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NORBERTO BOBBIO DIREITO E ESTADO NO PENSAMENTO DE EMANUEL Traducio Alfredo Fait Sto Paulo Editora Mandarim 2000 “Thal igi Dis came md pine me ant ‘Sy GCap ere Tor ‘Coren ay Sma Ae ‘Dag Fb Tak ‘Caps Ramp Re ne nde Marios Pol Ca dO Ingen ac Sn Ba alee Cor ge (Cle Bnei de Ur SP, Bl abi, Neh, 1. ‘st a epee de Ena oe Bato" ge ones 1, O-line 3. Hi ina Ra Earn a0 ~ Ca ‘epee 6 hla” Rae Tat fats pr os semi: erp ja de 200, ii epoatlon paca . cnr ee pcm an dal ‘a ha aes igus pore “eoStanoS A, Eker Mann ‘Raima oie Mogi, 505 {CEP0105200~ Sto Fab Bra ‘on mapa com be APRESENTAGKO ‘Ainclusio deste livro na Biblioteca Liberal, patrocinada pelo Instituto Tancredo Neves, equivale a inictatva de maior rele- vnc. Além de corresponder uma exposi¢io magisral, como 6 um professor muito experimentado conseguira efetivar, @ livio Direto e Estado no pensamento de Emanuel Kant retine ‘4 somente através do reconhecimento conferdo a eles pelo soberano, motivo pelo qual nto podem ser consi- eradas ordenamentos origndrios nem aut6nomos. -20- No movimeno do senso etal é necesito evar em conn tembem aqvelsdvins poles que ft chard, com soto depecv, de magultlimo. © mamseluno, tose sige is opi, € un sapesto daa para 2 forma do sa abso, quer icy do Estado sem te A ager atmor do Eto cup per abso m0 Se do prio, quer die, em ie juris ep so), Mas podan admis ous mes alm doshas Como os elgitose or Quando se procamara qu opi ie esva sina das fo, gerinent bo ve qt die com is que ele esnese amb acim dar ki dias ¢ mers: or meio da tori do mauiavelo sto quedo anben tes limes oprecpe mo € as omen Ihe doe vngdoe Jaros, nas tb (as usar uma expresso provera) Bem do bom e do ma gue diac le dos vncls sora {rue delimiam a0 dos simples moras O maguavcsme nesse sonido 2 expongaa eoica mae audacos se IBeautomo do poder eit (Ques nen por muvee? © magutvelm una Imereti de Oprinopede Magee em pac er prc pueda cual ago pli, st 4 a0 la urns coms ea conserva do Eso, € um ayo que mio possum fin propo delta e no deve st Ilgada pormeio decor dtetes ds de conrennin¢ Spomturiade, Ea temosflosfies nodemos, ale qve -n- Maqulavel tera sido 0 descobridor da poltica como categoria independent, dstinta da morale da religio, 0 divulgador a autonomia da politica da politica nto como moral nem como imoral, mas como amoral. De qualquer maneia, € cero que [Maquiavel nos ensinov a ulgat 35 ges do principe segundo a vantagem que oferece para o Estado, e io segundo seu valor ‘moral; em outras palavras, segundo a conformidade aos fins ‘da conquist e da manutencio do Estado, e seguramente: no segundo a bondade inrinseca delas. Ao descrever a mancita “como 0 duque Valentino matou Vitellozzo Vitel, Oivertto dda Fermo, 0 senhot Pagolo € o duque Gravina Orsini", Maquiavel € totalmente impassvel. A aco suscia, moralmen- te, horror. Maso julgamento poliico & um outro: aquela acio Foi itl ou nao para o Estado? Quando fala das vitudes e dos vicios dos principes, ele nao se refere as virudes € 205 vicios ‘dos quais alam os morass: vinudes sio as qualidades id- reas 3 conservacio do Estado, vicios st0 as que levam a des- teuigio do Estado. Falando do duque Valentino, diz: "César Borgia era considertdo crue: contudo al crueldade tisha 2jus- tao, unido, apaiguads e oferecido confianga & Romagna” ap. XVID). Esse ‘contudo' encerra integralmente 0 espieto do rmaquiavelismo. Que importa 20 politico que Borgia tenha sido to crue? © que importa a0 politico € saber se aquela crueda- e fo til ou no 20 “ajustamento’ do Estado, (© maquiaveismo assim entendido chega a fazer parte da teoria da razdo do Bstade, que acompanhou a consolidacio do Estado absoluto. Com 2 expressio ‘azio de Fstado! deve ser entendide que 0 Estado tem as suas proprias razdes, que 0 individyo desconhece. Em nome de ts rz8es, 0 Esado pode agir de maneira diferente daquela pela qual 6 Individuo deve- fia comporarse nas mesmas crcunstancias, Em outras pala ‘ras, a moral do Estado, ou sea, daqueles que detém o poder supremo de um homem sobre os outos homens, é diferente da ‘moral dos individuos. 0 indivduo tem obrigagBes que 0 sobe -2- sano nio tem. A teoria da razio de Estado é, portanto, uma ‘ura mancira de afirmaro absolutsmo do poder do soberano, ‘© qual no esti obrigado a obedecer nem 3s les juridieas nem as leis moras. Enquanto, através das eorasjuridicas, se vinta afimmando a supremacia do poder estatl sobre o direto, com as teoras do maquiavelsmo da razio de Estado dé-se um asso 2 frente: afirma-se a supremacia do poder estatal tam bem sobre a moral (e sobre a religito). De outa forma nto se poderiachegarjusiicacio do Estado absoluto, Chegar-se-i, pporém, a extremas conseqiéneias tis que se seguinam foreo- samente 2 reagio € a decadéncia.’ -23- 3 ‘Trortas sone os Limrres po Pope Estatat. O tecado moter ier demoed es sao con sta tol se mse, qo em on fs eines ad revues gles do slo XV ¢ {revlon Prince, fr acompah pot eos polis “aj propa unmet et ode encoun remo cone tur apettamo do poder do pipe, Na tio do pens tno poles ue fea ir comb prs alto dente proleia, dics 0 nome especie de “onttuonal! a conunt de movinieos qe MAM co tt abuso do poe es 8 problema fundamental qvepre0cpa oF ons alta 6 segue eo pie fem un poder abl, fos spr dle. Como pale peo abuso do poet Sao psc imped de un moo land. Tae Sn de desea asi mas parapet abs ese eos poles modern st toes oad par Fs de sue com ego ese poem. Cons ramos qu se podem css anes gos em bus i do vom sr perencalnt propo conta sb too poet 1) Teoria dos direttos natrais, ou jusnaturaismo. Segun~ do esta teotia, © poder do Estado tem um limite exter- rn. que decorte do fato de que, além do dieito propos- =246- >» to pela vontade do principe (ireto positive), existe um dire que no € propos por vontade algums, mas pertence a0 individuo, a todos os individuos, pela sua prépria natureza de homens, independentemente da par- Hiipacio dessa ou daquela comunidade politica. Esses direitos s20 05 direitos naturais que, preexistindo 20 Estado, dele nto dependem, ¢, nto dependendo do Es- tudo, este tem 0 dever de reconhecé-los e garantilos Integralmente. Os direitos naturals constivem, assim, ‘um limite ao poder do Estado, pois este deve reconhece- lose mio pode vioki-les, pelo contrino, deve assegurar 08 cidadios o seu livre exercicio, O Estado que se ‘modela segundo o reconhecimento dos direitos natu- ris individuais € 0 Estado liberal, no semido origindtio dda palavra ‘Teorias da separagao dos poderes.Exstem outa teorias que impem ao Estado limites intornos independente mente do fato que 0 poder estatal tenba que deterse dliante de direitos preexistentes ao Estado, elas susten- tam quea melhor maneira de mar esse poder € quebri- Jo, Trata-se de conseguir que: 4) a massa do poder estatal no seja concentrada numa ‘6 pessoa, mas distibuida entre diversas pessoas; b) as diferentes fungdes estatais nfo sejam confund- das num s6 poder, mas sejam atribuidas a ros dlistintos Segundo esta teoras, 0 limite do poder nasce de sua propria dstbuigdo por duas razoes: 1D no exitcd mais uma 56 pessoa que tenfa todo 0 poder, cada uma ter somente uns porsio dele 2) 0s Gros dstintos 20s quais serio atributdas fungoes distintas se contolario reciprocamente (balanga ou -25- 2 ‘equilbrio dos poderes), de maneira que ninguém po ‘deri abusar do poder que le foi confiado ‘Se se considerum como funcdes fundamentas do Estado 2 fungio legsiatva, a executiva e a judiciira, as teoras ‘da separagao dos poderesexigem que existam fants po ‘deres quantas sio as fungbes © que cada um dos poderes cexerga uma s6 Fungo, assim que possa sugir o Estado desejado por essasteoris, Estado que fot também cha- mado Estado Constitucional, quer dizer, aquele Estado ‘no qual os podereslegslativo, executivo e judicidio sto {ndependentes um do outro e em posi tal que podem controlarse reiprocamente ‘Toortas da soberania popular on democracia, Existe wma terceira maneita de opor-se 20 Estado absoluto do prin- Cpe, proposta pels worias democritcas. Segundo es ‘88 eorits, mo se trata de conter 0 poder limitando-o por meio de direitos naturais ou da distibuicio para dr ‘los diferentes, mas de aleancar a partiipagdo de todos (0s dado. Trata-se de uma verdadeira quebra do pO ‘der estatal, 0 qual, pertencendo a todos, disse Rousseau, {coma se nio pertencesse totalmente 3 ninguém. Veja ‘se que, nessa teora, 0 temédio contra 0 abuso do poder no € tanto a limitaclo deste, mas 2 mudanga incondicio- ral do seu titular. O ponto de parida dessa teora € a huipétese de que 0 poder fundamentado no consenso po pla ndo pode cometer abusos, ou sea, que © povo no pole exercer 0 poder que Ihe pertence conta si mesmo, Entio, a diferenga ene a reora democeitiea e as outs duas consietenisc: frente 80 abuso do poder, as duas rimeiras buseam motivs para liitae 0 poder absoluto; a tereeira considera que 0 Gnico remédi sea 0 fato de atribuir 0 poder a quem, por sua propria natureza, nao pode abusar dee, ou sea, A vontade geral = 26- Esses ts grupos de teorias podem ser considerados as eta- as principals através das quais se desenvolve o pensamento politico dos séculos XVII e XVII até Kant. El considera tés Formas divers que a polemica contra o Estado absoluto as- sme, porque as encontraremos no pensamento de Kant, que, sob certos aspectos, pode ser considerado uma sintese das ddoutrinas iluministas do Estado. Antecipamos desde ji que fencontramos em Kant tanto a afiimago dos direitos naturals como a teora da separagio dos podetes, ow a da vontade geral ‘como fundamento do poder de fazer leis 4 O PRroLeMa Da Justiricacio po Pooet Poarece ques douina moderna do sd ee det crc ea gas 2 ont cata, ue ne torn fondant o pdr eal mum aod dor si ples membros a counts Naw cis corti er Feiams protease do idee do pc Sequin gue inane ego oer ot robe titre oust dee on o ito do poe gm ours plo ote cnt que az pcs cr poto ao poled legmiade do per 8 ets dey Tepito manera pl lo pode po se eee Que set aman, agro one do Handel ¢ soma at no nant pl al fica OF tna, mas mes que ne so auton ooo mee relies prs np tbse de prer A prom de a mart ecm propa eon do ros at Fedo a tn do pense police an exons Ines quanto timings, ano eadorauoescos quanto omoatucesO quale par erin da cn es esaos Conducio nie € tte quo poet obese ca eto Suet furdameno, ma ue so pons aust ds pop Ge cue ov dein do eadon son ute Sony Frepoteca de quem an Them as cone be o fda Jo poder eat gocem se dvs om ts gap ~28- 1) Toorias do fundamento teoligica do poder. Segundo 0s autores que seguem estas tearias, 0 poder do soberano deriva de Deus, no sentido de que 0 poder maximo que uum horsem ou um grupo de homens tém sobte 0s outros pode encontrar sua prSpria jusifiagio somente no fato ‘de que ele € uma manifestacta do poder que Deus tem sobre o mundo, © testo fundamental a que se refere essa doutrina @ 0 wecho de so Paulo: Nom est potestas nist a Deo: quae autem sunt, a Deo ordinatae sunt Raque qui resist posta, Det ordinations resitt"(Ep. ad Rom. cap. XN). » ‘Teoria do fundamento bst6rco do poder Segundo ou- tras autores, 0 poder € 0 resultado de determinados acontecimentos hist6ricos ou de uma determinada dre ‘Go do desenvolvimento histrieo, que concentraram ‘numa pessoa, numa clase, num povo, «forga para go- ‘vernae outros homens, Existe uma maneira caraterst- ‘ca segundo a qual em cada Sociedade forma-se a autori- ‘dade: 4 tradigao, Parafaseando o trecho de sto Paulo, poder-se-ia dizer que, segundo esse ponto de vist, © ppoder no pode derivar sendo da tadicio, e quem re siste do poder & como se se colocasse contra a autorida- de da tradigt. 3) Teorias do fundamento voluntarsta do poder. Aqui ofan damento do poder nao é buscado nem na poténcia divi- ra nem ni tradigao histérca, mas no live acordo dos homens que, num certo periado do desenvolvimento his ‘rico, deciditam a criagio do Estado, Nesse terceiro gr ‘po tém lugar as doutrinas do contatualismo. Hla deri- ‘vam da consideracio de que ninguém pode ter poder supremo sobre a vida e a morte dos outros homens se ‘estes no iverem aceltado livremente esse poder, © n30 -29- cestver baseado de fato/na propria vontade daqueles que devam submeter-se a ele? Deve-se observar que todas as és teorias serviam para fustiicar pos completamente diferentes de Estado, tanto a ‘onarquia absoluta quanto o Estado democrtico, tanto um poder iimiado quanto um poder liitada, Vamos considerae alguns exemplossignticatives ‘Ateoria teologica do poder foi certamente proclamada pe- los defensores da monarquia absoluta: no curso do século XVII, uma das doutrinas mais difundidas era denominada di- reito dvino dos res” Mas a origem divina do poder foi pro- sentise ao sito no se submeter 3s leis que cada um julgasse injustas. Segundo esses autores, € a tirania se sBuramente melhor do que a narquia. Essa doutrina ge~ ralmente € aceita, por exemplo, na tadiglo escotistica {€ possivel encontrar um exemplo num techo de slo To- mis, De regimine principum., 6, no qual se afrma que a tirana deve ser suportada quando, por motivo da tenta- tiva de sua derrabada, possam surgi males maiores), € ‘compreensivel com virios limites e diversas afrmagoes segundo os diferentes autores. Exstem casos extremes de tirana nos quals também os seguidores dessa douti- fa admitem o direto de resistencia, Toortas que afsrmam que a ordem do soberano pode sor ‘nyusta, que é possivel desobedecer, mas deve seraceta a _punseao por causa da desobediéncia cometida. Segundo cesses autores, no ha dvida de que a ordem do sobera- ‘no pode ser injust; mas o comportamento do sito no ‘aso em que 0 soberano chegue a viola, por exemplo, as leis divas, € um problema complexo, Se admtimos (© diteko de desobedecer,€ possivel o aparecimento da anarquia; mas se admitimos o dever de obedecer a qual- ‘quer custo, vioase 0 que existe de mais precioso ma hhumanidide, ou se, a consciéncia religiosa e moral do ‘sido. Por meio dessa nova tora busca-se superar as dificuldades, distinguindo em cada norma jurdiea uma parte preceitual, 0 assim chamada preceto (por exer plo, ‘nio se deve roubar’), € uma pare relativa 3 san- (lo, a assim chamada sancio (por exemplo, "se oubar, vai ser pres"). F sustenta-se que, no aso de lt injusta, © sito tem © direto de resist 20 preceito, mas 20 mesmo tempo tem o dever de submeterse 4 singio, 08 sea, de sujelarse, sem resists, 8 pena que o soberano ‘decid atnbuirhe pela violagao comes. Tal teoria cha ‘mavse teora da obediénciapassoae foi sustentada princ ~ 3h palmente pela maiora dos defensores da monarquta ab- Soluta de dizeto divino. Ela visavs a respoardar pasta: mente © sagrado da consciénca individual e 2 autora de do Estado no periodo das guertas religiosas e da ‘oposigao entre relgito de Estado e religizo individual. 4) Teortas que afirmam que a ordem do soberano pode ser Injuca , no caso de ijustiga, tem seo diveto de resist a la, 0 dirt de resstncia & natural Chegamos aqui tora que, no capitulo 3 desta parte, indicamos como doutrina liberal. Se o poder esata esti limitado pela pre= senga de direitos naturals independentes do Estado, 0 Enado que viola um direto natural sai dos limites do proprio poder, realiza uma aco injusta. Nesse c2s0, 0 indivduo tem o direito natural de desobedecer 3 ordem injusta: como garantia do diteta natural violado existe, ‘camo extrema ratio, 0 deco natural de desobedecer 3 forma que viola © direito natural. © direto natural en= contr a propria garantia em si mesmo. Recorde-se que, ‘9 aft. I da Declaragio dos Diretes do Homem ¢ do Ci- dadio de 1789, slo enumerados 0s direitos naturais do Jndividuo, Estes sto: berdade, propriedade, seguranca, resistencia contra a opressao. 0 lado inoportuno de ura tal doutrina & que, se 0 direito de resistencia & um direto ‘natural, no € garantido pelo Estado, ¢, portanto, 20 di- reito de resistie por pate do individu ado coreesponde, Por pare do Estado, o dever de respeiti-lo, Se o Estado inflige uma pena por motivo de resisténeia, que direto Uulerior eabe 20 eidadio? A lua entre os direitos natura 0 poder organizado do Esado € uma luta desigual Somente em caso de direito de resistencia ha uma poss bilkdade de @xito: quando a minha resisténcia se alla 3 de outros, a resisténcia individual ransforma-se en re. sisténcia coleva ou revolugio, e esta deruba 0 govemno fnjusto para instaurar um governo novo =35- 5) Teorias que afirmam que a ordem do soberano pode ser injusta, que, no caso de injustica, se temo dire de resisir contra ele e que odireto de resistencia é posit. A essas teorits correspondem a5 que chamamos, no capitulo 3 desta parte, de teorias da separacio dos poderes. Qual & ‘de fat © fin principal da separacao dos poderes? E 0 de ‘arantr 0 dieto de resistencia, de tansformar 0 dieto de resistencia de deco natural em direto posi. Dois ‘dos prncipas feos da separacio dos poderes si 2) a separagio do poder legislative do poder executive; by a separagio do poder judittio do poder exeeutiv. ‘Numa palavra, seria possivel dizer que a separaga0 dos pderes vist 20 isolamento do poder executive. Por ‘cio do primeira efeito obtém-se que 0 poder executi- vo nao pode substituir 0 poder legislavo e, portanto, € colocado na condigio de mao poder abusar do pro prio poder ou, pelo menos, de poder fazé-lo muito mais faramente. Por meio do segundo efeito obtémse que, frente 20 abuso do poder executivo, 0 cidadao tem a possbilidade de recorrer a0 poder judicirio para a eli- rinagio do abuso, ou seja, ndo somente de nao obede- cer ordem injusta, mas também de conseguir anul-la Se i850 acontece, 0 diet de cesisténcia no € mals ‘uma aventura ariscada fora do dteitopositivo, mas um direto garantido no Ambito do ordenamento juridico, (04 sejt, um diteto positive. estado no qual o diceto de resisténcia nao & mais um direito natural no prote sido, mas um dircto postivo protegido, chama-se pe ralmente ‘estado de direito!, entendendo-se com essa cexpressio que os préprios Gros supremos do Estado estto submetidos 20 dreto posiivo (e nto somente 20 direto natura. -36- Surge agora a pergunta, no final desis classificaglo, sobre fonde se dao 2s teorias democrilcas, ou sejs, a8 teorias que foram expostas como utimas no capitulo 3 dest parte. Nao se pode proceder como nas teorias precedentes, no que diz res- peito 3 protego do individuo contra o poder injuto.E entio: ‘onde colocariamos as eorias democriticas? Pode parecer um paradoxo histérco, mas é fato que, para encontrar um lugar para as teorits demacrtias com rela 2 prépria maneira de colocar o problema da obrigacio politica, temos que volta 20 onto de partda, Uma teoria democritca no estado puro como 4 de Rousseau coincide perestamente com a teoria de Hobbes, segundo a qual 2 ordem do soberano ¢ justa em sie, portanto, ‘lo pode propor a questio se € obrigatério admitr 0 diteto de resistencia. £, de fato, quem & 0 soberano, segundo Rousseau? E a vontade geral. Mas a vontade geral €a expres- ‘80 global dos interesses e dos sentimentos da sociedade dos ‘idadios.E, portanto, como tal, ndo pode errr: ela €infalivel [A éa-forga que move Rousseau que o Estado seri tanto mais perfeto quanto mais sua vontade coincda com a vontade eral. isso porque se deve considerar um Estado no qual as Tels sejam sempre justas © chegar 2 constituigio da vontade eral como Gnicafonte do diet. Uma ver instaurado 0 Esta- do como expressio da vontade geral, porém, 0 individuo no tem mais motivo para resis, porque a vontade geral € sempre juts, O cidado que resstsse 8 vontade geral sera como se resistsse a si mesmo, Assim o ciclo se fecha: a teoria democré- tica exrema coincide, no que diz respeito 1 obedincia do c- dai, com & teoria extrema do absolutsmo. © que diferencia as dus € a natureza da ordem, como vamos ver: no Estado absolut © comando € heterGnomo, no Estado democritico & ‘autdnomo, —37- 6 Exempuiricagio Historica Par comprecrer meio desenvolvimento hiss do pensannto polis Ran, ser al sgunes capa Grcericar dese desensvinento,eclecen airs teas © movimento, No for 1 prtensio de apescar ties ks compes, eu reve Hal segundo ca pos esc para fs cos ‘Os moments mas tesa da haem pol do Estado modern so 1) 0 petiodo das guests eligiosas, especialmente na Frans ‘4, no final do século XVI, 2) a guerra civil e a assim chamada revolucao pactica na Inglaterra; 23) 4 Revolugio Frances. No peimeito periodo lustraremos brevemente as teorias do tiranicidio, também chamadas monarcomact. No segundo pe- ‘odo nos frmaremos em rés momentos 0 Mberalismo republi- camo, 0 democratismo des niveladorese a teria do Estado libe- ral de John Locke. No terceiro perfodo escolhemos para uma breve ilustracao os dois pensadores politicos que exerceram ‘major influéncia sobre a Revoluglo Francesa © cujas teorias sito retomadase reintepretadas pelo proprio Kant: Montesquieu fe Roussea 7 Os Moarcomact Crananse monarcomact alguns csstres polices catia qu no prod das gem lou aemaran © ico de wetitac cons oping nao ov lege Ct fun) ¢ludamenaran esc diet concio deus © po der do prince koe devs do conser popu $0 thors nor que se cocoa afrodse tno 2 ois dor Gets rue quaso a0 conravalnn, Molar fo 31 chia, quae sempre patos, qe poem er nan nese fraps vanes lena, pel valor pardipaico, us. 1 piocia & "Deine agate i ubtoe oc subaru vga magia (1575) 0 aor € Tore de Be, dpa © sucesor de Cain. ponte de pra € Sida teora coral dofandamento dvi do pe como teas no Ue“ unts df opin mas vata cum Pepin sie immutable om lia raga Il sine ctione parent exe dima Nese ech afmase que ese um deve abot de be dient 2 vote dig, bse lel de ods sti pormuc os pinpe comand." rortDe il quguesenper tt sine eciption tion eons, Poo nc tes comandam ex Det ler se devs ober como 2 Deus. Ihe et bedinc, extern porque et fndarentda to presupeso da conespondénc da vontade do principe Cont ego 3 vor dea, es condoms. A congo ta express cramer et che, ue ares por pars ~39- armagio do direito de resisténcia: “Addenda est ad ila hace condita: dum nib vel impiuum vel inigueum praccipiant. Unde consequitur, non populus propter magistratum, sed contra ‘magisratusproptr populu fuisse creas ‘A obediénci 30 principe tem limites, Quis sto esses limites? (Que 0 principe nio mand nada que seja contra as leis divinas| impium) ou cootra a5 leis humanas (niguu). Beze explica ‘que o muigistrado € criado pelo povo como, epetindo analogias tradicionas, 0 tutor pelo tuelado, © pastor pelo rebanbo. Segundo 2 tradie40, 0 autor dstingue ts casos tpicos de violagto dos limites do poder por parte do principe: 1) a usurpagdo do poder: £0 caso que comumente & chama- do byrannus ex defect rut, ou do principe ‘legtimo. Este primeiro caso pode apresentarse sob duas formas 2) 2 usurpagio do poder no interior do Estado, by a usurpagio do poder de um Estado alheio (© que ‘mais comumente€ chamado de ‘conquista’); 2) 0 exercicio iusto de um poder legttimo. # 0 cas0 a0 qual a tradigio tinha dado 0 nome de wyranus quoad exerciium, ou do principe injusto. Todos os ts casos levam, segundo Béze, a0 problema dos limites da obedi= {ncia € da leitimidade do direito de resistencia. Em par- ticulas, 0 problema se divide em duas perguntas: 2) em qual dos tes casos surge 0 diteito de resisténcia? ‘uma vez surgido, a quem cabe? As respostas que oferece 0 nosso autor s20 as Seguintes: no primero exso (sub. 1a) iia a resisténcia, mas ela cabe, em rimeiro lugar, nio a0 povo, mas somente aos magstrados; 0 [povo somente em extrema ratio, se 0s magisrados, por coni- vencia com 0 tno, recusam-se; no segunda caso (sub. 1b), -40- aque € aquele de violagio mais manifesta, a resistencia cabe a todo 0 povo; no terceiro caso (sub, 2), a resisténcia cabe so- mente os magisiides, sendo que 0 povo nao em outro po- der, a nto ser deixar vale os proprios deitos através dos legi- timos magisrados 'h segunda obra que queremos considerar, muito mais in portante e explicita do que a primeira, intitulase: Vindicae ‘oniratyrannos (1597), Foi publicads sob 0 nome de Irinius Brutus. $6 recentemente fol coafiemada sua atribuigio a dois notive's escrtores « chefes huguenotes: 0 preficio (© qual, rote-se, & uma invetiva contra 0 maqulavelsmo) € atribuido a Hubert Languet;o texto, a Philippe du Plessis Mornay. ‘Nessa obra existe uma enunciacto clara da tese do ccontatalismo, segundo a qual © poder nasce do consenso. ara o autor, dois 840 0s contrat que esto na base do poder cestatal 1D um pacto entre 0 pow a ee Deus, com base no qual, sea 0 povo, se o rei, esto solidatiamente vinculados 0 respeito das les divinas. Assim, quando se comete ‘uma injustica, transgredindo-a, ¢ tanto do povo com lagio a0 rei quanto do eei com relacio 20 povo; 2) um pacto entre o pov ere, com ase no qual ambos os coniraentes esto obrigados, um a comandar com sabedo~ fit € 0 outro a obedecer com respeito 20 sibio comand ‘A eeciprocdade do pacto resalta muito bem nese trecho: * Duplex autem foods requ snauguratione legimus, primum inter Deun et Regem et populum ut eset dei populus, secundum vero inter Regem et populum ut bene imperanti bene ‘obtemporaretar™ ‘A obra de Brits esté dividida em quatro partes, das quais cada uma coloea um problema essencial para a discussio que estamos expondo: ~a- 1. Se 0 tas sao obvigados a obedecor a um principe que es imponba violar a let de Deus. A resposta € negative Deus € superior 20s ris, como 0s ris 20s seus proprios bardes. Portanto,o rl € obrigado a respeitar as les divi- nas. Em ciso contéto, surge nos slits © direito de 1, A quem cabe co diet de resistinca, No caso de vilas20, por pare do principe, das les divinas, o povo tem 0 direito de resistencia, sempre que a resisténcia seja ‘exercda por todo 0 povo. O dircto de resisténcia € ad mito também no easo em que seja uma 56 cidade que ‘oponha resisténcia. Nao lita, pelo contro, a resis- ‘cia de um individuo isolado. Os cidadaos ut singult tem somente 0 dieeto de apoiar a resiséncia egitim das autoridades natura IIL, Se os sis tm 0 direto de resistr a wm principe que vile ecu. Nesse caso, intervém o segundo pact, entre 0 povo e 0 rei; no 0 respeitindo, 0 rel toma-se trano.£, quando o reise torn trano, o dieito de resis- tencia cabe aos magistrados, os qualstém, em primeiro lugar, o dever de advert ret sobre 2s agdes erradas. Se fo rei continuar na conduta injusta, eles t8m 0 dever de resist. O dieto de resisténcia cabe a0 povo somente no caso de tania ex defectu ta, ou ej, de usurpacao. IW. Se os principes vizinbos tém, en ambos os casas, o dieito 0 dever de intonengao para lular contra a tirana. 8 esposta € afimativ: isso equivale afirmagio do asim cchamado direito de interengdo de um Esado nos acon- tecimentos internos de um outto Estado (© que nao € Aaceito no dirito internacional ata). ‘Tanto na obra de Béze quanto na de Brutus, vse que a afirmacao dos limites do poder estatal(Sejam eles consitucos =a pela leis divinas ou pela leis humana) coincide com a repre senaglo da tania como poder que exorbita dos limites. Co- frente com as suas premisss, Hobbes, pelo conto, no acei- tando limites para 0 poder estatl, tumpouco admite a figura do tirano, liga estrtamente 2 douteina dos limites do poder esta Coneluindo, € possivel dizer que o problema dos timi- tes do poder coincide com 0 da definicio do tirano, eo proble sma do direito de resistencia com o comportimento que devem {er 0s stditos frente 20 tino, ‘Abra mais ampli ¢ conclusiva desse primeiro periodo dito dos monarcomaci é o grande tatado de Giovanni Althusius, initulado Politica methodice digesta (1603), verdadeia summa «da doutvina politica conta o absolutsmo, Também Althusius, jurist, profesor de dieito em Hesbor, prefeto da eidade de Emden (oa Frisia Onenta, & calvinista. Sua obra, de grande dlifsio © notoriedade nos primeios anos, quando ainda feri- am as dsputas que a tiaham provocado, caiu no mais prof o esquecimento na segunda mecade do século XVIL, 56 vol- tow 8 notoriedade dois séculos mais tarde, pela obra do jurist slemio Oto von Gierke, que The dedicou um estudo ainda hoje fundamental ‘A idéla inspiradora da teoria politica de althusius € 0 contratualismo. O homem & um animal social que vive em associagdes de virios tipos, As quis Althusis df 0 nome de ‘onsociationes symbiotieae (ou seja,unides orginicas) fami las, corporagoes, comunidades, provincias, estados. Todas cessas associngBes esto fundamentadas no consenso, expres- 50 0 Hicito, e nao slo exatamente sociedades naturis, ou Seja suridas ca natureza do homem, mas arificiais. No que diz respeto a0 Estado, tkima e mais perfeita forma de socie~ dade, pensi-se que Althusius seja 0 saventor da doutrina do ‘monarquia absolute: governo no qual uma 56 pessoa tem 0 poder politico, enquanto s6 ele possi todo 0 ter- titrio do Estado, O rei, na monarquia absolut, ¢ titular de cada bem existente no pats; alo tem somente o imperium, mas também o dominum, ¢ tem o imperium ‘exatamente porque tem, eaté 0 momento em que conse gue télo, 0 dominum A propriedade dos sihtos com elas a terra & uma concessio do soberano; rmonarquia feudal: € 0 Estado no qual o poder politico se caracteriaa pelo fat de ser fortemente dominado pe- los grandes proprietirios da ter, que sio de fato os senhores feudais. Quanto maior 0 poser econdmico dos senhores feudais, maior € seu poder palitico; reptbica:& 0 Estado no qual a propriedade esti dvidi- dla, extinguem-se as grandes propriedades feuds, © 0 poder politico, consequentemente, se amplla, Essa era fase por que estava passando, segundo Heerington, a la- slaterra de seu tempo. E exatamente a ansformagio do regime da tera expicava a revolugio que marca a transi- 80 do regime feudal ao regime burgués, Ble pensava que, mudando-se 0 regime econdmico, deveria mudar também o regime politico. E se um regime politico conti- rua a durae no obstante a mudanca da propriedad, ‘ornase um regime corrupto. A doutrina poltica antiga, erivada de Arist6eles,conheca,além das Formas puss de govesno, as formas comrups: & monarguia corres: pondia a tania, & aristeracia a ollgarquia, 3 democra cia a demagogla. Com sua tora Harrington oferece uma explicagao para a degeneragao das formas de governo: a ddegeneragao acontece quando o regime politic arcaico sobrevive a uma situagio econdmiea trnsformada, Essa ‘era a situagio da Inglaterra, tal situacio explicava 2 ‘guerra civil Hle era favorivel a mudanga politics, por =51- que achava isso necessirio, uma consequéncia ineviti- ‘el da transformagio do regime econdmico que tnha cia- do uma nova classe de proprietiies. Como conseqiiéncia das transformagbes econdmicas, 0 re- ime adequado para a Inglaterra era, segundo Harrington, 2 repriblica (commonwealt).Por iso ele era republicano. Dus Istiuigdes caracteristicas da repablica como ele a concebia, {que tinham o fim de impede qualquer abuso de poder, eram o tquiltrio dos poderes¢ a rotaividade dos cargos. Os poseres fundamentas eram us: 1 0 Senado, xo qual cabia 2 iniciatva das les 2) a Camara des Comuns, go representativo do povo, ‘20 qual cabia a tarefa de aprovar as leis propostas pelo Senado; 3) 0s magistrades, que tinham Funcao executiva. ESses po- ‘eres nto deviam, segundo a concepeio de Harrington, estar separados, mas equilibrados (brated, em ea brio entre s, "de maneita que ninguém que tena inte= esse em usirpar 0 governo tenha também o poder, € hinguém que tenha o poder tenha ineressenisso" No que diz respeito 8 rotativdade dos cargos, comparia ‘com a circulagao do sangue: uma repabliea & tanto mais petei- ta quanto mais 0s elit sio trocados num breve periodo de tempo. Ele propunha que os magistrdos fossem eleitos part tum periodo de no mais do que um ano e que nio fossem reelegiveis de imediat. ‘Algernon Sidney, expirto combatvo ¢ independente, parti- cipou da revolucao, retiou-se do Conselho de Estado quando {Cromwell mouse protetor (1653), passou no exilio 0s pri- meiros anos da restauracio, de volta Inglatera (1677), fo! um =52- dos chefes do paride Whig: implicado na conspiracio de Rye House (1683), foi decapitado, Sua obra politica, ittulada Dis curso sobre 0 governo, fot publicada postumamente no ano de 1698. Coma o primeito Tratado sobre o governo ciilde Locke, também a obra de Sidney surge de uma polémica com Filmer Desde a8 primeinas piginas se observa uma severa condena: ‘Go de todos os seguidores da tania e uma defesa apaixonada da liberdade natural do homem, © conceit fundamental que pode ser extrafdo da obra € que o melhor governo & 0 governo limitado pela lei, Exste uma contraposigio continua entre a monarquia absoluta,considerada como governo detesivel, € a monarquialimitada, que é Unica a merecerrespeto. A mo- narquia limitada 6 mais uma vex 0 governo mist, ou Sea, 0 [govemo que tem monarquia aristocracia e demoeracia. O go- verno misto € o ideal de Sidney: ele cortesponde inclusive 2 histéela da monarquia ingless © seria @Gnica garantia da iber- dade dos cidados, —53— 10 Os Nivenapones: OO excrtcrs que exis sé ago sgn come defenses do faa ln ents a ate Fo dem serchamados com i e econ Goa il ou comsitoo un er gue cmc concep facil 1 Sorin ds inte do pre sata suo de emt enn» pba de qv 0 Poet tour dns pps prongs sora Mo pork true ects dency, pqs coer cro fa armenia parr do paps popictoe Com Servo cae nbn te Losko, Caceres fet (ets domowia¢ gst pac 2 pac (Gove pote plc de ods en aon ncpedetenntc Spe de toe Froninent picamente democico¢ dos Neds, um peep uc sun cae 17 10, nome di evloe ov Hc epcna sl dl te Ido, bara lar cc de revo, es de ts cio, manent Ect do ovo Moo a ‘ipo cole com regi a Pena tuo Cc oe repbla denowie, O morinenta sande com Igo muro ds uc to tee eu to pac Seu chee cos, Pines Jo bur, kad Cvenon «Willan ln, dcr nos consi Cocummto de pnde Flom doo ae dooce than na elo, pr eclnc una eohe Ibe =54- A tese politica Fundamental, por eles sustentada com apai- xxonada confianga, foi que, no novo Estado, a ser istaurado Apes a revolucio, 08 direitos politicos deveriam ser concedi- dos a todos 0s ckdadios, e nao somente aos possuidores de ters, Ees represeniavam os interesses dos pequenos burgue- 28 6, no excita, dos oficiais inferiorese dos soldados. ‘Dos muitos documentos que deixaram, por longo tempo ig norados, «que somente hi alguns anos s20 objeto de estado, ‘vamos lembrar dois: © pacto do povo e Os debates de Pues: (0 pact do povo é um projto de consituigao claborado pe los chefes do movimento, num primeito momento em 1647, € na forma definkiva em 1689, quando sev movimento polio tinha sido derotado, Ainda que tenha permanecido somente como projeto, sem aplicagio alguma, ele constiui um impor- tante antecedentehistrico das grandes consttugbes que se- rio adotadas, prime pelos estados americanos e depois, no curso da Revolucio Francesa, no final do século XVII A idéia central que anima essa constiuigio & a do Estado limitado, como se Ié no *Predmbilo”: *Nés, powo livre da Inglaterta (.) concordamos em ‘oferecer seguranga a0 aoss0 gover, abolir qualquer poster arbindrioe colocar lines ¢smpedimentosa qual- ‘quer autorsdade” Para garantie o cidadio contra o abuso de poder, © ar. 30 alirma que no serio validas a lels que violaem os principios do pact: "Todas as les fits, no pasado ou no faturo, que se~ fam contri a qualquer parte desse pact, esto sujetas 4 ser anuladas e desituilas de vaidade, 0 pacto do poso 0 que hoje seria chamado uma lei consitucional: cle determina que as leis ordinitias conririas a0 paco de~ =55- vvem ser consideridas como contras 2 consitugo portnto, invslidas, O pacto do povo é, poranto, 0 fund ‘mento orginrio de qualquer norma jurica valida, © sim € porque deriva da vontade popular (dao seu nome), como dizer que o consenso popular €0 fundamento do direito: e esta & uma tese laramente democritica” em mais importante €, porém, oat. 18, no qual est escrito: “A autoridade suprema da Inglaterra dos teritérios neta incorponidos estar e resided pare de agora numa representacio do povo, composta de 400 pessoas € no ais do que iso; na elec das quais — segundo a lei dda natureza — todos or bomens a partir de 21 anos ou ‘mais terdo o dirito de volar e serio elegives para aque- le cargo supremo,” Na fiase “todos 0s homens a partir de 21 anos ou mais." esti expresso o prinipio do que hoje & chamado sufigio uni- ters, Somente quem recorde quanto foi Ienta 4 conquista do sufriglo universal nos esados civis da Europa e lembre que ‘mesmo os maiores eseritores liners da Gpgca da Restauacio, ‘como Benjamin Constant, afimavam que uma das maiores ga rantias de liberdade ¢ 0 Suftgio universal restrto unicamente 20s propriettios, pade considerar a impornciaantecipadora ‘daquela afirmagio. (Que essa afimacao era uma das bases da doutrina dos Niveladores € confirmado pelos Debates de Putney. Esses de bates sio a cronica estenogestics de uma discussio que teve lugar entre o final de outubro © 0 comeco de novembro de 1647, no Conselho Geral do Exército Revolucioniri, con- vvocado, na realidade, para discutir 0 pacto do pove. Grande parte do debate € dedicada a0 art. 1 € 3 questio do suftigio universal, Existem dois partidos: por um lado, o general Ieton, -36- genro de Cromwell, que representa a ala moderada, © per fgunta “quem dever! ser eletor"responde claramente: 0 pro- Pritésios, por outra lado, alguns ofciais, representantes a ala radical, que opoem 2 tse de Ireton a tse dos Niveladores, segundo a qual todos os eidadios dever ter o direito de vo tar B interessante mencionar 2s argumentagdes 2 favor e con tea apresentadas na discussio, porque expressam idéias tpi cas da ép0c TWeton afirma que aio existe um direto inato relativo a0 poder, mas somente os dieitos que 2 constituigao do pais re- conhece. essa argumentacio, um dos interlocutores respon de, referindo-se le natural, que € superior a qualquer consti- tla: ‘Nao enconito trecho na lei de Deus que afirme que ‘um lorde tenha que escolher vinte deputados, e um gen ‘ikhomem somente dois, « um pobre nenfum: no en= contro nada de semelhante nem na let da natureza nem nates das mages.” Um segundo argumento de Ireton & que devem votarsomen: ‘te aqueles que tém um interesse qualquer no pals, € somente os propretriostém interesses. © indigente€ comparado com um esirangezo que nao tem eaizes no pais; seri que se concederia f direko de votar a um estrngeiro? A esta questio, um out Interlocutor esponde que o fundamento das leis nto € 0 inte- 0 principio incontestvel do governo me parece que ‘ef 0 fato de que cada governo depende do Hore con- senso do pvo. Se for assim, entio por causa deste res pet, ninguém pode dizer que esté submetido a um go- verno justo, ou que tem o que Ihe eabe, se no tveraceto aquele governo com o seu proprio livre consenso.” -57- Enfim,leetonafirma que ofim de uma consttuigao & salva sguarda das propriedades e que os homens se associaram para tera seguranca dos proprios dominios. esta afimacio, o pri smeito interlocutor responde com a argumentacio decsiva para a justificagao de um regime democrtic, ou seja, que o fim de ‘una constituigio ndo € a protesio dos bens, mas das pessoas: Peaso que, se € possvel demoastar que é justo & racional e do interes da conservario de todos 0s eida- ‘dios lives deste pas que eles tenham um voto igual nas eleigaes, tal dirito tem que thes ser reconhecido, uma ve2 que 0 fim principal deste governo é 0 de presenaras pessoas, iio menos do que os bens, e se uma lel atinge a ‘minha pessoa, esta € mals preciosa do que a minha pro- priedade -58- Il Joun Locke O segundo rata ogee ci 190d ks, pode constr come a prime ¢ as Comps orm te do fxado ibe um do es ou qua ns des ‘os a hits do penser policemen, Sn impor “ci dma ca soto gue a acs pica rolenat che hava seo debater ne ado, oso fas lacs potizs na nga locke 6 juan © pont de pari do seu itcno sot conto do Estado ama deed nat tal ou syd ead erino no qual os ios “ivi ro obedecendo sous cea ses al Mab Camber pa Locke, ono pas Hobbes eed dents tho lene enue exado ea, ma um td tome prs sree acl teh pa sees acca {ese pada somes pls enamored tral OF homens, port, eo sgem sempre como ses col esa de ratuca io havendo nem per super aos Simple ndvidon ca um € ts ements rip vi, ciando fendi, a ving lens de man dsprepareo- nada is deriva que oe de ate ol Sever et Um edo de ss pep, anfomase num ado de per 12 Bp a co nao de quer no qa aaa po at Serene fos que os home canine endo cl “A nccessidade de evitar ese estado de guerra (..) & ‘© Gnico motivo fundamental para que os homens Se = ~59- ‘nam em sociedade e abandonem 0 estado de natureza, porque, onde hi autoridade, um poder sobre a ter 30 ‘qual pedindo-se ajuda € possivel obté-la, esti exclu a permanéneia do estado de guerra ea controversia€ re~ solvida por esse poder"* claro, ponanto, que a primeira azo pela qual o homem abandona 0 estado de naturezt @ se rene Com 0s OUt%s NO estado civil, submetendo-se a uma autoridade, € o descjo de Conservar a vida, un dos primeiras direitos naturais, Mas o homem nao constitu: 0 Estado, segundo Locke, so mente para conservar a vida, mas também para conservar um utto dieito natural fundamental, que € a propriedade, Esse 6 lum ponto caractersico da doutrina de Locke, que 0 colocs| como um representantetpico do Estado burgués, baseado no reconhecimento da propriedade como um direito natural. D- 2zer que a propriedate & um direito natural significa que o di- reito de propriedade nio deriva do Estado, precede qualquer constiuigao civil € um deo que cabe a0 individuo inde~ pendentemente do Estado, Para Locke, 0 direto de proprieda- fe é um direto natural porque no Surge, como para Hobbes, a lel do Estado, , portanto, deriva da consttugio evil, nem ‘de um livre acordo ene individuo no estado de natuteza, como para Pulfendor, mas surge de un atividade pessoal do indivi- ‘duo, © esa aividade pessoal do individuo € 0 trabalbo. ainda que a tera © todas 28 criturasinferiores se jam comuns «todos 0s homens, também eada um tem a propriedade da prépria pessoa, sobre a qual ninguém tem direto a nao ser ele proprio. Podemos dizer que o trabalbo do seu corpo e a obra das suas mas sao verda- ddeiramente sous, todas as coisas que tira do estado no ‘qual 3 natureza as produziu e deixou, juntou 0 proprio trabalho e, portant, untu algo que ibe & préprio, com -60- {sso as torna propridade dele. Porque so removides por cle do estado comum no qual a ratureza as eolocou, las, por meio do seu trabalho, possuem, conexas consigo mes- mas, algo que excuio direito comum de outres”(p. 260. © esado civil nasce, portanto, segundo Locke, do desejo aque of homens tm de conservar os diteitos naturais funda ‘nals, ou seja, a vida e a propriedade, Mas ent2o claro que cles, enlrindo no estado civil, ndo renuneiam aos direitos na- turais, como pensava Hobbes, mas, pelo contro, os querem ainda mais garsntides do que aconteia no estado de naturez (O estado civil €substanclalmente a eragio de uma autoridade, superior aos simples indviduos, para a proteg20 dos dieitos ‘natura fundamentais, Em suma’ no estado de ratureza, ho- mem tem 08 direitos naturals, mas eles no estio garantidos, No estado civil, o homem nio perde os seus dietos naturis, mas of conservi garantides pelo poder supremo. Em outas palavras, & possivel dizes ue o Estado, para Locke, nasce com "um fim fundamensal de fazer com que os individuos possam conserva os proprio direitos natuas, Fsse ponto deve ser le- vado.em conta, porque veremos que também Kant se coloca a mesma cortente de pensamento, As douttinas do jusnaturlisso podem ser divididas em dus grandes categoras 1) as que, na passagem do estado de natureza para o esta- {do chil, consideram extinios 0s direitos naturals, ou pelo ‘menos transformados, e segundo as quais, enti 0 esta- do civil se sobrepde completamente 20 estado natural, até suprimé-lo (Hobbes ¢ Rousseau); 2) as que, na mesma passagem, consideram conservado 0 {que existe de melhor no estado de natureza ¢ apresen- tam o estado civil nto como uma substiuigto do estado de natureza, mas como a sta mais plena e eficaz con- -6- servagio, Tanto Locke quanto Kant pertencem a este se- sgundo grupo. Se os homens saem do estado de natureza para evitara de- seneragao em estado de guera, € natural que queram cons wir um Bstido baseado mo na forga, porque entio valeria 3 pena permanecer no estado de natureza, mas exclusivamente rho consenso, Esti na propria ldgia da passagem do estado de ratureza para o estado civil, como é vista por Locke, que © estado civil tenha que estar baseado no consenso. £ este um ‘outro ponto importante da sua douitrina. ES como Locke se cexpressa um trecho caractristic: Porque 0s homens s20 (..) todos lives por nature 2, igoais © independentes, ninguém pode ser ido ‘dessa condigaoe sujtado 20 poder polio de um outro sem 0 priprio consenso, O nico modo pelo qual uma pessoa se despe da sua lberdade naturale se investe dos vinculos da sociedade civil consiste no acordo com ‘outros bomens para juntarse e unit-se numa comunida- de, para viver em unido com comodidade, seguranca & paz, na posse segura das proprias propriedades © com ‘uma garanta maior contra quem no pertence & mes ima” (p. 315). eo fato de que o estado civil nasce para garanti os direitos naturais © € baseado no consenso deriva atese Fundamental de ‘que 0 poder do Estado ¢ essencialmente ltmitado. & lmitado primeiramente porque pressupde os direitos naturals no pode ioli-os; € lmitado em segundo lugar poeque © consenso & dado aos governantes somente sab condiglo de que exersam © poder dentro dos limites estabelecidos. ‘Os poderes fundamentals do Estado sto dois: o poder legislaticoe 0 poder executio (Locke considera também um ter- = @2- cero poder, que chama fedorativa, que consste no poder go vernamental de fimar pactos com ouvos estos, mas € um aspecto do poder exccutivo). Assim, © poder executive esti subordinado por sva natureza ao poder legislativo, porque sa tarefa € dar execugio Bs leis, que so 38 normas geraise abstra- tas emanadas do poder legisltvo. 0 poder legislativo, ainda ue seja poder supremo, esti subordinado 40 povo, de cujo cconsenso deriva, Tambémn sobre esse ponto Locke se expresst ‘com muita clarez “ainda que numa sociedad civil constiuida (..) pos- s exis somente um Gnieo poder supremo, que € 0 leglsativo, ao qual tados os outros estio e devem estar subordinadas, Codava, porque 0 legislatvo & somente tun poder fcuctaro de deliberagao em vista de fins deter- ‘minades,permanece sempre 90 povo o poder supremo de remover ou alterar o legisatico; quando ve que 0 legislativo dlibera conta a confianga dada a ele” (p. 360. 0s limites do poder legislative sto taxativamente fixados ‘por Locke, O primero limite € dado pela persistent, também no estado civil, dos direitos natura *As obrigagdes da let de natureza ndo acaba na scie- dade, mas em muitos casos tornam-se mais coerivas, € por meio das leis humanas tim astociadas a elas pena dades que levam a respeitilas, Assim, a ll de nanureza subsite como norma eterna para todos os homens, seit para os legistadores, seja para as outs" (P. 349) Em segundo lugar, oParlamento deve emitr leis que tena ‘uma cert esabildade. Ee terceio lugar, 20 pode privar um individuo da sua propria propriedade em 0 consenso dele (aqul se evela a consequéacia da consideragio da propriedade como -6- lireito natura. Em quarto lugar, do pode transfer 0 poder ide fazer lls para cxas 0s, porque Seu poder ji Ihe € dele ‘do pelo povo, e 0 delegado nio pode delegar. "A conseqdéncia Logica da afirmacio dos limites do poder cesttal€, como jd vimos ous vezes, 0 direto de resistencia. CCoerente com suas premissas, Locke & um defensoraivo de tal direto. Ele admite o direto de resistncia se/a ao abuso do ‘poder executivo (aso da tirana), sea @ violagao dos limites por (parte do poder legislasvo, © responde de manera enésgica a todas as objecoes, seu conceite fundamental é quem realiza injustiga nio € quem ze rebela contra um poder opressor, mas ‘quem oprime 0s sds. “0 fim do governo & 0 bem dos homens: € 0 que & melhor para a humanidade: que 0 povo se encontre sem pre exposto & vontade ilimitada da tiania ou que 08 [Boverantes se encontrem 3s Vezes expostos 2 oposigho, ‘quando se excedem no uso do poder e o uilizam para a destruigho © nio para a conservaio das propriedades do povo"(p. 425), Resumindo: através dos principios de um direto natural preexistente ao Estado, ce wm Estado baseado no consenso, de ‘subordinagdo do poder executivo a0 poder lesislativo, de po- der limitado, de dieeto de resslncia, Locke expos a8 diretr- es fundamentais do Estado liberal, coneluindo 0 periodo das fuerrascivs na Inglaterra e abrindo o nove perfodo que, ata ‘és de Montesquieu, chegar 3s constituigdes dos estados ame ricanos e & Revolucio Francesa. Sua obra € a ponte de passa- ‘gem do Estado liberal inglés para o continental” 12 Mont Da vasa obra de Montesquieu, Lapidot (74, Imre nor net pate nko fax cpl, qve conten amo menos mom eo da spars dos pees. Imeesertos de mane paar pque,taves dese cap tl ob de Notesqucu eve ua noc import no destmolvinento do psanento polio postin, nce ode Kan Gomo ¢ oto, 3 od separ dos pees tance em Fp des is ouse Coo i cof cae, ao Ghul € posted ver bem, ou wmete com dilate, 0 exo om ademas pues da ob, dedicat pine to eto ds cvess omas de govern com ag 48d frente pincpon que ar ep, A Oferetescondgbes hats cocina cise desevolvem ee, formas Ge govemo que, segundo Montexque, estado da Nia tna ender eveow os repo ule nl distin demounce quanto antocaes), qu sete no penciled vitae, 4 monargula, ques ast no rnp aon, despot que we bus no principio do meso. Jomo seca separ da fomas de gore, que se base tu tem a prota de bscarse muna maize cet da ox lade hist, move so fongo de (oda obs na os distin que to reaponde amo 0 eto do peipo ingpador mide, ho, me) quanto ao cto da ancl tatom qual ¢exeredoo paler pater pode se exeredo de imanein que dane una mare de Iberdade os eaen -6— 20s corpos intermesdirios, ou de maneita a reduzta ov mes- ‘mo supimla, Com base esse eter, os governos dstinguer- se em moderadas ¢ absolutes. Enquanto a divisio com base nos principio inspiradores tem principalmente um fim descritivo (ainda que seja cara 3 versio de Montesquieu pela terceia forma, 0 despotismo), 3 icotomia em governos moderados € absolutos tem vin claro intento normativo. A aversio contra 0 despotsmo caminka no pensamento de Montesquie untamente com a apreclaczo dos fovernos moderados (que podem ser encontrados tani as repsblicas quanto nas monarquis) ‘0 tema do governo moderado esti prenunciado num trecho do capitulo V (3), que diz: “Apés tudo o que dissemos, parecer que # nature= za humana deveriarebelirse continuamente contra 0 fpoverno desptico; mas, malgrado seu amor 3 liberda- ‘de-e seu Sdio& violencia, a maior parte dos povos sub- meteuse; iso se entende facilmente, Para formar um governo moderado € necessirio juntar as poténcias, dirigilas, moderd-las, detxd-la agin dar, digamas as- ‘Sim, defesas a uma para que possa resistir a outra: wma ‘obri-primna de lepisagio que 0 acaso raramente conse~ fque realizar e que raramente se deixa realizar pela pri- encia, Ao contrtio, um governo despotico € bem evi- dente; em qualquer lugar € 0 mesmo; uma vez que para cto siosuflcientes as paix6es, o mundo inteiro€ apto para recebélo."* esse trecho, © governo maderado & claramente contrapos to-a0 governo despético. Ble € apresentado como govemo da razio —e por isso dificil de ser realizado —, coniraposto 40 spoverno das palxdes, Sua natureza peculiar consiste no fato de ‘que os poderes que o compdem se contrapBem reciprocamen- - 6 te £ claramente 6 prendnclo da teoria da separagio dos tris poderes, exposta amplamente, como dissemes, no capitulo XL [Nesse capitulo, 0 governo moderado & considerado em far odo problema da iberdade. © governo moderado € aquele ue garante principalmente 2 liberdade. A definigao que Montesquieu di de liberdade nesse capitulo deve ser levada em conta, porque € uma definicdo exemplar da assim chamada berdade negatva, que se distingue da “iberdade como auto- pom’, que veremos daqui a pouco em Roussea, Em Kant iremos encontrar ambos os conceitos de iberdade, ainda que rem sempre bem claros: pelo contrivi, © fato de em Kant se tenconirarem ambos os conceitos de liberdade pode ser const derado como uma caracteristica do seu pensamento, que con- cilia num certo sentido a tradicio do pensamento liberal, basea dda no primeiro concelto, com a tradigao do pensamento \democritico, baseada no segundo. Montesquieu, portanto, define a liberdade como “0 diteito de fazer tudo aguilo que as leis permitem® (J, p. 273). Num outro trecho da mesma obra (CCK, p. 20), di “A iberdade consiste prneipalmente no Fto de mio se estar obrigado 2 praticar uma acto que a let nto cordene” (H,p. 168. ssa lberdade pode ser chamada ‘negativa’, porque con- siste em ter um Ambito de apio no qual as leis no intervém ‘com ordens ou proibigdes proprias nas quals nossa agio ni esti impedida pelas leis, ou esti Hore de qualquer interfeén- cia legislaiva (a ‘berdade negatva’ € também chamada I berdadede.,). Montesquieu considers essa forma de Uberda- de como um grande beneficio a0 qual os homens nto renunciam voluntariamente, ¢ & justamente a que distingue fs governos das trans. Mas, exatamente por ser essa forma de liberdade um bem, € necessirio que sua existencia seit ‘garantida de qualquer modo, Assim, ess bberdade € garan dda somente naqueles regimes em que o poder soberano no ‘esti conceeteado auaia 56 mi 10, mas distrbuido por 6rR0s -6r- diferentes que se controlam reciprocamente. A distibuigio do poder © 0 controle recipraco dos érgios que detem o po: der assim distbuido sto o expediente tipico dos governas rmoderados, ou seja, dos governos nos quats 0s cidados usu- fruem da liberdade de fazer tudo aquilo que a5 lis permiter, © fato de Montesquieu atrbuir essa forma de exercico di dido e controlado de poder a0 governo inglés da sua época e também pensar ter elaborado esse principio por meio do es- tudo da constituigio inglesa € um problema que no nos inte- esta aqui, Interesa-nos a frmula com a qual enunciow 0 principio: “Para que nao seja possivl abusar do pode, & neces. ‘sdrio que, segundo a disposicio das coisas, © poder re prima 0 poder" (I p. 274. Apés esse enunciatlo, Montesquieu retoma de imeditta 0 tema da Hberdade, mostrando, desse modo, 0 nexo que, em sua mente existe entre 0 meio (a separacio dos poderes) e 0 fim (a iberdade), De fato acrescenta: Uma constiuigao pode seta que ninguém seja obri- sgdo a cumprir a agdes que a lei no obriga a fazer ea info cumpriraquelas que a let Ihe facut”, p. 274), (0s poderes do Estado 20 qual Montesquieu se refere s40, segundo a tradicio, 0 poder leisativo, o executivo 0 judi rio. Separaglo dos poderes sigaifica, portanto, que 0 poder fexecutivo deve ser separado do legsitiva © do fudiitio © assim por diante. Montesquiew diz que quando, numa mesma [pestoa, o poder legislative esté unido a0 executivo, "no exis te liberdade’; assim, “no existe iberdade” se 0 poder judici- fo no esti separado do poder legisiatvo e do executivo. E cexplica - 6 “Se ele estivesse unido a0 poder legislatvo, 0 pode sobre a vida e a lberdade dos edadaos seria arbitcirio, porque 0 juiz ser 20 mesma tempo legislador, Se este vvesse unido 20 poder executvo, o jz poderia ter a for- «2 de um opressor (I, p. 276). [esse ponto, 2 conclusto € natural € no precisa de mais “Tudo estaria perdido se a mesma pessoa, ou o mes: ‘mo corpo de grandes ou de nobres, ou de povo, exerces- se esses trés poderes:o de fazer as les, 0 de executar as resolugdes publicas € o de julga os delitos ou oligos dos paniculares" (lp. 277) De maneieainvers 0s principes que desejam tomarse titanos sempre ‘comecam por reunie na sua pr6pria pessoa todas as ma- slstraturas,€ muitas ris da Europa, at todos os cargos do Estado" (, p. 278). 13 Jean-Jacques Rousseau Rousseau pode se cosierdo como o shino jt tlt, De fats steno compte de ngs der doy do jsranalsmo 0 eado denature 0 ena Cl © Contato soca liberdade nar aera cl te as 2 elute que no problema da conto eal & ng tal stndg dos camino que tau so aga plos fms pees. &aematva qu ea coloads ha mente dos taalinae ex seus: oun sarge no ‘Sade maura sraddo no ead ce ead aa ‘ramet de era, mas vars sa de toto con {todos eau cl em um sao de pare de sere, Insane 2 belli ssid 1 open. Puce {ue mio sea dado abs homens owt de oso bens Supremos dia ead ep has estan conde does iver oem Abram pou em par som bead Darl avi nto uma ela ou ola 0 edo de tater com odo os perio da sna, ou aceaio do Tata com tolas ss opr Thomas Hobbes colts todo. peso do seu engeno so bec 0 to da aang, Opa pelo ad ,conteqhen- tement, pets serio. le para da congo de que ne © reo ceipoce no eal os otens esto Oba er two esa de rarer eo med do soberan, es prt @ ‘Teundoc que no fund, os hones wbmetense com pier 2 obelénc sum oben pt sir sari, Reconhea -70 ‘que anarquia € Estado eram dois males; mas 0 mal menor ert 0 Segundo. Construu sua teoria de maneisa a mostrar a neces dade da passagem do estado de natureza pars 0 estado civil, como passagem de um estado de iberdade para um estado de servidio, Porque sendo um estado dle guerra perpet, 0 est do de natureza conteidiis © instinto Fandamental do homen, ‘que 6 a conservacio da vida, Para sir dele precsava suprimi- 1, para suprimi-lo 0s homens renunciavans a todos 0s direitos raturas € 08 atbulam, segundo um acordo reiproce, a uma pessoa ou a um grupo de pessoas As quais conferiam 0 poder ‘supremo de comandar e comprometiam-se a obedecer em qual- quer crcunstincia (a no ser no caso em que estivesse ameagada «sua propria vida), Os homens, portanto, compravam 2 Segu- ranea pelo prego da servidao. ‘A solugio radical de Hobbes, que tinha optado claramente por um das dois termos da altemativa, nde havia sido segul- dda pela maior parte dos jusnaturalistas, os quaistinkam bus- ‘ado geralmente um meio-teemo. Como vis, falando sobre Locke, a solugio mais feqente tina sido considerar a passa- gem do estado de natureza para o estado eivil nfo como um ‘tansmutacao completa, mas como uma espécie de integragio due pemitsse a instauragao de um Estado que obtivesse os beneficios da sociedad civil sem perder os da sociedade natu- ‘al, Digote da altermativa: ou iberdade sem seguranct ov Segu- xanga sem liberdade, os jusnaturalstas esforcarame por en- contrat uma Férmula de compromissa que permitisse 8 liberdade do estado de natureza ser compatvel com a seguranga do tae Ao civil, e vice-versa. E concebiam o estado cv, como vim, no segundo a visio de Hobbes, como uma eliminagao total do estado natural, mas como aquele Estado que se limitava a farantt, por meio da coago atibuida a um poder centea, os direitos naturas. Enquanto a solugao de Hobbes levava a0 B= Jado absolut, a segunda solucio era a formula ideolégica do Estado Uberal -n- Rousseau nao segue o caminho de compromisso dos jusnatualistas, como Locke: volta posigio radical de Hobbes, ro sentido de que, entre estado natural € estado eWvil, opt pelo segundo, Mas desenvoive a teoria de Hobbes em sentido ‘democratico,Tarbém ele pensa que entre estado natural ees- tado civil nfo existe meiotermo. Mas nega que o estado civil ej incompativel com aliberdade. Seu problema torna-se, po tanto, conciliar 0 Estado com a liberdade Diante da altemativa de Hobbes, ou iberdade ow Estado, cle tenta responder com uma sintese:¢ liberdade ¢ Estado, ‘Tada a consttucao daquele livrinho famaso que € Do cantrato social visa elaborar a férmula de compauibildade da tiberda- ‘de com o Estado, visa estudar 0 modo pelo qual pode se dar 1 passagem de um estado de liberdade e de guerra para um ‘estado de paz e liberdade, melhor: de liberdade mais plena do que antes ‘A solugio do problema ¢ buscada por Rousseau pa férmu- la do contrato. Num jusnaturalista como Locke o contato que i origem ao Estado nao ¢ ato de rendincla total aos ditetos naturais, mas um sto pelo qual os individios, para stir do estado de naturezs, renunciam a0 Gnico ditto de fazer justi- ‘8 por si mesmos e conservam os direitos naturais fundamen: tais @ vida, 2 iberdade, & propriedade). Em Hobbes, como vimos, 0 contrat constitutivo do Estado € um contrato de re- niincia e de transferéncia dos préprios direitos naturals ert {favor de um tecetro(o soberano) Rousseau ligase no ao liberal Locke, mas 20 absolutista Hobbes: 0 contato social tal como o apresenta & também um ato coletivo de rentncia 208 direitos naturas, mas — e aqui esti a diferenga fundamental que deixa Rousseau como 0 tei- co mais consequente do Estado democritico — a reniincla nto 6 feta em favor de um tereiro, mas por um em favor de todos, ‘ou sejt, por individuo (considerado singulaemente) paea si mesmo (Como membro de uma totalidade). Se quisermos nos -2- cexpressar com outras palavas, tanto Hobbes quanto Rousseau concebem 0 contralo social camo um contrao de alienagio dos préprios direitos. Mas enquanto para Hobbes alienacao acontece em favor do soberano, considerado como tna enti- dade distinaa da multieio que o investe dos peSprios direitos ratando-s, portant, de ui verdadero pactom subjectionto, para Rousseau a alienacio acontece em favor da comunidade Inteirs, ou do corp pollico, do qual & manifestagao suprema a vontade geral (razio pela qual se deve falar de um pactum socitats em lugar de sublectons), que &exatamente & vont de dos individuos contraentes, Diferentemente da rendneia de Hobbes, que leva a abandonar a berdade natural para obter a serviio civil, a rendincia de Rousseau deveria leva & abando fat, sim, a liberdade natural, mas para reencontrar ua liber- dade mais plena e superior, ue € Uberdade civil, ou Hera: perativo: Voce no deve ment’, nao tena valor somen- ~~ {e para 0s homens, deixando para outros seres racials 4 faculdade de no levi-lo em conta; e assim € também para todas as outras leis moras propriamente ditas. E ‘consequentemente o principio da obrigacao ndo deve ser Duscado aqui na natureza do homer, nem nas cireuns- acias nas quaiseleécolocade nese mundo, masa priori cexclusioamente nos conceitas da raz purd” (9.3) claro entio que somente uma metafisca dos costumes, ‘como estudo dos principios racionas a prion da nossa condu- 1a, pode satisazer 2 exigéneia de expor os fundamentos pendentemente de uma resposta qualquer do outro; no diei- {0 08 outros exstem como swetos que exigem de mim o cum- primento da agao. © fato de que, na ago jurdica, eu seft responsivel frente aos outros, insttul uma relagio determina- ds entre mim ¢ o8 outros, que € possvel chamar de relagio “ntersubyetea (para um sprofundamento ulteror, veja 0 capitu- 48 desta parte). Em tal telago 3 obrigacio ou dever de quem se adapta lel comresponde, no outro 04 nos outros, um poder coerckivo pelo qual tenho de cumprira agio, ¢ess¢ poder € 0 ‘que comumente se chara direto, em sentido subjetvo. Pode- mos entio dizer que a experiencia jurdica € caracerizada pela ‘correspondéncia de um direita a um dever e reciprocamente de tum dever a um direto, ou pela presenca simultinea de um ddever de um lado € de um direito do outo: © que se chama relacdojuridica. 0 concelto de relagao juries, como earac- teristico do diteito em oposigio & moral, pode ser devivado 98 a disting2o, iustrada neste parigrafo, entre hberdade ex- tema ¢ liberdade interna. Do conceito de liberdade externa deriva a caracteristica do dever juridico de ser umn dever pelo {ual somos responsiveis frente aos outros; dessa caracteris- tica do direito como Uberdade externa de gerar uma respon sabllidade frente aos outros deriva que os outros podem exigir de mim o cumprimento da minha obrigagio (o que se chama direito subjetivo); finalmente, do direto dos outros de exighro cumprimento da minha obrigagto deriva a carae~ teristica propria ca experiénciajuridica de oferecer espago para rlagées intesubjetivas de diteto-dever, ou seja, para relagdes juridicas. Acrescentamos que a relaclo juridica pode ser instituida somente entre dois sees humanos, ou sej, entre seres que se encontram numa regio de limitagio eciproca da propria li berdade externa. Kant esti hem consciente desea natureza pe- clr da experigneia jurdica ¢ chega 8 definigao da retacio juvidica como relacto de direto-dever ene seres humanos, excluindo, dessa maneira, 0 resto, Podem exist quatro tipos Possiveis de rlagio entre o homem © outros sees 1) relagio do homem com seres que no tém nem direitos nem deveres (por exempla, o¢ animais); 2) relago do homem com seres que tém dieitos ¢ deveres (por exemplo, os outros homens); 3) relagio dos homens com seres que tm somente deveres «© nenhum direto (por exemplo, os escravos) 4) reiagto do homem com um ser que tem somente direitos «enenhum dever (Deus) Kant aflma que desses quatro casos somente 0 segundo, ‘01 se, a relagio do homem com outros seres hurnanos, pode constiuie uma verdadeita relagio juridica. Nao podemos, con- ~99- tudo, excluir que uma relagdo moral possa acontecer nos Ov tos tts casos. Disso deriva a confirmagio de que a caracterts- tien do diteto com relaga0 2 moral é um certo tipo de relaga0 entre mim ¢ 0s outros e que esse tipo de relacdo, 3 qual damos fo nome de relagojurdica, &constiuida por uma reciprocida- de entre 0 dever como cumprimento da lei € 0 direito como Faculdade de obrigtr ao cumprimento 100 - 6 Avronowis & HETERONOMIA Eesaninamos dois crtsios de into ene mont ea reo anos existe, ov se, que pam sr drial do Proprio eo de Kan, Com bate no prime, Kan dstngue Forage, ov exes dos Severs cumpies scpunde + Chrigaco da gaia ow efor dos deveres par os guais € pedis somente uta conformiade ener Com bast to segune, Kant ising amor como esa da perdade inema ow da adequiao Ie a zi independenteente do deo dos outon, do dieko como ete da Iberdade textes ov da equa 2 et aioral, obits so tae bem peta experiencia ds cuton, unt a ese Gi ror explo, prem sr conden, no texto de Kat es dete ettos pisos mplictos no sentido de gu Kant colocou svn premise sm as desenolver 06 exepes Je ane que sucesvament, anda gue cr conta, pena: arn que fone ponte dere ees emtion dos toe © bute, se no. pp ln, pelo menos oo cpa do © prio deses cro dein da dts kann en te atonomts€ bern da sug da aonomia ont moral com aie din da vonade boa em opo to avons qu € did, no poo respelo sl ts pr um oj extern suaquer on tn fn qualquer, Me Pandamentgo Kati: =101- *\ autonomia da vontade € 4 qualidade que a vont de tem de ser let para si mesma Cindependentemente de ‘uma qualidade qualquer dos objetivos do dever"(p. 6. Essa definigio € por si mesma muito car: se por autono- mia se entende a faculdade de dat leis si mesmo, & certo que a vontade moral € por exceléncia uma vontade autonoma; por- ‘que, como jé multas vezes foi dito, a vontade moral € aquela, segundo Kant, que nao obedece 2 outa lela no ser a lei mo ral enio se deixa determinar por inclinagses ou calcul inte- ressados. Lembremos que essa defingio de autonomia coinci- dde com a definigto dada por Rousseau 2 iberdade, entendia ‘como a obediénei & let que cada um prescreve par si mesmo (cia capitol 13 da pate D. © conceto de heteronomia é derivado, por anttese, do de autonomia, Eis a5 palavias de Kant “Quando a vontade busca ali que deve determina ‘num lugar diferente daquele a0 qual esti scostumad, segundo as suas méximas, a insti uma lexislaclo ‘universal, quando, conseqlentemente, superando a si mesma, busca ess lei na qualidade de alguns dos seus ‘objtos, resulta sempre de tudo isso uma heteronomia. A ‘vontade no di, eni2o, 2 lei para si mesma: € 0 objeto, a0 contririo, que lhe d8, por efeito das suas relagoes com ela” (i, p. 68). notéria a importincia que tem a distingo entre auiono- sia © heteronomia para a determinagio da moral de Kant. Se- irundo Kant, a vontide moral ov & aut6noma ou nit € moral ‘qualquer objeto que determine a vontade de maneira hetero- roma tia vontade ea agio que derivam disso a qualidade de moral, Todos os sistemas morais tradicionais que colocaram ‘como fim da vontade humana a perfeigao, ou a felicidade, ou 102 - qualquer outro bem, sto legimos: nao entenderam o cariter profundo e auténtico da moralidade Mas aqui é posta a pergunta: a distin entre autonomia & hheteronomia pode ser aplicuda 2 distingdo entre moral e diei- 1? Uma ver reconhecido que a moral éa esfera da autonomia, possivel dervara consequéncia de que o direto & a esfera da heteronomia? Kant no claborou esss conclusto de mani explicit, Mas nds estamos fl suficentementeinformados so- bye & natureza do dieito, segundo Kant, para buscar alguma slagao. ‘Que se consider o direlto seja como legalidade, seja como Iiberdade externa (Segundo as duas defingdes explicas ilus- rads snteriormente,acreditamos que a vontade juridica pos- ‘4 ser consderada somente como vontade beterénoma, Na con- dicho de legalidade, a vontadejuridica se diferencia da vontade moral pelo fato de poder ser determinada por impulsos diver- s80$ do respeito a lei: e ests & de fato a propria definigio da heteronomia, Para 0 direlto nto ¢ importance que eu cumpra a cio prescris a fim de satisfazer um interesse meu, uma vez ‘que esti bem claro que também a ago mais honest, cumprida por ineresse, nfo € mais, or iso mesmo, uma 220 moral. Na Condisio de liberdade externa, a vontade juridica se diferencia ‘da vontade moral, porque provoca nos oueosttlares de igual Nberdade externa poder de me obrigar e, portant, & peel tamente compativel, como veremos melhor mais adiante, com 8 coaglo; mas, mais uma vez, uma vontade determinada pela coagao € uma vontace heterOnoma, uma vez que é bem claro ‘que também a aco mals honesta, quando cumprida por medo da puniclo, eo € mais uma ago moral 103 - 7 Inpenativos Cxrecéricos b Impenativos O sesunio ds dois ition dsinivon ene do € mor uch dnp, den da sin de ant tne inperives cae ¢impernvor pws Ut sulfite de tego daa 20 inpeato mor, come Heino de tos avon fomas de imperative, as lels da cond humana (up cade € objeto de meter Jos comumes) do oes iret eo das kes mtu (cj esto € bjt a metas a a. ren) Sto orders porque, enquant le rate elas te fendmenos ara de mane, eceaia expe ave nt conan ua epi de neces, all Ge x reeem ao homer, oul é le, ereemete dos futros seres naturais, estabelecem entre Fato e consequéncia uma relacio de obrigagao, que se expressa por meio do ver- bo ‘dever, ou seja, no descrevem, mas prescrevem. Assim diz Kant na Fundamentagao “Todi os imperatives sio expressos por meto da pa favra dever¢ indicam com iso a relacio entre uma Te bjetva da razdo © uma vontade que, segundo a sua cons- thuigio subjetiva, do & necessariamente detorminada ‘poressa lei(uma coagac).Elesdizem que sea bom fazer ‘uma ta coisa 04 nao, mas o dizem 2 uma voniade que = 104- nem sempre faz. uma coisa porque Ihe fol apresentada ‘como boa para ser feta" (pp. 33:30. E um pouco mais adiante: “0s imperativos sto somente formulas que expressam a relagao entre as les objetivas do querer em geral €a imperfeicao subjeiva da vontade deste ou daquele ser racial, por exemplo, da wontade humana" (p. 35) ‘ima vex dito que 2s les da conduta humara sto precetos, Kant ditingue o género‘precet’ em dus espécies:categricos € hipotticas.CaeRéricos so 0s que prescrever uma ago boa ‘por si mesma, como por exemplo: “Vooe milo deve ment’, € ‘Ghamam-se assim porque Sto declarados por meio de um juizo ‘catepérico. Hipotdticos si0 aqueles que peescrevem uma a¢l0 boa para alcangar um certo fim, como por exemplo:°Se voce quer evita ser condenado por flsidade, voct nao deve ment, fe chamam-se assim porque io decarados por meio de um hipotético. Por sua vez, os imperatives hiporéticos lstinguer- s2.m das subespécies, segundo o fato de que o fim sea, como diz Kant, postvelou rea isto €, com nosss palaras, segundo 0 fato de que o fim sea tal que sua obtengao ou nto-obtencao sea indiferente Ce, potanto, sei ito busc-lo ou nao), como & por ‘exempl,o fim de aprender o latin o4 sea, al que dependa de uma necessidade natura, de modo que sea possivelafirmar que todos 0s homens coloquemno de Tato como, por exempl, 2 Felicidade, Desses dois pos de imperativos hipotéticos, Kant chama os primeitostéenlas(enquant so proprios de cad ae), (0s segundos pragmaticos enquanto se referers ao bemestar em ‘era Um exemplo dos primeiros poe sero seguince: “Se voce ‘quer aprender latin, deve fazer muitos exercicios"; um exemplo dos segundos: "Se voet quer (ou porque voce ques) ser feliz, deve evar qualquer excesso”. Os primeiros preserevem regs = 105 de babitidade, os segundos, regras de pradéncia. Conciuindo, Segundo Kant exitem irés expécies de imperatvos 1) catepéricosou morats, cua formula €:Vooe deve execu tara ago a 2) tentcosou de ablidade,cvja formula & "Se voce quer aleancar B, deve executar a agio A"; 3) pragmavcos ou de prudéncia, cuja Gemula & “Porque voce deve aleancar B, deve execute a gio A” ‘Também diante dessa distingio coloca-se a pergunta que fzemos com relaco distinco ene autonomia eheteronomit: 4 distingio entre imperativos categéricos © hipotticos pode ser ampliada para a distingio entre moral © direito? Ndo hi tdavida que, para Kant, « moral conhece somente imperativas ‘categéricos: desta afiemagio & possiveltrarse a consequencta {que Kant nfo trow de maneira explicit, de que os imperativos juridics sto hipotéicos? © problema foi debatide longamente pelos exegetas de Kant. Para oassunto, indicoo liv inttalado Mdirto come norma tecnica 1911) de Adolfo Rav: do ttalo & facil entender a tese do autora respeito da questio que estamos cexaminando. Ravi, efesindo-se de fato A distingio de Kant, sustenta que as normas juridicas slo imperatives técicos. De minba parce acredto que, ea questo da heteronomia € resolvda sustentando-se que a vontadejurdica & heterdnoma, deve-se resolver a questo do Embito do hipotético sustenta ddo-se que os imperativos juridicos s20 hipotéicos. As duas ‘questdes so estreitamente conexas, como resulta, de resto, do seguiate techo de Kant “Todas as vezes que se deve tomat como fundamento ‘um objeto da voatade para os fins de prescrever 3 vonta~ de a regra que deve determing 106 - beterdnoma: 0 imperativo é condicionad, ou sea: seo porque se deseja este objeto, deve'se agir deste 00 di quele modo; consequentemente ele ndo pode nunca co- ‘manda moraimente, ou sea, de maneia caepérica"(Rur- damentagao, p. 72). claro, nesse echo, que da heteronomis da vontade deriva ‘Abita do hiposzico, assim como da autonomia deriva aesfe- 11 do cateprico, Se uma vontade & determinada por um objeto extemo e, poranto, é heterdnoma,é sinal de que o imperative ‘to prescreveu wma ago boa por mesma, mas uma ago Cujo cumprimento depende da vontide de alcansar 0 objetivo exter. no do proprio deseo. Se a vontade € autBnoma, isso € sinal de que 0 imperativo €categérco, ou sia, prescreveu uma aio bos Por si mesma. Rigorosamente, deveriamos entio admit sem ne cessidade de uma prova ulterior que, uma ver atrbuida a quale ficagio de heteronoma a vontade jurdics, seja possvel atibuir qualiicagio de hipotético 40 imperativajurdico De resto, a dedueto pode ser facimente confimada logo {que pensamos nos dois significados do direto: como legalida- de © como liberdade externa. Se 0 direto coincide com a legst- Tidade, isso significa que um imperativ juridico no € formula do desta manera: “Vooe deve manter as promessas", mas desta ‘outa maneina “Porque o fat de manter as promessas € vanta- gem para voce, voc’ deve agir em conformidade”, Se depois tentendermos por obrigasio juridica aquilo que tem como cot respondente a faculdide dos outros de me obrigar 20 cumpei mento, devemos deduzir que a formulago do imperativ jar ico devera ser feta desta maneira: "Se vocd quer evita ser constangido pela forga a cumpritas obrigagbes assumidas, voc deve manter as promessis" B com isso fcaria confimado que ‘comands categéricos slo somente os comands morais,¢ que também nesse aspecto a esfera da juridicidade se distingue da esfera da moralidade, 107 - Apes temos exposo a dsingto ent mon ¢ deto comn base nos crits expose iplcton cxamesprotos para enfrenaro problema da defn do iret. ‘Kan dese primeimmenteescaecer que a definigto que dark mio € empire, ou ss, aque que se pode extra do esto do dieto posto. Anes, quem se apega 20 direto Poskivo, como fo jurist, ro pase munca exabrlecer 0 fue € jst iusto (quid, as poder somenteesae- Iecer eu determina fto ou aoa to 0¥ to sob 0 onto de isa uric qui sr). Em lingam moderna, Poderiamos cer que o usta gue nao domino deo pos tivo pode sim, exabelecer 0 que € wide sob o pono de ia jurdco (ou problema da valdade do dro), mas 20 © que tale como ere (ou problema do sao do dre). A énca Imancra para se chegara compreender 0 diet como valor, fej, como leis da unig, abandons o terreno empico © toltar a9 Tundamento de qualquer diteto empiico, ov sen, 3 ri pra © echo de Kant que cloca esa distinc encon- tease Bs pp. 405406 “10 jurisconsultol pode, certamente, contecere decla- aro que venha a sero dirito (quid st rid), 08 se, 0 {que as leis, num cero lugar e numa cera Epoca, preste- ‘vem ou prescreverant, mas, 6 justo oque essas les pres- creveme o cetera universal por meio do qual € possivel = 108 = reconhecer em ger © que € justo ou justo Clustum et ‘ntustu), permancce Ihe completamente obscuro, se 0 abandonar por um certo tempo aqueles principios fempiricas e se ainda que passa servirse daquelas leis ‘como excelente fis condutores) no buscar as orgens dagueles jutz0s na razao pura como tinico fundamento. de qualquer legisacao positia passivel” Em conformidade, portanto, com 0s fins préprios de uma retafisca dos costumes, Kant apresenta a propria investgagio dd direto como nio-empirica,racional,£, como veremos me- Thor no decorrer da exposict, todo o seu esforc estara dri do conseguir a jusfcagio dos prncipas insttutosjuridicos & pani de alguns prinipios racionais a prion, ou pestulados, fe manera que sia dostrina do direto pode muito bem set designada como uma dedugio transcendental do direto © dos institut jurdicos fundamentsis, a partir dos postulados da razio pura pritica Segundo Kant, rs sto os elementos constituvos do con- ceito do direto, Vamos consider-los separadamente: 1) °O conceito do direto, enquanto este se refere a uma ‘obrigagio correspondente (..) diz respeito em prime Jugar somente a relagdo externa, absolutamente prii- cextema nio pode ainds caracterzar suficientemente © dlireto: também um ato de convenignca, de cortesi, Jmplica uma relagdo externa; vamos aereseentattamberh um ato moral, quando se trata de deveres com relagio 208 outros, como os deveres de benefcéneia,smplica uma relagio externa, © mundo do intersubjetvo € mais an plo do que © mundo do dreto.E necessiria uma earac- terizagao ulterio« “Em segundo lugar fo conceito do dirito (no signif cx uma relagio do aris com 0 deseo em conseqiéncia também da pura necessdade) dos outros, como acontece fos alos de beneficncia ou de cruckiade, mas referee ‘exclusiamente as relagcescom 0 arbitio dos outos" Aavés dessa segunda caracteaaga, Kant se prope a disinguir a intersubjetividade juridica de outra forma ‘qualquer de intersubjtividade. E de fro ele observa que, para que exista uma reacao juridica, € necessrio que 0 ‘meu arbitio esteja relacionado com © arbitio dos ou- ‘ros; no 6 suicente que este relacionado com o dese jo dos outros. Disso é possivel dizerse que a prmeita ‘caracterisca da relaco juridica € aquela de ser tma re lagao ene dois arbririos e nao entze um deseo © um axbitio, ou ene um arbirio © um desejo, Com relagho 20 significado de arbi, em oposicio a deseo, emete- ‘mos a0 que Kant diz nap. 387 “Quando a faculdade de desejar ests ligada& conscién- cia pela capacidade que sua acto pode ter de produzit © objeto, chama-se avira, se falta essa conscigncia,entd0 ‘0 ato da faculdade de desejar chama-se aspiragdo” esse trecho resia que o arti se distingue da mero deseo ou, mais ainda, da aspirago, pela consciéaca da capacidade de produzie um objeto determinad =10- Observe-se a diferenga de significado estas duas expres- ‘6s: “E meu deseo dae rma bela volta na montanha”."E ‘meu arbtrio dar uma bela volta na montanha.” O desejo 6.4 representagio de um objeto determinado colocado como fim; o abitrio é, ainda mais, a conscéncia da pos sibilidade de aleangi-lo. Quando Kant diz que o direto consste numa relaglo entre dois arbirios, € alo ente dois desejs, quer dizer que, para constiuie-se uma re fo jurdica, € necessério que aconreca o enconiro nao somente de dois desejos, ou de um arbitio com um sim- ples desejo, mas de duas capacidades conscientes do ‘poder que cada um tem de alcancar o objeto do deseo. ara que sea possvel dar origem a um contrat, por exer plo uma compa e venda, nto € suciente ue o arbitrio ‘do comprador se encontre com o desejo do vendedor, ‘mas € preciso que também por parte do vendedor 0 de~ sejo se resolva em arbiro, ou seja, na capacidade de ‘executar 0 que 6 0 objeto do mero desejo. Para indicae a diferenca entre a relacio juridica e aquela que nao € tal, Kant di dois exemplos: os atos de benevolénciae os atos de cruedade, De fato, um ato de benevoléncia nao é absolutamente necessirio que meu arbitro correspond 0 dos oultas, uma vex que © beneficiado enconta-se frente 2 mim numa siuagio de passividade, © a ele € pedido somente o deseo puro e simples de receber a fesmola. Ao mendigo nil & possivel atbuir a frase: “E sme acbitrio receber a esmola", mas pode-se bem at- buira ele eta outra fase: “E meu desejo receber a esto 1a", Com relagio aos atos de erueldade, fala no sujeko ppassivo no somente uma forma qualquer de arbitio, ‘mas também 0 deseo: o arbi do tano que mata qual {quer um de que suspeite ter conjurado contra ele no ‘pode levar a uma rlagiojuridica, sendo um mero ato de ooga, em que ao arbitio de wm no correspond o ar =m tro igual do outro. Penso que € possivelintespretar © significado desse segundo requisto da telagio juridica dizendo que, para que exista uma relagio juries, mo & suficiente a intersubjetietdade também os atos de bene Ficéncia e de crucldade sto intersubjetivos), mas € prec so também a reciprocidade, ou ses, que a0 atbittio de tum corresponda 0 arbitio do outro. 3) "Em terceiro lug, nesta rlagaoreciprocace um atbitio om 0 outro, no se considera absolutamente a maria do arbitrio, ou sj, o fim que uma pessoa se prope por tum objeto que ela quer (.) mas somente a forma na ‘elagdo dos dois arbtrios, enquanto esses si6 conside= Fados absolutamente conse livres.” (Com esse terceiro requisto, Kant quer dizer que o die: to, na regulagao de uma relagdo entre abitios, nio se ‘preocupa em estabelecerquais sejam 0s fin individuais, ‘ilies, que os dois sujeitos pretenlem, os tnteresses {que estio em pauta, mas somente em prescever a forma, ou sep, as modalida des através das quais aquele fim deve ser aleangado, e aqueles ineresses,regulados. Para se= ‘uir o exemplo de Kant, quando o dlreito estbelece as regres do contrato de compra e vend, no se preocupa om a vantagem ou desvantagem que vendedor ou com pradlor possam ter no cumprimento, mas somente com as ‘ondigdes formais com base nas quals deverd ser cunt. prido, Dando um outro exemplo, quando o ditto rege la a instiuigto do casamento, nto estabelece nem com quem eu devo casa nem quais Sto os fins individuais {que eu possa propor-me a aleangar por meio do casi -mento; iitase a fixar as modaldades por meio das quais se toma possvel a atuacao das minhas intengoes NNesse terceiro atributo da relagao jurdia, esti a origem ‘da doutrina moderna chamada de formalismo juridic -12- cajos nicadores foram exatamente 05 fotos neo femrans do det, como Simmer © Kelsen, na NE- Trunk Del Vecchio, polo menos ma prime fase do Tu penser. na il Sendo a formalasto als pk do formatano jaro, que € de Sumer, die- taining se da econ como forma do comet Cinque lao tnterbjtaocemeno materia € SSonomio, element ol, rico. Hm outs pal- San ars crtr formal 30 eto sigan diner que Treo prescreve nto tr o que se deve fazer, as somo se deve ant que eu Seve fe para regula 0 tvs meres indica pela economia do, com teas an suns pes, ls me die como evo seirpa alana, juntamere com or ovo oe om Steaciacom os ten, os mews Bon Se mie Sezer com qu, independetemente do objeto de me deseo, med abo pose ear de coda com 07 to de des oto Ese terceiro requisito abre de maneira definiva a porta para a famosa definigto do direito de Kant, que aqui apresen “0 eet € 0 cons das condiges por mio ds vata dun pode exer de sorta com oa Cho de um ou, segundo una universal a bers dean, essa definigio deriva aquela que Kant chama a let univer sal do dirt, assim formlada: anua externamente de maneia que o uso livre do teu arbivio possa estar de acordo com a liberdade de qual {quer outro segundo uma lei universal” (p. 407) -13- Na definigio do direto podem ser relevados 0s tes requis tos dos quas flamos anteriormente: Do direto pertence ao mundo das relagbes externas; 2) ele se constitu na relagio de dois ou mais abitvios; 3) a sua funglo nio & de prescrever este ou aquele dever substancial com relago aos sujitos dos virios arbitios, mas de prescrever-hes a maneira de coexist, ou sea, 28 condigoes por melo das quas oabivio de um possacoe= sxistir com 0 arbtrio de todos as outros, De fata, podemas dlizer que, segundo Kant, o dieto & forma universal de coexisténcia dos arbtios dos simples. Enquanto tl, € Condigio ot © conjunta das condigbes segunda as quis ‘os homens podem conviver entre si, ou 0 limiteda liber- dade de cada um, de manera que todas as liberdades ex tesmas possam coexist segundo wma lel universal Fi mente, o diréito € 0 que possibiita a livre coexisténcia dos homens, a coexistiacia em nome da liberdade, por. que somente onde a liberdade € limitada, a liberdade de ‘um no se transforma numa no-iberdade para os outs, cada um pode usfruir da liberdade que the € concedida pelo dreito de todos os outs de usufruir de uma liber- dade igual 8 dele = 14 - Uhr eet denice dete que Kant, de vemos pergtn qos alor ten cas inp ine ern 0 tsa dvi 6 cus oq oto deve ser? Na termine Ives, ata principamene pels fcr nckantaner, Kant define concede dco ou» lee de dct! Se mos ‘fears 0 qe diteos n ie do paignfopetseate, ‘ho vida quam ao ao de qo problr que Kant et ‘eadvendo por mo de tn defo ao € oq 0 cts taro ue art dete wt © pena Ge Kant nun 96 Falisopclena dso se do ese com bse no {palace pose dingo qe € ato do que Cink, Qua dh le ir quo dct €o sent dae cone por melo das qua obit de un poe et de scordo com o ao de un out segundo una el univer da iberdade to em tends eblecer alo que €o co na eldest, ‘ma agulo qu dvr ero dco pars coed 0 We de just, No ets do con efi, que'o deo sje ele dey anilo qu nt ns aa tii, Ao ue Kat vin 0 we do dco, a gal quater deve adoqat Se part poder ser considera como fsa Anda enema Iga entesteconesponese pleamente quel Wes, 2 iii de Kate ete noe vere, Uk ve Qe br dr omenteo West so ual olepador eves ae crag coo na genet dead expen aa fo vale camo conn sdefiiao que Kant Gao pos = 15 - Uma acio ¢ usta quando, por meio deta, ov segun= do a sua mixin, « iberdade do arbieio de um pode continuar com a lberdade de qualquer outro segundo ‘um lei universal (p. 407), ‘Aqui € claro que Kant se preocupa em estabelecer 0 critéio para distinguir uma acio justa de uma aco injust, ero aque- le para distinguir una ago juridica(conforme o dirt existen- te) de uma ago no juridca (no conforme o dieito existente) ‘Kant, Prtant, neste momento realmente central da sua obra, presenta ui sdeal de justica. De que ieal se tra? Penso que seria possivel defini-lo como 0 da fusca como tberdade [Na histéria do pensamentojurdico foram sustentadas varias teorias da juste. Ess teria distinguem-se com base na res: posta que derim a pergunta: qual é o fim dltimo do dirito? [Acredito que as wirss respostas esta pergunta possam ser dlivididas em us grupos: 1 a justga € ordem. Esta teorka surge do fato de considerar ‘como fim iltimo do direto a paz social. Ela sustenta que 4 exigéncia fundamental segundo a qual os homens cria- ‘am 0 ordenamentojuridico € de sar do estado de anar- {quia e de guerra, no qual viveram no estado de natreza, 0 direto & 0 remédio primero ¢ fundamental conta 05 males que derivam do bellum: ommium: contra omnes. E esse realiza seu fim quando, por meio de um poder cen- teal capaz de emanar normas coerciivas para todos 0s sssociados, 6 estbelecida uma ordem social, qualquer ‘que seja ess, O diteto natural fundamental que esta teora deseja salvaquardar € o direto a vida. O direito ‘como ordem é o meio que 0s homens, no decorrer dt ‘hilizasao, encontrarim para garantira segueanca da vida Um exemplo caracterisico desta concepsio da justin encontta-se na flosoia politica de Hobbes, = 116 ~ 2) a jusica € ualdade. Segundo esta concepeio, que € mais antiga © tradicional (deriva de Adstteles na sua Fermulaco mais clara), o fim do direto, ou sea, das re ‘as coerciivas que disipliaam a conduta dos homens fa sociedad, ¢ de garantie a igualdade, sea nas eela- Bes entre os individvos (© que geralmente & chamado e justica comutatiea), soja nas teagdes entre 0 Estado € (0s individuos (o que € chamado tradiconalmentejustica istributioa).O direito € aqui remédio primeiro fun- ‘damental para as dispardades entre os homens, que po dem derivar tanto das desigualdades naturais como das desigualdades sociais. Um ordenamento jurdico nao pode ser considerado justo se nao protege os fracos dos Fortes, os pobres do rico, se nto esabelece com as pr6- pias rogras uma medida ou uma sésle de medidas com as quals sea impedida a prevaricaglo € todos os mem- bros de uma sociedade recebam igual tatamento com base em certos eritéios fundamentals (que podem ser (2 o trabalho, ora 0 mérito, ora a necessidade etc). Se- undo esta teora, ndo € sufciente que 0 dizeto impo- ‘nha uma ordem qualquer: & preciso que a ordem seja Justae por jst’ entende-se ‘Ue Fito fandada no respeito 2 igualdade’. Se imaginamos 2 justica tendo a espada © 2 blanca, a teoia do direito como ordem vist a ressaltar cespada; a do direto com igualdade, a balanga, O direito ‘natural fundamental que est na base desta concepso & © direto 2 gualdade, » ‘a justia & Mberdade, Com base nesta concepeao, 0 fim Ultimo do dreto é @ liberdade Ce entenda-se x Hberda de externa). Ar223o Ghia pela qual os homens se reu- niram em sociedade e eonstituiram 0 Estado ¢ a de ga fant 4 expressio maxima da propria personalidad, {que nio seria possvel se um conjunto de normas coer. -u7- chivas nao garantisse para cada um uma esfera de ber ‘dade, impedindo a violagio por parte dos outros. O ‘ordenamento justo € somente aquele que consegue fa et com que todos os consociadas possam usufruir de uma esfera de hiberdade tal que thes seja consentido desenvolver a propria personaidade segundo 0 talento peculiar de cada um. Aqui o direito € concebido como ‘um conjunto de fimitesas liberdades individuais, de ma- reira que cacla um tenia a seguranga de nao ser lesado na propria esfera de liceidade até © momento em que também nao lese a esfera de licekdade dos outros. Por- tanto, lo €suficente, segundo o ideal do dieito como Liberdade, que o ordenamento jurdico estabelega 2 0r- dem, nem € suliciente que essa ordem sefa fundada na ‘gualdade (também uma sociedade na qual todos sejam ceseravos @ uma sociedade de iguais, ainda que iguais ‘a escravidio). £ necessirio, para que brilhe a justiga ‘com toda a sua lz, que os membros da associagio us fruam da mais ampla liberdade compativel com a exis- tncia da propria associago. Motlvo pelo qual seria justo somente aquele ordenamento em que Fosse cestabelecida una ordem na liberdade. © direto natural Fundamental pelo qual esta concepeio & reforgada € 0 direto.a lberdade.- Parece-me claro que todo o pensament juriico de Kant vist ‘4 teorizar a jusiga como liberdade. E alver a expresso mais ‘caracterstic e consequente desateorascenamente, mais es- peltivel Ese pensamos no fato de que a teora da justiga como linerdade & aquels da qual nasce a inspragio para a toda do Estado liberal, devems eoncuir que a teora do dete de Kant ‘deve ser considerada como um dos fundamentos tedricas do Estado liberal, como veremos melhor quando trtarmos do di reito pablico, na quanta parte do curso. =118- Aqui € suficiente dizer que 0 conceito de liberdade pro= prio 8 teoria liberal do Estado é 0 coneeito de liberdade como ro-impedimento, Como fl foi dito no capitulo 5 desta parte, ‘quando Kant fala de iberdade imerna ou externa, dese fa- lar exatamente da faculdade que temas de agit nao sendo obstaculados ow pelas Forgas inferiores das nossas paixbes, ‘ou pela forga externa que provém do abitio dos outros. Ba justia a que visa € somente © conjunto das garantas por meio das quais posso expressar a minha liberdade externa nto limpedida pela nio-liberdade dos outs, ou seja, a idéia da coexisténcia das liberdades externas, como coexistencia de tanta esferas de nio-impedimento. E de fto o que significa para Kant agir de maneinainjust? significa interfer na esfe- fa da liberdade dos outros, ou seja, colocar obsticulos para {que 0s outras, com os quais eu devo conviver, possam exer cer sua lberdade na propria esfera de liceidade, Como con- Firmaglo, lease est trecho que segue imediatamente a def nigdo de aga0 justa, citada hi povco: “Se, portanto, a minha ago oem geral, o meu esa- do, pode estar de acordo com a liberdade de qualquer ‘out, segundo uma let universl, agi de manetra in- {usta com relagdo a mim aguele que colocar obsticulos ‘para mim, porque esse obsticulo (essa oposigto) nao pode subsistir com a Hberdade, segundo as leis univer- sais" (p. 407). Se, como aparece ness trecho, a injustia consite em colo- car obsticulos contra aliberdade, a justga deverd consistie em climinar esses obsticulas, ou sea, Fizer com que cada um pos- si usufrui da liberdade que the pode ser consentida pela le berdade igual das ovtros, entendendo por liberdade aquela csfera ma qual no se é obstaculado, em suma, a esfera do mao- impediment, -119- 4 fol dito que as vias teorias da justiga podem ser con- traditrias com base no dizeto natural, considerado funda- mental por clas, ou sea, tal que deva Ser garantido acim © antes de qualquer out. © direto natural fundamental de uma teota da justca como liberdade € o divetto a tiberdade. Kant, apds ter Fito distin $0 entre direitos inates © adquirides, definindo os primeitos ‘como os que sto tansmiidas pela natureza independentemente ‘de qualquer ato jurdico, os outros como aqueles que preci sam de um ato jridico para a teansmisso, intitle um breve parigrfo desta mancira: O diretto inato & um s6,(p, 416). E qual € esse Unico deli into? Eo diet a iberdadle externa. “Liberdade (..) enquanto pode subsist com a iber- dade de qualquer outro segundo uma lei geral: € este o direitoinicoorginarto quecabea cada homem segundo «sua prépria bumanidade"(p. 416). uttos direitos, que geralmente sto considerados como dl- reitos inatos, entre os quais também o da igualdade, para Kant eso *compreendides no principio da lberdade inata e no diferem realmente dla‘. Essa redugo dristica de todos os di- reitos que a tradicio do jusnaturalsmo inelul entre os dietos inatos e, com base na tradio do jusnaturalismo, as wiras de- laragées dos direitos emanadas antes do escrito de Kant revela mais do que outa considerigio, que € o fundamento timo do Weal de justga segund Kant. Apresentamos, como exem plo de todas, 2 primeira declaracao dos direstos, do Estado da Virginia (1776) “Todos os homens sio por naturezajgualmente ives f independents, € possuem alguns direitos nats, dos quis, entrando no estado de sociedade, no podem, ata- vés de convencio, privar ou despic a sua posteridade: -120- cou sea, 0 nsufruto da vida da liberdade, através da aqui- sigio ou posse da propriedade,e 0 buscar e ober fect dade seguranca” Ene os diretos naturis, 2 primeira declarago dos diei- (os, a francesa (1789), colocava a liberdade, a propriedade, a seguranca e a ressténcia contra a opressdo, da Convensi0 ‘Nacional (1793) acrescentava a igualdade ea garantia social, a {do Ato Consttucional de 1793 reduzia 0s dieitos a estes qua- two, liberdade, propriedade, segurancae igualdade. Kant esfor- couse em reduzir a uma unidade o fundamento do direto, eliminando todos 08 direitos inalos, exceto um a iberdade, Fazendo isso mostra que 0 dito de lberdade & verdadeira- mente a base sobre a qual entende montar todo 0 sistema -1a1- 10 Dmnerro Coxcio ene oe probiemas gens do diets coup sempre um lugar cet o problema tt copa ou da coed do dieto, Discus e edict dala hora se congo deve $5 consderada clement exencl do conci de di, io resent noma favs convents pe ser oa Gerad noma tie (Or romance dnguram a8 legs perfectae das lege imperictae:es inas era chamaas im pou inc tamo presi, aso sang. © ue ameorst que pn pee’ ds rer pido que o pete clots ape io ot mts pts sa sao tb ce os nde Ni tag do jrntralm fo sepa de mana consante a dingo ere mspectome lt inperfctanetndenrs pelo pinto o eto que pole sr alado tbe aves for, ou moma alas, odo pun ocamprinenio do qua ¢ Hato core abn foc pelo eur © Gircto que nto pce sr alco por meio da forge em Outs pals, prt © cumprimcete do qual 9 ws oa gt scm condo fein. Por exp pret 9 dco Que etna rene qucm me pce algo (com base na nore ja fndatentl peta su seconde impo ‘eto do poe fete no hen quando et sem om eag20 {ele odever menmene mor de ofeecero supe. Cy ‘lindo, segundo take do nti, peo {einen ono coosl ou se eit! por cod og -12- [Na histéra do jusnaturalismo modem considera-se que tenha sido Cristiano Thomasius o primeiro a climinar da esfera do diteto 0 dtetaimperteito, definindo como verdadeio so- mente 0 diteito perfeto ¢ eunindo assim, de maneira definit- va, a nogio do dieto com a de coagio. Ble dstingue, na aie dade pritca do homem, tés esferas:o fustum, 0 honest, © decorum, Uma vex que os deveres juridicos tém os dois caracteres de intersubjetivdade © de exteriordade & sto, por tanto, coercivis, nado s40 coereveis os deveres moras, subjet- vos intemas, nem os deveres do decorum, subjetivos © exter- nos, Falourse que, com Thomasivs, comeou a distingo rmoxlerna ene o diteto e moral, fundada exatamente no cite Ho da presenga ou da ausencia de coagio. Fa partie de ‘Thomasius todos os fildsofos do direto tomaram posigia fren. te20 problema, feando ou 20 lado de Thomasts em favor da coagio como elemento constiutivo da nocio do dircito, ot contra ele, em favor da dssociagio entre a nogio de direito ea e coagio. Sem duvida Kant pertence 20 primelro grupo: para ele a ogo de dleto € esttamenteligada a nogio da coagio. Vie mos que um dos ertérios de distingio entre morale direito, segundo Kant, € 0 que se fundamenta na liberdade interna © na liberdade externa; e que desse crits nasce a caracteristica do dever jurdico de referise a uma agio pela qual eu sou responsivel frente aos outros. Mas exatamente disso surge © fato de que os outros ém o direto de me obrigara cumpeilo. A Interiordade do dever moral atua de maneira que ninguém pode obrigar-me a cumprio; se alguém me obrigasse e eu ce- esse coacio, a minha aglo, somente pelo fato de ter sido ccumprida, nio por dever, mas por causa da coersio, no seria mais mor. Pelo comtrieio, 0 deverjridico,sendo externo, n0 duplo sentido de que nie impte a agio pelo dever, mas 50° mente a acio conforme o dever, € que impoe uma acto pela qual sou responsivel frente a0s outros, suscta nos outros 0 = 133 - dlircito de obrigar © lo exclui o fato de poder ser cumprido ‘somente pelo impulso do medo da coagao. Em outras palavra, ‘uma ver que moral e coacio so para Kant incompatives, die reito © coagio sho perfeitamente compatives, no sentido de ‘que no hd nada no conceita de coagio, ou coerg20, ou recur- 0 3 forga para exceutar uma obrigagio, que seja incompativel com o conceita do dever externa de legalidade ou deverjuridi- 9; pelo contritio, a coagio é necessria para 0 cumprimento| {0 deverjurdico, como vemos muito caramente neste trecho: 0 direto esrto fundamenta-se sem dvida na cons citncia da obrigagto de cada um de conformar-se 2 lel; ‘mas, para determinat a vontade de obedecer a eto le do se deve e nao se pode, xe 0 dirito deve set puro, {moocar essa conscténcia como um tmpulss, esse dieio ‘apita-se wnicamente sobre o principio da possbilidade de uma coergdo externa que possa coexstie com a iberda- de de cada um segundo leis gers" (pp. 408-408). Em conformidade com este principio, estabelecido io dars- mente, da compatiildade entre as nogbes de direito e de cox ‘glo e da necessidade da coacto para a realizagio do dieito, Kant define em diferentes circunstanclas 0 direito subjetivo como Jaculdade de obrigar. Consequentemente,& possivel dizer que '0 meu dever externa juridco comesponde, no out, um dieto| de me obrigar a cumpri (o que mo aconteceria, se meu dever fosse apenas interno © moral) e que o dever€ juridico quando surge no outro faculdade de obrigar,fato em que consise 0 fspecto correlaconada oposto ao dever juridico, ou sea, 0 direitosubjetivo. Com relacao 2 deinicio do direito subjetio, ‘como faculdade de obrigar, veja-se 0 wecho seguinte: “Se, pontanto,diz-se: um eredor tem o direto de exi- Bit do devedor 0 pagamento da sua diva, iso nao sig- 124 - nifica que ele possa demonstrat que sua propria razio o ‘obriga a essa restituigao, quer dizer somente que uma coagio que obriga cad um fazer isso pode muito bem cesar de acordo, Segundo uma lei externa e geral, com a lberdade de cada um e, portanto, também com a dele Direito e faculdade de abrigar signsicam, portant, uma coisa 56" (p. 409) ‘Surge ainda um problema: num primelto tempo fot dado particular relevo a0 coneeito do deco como liberdade; agora fol salientado 0 nexo necessiro que existe entre direto e cou- ‘lo. Mas ‘iberdade’e ‘coagio’ no sto dois termos antiéticos? Como € possivel falar do direto como de um aspecto da liber- dade humane a0 mesmo tempo ligi-lo necessariamente 3 coa- ‘Sho? Como se concila a liberdade, que devo respetar para cum- Pra ei juridica fundamental, com a coaco, que tenho o diet de exercer? Kant preocupa-se com esta aparenteantinomia ed para ela uma resposta muito clara E verdade que 0 dieito¢ liberdade; mas & liberdade limi- tada pela presenga da lerdade dos outros. Sendo a liberda- de limitada e sendo eu um ser livre, pode acontecer que al- ‘gum transgrida os limites que ame foram dads. Mas, uma vez ‘que eu transgrida os limites, iavadindo com minha liberdade ‘a esfera de Hberdade do outro, cormo-me uma ndodiberdade pra 0 outro, Exatamente porque “0 Out € livre como eu, ainda que com uma liberdade limitada, vem o direito de repe- liro meu ato de ndo-liberdade" Pelo fato de que ato pode repeli-o.a nao ser por meio da coacao, esta se apresenta como um ato de ndo-iberdade cumprido para repeliro ato de nao Liberdade do ontroe, portanto — uma vez que duas negagbes afirmam —, como um ato restaurador de liberdade. A coagio 6, pols, um concelto anttético com relagao 2 liberdade, mas, tenquanto surge como remédio contea uma nao-iberdade an- terior, € negagio da negagio e, entio, afimagio. Poranto, 125 - ainda que seja aniética com relag30 A Uberdade, a coacio & rnecessiria pra a conservacio di lberdade. Podemos esclarecer 9 mesmo conceito usuado termos con siderados geralmente como anitéicos, justia’ ¢ fore’. Como pode acontecer dea forca ser necessitia para usta? A Tong € necessiria para a justica quando a sua tarefa ¢ de repelir uma futra forga que impede 2 atuagio da jusica, ou se, a Forga Injusta.# possive falar de dois usos da forga: de um wso leit mo 04 justo e de um uso ilegtimo ou injusto, segundo se refi, orga usada para obrigar a0 respeito do diteto violado ou para violar 0 dito. Da mesma maneita a ndo-liberdade 0: coagio pode ser incompativel ou compativel com a iberdade, segundo vise & violaglo ow 3 restauragao da lberdade ical Diz Kant ‘A resisncia que & oposta Aquilo que impede um feito serve como auxilar para este efeito © concord ‘com ele" (p. 408). (© que significa: 1) eu quero buscar de mane leita wm certo fim (efeto), por exemplo, cultivar em paz a minha lavou- '3;2) voce tena impedie que et faga sso, por exemplo, entran- do na minha propriedade e levando as sementes embor 3) eu resist 2 esse ato, usando também a foga sca, Bem: 4) a re- sisiéncia que eu openho 20 impedimento € a dnica coisa que sme permite aleangar 0 efeito. £ Kant continua, concretizando seu pensament “Tudo aqullo que € injusto & um impediment para a bordade enquanto esta est submetida ales universis © a coorzo é um abstdculo ou uma resisténeis& Heda” Isso significa que a coereo, como impedimento para a I brad, €injusta? Nao. E porque = 126- Quando um certo uso da propria liberdade & um im pedimento part a iberdade segundo leis universis (ou Sef € iusto), a coersa0 oposta a tl so, enguanto ser- ve para impedir um obstdculo posto & lberdade, esti de acordo com a propria liberdade, segundo leis univers, ou sea, justo” - 17 il Dots Casos ANOMALos Came vines, kant considers costo come un melo indispnsve pana staf de dco e expres secon ceo de mane desta “Qugur deo en sent ho ecru) ca eal de cog Ma ade has sugtes, ida que considers pelo deo, has ons cote nn agree ti w songs de Sere ennai eee coum cares prince defo wm coplee 0 can bn pete ta sega ee a cou fo et, © 0 cto do Sate de needa or tad entndesetdidoralmen asad as cence oe al pi qe ace mo da sequio ha ia gle abn, sas caesar Fe ee ce erence Seta aoe ai nsea-coecd eee ee eee ca ha ae pind ae eeu casa ea rin ho sate rep do oro 20 all pe, tinal oni fects St ee mata py ee cetera de ane tated eters cm so Tuto a er dade aque eso para eden: Segundo» fee eset aoa eee ome eauelec,seasto, questa caine? Nao ee eaudad por case eum event = 128 - desvalorizagio) que nao & smputivel a ele Portanto existem dois diteitos que concortem: um dirito segundo ajustiga,€ & direto de receber a quantia em dinheiro que fo estabelecids, um direito segundo a equidade, e€ 0 dieito de receber nao quantia, mas 0 valor. Qual dos dois deve prevalecer? Segun- do Kant, nto hi dvida: deve prevalecer 0 primero; mas en 1 € claro que o servo tem um dreto Geom base na equidade) {que no pode ser aplicado de manera coativa, ou sea, tem lum direito sem coagdo. Kant nao admite um tribunal da equidade, ou sej, um teibunal que julgue nto com base nas leis geris e abstratas, mas caso por caso. E jusifica esse Fo dla seguinte maneia *0 lema da equidade de fato € este: ‘© miximo de fustga € © maximo de iniqaidade (summus ius, summa {niuri; mas a esse mal ndo épossvelremediar com base no proprio direito, ainda que se tate de una exigéncia fandada nele, porque a equidade pertence somente ao tribunal da consciéncia forum pol), uma vee que, pelo contro, cada questio de dieito propramente dito deve ser levada 0 tribunal cei forum soli” (p. 411), Exeluindo-se 0 tibunal que julgue com base nos entérios de equidade, podemos dizer que quem se encontra na stuago do servo tem um direto, mas nto tem a coagdo para que seja aplicado, porque o tibunal, de cvia decisto depende a aplics- (lo da cougio, decide mio com base na equidade, mas na jus- ‘ga abstata, ou se, com base numa forma de justiga diferente daquela a qual o servo teria vontade de recorrer (© ‘estado de necessidade’ € definido por Kant deforma par- ‘ial (no sentido de que ele indica um caso 55, © mais tpico, entre todos aqueles que podem ser compreencldas nesta cate. fori) e incompleta (no sentido de que nao leva em conta to- dos os requisitos indspensiveis para caracterizar 0 conceto) = 129- “Ese pretensodietto seria a autoi2agto, que eu teria no easo de perigo de perda da minha vida, de tiara vida um outto que nao fez mal algum conta mim" (p. 412) “Tat-se,em outras palavas ce uma btolénciapermutidacon- 1a mim. Para tornar diditco 0 exemplo comum, aceito tam- ‘bém por Kant, considere-se um aaufrago que para poder so- breviver impede um outro ndulrago de apanhar uma tibua ou um salva-vidas; ou, para dar umn exemplo mais atual,o apinis- {a que corta a corda por meio da qual o companheio ests de- Pendurado, no caso em que a corda, gasta, alo possa mais agientar os dois Kant considera o estado de necessidade como um caso de ndo-puntbilidade, apresentando a argumentacio {de que a punigio com a qual a lei ameaga o culpado nto pode- fia nunca sero grande para ser efcaz c, poranto, seria per- Feitamente indi: ninguém de fato poderia ser induzido a abs- terse de um mal coroCaquele de moter afogad ou destosado) através da ameaca de um mal menos certo (a condenaeio pe- nal). 0 que entio diminuiia no estado de necessdade seria, pportanto, nlo a culpa, mas somente a pena: o que significa ‘que, pari Kant, 0 ato cumprida no estado dle necessidade injuso, ainda que no seja punido por motivos priticos. En- ‘quanto ato culpivel, 20 qual nto cortesponde a pena, 0 estado ide necessdade pode ser considerado como uma coacio (ou ato de forca ou de viléncia) sem o direito correspondent. ‘Geri bom advertic que a doutrina dominante hoje segue uma tese diferente da de Kant e mio classifica @ estado de ne~ ‘cessidade entre as causis de exclusto da punibildade, mas da culpabilidade, O esto de necessidade € previsto no art. 54 do Cédigo Penal Ialino.) Resumindo, eis como © propio Kant identifica a diferenga centre 0s casos de equidade e estado de necessidade: no pri- rmeizo caso, “0 que cada um por si mesmo, com ons motivos, reconhece como just, pode niio encontrar confirmagao frente ~130- 2 um thbunal"; no segundo easo, o que ele mesmo deve jugar como injusto pode obter indulgencia e absolvicio deste". A anomalia desses dois casos esti, poranto, no fato de que, en- ‘quanto 2 normalidade da rlagio entte dgeto e coagio exige que o dircito sea satisfeito, e 0 ero, emediada, aqui existe de tum lado um direto ndo-stisfetta, do outro um erro ndo-reme- dado, Em outeas palavras, seria possivel dizer assim: a nature- 2a da justca implica que Sea dada raz40 a quem tem razio & regada a quem nio a tem, Nos dois casos anémalas, porém, existe esta aterag20: no peimeito caso, uma pessoa tem razdoe do Ibe & dada, no segundo caso, uma pessoa ndo a tem e Ube 6 dada, = 131- Il O Sistema po Dinero PRIVADO NO PENSAMENTO DE KANT — 1 Dinero Pruvapo © Dmerro PUnuico Nesters precedes dingo ene mont dito sera pn creer o eect lation de cto a remands proba do dete da sss tes, ie To problema» tr eared anal ene tr dum een qu didn Todo» compo do deo, que dome arate pnadoce ttn pbs as cing Sum dos cpus insets de unger geo dco @ abo de ements a ¢ some neva Cot Sera vino crosses ee oes Ame er pero sr seu, onan, ots rp, conto tio trend ea bused na orm on ma ata Sa avr Com base ms flora da onbo pte, tinge Se Magnes de condone one sjton dv al © Tes de song ness devel eet, dos Guus um €speroy ou, inter grreies de dicio prvade eum csceadee ple guide dos soon, © Tetum, porto, lye de ooneagoy snc de foto pbc sam canceinan pla Sgt do jets seam, portant aoe sor, om ase Ta mets prem, qu cna o bes dopo, da soem osc ind que ete Ses ee {Es peso clevdde Levanto cm cont es igo, ooo prt carcttnd porta eof = 135- 0s interessesprivados, e 0 ditcto pablico, pela protecio ofe recida a0 interesses coletivos, Muitas controvérsiasiniteis surgem do fato de que geral- mente se busca um citi nico ¢ exclusvo para a dstingio entre dreto privado e direto publico (como acontece inclsi- ve para qualquer outa disinglo), uma vez que esti caro que (08 dois crtrios de distingio acima mencionados no se ex cluem absolutamente, mas ambos s20 vil segundo 0 pon to de vista no qual queremos estar e segundo o fim que nos imteressa, De fto, quando usamos a distingto entre diteto pri- vvado e pblico para caracterizara dstingao entre direito civil e dlireto adminisirativo, inttouzimos o primeico crtéi, formal ‘quando usamos a mesma distingto para caraterzar distin. to entre direito civil e dieito penal, seevimo-nos, sem saber do segundo critério, O que significa, em outras palavra, que 0 dligeto administrativo € direto pablico com rekigio a0 dieto iil, segundo uma perspectiva diferente do diteto penal, o, fem outras palavras, que o direito administativo se distingue do direito privado ratione personae, e o dieto penal, ratione materia A dlstingao entre diet privado e direito pabico € to di nmi e relatva, que se nés adotamos, no higar dos critéios citados, um tereiro ertéxio de distingio, aquele da font, 2 distingo entre direito prvada e dreto piblico, assim como & bora peo jurista modemo que se funda num ordenamento Positvo, nio tem mais razto alguma de subsist. E de fat, ‘om relagio &s Fontes, ov se, com relaglo aos atos ou Fatos ‘dos quais derivam normas jurdicas validas, entre 0 dlieito pri vado © 0 direto publico, ov ene o diteto civil e 6 administea tivo, ov entre 0 dieito civil © © penal, nio existe diferenga alguma: todos os direitos menclonadas derivam das mesmas Fontes juridicas (costumes, leis, decretos, regulamentos, sen- tengasjuicias, temas juridios ete), e, porque todas esas fon tes jurdieas dependem do supremo poder estatal, todos 0s =136- feitos citados, com relacao A forte, slo diretes pablicos. O iret privado, assim como é objeto de estudo por pare de tum jurists, & também um diteto do Estado, ou se, um dieito ppblic. Se queremos opor a0 dieto pibico um dieito que no sea pablico com relagto& font, isto €, que no sea colocs do palo Estado, devemos falar nto de direto privado, mas de diroto dos prvados, ou sea, de um direto que nasce das relae ‘8s dos individuos ene i, antes do surpimento do Estado, Kant, como fi se falou, elabora mio uma doutrina empirica do diteito, mas uma doutrina metafisica, ou seja, uma doutrina racional do direito, Também a dstingio entre dieito privado & pablico no pode ser para ele uma disingao emplrica, mas deve estar fandamentada faclonalmente. A unica maneira de fundamenti-a racionaimente € volar 36 diversas fontes das nis os diversos diceitos dervam. Qualquer direito que deri- va do poder estatl é dircito pablic, também aquele que um jurista positive chama de diveito privado. Enquanto permane- ‘cemos no Ambito do diretoesttal, una distingdo absoluta N20 ( possivel. Para caracterizar um diteit diverso de maneia es- sencial e nto somente acidental do dieito publica, & necess fio sair do direto esata Exste um direto fora do dielto esta- tal Para Kant, que @ um jusnaturalista, a esposta no pode ser duvidosa; um diteto fora do direto esata existe, e & o diretto riatural entendido, no sentido proprio € esto, como © que regula. as relagdes entre 0s homens no estado de natureza. Pot- tanto, se por dreto privado deve-se entender um direto que se diferencia essencialmente do direto pblico ou estatale io sejt uma parte dele, assim como € geralmente entendid © di- ito privado, deve-se chegar a conclusto de que o diretopri= teido identifica-se como direto que é proprio do estado de mat- esa, Dessa forma, 0 problema da dingo entre dito privado € direko pablico em Kant muda para a dstingdo ente diet natural diteto postvo, ou seja, entre o direto a que se visa no estado de natureza-e o diet a que se visa no estado cil -137- TE essa mio € mals uma dstingio empirica no Ambito do pr pio dreto estatal, mas uma distine0 racional que distingue das esferas de direto diversas quahiativamente, ou dois mo rmentosdistintos do process juridico. Direito privado e dreto Poblico correspondem, no pensamento de Kant, a uma distin: ‘io de status: © primeira & proprio do estado de natureza, no {qual as relagbes juridicasatuam entre indviduos isolados, \dependentemente de uma autoridade superior, o segundo € proprio do estado civil, no qual as relagdesjurdicas sho rege ladis — tanto com respeito a relagdes entre indivuos, quan to com respeito a relagoes entre o Estado e os individuos — or uma autordade superior 208 simples individvos, que € a utoridade do Estado. Por meio dessa disting20, Kant se opde também aqueles Jusnaturalistas que intoduziam uma distingdo entre um direito ‘natural individual e um direto natural social. Para Kant, a Gni- ca dstingio legtima € aquela que separso direto natural (seit cle individual ou sociaD do direto postivo (ej ee individual (04 social, como resulta do recho seguinte: “A divisio do direto natural nto reside (como & ad mitido as vezes) na disting0 entre dirt naturale di- ‘eto social, mas entre diveto naturale direto cei, dos uals 0 primeiro échamado diretoprivado, eo segundo, Aireto pablico.E, de fat, a0 estado de natureza ndo & oposto 0 estado soctal, mas 0 estado cil, porque pode ‘muito bem existir uma sociedade no estado de natureza, ‘mas no uma sociedade civil que garante © meu eo teu [Por meio de leis piblica), e & por 0 que odireto neste caso chama-se dito prado” (p. 422), ‘Uma ver reduzida a dstingdo entre dirt privado € direto Pidblco 2 distingio entre direto naturale dieito positvo, ela se tora uma disingio efetva, ¢ nl #6 aparente, porque se = 138 - basela nas fontes diversas de que ambos os direitos derivam. O dlireito natural & 0 que ni reconhece outea fonte a nio ser a ratureza mesma das relagdes entre pesson e pessoa; 0 diet positvo deriva, 20 invés, da vontade do legislador.O primo um dito permanente, racional e ideal; o segundo € um direito voluntrio © determinado historicamente, O que ¢ dito Claramente no wecho seguint: iia sisterstica, 0 dlireito, enquanto forma uma Aividese em direto natural, que se basta exclusioamen- teem principtos apron, e em diet posttv (esattiio), ‘que deriva da vontade de um lgilador”(p. 416). E confirmado por este outro trecho, no qual fea bem evi- dente que a distingao entre diceito natural edizeito positive se baseia na ciferentefonte da obrigacio que caractriza 0s dois direitos “nice esas leis, ou sea, entre as leis obrigatrias ex- temas, 3s quais se pode reconhecer 0 caster obrigatério também sem legslagio externa, e ss0 a prior por meio dda raxto, esti, ainda que leis externas, leis naturas, aguelss, pelo contrivi, que sem uma legislagzo externa real nlo obrigam a nada © que conseqientemente sem essa legislagao no seriam leis, chamanse leis post vas" (p. 400), Na distin assim colocada entte direito privado e diteto pblico, como diferenciagao entre duas esferas distinas de d- feito, sendo que a primeira se refere ao estado de natuteza © ‘esti fundamentada em principios a prion, ea segunda se refere 4 estado civil e esté Fundamentada na vontae do legislador, 1s encontramos 0s erterios wadicionais de distingio usados pelos jurstas para disinguir 0 deo privado do pablico. De = 139- fato, no estado de natureza, sendo os indivduos todos iguais, 25 relacoes juridicas podem ser somente rolagbes de coordena- dor somente no estado civil, uma vex que fol constuida a au toridade do Estado, instauram-se stuagoes de desigualdade entre aqueles que comandam e aqueles que obedecem, e das sitva- ‘8s de desigualdade surgem elagdes de stubordinago. E mals no estado de natureza, sendo cada individuo uma toralidade or simesmo, subsisem somenteinteresses individuais: somente fo estado civil instaura-se um iniersse cotta, e, porno, & direito piblico, peiprio desse estado, coma-se um sistema pars proteger, além dos imteresses individuais, também inveresses coleivos. Para concluir este ponto, seria possivel dizer que 0 lireto natural € 0 verdadero direito dos indviduos, uma vez que © direto privado, no sentido costumeito da palava, € a regulamentacio das relagdes entre interesses privados imposta pelo diteto publico, O dieito do estado de natureza, como ‘ireto dos individuos, € qualtativamente distinto do dieto cestatal, enquznto 0 diteto privado, no sentido costumeiro da palavr, € simplesmente uma parte do dirt esata, = 140- 2 Sonne a Juripicipave DO Dinerro Privavo Coad oat private, como det do eto de auc foro dito plice oneal 4 Eng ene Seo plc prado et bom fundamen di de ser probisia,Has surge entoum novo problem 0 des ‘Sco eo de nara @ dete oe mean aa que © Goto no nado ci Vines, pre eos qo conse do deta nt eauaments led, sno Kan, Agee cos uw pono ¢ posse! ar dem eke me hipster aieraaharaprirrornesrrnee nanan sho Mase eando de nea, one ocean po Scraupeor ses imps nds, coo ¢ ponte soa concen € pone: des ae eu dco mm seta pete, ware oa faa cs aa as Comet so di cana cue € pi pe Congr” (© pratina, cono seve butt sno Aconeao concede dic rors vo conto es de macy dl fo ae contr one dco 4m sero eta as eo © Get stu no dete fy eno € sca vrdc, problema do det rade, seta por Kant com 0 fe noe denen oe eso, Pts oun comm, oto proado€ ma ead rm pane do eto paler Kank, ps gamers uma sono le {ire do dvcio plc fsa tance 2 dsp ted aor uit, Desa forma ops do ik pre ~~ do apresents uma verdadeira aporia: se, com 0s jurists © con sideramos como uma parte do diteito esata, ele nto € mals privado, porém pablico; se, com Kant o identificamos com © Gireto do estado de natureza,¢ pleramente distinto do dizeto pblico, mas arisea-se a nfo ser mais dieto, Poderamnos falar ‘de um paradoxo do direto privado, formulando a questio des- ‘ta maneira: para 0s justas positives, € pouco ‘prvado*, por- que todo dlireto € pablico; para Kant, © em geral para os jusnaturalists, € pouco “dieito', porque somente o diteto pi blico € dirit, ‘Kant esti bem consciente da dificuldade e idea una solu ho que visa a salvar 20 mesmo tempo 0 cariter prvado © 0 arte juridico do direito no estado de naturezs. Enquanto outros jusnaruralisas tisham prefer considera 0 estado de natureza como um estado nio-urico, para atibuir carter ju Fidico somente ao direito do estado civil, Kant afirma que 0 estado de natueza & um estado juridio, mas provi, distin to do estado civil, ue € 0 Unico estado jurico peremprério, Dizendo que o estado de natureza € proviséro, Kant quer di- er que, segundo a sua mesma constuigio, se, pla falta de uma coacio organizads ©, portanto, de uma garantia co- rum das respectivaslberdades externas dos individuos sin- glares, no est destinado a durar & um estado cujo destino & levar ao estado civil, o qual somtente poe durar uma ver orga nizado o poder coercitvo. Kant frequentemente volta a ess Uistingzo entre dteito natural ou privado e ditelto postivo ou ‘pblico, como dois momentos sucessvos e necessirios do de- senvolvimento jurtdico da humanidade *Verdadeiramente 0 estado de natureza bem que po: dla no ser, exatamente por isso, um estado de injustica Cintustus, no qual os homens nao reconhecessem nas felagdes entre st outro principio a nao ser aquele da Forga; mas era um estado sem nembuna garantia legat -142- (tats usta vac), no qual, quando su woversia com relacio ao dieito (ius controversum), no ‘se enconteava nenlhum juz competente que pudesse pro: ‘nunciar uma sentenga com fora de lel.) De fato, ain da que, segundo 0s conceitos que cada uma tem do di- Feito, possa ser adquiido algo de externa por meio da ‘ocupagio ou do contrato, essa aquisigto € sempre pro- viséria, até quando ndo tenba para sia sancao de wma des publica’ Com base nessa distingio poder se dizer que no estado de natureza pode existr uma poste, mas somente peoviséria,e que de possessio peremptéria é possivel falar somente no estado cul (p. 437), ainda: que no estado de natureza pode ser ad- ‘quirida alguma coisa, mas somente de maneita proviséria, € ‘que, para se ter uma aquisiglo perempréria, ou sj, defnitiva, de alguma cosa, € preciso constuir 0 Estado (p. 445), Em ou tise palavras,dirse-d que o estado de natureza € aquele no ‘qual se express a justia comutatiog, ou Sea, a justica entre as partes iguais nos proprios diretes, uma vez que no estado civil 2 justia comutativa juntas a justga sino, que € aqueta ‘que regula as relagdes entre o Estado & 0s indviduos, Mas nem sempre Kant consegue dissolver a divida se o estado de natu reza, sendo um estado de dzeito, sim, mas somente proviséio, fe portnto, destinado a ser substtudo pelo estado perempts- "Ho, soja exatamente um est juridico ou nao seja um estado préjuriico,Existem até alguns techos (por exemplo nap. 492) fm que o estado natural & chamado, e certamente de mancira cequivocada (mas € um equivaco reveladon), um estado ndo- _furdico, Masa maior parte dos recaes nao dio lugar a divides ‘com relagio ’ intengio de Kant de consideraro estado de natu- reza como um estado jurdico. Por exemplo, onde fala da aqui- sigho provisria no estado de nauureza, apresa-se a dizer que odavia aquelaaquisigho € uma verdadeira aquisigao”(p. 440) = 143 - [Em favor da juridiedade do direto privado e natural, Kant presenta especialmente uma argumentagao que pode ser for- rmulada desta maneia: se no estado de natureza nio exists sem direitos, nio existria 0 dito de obrigar os outos suit desse estado para consituir 0 estado evil e, poranto, este no surgiia. Em outra palavras, para que seja possivelconstituir 0 estado civil como estado juridico € necestirio que esse estado surfa de um direto anterior, que s6 pode ser o deta natural Podem ser apresentados diferentes techos em favor dessa tese 1No mesmo trecho citado ha pouco, aquele da p. 445, apés ter dito que 4 aquisiglo proviséria é uma verdadeina aquisigio, Kant explica que iso depende do fato de que: “E um principio do direito privado, segundo © qual cada um est autorizado a usaraquela coerg20, por meio da qual somente & possvel sar do estado de natureza € entrar no estado civil, que somente & capaz de Fazer esta aquisga0 peremptéia” ‘Mas explica mals clara e amplamente na p. 499: *Se desejisemos, antes da entrada no estado civil, ‘no econhecer como legtiaa alguna aqusico, nem pro visoriamente, aguole mesmo estado, ou sea, 0 esade ck vil, seria impossivel(..) Se (..) no exisisse nem prov sottamente um mew e um feu externos no estado de natureza, ndo existriam nem deveresjuridicos com rela- fo a ele, conseqitentemente no poderia exstir o- mando algum que obrigisse a stir daquele estado," (© que signitica que, om o meu direita constituindo 0 Esta- do para protege de maneira perempt6ria a minha posse, surge Ge Fato que esta posse constitu anteriormente um dieto, Se cu aio tvesse um dlreto sobre as coisas, nem teria © ditcto ~M4- de conservivlas através da proteg20 do Estado, O direlto de ‘obrigar 0s outros a entrar no estado civil é uma conseqincia do fato de que eu tenho odireto de excluir 0s outros da posse de certas coisas; © se direto precede 0 surgimento do Esti- do, pelo fato mesmo de que € 0 seu pressuposto ou condicao. ‘A melhor formulagio dessa argumentagao encontra-se nm tre- cho da p. 437 “Se deve ser juridicamente possivel ter um objeto ex- temo como seu, deve também ser permitide 20 sujeito ‘brigar qualquer outro, com o qual sura contestgio do ‘mew e do few sobre um tal objet, a entrar juntamente com ele numa constiwigio evi (..) Consequentement ‘precisa admit como possivel anteriormente 3 constitu ‘lo chil (ou abstraindo desea constiuiglo) um mew e um feu exterese 20 mesmo tempo um direto de obrigar to- dos aqueles com os quais nds podlemos vir a ter qualquer forma de relagio, a entrar conosco num Estado constitu do, no qual esse mew e esse feu possam ser garantidos." Como se vé, afrmagio da juridicidade do estado de natu- seza serve para fundamentat a juridiidade do estado civil, Aqui se revel a diferenca ente a posicio do jusnaturalisno.e aquela do postivismo que triunfou no inal do século passado © do- rina ainda hoje. Os jusnaturalistas visam a oferecer ao Estado um fundamento juridic e, portanto, so obrigidos a admit a existincia de um estado jurdico anterior 20 Estado; 08 posit- vistas coerentes com seus pressupostos de no reconhecer ou- to dielto a nao ser aquele do Estado podem Fundar © poder do Estado somente na forga ou sea, no fato de que esse po- der existe e 6 capaz de manter-se (o que Kelsen chama o prin- ipo de eftividade). 145 - 3 A Sistemirica po Dimetra Pruyano, O prostena de ua sitematzago riional da ample mata doc prvi havin ido Sculomaio tempo tres de Kant A pare cli, na qual estan food Imntdas a Insti de junio, dvi oda 4 mates Ie ems panes exons esa, clas fee A Prime cacgos acl 3 mata nas ov menos compen Acme to dt de anda de hoje. Asegunds nl to os tes ncn eu) unto ra a om (eo or sou A tec il 0 oon ered 0 lt come fra do seu dct Cera) sa dvi tna sto acl EScmanees tte pr ng empo. Fama Vo lr toda asm sted do del nun ae ob ati Ae De so unter rs prac tn ie 72), co Desens ts cones udamenas a eda, Jo dino {a slag Covspondam 3 iar dlc Ma 0 Tina nto, re es stendcos © nes swat, trea desu coin aap dito ewrenar de ite Inaaao mals morals Ama fans des tenn oh Sto de Lebel; que una obra da ventude, Nua moto “cones dcendaqueurdrudetag Gs, hava esse $d nalconl como sui de elgtncts pri eno ttndolorderfzo faa contapone cn ra or sie ts faded a Conte de qua eae cas pcan eons rents ene Ov se 38 a = 146 - es possesrias, as rolagdes que surgem da injiria, as relagdes contratuas, as relagdessucessérias.O dieito de familia era ge- ralmente considerado pelos jusnaturalitas como uma calego- fia por si mesma, que pertencia ao direto natural soctal, que regula rlagbes no Ambito de uma sociedade e, como ta, era disinto do direito natural individual, que regula relagbes en tue individuos considerados singularmente. Como direlto natu- ral socal, 0 direito de familia estiva no meto entie 0 diet natural propriamente dito ¢ o direto pblico, que ineluia as relages que nascem da constituigio daquela mais alta entre todas as sociedades humanas, que € o Estado. Kant, como se disse, tha 2 inteng2o de elaborar uma teor ‘acional do direc. Um dos peimetos problemas que encontrou foi o de claborar uma sistematizagio racional da matéria do di reto privado que no fosse uma reprodugio da divsto empirca da tradigto. Para elaborar uma sistematizaga0 raconal, precsa- ‘va panic de um conceito indamental da experincisjridica, do ‘qual fosse possvel deduzir as virias panes do sistema. Kant ‘coloca como conceitoFurdamental da experiénca juridica 0 coo ‘eto de passe que ems dustar mais adiante). B observa que, senda. posse o mado de considera algo do mundo extemo como priprio Co mew. o rewexternos), esta pode esa diigida para ues coiss: ou uma coisa compérea fora de mim, ou 0 arbtrio de wm ‘outro ser parecido comigo, ou sea, de uma outra pessoa, ou © status de um outro com relagio a mim. Lease nap. 427 ‘Os objetes externas do meu arbiteio podem ser so mente de és espécies: 1) uma coisa (corparea) fora de ‘mim; 2) o arbirio de um outro com relagio a um todo deserminado (praestato); 31 0 status de um outro com relagio a mim." A primeira rolago inclu a esfera dos divetts reat; a segun- dda, 2 dos diretas pessoas; a terceira, dos direitos de fami. -7- Para estar de acordo com as cateyorias fundamentals do inte= ecto, expostas na Critica da razdo pura, Kant deixa coincidir essas ts relagdes com a5 tts categoria da relagdo, que slo a subsdncia, a causalidade ea reciprocidade. Com isso quer di- 2er que, auma relagio real, possuo a substincia de uma coisa; numa relaglo pessoal, 0 que possuo é a atvidade do outro como causa da minha posse de uma coisa determinada; numa relagio familie (exemplotipico, 0 casamento) eu possuo o status do outto, enguanto 0 outr possui o meu status. Uma outa formulacio dessa tripartgio pode ser lida na p. 44: “Com relagio & matéria (a0 objet) € possvel adqui- sir ow uma coisa corpérea (uma substancia), ou a presta- $A0(a causalidade) de uma outra pessoa, ou ess2 outa pessoa mesma, quer dizer, © seu satus, enquanto eu ob- tenho. direkto de dispor dela (de ter comércio com ela)" ‘A essa tripartigio segundo 2 matérla da posse, Kant faz coresponder uma tripanticio segundo a form ou 0 modo de cexercicio do dito. A posse da coisa coresponde a esfera dos direitos reais. \ posse da prestagio de um outro correspond a cesfera dos direitos pessoas. Finalmente, a posse do satus de lum outro cortesponde 2 nova categori, que Kant se orgulht de ter formulado em primeira mo, dos dietos pessats de na: tureza real (tus realiterpersonale) Com tal clasificacio, Kant pensava ter encontrado uma solusio para sistematizagio da ‘categoria des direitos que tha causado muitos problemas 30s sistemiticos, ou sea, dos dretos de Familia, que ele conside- rava como Uma espécie inermedira entre 05 direitos reais € (0s direitos pessous, enquanto eram pessoais segundo a maté- ria, mas reas segundo a maneira com a qual essa matéria era ‘objeto de tratamento. Substancialmente, cle pensava poder afit- mar que a caractersica dos direitos de Familia podia sr refer dda, contrariamente aos diretas reais, a pessoas, mas podia = 148 ~ possuir pessoas, contrariamente aos direitos pessoas, como coisas. Num outro trecho (p. 458) ele explica que oditcto pes: soal de natueza teal €aquele dreito “que consiste em passuir lum objeto extemo como uma cofsa e em sd-fo como wma ‘pessoa’. Ens outras palavrss, ele nfo 6 nem diteito sobre uma coisa, nem um direito com relagdoa uma pessoa, mas um dire to sobre uma pessoa, © como tal € um direitoalém do direto real e do direito pessoa sea categoria kantina dos direitos pescoaie de natureza real, na qual ele inclufa os direitos de familia, provocou de imediato objegbes. Possui uma pessoa como uma cols no significava realirmaro instituto da eservidio? O que era a pos se de uma pessoa como uma coisa semo 0 dieito do dono Sobre o escravo? E era possvelreduzira relacio, por exemplo, centre marido e mulher, a relagto entre dono e escravo? Essa objeg20 fo! colocada por Friedrich Bonterwerk, que nos Gattinger Gelobren-Anzeigen de 19 de Fevereiro de 1798 fez uma recensio ds Doutrina do dieio, Kant responden com Observagdesexplicatioa sobre os elementas metafisicos da dou rina do dire, publicadas como apéndice a segunda edig20 ‘da Doutrina do direito (1798), que podem ser encontradas na cedigio que estamos examinando (p, 548 ¢ 58). TNessas observasées, ele explica que, se de um ponto de ‘sta racional existem direitos reas e direitos pessoas, sto pos: sveis também as das categorias combinadas dos eto reas cde natureza pessoal © dos direitos pesoass de matureza real. Mas a primeira das duaseategodas combinadas deve ser eli- nada de fato, porque nao € possivel conceber a posse le unit ‘coisa como se Fosse uma pessoa. & sempre possvel,contudo, {que a segunda categoria mio sea entendida no sentido que ‘ostarfamos que Ihe fosse auibuido, ou sea, de um direto de tuatar uma pessoa de todas as maneiras como uma coisa, por ue neste caso voltarfamos 20 reconhecimento do direto do dono sobre 6 escravo, mas:no sentido mais imitado de possuie -149- ‘uma pessoa de modo parecido a uma coisa, ainda que usando como uma pessoa. E explic: *O proprio no significa aqui verdaderamente a _Propriedade da pessoa de wm outro (porque um homem ‘no pode nem ser consierado como um proprietiio de 1 mesmo, tanto menos entio de uma outa pessoa), mas somente 6 direito de usar (ius ten, fruend de imedia- to dessa pessoa comode uma coisa, como de um meio para servic ao meu prépeio fi sem, porém, prjudicar sua personaldade” (pp. 551-552). io parece que essa explicagio, na qual se fala em usar tuma pessoa como coisa, ese de acordo com a definiglo ante- lor (p. 458), na qual se falava em usar a coisa como pessoa; mas € claro de qualquer foema que Kant @ bem consciente do fato de que no direto pessoal de natureza real o objeto da relacio nao perde seu carter de pessoa, nlo se tomna coisa, ‘como ¢ reafimado neste outro tech, que também se encontrs no apéndice: “A definigao do diteto pessoal de natureza real €, de rmaneira breve, mas exala, est: € 0 direito que o homem tem de possuitalém de si, uma outra pessoa como pré- ‘ria, por exemplo a esposa, ou filhos, ou 05 empregi- ‘dos de casa. Digo intencionalmente ums peste no uma ‘coisa, porque € possivel ter como algo que faz parte do ‘que & priprio um outro homem, que por causa de uma livid tenha perdido a sua personalidade (sia eservo), ‘mas aqui ndo se rata dese diretto reat” (pp. 550-55). E perfetamente claro que o direito do dono sobre o escravo ‘io difere absolutamente do dircita real. Se a categoria dos d- reitos pessonis de natureza real difere da dos diets reas, & = 150- eatamente porque © homem, objeto dessa espécle panicular de posse, usa como coisa (ol sje, na totaidade ds suas pres- lagGes € no somente, como acontece nos direitos pessoais, segundo uma prestacio determinada), mas sempre dentro dos limites do respeto da sua personalidad. Deve-se ainda acrescentar, para completa a expos ‘1 tripanigto do direto privado, que Kant faz comresponder 2 cada uma das és categoras um ttlo diverso de aquisigo. ‘Ao dieito real coresponde a aquisigio segundo 0 ato do arbi trio de tm intea, ou fact, 20 direlto pessoal, a aqusigio se ‘undo 0 ato do arbitrio de dots, ou pacto, a0 dito pessoal de natureza rea, a aqusigao segundo o ato do arbisio de todos (emende-se por tolos a toalidade dos membros de uma deter ‘minada sociedad, ou lege. Ess ts formas diferentes de aqui- siglo serio mais bem analisadas quando falaemos paniculse ‘mente dos institutes, io des -151- O Meu eo Ti u EXTERNOS OD rein robes sue apres pan Kot, ma ante do do privdo 0 que pode se fomaulado com tis peng: que ented ands doemes qe oma cok {3 ¢ minba? gue dingo una oa que ¢ minba de una ois que ¢ ta ante on gurao do problems de ‘mew o evento, pan nia usc tun ome teu sb 0 pono de vita do deo (ue € de ftoa reg dat Aste eater do homer). Bem outs pala, © pele tm do qu nines pasn-uina clin, sar ta sitaiao de posted una ota ented otro os’ em tenis fenerico, emo wri), Kant de ato Hein» poem So meu cdo teu extenos como o problema da posse one ster, port, a pose como oconcelo prnd exper faci jira, hexpenniardcansce no momen em Gees pono due que eno igo do mundo eto com thy ue pum igo ia wade, o problema fete 20 qual Kant se enconta ¢ ampleament hf dnos, 0 problema do dito sue ‘0.0 pole do eho spo ¢ clea por melo der pent gus gnc fr dato. Ganado Kan pr Bonen meno oie sige te sigo de me, clos © theo problema quem fra moana ao fe pean © Ge deve entender or drctowbpso, © que ¢ mex (ene. de desman) © te dingo do teu e fo aul sobre © gil cu nko tm Sct, Tombem 0 gue Kant ua ~152- ‘como ‘posse’ é una expressio genérica que podemos muito ‘bem substiuir pela palavra ‘ireito™. Onde Kant fala de posse de uma coist, ou de uma prestagto, ou de um status, dia- ‘mos melhor: dizeto a uma coisa, direto a uma prestagio, di ‘Que se entende por ‘direito subjetvo? A nogto de diekto subjetivo ¢ das mais controveridas. Nuo temos aqui a preten Slo de examinéla profundamente, Digamos somente que, 2 nosso ver, na nogio de dire subjetvo esto inculdas duas nogbes diversas que se integram: a nogio de faculdade, enten- ‘dkda como liberdade de fazer ou no fazer, ou come liberdade fot esfera de permissio, opasta as esferus do abrgatério € do proibido, ou ainda como liberdade em sentido negativo (ber- dade como mo-impedimento};¢ a nogio de poder, entendida como capacidade efetiva de exercer minha liberdade contra ‘qualquer um que © queita impedir, ou liberdade em sentido positivo, Quando eu digo que uma coisa é jurdcamente mi- ‘ha, quero dizer que tenho, sobre aquela coisa, una Faculdade ‘ou mais faculdades (por exemplo, usuruit dela, illzay, dis pone juntamente também um poder, ue consist no uso legi- {imo da forga (no impora se essa fora sea minha ov do Esta- do) para rejeitar qualquer tenatva de limita ou anulae 2 miohsa ibetdade, Com 850 quero dizer que nao exise diferenca algu- sma. de relevo entre os problemas que colocamds tratando do dliceitosubjetivo e aquees que Kant enftentafalando do meu do tu extemos, Para dizer a verdade, encontram-se trésdefinigbes, substan- cialmente no- rior a8 duas partes, € 2 Unica a poder garantir a elevagao da relagio sexual do nivel natural e animal para 0 nivel raciona, fundando assim a idissolubilidade Segundo Kani, que 0 cas mento tenha que se indissolGvel para corresponder aos prin cipios racionas do dirito resulta, na defnigZo cad, das pa lavras ‘durante vida jnteifa’. E 2 indssolubilidade no pode ser deduzida, a 0 ser por ums ll universal, qual os cOnju- 'e5 sto obrigados como seres racionais que submetem seus petites 20s principios da razio, Em segundo hug, também o casamento obedece a0 critrio geralcolocado por Kant para define qualquer espécie de rela- So jurdiea, of sj, ao extrio da passe. Por isso ele define também o easamento como uma posse, Tratando-se de um ins tituto do diteto pessoal de natureza real, essa posse deve ter como objetivo mio uma presagio individual, mas um statu, fuse, um conjunto de prestagbes derivantes de uma sitvaglo determina, como resulta da definicio. Segundo Kant, a pro- ‘va do lito de que o cnjuge tem com relagdo a0 outro éBnjuge lum dlceito de natureza real & dada pelo fata de que, se 0 outro cOnjuge foge ou se entrega & posse de uma outra pessoa, ele temo direto “em qualquer momento e deforma incontestivel de reconduzi-lo ao seu poder como uma coisa” (p. 460), Finalmente, 0 casamenta implica, como resulta também da definigio, uma eelagio reesprocalali-se de fato de ‘posse rece ~178- roca. © que significa que essa posse distingue-se de qual- quer outra forma de posse, no somente segundo a matéra, mas também segundo o cariter formal da eeciprocidade. Esse ‘ariter da reciprocidade € imporante, porque impede 0 casi ‘mento de ser uma felagio degradante. O raciocinio de Kant pode ser interpretado e desenvolvido dessa maneira: se um ‘Snjuge possusse 0 outro sem reciprocidade, © outro sera duzido a coisa, o que € contrtio 2 lei moral que prescreve respetar 0s outros como pessoas; mas, e existe reciprocida- de, isso significa que, 20 mesma tempo que o primeito poss © segundo, © segundo possui 0 primeieo; e entdo o segundo, possuindo por sua vez 0 primero, livase do seu ser [cosa € age como pessoa, Sela possvel dizer entto que cada um dos dole 6 colza enquanto possuida, mas pessoa enguante posse Se somente um fosse 0 possuidor do outro, existiiam na ela- (o uma pessoa e uma colss, mas uma vez que ambos, por feito da reciprocidade da relago, sto possuidores,livam-se dda sua posigio de coisas e, encontrando-se si mesmos na posse do obtro, estabelecem novamente & pr6pria personali- dade. Pelo mesmo motivo Kant pensa que a relaco conjugal deve ser fundamentada na igualdade, tanto das pessoas dos cBnjuges quanto dos bens: e disso deduz a iicekdade (enten- de-se sob 0 ponto de visa do direto racional) da poligaria © ‘afemagao de que somente 0 casamento monogdmico est em conformidade com a raz30, -179- 9 ‘ORMAS ANOMALAS DE. Aguisicio CAACSEPeeoeeeoe He eRaE SE SOSHIESREEEEa step ee cgeeesinptneniepeeeteerearrectsoenaee has fons digas Sim, tay de agi, a ia Kanna ps de apne, a fomas dee po danas annals pogue se trent, por vcs fetes, aque qu fot dese como aqugo wal force Scns ao aio a aarp dew oo Ea has formas snomaas de aqigo sto charade ot Kan te de aus ale a curs de au conitonada Kant fala sob o titulo de segto episédica, ‘quase deixando entender que se trata de algo estranho a mat fa, de acidental, de acesséro, ou seja, de um episédio com relagio Aquilo qe 6, em si o enredo completo do conto. Kant define assim a aquisicao ideal “Eu chamo de ideal a aquisiga0 que no admite cau salidade alguma dependente do tempo € que, conse- aqueentemente, tem como fundamento uma idea sim- ples da razao pura. Apesar disso, ela & uma aquisicio verdadeira eo imagindea, nao sendo chamada de real unicamente porque © ato de aquisicio nao é empirico”(p. 475). = 180- Para entender o que Kant pretende, precisa-e compreender ‘qual € a forma de aquisigao qual ele se contrapse, falando de aquisigi ideal, diferente da normal. Peovavelmente ele se con- tape 2 que chamou de aquisicio derivada, incluida na se: funda parte do direto privado, ou sei, nos dieitos pessoais: inde se tratava de uma aquisigo que derivava do direto de uma outra pessoa, quc tna entio como tla justiicativo um ireito de outrem. Existem casos nos quais € possvel falar de aquisigio sem que sejt possivel dizer, no sentido proprio da palaves, que exist um outro, Trata-se entio no mais de uma aquisigio que pode ser jstifcada, no havendo um ovteo, somente com base numa lei ds nizio, ou sea, de mancira pura mente ideal, porque nao tem substincia empiric, € vazio de contetido, nem emerge de relagdes observiveis pelos sentido. Kant dé ts exemplos dessa aquisico ideal cedutiveis porém dois, sendo o terceito muito semelhante a0 segundo. Esses dois casos si0 a precricdoe 2 sucessao, No primel aso, 0 suite adquire de um outro que ainda nio existe; no segundo «aso acquire de um outro que nio existe mais, ou sja,cessou de existe. Eis como Kant se exprime, na p. 475: "(.) porque o sujekto adquie de um outro, que ou ‘ainda ndo existe do qual se admte somente 4 possibil- dade de existneia), ou que de fato cess de existe, que rndo existe mais; consequestemente, a passagem para a posse & uma simples idk pritiea a azo.” ara diferencia ciaramente esses dois casos, vamos admit que, na aqusigao real ou normal, o outro seja um sujeko que tem dois arbutos Fundamentais, a existéncia fica e a existe ca juridica, Nos dois casos andmalos de aquisigio acontece uma dissociagio entre exstenca Fisica e exsténcia rica: na prescricao podemos muito bem admiie a existéncia fisiea do =181- ‘outro como verdadeito titular do direito sobre aquela coisa {que eu possuo por longo tempo, mas deve-se exclu a sua cexstencajurdica, porque ele no fa. valer 0 seu dieito, por: ‘antonio pode ser considerado sujeto juridico; no cas0 da sucessio, inversamente, tem-se 4 stuagdo contri, ov seja, adquire-se de um sujeto, o testador, © qual subsite jurdiea- ‘mente, uma ver que a sua vontade val além da sua vida fii, ‘mas no existe mais Fiscamente, por causs da morte, Nesses dois casos, falando um dos dots atibutes do outo sujeto, io € possvel falar de uma verdadeia relagio entre dais sujei- tos, como no caso da aquiscdo real. Nesse sentido sio dois ‘casos an6malos, ainda que inversos a sua anomalia. O nome eles atribuido de formas de aquistcao Ideal explica-se pee ato {de que em ambos os casos no € possivel falar de um encontro real de vontade, fatando algumas dis condigdes pelas quais ese enconta possa acontecer: pars jasifcar a transmisso de tum dizeto de uma pessoa para outra nesses dois casos extrioe iniris € preciso supor ums tontade ideal, independente das condigBes empiricas de espago e de tempo as quas se realiza. Se levisemos em conta as condigbes empiricas, no sera poss vel falar de uma verdadeiea aquisgio Sem dvida, © caso mais importante € 6 da sucessio ou da hheranca @. qual € possvelreduair o terceiro caso, que € 0 die reito de deixar uma boa.reputacio apés.a morte), O problem dda sucessio havia sido watado longamente pelos jusnatura Tistas. Para esses, que buscavam as justificagBes ideas ou racio~ ‘ais, € io posiivas, de um insttuto juriico, 0 problema da sucessao devia apresentar um incerese particle. Quem se l- rita a buscar a justiicagao de um insttto juriico no dreto posivo nio faré mais do que buscar uma lel vigente que, pot cexemplo, autorize 05 sujeitos dotados de requisits particula- res 4 fazer testamento: poderd dizer ent, se esta let existe, Aue 0 fato de fazer testamento ¢ um ao juriicamente justifies do, portant, vido, Para quem, 20 iavés, renuncie ao ordena- = 182- mento posiivo, como faz de fato um jusnaturlisa, o problema buscar nio uma justiieagdo posiiva e bistrice do testamen- to, mas ideal € racional, ou sea, 0 fundamento do poder, de ‘um titular de direito, em transmitlo nfo somente durante mas também apés a sua vida, quando entio, como sujet Fisica, no existe mais. Foram tes as solugbestpicas dadas a0 pro- blema do fundamento da sucessio pelos te6xcos do direto patural 1. Teoria do contratualiomo ou do voluntarismo, © funda smento do poder de fazer testamento reside na vontade do sujeto. A sucesso seria entio um instuto de diteto natural voluntirio, Essa tse € sustentada, por exemplo, or Grotus. © testamento é equiparado a uma verdadel ‘alienagio dos proprios bens e €vilide quando relacio- nado com a vontade do testador. A isso € possivel acres- centar, ¢ Grotius 0 deixa entender, que a sucessio rdo-estamentiria pode esta fundamentada auma pre- sunglo de vontade, ou seja, numa voniade ticita. © fan- ddamento pelo qual os filhos herdam do pai, sem que tenha existido um ato explicto de vontade nem um ato ide vontade contrria, é 4 presunsio tiita de que © pal ej favorivel a tal wansmissao. 2. Teoria do publicismo, Segundo essa teoris, susentada pot ‘exemplo por Puffendod, a sucesso testamentiria nio pode ser justiicada de mancira naturalist; a testamento um insituto de direto pablico surpido exclusivamente dda voniade do Estado, ou seja, de rizdes de cariter pol tico, que sio para um jusnaturalisa razdes histories contingentes, empiricas, Nao existe nenhuma razio na tural, acional, que justifique a sucesso testament: € (© Estado que, por motivos de ordem, de seguranga, de paz e de garanta da liberdade indvidval dispOe dessa 183 - rmancira.O que leva 8 conseatiéncia que se deve admitie. 0 poder testimentitio somente se aquele Estado deter rminado 0 reconhece. 3, Teoria naturalisa, Segundo essa teoria, que deriva dos escrito juridicos de Locke, a sucessio hereditiia € uma consequéncia natural da propriedade: como vimos, 3 propriedade, para Locke, € um direito natural que nasce {do trabalho. Desse trabalho Se origina um patrimsnio {que tem um valor econdmico, que & justo que nilo per- smanega sem titular: esse pawiménio, segundo uma justi- ficacao natural e ricional, no pode ser destruido; por- tanto, com a more do stular nao deve votarapropriedade ‘comum (como acontecers se no fosse admitida a suces- ‘slo), mas € nevessiro que aparega urn novo tur. Mas _quem pode ser esse novo titular? Como € posiveldedu- ir da lei natural, que prescreve a0s pais educate ali- rmentaro$ ios até 0 momento em que eles se tornem independentes, que o titular natural do parimenio fam liar deva ser somence aquele que tem direitos naturais com relasi0 20 pai, ou sea, 0 filho, Sem inteoduzir nem ato de vontade, nem contato, nem a intervengto do Es- tado, Locke tenta explicit o Instiuto da sucessio como fundamento na propria natureza das relagdes entre 0 sujeito ©. coisa e entre 0 sueito os seus descendents. Dessas ts teorts, Kant adotaa primeira, ou sea, a teria do voluntarismo: mas exatamente por isso ele se encontra fen= te 20 obsticulo de explicar como acontece 0 encontro entre vontade do testador © a do herdeiro. Quando o testador ex- pressa a sua vontade no testamento, 2 outea, ou sj, a do her- iro, no existe ainda; quando existe a vontade desse citimo, ‘do prime nao existe mais. Kant procurou sai dessa ificul dade formulando a hipétese de uma aquisicao ideal, anda, = 184 — ‘que acontece independentemente do encontro das vontades, ¢ portnto de um encontro meramentc ideal de desejos. O mode- lo de fusto simoltdnea das duas vontades, caracerstico da aqui- sielo real, lo acontece na sucesso testament no existe femio pode existe a vontade comum, da qual flamos no capi- twlo 7 desta parte. E poranto a aquisiclo ideal é justiicada ‘unicamene pela razio,e no pela experiencia (© outro caso de aguisigio andmala € o que Kant chama de subyeuwamentecondicionada,cyja anomalia & completamente diferente da analisada na sucessio. No primeito e280, trata-se ‘de um insttuto sempre justiicivel naturalmente, ou sj, inde- Pendentemente do direito postivo, ainda que nao aconte- ‘gam todas as condigbes essencials dos instiutos normais, mo- tivo pelo qual € exato defini-los como anormais. No segundo ‘aso no acontece mais uma oposigio no Ambito do direito natural, mas uma aposigo entre direto naturale diretopast- 29, Tralase entao de casos que, embora com base na justin natural devessem fer uma solugio determinada, no Ambito do direto postivo encontram uma solugio diversa ou anttética, |Aanomallacoasiste, poranto, numa intromissio do dieito po- sitvo, que mxifiea as condigdesideais do dieito natural, Kant fala de aquisigdes condicionadas subjetivamente, pois © que determina essa intromissio ov modifiagio 0 ponto de vista subjtvo do juiz que € chamado a decidir. © juiz, segundo cer tas razdes priticas relacionadas com o modo de acminstar 2 justga, no pode levar em conta todos os elementos do institi- to examinado, asim como os presereve 0 direto natural, mas precisa introduzit algumas modifiacées, ou sea, modifis-o subjetivamente. Eis 2s palavras de Kant: “A questio, portato, nto ¢ somente de saber 0 que € {sto em si ou sea, conto cada homem deve jug por si rmesino, mas.o que¢ justo frente auum inbunal, ou Se, 0 que € de diteto”(p. 482) ~ 185 Kant ita quatro casos de aqusiglo condicionada subjetiva- mente, nos quais 8 justiga disinbutia, que vige nas eelagoes cenire © Estado © 08 individuos, no coincide com a justica comutativa, que vige nas relagdes pevadas de direto natural (© deal seria que a justiga disinbutiva coincdisse com a ccomutativa, mas isso ndo € sempre possivel (€ aio por causa de um arbliio do Estado, mas por necessklade). Os quatro casos sio: "1, © contrato de doacao (pactum donationi9; 2. 0 ‘contrato de présito commodatum); 3. recuperagao ou revindicagao sndicatio) 40 juramentosuramentun) (482). Assnalemos brevemente dots deles, Na doapdo, aquete que doa, segundo o direito natural, sendo 0 danativo um ato gra- tito, mio deve manter a propria promessa de mancia coerct- va, Ou sea, cumprir a obrigagdo que assumi com relago 40 donatério: motivo pelo qual a dougie nio dé origem a uma verdadeira obrigaeio juridica (a tus stricum) que possa valer por meio da fore do Estado, No diet posivo ao inves, aquele ‘que promete doar deve obrigatorlamente cumprir a sua pro- ‘mess, raz4o pela qual sem justos moxivos mio pode revogar doasio, O que leva 0 legslador posiivo a modiiear 0 dito natural é um motivo de seguranga na jristigao, Resta ofato de ‘que a relaglo de doarao no dizcto postive é diferente daque- la que tem lugar no direito natural. Dos easos acima mencionados © mais interessante € aquele do furamento, corn rlacao a0 qual Kant considera duas vi- das. Segundo ele, o juramento nao é um instiuro de diteto ratural por dois metivos: 1) Posco eu se obrigadoa dizer a verdade, a jurar sob ameas ‘2 de uma sangio que prowém de uma poténcia externa? = 186 - Isto 6, pode uma forga externa me obsgar a dizer exter: rhamente 0 que nio quero dizeP Sendo o juramento deri- vado de uma superstigao, pode ser usado como instru mento de justice? 2) E necessrio acreditar em quem jurou? A primeira perplexidade diz espeto a0 dever de quem jua, 4 segunda diz respeito 20 dever da pessca em vantagem da ‘qual 0 juramento € feito. Kant, porunto, pens que nao seja possivel demonstrar nem um dever natural de jurae nem ui ever natural de acreditar num juramento. Mas o juramento & um Instituto de diceto postvo. © que significa mais uma vez {que nem sempre odirelto postivo coincide com o dreito natu- ‘al. O diteto postivo tem as suas propria razdes, que 0 dre ‘o natural nio conhece. Eis como o juramento pode ser jusifi- «ado pelo juiz: *atas com relaezo a um tnbunal, sempre no estado ce vil, se admiimos que nao existe em cers exs0s nenhum ‘outro meio para conseguir descobrira verdade a nio ser 0 juramento, deve ser pressuposto que cada um tenha uma religito, para poder usi-ls como meio extremo (in ease necesitatis) 2 servigo do procedimento judicitio frente um trbunal, 0 qual considera uma tal obrigacio espie: tual (lotura spiritual) como meio mais tipido e mais correspondente & tendéneia do homem para a supers 80, para descobrir 0 que estl escondido; motivo pelo ‘ual ele pense estar autorizado a usi-o" (p. 490). = 187- IV O Sistema po Direrro POBLICO INTERNO E_ EXTERNO NO PENSAMENTO DE Kant 1 A PassaceM po Estapo bE Narureza pana 0 Estano Cn. valquer que seja a forma pela qual e entenda o estado de naStieza de Kant, sea como estado nao urdico, sea como estado jurdico (vei © capitulo 2 da pare I), & certo que, sem do um estado provisio, deve levar 20 estado civil. Trata-se agora de ver como acontece essa passagem, ou melhor, ess transformacio, Na parte introdutGea vimos que as eoras do jusnaturalismo podem dividir-se, segundo a solucio dada a esse problema, fem dois grandes grupos: 1D & passage do estado de natuteza para o estado civil pode acontecer somente com wm toil eliminagdo do primeira no segundo, razto pela qual, nascendo da com- peta alienaso dos direitos natursis para a autoridade do Estado, & um estado sbsolutamente novo (Hobbes, Rousseau); 2) a passagem do esado de natureza para 0 estado civil ‘io admite 8 climinagio do estado de natureza, mas 2 ‘sua conseroagdo; pelo contririo, o estado evil € aquele estado que deve de fato possibiliar © exercicio dos di reltos naturals aavés da organizacio da coacio, motivo pelo qual nio € mais um estado completamente novo, ~191- mas 6, deve ser, tanto quanto possivel, andlogo a0 esa ddo de natureza,¢ inclusive € tanto mais perfeto quanto mais numerosos Sto 0$ direitos naturis que consegue salvaguardar (Locke), estas duas posigbes, 2 aceta por Kant ¢ seguramente a segunda. O que signifies que, enze posigio raconal e mode- sada, Kant opta pela moderada. & inclusive a segunda posicio, ‘no a primela, que € prépria concepeao liberal do Estado, E Kant, apesar de algumas influéncias recebidas de Rousseau, ‘como veremes, permanece substancalmente um eseitor libe- ‘al, na linha do pensamento liberal que forma a conceps2o politica do uminismo, 2 qual ele se ajusta e da qual & um dos tecricas mais coerentes. De fato, se Kant svesse aderido A pe meira concepsio, no feria podido reafimar, como vimos no ‘capitulo 1 da pare Il, distingio entre o direto privado © 0 diteito pablico, que perde, ao invés, qualquer valor para Hobbes e Rousseau. 0 direto privado, segundo Kant, no deve desaparecer no direito pablo, mas deve usufruir de garantias ‘que nao pode ter no estado de natureza. O estado civil nasce rnlo para anular © direito natural, mas para possibilitar seu exercicio através da coagao. © direito estatal € 0 natural nao estio numa relagio de antitese, mas de integragdo. O que muda na passagem no é a substincia, mas a forma, no é, pportanto, © conterido da regrao qual somente a razio pode dita), mas o modo de fazé-la valer mesmo quando Kant Indica como provisério 0 esto de natureza e como peremp- ‘rio o estado civil, indica claramente que a modifiagao, aia- dda que importante, nio é substancial, mas formal. Seri pos sivel dizer que, apés a constituigao do estado cli, 0 diteto toma-se formalmente plblico, ainda que continue sendo subs- tanclalmente privado, ou sej, natural, O Estado nfo modifica C5 principals institutos do direto privado que surgiram nas relagoes entee os individuos no estado de matureza, como a = 192- propriedade, 0 contrato com suas principals espécies, a su- fessto, Limitase @ garantie 0 exercicio substituindo a forga coletiva e imparcial pela forca individual, naturalmente pat= cial & possve falar também, segundo essa concepeio, de wma verdadeira recepeio do direto privado, entendido como diei- to natura, no dieito esta, ¢ Finalmente do direto posivo ‘como direta natural + coagao ‘Com relagio a esse ponto, existe um trecho de Kant que deixa dividas, Apes ter dstinguido o dirt privado do pal 9, precisa Este (ou sea, 0 direto pablico) nao incu nada mais ‘08 nto inclui outros deveres dos homens entre sia no ‘ser 08 que podem ser pensados no primeieo (ou sea, no dlireito privado); a matéra do dieito privado€ igual em ‘ambos os caso. As les do direlto pblico dizem respeito, portanto, somente a forma juridica de unio dos homens entre si (sua conatituigho), com relacio a qual essas leis devem ser pensadas necessaramente como pabli- cas" (p. 493) Pode-se citar também um trecho de uma importante carta de Kant dirgida @ Heinrich jung-Stiling (1789), na qual faz uma ‘exposiglo sinttca e muito eficaz da sua teora jridica (essa cata est reproduzida na antologis kantana de Mesker ctada 10 “Preficio")-E comer assim: 0 principio essencial supremo da legstag civil r= alizar 0 direto natural dos homens que, no statu natural (ou seja, antes da unio civil), € uma mera idéia, ou cj, de submetélo a normas gerais pablicas acompa- inhadas por coagio adequada, com base nas quais pos $a ser garantido ou procurado pura cada um diteito pré- prio" (p. 195), = 193 - [No capitulo 2 da pare Ill vimes que, no estado de nature, juridicamente provis6rio, surge, exatamente por causa dessa Stwagio provissna, um direto, por pare do individuo, a obr- ‘ar 08 outros a entrar no estado civil Tratase de ver, agora, por que surgi esse ditekto e, paralelamente, 0 dever de cons: tuir 0 estado civil, A tese de Kant € que, sendo o estado de natureza provis6rio, & um estado que deve necessariamente ‘cessar, emt outras palavas, est implica na sua prépria natu teza de estado provis6rio a necessidade da transformaga0. 0 fato de querer permanecer num estado provsério, consciente mente da sia reconhecida situagio proviséra, acabarla Levan do, a0 final, 2 uma injstiga permanente, Leiase com rela a fsx0 0 techo da p. 494 “Na intengio de estar © permanecer nesse estado de libetdade desenfreads, sem nenhuma le externa, 0 ho- mens nio realizam injustica alguma uns contra 0s ou tos (..; mas em ger eles realizam uma injustiga no nivel maximo, no fato de querer estar e permanecer num estado que nio ¢ juridio, no qual entio ninguém esti seguro do seu contea a prepoténcia dos outros.” B ainda a p. 498 ‘Conseqientemente, a primeira coist que devemos admit, se n20 queremos renunciae a todo conceto de direto, 64 proposigio fundamental: 0 homem deve sair cdo estado de natureza, ao qual cada wm segue 0s capri- ‘hos da propria fantasia, e unirse a todas os outros(com ‘os quas ele no pode evita de se encontrar em relacio ‘eciproca) submetendo-se a uma coagio externa publica mente legal (J, ou seja, que cada um deve, antes de ‘mals nada, entrar num estado ctl” = 194 = Fca claro, poranto, que para Kant a passagem do estado de natureza part o estado civil € um dever para 6 homem: o que, ‘em outros tesmos, significa que a consttigio do Estado no & rem wm capricho nem uma necessidade natural, mas uma ex ‘gencia moral. Kant chama esse dever de constiulr 0 Estado de (postulado do direto publica o formula des maneirs Do direto peivado no estado natural surge agora 0 postulado do dieito piblico: toed deve, com base na re- Tago de coexsténcia que se estabelece inevitavelmente entre vocé ¢ 0s outros homens, sar do estado de nature ‘24 para entrar num estado furidco, ov sea, um estado de justia distibutiva® (p. 493). © conteddo desse postulado do direto pablico permite ‘indicat uma clara diferenca entre Kant e os outtos jusnaturae listas.Vimos que Kant segue Locke no que diz espeito& solu- ‘gio do problema da relagao entre direito natural e diteto positive. Mas 0 distingue de Locke o fato de que, para este uldmo, a passagem do estado de natureza para o estado civil acontece por motivos de ulidade, & poranto segundo um c’lculo interessado (o estado de natureza sendo considerado de fato como um estado incémodo e prejudicial), enquanto para Kant essa mesma passagem deve ser realizada para obe- decer a wma let moral. Os outros jusnaturlistas evidencia- vam especialmente as desvantagens do estado de natureza, Kant, pelo contstio, © considers essencialmente como um estado injust. Seria posivel ainda discutir seo deverde constitur 0 esta- do eivil tenha que ser considerado como moral ou somente como juridico, ou sea, se € uma aco boa por si mesma, de smaneiraincondicional, ou uma agio boa para aleangar um fim eterminado. Do que & possivel derivar dos trechos cada anteriormente, parece que Kant entende esse dever como um = 195~ dever moral, que, como tal, decorte de um imperaivo catep6ri- co. E possivel confimar isso num trecho de uma obra menos, ‘mas muito interessante para 08 nosso fins que teremos Ou tras oportunidades de citar: Sobre o dito comm. (encontra-se 1a nossa edigdo dos eseritos kantianos as pp. 237-283) “unio de muitos para qualquer fim comum (.) € en contrada em qualquer pacto Socal: nas uma unio qe sea fiw em si mesma Tin que cada um deve? e que poranto ‘constitu 0 primeiro dover incondicionalde qualquer rela ‘to extema dos homens em gerl (.) éencontrada somen te numa Sociedade que esta no estado civ, ou sia, & pont de constiu-se em um corpo comum, © fim que em {al rela externa € dever em of, ¢ & trbémn a suprema ong formal.) de todos 0s outros deveresextros, 60 direito dos homens a se consiuirem sob o impétio de leis pris coercitsas, segundo as quatspossa ser reconheci- do para cada um o Seu ecada um possa ser garantido con- tea qualquer steno por pane dos outros" (p. 253). Portanto, 0 ato de entrar no estado evil para que a pr6pria liberdade possa coexisie com a dos outros, ou seja, para atuar © principio jurdico Fundamental, € um dever moral, uma vez ‘que € agdo que visa a mo sasfazer intereses ou evitar pele 20s, as alcangar um estado de justia que suprime o estado de natureza,injusto © moral. Para esclarecer como o imperat- vo prescinde de qualquer fnalidade externa e em particular da Felicidade, pode-se ler nda o techo seguinte na p. 254: “Mas o conceito de um dieitoexterno em geral dei- va inteiramente do conceito de liberdade nas relagbes ‘externas dos homens entre si € no tem nada a ver com © fim que fodos os homens tém naturalmente (a busca ‘a Felicidade) e com a preserigao dos meios para conse- 196 - guilo; de manelea que esse fim sitimo (de Felicidade) ‘nto deve absolutamente entrar naquela lel como mati- vo determinante Bum pouco mais adiante: “Com relagio a felicidad, porque cada um a ident ‘22 com aquilo que desej,o§ homens a imaginam de mancira diversa ¢ sua vontade nao pode ser reduzida a qualquer peincpio comum, e portanto lei extema algu- sma deve concilarse com a lberdade de cada um." A felicidad, como veremos melhor adiante, & um fim que deve prescindi totalmente da consituigto do Estado, porque (0 que pode estabelecer a vontade comum & pura e simples- mente 0 ato de que a minha liberdade pode coexistir com a dos outros, € nto que cada um seja feliz. Cada indiwiduo é 0 {inico frbiteo da propria fliidade: 0 Estado nao pode obrigar (0s individuos a ser felizes segundo as suas dietizes, porque a Felicidade € coisa individval, que depende da faculdade de desejar de cada urn; mas deve simplesmente atuar de maneira ‘que individuo possa realizar a propria Felicidade como achar melhor, sem impedimentos extenos ¢ no Ambito da liberdade pessoal 0 fato de que o dever de coastuiro Estado seja um dever moral nto quer dizer que nio possa levar também a um de- ver juridico, Como vimos, com relacto 2 distingzo entre di reito e moral, os deveresjuridicos distinguemse dos deveres ‘moms no pelo conteddo, mas pela forma. Quando assumo a responsabiidade de impor um dever moral através da fore, sei antecipadamente que aqueles que Io adequarsse & le, rio segundo o respeito ao dever, mas somente porque obsiga- dos, realzario uma ago que nao é mais moral, mas somente legal. Uma vez que no estado natural de injustica surge um -197- direio a obrigar os outros a entrar no estado civil, para aque les que se submctem & minha coerso no porque intimarente convencides da bondade absoluts da aco, mas somente ce- ddendo frente 3 fora, o dever de entrar no estado il nao um ever moral, mas somente legal 198 - 2 A Teoria Do Contrato Onicrninro A\ passage do ead de nities part 0 etd acomec senda Fa, por to de um contrat onda Ns ache de dou do coneatno at vet revels ss legis com 0 mtn tonal “i er ue vn odor einen concede ttnas prea conto do bdo snd uc open Sreutalagio doe amenen mes cise cs Eat lst Stree opr se ete cn rig See prenoopialo cao ap. 28 “Existe, portato, um contrato angina, que & 0 Gn ‘ono qual pode ser Fundamentada uma constiuigio c- vil universalmentejurdica entre os homens e constitu ‘da uma comunidade." ara os jusnaturalistas esse contato era, ou pelo menos ten dla ser, um fatobistoricoacontecido num certo momento da fevolugae dos homens, Segundo Kant, 0 invés,¢ aqui aconte ce a transavaiaglo racional, esse conrato no & um to histé- ‘ico, mas € uma idéia da razdo, um principio ideal que deve servi para justifcaga0 racional do Estado. Kant nao acredita no mito do contato socal efeivamente ‘estipulado entre os homens para dar origem a0 Estado: 0 con- testo origindrio & para ele pura e simplesmente um ideal do =19- {qual se deve tra justifcagto da passagem do estado de natu- reza para o estado cil Nap. 262 encontrase ese trecho oposto os jusnaturalsas: “Mas esse contrato (chamado contractus orignarius ‘ou pactum social), como unio de todas as vortades pariculares e privadas de um povo numa vontade co- rum e pablica (para os fins de una legislagao simples mente jurgica), mo € necessirio pressupé-lo como um fata (coma tal nem seri possveD, como se, para que ‘hos considerissemos ligades a uma constcuiglo civil estabelecida,fosse necessiro primeito ser demonsirado pela histéria que um pove (cujos direitos e cujs obsiga- 965 nds, como descendentes, teriamos herdado) preci- sasse uma vez er cumprido realmente um fl ato e pre csasse ter deixado para nés testemunho escrito © oral Esce contrto é, pelo contritio, uma simples idéia da razdo, mas que tem sem dvida a sua realidade (pré- pia): ou sea, a sua realidade consste em obrigar cada legislador a fazer leis como se estas proisassem derioar dda vontade comu de todo um povoe er considerar cada sido, uma vex que quer ser cidado, como see esse dado o seu consenso para uma tal vontade™ Results claro desse recho que 0 conirato social, para Kant, ‘nto € um fato hstrico, mas um ideal da razio. Que significa cess transformacio da doutrina tradicional Significa que 0 ES- ‘ado nao € de fato fundamentado no consenso, mas deve estar fundamentado no consenso, ainda que de fato tena se orig nado da fore. Significa, em outas palavas, que © consenso é lum ideal a que o Estado deve visa, € uma exigéncia ra qual ‘qualquer Estado deve inspirar-se, No ¢ um acontecimenton ‘empirico, mas um ideal racional que, enquanto tal, wale inde: pendentemente da experiéncia, = 200- antiga a questio se verdadelamente os jusnaturalistas anteriores a Kant teriam considerado 0 contrato social como ‘um fato histérico, Essa questi ligase a uma outra antiga dis- puta: se 0s mesmos jusnaturalists teriam considerado que 0 cesado de natureza exis hiswricamente Pergunta'se: 6 possivel que os jusnaturalistas fossem tio ingénuos em acreditar que o estado de satureza, ou seja, um estado no qual os homens teriam vivido isolados ¢ fora de ‘qualquer lei, tivesse realmente exist? Os jusnatualistas, para dizer a verdade, nfo eram Go inginuos. Tome-se, por texemplo, Hobbes: geralmente se supde nio levar em conta ‘que Hobbes distingue um estado natural puro, ou seja, aque le no qual sconteceria o bellum ommium contra omnes, do estado de natureza limitado, ov seja, o estado de natureza ‘Que subsiste de maneiralimitada com relagao 2 cenas rela- ‘805 © & cerlas stuagbes, Como, or exemplo, entre gentes rhuma sociedade primitiva ou entre estados soberanos na co munidade internacional, ou também proviséria ¢ acidental: mente entre simples indviduos que um naufrgiojogue numa ‘tha deserts. Somente este sogundo estado de natureza & de fato um estado histérico. © primeico, pelo contrtio, € um estado puramente Imagindrio, colocado como uma simples hipétese, que vale para mostrar as conseqiencis sasuports- veis que aconteceriam se 05 homens seguissem os instintos naturais. A distinglo, somente mencionada por Hobbes, € cexplcitada por Pulfendor,cujo pensimento 6 por outo lado, inspirado pela concepglo de Hobbes. Pulfendor escreve que © estado de natureza & puro e absoluto, quando se refere a todos os homens indiferemtement, ou limitado erestrito, quan dose sefere somente a uma certa parte da humanidade, Ele diz muito claramente que ‘o género humano nunca foi todo tunido de wma s6 vez no estado natural puro": para acreditae ‘numa fl imaginag20, explica precisariamos acreditar na men- tira de que os homens tivessem surgido da term separada- =m1- mente, como 25 ris, ou tivessem sido germinados de uma semente como os iemaios Cadme. E conelui 0 estado natural nunca existv, 2 nao ser moderado ‘ou parcial, o seit, no caso em que alguns homens se reuniram aum estado civil ou num estado andlogo, e co tinuaram a manter o estado de liberdade natural com re- lao 20s outros" Esse conceito de que 0 estado de natureza seja um estado real, mas imitado a cercas stuagbes historicas, enconta-se ex presso claramente também em Locke: "Pergunta-se frequentemente, para apresentar uma ‘grande objes0: onde estio ou estiveram afinal os ho- mens neste estado de naturezs? A iso pode ser suficlen- te responder no momenta que, porque todos 6 princi- pes € os magistrados de governos independentes no mundo incero esto num estado de natureza,€ cara que ‘© mundo nio foi nem nunca seri carente de wm certo nimero de bomens naquele estado, No hd dvida, poranto, de que os jusnaturalistas mais cons- cientes, quando falavam de um estado de natureza como um est do histicco, no se efeam absolutamente a hipatético estado de natureza universal, mas iquele que era possivel considerar ‘as relagdes de um certo mtimero de bomens ente si ‘Menos clara € a solucio que os jusnaturalisas davam a0 problema da existinciahistrica do contrato socal, través do ual os homens, que viviam no estado de natureza, davamm ori- {gem 20 estado cv, Teoricamente, uma vez exclu 2 histori- cidade do estado de natureza dos individuos, tems a impos- sibiidade de considera © contato socal come historicamente acontecido, frmado pelos individuos que viviam no estado de 202 | atureza. © Unico autor que considera explictamente 0 contrato social como historicamente acontecido € Locke, que, no captu- Jo VIII do Segundo ratado, reputa expressimente 20s que sus tentavam nunca ter acontecido que homens independentes hour vvessem realizado uma unio entre si numa soctedade civil através do contato. E08 efua argumersardo, em primeito lugar, que a constiuigio dos Estados € geralmente Wo antiga que no con- serva mutreaalgumma da origemy, em segundo lugur, que onde foram transmiidas as noticias sobre as origens de um Estado, ‘como na fundagio de Roma e de Veneza, nao parece duvidaso ‘que a origem da constiuigio estat sej de natureza contatual; € finalmente que todos podem observar 0 exemplo dos novos «estados fundados nas colnias (Locke considerava especialmente 1s coldnias inglesas da America do None), cujaorigem deve-se a ‘um verdadeiro pacto entre os colonos. ‘Quanto a Rousseau, a interpretacio do seu pensimento so- bre esse ponto ¢ um pouco mais dificil: sua teoria no € cet ‘mente linear como a de Locke, Segundo Gierke, € possivel ad- rir que Rousseau considerasse o contrato social como um fato histrico, mas, diferentemente de Locke, pensava igual- mente que até eno, ou Se, até 0 estado atal da humanida- de, nao houvesse sido realizado em nenhuma sociedade, O ‘estado atual era. o estado de corrupeo que se seguit a degene- ragio do estado de naturezaprimitivo. A tinica maneira que vit pata sir do estado de coreupso era 0 esabelecimento de uma sociedade funvdamentada no Contato, assim como © hava con- cebido, Como exigéncia ideal da sociedade humana, 0 que vist a superar o estado de coerupedo, 0 conteato social € um evento ainda nao acontecido, mas que deve acontecer, A dimension Iistrica que Ihe € propria nao € do pasado, mas a do futu- to: & em outs palavias, um evento histico projetado no futuro da humanidade, ‘Kant, afirmando que o contrato social é uma idéia pura da rao, op6e-se tanto a Locke quanto a Rousseau contra Locke: = 203 - le afiema que qualquer Estado que se adapte a0 ideal do con- senso, ott sej, qualquer Estado no qual emanam dos gover- nantes somente aquelas leis que estio em conformidade com 0 espinto pablico, ¢ um Estado que se inspira na ida do contra- to originisi, ainda que de f3to 0 contrato social alo tenha unc exstido; conta Rousseau, ele nega que 0 consenso es teja na base somente do Estado futuro, que deverd ser instau- raido através da efetva estipalacho de um contrato social, mas admite que este € 0 fundamento possivel de qualquer Estado cujos governantes acministrem a coisa pblca segundo a ri- 2lo, independentemente do fato de que o consenso dos cida- dos seja expressamente manifesto. Entende-se que Kant, dessa maneia,transfigurando 0 cor testo social de fat histrico para ideal de razto,acabava elim rando da idéia do contratvalismo qualquer forca revolucins ria. Quando Locke sustentava que © contrat era um fato histeco, ess sua afrmacio tinha um significado politico bem preciso: significava que, se um Estado de fto no estava firma do em conttao, no devia ser considerado egitim: em outs palavras, a historcidade do cootrato epresentava um eritéio empirica para distinguir 0s estados legtimos ds ilegtimas e, portato, para esubelecer em que casos se admitisa 0 diteto de resstncia. Da mesma forma & possvel dizer, com rlaga0 3 {dea do contratualismo de Rousseau: se de uma indagacao his torica resultava que o contrato Social, assim como o imaginata, nunca tina sido realizado (e essa indagagio 5 era possivel {quando © contato social fosse admitido como um fate), devia- se deduzir que o estado atual da humanidade precisava set completamente reformado, Segundo Kant, a0 invés, uma vez, ‘que © contrato no € um fato histrco, mas uma iia da rae io, era absurda qualquer indagacio desenvolvida para saber se uma determinada consituigi teria sido realmente fundada ‘num pacto orginiio ou nao; era exeluido, pontnto, qualquer cxitrio de Fato para provara leiimidade ou nto de um Estido = 204 - 6, consequentemente, afastida do povo uma potente arma de critica e de reforma da consituigio. Com respeito a isso exis- tem dois rechos bem explictes, igados um 20 outro. Vamnos ler 0 primeteo: “A origem do poder superior & para'6 povo, que Ihe ‘std submetido do ponto de vista pritico, imperscrutdve, ‘out seja,0 sito nto deve expectlar sutmente sobre esa forigem, convo sea considerasse de dieito duvidoso com felagao & obedigncia que lhe & devida" (p. 505) Por que a origem do poder é imperscrutiveP Porque o que egitim o poder, segundo Kant, no € absolutamente 0 fato de derivar ou nto de um contato social estipalado entre todos os ‘idados, mas de estar em conforidade com a idéia pura do Contato orgindrio. Eno, € perfeitamente ind realizar nda ‘gagdes histérieas que nao levaniam a resultado algum. f ro € Somente indi, mas também delitoso, como se pode ler no segundo trecho: “Bint buscar as origens bitGrcas esse mecanismno, ‘ou sea, &impostvelanalisr 0 porto de parida da socie~ dade ‘cluil (porque os selvagens nao estipulam nenhum ato da submisao lel, e, pelo contro, a prSprianature- 2a desses homens vilentes fz ever que eles foram sub mtidos por meto da forga). Mas € criminoso empreender ‘ssa investigaedo com 3 incengo de mudar em seguida, através da org, a constiuledo existent” (p, 530). E ficil entender que fats histéricos tinha Kant em mente cenquanto escrevia esas palavas: a Revoluco Francesa, como veremos, ao mesmo tempo o havia conturbado ¢ deixado cheio de admiragio. E no fundo de cada movimento revoluctonsrio ‘eistiaexatamente essa busca das origeas do governo, da qual ~ 205 - (0s reformadores dervavam argumentagdes para afiemar a iegit- ‘midade do poder const. Veremos melhor mais adiante que Kant, apesar da sua teorit do Estado liberal, ¢ do Estado de diseto, era polticamente um conservador. Uma expressio do seu conservadorismo é, sem divide, 2 teora do conta origi rio como iia da razio por meio da qual 0 contrato social, om efeto,sublimado. Ao mesmo tempo, contudo, em que € levado do nivel histrico para o nivel racional, & privado de ‘qualquer elicicin pritica como instrumento de luta politica. A ileal do contrato social € 20 mesmo tempo sia extusto, Levande 2s extemas consequéncias 0 processo de racionaliza- ‘fo da ideia do contatualismo que tnha inciado com o Tumi- nismo, Kanto esvaaa de qualquer conteido postivo e de qua: quer forga pritica. Hle & pode-se dizer, 0 thimo eseritor do contatalismo. Depois dele os movimentos polticos mais atu antes abandonarto a idéia do contato soca; pois, seguindo-a, tinham enfentado as mais duras lots para frmagao do Esta ‘do moderno. O contato socal sera um dos alvos polémicos pre- feridos tanto pelos uiltrstsingleses, como Bentham, quanto pelos dealisas alemaes, como Hegel = 206 = po po Contraro ‘Vines come Kan este ric prema ran reato un coum uso proba daa iid © vcpuno problema econ! odo conto socal 60 ce fe av et conede Agu como eon a furl tina se dvi er do noviment: 1D de um lado aqueles que consideravam o contrato social ‘camo um ato de tot allenardo dos direitos natura em favor do Estado (Hobbes & Rousseau); 2) de outro lado, aqueles que eonsideravam 0 contrato so- cial como um ato de limitagdo reciproca dos direitos na tui, através do qual os individuos, vivendo no estado de natureza, som renunciar 20s seus proprios direitos naturais, consttuiriam vm poder coercive eapaz de ga rantir ¢ de assegurar © lvee © pacifico exerccio desses direitos (Locke) Do que i foi dito no capitulo 1 desta parte, seria possivel deduzr que Kant concebia © contesdo do contrato originiio segundo 'a manelra de Locke mais do que segundo a de Rousseau. E, pelo contrato, & necessiro reconhecer que afr ‘ula do contrato social em Kant lembra a de Rousseau, € na02 de Locke. O trcho mais importante desta matéria & 0 que se fencontsa & p. 502 da Metafisica dos costumes: = 207 - “0 ato por meio do qual o préprio povo se constitul fm Estado, ou melhor, a simples idea desse ato, que 56 laf permite concebeer a sua legitimidade, & 0 contato origindrio, segundo 0 qual todos Comes et singul do ppovo detaam a iberdade externa para retomi-la nova- ‘mente, ja como membros de um corpo comum, ou se, como membros do povo enquanto Estado (univers) Se compararmos esse techo com a doutrina de Rousseau, ilustrada no capitulo 13 da parte 1, lo poderemos fugir a evi- déncia das semelhangas, até mesmo liters. Rousseau havia afirmado que aquilo que o homem perde com 0 cantrato social 4 liberdade naturale 0 que ganha & 2 liberdade cul. Tam- bém para Kanto indiduo, passando do estado natural para © ‘estado civil, no conserva a liberdade natural, mas a depde, ou sei, a abandona para receber no mais a mesma liberdade sarantida pelo poder coercitiv, mas uma nova liberdade, que @ exatamente a iberdade cul, discutda no trecho a seguir: “No se pode dizer que © homem no Esado tena si- cxificado a um certo fim wma parte da sua liberdade exer- tha inata, mas que abandonou completamente a Vberds de selvagem e desenfeada para encontar novamente a sua liberdade, em geral nio-diminufda numa dependén- a legal, ou sea, num estado juridico, porque essa depen favorivel, faz parte da casusticajesutica e€indigna dos sobeninos, Pade-se acrescentar que, para Kant, um tat do dle paz no deve canter ne 0 pedo de resarcimen to das despesis le guerra, porque nesse caso 0 Estado vvencedor se arvoraria em juiz-em causa propria, nem re- tirar dos sidltos do pais conquistido a liberdade, pois esse ¢ un direito natural dos individuos e dos poves. ‘Nenbuom Estado tndependente pode ser adquirido por u- tro através de sicesao beredstaria, toca, compra ou dea- (20, Aqui Kant combate claramente a teorta do Estado ‘patrimonial, segundo a qual 0 Estado, ou melhor, 0 ter rério do Estado, € considerido propriedade do princi- pe, que pode dispor dele (segundo um ato entre vivos ‘04 martis causa), como vm domes dispde da propria posse. A concep0 do Estado patrimonial Kant ope que (0 Estado € uma pessoa moral, ¢ de uma pessoa moral, por analogia com a pessoa fsica, nlo se pode dispor como se Fosse uma colsa Osexérctos permanente devem, com o tempo, desapare- cer ineinamente, Como sempre, o problema da paz cami- ‘ha paralelamente a0 problema do desarmamento, Kant alega, a favor da aboligio dos exércites permanente, ‘aabes de ordem utltra e moral. Entreas primeras deve ser considerada a despesa excessiva com a sua manuter- ‘Glo, despesa que as vezes pode induzir um Estado a guer- 1 agressiva somente para livarse do peso, que se tor rou insuportivel, A rizko moral € que 0 soda de urn exérito permanente acaba se tornando um mero inst mento de fins iniquos e, portanto, acaba sendo degrada do na sua propria dignidade pessoal: ‘usar homens como simples maquina ¢instrumentos nas mos de um outro (Uo Estado) (. no pode concliarse ‘om o dieto do homens sobre a propria pessoa” (P. 285). = 256 - 4) Nao devem ser cantradas diidas piblicas em visa de uma agdo a serempreendida no exterior. Aqui Kant, refe- ‘indo-se ao sistema das divi pblics,itroduzido pela primeira vez na Ingltera por Guilherme I, quer evita 0 Perigo implicto no aumento indefinido da divida publica, {que leva o Estado a possuir uma perigosaforga Hinanceia, ameaga perpéeu, dire ou indets, de guerts 5) Nenbum Estado deve intrometerse, através da forca, na ‘consiticdo e no governo de wm outro Estado. Aqui Kant somente repete © principio, consagrado no dlielto inter- racional, da do-intervenedo, segundo 0 qual nenhum Estado pode intervie nos negécios internos ou externos de um outro Estdo ano ser que isso Sejaprevito num teatado que vincule os dos. Existe um caso em que Kant admite 0 direito de intewveng20, ¢ & aquele no qual um Estado foi dilacerado por uma guerra civil mas, nesse caso, ele comenta, a siuagio que se ertou fol de anar- ‘quia, a anarquia nao € mais um Estado, pelo contri, 6a austacia de qualquer forma de Estado, 6) Nenbum Estado em guerra com outro deve permitratos dd bositdade que tornariam impossieel a confianca rec- ‘roca na paz futura. Entze esses atos Kant cit o recurso 44 assasinos, envenenadores, espides, ruptura de uma ‘apltulagdo, instigagdo 2 taigdo. Também apresentara- 25es uulitirias e€ morais. Ente as primeiras lembra que essas artes ‘infemais,intoduzidas no estado de guerra, Aficmente poderio ser abolidas no estado de paz eaca- bam envenenando perpetuamente as relagdes entee 08 cesados. Moralmente, tas atos io reproviveis porque, como & evidente no caso de espides a falta de sentido {de honra de certs pessoas & explonsda part fins pibli- cos. Pode ser acrescentado que 0 uso de meios desones- tos transformaria qualquer guerra em guerra de extermé- -257- ‘no (Belhune Inornecinum), que & uma foma iets de guerra, Além da guerra de exterminio, Kant consider: ica a guerra de punigao, porque a punigio € possivel somente entre um superior € um inferior, uma vez que todas os estados sto iguais entre si; ea guerra de con- ‘gusta, porque a liberdade de um povo tem como efeito ‘© aniqulamento moral do Estado. A guerra justa 6 so- ‘mente a que um Estado empreende para se defender de ‘um inimigoinjusto,E quem 6 0 inimigo injuste? B aque- le, responde Kant, “cujavortade publicamente manifesta tral uma méxima que, se elevada 2 condigio de rege univers, impossibilitra qualquer estado de paz entre ‘0s povos ¢ perpetuara 0 estado de natureza”(p. 541. Mas também a guerea justa torna-se injusta se so usados fs meios desonesios aqui condenads. (Os ts artigos definivos st: 1) A consttulgdo de qualquer Estado deve ser republican Depois do que dissemos sobre o ideal republicano de ‘Kant, nfo precisamos sublinhar a importincia deste ar- igo. A repUblica, portnto, nio é somente a melhor for- ima de gavera no que dit. espeito As telagbes entre 0 Estado e os cidadios, mas também no que diz respeito As relagbes entre os estados, Ba garante, melhor do que ‘qualquer outta, Internamente, a liberdade e, externa mente, « paz: €, portanto, a condi principal daquela ‘coexistcia pacifica na liberdade ou livre na paz, que constiui 0 ideal moral da espécie humana. © porque dea tepablica ser condicio de paz, Kant explica desta “Se € pedido o assentimento dos cidadios para decidir se a guerma deve ou ndo ser feta, nada de mals natural = 258 = pensar que, devendo deixar cair sobre eles prSpros to ‘das as calamnades da guerra. eles refletindo longa ‘mente antes de inicar um jogo tdo rum. Ao conteiio, ‘numa consttuicio na qual o sidito nlo € cidad, isto 6, numa consttuicdo nao-republicana, a guerra toma- s6 8 coisa mais fail do mundo, porque 0 soberano nao membro do Estado, mas sou proprictirio(..), © pode ento declarar guerra como uma espécte de jogo de pr et" (p. 298), Esa argumentagio de Kant € comum a todo 0 pacifsmo democratico, que ters maior némero de seguidores no século seguinte ese fundamenta no pressuposto de que 1 causa principal das gueers &o arbitnio do princi pportanto, 0 problema da paz pode ser resolvido somen- fe através da tansformagio dos estados absolutos em estadas com soberania popula. Quanto 20 fato de ess ‘deia da paz através da mudanca de regime politico es- tar ricada no pensamento de Kant, i850 pode see mos- trado em um outro trecho, que nto se encontra ns Paz perpétua, eas no ensaio que mantém sobre 0 progres- 0, € onde se afirma que uma sociedade civil onganiz cla segundo uma consttuicio “em harmonia com os di- reitos naturais dos homens, ou seja, aqueles que ‘obedecem & lei devem também, reunidos, legisar", ow seja, em conformidude com a constiuigio republican, aquela que “se qualifica como a melhor para os fins de afastar a guerra que tudo destréi"(p. 225), € chega se 8 seguinte conclusio: “Portanto, & dever entrar em tal sociedad © provisors mente (..)€ dever dos monareas, ainda que aristocrdt- os, goverar de forma republicina (no-demorritica), u sea, trata 0 povo segundo principias em conform dade com 0 espitto das leis de liberdade”(p. 225). = 259- Em uma nota, essa solugto € explicada de maneira muito simples com um exemplo (através do qual Kant quer gol- pear a monarquia inglsa) Que é um monatea absolut? B aquele que quando diz “A guerra deve ser fi, a guerra acontece. O que €, 20 contri, um monatca limitado? Aquele que pergunta primeito a0 pova sea guerra deve fazerse ou n40, €5¢ 0 ova di*A guerta nto deve fazer-se, ela ro acontece,” (© pacismo democritico 6 um pacifism politic, porque ‘Ga causa principal das gueras e, porno, conhece 0 remédo para a paz, principalmente numa trnsformacio poltica. Exisem outras formas de paciismo: um pacfis- mo econdmico (que fol sustentado pelos paridiios do comérco livre do século passado, como Cobden), segun- do 0 qual as guerras dependem da politica econdmica dos extados, ¢, poranto, 0 caminho rumo & paz passa através da transformagio da politica do mercanlismo ‘para. a do comésco livre; um pacifism social (defendido pelos socilistas da Segunda Internacional), segundo © ‘qual a caus principal das guerra é a divisio da socie dade em classes, e a paz pode ser conseguida soment através de uma revolucio socal que venha a abolir as classes; um pacifism juridico (sustertado hoje pelos federalists europeus¢ mundiai), segundo o qual causa principal das querras & a estruura juriica dos estados etentores da soberania absoluta € muito ciosos del [esse e280, paz €alcancivel somente através da limit ‘ho juridia da soberania, que s6 pode existe num sist tna federal de Estado, Acima de todas essa formas de pacifism, existe o chamado pacifism mora, segundo 0 {qual as guetras dependem exclusivamente da maldade ‘dos hontens ea paz mo poder sero resultado sendo de tums reforma geral dos costumes = 260 rabies 2) 0 direito internacional deve fundamentar-se numa fe- deragao de estados lures. Aqui vemos 0 paciisao pol tico de Kant desembocar no pacifismo juridico. Nio é suficiente que os estados se tornem republicanos: a re- pablica € uma condigio necessiria, mas nlo suficiente, para a paz perpetua.E necessieio também que as rept blicas assim consttuidas originem uma federagio, ou seja, obriguem-se a entrar numa constiuigao andloge A consituicao cet na qual sea possiel garantir para cada membro 0 proprio diveto, Esa Federagao deve se dlistnguir, or um lado, de um superestadoque, como ji dlissemos, contradz 0 principio da igualdade dos ests- dos, mas, por outro, de um puro e simples tratado de az, porque este se propoe a por fim a uma guerra, fenquanto aquele se prope a pir termo a todas as quer” ‘as, ¢ para sempre. 3) O direto cosmopolita deve ser mitado as condicdes de uma bospitalidade universal, Por ‘direto cosmopelita’ centende-se uma seglo do diteito diversa do direito in- ‘temacional dela Kan tata brevemente no final da Meta- Fisica dos costumes. Enquanto 0 diveito internacional re- aula as relagdes entre os estados, € o dizeto interno regula as relagdes entre o Estado e os préprios cia- os, 0 direto cosmopobia regula as relagdes entre um Estado € os cidadios dos outros estados (ou sea, 08 estrangeiros) A mixima fundamental do direito cosmo- polita€ que um estrangeiro que vas para o teritria de tum outro Estado ndo deve ser tratado com bostilidade té.0 momento em que comets alos hosts contea 0 Esta- do que o esté haspedando. Kant justifies essa maxima como direto que cabe a todos os homens de entrar em sociedade com os seus semelhantes, em vieude da pos- se comum origindria de toda a superfice da Terra. Mas = 261 - esse atime antigo do seu projeto de paz perpétua, Kant estabelece um limite para esse dieito de hosptalitadk (4 pelo menas quer defini exatamente 0 Ambito den- tro do qual pode ser exercido, Dizendo que nio & pos sivel ie além das condigoes de uma hospitalidade uni= versal, quer dizer que aquele que & hdspede de um Estado estrangeio no pode aproveitar-se dessa post ‘lo para desagregar o Bstado ou para ameagar sua ex tencia, Essa clausula € diriida claramente contra a in ‘gerGncla dos cidadios dos estados colonizadores nos patsesindigenas,ingeréncia que justia, segendo Kant, fs medidas restritvas com relagio 20s europeus da China e do Japto € que, por este motivo, 0 obriga a atirar esta invectiva contra as polémicas colonialistas da sua época! *Se compararmos com este [dieito de hospitaladel a ‘conduta ant-ospitalera dos esiados cis, especialmente dos estados comercais do nosso continent, fcamos hor rorizados 20 ver a inustiga que cometem ao visitrem ternas © povos estringeitas (o que para cles significa conguisti-los) (..) Na India Oriental (Indust, sob 0 preteato de estabelecer postos comers, introduziram tropas estrangeias e derivou disto a opressio contra 05 indigenas, a provdcagio dos diversos esados do pais para guerra sempre mals extensas, cares, nsurreigbes, Iraigdes€ toda s longa série de males que podem agit ‘s humanidade” (p. 303) Nao podertos concluir ess rica exposiclo sem lembrar ‘que, além dos sels arigos preliminares © dos tts definitivos, Kant acrescentou na segunda edigio do ensaio (1796) um art go secreto, © que tem de to misteioso esse antigo secrete? Leiamol: = 262- “As maximas dos hildsofos sobre as condigbes que pos: sibiltam a pax publica devem ser tomadas em considera- ‘io pelos estados armados para a guerra” (p. 315) Esse trecho nos reconduz, exatamente no final do nosso ‘curso, 8 encontrar no pensamento de Kant o valor ¢ a fun: ‘elo daquela libertas philosophasdi que constiui © ponto de parti? e agora podemos dizer também o ponto de chega- a, da sua concepgao liberal da vida © da histéria. Que os estados se empenhem em ouvir as miximas dos fildsofos de- onstea que, para Kant, a razio humana, da qual os flésofos Slo a mais alta expressio, est acima da poténcia do Estado, fem pode ser por ele nem apagads nem limitada. Mas sgai- fica dizer também uma gutea coisa: que os Alésofos (nds dia mos hoje, de mancira mais geral, os homens de cultura, os Incelectuts) tém algo a dizer aos poderosos, que detém ras ‘ios o destino dos homens. Nao sio visionos fora do tem po, nem dridos repetidores de coisas mortas; mas esto, de- vem estar, peto dos poderosos para adestrislos, Flizes os tados onde a cultura ¢ livee (ou seja, nto dominada),€ res- peitada (ou se, ndo usada para fins baixos de propaganda), Kant nio tem ilusio alguma de que os politicos se tornem fil6sofos, nem tem a pretensto (este, sim, seria um sonho de vislondrios) de que os filsofos criem os politicos. Pede, por tum lado, que 08 polticos formem os politicos ¢ deixem aos filésofos a liberdade de formar os fi6sofos. Pede, por outro lado, aos fildsofos mio se fecharem na torre de marfim, mas dirigiren-se aos politicos com os seus ensinamentos deriva dos de uma erica desapaixonada da raz30, Existe um techo ‘com respeito a is80 que poderia ser indicado como maxima reguladora das relagdes, sobre as quais nunca acabou a dis- cussio, entre a politica e a cultura, ¢ com o qual tenho 0 prazer de terminae © curso: = 263 - “io podemos esperar que 0s fis filosofem ou os fl6sofos torments res, nem é algo a ser desejado, por- {que a posse da forga corrompe inevitavelmente 0 live juizo da rardo, Mas que o ei ou 0s povos soberanos (..) Indo deivem perder ou redusirao silencio a classe dos flé- Sof, mas a deixem falar publicament, isto € indispen- sivel a ambos os dos, para sluminar es proprios nego ios" (p. 310) = 264- Notas 2. Aquem dese er alguras nips supetivas sobre o magus, ‘sccm er cole de GHRIARD RFT, Hote mona dpe ‘Bolen I Ming, 2 958 2, Fan ouasinomasces indo nog de elo com epoca nto: ‘ga iting tac Chico nl coma eoberapo de Meee ent sino, 962, 2, Fs pico ds formas de lepine ope flere da de Max ‘ete sy, ue dangue ts formas de pode imo: ard, {don lepl us bee Eeomac ch i, Comunt, 16 psiem) 4 Por om lado, a pep era de Hobbes no € to extrem nos ‘woh. Fb jn bes exit lie pared ema, ge 6 (deo rau e cad indo fete 3rd fae cre no poo et ‘eeundo ,poram, 9 baud euc 0 i ei en ago do meio Den deminclando oso abet Ps ota rman ica Ine ive De ats Mare Napa, orn, 95, 5. Paraexposo conti nse parignfo no especialmente dus obs .MESNARD,Lesrdelapboupblepequ at XV el Par, Vn, 1952. DADDIO, idol contre daft ala rforma 0 Be Prince Salomon, Ga 1954 6 obs encore annem vc aan sb ole Gk ‘iusto mligpo storie dele ae pace gamatnatich Tein, oa 10 7 Besteua raurie de aln dens tense document, cm color ‘apo de Viti Gabi obo thle Purana un, nau, 156 {8 Godlee dos Clank Pt da ars et Ti, 2 ‘ao, 190, p34 9. Para quem dese profendar oconhecimero do pense plo de Locke nto mes es face rt natura, Tren, Gippell, 18S. © 10. Cap da wndugo ala 8 Si Cot medio Clas Polit de etm et, Trim 1952 0 nec cat encom 13 do pic = 265 ~ 11, Quando noes indo ot do ua deez echo, renee ie lv so unl eames ns endo €ngele cad no retin, ou Se 2 Spence: 12, eins Cea darn pura ego aes, pp 5458 13. Cho ancoga de Pllend, sob 0 tino Pan dart natura, Tin, avn p BP. 1A. Eas comers der do esi de SOLARL La dia kcana i etic’ om Ri fli 190, pp 1-25, gue indi pn 15. Os wechor cas fem pate de tli ft menconada Pome ‘dru nati 9p 0 16. Socamdo raat goo oo cad, 2, 17, Ceosepundo ur edi fences, dtd de Bindu, does enerase p18 1, Eas hago fx pare a cra Cues cotnsion dla Franca mo- ‘Suma colori de sts, Tarn, Baud 1952, p58. 50. aso = 266 ~ INSTITUTO TANCREDO NEVES DE PESQUISAS E ESTUDOS POLITICOS, ECONOMICOS E SOCIAIS Objetivos O Instituto Tancredo Neves, ITN, € 0 Gro de assessor € cooperagi0 do Diretério Nacional do Partido da Frente Libe- ral, PFL, © 05 congéneres nos Estudos e nos Muniipios dos Diretérios Regionais e Municipais,respectivamente, destinados a realizar pesquisas ientificas, estos econdenios, politicos € sociais, bem como promover cursos, seminsrios, patrocinar convenpées € outros eventos de ineresse partido, com af ralkdade de difundir a doutrina ¢ 0s postulados do iberalismo social adotados pelo Partido, Diretoria Executiva Depuado Vilna Rocha Dr. Gustavo Krause Dietor- Presidente Dietor Pref Alcen! Goer Joie Meliio Neto Diretor Ditetor Depotado Aroiso Cadraz Dr. Vinicius tummertz Ditetor Direior Clivdio Lembo Depstado Inacéncio Olive, Diretor der na Camara das Depuaidos Deputado tiseu Resende Semador Hugo Napoledo Diretor Lider no Senad Federal A Biblioteca Liberal é wma inicativa do Instituto Tancredo Neves, em convénio com a Editara Mandarin, como parte do ‘esforgo que vem desenvolvendo 0 PFL no sentido de familar- ar a ss mitincia com a duiina politica ¢ também com a teadigao liberal brasileira e com 0 programa do PPL. Estio pro sgrimados doze titulos pars publieaglo no periodo imedlto. CCompreendem a apresentagio do pensamento dos grandes clis- sicos, a exemplo de Kant, Tocqueville e Popper, mas igualmen- tea maneira como encara questbes emergentes da atvaidade brasileira e os temas teéricos mals mobilizadores, notadamente © sentido profundo do liberalism social « 0 modo de distin~ gutlo do cliamado ‘neotiberalismo’ (© programa editrial do Instituto Tancredo Neves abrange ainda outrs série, entre as quals se destacam 0s Cadernos “iborais, que vém aleangando o mais amplo sucesso junto a0 pablico, Com © seu trabalho, o Insituto Tancredo Neves acredita ‘estar contibuindo pars vializar a vida poliiea brasileira, ele- vvando © nivel das discussdes e contrbuindo para a melhor ‘estruturagio das corentes de opinito do pats. Sem se identf- ‘car com estas itimas nao hé partidos politicos auténticos. Mas também ni consolidaremos a nossa democraia sem agremia- goes pias ansparenes areas, em cone Consetho Editoriat Deputado Vilna Rocha Claudio Lembo Cislos Henrique Cardin Courgio Bu [A Democraca Liberal segunda Alexis de Tocqueville icaro Velez Rodriguez Historia do Lberalismo Brasteiro “Antonto Pains Direko ¢ Estado no Pensamento de Emanvel Kant Norberto fob

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