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As gravações obtidas pela Folha de São Paulo, que oferecem rara visão sobre
práticas da igreja, são de duas reuniões feitas por videoconferência entre
líderes na sede, em São Paulo, e outros nos Estados. Foram coordenadas pelo
bispo Romualdo Panceiro. Ele é considerado o segundo nome mais importante
na igreja e foi apontado pelo bispo Edir Macedo como o seu sucessor.
Romualdo, que coordenou a igreja no Brasil por mais de 12 anos, hoje vive
em Buenos Aires e é responsável pela instituição na América Latina.
Romualdo orienta que "semear" é dar dinheiro à igreja. Ele diz que a igreja deveria perguntar aos fiéis se eles "acreditam mais" na
crise ou em Deus.
"Por isso que a gente tem que perguntar [ao fiel]: "Você crê mais na crise ou você crê em Deus? Porque se você crê na crise, então
você vai guardar para ela, ela vai pegar o que você tem. Sem que você saiba, quando você acordar, já era. Mas se você crê em Deus,
você vai pegar o que a crise pode pegar e você vai colocar onde? [...] Vai semear no altar!", diz.
Romualdo indaga se Clodomir compreendeu: "É ou não é, Clodomir? Entendeu? [...] Não é legal isso?". Clodomir concorda: "Arrebenta.
Tá ligado".
Em seguida, o bispo diz que a ideia deve ser disseminada entre os pregadores: "Quer dizer, mais semente você vai ter, e quanto mais
você tem semente, mais você vai colher. Pô, é muito forte, não é? Então, a gente tem que virar o jogo. Passar esse espírito para os
pastores agora, como eu já passei".
Ele se dirige ao bispo Sidney Marques, de Belo Horizonte: "Vai arrebentar, é muito forte! Hein, ô, Sidney?" "É o melhor investimento. O
melhor investimento é esse", responde Sidney. "Momento propício para o uso da fé", arremata Romualdo.
O bispo diz que "combinou" com os pastores regionais de abrir três Bíblias, durante a oração do domingo, para "desafiar" as pessoas a
trazerem dinheiro. "Eu combinei com os regionais aqui o seguinte, malandro. No domingo [esfrega as mãos], falar assim: "Olha,
pessoal, em nome de Jesus, você que vai agora semear em cima dessa palavra aqui, com [R$] 10 mil para cima, vem aqui na frente,
coloca, muito bem. Com [R$] 1.000 para cima, vem aqui pra frente. Com [R$] 500 para cima, vem aqui na frente, com [R$] 100 para
cima, com dez reais para cima, com uma moeda para cima, coloca aqui". Porque aí a gente não está, como se diz, estipulando.
Porque foi na hora da oferta, um desafio."
Vídeo de outra reunião indica que membros da igreja procuraram se aproximar de criminosos para evitar assaltos a carros-fortes que
transportam dinheiro doado por fiéis.
Romualdo conta que um carro-forte com R$ 52 mil arrecadados pela igreja havia sido assaltado na Grande São Paulo. Ele atribui a
autoria do crime a policiais e diz que pastores e bispos deveriam fazer contato com a criminalidade. "Nosso problema não é bandido, o
nosso problema é polícia. Você não pode falar isso para ninguém. [...] A não ser que, no Brasil, vocês não tenham feito o que nós
fizemos aqui com os chefes da comunidade, de bandidos etc etc. Eu já falei para vocês fazerem. Não falei, Sidney? [...] Todos já
devem ter feito."
Os vídeos foram entregues ao Ministério Público pelo ex-voluntário da Universal e ourives Eduardo Cândido da Silva. Os promotores
Everton Luiz Zanella, Fernanda Narezi, Luiz Henrique Cardoso Dal Poz e Roberto Porto denunciaram, em agosto passado, Edir Macedo
e mais nove membros da igreja sob acusação de formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. A denúncia foi acolhida pelo juiz
Glaucio Roberto Brittes, da 9ª Vara Criminal, o que deu origem a ação penal.
Segundo os promotores, recursos obtidos pela igreja de fiéis eram enviados ao exterior por meio de empresas de fachada e
retornavam ao Brasil com aparência legal, para a compra de emissores de rádio e TV.
Os promotores também pediram à Justiça dos Estados Unidos, por meio um acordo de cooperação bilateral, a quebra de sigilo das
contas bancárias utilizadas pela igreja e por empresas a ela relacionadas.
O ourives Silva obteve os CDs de um ex-pastor regional que hoje atua em outra igreja. A Folha conversou com o pastor que tinha as
gravações. Ele pediu para não ter o nome publicado, mas confirmou a história.
O ourives move uma ação para o ressarcimento de R$ 232 mil referentes a supostos cheques sem fundos passados por pastores pela
venda de joias.
"Como já explicado reiteradas vezes à Folha de S. Paulo, a Iurd é uma denominação evangélica neopentecostal que possui como
doutrina a Teologia da Prosperidade. Ou seja, acredita na intervenção divina também para o bem-estar material do homem. O
exercício de fé pregado por seus bispos e pastores tem como único fundamento a prática dos ensinamentos da Bíblia", informou a
igreja, em nota.
"Essa orientação teológica é transmitida diariamente a milhões de fiéis, em programas de TV, rádios e, ao vivo, nos milhares de
templos da Iurd nos mais de 170 países em que está presente. A veracidade dessa doutrina pode ser facilmente comprovada pela
Folha de S.Paulo numa conversa rápida com um dos milhões de membros da Iurd em todo mundo", afirmou a igreja.
A respeito da menção feita pelo bispo Romualdo sobre aproximar-se de "bandidos", a Iurd afirmou que "não há e nunca existiu
qualquer orientação para que fossem feitos acordos com bandidos". A igreja repeliu "interpretação equivocada de um trecho isolado
do seu contexto geral".
"Há, sim, diálogos permanentes de pastores e bispos com chefes de comunidades, como é feito por qualquer líder religioso presente
em uma comunidade carente (seja ele evangélico, católico, espírita)", informou a igreja.
"A gravação feita, se interpretada em sua totalidade, mostra a orientação dada aos bispos e pastores sobre os cuidados que devem ser
tomados nas igrejas diante do alto índice de criminalidade que tem aumentado dia a dia nas grandes cidades, tomando como exemplo
um roubo ocorrido em um dos templos da Iurd na cidade de Diadema."
"O atendimento prestado pela Iurd, que preenche uma lacuna deixada pelo Estado, conta com o respeito inequívoco de diversos
representantes da sociedade civil, incluindo os líderes comunitários mencionados pelo bispo Romualdo Panceiro. Existem centenas de
gravações à disposição da Folha de S.Paulo comprovando "o que o bispo quer que seja feito em todo Brasil': doações de alimentos,
roupas, remédios, produtos de higiene, além de assistência jurídica em favelas, periferias e unidades do sistema penitenciário."
O livro diz que o bispo "é temido entre os pastores da igreja", mas que, "horas depois de convívio, demonstra gentileza e bom humor".
Assista os vídeos: