Baruque Prof. Dr. Valtair A. Miranda O título do livro
• O Apocalipse de Baruque é também chamado
de 2Baruque (neste caso, o Baruque grego seria 3Baruque) ou 1Baruque (o Baruque grego seria 2Baruque). • Para evitar confusão, alguns o chamam de Apocalipse Siríaco de Baruque, quando comparado com o Apocalipse Grego de Baruque. Data
• O Apocalipse Siríaco de Baruque, o Apocalipse
Grego de Baruque, 4Esdras e Apocalipse de Abraão são obras judaicas originadas com a destruição de Jerusalém e do Templo em 70 E.C. • O Apocalipse Siríaco de Baruque é, por temática e origem, paralelo a 4Esdras, posteriores a 70 e antes do Imperador Adriano (117-138). Língua
• O Apocalipse Siríaco de Baruque é tradução de
um texto grego. • Esse texto grego, entretanto, poderia ser igualmente uma tradução de um texto hebraico, em função de numerosos hebraísmos ou jogos de palavras que são somente possíveis em hebraico. • A carta às nove tribos e meia (caps. 78-87) é uma adição tardia de origem grega. Autor
• Apocalipse de Baruque foi escrito por um autor
de origem farisaica. • É um verdadeiro autor e não um mero compilador de tradições distintas. • Apesar de usar diversas fontes, tem seu próprio pensamento. Conteúdo teológico
• O questão principal do Apocalipse de Baruque
o sucesso dos pecadores diante do fracasso dos justos (14.1-7). • A resposta deste Apocalipse para a questão é que o futuro depende do juízo de Deus. Somente então serão separados os bons dos maus em um novo mundo incorruptível (13.3- 9; 19.5-20.5). • O Templo, por sua destruição, e a Lei, pela discussão de sua validade, também são temas importantes no livro. • As questões levantadas pela destruição do Templo são tratadas não como uma questão de teodicéia (para justificar a conduta de Deus, como fez 4Esdras), mas para encontrar consolo e esperança para si mesmo e para sua audiência do livro. • A narrativa se desenvolve através do diálogo de Baruque com Deus, entre jejuns (9.1-2; 12.5; 21.1; 47.1-2) e visões (27.1-30; 36.1- 43.3; 53.1-12; 56.1-74.4), com o levantamento das razões subjacentes à destruição do Templo. • A seqüência pecado-castigo é constante no livro. • O que mais interessa ao autor não é a história, nem mesmo o Messias (tema secundário no Ap Baruque), mas o fim do mundo, a ressurreição dos mortos e destino das pessoas no mundo futuro após o juízo. • Baruque se dirige ao povo três vezes para exortar a viver segundo a Lei e assim se salvar. • Isso signfica que a destruição de Jerusalém e do Templo é castigo divino por causa dos pecados de Israel. • O pecado de Adão é a origem e a causa dos pecados de Israel, mas isso não exime os israelitas pecadores da responsabilidade pelos seus erros. • A destruição de Jerusalém e do Templo procede diretamente de Deus. • A punição de Deus afeta a vida presente, mas também existe uma retribuição após o juízo final, e isso é o que realmente importa. • Os israelitas sofrem agora duro castigo; os gentios também receberão seu merecimento; mas não se precisa dar excessiva importância a um ou outro, nem tampouco aos triunfos dos perversos nem aos sofrimentos das pessoas justas neste mundo, porque Deus apressará o final e dará lugar a outra era. Angelologia
• Apocalipse de Baruque fala pouco deste tema.
• Raros são os nomes dos anjos. Ap Bar 55.3 e 63.6 mencionam o anjo Remiel; 21.23 menciona o anjo da morte; fala-se de anjos sem nome; • Os demônios são mencionados apenas em Ap Bar 10.8 e 27.9. A relação pecado-castigo
• A destruição de Jerusalém e a diáspora judaica
entre as nações aconteceu “para que os judeus tratem bem aos gentios” (1.4). • Mas a causa imediata estava no pecado. • O Reino de Judá é mais pecador que o reino do Norte. As tribos do Norte foram induzidas a pecar por seus reis, enquanto no Sul é o povo que induz os reis a pecar (1.1-2). • Entre o pecado e o castigo pode interpor-se o poder intercessor das boas obras e das orações dos fieis a Deus: “vossas obras são para a cidade como colunas fortes, vossas orações como muralhas fortificadas” (2.1). • Se esses santos ficarem em Jerusalém a cidade não será castigada. • Baruque se questiona: Se Jerusalém é destruída e os judeus dispersados, o que será de Israel? O que será do ensino da Lei? Quem louvará ao Senhor? Que futuro terá o mundo? Que fim terá a raça humana? E o que se dirá das promessas a Israel? (3.5-9) • Sua resposta: o castigo de Jerusalém e do povo de Deus é temporário e o mundo não será esquecido nem destruído por Deus (4.1). • O mundo foi criado por causa de Israel (21.24- 25), e continuará apesar do castigo do povo. • Deus não está longe do mundo, mas o governa. A Jerusalém celestial
• A respeito de Jerusalém, Deus recorda que é
outra Jerusalém, a celestial, que não será destruída (4.3). • A Jerusalém celeste, seu Templo celeste e o paraíso foram mostrados a Adão antes de pecar; também a Abraão em a visão de Gn 15.12 (4.5). • Jerusalém e o Templo celestes precederam a criação do mundo; também o Jardim do Eden foi criado antes da criação. A justiça divina
• “Meu juízo fará justiça no seu devido tempo”
(5.2). • Trata-se da justiça forense, ou seja, retributiva. • Pouco se fala sobre a justiça humana; mas sobre o juízo de Deus no final dos tempos se fala 19 vezes. • A concepção de justiça divina está ilustrada na idéia de que foi Deus mesmo quem destruiu Jerusalém e o Templo: os inimigos de Israel não podem se vangloriar, pois foram simples instrumentos nas mãos de Deus (5.3). • Os capítulos 6-8 narram a destruição de Jerusalém: quatro anjos puseram fogo em quatro ângulos da cidade e destruiram os muros, mas somente depois que um quinto anjo retirou os objetos sagrados do Templo e deu ordem à terra para tragá-los. • Destruida a muralha pelos anjos, uma voz (8.1; 13.1; 22.1) do céu convidou aos caldeus a entrar. • Deus já havia abandonado o Templo. • O texto deixa claro que os sofrimentos de Jerusalém e Israel são um castigo de Deus, a quem cabe apelação, pois ele é o justo Juiz (5.3; 48.39; 11.3). • A justiça de Deus se voltará também contra os gentios (12.4). O Altíssimo não tem acepção de pessoas no juízo (13.8). • Deus não teve misericórdia de seus filhos e os castigou por terem pecado (13.9), se bem que “foram castigados para serem perdoados” (13.10) no futuro com misericórdia. • Os gentios serão castigados, pois as nações sempre pecaram (13.12). • Os gentios são piores que os israelitas, apesar de serem os israelitas pecadores. • Entretanto, Deus é benfeitor dos gentios, como expresso também em Mt 5.45: “ele faz sair o sol sobre os mal e os bons e sobre justos e injustos”. A justificação pelas obras
• As más obras serão retribuídas com o castigo
no final, do mesmo jeito que as boas obras receberão uma retribuição positiva: “Os justos com razão esperam o fim e sem medo partem desta habitação, porque têm junto a ti multidão de boas obras, guardadas no tesouro” (14.12). • Há um depósito celeste para as obras dos justos, assim como há um depósito para as almas (21.23; 30.2). • Segundo 24.1, as boas obras dos justos estão guardadas no tesouro de Deus até o dia do juizo, dia em que também se abrirão os livros onde estão escritos os pecados dos pecadores (Dn 7.10). • Os justos serão salvos por suas obras e justificados pela lei (51.3). Eles confiam em suas boas obras, como Ezequias, que foi escoltado por sua justiça (63.3-5). • Com esta confiança, os justos “abandonam este mundo sem medo e esperam confiados, com alegria, receber o mundo que tu (o Deus) lhes tem prometido” (14.13). • Segundo estes textos, a esperança de salvação dos justos não se baseia na eleição, em pertencer ao povo de Israel, senão em suas próprias boas obras. • Não basta ser israelita para se salvar do juízo vindouro: “Ai de nós, que padecemos nesta vida, ainda teremos em perspectiva mais sofrimentos no mundo vindouro” (14.14). • Não alcançar a salvação pode acontecer a qualquer pessoa, mesmo aos israelitas (14.18). Os gentios e a lei
• Quem não cumprir a Lei será castigado por
Deus com sofrimentos nesta vida ou na vida futura. Isso vale também para os gentios. • É isso que afirma Baruque em 15.5-6. Deus tem dado sua Torá, e, portanto, os gentios merecem castigo por não cumpri-la. • Também em 48.40 se afirma que os homens pecaram com conhecimento de causa, pois foi por orgulho que ignoram a lei de Moisés. • Deus presenteou a lei aos povos gentios, mas estes, ao descobriram seu conteúdo, a desprezaram. • A lei é uma e que está com os Israelitas: “Nós temos recebido uma lei daquele que é Um, e a lei, que está entre nós, nos ajudará.” • A lei é Uma, ou seja, não haverá nenhuma outra nova lei como pretendem os cristãos. O mundo futuro
• Grande consolo para os israelitas, “para os que
foram criados no mundo”, é saber que o mundo futuro foi sido criado para eles, e ali terão “uma cora de grande glória” (15.7-8; Is 62.3). • Uma vez admitida a retribuição no mundo futuro, o viver muitos anos, como Adão, ou poucos, como Moisés, é coisa de pequena importância. • O importante é comportar-se bem para conseguir o prêmio do mundo futuro (17.1-4), o que se revela um forte componente ético de Ap. Bar. • Não se pode queixar da prosperidade dos ímpios ou do sofrimento dos justos, pois o que realmente vale é o que virá no final dos tempos, quando Deus julgará a todos: “Eu sou o juiz de todos” (19.4-7). • Neste contexto, a destruição de Jerusalém pode entender-se como um apressamento da chegada do juízo final: “Eu tenho feito desaparecer a Sião para apressar o tempo de minha visita a este mundo” (20.2). • Baruque suplica a Deus que apresse o juízo final, para que não se diga que sua paciência é falta de poder (21.20; 2Pe 10.9). • 21.23-25 é uma intensa oração do profeta para que Deus apresse sua visita. • Apesar da intensa oração de Baruque para que Deus apresse o fim, este não virá sem que certas condições prévias tenham se dado: tem que nascer primeiro as pessoas que Deus planejou. • Deus fixou o número de pessoas que têm que nascer e a cada um deu um lugar (23.4). A salvação não virá até que o número de humanos esteja completo (23.5). • Ap 6.11: “até que se cumpra o número dos santos”. • No fim: “Vem os dias em que os livros serão abertos, os livros em os quais estão escritos os pecados de todos, e também os tesouros em os quais se guardam as justiças de todos os que foram justos na criação” (24.1; Dn 7.10; 1En 90.20; 4Esdras 6.20; Ap 20.12). • No final do tempo aparecerá a longanimidade e paciência de Deus: “E em aquele tempo verás, Baruque, a longanimidade do Altíssimo, que tem durado através de todas as gerações, que tem sido magnânimo com todos os nascidos, com os que tem pecado e com os justos” (24.2). “Deus somente é o que alimenta os que existem, aos que foram e aos que serão, pecadores e justificados” (21.9). • Baruque insiste na longanimidade de Deus (12.4; 21.20-21; 24.2; 48.29; 59.6; 85.8). Soteriologia
• Quanto ao número dos que se salvam, o autor
não é tanto pessimista quanto 4Esdras. • Deus conhece o número dos pecadores e os justificados, e estes não são menos numerosos que aqueles (21.11). Baruque mesmo está seguro de sua própria salvação (13.3). • Entre os que possuirão o reino futuro se encontram os que “não se tem apartado de a miserícódia e tem guardado a verdade da Torá” (44.14). • Deus também se ira. Baruque diz: “Que força temos para poder suportar sua ira, o que somos para que possamos suportar teu juízo” (48.17). • A consequencia da ira e do juízo de Deus pode ser o fogo: “Portanto, em um fogo consumirá seus pensamentos e em uma chama será provada a meditação de seus rins, pois o juiz virá e não se demorará” (48.39; 5.3). • “No tempo de Moisés brilhou a lei eterna sobre todos os que estavam sentados na escuridão, anunciando a promessa de sua recompensa a todos os que creram, e a todos os que a negam, o tormento do fogo está reservado” (59.2). • A retribuição depende das obras: “A consumação do mundo será tomada de vingança os que tem feito a maldade segundo sua maldade, e tu, o Deus, glorificará aos fieis segundo sua fidelidade” (54.21). • Aqui, fidelidade significa fidelidade à lei. • As obras boas ou más são o que determinam o premio ou o castigo no juízo de Deus. • Em 52.6 encontramos uma apreciação positiva do sofrimento dos justos diante da salvação: “Alegrem-se, justos, pelos sofrimentos que agora sofreis” Israel e os gentios
• Apesar das exigências éticas de Ap Bar, o
comportamento de Israel com os gentios é de inimizade. • Em 61.2 entre as coisas boas do tempo de Davi e Salomão (no sexto período, de águas claras), se conta “o derramamento de muito sangue das nações que pecaram”. • 63.7-8 inclui também no oitavo período (período de águas claras, de coisas boas) o haver destruído o anjo Remiel a 185.000 soldados e haver queimados seus corpos. • Outras ações “boas” do décimo período, de águas claras, é haver destruído o rei Josias não somente a magos, encantadores e necromantes, mas também aos ímpios que encontrou vivo, havendo queimado seus ossos (66.3). Aos mentirosos ele jogou na corrente de Cedron, cobertos de pedras. • Por esses e outros atos Josias será recompensado eternamente e será glorificado ante ao Altíssimo muito mais que outros reis de tempos posteriores (66.6). • Há aqui um odium theologicum.