? — Eu perguntei quando
ela começou a nos ajudar a descarregar as compras.
— Tive uma consulta médica - e não, você não pode
perguntar o quê, algumas coisas podem ser particulares,
muito obrigada - e então tive que trocar o óleo da minha van.
— Você levou para o clube? — Eu perguntei, olhando
para ela.
— Claro que não, — ela disse com um bufo. — Eu só
tenho algumas maneiras de irritar seu pai, e essa é uma
delas. Fui a um desses lugares drive thru.
— Ele vai se cagar.
— Esse é o ponto, — ela disse, sorrindo como o
Coringa. — Depois disso, tive que ir buscar umas plantas
para o quintal, trazê-las para cá porque encheram a
carroceria da van e depois tive que fazer compras. Eu só
cheguei em casa antes de vocês por alguns minutos.
— Merda, dia longo.
— Cuidado com a boca em torno de Emmy, — minha
mãe disse facilmente, como se ela não xingasse como um
marinheiro. — E você não me distraiu. Rumi ainda vai sentir
minha ira.
— Bem, pelo menos diga a ele que tentei, — respondi.
— Sinto muito, Emmy, — minha mãe disse, parando
para encarar Emilia. — Eu sei que você provavelmente pensa
que somos lunáticos.
— Eu te acho incrível, na verdade, — Emilia respondeu
alegremente. — Além disso, não é como se eu não tivesse
visto sua loucura antes.
Mamãe riu. — Amém a isso. Não podemos manter isso
em segredo por aqui, com certeza.
— Eu e Emilia vamos ficar do lado de fora, — eu disse,
pegando a mão dela.
— Legal, — minha mãe respondeu. — Obrigada pela
ajuda, cara. Você poderia levar os refrigerantes para a
geladeira externa no caminho?
— Sem problemas. — Larguei a mão de Emilia de novo
para poder pegar as caixas de refrigerante. Ela caminhou na
minha frente e abriu a porta.
— Ah, pendurei a rede pra você!
— Legal, — eu disse com prazer. — Obrigado, mãe.
— Não entendo por que você ama tanto a rede, — disse
Emilia enquanto eu guardava o refrigerante.
— O que há para não amar? — Eu perguntei, levando-a
para o fundo do quintal. — É confortável e balança de um
lado para o outro. Além disso, quando você está comigo, tem
que praticamente deitar em cima de mim.
— Se eu não o fizesse, você me esmagaria até a morte,
— ela disse razoavelmente.
— Isso é justo, — eu disse bufando. — Você é bem
pequena.
O sol estava atrás de nós, fazendo nossas sombras se
estenderem à frente.
A de Emilia parecia a de uma criança.
— Ser baixa é bom para a ginástica, — disse ela,
olhando para nossas sombras. — Mas não vou mentir,
aceitaria mais alguns centímetros.
— Isso foi o que ela disse.
— Oh, — ela disse com desgosto fingido. — Isso é
simplesmente errado.
— O que há, Emília? — perguntei, avançando para me
sentar na rede estendida entre duas árvores. — Você não
gostaria de mais alguns centímetros?
— Michael, — ela sibilou como se estivesse
escandalizada, mas seus olhos estavam cheios de humor. —
Alguns centímetros a mais seriam muito desconfortáveis.
— Você é boa para o meu ego, — eu disse, puxando-a
para baixo comigo para que pudéssemos nos situar sem virar
a coisa toda.
— Acho que nos encaixamos muito bem, não é? — ela
perguntou quando nos acomodamos, seu corpo pressionado
contra o meu, sua cabeça no meu peito.
— Na rede ou na carroceria da minha caminhonete? —
Eu perguntei brincando.
— Bem, ambos, eu acho.
— Acho que nos encaixamos de todas as formas
possíveis, doçura, — eu disse com um suspiro, fechando os
olhos.
— Bom, eu também.
Ficamos em silêncio por um tempo. Ainda não estava
esquentando lá fora. A primavera estava muito legal no
Oregon, mas foi um dia agradável de qualquer maneira. Entre
nossos moletons, o calor do corpo e o sol brilhando, estava
bom e quente em nosso pequeno casulo.
— Estou animada para o próximo ano, — disse Emilia,
traçando padrões no meu peito com o dedo. — A faculdade
vai ser tão diferente.
— Você está nervosa?
— Estou um pouco nervosa por me juntar ao time de
ginástica. Eu sinto que preciso realmente ganhar a bolsa que
eles me deram ou vão retirá-la.
— Você vai arrasar.
— Espero que sim. Eu gostaria que você fosse comigo,
no entanto.
— Você sabe que a faculdade não é realmente a minha
praia, — eu disse, passando meus dedos por seu cabelo. —
Gosto de andar de motocicleta e sou bom nisso.
— Eu sei, — ela disse com um suspiro. — Você acha que
vai comprar uma? Uma motocicleta?
Eu ri da esperança em sua voz. — No minuto em que eu
fizer dezoito anos, — eu confirmei. — Não pode ser um
prospecto sem uma.
— Você vai se juntar com certeza? — ela perguntou,
olhando para mim.
Eu olhei para ela por um momento em surpresa. — Sim,
querida, — eu disse finalmente. — Esse sempre foi o plano.
— Acho que pensei que teríamos mais tempo.
— Mais tempo para quê? — Eu perguntei curiosamente.
— Mais tempo para sermos apenas nós, — disse ela
calmamente.
— Eu ainda vou ser eu. — Corri meus dedos por seu
cabelo. — Só com mais algumas responsabilidades e merda.
— Sim. — Ela deitou a cabeça para trás. — Eu só queria
que você fosse para a faculdade comigo. Você sabe, ser
criança um pouco mais.
— Eu estaria me endividando com a faculdade que nem
vai me ajudar no meu trabalho, — eu respondi. Eu não tinha
certeza se estava tentando convencê-la ou a mim mesmo. Eu
nem queria ir para a faculdade e tinha outros planos para
ganhar a vida, uma boa vida, mas ainda assim parecia
estranho que ela fizesse isso sem mim. Ela estava
certa. Assim que nos formássemos, eu entraria na minha vida
adulta com os dois pés. Pela primeira vez desde que nos
conhecemos, eu não a veria durante o dia.
— Você fará coisas de adulto de verdade e eu ainda
estarei carregando livros de matemática por aí, — ela brincou
levemente, espelhando meus pensamentos.
— Sabe qual é a melhor parte disso? — Perguntei.
— O que? — Ela se inclinou para olhar para mim
descansando o queixo no meu esterno.
— Eu vou ter meu próprio lugar. — Eu balancei minhas
sobrancelhas para cima e para baixo. — E você pode ficar lá
quando quiser.
— Você está certo, — ela disse com um sorriso. — Como
prêmio de consolação, isso não é tão ruim.
— Vai ser bom, querida, — murmurei, beijando o topo
de sua cabeça enquanto ela se deitava. — Você vai para a
faculdade para conseguir um emprego e ser minha docinha…
Emília deu uma risadinha.
— E eu trabalharei para que possamos ter um lugar
onde possamos fazer sexo em uma cama de verdade.
— Eu me pergunto como é isso, — ela murmurou
secamente.
— Vou te mostrar, — eu disse, a ideia dela nua na
minha cama me deixando instantaneamente duro. Sem
interrupções. Sem se preocupar em ser pego. Espaço para
atividades. Eu mal podia esperar.
— Como você vai me mostrar? — ela perguntou
desconfiada. — Como você saberia?
O barulho que fiz foi involuntário, meio bufo meio
zombaria. — Você sabe que eu não estive com ninguém além
de você, — eu disse, dando um tapa na bunda dela.
— É melhor você continuar assim.
— Eu estava planejando isso.
— Bom.
— Bom.
Ela ficou quieta por um momento, mas seu corpo estava
tenso e eu sabia que ela ainda tinha algo em mente. Não
demorou muito para descobrir o que era.
— Você acha que algum dia vai se cansar de mim?
Eu estremeci de surpresa. — O que?
— Sabe, só estando comigo. Você acha que vai ficar
entediado?
— Você está entediada? — Eu perguntei, olhando para a
cabeça dela. De onde diabos isso estava vindo?
— Claro que não, — disse ela, levantando a cabeça para
olhar para mim. — Por que você pensaria isso?
— Então por que você está perguntando se eu vou ficar
entediado?
— Porque é diferente para os caras, — ela respondeu, as
palavras quase um sussurro. — Tipo, e se você quiser alguém
que pareça diferente ou algo assim? Ou tipo, seios
maiores. Talvez você queira ver o que há lá fora.
— Não vai acontecer.
— Você não sabe disso, — ela respondeu.
— Sim, eu sei, — eu disse, dobrando meu braço sob
minha cabeça enquanto olhava para o céu. — Por que eu iria
querer alguém além de você? Eu te amo. Você me
pegou. Além disso, você é gostosa pra caralho e pode colocar
as pernas atrás da cabeça.
— Você não está falando sério, — ela respondeu
categoricamente, deixando cair a cabeça para trás contra o
meu peito.
— Eu estou, no entanto, — eu disse, dando um aperto
na bunda dela. — Eu não posso imaginar querer estar com
ninguém além de você, doçura. Essa é a verdade
honesta. Não preciso de mais nada, não quero mais nada.
— Os relacionamentos do ensino médio nunca duram,
— ela disse calmamente.
— Às vezes, sim, — respondi. — Nós seremos a exceção,
certo?
— Espero que sim.
— Eu sei que sim.
— Como você está... — Ela fez uma pausa e bufou. —
Tão calmo sobre isso?
— Não entendo por que você está tão preocupada com
isso. — Eu inclinei minha cabeça para trás. — Você está indo
para a faculdade aqui perto. Nós nos conhecemos desde
sempre. Você conhece minha família e eu, uh, vi a sua.
Ela riu um pouco. — Somos sólidos.
— As pessoas mudam muito antes dos 25 anos, —
argumentou ela. — E se formos pessoas completamente
diferentes?
— Então acho que terei que amar quem quer que você
seja quando tiver vinte e cinco anos, — eu disse com uma
risada. — Você está pensando demais nisso. Estaremos
juntos, mudaremos juntos, tudo ficará bem, certo?
— Tudo bem.
— Emmy! — uma voz alta gritou do outro lado do
pátio. — Você está aqui!
— Mila! — Emilia gritou de volta, colocando a cabeça
para fora da rede para ver minha irmãzinha. — Eu estou!
— Ooh, eu amo seu cabelo!
— Obrigada! Eu gosto de suas tranças!
— Sua camisa é bonita.
— Assim como a sua.
— Jesus, — eu murmurei. — Chega de elogios Cathys.
— Fiz um mural enorme na escola sobre a Guerra
Revolucionária e tive que trazê-lo para casa no ônibus, —
Myla anunciou quando chegou até nós, agarrando a lateral
da rede. — É tão legal. Eu fiz todas as grandes batalhas tipo,
uma linha do tempo que não pude colocar todas as pequenas
escaramuças porque não tinha espaço, além de quem sabe
quantas realmente eram.
Ela estava falando tão rápido que teve que fazer uma
pausa para respirar audivelmente. — E eu desenhei. Posso
sentar com vocês?
— Claro que não, — respondi instantaneamente.
O cotovelo de Emilia cavou no meu lado. — Eu não acho
que você vai caber, — ela disse se desculpando.
— Quer vir ver meu mural? Vou pendurá-lo na sala de
jantar. Você pode ajudar se quiser? Minha mãe disse que
ajudaria, mas ela pendura tudo torto.
Emilia olhou para mim, tentando conter o riso. Minha
irmã era muito em um bom dia e hoje ela estava indo para o
ouro.
— Vá. Fique com minha irmãzinha. — Eu me movi para
que ela pudesse deslizar para fora da rede. — Temos muito
tempo de rede chegando.
— Verão, — disse Emilia alegremente.
— Apenas mais algumas semanas e então vamos passar
o dia todo nessa coisa.
— Talvez não o dia todo, — ela respondeu enquanto se
levantava.
— O dia todo, — respondi, agarrando seu pulso antes
que ela pudesse ir embora.
Ela se inclinou para me beijar enquanto Myla fazia
barulhos de vômito.
— Eu já volto, — Emilia disse se desculpando contra
meus lábios.
— Estarei aqui, — respondi. — Não se preocupe, doçura,
você tem o resto de sua vida para ficar comigo na rede.
— Promete?
— Cem por cento, — respondi, deixando-a ir.
Capitulo 1

EMÍLIA

— Não chute o banco, — avisei enquanto meu


filho de dois anos se agitava no banco de trás.
Era quase meia-noite e estávamos na estrada desde que
terminamos de jantar. Nós dois estávamos tão enjoados do
carro que eu queria ter um ataque também. Infelizmente, não
tinha o luxo. Depois de dirigir por todos os estados do oeste,
finalmente estávamos perto de nosso destino final. Faltava
apenas uma hora para chegarmos à cidade e eu poderia
encontrar um hotel para passar a noite.
Alívio com a ideia de finalmente parar em algum lugar
guerreava com a sensação de pavor e ansiedade em minha
barriga. Depois de quase três anos longe, eu finalmente
estava voltando para casa em Eugene. Eu estava ansiosa
para mostrar a Rhett o lugar onde cresci, os parques em que
brinquei e a casa em que moramos com o balanço de pneu no
quintal. A cada quilômetro que nos aproximava de nosso
destino, a sensação de lar aumentava.
— Eu quero sair, — Rhett gritou, chutando o encosto do
banco. — Sair!
— Rhett, — chamei, olhando para ele pelo espelho
retrovisor. — Pare de chutar o assento, amigo. Estamos
quase lá.
— Sair.
— Em breve estaremos lá.
Ele parou de chutar o assento, mas sua carranca estava
clara no espelho. — Obrigada.
— Cansado, — ele resmungou, pressionando as alças
dos ombros para fora do assento como se fosse o Hulk.
— Desculpe, amigo, — eu disse com uma careta. — Eu
sei que você está. Onde estão seus brinquedos?
— Não sei.
Ele ficou em silêncio por alguns minutos, fazendo
beicinho, mas eventualmente deve ter encontrado um
brinquedo porque começou a fazer barulhos de carro
baixinho.
Os sinais ficavam mais familiares quanto mais perto
chegávamos da cidade. Lembrei-me de cada uma das saídas
da rodovia e para onde elas levavam, mas me perguntei o que
encontraria se as pegasse. Quanto mudou em seis anos? Eu
gostaria de ter explorado um pouco antes de ir para casa,
mas com Rhett no banco de trás e minha conta corrente
diminuindo rapidamente, eu não tinha esse luxo.
No momento em que entramos em um motel na saída da
rodovia, Rhett havia adormecido no banco de trás e meus
ombros estavam tão tensos que parecia que estavam
permanentemente presos ao lado de minhas
orelhas. Estacionei, tirei o corpo flácido de Rhett da
cadeirinha e o arrastei até o saguão principal. Ele estava
ficando tão grande que era difícil carregá-lo se ele não
estivesse agarrado como um macaco, mas eu não me
importava.
— Parece que você está com as mãos ocupadas, — disse
a senhora da recepção, sorrindo.
Deixei escapar um suspiro de alívio. Eu encontrei
alguns pervertidos ao fazer check-in em motéis
baratos. Depois de escurecer parecia ser o pior momento para
isso. Os homens viam uma mulher e um bebê e
automaticamente pensavam que éramos presas fáceis ou que
eu estava procurando algum tipo de salvador.
— Só precisamos de um quarto para passar a noite, —
eu disse, passando Rhett para um braço para que pudesse
pegar minha bolsa. — Seu sinal de vaga está aceso.
— Muitos quartos disponíveis, — disse ela, olhando para
o computador enquanto acenava com a cabeça. — Uma cama
está bem?
— Perfeito.
— Ok, bom, — disse ela, piscando para mim. — As
camas de solteiro são mais baratas. Ah, e vejo que você é um
membro do Road Rewards! Boas notícias, isso dá um
desconto.
Eu não tinha ideia do que era um membro do Road
Rewards, mas não discutiria se isso me poupasse
dinheiro. Inferno, eu sapatearia na mesa se ela me dissesse
que isso me pouparia alguns dólares.
Eu a observei por alguns momentos. — Você acha que
eu poderia pagar em dinheiro? — Eu perguntei, mordendo o
interior da minha bochecha. Normalmente, os hotéis não
deixavam você pagar em dinheiro. Eles tinham que ter um
cartão de crédito arquivado, caso você destruísse o quarto,
mas era isso, eu não queria nenhum registro digital da minha
estadia. Não tão perto de casa.
— Você está bem, querida? — ela perguntou, olhando
para a porta atrás de mim.
— Eu prefiro não usar cartão de crédito, — eu disse,
sorrindo fracamente.
Ela olhou para mim e depois para Rhett. — Ok, — disse
ela com um aceno firme. — Agora, não conte a ninguém, mas
para você, vamos abrir uma exceção, só desta vez.
— Muito obrigada, — eu disse, tentando e falhando em
esconder meu alívio.
Depois de assinar e dar-lhe o dinheiro, ela correu ao
redor da mesa para abrir a porta da frente para mim. —
Agora, seu quarto fica a apenas algumas portas do saguão,
querida, — disse ela, apontando. — Então você não precisa
carregar esse menino pelo estacionamento escuro.
— Muito obrigada, — eu disse, as palavras um pouco
presas na minha garganta. Quando foi a última vez que uma
pessoa fez algo gentil por mim? Eu não conseguia me
lembrar.
A senhora apenas sorriu. — O check-out é às onze,
então certifique-se de que esteja tudo limpo, certo? Se não,
eles vão cobrar por um 'outro dia' inteiro.
— Vou sair antes das onze, — concordei.
Usando o que restava da minha energia, peguei nossa
bolsa no carro e o tranquei. A recepcionista estava certa,
nosso quarto ficava a apenas duas portas do saguão, e eu
rapidamente carreguei Rhett para dentro, fechando e
trancando a porta atrás de nós. Caí na cama e desmaiei de
exaustão, a cabeça de Rhett pendendo sobre meu ombro.
Deus, eu estava tão cansada. Pelo menos, eu sabia,
quando chegássemos amanhã, teria um minuto para
respirar. Estávamos na estrada há tanto tempo que os dias
começaram a se misturar. Mesmo quando dormia, parecia
estar um tanto consciente, ciente de cada som em nossos
quartos e nos estacionamentos além. Eu não podia desligá-lo,
ainda não. Eu tinha que ficar de olho em tudo. Eu estava no
comando. Tudo dependia de mim.
— Tudo pronto? — Rhett perguntou grogue.
— Acabei de chegar no nosso quarto, garotinho, — eu
disse, beijando sua testa. — Você está pronto para escovar os
dentes e colocar o pijama?
— Não, — ele lamentou, seus punhos agarrando minha
camisa.
Eu debati internamente por apenas um momento antes
de responder.
— Podemos fazê-los de manhã. Você precisa ir ao
banheiro? — Eu perguntei, ficando de pé.
Ele balançou a cabeça e se enterrou ainda mais em
mim. Eu considerei acordá-lo completamente só para ter
certeza, mas decidi contra isso quase imediatamente. Usar o
peniquinho era praticamente impossível quando você estava
na estrada, e o pouco progresso que tínhamos feito antes de
partirmos havia praticamente desaparecido. Eu estava
cansada demais para lidar com isso.
No momento em que puxei a cama e o coloquei nos
lençóis, ele já estava dormindo novamente. Eu nem me
incomodei com o pijama, apenas o despi da parte de baixo e
uma camiseta e o enrolei com seu cobertor.
Esse cobertor estúpido. Eu o havia esquecido em um
hotel em Utah e tivemos que perder três horas para voltar e
pegá-lo. Era rosa, surrado, puído e com buracos nas bordas,
mas ele adorava. Quando ele era criança, eu tentei trocá-lo
por algo mais novo, mas não adiantou - ele queria o mesmo
cobertor que usei na minha cama durante toda a minha
infância.
Assim que Rhett se acomodou, fui para o banheiro,
deixando a porta aberta para tomar um banho rápido e
escovar os dentes. Eu só sabia que na manhã seguinte meu
pequeno pacote de energia estaria ricocheteando nas paredes
e eu não teria um momento para fazer xixi, muito menos
tomar banho e secar meu cabelo. Eu estava um zumbi
quando finalmente arrastei os pés até a cama e subi ao lado
de Rhett. Levou apenas alguns segundos para eu cair no sono
semiconsciente ao qual estava me acostumando.
Na manhã seguinte, acordei com o rosto de Rhett a
apenas alguns centímetros do meu. — Mamãe, acorda? — ele
sussurrou, os olhos arregalados.
— Sim, mamãe está acordada, — murmurei, gemendo
enquanto me espreguiçava.
— Mais, — ele disse, seu rosto ainda a centímetros do
meu. — Rhett com fome.
— Você está com fome? — Eu respondi fingindo
surpresa enquanto me sentava. — Sem chance.
— Sim, sim, — Rhett rebateu, seu tom combinando
quase perfeitamente com o meu.
— Por que não nos vestimos? — Eu o puxei para o meu
colo. — E então, quando entrarmos no carro, te dou café da
manhã.
— Com fome.
— Sim, eu sei, — eu meditei, colocando-o de pé. — Você
quer tentar ir ao banheiro? Sua fralda ainda está seca.
— Não, — ele respondeu facilmente, vagando para
checar o quarto do hotel.
— Você está pronto para ver onde eu, vovô e vovó
morávamos? — Eu perguntei, levantando-me.
— Vovó, — ele murmurou, puxando a gaveta do criado-
mudo.
— Sim. — Arrumei-me rapidamente enquanto Rhett
estava ocupado e, quando saí do banheiro, ele estava parado
na porta.
— Pronto, — ele anunciou.
— Vamos colocar umas calças primeiro, certo? — Eu
disse com uma risada. — Você vai sentir frio se não se vestir.
— Pronto, — ele respondeu teimosamente, parado na
porta.
— Vamos, amigo, — eu disse, ignorando a expressão
amotinada em seu rosto. — Vamos nos apressar.
Ele suspirou pesadamente, fazendo minha boca se
contrair em diversão, e pisou em minha direção.
— Com roupas.
— Você quer usar sua camiseta do carro? — Eu
perguntei, deixando-o puxá-la da minha mão enquanto eu
procurava por uma calça. — Essa é o sua favorita, hein?
— Camiseta de carro, — disse ele, abraçando-a. Eu tive
que racionar a quantidade que ele usava porque estava com
tanto medo de que a gastasse antes de estar pronto para
desistir. Mais ou menos como o cobertor dele.
— Rhett, pegue seu cobertor agora mesmo e leve para a
mamãe, ok?
— Ok, — disse ele imediatamente. Ele não estava se
arriscando a deixá-lo para trás novamente.
Quinze minutos depois, estávamos saindo de nosso
quarto de motel para o sol fresco da primavera.
— Frio, mamãe, — Rhett disse confuso, olhando para o
sol através de seus óculos escuros.
— Não esquenta aqui até o verão, amigo, — eu respondi,
recolocando-o no meu quadril. Mesmo depois de quase duas
semanas sem problemas, meus olhos ainda vasculhavam o
estacionamento, procurando por qualquer coisa fora do lugar.
— Brr.
— Agora é primavera, — eu disse enquanto destrancava
o carro e jogava nossa bolsa no banco de trás. — E a
primavera é fria no Oregon.
Eu mantive uma conversa enquanto o colocava em seu
assento e pegava uma barra de cereal para o café da manhã e
uma garrafa de água. Eu fazia isso desde que ele era um
bebê, discutindo coisas que estavam muito fora de seu
entendimento, descrevendo o que estávamos fazendo,
apontando coisas que achava que poderiam interessá-lo. Eu
não tinha certeza de porque fazia isso, talvez porque nunca
tivesse tido mais ninguém com quem conversar. À medida
que envelhecia, ele respondia à maioria das coisas que eu
dizia, mesmo que não tivesse certeza do que eu estava
falando. Eu gostava de pensar que era por isso que seu
vocabulário era tão bom, porque eu nunca me calava.
— Obrigado, — disse ele quando finalmente terminei de
descrever o clima do Oregon.
— De nada, — eu disse, afastando o cabelo de seu
rosto. — Sabe, você é meu melhor amigo.
— Meu melhor amigo, — ele respondeu alegremente,
sorrindo com a barra de cereal entre os dentes.
— Só mais uma curta viagem e estaremos lá.
Fechei a porta e corri ao redor do carro, verificando-o no
espelho assim que me sentei novamente.
— Pequenas mordidas, Rhett, — eu o lembrei. —
Mastigue bem, ok?
— OK.
— Hum, não, — eu disse, parando para observá-lo
enquanto ele dava uma grande mordida. — Pequenas
mordidas.
— “Pequenas mordidas”, — ele concordou.
— Tente novamente.
A mordida que ele deu foi tão pequena que duvidei que
ele pudesse sentir o gosto.
— Obrigada. — Eu saí da vaga e dirigi para fora do
estacionamento, meus olhos meio na estrada e meio em
Rhett. Eu sabia que não deveria deixá-lo comer no carro, mas
tive que relaxar em algumas de minhas próprias regras
enquanto estávamos viajando. Se tivéssemos parado toda vez
que ele comia, ainda estaríamos em algum lugar da
Califórnia.
— Tudo pronto, — disse Rhett com um suspiro
enquanto olhava pela janela.
— Nós não vamos ficar no carro por muito tempo, cara,
— eu assegurei a ele, entrando na rodovia.
— Sem carro, por favor, — ele choramingou. Ele já havia
terminado sua barra de cereal e não estava mais distraído.
Eu fiz uma careta. — Apenas olhe pelas janelas, amigo,
— eu disse. — Há todo tipo de coisa para ver.
— Rhett acabou, — ele reclamou. Então, um silêncio
abençoado encheu o carro.
Olhei para ele para ter certeza de que estava bem, então
sorri um pouco para mim mesma quando encontrei uma
estação de rádio familiar. Havia algo sobre as estações de sua
infância que simplesmente ficava com você. Não importa onde
eu morasse, sempre me lembrava das estações que tínhamos
em Eugene. Ia ser um longo dia, mas a nostalgia da música
familiar era um bálsamo.
— É aqui, — eu disse cerca de dez minutos depois,
estacionado em frente à minha casa de infância. Parecia
menor do que eu me lembrava.
— Casa da vovó? — Rhett perguntou, esforçando-se em
direção a sua janela.
— Sim, essa era a minha casa quando eu era pequena
como você, — respondi. — Eu morava lá com a vovó e o vovô.
— Sair, — ele persuadiu, puxando as alças de seus
ombros. — Eu vou.
— Podemos ir olhar, — eu disse com um sorriso
enquanto desligava o carro. — Mas só por fora, ok?
— OK!
— Você precisa ficar com a mamãe, — eu avisei
enquanto o tirava de seu assento. — Sem correr.
— Sem correr, — ele repetiu.
— E você tem que segurar minha mão.
— Vovó, — ele disse enquanto segurava minha mão. —
Casa da vovó.
— Sim, esta era a antiga casa da vovó. — Caminhamos
até a beira do quintal e espiamos por cima da cerca.
— Eu vou, — Rhett disse excitado, puxando minha
camisa para que eu pudesse levantá-lo para ver.
— Não, amigo, não podemos entrar lá, — eu disse, meu
coração trovejando na garganta enquanto olhava para o
quintal familiar. Era estúpido, era apenas uma rede - um
milhão de pessoas tinham uma - mas algo sobre ela
pendurada ali, balançando levemente na brisa me deixou com
saudades do passado.
— Vovó, — Rhett ordenou, balançando no meu
quadril. — Casa da vovó.
Foi então que percebi minha fodida confusão. Meu peito
doeu quando Rhett olhou para frente da casa, se contorcendo
para descer. Ele achou que minha mãe estava lá.
— A vovó não está aqui, amigo, — eu disse gentilmente
enquanto o carregava de volta para o carro. — Esta era a
minha casa quando eu era pequena. Agora é a casa de outra
pessoa.
— Não, casa da vovó, — Rhett gritou, tentando se livrar
dos meus braços, olhando para a casa por cima do meu
ombro.
— Não é... — eu disse, parando quando percebi que ele
não entenderia, não importa quantas vezes eu dissesse
isso. — A vovó não está aí, Rhett.
— Vovó, — disse ele, descansando a cabeça no meu
ombro. Ele fungou e eu engoli contra o nó na garganta. —
Vovô?
— O vovô também não está, amigo, — eu disse
suavemente, balançando-o de um lado para o outro. — Sinto
muito.
— Sinto muito, — ele repetiu, as palavras abafadas
contra o meu pescoço.
— Vai ficar tudo bem, — murmurei. — Eu prometo.
— Meu melhor amigo, — ele respondeu calmamente.
— Bem, isso é bom, — eu provoquei enquanto o
colocava de volta em seu assento. — Porque você
é meu melhor amigo. Você está pronto para a próxima
parada?
— Sem carro, — disse ele com um suspiro, deixando-me
afivelá-lo.
— Não é muito longe, — eu disse, meu estômago
revirando com memórias e ansiedade. — Apenas alguns
minutos e então você pode correr e brincar, ok?
— OK. — Ele não parecia acreditar em mim, e eu não
estava surpresa. Eu o estava arrastando com a garantia de
que chegaríamos em breve e apenas um pouco mais por
dias. Ele superou isso e, francamente, eu também.
A viagem durou apenas alguns minutos, como eu havia
dito a Rhett, mas pareceu uma vida inteira. As lembranças de
dirigir exatamente na mesma rota me atingiram como uma
marreta e, quando estávamos dirigindo lentamente pela
entrada de cascalho, senti que a qualquer momento iria
explodir em gargalhadas histéricas ou vomitar.
— Árvores? — Rhett perguntou excitado, apontando
para fora de sua janela.
— Estamos cercados por árvores desde que chegamos ao
Oregon, — eu disse com uma risada.
— Muitas árvores.
— Sim, há muitas árvores. — Olhei pelo para-brisa,
maravilhada com as mudanças e todas as coisas que
permaneceram as mesmas. A porta da frente estava pintada
de vermelho agora, e havia um enorme vaso próximo a ela
cheio de plantas de todas as cores. Parecia bom. O telhado
era de uma cor diferente, eles devem ter reformado. Eles
haviam mudado o paisagismo da frente da casa, estava mais
polido do que da última vez que a vi. Mais chique.
— Fora? — Rhett perguntou.
— Claro, — eu disse, respirando fundo. — Só um
segundo e irei te pegar.
Endireitei os ombros e abri a porta, sabendo que pelo
menos uma pessoa estava olhando pela janela para ver quem
estava na garagem. Quando você morava na cidade, você se
acostumava com as pessoas passando de carro ou
estacionando na calçada. Você nem percebia isso depois de
um tempo. Mas quando morava em uma propriedade, não
havia motivo para alguém estar na frente de sua casa, a
menos que estivesse lá para vê-lo. Um carro em sua entrada
era sempre perceptível.
Dei a volta no carro, mantendo os olhos longe da frente
da casa. — Tudo bem, — eu disse, afastando o cabelo de
Rhett de seu rosto. — Está pronto?
— Sim. — Ele balançou os pés com impaciência.
— Bom comportamento, certo? — Eu disse enquanto o
tirava e o colocava de pé. — Use suas boas maneiras.
— Boas maneiras, — ele concordou, olhando para a
casa ao meu redor.
— Vamos, então, — eu disse, agarrando sua mão.
Ele andou ao meu lado como se fosse a coisa mais
normal do mundo visitar a casa de um estranho aleatório no
meio da floresta. Juro que nada jamais perturbava Rhett. Ele
estava alegremente absorvendo tudo quando a porta se abriu
e um rosto familiar entrou em foco.
— Emmy? — Myla disse em descrença. Seus olhos se
arregalaram quando ela olhou para mim e depois para
Rhett. Por alguns segundos ela ficou boquiaberta como um
peixinho dourado, então se virou para olhar por cima do
ombro. — Mãe, é melhor você vir aqui!
— Ei Myla, — eu disse, sorrindo sem entusiasmo. Eu
sabia que era estranho eu estar ali, e sabia que
provavelmente todos estavam muito zangados comigo e
ficariam ainda mais zangados no final do dia, mas ainda
assim era maravilhoso vê-la. Ela estava linda. Eu sabia
quando era apenas uma criança desajeitada que ela seria.
— O que há de errado? — sua mãe perguntou, chegando
atrás dela. Quando ela passou por Myla para olhar para fora
da porta, sua mão disparou para cobrir sua boca. — Puta
merda.
— Ei, Sra. Hawthorne, — eu disse sem jeito quando
Rhett passou os braços em volta da minha coxa e encostou a
cabeça no meu quadril. — Faz algum tempo.
— Puta merda, — ela sussurrou novamente, com os
olhos em Rhett.
— Mamãe, levanta, — Rhett sussurrou, seu corpo
praticamente vibrando de tensão.
Ergui meu filho no colo, mas esse foi o único movimento
na frente da casa até que alguém enfiou a cabeça por cima do
ombro da Sra. Hawthorne.
— Ele não mora mais aqui, — disse o adolescente
categoricamente, com os olhos em mim.
Levou um momento para perceber quem era. — Otto? —
Eu gaguejei em descrença.
Ele era enorme, ainda maior do que Michael na sua
idade.
— Com o que estão te alimentando? — Eu perguntei
estupidamente.
— Literalmente tudo, — Myla disse secamente,
esquivando-se enquanto Otto tentava golpeá-la por trás de
sua mãe.
— Mamãe vai? Rhett vai? — Rhett perguntou. Ele
pressionou o rosto contra o meu pescoço.
— Puta merda, — a Sra. Hawthorne disse uma última
vez enquanto descia os degraus. Em segundos, ela passou os
braços em volta de mim e de Rhett, puxando-nos para um
abraço apertado. — Ah, querida. Eu estive tão preocupada
com você.
Estremeci ao sentir seus braços em volta de mim. Eu
esperei anos por essa sensação em particular.
— Parece que ela está bem para mim, — Otto disse da
porta. Ele estava encostado no batente, os braços cruzados
sobre o peito.
— Cale a boca, Otto, — sibilou Myla.
— Você está bem? — Sra. Hawthorne perguntou,
inclinando-se para trás para olhar na minha cara.
— Estou bem, — eu disse calmamente.
— E quem é este? — ela perguntou, dando um passo
para trás.
— Este é Rhett, — eu disse, minha voz tremendo um
pouco.
— Quem é o pai? — Otto perguntou sarcasticamente.
— Otto William, — disparou a Sra. Hawthorne, virando
a cabeça para encarar o filho. — Se não entrar agora, vou
deixar seu irmão lidar com você quando chegar aqui.
— Ele não vai... — A boca de Otto se fechou com o que
quer que ele tenha visto no rosto de sua mãe. Sem outra
palavra, ele girou e desapareceu lá dentro.
— Ignore Otto, — disse a Sra. Hawthorne, sua voz suave
enquanto falava com Rhett. — Ele é como um urso mal-
humorado com um espinho na pata.
— Urso? — Rhett perguntou, virando a cabeça um
pouco para poder olhar para ela com a testa ainda enfiada no
meu pescoço.
— Sim, ele é como um urso, — disse a Sra.
Hawthorne. — Um urso mal-humorado e fedorento.
— Huh, — Myla meditou da varanda. — Essa é uma boa
descrição de Otto.
— Vocês querem entrar? — A Sra. Hawthorne perguntou
timidamente, tirando os olhos de Rhett por apenas um
segundo para olhar para mim. — Temos lanches e bebidas.
Ela fez uma careta para mim e falou com Rhett. — Você
está com sede? Quer um pouco de suco?
— Aposto que ele adoraria, — eu disse, sorrindo para
ela. Rhett raramente bebia nada além de água ou leite. —
Você quer um pouco de suco, Rhett?
— Sim, — disse ele, levantando a cabeça.
— Entre, — disse a Sra. Hawthorne, liderando o
caminho. — Temos todos os tipos diferentes.
Eu a segui para dentro de casa e tive um déjà vu
enquanto atravessávamos a sala até a cozinha. Tudo era o
mesmo. Eles tinham um sofá novo, mas estava no mesmo
lugar. As mantas eram de cores diferentes, mas ainda
estavam espalhados desordenadamente sobre os móveis. As
fotos nas paredes foram adicionadas, mas as antigas ainda
estavam lá. A mesa da entrada havia sido pintada, mas o
formato era familiar. Havia mochilas empilhadas no banco
perto da porta e, por um instante, pude ver minha roxa do
colégio na pilha.
— Myla, você pode pegar um pouco de suco para Rhett?
— ela perguntou. — Use um dos copos com canudinho, ok?
— Ela olhou para mim. — Eu volto já.
— Claro, — disse Myla, dirigindo-se para a porta da
cozinha. — De que tipo vocês gostam? Temos tudo.
— Nada para mim, — eu disse, desejando poder colocar
Rhett no chão para poder esfregar minhas mãos suadas em
meus jeans. — Mas obrigada.
— Você gosta de suco de laranja? — perguntou Myla.
— Suco de maçã, — respondeu Rhett timidamente.
— É o favorito dele. — Eu balancei Rhett um pouco no
meu braço. — O que você diz, Rhett?
— Por favor.
— Entendi, — ela disse. — Volto logo.
Ela saiu e a gravidade da situação se instalou na boca
do meu estômago. Eu sabia com absoluta certeza que a Sra.
Hawthorne tinha ido ligar para o marido e provavelmente
para Michael também. Ela estava dizendo a eles para virem
para casa. Estava dizendo a eles que apareci do nada com um
pequeno terrorista no quadril que parecia com Michael. Ela
estava...
— Ok, eu trouxe um café gelado para você, embora
tenha dito que não queria nada, — disse Myla enquanto
voltava para dentro. — Achei que você não iria querer uma
cerveja já que está dirigindo, então a cafeína teria que servir.
— Quanto tempo eu estive fora? — Eu perguntei com
tristeza, balançando a cabeça.
— Ei, eu posso ter apenas dez anos, mas sei o que está
acontecendo.
— Eu posso ver isso, — eu disse enquanto Rhett
endireitou seu corpo, tentando descer. Eu o coloquei de pé.
— Provavelmente deva beber isto à mesa, — disse Myla
a Rhett, pousando o copo com canudinho. — Para você não
derramar.
— Vá em frente, amigo, — eu disse, empurrando um
pouco suas costas para fazê-lo se mexer. Assim que ele subiu
na cadeira, fiquei atrás dele, passando meus dedos por seu
cabelo.
— Eu também gosto de suco de maçã, — disse Myla,
sentando-se na cadeira em frente a ele. — Mas o meu
preferido é o abacaxi. Você gosta de suco de abacaxi?
Rhett olhou para mim.
— Acho que ele nunca tomou. — Eu sorri. Ela era
exatamente como eu me lembrava, e senti algo dentro de mim
revirar ao saber disso. Por alguma razão, a tagarelice de Myla
me fez sentir como se tivesse feito a coisa certa ao vir para cá.
— Oh cara. — Myla suspirou dramaticamente. — Este é
o melhor. Da próxima vez, você terá que provar. Aposto que
você vai adorar.
— A maçã favorita de Rhett, — disse Rhett alegremente,
tomando um gole de seu suco.
— Boa escolha, Rhett, — respondeu Myla. — Você sabia
que abacaxi cresce no chão? A maioria das pessoas pensa
que crescem em árvores como maçãs, mas não.
Rhett balançou a cabeça e eu sabia que ele estava
entendendo apenas metade do que ela dizia, mas estava
fascinado.
— Estou de volta, — disse a Sra. Hawthorne, deslizando
para a cozinha. — Vocês receberam suas bebidas? Estão com
fome?
Rhett olhou para mim interrogativamente e eu assenti.
— Com fome, — disse ele calmamente.
— Bem, então teremos que pegar algo para você
comer. Do que você gosta?
— Maçãs, — respondeu Rhett.
— Talvez algo mais fácil, — eu disse, colocando minha
mão em seu ombro.
— Eu tenho biscoitos, — disse a Sra. Hawthorne com
um sorriso. — Você gosta de biscoito? E talvez algumas uvas?
— Biscoitos, — disse Rhett com um aceno de cabeça.
— O que você diz, amigo? — Eu sussurrei.
— Por favor.
— Você tem boas maneiras, — disse a Sra. Hawthorne
enquanto entregava alguns biscoitos a Rhett. — Myla, você
quer lavar algumas uvas para mim?
— Tudo bem, — disse Myla, levantando-se da mesa.
— Ei, Myla, — eu chamei, sentindo-me completamente
desconfortável, mas incapaz de me conter. — Você poderia
cortar essas uvas em quatro?
— Eu sou uma idiota, — disse a Sra. Hawthorne com
tristeza.
— Não, — eu argumentei instantaneamente. — Não, eu
sou apenas superprotetora. Sempre fico com medo de que ele
engasgue.
— Isso não é superproteção, apenas inteligência! —
disse a Sra. Hawthorne, sorrindo para Rhett. — Sua mãe
sabe o que está fazendo.
Estávamos todos parados enquanto meu filho comia
suas uvas quando o Sr. Hawthorne entrou pela porta da
cozinha, parando abruptamente quando me viu.
— Bem, inferno, — disse ele, parecendo surpreso,
embora a Sra. Hawthorne devesse tê-lo avisado. — Bom vê-la,
garota.
— Você também, — murmurei. Ele deve ter vindo direto
do trabalho porque estava vestindo uma camiseta
engordurada. Ele também obviamente saiu de lá com pressa
porque, embora tivesse limpado bem as mãos e os pulsos,
ainda havia gordura preta começando na metade de seus
antebraços.
— Santo Cristo, — ele murmurou quando Rhett se virou
para olhar para ele.
— Este é Rhett, — eu disse, colocando minha mão
gentilmente no topo de sua cabeça.
— Não é o retorno1, — a Sra. Hawthorne brincou.
— Você não é engraçada, — disparou o Sr. Hawthorne,
mas não havia calor nas palavras.
— Só tentando aliviar o clima, — disse ela um pouco
nervosa.
O Sr. Hawthorne balançou a cabeça. — É um prazer
conhecê-lo, Rhett, — disse ele, com os olhos no meu
menino. — Receio que o clima não vai melhorar. Mick...
— Bem atrás de você, — Myla disse prestativamente.
Meus olhos dispararam acima do ombro do Sr.
Hawthorne e minha barriga mergulhou de uma forma que
não acontecia há quase três anos. Minha pele formigava,
minha boca salivava e eu podia ouvir meu coração batendo
em meus ouvidos quando seus olhos encontraram os meus.
Então tudo dentro de mim se acalmou enquanto seus
olhos viajavam pelo meu braço até onde meus dedos se
enredavam no cabelo de Rhett, seus olhos se arregalaram e
ele perdeu o equilíbrio, tropeçando no batente da porta.

1 Aqui ela faz uma brincadeira sobre o nome Rhett, do mocinho de E o Vento Levou.
Capitulo 2

MICHAEL

Eu não acreditei muito quando meu pai veio me avisar


que Emilia tinha aparecido na casa deles do nada. Eu sabia
que não era algo sobre o qual ele mentiria - qual seria o
sentido disso? Eu simplesmente não conseguia realmente
envolver minha cabeça em torno disso. Eu não tinha visto ou
ouvido falar dela em três malditos anos.
Um dia estávamos felizes como o inferno flutuando rio
abaixo em um par de câmaras de ar e no outro, ela
simplesmente desapareceu. Nenhum telefonema. Nenhuma
carta. Nada. Seus pais simplesmente embalaram tudo e
partiram para lugares desconhecidos. A única razão pela qual
sabíamos que eles não estavam mortos em uma vala em
algum lugar era o fato de que um corretor de imóveis local
que meu pai conhecia havia passado o resto do verão
tentando vender a casa deles.
Então, enquanto reconhecia o velho Subaru estacionado
na frente da casa dos meus pais, eu ainda estava atordoado
quando entrei na cozinha e lá estava ela, de pé ao lado da
mesa como se o tempo não tivesse passado. Seu cabelo
estava mais comprido do que eu já tinha visto e seu rosto
estava mais fino, fazendo seus olhos parecerem ainda
maiores do que antes - mas era ela. Eu a reconheceria em
qualquer lugar.
Olhei para seu corpo instintivamente, calculando as
mudanças e me certificando de que ela estava inteira, mas
parei em seu quadril. Um rostinho espiou por trás da cadeira
ao lado dela e parecia que minhas pernas haviam se
transformado em água embaixo de mim. Eu tropecei para o
lado, quicando no batente da porta.
— Michael. — Ela deu um passo à frente preocupada,
então parou quando recuperei o equilíbrio.
— Que diabos? — Eu respirei, olhando para aquele
rostinho.
Foi como ser transportado de volta no tempo e me olhar
no espelho.
— Este é o Rhett — disse Emilia. Ela estava tentando
parecer confiante, e isso provavelmente teria funcionado se a
voz dela não tivesse tremido.
— Olá, Rhett, — gaguejei, ainda completamente
desorientado. Ele se parecia tanto comigo. Ele tinha que ser
meu, certo? Claro que ele era. Ele tinha a idade certa.
— Você quer se sentar antes de cair? — meu pai
perguntou baixinho.
Dei um passo à frente e então parei. Eu queria tocá-
lo. Passar minha mão por seu cabelo, descer por seus
braços. Eu queria segurá-lo, mas ele ainda estava espiando
nervosamente ao redor da cadeira e eu sabia que, sem
dúvida, se eu fizesse alguma dessas coisas, iria assustá-lo.
Ele roía as unhas? Ele parecia alto. Qual era a altura
dele quando estava de pé?
— Oi, — Rhett disse suavemente, seu polegar entrando
em sua boca.
— Eu sou... — eu me debati. Eu deveria lhe dizer meu
nome? Como você se apresentava para a porra do seu próprio
filho?
— Ele sabe quem você é, — disse Emilia, passando a
mão sobre a cabeça dele do jeito que eu queria. — Não é,
Rhett?
Ele olhou para Emilia em confusão antes de olhar para
mim. Ela se agachou ao lado dele e virou a cadeira para que
ambos ficassem de frente para mim.
— Você o conhece, — ela disse gentilmente enquanto
ambos olhavam para mim. — Olhe para o rosto dele,
bebê. Quem é esse?
A boca de Rhett se abriu em reconhecimento animado e
sua cabeça virou para o lado para olhar para sua mãe. —
Papai?
— É ele, — ela confirmou, com os olhos em nosso filho.
— Grande, — Rhett sussurrou, fazendo meu pai rir.
— Eu disse que ele era grande. É por isso que você é tão
alto, — ela disse com um sorriso, cutucando-o no lado. — E
vocês têm os mesmos olhos castanhos.
— Oi, — disse Rhett novamente, olhando para mim.
— Oi, amigo, — eu disse asperamente. Eu sabia que
deveria fazer alguma coisa. Dizer algo. Mas parecia que o
mundo havia mudado de repente e eu estava tentando
descobrir como me manter de pé. Minha pele estava
quente. O ar na sala parecia muito rarefeito.
Avancei e me agachei a alguns metros dele.
— Você está comendo um lanche? — Eu disse
estupidamente, passando minha mão sobre minha
barba. Porra, eu nem tinha me olhado no espelho antes de
sair da loja. Eu provavelmente parecia um maldito louco com
meu cabelo voando por todo o lugar.
— Sim, lanche, — ele respondeu facilmente.
— Eu disse que íamos ver seu pai, — disse Emilia,
colocando a mão nas costas dele.
— Papai, — Rhett repetiu, estendendo a mão para tocar
minha barba. Ele retirou a mão rapidamente e se encostou
em Emilia.
— Está ficando meio comprida, — eu disse, estendendo
a mão para puxar minha barba. Rhett apenas olhou para
mim, balançando um pouco as pernas.
— É muito bom conhecê-lo, — eu sussurrei. — Você é
tão grande.
— Tenho dois anos, — Rhett respondeu com o polegar
na boca. Levei um segundo para decifrar o que ele disse.
— Você tem dois anos? — Eu deixei minha boca aberta
em surpresa. — Uau. Você dirigirá um carro em breve.
— Sem carro, — disse Rhett, franzindo o nariz.
— Ele está cansado do carro, — Emilia explicou com
uma risada envergonhada. — Eu realmente não o culpo. Foi
uma longa viagem.
De repente, e sem aviso, senti como se fosse chorar
como um bebê. Quanto tempo de viagem foi? Onde eles
estiveram?
— Camiseta de carro, — Rhett me disse, erguendo as
sobrancelhas enquanto apontava para o peito. Parecia que ele
estava dizendo merda de carro, e não pude evitar o sorriso
que puxou meus lábios.
— Essa camiseta é muito legal.
— É a favorita dele, — disse Emilia, soando tão abalada
quanto eu.
— Sua camiseta de carro? — Rhett perguntou, tirando o
polegar da boca.
— Eu não tenho uma camiseta de carro. — Eu balancei
minha cabeça. — Mas tenho algumas camisetas de
motocicleta.
— Motocicleta, — respondeu Rhett, com os olhos
brilhando. Ele fez um som notavelmente semelhante ao
rugido da surdina da Harley.
— Uau, cara, — eu disse, caindo sobre meus
calcanhares, fazendo-o rir. Ele fez o som novamente. — Você
é bom nisso!
— Sim, ele gosta de motocicletas, — Emilia
murmurou. — Não é, Rhett?
— Nenhuma surpresa aí, — minha mãe disse, com a voz
trêmula.
— Mãe, preciso lavar roupa. Não vou mais à
lavanderia. As old ladies sempre dão em cima de mim, e
estou começando a ter dificuldade em lutar contra elas... —
Rumi gritou da frente da casa. — De quem é o carro na
frente? Juro que se parece com aquele...
Ele parou atordoado quando chegou à cozinha,
boquiaberto de surpresa. — Emília?
— Ei, Rum, — disse Emilia, endireitando-se. — Como
você está?
— Puta merda, — ele gritou, deixando cair o saco de lixo
de roupa enquanto cambaleava para ela. Ele não hesitou por
um segundo antes de envolvê-la em um abraço de urso e
girá-la em um círculo. — Onde diabos você esteve, duende?
— Essa é uma boa pergunta, — eu disse. Eu não queria
tocá-la, mas a facilidade com que ele fez isso fez algo como
ciúme queimar em meu peito.
Rumi olhou para mim e depois para Rhett, e colocou
Emilia abruptamente de pé novamente.
— Quem é você? — ele perguntou a Rhett confuso.
Rhett imediatamente se calou e seu polegar voltou à
boca.
— Você teve um filho, — meu irmão disse
estupidamente, seu tom ainda incrédulo.
— Este é Rhett, — Emilia confirmou suavemente.
— Ei, Rhett, — disse Rumi, ainda olhando para meu
filho. — Eu sou Rumi.
— Rumi, — Rhett murmurou, inclinando a cabeça para
trás para olhar para sua mãe.
— Sim, esse é o seu nome também, hein? — Seus olhos
encontraram os meus e ela desviou o olhar rapidamente. —
Você pode dizer seu nome completo?
— Rhett Michael Rumi Hawtorne, — disse Rhett. Ele
claramente praticou isso.
Emília assentiu. — Rhett Michael Rumi Hawthorne.
— Você deu a ele o meu nome? — Rumi perguntou
incrédulo.
Emilia deu de ombros e estendeu a mão para tirar o
cabelo do rosto. Ela parecia envergonhada.
A sala estava em silêncio e quando Rhett estendeu a
mão para Emilia, ela imediatamente o levantou em seus
braços. Quando ele pressionou o rosto em seu pescoço, ela
inclinou a cabeça para baixo na dele e sussurrou algo que
não consegui ouvir.
— É um pouco opressor, — disse ela para a sala,
desculpando-se, esfregando as costas de nosso filho.
Ele era tão alto que seus pés pendiam até a altura dos
joelhos dela.
— Eu conheço a sensação, — eu murmurei, passando
minha mão pelo meu rosto.
— Michael... — ela disse suavemente.
Eu a interrompi com um movimento de cabeça. Eu não
queria falar com ela. Ainda não. Não queria ouvir nenhuma
desculpa ou explicação; Eu não queria lidar com nada disso –
não agora. Não quando estava olhando para o topete na parte
de trás da cabeça do meu filho pela primeira vez.
Eu não tinha frequência para lidar com mais nada. Só
ele.
— Por que não peço um almoço para nós? — disse
minha mãe, com os olhos em Emilia. — Vocês vão ficar para
o almoço?
Cada músculo do meu corpo se contraiu. De jeito
nenhum ela iria embora.
A tensão na sala disparou.
— Claro, podemos ficar para o almoço, — respondeu
Emilia.
— Ei, Rhett, — minha irmãzinha chamou, caminhando
pela sala até que estava no ombro de Emilia. — Você quer ir
brincar lá fora comigo por um tempo?
— Fora? — Rhett perguntou, sua voz abafada.
— Sim, — respondeu Myla. — Há todo tipo de coisa para
fazer lá fora.
— Talvez vocês devam ficar dentro de casa, — eu disse
automaticamente. Eu não queria ele fora da minha vista,
ainda não. O constrangimento atingiu como um tijolo no
rosto quando encontrei o olhar de Emilia.
— Vou observá-lo bem de perto, — disse Myla quando
Rhett estendeu a mão para ela. — Eu prometo.
Emilia mordeu o interior da bochecha.
— Ela fica de olho em todos os pequenos há alguns
anos, — minha mãe assegurou a Emilia. — Ele estará seguro
com ela.
— Tudo bem, — Emilia concedeu. Ela não parecia
segura, mas permitiu. — Aqui, baby, coloque seus óculos de
sol.
Assim que saíram de casa, os cinco adultos ficaram
parados em silêncio. — Temos muito o que conversar, —
Emilia disse suavemente.
Ela estava falando comigo, mas eu não conseguia nem
olhar para ela. Agora que Rhett estava fora do alcance da voz
e eu não precisava regular o que dizia e fazia, todas as
emoções borbulhavam à superfície. Raiva, descrença,
vergonha, euforia e, surpreendentemente, alívio, guerrearam
entre si até meu estômago revirar com náuseas.
— Você tem um monte de explicações a dar, — disse
meu pai, cruzando os braços sobre o peito enquanto se
recostava no balcão.
— Eu sei, — ela disse.
Eu ainda não conseguia olhar para ela.
— Acho que não, — papai respondeu. Ele olhou para
minha mãe por um momento e então suspirou. — Mas antes
de entrar nisso tudo, quero que você saiba, que sempre foi
bem-vinda nesta casa e sempre será bem-vinda nesta casa.
— Obrigada. — Parecia que Emilia estava chorando,
mas eu estava tão concentrado em manter tudo sob controle
que ainda não olhava para ela.
— Bem, isso é besteira, — meu irmãozinho Otto disse do
corredor. — Ela foi embora, deixe-a ficar longe.
— Cale a boca, Otto, — eu lati.
— Ela fugiu e roubou seu filho, — disse Otto, olhando
para mim incrédulo.
— Não é tão simples assim, Otto, — disse Emilia.
— Não fale comigo, — ele respondeu categoricamente.
— Mais uma palavra e teremos problemas, — meu pai
disse sombriamente, fazendo Otto girar nos calcanhares e
sair da sala novamente.
— Está tudo bem, — Emilia murmurou. — Eu entendo
por que ele está bravo.
— Não pense que bravo é uma descrição precisa, —
Rumi disse em um tom que nunca havia usado com Emilia
antes.
— Eu...
— Você pode sentir o que quiser, Rumi, — disse minha
mãe. — Otto também. Mas isso é entre Mick e Emilia.
— Por que nenhum de nós ficou muito preocupado
quando ela partiu? — Rumi latiu. — Porque nenhum de nós
foi procurá-la e acalmou Mick quando...
— Porque eles compartilham um filho e nada é mais
importante do que isso, — minha mãe respondeu,
interrompendo-o no meio da frase. — Vou pedir comida
chinesa. Rhett tem alguma alergia?
— Não, — Emilia respondeu, a palavra quase inaudível.
Rumi olhou para Emilia. — Eu não posso acreditar que
você teve um bebê, e nunca...
— Não, filho, — meu pai ordenou, interrompendo
Rumi. — Temos tempo para isso mais tarde. Vamos, vamos
dar a eles um minuto.
Ele empurrou Rumi para fora da sala e de repente
éramos só eu e Emilia.
— Sinto muito, Michael, — ela disse suavemente, as
palavras como unhas em um quadro-negro. — Não tenho
desculpas. Eu... nós estamos aqui agora, no entanto.
— Você está aqui agora? — Eu perguntei,
deliberadamente mantendo minha voz baixa para que os
pequenos ouvidos de fora não captassem. — Você está
brincando comigo?
— Fiz o melhor que pude com as opções que tive, —
disse ela teimosamente.
— Ele tem dois anos! — Eu olhei para ela.
Eu a conhecia. Eu conhecia a maneira como ela se
movia e ria e a sarda na sola do pé esquerdo. Eu sabia como
ela comia seus hambúrgueres e a sensação do calo em seu
dedo médio onde segurava uma caneta. Eu conhecia tudo. Eu
tinha visto cada emoção cruzar seu rosto, cada corte de
cabelo ruim que ela já teve. Inferno, ela pegou emprestado
meu moletom quando teve sua primeira menstruação na
sexta série e sangrou nas calças. Eu a conhecia, mas olhando
para ela agora parecia que estava olhando para uma maldita
estranha.
— Eu posso te contar tudo, — ela disse, movendo-se em
minha direção. — Eu sei que você não vai me perdoar, mas
talvez isso explique um pouco porque... — Ela estendeu a
mão para tocar meu braço e sem pensar, eu o afastei.
— Você foi sequestrada? — Eu perguntei, olhando para
ela. — Esteve presa em um buraco nos últimos três anos?
— Não, — disse ela, balançando a cabeça.
— Amnésia?
— Não, eu...
— Proteção a testemunha?
— Não, eu não estava no programa de proteção a
testemunhas, — ela respondeu, exasperada. — Você vai me
deixar falar?
— Eu já sei como foi, — eu disse bufando. E eu
sabia. Eu sabia exatamente o que tinha acontecido. Eu
apostaria cada centavo que tinha nisso.
— Claro, — ela disse sarcasticamente. — Depois de dez
minutos conosco, você simplesmente sabe tudo.
— Nem tudo, — eu resmunguei. — Quando é o
aniversário dele?
— Dezesseis de fevereiro, — ela disse, endireitando os
ombros. — Ele perdeu por pouco o Dia dos Namorados.
— Ele já está na escola?
— Não, ele não começou a escola, — ela murmurou
incrédula. — Ele não tem idade suficiente.
Minhas bochechas queimaram de vergonha. Eu deveria
saber disso.
— Qual é a coisa favorita dele para fazer?
— Brincar em uma caixa de areia ou terra. A segunda
favorito é brincar com carros. Qualquer carro, grande,
pequeno, o que for.
— Cor favorita?
— Ele ainda não tem uma.
— Comida favorita?
— Pizza.
— O que... — Minha voz falhou, e eu limpei minha
garganta. — Como ele era quando bebê?
— Ele era um filhinho da mamãe, — ela respondeu
suavemente. — Ele queria estar em qualquer lugar que eu
estivesse. Feliz. Ele dormiu bem desde o começo.
— Ele era grande ou pequeno?
— Enorme, — disse ela, fungando um pouco enquanto
sorria. — Ele pesava quatro quilos e duzentos quando
nasceu.
— Diga-me outra coisa, — eu exigi.
— O que?
— Diga-me algo que não sei perguntar, — eu disse em
frustração. Eu tinha perdido tudo. Eu nem sabia o que
deveria saber.
— Ele dorme na cama comigo, — disse ela, mordendo a
parte interna da bochecha. — Ele arrasta meu velho cobertor
rosa como se fosse um de seus membros. Ele não gosta de
crosta em nada, então não come. Hum… ele sempre usa
óculos escuros do lado de fora porque diz que está muito
claro mesmo quando está nublado. Foi por isso que os
coloquei nele quando o mandei para fora.
Eu balancei minha cabeça e olhei para o chão. Foram
apenas pedaços. Eu não o conhecia. Olhei para ele e o amei,
mas não tinha a menor ideia de como ele era.
— Por favor, — disse ela, caminhando em minha
direção. — Deixe-me explicar.
Eu olhei para ela. — Eu não quero que a primeira
memória do nosso garoto seja de nós brigando, — eu
resmunguei. — Então, vamos deixar isso de lado por
enquanto.
— Eu não quero adiar isso, — ela argumentou. — Eu
pelo menos tenho o direito de realmente contar o que
aconteceu.
— Você fugiu. Você não tem direitos, porra, — eu
respondi, lutando para manter minha voz baixa.
Se ela tivesse discutido de novo, eu poderia ter mantido
distância. Se ela tivesse ficado frustrada e séria, eu teria sido
capaz de desligá-la. Mas com a pouca luta que tinha drenado
dela, e seu queixo começando a tremer, fui jogado de volta ao
nosso último ano do ensino médio quando ela apareceu
depois de uma briga particularmente ruim com seus pais,
com os olhos vazios e tristes.
— Você está absolutamente certo, — ela disse
suavemente, seus olhos se enchendo de lágrimas. — Estou
tão feliz que finalmente estamos aqui. — Ela deixou cair o
rosto nas mãos e estremeceu com um soluço reprimido. —
Deus, demorou tanto.
Eu nunca tinha conseguido vê-la chorar sem
fazer alguma coisa e acho que ainda não conseguia, porque
antes que eu percebesse o que tinha feito, meus braços a
envolveram. Ela pressionou a testa contra o meu peito e
estremeceu.
— Eu sei que você não vai me perdoar, — ela
murmurou. — Eu sei. Mas finalmente estamos aqui.
— Shh, — eu sussurrei contra o topo de sua
cabeça. Jesus, como se passaram três anos desde a última
vez que a senti contra mim? Como tanto tempo
passou? Parecia impossível. Seu cabelo parecia o mesmo,
mas notei agora que estava preso na minha barba.
Ficamos em silêncio por um tempo enquanto ela se
acalmava. Ela tinha o mesmo cheiro, mas não parecia a
mesma. Ela estava mais magra do que antes, com mais
ângulos do que curvas, mas ainda parecia incrível. Quando
ela deslizou os braços em volta da minha cintura e
pressionou seu peito mais contra mim, eu sabia que
precisava colocar algum espaço entre nós. Minha mente
estava começando a viajar por uma estrada muito perigosa.
— Você chamou meu filho de Rhett? — Eu murmurei,
afrouxando meus braços.
— O que há de errado com Rhett? — ela perguntou, se
afastando. — É um nome incrível.
— Se você diz.
— Seu nome é perfeito, — ela disse teimosamente.
— Ele parece um velho cavalheiro sulista.
— Bom.
— Não somos do sul.
— Eu dei a ele seu nome também, — ela apontou.
— E aparentemente o de Rumi, — eu disse secamente,
passando minhas mãos sobre meu rosto.
— Bem, eu sabia... — Ela parecia afobada enquanto
olhava ao redor da cozinha. — Eu sabia que você escolheria
Rumi, mas queria que ele tivesse o seu nome. — Ela olhou
para mim desafiadoramente. — Então foi por isso.
Eu olhei para ela.
— Quem está aqui? — meu irmão mais novo, Titus,
gritou ao passar pela porta da frente. — O carro de alguém
está na frente. Olá? Onde está todo mundo?
Ele entrou na cozinha correndo, escorregando nas meias
até a mesa antes de se segurar.
— Que diabos? — ele disse confuso quando avistou
Emilia.
— Ei, Titus, — ela disse, sorrindo nervosamente.
— Você voltou?
— Voltei.
— Puta merda, — disse ele, olhando para mim. — Onde
diabos você estava? Mick enlouqueceu quando você...
— Titus, — eu gritei, interrompendo-o. — Você fede,
cara. Tome um banho.
— Tente correr uns oito quilômetros e veja como cheira,
— ele retrucou, levantando o braço para cheirar o sovaco. —
Nah, eu estou bem.
— Você cheira a bunda.
— Então não vou chegar muito perto, — ele disse
exasperado, revirando os olhos. — Jesus.
— Você está fazendo trilha?
— Sim, — disse Titus, tirando as meias. — E sou mais
rápido que todos, então estou no time do colégio.
Eles continuaram conversando, mas eu os desliguei
enquanto me aproximava e olhava pela grande janela atrás
da mesa de jantar. Myla e Rhett estavam brincando no andar
de baixo da casa da árvore, que na verdade era apenas uma
plataforma a cerca de trinta centímetros do
chão. Antigamente, tínhamos uma pequena mesa de
piquenique lá. Observei enquanto os dois conversavam,
falando a mil por hora.
Eles tinham acabado de se conhecer, mas suas
expressões e a maneira como se moviam eram muito
semelhantes. Com seus cabelos castanhos combinando, eles
pareciam irmãos. Rhett disse algo para Myla, e ela assentiu e
pulou da plataforma. Quando ela se virou para encará-lo, ele
pulou também. Não deveria ser grande coisa. A queda não foi
muito grande, mas algo deve tê-lo feito tropeçar porque ele
caiu com as mãos e joelhos no cascalho abaixo, seus óculos
de sol caindo de seu rosto.
Eu estava em movimento antes mesmo de ouvi-lo
uivar. Quase os alcancei quando Myla o ergueu sobre o
quadril. Se meu coração não parecesse que ia sair do meu
peito, a visão deles teria sido engraçada.
— Você está bem, — Myla acalmou enquanto o
abraçava, um pouco instável em seus pés quando ela mudou
seu peso.
— Ei, amigo, — eu disse, estendendo a mão para ele. —
Você está bem?
— Caiu, — ele lamentou, deixando-me pegá-lo de Myla.
— O que aconteceu? — perguntou Emilia, correndo em
nossa direção. Quando ela parou ao meu lado, pude ver sua
indecisão entre me deixar segurá-lo e confortá-lo ela mesma.
— Caiu, — Rhett chorou. — Dodói.
— Ah, cara — disse Emilia, aproximando-se. — Isso é
horrível.
— Dói, — Rhett chorou.
Ele não estendeu a mão para ela, e me senti com cerca
de três metros de altura.
— Vamos entrar e limpar esses machucados — disse
Emilia, esfregando as costas de Rhett. — OK?
— Band-Aid? — Rhett perguntou enquanto partíamos
para a casa.
— Vamos colocar um Band-Aid se você precisar de um.
— Sinto muito, Emmy, — disse Myla, com a voz
trêmula. — Eu não sei o que aconteceu. Ele ia pular da
plataforma, mas caiu de alguma forma.
— Não é sua culpa, — eu disse, enviando-lhe um sorriso
tranquilizador. — Ele tropeçou.
— Laços, — disse Rhett miseravelmente, apoiando o
queixo no meu ombro para que pudesse olhar para Emilia. —
Laços do sapato.
— Ah, cara, — disse Emilia, agarrando o pé de Rhett. —
Lamento que seu sapato tenha desamarrado.
— Laços, — Rhett lamentou. Ele chutou, e eu tive que
movimentá-lo rapidamente para que não me acertasse nas
bolas.
— Ei, não me chute. — Minhas palavras não eram
raivosas ou duras, mas Rhett começou a chorar de novo e
Emilia se aproximou.
— Está tudo bem, é...
Eu olhei para ela. — Ele quase me chutou nas bolas.
— Mamãe, — Rhett fungou, estendendo a mão para
Emilia.
— Está tudo bem, amigo, — ela disse, encontrando
meus olhos em desculpas enquanto eu o entregava.
— Parece que alguém morreu, — minha mãe disse,
abrindo a porta da cozinha para nós.
— Rhett caiu da plataforma, — respondeu Myla,
culpada.
— Acidentes acontecem, — disse Emilia, sorrindo para
ela. — Eu deveria ter dado um nó duplo nos sapatos dele, eu
acho.
— Vou pegar alguns Band-Aids e a água oxigenada, —
minha mãe disse, saindo correndo da cozinha. Ela fez uma
pausa e olhou por cima do ombro para mim. — Eu pedi
comida, e você pode ligar a máquina de lavar louça? Titus
acabou de entrar no banho, e devo uma a ele por lavar a
roupa bem quando eu estava tentando tomar banho na outra
noite.
— Sua mãe não mudou nada, — disse Emilia, colocando
Rhett no balcão. Ele se acalmou novamente, mas eu tinha a
sensação de que ainda estava no limite.
— Não. — Eu me movi ao redor dela para ligar a
máquina de lavar louça.
— Ah, cara, — disse Myla, inclinando-se para olhar os
joelhos de Rhett. — Você rasgou as calças.
— Oh, não, — Emilia murmurou severamente quando
Rhett começou a chorar de novo.
— Dodói, — ele soluçou.
Eu queria fazer alguma coisa, dizer alguma coisa, mas
parecia que qualquer coisa e tudo o estava deixando
nervoso. Em vez disso, apenas fiquei lá como um idiota,
pairando.
— Ei, amigo, olhe para mim, — Emilia disse
suavemente, endireitando a perna de Rhett. — Olha, está
tudo bem. Totalmente bem. E podemos colocar um band-aid
nele.
— Você pode? — ele perguntou, soluçando.
— Juro.
— Eu tenho Band-Aids de todos os formatos, — minha
mãe anunciou. — Mas esses filisteus não gostam mais dos
padrões legais, então não temos nenhum desses.
— Filisteus? — Myla olhou confusa para minha mãe.
— Um suíno sem cultura, — minha mãe disse com um
floreio, sorrindo para minha irmã. — Aqui está o peróxido,
Em.
Minha respiração me deixou em um silvo silencioso com
o apelido casual de minha mãe para Emilia. Eu estava
lutando. Cada respiração que dava era dolorosa, e não sabia
o que fazer, porra, mas acho que minha mãe apenas
planejava começar de onde paramos, como se nada tivesse
acontecido. Cerrei os dentes até meu maxilar estalar.
— Uau, homenzinho, — Rumi disse enquanto
caminhava para a cozinha. — Você brigou com um guaxinim?
— Dodói, — Rhett fungou, observando enquanto sua
mãe limpava os arranhões nas palmas das mãos.
— Isso dói?
— Sim.
— Sim, parece que sim. — Rumi aproximou-se e olhou
para as mãos de Rhett. — Mas você vê as bolhas? Ele espuma
assim enquanto limpa todos os germes. Muito legal, certo?
— Ai, — Rhett lamentou, tentando puxar a mão dele.
— Pare com isso, Rhett, — Emilia ordenou, sua voz
firme, mas gentil enquanto ela continuava limpando seus
arranhões. — Estou quase terminando.
Rhett gemeu mais alto.
— Quase pronto, — disse Emilia novamente.
Eu assisti enquanto Rhett continuava chorando alto, e
Emilia continuou, e enquanto parte de mim se sentia mal do
estômago por ela parecer estar ignorando o fato de que o
estava machucando, a maior parte de mim não sentia nada
além de respeito em seu rápido e eficiente
movimento. Demorou apenas alguns segundos para eu
perceber que isso a incomodava tanto quanto me
incomodava, ela só sabia que a sujeira precisava ser limpa e
não queria prolongar isso.
Quando ela terminou de enfaixá-lo, ela o ergueu nos
braços e o carregou até a bolsa, tirando um cobertor cinza-
rosado de dentro. Ele arrancou-o de suas mãos e puxou-o
para o rosto.
— Bem, — minha mãe disse, movendo-se pela cozinha
lotada, juntando pratos e utensílios. — Estou feliz que você
foi tão corajoso, Rhett. Limpar é uma merda.
— Band-Aid, — disse Rhett, seguindo os movimentos
dela com os olhos.
— Eu vi isso, — disse ela. — Muito legal.
O olhar de Rhett moveu-se para mim. — Papai me
pegou.
— Papai pegou você? — minha mãe perguntou, virando-
se para ele. — Sim, isso faz sentido. Papais são rápidos.
— Rápido, — Rhett concordou, apontando o queixo para
mim. Mamãe sorriu para mim, seus olhos brilhantes.
— Mamãe, — disse Rhett, estendendo a mão para
passar os dedos da mão livre cuidadosamente pelo cabelo de
Emilia.
— Você tem a melhor mãe, hein, — minha mãe disse
gentilmente. Ela olhou para Emília. — Levei anos para
conseguir limpar os arranhões e merdas das
crianças. Tommy tinha que fazer isso.
— Realmente?
— Sim, — minha mãe disse, inclinando-se no balcão em
frente a Rhett. — Fiquei melhor nisso, mas não sou
exatamente legal sob pressão. — Ela riu. — Quando Micky
caiu na beira da propriedade e quebrou o braço, eu o ouvi
acima do som do aspirador. Entrei em pânico tanto que
quase me cai no batente da porta quando estava correndo
para pegá-lo.
Rhett nos observou, seus olhos ficando pesados.
— Sente-se melhor, amigo? — Estendi a mão e
gentilmente a passei por suas costas. Eu podia sentir cada
saliência de sua espinha. Jesus, ele era tão pequeno.
— Dodói, — Rhett me informou com o polegar.
— Eu sei.
— Espero que eu fique melhor com os netos, — disse
mamãe com tristeza. — Desculpe, Rhett, você vai ser a cobaia
nisso.
— Vovó, — Rhett murmurou.
— Esta é a sua avó também, — disse Emilia, beijando-
lhe a cabeça. — Esta é sua outra avó. A mãe do papai.
Rhett balançou a cabeça. — Avó.
— Desculpe. — Emília fez uma careta. — Ele realmente
não entendeu ainda.
— Ele vai entender, — minha mãe disse, acenando para
ela.
— E o Sr. Hawthorne é seu avô — continuou Emilia,
encostando o rosto no cabelo de Rhett. — E tio Rumi e tio
Otto e tio Titus e tia Myla.
Os olhos de Rhett se fecharam.
— Ele não parece impressionado, — eu disse com uma
risada silenciosa, tudo dentro de mim congelando com a visão
de seu rosto adormecido.
Todo mundo se sentia assim quando tinha um filho? Ele
era tão lindo, lindo de tirar o fôlego. Eu queria contar seus
cílios, medir seu crânio em minhas mãos, tirar seus sapatos
para poder contar seus dedos, segurá-lo contra mim para que
pudesse sentir seu batimento cardíaco sob minha mão. Era
estranho pra caralho, certo? Eu era um maldito lunático.
— Para ser justa, você não parece uma avó, — Emilia
disse a minha mãe secamente. — Pode ser meio confuso.
— Obrigada, querida, — ela disse alegremente. — Esse é
o melhor elogio que recebi em um ano.
— Acabei de te dizer ontem que sua bunda estava
gostosa como merda em seu jeans, — meu pai murmurou,
juntando-se a nós na cozinha.
— Oh, meu Deus, cuidado com a boca, — minha mãe
sussurrou, jogando uma colher de servir nele. — E fale baixo,
porra, seu neto está dormindo.
Papai pegou a colher quando ela atingiu seu peito e
sorriu para ela.
Uma batida na porta da frente evitou uma guerra de
talheres na cozinha quando meus pais saíram para atender.
— A mamãe diz que o papai assusta o entregador, —
Myla informou a Emilia. — Então ela sempre vai com ele até a
porta.
— Ele o assusta, — Rumi disse divertido. — Porque ele
pegou o cara checando a mamãe há um ano.
— Sinto cheiro de comida chinesa, — Titus gritou do
corredor. Ele, Otto e meus pais convergiram para a cozinha
ao mesmo tempo. — Oh, opa! — ele sussurrou quando
avistou Rhett. — Desculpe.
— Você parou de ser um idiota, Otto? — Myla perguntou
enquanto pegava um prato.
— Você deixou de ser uma princesinha mimada,
Myla? — ele atirou de volta.
— Nunca. — Ela olhou por cima do ombro enquanto
papai voltava carregando a comida. — Papai nunca permitiria
isso.
— Chega, — papai ordenou, seus lábios se contorcendo
com o riso reprimido.
— Você quer deitá-lo? — minha mãe perguntou a
Emilia.
— Eu posso apenas segurá-lo, — respondeu ela,
balançando a cabeça.
— Isso funciona, — mamãe disse, encolhendo os
ombros.
— Uh, eu posso segurá-lo se você quiser.
Emilia olhou para mim e balançou a cabeça. — Tudo
bem. Estou bem.
Eu silenciosamente me repreendi enquanto todos se
moviam pela cozinha, enchendo seus pratos. Eu deveria
ter pedido para segurá-lo, não oferecido. Parecia que eu
estava fazendo um favor a ela quando na verdade era o
contrário. Eu estava morrendo de vontade de abraçá-lo. Eu
só coloquei minhas mãos nele uma vez, e ele estava chorando
então.
Eu queria saber como era abraçá-lo enquanto ele
dormia.
Quando todos nos sentamos, percebi que não havia
cadeiras suficientes para todos.
— Otto e Titus sentam no balcão, — meu pai ordenou,
percebendo a mesma coisa.
— Certo, — Otto murmurou baixinho, girando para
longe da mesa.
— Cara, sério? — Eu perguntei, olhando para ele. O
garoto era geralmente maleável. Ele tinha toda essa coisa de
filho do meio que precisa de mais atenção acontecendo, mas
ele geralmente não era tão idiota.
— Todo mundo está agindo como se a filha pródiga
tivesse acabado de voltar, — Otto disse com uma risada
incrédula. — Eu sou o único aqui que se lembra...
Dei um passo à frente e sua boca se fechou.
— Você vê meu filho bem ali? — Eu perguntei, minha
voz baixa, apontando para onde Emilia estava sentada. — Ele
é a razão pela qual você vai manter uma linguagem civilizada
em sua cabeça. Entendeu?
— Ele está dormindo, — Otto disparou de volta.
— Juro por Deus... — murmurei, dando um passo à
frente.
— Tudo bem, — Otto disparou, jogando-se em uma
banqueta. — Não vou dizer o que todo mundo está pensando.
Olhei para ele por um momento, certificando-me de que
ele realmente havia terminado. Então, coloquei meu prato
cuidadosamente no balcão para não bater e sai da
cozinha. Eu precisava de uma fodida respiração. Desde o
momento em que entrei e vi Emilia e nosso filho, não tive um
único segundo em que não houvesse alguém me observando.
Uma vez que eu estava fora, engoli o ar fresco. Cheirava
como se fosse chover, embora quase não houvesse nuvens no
céu.
Jesus.
Inclinei-me pela cintura e apoiei as mãos nos joelhos,
tentando recuperar o fôlego.
Eu tinha um filho. Nós tivemos um filho. Uma criança
de dois anos. Que porra você faz com uma criança de dois
anos? Minha experiência com isso era limitada pra
caralho. Sempre tivemos crianças de todas as idades no
clube, mas além de persegui-los com uma pistola de água e
garantir que não corressem com nada pontiagudo, eu quase
não tinha contato com eles. Ele nem tinha idade para brincar
com uma pistola de água, tinha? Tentei me lembrar de
quando Myla tinha dois anos, mas tudo parecia um
borrão. Eu estava muito focado em perseguir Emilia para
passar muito tempo com minha irmãzinha.
Como diabos eu deveria ser o pai de alguém? E de onde
diabos eles vieram? Eu nem sabia onde eles moravam.
Caminhei até o carro de Emilia e olhei para
dentro. Estava cheio de coisas do chão ao teto. Eles moravam
no carro dela? Foi por isso que ela voltou? Ela era uma sem-
teto?
— Você está bem? — meu pai perguntou, saindo para a
varanda da frente.
— Estou bem.
Papai riu. — Não, você não está.
Eu me virei para encará-lo. — O que diabos está
acontecendo agora?
— Seu palpite é tão bom quanto o meu, — respondeu
ele, tirando um baseado do bolso da camisa. — Parece que
você tem um filho.
— Bom saber, certo? — Eu perguntei, balançando a
cabeça.
— Ele é muito fofo. Parece com você.
— Não acho que vou precisar de um teste de DNA, — eu
disse sarcasticamente. O garoto era uma mini versão de
mim. As únicas semelhanças que vi com Emilia eram suas
mãos e seu sorriso. Ela tinha um grande sorriso, e agora ele
também.
— Ela disse a você por que está aqui? — ele perguntou
curiosamente enquanto se sentava nos degraus. — Por que
agora?
— Não, — eu disse, sentando ao lado dele. — Só que
eles finalmente estão aqui.
— Finalmente, hein?
— Isso foi o que ela disse.
Papai fez um barulho com a garganta. — Você pode
querer tomar um minuto, amigo, — disse ele depois de alguns
momentos. — Porque aquela garota ali está com medo. Ela
está escondendo bem, mas definitivamente está morrendo de
medo.
— E?
— Ela veio até você, — disse ele, olhando para mim. —
Sabendo que você ia ficar chateado. Sabendo que íamos ficar
chateados, ainda veio aqui.
— Tenho um filho de dois anos que acabei de conhecer,
— retruquei. — Não é de admirar que ela esteja assustada.
— Ouça-a, — disse ele, dando uma baforada em seu
baseado. — Isso é tudo que estou dizendo.
— Eu vou. — Suspirei.
Acordei tarde naquela manhã, e a única coisa que
pensei que teria que lidar era meu pai reclamando de
mim. Em vez disso, estava me escondendo na varanda dos
meus pais enquanto a terra inteira se movia ao meu redor.
— Ela o chamou de Rhett, — eu murmurei, esfregando
minhas mãos sobre meu rosto. A risada de papai encheu o
jardim da frente.
Capitulo 3

EMÍLIA

O dia passou tão rápido que eu não conseguia recuperar


o fôlego. Foi incrível ver Rhett cercado por uma família grande
e barulhenta pela primeira vez. Sua experiência até esse
ponto tinha sido apenas meus pais e eu. Nós o amávamos,
mas não era a mesma coisa. Todos na família de Michael
queriam sua atenção, e ele a absorvia como uma esponja. Até
Otto parecia ter se aquecido um pouco, se não comigo, pelo
menos com o sobrinho.
No momento em que ele acordou de seu cochilo, era o
garoto ensolarado e brilhante que eu conhecia, seus
machucados praticamente esquecidos. Observei enquanto
meu filho pulava de um lado para o outro, passando de
pessoa em pessoa com um nó na garganta. A casa era
barulhenta e divertida, e ele estava nas nuvens. Depois do
ano que tivemos, me deu vontade de chorar.
Ele deveria ter tido isso desde que nasceu. Eles o
adoravam.
— Onde você está ficando? — Michael perguntou,
curvando-se para descansar os cotovelos nas costas do sofá
em que eu estava sentada.
— Hum. — Eu congelei, sem saber o que dizer. Ele
pediu para não discutir nada, e eu estava tentando muito
respeitar isso, mas como dizer a ele que não tínhamos
exatamente dinheiro para ficar em um motel?
— Não é uma pergunta difícil, — disse ele, olhando para
mim.
— Ficamos em um motel ontem à noite...
— Você chegou aqui ontem à noite? — ele perguntou
incrédulo.
— Era tarde.
— Você estava em Eugene na noite passada, — disse ele
categoricamente.
— Eu vim aqui logo de cara.
— Certo. Então, qual hotel? — perguntou ele,
observando Rhett dar uma cambalhota pela sala.
— Eu dou nove vírgula seis, — Rumi anunciou em voz
alta.
— O que há de errado com você? — Tito argumentou. —
Um dez perfeito!
— Fizemos o check-out esta manhã, — eu me
esquivei. — Então, está em aberto.
— Você está morando no seu carro? — ele perguntou
sem rodeios, seus olhos ainda em Rhett.
— Não! — Eu ofeguei, engasgando com nada. —Por que
você está perguntando isso?
— A parte de trás está cheia até o teto, — ele respondeu
calmamente. — Não minta para mim.
— Estamos nos mudando para cá. — Tentei dizer as
palavras como se não fosse grande coisa, mas senti as
palmas das minhas mãos começarem a suar. A névoa de
segurança que eu sentia por estar cercada pelos Hawthornes
de repente não parecia tão reconfortante.
— Você tem um caminhão de mudança a caminho? —
Michael perguntou. — Não vi nenhuma mobília lá.
— Você está pronto para falar agora? — Eu contra-
ataquei.
Michael olhou para mim, mas não teve o efeito
desejado. Em vez de me fazer recuar, isso me deu algo como
coragem.
— Vamos lá atrás, — eu disse suavemente. — Podemos
conversar lá fora. — Ao seu aceno de concordância, eu me
levantei.
— Mamãe? — Rhett perguntou, parando no meio da
sala.
— Eu vou falar com seu pai por alguns minutos. Estarei
lá fora.
— Eu vou. — Ele correu para seus sapatos.
— Não, baby, — eu argumentei. — Você fica aqui.
— Eu vou, — ele respondeu quase desesperadamente.
— Rhett, eu só vou sair na varanda de trás.
— Eu vou junto. — Sentou-se no chão, segurando os
sapatos.
— Baby...
— Isso pode esperar, — Michael disse baixinho,
colocando uma mão nas minhas costas brevemente enquanto
observava Rhett tentar freneticamente calçar os sapatos.
— Eu...
— Deixe estar, Emilia, — Michael ordenou, sua voz
ainda baixa.
— Vamos ficar aqui dentro, querido, — eu disse,
ajoelhando-me ao lado de Rhett. Ele me olhou com
desconfiança.
— Eu não preciso sair agora, — eu disse com um
encolher de ombros, pegando os sapatos dele e colocando-os
de lado. — Vá brincar um pouco mais. Eu assistirei.
— Tudo bem, — respondeu ele, ficando de pé. Ele olhou
para trás duas vezes antes de chegar ao meio da sala.
— Ele geralmente não é tão pegajoso, — eu disse
desculpando-me, olhando para Michael enquanto me
levantava. — Não sei qual é o problema dele.
— Ele ainda não tem certeza de nós, — respondeu
Michael, alisando a barba com a mão. — Não queria que você
o deixasse.
— Não. — Eu balancei minha cabeça. Não pode ser
isso. Meu filho não se preocupava com coisas assim. Ele era o
filho e eu era a mãe, me preocupava com ele. — Ele não tem
medo de coisas assim...
— Ele não entende nada disso, — Michael disse
rispidamente, me interrompendo. — Ele ganhou uma família
inteira em um dia. Nada dessa merda é normal. Ele não nos
conhece.
— Está ficando frio lá fora, — disse a Sra. Hawthorne
quando ela e o Sr. Hawthorne entraram pela porta da
frente. Eles trouxeram o cheiro de ar fresco e maconha com
eles.
— De alguma forma, tinha esquecido como esfria rápido
aqui, — respondi. — Assim que o sol se põe, estou
congelando minha bunda.
— Parece preciso, — disse ela com uma risada. — Deve
fazer muito frio esta noite. Onde vocês vão ficar?
— Oh, bem, nós ficamos em um motel ontem à noite.
— Você pode ficar aqui se quiser, — disse ela enquanto
o marido a ajudava a tirar o casaco. — Posso colocar um dos
meninos para dormir na sala se você aguentar o cheiro de
pés. Não consigo eliminar o fedor de seus quartos.
Eu debati, mas apenas por um segundo. Eu podia sentir
os olhos de Otto na minha nuca. Ele se aqueceu, claro, mas
eu tinha a sensação de que passar a noite faria com que o
degelo desaparecesse, especialmente quando Michael não
estava interferindo. Eu odiava que ele estivesse tão zangado
comigo. Eu entendia, mas realmente odiava. Eu esperava isso
de Michael. Eu me preparei para isso, mas não esperava isso
de seu irmão adolescente.
— Tudo bem, — eu disse, acenando para ela.
— Eles podem ficar comigo, — disse Michael, com os
olhos em Rhett enquanto ele se movia de um lado para o
outro. — Eu tenho um quarto.
— Ah, — respondeu a Sra. Hawthorne. Eu não
conseguia ler o tom dela. — Ok, sim, isso faz sentido.
Otto começou a rir, mas não me virei para olhar para
ele. Algo no som me deixou apreensiva.
Algumas horas depois, eu estava seguindo a motocicleta
de Michael enquanto passávamos por um bairro próximo
daquele em que cresci. Rhett levou apenas alguns minutos
para desmaiar de exaustão e o carro estava silencioso ao meu
redor enquanto pensava sobre o dia. Não foi tão ruim quanto
imaginei, pelo contrário, foi muito melhor do que eu
esperava. Os pais de Michael foram tão receptivos quanto na
primeira vez que os encontrei e todos eles adoraram Rhett,
embora eu soubesse que o fariam, então isso não foi
surpreendente.
O que foi surpreendente foi Michael.
Ele estava tão diferente da última vez que o vi. O garoto
que deixei para trás era um idiota. Ele raramente ficava sem
um sorriso no rosto. Este novo homem era sério, calmo,
reservado. Eu não podia acreditar na diferença. Ele andava
na porra de uma motocicleta, o que admitia, não deveria ter
ficado surpresa considerando que ele sempre planejou
comprar uma, mas ainda assim era meio surpreendente.
Ele também estava mais gostoso, o que eu não achava
que fosse possível. Michael sempre foi volumoso, mas agora
ele estava firme, por falta de uma palavra melhor. Os
músculos que ele sempre teve foram aperfeiçoados com
perfeição. Limpei o sorriso do rosto com as costas da mão.
Eu não precisava estar pensando sobre o quão firme
Michael era. Eu não precisava ficar pensando na barba que
ele tinha agora e como seria contra a minha pele. Eu não
precisava imaginar enredar meus dedos em seu cabelo
enquanto...
A fantasia na qual eu não precisava estar pensando foi
cortada abruptamente quando parei atrás dele em uma
entrada muito familiar. O que diabos ele estava fazendo?
Estacionei o carro e olhei para ele enquanto a porta da
garagem se abria e ele entrava, estacionando sua motocicleta
ao lado de uma caminhonete muito familiar. Eu ainda estava
olhando, minha boca aberta enquanto ele voltava até mim, a
garagem fechando atrás dele.
— Você vem? — ele perguntou secamente enquanto eu
abria a janela.
— Que porra é essa? — Eu deixei escapar em confusão.
— Droga. — Ele bufou. — Quando você começou a dizer
porra?
— Provavelmente quando estava em trabalho de parto,
— respondi. — Por que diabos estamos na minha casa?
— Estamos na minha casa, — ele respondeu, sua
expressão completamente vazia. — Você precisa de ajuda
para levar nosso menino para dentro?
— Não, eu pego ele. — Fechei a janela e saí do carro,
deixando-o ligado. — O que você quer dizer com sua casa?
— Minha casa. Eu a comprei.
— Você comprou minha casa? — Eu assobiei incrédula.
— Não. — Ele cruzou os braços sobre o peito. — Meu pai
comprou esta casa da simpática família que comprou da
sua. Eles perceberam durante seu primeiro inverno no
Oregon que talvez não devessem ter deixado a Califórnia. Eu
comprei dele.
— Esta éa minha casa, — repeti teimosamente,
apontando para o cimento sob nossos pés. — Eu morei aqui a
vida inteira e você comprou? Por que você faria isso?
— Parecia uma boa ideia na época, — ele respondeu
categoricamente. — Você vai entrar ou o quê? Vai chover em
cerca de trinta segundos.
Ele se dirigiu para a porta enquanto eu permanecia lá,
gaguejando em descrença. O que diabos estava
acontecendo? Por que ele compraria minha casa de
infância? Desliguei o carro assim que a chuva começou a cair
e quando tirei Rhett de seu assento, tive que jogar o cobertor
sobre ele para evitar que se molhasse. Michael nos observava
da varanda da frente.
— Você tem algum lugar onde eu possa deitá-lo? — Eu
perguntei enquanto subia as escadas.
O terceiro degrau não rangeu como deveria. Eu cerrei os
dentes.
— Sim, entre, — disse ele, abrindo a porta da frente. —
Tenho um sofá no escritório onde você pode colocá-lo.
— Escritório? — Olhei em volta confusa quando
entramos.
Tudo estava diferente. A parede da cozinha foi
derrubada para que fluísse direto para a sala de estar, e a
sala de estar formal foi completamente isolada. Michael
caminhou naquela direção e abriu a porta.
— Vou pegar um travesseiro para ele, — disse ele,
deixando-me ali, boquiaberta como um peixe.
Se eu não tivesse visto o lado de fora, não teria ideia de
que era a mesma casa em que passei tantos anos. As paredes
foram pintadas de cinza claro e na extremidade da sala de
jantar uma parede inteira havia sido convertido em uma
enorme estante do chão ao teto. A única coisa familiar era a
escada, bem no centro de tudo, mas o corrimão era
completamente novo.
— Você vai deitá-lo? — Michael perguntou quando ele
voltou.
— O que você fez? — perguntei enquanto deitava Rhett
no sofá. Ele não se mexeu.
— O que? Com a casa? — Michael perguntou facilmente,
voltando para fora da sala. — Demoli a maior parte.
— Eu posso ver isso, — respondi, seguindo-o. — Você
derrubou uma parede.
— Derrubei mais de uma. Quer uma cerveja?
— Não, eu não quero uma cerveja.
— Você não bebe cerveja?
— Sim, eu bebo. Não, eu não quero uma.
— Tudo bem.
Eu o segui até a cozinha e olhei em volta com os olhos
arregalados. Todos os novos aparelhos. Novas
bancadas. Armários atualizados. A porra de uma janela onde
não havia antes. Eu estava cambaleando.
— Você deve ganhar muito dinheiro, — gaguejei, girando
em círculo.
— Eu estou bem, — respondeu Michael. — Meu pai
ajudou na maior parte. Ele reforma casas desde antes de eu
nascer.
— Você vai vendê-la? — Eu perguntei, parando para
olhar para ele.
— Não.
— Mas por quê? — Não fazia sentido. De todas as casas
para escolher, por que ele comprou a nossa? Não foi porque
adorava, ele reformou tudo.
— Eu queria, — disse ele com um encolher de ombros.
— Isso é tão estranho, — murmurei baixinho.
Michael riu, o som tudo menos alegre. — Eu acho que
sim.
— Você está morando na minha casa. — Passei a mão
pela nova bancada de concreto.
— Rhett está dormindo. — Ele tomou um gole de sua
cerveja. — Comece a falar.
— O que? — Tirei minha mão do balcão.
— Onde você esteve?
— Eu... bem, em todos os lugares, realmente.
— Pare com essa merda, Emilia, — ele latiu. — Onde
diabos você estava?
— Arizona, — respondi rapidamente. — Fomos para o
Arizona.
— Huh, — ele murmurou pensativo.
— Eu entrei na faculdade do Arizona, lembra? — Eu
disse, engolindo em seco com a memória.
— Sim, eu me lembro.
Lutei para encontrar algo a dizer. Eu tinha planejado
tudo na longa viagem para o Oregon, mas de repente nada
parecia certo, não quando ele estava parado ali, crescido, com
uma cerveja na mão.
Eu sabia falar com o menino que conhecia antes, não
sabia falar com esse homem.
— Bem? — ele perdeu a cabeça. — Diga o que você quer
dizer. Explique essa merda para mim.
Resolvi começar do começo.
— Eu descobri que estava grávida na manhã depois que
voltamos para casa do rio, — eu disse, cruzando os braços
sobre o peito. — E minha mãe descobriu cerca de uma hora
depois porque ela era intrometida e sempre sabia de tudo.
— Nem tudo, — ele murmurou.
Eu admiti isso com um aceno de cabeça. — Eles
piraram. — Olhei ao redor da cozinha novamente, desta vez
grata por não se parecer com nada das minhas memórias. —
Para encurtar a história, eles disseram que não pagariam a
faculdade a menos que eu colocasse o bebê para adoção e
cortasse toda a comunicação com você.
— Besteira, — argumentou ele, colocando a cerveja na
mesa.
— Eu juro por Deus.
— Você tinha uma bolsa completa na Universidade do
Óregon.
Olhei para ele com os olhos arregalados. — Eu tinha
uma bolsa esportiva, — eu o lembrei. — Que eu não poderia
exatamente seguir durante a gravidez.
— Então por que não fazer um aborto? — ele perguntou
facilmente, pegando sua cerveja de volta. Não era acusatório,
apenas curioso.
— Porque, — eu gaguejei, balançando a cabeça. — Por
quê.
— Pelo que me lembro, você era pró-escolha.
— Eu ainda sou, — eu resmunguei. — Mas não foi algo
que eu considerei na época.
— Por quê?
Como eu não havia me preparado para onde essa
conversa iria? Eu imaginei que apenas contaria a linha do
tempo dos eventos, explicaria onde estive e então seguiríamos
em frente de alguma forma. Que idiota.
— Porque não foi, — eu finalmente disse. Eu não estava
disposto a esclarecer mais. — Eu sabia que precisava ir para
a faculdade. Não era uma opção não ir. Então, concordei com
isso.
— Você concordou com isso, — ele murmurou
sombriamente.
— Eu tinha dezoito anos.
— Eu também, — respondeu ele. — Você acha que meus
pais poderiam ter me mantido longe de você?
— Eles nunca teriam, — eu respondi. — Essa é a
diferença.
— Não, a diferença é que eu nunca teria te deixado, —
ele disse, apontando sua garrafa de cerveja para mim. —
Essa é a diferença.
— Então, fui para o Arizona, — eu disse, a frustração
tornando minhas palavras curtas. — Porque eu tinha uma
bolsa acadêmica parcial lá, e eles falaram que pagariam o
resto. E pagaram. Durante toda a minha gravidez e até Rhett
nascer.
Ele ficou em silêncio quando comecei a andar pela
cozinha, as memórias me fazendo sentir coceira.
— Mas então eu não pude fazer isso, — eu disse,
parando em frente a ele. — Eu escolhi os pais perfeitos. Eles
eram tão legais, Michael. O pai era algum tipo de engenheiro
de software e a mãe era a recepcionista do consultório de um
pediatra, mas ela planejava ficar em casa quando ele
nascesse. Eles eram perfeitos, e eu... — Minha voz começou a
tremer e eu parei, engolindo em seco. — Eu não pude desistir
dele. Ele saiu e parecia com você e eu não consegui fazer isso
e quebrei seus corações.
Mick olhou para mim, o músculo em sua mandíbula
latejando.
— Então, o levei para casa e meus pais ficaram
furiosos. Eles pagaram a faculdade com a condição de que eu
o entregasse para adoção e então não continuei com
isso. Então eles pararam de pagar.
— Fodidos de merda.
— Eles nos deixaram viver com eles, — eu disse com um
encolher de ombros. Eu estava tão agradecida por isso. —
Eles nos apoiaram.
— Então você não voltaria para mim, — ele disse com
um escárnio, balançando a cabeça.
Eu não discuti. Era algo que eu sempre suspeitei, mas
nunca disse em voz alta.
— Estava tudo bem, — eu disse suavemente. — Eles
amavam Rhett e estava tudo bem.
— Então por que você está aqui? — ele perguntou,
colocando sua garrafa na pia.
— No ano passado, eles sofreram um acidente de carro,
— respondi baixinho, lembrando-me de como as luzes da
frente da casa se iluminaram quando a polícia estadual veio
me informar.
— Os dois?
— Sim.
— Merda, me desculpe.
— Você não precisa se desculpar. Eles foram horríveis
com você.
— Sinto muito por você, — disse ele com um suspiro. —
Eles ainda eram seus pais.
Eu balancei a cabeça, meus olhos marejados. — Então,
— eu disse com uma risada aquosa. — Acontece que quando
sua única habilidade é uma cambalhota perfeita e você não
tem nenhum histórico de trabalho, é quase impossível
conseguir um emprego que pague o suficiente para sustentar
uma criança.
— Eles não deixaram nada para você? — ele perguntou
em dúvida.
— Quando vendi a casa, ela pagou os impostos sobre a
herança e as dívidas deles. Não sobrou muito.
— Merda.
— Eu fiz funcionar por um tempo, — eu disse,
lembrando o quão apertado tinha sido. Vendendo roupas e
penhorando as joias da minha mãe. — Mas cuidar de uma
criança acabava com todo o meu salário, então estávamos
morando em um lixão e caminhando porque eu não tinha
dinheiro para colocar gasolina no carro. Não era sustentável.
— Então você veio para cá.
— Não, — eu disse suavemente, balançando a
cabeça. — Demorou um pouco mais, porque tive que
economizar para chegar aqui. Tenho economizado desde que
soube que Rhett voltaria para casa comigo. Era o único
dinheiro que me recusava a tocar, não importa o
quê. Economizei um pouco com cada contracheque. Às vezes,
eu não tinha mais do que alguns dólares para adicionar.
— Você poderia ter ligado, porra, — ele argumentou com
raiva, dando um passo à frente. — Você sabe que eu iria e te
pegaria.
— Eu não tinha ideia de qual era o seu número de
telefone, — eu disse, vergonha fazendo minhas bochechas
esquentarem. — E tinha que fazer isso sozinha.
— Você tinha que fazer isso sozinha? — ele cuspiu. —
Não passei os últimos dois anos com meu filho porque você
tinha que economizar alguns centavos até ter o suficiente
para chegar até aqui?
Eu não tinha certeza de como fazê-lo entender. Eu era
tão dependente de meus pais para tudo, tão encaixotada pelo
que eles queriam, que não fui capaz de chamá-lo. Eu tinha
tanto medo quando Rhett era um bebê que saísse da linha e
eles me cortassem completamente. Eu imaginei uma centena
de piores cenários onde entraria em contato com Mick e ele
não iria querer nada conosco, mas eles nos expulsariam por
tentar. Economizar tinha sido a única maneira de me sentir
segura, sabendo que em algum momento eu poderia
simplesmente partir e dane-se as consequências. Era a
minha saída. Nossa saída.
Explicar tudo isso para um homem que foi criado por
pais que o amavam e o apoiavam não importa o que... era
impossível. Metade do tempo, eu nem mesmo compreendia
totalmente as escolhas que havia feito.
— Fiz o melhor que pude, — eu disse com a voz
rouca. — Eu o trouxe para cá assim que pude.
— Você poderia ter dado meu filho para adoção sem que
eu sequer soubesse que ele existia, — Mick murmurou,
balançando a cabeça.
— Eu sei, — eu disse suavemente. — Eu soube no
minuto em que vi o rosto dele que nunca seria capaz de fazer
isso - não com nenhum de nós.
— Se eu acordar um dia e você tiver partido
novamente. Não há um lugar nesta terra que não vou te
encontrar, — ele resmungou. — Você entende isso, certo?
Quantas noites eu passei acordada, desejando que ele
aparecesse na nossa porta? Cem? Mil? Sentada perto da
janela cuidando de Rhett, observando os faróis.
— Isso é uma promessa? — Eu perguntei, minha voz
embargada. Sua expressão suavizou.
— Foda-se, — ele murmurou.
Levou apenas dois passos para ele me alcançar, menos
de um segundo para suas mãos se enredarem no meu cabelo,
e uma única respiração antes de sua boca estar na minha.
O beijo foi uma mistura de tudo que eu lembrava e nada
que já havia conhecido. Forte. Desesperado. O doce menino
que eu conhecia, que me beijava do jeito que eu gostava,
tinha ido embora. Este era um homem que beijava
como ele gostava. Eu não estava reclamando, porque foi um
milhão de vezes melhor do que qualquer beijo que já tivemos
antes.
Eu estava lutando para respirar e instável em meus pés
quando ele se afastou abruptamente.
— Vá para a cama, — ele ordenou, limpando a boca com
as costas da mão.
Olhei para a maneira como seu pulso pulsava
fortemente ao lado de seu pescoço. — Não sei onde vamos
dormir, — gaguejei. Eu queria beijar aquele lugar. Chupá-lo
entre os dentes. Morder.
Foi apenas um beijo, e não durou muito tempo, mas eu
não conseguia me lembrar da última vez que estive tão
excitada. Meus lábios estavam inchados e quentes. O resto de
mim estava pegando fogo.
— Escolha a porra de um quarto, — ele retrucou,
virando as costas para mim. — Vai, Emília.
Eu hesitei, observando enquanto ele se abaixava para
segurar a borda da pia. Ele estava lutando com alguma coisa,
mas eu não conseguia decidir se era o desejo de me jogar no
chão e me foder ou me jogar para fora de sua casa.
Tomando o que considerei o caminho mais seguro, corri
para fora da cozinha, mal olhando ao meu redor enquanto me
dirigia para Rhett. Ele não se moveu da posição que eu o
deixei, seus braços jogados acima de sua cabeça com seu
cobertor tecido entre seu ombro e pescoço e enrolado no meio
de seu torso. Eu segurei um grunhido quando o levantei em
meus braços.
— Vamos encontrar uma cama, — eu sussurrei,
beijando o lado de sua cabeça.
Não vou mentir, carregá-lo pelas escadas foi um pouco
difícil, mas consegui. Instintivamente, fui direto para a porta
do meu antigo quarto e a escancarei sem hesitar, mas
congelei quando percebi que realmente precisava parar de
pensar na casa como minha.
Meu quartinho com paredes roxas, assento na janela e
armário minúsculo havia sumido, e em seu lugar havia um
quarto enorme com o que parecia ser um closet e banheiro
conectados.
— Puta merda, — eu murmurei, saindo do
quarto. Fiquei por um momento no corredor escuro
contemplando minhas opções. Havia outras quatro portas
para escolher, eu só precisava escolher uma e ver o que
encontrava.
O que se seguiu foi eu bisbilhotando o andar de cima de
Mick. Eu não estava orgulhosa disso, mas não conseguia
evitar. O banheiro tinha sido atualizado de uma banheira
branca simples para um chuveiro elegante com portas de
vidro e um dos chuveiros mais extravagantes que já
vi. Lajotas haviam substituído o antigo linóleo. Até a pia e o
banheiro foram atualizados.
A segunda porta era um armário de roupas de cama, e
dei uma risadinha de alívio quando percebi que era a única
coisa que ele não havia mudado. Ainda tinha quatro
prateleiras de madeira com pilhas altas de toalhas, lençóis e
cobertores.
A terceira porta era o quarto de hóspedes quando eu era
criança e ainda era, mas era aí que as semelhanças
terminavam. O quarto foi ampliado, tornando-a quase duas
vezes maior do que antes, com um closet adicional. As
paredes eram de uma cor diferente, o carpete havia sido
substituído, até a luminária era diferente.
Coloquei Rhett no centro da cama e puxei a colcha
debaixo dele para poder aconchegá-lo.
— Mamãe? — ele perguntou, sem abrir os olhos.
— Estou bem aqui, — eu sussurrei de volta, tentando
não acordá-lo completamente. — Durma, bebê.
— OK. — Em segundos, seu corpo estava
completamente relaxado novamente.
Olhei para a porta indecisa, sabendo que provavelmente
deveria ir para a cama, mas, em vez disso, voltei para o
corredor, ouvindo Mick. Quando soube que ele ainda estava
lá embaixo em algum lugar, provavelmente me xingando,
continuei até o último quarto. O antigo quarto dos meus pais.
Eu não estrava muito lá quando criança. A maior parte
da casa era meu playground, mas o quarto dos meus pais
sempre fora proibido. Era uma regra rigorosamente aplicada
mesmo depois que me tornei adulta e provavelmente foi por
isso que Rhett e eu dividíamos um quarto e uma cama
durante toda a sua vida. Eu não podia imaginar tentar
mantê-lo fora do meu espaço.
Abri a porta, sabendo que não estaria igual. A parede
entre o quarto onde Rhett estava dormindo e o antigo quarto
principal havia sido movida, o que pensei que significava que
o principal seria muito menor, mas não. Em vez disso, o
enorme closet que meus pais usavam havia sumido e, em seu
lugar, havia um closet mais modesto. Ele também
acrescentou outra janela do outro lado do quarto. Olhei ao
redor, olhando para as paredes e o carpete cinza-claro,
esperando sentir algo, tristeza, nostalgia, qualquer coisa, mas
não senti. Eu não o reconheci. Era como se estivesse em uma
casa completamente diferente.
Voltei lentamente para onde Rhett estava dormindo e
fechei a porta silenciosamente atrás de mim.
Por que diabos Mick comprou nossa velha casa e depois
a reformou completamente? A planta baixa não estava nem
perto da original. Não fazia sentido. Quando alguém
comprava uma casa, eu sempre achei que era
porque gostava dela, mas ele claramente não, porque
mudou tudo. Eu sabia que devia ter algo a ver comigo,
conosco, mas não conseguia entender.
Eu tirei minha roupa íntima e coloquei uma camiseta e
subi na cama. Era estranho não escovar os dentes, mas
estava muito nervosa em ficar cara a cara com Mick
novamente no corredor, e não estava pronta para isso. Ainda
não.
Eu sabia que vê-lo novamente seria difícil. Ver um ex
depois de tanto tempo seria desconfortável nas melhores
circunstâncias e isso era um milhão de vezes mais
complicado do que isso... mas tinha sido melhor e pior do que
eu esperava.
Ele não tinha uma significativa pelo que pude ver. Ele
não tinha mais filhos. Ele não gritou ou se enfureceu. Ele não
questionou se Rhett era dele ou me ameaçou legalmente. Sua
família não tinha fechado a porta na minha cara e tinha sido
muito acolhedora, exceto por Otto. Todas essas coisas eram
boas. Era um bom começo, eu esperava.
Acho que, no fundo do meu coração, eu esperava por
algo diferente, embora mal pudesse admitir para mim
mesma. Enquanto economizava e planejava voltar para ele,
eu tinha essa visão em minha mente, que ele me veria e me
puxaria para seus braços. Que ficaria tão grato por eu estar
de volta que abraçaria nosso retorno de todo o coração, com
compreensão e gratidão.
Eu sabia que era um sonho de merda. Eu sabia que a
vida não funcionava assim e ele tinha muitas coisas válidas
para se zangar. Eu sabia que não ia acontecer como a
fantasia na minha cabeça, mas depois de alimentar essa
fantasia por tanto tempo, a realidade ainda tinha sido um
golpe.
Fiquei ali pensando em como estava grata por tudo ter
corrido tão bem, por Rhett e eu finalmente estarmos de volta
ao lugar ao qual pertencíamos e por nossa viagem do Arizona
finalmente ter terminado. Mas adormeci revivendo a sensação
da barba de Mick roçando meu rosto, a mordida de seus
dentes em meus lábios e o gosto de cerveja em sua língua.
Capitulo 4

MICHAEL

— O que você está fazendo aqui? — Eu perguntei,


abrindo a porta da frente para o meu irmão.
— Pensei em vir me certificar de que você não está
fazendo nada estúpido, — ele brincou, entrando. — Onde está
Em?
— Ela está lá em cima, — murmurei, fechando a porta
atrás dele. — Entre.
— Ah, mas qual quarto lá em cima? — ele brincou
enquanto se movia em direção a cozinha como se fosse o
dono da casa.
— Não faço ideia, — respondi categoricamente. — Eu
disse a ela para escolher um.
Rumi riu baixinho. — Ela provavelmente está na sua
cama.
— Duvido muito.
— É comigo que você está falando. Você percebe isso,
certo? — Ele pegou uma cerveja na geladeira e usou o balcão
para abrir a tampa. — Se você acha que não vi os olhares de
saudade que vocês dois estavam lançando um ao outro
quando achavam outra pessoa não estava olhando...
— Não houve olhares de saudade.
— Você poderia cortar a tensão com uma faca, irmão.
— Ela sumiu por três anos, — eu disse categoricamente,
sentando-me à mesa. Havia quatro garrafas de cerveja vazias
na mesa à minha frente e uma ainda pela metade.
— Não exatamente três, — Rumi respondeu, sentando-
se na minha frente. — Você está lidando?
— Com qual parte? — Eu perguntei sarcasticamente. —
O fato de que minha namorada do ensino médio voltou de
repente e está dormindo na minha casa ou que ela trouxe
nosso filho de dois anos com ela?
— Na sua casa que costumava ser a casa dela, — Rumi
apontou. — Repensando isso ainda?
— Não, — eu disse teimosamente. — Gosto desta
casa. Eu trabalhei muito nela. É minha.
— Você teve que trabalhar muito nela, considerando o
estado em que estava quando a comprou.
— Você está aqui para estourar minhas bolas ou o quê?
— Não. — Rumi balançou a cabeça. — Apenas
checando. Sabia que você ainda estaria acordado. Hoje foi
uma merda completa.
— Eufemismo. — Estendi a mão para esfregar a parte de
trás do meu pescoço, onde uma dor de cabeça de tensão
estava começando. — Não foi assim que pensei que meu dia
seria quando acordei todo animado para pintar aquela Dyna2.
— Como vai isso?

2 Harley-Davidson Dyna.
— Ela é linda pra caralho, cara, — eu disse com um
suspiro. — Pensei em lidar com a ferrugem, mas não com
uma partícula. Tem sido a porra de um sonho.
— Mal posso esperar para vê-la reformada.
— Deve levar apenas mais uma semana. — Terminei
minha cerveja e me recostei na cadeira. — Supondo que eu
entre na garagem.
— Por que não?
— Que porra eu devo fazer com eles? — Eu perguntei,
apontando meu queixo em direção às escadas.
Rumi olhou para mim como se eu tivesse crescido duas
cabeças. — Bem, considerando que Emilia é adulta e já é mãe
há alguns anos, acho que você pode simplesmente deixá-los
fazer suas coisas?
— Eu simplesmente volto ao normal? — Eu disse
incrédulo. Nem parecia possível.
— Você tem que trabalhar, cara, — Rumi respondeu
com uma risada. — O que você achou, que iria se aposentar
aos vinte e um anos e viver de sua boa aparência?
Joguei uma tampinha de garrafa nele. — Idiota.
— Não tenho certeza se o seu antigo normal voltará a
ser o seu normal novamente, — disse Rumi, pegando o
boné. — Mas sim, você encontrará um novo normal. Você tem
que trabalhar, cara.
Eu balancei a cabeça, mas o pensamento fez uma
piscina de ansiedade em meu estômago.
— Você tem o resto do fim de semana para acomodá-los,
certo? — ele disse, me observando atentamente. — Na
segunda-feira, você estará ansioso para sair de casa como
sempre.
Eu balancei a cabeça novamente, mas não tinha tanta
certeza sobre isso.
— Mick, — meu irmão disse baixinho, quase
gentilmente. — Ela não teria vindo até aqui se fosse apenas
decolar de novo, certo?
— Não achei que ela fugiria da primeira vez, — eu
respondi. — Conheço-a ainda menos agora. Não tenho a
menor ideia do que ela faria.
— Tudo bem, acredite em mim, seu irmão mais novo,
mas mais inteligente...
Eu zombei.
— Ela não veio até aqui para partir de novo, e você não é
o garoto de dezoito anos que ela deixou da primeira vez. Está
tudo bem, cara. Em vez de se preocupar com o que pode
acontecer, tente apenas aproveitar para conhecer seu filho.
— Ele se parece comigo, — eu disse, um sorriso
puxando minha boca.
— Foda-se, — disse Rumi, prolongando a palavra. — Ele
é um maldito clone. Quando o vi, foi como ser transportado
de volta no tempo. Espero que ele não seja um babaca como
você era.
— Eu não era um babaca!
— Você era.
— Eu sempre te deixava brincar comigo, —
argumentei. — Sempre fui legal com você.
— Você me tolerava na melhor das hipóteses, — disse
Rumi, apontando sua garrafa de cerveja para mim. — E isso
só se mamãe estivesse assistindo.
— Bebê chorão, — eu murmurei, fazendo-o rir.
— Mas ele tem o sorriso de Em, — disse Rumi.
— Você percebeu isso?
— Como eu poderia perder isso?
— O resto é tudo você, no entanto. O garoto é
enorme. Ele vai ser maior do que eu quando tiver doze anos.
— Não acredito que tenho um filho, — murmurei,
balançando a cabeça.
Eu queria socar alguma coisa e gritar a notícia dos
telhados. Eu tinha um filho. Um filho de dois anos. Um filho
que se parecia comigo e estava dormindo no andar de
cima. Era selvagem.
— Opinião impopular, — Rumi disse hesitante. — Mas
você não poderia ter escolhido uma mãe melhor para ele.
Eu só olhei para ele.
— Ela fodeu tudo, claramente, e estou seriamente
chateado. — Eu bufei.
— Mas ela é boa com ele, cara, e ele a adora. Ela é uma
boa mãe, mesmo que tenha feito merda.
— Não consigo nem entender o fato de que ela
simplesmente não disse nada por três malditos anos.
— Nem eu, — Rumi murmurou.
— Os pais dela morreram.
— O que? — Rumi me observou caminhar até a
geladeira, com os olhos arregalados.
— Sim. — Peguei outra cerveja. — Acidente de carro.
— Triste por ela, mas eu com certeza não vou sentir
falta deles, — Rumi disse categoricamente.
— Sem brincadeira.
— É por isso que ela veio até aqui?
— Parte disso, — eu confirmei. — Percebeu que não
poderia sustentá-lo sozinha.
— Ela está aqui por dinheiro? — A expressão no rosto
do meu irmão era uma mistura de surpresa e desgosto.
— Eu não acho que seja tão mercenário assim, — eu
disse cansado. — Há uma longa história, mas a versão
resumida é que seus pais não a apoiariam se ela tivesse
qualquer contato comigo, e ela estava com medo de balançar
o barco. Depois que eles morreram, ela tentou fazer isso
sozinha e finalmente percebeu que era hora de voltar para
casa.
— Jesus.
— A porra dos pais dela, cara, — eu disse, balançando a
cabeça. — Que casal de psicopatas.
— Eles sempre foram estranhos pra caralho, —
respondeu Rumi. — Você se lembra quando fizemos aquela
grande festa de Halloween na escola primária, e eles disseram
que Em não podia comer nenhum dos doces?
— Sim, — eu disse, lembrando de Emilia em suas
marias-chiquinhas, sorrindo enquanto olhava toda a merda
que não tinha permissão de comer. — O que sempre me
marcou foi o fato de que ela não comeu nada, mesmo que eles
não estivessem lá olhando.
— Eu teria me empanturrado pra caralho, — Rumi disse
com um encolher de ombros. — Me preocuparia com as
consequências mais tarde.
— Eu também. — Inferno, qualquer criança comeria
pelo menos uma guloseima e dane-se as consequências, mas
não Emilia.
— Parece que eles foram bons para Rhett, no entanto, —
disse Rumi, estendendo a mão para puxar o cabelo do rosto
em um rabo de cavalo. — Ele os mencionou algumas vezes
antes. Tudo coisas boas.
— Sim, exceto pelo fato de que eles manipularam sua
mãe para mantê-lo em segredo de seu pai, — eu respondi
categoricamente. — Tenho certeza de que era uma alegria
estar por perto.
— Eu só estou dizendo... — Ele levantou as mãos em
sinal de rendição. — Ele tem lembranças felizes deles. Isso é
uma coisa boa. Não gostaria de ter que desenterrá-los só para
mijar neles, sabe?
— Você é um maluco do caralho.
— Sim, bem, culpado. — Rumi deu de ombros,
despreocupado. Ele olhou para mim por cima da garrafa de
cerveja. — Agora vamos falar sobre o elefante na sala.
— Não há elefante.
— O que você vai fazer sobre Em? — ele perguntou,
falando sobre mim.
— Nada.
— Ela só vai viver com você platonicamente?
— Ela não está vivendo comigo, — eu bati. — Ela vai
passar a noite. Uma noite.
— Você vai expulsá-la amanhã, então?
— Claro que não.
— Então ela vai ficar?
— Por agora.
— Besteira.
— Até ela conseguir um lugar, ela e Rhett podem ficar
aqui, — eu disse, rangendo os dentes. — Por que você está
empurrando isso?
— Então, — Rumi disse pensativo. Pelo seu tom, eu
sabia que ele só iria me irritar ainda mais. — Ela vai ficar até
encontrar um emprego e economizar o suficiente para pagar o
primeiro e o último aluguel em algum lugar? Ela vai morar
aqui, irmão. Apenas acostume-se a isso.
— Ela não vai morar aqui, porra, — eu bati. — Você
pode deixar isso pra lá?
— Apenas tentando descobrir se você está prestes a
cometer um grande erro ou não. Você vai manter civilizado e
deixá-la ficar até que encontre um lugar ou vai ver se pode
voltar e brincar de casinha com a única garota que já olhou
duas vezes e nunca superou?
— Eu não estou cometendo nenhum maldito erro, — eu
respondi. — Ela pode ficar até que esteja de pé. Meu filho
mora com ela. Não é como se eu fosse deixá-la sem-teto.
Rumi apenas me observou como se soubesse de algo
que eu desconhecia. — Nunca disse qual cenário eu achava
que era um erro, — disse ele finalmente.
— E eu olhei duas vezes para muitas mulheres, — eu
lati. — Não é como se eu estivesse esperando que Emilia
aparecesse. Eu transo bastante. Tenho certeza que ela tem
fodido outras pessoas também. Já se passaram três malditos
anos.
— Na verdade, tenho estado um pouco ocupada, — disse
Emilia atrás de mim. — Criar um filho e trabalhar não deixa
muito tempo para transar.
Fechei os olhos e segurei um gemido.
— Ei Em, — Rumi disse divertido.
— Ei, Rum. — Ela entrou na cozinha quando eu abri
meus olhos novamente. — Desculpe, Rhett acordou com sede
e não pensei que alguém estaria aqui embaixo.
— À direita da pia, — eu disse a ela enquanto ela abria o
armário errado procurando por um copo.
— Obrigada, — ela murmurou.
— Você sabe, — Rumi disse, virando-se em sua cadeira
para observá-la. — Aposto que mamãe cuidaria de Rhett se
você estiver planejando encontrar um emprego.
Emília riu. — Que diabos mais eu faria? Temos que
comer. — Ela encheu o copo até a metade com água da
torneira. — Mas obrigada, na verdade é uma boa ideia. Vou
perguntar a sua mãe sobre isso. Seria incrível se eu não
tivesse que pagar pela creche.
— Quando você começou a xingar? — Rumi perguntou
surpreso.
Emília revirou os olhos. — Seu irmão me perguntou a
mesma coisa.
— Você era uma princesa, — Rumi disse com um
sorriso.
— Eu era uma criança, — ela respondeu. — Vou levar
isto ao Rhett. Boa noite pessoal.
— Boa noite, — murmurei quando ela passou por mim.
— Boa noite, Emmy Lou, — Rumi cantou, fazendo-a
acenar por cima do ombro.
— Emmy Lou? — perguntei ao meu irmão. —
Realmente?
— O que?
— Você só vai agir como se tudo estivesse bem?
— Você quer que eu a trate como merda?
— Quero que você fique do meu lado, — murmurei,
sabendo que parecia uma criança de doze anos.
— Estou sempre do seu lado, Michael, — Rumi disse
sério. — Mas eu a conhecia quase tão bem quanto você
antes. Foda-se, cara, ela era da família. Devo agir como se
isso tivesse acabado agora?
— Não acabou?
— Você me diz, — ele atirou de volta. — Pelo que você
sabe, ela pode ter passado os últimos três anos roubando
pessoas ou sendo uma porra de uma viúva negra, mas ela
ainda está dormindo na sua casa.
— Ela não é uma porra de uma ladra.
— Então, rápido para vir em sua defesa.
— Jesus Cristo, você me dá dor de cabeça.
— Eu tenho esse efeito, — ele disse facilmente,
levantando-se de seu assento. — Olha, eu não vou tratá-la
como merda ou congelá-la porque ela fez algo de merda. Ela
já teve o suficiente disso e não vou acrescentar nada a
isso. Você quer fazer isso, é com você.
Depois que ele saiu, limpei nossas garrafas de cerveja e
fechei a casa para a noite, subindo as escadas no
escuro. Quanto mais perto eu chegava do meu quarto, mais
ansioso ficava, imaginando se iria encontrar Emilia na minha
cama como Rumi havia mencionado. Como diabos eu a
jogaria para fora? Porque eu sabia que teria que fazer. Foder
Emilia seria a coisa mais estúpida que eu já fiz, e não iria por
esse caminho. Ela me ferrou uma vez, e eu não ia deixar isso
acontecer novamente. Tínhamos um filho em quem pensar e
precisávamos manter as coisas amigáveis entre nós — o sexo
estragaria tudo rapidamente.
Quando cheguei ao meu quarto e encontrei a porta
aberta, me preparei, mas percebi quase imediatamente que
ela não estava lá. Ignorando a decepção que senti - devo ser
um maldito masoquista - fechei. O quarto era o mais próximo
da perfeição que eu poderia conseguir. Eu escolhi todos os
recursos, desde o ventilador de teto até a enorme cama king-
size da Califórnia. Minha mãe disse que me preocupo tanto
com os mínimos detalhes porque sou um artista, meu pai
argumentou que era porque eu era um perfeccionista, mas
apenas pensei que sabia o que parecia bom e não estava
disposto a cortar custos. O carpete era macio, as cortinas
eram opacas e os lençóis eram incríveis. Eu poderia viver com
o mesmo jeans de trabalho e uma flanela surrada sem
problemas, mas não estava disposto a dormir em lençóis de
merda. A vida era muito curta.
Eu me perguntei o que Emilia achou da casa enquanto
me preparava para dormir. Ela obviamente deu uma olhada
ao redor, porque eu sabia que tinha fechado a porta do meu
quarto e ela estava aberta quando cheguei. Ela gostou? Era
estranho para ela?
Claro que era estranho para ela. Eu estava morando na
porra da casa dela. Não, era a minha casa. Eu a fiz minha.
Não era quando me mudei. A família de quem comprei o
lugar não mudou muito e ainda parecia a casa de
Emilia. Tinha os mesmos tapetes e a maioria das mesmas
cores de parede. Mesmos armários, eletrodomésticos, inferno,
eles nem haviam trocado as persianas. Eu só estive na casa
dela algumas vezes enquanto seus pais estavam fora, mas me
lembrava exatamente de como era o lugar naquela época.
Afastei a memória do primeiro dia em que voltei aqui,
procurando por respostas.
A água quente fez pouco para relaxar meus ombros e
pescoço, mas fiquei lá por um longo tempo de qualquer
maneira. Eu não podia acreditar que ela estava de
volta. Porra, por um ano depois que ela se foi, adormeci com
ela em minha mente. Não importava se eu estava bêbado ou
sóbrio, Emilia era a primeira coisa em que eu pensava
quando acordava e a última quando ia dormir. Eu estava
preocupado com ela, porra, estava
preocupado. Silenciosamente e não tão silenciosamente
furioso com ela. Sentia falta dela. A amava. E então, em
algum momento do ano passado, toda essa merda se
acalmou. Eu ainda pensava nela com frequência, mas não
com tanta frequência. Ainda estava preocupada, mas isso
também havia abrandado.
Agora de repente ela estava de volta, e eu não sabia o
que fazer com isso. Nós tínhamos um filho, e eu não tinha
certeza do que deveria fazer com isso também.
Quando as pessoas diziam que você não sabia a
profundidade dos sentimentos que poderia ter até ter um
filho, elas não estavam mentindo. No momento em que
conheci Rhett, soube que morreria por ele. Quando ele sumiu
no quintal e o ouvi chorar, senti isso no fundo do meu
peito. Medo instantâneo e o desejo de melhorar, não importa
o que eu tivesse que fazer. Foi uma viagem foda, para dizer o
mínimo. Eu nem sabia nada sobre ele, mas sabia que ele era
meu. Cem por cento meu.
Ok, cinquenta por cento. Que seja.
Ele era tão doce, e você poderia dizer apenas olhando
para ele o quanto amava Emilia. Ela era sua estrela do
norte. Esfreguei meu corpo enquanto contemplava como tudo
poderia funcionar.
Eventualmente, eles conseguiriam um lugar próprio,
mas eu o queria comigo. Me dava náuseas pensar nas coisas
que eu já tinha perdido. Passar metade do tempo comigo e
metade do tempo com Emilia parecia a coisa mais
justa. Tempo igual. Nós dois éramos seus pais.
Então pensei na maneira como ele olhava para ela, na
maneira como orbitava em torno dela, na maneira como se
agarrava a ela, e eu sabia que cinquenta por cento nunca
daria certo. Ainda não. Não por algum tempo.
Ela era tudo para ele e eu era apenas um gigante que ele
não conhecia e em quem não confiava.
Porra.
Deixando a água cair sobre minha cabeça, contei de cem
para trás, sentindo a raiva e a frustração se dissiparem uma
fração de cada vez.
Terminei o banho e fui para a cama, imaginando se
Rhett acordaria cedo. Eu o ouviria pela manhã ou Emilia
cuidaria para que ele não me acordasse? Eu tinha certeza de
que seria o último, então programei meu alarme para as seis
e meia. Eu não queria perder nenhum momento. Ele iria
querer cereal pela manhã? Eu tinha alguns. Ou fruta? Eu
tinha certeza de que ainda tinha alguns morangos na
geladeira - ou talvez os levasse para o café da manhã e fizesse
disso uma coisa de boas-vindas em casa.
Adormeci pensando se os levaria para a casa de
panquecas na rua ou para a lanchonete mais perto da casa
dos meus pais. Menos de uma hora depois, acordei com a
mão no meu pau e um sonho muito vívido de Emilia tocando
sem parar na minha cabeça. Ela estava linda com seu cabelo
castanho claro suado e selvagem, seus seios pesados
enquanto balançavam com cada movimento de seus quadris,
e seus olhos fechados enquanto jogava a cabeça para trás e
gemia.
Eu gozei, gemendo baixinho, antes mesmo de perceber o
que estava fazendo.
— Foda-se, — murmurei, respirando pesadamente
enquanto olhava para o ventilador de teto. Eu tinha acabado
de sonhar com Emilia enquanto ela dormia no corredor. O
que diabos eu estava fazendo?
Eu sabia que o beijo tinha sido um erro no segundo em
que o dei. Velhos hábitos custam a morrer, eu acho, porque
ela estava olhando para mim como antes, com absoluta
confiança, como se eu pudesse consertar qualquer coisa e ser
qualquer coisa e cedi.
Claro, eu pensei em fazer isso desde o momento em que
entrei na cozinha da minha mãe e a vi parada lá, mas na
verdade não tinha planejado fazer isso. Eu nem a conhecia
mais. Rumi estava certo. Ela poderia ser qualquer uma agora.
Eu me levantei e me limpei, vestindo uma calça de
moletom em um esforço para manter minhas mãos longe do
meu pau se tivesse mais sonhos.
Eu precisava manter uma pequena distância entre
Emilia e eu enquanto descobríamos exatamente como iríamos
seguir em frente. Brincar de casinha enquanto fazíamos isso
confundiria a situação de uma maneira que nenhum de nós
queria. Tínhamos um filho para cuidar. Precisávamos cuidar
dele primeiro, garantir que ele se sentisse bem e seguro. Essa
tinha que ser minha prioridade - não transar com a mãe dele.
Porém, eu não tinha certeza se seria capaz de manter os
sonhos afastados. Porra, ela parecia bem. Como antes, só que
melhor. Ela costumava ser tão doce e despreocupada, agora
você podia dizer que ela viveu um pouco. Seus olhos não
eram mais arregalados e inquisitivos. Eles sabiam, e caramba
se isso não funcionava para mim. Ela não era mais uma
adolescente, nem eu, e tinha a sensação de que, se
acabássemos na cama, seria um milhão de vezes melhor do
que antes.
Eu rolei e enfiei meu rosto no travesseiro, rosnando de
frustração. Seria mais fácil se eu não a achasse mais
atraente. Se ela de alguma forma se tornasse menos ela. Tão
zangado quanto eu estava com ela - e podia sentir essa raiva
ainda borbulhando logo abaixo da superfície - eu ainda a
queria. Seriamente.
Por fim, adormeci, mas não fazia ideia de quanto tempo
demorou.
Quando meu despertador tocou na manhã seguinte,
pulei da cama, certo de que Emilia e Rhett tinham ido
embora. Sem me preocupar em vestir uma camiseta ou deixar
minha ereção matinal desaparecer, praticamente corri pelo
corredor e abri a primeira porta. Foi pura sorte que consegui
evitar que batesse na parede quando os encontrei dormindo
profundamente na cama de hóspedes.
Emilia estava de costas, os braços jogados acima da
cabeça e a boca aberta, mas foi Rhett quem me fez parar e
olhar. Ele estava dormindo enrolado em torno dela, toda a
metade superior de seu corpo pressionada contra o lado dela,
o braço e uma perna jogados sobre ela e a cabeça
descansando em seu ombro, o rosto a apenas alguns
centímetros de seu pescoço. Ambos estavam completamente
inconscientes, roncando baixinho, e eu apenas fiquei parado
olhando.
Eles eram meus. Ele era meu. Ela podia estar diferente,
eu sabia que estava, mas ainda veio até mim. Ela ficou na
minha casa em vez da casa dos meus pais. Ela dirigiu do
Arizona para me encontrar e, em vez de ficar em um motel e
manter distância, ela bisbilhotou minha casa e dormiu no
meu quarto de hóspedes.
Eu esfreguei meu esterno enquanto meu coração
trovejava em meu peito.
Eu queria rastejar na cama ao lado deles e colocar Rhett
entre nós. Talvez eu adormecesse e acordasse com o braço
dele sobre minha barriga. Talvez ela acordasse e sorrisse para
mim por cima da cabeça dele com um olhar secreto de
orgulho dessa pessoinha que estava aninhada entre nós.
Eu silenciosamente engasguei por ar quando saí e fechei
a porta do quarto. Porra, eu podia nos ver como uma família
tão claramente. A perfeição disso.
E então a realidade me atingiu como um martelo.
Ela escolheu algo diferente. Poderíamos ter sido uma
família há três anos, dois anos atrás, no ano passado. Ela
viveu uma vida completamente separada, mantendo o
conhecimento de nosso filho para si mesma por quase três
anos. A unidade familiar que eu estava imaginando era uma
fantasia. Era besteira.
Em algum momento, talvez Rhett dormisse ao meu lado,
me chutando e monopolizando a cama, mas Emilia não
estaria ali roncando ao lado dele. Isso não estava nas cartas,
e eu precisava lidar com essa merda e seguir em frente.
Eu me endireitei e endireitei meus ombros.
Eu precisava me concentrar no que era importante -
conhecer meu filho - e começaria levando ele e sua mãe para
tomar café da manhã. Depois disso, veria onde o dia nos
levaria. Talvez ele gostasse do parque, ou achasse legal jogar
pedras no rio. Eu era um fodido profissional em jogar
pedras. Talvez eu pudesse impressioná-lo dessa
maneira. Mostrar-lhe como era feito.
Ele tinha uma bicicleta? Talvez pudéssemos comprar
uma para ele. Eu tinha visto garotos da idade dele andando
pelo clube em pequenas bicicletas sem pedais. Ensiná-lo a
andar sobre duas rodas cedo, como eu fiz. Talvez ele gostasse
disso.
Minha mente passou por diferentes ideias de como eu
faria meu filho gostar de mim enquanto me vestia e me
preparava para o dia. Era nisso que eu me concentraria desse
ponto em diante.
Capitulo 5

EMÍLIA

— Mama, — Rhett sussurrou, seu hálito matinal me


fazendo torcer o nariz em desgosto. — Mamãe, acordada?
— Estou acordada agora, — eu sussurrei de volta,
abrindo meus olhos.
— Estou com fome. — Seu rosto estava a cerca de cinco
centímetros do meu.
— Você está sempre com fome, — eu provoquei, tirando
meu cabelo do rosto. — Você dormiu bem?
— Sim.
— Bom, — eu disse, puxando-o para perto de mim na
cama. — Tem certeza que não quer dormir mais um pouco?
— Não. Com fome.
— Oh, certo, — eu murmurei, olhando ao redor da
sala. Pelo menos ele me deixou dormir até o sol nascer. O
quarto parecia diferente à luz do dia. As cores eram mais
quentes e ainda mais acolhedoras do que na noite
anterior. Quem as escolheu tinha bom gosto.
— Almoço? — Rhett perguntou, afastando-se para poder
deslizar para fora da cama.
— Café da manhã, bebê. O almoço é mais tarde, — eu o
lembrei com um suspiro. Eu teria gostado de adiar o encontro
com Mick por pelo menos um pouco mais depois daquele
beijo na noite anterior, mas sabia que Rhett não me deixaria
protelar. Se eu não me levantasse e começasse a me arrumar
para o dia, ele rapidamente desabaria. A palavra fome poderia
ter sido inventada pensando no meu filho.
O fato de ele não ter perguntado onde estávamos fez
uma pequena explosão de vergonha explodir em meu
peito. Nós tínhamos acordado em tantos lugares diferentes
ultimamente que ele não estava preocupado com mais um.
Depois de nos vestirmos e de uma rápida visita ao lindo
banheiro no andar de cima, Rhett e eu nos aventuramos até a
cozinha. Mick estava sentado à mesa da cozinha com uma
xícara de café na mão.
— Ei, como você dormiu? — ele perguntou, com os olhos
em Rhett.
— Ótimo, — respondi, parando bruscamente para não
tropeçar quando Rhett parou na minha frente. — Aquela
cama é muito confortável.
— Meio inútil comprar um que não é, — Mick respondeu
com um encolher de ombros. — Tem café no balcão se você
quiser. Vocês estão com fome?
Olhei para o topo da cabeça do meu filho, esperando que
ele respondesse. A única razão pela qual saímos da cama foi
porque ele estava com fome, mas Rhett estava em silêncio. O
momento ficou estranho quando Rhett e eu ficamos parados
em silêncio.
— Rhett está morrendo de fome, — eu disse, acariciando
o topo de sua cabeça enquanto me movia ao redor dele para
jogar sua fralda no lixo. — Mas eu poderia me safar apenas
com café.
— Quer ir comer umas panquecas, Rhett? — Mick
perguntou casualmente. — Há um restaurante a alguns
minutos que faz panquecas incríveis.
— Como panquecas, — Rhett respondeu timidamente
enquanto eu me servia de uma xícara de café. — Xarope?
— Absolutamente.
Eu me virei e me encostei no balcão, observando a
interação deles. Rhett havia se aproximado alguns passos e
estava parado com um pé coberto pela meia em cima do
outro.
— Mamãe também? — Rhett perguntou, olhando para
mim.
— Claro. Mamãe tem que comer, certo?
Ambos olharam para mim com expectativa, e eu
coloquei minha xícara cheia de café no balcão com um
suspiro. — Ok, vamos fazer isso.
Tudo estava indo bem quando colocamos nossas
jaquetas e sapatos, mas no momento em que saímos e Mick
começou a se dirigir para a garagem com Rhett seguindo
atrás dele como um patinho, tive que quebrar o feitiço.
— Uh, Rhett, — eu chamei, rindo. — Onde você está
indo, amigo?
— Panquecas!
— Sua cadeirinha está no nosso carro, — eu apontei,
literalmente apontando meu polegar em direção ao nosso
carro. — Você tem que ir comigo.
— Panquecas, mamãe. — Ele olhou por cima do ombro
para Mick.
— Seu pai pode ir conosco se quiser, — eu disse,
calculando automaticamente quanto tempo levaria para eu
limpar o banco do passageiro. Em um dia bom, sempre havia
embalagens e brinquedos aleatórios lá em cima, mas já
estávamos na estrada há algum tempo. Estava meio que um
pesadelo.
— Podemos colocar o assento dele na minha
caminhonete, — disse Mick enquanto eu pegava Rhett e o
carregava até o carro.
— Tudo bem, — eu disse por cima do ombro enquanto
abria a porta de Rhett e o colocava em seu assento. — Apenas
me dê um segundo, e você pode ir conosco.
— Vamos pegar a caminhonete, — Michael respondeu
teimosamente.
Eu sabia que seria novidade para ele, mas em algum
lugar ao longo da linha, eu parecia ter crescido um pouco de
espinha dorsal. Anos atrás, eu teria feito o que ele
quisesse. Ir para o rio mesmo estando menstruada e só
querendo ficar deitada assistindo a filmes? Claro,
Michael. Deitar na rede por uma hora mesmo estando
entediada e querendo ir fazer alguma coisa? Claro, Michael. Ir
à lanchonete mesmo gostando muito de tacos? Com certeza,
Michael, hambúrgueres parecem ótimos.
Brigar com Michael era a última coisa que eu queria
fazer, mas também não queria mais ser aquela
pessoa. Depois de passar toda a minha vida sob o controle de
meus pais, passei os últimos meses descobrindo como era
tomar minhas próprias decisões e cumpri-las. Eu não tinha
interesse em voltar a ser como era antes.
Eu queria dirigir meu carro. Eu não queria passar pelo
incômodo de tirar o assento de Rhett da parte de trás e
colocá-lo de volta em uma hora quando voltássemos do café
da manhã. Era pesada, desajeitada e simplesmente irritante.
Terminei de colocar Rhett e encontrei um saco de fast
food quase vazio. Inclinando-me para dentro do carro, usei a
sacola para juntar todos os pedacinhos de lixo no assoalho da
frente, jogando os brinquedos no banco de trás enquanto me
apressava.
— Jesus, — a voz divertida de Michael veio bem atrás de
mim. — Você é uma desleixada.
Virei-me tão rápido que bati com a nuca no teto do
carro.
— Eu não sou desleixada.
— Doçura, — ele murmurou, olhando para mim, o
carro, e depois de volta para mim de novo. — Seu carro está
destruído.
Eu fiz uma careta, ignorando como o apelido carinhoso
fez meu estômago revirar.
— Você tem alguma ideia de como é nunca ser capaz de
simplesmente sair do carro e correr até a loja, ou um
restaurante, ou banco, ou apenas direto para sua casa depois
de um longo dia? — perguntei, olhando para Rhett. — Tenho
que pegar minha bolsa e depois sair, dar a volta no carro e
abrir a porta de Rhett. Cinquenta por cento das vezes, tenho
que calçar os sapatos antes de pegá-lo, desafivela-lo e tirá-lo
do carro. Então tenho que pegar qualquer brinquedo que ele
trouxe, seu cobertor que ele não consegue sair de casa sem...
O olhar de Mick disparou para Rhett, que estava
tentando puxar o cobertor debaixo de um de seus pés.
— E então tenho que conduzi-lo ou carregá-lo para onde
quer que estejamos indo. Lamento se meu carro não está de
acordo com seus padrões, mas só tenho duas mãos, e elas
geralmente estão cheias de merda do nosso filho.
— Posso pedir a um dos prospectos para cuidar disso
para você, — Mick respondeu, seus olhos enrugando nos
cantos. — Se isso ajudar.
— Só até a próxima vez que Rhett for comigo até a loja,
— murmurei, inclinando-me para trás para pegar o resto dos
destroços e refugos que estavam espalhados pelo banco do
carona do meu carro. Acenei com a mão em sua direção. —
Percebi que você se juntou ao clube.
— Difícil de perder, — disse ele, olhando para o colete de
couro que usava. Pegando o lixo das minhas mãos, ele
caminhou até uma lata de lixo ao lado da casa e jogou
dentro.
— Você está pronto, amigo? — perguntei, batendo na
janela de Rhett enquanto contornava o carro.
— Caminhonete, — ele gritou em resposta. Eu deveria
ter previsto isso. Se as opções fossem andar no Subie velho e
chato da mamãe ou em uma caminhonete bacana, a resposta
sempre seria a caminhonete para Rhett.
— Talvez da próxima vez, — respondi, rindo.
— Chaves? — Mick perguntou, estendendo a mão sobre
o capô do carro.
— Eu sei dirigir.
Ele apenas olhou para mim, sua mão entre nós.
— É o meu carro, — eu bufei.
Mick olhou para o banco do passageiro e eu segui seu
olhar. Levei um momento para perceber que ele não ia caber.
— Eu posso tentar empurrar o assento para trás, — ele
murmurou. — Mas duvido que vá adiantar muito com a
cadeirinha de Rhett ali.
Ele estava certo. Para que a cadeirinha de Rhett pudesse
caber, o banco do passageiro tinha que ser empurrado
totalmente para frente. Era toda a razão pela qual ele não
estava atrás do banco do motorista. Eu não precisava de
muito espaço para as pernas, mas também não gostava de
estar a um centímetro do volante.
— Tudo bem, — eu concedi, jogando as chaves para ele
enquanto voltava para o banco do passageiro. Michael riu do
meu olhar furioso quando passou por mim.
— O biquinho da sua mãe, Rhett, — ele disse enquanto
abria a porta do lado do motorista.
— Mamãe biquinho.
— Não estou, — eu disse, virando-me para encarar
Rhett enquanto Mick fechava minha porta. Rhett estava
rindo, seu rosto pressionado em seu cobertor.
— Mamãe biquinho, — Rhett brincou, sorrindo para
mim no pequeno espelho.
—É como dirigir um carro de palhaço, — Michael
resmungou enquanto empurrava o banco do motorista o mais
para trás possível. — Sempre foi tão pequeno?
— Isso foi o que ela disse, — eu murmurei baixinho.
O olhar surpreso de Michael disparou para mim. A
piada era antiga, mas eu nunca a havia contado. Naquela
época, era a piada favorita dele e de Rumi me fazer rir e
repreendê-los.
Ele limpou a garganta. — Eu não posso acreditar que
você ainda está dirigindo essa coisa.
— É confiável. — Estendi a mão e dei um tapinha no
painel. — Por que eu compraria algo novo?
— Eu me lembro quando seus pais compraram para
você depois da formatura, — Mick disse, saindo da
garagem. — Eu não sabia se você ia pular de alegria ou
chorar.
— Tive vontade de fazer os dois. Era “ah, liberdade e vou
parecer uma bibliotecária hippie de cinquenta anos” reunido
em um. Tem sido um bom carro, no entanto, e tenho um
porta-malas incrível.
— Conduz bem, — ele respondeu. — Você está
mantendo a manutenção?
— Você parece meu pai, — eu brinquei.
As palavras caíram como uma bigorna entre nós. Foi
uma declaração provocativa genérica, mas havia muita
história ali para ser engraçada. Eu nem tinha certeza de
como voltar atrás.
— Frances, — disse Rhett do banco de trás. — Frances!
— Quem é Frances? — Mick perguntou, estendendo a
mão para ajustar o espelho para que pudesse olhar para
Rhett.
Rhett deu um tapinha na janela. — Frances.
— Do que ele está falando? — Mick me perguntou
confuso.
Uma risada constrangida subiu pela minha garganta e
lutei para contê-la.
— Você consegue, Frances, — eu disse, bufando,
batendo no painel. — Só mais um pouco, minha velha.
— Jesus, — Mick murmurou divertido.
— Faça isso, Frances, — Rhett copiou no banco de trás,
batendo na porta.
— Vou colocar mais gasolina assim que chegarmos a
Eugene, — continuei, amando o som de sua risada enquanto
esfregava ao longo do painel. — Não vai ser legal?
— Legal, Frances, — Rhett repetiu.
— Casal malucos, — disse ele, balançando a cabeça. —
Ei, se você levar para a loja na segunda-feira, posso pedir a
um dos meninos para garantir que tudo esteja bem depois de
sua viagem.
— Você não precisa fazer isso, — eu disse, relaxando em
meu assento. — Troquei o óleo e os pneus antes de sairmos.
— Você precisa de pneus novos, — Mick disse
facilmente. — Os que têm estão carecas porra.
— Porra careca, — repetiu Rhett como papagaio.
— Michael, — eu sibilei.
— Significa apenas que os pneus estão ficando velhos,
— Mick respondeu em voz alta, como se o volume de suas
palavras fosse fazer Rhett esquecer sua nova e divertida
palavra. — Você tem que substituí-los quando eles podem
estourar quando está dirigindo.
— Estourar. Porra.
— Eles não vão estourar, — eu cantei, olhando para
Mick. — Eles não são tão velhos.
— Você os verificou desde que chegou aqui?
— Eles estão bons.
— Olhe para eles quando sairmos do carro.
— Eu não preciso, — eu disse, revirando os olhos. —
Acabei de verificar antes de sairmos.
— Bem, eu não sei que tipo de rota você fez para chegar
aqui, mas eles estão uma merda agora.
— Você sempre foi tão controlador? — Eu perguntei
exasperada. — Porque é realmente irritante.
Michael olhou para mim. — Controlar seria pegar as
chaves para que você não pudesse dirigir com meu filho por
aí com seus pneus carecas, — ele disse categoricamente. —
Não eu dizendo que eles estão carecas e você precisa procurar
novos.
— Acho que posso decidir quando preciso de pneus
novos.
— Porra! — Rhett sibilou no banco de trás.
— Como quiser, — Michael disse com um encolher de
ombros quando entramos no estacionamento da familiar casa
de panquecas que íamos quando éramos crianças. — Não me
ligue quando estiver parada na beira da estrada com um
pneu furado.
— Eu não vou, — eu respondi teimosamente.
Ficamos em silêncio enquanto estacionamos e saímos do
carro. Voltando para a porta de Rhett, recusei-me a olhar
para os pneus. Eu sabia que eles estavam bons.
— Porra, — disse Rhett quando o tirei do carro.
— Você está pronto para algumas panquecas? — Eu
perguntei, tentando distraí-lo da nova palavra divertida.
— Sim.
— Com calda? — Eu o cutuquei no lado.
— Sim. — Então, alguns segundos depois, — Porra.
— Por que você tem que ser tão inteligente, hein? — Eu
perguntei, revirando os olhos. Talvez eu devesse ter avisado
Michael que nunca xinguei na frente de Rhett exatamente por
esse motivo. Ele copiava tudo.
Fechei a porta do carro e encontrei Michael agachado ao
lado do meu pneu dianteiro com uma moeda entre o polegar e
o indicador, medindo a banda de rodagem dos meus pneus.
— Você está falando sério agora?
— Tenho razão, — ele rebateu, apontando para onde
segurava a moeda. — Você precisa de novos.
— Jesus, Michael, — eu sussurrei, puxando a cabeça de
Rhett contra meu ombro e cobrindo sua orelha com minha
mão. — Leia a porra da margem. Onde vou conseguir
dinheiro para um novo jogo de pneus?
A expressão de Michael mudou de presunçosa para
compreensiva em menos de um segundo quando ele se
levantou.
— Podemos tomar café da manhã? — perguntei,
deixando Rhett levantar a cabeça. — Rhett está morrendo de
fome.
— Com fome, — Rhett concordou.
— Sim, — Michael respondeu, acenando para nós
passarmos por ele. — Vamos tomar café da manhã.
Endireitando meus ombros, andei em direção ao
restaurante. Fiquei envergonhada por ter mencionado que
não podia comprar pneus novos, mas a verdade era a
verdade. Não era como se Rhett e eu estivéssemos
completamente desamparados ou algo assim, mas até eu
encontrar um emprego e começar a trazer algum dinheiro,
tinha que me segurar para não fazer grandes compras. Foi
pura sorte que nada caro tivesse dado problema ainda.
— Posso comprar alguns pneus para você, — Michael
disse em meu ouvido enquanto abria a porta para nós.
— Eu não quero que você me compre pneus, — eu
respondi, minha voz baixa enquanto passava por ele.
— Difícil.
— Micky Hawthorne, — disse a anfitriã com um sorriso,
contornando a frente de seu pequeno pódio. — Não te vejo há
meses!
— Ei, Nova, — disse Michael, passando por Rhett e eu
para poder dar um abraço na garota.
Meu estômago caiu quando ele passou os braços em
volta da cintura dela e a ergueu do chão, balançando-a um
pouco de um lado para o outro.
— Quem é? — ela perguntou, ainda sorrindo quando ele
a colocou no chão.
— Oh, esta é Emilia, — disse Michael, apontando para
mim. — E nosso filho, Rhett.
— Seu o quê? — ela gaguejou, sua boca aberta.
Michael estendeu a mão e esfregou a nuca
timidamente. — Meu filho.
A boca de Nova abriu e fechou algumas vezes antes que
ela percebesse que estava ali boquiaberta como um peixe e
mudou sua expressão. — Prazer em conhecê-los, Emilia e
Rhett, — ela disse com um sorriso estranho.
Eu sorri de volta e balancei a cabeça enquanto Rhett a
observava em silêncio.
— Então, uh, mesa para três, certo? — Nova perguntou,
voltando para trás de seu pódio para pegar os menus. —
Vamos lá.
— Você ainda trabalha na loja de artesanato? — Michael
perguntou enquanto seguíamos Nova para nossa mesa.
— Sim, — ela cantou, sorrindo para ele por cima do
ombro.
Eu segui Rhett alguns passos atrás de Michael, com um
nó no estômago.
— Ambos os lugares então, — Michael disse. — Droga,
garota. Quando você dorme?
— Estou pegando turnos extras sempre que tenho um
minuto livre. Dormir é para os velhos e os mortos, — brincou
Nova. — Tenho pressa.
— Sim, você tem.
— Aqui está a sua mesa, — ela disse, colocando nossos
cardápios na mesa. — Vou ver se consigo alguns giz de cera
para que Rhett possa colorir enquanto vocês esperam pela
sua comida.
— Obrigada, — respondi, colocando Rhett no meu lado
da cabine. Ele rastejou pelo assento, indo para os pacotinhos
de açúcar na mesa. Pelo canto do olho, vi Nova dando um
aperto no antebraço de Mick enquanto se afastava.
— Nova, hein? — Eu perguntei casualmente quando me
sentei. — Ela parece legal.
— Ela é, — respondeu Michael, entregando-me um
menu.
— Ela tem a nossa idade?
— Poucos anos mais jovem.
— Não me lembro dela.
Michael largou o cardápio e olhou para mim. — Ela ia
para uma escola diferente.
— Huh, — eu meditei.
— Na verdade, ela estudou em uma escola
particular. Com bolsa de estudos.
— Isso não pareceu fazer muito bem a ela, — eu
murmurei, olhando ao redor da lanchonete. Não sei por que
disse isso. Foi sarcástico e rude e simplesmente uma merda.
— Não sei sobre isso, — Mick respondeu. — Ela tem um
emprego. — Eu empurrei para trás em surpresa.
— Vou encontrar um emprego, — repeti baixinho, minha
pele formigando como se a qualquer momento fosse explodir
em chamas. — Acabamos de chegar.
— Eu sei. — Michael suspirou e passou a mão pelo
rosto. — Olha, ela trabalha pra caramba, certo? Não sei por
que diabos você a desprezaria por isso.
— Eu não estou menosprezando ninguém, — eu
argumentei, congelada no lugar.
— Claro que não, — ele respondeu cansado, pegando
seu cardápio de volta.
Sentei-me lá, meu rosto em chamas enquanto ele
desviava o olhar. Minha garganta estava apertada e meu
nariz ardia. Prendendo a respiração, coloquei as mãos no
colo, concentrando-me na maneira como meus polegares
roçavam meu jeans. Não olhei para Rhett quando ele
começou a colocar todos os pacotes de açúcar na mesa. Eu
não olhei para Michael enquanto ele colocava o cardápio na
frente dele. Eu nem olhei para Nova quando ela trouxe alguns
giz de cera para que Rhett pudesse colorir o menu infantil.
Se eu tivesse me movido ou mesmo respirado, as
lágrimas que ameaçavam se tornariam realidade. Recusei-me
a chorar no meio de um restaurante de panquecas lotado.
— Panquecas, — Rhett me disse, aconchegando-se ao
meu lado.
— Ok, — eu sussurrei, inclinando-me para beijar o topo
de sua cabeça.
— O que você quer beber, Rhett? — Michael perguntou,
sua voz quase alta demais enquanto tentava fingir que a
mesa não estava praticamente vibrando de tensão.
Rhett não respondeu.
— Você quer um pouco de suco, amigo? — Eu
perguntei, envolvendo meu braço em volta de sua cintura
enquanto ele se inclinava sobre a mesa.
— Sim, — respondeu Rhett.
Eu não tinha certeza se estava mais envergonhada por
ter sido chamada de esnobe ou pelo fato de Mick ter me
colocado no meu lugar. Ele estava certo. Pelo menos Nova
tinha um emprego. Inferno, Michael estava tão melhor
financeiramente que era ridículo. Ele era dono de uma
maldita casa. Alguém poderia argumentar que ele estava indo
muito bem porque não teve que cuidar de uma criança nos
últimos dois anos como eu tive - mas não iria trazer esse
argumento.
A coisa mais idiota sobre isso é que eu nem tinha feito o
comentário sobre Nova porque me importava onde ela
trabalhava. Não era como se eu tivesse espaço para falar. Era
ciúme, puro e simples. Eu tinha visto o jeito fácil que ele agia
com ela, e queria arruiná-lo. Eu queria torná-la menor de
alguma forma.
Ficamos sentados em silêncio até que o garçom veio e
anotou nosso pedido.
— Ele gostaria das panquecas e calda, por favor, — eu
disse, sorrindo para o garçom. — E um pouco de suco de
maçã diluído em água.
— OK. E você?
— Só café, por favor.
— Nada para comer?
— Não, obrigada.
— Coma um pouco, — Michael ordenou, sua voz baixa.
— Não, obrigada, não estou com fome. — A ideia de
tentar engolir uma refeição enquanto Michael estava sentado
à nossa frente me dava vontade de vomitar.
— Só pegue alguma coisa para comer, Emilia.
— Não, eu estou bem, — eu disse, balançando a
cabeça. Atirei ao garçom outro sorriso.
— Eu gostaria das panquecas de morango, — Michael
disse. — Com café.
— Vou trazer imediatamente, — respondeu o garçom
alegremente, afastando-se o mais rápido que pôde.
— Você está falando sério agora? — Mick perguntou,
olhando para mim. — Você não vai comer?
— Eu não estou com fome.
— Então por que viemos para o café da manhã?
— Você e Rhett estão com fome.
— Você está agindo como uma criança.
— Apenas deixe pra lá, — eu resmunguei entre os
dentes. Virei-me para Rhett e apontei para a página de colorir
do cardápio. — Você vai pintar os pneus?
Durante o resto da refeição, Michael e eu mal nos
falamos. Rhett e eu conversamos, e Michael falou com Rhett,
mas era como se houvesse um muro entre nós. Nosso filho
podia sentir a tensão no ar e imediatamente se aconchegou
ao meu lado. Ele mal olhou para Michael. Eu me senti mal
com isso, mas não tinha certeza de como consertar.
No momento em que nos levantamos da mesa e nos
dirigimos para a porta da frente, Michael estava tão tenso que
parecia que a qualquer momento ele se transformaria no
Hulk. Quando ele parou na estação de recepção para falar
com Nova, dei um pequeno aceno, mas continuei
andando. Eu disse a mim mesma que era porque eu não a
conhecia e seria estranho para mim parar, mas a verdade é
que eu estava envergonhada.
Eu estava falando merda quando a garota tinha sido
perfeitamente legal comigo. Não foi meu melhor momento.
— Sem carro, — Rhett choramingou enquanto eu o
colocava de volta na cadeirinha.
— Vamos voltar para a casa do papai, — eu disse,
passando meus dedos por seu cabelo.
— Casa da vovó, — disse ele, olhando para mim.
— Você está certo, — eu disse, balançando a cabeça. Eu
me perguntei quando ele perceberia que era a mesma casa
que visitamos quando chegamos à cidade. — Era minha casa
quando eu era pequena, mas agora é a casa do papai.
— Papai é mau.
— Seu pai não é mau, amigo, — eu disse surpresa. —
Papai é incrível.
— Papai. — Rhett franziu o rosto em uma carranca, e foi
quase surpreendente como ela se parecia com a de Michael.
Suspirei, lutando para encontrar uma maneira de
explicar. Não havia como explicar as nuances de um
relacionamento para uma criança de dois anos.
— Ele não estava sendo mau, — eu disse, afastando o
cabelo de sua testa. — Eu não estava sendo muito legal, e ele
estava apenas se certificando de que eu soubesse disso.
— Mamãe é legal, — Rhett respondeu teimosamente.
— Você é meu melhor amigo, — eu disse, inclinando-me
para beijá-lo. — Você sabe disso, certo?
— Meu melhor amigo, — disse ele, suspirando. Ele
puxou o cobertor contra o rosto e olhou para os pés enquanto
eu fechava a porta entre nós.
— Sabe, talvez fosse melhor se eu e Rhett passássemos
algum tempo sem você, — disse Michael, me assustando
quando me virei para a porta.
Meu estômago revirou. — O que?
— Quando você enfia alguma coisa no seu traseiro, ele
pensa que eu sou o problema, — Michael disse
exasperado. — O que eu entendo porque você é a mãe
dele. Mas você parece ter algo permanentemente preso lá,
então ele nunca vai falar comigo.
— Ele te conheceu ontem.
— E de quem é a culpa? — Michael estalou, sua voz
ficando mais alta.
— Você não vai levá-lo a lugar nenhum, — eu disse com
firmeza, olhando para Rhett através da janela. — Agora
podemos sair do estacionamento ou você quer continuar
dando a todos, incluindo nosso filho, um show?
Sem outra palavra, ele contornou o capô do meu carro e
subiu no banco da frente. Quando me sentei no meu próprio
lugar, minha mente disparou. Eu não sabia como tornar as
coisas mais fáceis entre nós. Se eu queria que Rhett tivesse
um bom relacionamento com o pai, precisava facilitar. Eu
sabia. Mas não tinha certeza de como aliviar a
tensão. Realmente não importava sobre o que estávamos
falando. Sempre havia essa corrente de algo passando pela
conversa. Meu filho não era estúpido e passou seu primeiro
ano e meio morando com meus pais - ele sabia ler a
linguagem corporal e o tom.
Eu não estava mais perto de descobrir o que fazer
quando paramos na frente da minha antiga casa. Casa de
Michael. Eu precisava começar a pensar nisso como a casa
de Michael. Quando tirei Rhett do carro, ele ganiu e se
recusou a andar, e tive de carregá-lo para dentro.
— Ei amigo, — murmurei em seu ouvido enquanto
chutava meus sapatos perto da porta da frente. — Você quer
brincar com seus carros?
— Não.
— Tem certeza? — eu alfinetei. — Você ama carros.
Dei-lhe um aperto quando ele empurrou a testa contra o
meu pescoço.
— OK. — Ele estava tão quieto que quase não o ouvi.
— Vamos, vou pegar seus carros, — eu disse, levando-o
para a sala. Ignorei Michael quando ele foi para a cozinha e
começou a limpar o café que havíamos deixado.
— Aqui está, — eu disse, abrindo sua pequena mochila
para que pudesse despejar os carros no carpete. — Que tal?
— Mamãe brinca? — Rhett perguntou enquanto eu o
colocava de pé.
— Não desta vez, — respondi. — Mas eu já volto, ok?
Ele balbuciou algo que não entendi, mas em menos de
um minuto estava brincando alegremente com os brinquedos.
— Me desculpe pelas coisas que eu disse no
restaurante, — murmurei enquanto caminhava para a
cozinha. — Foi uma merda.
— Nova é esperta como o inferno, — Mick respondeu. —
Ela está economizando para ir para a escola para poder
cortar o cabelo e essas merdas.
— Tenho certeza que ela é, — respondi baixinho
enquanto meu estômago embrulhava. — Ela parecia legal.
— Ela é ótima pra caralho, — disse ele, fechando a
máquina de lavar louça. — E ela não merece pessoas falando
merda, nem mesmo comentários passivo-agressivos sobre o
que ela está fazendo com sua vida.
— Você está certo, — eu disse, me afastando da
janela. — Foi estúpido.
— O engraçado é que você gostaria dela, — disse ele,
encostado no balcão. — Vocês duas são muito parecidas.
Eu realmente não queria ouvir sobre como eu e a bela
mulher da casa de panqueca éramos parecidas,
especialmente porque Michael parecia ser um pouco
defensivo demais com ela.
— Você tem estado estranha a manhã toda, — Michael
disse, me observando de perto. — Está pensando duas vezes
sobre voltar para cá?
— De jeito nenhum, — respondi rapidamente,
balançando a cabeça. Olhei para a sala de estar. Rhett estava
dirigindo carros na beirada do sofá. — Estou feliz por
estarmos aqui.
— Você sabe que eu nunca faria nada para machucá-lo,
certo? — Michael perguntou sério.
— Claro, — respondi apressadamente, virando-me para
olhar para ele.
— Você foi muito rápida em dizer que eu não poderia
ficar sozinho com ele. — Engoli em seco com a acusação em
suas palavras.
— Ele ainda não está pronto para isso.
— Será que ele vai estar pronto?
— Por que você me perguntaria isso?
— Apenas tentando ver onde estamos, — disse ele
categoricamente.
— Acabamos de chegar aqui, Michael, — eu disse,
levantando minhas mãos com as palmas para cima. — Dê a
ele pelo menos alguns dias.
— Eu não estou planejando tirá-lo de você.
Meu corpo inteiro aqueceu e, em seguida, congelou
instantaneamente com as palavras. Talvez fosse ingênuo da
minha parte, ou simplesmente estúpido, mas esse cenário
nem havia me ocorrido. Agora que ele disse isso, eu não
conseguia pensar em mais nada.
Ele tinha uma casa. Um trabalho. Uma família unida
para apoia-lo.
Eu tinha um Subaru surrado cheio até a borda com as
coisas de Rhett e uma mala cheia de roupas.
— Eu sou uma boa mãe, — eu murmurei, dando um
passo para trás em direção à porta. — Eu sou uma mãe
ótima.
— Eu nunca disse que você não era, — ele disse
gentilmente, suas sobrancelhas se juntando em confusão.
— Ninguém jamais o levaria, — eu continuei. — Um juiz
nunca concordaria com isso.
— Um juiz? — Ele deu um passo em minha direção, o
rosto vincado de preocupação. — Do que você está falando,
Emília?
— Acho que provavelmente deveríamos encontrar outro
lugar para ficar, — eu disse, olhando para Rhett novamente.
— Você pode ficar aqui, — respondeu Michael. Levou
apenas dois de seus passos de pernas longas para me
alcançar, e antes que eu pudesse dar um único passo, meu
pulso foi capturado em seu aperto. — O que diabos está
acontecendo nessa sua cabeça?
— Acho que fiz tudo errado, — eu disse com uma
risadinha. A histeria borbulhou dentro de mim, tornando o
som nada alegre. — Nós definitivamente deveríamos ter
algum tipo de plano em prática. Eu não deveria ter invadido
sua vida.
Meus olhos dispararam para Rhett novamente.
— Emilia, — Mick disse rispidamente. Quando não olhei
para ele, ele deu uma pequena sacudida em meu braço.
— Estúpida, — eu murmurei, tentando sorrir como se
não fosse grande coisa. — Acho que estava tão empolgada por
estar de volta que nem pensei na logística, sabe?
— Olhe para mim.
Eu olhei para ele e depois para longe novamente. Eu não
o conhecia, não mais. Meu erro foi assumir que ainda o
fazia. Uma vez, eu sabia tudo sobre ele. Eu era capaz de lê-lo,
antecipar o que ele pensaria e como reagiria. Isso não era
mais o caso. Estúpida. Tão estúpida.
Mick murmurou algo baixinho e depois passou por mim
em direção à sala de estar.
Sem pensar, me joguei na frente dele.
— Que porra? — ele deixou escapar, olhando para mim
em perplexidade.
Levei um segundo para perceber que estava agindo
como uma lunática absoluta. Forcei meu corpo a sair de seu
caminho.
— Rhett, — ele chamou, entrando na sala de estar. —
Você quer ir até a casa da vovó?
— Sim! — Rhett gritou de volta. Ele veio correndo. —
Casa da vovó?
— Sim, — disse Michael, pegando-o. — Vou leva-lo até o
carro, certo?
— Vem, mamãe? — Rhett perguntou preocupado por
cima do ombro de Michael.
— Sim, mamãe, — Michael disse, caminhando em
direção à porta da frente. — Você vem?
Eu os segui para fora de casa e de volta para o meu
carro, então fiquei lá estupidamente enquanto Michael
descobria as fivelas do assento do carro de Rhett.
— Você quer verificar isso? — ele perguntou enquanto
se afastava do caminho. — Não tenho certeza de como apertá-
las.
Balancei a cabeça silenciosamente e apertei os cintos,
inclinando-me para dar um beijo na cabeça de Rhett.
— Brincar lá fora? — Rhett perguntou assim que
estávamos saindo da garagem.
— Vamos ver, amigo, — eu disse, olhando para fora do
para-brisa. Internamente, eu ainda estava em pânico, mas
saber que estávamos indo para a casa dos pais de Michael me
acalmou um pouco. Havia algo naquela casa que fazia tudo
parecer que ia ficar bem. Eu não tinha tempo para analisar
isso.
Quando paramos na frente da casa, a Sra. Hawthorne
saiu para nos cumprimentar.
— Ok, então eu não queria me intrometer, — ela disse,
vindo em direção ao carro enquanto descíamos. — Mas eu
realmente esperava que vocês voltassem hoje.
— Rhett pode ficar com você por um tempo? — Michael
perguntou, fazendo-me estremecer de surpresa. Achei que
íamos todos ficar com a família dele.
— Sempre, — Sra. Hawthorne respondeu facilmente. Ela
olhou para mim. — Contanto que esteja tudo bem para
Emilia?
— Mamãe, sai! — Rhett chamou de seu assento. Eu
hesitei.
— Ele vai ficar bem aqui por um tempo, — Michael me
disse por cima do teto do carro. — Relaxe.
O pânico dentro de mim diminuiu um pouco, mas
apenas o suficiente para que a raiva tomasse seu lugar.
— Você pensaria que com uma mãe como a sua, saberia
aos vinte e quatro anos a não dizer a uma mulher para
relaxar.
— Movimento de novato, — a Sra. Hawthorne
concordou. — Mas ele estará totalmente seguro conosco,
Em. Você sabe disso.
Abri a porta de trás e me inclinei para falar com Rhett.
— Ei, você quer ficar aqui um pouco para que eu e seu
pai possamos fazer alguma coisa?
— Mamãe vai? — Rhett perguntou inquieto.
— Só um pouquinho, — repeti. — Aposto que a vovó vai
te dar um lanche se você pedir, e você pode brincar lá fora.
— Tudo bem, — Rhett murmurou, inseguro.
— Estaremos de volta daqui a pouco, — eu assegurei a
ele enquanto desafivelava seu assento.
— Ei, Rhett! — Sra. Hawthorne disse alegremente
enquanto eu o ajudava a sair do carro. — Eu estava
pensando em fazer alguns biscoitos ou cupcakes ou algo
assim. Quer me ajudar?
— Biscoitos? — Rhett disse, olhando para mim
enquanto eu o colocava de pé.
— Coma todos os biscoitos que quiser, — eu disse com
uma risada. — Vá em frente. Divirta-se.
Ele beijou meu braço antes de correr para sua avó.
— Estaremos de volta em alguns minutos, — Michael
disse a sua mãe enquanto subia de volta no carro.
— Estaremos aqui, — disse a Sra. Hawthorne para
mim. — Sem planos hoje, exceto fazer algumas guloseimas.
Observei enquanto ela levava Rhett para dentro de casa
antes de voltar para o carro.
— Isso foi besteira, — eu disse baixinho quando Michael
virou na garagem. — Você me emboscou.
— Você poderia ter dito não.
— Não sem ferir os sentimentos de sua mãe.
— Precisávamos de um minuto sem Rhett e agora
conseguimos.
Eu não respondi. Eu me sentia nua sem Rhett. Como se
tivesse esquecido alguma coisa. Provavelmente não era
saudável, mas eu estava acostumada com ele sempre
comigo. Partir sem ele fez meu estômago revirar de náusea.
— Onde você está indo? — Eu perguntei desconfiada
enquanto descíamos uma estrada rural familiar.
— Em algum lugar onde não seremos interrompidos, —
Michael disse calmamente.
Cruzei os braços sobre o peito, sem acreditar que ele iria
para onde eu pensava. Quando paramos no portão do
complexo Aces Motorcycle Club, eu o encarei.
Mick abaixou a janela e acenou com a cabeça, e o
prospecto no portão o abriu sem dizer uma palavra,
deixando-nos passar.
— Você deve estar brincando comigo, — eu murmurei
baixinho.
O caminho que ele tomou estava coberto de ervas
daninhas e arbustos de amora, mas passamos tempo
suficiente esculpindo-o no colégio para que ainda fosse
transitável. Quanto mais perto chegávamos do nosso lugar,
mais impaciente eu ficava e quando ele parou, eu já estava
desafivelando meu cinto de segurança. Eu pulei para fora do
carro e bati a porta, raiva e descrença correndo por mim.
— Por que diabos você achou que deveríamos vir aqui?
— Eu perguntei enquanto ele calmamente saía do lado do
motorista.
— Nunca fui interrompido aqui antes. Achei que não
seríamos hoje.
— Parecia uma viagem pela estrada da memória? — Eu
perguntei duvidosamente, puxando meu capuz para cima
quando começou a chover. — Tenho certeza de que Rhett foi
concebido aqui.
— Na parte de trás da minha caminhonete, — Mick
respondeu, contornando o carro. — Sim, eu me lembro.
— Eu quero voltar para a casa dos seus pais, — eu
disse, mantendo minha posição enquanto ele se
aproximava. — Agora mesmo.
— Vamos resolver algumas coisas primeiro.
— Não há nada para resolver neste momento, —
argumentei.
— Achei que você queria colocar um plano em prática,
— disse ele facilmente, chegando perto. — Vamos planejar.
— Eu não posso planejar aqui, — eu respondi
desesperadamente, olhando para qualquer lugar menos para
ele.
A floresta era tão familiar. Gravamos nossas malditas
iniciais na árvore a menos de três metros do meu para-
choque dianteiro, colhemos amoras frescas nos arbustos,
fomos picados por um milhão de mosquitos.
— Emília, acalme-se.
— Você se acalme, — eu argumentei sem sentido.
Era demais. As lembranças eram demais. O frio na
barriga, o medo de ser pega, a alegria quando não
éramos. Naquela época, eu não tinha percebido o quão
grandes seriam as consequências de nossos pequenos
encontros.
— Doçura, — Mick disse exasperado, pegando minha
cabeça entre as palmas das mãos. — Olhe para mim.
— O que? — Eu disparei.
— O que diabos está acontecendo com você agora?
— Nada.
— Você começou a perder a cabeça na minha casa, e
não parece estar diminuindo.
— Então você me traz para o local que você sabe que vai
piorar? — eu cuspi. — Jesus.
— Não achei que poderia ficar pior, — ele respondeu,
inclinando-se para que nossos rostos ficassem próximos. —
Não consigo entender o que está acontecendo, então estou
jogando merda na parede para ver o que gruda.
— Eu deveria ter feito isso direito, — eu disse
rapidamente, olhando para seus olhos castanhos quentes. —
Eu não deveria ter aparecido. Eu deveria ter ligado primeiro,
e poderíamos ter nos encontrado para um café ou algo assim,
e então eu poderia ter contado a você sobre Rhett, e
poderíamos ter bolado um plano para você conhecê-lo e
passar um tempo com ele, e então nós poderia ter planejado
visitas e festas do pijama e...
— Devagar, — ele murmurou baixinho, seus polegares
acariciando o cabelo nas minhas têmporas.
— Eu vim para cá e desestabilizei sua vida.
— Gostaria que você tivesse feito isso antes.
— Eu não tinha um plano de como isso deveria ser, —
eu disse, quase em transe. — Que eu teria que apenas... —
Eu balancei minha cabeça, minha respiração acelerando. —
Apenas dá-lo a você.
— Do que diabos você está falando? — ele perguntou
incrédulo.
— Ele nunca passou uma noite sem mim, — eu
murmurei, o pensamento me fazendo tremer. — Mas ele terá
que ir com você. Você merece esse tempo com ele. Eu sei
disso. Só não pensei direito, sabe? Eu só... acho que não vi
um futuro em que não estivéssemos todos juntos.
O rosto de Mick perdeu toda a expressão quando ele
recuou surpreso.
— Foda-se, — eu sussurrei, o sangue drenando do meu
rosto. — Esqueça que eu disse isso.
— O quê, você apenas pensou que voltaria para cá e
começaríamos de onde paramos? — ele perguntou incrédulo,
suas mãos apertando meu cabelo.
— Não, — eu voltei atrás. — Isso não foi o que eu quis
dizer.
— Foi o que você disse.
— Não, não foi. — Eu puxei contra seu aperto, mas ele
não me soltou. —Eu simplesmente não planejei com
antecedência.
— Você pensou que voltaria e seríamos uma pequena
família feliz? — ele rosnou. — Depois de três malditos anos?
— Isso não foi... — eu gaguejei. — Não, não foi isso que
eu quis dizer.
— Pelo que você sabia, eu poderia estar casado, porra,
— ele continuou, sua voz ainda misturada com
perplexidade. — Ou um maldito viciado. Ou fodendo meu
caminho através do condado. Eu poderia ser um completo
pedaço de merda. Você nem me conhece mais.
— Eu te conheço, — eu sussurrei, observando seus
cílios longos e a cicatriz em sua testa que ele ganhou ao bater
a cabeça na varanda da frente de seus pais quando tínhamos
oito anos. A sarda na lateral do nariz dele era tão familiar
quanto meu próprio rosto, eu a beijei tantas vezes. — Eu
sempre saberei exatamente quem você é.
— Jesus, Emilia, — ele sussurrou, sua cabeça caiu para
frente. Um segundo depois, estremeci de surpresa quando
seus lábios encontraram os meus.
Eu quase me afastei para perguntar o que diabos
estávamos fazendo, mas o pensamento de perder seus dedos
no meu cabelo e sua língua correndo pelo meu lábio inferior
me manteve em silêncio. Eu sonhei que o teria de volta
assim, que o sentiria contra mim em algum momento, algum
dia, mas a fantasia não tinha nada da vida real. Era muito
melhor. Cada sentido foi intensificado quando uma mão
deixou meu cabelo e deslizou pelo meu corpo, pressionando
entre minhas omoplatas, correndo firmemente pela parte de
trás da minha calça jeans e finalmente segurando minha
bunda com força.
Levou apenas um momento para eu perceber o que ele
queria, e passei meus braços em volta de seus ombros e
pulei, envolvendo minhas pernas em volta de sua
cintura. Minhas costas bateram na lateral do Subaru com um
baque. Usando seus quadris para me prender no lugar, as
mãos de Micky começaram a vagar. Engoli em seco contra
sua boca quando suas mãos deslizaram sob meu moletom,
seus longos dedos encontrando seu caminho ao longo de
cada costela até que seus polegares deslizassem sobre meus
mamilos.
Depois disso, não havia como nos parar. Era inevitável,
realmente. Não importa quantos anos tínhamos ou quanto
tempo fazia desde que nos vimos, fomos atraídos como um
par de ímãs. A centelha que iniciou nossa amizade quando
crianças e se transformou em mais quando adolescentes
ainda estava lá, sempre fervendo logo abaixo da
superfície. Bastou um olhar, um argumento, um toque, e
aquela faísca explodiu em chamas. Nós nem percebemos
quando a chuva passou de chuvisco para aguaceiro.
Ele tirou meu moletom, minha regata, meu
sutiã. Rasguei seu colete de couro, flanela e a camiseta por
baixo. Seus dedos não hesitaram ou se atrapalharam quando
ele desabotoou e abriu o zíper da minha calça jeans.
Eu deveria ter previsto isso. Talvez então, não teria
ficado surpreso ao me encontrar de bunda nua, exceto por
minhas meias e tênis no meio da floresta, encharcada da
chuva, sendo fodida contra a lateral do meu carro.
— Puta merda, — eu ofeguei, minhas unhas cravando
nas costas de Mick enquanto ele deslizava para dentro.
Suas mãos agarraram minhas coxas, segurando-me no
lugar como se não fosse nada, e quando ele puxava e
empurrava de volta, ele as usou para mover meu corpo
apenas uma fração. A ligeira mudança de posição quando ele
empurrou fez meus olhos lacrimejarem e minha boca se abrir
em estado de choque. Eu não sabia onde ele havia aprendido
esse truque e não queria saber - só queria que ele
continuasse fazendo isso.
— Maldição, — ele sussurrou, com o rosto no meu
pescoço. — Foda-se, Emília.
Deixando minha cabeça cair para trás contra o carro, eu
apertei meus braços em volta de seu pescoço, cravei meus
dedos em suas costas, fechei meus olhos e deixei a chuva
escorrer pelo meu rosto enquanto ele empurrava uma e outra
vez, seu pau batendo exatamente no mesmo lugar, no ponto
certo. Minutos depois, gozei com um gemido alto que não
poderia conter nem se tentasse. Parecia ecoar ao nosso redor
enquanto ele congelava e se movia contra mim, encontrando
sua própria liberação.
Quase imediatamente depois, ainda enrolados um no
outro e ofegando pesadamente, nós dois endurecemos
quando a realidade se estabeleceu.
Minhas pernas estavam rígidas e doloridas quando ele
gentilmente me colocou de volta em meus pés, e eu estava
perfeitamente ciente de como estava frio quando peguei
minha roupa agora encharcada. Estremeci quando me afastei
do carro e comecei a me vestir.
— Essa foi uma porra de uma péssima ideia, — Mick
disse, endireitando seu jeans e boxer.
Em nossa pressa, ele nem os havia tirado totalmente,
apenas deixou cair em torno de suas coxas. Por alguma
razão, fiquei envergonhada como o inferno por estar
totalmente nua. Virei as costas para ele enquanto tentava
fechar meu sutiã. Meus dedos estavam dormentes de frio, e
lutei contra eles até que mãos quentes afastaram as minhas e
os apertaram para mim.
— Obrigada, — eu murmurei, arrastando minha regata
gelada.
— Você está protegida?
Levei um momento para entender o que ele estava
perguntando. — Sim, eu uso um DIU.
— Graças a Deus, — ele murmurou, pegando meu
moletom do chão. — Aqui... estava debaixo da minha flanela.
Vesti o moletom, grata por estar um pouco protegido da
chuva e não estar tão úmido quanto todo o resto. Enfiei
minha calcinha no bolso da calça jeans, grata por ela ser
folgada e poder puxar o tecido úmido por cima dos sapatos e
subir pelas pernas.
— Então, hum... — murmurei, olhando para qualquer
lugar, menos diretamente para ele. Era insano quão
desconfortável eu estava enquanto ainda sentia os efeitos
prolongados do orgasmo que tinha acabado de ter.
— Entre no carro, — ele ordenou, não
indelicadamente. Ele abriu a porta para mim e a fechou
novamente quando eu estava segura lá dentro.
Afastei o cabelo do rosto enquanto o observava correr ao
redor do capô, depois sequei o rosto com as mangas do
moletom, me escondendo, enquanto ele subia no banco do
motorista.
Ficamos em silêncio enquanto ele ligava o motor e o
aquecedor no máximo.
Se havia algo mais desconfortável do que sentar em um
carro esquentando rapidamente enquanto usava roupas que
estavam úmidas o tempo todo, eu não conseguia pensar
nisso. Tudo grudou, e meu jeans rangeu quando me mexi no
assento.
— Eu não vou tirá-lo de você, — Michael disse baixinho,
sua voz no carro silencioso me assustando.
— O que?
— Eu não vou levá-lo, — disse ele, olhando para o para-
brisa embaçado. — Eu nunca faria isso.
— Foi uma má escolha de palavras, — respondi
baixinho. — Eu sei que você não vai.
— Eu sei que ele não está pronto para ficar comigo,
especialmente durante a noite, — ele disse. — Você é a mãe
dele. Ele não quer ficar sem você.
— Obrigada, — eu disse com um suspiro, inclinando
minha cabeça para trás contra o assento. — Me desculpe, eu
me apavorei.
— Me desculpe, minha reação ao seu surto foi bater com
você contra a lateral do seu carro, — ele murmurou.
Eu lati uma risada surpresa enquanto ele esfregava as
mãos sobre o rosto.
— Fui uma participante voluntária, — eu disse com
tristeza. — Não foi minha decisão mais inteligente.
— Foi uma jogada realmente idiota, — Mick disse,
envolvendo suas mãos firmemente ao redor do volante.
Eu concordava com ele cem por cento, mas as palavras
ainda doíam. Cruzei os braços sobre o peito, sentindo ainda
mais frio do que antes.
— Nós temos um monte de merda para resolver, — ele
continuou. — Sexo só vai confundir as coisas.
— Você tem razão.
— Eu tenho?
— Você achou que eu ia discutir? — Eu perguntei com
uma risada oca. — Não nos vemos desde o verão depois do
colégio, e temos um filho. Não tenho nem emprego nem lugar
para morar. — Eu balancei minha cabeça.
— Você pode ficar comigo o tempo que precisar, — ele
respondeu imediatamente. — Não se preocupe com isso.
— Eu tenho que resolver as coisas, — respondi. — Eu
trabalhei muito duro para ficar de pé com meus próprios pés.
Michael ficou quieto por um tempo antes de falar
novamente. — Você sabe que tipo de trabalho quer
conseguir? — ele perguntou, virando-se para olhar para
mim. — Onde você trabalhou antes?
Levou tudo dentro de mim para não mostrar qualquer
reação à pergunta enquanto as memórias da noite em que
larguei meu emprego passaram pela minha mente. Eu
estremeci.
Não havia nenhuma razão para Michael saber sobre
essa parte da minha vida. Não significava nada agora. Menos
do que nada.
— Eu fui garçonete por um tempo, — eu disse,
mantendo minha voz calma. — Então provavelmente poderia
fazer isso. Ou uma recepcionista em algum lugar? Talvez
varejo ou uma cafeteria? Não sei. Aceito qualquer coisa, sério.
— Você já pensou em voltar a estudar? — ele perguntou
baixinho.
Eu sorri melancolicamente. — Acho que isso não está
nas cartas, não até Rhett ficar mais velho, pelo menos.
— Por que diabos não?
— Porque eu tenho que trabalhar, — respondi com uma
risada. — Entre trabalhar e passar tempo com Rhett, meus
dias serão completamente preenchidos. Sei que parece
dramático, mas é verdade.
— E se você não tivesse que trabalhar? — Michael
perguntou.
Antes que eu pudesse responder, gritei de surpresa
quando o contorno de uma pessoa apareceu do lado de fora
da janela de Michael.
Capitulo 6

MICHAEL
Quando os olhos de Emilia se arregalaram, seu olhar
apontado para cima do meu ombro, eu imediatamente
estendi a mão para a parte inferior das minhas
costas. Quando ela gritou, eu já estava me virando, sacando
a pistola do coldre. Fiz uma pausa, minha mão ainda atrás de
mim quando percebi quem estava fora do carro.
— Foda-se, — murmurei, guardando a pistola
novamente enquanto abria a janela.
— Não esperava encontra-los aqui novamente, — meu
avô disse, um meio sorriso puxando seus lábios. — Você não
tem uma casa onde poderia estar brincando?
— Por que diabos você está aqui na chuva? — Olhei ao
redor da clareira. — A pé?
— Caminhada diária, — ele respondeu inocentemente.
— Uh-huh.
— Sua avó me pega se eu não fizer meus exercícios.
— Você está em melhor forma do que eu, — respondi
categoricamente.
— Ei, garota Emmy, — ele disse, ignorando meu
comentário enquanto se inclinava na minha janela. — Como
você está, querida?
— Eu estou bem Sr....
Vovô a cortou com um bufo.
— Estou bem, vovô, — ela emendou.
— Traga aquele meu neto hoje à noite, — ele ordenou,
apontando para ela. — Sem desculpas. Estou aqui há dois
malditos dias e ainda não conhecemos.
— Eles chegaram aqui ontem, — eu corrigi.
— Isso mesmo, — respondeu ele, endireitando-se. —
Hoje e ontem.
— Nós vamos trazê-lo.
— Com certeza, você vai, — disse ele, olhando para
mim. — E pare de bater na garota na chuva. Você é velho
demais para essa merda. Você tem uma cama, use-a.
— Eu não estava... — eu gaguejei.
Vovô apenas levantou uma sobrancelha.
— Entendido, — eu murmurei.
— Vejo vocês hoje à noite, — ele disse enquanto recuava
um passo. — Vovó fará o jantar. Tchau, Em.
— Tchau, vovô, — Emilia disse enquanto ele se afastava.
— Velho intrometido, — murmurei enquanto abria a
janela.
— Não acredito que isso acabou de acontecer, — Emilia
gemeu de vergonha, puxando o moletom para cima até cobrir
tudo abaixo de seus olhos. —Como ele sabia onde
estávamos?
Comecei a rir quando coloquei o carro em marcha à ré e
virei, e quando estávamos voltando para o portão da frente,
eu estava rindo muito. Jesus, é claro que ele foi até lá para
me dar merda. Claro que ele o fez.
— O que? — Emilia perguntou, olhando para mim como
se eu fosse louco. — O que? Por que você está rindo?
— Eles sempre sabiam onde estávamos, — eu disse a ela
entre risos. — Cada maldita vez.
— O que? — ela gritou.
— Não era um segredo, — respondi, olhando para ela. —
Você tinha que saber disso.
— Eu não sabia disso, — ela respondeu, deixando o
moletom cair de seu rosto. — O que você quer dizer, não era
um segredo?
— Todos os meninos sabiam onde estávamos e
exatamente o que estávamos fazendo, — eu disse, acenando
para o prospecto enquanto ele abria o portão para nós. —
Inferno, eles costumavam jogar preservativos em mim
diariamente.
— Você contou a eles? — ela perguntou incrédula,
batendo no meu ombro. — Nojento!
— Claro que não contei a eles, — respondi, pegando a
mão dela. Esfreguei meu polegar na parte de trás sem pensar,
então deixei cair como um carvão em brasa quando percebi o
que estava fazendo. — Eles sabiam. Estacionávamos no meio
do nada pelo menos uma vez por semana. Você achou que
eles não descobririam?
— Achei que ninguém estava prestando atenção, — ela
disse bruscamente.
— Os prospectos abriam o portão para nós todas as
vezes, — eu disse, olhando para ela para ver se estava
falando sério. Ela estava carrancuda para mim como se eu
tivesse chutado seu cachorro.
— Ninguém nunca disse nada, — disse ela com
ceticismo.
— Não para você, não, — eu concordei. — Eles tinham
todo tipo de merda para me dizer, no entanto.
— Seus pais sabiam? — ela sussurrou horrorizada.
— Tenho certeza que minha mãe suspeitava, — eu
respondi, soltando uma risada enquanto ela gemia. — Papai
definitivamente sabia.
— Oh meu Deus, — ela sussurrou.
— Emilia, nós temos um filho, — eu a lembrei. — Eles
sabiam que estávamos fazendo sexo naquela época.
— Isso não significa que eles precisam saber detalhes!
— Calma, — eu disse, quase estendendo a mão para
ela. Em vez disso, apertei minhas mãos no volante. — Eles
sabiam que estávamos fodendo. Não é como se soubessem
que você gostava dos seus mamilos beliscados, pelo amor de
Deus.
— Isso foi desnecessário, — ela sibilou.
— O que? — Eu perguntei inocentemente. — Você
gostava, não é?
— Você não quer saber, — ela estalou.
— Se eu estendesse a mão e deslizasse minha mão pelo
seu moletom...
— Vou pará-lo bem aí.
— Duvido que você iria, — eu disse baixinho.
— Eu não posso dizer se você está flertando ou sendo
um idiota agora, — ela bufou. — Mas pare com isso.
O mais louco era que eu também não tinha
certeza. Parte de mim estava apenas tentando provocá-la,
mas até mesmo dizer as palavras em voz alta fez minhas
mãos coçarem para prosseguir. Mesmo sabendo que era
completamente insano, eu a queria de novo.
Ficamos quietos pelo resto da viagem, mas quando
paramos na frente da casa dos meus pais, percebi que
realmente não havíamos resolvido nada. Eu a levei para o
nosso antigo local para resolver as coisas e, em vez disso, a
situação ficou ainda mais fodida. Trocadilho intencional.
— Em, espere, — eu disse, agarrando seu braço
enquanto ela se estendia para a porta. Ela me olhou
surpresa.
— Vamos apenas seguir em frente,— eu disse
impulsivamente.
— Seguir o quê?
— Você e Rhett morando comigo, — eu disse, soltando o
braço dela. — Não precisamos ter todas as respostas
agora. Vamos apenas seguir em frente. Você pode encontrar
um emprego, e nós descobriremos isso à medida que
avançamos.
— Essa é provavelmente uma péssima ideia.
Eu sabia que era. Com certeza era. Eu já podia sentir a
atração dela, o jeito que ela facilmente se enterrava sob
minha pele. Jesus, eu a fodi no maldito complexo, embora
soubesse que todos os irmãos saberiam disso no final do
dia. Eu poderia tê-la levado de volta para casa para
conversar, dar uma volta, qualquer coisa, mas em vez disso a
levei para o nosso lugar. Jesus, o que havia de errado
comigo?
Era tão fodido, e eu não entendia, mas não importa o
quão zangado e ressentido estivesse, ainda a queria o mais
perto possível.
— Você está certa, — eu disse finalmente. — Você tem
uma ideia melhor?
Observei as expressões em seu rosto. Surpresa,
preocupação, melancolia e, finalmente, teimosia.
— Então, vamos ficar com você enquanto procuro um
emprego? — ela perguntou, soltando a maçaneta da porta. —
Quanto você quer de aluguel?
— Sim, — eu respondi, meus lábios se contraindo. — E
não vou aceitar dinheiro de você.
— Eu... — Sua boca se fechou, e ela apenas olhou para
mim. Ela suspirou. — Embora meu orgulho realmente queira
dizer que não posso morar na sua casa sem pagar aluguel,
minha sanidade sabe que isso seria uma dádiva de Deus.
— Bom, porque eu não aceitaria isso de você de
qualquer maneira.
— E sem tocar, certo?
— Nós não vamos resolver nada se estivermos turvando
as águas, — eu concordei.
— OK.
— Sim?
— Vamos ficar com você por um tempo, — disse ela,
balançando a cabeça. Ela parou por um momento, olhando
para suas mãos. — Obrigada, Michael.
Ela estendeu a mão para a maçaneta da porta
novamente, e estava na metade do caminho para fora do
carro antes que eu falasse.
— Mesmo se você não tivesse Rhett, — eu disse, incapaz
de deixar as palavras não serem ditas. — Você nunca seria
uma sem-teto, Em. Eu sempre teria um lugar para você.
Ela se virou para olhar para mim, seus olhos brilhando
e sua boca tremendo. Foi uma loucura, porque menos de um
segundo depois, aquela expressão de olhos brilhantes se foi e
em seu lugar havia um sorriso fácil.
— Idem.
Ela caminhou em direção à casa e eu a segui
lentamente, sem pressa, saindo do carro e seguindo pela
entrada da garagem.
Emilia foi tudo o que eu tinha imaginado e muito
mais. Ela estava menos musculosa do que antes e seus seios
eram menores, mas ela ainda era a mesma garota por quem
me apaixonei anos atrás. Sua pele ainda era tão lisa quanto o
cetim do cobertor que eu carregava quando criança, e quando
a fodi em pé, seus sapatos ainda cravaram em minhas costas
exatamente no mesmo lugar na parte inferior das minhas
costas. Seu estômago não era tão plano, e ela trocou o
abdome definido que tinha antes por uma pequena pochete
que imaginei ser uma sobra por carregar Rhett, mas
gostei. Eu respirei fundo e balancei a cabeça enquanto me
lembrava de como sua boceta estava molhada e confortável -
isso não mudou nada.
Tinha que parar de pensar nela como parceira sexual e
começar a pensar nela como colega de quarto e mãe do meu
filho. Se eu não o fizesse, estaríamos seriamente ferrados.
Não importava o quão bem parecíamos na cama - ela
havia fugido sem dizer uma palavra e ficou fora por três
anos. Ela manteve meu filho em segredo por todo esse
tempo. Foi por causa dela que perdi os dois primeiros anos de
sua vida, seus primeiros passos, suas primeiras palavras, seu
primeiro tudo. Senti uma raiva muito familiar crescer dentro
de mim enquanto listava mentalmente todas as coisas que ela
tinha escondido de mim e parei na varanda, parando por um
momento para contar até dez.
Se fôssemos fazer qualquer tipo de relacionamento
funcionar, tinha que ser platônico. Qualquer coisa além disso
era impossível. Eu precisava manter meu pau nas calças,
pelo amor de Deus.
— Você não está com frio aqui fora? — meu irmão Titus
perguntou enquanto abria a porta da frente. Ele deu um
arrepio dramático. — Parece que você foi pego na chuva.
— Cala a boca, idiota, — eu disse, começando a avançar
novamente.
— Emilia parece ter sido pega pela mesma chuva, — ele
disse com uma risada, esquivando-se enquanto eu tentava
bater na lateral de sua cabeça.
— Nós estávamos conversando, — eu murmurei
enquanto o empurrava para fora do meu caminho. Ele me
seguiu até a sala como um cachorrinho ansioso demais.
— Sério? — ele disse, olhando para Emilia, que havia
tirado o moletom e estava agachada beijando Rhett no topo
da cabeça. — Como a camisa de Emilia está virada do
avesso?
— O que? — Emilia disse, olhando para si mesma
enquanto Rhett corria de volta para onde minha mãe estava
sentada entre o sofá e a mesa de centro. — Ah Merda.
Titus riu alto e correu enquanto eu o agarrava.
— Vocês dois nunca são tão espertos quanto acham que
são, — minha mãe disse secamente enquanto reorganizava as
pequenas peças do quebra-cabeça de madeira na mesa na
frente dela. — Eu não sei por que ainda tentam.
— Devo ter colocado do avesso esta manhã, — Emilia
disse tão baixinho que quase não ouvi. — Ops.
Eu nem falei. Não havia como convencer minha mãe de
que não estávamos brincando, não com o rosto de Emilia
vermelho como um tomate.
— Resolveram as coisas? — Mamãe perguntou, olhando
para mim.
— Eles vão ficar comigo por um tempo, — respondi.
— Aposto que sim, — mamãe disse conscientemente.
— Até que eu encontre um emprego e consigamos nossa
própria casa, — Emilia acrescentou rapidamente, sorrindo
para Rhett. — Eu provavelmente deveria começar a busca
hoje à noite.
— Que tipo de trabalho você está procurando? — minha
mãe perguntou, apontando para Rhett onde uma peça do
quebra-cabeça deveria ficar.
— Qualquer coisa realmente, — disse Emilia, vestindo o
moletom de volta. — Varejo ou garçonete ou qualquer outra
coisa. Algo que pague as contas.
Minha mãe cantarolou. — Você já fez café?
— Todas as manhãs, — Emilia respondeu secamente.
— Eu quis dizer café expresso. — Mamãe riu. — Charlie
está sempre procurando por baristas. Aposto que você
conseguiria um emprego lá.
— Não preciso de favores. — Emilia sorriu
desconfortavelmente.
— Sem favor, — minha mãe disse facilmente. — Eu não
estava brincando quando disse que ela está sempre
procurando. Eu juro que o volume de negócios é uma merda
em seus carrinhos. Ela está sempre contratando.
— Eu nunca trabalhei como barista, — Emilia
respondeu, arregalando os olhos para mim como se quisesse
que eu dissesse alguma coisa. Eu não tinha certeza do que
exatamente ela estava esperando. Minha prima Charlie
estava sempre procurando ajuda e eu sabia que o pagamento
era bom. Nada espetacular, mas acima do normal. Ela
poderia fazer pior.
— Ela vai treina-la. Eu ligo para ela mais tarde, —
minha mãe disse, voltando para o quebra-cabeça. — Ver o
que ela tem.
— Tudo bem, — Emilia disse fracamente quando ela se
sentou na poltrona do meu pai.
— Vocês dois vêm jantar hoje à noite? — minha mãe
perguntou.
— Jantar? — Rhett perguntou.
— Não posso, mãe, — respondi ao mesmo tempo. — O
vovô nos convidou. — Os lábios de mamãe se contraíram
como se ela estivesse segurando um sorriso.
— Você já sabia disso.
— Sua avó me ligou, — ela disse com uma risada. — Só
queria saber se você me diria que Asa pegou vocês dois
brincando no carro de Em.
— Asa? — perguntou Emília.
— Grease, — eu esclareci. — Vovô. Ela o chama de Asa
para incomodá-lo.
— É o nome dele, — minha mãe disse com um encolher
de ombros.
— Ah, certo, — disse Emilia, percebendo. — Você
recebeu o nome dele.
— Sim. — Eu olhei de volta para minha mãe.
— Não estávamos brincando de nada.
— Não foi isso que o velho disse a Rose.
— Jesus Cristo, — eu murmurei.
— Palavra ruim, — disse Rhett horrorizado, virando-se
para olhar para mim.
— Ele é um adulto, Rhett, — Emilia saltou. — Ele pode
usar as palavras que quiser.
— Palavra ruim, — Rhett repetiu, ainda olhando para
mim.
— Desculpe, amigo, — respondi. — Não direi mais.
— Boa sorte com isso, — minha mãe murmurou.
— A, — Rhett anunciou, pegando uma peça do quebra-
cabeça J.
— Isso é um J, querido, — minha mãe corrigiu
gentilmente.
— Ainda não começamos a trabalhar nas letras, —
confessou Emilia, envergonhada. — Eu provavelmente
deveria encontrar uma pré-escola ou algo assim.
— Vou perguntar para onde Kara e Draco enviaram
suas garotas, — mamãe respondeu. — E podemos inscrevê-lo
assim que tiver idade suficiente.
— Devagar, Heather, — eu disse imediatamente, fazendo
minha mãe endurecer. — Vamos encontrar uma pré-escola
para Rhett e cuidar disso nós mesmos. Ele tem dois anos. Ele
não precisa saber as letras ainda. Tenho certeza que Rumi
ainda não falava nada com nada aos dois.
— Está tudo bem, Michael, — Emilia disse
calmamente. — Ela está apenas tentando ajudar.
Olhei para Emilia, que ainda parecia envergonhada, e
depois para minha mãe.
—Claro, — minha mãe disse arrependida. — Embora
Rumi tenha sido indiscutivelmente o menos inteligente de
vocês cinco. Eu não queria passar dos limites.
— Sabemos disso — disse Emilia rapidamente.
— Apenas deixe-nos resolver, sim? — Eu perguntei,
estendendo a mão para puxar o rabo de cavalo da minha
mãe. — E vou dizer a Rum que você disse isso.
— Desculpe, querido, — ela disse com um meio
sorriso. — Rumi me chamou de velha ontem - você pode dizer
a ele o que quiser.
— Está tudo bem... — A boca de Emilia se fechou
quando eu lancei a ela um olhar para esfriá-la.
— Eu posso mandar uma mensagem para Kara, — eu
disse a minha mãe. — Ver que escola eles usaram.
— Só sei que eles gostaram muito, — disse minha mãe,
relaxando os ombros.
Ficamos na sala, conversando enquanto Rhett e minha
mãe faziam o mesmo quebra-cabeça do alfabeto pelo menos
quatro vezes. Era fácil e muito aconchegante, e depois de um
tempo senti meu corpo relaxando no sofá enquanto cochilava.
— Papai. — Uma mãozinha tocou meu joelho. — Papai!
— E aí? — Eu perguntei, meus olhos se
abrindo. Merda, eu era o papai.
— Hora de ir.
— Oh sim? — perguntei, observando Rhett puxar o
cobertor contra o rosto. — É hora de ir?
— Sim.
— Você está pronto para voltar para a casa? — Eu
perguntei enquanto ele se inclinava contra o meu joelho.
— Vovó cansada.
— A vovó está cansada?
— Sim, — ele murmurou, inclinando-se mais fortemente
contra o meu joelho. Eu não achava que era minha mãe que
estava cansada.
— Onde foi sua mãe? — Eu perguntei curiosamente.
— Quarto da vovó.
— Eu me pergunto o que elas estão fazendo, — eu disse,
estendendo a mão para colocá-lo no meu colo. Não fui
devagar nem nada do tipo, mas fiquei hiper vigilante ao pegá-
lo, certificando-me de que ele não se importasse.
Meu peito parecia que ia estourar os botões da minha
flanela quando ele se enrolou em um ponto de interrogação
contra mim, com a cabeça no meu ombro.
— Não sei, — ele respondeu sonolento.
— Você teve um dia divertido? — Eu perguntei,
esfregando suas costas suavemente. Ele era um garoto tão
robusto, pesado e sólido, que quando você olhava para ele era
fácil esquecer o quão pequeno realmente era. Segurá-lo,
porém, trouxe de volta o quão frágil seu pequeno corpo
era. Eu podia sentir as pequenas protuberâncias de sua
coluna, a ponta afiada de seu cotovelo contra meu esterno,
seus dedos em miniatura curvados contra minha coxa. Uma
onda de proteção atingiu tão forte e rápido que meu coração
começou a acelerar, e eu passei meu braço em torno dele,
puxando-o para perto.
— Eu fiz biscoitos, — respondeu Rhett, coçando o nariz.
— Oh sim?
— Biscoitos de açúcar.
— Eu amo biscoitos de açúcar.
— Sem gotas, — disse Rhett com um bocejo.
Eu ri. — Sim, vovó sempre fica sem gotas de chocolate.
— Vocês estão prontos para ir? — Emilia perguntou,
vindo atrás de mim. Ela passou por cima da minha cabeça
para passar os dedos pelo cabelo de Rhett e eu
instintivamente puxei o cheiro dela para os meus
pulmões. Jesus, eu precisava colocar minha cabeça no lugar.
— Tudo feito com a minha mãe? — Eu perguntei,
inclinando minha cabeça para trás para olhar para ela.
— Sim, — disse ela, caminhando até a porta para
colocar os sapatos. — Ela só tinha algumas fotos que queria
me mostrar.
— Ela tem o suficiente, — respondi, carregando Rhett
comigo enquanto me levantava. — Vou apenas carregá-lo até
o carro.
Emilia olhou para mim e depois para Rhett. — Isso
funciona, — disse ela com um sorriso. — Então não preciso
calçar os sapatos dele.
— Vocês estão saindo? — minha mãe perguntou.
— Sim. — Eu me virei para olhar para ela. — Disse para
Rhett te chamar de vovó, hein?
— Ele estava ficando meio confuso, eu acho, — ela
respondeu, olhando como se desculpando para Emilia. —
Duas avós, você sabe.
— Vovó é perfeito — Emilia disse baixinho.
— Obrigada. — Mamãe apertou o ombro de Emilia.
— Vamos sair do seu caminho antes que a horda desça,
— eu murmurei.
Mamãe riu. — Não tenho essa sorte. Papai está voltando
do clube com Titus e Myla. Você vai perdê-los.
— Eu os verei amanhã, — eu disse enquanto ela
abraçava a mim e a Rhett juntos.
— Você deveria vir amanhã enquanto Michael está no
trabalho, — minha mãe disse a Emilia, inclinando-se ao meu
redor para olhá-la. — As crianças estarão todas na escola e
terei a casa só para mim. Podemos conversar com Charlie
sobre o trabalho.
— Tudo bem, — Emilia respondeu com um sorriso
tenso.
Eu a segui para fora de casa e a ajudei a colocar Rhett
em sua cadeirinha e, minutos depois, estávamos voltando
para minha casa.
— Sua mãe é tão legal, — Emilia disse com um suspiro,
inclinando a cabeça para trás contra o assento.
— Você está surpresa com isso? — Eu perguntei
curiosamente.
— Eu não sei, — ela murmurou. — Sim. Eu acho.
— Ela sempre foi legal com você.
— Eu sei, — ela respondeu. — Acho que não estava
realmente esperando por isso. Educada, sim. Legal, nem
tanto.
— Por que isso?
— Porque ferrei com você, — Emilia disse cansada. —
Porque engravidei aos dezoito anos, desapareci e apareci aqui
com uma criança de dois anos. Surpresa!
— Ela não guarda rancor, — eu menti.
Emilia olhou para mim com ceticismo. — Sim, ela
guarda.
— Não contra você, aparentemente.
— Estou apenas agradecida, eu acho. — Emilia deu de
ombros e voltou a ficar quieta.
— Qual seria o ponto em tratá-la como merda? — Eu
perguntei quando paramos na frente de casa. — Você está
aqui. Você é a mãe de Rhett. Somos uma família.
— Você tem razão, — disse Emilia com um sorriso
tímido. — Eu provavelmente deveria apenas aceitar isso,
hein?
— Meus pais não são como os seus, Emilia, — eu disse
baixinho, olhando para Rhett que estava desmaiado em seu
assento. — Eles não vão se virar contra você de repente ou te
congelar porque os irritou.
— Eu sei disso.
— Você os irrita, eles vão dizer algo sobre isso, —
continuei. — Você saberá.
— Eles devem estar com raiva de mim, — ela
argumentou. — Não há como estarem bem com a forma como
tudo aconteceu.
Suspirei. — Não sei. Não tive chance de falar com eles
desde que você chegou aqui.
— Eu só... — Ela bateu as mãos desajeitadamente no
colo. — Só não quero me acostumar com isso se for mudar.
— Isso não vai mudar, — eu respondi, estendendo a
mão para parar seus gestos frenéticos. — Eles não vão corta-
la ou começar a tratá-la como merda. Esse não é o estilo
deles.
— Mas em algum momento, tudo vai sair, — ela
sussurrou. — Eles vão dizer alguma coisa.
— Provavelmente, — respondi seriamente. — Mas será
isso. Eles dirão algo e te darão a oportunidade de responder a
quaisquer perguntas que tiverem, e será isso.
— Eu não posso imaginar que vai ser tão simples, — ela
murmurou.
— Cristo, nada disso é simples, — respondi, olhando
para Rhett novamente. — Mas vamos resolver.
Carreguei Rhett para dentro e para cima, e o tempo todo
ele estava completamente flácido em meus braços. Ele herdou
isso de mim. Eu conseguia me lembrar de tantas vezes na
minha infância quando adormeci em algum lugar e acordei
horas depois em um lugar completamente diferente. Algumas
vezes, adormeci na sede do clube e acordei em minha própria
cama em casa, completamente inconsciente da viagem de
carro no meio. Eu não conseguia me lembrar quando isso
havia parado - provavelmente na época em que cresci demais
para meus pais me carregarem.
Coloquei Rhett na cama de hóspedes e desci novamente
encontrando Emilia vasculhando minha geladeira.
— Precisa de ajuda? — Eu perguntei, fazendo-a gritar de
surpresa.
— Estou morrendo de fome, — disse ela timidamente,
virando-se para mim.
— Você deveria ter tomado café da manhã no
restaurante, — eu respondi secamente, passando por ela
para a despensa. — Você quer um queijo grelhado?
— Que tipo de queijo você tem? — ela perguntou
alegremente, agachando-se para olhar na geladeira.
— Não faço ideia, — murmurei enquanto pegava o
pão. — Provavelmente apenas cheddar, mas tenho certeza
que você pode encontrar uma maneira de saciar a fome.
Ela sempre adorou queijo grelhado. Fazíamos centenas
deles na adolescência, misturando todos os queijos
fedorentos que minha mãe guardava na geladeira, sempre
tentando encontrar a melhor receita.
Eu não comia um desde que ela partiu.
— Uma vez, — ela disse enquanto se levantava,
segurando meio pedaço de queijo cheddar e uma garrafa de
sriracha em suas mãos. — Comprei uma geleia de pêssego e
jalapeña muito boa em um mercado de agricultores e coloquei
nele.
Eu torci meu nariz em desgosto.
— Ficou tão bom, — disse ela com uma risada.
— Você realmente vai colocar sriracha nele? — Eu
perguntei enquanto pegava uma panela para ela.
— Eu estou com vontade de algo picante, — ela disse
com um encolher de ombros. — Isso vai funcionar.
— Isso é complicado.
— Ei, você nunca sabe até tentar, — ela argumentou. —
Quando estava grávida de Rhett, tentei todas as combinações
imagináveis.
A raiva familiar cresceu dentro de mim, mas a contive
com força. Era assim que eu descobriria as coisas. Era assim
que saberia o que havia perdido. Pequenos comentários aqui
e ali, lembranças aleatórias que não significavam nada para
ela, mas pelas quais eu estava faminto. Encostei-me no
balcão e forcei um sorriso.
— Não surpreendentemente, — ela disse enquanto
começava a montar o sanduíche. — Tomates ficam ótimos
neles. Geleia também.
— Acredito na sua palavra, — respondi. A cozinha
estava silenciosa, exceto pelos sons dela cortando o
queijo. Eventualmente, minha curiosidade não pôde ser
contida. — Esse foi o seu único desejo? — Eu perguntei
casualmente.
— Não, — ela disse, jogando um pedaço de queijo na
boca. — Eu também queria melão o tempo todo, na verdade
qualquer tipo de melão que pudesse colocar em minhas
mãos. Ah, e os cheeseburgers do McDonald's.
— Legal, — murmurei.
— O que é meio hilário, — disse ela, colocando o
sanduíche na panela. — Porque Rhett não come nenhum tipo
de melão. Ele os odeia.
— Comeu muitos deles quando estava do lado de
dentro, — eu brinquei.
— Acho que sim, — ela murmurou, sorrindo para mim.
Fiquei ali, sem saber o que dizer. Ela estava se movendo
com facilidade, guardando as coisas como se estivesse
confortável no espaço, e eu estava olhando para ela querendo
fazer um milhão de perguntas ao mesmo tempo em que me
lembrava exatamente de como tirei as roupas que ela estava
vestindo mais cedo naquele dia.
Jesus, era como se Rhett não estivesse na sala, minha
mente voltava para deixá-la nua.
— O que...
— Você acha que...
Falamos ao mesmo tempo e então ambos paramos.
— Vá em frente, — eu disse com um aceno de cabeça.
— Você acha que devemos levar alguma coisa para a
casa de seus avós esta noite? — ela perguntou, verificando
seu sanduíche.
— Tipo um presente?
— Não, tipo comida, — ela respondeu. — Devemos levar
um aperitivo ou algo assim?
Eu fiz um barulho que estava em algum lugar entre uma
zombaria e uma bufada. — Não, — eu disse
categoricamente. — Não somos tão chiques.
— Não é chique, é apenas educado.
— Ok, então não somos tão educados, — eu esclareci. —
Não precisamos levar nada. Minha avó nem deixa ajudá-la a
limpar depois.
— É estranho apenas aparecer, — ela disse, pegando
um prato para sua comida. Ela deslizou para fora da panela e
colocou no balcão para esfriar. — Sinto que devemos levar
algo. Flores?
— Estamos levando Rhett, — respondi. — Isso é tudo
com o que eles se importam.
— Certo, — ela murmurou.
— Por que você está tão preocupada com isso de
repente? Você já esteve lá antes.
— Eu não estou... — Ela agitou as mãos antes de juntá-
las na cintura. — Eu não era a prostituta da Babilônia que
roubou o bisneto deles na época.
— Você não é a prostituta da Babilônia agora.
— Ok, — ela retrucou. — Mas ainda sou o monstro que
não contou a eles sobre o bisneto.
Capitulo 7

EMÍLIA

Mick soltou uma risada áspera e balançou a cabeça,


depois estendeu a mão e alisou o cabelo para trás com as
duas mãos.
— Eu não tenho certeza do que você quer que eu diga,
— ele disse cansado. — Todo mundo tem sido mais do que
legal com você desde que apareceu do nada. Meu
palpite? Eles continuarão sendo legais com você.
— Desculpe se meu nervosismo está te incomodando, —
respondi, voltando-me para o meu sanduíche. Meu estômago
revirou, mas me forcei a dar uma mordida de qualquer
maneira. Tinha dificuldade em comer quando estava ansiosa
ou estressada. A manifestação física era sempre náusea e
falta de apetite, mas eu sabia que tinha que forçar alguma
coisa para baixo.
— Não tenho certeza do que você quer que eu diga,
Emilia, — Mick disse nas minhas costas. — Você tomou
decisões e agora está se sentindo, o quê,
envergonhada? Constrangida? Não posso te ajudar com isso.
— Eu não te pedi isso, — respondi, forçando outra
mordida em minha boca.
— Parece que você está tentando me convencer a
tranquilizá-la.
— Eu não estou tentando fazer nada, — eu retruquei,
colocando o sanduíche de volta na mesa.
O dia tinha sido uma montanha-russa de emoções que
senti como se tivesse levado uma chicotada. Medo, ansiedade,
nostalgia, tensão sexual e alívio, ansiedade de novo, era
demais. Eu me sentia calma, quase relaxada, na casa dos
pais dele, sentada na sala com Heather, Michael e Rhett. Mas
antes e depois disso, senti como se fosse sair da minha
pele. Nada estava ajudando.
Michael tinha sido meu lugar seguro e caixa de
ressonância durante toda a minha infância, mas ele não era
mais. Eu odiava não poder mais lê-lo. Era como se toda a
exuberância juvenil que ele tinha quando éramos mais jovens
tivesse desaparecido completamente. Ele estava calmo, quase
anormalmente, o tempo todo. Mesmo quando eu sabia que ele
deveria estar com raiva e frustrado - essas seriam reações
normais - ele não mostrava nada disso. Ele era um estranho
e alguém que eu conhecia em um nível celular. Era confuso e
cansativo tentar descobrir tudo.
— Tenho certeza que vamos nos divertir na casa dos
seus avós, — eu disse, levando a comida não consumida para
o lixo. — Vou subir e me trocar.
— Emilia, — ele chamou enquanto eu caminhava em
direção às escadas. — Que diabos?
— O que? — Eu me virei para olhar para ele.
— Você acabou de fazer isso e jogou fora? — ele
perguntou, vindo em minha direção.
— Acho que não estava com tanta fome.
— Bobagem, — respondeu ele. — O que diabos está
acontecendo?
— Eu realmente quero tirar essas roupas úmidas, — eu
disse, puxando a gola do meu moletom.
— É por isso que você está tão magra? — ele perguntou,
aproximando-se. — Você simplesmente não come?
— Eu como.
— Realmente? Porque você mal tocou na comida desde
que chegou aqui.
— Eu comi na casa dos seus pais ontem à noite.
— Muito pouco.
— Estamos realmente discutindo sobre o que eu como?
— Eu perguntei em frustração. — Porque isso é ridículo.
— Tudo bem, — disse ele, levantando as mãos em sinal
de rendição. — Coma ou não coma. Faça o que você quiser.
— Vou me trocar e me deitar com Rhett, — respondi
cansada. — Vamos descer com bastante tempo para ir para a
casa dos seus avós.
— Parece bom, — disse ele por cima do ombro enquanto
se afastava.
Enquanto subia as escadas, a exaustão me atingiu como
um trem de carga. Foram dois dias tão intensos que parecia
que não tive nem um minuto para relaxar. Cada músculo do
meu corpo estava tenso, minha mente sempre correndo a um
milhão de milhas por hora.
Em vez de apenas trocar de roupa, optei por um banho
no elegante banheiro de hóspedes de Michael. A água quente
era fantástica em meus músculos doloridos, e finalmente me
senti quente depois de nosso pequeno interlúdio na
chuva. Em quinze minutos, eu estava enrolada ao lado de
Rhett, completamente desmaiado.
— Mama, jantar, — Rhett sussurrou, seus lábios tão
perto do meu ouvido que eu podia sentir a respiração dele.
Estremeci e afastei minha cabeça, mas isso não o
impediu de bater-tap-tap no meu ombro.
— Mamãe, jantar!
— Estou acordada, — eu assegurei a ele, abrindo meus
olhos. Sentei-me e os olhos de Rhett se arregalaram.
— O cabelo da mamãe, — ele disse, franzindo o nariz
enquanto se sentava sobre os calcanhares. Ele ergueu as
mãos até que estivessem niveladas com as orelhas e a cerca
de trinta centímetros da cabeça. — Uau.
— Louco, hein? — Eu gargalhei. Meu cabelo fluía em
volta da minha cabeça como uma nuvem, e Rhett riu como
um bobo enquanto eu o balançava de um lado para o
outro. — Acho maravilhoso.
— Penteie o cabelo, mamãe. — Ele riu.
— Eu acho que vou deixar como está, na verdade, — eu
provoquei, inclinando dramaticamente minha cabeça para o
lado para que meu cabelo caísse novamente.
— Parece bom para mim, — Michael disse da porta.
Eu gritei de surpresa e me joguei contra o travesseiro,
puxando os cobertores sobre minha cabeça. Rhett riu tanto
que caiu.
— Você sabia que ele estava lá? — Eu perguntei a ele,
deslizando meu braço para fora dos cobertores para cutucá-lo
na barriga. — Traidor!
— Eu o peguei na porta há pouco, — Michael disse, sua
voz misturada com diversão. — Nós provavelmente
deveríamos colocar um portão de bebê no topo da escada.
Eu gemi e joguei para trás os cobertores. — Sim, é uma
boa ideia.
— Mamãe? — Rhett perguntou timidamente. — Escova
de cabelo?
— Sim, vou escovar meu cabelo, — eu disse, puxando-o
para um abraço. — Dê-me vinte minutos e serei a linda mãe
que você conhece e ama.
— Meu melhor amigo, — ele respondeu sério, jogando
sua cabeça para trás para olhar para mim.
— Você é meu melhor amigo. — Colocando-o de volta ao
meu lado, eu lhe dei a ele um pequeno empurrão. — Vá com
seu pai enquanto eu me arrumo.
Levei menos de vinte minutos para me vestir e ficar
pronta, mas não muito menos. Rhett estava certo. Meu
cabelo estava um show de merda absoluto. Eu mal consegui
domá-lo sem ter que lavá-lo novamente. Eu estava fechando
meu suéter enquanto descia as escadas quando Rhett
deslizou até parar no final, um enorme sorriso dividindo seu
rosto.
— Mamãe viu? — ele perguntou, com os olhos
arregalados. — Deslizar!
— Bom deslizamento. Apenas tome cuidado, ok? — Eu
avisei. — Não suba as escadas com essas meias, ou você pode
se machucar.
— Eu não vou, — ele concordou, balançando a
cabeça. Eu sabia que no minuto em que virasse as costas, o
pequeno fedorento estaria fazendo exatamente o que eu disse
para não fazer. — Mamãe linda.
— Obrigada, seu pequeno bajulador. Você parece
suado.
— Suado, sim, — ele anunciou com prazer.
— Ok, bem, talvez deva acalmar o suor? — Eu enruguei
meu nariz enquanto bagunçava seu cabelo. — Você vai
conhecer seus bisavós hoje à noite.
— Eu sei, — disse Rhett, seguindo-me em direção à
porta da frente.
— Eu realmente adorava antes que você conhecesse
essa frase, — eu brinquei, deslizando meus sapatos enquanto
meu estômago revirava de nervosismo.
— Papai, uma motocicleta. — Rhett apontou para a
porta da garagem. Eles devem ter feito algumas explorações
enquanto eu estava me preparando.
— Isso é legal, amigo.
— Papai, uma caminhonete.
— Eu sei. Papai tem aquela caminhonete há muito
tempo, — murmurei, sorrindo.
— Muito tempo, — disse ele, balançando a cabeça.
— Você está animado? — Eu perguntei, agachando-me
para que ficássemos nariz com nariz.
— Sim.
— Você está se divertindo?
— Sim. — Ele colocou as mãos em minhas bochechas.
Eu pressionei a mão contra o meu peito, tentando
diminuir a batida do meu coração.
— Estou tão feliz, cara, — eu disse, minha voz rouca. —
Eu também gosto daqui.
— Minha casa.
— Esta é a casa do papai. — Eu ri.
— Minha casa, — Rhett insistiu enquanto eu me
endireitava. — Casa da mamãe. Casa do papai. Minha casa.
— OK. — Eu sabia que não deveria discutir quando ele
tinha aquela inclinação teimosa no queixo. Eu olhei para
cima quando Michael saiu da cozinha, e minha boca ficou
seca.
— Desculpe, — ele murmurou baixinho. — Eu disse a
ele que agora era a casa dele também.
Eu balancei a cabeça distraidamente. Ele estava usando
um estilo diferente das roupas que usou nos últimos dias,
mas caramba, ele parecia bem. Ele aparou a barba e puxou o
cabelo para trás em um coque baixo. A calça jeans que ele
usava era familiar, parecia igual às outras, gasta e justa o
suficiente em todos os lugares certos, mas vestia o que
parecia ser uma flanela novinha sob o colete.
— Devo ir me trocar? — Eu perguntei, olhando para a
legging e o suéter que estava usando. Parecia apropriado para
um jantar em família, mas não se Michael tivesse se
arrumado.
— Por quê? — ele perguntou confuso quando Rhett
puxou minha mão. — Você parece bem.
— Mas você está todo... — Eu acenei com a mão em sua
direção.
Michael olhou para si mesmo. — O que?
— Arrumado, — eu terminei desajeitadamente.
Michael zombou e caiu de joelhos para ajudar Rhett a
calçar os sapatos.
— Ugh, — eu gemi. — Desculpe, cara. Esqueci de calçar
seus sapatos.
— Vovó me deu esta camisa, — disse Michael, olhando
para mim. — Eu não usei e sabia que ela perguntaria sobre
isso, então.
— Ah, — eu disse timidamente. — Entendi.
— Onde diabos você esteve se acha que isso é
arrumado? — ele perguntou com uma risada.
— Smokings não eram comuns, — eu respondi
tristemente.
— Foda-se smokings, — disse ele, sorrindo para mim. —
Mas eu pelo menos colocaria jeans sem manchas de graxa e
um buraco no bolso.
— É justo, — eu concedi com uma risada.
Eu não tinha certeza porque as coisas estavam tão
calmas entre nós desde que eu não tinha deixado as coisas
em um bom lugar quando fui tirar uma soneca, mas estava
grata por ele parecer estar tentando me deixar à vontade. Eu
já estava no limite sem adicionar mais tensão entre nós. Eu
não via a avó de Michael há muito tempo e, embora mal
pudesse esperar, também temia isso. Ela tinha sido boa para
mim. Tipo. E eu tinha desaparecido.
— Casaco, filho, — murmurei, ajudando Rhett a vestir o
casaco.
— Coloquei o assento dele na caminhonete, — Michael
disse enquanto eu enfiava meus braços nas mangas da
minha própria jaqueta. — Assisti a um vídeo para ter certeza
de que estava afivelado certo. Achei que estaria tudo bem.
— Está tudo bem, — eu respondi. Não valia a pena
brigar, não quando parecíamos estar em um bom lugar no
momento.
Seguimos Michael para fora da garagem e, quando ouvi
o vento e a chuva lá fora aumentarem de repente, fiquei
realmente agradecida por usarmos sua caminhonete. Fiquei
seca e relativamente aquecida enquanto prendia Rhett em
seu assento, algo que eu não teria feito na garagem perto do
meu carro.
— Você vai ter que ir no meio, — Michael murmurou,
me conduzindo ao redor do capô da caminhonete.
— Sim, eu notei, — respondi secamente.
— Seu assento não vai caber no meio.
— Tudo bem.
— Segurança primeiro.
Nós dois agimos como se eu não soubesse o quanto ele
amava quando me sentava no banco do meio de sua
caminhonete, meu ombro encostado ao dele e nossos corpos
pressionados até os joelhos.
Lutei contra a sensação de déjà vu enquanto dirigíamos
em direção à casa dos avós de Michael, do outro lado da
cidade. Eles viviam no mesmo lugar desde sempre, desde que
o tio de Michael, Will, era apenas um bebê, e eu não poderia
contar o número de vezes que estive lá para eventos
familiares. Festas de aniversário, feriados, jantares em família
só porque - tudo acontecia na casa da família. Eu ainda
conseguia me lembrar da primeira vez que Michael me levou
lá, a ansiedade que senti por estar cercada por tantas
pessoas de todas as idades. Eles me receberam bem no
grupo, porém, aprendendo meu nome e me incluindo em
suas conversas, planos e piadas internas. Michael brincou
dizendo que estava usando os eventos familiares para me
preparar para a vida no clube e todo o caos que reinava lá,
mas nunca fomos a um evento do clube. A única experiência
que tive naquele lugar em particular limitou-se a uma árvore
nos fundos da propriedade onde gravamos nossas
iniciais. Quando eu tinha idade e coragem o suficiente para ir
a uma festa do clube, já tinha partido.
Rhett estava batendo os pés no banco com entusiasmo e
não tive coragem de impedi-lo. Ele manteve um fluxo
constante de conversa durante todo o caminho até a casa de
Grease e Callie. Perguntou sobre comida, se podia tomar
suco, se podia brincar lá fora. Ele falou sobre caminhões,
apontou uma motocicleta aleatória, puxou o cinto de
segurança.
No momento em que entramos na garagem da casa
familiar, o rosto de Michael estava pálido de puro espanto
com o número de palavras incompatíveis que Rhett havia
embalado em dez minutos de carro, e eu estava tentando não
cair na gargalhada.
— Não tenho certeza do que você fez enquanto eu estava
dormindo, mas deve ter aberto a represa, — murmurei
enquanto o seguia para fora da caminhonete.
— Tudo o que fiz foi pedir para ele me ajudar a guardar
algumas coisas na garagem, — ele sussurrou de volta.
— Você encontrou a chave, — eu brinquei, contornando
o capô da caminhonete. — Se quer que ele saia de sua
concha, peça ajuda a ele.
— Bom saber.
— Fora, — Rhett ordenou enquanto eu abria a porta.
— Estou trabalhando nisso, — eu disse, colocando uma
mão em seu joelho para parar sua inquietação. — Credo, você
está como um gafanhoto hoje.
— Não gafanhoto. Eu sou Rhett.
— Você está pulando como um.
— Sou um menino, — argumentou.
— Na verdade, você é o melhor menino, — eu corrigi,
ajudando-o a se levantar. — Meu menino favorito em todo o
universo.
— Ir? — ele perguntou quando eu o coloquei de pé.
— Realmente? — Eu perguntei, colocando minhas mãos
em meus quadris.
— Melhor mãe, — ele respondeu rapidamente.
— Ir?
— Eu acho, — eu bufei brincando.
Meu orgulho foi acalmado quando ele agarrou minha
mão antes de caminhar em direção a Michael.
— Está pronto? — Michael perguntou a Rhett. — Não
tenho certeza de quem estará aqui. Pode haver muitas
pessoas.
— Pronto, — disse Rhett com um sorriso. Ele estendeu a
mão para segurar a de Michael e meu estômago revirou um
pouco enquanto caminhávamos em direção à porta da frente.
— Eu pensei ter visto sua caminhonete, — a avó de
Michael gritou enquanto abria a porta da frente.
— Ooh, linda vovó, — Rhett murmurou para mim,
fazendo meus lábios tremerem.
Ele não estava errado. Enquanto Heather parecia que
ainda poderia levar seus filhos para a pré-escola, Callie
parecia ser aquela que os encheria de comida, doces e
mandá-los para casa. Ela era redonda, macia e bonita, seu
cabelo preto com mechas prateadas, rugas ao redor dos olhos
e da boca.
— Ei vovó, — disse Michael, sorrindo com orgulho. —
Este é Rhett.
— Tipo, E o Vento Levou, — ela disse, curvando-se para
encontrar os olhos de Rhett. — Eu aprovo.
— Oi, — disse Rhett timidamente.
— Mesmo que seja problemático, — eu murmurei,
olhando para Michael. Ele riu baixinho. Era um assunto com
o qual eu o entediava pelo menos uma centena de vezes
quando estávamos no ensino médio.
— Às vezes a melhor literatura é um pouco
problemática, — Callie murmurou seriamente. — Sua mãe
entendeu isso.
— Sim, — disse Rhett, encostando-se à minha perna.
— Ela sempre foi esperta, — Callie disse enquanto se
endireitava. — Olá, Emmy Lou.
— Ei, vovó, — eu respondi, as palavras ficando presas
na minha garganta. Elas saíram como um coaxar enquanto
meus olhos lacrimejavam.
— Oh, querida, — disse ela, avançando para me puxar
em um abraço. — Olha esse menino lindo que você fez.
Eu senti o cheiro dela e a sensação de seu cabelo contra
a minha bochecha e fechei os olhos, segurando com unhas e
dentes. — Sinto muito por ter demorado tanto para chegar
aqui.
— Estou feliz que você esteja aqui agora, — ela
sussurrou de volta, passando a mão pela parte de trás do
meu cabelo.
— Eu senti sua falta, — eu funguei, tentando e falhando
em me recompor.
— Sentimos sua falta também, — disse ela, me dando
um aperto.
Enquanto a casa dos pais de Michael sempre pareceu
um lar, segura, caótica e estável, a casa dos avós de Michael
parecia um abraço caloroso. Era o lugar para onde você ia
quando precisava ser amada, para onde fugia, para onde ia
quando estragava tudo. Era a rede que te pegava quando você
caia.
Callie era a rede que te pegava quando você caia. Sem
recriminações. Sem palestras. Ela era o epítome do amor
incondicional.
— Começando a chover de novo, — Michael disse
suavemente. — Vamos entrar.
— Bem, olhe para nós, — disse Callie, enxugando o
próprio rosto enquanto se afastava. — Apenas alguns bebês
chorões.
Rhett me observava atentamente enquanto entrávamos,
mas quaisquer perguntas que tivesse, ele guardou para si
mesmo. Eu nem tinha certeza se poderia responder a
ele. Algum dia, quando ele tivesse estragado tudo e estivesse
com medo de voltar para casa, ele entenderia a magia de
Callie e porque minhas bochechas estavam molhadas.
— Eles estão aqui, Asa!
— Eu posso ver isso, Calliope, — o avô de Michael disse
divertido do lado de dentro da porta. — Não precisa gritar.
— Merda, — ela gritou antes de rir. — De onde diabos
você veio?
— Eu moro aqui, — ele brincou, batendo levemente em
sua bunda enquanto ela nos levava para dentro de casa. —
Uau, você deve ser o Rhett.
Rhett olhou para o grande homem, com os olhos
arregalados, sua mão segurando a minha.
— Eu achei que você seria menor, — disse Grease em
tom de conversa.
— Você grande, — Rhett murmurou, fazendo seu bisavô
rir.
— A quem você acha que puxou? — Grease perguntou,
rindo. — Algum dia, você será alto como eu.
— Tudo bem, — Rhett suspirou, fazendo todos nós
rirmos.
— Ei, você quer vir me ajudar a limpar a mesa? Minha
esposa é uma acumuladora e tem papéis e merdas por toda
parte.
Grease estendeu a mão e, após uma pequena hesitação,
Rhett me soltou e foi em sua direção.
— Esposa? — ele perguntou curioso.
Grease apontou para Callie com o polegar.
— Ah, — disse Rhett.
— Sim, — respondeu Grease.
— Eu não sou uma acumuladora, — Callie disse
enquanto eles passavam por ela, batendo de leve na barriga
de Grease.
— Se o sapato serviu, doçura, — disse Grease com uma
risada enquanto se afastava.
— Suco? — Rhett perguntou quando eles saíram de
vista.
— Não há muitos papéis, — Callie disse para nós com
um acesso de raiva. — Entrem, entrem. Sentem-se. Tirem o
casaco.
— Achei que você teria toda a família aqui, — Michael
disse enquanto eu tirava meu casaco e o pendurava no
cabideiro.
— Pensei nisso, — disse Callie com um sorriso. — Mas
decidimos que desta vez queríamos ter Emilia e Rhett só para
nós.
— Ei, e quanto a mim? — Michael perguntou com uma
risada.
— Nós te vemos o tempo todo, — Callie respondeu com
um aceno de mão enquanto ela se sentava no sofá.
— Fui substituído, — Michael disse brincando, levando-
me até uma cadeira.
Assim que me sentei, o olhar de Callie pousou em mim
novamente.
— Onde você esteve, querida? Parece que pegou um
pouco de sol.
A risada que saiu da minha boca foi desajeitadamente
alta e curta, e coloquei minha mão na boca para evitar que
qualquer outro ruído estranho escapasse. Sim, eu tomei um
pouco no sol.
— Estávamos no Arizona, — eu disse finalmente,
deixando minha mão cair no colo. Limpei minha garganta
desconfortavelmente. — Meus pais se mudaram para lá
quando descobriram que eu estava grávida.
— Parece bastante dramático para uma gravidez na
adolescência, — ela murmurou.
Olhei para Michael, mas não havia ajuda daquela
direção. Seu rosto estava sem emoção enquanto ele me
observava.
— A empresa do meu pai tinha uma filial lá, — eu disse,
entrelaçando meus dedos no meu colo para não ficar
inquieta. — E desde que entrei na faculdade do Arizona, eles
acharam que eu poderia simplesmente me transferir para lá.
— E você? — Callie perguntou curiosamente.
— Por um tempo, — eu respondi suavemente. Forcei um
sorriso. — E então Rhett veio e cuidei dele.
— E você fez um bom trabalho com isso, — disse Callie,
olhando para Michael. — Heather disse que ele é um amor de
verdade.
— Ele é, — Michael concordou calmamente.
A sala ficou em silêncio por alguns momentos pesados.
— Eles não queriam que eu entrasse em contato com
Michael, — eu disse, me endireitando na minha cadeira. —
Foi parte do acordo que fizemos para que Rhett e eu
pudéssemos ficar com eles.
— Idiotas, — Callie disse baixinho.
— Eles seguiram adiante, — eu disse, me mexendo um
pouco. — Então, se eu tivesse entrado em contato com ele...
— Olhei para Michael, que estava olhando para o carpete
entre seus pés, e então de volta para Callie. — Eu sabia que
eles me expulsariam.
— Pessoas horríveis, — Callie murmurou. —
Simplesmente horríveis. Sinto muito, Emmy, mas isso é
nojento.
— Sim, — eu respirei.
Eles foram horríveis. Pessoas terríveis, manipuladoras e
mesquinhas. Mas eles também eram meus pais. Eles riram
com Rhett e compraram meu sorvete de creme favorito e
certificaram-se de termos tudo o que precisávamos.
Exceto por Michael. Ele tinha sido a única coisa que eles
se recusaram a me deixar ter. A lembrança daquelas
discussões, as lágrimas, a sensação de desesperança, o
medo, voltaram em um instante, fazendo meu estômago
revirar. Eu empurrei para longe.
Eu estava de volta a Eugene. Michael estava sentado a
menos de um metro e meio de mim. Rhett estava rindo na
cozinha de algo que seu bisavô estava dizendo.
Eles mantiveram Michael longe de nós. Nos afastaram
dele. Mas não tinham mais esse poder.
— Os pais dela morreram, — Michael disse quando eu
saí da memória. Devo ter perdido Callie me fazendo uma
pergunta.
— Sinto muito, — disse Callie com simpatia. — Apesar
de todos os seus defeitos, eles ainda eram seus pais.
— Obrigada.
Eu também sentia muito. Mas misturado com o buraco
que suas mortes deixaram e as coisas que sentia falta sobre
eles estavam a culpa e o alívio em igual medida. Se eles não
tivessem morrido, quanto tempo levaria para criar coragem
para partir? Eu não tinha certeza. Eu disse a mim mesma mil
vezes que partiria, entraria no carro e iria embora - mas foi
preciso a morte deles e meu desespero para fazer isso.
Olhei com culpa para Michael.
— Sorvete, — disse Rhett, praticamente voando para a
sala de estar. — Hambúrgueres.
— Sorvete depois dos hambúrgueres, — informei para o
caso de haver alguma confusão.
— Batatas fritas, — Rhett anunciou alegremente.
— Venham para a cozinha, — disse Callie, levantando-
se. — Vocês podem me fazer companhia enquanto termino o
jantar. Se eu deixar seu avô lá sozinho, comeremos
hambúrguer cru e batatas fritas queimadas.
— Eu disse a você que não seria ruim, — disse Michael,
me parando com uma mão no meu braço.
— Eu sei, — eu bufei, balançando a cabeça. — Mas a
ideia da pessoa mais misericordiosa do planeta não te
perdoar é um pouco assustadora.
— Você não precisa contar à minha família o que
aconteceu, — ele disse baixinho, com os olhos nos meus. —
Você me contou. É o bastante.
— Eles merecem uma explicação, — eu argumentei com
um encolher de ombros.
— Se eles quiserem uma, darei uma a eles. — Ele
apertou meu braço suavemente antes de me soltar. — Você
não tem que expor sua merda para todos que perguntam.
— É Callie, — eu disse defensivamente.
— E amanhã, será uma das minhas tias, ou um tio, ou
um primo. Todos vão querer saber por que você se afastou.
— Porra.
— Você não está me ouvindo, — disse ele, inclinando-se
mais perto. — Você falou com meus pais. Você falou com
vovó. É isso, ok?
Eu balancei a cabeça.
— Todos os outros podem se foder. Isso é entre você e
eu.
— Achei que você tivesse dito que não iria me proteger,
— eu o lembrei.
— Eu disse que não iria tranquilizá-la, — ele
resmungou, caminhando em direção à cozinha.
— Bem, estou me sentindo muito tranquila, — brinquei
levemente, seguindo-o.
Ele me ignorou.
Capitulo 8

MICHAEL

O jantar foi fácil. Calmo. Meus avós estavam


apaixonados por Rhett e o encheram de perguntas. Ele
absorvia tudo. Nosso filho ainda não dizia frases completas,
mas sabia um monte de palavras. Você poderia acompanhar
com bastante facilidade se apenas prestasse atenção à
inflexão que ele colocava nelas.
Vovô perguntou a ele sobre dinossauros. Rhett
balbuciou por um minuto inteiro. A vovó mencionou seu
jardim e Rhett contou a ela sobre as abelhas. Eles
mantiveram uma conversa inteira indo e vindo com Rhett
apenas acrescentando uma palavra ou duas aqui e ali e vovó
preenchendo o resto.
Ele era uma viagem. Meus avós ficaram encantados com
Rhett. Não consegui pensar em outra palavra para descrever.
— Você sabe, — vovô disse, apontando o garfo para
mim. — O pequeno Mick costumava colocar todas as minhas
ferramentas em uma fileira e nomear que cada e como era
usada. Aposto que você poderia fazer o mesmo.
— Papai é grande, — Rhett apontou, dando uma
mordida em seu hambúrguer.
Vovô riu.
— Ele nem sempre foi grande.
— Nós o chamamos de Pequeno Mick porque ele recebeu
o nome de seu tio, — vovó disse gentilmente, olhando para
vovô. — Assim, quando alguém estivesse falando sobre seu
pai, saberíamos que era ele e não seu tio.
Rhett ficou quieto por um momento, processando.
— Grande Mick? — ele perguntou finalmente.
Vovô limpou a garganta. — Ele morreu, filho. — Os
olhos de Rhett se arregalaram quando ele olhou para sua
mãe.
— Sim, — respondeu Emília. — Você conhece essa
palavra, hein? A vovó e o vovô também morreram.
— Morreu, — Rhett confirmou, voltando para a sua
comida. Ele podia conhecer a palavra, mas não tinha
nenhum significado para ele, ainda não.
A mesa ficou em silêncio por um minuto, todos perdidos
em seus próprios pensamentos. Meu tio Mick, o Mick
original, morreu na adolescência, muito antes de eu
nascer. Ele era o melhor amigo da minha mãe e o irmão mais
novo do meu pai e eu sabia que eles ainda sentiam essa
perda, quase trinta anos depois.
— Papai Michael? — Rhett perguntou a Emilia curioso,
quebrando o silêncio.
Todos nós o observamos confusos, mas Emilia parecia
saber exatamente o que ele estava perguntando.
— Quando seu pai e eu éramos crianças, ele me disse
que não gostava de ser chamado de Mick, — disse ela.
Meus avós sentaram-se mais eretos e olharam para
mim, depois para Emilia.
— Ele não gostava de ser comparado ao tio. Ambos eram
caras grandes, inteligentes, engraçados e gentis. — Seus
olhos encontraram os meus novamente. — E ele estava se
sentindo meio mal com isso, então, a partir de daí, eu o
chamo de Michael.
— Oh, — Rhett disse facilmente. Eu não tinha certeza se
ele tinha entendido o que ela disse.
— Mas eu o chamava de Mick quando éramos pequenos,
— Emilia disse com um sorriso.
Apreciei a forma como ela respondeu a Rhett. Ela
explicou tudo, embora ele não tivesse entendido
completamente. Tive a sensação de que era por isso que ele
sabia tantas palavras - porque ela falava com ele.
Eu não apenas não gostava de ser comparado ao meu
tio, eu odiava ser um lembrete. Meus avós nunca se
recuperaram da morte de meu tio, e eu não tinha certeza se
meus pais também. Eu não os conhecia antes, então não
podia ter certeza, mas sempre estive muito ciente do quanto
os lembrava da criança que perderam. Minha mãe mandava
um olhar para meu pai, ou minha avó me puxava para um
beijo sem motivo algum, e eu sentia. A perda.
— Nós não sabíamos que você não gostava, — meu avô
disse rispidamente, seus olhos em mim.
— Eu era uma criança, — respondi facilmente, atirando-
lhe um sorriso. — Eu aprendi a gostar. — E eu tinha. À
medida que cresci e amadureci, percebi que enquanto minhas
semelhanças com meu tio machucavam de certa forma,
também eram um bálsamo. Estava orgulhoso de carregar o
nome de alguém que eles tanto amavam. Eu nunca admitiria
isso, mas quando fiquei mais velho do que meu tio Mick
jamais foi, também percebi que eles não tinham mais
ninguém para me comparar. Ele nunca foi um adulto. Eu não
estava mais seguindo seus passos.
— Você deveria ter dito alguma coisa, — disse vovó,
balançando a cabeça enquanto me batia com o guardanapo.
— Eu disse a Emilia, — respondi, esquivando-me. —
Isso foi o suficiente.
— Rhett Michael Rumi Hawtorne, — Rhett disse
alegremente.
— Sim, esse é o seu nome, — Emilia confirmou.
— Isso é um maldito bocado, — vovô murmurou com
uma risada.
— Ei, — Emilia disse com falsa ofensa. — Nem todo
mundo pode receber o nome de lubrificante.
Vovô gaguejou antes de cair na gargalhada, o som
enchendo a sala.
— Ela te pegou aí, — vovó cantou alegremente, sua
própria risada se juntando.
— Lubicante? — Rhett perguntou, fazendo todos nós
uivar.
— É algo que torna as coisas lisas.
— Liso?
— Sim, tipo... — Jesus, por que eu estava em
branco? Minha mente estava tão perdida que não consegui
encontrar um exemplo inocente.
— Como loção, — Emilia disse divertida. — Ou sabão.
— Oh, — disse Rhett, prolongando a palavra enquanto
acenava com a cabeça. Então ele olhou para vovô em
confusão. — Seu nome?
— Eles me chamam de Grease, — vovô disse.
Rhett torceu o nariz.
— Mas a mãe dele o chamou de Asa, — vovó entrou na
conversa. — Esse é o nome verdadeiro dele.
— Asa, — Rhett meditou.
— Eu também gosto mais desse nome, — vovó
concordou.
— Grease é melhor do que Sr. Hawthorne, — Vovô disse,
voltando para sua comida. — Que é como sua mãe me
chamou por um longo tempo.
— É um sinal de respeito, — Emilia disse
defensivamente.
— Não é respeitoso se alguém pedir para você usar um
nome diferente, — argumentou vovô.
— Estamos realmente tendo essa conversa de novo? —
Emilia perguntou divertida. — Comecei a te chamar de vovô,
como você pediu.
— Você só levou um ano inteiro, — vovô murmurou.
— Você está planejando ficar na casa de Mick... — Vovó
fez uma pausa. Foi só por um segundo, mas eu notei.
— Sempre serei Mick, — eu disse, estendendo a mão
para apertar a mão dela. — Me acostumei com essa
merda. Juro.
Vovó apertou minha mão de volta.
— Você está pensando em ficar na casa de Micky
enquanto se organiza? — perguntou a Emília.
— Sim. — Emilia olhou para mim. — Esse é o plano.
— Bem, bom. Avise-me quando encontrar um
emprego. Adoraríamos receber Rhett um dia por semana.
— Isso seria tão incrível, — disse Emilia, com os olhos
brilhando.
— Eu pediria mais dias do que isso, — vovó disse com
um sorriso. — Mas Heather pode me matar se eu tirar seu
tempo de babá.
Emília riu.
— O clube vai fazer um churrasco no próximo final de
semana, — vovô me disse. — Você estará lá?
— Não tinha ouvido nada sobre isso.
— Estou te dizendo agora, — ele respondeu com uma
carranca.
— Vamos conversar sobre isso.
Vovô zombou. — Você estará lá, — disse ele
conscientemente.
— Emilia nunca foi a uma festa no clube.
— Inferno, haverá crianças correndo por toda parte. —
Ele acenou com a mão com desdém. — Não é como se fosse
ficar turbulento.
— Eu te aviso.
— É melhor jogá-los no fundo do poço imediatamente, —
brincou. — Dê-lhes a chance de mergulhar o dedo do pé e
eles fugirão gritando noite adentro.
— Ela já fez isso uma vez, — eu murmurei.
— Não pense que foi escolha dela, — vovô respondeu,
baixando a voz. — Essa garota te olhava como se você tivesse
pendurado a porra da lua.
— As coisas mudam.
— Isso não, — ele respondeu com um escárnio.
— Talvez quarta-feira? — Vovó disse, levantando um
pouco a voz para nos interromper. — Isso funciona para você,
neto?
— O que há na quarta-feira?
— Jantar em família.
Esfreguei as mãos no rosto. Eu ainda estava me
acostumando a ter Emilia e Rhett de volta, e parecia que teria
que dividi-los. De novo.
— Isso funciona, — eu disse, olhando para Emilia por
confirmação.
— Minha agenda está vazia, — ela brincou.
Algumas horas depois, eu me vi dirigindo de volta para
minha casa, Emilia aconchegada ao meu lado. Rhett não
tinha adormecido, provavelmente porque estava apreciando a
vista desconhecida pela janela, mas estava cansado o
suficiente para que a caminhonete estivesse silenciosa.
— Senti saudades dos seus avós, — Emilia disse
suavemente. — Às vezes, eu costumava reproduzir conversas
inteiras com Callie na minha cabeça.
— Oh sim? — Eu limpei minha garganta. — Sobre o
que?
— Tudo, — disse ela com uma risada tranquila. — Como
Rhett estava. Como ele era fofo. Como eu estava com medo.
— Você poderia ter ligado para ela, — murmurei. —
Inferno, ela provavelmente não teria contado a ninguém.
— Eu não queria colocá-la nessa posição, — Emilia
respondeu com tristeza. — Estúpido, certo? — Ela suspirou.
— Você poderia voltar para casa a qualquer momento,
Em, — eu a lembrei. — Você sabia disso.
— Você pode pensar que sabe alguma coisa e ainda
assim não acreditar, — ela disse, estendendo a mão para
passar os dedos pelo cabelo de Rhett. Sua cabeça balançando
para frente quando ele adormeceu.
Levamos apenas mais alguns minutos para chegar em
casa, mas isso foi o suficiente para que a familiar pontada de
frustração começasse a arranhar minha pele. Contar ao
contrário ajudou. Dizer a mim mesmo que ficar com raiva não
resolvia nada e nunca ajudaria também. Ela sabia que
poderia voltar. Minha família nunca foi nada além de boa
para ela. Solidária ao extremo. Mesmo agora, mesmo depois
da merda que ela fez, eles a receberam de braços abertos.
Mesmo que eu pudesse acreditar que ela não tinha
certeza de mim - e não conseguia descobrir como isso era
possível - ela sabia que minha família a acolheria. Eles nunca
a deixariam lutar se pudessem evitar, e Rhett apenas
aumentou essa garantia.
Deixei Emilia carregar Rhett para dentro porque ela
parecia precisar. Quando ela passou os braços em volta dele
e ele se agarrou a ela como um bebê coala, ela pressionou o
nariz contra o cabelo dele, abraçando-o perto.
Ela me encontrou na cozinha um pouco depois, com os
olhos cautelosos e cansados.
— Você está louco de novo, — ela disse timidamente,
inclinando-se contra a ilha.
— Acho que eu mereço, — eu murmurei.
— Sim, você merece, — ela admitiu. — Como posso
consertar isso?
— Conseguindo uma maldita máquina do tempo?
— O que mais? — ela perguntou, cruzando os braços
sobre o peito.
— Você o manteve longe de mim, — eu disse, fechando
meus olhos enquanto tentava acalmar minhas emoções
turbulentas. — Jesus. Três anos. Não sei nem como ele sabe
metade das palavras que pronuncia.
— Eu também não, — ela brincou. Era uma piada
pronta.
— Eu simplesmente não entendo, — eu disse
finalmente. — Realmente não. Você sabia que poderia voltar
para cá. Se você achasse que eu seria um idiota, ainda sabia
que minha família a acolheria. Eles te amam pra caralho e
sempre amaram.
— Não é tão simples assim.
— É exatamente tão simples quanto isso, — eu
retruquei. A corda com a qual me segurei estava se
desgastando e eu não tinha certeza de como parar isso.
— Você não tem ideia de como era, — ela sibilou,
apontando para mim.
— Certo, — eu zombei.
— Eu tinha dezoito anos!
— Eu também! — Eu gritei, apontando para o meu
peito. — Eu tinha a mesma maldita idade, Emilia.
— Sim, — disse ela, dando um passo à frente. — E a
única coisa com que tinha que se preocupar era se um de
seus primos teria ou não tempo para comprar cerveja para
você naquele fim de semana. Você não precisava se
preocupar se Rhett estava comendo o suficiente, fazendo cocô
o suficiente ou dormindo o suficiente. Você não precisava
entrar em pânico toda vez que ele tinha febre, assaduras ou
batia com a cabeça na mesa da cozinha!
— Eu não pude. — Lutei para baixar a voz, mas não
adiantou. — Você tirou isso de mim.
— Eu não queria que você tivesse que se preocupar com
essas coisas! Eu não queria ser um fardo.
— Em vez disso, eu estava preocupado se você estava
bem, — eu gritei. — Se você estava segura. Se estava em
algum lugar tentando entrar em contato comigo. Se me
amava. Se você me odiava. Se seus pais tinham feito alguma
coisa com você.
— Você parece estar indo muito bem, — ela explodiu,
jogando as mãos no ar. — Você tem um bom emprego. Você
se juntou ao clube. Comprou a porra de uma casa!
— Sim, — eu disse, rindo sem alegria. — Comprei uma
casa. Essa porra de casa. Porque a invadi depois que os
antigos donos saíram e demoli o lugar. Essa parede. — Eu
apontei, vergonha queimando em meu estômago. — Aquela
parede. Essa parede. — Deixei cair meu braço. — Foi tão
fodido que tive que comprá-la, ou teria ido para a cadeia.
— Você o que? — ela respirou, olhando para mim em
confusão.
— Eu era um garoto de dezenove anos, — eu cuspi,
vergonha subindo pelo meu pescoço. — Pensei, porra, não sei
o que pensei. Que você tivesse me deixado um maldito bilhete
na parede. Que se pudesse entrar aqui, encontraria alguma
coisa.
— Micky. — Seus olhos ficaram vidrados.
— Fazia quase um maldito ano, e eu não ouvi
nada. Você simplesmente desapareceu como a porra
da fumaça. Então, invadi aqui. Vasculhei o local de cima a
baixo. Quando não consegui encontrar nada, comecei a
arrancar o carpete. Fazendo buracos nas paredes. Subindo
pelo forro sob o piso. — A memória daqueles poucos dias
queimou em meu estômago. Minha preocupação se tornou
desespero e esse desespero se transformou em uma fúria que
queimou tanto que eu não a sentia antes ou depois. — No
momento em que Rumi descobriu onde eu estava, a casa era
uma porra de uma concha. Meu pai teve que entrar e fazer
uma oferta pelo lugar e depois assumir o empréstimo até que
eu pudesse comprá-la dele.
— Oh meu Deus, — ela sussurrou, olhando ao redor da
sala.
— E o tempo todo você estava bem, — eu disse com uma
risada amarga. — Morando no Arizona. Indo para a
faculdade. Mantendo meu filho.
— Eu não estava bem, — ela respondeu, balançando a
cabeça. — Estava apavorada. Senti tanto a sua falta que
fiquei doente com isso.
— Claro que parece isso. — Eu não me incomodei em
tentar esconder o sarcasmo.
— Sabe como foi para mim? — ela disse, sua voz
calma. — Eu chorei durante todo o caminho para o
Arizona. Vomitei. Chorei mais um pouco. Deitei no banco de
trás, esperando que parássemos para passar a noite em
algum lugar e você estaria lá, esperando para me trazer de
volta para casa. Vigiei a frente da minha casa durante
meses. Anos. Esperando o dia em que veria sua caminhonete
aparecer, como um cavaleiro de armadura brilhante. Procurei
em todos os rostos do campus, pensando que você me
encontraria lá. Eu deitei na cama todas as noites, desejando,
esperando, rezando para que você aparecesse e eu não tivesse
que enfrentar meus pais sozinha. Mas você não o fez.
Eu olhei para ela.
— Claro que não, — ela disse tristemente. — Você não
sabia onde eu estava. Você não sabia que eu precisava de
você. Eu entendi isso. Mas, como disse, pensar que sabe
alguma coisa e acreditar são duas coisas totalmente
diferentes. Acreditei que você apareceria, mesmo sabendo que
não tinha lhe dado nenhuma pista. Eu não podia imaginar
que a vida ou o universo ou o que fosse te impediria de me
encontrar. Eu tinha que acreditar nisso, ou teria entrado em
uma espiral tão ruim que nunca teria sido capaz de sair dela.
— Bastava um único telefonema, — eu disse com a voz
rouca. — Uma carta.
— Acho que você realmente nunca entendeu como era a
minha casa, — ela respondeu com uma careta. — Fiquei
doente por desafiar meus pais. Era como se, no minuto em
que eu fizesse algo errado, eles saberiam, e o pânico disso era
uma coisa física. A única vez que consegui fazer isso foi com
você. Você me fez sentir segura. Você me fez sentir que as
consequências valeriam a pena, e uma vez que estava fora do
meu alcance, perdi qualquer resquício de coragem que eu
tinha.
— Eu teria indo te pegar, — eu rosnei, minha garganta
apertada. — Eu teria chegado lá muito rápido.
— Eu entendo isso agora, — ela respondeu, com
lágrimas caindo em seu rosto. — Mas não sabia na
época. Precisei de cada fragmento de coragem e
autoconfiança que tinha para ir contra a vontade deles e
manter Rhett, depois disso, eu não tinha mais nada. Nem
para você, nem para ninguém.
Esfreguei o rosto e percebi que minhas mãos
tremiam. Eu sabia que os pais dela eram terríveis. Eu sempre
soube disso. Mas acho que nunca reconheci quão ruins eles
eram. Eles não tinham sido apenas mesquinhos, rígidos ou
tacanhos. Eles controlavam a ponto de deixar sua única filha
com muito medo de fazer qualquer uma de suas próprias
escolhas. A percepção foi como um soco no queixo.
— Uma vez, quando falei sobre conseguir um emprego e
ter minha própria casa, — Emilia disse, sua voz quase
inaudível na cozinha silenciosa. — Eles começaram a discutir
o quão jovem eu era para ser mãe e mal equipada para lidar
com isso sozinha, e o quanto eles estavam mais preparados
para criar Rhett. — Seus olhos encontraram os meus e sua
respiração falhou. — Então, nunca mais toquei no assunto.
Levou tudo que eu tinha para não jogar alguma
coisa. Bater em alguma coisa. Rasgar algo. Esses filhos da
puta.
— Depois que eles se foram, levei um minuto para
colocar meus pés debaixo de mim, — disse ela, encolhendo os
ombros. — Eu ainda estava com tanto medo de fazer a
escolha errada, mesmo que eles não estivessem lá para me
punir por isso.
— Venha aqui.
— Eu não sabia mais como tomar minhas próprias
decisões, — ela disse, me ignorando. — E eu não queria
simplesmente aparecer aqui, fraca e inútil, para que você
pudesse tomar minhas decisões por mim.
— Venha aqui, Emília.
Ela balançou a cabeça apenas uma vez. — Então eu
consegui um emprego, — ela disse com um acesso de
raiva. — Foi em um clube de strip. — Ela ignorou meu
empurrão assustado. — Eu era apenas garçonete, mas as
gorjetas ainda eram boas, e eu podia deixar Rhett com a
vizinha e ele gostava disso. Ela era doce e mais velha, e eles
assistiram desenhos animados até ele adormecer. Era
divertido para ele, e eu podia trabalhar, e estava tudo
bem. Estava tudo bem. — Suas palavras continuaram saindo,
cada vez mais rápidas enquanto ela olhava para o nada. —
Mas aí o gerente começou a ficar pegajoso e controlador, e eu
não gostei. De forma alguma. Ele finalmente me encurralou
no corredor dos fundos e dei uma joelhada nas bolas dele e
nunca mais voltei. Ele me assustou tanto que peguei todo o
dinheiro que tinha e saímos da cidade.
— Doçura, venha aqui, — eu bati, finalmente chamando
sua atenção.
— Você vai me estrangular? — ela perguntou com uma
risada ofegante e desconfortável, caminhando em minha
direção.
Apenas o ato de puxá-la em meus braços fez a raiva em
meu peito diminuir de um tsunami para um rugido
silencioso.
— Eu estava preocupada que ele fosse nos seguir, — ela
disse com um bufo envergonhado. — Então pegamos o
caminho mais longo até aqui. Estúpido, eu sei. Mas ele
parecia muito mais assustador no Arizona. Ele conhecia todo
mundo, e acho que gostava de merda que eu nunca vi. Não
sei, as pessoas tinham medo dele e sabia que ele
provavelmente estava muito chateado por eu ter recusado.
— Qual o nome dele? — Eu perguntei, correndo meus
dedos por seu cabelo. Uma pequena viagem ao Arizona não
seria grande coisa. Eu poderia estar lá e voltar em alguns
dias e tinha certeza de que Rumi adoraria ir junto.
— Não importa, — ela disse suavemente, seu corpo
relaxando no meu. — Estamos aqui e ele é apenas mais uma
lembrança ruim.
— Você quer que eu o verifique?
— O que você quer dizer? — ela perguntou, inclinando a
cabeça para trás para olhar para mim. Porra, ela era
linda. Mesmo com os olhos vermelhos e o rosto manchado de
tanto chorar, era quase assustador ver quão bonita ela era.
— Quero dizer, o clube tem recursos e podemos verificar
se ele ainda está fazendo sua merda no Arizona e continua
assim.
A expressão em seu rosto estava lá e desapareceu em
um instante, mas eu ainda sabia exatamente o que havia se
passado por sua mente. Apertei meus braços ao redor dela.
— Temos contatos por toda parte, doçura, mas eles não
têm ideia de como encontrar um empresário de classe média
que nem sequer teve a porra de uma multa por excesso de
velocidade. Você poderia estar em qualquer lugar. — Afastei
seu cabelo do rosto. — Mas algum idiota que dirige um clube
de strip em Nowheresville, Arizona, eu poderia descobrir
muito sobre esse cara.
— Morávamos em Mesa, não em Nowheresville.
— A mesma merda.
Sua pequena risada enxugou o que restava da minha
raiva, deixando-me o mais calmo que já estive desde que ela
apareceu com Rhett.
— Claro, — ela disse com um suspiro. — Você pode
investigá-lo.
— Não estava pedindo permissão, — eu brinquei.
— Você não saberá quem procurar se eu não disser o
nome dele.
— Não deve haver tantos clubes de strip em Mesa.
— Você ficaria surpreso, — ela retrucou, sorrindo.
— Estou feliz que você não estava dançando, — eu disse
com um suspiro, puxando-a comigo enquanto me recostava
contra o balcão. — Você é flexível, mas tem um ritmo terrível.
— Isso é inequivocamente falso, — ela argumentou, seu
sorriso se transformando em uma carranca. — Eu sou uma
ótima dançarina.
— Claro que você é, — eu respondi, meus lábios se
contraindo.
— Eu sou!
— Eu sei.
— Pare de concordar comigo.
— Você é uma ótima dançarina, — eu disse, tentando
manter minha voz séria. — Peço desculpas.
— Eu totalmente poderia ter dançado no clube, — ela
bufou. — Se eu quisesse.
— Prefiro vê-la em um poste, — respondi sem pensar.
Ela me beliscou com força. — O que? Não é como se eu
quisesse que mais alguém te visse. Mas pole dance é gostoso
pra caralho e aposto que você seria boa nisso.
— Como essa é uma conversa que estamos tendo? — ela
perguntou incrédula.
— Nenhuma porra de pista.
Ela deitou a cabeça no meu peito. — Eu sei que ainda
não estamos bem, — ela disse com um suspiro. — Mas ainda
me sinto um pouco melhor.
— Isso é o que o jantar com meus avós fará por você.
— Isso ajudou, — ela concordou. — Mas falar sobre
merda ajudou ainda mais.
— Sim.
— Obrigada, — ela respirou.
— Pelo que?
— Por tudo. Há um milhão de maneiras diferentes e
horríveis de tudo isso ter acontecido. — Ela inclinou a cabeça
para trás para olhar para mim. — Acredite, eu imaginei a
maioria delas.
Eu zombei. — Não para nós.
— Eu ainda estou com medo, — ela disse com um
suspiro. — Mas não disso. Não de você.
— Realmente? — eu murmurei. — Porque eu estou
apavorado como o inferno.
Capitulo 9

EMÍLIA

Após nossa discussão na cozinha, Michael e eu


chegamos a uma trégua tácita e as coisas ficaram
surpreendentemente... normais. Ou pelo menos nossa versão
da palavra.
A casa de Michael se transformou quando eu
desempacotei o Subaru pouco a pouco e pequenos carros,
blocos de construção e bichos de pelúcia estavam espalhados
pela casa. Uma cesta de brinquedos de banho encontrou um
lugar embaixo da pia do banheiro principal, o único banheiro
com banheira. Os sapatos de Rhett e os meus ficaram
emaranhados com os de Michael em uma pilha perto da porta
da frente.
Ia fazer compras e comecei a fazer o jantar para nós
três. Michael ia trabalhar e voltava para casa cheirando a
garagem. Levei Rhett para visitar Heather e liguei para várias
pré-escolas — ele não tinha idade para nenhuma delas e
fiquei secretamente aliviada. Eu não estava pronta
ainda. Michael levava Rhett para a rede quando não estava
chovendo e metade do tempo Rhett adormecia enquanto eles
balançavam preguiçosamente de um lado para o outro.
Se eu encarava um pouco demais quando Michael
lavava as mãos antes do jantar, hipnotizada pela maneira
como ele esfregava seus antebraços musculosos, ele não
mencionou isso. Quando seus olhos quase saltaram das
órbitas depois que Rhett me jogou água do banho, deixando
minha camisa branca quase transparente, eu também não
disse uma palavra. Fizemos parceria em tarefas que exigiam
de nós dois e, de outra forma, orbitávamos um ao redor do
outro, próximos, mas nunca próximos demais.
O jantar de quarta-feira na casa de Callie e Grease
estava um verdadeiro caos. As crianças corriam de uma
ponta a outra da casa e primos, tias e tios enchiam cada
ambiente. Suas vozes encheram a casa do chão ao teto, uma
sinfonia que eu nunca pensei que ouviria novamente.
Apenas duas pessoas tinham me encurralado, as tias de
Michael, Molly e Rose. As duas eram como noite e dia, Rose
fazia perguntas pontuais, senão agressivas, enquanto Molly
falava sobre o assunto, mas basicamente perguntava as
mesmas coisas. Não fiquei surpresa com suas perguntas ou
com o fato de terem de alguma forma me separado do resto
do grupo, mas fiquei surpresa com a maneira como Michael
imediatamente notou e me salvou. Ele ficou de guarda a noite
toda, os ombros e o pescoço visivelmente tensos, mas achei
que tudo tinha corrido surpreendentemente bem.
Eu não estava tão otimista para as festividades no
clube, no entanto. Olhei para minhas roupas espalhadas na
cama, minhas mãos nos quadris. Eu não tinha muito, nunca
precisei de muito, mas agora me perguntava se deveria ter
comprado algo novo para vestir. O problema é que eu não
fazia ideia do que alguém usava em uma festa em um moto
clube. Não era como se eu tivesse uma camiseta da Harley no
meu guarda-roupa. Nenhuma das minhas camisas era de
marca, para ser sincera.
Muito tempo atrás, eu tinha visto as mulheres que
lotavam as festas do clube em suas minissaias e shorts
curtos, mas mesmo se tivesse isso - e eu não tinha - não os
usaria. Por um lado, estava frio lá fora e eu ainda estava me
acostumando com as temperaturas do Oregon
novamente. Por outro lado, usar uma minissaia enquanto
perseguia uma criança de dois anos soava como um mau
funcionamento do guarda-roupa prestes a acontecer. Além
disso, eu era a mãe de alguém. Eu gostava de me sentir sexy
tanto quanto qualquer outra garota, mas meus dias exibindo
minha bunda estavam principalmente no passado.
Sentei-me na cama bufando.
— Ei, minha prima Charlie passou aqui, — disse
Michael, entrando no quarto sem bater. — Ela deixou um
monte de roupas... — Sua boca se fechou quando ele
percebeu que eu estava sentada lá de calcinha.
— É por isso que batemos, — murmurei, meus lábios se
contraindo enquanto ele olhava. O saco de lixo preto em sua
mão caiu no chão com um baque.
— Rhett está pronto, — ele disse, seu rosto virando para
o lado. — Eu pensei em você também estava.
— É mais fácil se eu apenas prepará-lo primeiro, — eu
expliquei. — Então não preciso me preocupar com isso.
— Faz sentido. — Ele assentiu com a cabeça, os olhos
ainda na parede.
— Você vai sair para que eu possa me vestir? — Eu
perguntei divertida. Em qualquer outro momento eu
provavelmente teria ficado envergonhada ou constrangida por
estar sentada ali com meu sutiã esfarrapado e calcinha, mas
ele estava claramente desconfortável o suficiente por nós
dois.
— Sim, eu só... — Quando ele se virou para sair, sua
bota prendeu na lateral do saco de lixo e ele tropeçou. Eu não
pude evitar a gargalhada que saiu da minha boca.
— Cale a boca, — ele resmungou enquanto se
desembaraçava e saía do quarto.
Assim que ele se foi, pulei e peguei o saco, jogando-o
sobre a cama. A mãe de Michael havia mencionado que
Charlie ia passar algumas roupas que não usava mais, mas
eu não fazia ideia de que ela mandaria tanta coisa. Um
pedaço de papel preso sob uma blusa preta de gola alta
chamou minha atenção e o puxei da pilha.
Você não pode parecer uma merda se estiver trabalhando
em um dos meus carrinhos – Charlie
Eu sorri quando deixei cair o papel de volta na cama. Eu
tinha falado com Charlie alguns dias antes sobre trabalhar
para ela como barista, mas ela não tinha me dado uma
resposta até agora. Eu não a culpei. Eu nunca tinha feito café
antes e tinha certeza de que a família dela me via como um
risco de fuga.
Enquanto separava as roupas, jeans e shorts, blusas de
manga comprida, camisetas, regatas e até uma jaqueta,
percebi que não precisaria comprar nada novo. Ela me deu as
roupas que não usava e era o dobro do que eu possuía
atualmente. Eu não tinha tantas roupas desde antes de Rhett
nascer.
— Temos que ir, — Michael gritou pela porta, batendo
duas vezes.
— Já estarei aí, — respondi, olhando freneticamente
para as roupas.
Eventualmente, peguei um jeans bootcut e o vesti. Ele
estava um pouco apertado nas coxas e na bunda, mas eu
poderia abotoá-lo e fechar o zíper, então imaginei que
provavelmente ficariam bem. Eu gostaria de ter um espelho
de corpo inteiro enquanto combinava o jeans com uma
camisa preta canelada. Também era confortável, mas não
apertada. Fiquei meio surpresa que as roupas se
encaixassem tão bem. Charlie sempre pareceu tão pequena.
— Mamãe, — disse Rhett enquanto irrompia pela porta,
já vestindo o casaco. — Está atrasado!
— Você pode realmente se atrasar para um churrasco?
— Eu perguntei curiosamente.
— Você pode se estiver levando a merda do cachorro-
quente, — Michael respondeu do corredor. — As crianças vão
se revoltar se não chegarmos a tempo.
— Ok, estou pronta, — eu disse, pegando a jaqueta
verde oliva de Charlie.
Vesti o casaco enquanto caminhávamos pela casa e,
alguns minutos depois, estávamos na caminhonete de
Michael e nos dirigimos para a sede do clube.
A viagem pareceu mais curta do que eu gostaria e,
quando estacionamos no cascalho na frente, limpei minhas
mãos suadas nas coxas da minha calça jeans. Eu já tinha
visto a maior parte da família de Michael, mas já podia ver
que esse grupo era muito maior. Havia homens e mulheres do
lado de fora, sentados em bancos de piquenique e
perambulando em volta de churrasqueiras dispostas na
grama. As crianças brincavam em pequenos grupos ao seu
redor.
— Relaxe, — Michael disse enquanto descia da
caminhonete. — Só vai doer por um segundo.
— Haha, muito engraçado, — eu murmurei enquanto
deslizava atrás dele.
Tirei Rhett de seu assento enquanto Michael puxava o
isopor da carroceria da caminhonete e então o segui até a
multidão.
— Pequeno Mick, — um homem mais velho chamou. —
Já era hora. Você está com os cachorros?
— Estou, — Michael confirmou, lançando-me um olhar
enquanto levantava o cooler mais alto.
— E quem é este? — o homem perguntou, olhando para
Rhett e depois para mim.
Eu o conhecia. Ele era um familiar distante de Michael e
eu tinha certeza que já tínhamos nos encontrado antes. Eu
nunca esqueceria a cicatriz que dividia seu rosto, mas não
conseguia lembrar o nome dele.
— Este é meu filho Rhett, — Michael disse, seu peito
estufando um pouco. Meus lábios se contraíram. — E sua
mãe, Emilia. — Ele olhou para Rhett. — Este é Leo, ele é
casado com a prima do meu pai, Lily.
— Certo, nós já nos conhecemos, — Leo disse para
mim. Eu não conseguia ler seu tom. — E prazer em conhecê-
lo, Rhett.
Rhett encostou-se à minha coxa. — Dodói. — Ele
apontou para o rosto de Leo.
Quase gemi de mortificação, mas Leo nem se mexeu. Ele
se agachou até ficar no nível de Rhett. — Nah, grande
homem, — disse ele facilmente. — Não dói. — Ele cutucou
seu rosto. — Tudo bem, ok?
— Você quer que eu deixe os cachorros aqui? — Michael
perguntou, colocando o refrigerador para baixo.
— Sim, você trouxe os pães? — Leo se levantou. Michael
os tirou do refrigerador em resposta. — Dê isso para as
mulheres lá dentro, — Leo ordenou.
Michael os entregou para mim e fiquei ali sem jeito por
um momento.
— Você pode leva-los? — ele perguntou enquanto
puxava pacotes de cachorros-quentes para fora do
refrigerador.
Eu queria olhar para ele e dizer não. Estávamos no
clube há menos de cinco minutos e ele já estava me
dispensando? Que porra? Mas quando olhei para Leo, que
estava me observando atentamente, percebi que era um teste.
— Claro, — eu disse, agarrando a mão de Rhett.
Atravessei o pátio carregando sacolas de pães de
cachorro-quente e poderia jurar que estava sendo
observada. Parecia que cada pessoa tinha os olhos nas
minhas costas enquanto eu subia as escadas que levavam à
porta do clube.
Se achei que estava lotado lá fora, estava
enganada. Dentro estava o caos. As crianças corriam por toda
parte, homens e mulheres sentavam-se nas mesas,
conversando e rindo, e no centro de tudo, a avó de Michael,
Callie, e a tia-avó Farrah mantinham a corte.
Parei na porta e deixei meus olhos se ajustarem ao
interior escuro, olhando para a sala. Os irmãos de Michael
não estavam em lugar nenhum, mas suas tias estavam
entrando e saindo do que eu assumi ser a cozinha,
carregando grandes tigelas para o bar que ocupava toda a
extensão da sala. Eu fui nessa direção.
— Mamãe, me abrace? — Rhett perguntou, puxando
minha mão. Eu não o culpava
Desejei que alguém pudesse me carregar pela sala.
Eu o levantei no meu quadril e caminhei em direção ao
final do bar, quase desviando quando um velho se virou para
mim.
— Merda, — eu gritei. — Desculpe.
— Não precisa se desculpar, querida, — ele disse com
uma risada rouca. — Minha culpa. — Seus olhos azuis
brilharam enquanto ele nos observava. — Vocês devem ser
Emilia e Rhett. Sou o tio do Michael, Casper. Acho que nos
conhecemos há muito tempo.
— Nós conhecemos, — eu disse, reconhecimento
surgindo. Não sei como esqueci esses olhos. O azul era
impressionante contra sua pele bronzeada.
— Parece que você está prestes a cair, — ele brincou,
gesticulando para a criança agarrada a mim com unhas e
dentes. — Você precisa de alguma ajuda?
— Tenho que levar isso para as mulheres, — eu disse,
sacudindo os pães.
— Basta jogá-los em cima do bar, — ele disse,
apontando com o queixo em direção a ele.
— Essas abutres vão encontrá-los.
Fiz o que ele ordenou e usei as duas mãos para
reassentar Rhett, que estava observando algo por cima do
meu ombro.
— Ei, amigo, — disse Casper, estendendo a mão para
dar um tapinha nas costas de Rhett. — Você quer ir brincar
com as crianças? — Quando Rhett se virou para olhar para
ele, o sorriso de Casper cresceu e sua voz suavizou ainda
mais. — Tenho alguns netos por aqui em algum lugar para
você brincar.
Rhett olhou para mim e eu assenti.
— Droga, ele parece seu pai, — disse Casper com uma
risada.
— Você acha? — Eu brinquei enquanto colocava Rhett
de pé.
— Agora, eu sei que há muitos deles, — disse Casper
enquanto estendia a mão e segurava a de Rhett. — Mas você
aprenderá quem é quem.
Eles se afastaram e de repente me senti nua. Eu estava
acostumada com Rhett grudado em mim como uma
craca. Minhas mãos pareciam vazias. Nua.
— Você chegou, — Heather gritou do outro lado da sala,
chamando minha atenção acenando com os braços sobre a
cabeça. — Onde está meu neto?
Caminhei até ela, ignorando os olhares curiosos que
recebi ao redor da sala. Se as pessoas aqui dentro não
tinham me notado antes, com certeza notaram agora. — Ele
acabou de fugir com Casper, — eu disse a ela enquanto ela
me puxava para um abraço. — Eles iam encontrar algumas
crianças.
— Há o suficiente delas, — disse uma mulher
secamente.
— Ele correrá por aqui com um bando delas em algum
momento, — disse Heather, apertando minha mão. — Ok, eu
sei que você conhece algumas dessas pessoas, mas vou
apresentar a todos de qualquer maneira. Essa é Trix no sofá,
depois Lily, Brenna, Molly e Rose, você já se conhece, é claro,
e Kara.
— Ei, — eu disse, acenando desajeitadamente.
— Bem-vinda, querida, — Brenna disse gentilmente. —
Não se preocupe, você vai decorar todas eventualmente.
— Ei, você também trabalha, — brincou Lily.
— Emilia, — uma voz explodiu atrás de mim. Eu não
tive tempo de me virar antes de braços fortes agarrarem
minha cintura e me levantarem do chão.
— Rumi, — Heather disse exasperada enquanto Rumi
me carregava. — Você é um pé no saco.
— Ela é minha amiga, — ele argumentou, nem mesmo
parando. — Ela não quer ficar com um monte de garotas. —
Eu bufei enquanto ele continuou me carregando em
direção à porta da frente.
— De nada, — disse ele, colocando-me de pé quando a
alcancei. Ele não me deixou ir, seu braço pesado em meus
ombros enquanto caminhávamos para fora.
— Pelo que? — Eu perguntei secamente. — Sua mãe
acabou de me apresentar a todas.
— Essas são as mulheres mais intrometidas da face do
planeta, — disse ele, arrastando-me para uma mesa de
piquenique. — Eu te salvei.
— Se você diz. — Examinei o quintal em busca de
Michael e o encontrei conversando com um grupo de homens
perto das churrasqueiras.
— Emmy Lou, — Rumi disse, puxando minha atenção
de volta. — Esta é Nova...
— Já nos conhecemos, — disse Nova com um
sorriso. Meu estômago revirou com culpa mesmo quando
sorri de volta.
— Gray e Olive, — Rumi continuou. — Charlie, você
deve conhecer, já que está usando a jaqueta dela.
A velocidade com que meu rosto se inflamou em um
vermelho profundo só aumentou meu embaraço.
— Você é um idiota, — disse Charlie, revirando os
olhos. — Jesus, Rumi.
— Huh, — Rumi brincou, jogando a perna por cima do
banco para que ele pudesse se sentar. — Mamãe acabou de
dizer a mesma coisa.
— Fica melhor em você do que em mim, — Charlie disse
generosamente. — Sente-se.
— Obrigada, — eu murmurei. — Prazer em conhecê-los,
Olive e Gray.
— Ei, — Gray retornou, acendendo um cigarro.
— Você também, — disse Olive com um sorriso. — e não
se preocupe, as roupas são passadas como loucas por
aqui. Não é grande coisa.
— Quase ninguém quer minhas merdas, no entanto, —
Charlie disse com uma risada.
— Isso é porque não cabe em nenhuma de nós, — Nova
apontou. ela olhou para mim. — Você é sortuda. Charlie
sempre tem as melhores coisas e nenhuma de nós pode se
encaixar nisso.
— Não é com a bunda que você tem que se preocupar,
— argumentou Olive. — Tudo é muito curto.
— Podemos parar de falar sobre roupas? — Rumi
perguntou, se afastando para que eu pudesse sentar ao lado
dele.
— Você tocou no assunto, Einstein, — eu disse, dando-
lhe uma cotovelada no lado.
— A única razão pela qual reconheceu esse casaco é
porque foi você quem deixou cair um baseado aceso na
manga e deixou essa marca, — disse Charlie, apontando para
o meu braço.
Eu nem tinha notado o pequeno buraco com bordas
pretas no ombro.
— Culpado. — Rumi esticou os braços acima da cabeça
e as tatuagens apareceram nas bordas das mangas. — Não
deveria ter esbarrado em mim.
Charlie revirou os olhos. — Onde está Rhett? — ela me
perguntou.
— Casper o levou para conhecer todas as crianças, — eu
disse, enrolando meus dedos no meu colo. Não conseguia vê-
lo em nenhum lugar do lado de fora, então ele ainda devia
estar no prédio. Eu sabia que havia pelo menos vinte adultos
de olho no bando de crianças, mas ainda era estranho não
saber exatamente onde ele estava e o que estava fazendo.
— Oh, legal, — disse Charlie, balançando a cabeça. —
Meu pai vai se certificar de que ele esteja bem antes de deixá-
lo sozinho. Não se preocupe, ele vai se encaixar
perfeitamente.
Eu balancei a cabeça, meus olhos involuntariamente
voltando para onde Michael estava. Eu realmente não tive
tempo de olhar para ele direito antes de sairmos de casa, e
provavelmente não foi a ideia mais inteligente deixar meus
olhos percorrê-lo em uma multidão cheia de pessoas, mas eu
não deixei que me parasse. Ele estava usando jeans que
caíam em seus quadris, mas de alguma forma ainda eram
apertados o suficiente para mostrar sua bunda e coxas
musculosas, e um moletom cinza escuro que ele tinha
puxado para cima em seus antebraços. Eu não sabia por que
essa parte do corpo dele me dava água na boca desse jeito,
mas não estava triste com isso. Algo sobre os músculos ali,
afinando em pulsos grossos e mãos grandes... sim, eu
precisava pensar em outra coisa. Em cima do moletom estava
o colete de couro com o qual ele nunca saia de casa sem.
— Aquele é meu irmão, — Rumi disse, me cutucando no
lado. — Você poderia não?
— O que? — Eu bati, olhando de volta para a mesa.
— Está dez graus mais quente aqui fora, — Charlie
brincou, puxando a gola de seu suéter. — Droga.
— Então, — Olive brincou. — Morar juntos deve estar
indo muito bem.
— Eu não quero fazer parte dessa conversa, — disse
Charlie, levantando-se da mesa. — Ligue para mim e vamos
descobrir alguns turnos para você.
— Muito obrigada, — eu disse enquanto ela acenava
para mim.
— Você também vai trabalhar para a tia Charlie? —
Olive perguntou, tamborilando com as mãos na mesa. —
Talvez tenhamos o mesmo turno.
— Você trabalha lá?
— Sim, — ela sorriu. — Vou perguntar se posso treiná-
la. Vai ser divertido.
— Onde está o nosso menino? — Michael perguntou,
parando atrás de mim. Ele colocou as mãos nos meus
ombros e eu não pude evitar a forma como meu corpo
instintivamente inclinou-se para ele.
— Brincando com as crianças, — eu disse, olhando para
ele.
— Legal. Está pronta para comer?
Eu balancei a cabeça e deixei que ele me puxasse para
os meus pés.
— O que, nenhum olá para nós? — Nova brincou.
Eu tentei e falhei em manter a tensão em meus ombros.
— Ei, Nova, — respondeu Michael. — Olá, Olive. Gray.
— Você é hilário, — respondeu Olive, levantando-se.
— Irmão, — Rumi cumprimentou com um sorriso.
— Eu já te cumprimentei, idiota, — Michael riu, batendo
na cabeça de Rumi.
O nosso grupo acabou indo para o bar lá dentro, e o
nível de ruído era tão alto que eu mal conseguia me ouvir
pensar. Examinei a sala procurando Rhett, mas não o vi em
lugar nenhum.
— Eu vou procurá-lo, — disse Michael, inclinando-se até
que sua respiração fez cócegas no meu ouvido. — Você
mantém nosso lugar na fila.
Enquanto ele se afastava, passando pelo grupo de
pessoas que esperavam para pegar sua comida, eu me forcei
a desviar o olhar de sua bunda.
— Quando éramos crianças, — Rumi praticamente
gritou atrás de mim. — Costumávamos encher nossos pratos
primeiro.
— Sim, — respondeu Nova. — Quando diabos isso
parou de acontecer?
— Quando você se tornou adulta? — Olive perguntou
secamente.
— Estúpido, — Rumi reclamou.
Em poucos minutos, Michael estava de volta ao meu
lado e se inclinando para perto novamente. — Minha mãe
pegou um prato para ele e ele está comendo com vovó. — Sua
mão agarrou meu quadril e deu um leve aperto, e tudo dentro
de mim congelou.
Então o momento acabou e ele estava olhando por cima
do ombro para dizer algo a Rumi. Olhei fixamente para o
chão, tentando me convencer a não sentir a sensação que
estava se espalhando por meus membros.
Estávamos indo bem e fazendo as coisas funcionarem
enquanto dividíamos uma casa, mas algo parecia diferente no
clube. Era como se, ao passarmos pelo pátio, nos
tornássemos uma unidade. Nossa pequena família de três,
uma parte das coisas, mas também um pouco
separada. Pensei na maneira como ele colocou as mãos no
meu ombro, a mão nas minhas costas quando entramos no
prédio, na maneira como ele foi verificar Rhett e depois voltou
direto para me contar sobre nosso filho estar bem e já
comendo, a mão no meu quadril.
Como se ele estivesse nos reivindicando para todo
mundo ver.
Era perigoso cair nesse sentimento. Eu sabia. Eu não
conseguia parar, no entanto.
— Juro por Cristo, — Michael disse em meu ouvido, me
assustando. — Meu irmão poderia reclamar sobre o nascer do
sol.
— Ele provavelmente reclama, — eu respondi bufando,
virando-me para ele.
Foi um erro logístico, mas uma vez feito, não havia como
voltar atrás. Nossos rostos estavam a apenas alguns
centímetros de distância.
— Você está com fome? — ele perguntou, seus lábios se
curvando em um canto. As palavras eram inocentes, o tom
não.
— O que há no cardápio, — eu murmurei de volta,
olhando para aquele meio sorriso.
— O céu é o limite... — ele começou a dizer antes de
uma grande mão bater em suas costas, nos interrompendo.
— Tem um minuto? — seu pai perguntou, olhando entre
nós.
— Claro, o que há? — Michael perguntou.
Tommy apontou com o queixo para a porta atrás de nós
e Michael o seguiu para fora do prédio.
— O que foi isso? — Rumi perguntou, inclinando-se ao
lado do meu ombro.
— Nenhuma ideia. — Dei de ombros.
Em segundos, Rumi estava seguindo seu pai e irmão
para fora do clube.
Não pensei muito nisso enquanto a fila avançava
lentamente, mas quando enchi meu prato e me dirigi para as
mesas onde Rhett estava sentado com Callie e Michael ainda
não havia retornado, comecei a ficar um pouco
nervosa. Quando terminamos de comer, um pequeno nó se
formou na boca do meu estômago.
Foi quase um alívio quando Michael voltou para dentro,
ou teria sido se seu corpo inteiro não parecesse vibrar de
raiva. Procurei em seu rosto uma pista do que estava
acontecendo quando ele parou em nossa mesa.
— Vamos lá fora comigo? — ele perguntou, olhando para
sua avó.
— O que está acontecendo? — ela perguntou.
— Nada grande, — ele a assegurou. — Você poderia
observar Rhett por um minuto?
— Ir lá fora, — disse Rhett, tentando sair da cadeira. ele
deve ter lido algo que não gostou na expressão de Michael,
porque fazia dias desde que ele se preocupava comigo saindo
do seu lado.
— Você fica dentro de casa com a vovó, — Michael
ordenou. O rosto de Rhett se contorceu em uma carranca.
— Eu já volto, baby, — eu disse a ele, inclinando-me
para beijar sua testa. — Por que você não vai brincar com as
crianças?
Michael me rebocou até a porta aberta enquanto minha
mente disparava. O que poderia ter acontecido para que ele
precisasse de mim?
Estávamos no meio do pátio quando percebi.
Capitulo 10

MICHAEL

Eu soube no segundo que Emilia viu o idiota encostado


em seu carro no pátio. A mão dela apertou a minha, mas na
verdade fiquei meio impressionado por ela não ter parado. Ela
me seguiu por todo o caminho até que estávamos ao lado do
meu pai, avô, Rumi e Dragon, o presidente do clube.
— Emilia, — o idiota disse, ficando mais ereto. — Você é
uma garota difícil de encontrar.
Mais do que tudo, eu gostaria de ter encontrado o filho
da puta primeiro. Nós conversamos sobre as coisas quase
uma semana atrás, e eu disse a ela que iria checá-lo, mas a
merda esteve tão louca que não tive tempo. Eu mal tinha
pensado nisso.
— O que você está fazendo aqui, Parker? — Emilia
perguntou entredentes.
— Engraçado você perguntar, — ele disse com uma
risada. — Veja, você decolou e no dia seguinte, encontrei um
monte de dinheiro faltando no cofre.
— Besteira, — ela rebateu.
Meus lábios se contraíram. Eu esperava que qualquer
jogo que ele estivesse jogando não terminasse bem para ele. O
cara era um palhaço.
— Não deveria saber que meu escritório tem câmeras, —
disse ele em tom de conversa para meu pai.
Todo o sangue deixou o rosto de Emilia e qualquer
presunção que eu estava sentindo desapareceu em um
instante. Porra.
— Eu não roubei seu dinheiro.
— Devemos assistir? — ele perguntou
condescendentemente. Ele enfiou a mão no bolso e minha
mão foi instintivamente para a parte inferior das minhas
costas, mas tudo o que ele tirou foi o telefone.
— Você pode assistir o que quiser, — respondeu
Emilia. Ela estava tão perto de mim que eu podia sentir o
jeito que ela tremia, mas manteve a cabeça erguida.
— Ok, — disse ele com um encolher de ombros. Ele
começou o vídeo.
— Eu só peguei o dinheiro que você se recusou a me
pagar, — ela disse, seus lábios mal se movendo enquanto a
observávamos abrir o cofre e colocar a mão dentro. — Nem
um centavo a mais.
— Huh, — o idiota murmurou. — Parece mais do que
isso.
— Eu trabalhei vinte e oito horas, — ela disse, olhando
para meu pai, meu avô, Dragon. Ela parecia à beira das
lágrimas, mas continuou. — Dezoito dólares a hora. São
quinhentos e quatro dólares. Peguei quinhentos.
— Vamos lá, — Parker, ou qualquer merda que seu
nome debochou. — Não há razão para mentir. Tenho provas
aqui.
— Eu não peguei mais do que você me devia.
— Pague de volta os cinco mil dólares que você pegou e
todos nós podemos simplesmente ir embora, — ele respondeu
categoricamente, toda a emoção se foi. Havia algo em seus
olhos que não gostei. Ele parecia gostar de deixar Emilia
nervosa, pressionando-a. O filho da puta estava debochando.
— Cinco mil? — Emilia gaguejou, com os olhos
arregalados.
— Que tal você se foder e correr de volta para o Arizona,
— meu irmão disparou. Meu pai colocou a mão em seu
ombro e Rumi ficou quieto.
— Você só pegou o que era devido? — Dragon perguntou
a Emilia.
— Eu juro, — ela respondeu com a voz rouca. — Eu só
peguei quinhentos. Na verdade, ele ainda me deve quatro
dólares.
No momento em que o antigo chefe de Emilia percebeu
que não conseguiria o que esperava de nós, deu um passo à
frente. Cada um de nós ficou tenso, mas acho que posso ter
sido o único que esperava que ele realmente fizesse alguma
coisa. Desde o momento em que ele dirigiu até a sede do
clube, eu estive esperando por esse evento em particular. Nós
o ouvimos quando ele disse que Emilia havia roubado
dinheiro dele e ele foi convincente pra caralho, mas eu ainda
queria colocar minhas mãos nele. Mesmo enquanto me
perguntava se ela mentiu para mim sobre por que deixou o
Arizona, eu sabia que ela não estava mentindo quando
mencionou ter medo dele.
Não foi até que trouxemos Emilia para fora e ela olhou
para ele sem entender que eu percebi que tínhamos sido
enganados.
— Parece que você ainda deve quatro dólares a ela, —
Dragon disse, sua voz dura e calma. — Que tal terminarmos
as contas e todos nós podemos simplesmente ir embora.
Rumi riu.
— Eu não vou embora sem meu dinheiro, — Parker
murmurou teimosamente, olhando para Dragon e depois para
Emilia.
— Rapaz, — vovô disse com um bufo. — Você é
estúpido?
— Ele é, — Emilia murmurou baixinho.
— Você não está entendendo essa merda, — meu pai
disse com firmeza. Parker recuou surpreso com o veneno de
suas palavras. — E no caso de estar pensando em incomodar
meu filho e sua mulher novamente, não. O clube tem um
braço comprido e uma memória longa, porra.
— Isso ainda não acabou — vociferou Parker, abrindo a
porta do carro. — A polícia vai ficar muito interessada.
— Deixe-me pará-lo aí, — eu disse entre dentes,
fazendo-o parar. — Você estava pagando a Emilia por baixo
dos panos e suponho que paga a todos dessa forma
também. Tenho certeza de que isso não é exatamente
legal. Vovô?
— Com certeza não é, — vovô murmurou, olhando.
Ele ficou boquiaberto para mim como um peixe,
procurando algo para dizer.
— Não brinque comigo, — eu terminei. — Você não vai
gostar do resultado.
— Parker, — Emilia chamou enquanto ele se jogava no
carro. — Como você me encontrou?
O babaca zombou. — Cadela, se você estava tentando se
esconder, não deveria abrir sua boca para todos os outros
inúteis que eu emprego.
Apenas a mão do vovô no meu peito me impediu de tirá-
lo do carro.
Segundos depois, ele se afastou, espalhando cascalho
como um idiota.
— Não quero lidar com essa merda de novo, — Dragon
murmurou, lançando-me um olhar. — Perdi meu maldito
tempo.
— Sinto muito, — disse Emilia, com a voz falhando.
Dragon a ignorou enquanto caminhava de volta para a
sede do clube.
— Eu não queria... — As palavras de Emilia foram
cortadas quando meu pai colocou as mãos em volta da
cabeça dela, as palmas em suas bochechas, puxando-a para
mais perto para que ele pudesse beijar sua testa.
— Família cuida de família, — ele murmurou. — Não
importa se você pegou quinhentos ou cinco milhões,
certo? Acabou.
— Inferno, sim, nós cuidamos, — Rumi disse com um
sorriso.
Papai, vovô e Rumi foram embora, deixando-nos
sozinhos no meio do pátio.
— Eu não peguei cinco mil dólares, — disse Emilia,
virando-se para mim. — Eu juro, Michael. Eu só peguei o que
ele devia...
— Você não acha que deveria ter me avisado? — Eu
perguntei em frustração.
Eu pensei que tínhamos superado toda essa
merda. Achei que ela tinha me contado tudo. Em vez disso,
seu antigo chefe apareceu no clube enquanto estavam dando-
lhe as boas-vindas ao churrasco da família, dizendo que ela
roubou um monte de dinheiro. Jesus, Rumi estava certo
quando me lembrou que eu não a conhecia mais?
— Jesus Cristo, Emilia, — eu cuspi. — O que mais você
não está me dizendo?
— Nada, — ela respondeu rapidamente. — Nada, é isso.
— Certo, — eu murmurei, passando por ela. — Volte
para dentro.
A raiva que eu reprimi por anos borbulhou, e me vi
abrindo e fechando minhas mãos. Eu nunca machucaria
Emilia, nem em mil anos, mas toda a raiva que corria em
minhas veias precisava de uma maldita saída.
Ela estava no Oregon por uma semana e não disse
nada. Ela trouxe meu filho do Arizona com um alvo nas
costas e não disse nada. Tivemos muita sorte por ele ter
aparecido no clube. Aquele filho da puta poderia ter
aparecido em nossa casa a qualquer momento enquanto
Emilia e Rhett estivessem lá sozinhos, e eu não poderia fazer
nada. Ele poderia tê-los encontrado em algum motel barato
perto da interestadual antes mesmo de eu saber que Emilia
estava voltando para mim ou que Rhett existia. Pensei em
todas as vezes que voltava do trabalho enquanto Rhett
brincava no quintal, nas idas ao supermercado que Emilia
tinha feito sozinha, no jeito como ela se encolhia de alívio
quando dizia que eles finalmente chegaram, o jeito que ela
encobriu o fato de que seu chefe poderia estar procurando
por ela porque o recusou, o jeito que fui pego de surpresa
quando ele apareceu no clube pedindo para falar com quem
estava no comando. O brilho desagradável em seus olhos
enquanto observava Emilia se defender, assustada e trêmula.
— Vamos lá, — eu lati, agarrando a mão de Emilia. Eu a
reboquei atrás de mim de volta para a sede do clube.
— Sinto muito, — disse ela, lutando para
acompanhar. — Eu sei que deveria ter dito algo, mas...
— Falaremos sobre isso mais tarde, — eu resmunguei.
Eu me conhecia. Sabia que precisava controlar minhas
emoções antes de termos qualquer tipo de conversa. Minha
pele estava muito tensa sobre meus ossos, quase coçando,
tão quente que eu suava mesmo no ar frio.
Levei Emilia para a mesa e a deixei ao lado de minha
avó enquanto procurava por Rumi. Ele estava parado com
Nova nas mesas de bilhar e no minuto em que nossos olhos
se encontraram, ele assentiu. Ele deve ter reconhecido a
expressão no meu rosto, ele tinha visto isso antes.
— Dê isso para Emilia, — eu ordenei, jogando minhas
chaves para Nova.
— O que? — ela perguntou confusa, mal conseguindo
pegá-las. — Espere, por que você não pode dar a ela?
— Obrigado, No! — Rumi gritou por cima do ombro
enquanto nos afastávamos. — Te ligo mais tarde.
Rumi me deu um tapa nas costas quando saíamos do
clube.
— Vamos festejar como se fosse 1999, — ele cantou.
— Você trouxe a caminhonete?
— Por quê? — Ele sorriu. — Não quer andar na garupa
da minha moto?
— Nunca vai acontecer, porra.
Rumi revirou os olhos. — Eu trouxe Nova, — disse ele,
tirando as chaves do bolso. — E você sabe que ela não anda
de motocicleta, então sim. Eu trouxe a caminhonete.
— Ei, onde vocês estão indo? — Otto gritou enquanto
avançava para nos encontrar. — Acabei de chegar!
— Vou rasgar alguma merda, — Rumi respondeu
jovialmente.
— Tudo bem? — Otto me olhou atentamente.
— Só vou desanuviar um pouco, — eu murmurei. —
Você pode me fazer um favor?
— Depende do favor.
— Você pode ficar na minha casa esta noite até eu
chegar?
— Você está brincando comigo?
— Vou explicar tudo mais tarde, — prometi, olhando
para trás. Eu tinha a sensação de que a qualquer momento
Emilia nos seguiria para fora e eu realmente não queria
discutir isso com ela novamente. — Apenas fique de olho nas
coisas.
— Tomar conta da sua ex, você quer dizer, — Otto
resmungou.
— Apenas faça isso, sim?
— Não é como se eu tivesse escolha, — ele respondeu,
jogando os braços no ar.
— Você realmente não tem, — Rumi meditou, socando-o
levemente no estômago.
— Obrigado, turbo, — eu disse a Otto enquanto ele
caminhava para trás em direção ao clube.
— Jesus, você nunca vai parar de me chamar assim? —
ele cuspiu, sem esperar por uma resposta enquanto se
virava.
— Você nos disse para chamá-lo de Turbo, — Rumi o
lembrou.
— Eu tinha cinco anos, — Otto gritou por cima do
ombro, nos mostrando o dedo do meio.
— Você acha que é uma boa ideia? — Rumi me
perguntou quando entramos em sua caminhonete. — Enviar
Otto para ficar com Em?
— Melhor do que ninguém, — murmurei, tirando o
cabelo do rosto. — Acho que aquele filho da puta já está
voltando para o Arizona, mas prefiro que alguém esteja com
eles em casa, caso ele esteja se sentindo esperto.
— Podia ter pedido ao papai.
— Papai teria os levado para sua casa, — eu disse com
um suspiro enquanto tentava evitar que meu joelho
saltasse. — E suponho que Emilia vai precisar de um tempo
de inatividade depois daquele show de merda que acabamos
de testemunhar.
— Não posso acreditar que nossa pequena Em roubou
dinheiro do cofre em um clube de strip-tease, — Rumi
respondeu com uma risada. — Não pensei que ela tivesse isso
nela.
— Estúpido pra caralho, — eu murmurei. — Tenho a
sensação de que se ele a tivesse pego em flagrante, não teria
chamado a polícia.
— Sorte que ela veio direto para casa, hein? — Rumi
disse, olhando para mim.
— Sim, muita sorte. Pena que ela não me disse nada
sobre isso.
— Sentindo-se fora do circuito, irmão mais velho?
— Estou me sentindo como se eu devesse saber que ela
roubou dinheiro de algum idiota que é fodido o suficiente
para dirigir mil milhas para conseguir essa merda de volta, —
eu respondi. — Ele poderia tê-la alcançado a qualquer
momento.
— Ele não o fez.
— Ele poderia ter.
— Onde você está com Emilia? — Rumi perguntou
depois de uma longa pausa. — Vocês dois voltaram a ficar
juntos?
— Não.
— Pareci no clube.
— Não voltamos a ficar juntos.
— Morando juntos.
— Estritamente sem toques.
— Isso não vai durar muito.
— Por que você está tão interessado?
— Porque estou esperando que você descubra. — Ele fez
uma pausa. — Além disso, há uma aposta...
— Você está apostando em nós, — respondi
categoricamente.
— Em mais de uma maneira. — Ele riu. — Eu imaginei
que você arrancaria sua cabeça dentro de vinte e quatro
horas. Na verdade, estou meio impressionado com quanto
tempo você resistiu.
— Não podemos simplesmente continuar de onde
paramos, Rum, — eu disse baixinho. — Não funciona assim.
— Não vejo por que não. Você a ama, ela ama você,
vocês dois amam Rhett. Boom. Família instantânea.
— Eu provavelmente sempre a amarei...
— Ela é fácil de amar, — ele disse simplesmente.
— Mas ela fugiu, cara, — eu o lembrei. — Não tenho
certeza se isso é perdoável, certo?
— Tudo bem, — Rumi disse sério. — Então, qual é o
plano?
— Nenhuma ideia. Quebrar a merda, eu acho.
Encostei a cabeça no assento e fechei os olhos,
contando de cem para trás.
Capitulo 11

EMÍLIA

Sentei-me ao lado de Callie, surpreendentemente


entorpecida. Depois de me preocupar durante a
última semana e meia que Parker nos encontraria, de alguma
forma empurrei isso para o fundo da minha mente uma vez
que estávamos a salvo na casa de Michael. Eu tinha ficado
confiante demais.
Eu deveria saber que no minuto em que baixasse minha
guarda, algo aconteceria. O fato de que ele realmente veio até
o clube me surpreendeu. Por alguma razão, achei que apenas
minha associação com o clube seria suficiente para impedi-lo
de nos incomodar.
Cinco mil dólares. Que saco de merda mentiroso. Peguei
o que ele me devia e nem um centavo a mais. O que me
incomodou na coisa toda não foi nem o fato de ele ter
mentido ou nos seguido até aqui. Foi o brilho em seus olhos
quando ele viu meu nervosismo. Parker não precisava do
dinheiro que eu peguei. Era meu, e nós dois sabíamos
disso. Ele estava chateado por não ter vencido. Que ele fez
uma jogada, e o recusei e então, quando ele tentou forçar a
situação, fugi e não havia nada que ele pudesse fazer sobre
isso. Nós escapamos, e eu fui paga, e isso o matou. Isso o
deixou furioso, e eu estava começando a ver que também o
tornava imprevisível.
— Ei, Emília? — Nova disse, vindo atrás de mim. —
Micky me pediu para te dar isso. — Ela colocou as chaves de
Michael sobre a mesa.
— O que? — Eu perguntei sem expressão. — Onde ele
está?
Nova encolheu os ombros. — Ele saiu com Rumi.
— Ele deixou o complexo? — Eu perguntei em descrença
enquanto me levantava. — Tem certeza?
— Tenho certeza, — ela respondeu desconfortavelmente.
— Onde diabos ele iria? — Olhei para Callie, mas ela
estava conversando com alguém na mesa atrás dela.
Nova dá de ombros.
Enfiei as chaves no bolso e fui em direção ao centro da
sala onde Rhett brincava de Lincoln Logs no chão. Ele estava
cercado por outras crianças, e se eu parasse um minuto para
olhar para eles, provavelmente seria capaz de dizer a quem
pertenciam, mas não tinha tempo. Peguei Rhett e fiz cócegas
nele para impedi-lo de gritar enquanto andava em direção à
porta da frente. Assim que saímos, marchei em direção ao
estacionamento, parando na beirada quando percebi que não
tinha ideia do que Rumi dirigia.
— Ei, você já está indo embora? — Otto chamou,
correndo atrás de mim.
Olhei para as fileiras de carros e motocicletas. — O que
Rumi dirige?
— Um velho Dodge preto, — Otto respondeu
categoricamente. Ele estendeu a mão para Rhett e o puxou
para fora dos meus braços, levantando-o bem alto antes de
fingir que ia derrubá-lo. — Eles já foram embora.
— Para onde eles foram? — Eu perguntei, olhando para
o longo caminho da entrada.
— Não tenho certeza, — disse Otto, colocando Rhett de
pé para explorar.
— Bem, quando eles vão voltar? — Eu perguntei em
frustração, virando-me para ele. Eu estava tão cansada de
sua atitude. Sim, todos nós sabíamos que ele estava chateado
comigo. Ele me odiava, tanto faz. Mas eu ainda me lembrava
de esfregar suas têmporas porque sua cabeça doía enquanto
assistíamos a filmes. Lembrei-me de andar na caminhonete
de Michael, levando-o para a casa de seu amigo. Lembrei-me
de quando ele começou a ter espinhas e estava com vergonha
de perguntar a seus irmãos como diabos se livrar delas e eu
contrabandeei para ele um pouco do meu sabonete facial em
um frasco para que eles não notassem. Eu o conhecia. Ele
era o mais próximo de um irmão mais novo que eu jamais
teria, e gostando ou não, eu era o mais próximo de uma irmã
mais velha que ele já teve, e estava farta de suas merdas.
— Acho que eles não vão voltar tão cedo, já que Mick me
pediu para tomar conta de você.
— Ele pediu o quê? — Eu perguntei sombriamente.
— Me disse para ir para a casa dele e ficar de olho nas
coisas até ele chegar, — Otto respondeu, pegando Rhett
enquanto ele tropeçava.
— Fantástico, — eu murmurei.
— Então, se você estiver indo embora, me avise e eu a
seguirei.
— Eu não vou embora, — resmunguei, pegando Rhett
de volta. Eu voltei para a sede do clube, minhas mãos
tremendo de raiva.
Michael realmente tinha ido embora e me deixado com
uma multidão de pessoas que eu mal conhecia. Seu
pessoal. As pessoas que ele me garantiu que iria interferir. As
pessoas que estariam me observando e especulando por que
Michael havia desaparecido do churrasco que eles
prepararam para nós.
O medo que tinha sido um zumbido silencioso enquanto
eu sabia que estava segura na propriedade do clube dissipou-
se quase inteiramente quando a fúria o substituiu. Que idiota
absoluto. Tudo bem, ele queria apenas me deixar na festa,
presumindo que eu iria para casa sem ele? Bem, eu ficaria a
noite inteira. Eles teriam que me expulsar.
Assim que voltamos para dentro, me joguei na conversa
com todos. Enquanto Rhett brincava com as crianças e se
aconchegava com sua avó, eu fazia as rondas. Contei às
pessoas onde morávamos, onde estávamos morando agora,
como Charlie havia me contratado em um de seus carrinhos
de café, que meus pais haviam morrido, que eu trabalhei em
um clube de strip-tease para sobreviver, mas não tinha sido o
suficiente e por isso que voltamos. Eu brinquei sobre como o
avô de Michael nos pegou nos fundos da propriedade e dei de
ombros quando eles perguntaram se estávamos juntos
novamente. Deixe-os se perguntar. Mencionei que havia
pegado o dinheiro que me era devido e que meu antigo patrão
havia me seguido até o Oregon. Eu respondi a todas as
perguntas que as pessoas fizeram, não importa quão
constrangida ou envergonhada estivesse.
Discuti o parto e a maternidade com Brenna e Trix e a
volta para a faculdade com Lily. Conversei sobre roupas com
Olive e sua mãe Cecilia. Debati sobre marcas de calçados com
a tia de Michael, Molly, e prometi à filha dela, Rebel, que ela
poderia sair comigo e com Rhett em breve. A prima de
Michael estava completamente apaixonada por nosso filho -
eu realmente não podia culpá-la. Eu também estava, e ele
estava mais fofo conforme ficava cada vez mais cansado e
enérgico.
Conversei com um cara que não conhecia sobre
encontrar alguns pneus para o meu carro. Concordei em
deixar o pai de Michael marcar um horário para verificar o
Subaru. Falei sobre tudo e qualquer coisa, nenhum assunto
estava fora dos limites. Eu era uma fodida alegria. Eu era
extrovertida e alegre e a vida da festa.
Eu me sentia bêbada, embora não tivesse bebido
nada. Eu me convenci de que se Michael quisesse manter as
coisas entre nós, ele não teria me abandonado aos
tubarões. Minha política de livro aberto parecia uma
retaliação. Era a única coisa que me impedia de me calar. Em
vez disso, eu balbuciava e falava sem parar. Eventualmente,
Tommy e Heather começaram a olhar preocupados. Vovó
Callie me observava atentamente. Vovô passou o braço por
cima do meu ombro e tentou me levar para um canto
sossegado.
— Querida, por que você não leva o menino para casa?
— ele disse, beijando o lado da minha cabeça. — Ele está
caindo no sono onde está sentado.
— Estou esperando Michael voltar, — respondi
facilmente, sorrindo para Rhett. — Não há razão para voltar
para a casa dele se ele não estiver lá.
— Exceto pelo fato de que seu bebê está exausto, e você
também, — ele refletiu.
— Não é como se eu fosse para casa dormir, — eu
murmurei. A sede do clube ainda estava barulhenta com as
vozes, mas definitivamente havia amadurecido desde o início
da noite. As pessoas estavam decolando, levando seus filhos e
esposas para dormir em casa.
— Dê-lhe o inferno, — disse vovô com uma risada.
— Se ele não quer ficar aqui conosco, — eu disse com
um encolher de ombros. — Por que eu lhe daria o inferno por
isso? Prefiro que ele não esteja aqui se não quiser.
— Besteira, — vovô disse. — Não jogue esse
jogo. Ninguém ganha esse jogo.
— Não estou jogando nenhum jogo.
— Você o quer ao seu lado, lute por isso.
— Eu não deveria ter que lutar por isso, — eu respondi.
— Querida, — disse ele com um suspiro, me apertando
antes de deixar cair o braço. — Você não acha que já é hora
de fazer isso? Pense nisso.
Não demorou muito para eu reunir Rhett e Otto e voltar
para a casa de Michael. Vovô estava certo, eu precisava levar
Rhett para casa para dormir e estava honestamente exausta
de manter a fachada feliz. A família de Michael tinha visto
através disso, e assistiram a maior parte com sorrisos em
seus rostos. Eles sabiam que eu estava chateada e pareciam
estar felizes com isso, o que parecia estranho.
Rhett desmaiou antes mesmo de sairmos da propriedade
do clube, então a caminhonete ficou silenciosa enquanto eu
seguia a rota familiar para minha antiga casa, as luzes do
carro de Otto iluminando o espelho retrovisor.
Eu estava tão cansada. Decepcionada e
cansada. Nervosa e com raiva e assustada e cansada. Parte
de mim queria sair à procura de Michael, embora eu não
tivesse ideia de onde ele tinha ido, mas a maior parte só
queria rastejar na cama com Rhett e pensar em tudo pela
manhã. Eu passei pelo desafio do clube quase ilesa. Parker
tinha me seguido como estava preocupada que ele faria, e
cometeu o erro de me seguir direto para o clube, então isso
também acabou. Heather concordou em cuidar de Rhett
quando eu começasse a trabalhar na semana seguinte, e logo
eu teria algum dinheiro entrando.
Então, por que, enquanto tudo estava se encaixando
perfeitamente, eu me sentia tão sobrecarregada? Por que
Michael parecia mais distante do que quando entrou na casa
de seus pais e encontrou Rhett e eu lá? Meu estômago
revirou quando entrei na garagem e observei a porta da
garagem se abrir.
— Ei, você precisa de alguma ajuda? — Otto perguntou
enquanto eu descia da caminhonete.
Eu pensei em lhe pedir para carregar Rhett para dentro,
então balancei a cabeça.
— Eu consigo.
— Tudo bem—, ele murmurou. — Estarei logo atrás de
você. — Ele bateu no interruptor da garagem quando saiu e
fechou quando tirei Rhett de seu assento.
Eu estava me arrastando e perdida em meus próprios
pensamentos enquanto tirava os sapatos e carregava Rhett
pela casa, e é a única razão pela qual consigo pensar que não
vi o homem sentado na cadeira da sala de estar.
— Onde está seu namorado? — Parker perguntou,
fazendo-me tremer com tanta força que quase derrubei Rhett.
— Que diabos está fazendo aqui? — Eu sibilei, olhando
para ele. Sempre que o imaginava nos encontrando, pensava
em entrar em ação, garantindo que Rhett e eu estivéssemos
seguros e fora de seu alcance antes que ele pudesse
piscar. Não foi assim que aconteceu, no entanto. Era como se
eu não pudesse compreender como ele estava aqui, na casa
de Michael, no escuro.
— Devolva-me o dinheiro que você roubou, — ele
respondeu severamente. Ele bateu com a mão no braço da
cadeira, a pistola fazendo um barulho surdo que me fez
estremecer.
— Não tenho, — gaguejei, envolvendo Rhett com força
nos braços. Ele ainda estava desmaiado, completamente
inconsciente da maneira como todo o meu corpo tremia. —
Eu-eu usei. Vindo para cá. Em hotéis e gasolina e...
— Besteira, — Parker latiu. — De jeito nenhum você já
gastou todos os cinco mil.
— Eu disse a você, só peguei quinhentos, — sussurrei
desesperadamente. Ele estava apenas fodendo comigo, ou
realmente achava que eu tinha tirado cinco mil dólares dele?
— OK. — Ele riu maldosamente. — Essa merda
acabou. Vá pegar meu dinheiro.
Eu soube no instante em que os músculos de seu braço
se mexeram quando ele apontou a pistola para mim. Por um
momento, tive certeza de que perderia todo o controle de
minhas entranhas.
— Por favor, — eu disse, minha respiração saindo em
suspiros. — Por favor, eu não peguei. Juro.
Os pensamentos passaram pela minha cabeça em
menos de um instante. Onde eu poderia colocar Rhett? Eu
poderia jogá-lo atrás do sofá, mas e se isso o
machucasse? Ele estava tão adormecido que seus braços
pendiam ao lado do corpo. Ele nunca seria capaz de
amortecer sua queda. A ideia da cabeça de Rhett bater na
madeira de lei guerreava com a ideia de ele ser atingido por
uma bala. Se nós dois caíssemos, eu poderia protegê-lo de
alguma forma. Protegê-lo com meu corpo. Mas o que Parker
faria com ele depois que eu morresse? Ele o machucaria? O
levaria? Meu corpo era grande o suficiente para parar uma
bala, ou me atravessaria até o corpo frágil do meu
filho? Manchas escuras dançaram em minha visão quando
dei um passo para trás.
— Não, — ordenou Parker, levantando-se. Ele levantou o
braço e o baque mais alto que eu já ouvi encheu a
sala. Encolhi-me, deixando-me cair e enrolando o meu corpo
em torno do de Rhett.
— Não, — eu sussurrei, apertando meu corpo ao redor
de Rhett enquanto ele começava a chorar. — Shh, bebê.
— Emília.
— Fique quieto, baby, — eu engasguei, tentando segurar
Rhett debaixo de mim. — Shh, fique quieto.
— Emília.
Comecei a balançar, segurando Rhett contra mim. Eu
não conseguia ver nada, mas podia senti-lo. Meu bebê. Suas
mãos apertaram ao meu lado enquanto ele tentava escapar,
sem compreender por que sua mãe estava chorando e
segurando-o contra o chão.
— Em!
A voz de Otto era tão alta que parecia reverberar pelo
chão.
Suas mãos em meus ombros me puxaram para cima,
inflexível e firme.
— Você está bem? — ele perguntou, seus olhos
arregalados e assustados. Suas mãos roçaram em mim,
passando pelo meu cabelo e descendo pelos meus ombros,
passando pelas costas de Rhett, deslizando sobre meus
quadris e pernas.
— Otto?
— Foda-se, — ele sussurrou, olhando por cima do
ombro. — Quem diabos? — Segui seu olhar para encontrar
Parker de bruços no chão.
— Eu bati nele, — disse ele, parecendo quase
surpreso. — Usei uma panela da cozinha. Por que diabos
Michael não tem uma porra de bastão ou algo assim? Jesus!
— Otto, — eu disse, recuando até bater na parede atrás
de mim. — Ligue para 9-1-1.
— Foda-se, — Otto cuspiu, pegando seu telefone. —
Estou ligando para o meu pai.
— Você precisa parar de dizer tanto foda-se, ou Rhett
vai dizer isso também,
Eu murmurei, meus pensamentos em todos os lugares
ao mesmo tempo.
— Sim, eu vou direto nisso, — ele murmurou,
segurando o telefone em seu ouvido. — Pai? Você precisa vir
para cá, agora mesmo.
Quando o pai de Michael e os outros apareceram menos
de dez minutos depois, eu ainda estava no chão com Rhett no
colo. Ele se acalmou quando teve certeza de que estava tudo
bem, mas não voltou a dormir, contente em se aconchegar
contra meu peito com o polegar na boca, seu cobertor rosa
favorito enrolado nele. Otto estava acima de Parker, ainda
inconsciente, segurando uma arma que havia encontrado
escondida em algum lugar.
— Você está bem? — Tommy perguntou, vindo direto
para mim enquanto os outros entravam na casa atrás dele.
— Estamos bem, — eu confirmei, meus olhos
lacrimejando enquanto ele me ajudava a ficar de pé. — Otto...
— Graças a Deus ele estava aqui, — disse Tommy,
puxando-me em seus braços. — Obrigado, porra.
Eu não me incomodei em dizer a ele para não dizer
porra.
— Onde diabos está seu filho? — O tio de Michael, Will,
latiu, olhando para nós.
— Otto, ligue para o seu irmão, — Tommy ordenou,
então mais gentilmente, — Você pode guardar isso, amigo.
Otto assentiu, seus olhos ainda mais abertos do que o
normal. Ele colocou a arma na mesa atrás dele e meio que
cambaleou para longe dela.
— Você fez bem, garoto, — Vovô disse a ele com um
aceno de cabeça. — Muito bem.
— Parece que ele está prestes a vomitar, — Leo entrou
na conversa com uma risada. — Não se preocupe, nós
cuidaremos disso.
— Sua cabeça parecia um melão maduro, — Otto
murmurou com desgosto, fazendo os homens rirem.
— Ligue para Micky, — seu pai ordenou. Quando Otto
pegou o telefone e caminhou em direção à cozinha, Tommy
olhou para mim. — Tem certeza que está bem, querida?
— Ele acha que peguei o dinheiro dele, — murmurei,
olhando para Parker.
— Você pegou.
— Não, ele acha que eu peguei muito mais. — Eu
balancei minha cabeça em confusão. — Ou foi a desculpa
dele? Não sei. Ele vai continuar voltando.
— Não, — Tommy respondeu severamente. —
Ele não vai , eu posso te prometer isso.
Eu não tinha certeza do que Otto havia dito a Michael,
mas quando ele voltou da cozinha, seu rosto estava ainda
mais pálido do que antes.
— Ele está a caminho.
Tommy assentiu e me acompanhou até as escadas. —
Leve Rhett para cima, certo? Coloque-o na cama. Nós
cuidaremos disso.
— Eu não... — Minhas palavras sumiram enquanto eu
olhava ao redor da sala. Os homens pareciam calmos,
relaxados até, mas cada um deles carregava uma ou cinco
armas, algumas a mão e outras apenas protuberantes
escondidas dentro de suas roupas.
— Suba, — repetiu o pai de Michael. — Acomode Rhett,
ok?
Eu balancei a cabeça e subi as escadas. Cada sombra e
mudança de luz no corredor me fazia pular, e quando entrei
no quarto que Rhett e eu dividíamos, sabia que não seria
capaz de ficar lá. Cada peça de mobiliário parecia pairar
sobre mim no escuro. Eu rapidamente saí do quarto e fui
direto para o quarto de Michael. O interruptor de luz dele
tinha um dimmer, e o diminui totalmente antes de colocar
Rhett no meio da cama.
— Mamãe durma, — ele murmurou. — Vovô?
— Mamãe vai dormir com você, — respondi. — Mas o
vovô vai ficar lá embaixo.
Subi na cama e deixei o cheiro de Michael me acalmar
enquanto esperava Rhett voltar a dormir. O estrondo de vozes
lá embaixo era bastante constante, mas eu não conseguia
ouvir o que qualquer um deles estava dizendo até o minuto
em que Michael entrou pela porta da frente.
— Emília! — ele chamou, apenas uma vez antes de ser
silenciado.
Deslizei para fora da cama e desci as escadas. Toda a
situação desde o momento em que encontrei Parker
esperando por mim dentro da casa de Michael parecia que
estava acontecendo com outra pessoa. Eu me senti quase
separada dela, como se estivesse olhando por uma janela.
Will segurou Michael perto da porta da frente,
murmurando algo que não consegui ouvir.
— Em, — Michael latiu, empurrando seu tio facilmente
enquanto corria em minha direção. — Você está bem?
Suas mãos se moveram sobre mim, como as de Otto
antes, procurando por qualquer ferimento.
— Estou bem, — murmurei, afastando-me. — Estou
bem.
— Que porra é essa, doçura? — ele perguntou,
procurando meu rosto. — Ele estava esperando em casa?
— Ele estava sentado na cadeira, — respondi, olhando
para ele. Eu ainda podia ouvir o baque quando ele bateu com
a pistola no braço.
— Ele estava rondando, — vovô disse, me
surpreendendo. Ele deve ter chegado enquanto eu estava lá
em cima com Rhett.
— Não podemos permitir isso, — disse Casper, tio de
Michael, agachando-se ao lado da cabeça de Parker. — Olá,
— ele cumprimentou com um sorriso desagradável. Então,
com um golpe fácil na nuca de Parker perto de sua orelha, ele
o nocauteou. — Vamos, jovens. Pegue o lixo e vamos levá-lo
para fora daqui.
— Por que estamos fazendo todo o trabalho pesado? —
um dos caras brincou enquanto ele - e o que deveria ser seu
irmão gêmeo - levantava Parker pelas axilas e pés.
— Porque estamos velhos, — respondeu Casper,
enxotando-os. — Pare de reclamar e saia da garagem. Vamos
levá-lo na caminhonete de Micky.
— Espere, — vovô disse. Ele apalpou os quadris de
Parker e tirou um molho de chaves. — Encontre o carro dele.
— Ele jogou as chaves para Rumi. — Tome conta disso.
— Certo, — Rumi respondeu. Ele nem olhou para mim
quando saiu de casa.
— Emilia, — Michael disse, puxando minha atenção de
volta para seu rosto. — O que aconteceu, querida?
— O que aconteceu? — Otto disparou do outro lado da
sala. Ninguém o deteve quando ele avançou, parando a
apenas alguns centímetros do rosto de Michael. — Você fugiu
e deixou Emilia e seu filho para lidar com quem diabos ele
era. Que porra há de errado com você, cara?
— Eu não os deixei para lidar, — Michael cuspiu de
volta. — Eu enviei você com eles.
— Eu nem sabia o que diabos estava acontecendo, —
Otto disparou de volta, jogando as mãos para cima.
— Eu pedi para você ficar de olho na merda.
— Eu estava ligando para minha garota, — Otto
respondeu, seus olhos selvagens e sua respiração pesada. —
Se ela tivesse atendido o telefone, eu provavelmente ainda
estaria lá fora e Emilia estaria aqui morta.
Acho que ninguém havia previsto o soco que Otto deu,
nem mesmo Otto. Em um segundo ele estava lançando
adagas para Michael e no próximo, sua voz estava falhando e
cada pedacinho de terror e raiva da noite estava saindo dele
enquanto ele socava.
Felizmente, quando Otto veio em nossa direção, Michael
se afastou um pouco de mim, porque quando o punho de
Otto atingiu seu queixo, ele cambaleou.
— Opa, — Leo disse, passando ao lado deles para
envolver seu braço em volta da minha cintura e me carregar
fisicamente alguns metros para fora do caminho.
— Você não vai impedi-lo? — Eu perguntei quando Otto
socou novamente.
— Não, — Leo disse, encostado na parede. — Micky está
pedindo.
— Ele não sabia...
Leo me lançou um olhar. — Depois daquela cena no
clube, ele começou a fazer beicinho como um bebê e deixou
seu irmão adolescente cuidar de sua mulher, — ele disse
categoricamente. — Estúpido pra caralho. — Ele olhou para
Otto e Michael. — E seriamente injusto com Otto.
— Nós achamos que ele tinha ido embora, cara, —
Michael disse defensivamente, esquivando-se de Otto.
— Você não achou que ele tinha ido embora. — Otto deu
outro soco, atingindo Michael no estômago. — Ou não teria
me pedido para vigiar a casa.
— Cara, eu sabia que você poderia lidar com isso, —
Michael defendeu.
— Eu não sabia o que diabos estava fazendo, idiota, —
Otto cuspiu, seus braços finalmente caindo para os lados. —
Eles poderiam ter morrido, porra. Ele estava apontando a
porra de uma arma para eles.
O rosto de Michael perdeu toda a cor quando ele olhou
para mim, mas eu não conseguia tirar os olhos de Otto.
Ele empurrou Michael para longe dele pela gola de seu
moletom. — Quando eu bati nele, ela caiu no chão, — ele
engasgou. — Cobriu Rhett tão bem que você nem conseguia
vê-lo. A única maneira de saber que ele estava lá é porque
você podia ouvi-lo chorar. — Ele soltou um soluço agudo e
com raiva limpou o nariz com as costas da mão. — Ela nem
me ouviu chamando o nome dela.
— Tudo bem, filho, — Tommy disse baixinho, colocando
a mão no ombro de Otto. — Tudo bem.
Otto se livrou da mão de seu pai, abaixando a cabeça de
vergonha.
— Eu sabia que você não me odiava, — eu disse, minhas
palavras praticamente ecoando na casa repentinamente
silenciosa. Otto olhou para mim. — Quero dizer, eu teria
preferido um 'eu te perdoo, Emmy', mas me salvar de um
psicopata funciona.
— Foda-se, Em, — Otto disse, seu corpo estremecendo.
Eu me movi entre os homens e envolvi meus braços em
volta da cintura de Otto, colocando minha cabeça contra seu
peito. — Obrigada, Otto-mobile, — eu disse suavemente.
— Foda-se, — ele murmurou novamente, seus braços
subindo para cercar minha cabeça, seus bíceps descansando
em meus ombros. Ele estremeceu novamente quando colocou
sua bochecha contra o topo da minha cabeça.
Foi tão estranho. Quando eu saí, três anos atrás, ele
tinha a mesma altura que eu e agora de repente ele era do
tamanho de um homem. Ele cresceu quando eu não estava
aqui para ver.
— Estamos saindo, — disse Tommy, dando um tapinha
nas costas de Otto com tanta força que senti. — Vamos, filho.
— Você está bem? — Otto perguntou enquanto se
afastava.
— Sim. — Eu o deixei ir e tentei sorrir. Deve ter sido
realmente inacreditável porque Otto bufou.
— Você fica aqui, — vovô ordenou, apontando para
Michael enquanto ele passava. Ele beijou minha testa e
continuou se movendo, o que me fez suspirar de alívio. Se ele
tivesse me mimado um pouco, eu teria desmoronado.
Michael tentou argumentar. — Eu não sou...
Foi a primeira vez que vi aquela expressão particular no
rosto do vovô enquanto ele encarava Michael, e eu esperava
nunca mais vê-la novamente. — Você fica aqui e cuida da
Emilia.
A boca de Michael se fechou.
Em menos de um minuto, a casa estava vazia, exceto
por nós três.
O silêncio era ensurdecedor.
— Sinto muito por não ter...
— Poupe-me, — murmurei cansadamente,
interrompendo-o. — Apenas me poupe.
— Emília...
— Não. — Eu levantei minha mão para detê-lo enquanto
ele caminhava em minha direção. — Eu não... eu não posso
fazer isso agora.
— Eu deveria estar aqui. Eu sei disso agora.
— Oh, você sabe disso agora? — Eu perguntei
bruscamente. — Você sabe disso agora ?
— Sim, eu sei agora.
— Por que você não sabia disso antes? Onde diabos você
estava?
— Saí com Rum, — disse ele, passando as mãos pelos
cabelos. — Fomos a uma casa que meu pai está
reformando. Apenas desabafar. Apenas...
— Você me deixou no clube sozinha para que pudesse
quebrar uma casa? — Eu sibilei em descrença enquanto o
observava. Ele estava coberto com uma fina camada de poeira
que eu não tinha notado antes.
— Eu faço isso às vezes, — explicou ele. — Quando a
merda é demais. Isso clareia minha cabeça. Depois daquela
merda no clube, eu precisava de um minuto.
— Você não achou que talvez eu precisasse de um
minuto? — Eu perguntei baixinho, a decepção fazendo meus
ombros caírem. — Que talvez voltar para a festa que sua
família estava dando para nós sozinha não era o que eu
queria fazer?
— Achei que você iria embora, — disse ele, dando mais
um passo à frente. — Traria Rhett para casa e relaxaria.
— Você me deixou lá sozinha, — eu disse, minha voz
quase inaudível. — Você estava com raiva de mim e saiu sem
dizer uma palavra.
— Você realmente quer falar sobre quem deixou quem?
— ele perguntou, ficando na defensiva.
Deixei escapar uma gargalhada tão crua que machucou
minha garganta. — Eu não tive escolha.
— Sim, você teve, — ele respondeu categoricamente. —
Você teve uma escolha.
— Sim, bem, você também, — eu cuspi de volta. — E
você não tem dezoito anos, está grávida e morrendo de medo.
— Pensei que tínhamos cuidado dele. — Ele olhou para
a sala de estar. — Não pensei que ele voltaria.
— Então, isso só faz com que esteja tudo bem? — Eu
balancei minha cabeça. — Quer saber, eu nem estou brava
com isso.
— Besteira.
— Eu realmente não estou. — Era verdade. Eu não
estava com raiva por ele não ter estado aqui. Nenhum de nós
tinha percebido como Parker era maluco. Nenhum de nós
tinha previsto isso. — Estou com raiva, não, nem isso. Estou
desapontada...
Michael zombou.
— Estou desapontada, — eu disse novamente, minha
voz vacilante, não importa o quanto eu tentasse mantê-la
firme. — Que você correu no minuto em que ficou chateado,
assim como eu sabia que faria.
Capitulo 12

MICHAEL

— Isso não é justo, — eu resmunguei, a frustração


fazendo minhas mãos se fecharem em punhos. — Saí por
algumas malditas horas.
— E como isso funcionou para você? — ela perguntou
suavemente. — Você conseguiu o que precisava?
Engoli em seco. Não, eu não consegui. Derrubar uma
parede não foi igual ao que era antes. O tempo todo eu queria
voltar para casa e conversar com Emilia, mas fui muito
teimoso. Eu apenas continuei, esperando pela liberação
familiar de tensão que nunca veio.
Emilia estava quieta enquanto levantava as mãos à sua
frente, observando como elas tremiam.
— Eu sinto muito, — eu engasguei, seguindo em
frente. — Achei que ele tinha ido embora.
— Sim, — ela sussurrou. — Eu também.
Eu queria bater em alguma coisa. Eu queria que ela
batesse em alguma coisa. Batesse em mim. Se estivesse com
raiva, talvez pudesse ignorar o quanto falhei com ela.
Eu não tinha pensado por um segundo que aquele idiota
do Parker ficaria por aqui depois que o mandamos
embora. Se tivesse, nunca teria deixado ela e Rhett
sozinhos. Eu ainda estava muito tenso, porém, e foi por isso
que enviei Otto com ela. Eu me senti um pouco melhor
sabendo que alguém estava com ela até chegar em casa. Eu
só não queria que ela voltasse para uma casa vazia sozinha.
Jesus, que idiota do caralho.
— Ele estava apenas sentado aqui no escuro, — ela
murmurou, olhando para mim confusa. — Como ele sabe
onde você mora?
— Eu não sei, doçura.
— Ele nem estava nervoso. — Ela balançou a cabeça. —
Como se soubesse que você não estava comigo. E ele
continuou me mandando devolver seus cinco mil
dólares. Michael, eu nem peguei aquele dinheiro.
— Eu sei que você não pegou.
— Por que ele acha que eu peguei? — ela perguntou
desesperadamente, seus olhos se enchendo de lágrimas. —
Eu não...
— Venha aqui, baby, — eu ordenei, eliminando os
últimos passos que nos separavam.
Assim que a envolvi em meus braços, ela me agarrou,
puxando-me tão perto quanto ela podia. Eu me vi ajudando-a
enquanto ela envolvia as pernas em volta da minha cintura e
se agarrava. Ela estremeceu silenciosamente uma vez. Então,
novamente alguns segundos depois.
— Você está bem, — eu sussurrei, pressionando meus
lábios em seu ouvido. — Obrigado porra. Você está bem.
O primeiro soluço nem me surpreendeu. Honestamente,
fiquei impressionado com quão bem ela se manteve até esse
momento.
— Eu pensei que ele ia atirar em nós, — ela engasgou,
as palavras truncadas contra o meu pescoço. — Pensei que
ele fosse atirar em Rhett.
Meu nariz queimou enquanto eu a segurava com mais
força.
— Eu só fiquei pensando se poderia protegê-lo de
alguma forma, — ela soluçou. — Que ele ficasse bem, mesmo
que eu não ficasse.
Eu sabia que ela precisava colocar essa merda para fora,
que precisava falar sobre isso e processar isso, mas as
palavras quase me deixaram de joelhos. Eu mal conseguia
entender o quanto tinha fodido mandando-os para casa sem
mim.
Minhas mãos se moveram sobre ela incansavelmente,
procurando instintivamente por feridas, certificando-me de
que ela estava bem, mesmo enquanto ela falava sobre como
Otto havia nocauteado Parker com uma frigideira.
— Ele estava tão assustado, Michael, — ela chorou
ainda mais. — A expressão em seu rosto.
— Ele te protegeu.
— Eu pensei que ele me odiava, — ela engasgou.
— Ele nunca te odiou, — eu respondi, sem nem mesmo
ter certeza se ela estava me ouvindo. — Ele estava chateado
com você.
— Estou tão feliz que você esteja em casa, — ela disse
com um estremecimento, seu corpo finalmente relaxando no
meu. — Eu estava tão assustada.
Sentei-me no sofá quando minhas pernas começaram a
doer e segurei Emilia no meu colo enquanto sua respiração
desacelerava e seus braços relaxavam.
— Eu estraguei tudo, — murmurei, beijando sua
cabeça. Ela não discutiu comigo. Ficamos sentados em
silêncio até que a voz de Rhett desceu as escadas, chamando
por Emília. Ela saiu do meu colo em menos de um segundo, e
eu estava bem atrás dela enquanto ela subia as escadas e
entrava no meu quarto.
— Mamãe, — Rhett choramingou, sentando-se no meio
da minha cama.
— Ei, por que você está acordado? — Emilia perguntou
gentilmente, rastejando na cama. Ela se deitou ao lado dele e
Rhett caiu como uma árvore recém-cortada, sua cabeça
caindo no braço dela.
— Mamãe, — ele murmurou em torno de seu polegar,
rolando em direção a ela.
Emilia fechou os olhos e puxou os joelhos para cima até
que Rhett estivesse enrolado na curva de seu corpo. Eles
pareciam tão pequenos no meio da minha cama que senti
meu estômago revirar. Eu tinha acabado de encontrá-los e já
quase os perdi de novo. Se eu não tivesse mandado Otto para
casa com ela. Se Otto não tivesse entrado quando
entrou. Jesus. Eu deveria estar aqui.
Tirei minhas botas e subi no lado oposto de Rhett,
deitando perto de suas costas de lado, meu braço dobrado
sob minha cabeça. Lágrimas escorriam silenciosamente sob
as pálpebras fechadas de Emilia enquanto ela esfregava
suavemente as costas de Rhett. Eu a tinha visto feliz e triste e
com raiva e todas as emoções intermediárias, mas acho que
nunca tinha visto essa expressão antes. Era uma mistura de
devastação e alívio - eu tinha certeza de que a minha
espelhava a dela. Quando Rhett voltou a dormir, sem abrir os
olhos, Emilia estendeu a mão e colocou no meu lado.
Eu estava com medo de tocá-los e quebrar o feitiço, mas
no momento em que ela estendeu a mão para mim, cheguei
mais perto, envolvendo meu braço em torno de ambos. Rhett
era minúsculo entre nós. Sua bunda pressionou contra meu
esterno quando ele jogou um braço acima da cabeça e depois
se acomodou novamente.
— Eu sei que errei, — eu sussurrei. — Mas juro por
Deus, nunca mais vou deixar nada acontecer com você de
novo.
Eu tinha certeza que nenhum deles me ouviu desde que
ambos desmaiaram.
Horas depois, silenciosamente saí da cama e desci as
escadas para encontrar meu telefone. Meu pai atendeu no
primeiro toque.
— Como eles estão?
— Eles estão dormindo, — eu disse com um suspiro,
deixando cair minha bunda nas escadas.
— Bom.
— Você sabe por que estou ligando, — murmurei,
olhando para trás.
— Sei que você queria cuidar disso, — meu pai disse
cautelosamente. — Mas...
— Ele atacou minha família, — eu resmunguei. Discutir
se eu teria ou não a chance de acabar com aquele idiota não
era algo que eu estava disposto a fazer.
— Eu estou ciente disso, — papai disse severamente. —
Mas o idiota já está morto.
— O que?
— Sim. — Ele ficou quieto por alguns momentos. —
Começou a convulsionar no caminho para fora da cidade. No
momento em que chegamos onde estávamos indo, o filho da
puta já estava morto.
— Que porra é essa?
— Feridas na cabeça não são previsíveis, — ele
murmurou. — Não conte ao seu irmão.
— Eu não vou, — eu gaguejei em descrença. Otto não
precisava saber que havia matado um homem. Ele era muito
jovem para carregar esse peso.
— Acabou, — papai disse, cansado. — Tudo cuidado.
— Eu sei que estraguei tudo, — eu disse a ele, olhando
para a sala de estar.
— Bom, — ele respondeu instantaneamente. — Sorte
sua que acabou tudo bem.
— Sim.
— Na próxima vez...
— Não haverá uma próxima vez, — eu disse,
interrompendo-o.
— Há sempre uma próxima vez. Felizmente, você não é
um idiota de merda e aprenderá com isso.
— Achei que ele tinha ido embora. — Passei a mão no
rosto. — Foda-se, pai. Achei que ele tinha entendido o recado.
— Infelizmente para ele, ele era um idiota, — meu pai
resmungou. — Vá cuidar da sua família. Vou para a cama.
— Tudo bem, — eu disse, falando comigo mesmo porque
ele já tinha desligado.
A luz estava começando a entrar pelas janelas quando o
sol nasceu, e eu sabia que não conseguiria dormir. Eu
apenas olhei para a sala, imaginando Emilia parada lá
congelada com Rhett em seus braços. Parker segurando-a
sob a mira de uma arma. A insultando.
Levantei-me rapidamente e entrei no quarto. Menos de
dez minutos depois, a poltrona reclinável estava na calçada
em frente com uma placa de grátis. Era uma bela cadeira -
alguém a pegaria.
Eu estava movendo o sofá para um lugar diferente
quando Emilia desceu silenciosamente as escadas.
— O que você está fazendo? — ela perguntou
calmamente, sua voz rouca.
— Redecorando, — eu respondi, me endireitando. Eu
esfreguei a parte de trás do meu pescoço, um pouco
envergonhado. Talvez tenha sido uma ideia estúpida, mas
pensei que poderia ajudar se a merda parecesse diferente
quando ela voltasse para baixo.
— Eu gosto disso, — disse ela com um pequeno aceno
de cabeça. — Mas agora você terá que mover a TV ou não
poderá vê-la do sofá.
— Merda, — eu murmurei, olhando para onde a
televisão estava presa a parede.
— Você não precisava fazer isso.
— Eu sei, — reconheci, voltando-me para olhar para
ela.
— Você dormiu? — ela perguntou gentilmente.
— Não.
— Sei. — Ela suspirou, cruzando os braços sobre o
peito. — Eu continuei acordando achando que abriria meus
olhos e ele estaria parado em seu quarto.
— Ele não vai voltar, — eu assegurei a ela.
— Você não o viu, — ela argumentou. — Ele tinha tanta
certeza de que peguei aquele dinheiro.
— Ele não vai voltar, Emilia, — eu repeti com firmeza,
esperando que ela não fizesse nenhuma pergunta. Eu não
estava proibido de contar a ela, ninguém havia dado essa
ordem, mas quanto menos ela soubesse sobre o antigo
patrão, melhor para ela.
— Oh, — ela respirou, a compreensão surgindo em seu
rosto. — Está bem então.
— Você está segura, querida, — eu disse, dando um
passo à frente. — Eu juro que nunca deixarei alguma coisa...
— Michael, — disse ela, levantando uma mão para me
parar. — Acho que eu e Rhett deveríamos ficar com seus pais
até eu encontrar um lugar.
— O que? — Ela não poderia ter me surpreendido mais
se tivesse me dado um tapa.
— Nós tentamos, você sabe, — ela murmurou com um
encolher de ombros. — Mas morar junto não está
funcionando. Isso não está funcionando.
— Doçura, eu sei que te decepcionei, — eu disse, meu
coração começando a bater forte no meu peito. — Eu fodi
tudo. Eu sei que você não pode ver além disso agora...
— Não é isso, — disse ela, balançando a cabeça. — De
jeito nenhum.
— Então por que você acha que precisa se mudar?
— Precisei de você no clube ontem, — respondeu ela,
com os olhos tristes. — Eu estava com medo e envergonhada,
e precisava de você, e você desistiu.
— Eu já te disse...
— Você desistiu porque ainda está com raiva de mim, —
disse ela, falando sobre mim. — E eu entendo, ok? Eu
entendo. Mas não posso simplesmente viver aqui, esperando
pelo dia em que você decidirá me perdoar por algo que eu não
sentia que tinha controle. Eu não posso viver assim, meio
dentro e meio fora e pisando em ovos, então você não ficará
chateado e sairá por algumas horas... ou para sempre. Eu
pensei que podia, mas não posso.
— Eu não vou a lugar nenhum.
— Você está dizendo isso por causa do que acabou de
acontecer, — ela disse, erguendo as mãos em súplica.
— Estou dizendo isso porque é a maldita verdade.
— Fale baixo.
— Você quer que eu diga que te amo? Eu te
amo. Pronto. Feito. Você não vai se mudar.
Emília zombou. — Sim, isso é exatamente o que eu
estava querendo.
— Eu disse a você, — eu disse, dando um passo à
frente. — Você vai embora e não há lugar nesta terra em que
eu não te encontre.
— Você não terá que procurar, — ela gaguejou. —
Estaremos a três quilômetros de distância, na casa de seus
pais.
— Não, você não vai.
— Por que você está tornando isso tão difícil? — Suas
mãos se fecharam em punhos.
— Isso foi o que ela disse, — eu respondi, as palavras
saindo da minha língua sem pensar.
A boca de Emilia se abriu incrédula.
— Você pediu, — eu apontei estupidamente.
— Fico feliz em saber que você está levando isso a sério,
— ela retrucou, girando nos calcanhares. — Vou ligar para
sua mãe para ter certeza de que a oferta ainda está de pé.
— O inferno que você vai, — eu respondi, seguindo-a.
— Assim vai ser melhor, — disse ela, subindo as
escadas. — Você vai ver.
— Você não vai se mudar, Emilia, — argumentei, dois
passos atrás dela.
— Me assista.
A corda que eu estava segurando pelas pontas dos
dedos na última semana se partiu. Não havia outra
explicação para isso. Eu estava me segurando, mantendo
distância, mantendo minhas mãos para mim em um esforço
para não tornar nossa situação mais complicada do que já
era, mas estava me enganando. Não havia como tornar as
coisas mais complicadas. Já estávamos no auge da confusão.
Eu a peguei quando ela alcançou o patamar, e ela soltou
um grito de surpresa quando a girei para me encarar.
— Você se lembra quando me perguntou se eu ficaria
entediado? — Eu perguntei, puxando seu rosto para o
meu. — Estávamos na rede.
— Eu me lembro, — ela respondeu perplexa, suas mãos
subindo para agarrar meus pulsos.
— Nunca fiquei.
— O que?
— Eu nunca fiquei entediado. Nunca quis ninguém além
de você.
Ela estremeceu de surpresa. — Você disse que transou
bastante.
— Eu menti.
Quando a beijei, esperava resistência. Eu me preparei
para o momento em que ela se afastaria e me derrubaria,
mas ela não o fez. Em vez disso, suas mãos deixaram meus
pulsos e ela segurou meu rosto entre as palmas. Sem dizer
uma palavra, ela me acalmou, transformando o beijo de
frenético em lento e profundo.
— Você não vai me deixar, — eu disse contra sua boca,
me afastando apenas o suficiente para encontrar seus
olhos. — Eu não vou te deixar.
— Temos muito a descobrir, — ela sussurrou de volta,
passando os polegares pelas minhas bochechas. — Somos
adultos agora. Nós temos um filho. Não podemos
simplesmente...
— Você me ama? — Perguntei. Eu sabia a resposta.
— Sim, — ela respirou, seus olhos vagando pelo meu
rosto. — Sempre. Desde o momento em que soube o que
significava.
— Pergunte-me, — eu ordenei.
Ela respirou fundo, seus olhos fixos nos meus.
— Pergunte-me, — eu repeti.
— Você me ama? — ela perguntou suavemente.
— Sim. Mais do que ontem, — respondi, igualmente
suave. — Menos que amanhã.
— Eu senti sua falta, — disse ela, com a voz embargada.
— Querida, você não tem ideia. — Envolvendo meu
braço em volta de sua cintura, eu a conduzi de costas para o
quarto de hóspedes. — Rhett vai dormir um pouco mais?
— Sim, — ela respirou enquanto a parte de trás de seus
joelhos batia na cama.
Eu queria ir devagar, tomar meu tempo, mapear cada
mudança em seu corpo e guardá-la na memória, mas não foi
assim que aconteceu. As coisas estavam muito cruas entre
nós, muito novas. Ficamos emaranhados enquanto eu
tentava tirar a camisa dela enquanto ela atacava a fivela do
meu cinto. Seu sutiã acabou enrolado em um de seus braços
porque eu estava muito ocupado com seus mamilos para tirá-
lo completamente.
A certa altura, quando meu rosto estava entre suas
coxas e eu estava me divertindo com seus gemidos e
grunhidos, dei um tapa ao meu lado, sentindo como se algo
estivesse rastejando em cima de mim... eram apenas as meias
felpudas que ela nunca tirava, roçando em mim.
Nada disso importava. No momento em que deslizei para
dentro dela, foi como se o mundo inteiro entrasse em
foco. Tudo ficou claro.
— Puta merda, — ela gemeu, inclinando a cabeça para
trás para que eu pudesse beijar sua garganta.
Nós nem chegamos totalmente na cama. Eu a segurei,
as curvas de meus cotovelos atrás da parte de trás de seus
joelhos, minhas coxas queimando enquanto eu me agachava
no ângulo exato que precisava. Quase cambaleei quando
gozei, muito cedo, sentindo do meu couro cabeludo até a
ponta dos pés.
— Jesus, — murmurei, deixando cair minha cabeça em
seu ombro. — Eu mal fiz isto.
Emilia riu, correndo as pontas dos dedos para cima e
para baixo na minha espinha. — Ei, eu gozei. Eu diria que
seu timing foi perfeito.
— Da próxima vez, você gozará duas vezes, — eu
prometi, gentilmente colocando suas pernas na cama.
Emília gemeu. — Não sou tão flexível quanto costumava
ser.
— Eu te machuquei? — Eu levantei minha cabeça para
olhar para ela.
— De jeito nenhum, — ela murmurou, passando os
dedos pelo meu cabelo.
Eu a beijei e me levantei, segurando meu próprio gemido
enquanto minhas pernas protestavam. Emilia recuou na
cama e se curvou de lado para me ver colocar minha cueca e
jeans de volta.
— Então, estamos combinados, — eu disse enquanto
pegava minha camisa. — Você não vai se mudar.
— Ah, é isso? — ela brincou.
— Emília.
— Você quer que a gente fique? — ela perguntou
suavemente. — Você tem certeza?
— Tenho certeza, — confirmei, afastando o cabelo de
seu rosto.
— Eu não posso mudar o passado, Michael, — ela disse
cautelosamente. — Não importa o quanto eu gostaria que as
coisas tivessem sido diferentes.
— Eu sei que.
— Eu nunca quis ficar longe de você.
— Eu também sei disso.
— Mas você acredita nisso?
Olhei para ela, nua e amarrotada na cama, olhando
para mim como se eu fosse a resposta para tudo.
— Eu acredito nisso.
— Mamãe? — Rhett chamou da porta, me fazendo pular
de surpresa. — Mamãe, oi!
— Oi, amigo—, disse Emilia, sentando-se com um
sorriso envergonhado. — Você está acordado!
Enquanto ela procurava suas roupas, Rhett se
aproximou e estendeu a mão para mim para que eu o
pegasse.
— Como você está, amigo? — Eu perguntei quando ele
deitou a cabeça no meu ombro.
— Com fome, — ele respondeu com um suspiro
dramático.
Eu ri. — Vamos dar alguns minutos para a mamãe se
vestir, hein?
— E limpar, — murmurou Emilia, olhando para baixo
com uma careta.
— Leve o tempo que precisar, — ordenei, piscando. —
Use meu chuveiro.
— Mandão, — ela disse, acenando para nós sairmos.
Quando Emilia desceu mais tarde, Rhett e eu estávamos
terminando nosso cereal e discutindo sobre
motocicletas. Bem, ele estava jogando uma palavra aleatória
aqui e ali e eu estava tentando educá-lo sobre a doce Dyna
que acabei de reformar.
— Obrigada, — ela disse para mim, beijando meu
pescoço enquanto passava por mim. — Não me lembro da
última vez que tomei banho por tanto tempo.
— Achei que você estava me agradecendo por antes do
banho, — eu provoquei.
— Por favor, — ela zombou. — Você deveria estar me
agradecendo por isso. — Ela sorriu para mim por cima do
ombro.
— Você não está errada.
— Sua mãe me ligou, — ela disse, pegando uma xícara
de café no balcão. — Ela falou com seu pai e queria vir, mas
eu disse que poderíamos passar na casa deles hoje. Tudo
bem? Eu queria verificar Otto enquanto estivermos lá.
— Tudo bem por mim.
Ajudei Rhett a descer da mesa e observei enquanto ele
cambaleava até Emilia e passava os braços em volta de sua
coxa. Sem alarde ou pensamento, a mão dela caiu no topo de
sua cabeça e seus dedos começaram a mexer em seu
cabelo. Eu poderia dizer que era uma dança que eles fizeram
um milhão de vezes antes, fácil e inconsciente, e por algum
motivo, isso me atingiu muito forte. Eu balancei por um
segundo na minha cadeira antes de me endireitar.
Eu quase os perdi.
— Por que você está olhando assim para mim? — ela
perguntou baixinho, seus olhos encontrando os meus.
— Me sentindo com sorte, eu acho, — eu respondi com a
voz rouca.
— Engraçado. — Ela sorriu por trás de sua xícara de
café. — Eu estou me sentindo da mesma maneira.
— Eu quero mais filhos, — eu soltei, fazendo seus olhos
se arregalarem de surpresa enquanto ela engasgava com o
café.
— Eu também, — ela engasgou, balançando a cabeça. —
Mas talvez não por um tempo? — Ela olhou para Rhett. —
Estou com as mãos cheias.
— Nós, — eu corrigi. — Estamos com as mãos cheias.
— Certo. — O sorriso que ela me lançou iluminou toda a
porra da sala.
Capitulo 13

EMÍLIA

Eu tinha levantado cedo, estava usando uma das


roupas novas que Charlie tinha me dado, na verdade me
maquiado e arrumado meu cabelo, e estava me sentindo
muito bem no meu primeiro dia de treinamento de barista
com a prima de Michael. Honestamente, eu estava me
sentindo uma merda quente. Eu não pude evitar. Passei
metade da noite explorando o corpo de Michael e a outra
metade curtindo enquanto ele explorava o meu. Eu estava
exausta, mas valeu a pena.
As coisas pareciam sólidas com Michael. Eu estava
começando em um novo emprego e, no dia anterior, Rhett fez
cocô no banheiro pela primeira vez. Meus passos tremeram
quando me dirigi para o carro, deixando Michael e Rhett
dormindo no andar de cima.
E então meu carro não ligava.
— Michael, — eu chamei, subindo as escadas. Eu parei
bruscamente quando ele saiu do quarto de hóspedes.
— Estava te vendo sair, mas você não foi a lugar
nenhum, — disse ele sonolento, coçando a barba. — O que
está errado?
— Eu acho que minha bateria morreu, — eu respondi,
jogando minhas chaves para ele. — Você pode dar uma
olhada?
— Claro baby. — Ele beijou minha cabeça enquanto
passava por mim e descia as escadas correndo.
Ansiosa e frustrada, fui sentar com Rhett. Ainda não
havíamos colocado aquela estúpida porta para bebês, então
um de nós tinha que ficar com ele aqui em cima. Devo ter
checado a hora a cada trinta segundos, e cada vez que fazia
isso, ficava mais frustrada. Tudo o que eu precisava era que
Michael carregasse a bateria do meu carro. Por que diabos ele
estava demorando tanto? Eu ia me atrasar.
O pânico começou a se instalar quando Michael voltou a
subir as escadas. — Está funcionando? — Eu perguntei,
alcançando as chaves.
— Não, — respondeu ele, caminhando em direção ao seu
moletom. — Parece que o motor de partida estragou.
— Foda-se, — eu sibilei. — Posso pegar sua
caminhonete?
— Não pode, querida, — ele me lembrou enquanto
colocava o moletom e simultaneamente calçava suas botas. —
Tenho a cadeirinha na minha caminhonete e tenho que levar
Michael para a casa da minha mãe a caminho do trabalho,
lembra? É por isso que não vou de motocicleta.
— Oh, meu Deus, — eu sussurrei, olhando ao redor da
sala. — Vou ser demitida.
— Você não vai ser demitido.
— Eu vou se chegar atrasada!
— Você não vai se atrasar, — ele me assegurou. — Entre
na caminhonete. Eu levo Rhett para baixo e nós te levamos.
— Ele vai ser um monstro se o acordarmos tão cedo, —
eu respondi, agarrando seu braço para detê-lo. — E sua mãe
terá que lidar com isso o dia todo.
— Ela pode lidar, — respondeu ele quando meu nariz
começou a arder.
Deus, por que eu pensei que isso era uma boa ideia? Se
eu estragasse os negócios de Charlie, não seria apenas um
trabalho que poderia deixar. Haveria repercussões em toda a
família de Michael se eu parecesse uma louca. Qualquer erro
que eu cometesse seria alimento para as rainhas da fofoca.
— Em, vá, — Michael ordenou, batendo levemente na
minha bunda. — Nós estaremos lá.
Cerrei os dentes e segurei a mão de Rhett enquanto ele
choramingava durante todo o trajeto até a cafeteria em que
eu trabalharia naquele dia. Ele não entendia por que o
havíamos acordado, estava muito chateado por tê-lo colocado
no carro e tive a sensação de que, quando tentasse sair, ele
enlouqueceria.
— Ei, vai ficar tudo bem, — Michael me assegurou, com
a mão na minha coxa. — Pare de se estressar.
— Vai ser um desastre, — resmunguei de volta. Eu
estava tão nervosa que todos os músculos do meu corpo
estavam tensos, e quando encontramos Charlie do lado de
fora cinco minutos atrasada, senti como se fosse vomitar.
— O carro de Emilia morreu esta manhã, — Michael
anunciou enquanto me deixava sair da caminhonete.
— Bela história, — Charlie brincou facilmente, olhando
para mim. — Está tudo bem, cara. Você chegou.
— Sinto muito por estar atrasada.
— Sério, — disse ela, olhando para Michael e depois de
volta para mim. — Não é grande coisa.
— Eu tentei dizer a ela, — disse Michael quando Rhett
começou a chorar dentro da caminhonete. Eu me virei para ir
até ele quando Michael me parou. — Vá, baby. Eu vou
acalmá-lo.
Eu senti como se fosse vomitar quando balancei a
cabeça e segui Charlie até o pequeno trailer
iluminado. Alguns momentos depois, ouvi a caminhonete de
Michael sair do estacionamento.
— Manhã difícil, hein? — Charlie perguntou com
simpatia.
— Estava indo bem até que meu estúpido carro se
recusou a pegar, — eu respondi com uma risada
envergonhada.
— Acontece com a melhor de nós. — Ela deu de
ombros. — Não dá para planejar tudo o tempo todo. Você está
pronta para bater o ponto?
As próximas horas teriam sido engraçadas se não
fossem tão horríveis. Charlie tinha escolhido o carrinho que
tinha menos clientes pela manhã enquanto treinávamos, mas
ainda assim parecia que eu não tinha um único segundo
para parar enquanto carro após carro parava na janela. Eles
queriam tudo, desde café preto a bebidas energéticas com
sabor e, embora aprender na hora fosse como Charlie
treinava suas novas contratadas, claramente não parecia
estar funcionando para mim. Peguei os xaropes errados, fiz
uma bagunça gigantesca que nunca tinha tempo de limpar,
estraguei pedidos, joguei um latte inteiro entre a janela e o
carro do lado de fora e de alguma forma derrubei o sistema
que Charlie usava para processar as transações com cartão
de crédito. Foi um show de merda completo.
No momento em que fiz algo muito preocupante com a
máquina de café expresso, que fez um barulho alto e
estridente, Charlie e eu estávamos tão exaustas que fiquei
surpresa por ela não ter me ordenado a não tocar em nada
nunca mais.
— Que porra é essa? — Charlie gritou por cima do
barulho, olhando confusa para sua máquina. — O que você
fez?
— Eu não sei, — eu gritei de volta, meus olhos
começando a marejar. — Eu fiz exatamente como você me
mostrou.
Quando a máquina de café expresso foi desconectada da
tomada e o barulho finalmente parou, Charlie e eu estávamos
suadas, desgrenhadas e com os ouvidos zumbindo.
Charlie alcançou um interruptor na parede, desligando
as luzes. — Parece que fechamos por hoje, — ela disse com o
que era uma risada ou um bufo – eu não poderia dizer. —
Não dá para trabalhar em um carrinho sem a máquina de
café expresso, ou causaremos um tumulto. Voltarei mais
tarde para ver se consigo fazer os velhos fiéis trabalharem
novamente.
— Sinto muito, — respondi calmamente.
Charlie deu de ombros e olhou em volta para a
bagunça. — Eu vou lidar com isso mais tarde. Você quer que
eu te dê uma carona até a casa de Heather?
— Posso ligar para Michael me buscar.
— Tem certeza disso? — Ela gesticulou para que eu
saísse antes dela, então parou para trancar quando
estávamos do lado de fora. — Não me importo de leva-la.
— Sim, — respondi, tentando soar indiferente e não tão
desesperada para desaparecer quanto me sentia.
Ficamos do lado de fora ao vento enquanto eu ligava
para Michael.
— Ei, doçura, — Michael respondeu, sem fôlego. —
Como está seu primeiro dia?
— Eu terminei por hoje, — eu respondi, soando quase
alegre. — Você pode vir me buscar?
— Terminou por hoje?
— Sim!
Houve alguns segundos de silêncio quando sabia que ele
estava debatendo se deveria ou não perguntar por que eu
tinha terminado quatro horas antes do meu turno terminar,
mas Deus o abençoe, ele decidiu contra isso. Eu não tinha
certeza de como responder enquanto Charlie estava ao meu
lado, fechando o zíper de seu casaco.
— Estarei aí em cinco, — disse ele finalmente. — Estou
de motocicleta.
— Ele está vindo me buscar, — eu disse a Charlie com
um sorriso, guardando meu telefone. — Você não precisa
esperar.
— Eu não vou deixa-la aqui sozinha, — ela respondeu
com um bufo. — Posso esperar dez minutos.
— Você realmente não precisa. — Eu estava tão perto
das lágrimas que o nó na minha garganta era difícil de
ignorar.
— Não vai acontecer, — disse ela categoricamente,
inclinando-se para bater no meu ombro.
Ficamos ali em silêncio, tremendo dentro de nossas
jaquetas até que Michael entrou no estacionamento em sua
motocicleta. Eu não tinha certeza de como ou por que ele
voltou para casa para pegá-la depois que deixou Rhett em
casa, mas não ia perguntar. Eu só queria dar o fora dali o
mais rápido possível.
— Mesma hora amanhã? — Charlie perguntou com um
sorriso e um aceno. Ela caminhou até seu carro e estava
dentro dele antes que Michael desligasse sua motocicleta.
— O que aconteceu? — Michael perguntou enquanto eu
corri em direção a ele.
— Apenas me tire daqui, — eu ordenei
desesperadamente, tentando desajeitadamente subir na parte
de trás.
— Espere, espere, espere. — Ele me parou agarrando
meus quadris e me empurrou um pouco para trás para que
pudesse sair. — Você está bem?
— Eu estou bem, — eu retruquei. Eu estava perdendo a
luta contra minhas lágrimas e escovei meu rosto com
raiva. — Podemos ir, por favor?
— Você está congelando, — ele murmurou enquanto
tirava o capacete. — Por que diabos não esperou lá dentro?
— Ela provavelmente queria me levar o mais longe
possível de lá, — murmurei baixinho.
— O que?
— Eu só quero ir para casa.
— Tudo bem, — ele respondeu com um suspiro, ainda
me observando. — Aqui, coloque isso.
Alguns minutos depois, ele colocou o capacete na minha
cabeça e me ajudou a subir na moto, ordenando que eu
segurasse sua cintura com força antes de sair do
estacionamento. Meu estômago revirou de medo quando
entramos na estrada e forcei meu corpo a se mover com o
dele, embora tudo dentro de mim me exortasse a me inclinar
na direção oposta. Então, estávamos na estrada e, por alguns
momentos, parecia que estávamos voando.
Conforme fui ficando mais confortável na garupa da
motocicleta, a realidade começou a se infiltrar. Não importava
o quanto tenha tentado, falhei miseravelmente em algo que
deveria ter sido relativamente fácil. Atender um pedido, fazer
uma bebida, aceitar o pagamento e entregar a
bebida. Simples. Eu servi muita comida de bar e bebidas
então por que diabos o dia para fazer café foi tão
difícil? Charlie estava lá para me ajudar e eu ainda fui um
completo desastre. Eu não entendia e me sentia um completo
idiota.
— Como você deixou a caminhonete aqui? — Eu
perguntei quando estacionamos na frente da casa de Heather
e Tommy.
— Achei que você poderia precisar antes que eu
terminasse hoje, — Michael respondeu com um encolher de
ombros, ajudando-me a descer. — Então, estacionei a
caminhonete aqui e fui para casa no caminhão de reboque
com meu pai.
— Caminhão de reboque?
— Tenho que descobrir o que há de errado com o
Subaru, — Michael respondeu facilmente, tirando o capacete
de mim. — Nós o levamos para a garagem.
— Você não precisava fazer isso, — argumentei. As
coisas estavam começando a parecer muito fora do meu
controle e eu odiava isso. Eu entendia que ele estava
tentando fazer algo legal, mas nem tinha me perguntado.
— Precisamos dos dois veículos, — ele me lembrou. Ele
era tão prático que fiquei ainda mais irritada.
Eu sabia que precisava do meu carro. Michael
trabalhava muito mais horas do que eu e às vezes precisava
de sua caminhonete. Não era como se ele tivesse que me
informar desse fato.
— Diga-me quanto vai custar, — eu disse
categoricamente, indo em direção à casa. — Eu vou cobrir
isso de alguma forma.
— Uau, — Michael latiu, agarrando meu braço. — O que
diabos está acontecendo?
— Você nem me perguntou se podia pegar meu carro!
— Você está falando sério?
— É o meu carro, — eu resmunguei.
— E estava preso na porra da garagem, — ele disparou
de volta para mim, me olhando como se eu tivesse crescido
uma cabeça extra. — Você só queria deixá-lo lá como um
enfeite de jardim?
— Talvez eu só tivesse uma opinião sobre o que fazer a
seguir!
— Ok. — Ele ergueu as mãos. — O que você quer que eu
faça com o pedaço de metal que está na entrada da garagem?
— Não sei! — Eu gritei de volta.
— Embora eu normalmente adoraria assistir a este jogo,
— Heather disse secamente da varanda da frente. — Seu filho
está dormindo no sofá e vocês estão falando muito alto.
— Desculpe, — eu respondi, murchando. Eu só queria
que o dia acabasse. Eu queria que fosse hora de dormir,
então eu poderia colocar Rhett na cama e sentar em silêncio
por alguns minutos e descobrir o que diabos iria fazer.
— Você chegou cedo em casa, — Heather disse
enquanto eu caminhava em direção a ela. — Tudo certo?
— Bem, considerando o fato de que provavelmente terei
que pagar pela máquina de café expresso que joguei no lixo e
meu carro não pega, eu diria que foi um dia menos do que
bom.
Passei por ela e entrei na casa, ignorando Michael
quando ele perguntou o que diabos eu tinha feito com a
máquina de café expresso.
Rhett estava dormindo com a cabeça em uma almofada
e os pés apoiados no braço do sofá. Sentei-me perto de sua
cabeça com um suspiro, jogando meu braço sobre meu rosto.
— Parece que foi um dia estressante, — Heather disse
baixinho enquanto acariciava meu cabelo com a mão. Ela
atravessou a sala e sentou-se em uma cadeira. — Os
primeiros dias são os piores.
— Não foi um primeiro dia normal, — eu gemi, deixando
meu braço sobre meus olhos. — Foi um pesadelo completo.
— Você é nova, — respondeu Michael, inclinando-se na
parte de trás do sofá. — Depois que pegar o jeito das coisas...
— Por favor, — eu disse, levantando minha mão. —
Apenas pare, ok?
Ele ficou quieto por alguns momentos, e eu sabia que
tinha ferido seus sentimentos, mas não tentei consertar. Eu
só queria ficar sozinha por um minuto.
— Vou voltar para a garagem, — disse ele finalmente,
inclinando-se para beijar minha cabeça. — Vejo você depois
do trabalho.
— OK.
— Te amo, — ele disse calmamente. Ouvi seus passos e
depois a porta abrindo e fechando.
— Qual é o verdadeiro problema? — Heather perguntou
depois que ele se foi. — Um dia ruim nunca fez você cagar no
Michael.
— Eu não estava cagando nele, — argumentei, deixando
cair meu braço.
— Bem, como você chamaria isso? — ela perguntou,
levantando a sobrancelha.
— Eu só precisava de um segundo.
— Bem, agora você tem um. — Ela deu de ombros. —
Ele saiu.
— Ele tinha que voltar ao trabalho.
— Querida eu te amo. — Ela fez uma pausa. — Mas
pare de puxá-lo e depois empurrá-lo para longe.
— Não estou tentando fazer isso.
— Você quer ficar com meu filho, isso está claro como o
dia, — disse ela, levantando-se. — Deixe-o estar com você
também, certo?
Eu joguei meu braço para trás sobre o rosto quando ela
saiu da sala e deixei as lágrimas escorrerem pelos lados do
meu rosto. Que dia horrível. Eu não tinha a intenção de
começar uma briga com Michael, e agora, sentada em
silêncio, estava grata por ele ter visto um problema e ter feito
de tudo para começar a resolvê-lo. Se eu fosse honesta, era
algo que sempre amei nele. Se ele via que eu precisava de
algo, fazia de tudo para conseguir sem que eu precisasse
pedir. Se eu estava lutando com alguma coisa, ele tentava
consertar. Ele sempre foi assim, mesmo quando éramos
crianças.
Tudo parecia fora de controle. Uma vez que eu e Michael
decidimos fazer as coisas, tudo dentro, para sempre, eu
estava em uma nuvem de felicidade. Tudo parecia
possível. Mas muito cedo, a realidade parecia estar se
infiltrando em nossa pequena bolha, e eu não tinha ideia de
como navegá-la. Pensei no meu dia de trabalho e funguei.
Que porra eu ia fazer?
Algumas horas depois de deixar Heather com um abraço
e a promessa de parar de ser uma idiota com Michael, Rhett e
eu estávamos em casa preparando o jantar quando ouvi a
Harley de Michael na garagem. Fiquei no balcão mexendo no
bolo de carne enquanto Rhett corria até a porta da garagem e
o esperava.
— Cuidado, — gritei quando Michael abriu e Rhett
correu em sua direção.
— Uau! — Michael disse, rindo. — Você estava
esperando por mim?
— Papai, trabalho, — respondeu Rhett quando Michael
o pegou.
— Sim. Papai estava no trabalho. Mas estou em casa
agora! — Seus olhos encontraram os meus do outro lado da
sala.
— Desculpe pelo meu colapso antes, — eu disse
rapidamente. — Eu fui uma idiota.
— Você estava estressada, — Michael rebateu, vindo
para me beijar. — Não quis pisar em seus pés.
— O que você fez foi legal...
— Bem, eu pensei que sim, — ele brincou, colocando
Rhett de pé.
— Eu não estou acostumada com isso, — respondi
calmamente. — Nunca deixei Rhett chorando para que outra
pessoa pudesse confortá-lo. Eu me dirijo para onde preciso
ir. Eu cuido do meu próprio carro.
— Somos uma equipe, querida, — Michael me lembrou.
— Eu sei, eu só... — Eu balancei minha cabeça. — É
muito de uma vez.
— Quero dizer... posso ser menos útil?
— Eu só preciso entender isso, — eu murmurei,
voltando-me para o fogão.
— Amanhã será melhor, — Michael murmurou,
passando o braço em volta da minha cintura.
O nó em meu estômago que eu estava tentando ignorar
parecia ter aumentado de tamanho com suas palavras. Eu
não queria nem pensar no amanhã.
Imaginar voltar a trabalhar naquele carrinho, enfrentar
Charlie depois de ter estragado tanto, e potencialmente
quebrar outra coisa me deu vontade de chorar.
— Papai brinca, — Rhett ordenou, puxando a perna da
calça de Michael. — Eu brinco.
— Oh, você quer brincar, hein? — Michael respondeu,
me soltando para que pudesse pegar nosso filho. — O que
você quer jogar?
— O jantar estará pronto em dez, — eu disse para suas
costas enquanto caminhavam em direção à sala de estar.
— Obrigada, querida, — disse Michael, fazendo cócegas
em Rhett enquanto fingia jogá-lo no sofá.
Jantamos em família e passamos um tempinho ao ar
livre na grama e, por um tempo, pude fingir que minha
ansiedade não estava nas alturas. Eu ri, provoquei e
aconcheguei Rhett, mas o tempo todo havia um zumbido de
desconforto logo abaixo da superfície. Quanto mais tarde
ficava, mais perto eu estava do trabalho na manhã seguinte,
pior ficava minha ansiedade. Quando consegui fazer Rhett
dormir, estava quase em pânico.
Não podia voltar lá no dia seguinte. Eu não poderia
forçar Charlie a me manter por causa de alguma obrigação
familiar quando era incrivelmente ruim no trabalho. Esses
pensamentos, é claro, me levaram ao fato de que meu carro
era um grande pedaço de metal inutilizável e eu não tinha
dinheiro para consertá-lo, o que significava que eu tinha
que manter o emprego de barista. Foi um ciclo vicioso que
eventualmente me fez vomitar o pouco que consegui engolir
no jantar.
Michael me observou como se não pudesse me entender,
e eu finalmente subi para tomar banho só para ter um
segundo longe de seu escrutínio. Antes que eu perdesse a
coragem, mandei uma mensagem para Charlie dizendo que
não estava me sentindo bem e que não poderia trabalhar no
dia seguinte. Eu sabia que era um movimento covarde, mas
instantaneamente me fez sentir um pouco melhor.
O alívio durou apenas até o final do meu banho, porém,
e então eu estava em outra espiral de pensamentos sobre o
que diabos iria fazer. Antes de considerar as repercussões ou
realmente pensar sobre isso, eu tinha uma tesoura na mão e
estava cortando.
Michael me encontrou menos de dez minutos depois,
olhando no espelho para o meu novo corte de cabelo
massivamente mais curto e minha franja curta, sua boca
aberta em horror e surpresa.
— Que porra você fez? — ele perguntou incrédulo, com
os olhos arregalados.
— Vai crescer, — eu respondi estupidamente, correndo
meus dedos pelas mechas mais curtas. Assim como depois da
mensagem de texto covarde, estava me sentindo um pouco
melhor, mas sabia que não iria durar.
— Doçura, parece que você prendeu a cabeça em um
ventilador.
— Não está tão ruim.
— Você tem mechas compridas atrás, — ele apontou,
seu olhar vagando pelo meu cabelo. — Está tudo irregular.
— Talvez eu comece uma nova tendência. — Coloquei a
tesoura no balcão do banheiro.
— O que está acontecendo com você? — ele perguntou,
encostado no batente da porta e cruzando os braços. — Você
está pirando.
— Foi horrível lá hoje, — confessei com os dentes
cerrados.
— Miserável.
— Foi seu primeiro dia...
— Eu quebrei merda, — eu disse, falando sobre ele. —
Eu errei os pedidos. Derramei mais líquidos do que você
gostaria de saber. Eu quebrei toda a coisa do cartão de
crédito. Fiz a máquina de café expresso começar a guinchar.
Os lábios de Michael se contraíram.
— Não foi engraçado, — eu bati, meus olhos começando
a lacrimejar. — Foi terrível!
— Vai melhorar.
— Eu não quero voltar lá, — eu sussurrei, voltando-me
para a pia.
— Então não faça isso.
— Não posso simplesmente desistir, — argumentei.
— Por que diabos não? — ele perguntou, endireitando-
se. — Não é sua coisa. Você pode encontrar outra coisa.
— Eu não posso simplesmente desistir de sua prima, —
eu argumentei. — Eu pareceria uma idiota.
— Primeiro, quem se importa? — Ele levantou um
dedo. — E segundo, ficar em um emprego que você odeia é
simplesmente estúpido.
— Eu preciso do dinheiro.
— Não, você não precisa, — ele respondeu com um
suspiro. — Tenho tudo coberto até que você encontre outra
coisa.
— Eu não quero que você pague por tudo. Isso é
estranho.
— Você sabe quem trabalhava quando eu era criança?
— Ambos os seus pais?
— Às vezes, — Michael respondeu com um aceno de
cabeça. — E às vezes era só meu pai. Quando minha mãe
tinha um bebê novo ou simplesmente fazia sentido para ela
ficar em casa por um tempo, ela ficava. Você acha isso
estranho?
— Não, não é estranho.
— Então por que diabos você acha que é estranho para
nós fazermos isso?
— Porque eu acabei de chegar, — eu deixei escapar. —
Seus pais eram casados e estabelecidos e...
— Podemos nos casar.
— Cala a boca, — eu gemi.
— Pensei que você gostaria de uma proposta completa,
— Michael disse com um encolher de ombros. — Queria
economizar e comprar um belo anel e essas merdas, mas se
esse é o seu problema, eu me caso com você amanhã. Mas
você pode querer arrumar o cabelo primeiro, se quiser tirar
fotos.
— Você poderia falar sério pelo menos uma vez? — Eu
bati em frustração.
— Estou falando sério, — ele respondeu com tanta
calma que me irritou ainda mais. — Estou nisso para ganhar,
doçura. Tanto quanto eu sei, não precisamos de um papel
para torná-lo oficial, mas se isso tirar você da sua cabeça e
ajudá-la a relaxar por meio segundo, então vamos nos casar.
Comecei a chorar antes mesmo de ele terminar de
falar. Eu não sabia o que diabos havia de errado comigo. É
claro que eu queria me casar com Michael eventualmente,
mas ele estava certo - eu queria o grande pedido de
casamento. Eu queria fazer certo quando estivéssemos
prontos e empolgados com isso. Eu não queria me casar para
me sentir mais estável e segura.
Casar não apagaria esse sentimento de que eu era um
albatroz em volta do pescoço dele, algo que jurei a mim
mesma há muito tempo que nunca seria.
— Cara, — ele disse, levantando-me do chão. — Eu
realmente gostaria que você me dissesse o que estou dizendo
de errado aqui.
— Eu tenho que carregar meu próprio fardo, — eu disse
ironicamente, deitando minha cabeça em seu ombro
enquanto ele me levava para baixo. — Preciso ser um
membro produtivo por aqui.
— Você está cuidando de Rhett, — ele argumentou,
sentando-se no sofá. — Isso é muito produtivo.
— Você vai se ressentir, — murmurei, fechando os
olhos. — Ninguém quer uma vagabunda que apenas espera
que a outra pessoa pague por tudo.
Michael congelou, mas não percebi a princípio. Depois
de alguns momentos, porém, notei que sua mão estava
parada em minhas costas e seu coração trovejava sob meu
ouvido.
— Isso soa como seus pais falando, — ele disse, sua voz
rouca de raiva. — Foi isso que eles te disseram? Que eu
ficaria ressentido se você voltasse com Rhett e eu tivesse que
sustenta-los?
Não respondi porque estava muito próximo da
verdade. Eu amava meus pais e, durante a maior parte da
minha vida, confiei neles, mas eles nunca me deixaram
esquecer que eu tinha a responsabilidade de exercer minha
influência em nossa casa. Quando eu era criança era para
tirar boas notas, seguir as regras, fazer todas as
tarefas. Sempre que eu não atendia às suas expectativas, a
punição era rápida e terrível. Eu não lavei a louça, bem,
então poderia comer no balcão no dia seguinte. Com meus
dedos. O banheiro não estava limpo? Então eu não tinha
permissão para tomar banho. Uma nota ruim? Eu não podia
fazer nada além de estudar depois da escola até a hora de
dormir.
A casa era deles, e eu não contribuía financeiramente,
então tinha que contribuir de outras maneiras e, se não o
fizesse, não poderia aproveitar as coisas que eles tão
desinteressadamente forneciam. Depois que cresci e tive
Rhett, essas conversas se tornaram ainda mais diretas. Eles
estavam me apoiando, colocando um teto sobre a minha
cabeça e a de Rhett, e sempre que eu não atendia às
expectativas deles, lembrava-me de que eles pagavam as
contas. Eles não podiam mais me forçar a comer com as
mãos ou esperar para tomar banho, mas usaram outras
maneiras de se expressar.
Oh, eu achava que estar com Michael seria muito
melhor? Como ele se sentiria quando levasse Rhett para ele,
duas pessoas extras para apoiar e eu sem nenhuma
habilidade comercializável? Eu iria simplesmente depender
dele enquanto roubava para eles? Quanto tempo eu achava
que duraria antes que ele cansasse? Eu realmente achava que
ele só me deixaria sentar na minha bunda o dia todo enquanto
ele trabalhava, como eles? Como, como colocaria Rhett na
creche para que pudesse conseguir algum trabalho servil que
mal pagasse as compras, muito menos cuidar da
criança? Como Michael se sentiria sobre essa situação?
As memórias me esbofetearam, uma após a outra,
fazendo o nó em meu estômago aumentar.
A cabeça de Michael levantou quando alguém começou
a bater na porta da frente.
— Quem é? — Eu perguntei, saindo de seu colo.
— Não tenho visão de raio-x, — ele murmurou,
caminhando em direção à porta.
Quando ele a abriu e vi Charlie parada ali, quase gemi
de mortificação.
— Ei, — ela disse bruscamente, entrando, ela olhou
para mim. — Belo cabelo. Não se sente bem?
— O que? — Michael perguntou confuso.
— Eu só tive uma dor de cabeça a noite toda, — eu
disse, tentando ser vaga o suficiente para que ela acreditasse
em mim. Puxei o infeliz corte de cabelo.
— Você só não quer voltar amanhã depois do show de
merda de hoje, — ela corrigiu, movendo-se para a sala. Ela se
jogou em uma cadeira. — Eu não te culpo.
— Eu sinto muito...
— Pare de se desculpar, — ela disse, acenando para
mim enquanto Michael e eu nos sentávamos. — Ninguém
acerta no primeiro dia.
— Eu disse a você, — Michael murmurou.
— Eu realmente não estou me sentindo muito bem, —
respondi, estendendo a mão para esfregar minha testa para
efeito.
Charlie me observou atentamente. — Espero que não
pense que fiquei com raiva de você hoje, — ela disse depois
de alguns momentos. — Eu não fiquei.
— Eu matei sua máquina de café expresso...
— Isso foi o que ganhei por comprá-la de segunda mão,
— ela argumentou tristemente. — Você não a matou. A coisa
já estava em seu último suspiro, e não era muito barato
substituí-la.
— E agora você tem que fazer isso. — Eu fiz uma careta.
— Que parte você não está entendendo que não é sua
culpa? — ela perguntou curiosamente.
— Até você chamou isso de show de merda.
— Bem, sim, foi, — disse ela, inclinando-se para a frente
em sua cadeira. — Seu carro não deu partida, então você se
atrasou alguns minutos, teve que deixar seu filho enquanto
ele chorava, e então tivemos que encurtar o dia e você nem
tivesse suas oito horas completas. — Ela olhou para mim. —
E então parece que você brigou com um cortador de
grama. Parece um show de merda para mim.
— Eu quebrei sua coisa de cartão.
Charlie zombou. — Cai pelo menos duas vezes por
semana. você não quebrou.
— Eu derramei merda em todos os lugares!
— Você deveria ter visto o quanto Kara derramou na
primeira semana que trabalhou em nossa antiga loja, — ela
rebateu. — Ela escorregou e quase arrancou toda a prateleira
de xaropes. Pelo menos você não fez isso.
— Porque eu estava paralisada de terror.
A gargalhada de Charlie me assustou, mas não pude
evitar o sorriso que surgiu em meus lábios.
— Ouça, — ela disse, ainda sorrindo. — Eu não queria
que você achasse que estava com raiva de você ou algo
assim. Você trabalhou duro, mesmo que não tenha acertado
tudo. No meu livro, isso vai muito além de servir bebidas
como se você fosse Tom Cruise em Cocktail.
Minhas bochechas queimaram de vergonha, e eu não
tinha ideia do que ela estava falando, mas Michael
murmurou, — Boa referência, — baixinho.
— Tire folga amanhã, — ela disse enquanto se
levantava. — Tire o dia para que Farrah ou tia Callie
arrumem seu cabelo e decida se quer voltar. Eu adoraria tê-
la, especialmente considerando quão preocupada estava por
estar cinco minutos atrasado esta manhã, a maioria das
pessoas não dá a mínima, mas não quero que você volte e
fique infeliz.
— Obrigada Charlie, — eu disse enquanto a seguia até a
porta.
— Claro, cara. — Ela deu dois passos para fora antes de
girar de volta. — Uh, eu não tenho certeza se você percebeu...
— Ela fez uma careta e então riu levemente. — Mas aquela
camisa que você estava usando hoje?
— Aquela que você me deu?
— Sim, tem algo escrito na parte de trás.
— É mesmo?
— Você não parece o tipo de pessoa que usa isso para
trabalhar. — Ela fez uma pausa. — Ou em qualquer lugar
perto de uma escola primária.
Meus olhos se arregalaram de horror.
— Tudo bem tchau! — Ela correu escada abaixo,
acenando por cima do ombro.
— Michael, — chamei enquanto fechava a porta. — Você
notou alguma coisa sobre a camisa que eu estava vestindo
hoje?
— Não?
Subi correndo as escadas até o banheiro e tirei a camisa
do cesto de roupa suja, virando-a do lado direito para ler a
parte de trás.
Jovem o suficiente para roubar seu namorado, velha o
suficiente para foder seu pai.
— Oh meu Deus, — eu respirei envergonhada quando
Michael veio atrás de mim e começou a rir.
— Eu usei isso para trabalhar, — eu sussurrei,
horrorizada. — Por que você não me disse?
— Você estava de casaco, — ele disse defensivamente
enquanto eu o jogava no cesto.
— Vou para a cama, — anunciei, passando por ele. —
Para dormir.
— Nós não terminamos de conversar, — ele
argumentou, me pegando pela cintura.
Eu esvaziei contra ele, a dor de cabeça que fingia ter de
repente se tornando real.
— Nós podemos conversar amanhã?
Ele suspirou e beijou minha têmpora.
— Claro. Vou desligar as luzes e logo estarei com você.
— Obrigada, — eu disse, apertando seu braço antes de
me afastar.
— Emilia, — ele chamou suavemente quando cheguei à
porta do quarto. — Nós vamos conversar amanhã, doçura. —
Parecia menos uma promessa do que uma ameaça.
Capitulo 14

MICHAEL

Saí da cama naquela manhã, sabendo que não iria


trabalhar de jeito nenhum. Depois da conversa que tivemos e
do jeito que Emilia se calou antes de Charlie bater na porta,
eu sabia que se saísse o dia todo quando chegasse em casa
naquela noite, ela ficaria toda enrolada de novo. Eu não
queria sentar em outro jantar onde ela beliscava sua comida
e colocava uma frente muito transparente tentando agir como
se tudo estivesse bem.
A merda do carro a derrubou, e o péssimo primeiro dia
de trabalho a exacerbou - mas havia algo mais acontecendo
que eu não estava vendo. Ela era tão fanática por pagar suas
próprias despesas e fazer as coisas sozinha que quase parecia
uma compulsão. Logicamente, ela sabia que eu poderia
consertar o Subaru sem problemas com custos mínimos, mas
ainda estava em pânico sobre pagar por isso. Ela odiou o
trabalho no carrinho de café depois de um dia, até eu podia
ver, mas não falou a Charlie que não ia dar certo - embora
Charlie tivesse lhe dado a abertura perfeita.
Eu precisava descobrir o que diabos estava acontecendo
na cabeça dela, porque, se não o fizéssemos, acabaria se
tornando demais e eu precisava saber como mitigar as
consequências.
Suspirando, preparei um bule de café e me encostei no
balcão. Achei que depois que decidimos voltar a ficar juntos,
tudo se resolveria em algo fácil, mas isso simplesmente não
estava acontecendo. Pequenas coisas às quais eu não tinha
prestado muita atenção praticamente se iluminaram como
letreiros de néon enquanto eu deitava na cama tentando
dormir. A maneira como ela demorou tanto para voltar para
casa depois que seus pais morreram porque queria
economizar dinheiro, em vez de voltar correndo o mais rápido
que podia, estando claro que ela queria. Ela havia desistido
de pagar o aluguel, mas abasteceu minha cozinha com
centenas de dólares em mantimentos e não me deixou pagá-
la de volta. Como ela tinha pouca roupa, embora Rhett
estivesse totalmente equipado. A maneira como fez birra por
eu comprar pneus novos ou verificar o carro dela. Como ela
me garantia repetidamente que encontraria um emprego e
pagaria suas próprias despesas, embora eu tivesse a
assegurado e tranquilizado que não estava preocupado com
isso.
Enquanto eu olhava para o café pingando na jarra, meu
estômago queimava. Ela estava tão obcecada em pagar sua
hospedagem, em não ser uma vagabunda, como ela dizia, que
estava se amarrando em nós. Eu tinha certeza de que ela
havia se machucado tanto que vomitou na noite anterior. Ela
tentou fugir da sala, mas eu já tinha visto aquele tom de
verde antes.
Então ela cortou o cabelo, como costumava fazer
quando éramos crianças e ela tinha uma noite
particularmente ruim em casa.
Eu estava sentado à mesa tomando minha segunda
xícara de café quando Emilia tropeçou na cozinha com minha
camiseta. Seu cabelo curto espetado em todas as direções, e
voando ao redor de seu rosto enquanto ela guinchava e
parava bruscamente.
— Eu pensei que você tinha ido trabalhar, — ela
gaguejou, cruzando os braços sobre o peito e depois tentando
alisar o cabelo, indo e voltando entre os dois como se não
pudesse decidir se deveria esconder seus seios sem sutiã ou a
coisa cientista maluca na cabeça dela.
— Tirei o dia de folga, — respondi, observando-a com
diversão. — Café está quente se você quiser um pouco.
— Na verdade, foi por isso que desci. — Ela me deu um
sorriso tenso enquanto tentava passar por mim como se não
tivesse nenhuma preocupação no mundo, puxando a
camiseta.
— Rhett ainda está dormindo? — Eu me virei para
observá-la.
— Sim. Pensei em tomar uma xícara de café na
escada. — Ela olhou para mim por cima do ombro. — Alguns
minutos de paz e sossego, mas ainda capaz de detê-lo se ele
acordar e tentar descer sozinho.
— Esperta, — respondi, levantando-me. — Eu vou
acompanhá-la.
Acomodei-me na escada para esperá-la, imaginando
como iria se comportar sobre o dia anterior. Eu odiava
balançar o barco porque ela parecia mais calma do que antes,
mas não podia deixar essa merda apodrecer.
— Por que você tirou o dia de folga? — ela perguntou
enquanto se sentava ao meu lado, puxando os joelhos sob a
camiseta até que apenas os dedos dos pés estivessem saindo
do fundo.
— Precisamos terminar nossa conversa, — respondi,
encostado no corrimão.
— Poderia ter esperado até você chegar em casa.
— E você pensar nisso o dia todo? — Eu bufei.
— Você ouviu Charlie, — ela respondeu, tomando um
gole de seu café. — Não foi tão ruim quanto parecia. Voltarei
amanhã, e será um pouco melhor, e no dia seguinte será
ainda melhor...
— Você odeia isso, — eu percebi, observando as
emoções cruzarem seu rosto.
— Você não precisa gostar do seu trabalho para fazê-lo,
— ela rebateu. — É um salário. Vai funcionar até eu
encontrar outra coisa.
— Por quê? — Eu perguntei em confusão.
— Porque sim .
— Doçura, eu disse que ganho o suficiente para nos
cobrir.
— Você não deveria ter que nos cobrir sozinho, — ela
respondeu teimosamente.
— Eu quero.
A boca de Emilia se fechou. — Então, eu sou a pequena
dona de casa, — ela disse lentamente. — Descalça e grávida?
— Jesus. — Eu ri. — Espero que não. Use sapatos.
— Estou falando sério.
— Eu também, — respondi com firmeza. — Olha,
Em. Não sei por que você acha que precisa trabalhar em um
emprego que odeia só para ganhar algum dinheiro extra...
— Não sei por que você acha que eu não faria isso.
Respirei fundo, sabendo que estava tropeçando em um
campo minado. De alguma forma, ela havia metido na cabeça
que precisava se apressar para conseguir algum dinheiro,
mas não achei que isso tivesse algo a ver com seu sentimento
de auto-estima ou interesse genuíno em trabalhar. Era mais
sombrio do que isso de alguma forma.
— Coloque desta forma, — eu disse gentilmente. — Por
que você trabalharia em um lugar que odeia em vez de passar
esse tempo com Rhett antes de ele ir para a escola?
— Isso é um golpe baixo. — Sua espinha estalou em
linha reta. — Muitas mães trabalham. Isso não significa que
elas não queiram passar tempo com seus filhos. Ninguém
jamais diria isso sobre um pai.
Fechei os olhos em frustração. A conversa não estava
indo do jeito que eu queria, e não tinha certeza de como
salvá-la.
— Eu sei disso, — eu resmunguei. — Eu não estava
dizendo isso. Se você amasse seu trabalho, obtivesse alguma
satisfação com ele, ou inferno, mesmo que não gostasse, mas
precisasse trabalhar para pagar as contas, eu
entenderia. Tudo bem? Então faria sentido trabalhar, mas
docinho, nada disso se aplica.
— Eu não posso simplesmente ficar sentada de bunda o
dia todo.
Olhei para ela incrédulo. — É assim que você chama
perseguir Rhett o dia todo, limpando sua sujeira, limpando
sua bunda, alimentando-o doze vezes e depois limpando-o de
novo? Porque tenho que te dizer, eu o preparei para ir para a
casa da minha mãe ontem, e estava exausto antes mesmo de
começar a trabalhar.
— Eu nem sei por que estamos tendo essa conversa, —
ela disse, começando a se levantar. — Eu preciso trabalhar.
— Sente-se, — eu ordenei, minha paciência se
esgotando.
— Isso não está aberto a discussão, — ela disse, sua
bunda batendo na escada novamente. — Tenho de trabalhar.
— Jesus, — eu murmurei, olhando para o conjunto
amotinado de sua boca e a forma como seu corpo
praticamente vibrava com a tensão. — O que diabos eles
fizeram com você?
— O que você quer dizer? — As palavras eram
indiferentes. Condescendentes, até. Eu as ignorei.
— Por que você se contorceria para trabalhar em um
lugar que odeia quando não precisa? — Eu perguntei
gentilmente. — O que eles disseram a você para fazê-la
pensar que tinha que fazer isso?
— Me fazer puxar meu próprio peso não é uma coisa
horrível.
— Jesus Cristo, Emilia, — eu cuspi. — Você já puxa seu
próprio peso e metade do meu.
Ela zombou e balançou a cabeça.
— Você está cuidando do nosso filho.
Ela não respondeu.
— Você está cuidando da casa, não está tão limpa desde
que me mudei. Fazendo as compras para não ter que...
— Eu também moro aqui, — ela disse, me
interrompendo. — Claro que eu mesmo limpo.
— Vamos ser realistas aqui, — respondi. — Você limpa
para nós três. Você faz três vezes a merda que eu faço por
aqui. Como isso não é puxar seu peso?
— Como eu disse, — ela murmurou teimosamente. —
Não sei por que estamos tendo essa conversa. Tenho um
emprego e vou voltar amanhã.
— Não. Você não vai.
— Com licença?
— Vou ligar para a porra da minha prima e pedir que ela
te demita.
— Ela nunca vai te ouvir.
— Quer apostar?
— Por que você está fazendo isso? — ela latiu, ficando
de pé. — Por que isso é tão importante?
— Você me diz, — eu respondi, levantando. — O que
diabos está acontecendo nessa cabeça que está te
convencendo a voltar a um trabalho que te faz vomitar e
cortar seu cabelo?
— Vou puxar meu próprio peso...
— Aí está essa frase de novo, — eu murmurei
sombriamente. — Onde você ouviu isso?
— É uma frase comum.
— Você continua usando isso.
— Talvez porque eu tenha ouvido isso alguns milhões de
vezes, — ela rebateu frustrada. Assim que as palavras saíram
de sua boca, ela empalideceu.
— Você não ouviu isso de mim, — eu disse
suavemente. — Você nunca ouviria isso de mim.
Ela cruzou os braços sobre o peito novamente, olhando
para os pés.
— Você não precisa fazer nada além de estar aqui,
querida, — eu continuei, observando sua luta, esperando que
ela acreditasse em mim. — Eu e você não estamos marcando
pontos. Você pode fazer o que quiser, dormir o dia todo,
passar o dia inteiro no parque com Rhett cuidando dos patos,
treinar para ser uma maldita palhaça por tudo que me
importa. Eu não preciso de você tentando alcançar algum
ideal de sua parte da carga, só preciso que você esteja aqui
comigo. É isso.
— Ninguém quer um albatroz no pescoço, — ela
sussurrou, levantando a cabeça.
— Eu quero, — eu contra-ataquei. — Baby, eu
carregaria nosso peso todos os dias e duas vezes aos
domingos. Sem brincadeira.
— Mas por quanto tempo? — ela perguntou com um
sorriso triste.
— Para sempre. Eu já te disse isso. — Esperei alguns
segundos para que minhas palavras fossem absorvidas, então
estendi a mão e puxei uma mecha de seu cabelo maluco. —
Mas não se você continuar com esse corte de cabelo. Um
homem só pode aguentar tanto.
— Cale a boca, — ela disse, empurrando meu peito. —
Você não é engraçado.
— Quem está brincando?
Eu estava prestes a puxá-la contra mim, esperando tê-la
alcançado, quando uma vozinha no topo da escada fez meu
coração cair no estômago.
— Papai! — Rhett chamou alegremente. Meio segundo
depois, ele estava descendo a escada como se soubesse
exatamente o que fazer e eu estava avançando, tentando
impedi-lo.
Emilia chegou primeiro. Assim que Rhett errou o
primeiro degrau e começou a cair, Emilia caiu de joelhos
alguns degraus abaixo e o pegou antes que ele fizesse
contato. Ele gritou de surpresa quando cheguei atrás dela e
ajudei a virar Rhett de cabeça para cima.
— Não, Rhett, — Emilia disse, sua voz severa antes de
ambos começarem a chorar. — Sem escadas!
Eu caí de bunda e puxei os dois para o meu colo
enquanto tentava recuperar o fôlego.
— Não puxa seu peso, minha bunda, — eu murmurei,
meu coração ainda disparado. — Jesus. Vamos comprar um
portão agora mesmo.
— Depois de me vestir — disse Emilia, fungando
enquanto beijava o cabelo de Rhett. — Não vou sair de casa
com isso… e acho que fiz um pouco de xixi nas calças.
— Melhor do que eu, — eu brinquei com um
estremecimento. — Tenho certeza que caguei a minha.
Emilia começou a rir e eu sorri. — Vamos, Rhett, — eu
disse, puxando-o gentilmente para longe de sua mãe. —
Vamos vesti-lo enquanto mamãe se arruma.
Demorou quase o mesmo tempo para trocar Rhett -
ele tinha cagado nas calças, e vesti-lo quanto levou para
Emilia se arrumar. Eu mal tinha colocado seus sapatinhos
quando ela entrou na sala, com os olhos arregalados.
— E aí? — Eu perguntei, levantando-me.
— Temos que passar na casa dos seus avós, — disse ela,
puxando o cabelo. — Não posso sair em público assim.
— Não é tão ruim, — eu menti.
— Eu pareço uma completa esquisita.
— Eu gosto de esquisitas.
— Vou ligar para Callie.
— Tudo bem. — Olhei para Rhett. — Você quer ir ver a
vovó?
— Vovó, — ele concordou, levantando os braços para
que eu o pegasse.
Meia hora depois, Rhett e eu estávamos assistindo
desenhos animados na sala de estar dos meus avós,
enquanto vovó andava em volta de Emilia na cozinha,
cacarejando e cantarolando enquanto ela tentava descobrir
como salvar seu cabelo.
— O que diabos você fez, querida? — ela perguntou em
confusão genuína.
Eu ri baixinho.
— Dia estressante, — Emilia respondeu vagamente.
— Eu tive muitos desses, — disse vovó com um
escárnio. — Mas nunca cortei meu cabelo com um cortador
de unha.
— Eu usei uma tesoura.
— Se você diz.
— Consegue consertar isso? — Emilia disse
nervosamente. — Não posso deixar assim.
— Bem, — disse vovó, prolongando a palavra. — Posso,
sim. Mas você não quer falar com alguém que está por dentro
de todos os novos cortes? Eu não trabalho há muito tempo.
— Não quero que mais ninguém o veja assim, —
murmurou Emilia.
— Tem certeza? — Vovó cutucou. — Se eu tentar manter
o comprimento, você vai se parecer com Dorothy Hamill.
— Não sei quem é, — respondeu Emilia.
— Patinadora?
Não houve resposta.
— Ah, inferno. Eu posso cortá-lo em um duende fofo,
mas acho…
— O que você está fazendo? — Emilia perguntou
desconfiada enquanto inclinei minha cabeça para trás no sofá
para tentar ver a cozinha.
— Estou chamando reforços, — vovó disse severamente.
Não pude evitar a gargalhada que explodiu da minha
boca.
— Você fica quieto aí, — ordenou vovó, espiando pela
parede.
— Desculpe, vovó, — eu respondi.
Dez minutos depois, minha tia-avó Farrah entrou em
casa rebolando.
— Onde está a paciente? — ela perguntou importante,
nem mesmo parando quando eu apontei para a cozinha.
Eu esperei.
— Oh, pelo amor de Deus, — tia Farrah praticamente
gritou bem na hora. — O que você fez?
Tentei ouvir o que Emilia respondeu, mas outra pessoa
estava entrando pela porta.
— Olá, garotinho, — minha mãe cumprimentou.
— Ei mãe.
— Eu não estava falando com você, idiota, — ela
respondeu facilmente. — Rhett! Como está meu neto?
— Mila! — Rhett saiu do meu colo e correu para minha
irmã.
— Oh, como as coisas mudaram, — eu brinquei quando
minha mãe fez uma careta. — Pronta para cumprimentar
seu primeiro filho agora?
— Pfft, — ela respondeu, acenando para mim. Ela
rapidamente se abaixou para beijar minha cabeça antes de
seguir em direção à cozinha, Myla e Rhett seguindo atrás
dela. Depois disso, a porta não ficou fechada por mais de
alguns minutos de cada vez. Minhas tias e primas entraram,
praticamente me ignoraram e acabaram indo para a
cozinha. Eu nem tinha certeza de como eles se encaixariam
lá.
— O que diabos está acontecendo? — Eu perguntei
enquanto seguia o último lote.
— Meninos não são permitidos, — minha prima Rebel
anunciou. — Exceto Rhett. Ele pode ficar.
— Isso não é justo, — eu apontei.
— Eu não faço as regras, — ela rebateu com firmeza.
— Quem as faz?
Ela apontou para Charlie, que estava sorrindo para mim
com satisfação.
— Você é uma ameaça.
— Você tem um pau. Saia rapidamente.
Olhei para o grupo e encontrei Emilia, que ainda estava
sentada no meio da cozinha em uma cadeira, uma toalha
enrolada nos ombros.
— Você está bem? — Perguntei. Eu não conseguia nem
andar em direção a ela porque havia mulheres em todos os
lugares.
— Ela está bem, — Kara disse atrás dela.
— Estou bem, — disse Emilia, revirando os olhos. —
Desde que ninguém tire fotos.
— Tarde demais, — tia Farrah cacarejou, sorrindo para
Emilia.
— Nós te amamos, — disse minha tia Rose, cutucando-
me na barriga. — Mas, falando sério, saia.
Eu fiquei lá por um segundo, sem saber qual deveria ser
o meu próximo passo. Embora soubesse que Emilia estava
segura, obviamente, não me sentia bem em deixá-la com as
piranhas que eu chamava de família. Não era como se ela
fosse me pedir para ficar, mesmo que quisesse. Ela ficaria
muito envergonhada com isso.
— O quê, você acha que ela vai revelar seus segredos? —
Charlie falou. — Já sabemos de suas escapadas na
propriedade. Contra um carro? Realmente? Não pensei que
tivesse isso em você.
Meu rosto queimou como o fogo do inferno enquanto eu
olhava para Emilia. Ela encolheu os ombros, suas próprias
bochechas vermelhas como uma beterraba.
— Por que você não vai comprar aquele portão, baby? —
ela perguntou desesperadamente, seus olhos se arregalando.
Abri caminho pela multidão até alcançá-la, inclinando-
me para lhe dar um beijo.
— Nós vamos falar sobre isso mais tarde, — eu avisei.
— Eu fiquei um pouco tagarela quando você me deixou
no clube, — ela confessou.
— Ótimo.
— Por que você não deixa Rhett aqui? — ela disse,
obviamente tentando mudar de assunto. — Ele vai ficar bem
com todas essas babás. Fuja enquanto pode.
Eu bufei. — Eu te amo, mas você é um pé no saco.
— Digo o mesmo,— ela murmurou, seus lábios se
curvando em um sorriso.
— Diga a Charlie que você se demite.
— Cale-se, — ela sibilou.
— Você diz a ela, ou eu vou.
Saí de casa com um nó nas entranhas que tentei
ignorar. Emilia estava bem, e eu sabia disso, mas ainda
assim odiava deixá-la. Eu não tinha certeza se tinha
conseguido falar com ela naquela manhã e, honestamente,
não tinha certeza se algum dia conseguiria. Cristo, eu odiava
os pais dela. Eu não me importava que eles estivessem
mortos. Eu gostaria de poder lhes dizer que pedaços de
merda eles eram.
Como diabos ela poderia superar anos de
condicionamento que nunca fazia o suficiente? Como eu
poderia convencê-la de que ela não tinha que trabalhar duro
apenas pelo direito de existir em seu próprio maldito espaço?
Capitulo 15

EMÍLIA

— Ok , então eu costumava achar fofo como você estava


sempre mudando, — Heather disse para mim, passando os
dedos pela parte de trás do meu cabelo. — Mas está
parecendo menos fofo agora.
— Eu sei, — eu disse com um suspiro. — Está ruim.
— Por que diabos você fez isso? — ela perguntou,
virando-se para me encarar. — Nem parece que você estava
tentando manter a calma.
— Eu estava estressada, — murmurei, olhando para o
chão.
— Estressada? — Heather perguntou surpresa. —
Inferno, quando estou estressada, simplesmente pulo em
Tommy.
— Eca, mãe! — Myla gritou do chão perto da
geladeira. — Nojento!
— Sempre ajuda, — Heather continuou, ignorando a
filha. — Sempre.
— Esse é meu filho, você sabe, — Callie disse secamente
de seu assento na mesa.
— Temos cinco filhos, mãe, — Heather respondeu
alegremente. — Eu sei que você não acha que somos
celibatários.
— Eu prefiro não ouvir sobre isso, — Callie apontou.
— É apenas algo que eu faço, — eu disse,
interrompendo para não ter que ouvir mais nada sobre a vida
sexual dos pais de Michael. — Não sei por quê.
— Bem, você terá que encontrar outra maneira de lidar
com isso, — Farrah anunciou enquanto vasculhava sua
bolsa. — Porque se quiser cortar depois que eu terminar, vai
ter que ficar careca.
— Você vai cortar tão curto? — Eu perguntei, virando
minha cabeça em sua direção.
— Vai ser um duende, querida, — ela respondeu
distraidamente. — Não vou fazer muito curto, mas você não
vai ter muito com o que trabalhar quando eu terminar. Não
tem escolha. Você tem algumas partes muito curtas atrás.
— Ela vai deixá-lo fofo, não se preocupe, — a prima de
Michael, Cecilia, me assegurou. — Ela sempre arrumou meu
cabelo.
— Isso é porque você é muito mesquinha para pagar
alguém, — brincou Farrah. — Se você estragar de novo,
Emmy, vai ter que mandar Ceecee consertar. Ela é
cabelereira. Entendeu?
— Entendi, — eu disse fracamente. Era estúpido como
eu estava nervosa sobre cortar meu cabelo ainda mais
curto. Eu tinha feito isso comigo mesma, procurando aquela
adrenalina que sempre bloqueava qualquer punição que
meus pais decidissem ser boa para mim. Eu nunca esperei
resultados tão ruins porque nunca tinha feito um trabalho
tão curto antes.
— Você vai precisar de um piercing no nariz depois
disso, — Heather disse, pulando no balcão. — Vai combinar
com todo o seu visual.
— Passo, — murmurei quando senti os dedos de Farrah
passarem pelo meu cabelo.
— Ah, qual é, — a tia de Michael, Rose, reclamou. —
Viva um pouco.
— Você não tem nenhum piercing, — eu apontei.
— Não onde você possa vê-los, — Lily murmurou,
fazendo todo o grupo uivar de tanto rir.
—A maioria de nós já teve um piercing ou outro, — disse
Charlie com um sorriso. — Não estou dizendo que você
precisa se encaixar, mas...
— Não dê ouvidos a ela, — a tia de Michael, Molly,
ordenou, revirando os olhos. — A única coisa que furei foram
minhas orelhas.
— Eu quase te fiz furar a sobrancelha, — Heather
apontou.
— Eu estava bêbada, — Molly rebateu. — Você tem sorte
de Will ter me parado, ou eu teria te matado.
— Blá, blá. — Heather dispensou-a. — Eu quero saber
por que diabos Emmy Lou está tão estressada. O que está
acontecendo, garota? Você conseguiu Michael de volta, e
todos nós viemos com ele, e Rhett. Você está bem, querida,
finalmente.
— Não sei, — respondi evasivamente. — É muita coisa
acontecendo ao mesmo tempo.
— Eu posso entender isso, — Molly murmurou. —
Estive lá.
— Todas nós estivemos, — disse Callie com um aceno de
cabeça.
— OK. — Heather me observou de perto. — Mas qual é o
verdadeiro problema aqui?
Sentei-me lá sem ter para onde correr, imóvel como uma
pedra enquanto Farrah cortava meu cabelo e todos os olhos
da cozinha em mim.
— Eu não vim até aqui para vagabundear com Michael,
— eu respondi finalmente. — E parece que é tudo o que tenho
feito.
— Não é tudo o que você tem feito, — Charlie disse com
uma risada.
— E eu trouxe meus problemas comigo, — continuei. —
Meu antigo chefe me seguiu até aqui... — Eu parei para
engolir o nó na minha garganta. — E tudo isso aconteceu. E
agora meu carro morreu, e Michael tem que consertá-lo, e eu
quebrei a cafeteria de Charlie, e Rhett chorou quando o deixei
para trabalhar, e eu já estava atrasada, então nem consegui
acalmá-lo.
A cozinha estava silenciosa.
— E Michael quer ajudar com tudo isso e é tão doce,
mas eu não quero ser um fardo. Estou tão cansada de ser um
fardo que poderia gritar.
— Besteira, — disse Callie com um aceno de mão. Então
todas começaram a falar de uma vez.
— É para isso que serve a família.
— Você não acha que ele quer te ajudar? É para isso que
esses idiotas vivem.
— Eu disse que você não quebrou a porra da minha
máquina de café expresso.
— Aquele filho da puta deveria ter ficado no Arizona. Ele
conseguiu o que veio para ele.
— Deixar os filhos para trabalhar é difícil.
— Cara, você precisa de férias. Sem brincadeira.
— Todas nós consertamos nossos carros na oficina. Não é
grande coisa.
Os olhos de Heather ainda estavam em mim quando ela
levantou a mão, e o grupo se acalmou.
— Como diabos você pode ser um fardo quando deu ao
meu filho exatamente o que ele sempre quis? — ela
perguntou, inclinando a cabeça para o lado. — Esse menino é
cuidador desde que nasceu. Uma vez, quando ele ficou
agitado por uma hora inteira e Tommy estava no trabalho,
comecei a chorar. Você sabe o que ele fez? Parou de
chorar. Bem desse jeito. Eu estava chateada, então ele parou
para se certificar de que eu estava bem. Ele não tinha nem
um ano de idade. Ele cuida de seus irmãos e de mim desde
antes de começar a escola - e depois disso, ele te encontrou e
você se juntou a esse pequeno círculo.
Apertei minhas mãos com tanta força que meus dedos
ficaram brancos quando Farrah parou de tocar meu cabelo.
— Desde que era criança, ele nunca quis nada além de
você. Meus outros garotos estavam brincando, semeando sua
maldita aveia, mas não Micky. De jeito nenhum. Ele
encontrou o que queria quando era jovem e nunca
vacilou. Você aparecer com Rhett foi apenas a cereja no topo
do sundae que ele esperava há anos. Não desista desse
presente porque está preocupada que ele fique desapontado
ou sinta que você é um fardo, eu sou a mãe dele, e estou lhe
dizendo que isso nem é possível.
— Deixe-o carregar o peso por um tempo, — Callie disse
suavemente. — Ele tem ombros para isso - e acredite em
mim, chegará um momento em que você terá que carregá-lo
por ele.
— E eu odeio ser uma idiota, mas você está demitida, —
Charlie anunciou. — Se trabalhar te fez criar um mato no
cabelo, não vale a pena.
— Não me demita, — eu sufoquei, horrorizada.
— Tudo bem, eu não estou te demitindo, — disse ela
com uma risada. — Estou te dispensando. Até que eu
substitua aquela máquina, aquele carrinho estará fechado de
qualquer maneira e tenho pessoas suficientes para cobrir os
outros.
— Todas nós já estivemos no seu lugar de uma forma ou
de outra, — disse Molly, lançando-me um sorriso doce. —
Entendemos. Apenas... encontre um mecanismo de
enfrentamento diferente. Seu cabelo está muito ruim.
O grupo começou a rir e, embora eu pudesse sentir
meus olhos marejados de lágrimas, tive que me juntar a
elas. Elas eram incríveis. Cada uma delas sentou lá sem
julgamento, me ouvindo chorar sobre minha vida quando eu
sabia que algumas de suas histórias eram muito piores do
que a minha. Rose havia sido sequestrada com o marido e
teve que deixá-lo ferido para buscar ajuda. Lily ficou cega
durante a maior parte de sua adolescência por causa de um
tiroteio que as gerações mais velhas viveram. Cada história
era mais aterrorizante e angustiante do que a anterior, mas
ainda assim, quando elas ouviram que eu estava na casa de
Callie e algo estava errado, vieram correndo.
— Preciso encontrar um emprego, — engasguei,
fazendo-os rir de novo. — Alguém tem alguma ideia?
— Você não precisa de um maldito emprego, — disse
Farrah, colocando minha cabeça para trás com força na
posição que ela queria. — Fique em casa e cuide de Rhett...
— E Micky, — Lily gritou com uma risada.
— E ponha seus pés sob você, — Farrah continuou
como se sua filha não tivesse falado. — Você tem toda a sua
vida para trabalhar. Acomode-se um pouco. Veja como você
se sente em alguns meses.
— Isso não é realmente justo com Michael.
— É tão estranho te ouvir chamá-lo de Michael, — disse
Kara com um bufo.
— Bem, fica mais fácil saber de quem ela está falando,
— disse Rose, sorridente. — Temos o seu pai, Mack. O
homem de Cee Cee, Mark. E Mick. Isso é um maldito
pesadelo.
— Para ser justa, todo mundo o chama de Woody, —
apontou Cecilia.
— Ele gosta quando ela o chama de Michael, — Callie
disse, sorrindo para mim. — Eu acho que é doce.
— O suficiente para lhe dar uma dor de dente, — Farrah
murmurou atrás de mim. — E voltando ao que você disse,
Em, é muito justo com Michael. Ele pode voltar para casa
para você e seu filho todos os dias. Nada melhor do que isso.
— Amém, — Michael disse da porta, seus olhos em mim.
Ele deve ter entrado sorrateiramente em algum
momento, mas eu não tinha certeza do quanto ele tinha
ouvido. Meu estômago revirou com o sorriso que ele me
enviou.
— Você está adiantado, — disse Heather, virando-se
para encará-lo. — Ainda não terminamos.
— Bem, eu não vou embora de novo, — anunciou ele,
avançando.
— Espero que você não esteja planejando carregá-
la estilo An Officer and a Gentleman, — Callie disse com um
sorriso. — Porque o cabelo dela não está arrumado.
— Está quase, — disse Farrah, bloqueando minha visão
enquanto ela se aproximava para olhar para mim cara a
cara. — E parece fantástico se você me perguntar.
— Concordo! Concordo! — alguém concordou.
Farrah levou mais alguns minutos passando os dedos
pelo meu cabelo, cortando pedaços minúsculos, antes de dar
um passo para trás e puxar a toalha dos meus ombros com
um floreio. Ela me entregou um espelho de mão antes de
levar o pente e a tesoura de volta para a bolsa, e eu me
encarei, meu estômago revirando.
Estava tão curto. Bonito, porque Farrah nunca deixaria
ser diferente, mas curto. Eu nunca tinha usado tão curto
antes. Eu parecia uma pessoa diferente. Meus olhos
encontraram os de Michael quando ele se agachou na minha
frente.
— Está tão curto, — eu sussurrei, arrependimento
queimando meu estômago enquanto eu tentava não chorar.
— Eu acho que está lindo, — ele sussurrou de volta,
sorrindo. — Sexy.
— Cale-se.
— Não estou brincando, — disse ele, descansando as
mãos nas minhas coxas. — Eu gosto disso.
— Realmente?
— Realmente, doçura. — Seus olhos vagaram sobre
mim. — Faz seus olhos parecerem enormes.
— Isso é uma coisa boa?
— Lembra-me de quando éramos crianças e você ficava
com os olhos arregalados e inocentes, — disse ele
suavemente.
— Eu sinto que isso vai me aventurar em um território
piegas-não-posso-viver sem você, então estou fora, — Charlie
anunciou com uma risada. Ela deu um beijo de despedida na
mãe e em Callie antes de acenar para o grupo e sair da
cozinha. Michael se levantou enquanto uma a uma as
mulheres a seguiam, despedindo-se e dando
abraços. Eventualmente, éramos apenas eu, Michael, Callie,
Heather e Molly na cozinha.
— Reb está brincando com Rhett, — Molly explicou com
um pequeno sorriso. — Achei que deveria dar a ela mais
alguns minutos de tempo de bebê antes de sair.
— Ela é tão boa com ele, — eu disse, olhando para a
sala de estar.
— Ela sempre foi boa com bebês, — Molly respondeu
melancolicamente. — Eu tipo sempre desejei que tivéssemos
dado a ela alguns irmãos para amar.
— Ela nunca teve falta de primos, — Callie disse
consoladora, acariciando a mão de Molly.
— Muito verdadeiro.
— Parece bom, — disse Heather, chamando minha
atenção para seu poleiro no balcão.
— Realmente? — Eu perguntei, passando meus dedos
pelas mechas curtas de cabelo.
Eu me sentia careca.
— Realmente, — ela respondeu. — Combina com você.
— Obrigada. — Minha voz falhou na palavra e cobri meu
rosto de vergonha quando comecei a chorar.
Heather me dizendo que meu cabelo combinava
comigo assim como fazia toda vez que eu aparecia com um
novo corte de cabelo em casa pareceu abrir as
comportas. Chorei tanto que fiquei com soluços. Chorei tanto
que nem ouvi quando Rhett entrou na cozinha até ele dizer
meu nome.
— Mamãe? — ele perguntou confuso, seu rosto
contorcido como se ele fosse começar a chorar também. —
Mamãe está machucada?
— Estou bem, amigo, — eu disse, tentando recuperar o
fôlego enquanto o puxava para o meu colo.
— Cabelo, — ele murmurou, estendendo a mão para
tocá-lo. — Cabelo da mamãe.
— Eu cortei o cabelo, — eu disse, enxugando meu rosto
com uma mão enquanto o segurava firme com a outra. —
Você gosta disso?
— Não.
— A verdade sai da boca de bebês, — Molly disse com
tristeza, fazendo Callie e Heather rirem.
— Eu corto, — Rhett exigiu, pegando seu próprio cabelo.
— Vamos esperar por isso, — eu disse, puxando sua
mão de volta para baixo e beijando-a. — Você não tem o
suficiente para cortar ainda.
— Quando seu cabelo ficar um pouco mais comprido,
vamos juntos, — disse Michael. — Parece bom?
— Não. — Rhett fez beicinho.
— Bem, eu gosto do seu cabelo, — Rebel disse
docemente. — Parece atrevido.
— Atrevido, hein? — Eu disse com uma risada.
— Sim. Como se você tivesse uma atitude. — Ela
projetou o quadril para fora para dar ênfase. — Mas não uma
atitude ruim, no entanto.
— Uma mulher que vai atrás do que quer, — Molly
concordou, passando o braço em volta dos ombros de Rebel.
— Como eu, — Rebel concordou. — Talvez eu devesse
cortar meu cabelo.
— Se você quiser, — Molly disse com um encolher de
ombros enquanto Rebel se afastava. — Porque você não
pensa sobre isso por alguns dias e, se ainda quiser cortá-lo,
pediremos à tia Farrah.
— Quero que vovó faça isso, — rebateu Rebel.
— Claro, querida, — Callie disse enquanto pegava uma
vassoura para varrer a cozinha.
— Contanto que você não se importe, — Rebel disse,
olhando para mim timidamente. — Charlie disse que algumas
mulheres não gostam quando você copia o estilo delas.
— Eu adoraria ter o mesmo corte de cabelo, — eu
assegurei a ela.
— Eu também! — Os olhos dela se iluminaram.
— Ok, vamos decidir em alguns dias, — disse Molly com
firmeza. — Você está pronta para ir? Vamos levar o almoço
para o papai.
— Pronta, — Rebel assentiu. — Tchau, doce Rhett.
— Tchau, Reb, — disse Rhett com o polegar. Sua cabeça
já estava inclinada cansadamente contra meu ombro.
Depois que elas saíram, Heather olhou para mim.
— Sentindo-se menos estressada?
— Talvez um pouco, — respondi timidamente.
— Você tem uma tribo inteira agora, — Callie disse
enquanto passava por mim. — Não se esqueça disso.
— Meio difícil quando eles te cercam como abelhas, —
Michael brincou.
— O começo é sempre difícil, — Heather nos disse. —
Ninguém está imune a isso. Às vezes, você só precisa de um
lembrete de que tem muita gente atrás de você, esperando
que você dê um jeito nisso.—
— Bem, isso começou muito doce, — Michael
murmurou.
— Saia daqui, — Heather ordenou. — Coloque meu neto
para tirar uma soneca e relaxe um pouco. — Então ela olhou
diretamente para mim. — Você não tem que resolver nada
hoje, garota. Você não tem que resolver isso amanhã
também. Apenas absorva essa merda, sim? Você só terá esse
tempo uma vez.
— Estou tentando.
— Tente mais, — ela ordenou secamente. — Agora
vá. Corra.
Demos abraços em Callie e Heather e, alguns minutos
depois, estávamos indo para casa na caminhonete de
Michael.
— Ele já desmaiou, hein? — Michael perguntou baixinho
enquanto se inclinava ao meu redor para dar uma olhada em
Rhett.
— Sim, — murmurei, deitando minha cabeça em seu
ombro. — Charlie me demitiu.
— Aquela cadela, — ele respondeu instantaneamente.
Eu ri. — Cale-se.
— Você está se sentindo melhor sobre tudo? — ele
perguntou timidamente.
— Honestamente, — eu suspirei. — Sim. Estou.
— Eu tive um monólogo completo mais cedo, onde
expus meu coração e isso não te tocou, mas uma hora com
minha família, sim? — Ele balançou sua cabeça.
— Foi os dois. — Eu sorri. — Parece que elas me
odiariam por fugir de você, mas não odeiam.
— Claro que não. — Ele zombou. — Você foi coagida
quando éramos apenas crianças. Levei um minuto para
descobrir, mas agora entendi.
— Você entendeu? — Olhei para ele, maravilhada com a
maneira como a luz do sol tornava seu cabelo castanho quase
dourado. Seus cílios eram tão longos que projetavam uma
sombra em sua bochecha enquanto ele observava a
estrada. Eu não podia acreditar, depois de tudo o que
aconteceu, que eu estava ali ao lado dele novamente,
dirigindo por uma estrada familiar no banco do meio de sua
caminhonete.
— Você nunca quis me deixar, — ele disse baixinho,
colocando a mão na minha coxa.
— Não.
— Seus pais... — Ele fez uma pausa como se procurasse
as palavras certas. — Eles não te deram muita escolha,
baby. E não quero dizer que eles te sequestraram. — Ele
olhou para mim e depois de volta para a estrada. — Acho que
estou começando a entender como era aquela casa.
— Acho que eles fizeram o melhor que puderam, — eu
disse timidamente.
— Eu acho que eles te foderam completamente e você de
alguma forma saiu dessa merda depois que eles
morreram. Você ainda está encontrando uma saída para isso.
— Talvez, — eu respirei, olhando para fora do para-
brisa. Eu sabia que ele estava certo, mas ainda era difícil
admitir, até para mim.
— Mais importante, — disse ele, apertando minha
coxa. — Você não vai a lugar nenhum de novo.
— Nunca.
— Então estamos quites.
Soltei uma risada e ele me olhou interrogativamente.
— Estamos quites? — Eu engasguei.
— Estamos quites, — disse ele, arregalando os olhos
enquanto acenava com a cabeça. — Você sabe, nós estamos
bem. Estamos bem.
— Eu sei o que significa, — eu disse, meu corpo
tremendo de tanto rir. — Você estava sendo tão doce e
romântico, e então disse isso.
— O que há de errado com isso? — Ele demandou.
— Nada, — eu engasguei, tentando manter uma cara
séria. — Estamos quites.
— Você é uma babaca, — ele brincou, começando a
rir. — Estou sendo doce aqui.
— Claro que você está.
— Emilia, — ele latiu, tentando agir com severidade,
mas falhando miseravelmente enquanto ria novamente. — Eu
te amo, e vou consertar a merda se você precisar e vou pagar
a porra das contas até você encontrar um emprego que
realmente goste, não, amor, e você pode simplesmente lidar
com isso. Se eu ouvir sobre você carregar seu próprio peso de
novo, vou ficar super chateado, certo?
— E estamos de volta ao romance de novo, — eu
respondi, envolvendo meu braço em volta de sua cintura.
— Estou falando sério, sim? — ele disse, beijando o topo
da minha cabeça. — Estamos nessa merda juntos.
— Eu sei.
— Não existe o meu peso e o seu peso e marcar quem
está fazendo o quê.
— OK.
— Bom. — Ele acenou com a cabeça e olhou para mim,
seus lábios puxando para cima em um meio sorriso. — Então
nós estamos... quites.
Minha risada acordou Rhett. Estendi a mão para
segurar a dele enquanto ele olhava turvamente pelo para-
brisa e ficamos assim pelo resto da viagem, nós três
conectados.
Eu ainda estava preocupada por não ter minha própria
renda. Eu ainda me sentia um pouco como se algo ruim fosse
acontecer. Mas pela primeira vez desde que o deixei anos
atrás, não me preocupei, nem por um segundo, que Michael
algum dia perceberia que eu não era o suficiente. Quando ele
olhava para mim, tanta emoção em seus olhos que me
deixava sem fôlego, entendi que não teria que fazer nada para
merecer o amor de Michael ou seu respeito. Eu sempre tive.
Epilogo

MICHAEL

Desci as escadas na ponta dos pés, olhei pela esquina e


corri para a lavanderia, deslizando com as meias pelo piso
rangente. Abri a máquina de lavar e joguei minhas roupas de
trabalho da semana anterior e um jeans excepcionalmente
enlameado que Rhett havia usado. Eu adicionei sabão e liguei
a máquina quando uma risada atrás de mim me fez
estremecer de surpresa.
— Você deixou cair uma meia, — Emilia disse divertida,
balançando a meia de um lado para o outro entre nós.
— Apenas colocando uma carga antes de irmos, —
respondi com falsa indiferença, arrancando a meia de sua
mão para que eu pudesse colocá-la com o resto.
— Você é doce, sabe disso? — ela disse, encostada no
batente da porta.
— Tento o meu melhor.
— E sorrateiro.
— Eu não preciso que você lave minha roupa.
— Eu não me importo de fazer isso.
— Sim, querida, eu sei, — respondi com um suspiro,
passando meu braço sobre seus ombros enquanto a conduzia
pela casa.
— Você faz um monte de outras coisas, — ela apontou,
batendo no meu peito.
— Rhett! — Eu chamei quando ele ficou de pé no sofá
para cair de bunda, saltando e rindo como um maníaco. —
Não pule no sofá, cara.
Já havíamos movido qualquer móvel com pontas afiadas
para a garagem, mas eu ainda tinha visões diárias dele
caindo e quebrando o braço. O doce bebê que Em trouxe para
casa com ela se transformou em um viciado em adrenalina
que desafia a morte nos poucos meses em que eles estiveram
em casa. Ele subia em tudo, usando cadeiras e banquinhos
na cozinha para subir nos balcões, subindo pelo lado de fora
do corrimão da escada como um macaco e, geralmente, quase
nos causando ataques cardíacos a cada poucas horas. Não
importava quantas vezes disséssemos não a ele, o
redirecionávamos ou tornávamos mais difícil para ele ter
problemas - ele ainda encontrava.
— Sofás são para sentar, — Emilia o lembrou enquanto
ia buscá-lo. — Não para pular.
— Eu pulo.
— Não, — ela disse, cutucando-o na barriga. — Você
não.
— Eu pulo, — ele gritou de volta.
— Então, esta idade é divertida, — Emilia murmurou
para mim, revirando os olhos. — Você está pronto para ir?
— Só tenho que calçar minhas botas.
— Rhett, você quer ir ver vovó e papai?
— Vovô? — ele perguntou, estreitando os olhos.
— Sim, vovô estará lá também, — eu respondi, enfiando
meus pés em minhas botas. — E o tio Rumi.
— Myla?
— Sim, Myla também.
— Tudo bem, — disse Rhett, saltitando nos braços de
Emilia. — Eu vou.
Tínhamos desenvolvido um sistema para sair de casa e
observei alegremente enquanto Emilia saía com Rhett,
confiante de que eu pegaria sua bolsa e cobertor. Passaram-
se semanas antes que ela relaxasse o suficiente para me
deixar ter certeza de que tínhamos tudo o que ele
precisava. Não era como se houvesse muito, cobertor, copo
com canudinho, fraldas e lenços e uma muda de roupa. Ela
apenas sentia que precisava ter certeza de que tudo estava lá,
que era apenas sua responsabilidade.
Estávamos trabalhando nisso. Eu tentava não me
incomodar quando ela fazia coisas sozinhas que seriam mais
fáceis para nós fazermos juntos... e ela tentava não surtar
quando eu insistia em ajudar. Não era nem mesmo uma coisa
de controle - ela sabia que eu podia lidar com isso - ela ainda
estava lutando com aquela quantidade arbitrária de coisas
com as quais tinha que contribuir para sentir que estava
fazendo sua parte.
Estava ficando melhor. Ela parou de se preocupar em
conseguir um emprego o mais rápido possível e começou a
realmente procurar por algo que a fizesse feliz. Ela gostava de
ajudar as pessoas e estava pensando em ensinar, mas isso
exigiria mais alguns anos de escola e ela não tinha certeza se
queria esperar tanto para começar a trazer algum dinheiro.
Eu odiava que ela ainda tinha isso em mente, mas deixei
passar.
Eu não conseguia deixar de lado o jeito que ela parecia
quase obcecada em fazer tudo pela casa. Alguns dias eu
chegava em casa e juro que o brilho dos balcões da cozinha
queimava meus olhos porque ela havia polido as malditas
coisas. Tive de persuadi-la, ameaçá-la e seduzi-la para que se
sentasse comigo e assistisse a um filme depois que Rhett
fosse para a cama, porque ela sempre tinha uma lista de
coisas na cabeça que ainda precisava fazer. Quando a
encontrei montando a cama infantil que compramos para
Rhett, usando uma chave de fenda desajeitada e xingando
baixinho, bati o pé no chão e fui buscar a furadeira na
garagem.
Não deixei que isso se tornasse um problema, não
estava disposto a causar problemas entre nós, mas sempre
que podia, intervinha sem dizer nada. Jogava roupas na
máquina de lavar, limpava a lama das botas de Rhett, pegava
os brinquedos que Rhett havia espalhado pela sala — às
vezes antes de ele terminar de brincar com eles — só para
tirar um pouco do prato dela.
— Coloquei a salada de batata e a salada de macarrão
no refrigerador, — ela me disse enquanto dirigíamos em
direção ao clube. — Portanto, tenha cuidado ao retirá-lo do
caminhão para não tombar.
— Eles estão no gelo? — Eu nem a tinha visto sair
naquela manhã.
— Sim. — Ela torceu o nariz enquanto olhava para
mim. — Tive que fazer tipo quarenta e cinco viagens da
máquina de gelo na geladeira para o refrigerador porque não
queria comprar uma sacola na loja.
— Por que você simplesmente não levou o refrigerador
para dentro? E onde diabos eu estava?
— Porque seria muito pesado para carregar de volta
uma vez que o gelo estivesse nele e você estava no chuveiro.
Ela deu um tapinha consolador na minha perna
enquanto eu fazia uma careta.
Era merda assim o tempo todo. Eu poderia ter levado o
refrigerador para a caminhonete. Ela me pediu? Não. Ela
apenas carregava copos menores de gelo da cozinha para a
garagem várias vezes, tornando isso dez vezes mais difícil do
que o necessário, porque se recusava a pedir ajuda.
— Sacos de gelo custam apenas dois dólares, — eu a
lembrei.
Ela deu de ombros.
— Vovô? — Rhett perguntou de repente, inclinando-se o
máximo que pôde para olhar pela janela de trás.
— Sim, cara, eu disse que vovô vai estar lá também.
— Gosto vovô.
— Isso é porque ele te dá doces, — Emilia brincou,
fazendo cócegas nele.
— Eu gosto de doces.
— Realmente, — respondi secamente. — Eu não teria
imaginado isso.
— Acho que é isso.
—Estou ansiosa por isso, — Emilia disse alegremente
enquanto se inclinava contra meu ombro. — E estou feliz por
termos pegado a caminhonete.
— Devíamos ter mandado Rhett para a casa da minha
mãe e poderíamos vir de moto, — eu disse com uma
piscadela, fazendo-a sorrir. Depois de uma noite de encontro
particularmente... flexível, Emilia tinha um novo apreço pela
minha Harley.
— Você acha que Rumi vai trazer um encontro? — ela
perguntou, sentando-se em seu assento.
— Você precisa ficar fora disso, — eu avisei.
Emilia facilmente encontrou seu lugar na extensa
família Aces, e saía com Olive e Nova com bastante
frequência, o que era ótimo. O que não era bom foi o fato de
que ela colocou na cabeça que Nova estava apaixonada por
meu irmãozinho e tinha decidido que era sua
responsabilidade proteger a pobre garota da prostituição de
Rumi.
— Você viu o rosto dela, — ela retrucou ferozmente. —
Quando ele trouxe aquela garota.
— Ela era legal, — eu meditei. — Qual era o nome
dela? Mandy? Margo? Algo com um M.
— O nome dela era Candace, — Emilia disse, olhando
para mim como se eu fosse uma idiota.
— Não consigo mantê-los em linha, — murmurei,
encolhendo os ombros enquanto rolava minha janela no
portão do clube.
— Meu amigo Rhett está aí? — Gray perguntou,
aproximando-se da janela.
— Gray! — Rhett gritou.
— Que diabos você está fazendo no portão? — Eu
perguntei com uma risada.
— Os prospectos estão cagando até as entranhas, — ele
respondeu com um escárnio. — Eu disse que ficaria por uma
hora enquanto as pessoas chegavam aqui, então ninguém
tinha que lidar com isso.
— Eles estão doentes? — Emilia perguntou preocupada.
— Mais como eles comeram alguns frutos do mar
vencidos e completaram com Ouzo3, — disse Gray
categoricamente. Ele olhou para o relógio. — É melhor eles
colocarem suas bundas nojentas aqui nos próximos quinze,
ou vou quebrar algumas cabeças.
— Divirta-se com isso, — eu disse enquanto ele
caminhava para trás para abrir o portão. — Te vejo lá em
cima.
— Ele é tão legal, — Emilia disse, olhando para Gray
pela janela de trás. — Por que ele não tem namorada?
— Eu não perguntei, — respondi secamente. — Por que,
você está olhando?
— Por favor. — Ela me deu uma cotovelada no lado.

3Uzo, também conhecido pela grafia ouzo, é uma bebida alcoólica grega feita com base
no anis.
— Nem todo mundo se acomoda quando criança, — eu
apontei enquanto encontrava um lugar para estacionar.
— Acho que tivemos sorte. — Ela soltou o cinto de
segurança e se inclinou para beijar minha bochecha.
— Eu acho que sim.
— Vovó! — Rhett gritou, chutando e apontando.
— Dê-me um segundo, amigo, — eu disse, pegando um
vislumbre de Vovó pela janela. — Vou tira-lo dai.
A festa estava no auge enquanto eu carregava o isopor
para as mesas de piquenique, e isso me lembrou da primeira
onde trouxe Emilia e Rhett. Tive a sensação de que, se a
deixasse agora, ela acenaria para mim e diria que me veria
em casa.
— Gosto mais quando as crianças estão aqui, — Emilia
me disse baixinho enquanto um grupo delas passava
correndo, pistolas de água na mão.
— Você se divertiu muito quando eles não estavam, —
eu a lembrei. Eu nunca esqueceria Emilia bêbada tentando
ensinar as mulheres a fazer backbend. Tivemos sorte de não
termos levado ninguém ao hospital.
— Sim, sim. — Ela se afastou para um grupo de
mulheres que caminhava em direção ao prédio e deixei o
refrigerador em uma das mesas e me sentei ao lado para ver
minha avó ensinar Rhett a soprar uma bolha.
Ela soprava um pouco, e ele ria e as perseguia. Então
ele tentava soprar uma e borrifava a água com sabão em
todos os lugares, ficava frustrado, e ela soprava outro lote
para distraí-lo. Funcionou todas as vezes. Eu ri.
— Ei, garoto, — meu tio Will disse, me dando um
tapinha nas costas enquanto se sentava na mesa ao meu
lado. — Como vão as coisas?—
— Tudo certo.
— Sim? Isso é bom. Se acomodando?
— Como se ela nunca tivesse ido embora.
Tio Will assentiu. — Sem pesadelos?
Olhei para ele surpreso. — Como você sabe disso?
Tio Will zombou. — Juro por Cristo, pesadelos podem
ser a coisa que todas essas mulheres têm mais em comum.
— Serio?
— Alguém invadiu sua casa, cara, — disse ele,
observando Rhett e vovó. — Terminou bem. Ninguém foi
ferido. Ainda deixa uma marca.
— Às vezes eu tenho que sair da cama e verificar a casa
inteira antes que ela volte a dormir.
Tio Will assentiu. — Vai melhorar. — Ele olhou ao redor
do quintal até encontrar minha tia Molly. — Nunca
desaparece completamente, mas fica muito melhor.
— Tia Molly ainda…
— Raramente, mas acontece.
— O que... — Engoli em seco. Nós não conversamos
sobre essas merdas. Com meu pai, talvez. Com a minha mãe,
claro. Mas nunca com o tio Will. — O que devo fazer?
— Levante-se e verifique a casa, — ele disse
simplesmente, sorrindo para mim. — Você é um bom menino.
— Obrigado?
— Não estrague tudo de novo, — ele ordenou,
levantando-se. — Você tem sorte de Otto ter te atacado antes
de mim naquela noite porque eu teria te derrubado.
Meu rosto ficou frouxo de surpresa.
— Acho que aquela garota não tem um pai cuidando
dela, — ele disse calmamente. — E o que ela tinha era uma
merda. — Ele olhou para mim. — Considere-me um
substituto.
Levei alguns minutos para levantar meu queixo do chão
e ele estava quase na metade do quintal antes que eu
pudesse pensar em algo para dizer.
— Você não acha que isso é um pouco incestuoso? —
Eu gritei, fazendo com que cabeças se virassem em confusão
e nojo.
Tio Will simplesmente me mostrou o dedo por cima do
ombro enquanto alcançava tia Molly.
— Saia da mesa, — minha mãe ordenou enquanto ela e
Emilia vinham atrás de mim. — Estamos preparando a
comida.
— O que há de errado com o seu rosto? — Emilia
perguntou, agarrando meu braço enquanto eu tentava sair do
caminho.
— Acabei de ter uma conversa super estranha com meu
tio, — eu murmurei. — Você pode chamá-lo de pai a partir de
agora.
— Espere o que?
— Nova conversa estranha chegando, — minha mãe
anunciou enquanto meu pai caminhava em nossa direção.
— Você perguntou a eles?
— Eu não disse nada, Thomas, — minha mãe
respondeu afetadamente, movimentando-se ao redor da
mesa.
— Você já encontrou alguma coisa que quer fazer? —
meu pai perguntou a Emilia sem rodeios.
— Uh, não, — ela respondeu lentamente. — Eu estava
pensando em ensinar, mas...
— Eles não recebem nada, — ele latiu.
—Você começou muito bem, — minha mãe disse a ele,
rindo. — Continue.
— Sabe, você poderia ficar quieta por dois malditos
segundos, — ele rebateu.
— Que divertido seria isso?
— Pai, você teve uma ideia? — Eu perguntei antes que a
briga deles realmente começasse.
— Agente imobiliário, — meu pai disse, sorrindo. Ele fez
uma moldura com os dedos e olhou para Emilia através
dela. — É perfeito.
— Hum. — Emilia olhou para mim, os olhos tão
arregalados que parecia que estava tendo algum tipo de
ataque.
— Estou falando sério, — meu pai disse, balançando a
cabeça. — Você pode vender minhas casas.
— Vender suas casas? — Emilia disse lentamente.
— Ele não é louco, — minha mãe disse
divertidamente. — Apenas parece.
— Olha, eu quero vende-las, — ele disse, ignorando
minha mãe. — Eu não quero fazer toda a papelada quando
estou comprando e vendendo, então tenho que contratar um
corretor de imóveis para isso.
— Você quer que eu compre e venda casas para você?
— Heather cuida da merda da contabilidade, para não
falirmos.
— Muito obrigada, — minha mãe disse, fazendo uma
pequena reverência.
— Mas preciso de alguém que escreva as ofertas e faça
toda essa merda e depois divulgue e negocie e faça essas
merdas quando eu estiver vendendo. — Ele olhou para frente
e para trás entre nós, sorrindo. — Eu não sei o que tudo isso
envolve, mas prefiro pagar comissões a você do que algum
idiota que mal conheço.
— Uh. — Emilia parecia um cervo pego pelos faróis.
— Vamos conversar sobre isso, — eu disse ao meu pai,
que ainda estava sorrindo como um lunático.
— A melhor coisa é, — disse ele, ainda tentando
vender. — Não é em tempo integral, certo? Trabalhe de
acordo com a agenda de Rhett e essas merdas.
— Parece realmente ótimo, — Emilia respondeu
timidamente. — Só não tenho certeza de quanto tempo de
estudo isso leva...
— Nós vamos descobrir isso, — disse ele alegremente,
estendendo a mão para apertar os ombros dela. — Parceiros
de negócios.
Enquanto ele se afastava, minha mãe riu.
— Ele teve a ideia por semanas, mas estava preocupado
que você dissesse não. — Ela balançou a cabeça. — Foram
necessárias algumas doses e uma conversa estimulante para
ele dizer qualquer coisa hoje.
— Na verdade, é uma boa ideia, — disse Emilia, olhando
para mim.
— Achei que você poderia diversificar, — minha mãe
disse com um encolher de ombros. — Depois que estiver com
os pés no chão, talvez aceite mais clientes ou algo
assim. Você teria uma base de clientes integrada com todas
as pessoas conectadas ao clube.
— Vamos conversar sobre isso, — respondi com
firmeza. Eu não estava prestes a mandar Emilia para um
novo emprego que ela odiava. Afastei-a das mesas, olhando
para trás para ter certeza de que Rhett ainda estava feliz com
vovó antes de levá-la para fora do prédio para ter um pouco
de privacidade.
— Não diga sim só porque meu pai pediu, — eu ordenei,
apoiando-a contra a parede.
— Eu não vou.
— Você pode escolher o que quiser fazer. Não há
pressa.
— Eu sei.
— E ele é um grande pé no saco para trabalhar – apenas
avisando agora. Eu o vejo todos os dias na garagem e, na
metade do tempo, quero espancá-lo até a morte com uma
chave inglesa.
— Você esconde isso tão bem, — ela brincou.
— Estou só dizendo...
— Eu sei o que você está dizendo, — disse ela,
envolvendo os braços em volta dos meus ombros. — E eu te
amo por isso. — Ela fez uma pausa. — Na verdade, parece
muito legal.
— Realmente? — Eu perguntei duvidosamente.
— Sim. Vale a pena pesquisar.
— Tudo bem.
— Você me trouxe para cá para me dar um sermão ou
me beijar? Porque tem havido muitos sermões e não o
suficiente...
Suas palavras foram cortadas quando pressionei meus
lábios nos dela. Nós não tínhamos voltado para o nosso lugar
na parte de trás da propriedade novamente, mas beijá-la na
sombra do clube parecia uma boa substituição. Ela tinha
acabado de apertar os braços, e eu estava prestes a erguê-la
para que ela pudesse envolver as pernas em volta de mim
quando alguém dobrou a esquina e se chocou contra nós.
— Oh merda, — disse Nova, recuando um passo. — Eu
sinto muito.
— Está tudo bem, — eu disse, virando-me para encará-
la. Minha boca ficou seca quando vi seu rosto, e meus braços
ao redor de Emilia caíram. — O que diabos aconteceu com o
seu rosto?
— Não é grande coisa, — disse Nova com um bufo,
estendendo a mão para passar o dedo sob o olho. — Bebi um
pouco demais e tropecei de cara na grade da varanda.
— Parece que dói, — Emilia disse com simpatia, me
circulando até ficar entre Nova e eu.
— Parece que alguém te acertou, — argumentei,
inclinando-me para frente para dar uma olhada melhor.
— Não.
— Nova.
Nós olhamos um para o outro, nenhum de nós
recuando. Eu a conhecia desde que éramos bebês. Eu
mergulhei em piscinas infantis, andei em bicicleta, levei
minha caminhonete para o rio e fiquei tão bêbado que
tivemos que dormir na carroceria da caminhonete, assisti um
milhão de filmes, saí em um milhão de churrascos de clube, e
falei até tarde da noite mais vezes do que eu poderia contar.
Eu sabia quando ela estava mentindo.
— Nova! — meu irmão gritou quando dobrou a
esquina. Rumi não era um cara grande, ele era magro como
meu pai, mas quando ele parou e olhou para Nova, parecia
que poderia destruir o mundo sem nem suar. — Quem? — ele
latiu.
— Vamos, — Emilia disse baixinho, puxando minha
mão.
— Alguém bateu na porra da cara dela, — argumentei,
seguindo Emilia, mas olhando por cima do ombro para onde
Nova e meu irmão estavam a poucos metros de distância,
olhando um para o outro.
— Rumi cuidará disso, — disse Emilia, puxando minha
mão.
— Eu não posso simplesmente...
— Você pode, — ela me cortou. — Falarei com Nova
sobre isso mais tarde. Você não pode ver que ela está prestes
a chorar? Ela não quer que fiquemos parados olhando para
ela.
— Alguém bateu na porra do rosto dela, — eu repeti,
minha mão livre apertando em um punho.
— Michael, — disse Emilia, virando-se para mim assim
que sentiu que estávamos longe o suficiente. — Eu te amo, e
amo que você queira protegê-la, mas estamos na sede do
clube. Ela está segura aqui. Dê a ela um minuto para lidar
com seu irmão, ok?
— OK.
Emília revirou os olhos. — Você acha que Callie pode
cuidar de Rhett por um tempo?
— Sim. Por quê?
— Porque eu planejei seduzi-lo em nosso lugar, — ela
disse, suas mãos indo para seus quadris. — Mas se você não
está a fim...
Ela gritou quando a joguei por cima do ombro e
caminhei em direção ao campo dos fundos.
— Eu te amo, — disse ela, beijando minhas costas
enquanto ria.
— Também te amo.
Por fim, coloquei-a de pé e caminhamos de mãos dadas
em direção à pequena clareira que havíamos feito quando
éramos crianças.
Já vivíamos como se fôssemos casados, mas eu queria
tornar isso oficial, então planejei trazê-la para cá mais tarde
no verão, quando as amoras estivessem maduras para propor
casamento. Eu provavelmente poderia colocar o caro anel em
seu dedo a qualquer momento e ela alegremente diria que
sim, mas faria todo o discurso de joelhos. Ela provavelmente
riria e me diria para levantar, me provocar sobre isso mais
tarde e contar a todos sobre como fui cafona - mas tinha a
sensação de que ela provavelmente também choraria um
pouco e eu esperava que fosse algo ela se lembraria para
sempre.
— Você quer deitar na rede depois que Rhett for dormir
hoje à noite? — ela perguntou facilmente, balançando nossas
mãos para frente e para trás entre nós.
Eu gemi teatralmente, fazendo-a rir.
— Você realmente me ama.

Fim.

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