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ESTADO DE MINAS - DOMINGO, 9 DE FEVEREIRO DE 2003 PÁGINA 27

GERAIS

❚ BH DE RISCO
EDIFÍCIOS TRADICIONAIS, COMO JK, MALETTA E ACAIACA, AINDA NÃO SE ADEQUARAM TOTALMENTE ÀS NORMAS DE SEGURANÇA PARA ENFRENTAR
ACIDENTES. APESAR DISSO, O CORPO DE BOMBEIROS AINDA CONSIDERA A CAPITAL “RAZOAVELMENTE SEGURA” PARA CASOS EMERGENCIAIS

Prédio antigo exige plantão diário


LUIZ FERNANDO CAMPOS como uma escada de incêndio –
que, por limitações financeiras,
Os edifícios antigos de Belo o condomínio, com seis mil ha-
Horizonte dão um show de mau bitantes, ainda não dispõe.
exemplo, devido à falta de estru- No caso do Maletta, na aveni-
tura para garantir a segurança da Augusto de Lima, o fato de
de moradores na hora de um ser um prédio ao mesmo tempo
acidente de grandes proporções, residencial e comercial dificulta
como um incêndio. Por ser uma o cumprimento das normas. Nos
cidade nova, com pouco mais de andares onde há lojas, as esca-
100 anos, o Corpo de Bombeiros das são trancadas com grades, o
considera a capital “razoavel- que impossibilitaria o uso delas
mente segura”, já que muitos para fugir do fogo. Teixeira
prédios contam com a estrutura acrescenta que há um número
necessária para enfrentar emer- expressivo dos chamados “ga-
gências. Além disso, a cidade so- tos” – gambiarras elétricas que,
fre com a falta de hidrantes nas muitas vezes, são a causa de in-
ruas, principalmente nos bairros cêndios. No Acaiaca, há um bom
periféricos. sistema preventivo, com man-
De acordo com o tenente-co- gueiras e extintores, porém no-
ronel Cláudio Teixeira, do 1º Ba- vamente o orçamento apertado
talhão dos Bombeiros e especia- não possibilita a instalação de
lista na área de gerenciamento uma escada de incêndio.
de desastre, edifícios tradicio- A falta de hidrantes na cida-
nais como o JK, Maletta e Acaia- de começou, conforme o tenen-
ca, no Centro de Belo Horizonte, te, depois que houve o cresci-
não têm estrutura que dê supor- mento desenfreado da capital,
te para acidentes porque foram sobretudo após a década de 60.
construídos antes da Lei Munici- “Hoje há uma defasagem signifi-
pal 2.060, de 1972, que estabe- cativa de hidrantes na periferia.
lece as exigências de segurança. Dentro do limite da avenida do
“Esses prédios tiveram que se Contorno, a coisa é tranqüila, já
adaptar, mas ainda apresentam que a área abrangia o planeja-
riscos. No JK, por exemplo, há mento da cidade”, explica. Os
uma brigada de incêndio que faz síndicos do JK, Maletta e Acaia-
MARCELO SANT’ANA/03/12/01
plantão 24 horas, e o risco dimi- ca não foram localizados pela
nuiu”, destaca. No entanto, fal- reportagem ontem para falar EDIFÍCIO MALETTA
tam mecanismos de evacuação – sobre a situação dos edifícios. Vistoria feita no subsolo do prédio, que é comercial e residencial, é também dificultada pelo não cumprimento das normas de segurança

Bombeiro critica falta Moradores desafiam o perigo na BR-381


de política preventiva Para a dona de casa Jandira
de Fátima Morais, de 32 anos,
A falta de uma política de o perigo é visto da janela de seu
prevenção, que reflete a baixa barracão, na Vila da Luz, no
preocupação do brasileiro com bairro Goiânia, região Nordes-
possíveis acidentes, contribui te de Belo Horizonte. Ela, o ma-
para a precariedade da infra-es- rido e os três filhos, não sabem
trutura e capacitação dos órgãos o que são noites bem dormidas,
públicos no momento de uma tampouco refeições feitas sem o
tragédia. De acordo com o te- estremecer de pratos e copos. A
nente coronel Cláudio Teixeira, família vive à beira da BR-381,
do 1º Batalhão do Corpo de estrada para João Monlevade, e
Bombeiros e especialista em ge- convive de perto com carros,
renciamento de desastres, rara- ônibus, caminhões e carretas. O
mente acontece uma Análise In- CRISTINA HORTA/19/10/2001 barulho é ensurdecedor, mas is-
terdisciplinar de Presença de
Acidentes (Aipa), que reúne re-
“O COMBATE À so é apenas um detalhe diante
de tantas deficiências.
presentantes de vários órgãos
para a discussão de catástrofes
CRIMINALIDADE É MUITO Dona Jandira conta que há
um ano e meio se mudou para
e a capacidade de resposta da
própria comunidade.
MAIS VISADO QUE O o barracão, já que, há cerca de
dois anos, um carro invadiu
“A Aipa geralmente é feita
em países onde há o risco imi-
COMBATE A SINISTROS, E sua casa em alta velocidade e
destruiu as paredes da cons-
nente de grandes acidentes co-
mo terremotos, como é o caso
OS RECURSOS PARA ISSO trução e por pouco não matou
uma de suas filhas. “Parecia
do Japão. Com ela, vemos a vul-
nerabilidade da população em
SÃO MUITO MAIORES. MAS que os carros estavam fazendo
racha. De repente um deles en-
sofrer riscos e danos causados
por eles. Mas em face da carên-
O QUE A GENTE PERCEBE trou dentro da minha casa e
acabou com a sala e chegou a
cia de treinamento e da coesão
dos órgãos públicos, sempre vai
É QUE A POLÍCIA MILITAR atingir o berço onde estava mi-
nha menina”, relata. Segundo
haver grandes ocorrências no
País”, explicou Teixeira. “É uma
MUITAS VEZES VAI ATRÁS ela, o motorista não pagou o
conserto da casa porque “ali
BETO NOVAES

MORTE
questão cultural, já que no Brasil
não há ocorrência de terremo-
DE OCORRÊNCIAS não era lugar de se morar”.
Para construir a casa atual,
Ocupação desordenada muitas vezes acaba em tragédia às margens da rodovia, no bairro Goiânia
tos, maremotos, vulcões ou fura-
cões, o que faz cair a importân-
ASSISTENCIAIS, QUE grande parte do investimento
foi gasto em cimento, já que as
cia da prevenção. O jeito é ten-
tar resolver na hora que aconte-
SERIAM NOSSAS” paredes facilmente se trincam.
Ela confessa ter muito medo
cel”,completa o major Paulo ❚ Tenente-coronel Cláudio Teixeira, de morar no local, no entanto
Adriano Cunha, do 1º Batalhão. do 1º Batalhão de Bombeiros não vê outra possibilidade se-
Ele considera que deveria não acostumar-se à realidade.
haver melhor preparação dos “A gente não tem para onde ir,
órgãos públicos municipais, es- Teixeira conta que, por mas é difícil saber que você
taduais e da população na hora exemplo, as previsões meteo- nunca vai dormir tranqüila. De
de se comportar em um grande rológicas realizadas com ante- madrugada, quando os carros
acidente. “Sequer há um estudo
na Região Metropolitana de Be-
cedência não são trabalhadas
de maneira prevencionista. “Se
derrapam, eu empurro meu
marido e me jogo no chão, já é
“A GENTE NÃO TEM PARA
lo Horizonte que nos traz infor-
mações sobre o efetivo e a es-
a prefeitura, Cemig, Copasa,
Defesa Civil, Bombeiros, entre
automático”. Há cerca de seis
meses, um vizinho que costu-
ONDE IR, MAS É DIFÍCIL
trutura dos órgãos, número de
ambulâncias e de leitos para
outros órgãos, sabem se vai
chover forte, um trabalho ge-
mava ficar assentado na beira
da estrada foi atropelado e
SABER QUE VOCÊ NUNCA
atendimento a vítimas de sinis-
tros”, salienta Cunha.
rencial de prevenção contra
desastres poderia ser feito.”
morreu na hora.
Já na Vila Vietnã, no bairro
VAI DORMIR TRANQÜILA.
São Paulo, região Nordeste da DE MADRUGADA,
Estudo busca segurança capital, o caos se instala assim
que as chuvas desabam. A vi-
la, localizada embaixo de um
FAVELA VIETNÃ
José Carlos vive perto do córrego do Onça, e tem medo quando chove QUANDO OS CARROS
Na última quarta-feira,
uma reunião com voluntários
de prevenção contra incêndio e
pânico – que prevê exigências
viaduto e às margens do córre-
go do Onça, sofre quando há José Santos Vieira, de 47, diz informou que a Vila Vietnã é
DERRAPAM, EU EMPURRO
de vários órgãos, promovida
pelo Conselho Regional de
como o teste de estanqueidade
em tubulações, para evitar rom-
transbordamento das águas.
“Em alguns barracos, a água
que em todos os anos acontece
o mesmo problema. “Quando
considerada uma área de ris-
co de inundação. A área está
MEU MARIDO E ME JOGO
Química (CRQ-MG), discutiu a
possibilidade de se fazer um
pimentos e explosões – está pa-
ra ser aprovado no município.
vai até o teto, e o jeito é tirar
mulher e filhos e sair corren-
chega a época de chuva, fica-
mos três, quatro dias em claro,
incluída no plano global espe-
cífico de habitação da capital,
NO CHÃO, JÁ É
estudo sobre a segurança quí-
mica e prevenção a desastres.
Segundo ele, os bombeiros de-
veriam ter poder de polícia ad-
do. Na última chuva, perdi tu-
do”, conta o garçom desempre-
à espera dela”, ressaltou.
Por meio de sua assessoria
que prevê o remanejamento
dessas famílias, que provavel-
AUTOMÁTICO”.
“É uma discussão inicial de ministrativa para embargar gado José Carlos Gonçalves, de de imprensa, a Secretaria Mu- mente serão reassentadas na ❚ Jandira Morais, que vive
pessoas capacitadas que po- uma obra irregular. Atualmente, 36, pai de sete filhos. O vizinho nicipal de Regulação Urbana mesma região. em barracão às margens da 381
dem ajudar em ações preven- o órgão só pode notificar e re-
tivas. Num segundo momento, passar as irregularidades para
tentaremos obter apoio do go- a prefeitura. OBITUÁRIO
verno do Estado”, explicou a O tenente também conta que
engenheira e conselheira do a demanda dos bombeiros é ca- PEDRO MARQUES, conhecido como
CRQ, Auxiliadora Maria Santi. da vez mais crescente e a quan- “Juvelano”. Nascido em Formiga (MG), em
“São grupos de estudos com tidade de recursos para investi-
uma visão multidisciplinar”, mentos é cada vez menor. No
29/06/25, deixa a esposa, Regina Marques, os filhos
salientou o tenente-coronel ano passado, o orçamento dos Vilma, Ilma, Dilma e Ivan, netos, bisnetos, irmã e
Cláudio Teixeira. Bombeiros foi de cerca de R$ sobrinhos. Comerciante da Sacaria São Pedro Ltda,
No caso de obras irregulares, 6,5 milhões. Para este ano, o va- foi desportista amador, como jogador e dirigente do
Teixeira revela que um decreto lor não passa de R$ 5,2 milhões. Vasco da Gama, do bairro Caiçara, em BH.

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