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DIREITOS REAIS
CAPÍTULO I: INTRODUÇÃO
desconhecia a figura dos direitos subjectivos – acepção subjectivista. A primeira das actiones
dirigia-se contra uma coisa, enquanto que a segunda se dirigia contra uma pessoa,
características supra.
no plano adjectivo, que toda uma acção pressupõe um direito. A evolução posterior
germânica das relações jurídicas se pode falar na categoria de direitos reais enquanto ramo
do direito objectivo.
objectivista] perante o perigo de se supor que, através da formulação “direitos reais”, nos
§2: CONCEITO. O Direito das Coisas será, assim, o ramo da ordem jurídica que regula
ALBUQUERQUE concorda com esta acepção, completando que essa distribuição pode não ser
exclusiva, na medida em que o benefício em causa pode ser atribuído a diversas pessoas [vg
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intrínsecas e deve, por isso, ser afastada [“jurisprudência dos interesses”, diz-se].
indicar os traços caracterizadores dos direitos reais: o seu objecto é a coisa corpórea; não
abstracta e objectiva; preconiza a estreita vinculação da coisa ao direito real [a coisa não
sequela]. Por estas razões, entende PEDRO ALBUQUERQUE que, apesar da multiplicidade de
figuras, existe efectivamente uma categoria unitária de direitos reais. Feita esta primeira
poderes de facto].
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colaboração de outrem.
• Teoria mista:
de novo.
comunidade.
absoluta.
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o Poder violável por todos: a situação do titular poderia ser violada por
direitos reais.
o Poder oponível a todos: o direito real seria oponível a todos com que
poder em oposição actual com todos, cumpre discutir o conceito de relação absoluta
[vertente #1]. A teoria em causa repousa no pressuposto de que, no lado activo, participaria o
titular, enquanto que no lado passivo estariam todas as outras pessoas, vinculadas à
abstenção de qualquer acto que representasse uma intromissão na esfera do titular. Esta
construção é inadmissível, na medida em que toda a relação pressupõe a prévia fixação das
partes em oposição, ordenando-as reciprocamente. Não há, por isso, relações entre sujeitos
Ainda assim, entende-se que sobre terceiros recai o dever genérico de se absterem de
invadir a esfera jurídica do titular do direito real, dever esse que não está, todavia, integrado
numa relação [OLIVEIRA ASCENSÃO]. Solução: vertente #3, poder oponível a todos que
ordenada pelo direito] como uma relação entre pessoas ou entre pessoas e coisas, numa
acepção muito lata que abrangeria poderes, restrições e direitos ou obrigações de facere ou
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de dare a que os titulares estariam adstritos. A relação jurídica real, essa, caracterizar-se-ia
Primeiramente, partiremos das premissas seguintes: o direito real define-se fora de qualquer
todas as situações jurídicas, activas ou passivas, são autónomas; há deveres a que não
corresponde qualquer direito; há direitos a que não corresponde directamente nenhum dever.
coisas aos sujeitos, enquanto que a obrigação, por seu lado, pretende estabelecer formas de
cooperação entre sujeitos [afastaremos, aqui, qualquer teoria monista que reduza os direitos
Todavia, esta descrição não basta para dissecar o conceito de direito real: há numerosos
triunfar a sua situação sobre todas as oposições] além dos direitos reais [vg direitos de
seguinte:
obrigação universal [vertente #3: erga omnes; oposto a todos; violável por
todos].
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[por exclusão].
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direito de superfície, a servidão e o direito real de habitação periódica. Para uns, a posse
deveria constar deste elenco, mas não segundo OLIVEIRA ASCENSÃO e PEDRO
ALBUQUERQUE, cfr. infra. Só os direitos reais de gozo podem ser adquiridos pela usucapião
[art. 1287º, carece de invocação – art. 303º]. Os direitos pessoais de gozo, por seu lado, são
funcionalmente dirigidos à atribuição de coisas aos sujeitos: não são, todavia, verdadeiros
direitos reais [vg arrendamento], mas sim direitos reais com função semelhante aos direitos
titular o poder de actuar sobre a coisa que lhe foi afecta sem, para tal,
de preferência.
o Mecanismos de garantia:
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ordem temporal.
antiga].
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Assim, e para finalizar, a caracterização dos direitos reais é clara quando contraposta
• Absolutidade vs relatividade
• Continuidade vs tempestividade
noção de direito real nos termos seguintes: direito absoluto funcionalmente dirigido à
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§1: CONCEITO. A posse exprime o controlo material de uma coisa sobre a qual
vantagens que essa coisa lhe proporcionar e excluindo qualquer outra pessoa desse
“controlo material de uma coisa, desde que não excluído pela lei”, em clara formulação
de possuir em nome próprio, e não alheio, agindo como titular do direito a que o poder de
facto se refere], em termos que dependem da teoria preconizada. Para OLIVEIRA ASCENSÃO
JHERING quando, na verdade, fora este último a construí-las para, apenas, as criticar. A
formulação partia da ideia básica de detenção, junto da qual deveria existir uma intenção [de
ser proprietário, possuidor ou de ter a coisa para si?] para se verificar a posse da coisa. Não
bastava, assim, a mera detenção, mas tão-só a intenção de tê-la. Assim, quem exercesse o
controlo material de uma coisa em nome alheio não seria verdadeiro possuidor.
animus mínimo + animus adicional. A vontade distinguiria, assim, a posse da mera detenção
[mera detenção = controlo material [corpus] + animus mínimo]. Quanto à natureza do animus
causa por que detém [para MENEZES CORDEIRO, esta teoria nada mais é do
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objectiva.
espacial” entre uma pessoa e uma coisa, não acompanhada de vontade, não teria significado
jurídico.
que os subjectivistas haviam já defendido: o animus de ter a coisa sujeita ao seu controlo
material. Repudia-se, todavia, o animus adicional nos termos supra, e explicita-se a posse
com recurso ao esquema seguinte: posse = controlo material [corpus] + animus mínimo;
detenção = controlo material [corpus] + animus mínimo – factor legal. Parte-se da posse e
esta é descaracterizada pelo Direito, reduzida a mera detenção. O Direito distinguiria, assim,
a posse da mera detenção, e não já a vontade: haveria posse sempre que houvesse relação de
§4: POSIÇÃO DO CC. Após a publicação do CC, autores como PIRES DE LIMA,
subjectivista da posse.
OLIVEIRA ASCENSÃO, antes de revista a sua posição, defendeu que a lei portuguesa
Todavia, todas as leis actuais, incluindo o nosso CC, contêm o factor negativo legal
apontado por JHERING relativamente à redução da posse à mera detenção [art. 1253º], pelo
apesar do acolhimento que tiveram as orientações subjectivistas, numa primeira fase, não
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respeito.
§5: POSIÇÃO ADOPTADA. Com excepção do art. 1253º a), não há, no CC qualquer
objectivista [art. 1251º]. Por outro lado, não só se admite a posse por quem não tenha uso da
razão [art. 1266º], e a capacidade de aquisição da usucapião por incapazes [art. 1289º-2],
como também se indicam situações de detenção, por defeito [o factor legal], ao estilo de
JHERING [art. 1253º]. Mais: considerando a ampla defesa possessória atribuída também ao
controlo material da coisa; um sistema subjectivista, por seu lado, exige a demonstração e
prova do animus.
ministeriais [vide anteprojecto de PINTO COELHO], cuja invocação não procede por não
terem tido qualquer acolhimento legal, e as teorias de PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA,
Sobra-nos o disposto no art. 1253º a), norma que outrora serviu de base ao
§6: O ART. 1253º a). Aquela que é a única norma do CC com referência ao animus
OLIVEIRA ASCENSÃO propõe que a norma em causa contemplaria os casos nos quais o
agente declarasse não querer ser possuidor. MENEZES CORDEIRO e PEDRO ALBUQUERQUE
irrelevante, não sendo a actuação voluntária descaracterizada pela mera protestatio facta
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declaração de sinal contrário [vg sentar-se em cadeira sob toldo, na praia, e declarar não
querer alugá-la]. Por outro lado, a posse provoca o aparecimento de direitos e de deveres,
pelo que até o possuidor de má fé responde pela perda da coisa, vg [art. 1269º e 1271º].
A solução, para não ser possuidor, pautar-se-ia pelo abandono da coisa ou por uma
apontados por OLIVEIRA ASCENSÃO devem ser reconduzidos, assim, às situações de detenção
previstas no art. 1253º c) [todos os que possuem em nome alheio, de um modo geral – vg
arrendamento].
foi adquirido em termos tais que a própria lei afasta a posse, desde que a situação se não
poderes de facto sobre bens do domínio público, vg [art. 202º-2] – porque a sua posse não é
permitida; nulidade. O raciocínio de aplicação desta teoria deve pautar-se pelo afastamento
das alíneas b) e c), em primeiro lugar. Para PEDRO ALBUQUERQUE, a teoria da causa,
marcadamente objectivistas. Ao nível jurisprudencial não há, hoje, uma dogmática autónoma
§7: DETENÇÃO. Por detenção entende-se as situações em que, embora haja exercício
de poderes de facto, não se constitui a relação jurídica posse. O legislador refere-as para, na
tolerância [art. 1253º b], equivalentes aos actos facultativos consagrados no Código de Seabra
[que não constituiriam posse], praticados com a tolerância do proprietário e por razões de
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HENRIQUE MESQUITA, acolhe uma noção ampla de tolerância, além da mera simpatia,
e aquelas em que se actua em nome de outrem, mesmo sem representação formal [vg gestão
é possuidor quanto à servidão, mas mero detentor quanto ao terreno de B]. O CC não atendeu
os gestores de negócios sem poderes representativos adquirem logo a posse, já que actuam
o poder de facto foi adquirido em termos tais que a própria lei afasta a posse, vg o exercício
exemplo:
propriedade: a posse será, assim, interdictal e imprópria para usucapião [cfr. infra].
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aquisição dos frutos], a função da mesma pauta-se pela tutela dominial [da propriedade ou do
adquira os frutos.
Classificações da Posse
• Classificações legais:
art. 1259º-2.
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aparência].
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• Classificações doutrinárias:
nenhuma].
usucapião.
§2: POSSE OCULTA. Poder-se-ia admitir uma posse oculta, quando exercida de modo
a que o conhecimento, pelos interessados, não fosse possível [art. 1262º a contrario].
Todavia, sempre se entendeu que a posse deve ser acompanhada de publicidade, tal como
dispõe o art. 1251º [“poder que se manifesta”] ou o art. 1263º a), relativamente ao
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MENEZES CORDEIRO considera que a posse, para se constituir, terá de ser cognoscível
pelos interessados. A sua subsistência, essa, poderá ser clandestina, embora neste caso nada
mais seja do que posse interdictal. Define-se quanto ao modo como é exercida em contínua, e
posse contra terceiros, mas já não contra o esbulhado. O possuidor oculto não
oculta se torne pública para que valha para usucapião. Recorde-se que
coerente, já que não menciona qualquer controlo material oculto, mas sim
• Controlo material oculto, e que assim permaneça: posse lato sensu que não
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considera que este tipo de “posse” pode subsistir de forma clandestina [vg o
ética, já que a posse do esbulhador tem que ser efectivamente conhecida do esbulhado, e
desconhecida do esbulhado, ou pública, se conhecida pelo mesmo. Por outro lado, o controlo
exemplo:
O furto de coisa que logo é ocultada não constitui esbulho, vg, mas sim ocultação de
controlo material, por não existir uma verdadeira posse [um verdadeiro apossamento,
enfim].
Vicissitudes da Posse
novo, ou adquirida de forma derivada [sujeito recebe de outrem uma situação já constituída].
de uma coisa, previsto no art. 1263º a), é, para PEDRO ALBUQUERQUE, a prática reiterada
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existente – pode ser de bem próprio ou alheio. Não se confunda com ocupação: forma
casa].
coisa sobre a qual incidia uma situação possessória de outrem, que não deu qualquer
tinha o controlo material da coisa, ainda que no âmbito da mera detenção. São duas as
– restantes formas de detenção [art. 1253º a), b) e c], para além do controlo
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era detentor.
possessório sobre a coisa [tradição material, por mútuo consentimento, cedência e correlativa
integre. A tradição simbólica, essa, pode ser de três tipos, de acordo com a tradição romana:
• Traditio longa manu: acordo translativo que opera à distância [vg apontar, de
longe]
Nota: o elenco que consta do art. 1263º não é taxativo, já que não inclui a
que, mantendo o transmitente no controlo da coisa, faz dele detentor. Aqui observamos o
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classifica-o enquanto apenas mais uma forma de tradição simbólica [entrega da coisa através
A sucessão na posse [art. 1255º], essa, nada mais é do que um fenómeno de sucessão
próprio sensu, e não uma mera transmissão da posse que opere mortis causa – opera ex lege.
permanece estática a situação possessória, ainda que com um sujeito diferente. A posse do
do legado: o legatário, para ser possuidor, tem de ter o controlo material. A sua boa fé ou má
destruição da coisa, colocação da coisa fora do comércio, esbulho por mais de um ano e
não constitui esbulho. Os requisitos são, nessa medida, similares: materialidade, reiteração
A perda da coisa [art. 1267º-1b e 1269º], essa, consiste na sua saída fortuita/não
no sentido de não prever as hipóteses de perda por esquecimento da coisa por um breve
período de tempo, vg: se o controlo material for restabelecido, não há perda da coisa. A
perda da coisa só envolve extinção da posse com o concurso de nova posse, por mais de um
A destruição [total] da coisa [art. 1267º-1b] inviabiliza, por seu lado, o controlo
material sobre ela, enquanto que a colocação da coisa fora do comércio [vide mesma alínea]
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CORDEIRO].
O esbulho [posse de outrem contra a vontade] por mais de um ano [art. 1267º-1d e 2]
[ónus] que caducará findo esse prazo [art. 1282º], constituindo-se imediatamente nova posse.
tratando-se, na verdade, apenas da outra face da tradição. Duas faces: perda da posse para o
Não sendo taxativo, entende-se que o art. em análise não exclui a perda da posse
pela posse de terceiros de boa fé após esbulho [art. 1281º-2], pela expropriação, pelo não uso
[art. 298º-3], pela venda judicial de bens em processo executivo e pela ocultação do controlo
de restituição da posse.
acção de restituição podia ser intentada também contra esses terceiros. Orientação diversa
foi adoptada subitamente, aquando da segunda revisão ministerial do CC, pelo que é esta
boa fé que adquira a posse do esbulhador é, assim, tutelado pela nossa ordem jurídica
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Efeitos da Posse
relevar que encontramos influências deste instituto na norma do art. 1301º: quem adquirisse
de boa fé uma coisa móvel tornar-se-ia proprietário desta, ainda que o alienante não fosse
Nota: recusa do princípio de posse vale-título – quem, de boa fé, adquirisse coisa
efectuar a alienação; a posse de boa fé de uma coisa móvel bastaria para adquirir a
responde pela perda da coisa se tiver procedido com culpa. A contrario sensu, infere-se que o
objectiva [pelo risco] a acrescentar às hipóteses previstas nos arts. 500º e seguintes. A
possuidor, ainda que de má fé, não responderá se demonstrar que o possuidor prejudicado
teria sofrido o dano de qualquer modo. Se não o provar, e ainda que a perda da coisa não lhe
ALBUQUERQUE concordam com esta solução, que poderá obstar a injustiças de diversas
ordens.
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diferenciação:
ou de má fé
para a coisa
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direitos reais: a acessão [não confundir com acessão da posse, art. 1256º - cfr. infra §5]. As
melhorar a coisa. Nesse sentido, podem ser levantadas, desde que não haja detrimento para
Já a acessão [art. 1325º ss], por seu lado, é uma forma de constituição de direitos
reais que se caracteriza pela incorporação inseparável de uma coisa a outra [incorporação de
uma coisa noutra que não lhe pertence] e, por isso, impossível de levantamento sem
todo o regime possessório remete para as benfeitorias, e não para a acessão, e porque há um
do direito real correspondente à sua posse. Carece de invocação: pelo possuidor ou até
mesmo pelo titular do direito real de fundo, sem título de aquisição. Esta forma primária
[correspondentes à sua posse – faz surgir um direito real novo, limitado unicamente pela
posse a que se reporta] carece, todavia, da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos
[art. 1287º]:
• Posse
1300º].
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arrendamento].
• Prazos legais
posse
o Bens imóveis:
[art. 1294ºa].
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[art. 1294ºb].
MENEZES CORDEIRO]:
fé: 10 anos.
• Legitimidade
• Consequências
[art. 1288º].
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o Implicação das regras da prescrição, nos termos dos arts. 1292º, 300º-
Tutela Possessória
animus], a tutela possessória tende a ser alargada a todos que tenham o controlo material da
coisa: deve, por isso, ser concedida a todos os direitos reais de gozo, aos direitos reais de
garantia que permitam o controlo material sobre a coisa e aos direitos pessoais de gozo.
Ainda que o art. 1251º limite a posse aos direitos reais, uma solução mais equilibrada
dispensaria semelhante restrição [MENEZES CORDEIRO]. Assim, deve-se entender que a tutela
possessória abrange também os direitos reais de garantia [ou de aquisição] que facultem o
apossamento, ainda que a referida posse seja meramente interdictal e que não faculte, por
isso, a usucapião. A defesa possessória é instrumental, pelo que pode ser dispensada
direitos pessoais de gozo são estruturalmente reais [art. 1037º-2]. A doutrina dominante
considera-os direitos de crédito, já que o locatário e o comodatário têm o uso da coisa com
base num vínculo obrigacional que o proprietário assume num contrato de locação e de
é titular de um direito real de gozo limitado, já que dispõe das faculdades de uso e de fruição
directa sobre a coisa – doutrina realista; direito real oponível erga omnes [art. 1037º-1]. A
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comodato [quando gratuitos, art. 1133º-2]. Para MENEZES CORDEIRO, negar a defesa
possessória a quem tenha o controlo material de uma coisa equivale a abdicar da ordenação
âmbito das coisas corpóreas [realidade imaterial]: a analogia é possível, caso a caso, já que
posse relativamente a cada uma das coisas corpóreas que compõem o estabelecimento, por
maioria de razão deve a posse ser tutelada relativamente ao estabelecimento no seu todo.
Recorde-se que também esta posse é interdictal e, por isso, limitada à defesa e à fruição e
consequentemente não extensiva à usucapião. Fora dos direitos reais de gozo, a usucapião
Qualquer das acções possessórias só vale se o possuidor não for convencido na questão de
1282º].
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perturbado na posse por outrem [art. 1276º] sem que, para tal, a sua posse
objectivas].
turbação:
exercer
existir um direito real – daí que o possuidor só seja mantido ou restituído se não for
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convencido na titularidade do direito, sendo melhor a posse: titulada, mais antiga e actual,
primeiro pode recorrer à acção de reivindicação do direito real de fundo, nos termos do art.
restituição da coisa. Já não pode, todavia, defender a posse, por ilegitimidade. Esta acção
coisa.
Natureza
posse enquanto a realidade fáctica da detenção de uma coisa por alguém com a intenção de
se apropriar dela. Esta é, afinal, a opinião mais comum, sustentando-se mesmo que a
natureza da posse seria contrária à de um direito, por ser, muitas vezes, efeito do dolo, da
violência ou da injustiça.
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§3: POSSE É UM DIREITO. Sendo a posse protegida pela lei, dir-se-ia tratar-se de uma
realidade jurídica. Sendo a posse uma realidade jurídica, deve ser entendida enquanto acção,
jurídica, já que pode haver posse sem controlo material [vg a posse do
com eficácia real] – não há absolutidade no sentido em que não pode ser
direito.
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directo e imediato de uma coisa mediante defesa erga omnes. Revista a sua
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§1: FUNÇÃO. A função do registo predial é dar publicidade à situação dos prédios,
com vista à segurança do comércio jurídico imobiliário [art. 1º CR Predial]. Enquanto que a
publicidade dos direitos reais é espontânea, relativa aos poderes materiais a eles inerentes, a
Registo Predial, por funcionários públicos que respondem civil, criminal e disciplinarmente,
O registo tem como efeito principal a presunção de que o imóvel ainda pertence à
urbano.
• Quanto à eficácia:
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jurídicos.
70º CR Predial].
definitivo.
pelas partes. Com a reforma legislativa de 1984 o registo predial passou a estabelecer um
encargo [ónus material [art. 3º-2 e 9º CR Predial]: um dever de comportamento que não pode
ser exigido no seu cumprimento. Enquanto permissão, o encargo é meramente facultativo mas
que, a não ser observável, comporta consequências desfavoráveis [vg indisponibilidade dos
bens, art. 9º CR Predial]. Tais consequências não constituem sanções, já que a obtenção do
norma jurídica.
interessados, salvo nos casos legalmente previstos de registo oficioso [vg usufruto], art. 41º
CR Predial.
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propõe uma visão lata deste princípio, na medida em que o conservador será o “guardião da
dos requerentes.
Assim, e no mesmo sentido, entende MENEZES CORDEIRO que o conservador não deve
registar mecanicamente os actos, mas antes assegurar-se da validade dos mesmos, devendo
recusar o registo quando essa invalidade seja manifesta [art. 69º CR Predial, taxativamente].
Refere MOUTEIRA GUERREIRO que o registo não é, por essa razão, um “simples arquivo de
documentos”.
Perante dúvidas, pode registar provisoriamente o facto, nos termos supra [art. 70º CR
Predial].
§3: LEGITIMAÇÃO. Os factos não podem ser titulados sem que os bens estejam
constituir um encargo]. Este preceito dirige-se aos notários e atribui o ónus da prova da
jurídica. Proíbe que seja lavrado registo quando o trato sucessivo esteja interrompido: cada
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§6: TIPICIDADE. Apenas os actos previstos na lei devem ser submetidos a registo.
• Vícios substantivos:
• Vícios registais:
ilidíveis [iuris tantum]: o direito existe; e pertence a quem está inscrito como seu titular [art.
Todavia, quando a aquisição desse direito ocorra por força do registo [aquisição
tabular, por subaquisição, nos termos infra], teremos uma presunção inilidível [iuris et de
iure] que impõe a inoponibilidade do direito real a terceiro que, de boa fé, registou a sua
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A B C subadquirente do pseudoadquirente
Esta hipótese será analisada após breve incurso pelos efeitos do registo predial.
nem tira direitos”: esta é a regra, na nossa ordem jurídica, embora não seja exclusiva [perde
eficácia do direito em causa. É o caso do registo da usucapião, art. 5º-2 CR Predial, em nada
prejudicada pelas vicissitudes registais e cujo registo nada traria de novo à situação jurídica
situação registal ou substantiva, facto que sustenta a concepção de que a usucapião é o título
direitos].
Também assim o é no caso de registo da mera posse, para efeitos da usucapião [art.
B n/reg
A reg
consolidada se registar o prédio antes de C o fazer [art. 5º-1 CR Predial] – efeito comum,
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Direitos Reais – Lara Geraldes @ FDL
entre nós: consequências indirectas do registo. Todavia, esta regra tem alcance menor: a
posição de B já era oponível inter partes, com A, e mesmo com C, se estiver de má fé, não
excepcional, depende a eficácia inter partes de determinados factos jurídicos [vg hipoteca,
art. 4º-2 CR Predial e 687º]. Antes do registo, o negócio é incompleto, vg procuração sem o
direito a non domino [aquisição tabular] face à lei substantiva e atribui posições jurídicas
substantivas. Pode ser exemplificado mediante duas perspectivas, que serão desenvolvidas no
capítulo seguinte:
B n/reg
A reg
seu nome.
A B C subadquirente do pseudoadquirente
A vende um prédio a B do qual não era proprietário, por falso título, vg. B regista a
enquanto uns reclamam um sentido mais restrito, outros tendem para alargar o seu âmbito.
orientação, nos termos da qual terceiros seriam as pessoas que do mesmo autor adquiriram
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Direitos Reais – Lara Geraldes @ FDL
direitos incompatíveis sobre o mesmo prédio. Seria indiferente a aquisição a título oneroso ou
Alargando o conceito de terceiros preconizado por VAZ SERRA, ainda que de forma
subtil, sustentaram ANTUNES VARELA e HENRIQUE MESQUITA que esse conceito abrangeria
igualmente aqueles cujos direitos tenham esse alienante como sujeito passivo, ainda que ele
não haja intervindo nos actos jurídicos [nos casos de penhora, vg]. O primeiro dos autores
efeitos de registo, por não ser exigível a imposição de maior diligência que a mera consulta
do registo.
entendimento de terceiros mais lato que os anteriores: terceiro seria quem fundasse o seu
terceiro para efeitos de registo, segundo esta perspectiva. Não mereceria tutela quem,
adquirente que haja adquirido a título gratuito, por não existir qualquer investimento de
B n/reg
A reg
A é proprietário de um prédio com registo a seu favor. Vende-o a B, que não regista.
B é o proprietário, ainda que a sua posição jurídica seja precária. O prédio continua registado
em nome de A, pelo que este vende-o a C, que o regista finalmente em seu nome. A venda é
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Direitos Reais – Lara Geraldes @ FDL
de bem alheio, nula nos termos do art. 892º, e adquirida a non domino, mas ainda assim
Estiver de boa fé
Registar
C não registar
Nota: os requisitos de boa fé, onerosidade e registo devem ser comuns para as duas
CARVALHO FERNANDES].
mero efeito do contrato [art. 408º-1]. Todavia, nos termos do art. 5º-1 do CR Predial, os
factos sujeitos a registo só produzem efeitos contra terceiros depois do respectivo registo.
Pergunta-se: não estando o CR Predial em sintonia com o CC, como conciliá-los, de harmonia
com a unidade do sistema jurídico? O direito real apenas vale entre as partes porque se torna
oponível a terceiros, após registo? Será um direito real meramente relativo, antes de inscrito?
Cremos que não. OLIVEIRA ASCENSÃO sustenta que seria contra toda a tradição
cultural portuguesa sustentar que antes da inscrição não há direito real. Neste âmbito
B n/reg
A reg
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Direitos Reais – Lara Geraldes @ FDL
seu favor. Vende-o a B, que não regista a aquisição. B adquire, ainda assim, o direito de
Predial], este vende o prédio a C, que regista a aquisição. Embora C tenha adquirido a non
domino [venda de bem alheio], torna-se adquirente a domino, na medida em que registou e,
pertencia a B e era absoluto, apesar de não inscrito. Esta teoria é apresentada por OLIVEIRA
transferência do direito real opera-se por meio do contrato, salvo quando se trate de coisas
imóveis ou de coisas móveis sujeitas a registo. Neste caso, a constituição ou transferência dá-
se por mero efeito do contrato, entre as partes ou os seus herdeiros, mas em face de
A B C subadquirente do pseudoadquirente
A vende a B um prédio do qual não era proprietário, vg por falso título [venda de bem
alheio, nula: art. 892º]. Apesar do vício substancial, B registou a aquisição e vendeu o prédio
a C, de boa fé. Três anos de expiação volvidos, A instaura uma acção de declaração de
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três anos, contados a partir do negócio que A realizou com B, sem que estes
não pode opor o seu direito a C. A posição de C é inatacável. Regime mais gravoso
prazo de expiação de três anos, basta que C registe a sua aquisição antes de A
C e menos conveniente a A.
substantivo, que só seria aplicável quando não existisse registo prévio a favor de A, o primeiro
Por seu lado, OLIVEIRA ASCENSÃO opta pelo regime substantivo e considera o prazo
de expiação de três anos para instauração da acção de declaração de invalidade “uma cautela
curiosa” da lei.
registo prévio.
civil considera o registo uma excepção ao regime geral da invalidade e que a lei
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Poder-se-ia dizer que nada impediria a revogação do art. 291º pelo art. 17º-2 CR
quisesse revogar uma norma substantiva por uma norma técnica ou registal [SANTOS JUSTO e
PEDRO ALBUQUERQUE]. Por outro lado, não valendo entre nós a posse vale título [cfr. supra:
quem adquirisse de boa fé uma coisa móvel tornar-se-ia proprietário desta, ainda que o
alienante não fosse proprietário], não existe qualquer razão para a titularidade registal
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neste âmbito, o direito real de gozo mais amplo, quando plena. O usufruto,
por seu lado, é menos amplo que a propriedade. O uso, habitação e servidão
um direito real de gozo sobre uma coisa [vg direito de preferência com
eficácia real e contrato promessa com eficácia real]. Abordaremos este tipo
o Penhor
o Hipoteca
o Retenção
o Privilégios creditórios
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A análise que faremos será mais detalhada em relação aos direitos reais de gozo
suas faculdades, enfim [art. 1305º]. OLIVEIRA ASCENSÃO considera que o gozo não é
proprietário. Por outro lado, pode haver propriedade sem a faculdade de disposição da coisa,
corpórea.
até ao espaço aéreo correspondente à sua superfície, bem como até ao subsolo, nessa mesma
área. Ressalve-se que, todavia, nunca é a propriedade estendida de forma ilimitada em toda
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Características da propriedade:
coisa.
Relativamente à sua natureza jurídica, várias teorias lograram explicitá-la nos termos
seguintes:
enquanto o direito real mais extenso permitido sobre uma coisa – o que dizer
que consideram que o usufrutuário não tem, ainda assim, a generalidade dos
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lei, a propriedade é nula [art. 294º], embora possa ser convertida noutro
verifica-se:
justa indemnização].
• Outros exemplos:
independentemente de culpa
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portas
podem ser consideradas como tal! A coisa ocupável deve ser [art.
1318º]:
Móvel
Outros exemplos:
1321º]
1322º]
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abandono].
Natural: vg aluvião
• Mobiliária:
o União
De boa fé
[art. 1333º]
De má fé [art.
1334º]
o Confusão casual
o Especificação
De boa fé
[art. 1336º]
De má fé [art.
1337º]
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1316º].
• Meios extrajudiciais:
• Meios judiciais:
sujeita a registo [art. 3º-1a) CRPredial, sem o qual não produz efeitos
propriedade, ainda que ilidível, com inversão do ónus da prova [arts. 1268º e 344º-1].
• Expropriação – imóveis
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coisa móvel, e não mera deterioração. A coisa torna-se res nullius, susceptível
o Móveis
sejam simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa [art. 1403º].
Os seus direitos são qualitativamente iguais, embora possam ser quantitativamente diferentes
[as quotas presumem-se quantitativamente iguais, no silêncio das partes – art. 1403º-2].
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• Comunhão de direitos: direito patrimonial, quer seja direito real, quer seja
1404º].
plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância: direito real
de gozo [art. 1446º], não exclusivo, limitado, temporário [art. 1443º] e que recai sobre um
consiste na faculdade de se servir de uma coisa alheia e haver os respectivos frutos [art.
1484º]: direito real de gozo, não exclusivo, limitado, temporário que recai sobre coisa alheia.
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Será habitação quando esse direito respeitar à casa de morada [art. 1484º-2]. É um direito
[art. 1485º].
inseparáveis. Requisitos:
• Encargo
• Prédio
• Donos diferentes
§8: DIREITOS REAIS DE AQUISIÇÃO. A respeito dos direitos reais de aquisição importa
• Contrato promessa com eficácia real: negócio jurídico em que uma das partes
o Declaração expressa
presencial de assinaturas
o Inscrição no registo
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