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O âquêcÍmentoglobat

está a mudar o atlas do virúo


Que efeito está já a ter na üticultura mundial o aquecimento
do globo? Pedro Garcias explica que as consequências já são
visÍveis com a antecipação do tempo das vindimas, e reflecte
sobre o caso particular dos vinhos portugueses.
Se as previsões dos climatologistas próprios "Grand crus". No caso dos excepcional) duas ou três vezes.
se confirmarem, o aumento da ingleses, povo enófilo como poucos, Nesta década, já vamos em três anos
temperatura vai ter consequências seria a felicidade na Terra. Parajá, "Vintage": 2000, 2003 e 2007.
sérias na viticultura mundial. O graças ao aumento da temperatura, Mas não é seguro que a qualidade
cultivo da únha não atravessa o a Inglaterra vai-se afirmando no dos vinhos continue a aumentar, até
mesmo perigo de espécies como o mundo dos espumantes, em porque o excesso de calor não é bom
urso polar, mas é provável que o particular no sul do país, onde o solo para o amadurecimento das uvas. De
excesso de caìor venha a aduÌterar a não é muito diferente do da região acordo com as previsões dos
tipicidade de alguns vinhos (já de Champanhe. E ninguém se mesmos especialistas americanos, a
aconteceu isso em várias regiões admire se, dentro de aÌguns anos, as temperatura média nos próximos 50
francesas na colheita de 2003), que gtandes casas francesas começarem anos deverá aumentar 2,6 graus
surjam novas pragas, que muitas a comprar terras nas cada vez mais Céìsius, o suficiente para que se
regiões vitMnícoìas tenham que se pujantes regiões de l(ent e Sussex, torne " úrtualmente impossíveÌ
reinventar e adaptar se não assegurando, assim, a continuidade cullivar ünha nas regioes mais
quiserem desaparecer e que o mapa do negócio. quentes se os produtores não
vitícola mundial continue a equacionarem medidas de
estender-se rumo aos pólos e O vinho gosta de calor adaptação às mudanças climáticas".
comece a incorporar novas zonas O ünho gosta de soÌ e de calor e ao E as regiões mais ameaçadas, ainda
produtoras, actualmente frias de longo da História beneficiou muito segundo os três investigadores,
mais para a viticultura de qualidade. do aquecimento global, sobretudo situam-se na Califórnia e na
As mudançasjá estão a ocorrer, no chamado Velho l\4undo, ou seja, Península lbérica, onde a ,,
como se constata pela antecipação os paÍses europeus com maiores desertificação tem vindo a ganhar í.íì
do início das vindimas em vários
paÍses. Dentro de algumas décadas,
tradições vinícoÌas, como a França,
Itália, Espanha e Portugal, entre
terreno.
Em Portugal, os maiores receios +
o atÌas do ünho não será
seguramente o mesmo. Até ao Íìnal
outros. EspeciaÌistas de três
universidades americanas (Gregory
recaem sobre o Douro (em
particular sobre ojá tórrido Douro (r
Superior) e o AÌentejo, as regiões a
o
mais quentes do paÍs e onde são
esperados aumentos da temperatura
\,
de 2,4 e 2,8 graus Célsius,
respectivamente. A rega é uma das ^l
respostas possíveis, cada vez mais à
aplicada, de resto, mas o n
aquecimento também levará à
diminuição da água disponível. A
adaptação às alterações climáticas
terá que ser feita em várias frentes,
tdo-
desde a escolha de castas mais
resistentes ao calor e à seca até a
-0
uma gestão mais sustentáveÌ da a,
vinha e da água (sabia que por cada
copo de vinho são gastos, em média, ;è
120 Ìitros de água?), passando por
uma deslocalização dos vinhedos
(r
;&m"J
para zonas mais altas e frescas.
No AÌentejo, devido à orografia

deste sécuÌo, segundo a previsão de Jones, da Universidade do Suì de pìana da região, essa subida da
Bernard Seguin, coordenador das Oregon, Michael White, da altitude das únhas é dificil; no
pesquisas de clima do Institut Universidade Estadual do Utah, e Douro, é mais fácil, face à natureza
National de la Recherche Owen Cooper, da Universidade do montanhosa da região. O
Agronomique francês, o limite Colorado) compararam a moúmento tenderá, assim, a
setentrional da viticultura - que, em classificação atribuída pela leiloeira inverter-se, com os viticultores a
meados do século passado, se Sotheby's ao vinho produzido em 27 fugirem das zonasjunto aos rios, até
estendia da Bretanha à Ucrânia - regiões útivinícolas de todo o agora as mais procuradas, para as
deverá chegar à Escandinávia. mundo nos últimos 50 anos com a mais altas. E a classifìcação das
A boa notícia é que o aquecimento variação dos valores da temperatura vinhas para vinho do Porto, que,
vai melhorar a qualidade das uvas durante o mesmo período e seguindo o método de pontuação de
em muitas regiões, como a nossa concluíram que um aumento da Moreira da Fonseca, continua a
região dos Vinhos Verdes, por temperatura média de cerca de dois beneficiar as que se encontram á
exemplo. E países como a Bélgica, gtaus Célsius correspondeu a uma cotas mais baixas, deixará então de
Holanda ou Inglaterra, hoje sem melhoria gradual e significativa da fazer sentido, o que poderá provocar
clima para a úticultura de qualidade dos vinhos. uma verdadeira revolução fundiária
qualidade, poderão úr também a ter Em Portugal, o passado recente no e social na região demarcada mais
condições para produzir os seus vinho do Porto pode permitir a antiga do mundo no sentido
mesma conclusão. Em média, por moderno do termo.
década, as grandes casas do sector
só declaram Porto Vintage (únhos
de uma só colheita de qualidade

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