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Nas cenas de Mad Men que to a fundo espiei sentado na caseira sala
de aula de minha escola secreta fui lentamente entrando em contato
com o modo de trabalhar de Weiner e vi que tambm ele operava ao
modo borgiano, isto , que a histria que em Mad Men ia por baixo da
supostamente principal a histria aparentemente secundria ou
segundona da batalhadora Peggy Olsen (Elisabeth Moss) e suas
colegas de escritrio era na realidade a trama secreta, o centro da
narrativa, o eixo verdadeiro de tudo. E tambm percebia que,
acontecesse o que acontecesse, no fundo da cena sempre estava Peggy.
Cheguei a me acostumar a v-la com tanta frequncia em todos os
fragmentos que, em certa ocasio, em uma sequncia de uma festa
hippie, tive a impresso de v-la cantando no fundo da sala.
Peggy sempre canta ao fundo, pensei. E me disse tambm que ela era
no s a trama secreta, mas tambm o gnero segredo oculto no
prprio eixo da narrativa. Ento Peggy um conto? Acredito que sim,
que ela a trama secreta, mas tambm porque essa trama est
repleta de unidades de contos o prprio gnero camuflado dentro da
estrutura geral de romance, o verdadeiro gnero utilizado para a
narrativa global posta em marcha por Weiner.
Se fosse assim, Madame Bovary representaria o romance, o gnero
por excelncia do sculo XIX, enquanto nossa Peggy, a secretria
ascendente, estaria inserida no interior de um tipo de narrativa que
j no seria do sculo de Flaubert e na qual ela, como anti-Bovary,
encarnaria um conto intenso, um fragmento camuflado em um
labirinto narrativo que s na aparncia recordaria os do passado.
Exato. Peggy, vista nesta tarde enquanto termino estas linhas
como um fragmento que rompe, quebra e acaba cantando ao fundo de
alguma sala, aniquilando qualquer possvel ltima iluso antiquada de
plenitude do sculo XIX.