Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
net | nº 39 | 1€
Até quando
vamos
levar pancada?
FOTO CAPA PAULETE MATOS
[2] ESQUERDA Nº 39
EDITORIAL
Carlos Santos
“Privatizações
não respondem
ao interesse público”
Num jantar com apoiantes transportadora aérea nacional que ga- de apoio. Alegre defendeu que o que
em Bragança, Manuel Alegre ranta a ligação com o Brasil, Estados Uni- Portugal precisa “não é do código de con-
deixou críticas às medidas dos da América e os países lusófonos de duta das medidas orçamentais impostas
anunciadas no PEC do Governo África”, acrescentou Alegre, referindo-se pelo Banco Central Europeu, mas de uma
e considerou os prémios ao plano do governo para vender a TAP. austeridade republicana exemplar, a par-
milionários dos gestores “Estas privatizações, a concretizarem-se, tir de cima”. “Desde os titulares dos órgãos
públicos como “um escândalo comprometem talvez irremediavelmen- de soberania aos administradores de em-
para a saúde da República”. te o chamado Estado estratega, ou seja, presas públicas”, concretizou. “Nenhum
a função estratégica do Estado”, alerta
constrangimento vindo de fora pode pôr
A proposta de privatizações anun- o candidato. Manuel Alegre referiu-se
em causa serviços públicos essenciais ao
ciada pelo governo de José Sócrates também ao Programa de Estabilidade
povo português como a Segurança Social,
foi duramente criticada pelo candidato e Cresceimento proposto pelo gover-
a escola pública e o Serviço Nacional de
presidencial: “Ao prever a privatização de no, dizendo que “o esforço de contenção
Saúde”, afirmou.
serviços públicos essenciais, como a Rede que é pedido pelo PEC é desigualmente
Ainda sobre o PEC, Alegre defen-
Eléctrica Nacional ou os CTT, ainda por ci- distribuído”. E deu o exemplo dos pré-
deu que “as medidas positivas, como por
ma rentáveis, não se está a pretender uma mios milionários dos gestores. “Não é
melhoria da sua gestão e uma resposta moralmente aceitável que enquanto se exemplo a taxação das mais valias e a
ao interesse público, mas apenas a querer impõe o congelamento de salários na criação dum novo escalão do IRS, deviam
obter rapidamente uma receita extraordi- Função Pública, haja gestores de empre- ter sido acompanhadas por sacrifícios pe-
nária. Além disto ser muito negativo para sas com capitais públicos que se atribuem didos ao sector financeiro, que é o grande
as regiões do interior”, acrescentou Ma- milhões de euros de prémios e benefícios. beneficiário do sector público, e aos gru-
nuel Alegre. É um escândalo para a saúde da Repú- pos sociais mais privilegiados num dos
“Também me parece que um país co- blica”, afirmou o candidato, arrancando países da Europa com maiores desigual-
mo o nosso não pode prescindir de uma fortes aplausos dos presentes no jantar dades”.
[4] ESQUERDA Nº 39
PEC 2010-2013
A esquerda censura
e ataca o governo no
coração da sua política
POR FRANCISCO LOUÇÃ
Uma caixinha
sem surpresas
POR MARIANA MORTÁGUA
Teixeira dos Santos considera que A estratégia foi por si da justa distribuição do esforço
distribuiu de forma equilibrada o es- de saneamento das contas públicas.
definida. Para reduzir o
forço que pede aos portugueses mas A taxação das mais-valias bolsistas,
reconhece que pede pouco ao sistema
défice vale tudo – para o por sua vez, fica para mais tarde. Para
financeiro”, afirma o Jornal de Negó- prego vão as empresas quando o “quadro financeiro estiver
cios. O Ministro teme prejudicar a ban- estratégicas do Estado, relativamente estabilizado”, diz o Minis-
ca nacional e a actividade empresarial. os trabalhadores, tro.
Pelos vistos nenhum contexto é os pensionistas e os Para último fica o melhor. Ao mes-
bom para pedir seja o que for à finan- funcionários públicos. mo tempo que reforça a fiscalização so-
ça. Mas então, se de fora fica o sector Vale tudo menos irritar bre a atribuição de prestações sociais,
financeiro, o esforço de consolidação que aperta as condições de acesso ao
é equilibradamente partilhado entre
o sector financeiro e o subsídio de desemprego e rendimento
quem? grande capital. social de inserção, o Estado vai seguir
Os desempregados vão ser obriga- Será que este Governo em frente com um perdão fiscal para
dos a aceitar trabalhos mal pagos (va- ainda acredita que todos aqueles, indivíduos ou empresas,
lor do subsidio acrescido de 25% nos quem nos colocou na que fugiram ao fisco através de offsho-
primeiros 6 meses e de 10% a partir do crise nos vai tirar dela? res. A troco do pagamento de 5% sobre
décimo mês). A relação entre o subsí- os capitais em situação irregular, o Esta-
dio de desemprego e o último salário do português vai esquecer as enormes
de acidentes pessoais e de vida (ac-
será também reduzida. dívidas fiscais dos infractores e ignorar
Os beneficiários do RSI enfrenta- tualmente com um limite máximo de todos os crimes fiscais a elas associa-
rão regras mais rígidas de aceitação 128€), limitar globalmente os benefí- dos.
de novo emprego. A despesa total cios fiscais, as deduções à colecta e as Não nos deixemos enganar. Os sa-
com o programa será também alvo de deduções para rendimentos de pen- crifícios que nos pedem não são par-
redução através do estabelecimento sões inferiores a 22500€. Será ainda tilhados por todos. Aqueles que enri-
de tectos máximos. Paralelamente, as aplicada, temporariamente, uma taxa queceram à custa da especulação, da
transferências do Orçamento para a Se- de 45% em sede de IRS para os rendi- fraude e da exploração continuarão a
gurança Social (para prestações sociais mentos acima de 150000€ (actualmen- fazê-lo, sem sacrifícios. Quem nos trou-
não contributivas) sofrerão cortes nos te taxados a 42%). xe a crise não vai pagar por ela, sairá
próximos anos. É sabido que os benefícios fiscais reforçado, munido de novos argumen-
Na função pública, a regra de “dois devem ser limitados, mas fazê-lo de tos e factores de chantagem sobre o
por um” sairá reforçada, bem como a in- forma cega não é solução. Se faz sen- Estado Social, os serviços públicos, os
tenção de acelerar o aumento da idade tido limitar as deduções nas áreas em salários e as nossas vidas.
da reforma e as reduções salariais. que existe oferta publica de serviços Para manter as taxas de lucro, ga-
O investimento público, essencial (como os seguros de saúde ou os PPR), rantir condições económicas favoráveis
para a criação de emprego e dinamiza- o mesmo não é verdade para os segu- ao sector financeiro e acalmar os mer-
ção da economia, também sofrerá cor- ros de vida, por exemplo, obrigatórios cados internacionais, não são só as em-
tes, os maiores desde há muito. para quem quer pedir um empréstimo presas públicas que vão para o prego,
Ao nível fiscal, o Estado propõe- à habitação. Quanto ao novo escalão de são os nossos direitos, conquistados a
se eliminar os benefícios com seguros IRS, apesar de necessário, não é garante pulso nos últimos trinta anos.
[8] ESQUERDA Nº 39
SALÁRIOS
Salários
e competitividade
POR JOÃO FERREIRA DO AMARAL*
Empresa fantasma
Amorim na mira
do Bloco
O deputado Pedro Filipe Soares quer que o governo inves- nem a qualquer mudança do local de trabalho”, diz o deputado
tigue os indícios de gestão danosa na Corksribas, a em- bloquista no requerimento entregue ao ministério da Economia.
presa que o grupo Amorim diz não lhe pertencer. “Mesmo a água e a luz que é fornecida à empresa Corskribas
são provenientes da empresa Amorim Revestimentos, perten-
A empresa ficou conhecida por querer despedir um grupo de cente ao Grupo Amorim. Até a segurança nocturna das insta-
trabalhadores, sob a acusação de “sindicalistas”. A relação com lações da empresa CorksRibas é realizada pela mesma pessoa
o Grupo Amorim é conhecida dentro da empresa, embora a ad- que garante a segurança da empresa Amorim Revestimentos”,
ministração o negue. acrescenta o deputado. “Sendo a situação actual passível de
“As provas da integração da empresa no Grupo Amorim chega- esconder outras questões relevantes de engenharia financeira,
ram ao conhecimento do Grupo Parlamentar do Bloco de Es- nomeadamente ao nível de gestão danosa das empresas, existe
querda, desmentindo a administração. Existem trabalhadores a necessidade real de se proceder a uma clarificação cabal da
da CorksRibas que, ao longo da sua vida profissional nas insta- situação”, defendeu Pedro Filipe Soares.
lações da empresa CorksRibas, foram alternando o seu víncu- Apesar de estarem à vista as ligações com o grupo fundado por
lo contratual entre a empresa CorksRibas e o Grupo Amorim. Américo Amorim, a administração desta empresa granuladora
Realço que a mudança do vínculo contratual não teve qualquer de cortiça de Santa Maria da Feira sempre negou qualquer rela-
impacto ao nível das funções que os trabalhadores realizavam, ção com o grupo Amorim.
[10] ESQUERDA Nº 39
SOCIEDADE
PAULA NOGUEIRA
Centenas de pessoas
protestaram, em
Amarante, contra a
construção de seis Manifestação contra
novas barragens barragens
sem ter em conta os
prejuízos ambientais. no Vale do Tâmega
Ao som de tambores e em torno GEOTA, SOS Paiva, Salvar o Tua. O Bloco do lobo que se pretende salvaguardar.
de alguns mascarados representan- de Esquerda (deputados João Semedo, Apelou a que mais cidadãos subs-
do animais com existência ameaçada, José Soeiro e Rita Calvário, dirigentes crevam a petição Por Amarante, Sem
juntaram-se cerca de 300 pessoas jun- e militantes do distrito do Porto) e Os Barragens. De seguida falou Emanuel
to à Ponte de Amarante em protesto Verdes fizeram-se também represen- Queirós do Movimento Cidadania e De-
contra a construção de mais barragens tar. A presença de alguns autarcas fez- senvolvimento do Tâmega que afirmou
em rios naturais. No sábado de 13 de -se também notar, como foi o caso dos que «ali se estava a ouvir a voz do Tâme-
Março várias organizações locais e am- presidentes de Junta de São Gonçalo e ga», das populações desconsideradas
bientais convocaram essa concentração de Cepelos. Ricardo Marques da Quer- pelo poder central que pretende vender
para manifestar repúdio pela intenção cus tomou a palavra para desmistificar um dos seus principais recursos naturais,
do governo em construir mais 6 novas a importância da barragem do Fridão, o rio, fragmentando-o com 6 albufeiras.
barragens sem ter em conta os grandes lembrando que a pequena percenta- Considerou ainda que este programa é
prejuízos ambientais que acarretarão. gem com que iria contribuir para a pro- «mercenário» e «contra-natural» indo
Melhores resultados se obteriam, em dução energética não podia justificar os sacrificar aos interesses das empresas
sua opinião, com a manutenção das danos ambientais previsíveis. Para além produtoras de energia o futuro da zona.
barragens existentes e uma aposta forte de impedir a oxigenação das águas su- Apontou como saída possível um apos-
nas energias renováveis. perficiais, de prejudicar a vida de peixes ta no desenvolvimento sustentável.
Entre outras foram referidas as pre- e de roubar vários hectares à Reserva Entretanto, no rio, parados sob a
senças do GAIA, Movimento Cívico pela Agrícola e a zonas protegidas, iria causar ponte, vários canoístas juntaram-se ao
Linha do Tua, Quercus, Campo Aberto, impacte negativo na própria existência protesto.
à vista, apesar do PS considerando mesmo esta opção como “um absurdo”. Mariana
Aiveca recordou ainda os números referentes a mortes por do-
ença de trabalhadores da ENU: “Em Março de 2008 eram 80,
Depois de ter chumbado por duas vezes o acesso às pen- hoje sabe-se que faleceram 115 trabalhadores de cancro”.
sões de invalidez dos antigos trabalhadores da Empresa Da parte do CDS, cujo projecto de lei alarga as pensões aos tra-
Nacional de Urânio, o PS tenta agora limitá-las. balhadores a um vínculo mínimo de quatro anos com a empre-
sa, o deputado Helder Amaral afirmou que terá “abertura para
Todos os partidos da oposição apresentaram propostas para olhar para as propostas do BE, PCP e PEV” na especialidade.
garantir esse acesso aos trabalhadores afectados pela expo- António Minhoto, porta-voz da comissão dos antigos trabalha-
sição a material contaminante. Mas o PS, depois de ter chum- dores, está confiante em como o problema será resolvido na
bado por duas vezes iniciativas semelhantes quando tinha próxima semana. “Os partidos da oposição reafirmaram todo o
maioria absoluta no Parlamento, anuncia agora que irá viabili- seu apoio e o PS disse que ia ponderar a sua posição no sentido
zar apenas as do PSD e CDS, que limitam aquele acesso a um de viabilizar os projectos de lei, por isso estamos convencidos
período mínimo de permanência na empresa. de que na próxima quinta feira serão aprovados”.Desta forma, e
“Com esta posição o PS contraria todos os estudos científicos depois de uma luta que se arrasta há cerca de oito anos, Antó-
que existem sobre esta matéria”, criticou a deputada do Bloco nio Minhoto acredita que “este processo está pacificado, o que
de Esquerda Mariana Aiveca. só peca por tardio, devido à teimosia do PS”, que já chumbou,
A deputada do Bloco sublinhou o “erro grave” de manter ape- por duas vezes, os projectos de lei dos partidos da oposição.
FLICKR / MOISES.ON
Demolições forçadas
desalojam
3000 famílias
Segundo o site angolaresistente. estão também a provocar tensões e
Sob a direcção directa
net da SOS Habitat, o Governo de An- conflitos na Tchavola, entre as pessoas
gola está a proceder a demolições em
do governador de que estão a ser lá colocadas em tendas
massa ao longo da linha férrea no Lu- Huíla, estão a ser e os antigos moradores, porque “ as la-
bango, que levaram ao desalojamento feitas demolições de vras dos habitantes locais estão a ser
de cerca de 3.000 famílias, englobando casas em massa, ao cedidas aos desalojados”.
20.000 pessoas. Os desalojados não re- longo da linha férrea De acordo com o mesmo blogue,
ceberam notificações por escrito e nin- “fala-se em surdina que as ordens de
guém foi indemnizado. Os desalojados
no Lubango. Em demolição de casas partem do Gover-
que não têm hipótese de se alojar em Benguela, foi proibida no Central, nomeadamente do Gabi-
casas de familiares estão a ser coloca- uma marcha contra as nete Nacional de Reconstrução”. As de-
dos em tendas na área da Tchavola, nos demolições. molições irão prosseguir noutros locais
arredores do Lubango. O governador no perímetro não permitido ao longo
prevê utilizar o estádio da Tundavala da linha férrea, “ fala-se da previsão de
Na carta, a Omunga solicitava a
para alojar famílias debaixo das banca- projectos turísticos ao longo da cordi-
das. Eduardo dos Santos que parasse “de lheira montanhosa onde se situa a está-
A operação de demolição e desalo- imediato” as demolições, permitisse tua do Cristo Rei”, refere o blogue.
jamento forçado é comandada e super- uma investigação para apurar os factos A associação Omunga anunciou
visionada directamente pelo governa- e “punir os responsáveis”, “sob pena do a convocação de uma Marcha para o
dor da província, Isaac dos Anjos. Exmo. Sr. Presidente da República ser dia 25 de Março, a qual não se chegou
A associação Omunga reclamou responsável por todas as violações de a realizar devido a impedimento po-
contra as demolições na cidade do direitos humanos que estejam a ocor- licial, na cidade de Benguela, “com o
Lubango e enviou uma carta ao Pre- rer ou que advenham de tal acção de propósito de denunciar e exigir o cum-
sidente da República de Angola, José demolições”. primento da lei e de todos os tratados
Eduardo dos Santos, mas a presidência Segundo o blogue quintasdedeba- internacionais referentes a demolições
negou-se a recebê-la (leia notícia em te.blogspot.com, as demolições já pro- e desalojamentos forçados de popula-
quintasdedebate.blogspot.com). vocaram 7 mortes. Os desalojamentos ções”.
[12] ESQUERDA Nº 39
INTERNACIONAL
PE:
INLUSTRAÇÃO DE BEN HEINE
Bloco defende
Taxa Tobin
No debate do Parlamento Europeu Em resposta, argumentou que “di-
em Estrasburgo, sobre a taxação das zer isto é dizer às pessoas que jamais
transacções financeiras, Miguel Portas existirá taxa Tobin em escala planetária”.
defendeu a implementação da Taxa To- Assim, defendeu, “numa perspec-
bim. Para Miguel Portas foi claro a UE é tiva diferente”, que a União Europeia é
um mercado financeiro suficientemente “um mercado financeiro suficientemen-
forte para que uma taxa geral residual te forte para que uma taxa geral residual
sobre todas as transacções se possa fa- sobre todas as transacções se possa fa-
zer sem que haja fuga de capitais. zer sem que haja fuga de capitais”.
Mesmo considerando que se tivés- Miguel Portas explicou também
semos uma Taxa Tobin não teríamos que com medidas como a Taxa Tobin,
evitado a crise financeira, Miguel Portas a União Europeia deveria dar o sinal de
afirma que “teríamos seguramente mui- que “nesta crise, pelo menos residu-
to mais recursos para poder combater almente, o capital financeiro que nos
os efeitos da crise financeira nas nossas trouxe à crise, pelo menos residualmen-
economias e sobre os sectores mais des- te, tem que pagar”.
favorecidos da população europeia”. O objectivo, disse, seria “combater a
Além disto, o deputado criticou os fome e a pobreza à escala internacional”
argumentos que embora encarem a e “começar a financiar a montagem de
taxa como “uma ideia atraente e muito um pilar social na construção europeia,
interessante”, dizem também que não se que é o pilar que nos falta e que não
pode aplicá-la à escala europeia, neces- temos”. “Os cidadãos compreenderiam
sitando esta de um âmbito mundial. isto muito bem”, rematou.
dobram-se
perante o regime
de Marrocos”
Cerca de 30 activistas do Bloco participaram na contra-comei- nárias), no final de 2009, para protestar contra a sua expulsão
ra pelos direitos do povo saharaui. No final da contra-cimeira do Sahara Ocidental pelas autoridades marroquinas.
em Granada, Aminetu Haidar acusou o governo espanhol e a Já o rei de Marrocos, Mohamed VI, enviou uma mensagem à
União Europeia de porem os interesses económicos à frente cimeira entre a União Europeia e Marrocos, na qual defende
dos direitos humanos e da defesa do povo saharaui. a soberania de Marrocos sobre o Sahara Ocidental e apela à
A activista saharaui criticou a “traição” de Espanha à sua anti- resolução política do que considera um “diferendo artificial”.
ga colónia do Sahara Ocidental e o seu “cego seguidismo” em As autoridades de Rabat consideram que o Sahara Ocidental,
relação a Marrocos, numa intervenção na conferência de apoio uma antiga colónia espanhola anexada por Marrocos em 1975,
ao povo saharaui realizada em paralelo à cimeira UE-Marrocos faz parte do seu território. Mas a Frente Polisário, apoiada pela
na cidade espanhola de Granada. Argélia – onde se encontram milhares de refugiados saharauis
Esta foi a primeira aparição pública de Haidar em Espanha, – reclama a realização de um referendo que contemple a op-
desde a sua greve de fome de 32 dias em Lanzarote (ilhas Ca- ção pela independência.
Sabemos que estamos Vejam as recentes enormes “surpre- ansiando pela mudança, alimentando
a viver numa situação sas” - a eleição de um senador republica- uma sede de sangue.” Primeiro elegeram
no em Massachusetts; o colapso finan- Obama; agora, rejeitam-no. Porquê? “A
caótica quando (1) os
ceiro do Dubai; a quase bancarrota de multidão é volúvel.”
média de referência vários grandes estados no interior dos O que estamos a observar na Califór-
mostram-se constantemente Estados Unidos e de quatro ou cinco dos nia, na Grécia, na maioria dos governos
surpreendidos pelos estados-membro da União Europeia; mundiais? A arrecadação dos governos
acontecimentos; (2) as fortes flutuações mundiais das moedas. é baixa, principalmente pela redução da
Estas “surpresas” são comentadas colecta de impostos, que por sua vez é
previsões de curto-prazo
diariamente na imprensa mundial e causada pelo facto de em todo o lado
de vários especialistas pelos principais políticos. Não têm qual- as pessoas consumirem menos por me-
apontam para direcções quer acordo sobre o que está a aconte- do de o seu dinheiro acabar. Ao mesmo
totalmente diferentes cer, e muito menos sobre o que deveria tempo, precisamente porque o desem-
e são formuladas com ser feito para melhorar a situação. Por prego mundial é consideravelmente
exemplo, li apenas duas declarações in- maior, os Estados têm de gastar mais.
muitas reservas; (3) o
teligentes sobre os resultados eleitorais Assim, os Estados têm menos di-
Establishment ousa dizer nos Estados Unidos. nheiro para responder a necessidades
coisas ou usar palavras Uma foi do próprio Barack Obama: maiores. Que podem, então, fazer?
que antes eram tabu; (4) “O processo que levou à vitória de [o re- Podem aumentar impostos. Mas rara-
as pessoas comuns estão publicano] Scott Brown [em Massachu- mente os contribuintes são a favor de
setts] foi o mesmo que me deu também que aumentem os seus impostos. E os
assustadas e zangadas, mas
a vitória: as pessoas estão zangadas e Estados temem a fuga das empresas.
muito inseguras em relação
frustradas.” E a segunda foi do colunis- Bem, nesse caso, podem cortar gastos -
ao que fazer. Esta é uma boa ta afro-americano Charles M. Blow, do presentes ou futuros, como as pensões.
descrição dos últimos dois New York Times. Intitulou a sua coluna Depois, têm de enfrentar o desconten-
anos em todo o mundo, ou “As multidões mandam” Disse: “Benvin- tamento popular, ou mesmo a revolta
pelo menos na sua maior dos à multidão: um eleitorado zangado popular.
e ferido, exasperado pela recessão, osci- Entretanto, o “mercado” reage. Mas
parte.
lando através do espectro político, ainda que mercado é este que reage - por
[14] ESQUERDA Nº 39
OPINIÃO
exemplo, alterando as suas preferên-
cias em termos de moeda? São as muito
grandes empresas e as estruturas finan-
ceiras como os fundos de risco (hedge
funds), que moldam o sistema finan-
ceiro mundial à procura de ganhos de
curto-prazo, mas significativos.
O resultado é que os governos fi-
A raposa
cam diante de escolhas impossíveis, e
os indivíduos diante de escolhas ainda
mais impossíveis. Não podem prever o
e a galinha
que é provável que aconteça. Tornam-se
ainda mais frenéticos. Viram-se violenta-
mente para o proteccionismo, para a xe-
nofobia ou para a demagogia. Mas isso,
evidentemente, pouco resolve. POR BRUNO MAIA
Neste ponto entra o maior dos es-
pecialistas mundiais, Thomas L. Fried- Voltemos aos Mello! Prossegue Mello não contrataram outra - lá se foi,
man, que escreveu uma coluna intitu- em Braga o reinado dos “excluídos” do durante meses, a reabilitação dos do-
lada “Nunca tinha ouvido isso”. O que Amadora-Sintra. O Hospital de Braga entes afásicos.
é que ele nunca tinha ouvido? Ouviu foi auditado. Consta que não terá acre- Histórias e estórias que revelam
não-americanos falando em Davos so- ditação total. Aliás, durante o próprio o ambiente criado por um grupo de
bre “instabilidade política” nos Estados processo de auditoria, a luz, por azar,
16 gestores que ganham mais do que
Unidos. Diz que, na sua experiência pas- resolveu falhar, deixando uma criança
qualquer outro elemento daquele hos-
sada, uma frase como esta só fora usada anestesiada na máquina de Ressonân-
cia Magnética, tendo o exame ficado a pital (por mais anos que lá esteja...) e
referindo-se a países como Rússia, Irão cujos patrões são importantes senho-
meio...
ou Honduras. Imaginem. Pessoas real-
res da medicina privada que, como se
mente a considerar os Estados Unidos
O orçamento deste sabe, só beneficia com a derrocada do
politicamente imprevisíveis. E Thomas
ano para a saúde não SNS. É elementar, se eu fosse uma gali-
Friedman que nunca ouvira isso.
nha que mandasse numa capoeira, iria
Houve quem tivesse escrito isto, e ajuda. Aliás, desajuda.
explicando-o, durante pelo menos 40 eu contratar uma raposa para gerir a
E o congelamento nos capoeira no meu lugar??
anos, mas Thomas Friedman nunca ti-
salários dos funcionários O orçamento deste ano para a
nha ouvido. É porque ele vive num casu-
lo autoconstruído, o do Establishment públicos é paradigmático. saúde não ajuda. Aliás, desajuda. E o
político dos Estados Unidos e dos seus O SNS é, cada vez mais, congelamento nos salários dos fun-
acólitos noutros lados. As coisas devem abandonado por médicos cionários públicos é paradigmático. O
estar a correr-lhes mesmo mal para re- que se deslocam para o SNS é, cada vez mais, abandonado por
conhecerem esta realidade básica. Os médicos que se deslocam para o Priva-
Privado, ou em tempo
Estados Unidos são politicamente instá- do, ou em tempo total ou em tempo
veis - e é provável que fiquem mais, não total ou em tempo
parcial. Os que ficam vêem o peso do
menos, na próxima década. parcial. seu trabalho diário a aumentar - mais
A Europa é mais estável? Só um horas extraordinárias, maior o rácio de
pouco. A América Latina é mais estável? Há alturas durante o dia, sobretudo doente/médico, vêem os colegas a ce-
Só um pouco. A China é mais estável? nos turnos fora do horário diurno, em lebrar contratos com as administrações
Talvez um pouco, mas não há garantias. que há apenas um maqueiro para todo
EPE que os coloca fora da função públi-
Quando o gigante balança, muitas coi- o hospital - imaginemos o tempo que
ca ao mesmo tempo que lhes dobra o
sas podem cair com ele. levará apenas uma pessoa a transpor-
O caos diário é assim - uma situa- tar um hospital inteiro! Na Medicina ordenado. Vêem os hospitais a ficarem
ção que não é previsível no curto prazo, Física e da reabilitação começaram a velhos e ninguém a mexer uma palha
menos ainda no médio. Por isso, é uma falhar as ajudas técnicas a doentes que por isso. E no meio disto tudo, aumen-
situação na qual as flutuações econó- precisam de uma cadeira de rodas, de ta o trabalho, aumenta a precariedade,
micas, políticas e culturais são grandes canadianas, entre outras coisas. A única aumenta a desigualdade inter-pares,
e rápidas. E isto assusta a maioria das terapeuta da fala que o hospital tinha aumenta a exigência de cuidados e só
pessoas. entrou em licença de maternidade e os não aumento o ordenado.
FLICKR / EVIL
Milton Friedman
não salvou o Chile
POR NAOMI KLEIN
Desde que a desregulação causou sistir terramotos, foi adoptado em 1972. em rápida expansão. Os chilenos acre-
um desastre económico mundial em Se- Essa data tem um grande significado, ditaram no Estado, razão pela qual ele-
tembro de 2008, toda a gente se tornou porque é anterior à tomada de poder geram Allende para levar esse projecto
outra vez Keynesiana, e não tem sido sangrenta de Pinochet apoiado pelos mais além.
fácil ser um seguidor fanático do econo- Estados Unidos. Isso significa que se al- Depois do golpe e da morte de Al-
mista Milton Friedman. O seu símbolo guém merece mérito da lei, não é Fried- lende, Pinochet e os Chicago Boys fize-
fundamentalista de mercado livre está man ou Pinochet, mas Salvador Allende, ram de tudo para desmantelar a esfera
amplamente desacreditado e os seus o presidente socialista eleito democrati- pública do Chile , leiloando empresas
seguidores tornaram-se cada vez mais camente. (Na verdade são muitos os chi- estatais e cortando as regulações finan-
desesperados para reclamar vitórias ide- lenos que merecem o mérito, já que as ceiras e comerciais. Foram criadas enor-
ológicas, apesar de rebuscadas. leis foram criadas para responder a um mes fortunas neste período de tempo a
Vem ao acaso um exemplo particu- historial de terramotos, e a primeira lei um custo terrível: no principio dos anos
larmente desagradável. Dois dias antes foi adoptada na década de 1930). 80, as políticas de Pinochet recomenda-
de o Chile ser abalado por um terramo- Parece significativo, apesar de a lei das por Friedman causaram uma rápida
to devastador, o colunista do Wall Street ter sido promulgada durante um ago- desindustralização, um aumento em
Journal Bret Stephens, informou os seus nizante embargo económico (“façam a dez vezes do desemprego uma explo-
leitores que o espírito de Milton Fried- economia gritar” grunhiu epicamente são de bairros de lata claramente instá-
man “estava certamente a flutuar para Richard Nixon após a vitória de Allende veis. Eles também levaram o Chile a uma
proteger o Chile” porque, “graças a ele, o nas eleições de 1970). O código foi de- crise de corrupção e a uma dívida tão se-
país tinha resistido a uma tragédia que pois actualizado nos anos 90, depois de vera, que, em 1982, o Pinochet foi força-
em qualquer lugar teria sido um Apoca- Pinochet e os Chicago Boys estarem fi- do a despedir os principais conselheiros
lipse... Não é por acaso que os chilenos nalmente fora do poder e a democracia dos Chicago Boys e a nacionalizar várias
estão a viver em casas de tijolo - e os já tinha sido restaurada. instituições financeiras que tinham sido
haitianos em casas de palha - quando o Não se admirem: como Krugman desreguladas. (Soa a algo familiar?)
lobo chegou para derrubá-las com um aponta, Friedman era ambivalente Felizmente, os Chicago Boys não
sopro.” quanto aos códigos de construção, por- conseguiram desmantelar o trabalho de
De acordo com o Stephens, as po- que considerava-os uma forma de in- Allende. A empresa nacional de cobre,
líticas radicais do liberalismo prescritas fringir a liberdade capitalista. Codelco, continuou nas mãos do Estado,
ao ditador chileno Augusto Pinochet Quanto ao argumento de que as injectando riqueza nos cofres públicos e
por Milton Friedman e os seus infames políticas de “friedmanianas” são a razão evitando que os Chicago Boys arrasas-
“Chicago Boys” são a razão de o Chile de os chilenos viverem em “casas de ti- sem a economia chilena por completo.
ser uma nação próspera com “umas das jolo” em vez de “palha”, fica claro que Eles também não conseguiram des-
normas de construção mais rígidas do Stephens não conhece o Chile anterior fazer-se do código de construção de
mundo.” ao golpe. O Chile dos anos 60 tinha o Allende, um descuido ideológico pelo
Há um grande problema em torno melhor sistema de saúde e educação qual devemos estar gratos.
desta teoria: o novo código de constru- no Continente, além de uma indústria
ção sísmica no Chile, elaborado para re- efervescente e de uma classe média Tradução de André Costa Pina
[16] ESQUERDA Nº 39
OPINIÃO
Esses caminhos
que vão dar a Março
POR HELENA NEVES
Que vivências, que me- já um forte carácter reivindicativo, pa- ideológica e social sucederá o 8 de Mar-
tente nas enormes manifestações de ço. Mas as mulheres que ganham as ru-
mórias de lutas colecti-
massas, em Fevereiro, contra o desem- as de Nova Iorque, na primeira grande
vas conduziram a este prego e a inflação, quando do pânico manifestação de mulheres, não lêem o
momento? da crise de 1837. New York Dailly Tribune, não conhecem
8 de Março de 1857, É babilónico, na sua composição, Owen, estão longe de saber o que sig-
Nova Iorque, operárias este jovem proletariado americano. nifica a Igualdade, Liberdade e Fraterni-
Entre 1815 e 1860, oriundos não só de dade apregoados pela Revolução Fran-
têxteis nas ruas cesa e assimilados pelo pensamento
Inglaterra mas também de outros pa-
íses da Europa do Norte, aportavam à progressista americano. Não são iguais
Em pleno século XIX, o pensamen- América do Norte, 5 milhões e meio de a não ser entre si, irmanadas na mesma
to progressista americano reflecte um estrangeiros que, em 1850, constituem sorte pois até em relação aos operários
conjunto de influências, desde o ilumi- já 43% da população urbana. elas são discriminadas.
nismo subjacente aos ideais da Revolu- Provavelmente mais desprotegido Não conhecem a fraternidade a
ção Francesa de 1789 (recordemos que do que qualquer outro, porque a abun- não ser a da nascente solidariedade fe-
muitos revolucionários, banidos pelo minina pois que os trabalhadores, par-
dância de mão-de-obra, por um lado,
domínio napoleónico, emigram para a ticularmente os desempregados lhes
e a concentração industrial favorecida
América) e ao socialismo utópico, no- são, amiúde hostis.
pelo desenvolvimento da rede ferroviá-
meadamente de Calvet e de Owen. Es- Quais então as «causas» do 8 de
ria, proporcionam níveis de exploração
te chega mesmo a fundar, em Maio de Março nos EUA, Nova Iorque em 1857?
intensíssimos, a par do desemprego, da
1825, uma comuna em território ameri- Elas não são imediatas e muito me-
insegurança, das tensões no movimen-
cano «A Nova Alemanha» e influenciará
to operário. O escritor inglês Frederick nos, simples. Necessariamente terão de
a parte mais silenciada do feminismo
Marryat conta que os mecânicos de- ser buscadas na própria vivência femi-
americano através da comunalista
sempregados de Nova Iorque têm «ar nina no território americano, desde a
Fanny Wright.
de lobos esfomeados». participação das mulheres na coloniza-
Entretanto, em meados do século,
Charles Dickens fala da «pobreza, ção ao movimento feminista, passando
surgem timidamente alguns centros
desgraça e vício da cidade», em 1842. pela intervenção feminina na guerra da
de pensamento marxista ligados ao
Lydia Maria Child, autora de «uma in- independência, nas associações filan-
núcleo revolucionário de Marx e Engels
vocação a favor da classe dos negros trópicas e pacifistas e no movimento
em Bruxelas que constitui o embrião
americanos», desabafa «It is sad to abolicionista.
da Associação Internacional de Traba-
lhadores. talking in the city» («é triste andar na
O próprio Marx publicará, em 1853 cidade»). Mais triste ainda, a sorte da A mulher na coloniza-
e 1854, diversos artigos ao New York mulher trabalhadora. A ela os salários ção e independência
Dally Tribune. Paralelamente, o movi- mais miseráveis; as piores condições de «São elas as verdadeiras escravas do
mento operário americano apresenta trabalho, a opressão mais profunda. país» escreve uma inglesa referindo-se à
Neste contexto de fermentação mulher americana do período de colo-
[18] ESQUERDA Nº 39
ciando os baixos salários, as jornadas nómica, mas como vislumbrar sonhos por pão. Pouca arte, o amor e a beleza
brutais em duração e cadências, os pa- na agressividade dos dias de cansaço, conheceram os seus espíritos escravi-
gamentos em espécie. exploração insana? zados. Jim é por pão que nós lutamos...
Da consciência já específica dos Mas elas, as mulheres do 8 de Março mas lutamos também por rosas.
seus problemas enquanto mulheres tra- de 1957 abrem para outras exigências, À medida que marchamos, marcha-
balhadoras nasce o Female Labor Asso- outras reivindicações. Na greve têxtil de mos, trazemos os dias maiores. A eleva-
ciation e, a partir de 1850, a organização Lawrence, Massachusetts, em 1912, jo- ção da mullher representa a elevação da
de departamentos de mulheres no inte- vens trabalhadoras moleiras trazem nos raça. Não mais o escravo nem o vadio...
rior dos sindicatos masculinos. estandartes que seguram nas mãos de Mas uma partilha das glórias da vida:
E, finalmente, a 8 de Março de 1857, trabalhadoras, a expressão de um outro Pão e Rosas! Pão e Rosas!” - Joan Baezo
serão centenas de mulheres, vestidas querer, mais amplo, a dimensão do hu- cantará nos anos 60.
pobremente, de xaile de lã, vindas das mano: “Pão e Rosas! Pão e Rosas!”. James
Nos passos, nos gritos das mulheres
fábricas de confecção e calçado para as Oppenheirmer canta estas mulheres em
de todos os Marços, de todos os dias da
ruas de Nova Iorque. Trabalham 16 ho- luta, pela luta das mulheres de todos os
sua luta subjacente a memória da vivên-
ras e reivindicam «o dia das 10 horas» Marços. “(...) à medida que marchamos,
cia e experiência revolucionária da mu-
que os homens empregados na cidade marchamos, lutamos também pelos Ho-
lher americana do 8 de Março de 1857. A
conquistaram há cerca de 17 anos. mens! Pois que eles são filhos das mu-
memória das lutas colectivas. Memória
Passam os dias em salas sombrias e lheres e nós somos novamente as suas
pesadas e exigem «oficinas claras e sãs mães. As nossas vidas não serão adoça- na qual se enraízam outras e outras lu-
para trabalhar». Sofrem a ânsia de lucro das, desde o nascimento até que a vida tas, este Dia.
dos patrões como mão-de-obra mais se feche; Os corações têm fome, tal co-
Helena Neves, feminista, professora universitá-
barata e querem «salários iguais aos mo os corpos; dai-nos, mas dai-nos ro- ria e investigadora nas áreas de Filosofia, Socio-
dos alfaiates». É ainda uma luta marca- sas. À medida que marchamos, marcha- logia, Estudos sobre o Género e História de Mo-
da pela urgência da necessidade, tem a mos, inúmeras mulheres mortas gritam vimentos de Mulheres, foi deputada do Bloco
marca da reivindicação meramente eco- através do nosso canto, o seu velho grito de Esquerda de 1999 a 2002.
FLICKR
A marcha
da hipocisia
POR NELSON PERALTA
A Live Earth, criada por sume qualquer responsabilidade pela em Estarreja, onde foi co-organizado
Al Gore e pelo produtor fuga, pelas suas consequências ou pela com a Câmara Municipal local onde a
e empresário dos media poluição resultante da fábrica. A Am- empresa tem uma fábrica.
nistia Internacional chegou mesmo a A legitimação institucional eleva a
Kevin Wall, organizou a
requerer uma investigação à Dow face propaganda a outro patamar, e aí nem
propósito do dia da água
ao que considera serem pressões ina- a autarquia quis ficar de fora. Aprovei-
mais um evento à escala ceitáveis da empresa sobre o Governo tando o balanço, a Câmara Municipal
mundial. Em várias Indiano para se livrar das suas respon- anunciou que iria assinar a petição pa-
cidades de todo o planeta, sabilidades legais na catástrofe quími- ra que o acesso à água seja consagra-
para além de concertos e ca de Bhopal. Mas a actividade da Dow do como um direito básico na Decla-
actividades educacionais, é bastante vasta. Foi uma das produto- ração dos Direitos Humanos da ONU.
as comunidades locais ras do famoso agente laranja (herbicida Isto apesar de há poucos meses a CM
foram envolvidas em utilizado na guerra do Vietname, com Estarreja ter aderido a uma nova parce-
caminhadas de 6 km, consequente impacto ambiental e na ria para o abastecimento e saneamen-
a distância média que saúde de militares norte-americanos e to das águas, que vai exactamente no
muitas mulheres e da população vietnamita) e, um pouco sentido oposto, tratando a água como
por todo o globo, tem um enorme his- uma mera mercadoria e preparando a
crianças fazem todos
torial de contaminação de águas e do sua concessão a privados. Refira-se ain-
os dias para obter água
meio ambiente. da que, por duas vezes, o Bloco apre-
potável. Agora, esta empresa descobriu um sentou na Assembleia da República
novo nicho de mercado: o tratamen- uma proposta para a realização de um
A “The Dow Live Earth Run for to de água! Nada melhor do que ga- estudo epidemiológico no concelho de
Water” realizada nas vésperas do dia nhar dinheiro com a poluição que lhe Estarreja, para aferir se as doenças com
mundial da água, deve o seu nome permitiu acumular lucros à custa do causas ambientais - como o cancro - te-
ao patrocinador, a The Dow Chemical ambiente e da saúde das populações. rão aí uma maior incidência que no res-
Company, e tem como objectivo aler- Necessita portanto de lavar, perdão, re- to do país. A existência de um grande
tar para o problema e recolher fundos. converter a imagem, que sai certamen- complexo químico, onde aliás se situa
Tudo muito ambientalmente cor- te mais barato que limpar o seu rasto a Dow, e os dados empíricos justificam
recto, não fosse a Dow uma das em- de caos e destruição. que se averigúe a situação, seja para
presas que mais terá contribuído para a Esta Marcha assume transversal- tranquilizar a população ou para ga-
poluição das águas do planeta. A Dow mente um carácter de higienização rantir uma resposta mais eficaz às cau-
é hoje a proprietária da Union Carbide da opinião pública. Não deixa assim sas, à detecção e ao tratamento dessas
que em 1984, devido a uma fuga na sua de ser curioso que, para além de toda doenças. Contudo, esta proposta tem
fábrica em Bhopal (Índia), terá provoca- a mediatização, a página inglesa da sido inviabilizada por PS/PSD/CDS-PP
do a morte a 15 mil pessoas. Hoje em wikipedia sobre esta iniciativa tenha com o silêncio cúmplice da Câmara de
dia, 100 mil pessoas continuam a sofrer sido recentemente alterada, retirando Estarreja e do seu Presidente.
problemas de saúde em resultado do as referências ao alarme público que o De facto, o verde lava mais branco,
acidente, sem o devido tratamento ou patrocínio da Dow provocou. mas certamente que merecemos um
compensação, vivendo na penúria e A Marcha pela Água decorreu nas poder público que pugne pela defe-
sem que o meio ambiente tenha sido maiores cidades mundiais, por vezes sa dos interesses da população e não
devidamente descontaminado. com a legitimação de um apoio institu- que se comporte como mero relações
Contudo, e apesar dos esforços cional, mais ou menos directo. Em Por- públicas do poder económico, seja por
persistentes de ONG’s, a Dow não as- tugal, a iniciativa teve o seu ponto alto omissão seja por acção.
[20] ESQUERDA Nº 39
OPINIÃO
LUSA / MANUEL ANTÓNIO
Justiça e paz
POR TIAGO GILLOT
Roteiro da Cultura: geral e o investimento e/ou mecenato colapso de muitos serviços de saúde é
subfinanciamento em privado. Catarina Martins deu o exem- real. Apesar disso, a ministra da saúde
plo concreto da Fundação de Serralves, não se comprometeu com duas medi-
destaque
para ressalvar que este não será uma das absolutamente indispensáveis pa-
solução para o problema do subfinan- ra evitar este descalabro, reclamadas
ciamento cultural. Segundo a deputa- vezes sem conta pelos deputados do
da do Bloco, o investimento privado Bloco, ao longo da interpelação: a não
das 150 empresas que investem na aplicação no SNS da regra 2:1 ou 3:1
Fundação de Serralves não chega para para as admissões e um regime de ex-
igualar o investimento do Estado nessa cepção que desmotive os médicos de
mesma Fundação. A sessão de encer- antecipar a reforma sem os prejudicar”,
ramento do Roteiro da Cultura serviu acrescentou o deputado que partici-
ainda como palco para a apresentação pou dois dias antes na reunião do Bloco
do anteprojecto de Lei do Bloco de Es- com o Sindicato dos Enfermeiros. “Os
querda para a criação de uma Rede Na- enfermeiros estiveram, também, no
cional de Teatros e Cine-Teatros. centro do debate parlamentar. Ficou
claro que o governo pretende continu-
Interpelação ar a discriminá-los, recusando-lhes um
Na derrapagem das auto-estradas direito elementar: remuneração igual à
gastou-se o equivalente a 5 anos de ao governo sobre
de todos os licenciados da administra-
orçamento do Ministério da Cultura”, política da saúde ção pública”, declarou João Semedo ao
denunciou a deputada Catarina Mar- esquerda.net.
tins no encerramento do Roteiro da “A interpelação do Bloco sobre a
Cultura. Esta iniciativa dinamizada pelo política governamental de recursos
Bloco teve sessões em Aveiro, Viana do humanos na área da saúde não podia
Castelo, Guimarães, Coimbra, Vila Real, ter sido mais oportuna: no próprio dia,
Évora, Faro, Bragança, Covilhã, Guarda, confirmou-se a corrida à reforma de
Entroncamento, Santarém, Leiria, Cal- mais de 500 médicos e, duas ou três
das da Rainha, Portalegre, Beja, Viseu, horas antes, o conselho de ministros
Setúbal e Lisboa. tentava atrapalhadamente e à pressa
Para além da questão do subfinan- remendar o problema que ele próprio
ciamento para a área da Cultura a ses- havia criado ao mudar para pior as re-
são de encerramento discutiu a falta gras da aposentação na administração
de uma estrutura em rede na área dos pública”, afirmou o deputado João Se-
teatros e das artes do espectáculo em medo a seguir ao debate. “O risco de
[22] ESQUERDA Nº 39
BREVES
Bloco Açores
lança Publicação
O Bloco de Esquerda dos Açores
lançou uma publicação trimestral
em formato papel e em formato di-
gital. A publicação visa divulgar a
actividade do Bloco na Assembleia
Legislativa dos Açores, nas Assem-
bleias Municipais de Ponta Delgada
e Ribeira Grande, dedicando tam-
bém uma página exclusivamente a
Cultura. O primeiro número está dis-
ponível em http://acores.bloco.org.
Bloco quer alterar Ana Drago. O Bloco de Esquerda assu- Bloco de Esquerda vota favoravelmen-
modelo de gestão miu assim uma escolha de não propor te. Em Odemira, a AM também rejeitou
um novo modelo, mas sim de trabalhar a moção, com os votos a favor de Blo-
escolar
a lei em vigor com o intuito de dotar as co e CDU, a abstenção do PSD e o voto
escolas de ferramentas para a demo- contra do PS. Por proposta do Bloco, as
cratização e participação na sua gestão, AM’s de Beja e Almodôvar aprovaram
responsabilizando quem melhor as co- também moções de solidariedade com
nhece: os professores e as professoras. a greve dos trabalhadores da Somincor.
I Conferência de Jovens
Beja: AM aprova por Estudantes do Bloco
unanimidade alarga-
mento do subsídio de O primeiro encontro nacional do
sector estudantil bloquista realizou-se
desemprego
no Porto nos dias 19 e 20 de Março.
A deputada Ana Drago apresentou Estiveram em debate duas moções de
Por proposta do Bloco, a Assem-
o Projecto de Lei que altera o actual re- orientação alternativa, tendo obtido
bleia Municipal de Beja aprovou uma
gime de autonomia, administração e mais votos a moção “A”, que defendia,
moção apelano ao alargamento do
gestão das escolas públicas. O projecto entre outras coisas, que “o Bloco de Es-
subsídio de desempregoPor proposta
foi apresentado numa audição parla- querda rejeita o sectarismo e o conser-
do Bloco de Esquerda, a AM de Beja
mentar com representantes de sindica- vadorismo” e que “uma nova esquerda
aprovou por unanimidade um apelo
tos e associações de professores, como socialista é autónoma, é unitária, pro-
ao alargamento do subsídio de desem-
a FENPROF, SINDEP/FENEI movimentos move convergências, vai à luta, cria
prego, a quem tenha trabalhado e des-
independentes de professores, CONPA- uma nova cultura, é aberta”. A moção
contado pelo menos seis meses no ano
FP e CNIPE. “B”, que defendeu que “a direcção do
anterior. A moção apela a que a Assem-
Passado um ano da entrada em BE, o PCP e Manuel Alegre, ao mante-
bleia da República que aprove o alarga-
vigor da lei 75/2008, tornou-se óbvio rem-se separados, recusando erguer
mento do subsídio de desemprego.
que os receios do Bloco de Esquerda se uma plataforma conjunta para derrotar
realizaram com a diminuição da demo- o PS, contribuíram para que este ven-
Na AM de Serpa, uma moção se-
cracia nas escolas pela concentração de cesse”, foi derrotada na votação obten-
melhante foi aprovada com os votos a
poder na figura do Director. “Existem do 28% dos votos na eleição para os
favor de Bloco e CDU e o voto contra
mesmo escolas onde já se tornaram membros da nova coordenadora na-
do PS e a abstenção do PSD. Em Almo-
óbvias lógicas partidárias e de amiguis- cional de jovens estudantes do Bloco.
dôvar, a moção foi rejeitada pelo voto
mo que importa combater” – referiu A moção “A” foi maioritária, com o voto
contra do PSD e a abstenção do PS, só o
de 72% dos presentes.