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LÁGRIMAS
DE ANJO
MARCOS ALEXANDRE
Lágrimas de Anjo
QUANDO FALTA FÉ ATÉ OS ANJOS PODEM CAIR...
LÁGRIMAS
DE ANJO
“
P
MARCOS ensei em fugir,
mas uma legião
ALEXANDRE já havia me
é roteirista e cercado. Um entre
apresentador de incontáveis caídos.
programas de TV, ‘O que vai fazer?
professor, escritor,
compositor e
O que quer de mim?’
acumula mais de 10 anos de gritava, já desesperado,
experiências vividas nas redações enquanto incontáveis
de grandes jornais e assessorias de mãos me agarravam.
imprensa como repórter e editor-chefe. Aproximando-se
Leitor voraz e orador apaixonado, seus
textos, apresentações e palestras
cuidadosamente,
entusiasmam graças ao uso de uma o Primeiro Entre os
técnica moderna, que adapta elementos Caídos encostou seus
eruditos à linguagem popular para lábios em meu ouvido
transmitir conhecimentos e e sussurou: ‘Eu quero
desmistificar, com muito bom-humor,
conceitos e temas complexos,
suas asas!’ O pânico
polêmicos, mas sempre atuais, e o horror me
como fé, religião, sentimentos inundaram e, num mar
e comportamentos sociais. de vertigem, ouvi a
ordem: ‘Arranquem !!!’”
Marcos Alexandre
LÁGRIMAS
DE ANJO
MARCOS ALEXANDRE
Editora Questão
Lágrimas de Anjo
Agradecimentos:
Ao Deus único
A Cristo Jesus
Ao Espírito Consolador
À minha esposa Rosely e aos meus filhos Suellen,
Alexia Morgana e Marcos Filho
Aos meus pais, minha família e
A todos que me incentivaram a continuar meu trabalho
Capa:
MAX - Marcos Alexandre- Consultoria em Comunicação
Foto do autor: Jovino - Ilustrações: Marcos Alexandre
Prólogo
L
ágrimas do Anjo é um livro despretencioso,
que não tem como objetivo provar ou negar
a existência dos entes sobrenaturais conhe-
cidos como “anjos”. No entanto, o livro é uma ficção romance-
ada baseada em fatos reais, descritos e narrados por pessoas
que estiveram direta ou indiretamente envolvidas nos aconteci-
mentos.
O livro é uma metáfora, uma parábola, um mosaico,
no qual um homem comum se vê diante do sobrenatural e um
ente sobrenatural, por sua vez, redescobre a grandeza contida
em partilhar do destino da humanidade.
Apesar de falar sobre “Deus”, “anjos”, “demônios”,
o livro não é recomendado a “carolas”, religiosos fanáticos e
rançosos, fariseus encruados e falsos moralistas. Até porque
um dos principais personagens fala palavrões, (dane-se que seja
politicamente incorreto) bebe, fuma e não tem pudores em
mostrar seus defeitos. É um homem que tem, ao menos, uma
grande qualidade: é autêntico.
Lágrimas de Anjo
Considerações
Crença popular
Possessão
E
zequias gritava como
um porco e espuma
va como um cão
raivoso e dois diáconos tentavam
segurá-lo. Tentavam impedir que ba-
tesse a cabeça nos bancos. O corpo,
um pedaço de pau, parecia quebrar-se
a cada espasmo. “Ele é-é meu !!! Ele é
meu !!! Pelo amor de D...
aaarrrrghhh!!! Me ajuda !!!! Me Ajuda
!!!”. Eram duas pessoas, duas perso-
nalidades distintas que lutavam para
manter o controle sobre aquele corpo
debilitado. Se continuasse daquele
jeito, Ezequias teria um ataque, um
enfarte...
Assustados, alguns
“irmãos”procuravam se afastar para o
Lágrimas de Anjo
Igreja
O
que cê acha de
“montar” uma igreja
?!?
_Montar uma o quê ?!?
_Uma igreja, cara. Uma igual
àquela que aparece na televisão...
_E para quê? Você dizia
que não acreditava em mais nada...
faltou dizer que era ateu...
_Ah, não, não sou ateu,
não! Até porque “ateu”significa “contra
Deus”. Como é que eu posso ser con-
tra alguma coisa que não existe ?!?
_ Deus não existe? Bem, se
Ele não existe, pra quê “montar” uma
igreja?
_Pra ganhar dinheiro, oras!
E pr’eu não desperdiçar dois anos de
Marcos Alexandre
Ananás...
_Satanás...
_Esse aí mesmo, sair do corpo dele. Pronto.
Impressiono todo mundo! O problema é que o Biju mija nas
calças quando tem os ataques...
_Ainda não acredito que você esteja pensando
nisso...
_Tô pensando e vou fazer... Imagina quando
conseguir lotar o Morumbi !!!
_ Quê ?!?
_ Morumbi, cara, o do São Paulo. Vô fazer um
culto tão grande que vai lotar o Morumba. Aí, é só eu mandar
todo mundo jogar dinheiro, muletas e óculos no gramado.
_O dinheiro, tudo bem, mas para quê as muletas e
os óculos ?!?
_É prova de fé, cara, prova de fé !!! E depois, se
nenhum cegueta ou manquinho for curado, basta ele comprar
o acessório devidamente abençoado pela “Igreja do Santo
Zé”. Vai ser um sucesso !!!
_ Essa loucura não tem fim ?!?
_Não, e vai ser transmitida em cadeia nacional de
rádio e TV.
_E como você pretende fazer isso?
_Simples! Com o dinheiro arrecadado, eu vou
comprar a Globo!
_A Globo?!?
_É... e vai ser só a primeira. Depois eu vou com-
prar jornaizinhos como a “Folha do Estadão” e o “Populares
Lágrimas de Anjo
Natureza Humana
V
ós, humanos, sois
controversos.
Talvez por isso o
Altíssimo tenha tanto interesse em vós.
Para nós, anjos, o que não é virtude é
pecado. Vemos tudo em preto e bran-
co. Como disse o Messias, “Quem
comigo não ajunta, espalha”.
Vós, humanos, sois hipócri-
tas. Nasceis no pecado e achai-vos
dignos de julgardes a vós mesmos, uns
aos outros. Errais, mas não dais aos
outros, vossos semelhantes, o “direito”
de também errar. Nos púlpitos, altares,
lares, usais máscaras de virtude, vestis
o manto dos santos. Longe de olhos
estranhos, no entanto, vos consumis
Marcos Alexandre
Sombras
T
erceiro copo. Esse
troço é horrível !!!.
Aquele desgraçado
do Sérgio me enganou. É a segunda vez
que ele me vende uísque vagabundo.
Paraguai, com certeza. Merda!”, pra-
guejei.
A frustração não se devia,
sinceramente, à qualidade duvidosa do
uísque. A verdade é que eu estava
sofrendo de um tipo de “bloqueio
literário”. Em uma das minhas últimas
viagens em busca de inspiração - e
sobretudo, para desanuviar a mente, na
tentativa de esquecer minhas perdas
recentes -, ouvi a história triste de um
fazendeiro, na realidade, um pecuarista,
e a tragédia que se abateu sobre ele.
Marcos Alexandre
Sonho de menino
T
udo começou quando João Saldanha (que além
de nome de técnico da Seleção era fazendeiro
em Mairi, na Bahia) decidiu comprar mais um
boi reprodutor. João era daquele tipo supersticioso, medroso, até
mesmo indeciso, daqueles que precisam consultar desde horósco-
po até ciganas antes de fazer um negócio. Não que isso não tenha
dado certo até aquele momento. João deixara de ser empregado
na Fazenda Boi Guloso para ser dono de seu próprio negócio.
Nunca mais, depois de vinte anos de trabalho quase
escravo - entrara na fazenda aos 8 anos de idade, órfão de pai e
mãe - iria ficar abrindo porteira pra patrão. Principalmente para Zé
Olímpio, um homem baixo, gordo, com um grande anel de ouro no
dedo, barba e bigodes ralos, meio careca, fedido e suado. Fedido,
mesmo! Enquanto se dirigia para a feira de animais, João Saldanha
lembrava até mesmo do cheiro daquele seu ex-patrão imundo. Zé
Lágrimas de Anjo
mãos machucadas pela lida com os animais. Ela sorriu, talvez per-
cebendo o seu embaraço, o que não ajudou em nada.
_ Dá pra perceber que você é do tipo caladão, igual ao
meu pai - ela arrematou, enquanto soltava sua mão, com suavida-
de e como convinha a uma moça de família. Mesmo que meio
espevitada como Rosinha.
_É que... eu saio muito pouco... respondeu, sem saber
o que dizer. “Bo-bonita festa, né?!?” - gaguejou, desviando os olhos
da menina.
_É... todos os anos eu venho aqui, desde pequena. Eu
nunca tinha visto você antes. De onde você é? - perguntou Rosinha,
os olhos fixos nos olhos de João, e com um brilho esquisito, algo
que João nunca tinha visto. “O que uma moça como essa estaria
fazendo conversando com um ajudante como eu?”, chegou a pen-
sar. Ele se sentia mal, estava meio tonto e pensava se alguém esta-
va olhando... não era possível que uma moça de família quisesse
falar com ele e saber alguma coisa sobre sua vida. Ele nem tinha
família, onde morar direito. Não tinha cavalo seu. Sua vida era se-
lar e alimentar cavalos dos outros, especialmente o alazão Tormen-
ta, do seboso do Zé Olímpio. Não havia nada para saber...
_Eu vim da Fazenda Boi Guloso... - respondeu mesmo
assim. “É a primeira vez que me deix... É a primeira vez que eu
venho...” - ele ia dizer que era a primeira vez que o deixavam sair,
assim, sozinho, sem ser para trabalhar, carregando sacos de aveia,
café, ração ou para acompanhar o gado, mas decidiu consertar a
Lágrimas de Anjo
frase para ... será que queria impressionar uma moça que nem co-
nhecia direito?
_Você trabalha lá? - perguntou Rosinha, curiosa.
_É... é... mais ou menos...
_Como, “mais ou menos”? - retrucou, inquieta. “Tra-
balha ou não trabalha?” - disparou.
_ Trabalho... é que eu também moro lá... - disse, sem
pensar direito.
_ Naquela casa grande, branca, com varanda cheia de
plantas; avencas, samambaias e azaléias? - Perguntou, ávida.
_É... hum... (João Saldanha bem que não queria men-
tir, mas sentiu vergonha de dizer que morava junto aos bois, cava-
los e jumentos. O jeito foi fazer de conta...)
_Que legal!!! - A alegria e o espanto dela o fizeram
pensar que talvez tenha sido melhor mesmo não dizer a verdade...
_ Ah, eu tenho que ir... - João emendou, já achando
que o rumo da conversa não estaria agradando...
_Ah, vai não! - disse a moça, agarrando-o pelo braço
e puxando o pobre João Saldanha rumo à barraca do peixinho.
“Antes você vai me ajudar a pescar uma prenda na barraca da
Mirtes e eu aproveito e apresento você pro pessoal da vila” -, de-
cidiu, enquanto puxava João, que nem sabia como protestar.
_ Fica pra outra vez... - tentava se desvencilhar, com
uma polidez que não parecia sua.
_ Não, não, você vem comigo. Tá vendo aquele placa
Marcos Alexandre
Um novo começo
D
antas não desgrudava de João nem por um ins
tante. Parecia um carrapato. Para onde quer
que João fosse, Dantas ia atrás, tentando dis-
farçar. Mas para um varapau como Dantas passar despercebido
era a mesma coisa de tentar esconder um bambu no meio de um
capinzal. Isso incomodava João Saldanha. Parecia que Dantas o
estava espionando. Mas espionando para quê? A mando de quem?
De Zé Olímpio? Mas por quê? Decidiu afastar esse pensamento da
cabeça e, enquanto examinava alguns animais, assustados com tanto
barulho de fogos de artifício, cornetas, e a gritaria dos donos e
compradores se misturando, começou a lembrar de novo daquele
dia em que conhecera Rosinha. Talvez fosse o cheiro de sanduíche
de lingüiça, ou do pernil que assava na chapa, a poucos metros,
que o fez lembrar da festa junina na Paróquia de São Benedito,
mais de uma década atrás. Ou talvez fosse o cheiro de pipoca, talvez
o mais provável, que o fizesse se lembrar daqueles bons tempos.
Marcos Alexandre
e que não tinha onde cair morto. E João não sentia mais vergonha
disso. Pelo contrário, essa situação o impulsionava a lutar, traba-
lhar mais ainda e economizar cada centavo, guardando tudo na-
quela moringa quebrada, no fundo do galpão velho. Afinal, um dia
ele iria ter que casar com Rosinha e dar-lhe um lar decente. Isso
mesmo, ele já estava namorando Rosinha há seis meses! E com a
permissão dos pais dela, o sapateiro Sebastião, e da costureira
Dona Marta. Que maravilha! Só a via uma vez por semana, anda-
vam pela praça do coreto, de mãos dadas, mas era o céu. Ele
finalmente tinha alguém...
Mas como nem tudo são flores, na Fazenda Boi Gulo-
so a situação começou a complicar. Zé Olímpio, aquele gordo se-
bento, decidira descobrir porque aquele rapazote João estava tão
feliz nos últimos meses, e que tanto ele ia à missa. E por quê estava
tão mais esperto, falante, articulado, se nunca fôra a uma escola. E
mais, como é que se atrevia a conversar com os veterinários e até
mesmo com um engenheiro que por lá passou uma vez, para dar
um orçamento de perfuração de um poço artesiano para garantir
mais água aos animais?
_Dantas, vai ver o que o João anda aprontando e de-
pois cê me conta... - disse o sebento do Zé Olímpio, soltando uma
baforada do cigarro de palha fedido, daquele que deixa os dentes
pretejados, feito com fumo de corda dos mais vagabundos. Era
esse tipo de fumo que Zé Olímpio gostava: o mais barato. Porque,
mesmo rico, o homem era um sovina, um pão duro que não dava
Marcos Alexandre
virou-se e disse:
_ Tá empregado. Comece a trabalhar agora, termi-
nando de escovar meu cavalo...
_Sim, senhor !!! Obrigado, senhor !!! - respondeu João
Saldanha, jogando suas coisas no chão, pegando a escova da mão
do vaqueiro e começando a escovar o cavalo. _ Ahnnn... depois
eu levo o cavalo pra onde, senhor...
_ Pra cocheira. E pode me chamar de Jeremias. Eu
sou o dono da fazenda. O almoço é meio-dia. Não se atrase. -
respondeu o vaqueiro, virando de costas, se dirigindo para a casa
grande e deixando um João Sadanha totalmente boquiaberto.
Marcos Alexandre
Jeremias Guimarães
J
eremias Guimarães era um bom homem. Tinha uma
mulher maravilhosa, a Dona Fernanda, que estava
grávida de seis meses e era um homem muito cons-
ciente de suas responsabilidades. Muito diferente de Zé Olímpio.
Jeremias tinha as feições duras, o rosto severo, cabelos castanho-
grisalhos e um nariz grosso e comprido, meio puxado para baixo,
que acentuava a sensação de que ele sempre estivesse bravo, junto
com as sobrancelas grossas e escuras, e um bigode espesso, com
alguns fios branco-amarelados pelo cigarro. Único vício de Jeremias,
o cigarro. Não bebia, não jogava e nem gostava de ver os animais
sofrendo, ao contrário de Zé Olímpio, que adorava até briga de
galo e não perdia uma rinha. Jeremias sempre estava de jeans.
Calças e jaqueta jeans desbotadas, com uma camiseta branca por
baixo, cinto, botas e chapéu de vaqueiro. Nem parecia o dono da
Lágrimas de Anjo
meses depois que João chegou à Reunidas, Jeremias lhe deu uma
porção de terra para que iniciasse uma plantação e vendeu-lhe umas
cabeças de gado magro, recebendo como pagamento aquele pu-
nhado de trocados que João juntara a vida toda. Pagamento nada!
Jeremias havia dado mesmo aquele gado para ajudar João ! E João
sabia e reconhecia isso. Talvez por esse motivo é que estava se
tornando o mais dedicado empregado que Jeremias já tivera em
toda a sua vida.
João, pela primeira vez, começara a ter sonhos, e de-
via muito a Jeremias. Pouco tempo depois, João já estava se ca-
sando com Rosinha na igreja da Paróquia de São Benedito e os
pais de Rosinha, o sapateiro Sebastião e a costureira Dona Marta,
que fazia questão de contar a todos, boa fofoqueira que ela era,
que o genro João Saldanha iria dar uma boa vida à sua única filha
Rosinha, já que trabalhava na fazenda de um homem bom como
Jeremias Guimarães e estava progredindo na vida.
Nascera gordo e forte e estava crescendo bem e com
saúde, o pequeno Pedrinho, filho de Jeremias Guimarães e Dona
Fernanda. O menino ainda usava fraldas quando Jeremias come-
çou a sentir uma coisa esquisita, um aperto no coração toda a vez
que passava perto do curral. Os animais nunca o haviam incomo-
dado e João Saldanha, o empregado dedicado, que tinha sua pró-
pria terra e seus boizinhos, mesmo assim nunca descuidara dos bi-
chos. Mas alguma coisa o incomodava e todos os empregados
Lágrimas de Anjo
O boi Tufão
P
atrão, o que lhe perturba? - perguntou João
Saldanha de chofre, de repente, sem dar a
Jeremias tempo para pensar. Talvez por isso a
resposta tenha parecido tão absurda, a princípio.
_ Não sei, João. Sinceramente não sei. - respondeu,
balançando a cabeça, Jeremias - “Mas é que toda a vez que eu
passo na frente desse curral eu fico nervoso, com um nó no peito.
Você é a única pessoa que me conhece melhor que minha mulher, e
talvez eu confie mais em você, que eu tenho como se fosse meu
filho, mesmo que não seja, e meu filho verdadeiro, meu único filho
seja o Pedrinho, pra quem eu diria uma coisa dessas... mas eu ando
com muito medo...” - disse Jeremias, com um olhar estranho.
_ Ora, medo do quê, meu patrão? - perguntou João
Sadanha, sem entender.
Lágrimas de Anjo
A velha cigana
J
oão Saldanha não conseguiu dormir direito naque
la noite. Ficou encafifado com o boi Tufão. So
nhou com chifres de boi, com acidentes, com cho-
ro e gritos e acordou suando frio. Rosinha se levantou da cama e
lhe preparou um café com leite bem quente, preocupada com o
marido. “O que poderia ser motivo de tanta aflição?”, pensava,
mas decidiu não perguntar ao marido. Se fosse importante, João
lhe contaria, não contaria? O pior é que João contou.
Depois de contar a Rosinha toda a história sobre os
arrepios na espinha de Jeremias, de toda a sua preocupação, João
argumentou ainda que ele é que deveria ter medo de alguma coisa,
pois sempre fôra supersticioso, e não o patrão, que sempre se
mostrou tão seguro de si. Ele, João, é que na infância não deixava
de pedir a benção à velha cigana Maria, toda a vez que tinha uma
oportunidade...
Marcos Alexandre
A premonição
E
o que é que você veio fazer aqui na casa desta
cigana cansada de viver, meu filhinho João? Tão
cansada de viver estou que até esqueci de que a
vida dos ciganos não é criar raízes como vocês, gadjê, e sim, como
boa calon que sou, sair por aí como o vento, passando de lugar
em lugar... - disse a velha, enquanto estendia o copo de café para
Jeremias, que estava visivelmente contrariado. Não porque o copo
estivesse sujo, não. Mas porque sempre fôra católico. Não prati-
cante, mas católico. E sabia que nenhum padre aprovaria que um
bom católico, mesmo que não praticante, estivesse ali consultando
uma cigana, de um povo que não pára em nenhum lugar. Dizem que
roubam crianças e que praticam magia negra.
_ Não, cigana Maria, eu...- tentou dizer João Saldanha,
sendo interrompido pela anciã:
Lágrimas de Anjo
Benzedor,
Curador,
Benze cruzes
Que luzem
Nas noites de dor
E do andor do santo
Se perdem, saem encantos
Vindos das falanges que rangem
Os dentes pr’o mal
Benzedor,
Curador,
Teias urde,
De proteção
“Sai capapreta, cramulhão !!!”
Nas noites de dor
Do santo do andor
Fulgem luzes
Caem cruzes
Diante da fé
A crença menina
Mais rápida alcança
O que se quer
Do que a velha teoria
Que tal fé vazia
Tropeça, cai, geme
Como quem perdeu um pé
Benzedor,
Curador,
Tremeluze
Sofre, muge
Feito gado
De corte
Sente dores de morte
Nas rezas, nos sinais
Nas dores dos outros,
Nos seus ais
Lágrimas de Anjo
O fim da tempestade
J
oão Saldanha e Jeremias seguiram a viagem toda
calados. Nenhuma palavra foi trocada entre eles.
Quando chegaram na porteira da Fazenda Reuni-
das, Jeremias quebrou o silêncio:
_ João, amanhã bem cedo, quero que você leve o boi
Tufão para o matadouro. - disse.
_ Quê patrão?!? Mas lá o senhor disse que.... - espan-
tou-se João.
_ Eu sei o que disse e mantenho. Mas é melhor preve-
nir. Mate o boi Tufão amanhã cedo e não discuta mais. Nunca mais
eu quero falar sobre esse assunto. - disse secamente Jeremias a
João Saldanha.
_ Mas, patrão....
_ Eu disse NUNCA MAIS, ouviu BEM, João ?!? -
Lágrimas de Anjo
(Domínio Público)
“Vá buscar o boi Tufão, deixa ele encurralado!
Amanhã ao romper do dia, o boi vai ser degolado
FIM
Lágrimas de Anjo
Luz
N
ada. Li tudo de
novo e... nada. Não
conseguia mudar
mais uma vírgula sequer. Nem nos
poemas incluídos na história, um de
domínio público, que ouvi de uma velha
na Paróquia de São Benedito, e o
segundo, de autoria do um amigo meu,
o professor Marcos Alexandre, um dos
poucos que não me virou as costas.
|Ambos estavam presentes no texto
porque o primeiro resume a tragédia e o
segundo tocou-me particularmente por
transmitir a dor que deve sentir uma
pessoa que pressinta os acontecimentos
futuros - se é que isso existe.
Marcos Alexandre
Encontro
U
ma semana depois,
eu já havia conse
guido escrever
trinta e duas páginas do meu novo
livro. Como, até hoje eu não sei! Uma
verdadeira colcha de retalhos... sem
pé nem cabeça, mas ainda assim, já
começava a se formar algo... estava
confiante de que, durante o processo
de criação, surgiria alguma coisa... As
poucas páginas arrancadas de um
diário de um tal de Prior Augustini
Dominic Frazelli causavam estranheza
pela convicção e precisão de alguns
relatos. E também as diferenças de
estilo que eram utilizadas para descre-
ver algumas situações bizzaras. Absur-
das, totalmente fantásticas, devo dizer,
Lágrimas de Anjo
Ex-Machina
O
estranho entrou na
sala, com pose e
calma de um lorde
inglês. Fiquei nervoso, intimidado por
um momento. Os cabelos dele, casta-
nhos e compridos, estavam cuidadosa-
mente arranjados em um farto rabo de
cavalo. Barba feita, excepcionalmente
bem-feita. Parecia que sua pele nunca
havia visto uma lâmina ou um daqueles
cremes de barbear que prometem
muito e empipocam o rosto no dia
seguinte. O nariz, aquilino, contrastava
com uma boca delicada, vermelha, que
sobressaía na pele pálida. Calças,
sapatos, casaco...tudo negro, exceção
da camisa banca. Parecia um sacerdo-
te, um padre...um exorcista.
Ainda tentando descobrir
do que se tratava, e enquanto o estra-
Lágrimas de Anjo
Reminiscências
A
última coisa de
que eu precisava
era um problema
como esse! A julgar pelos últimos
anos da minha vida, podia mudar meu
nome para “Encrenca”... merda... lá
vou eu pensando naquela megera...
coitada... ela não teve culpa. Ah, no
fundo, será que alguém teve culpa?
Na faculdade a gente faz
cada cagada... depois nem acredita...
Quando eu conheci a Carla, ela era
namorada... namorada, não,... noiva
do Marson.
A gente saía juntos, os
três, eu segurando vela, e muito lá de
vez em quando me saindo bem, arran-
jando uma gatinha nesses barzinhos
Lágrimas de Anjo
Reencontro
N
o entanto, a vida nos
prega peças. Isso
mesmo. Cinco anos
após a formatura, quando eu já pensava
tê-la esquecido, acabei reencontrando
Carla em um barzinho no Bixiga. Parecia
outra pessoa. Nada que lembrasse
aquela estudante imatura que eu conhe-
cera. Seu noivado com o Marson havia
acabado há anos e ela estava muito
mais bonita.
Mesmo ressabiado, começa-
mos a sair juntos e passei a perceber
como Carla havia mudado: estava mais
madura, segura, sensível. Mas não me
rendi logo nos primeiros encontros -
recomeçamos nossa relação apenas
como amigos. A aventura nos dias de
Marcos Alexandre
Pesadelo
M
eu casamento ia
bem, mas
depois de seis
anos, o tédio surgiu e eu fiz a maior
burrada da minha vida. Eu estava me
envolvendo com a Baby. Sobrinha do
Jorge. Ela era uma gracinha. Dez
anos mais nova que eu. Mas bateu a
vontade, ela deu mole e fomos parar
em um restaurante, perto de uma
clínica em que ela trabalhava como
esteticista.
Morena, cabelos pretos,
boca carnuda e um par de coxas
capaz de parar um caminhão. Depois
do jantar e muitos drinques, fomos
parar em um motel. Incrível como um
bom papo e algumas doses têm o
Lágrimas de Anjo
Morte
Q
uando me prepara
va para sair, Carla
irrompeu quarto
adentro, furiosa, espumando de ódio.
“Você não vai sair, quem vai sair sou
eu !!!”, gritava, enquanto socava
algumas roupas dentro de uma mala,
apanhada ao acaso. Não tive tempo
de argumentar. Percebi que ela devia
ter ouvido a conversa com Baby e
agora meu casamento ia pro buraco.
Segurei-a pelos ombros e
tentava acalmá-la quando ela largou
as roupas e estourou uma bofetada em
meu rosto. Talvez por instinto, reflexo,
pura estupidez, devolvi-lhe o tapa
com violência redobrada. Ela
esborrachou-se no chão e eu me dei
Lágrimas de Anjo
cia que ia saltar pela boca. Carla olhou para trás e viu o que
tinha acontecido. Hoje, reconheço que foi um acidente, mas
na hora, eu abraçava o corpo ensangüentado do menino e
gritava: “Assassina... assassina !!!”.
Eu a odiava, mais que tudo, naquele momento. Eu
me odiava. Mas não queria acreditar que Guilherme estivesse
morto. Queria que ele respirasse, falasse e que aquele sangue
todo fosse como no cinema... de mentira.
Mas, não. Carla, pulando do carro, caiu de joe-
lhos junto ao menino, segurava a sua mão, tremia, chorava e
gritava: “O que eu fiz? O que eu fiz, meu Deus ?!?”
Um sujeito, talvez esse mesmo sujeito sentado
agora em meu sofá, surgiu do nada, aproximou-se, sem dizer
uma palavra e tentou, em vão, reviver o menino. Na hora,
pensei que fosse um médico, sei lá o que pensei, se é que eu
pensei... não pensei em nada. Só sei que pelo sangue e as
fraturas, eu já sabia que ele estava morto, mas quando o
estranho me tocou, afastando-me com gentileza, porém com
firmeza, do menino, ainda senti uma ponta de esperança.
Primeiro, ele tentou respiração boca a boca,
enquanto, pasmos, eu e Carla ficamos ajoelhados, unidos em
meio à raiva, à sensação de impotência e um incômodo
senso de solidariedade conjugal, esquecendo a briga de
momentos antes, enquanto o estranho de capote negro se
arqueava sobre nosso filho como um abutre humano. As
gêmeas choravam, esquecidas dentro do carro.
Com uma voz ininteligível, o estranho começou a
dizer palavras esquisitas (ao menos não parecia nenhuma
Lágrimas de Anjo
Nome
E
“ u disse que fiz o
possível para salvar
seu filho”, o estra-
nho repetiu, como se tentasse me
despertar de um transe. Sentado no
sofá da sala, sua imponência acentua-
va um ar de pretensa superioridade.
“Eu ouvi”, retruquei, irrita-
do, pondo um fim às lembranças.
“Mas você ainda não disse quem é e
o que quer comigo”, continuei.
“Eu sou um anjo. Ou
melhor: um ex-anjo. Quero que você
pare de escrever seu livro imediata-
mente. Também quero que me devol-
va os originais de meu diário, que
foram roubados de mim por um agen-
te que me persegue, e a esta altura,
Marcos Alexandre
Revolta
S
“ eu filho da puta!”,
esbravejei, irritado.
“Você não me conhe-
ce!!! Quem é você e quem te deu o
direito de me menosprezar? Um cara
que diz que é um ex-anjo... não lembro
muita coisa das aulas de catecismo,
mas se você é “ex” é porque é um
caído, um fracassado...”, devolvi a
ofensa. Na boca, um gosto de areia,
fel. Ondas de calor percorriam a minha
espinha.
“Gostaria que me perdoas-
se... Não desejava ofendê-lo”, disse,
no que soava como um pedido de
desculpas.
“Eu também estou muito
nervoso com esta loucura toda...e você
Lágrimas de Anjo
Queda
N
os primórdios da
Criação, eu era
um deles. Viajava
por entre as estrelas, andava na
superfície dos sóis, mergulhava em
buracos negros e assistia ao nasci-
mento de quasares, andando sobre
táquions e quarks. Meus irmãos se
dedicavam a louvar o Altíssimo, a
brincar na imensidão do cosmo e a
criar esferas de luz na imensidão
negra do espaço.
Na eternidade, nossas
vozes erguiam-se em um coro de
alegria, e nossos corpos dançavam
uma dança louca em um êxtase
inexprimível, imponderável. Éramos
incontáveis. Tantos, que somente
Lágrimas de Anjo
de existir? Eu me acovardei...
Depois da guerra vencida pelo Exército Celestial,
eu tentei voltar à Presença, mas os portões do Santo Lugar
estavam trancados. Gritei, clamei, implorei, mas não obtive
resposta alguma. Meus irmãos voavam pelo átrio do Santo
Lugar e pareciam não me ver ou ouvir. Fiquei pairando em
frente ao portão por mais um incalculável tempo, até que
decidi procurar os caídos. Quem sabe eles me receberiam?
Já que não tinha mais lugar entre os santos, busquei entre os
impuros. Não agüentava mais a solidão. Não agüentava mais
o silêncio.
Desci até às Trevas Exteriores e já comecei a me
arrepender de ter saído dos portões do Santo Lugar. Um
imenso “nada” me cercava. A escuridão era tamanha que
somente os sentidos espirituais permitiam vislumbrar o terrível
quadro à minha frente: o ódio dos caídos havia tomado for-
ma. Eram imensas línguas de fogo que ardiam ao redor dos
caídos e lhes conferiam um aspecto aterrador.
Encolhidos, os caídos eram uma paródia blasfema
dos anjos. Sua aparência lembrava mais o animal que os
humanos chamam de morcego, com suas asas enegrecidas e o
semblante deformado. Ao me verem chegar, todos se abriram
num sorriso que mais parecia um esgar. Uma risada como
gelo se quebrando pareceu surgir de um trono tosco, mal
acabado, em torno do qual alguns caídos se reuniam.
“O que vieste fazer aqui, Ariel? Vieste zombar de
nosso infortúnio?”, uma voz carregada de escárnio atingiu-me
como um raio.
Marcos Alexandre
Cerco
A
cordei em um
deserto. O sol
ardia em minha pele
e minhas costas latejavam. Com imen-
so esforço, cuspi areia e saliva e, com
um esforço maior ainda, tentei tocar
minhas asas. Os dedos encontraram
apenas duas crostas de sangue coagu-
lado. Gritei o mais alto que pude e
desmaiei, vencido pela dor. Trevas.
Acordei novamente, desta
vez com um pano molhado sobre a
testa. Olhando ao redor, percebi que
estava dentro de uma habitação huma-
na. Paredes de pedra. Brasas no chão
assavam uma massa escura. Um velho
sorriu com dentes podres e contou
que havia me recolhido às portas da
cidade, quando abutres e chacais já
Lágrimas de Anjo
Conquista
N
o décimo oitavo
dia, os portões
caíram. O cheiro
de morte era insuportável. Os que
haviam morrido de fome apodreciam
nas casas e praças, e agora se mistu-
ravam aos mortos feitos pelos solda-
dos. A visão da cidade, através de
uma fresta na porta, horrorizaria até
o mais duro dos homens. Os solda-
dos entraram triunfantes, sob o rufar
de tambores.
Lembrei-me do grupo de
anjos que anunciava, nos céus, as
manifestaçoes do Altíssimo e lem-
brei-me também de que um dos
atributos dEle era ser o “Homem de
Guerra”, o “Senhor da Guerra”...
Eu já começara a melho-
rar e, em um ou dois dias, já estaria
Marcos Alexandre
meus olhos!
Depois da queda do Primeiro Entre os Caídos, e
meu primeiro encontro com ele, eu assistira, do limbo fora
dos Portões da Cidade Alta, a criação da Terra e o
surgimento do homem. Longe de meus irmãos celestiais, e
mais preocupado em que alguém se lembrasse de mim e me
deixasse entrar novamente na Cidade de Prata, via , ao longe,
e como por uma névoa, o Altíssimo moldando, através da
persona do Verbo, da Sua Palavra, o gênero humano. Du-
rante a parcela da eternidade que fiquei pairando às portas
da Cidade Alta, via o homem sucumbir à mesma tentação na
qual caíram meus irmãos celestiais: querer igualar-se ao
Criador. No caso do homem, seu erro foi acreditar na mentira
do Primeiro Entre os Caídos, de que ao provar do Fruto do
Conhecimento do Bem e do Mal, igualar-se-ia ao Altíssimo.
Outro engano. Ao invés de igualar-se ao
Altíssimo, o homem e toda a sua espécie rebaixou-se à mes-
ma condição de desobediência que levou à queda de Lúcifer,
o Primeiro Entre os Caídos. Corroído pelo remorso e pela
impotência, já que não era ouvido nem pelos meus irmãos
celestiais, quanto mais seria pelos homens, que sequer pode-
riam tomar conhecimento de mim ou de qualquer outro ser
celestial- a não ser que o Altíssimo o permitisse, como o vi
fazer, tempos mais tarde, em algumas poucas ocasiões, assisti
o homem afastar-se, como eu, da Presença do Criador.
Mas, durante a minha solidão que antecedeu
minha derrocada, minha precipitação na Terra depois do
maldito encontro com o Primeiro Entre os Caídos, vi nascer a
Esperança do Perdão para os humanos, através do Messias.
E ainda impotente, e condenado a assistir a tudo, vi os huma-
Lágrimas de Anjo
Peregrinação
P
assei quinze anos na
Judéia, vivendo razoa
velmente bem. Contu-
do, rumores de que havia um homem
que não envelhecia já começavam a me
alertar de que era a hora de“Abner
Ahzel” (nome que adotara nesse perío-
do) “morrer”. Vendi todos os meus bens
e escravos (meu Senhor, tive até escra-
vos, etíopes e núbios), juntei toda minha
fortuna e segui para a Macedônia, onde
me estabeleci como comerciante de
azeite e especiarias por mais de vinte
anos.
Para enganar a solidão, me
entregava ao estudo das Escrituras, do
Torá judaico; aos escritos hoje perdidos
dos essênios, e tudo que se relacionasse
Marcos Alexandre
Imprimatur
N
o entanto, desde a
minha chegada a
este país, tenho sido
perseguido por um agente das sombras,
que apesar de toda a minha perspicácia
e talentos sobrenaturais, não consigo
identificar. Cheguei mesmo a pensar que
fosse alguns dos asseclas do Primeiro
Entre os Caídos, mas não vejo motivo
para que minha busca possa influenciar
seus planos contra vocês, já que busco
a minha própria redenção e vocês já
têm seu Redentor.
Só sei que o sumiço de
partes de meu diário e a divulgação de
alguns de meus registros pela imprensa
acabaram por comprometer a minha
identidade como Augustini Frazzelli, que
Marcos Alexandre
Dilema
S
inuca de bico. Esse
bosta me pôs numa
sinuca de bico. Entra
na minha casa, me conta uma história
que parece mais “Raízes em
Highlander” e ainda me lembra que eu
lhe devo um favor. Que merda !!!
Ainda pede para que eu pare de
escrever meu livro, a única solução
para que eu possa ganhar uma grana e
pagar as minhas dívidas. E tudo isso
para que ele, um anjinho bunda-mole,
possa voltar ao céu. Se é que esse
maluco realmente é quem diz ser... “É
o fim da picada”, pensei, enquanto o
gelo do meu terceiro uísque naquela
noite, derretia no copo.
“E se eu me recusar? O
que vai fazer, ‘Sr. Cruzado Sem-
Lágrimas de Anjo
Epílogo I
A
vida é mesmo
engraçada. Às
vezes, nada é como
se imagina. De fato, concluí meu livro.
Mas não da forma como planejara, a
principio. Toda aquela experiência com
aquele tal ex-anjo mexera comigo.
Ao invés de simplesmente
escrever baboseiras para ganhar di-
nheiro e enxovalhar a memória de um
religioso que talvez apenas tenha sofri-
do algumas alucinações (se bem que eu
também devo ter alucinado...), sim-
plesmente para ter um livro para entre-
gar ao Jorge, decidi contar minha
experiência e as peripécias suposta-
mente vividas por aquele maluco que
se me apresentou como um anjo. O
Marcos Alexandre
Encontro
D
epois daquele
malfadado encontro
com aquele escri-
tor, decidi deixar a América do Sul e
viajar até Calgary, no Canadá. Uma
nova religião estava sendo desenvolvi-
da por descendentes de franceses ali
residentes e talvez algo pudesse me
interessar. Ainda não entendia porque
simplesmente não havia tomado os
fragmentos de meu diário das mãos do
escritorzinho e o impedido de continu-
ar a escrever seu livreto. Pior: ainda
confessei-me com ele como um fiel
faria em um confessionário. Ainda
mais: enviei à sua ex-mulher rosas...
não pude ficar impassível diante do
que vi em sua mente... Talvez ele se
Lágrimas de Anjo
Epílogo II
C
“ aro amigo:
Ariel
Ensaio Literário
por Augustini Dominic Frazzelli
ou “Ariel”
AXIOMA
A VERDADE NÃO É ALGO...
A VERDADE É ALGUÉM...
A
“ xioma” é uma palavra grega que significaria,
em uma tradução livre, “verdade definitiva”
ou “verdade absoluta”. No entanto, não
existe “verdade absoluta”. Todas as verdades são relativas. Isso
porque a noção de verdade depende de um sentimento, de um
julgamento totalmente subjetivo que é conhecido por nós como
“fé”. Partindo do princípio que algo só é verdadeiro quando se
acredita que aquilo é verdade, “verdadeiro” é tudo aquilo em que
se acredita, em que se tem fé.
Por exemplo, não adianta atirar sobre um ateu uma
tonelada de provas sobre a existência de Deus. Ele, o ateu, que
não acredita que exista um Deus, a idéia de que haja um Ser
Onipotente, Onipresente e Onisciente cuidando deste Universo,
por mais que se apresentem fatos que comprovem a veracidade
da idéia, jamais acreditará. Pelo menos, enquanto não estiver
disposto a acreditar.
Analisando, a existência da “verdade” depende da fé.
E a fé busca, desesperadamente, algo em que se apoiar, algo em
que acreditar. A fé busca, eternamente, a verdade. Talvez seja
Lágrimas de Anjo
Súplica
Canto ao Senhor, me alegro
Busco ao meu Senhor, me encontro
Fecho os meus olhos e
Enxergo Seu Poder
Eu canto...
Fórmulas Matemáticas
Fórmulas matemáticas, invenções astronáuticas,
Lógica econômica, avanço na ciência atômica.
Concepções logísticas, imaginação artística,
Mente em desenvolvimento, sede de conhecimento.
Biologia, cibernética,
Estudos sobre genética
Dúvidas sobre o futuro,
Mas como se sentir seguro ?
Gesto Político
Já me perguntaram qual é minha posição,
Se sou da esquerda, direita ou do Centrão.
Se sou anarquista, comunista, sim ou não,
E a resposta sai, do fundo do meu coração:
Oração
Quando eu me sinto abatido, eu
A Ti clamo e sou ouvido
E o Teu amor vem me curar
Vejo então
Que nada tenho pra Te dar
Que pague Teu amor sem par,
A Tua compaixão
Não temas
Nas horas de maior dificuldade
Eu paro pra pensar em Jesus,
Que brilhou nas trevas com grande luz
E por nós morreu lá na cruz
Trono de Justiça
Aleluia
Samba Consagrado
Jesus é meu Senhor, é Ele quem alegra
Minha alma brasileira
Em meio à recessão, o atraso do metrô,
E a crise financeira.
Jazzsus
Jazzsus, melodia sem fim,
Orquestrada pelo Criador,
Com notas de amor...
Que toca na alma, fascina e transforma...
Jazz
Jazzsus...
O mais lindo dos blues,
Louvor
Consagração
Como um vaso nas mãos do oleiro,
Ó Deus, vem me amoldar
Dá nova forma ao meu ser,
Muda minha vida
Sempre que eu precisar
Em
Amanhece, abro os olhos e começo a cantar,
O louvor flui do meu ser e sinto então,
Jesus, a me tocar.
Amigo
Amigo, você anda tão sozinho;
A vida pra você, não tem mais sentido.
Você procura amor, e encontra incompreensão,
Não há mais nada, em seu mundo de ilusão,
Não há mais nada, em seu mundo de ilusão.
Fluir
Eu choro
e deixo a lágrima cair,
Eu rio,
e deixo o sorriso fluir,
Eu vivo,
e peço a Deus pra me dirigir.
O mundo é um mar
Suas ondas vão e vêm
Minha vida é um barco
Que Deus conhece bem
Eu iço as velas,
e rumo mais além
Pois quem crê nÊle
porto seguro tem
Lágrimas de Anjo
Considerações Finais
E
ste livro, de modo
peculiar, também fala
sobre “Deus”. Em
seu íntimo, cada um acredita em um
“Deus” diferente, pessoal, que é “dife-
rente” do “Deus” alvo da crença de
seu semelhante, porque cada homem
enxerga “Deus” e relaciona-se com Ele
de uma maneira estritamente particular,
pessoal e intransferível. É semelhante
ao pai que tem vários filhos. Mesmo
amando todos da mesma forma, cada
filho enxerga o mesmo pai de forma
diferente. Um dirá que o pai é “corajo-
so”, outro, que é “forte”, e um tercei-
ro, que é “grande”, e assim por diante.
De forma semelhante, cada
religião vê “Deus” de diferentes manei-
ras. O que não significa que o “Deus
Verdadeiro” seja como essas religiões
Marcos Alexandre
De um dos menores
entre os menores servos do Senhor
O autor