Você está na página 1de 18
‘Trdugio lo original francés inttulado Précts de Literature Comparé, de Pierre Brunel ¢ Yves Chevrel © Presses Universttres de France Reservados todos os direitos de acordo com lel Baiczo da FUNDAGAO CALOUSTE GULBENKIAN ‘Av. de Berna |Lisboa 2008 Depésito Legal N° 214 232/04 SBN 97231-10881 228 8 DERECETCAO PROBLEMAS DA RECEPCAO: ‘La relation thédtrale, Testos reunidos por Régis Durand, Presses Universitaires de Lille, 1980, 166 pp. PROBLEMAS DA APRESENTACAO DOS TEXTOS: Baumgartner, E, Boulestreau, N. (eds. La Présentation du livre, Actes du Colloque de Paris X~Nanterr (4,5, 6, dec. 1985), Université de Paris X ~ Nanterre, 1987, 348 pp. Geonette, G. Seuls, ats: Seuil, 1987, 394 pp. ALGUMAS FONTES DOCUMENTAIS: ‘COLEOGORS EXISTENTES QUE REUNEM OPINIORS CRETICAS: ‘Lectures de [..J». Pati: A. Colin «Les eritiques de notre temps et (... Paris: Gamer. The Critical Heritage». Londres: Routledge & K. Pal [BXISTE UM REPORTORIO MONUMENTAL RELATIVO A RECEPCAO DAS LITERATURAS ESTRANGEIRAS NA ROMENIA: Dumitrescu-Busulenga, Z. (ed.) Bibliografia relatiilor literaturii romdne ou literaturile strain n peridice (1859-1918) Bibiografa das Relagdes da Literaura Romena coma Literatras Extrongeras nox Periédicos (1859-1918), Bucarete: Edition de ‘Academia de la Replica socaista tomena, 3 ols. 1980-1985, xI-316, XV 449, 308 pp. [23813 entradas. dice dos esrtres estrngeitos, de esritoes © teadtoresromenés) sta smestrel Oewre et Critiques, fndada em 1976 evga por Wolfgang Leiner, ‘em colaboragfo com Clyde Fitante EmestBehler€consagradn especialmente 20 cestudo dos diferentes sspectos da recepeto erica de obras Hiertias © da oa confontago com os seus litres e rca. Exist um ace da evista cobrindo os sete primetos ans (19761983, dot a0 n* Vu2) pubicado em 1984, 72 p (Tbngen-Pais, Nar-Plice: fodico de matéias, temas ttados,bibliogais, colaboradores. AS LITERATURAS AFRICANAS NO DOMINIO DA INVESTIGAGAO COMPARATISTA Jacques Chevrier UM RECONHECIMENTO PRUDENTE; UMA ABORDAGEM DIF{CIL, ‘Uma vez mais temos de admitir que Africa continua a ser a grande ausente da série de manuais que, hé mais de meio século, tentam captar definir 0 objecto «Literatura Comparada». Aceita-se a auséncia na obra de ‘Van Tieghem, apesar de a sua publicagdo coincidir com a abertura, as portas de Paris, da Exposigo colonial de 1931 cujos pavilhdes exéticos atrairam milhdes de visitantes, mas que dizer do pequeno «Que sais-je?> de Marius-Frangois Guyard, reeditado varias vezes entre as décadas de 50 € 60, isto é, no preciso momento em que se inicia o movimento de desco- onizago do ultramar sem que nunca seja tido em conta 0 Terceiro Mundo? Confirma-se a mesma caréncia no livro de Claude Pichois & André-Marie Rousseau, notével em muitos aspectos, mas igualmente mudo sobre Africa, tal como a sua reedigiio na forma aumentada ¢ revista por Pierre Brunel sob o titulo Qu’est-ce que la littérature comparée? De tal modo que na recensio critica que fez a desta obra para a Revue de Littérature comparée (a2 4, Outubro-Dezembro, 1985), Jacques Body no pode deixar de constatar que, por muitas que sejam as qualidades dessa reedigo, 0 mundo que nos dé a ver é «um universo tristemente limi- tado a cultura ocidentaln Africa, considerada na sua dimenséo literéria, nfo parece ter tido um ‘melhor acolhimento no campo do africanismo ortodoxo. Se 0s afticanistas se interessam, hé muito tempo, pela historia, as religides, as linguas de ‘um modo geral pelas sociedades do continente afticano, parecem, em contrapartida, abordar de forma hesitante ¢ renitente as produgdes de caricter literdrio, Neste aspecto, & significative que 0 muito oficial Journal de la Société des Africanistes consagre apenas em situagées excepeionais recensées criticas de produgbes literérias africanas contem- orineas. Apesar de conceder um lugar de destaque ao estudo das litera- turas orais, limita-se frequentemente a reter apenas os aspectos etnogréficos ou lingufsticos, em detrimento da dimensio propriamente literéria. Contudo, esta assergio deve ser matizada na medida em que 0s trabalhos de alguns especialistas, como Genevidve Calame-Griaule, Christiane Seydoux, Denise Paulme ou Lilyan Kesteloot, etc. insistem, pelo contré- rio, cada vez mais no estudo dos processos estilisticos que distinguem a palavra ordinéria da lingua deste mito ou daquele conto. 0 ostracismo de que foi durante muito tempo vitima a literatura africana escrita ou impressa (este pleonasmo tem por fim diferenciar 0 que se convencionou designar, actualmente, pela expressio «literatura oral») pode, contudo, explicar-se pela juventude do fenémeno (pouco mais de meio século ¢ claramente pouco para uma literatura!), mas encontra a sua verdadeira origem num certo mimero de hébitos de atitudes mentais préprias do africanismo tradicional. Bernard Mouralis afirma que: «com efeito, as diferentes descrigdes que constituem 0 campo do africanismo nem sempre safram de certos quadros I6gicos nos quais nasceram no final do século XIX... Em particular, nunca aban- donaram um tipo de olhar ou de interrogagio que tende a colocat, réla- tivamente a Europa, a Africa como diferenga absoluta ¢ a postular assim uma hierarquia dos fenémenos que poderiam ser divididos. por uma linha que iria do mais africano ao menos afticano» («L'Université a-telle peur de la littérature négro-afiicaine d'expression frangaisen, Recherche, Pédagogie et Culture, n.° 57, Abril-Junho 1982). Compreende-se que 0 que interessa ao comparatista é menos reen- contrar «a africanidade» deste ou daquele texto — apesar de um tal conceito poder ser operative, como veremos mais adiante — do que de observar esse texto como 0 surgimento de uma consciéncia enraizada hic et nunc. : Decididamente azarada, a Africa literdria ndo tem um melhor acolhi- mento nos quadros da instituigo universitiria cléssica onde faz. ainda muitas vezes a figura de uma intrusa, Nao ha muito tempo, excelentes ccolegas, reputados progressistas, se espantavam com a importincia que eu atribuia aos «Negros» no curso de literatura geral e comparada proposto (COMPENDO DE LITERATURA COMPARADA 231 aos estudantes... A experigneia ndo é singular, uma vez que todos os comparatistas que partilham os seus ensinamentos sobre as literaturas afticanas ~€ eles so cada vez mais numerosos —mostram, num momento ‘ou noutro, provas de desconfianga, de espanto ou de interesse educado, manifestado relativamente a esta disciplina. Tudo se passa como se no preciso momento em que se efectuava a definigdo de um novo objecto do saber, este fosse imediatamente relegado para a periferia das «belas letras», para essa zona pouco conveniente onde se acotovela um certo miimero de textos intempestivos de uma legitimidade duvidosa, Nao deixa de ser interessante notar que a situagio tende a evoluir, ainda que certos reconhecimentos possam deixar perplexo ¢ traiam 0 cembarago persistente da critica face ao dominio literétio africano, Assim, pela primeira vez, em 1986, um autor afticano, Léopold Senghor, foi inscrito no programa das agregagdes literérias, mas, paradoxalmente... em literatifa francesa! Come Cole be ‘Formuladas estas reservas, nfo deixa de ser verdade que a Africa, compreendida na sua dupla configuragao de Africa ao norte e ao sul do Sara, tende a suscitar um intetesse crescente por entre as fileiras de comparatistas que af encontram um novo territério & medida das suas ambigbes. ‘Nao sei se seré necessério considerar Africa como fazendo parte dessas «zonas probleméticas» da instituigao literéria de que fala Daniel Pageaux na obra Libre Blane de la-recherche en littérature comparée, mas parece-me que actualmente o continente africano ~ e de um modo mais geral, © conjunto do Terceiro Mundo ~ constitui um espago privilegiado para a apreensio de fendmenos hist6ricos, culturais e sociais nos quais assenta a renovagdo dos estudos comparatistas. Com efeito, vemos desdo- brar-se no campo da literatura africana contemporiinea todo um jogo de interferéncias cuja compreensio passa necessariamente por uma atitude interdiseiplinar que alie a antropologia, a historia e a sociologia com exames mais especificamente ret6ricos. Campo de observacao privile- giado para o estudo da relagdo entre literatura e sociedade, a anélise das literaturas emergentes permite igualmente que nos interroguemos com beneficio sobre a propria nogdo'de literatura, sobre as relagdes que esta ‘mantém com 0 envasamento da tradigo oral ou ainda sobre o estatuto do escritor que ideologia da descolonizagao'tem, muitas vezes, tendéncia para investir com uma espécie de «mission simbélica para com o seu povo». Se quisermos considerar a descolonizagdo como um dos fenémenos maiores da nossa hist6ria imediata, medimos todo o interesse que uma tal perturbagio pode representar-para 0 comparatista confrontado com uma literatura da demanda e da{reconqiista da identidade, uma literatura que € 40 mesmo tempo o-espago problemitico de um imagingrio situado na interseceZo de uma pluralidade de ragas'e de culturas, Parece desejdvel que este alargamento do territério comparatista as literaturas de Africa seja acompanhado de um verdadeiro reconhecimento dos investigadores especializados neste dominio, reconhecimento que poria um fim as imposturas justamente denunciadas por Charles Bonn quando evoca 0 caso dessas teses sobre as literaturas do Terceiro Mundo «frequentemente dirigidas por docentes mal preparados e que, devido & sua especialidade, nao leram por vezes os textos sobre os quais se propdem trabalhar» («Tertitoires du comparatismen Actes des rencontre de la SPLGC, Saint-Etienne, 6 ¢ 7 de Junho de 1985). Esté em jogo a deon- tologia e a credibilidade da investigagao comparatista africana realizada nas universidades francesas. Jé tive ocasido de levantar este problema no Livre Blanc de la recherche en LGC. O estudo das literaturas africanas, € no caso concreto que nos ocupa especificamente, a andlise da literatura africana de expressio francesa (que também & em certa medida a da didspora) efectua-se com base uma série de procedimentos que se distribuem por diversos niveis: desde a anexagio pura ¢ simples a0 dominio do francés ao reconhecimento de uma especificidade, pasando por toda uma gama de atitudes marcadas pela hesitagdo e o embaraco. Deste modo, é legitimo pensar que os jurados que, em 1921, se pronunciaram a favor do romance de René Maran, Batouala, pretenderam antes de mais recompensar uma obra que, no seu entendimento, era uma justificagdo da actividade colonial, ainda que, é verdade, com algumas reservas, Com excepgio de um artigo particularmente veemente & violento surgido em Le Crapouillot, a critica, mesmo quando se dividiu sobre a escolha dos prémios Goncourt, considerou, com efeito, Batouala ‘como um romance francés que, pelo seu tema, pelo carécter polémico do prefacio e talvez pela personalidade do set autor, parecia ser extrema- mente dificil de classificar dentro de um género espectfico. Alguns comentacotes chegam mesmo ao ponto de aconselhar René Maran a inte- sgrar-se no modelo do romance exstico, de que Le Roman d’un spahi, de Pierre Loti constitui a seus othos o paradigma, enquanto outros, como E. Pujarniscle, esforgam-se pot incluir Batouala no romance colonial, caracterizado pela sua preocupagio de realismo e destinado, segundo eles, a suplantar 0 romance exético, E 0 critico literério de La Grande Revue concluiu o seu artigo confessando que «nutre grandes esperancas numa literatura colonial que seria obra dos indigenas» («Batouala et accueil de la critique», R. Fayolle, L’Afrique littéraire, n.° 50, 4.° trimestre, 1978). Encontramos a mesma atitude fundamentalmente paternalista a trabalhar, nos prefécios, ou «adverténcias» que varios administradores das, col6nias, Jean-Richard Bloch, Georges Hardy ou Robert Delavignette, redigem 2 Jaia de apresentacio dos primeiros escritos dos seus protegidos, Bakary Diallo (autor de Force Beauté, 1926), Paul Hazoumé (Doguicimi, 1938) e, por fim, Ousmane Socé cujo romance Karim surge em 1935. No livro de memérias em que recorda a sua carreira no ultramar, Service africain, © mesmo Delavignette consagra um capftulo & obra dos seus escritores «indigenas> com um titulo que nos abstemos de comentar: Esta irrupgio das literaturas africanas é saudada vivamente no céle~ bre Orphée noir de Jean-Paul Sartre que preludia a Anthologie de la nouvelle poésie negre et malgache de langue francaise realizada por Léopold-Senghor em 1948, Se a Antologia é em si testemunho do fim do monopélio europeu em matéria de critica literéria africana, o seu prefiicio dé bem conta das dificuldades de uma leitura branca ¢ do sentimento de mé consciéncia que a acompanha. Fundamental para toda-a anélise da recepefio da literatura negra em Franga, 0 texto de Sartre satida devida- mente a grande epifania poética da Negritude cujos elementos essenciais analisa: a paixdo pelo softimento, a busca da identidade perdida, o regress0 a0 pafs natal, a descida aos «irifernos destumbrantes da alma negra, auto-de-fé da linguagem. No mesmo perfodo, o autor de Mains sales [As Méos Sujas] insiste no carécter escandaloso deste surgimento pottico, escandaloso bem entendido para os «Europeus de direito divino» habituados durante séculos a «ver sem serem vistos». Mas eis que «a mordaga que tapava as bocas negras» foi arrancada e «hoje em dia, estes homens negros olham-nos ¢ 0 nosso olhar reentra nos nossos olhos». Contudo, a homenagem vibrante feita & Negritude é acompanhada de reservas que Ihe limitam singularmente o alcance. Depois de insistir na dimensdo evangélica da poesia negra ~ «ela anuncia a boa nova: 0 reen- contro da Negritude» -, Jean-Paul Sartre conclui sobre a negatividade dessa Negritude, «tempo fraco de uma progressdo dialéctica» ao fim da ‘qual aparece votada a desaparecer e a fundir-se numa sintese superior que no é sendo «a realizagao do humano numa sociedade sem ragas». Assim, de um modo que pode parecer um pouco precipitado, o autor de Orphée noir chega a uma conclusio em forma de veredicto: «A Negritude é para ser destrufda, & passagem ¢ niio objectivo, meio e nfo um fim» ‘Teremos, naturalmente, ocasiéo de regressar ao contetido actual- ‘mente tio controverso da Negritude e As interpretages, miltiplas e diver- gentes, &s quais deu lugar, mas através da andlise de Sartre vemos jé perfi- larem-se duas atitudes que definem um duplo sistema de leitura relativamente ao objecto literatura africana, De um lado, uma perspectiva naturalmente ecuménica, pronta a recuperar esta literatura englobando-a ‘num certo nimero de correntes mais gerais, surrealismo, literatura revolu- ciondria € proletéria, etc.; do outro, uma leitura que procuraré mais descortinar os caracteres pr6prios, a especificidade. O problema da especificidade das literaturas afticanas coloca-se com tanto mais acuidade ) ‘quanto 0 critério lingufstico & aqui inoperante ~ as literaturas africanas escrevem-se essencialmente em francés, inglés e portugués ~ e toma-se, consequentemente, necessério definir as caracteristicas susceptiveis de as separar da tutela ocidental e de Ihes conferir uma real autonomia, i nisso {que investem os fundadores da Negritude, os seus epigonos e os seus umerosos exegetas, Enquanto se aguarda que este dispositive analftico se manifeste plenamente e enquanto florescem as primeiras obras-primas da Negritude, provenientes quer de Africa quer das Carafbas ou de Madagéscar, é todo tum processo de reconhecimento das literaturas africanas que se instala progressivamente, A criago, em 1947, de «Présence afticaine», simul- taneamente revista ¢ editora, marca o comego de uma série de iniciativas que encontrario 0 seu prolongamento natural nos dois congressos inter- nacionais de Paris (1956) e de Roma (1959), enquanto comegam a surgit uma série de periédicos como L’Afrique en marche, animado por Lamine Diakhaté, La Vie africaine de Olympe Bhély-Quenum ou ainda L'Afrique actuelle, dirigido por Paulin Joachim, etc., nos quais se desenvolve uma critica literéria autéctone. E também justo assinalar o papel pioneiro desempenhado em Africa pelas revistas como Liaison, no Congo, Souffles, em Marrocos ou ainda de mencionar a efervescéncia intelectual de que 0 antigo Dahomey foi o teatro durante quase meio século de colonizagao, exemplos tfpicos de ‘fenémenos por vezes ignorados ou menorizados em proveito quase exclu sivo das turbuléneias parisienses. Apesar de tudo, foi nas margens do Sena que estava destinado a nascer 0 movimento da Negritude. A sua primeira manifestagéo avant la lettre foi uma espécie de manifesto programa com o titulo provocador: Légitime défense, publicado em 1932, mas 6 sobretudo em volta do jornal L’Etudiant noir, fundado em Paris, em 1935, por Léon Damas, Aimé Césaire e Léopold Senghor que se cristalizam as reivindicagées e aspi- rages do renascimento cultural negro, No princfpio de inspiragio franca- mente franc6fona, a Negritude exerceu durante quase dez anos um verdadeiro monopélio literétio ¢ o papel de locomotiva cultural relativa- ‘mente ao conjunto do continente africano. A ideologia da Negritude, arti- culada em tomo de um anticolonialismo por vezes virulento ¢ de_um Jirismo militante, esteve na origem do sucesso alcangado por Léopold ‘Senghor e David Diop entre os estudantes luso-africanos agrupados em Lisboa na Casa dos Estudantes do Império. Mas é sobretudo na Africa _COsMFETWONO DE LATEAATUKA COMPAKADA 2st angléfona que se viria a exercer, momentaneamente, a influéncia do movi- mento nascido em 1935, em Patis. ‘Ao langar, em 1957, em Ibadan, na Nigéria, a revista Black Orpheus, Janheinz Jahn © Ulli Beier, dois afticanistas alemaes, prestavam home- nagem explicita a Orphée noir de Jean-Paul Sartre publicado nove anos antes. Para além disso, as primeiras tiragens da revista foram sobretudo consagradas & publicagaio de tradugdes de escritores africanos e antilhanos de Iingua francesa e apenas a partir de 1960 € que surgiu um movimento de reacgo contra a Negritude, considerada simultaneamente como demasiado tedrica e exageradamente idealista Estas queixas seriam, alids, retomadas um pouco mais tarde nas pr6prias fileiras dos franc6fonos, em particular por ocasitio do Festival pan-africano de Argel, em 1969, ¢ depois durante 0 Coléquio de Villetaneuse, em 1973, durante 0 qual 0 chefe de fila dos contestatérios, ‘Tidjani-Serpos, no hesitou em denunciar 0 carfcter, na sua opinigo, sinmul- taneamente anacrénico e inoperante da Negritude senghoriana, Tchicaya, que vé na Negritude uma «abomindvel diversfio», acrescenta pela sua parte: «recuso-me a cair na armaditha que quer que a cultura seja feita de remi- niscéncias vagas do passado. Esta 6 outra forma de oprimit, de perverter, de distrair!» E precisamente esta ideia de distracgdio que é explorada pelo hiaitiano René Depestre que, tendo considerado que «a Negritude foi um ‘momento determinante deste século», constata também que ela se conver teu num processo de zombificagao. Perante este verdadeiro «motim», Lilyan Kesteloot, que esteve em grande parte na origem do interesse pela literatura africana em Franga, formula duas chamadas de atengo, A primeira para observar que «a Negritude aparece um pouco como o bode expiat6rio dos infortinios de Africas. A segunda para dizer que, face Aqueles ataques, «Léopold Senghor, que foi e permanece 0 tinico teérico dessa ideologia da Negritude, a defende com muita subtileza e energia, sem deixar de modi- ficar, de ajustar o seu sistema em fungo das criticas que Ihe sao feitas» (Col6quio de Villetaneuse, op. ci.). Os cinco volumes de Liberté sto disto testemunho eloquentemente. Uma anélise deste corpus ainda pouco explorado permitiria, sem vida, circunscrever com maior precisdo os componentes da Negritude senghoriana, determinar-the as fases sucessivas e matizar o cardcter por vezes peremptério de declaragdes que remontam & juventude do poeta. A via foi aberta por Michel Hausser que na sua tese, Essai sur le podtique £00 __ po uvonasunnd APRILANAD SU DUMINIO DA INVESTIOAGAO COMPARATISTA de la Négritude (1986) se empenha em demonstrar 0 carécter simultanea- mente hist6rico e mitico do movimento. Histérico uma vez que é impos- sivel situar a Negritude com preciso no perfodo compreendido entre 1934 e 1950, periodo que corresponde, alids, &tiltima fase da colonizagio Para a qual a Negritude contribuiu para acelerar o declinio, Mas igual- mente mitica na medida em que, com um conjunto de processos e de estratégias, a Negritude visa exprimir a totalidade do mundo negro e funciona, na realidade, como um contramito que corresponde ao conjunto das representagdes do homem negro elaboradas ao longo de séculos pelo homem branco. v _ AINTERTEXTUALIDADE DA OBRA. Expresso de uma consciéncia ocultada durante muito tempo, 6 natural que as literaturas africanas procurem afastar-se de uma perspectiva globalizante e eurocéntrica que ndo via nelas mais do que um ramo exético das literaturas europeias. Fundadas por direito préprio, a iniciativa apresenta, contudo, alguns obstéculos na medida em que ¢ dificil afirmar que produgées literdrias escritas em frances, inglés ou portugues e cijos ‘modelos formais t@m a sua origem na cultura ocidental (por exemplo, 0 romance) no podem legitimamente ser apreendidas a nao ser por refe- réncia a um sistema de valores autérquicos, «autenticamente» afticanos. A fim de delimitar o campo dos estudos literérios afticanos é-se levado arelativizar um certo discurso ideol6gico e a recolocar as obras numa situa- 40 hist6rica concreta, o que permite, por um lado, mostrar o escalonamento no tempo, a diversidade e sobretudo as diferengas de estatuto, Neste quadro, € evidente que a literatura oral ocupa cronologi ‘mente o primeiro lugar. Literatura secular cujas origens se perdem na noite dos tempos, esta literatura oral constitufda por mitos, por contos, por Panegiricos e epopeias foi objecto de numerosos trabalhos de caricter antropol6gico ou lingufstico, mais raramente literdrio, e a sua importincia € hoje em dia unanimemente reconhecida, quanto mais nfo seja em fungao do papel cultural determinante que continua a desempenhar para 80 % dos africanos ainda afastados da alfabetizacio. Enguanto objecto do discurso ideol6gico, a literatura oral esté igual- mente presente nos debates orquestrados em volta da autenticidade africana, debates que frequentemente se confinam, 20 mesmo tempo, 20 wie [COMPENDIO DE LITERATURA COMPARADA 239 politico e ao cultural aos quais teremos ocasio de regressar. Basta, por agora, assinalar que uma parte considerdvel desta tradigio oral esté consagrada & celebragio dos herdis do passado e dos seus feitos, reais ou imagindrios, 0 que explica, sem diivida, 0 interesse que, nos anos 30 a 40, 6s alunos da Ecole Normal William-Ponty manifestavam pelo patriménio cultural dos seus respectivos pafses e, mais perto de nés no tempo, dé conta da celebrago de um Sunyat ou de um Chaka por uma pleiade de escritores contemporiineos entre os quais Léopold Senghor e Tehicaya UTam Si Consideradas durante muito tempo como sociedades «sem escrita» ~ 0 que por vezes tinha valor de condenacdo -, vérias comunidades, em parti- cular na regio austral do continente, nfo esperaram a chegada dos ceuropeus para se dotar de literaturas em Iinguas vernéculas, Em primeiro lugar, € necessério citar a Btipia cujas literaturas escritas, primeiramente em ghez, depois em américo, se contam entre as mais antigas, Num segundo tempo, a influéncia do Istéo e o seu corolétio, a introduclo da Ingua do Alcordo, impulsionam desde a Idade Média o desenvolvimento de uma importante literatura em érabe cujas ramificagdes se encontram também em Tumbuctu, intenso micleo cultural no século XVi que na zona oriental de Africa onde o arabe serve para transcrever 0 corpus suaili, ou ainda no Senegal onde desabrocham, a partir do século XVI, as literaturas wolof e peule as quais foram recentemente consagrados estudos eruditos, Mas é a partir do século XIX que se vai exercer a influéncia ociden- tal, essencialmente através da ac¢‘o evangelizadora, principalmente nas zonas de influéncia britinica onde os missiondrios protestantes se empe- nham em fixar pela escrita um certo mimero de linguas africanas. Ciosos, em tomar a palavra de Deus acessivel ao maior niimero possivel de pessoas, comegam por traduzir a Biblia (ou pelo menos fragmentos importantes desta), antes de propor aos seus leitores neéfitos adaptagdes de textos edificantes como Pilgrim’s Progress de John Bunyam que, desde 1923, era divulgado em mais de trinta linguas afticanas, ~ Este zelo apostélico engendraria varias vocagbes literdrias entre os novos convertidos, que se dedicaram voluntariamente & elaboracdio de hinos religiosos, de epopeias ou relatos aleg6ricos; entre os mais conheci- dos figuram Chaka de Thomas Mofolo, The Forest of Thousand Daemons do nigeriano Daniel Fagunwa (texto traduzido do yoruba para inglés por ‘Wole Soyinka) e, bem entendido, o célebre relato de Amos Tutuola, The Palm-wine drinkard (O Bebedor de Vinho de Palma}, traduzido em francés por Raymond Queneau, em 1952. Estas literaturas, durante muito tempo ignoradas ou desprezadas, so actualmente objecto de todo um trabalho de reavaliagio e podem oferecer ao investigador um campo de estudo que nfo é negligencifvel. Pode ser interessante avaliar em parti- cular as influéneias bfblicas © as dos mitos e cosmogonias africanas nos relatos de inspiragio, quando nao de factura crista, engendrados pelo zelo missionério, Por fim inscrevem-se, no campo dos estudos literétios africanos, de forma natural e prioritéria, os textos mais modernos redigidos nas trés Brandes linguas europeias da penetragio colonial, o francés, o inglés € 0 Portugués, Notar-se-4, alids, que ao contrério das literaturas angléfona e francéfona, agora bem conhecidas ¢ amplamente descritas, a literatura Iusofona permanece, em contrapartida, ainda largamente desconhecida do Piblico culto, principalmente devido a falta de tradugSes em mémero sufi- ciente. Com estas literaturas escritas nas linguas europeias coloca-se, evi- dentemente, um problema de identificagio que nfio encontrdimos nos dois casos precedentes, Se devemos reconhecer, com efeito, que as literaturas ‘modernas encontram a sua origem comum quer no facto colonial quer na reacgio a esse mesmo facto colonial, acrescentado com uma reivindicagao de identidade cultural, permanece 0 facto de a sua especificidade poder parecer problemética aos comentadores, alguns dos quais nao hesitam mesmo em colocar a seguinte questiio: «O que € que diferencia um romance escrito por um africano de um romance colonial produzido por ‘um europeu»? ‘Somos assim introduzidos na problemética, jé evocada, da especifi- cidade da obra literdria africana contempordnea ou, se quisermos, do que Ihe confere a sua «africanidade». Léopold Senghor foi um dos primeiros a responder a esta questo uma vez. que 0 conceito de Negritude de que cle se afirmou como paladino se define precisamente como «0 patriménio cultural, os valores e sobretudo o espirito da civilizagio negro-africana. De um modo mais formal, o autor de Chants d’ombre cré aperceber na ‘Negritude uma forma de expresso especifica baseada no ritmo e no tom: «A monotonia do tom 60 que distingue a poesia da prosa, é a chancela da Negritude, a encantagdo que faz aceder & verdade das coisas essenciais.» ‘Na peugada do movimento da Negritude, um certo mimero de exege- tas tentou, com uma sorte desigual, delimitar os contomos da aftica- nidade. Uns, como Janheinz Jahn, autor de Muntu, homme africain et la {COMPENDIO DELITERATURACOMPARADA 24L culture néo-africaine (1961) ou 0 reverendo P. Tempels a quem devemos uma obra controversa sobre La Philosophie bantou (1949), créem encon- tré-la num sistema vitalista organizado em volta de uma hierarquia de forgas que governam o universo e cujas manifestagdes se reconhecem num estilo especifico articulado em torno de uma imagem e de um ritmo. Para outros, € 0 critério etnogréfico, da raga e da origem geogréfica, que conferem & obra a chancela de africanidade quando ni a inscrigo do seu autor numa corrente ideolégica marcada pela revolta € 0 envolvimento politico. Reconhece-se nesta posigio trabalho fundador de Lilyan Kesteloot, cujas teses so retomadas incansavelmente por numerosos cepfgonos das fileiras da critica negro-africana, Constata-se, portanto, que este problema da africanidade esté longe de alcangar a concordncia dos espiritos ¢ encontramos uma prova suple- mentar no embarago que preside & escotha dos temas e dos autores que Léonard Sainville propde em 1968 sob o titulo Romanciers et conteurs négro-africains. No recenseamento a0 qual procede, Sainville encontra ‘um tio grande mimero de autores nao africanos que assimilaram de tal modo, intimamente, 0 ponto de vista negro que nada, @ priori, permite distingui-tos. F, por exemplo, 0 caso de Jorge Amado em Bafa de Todos 5 Santos ou ainda 0 de Camaxilo de Castro Soromenho. Contudo, cons- ciente dos problemas colocados pela escolha, 0 autor matiza 0 seu propésito quando, no final da obra, distingue nas bibliografias os autores propriamente negro-afticanos dos «autores brancos, amigos do mundo negro»... Um outro modo de abordar o problema consiste, entio, em se inter- rogar sobre a propria estrutura das obras literérias produzidas por escritores africanos de modo a detectar quer no plano da forma quer no do contetido a parte das influéncias autéctones © a das influéncias estran- geiras. O peso da heranga tradicional varia muito, evidentemente, de autor para autor, de um perfodo para outro. Parece, em particular, que os escritores da primeira geragio foram muito mais marcados que os seus benjamins pela instituigao escolar e pelas normas da linguagem de que ela € portadora. Mas, mesmo neste caso, nem sempre é fécil separar as coisas como se pode constatar pelo caso de Léopold Senghor. Enquanto alguns crfticos sublinham a parte das influéncias ocidentais (Claudel, Saint-John Perse, etc.) na obra do poeta senegalés, este tenta demonstrar no posfiicio de Ethiopiques que foi sobretudo marcado pelos «seres e pelas coisas da (sua) regio: algumas aldeias serenas perdidas por entre os tanns, os ere __no anna Anas NU DUBIN DA INVESTIGAGAD COMPARATISTA bosques, os bolongs e os campos». E acrescenta: «Se nos querem encon- ‘trar mestres, seria mais avisado procurd-los em Africa, Como os laman- tins vo beber a fonte do Simal.» Contudo, esta ancoragem da obra literdria na heranga da tradigdo oral arece-nos mais deliberada e mais alardeada nas produgdes contempo- rineas, A parte da heranga colonial, incarnada principalmente pela escola, niio deve ser minimizada na apreensio do corpus africano, Quer ela tenha sido de esséncia laica ow religiosa, a escola desempenhou um papel considerdvel na promogio das elites afticanas, sobretudo nas da primeira ‘geragdo, De Bernard Dadié ao xeque Hamidou Kane, passando por Ngugi wa Thiong’o ¢ Camara Laye, a maior parte dos grandes autores cléssicos evocaram a importancia deste rito de passagem, essencial para a emergén- cia social do individuo, e é evidente que os modelos propostos pela insti- tuigdo escolar desempenharam um papel importante que no se pode negligenciar ~ embora talvez.ainda muito pouco apreciado ~ na formagdo da maioria dos escritores afticanos, frane6fonos ou angl6fonos. ‘Nos angléfonos, entre as influencias detectéves, para além de Pilgrim's Progress, jd referido, a influéncia exercida pela Biblia no deveria ser minimizada quando sabemos 0 papel que ela desempenhou, no ensino ministrado nas escolas missionérias, na sua grande maioria protestantes. Para nos convencermos basta ler 0 romance do escritor queniano Ngugi wa Thiong’o, Weep not child (Nao chores, Menino}, relato de aprendiza- gem em parte biogréfico no qual a heranga bfblica transparece quase em. cada pégin Debate-se também muito para determinar as influéneias literérias ocidentais que se exerceram sobre os escritores afticanos, Se 0 impacto dos mestres do naturalismo do realismo do fim do século XIX parece confirmado para um grande nimero de romancistas (em particular o sene- galés Sembene Ousmane), nao podemos contudo negligenciar o papel desempenhado pelos grandes autores russos (como Gorki) ¢ os mestres da pprosa americana do prinefpio do século Xx, como Dos Passos, Steinbeck, Hemingway. A hipétese da influéncia surrealista foi avangada por varias ‘vezes a propésito de Césaire (onde parece muito plausfvel) e de Senghor, que se defende pretendendo preferir Victor Hugo, Alexandre Dumas e Corneille a André Breton ¢ os seus amigos. Também é verosfmil pensar que escritores como Wole Soyinka foram fortemente marcados pelos grandes cléssicos ingleses, a comegar por Shakespeare ¢ os isabelinos, ‘CoMIDIO DELITERATURA COMPARADA 243 cujo teatro do prémio Nobel da literatura de 1986 revela uma marca clara, para nfo falar de poetas menos conhecidos, como T. S. Eliot ou Yates cujo trago 6 perceptivel na obra de Chinua Achebe, por exemplo. Também é de investigar 0 papel desempenhado por autores menores, populares mesmo, na formagio dos escritores africanos, observa com toda a razo Albert Gérard, ‘Una tal investigagio ndlo pode deixar de reservar algumas surpresas, pois os critéros de avaliaglo do lito afrcano sio muito diferentes dos do leitor curopeu. No dominio franc8s, sabe-se que muitos adolescentes afticanos consideram que ‘Madame Bovary 6 wins obra de uma rara comicidade.. (Essais d'histoire littéraire africaine, 1984), Nao se deve ainda, nesta investigacio, negligenciar 0 peso das ideologias e em particular do marxismo que marcou, com niveis de profundidade variaveis, grande niimero de escritores aparentados com 0 novo movimento da Negritude: Aimé Césaire, René Depestre, Sembene ‘Ousmane, ete. Pelo contrério, a tese de Martin Steins, Les Antécédents et la genase de la Négritude senghorienne, tende a demonstra que Léopold Senghor, por seu lado, teria sido particularmente sensfvel as ideias veiculadas pela extrema-direita francesa no perfodo entre as duas guerras, as quais a revista La Race négre pode, por razbes que Ihe eram proprias, servir por um momento de retransmissor. Escreve 0 autor: Constatamos que algumas ideias-chave de Negritude surgem no preciso ‘momento em que os futuros spéstolos da Negrtude tomam também a palavra quatro ‘anos antes de otermo ter sido forjado. Ao mesmo tempo, o aspecto politico das suas, cconsideragées, a sua apicagio Tuta de emancipacto, faz-se numa oposigfo feroz, {As doutrinas intemnacionalistas de esquerda; segundo a sua prépria confissfo cles 3-4¢ no exemplo alomion, Mais recentemente, o campo das letras africano parece atravessado por numerosas correntes de influéncia, frequentemente de origem extra-ociden- tal, como é 0 caso dos romancistas latino-americanos relativamente aos seus homblogos africanos. Pudemos, deste modo, estabelecer a prova da influéncia de Gabriel Garcia Marques nos romances do congolés Sony Labou Tansi, influéncia que 0 autor de La Vie et demie reconhece e reivi ica aliés em nome da «tropicalidade» que the parece servir de denomi nador comum nos escritos de um € outro continente, Por tltimo, com o desenvolvimento das relagdes sul-sul vemos perfilar-se toda uma corrente de interedmbio entre escritores que, por estarem afastados geografica- mente ou culturalmente, ndo sfo, por isso, menos solidarios na sua forma de apreender 0 mundo. Deste modo, a recolha poética de Jean-Marie Adialfi, da Costa do Marfim, D’Eclairs et de foudre, & atravessada por reminiscéncias do martinicano Aimé Césaire ¢ do sei congolés Tehicaya U Ao mesmo tempo que se multiplicam e se diversificam as correntes de influéneia, a produgdo literéria africana é igualmente objecto de uma série de investigagGes que visam colocar em termos novos a sua relagéo com a tradigio oral e as Iinguas vernéculas, AS GRANDES ORIENTACOES DA INVESTIGACAO ___ Porentre as grandes orientagdes actualmente perceptiveis na inves- tigagio afticanista figuram, em simultineo, preocupagées relatives a divisdo do espago literécio & topotogia dos géneros litertios refleaten sobre a integragao da tradigao na escrita contemporanea e, por fim, uma série de interrogagées visando a emergéncia de uma esctita nova, conse. quéncia de uma série de interrogagées, : Nao esquecemos as propostas de Franz Fanon que, no capitulo de Damnés de la terre consagrado & «cultura nacional», assimila 0 combate do intelectual colonizado a uma « e que poderia operar-se, por um lado, associando mais os detentores da palavra tradicional ao ensino e d investigagao ~ enquanto o seu papel se resume frequentemente ao de informador — e por outro, incitando os jovens a «praticar as grandes obras da tradi¢ao», Por mais ut6picas que possam parecer, actualmente, estas propostas ‘generosas, se fossem postas em pritica, facilitariam a insergo da cultura tradicional na modemidade, como desejam bom méimero de escritores contemporaneos ¢ acelerariam a criagdo de «verdadeiras humanidades africanas» que 0 comparatista nfo pode deixar de desejar profundamente. Através do ensino, das publicagdes e dos trabalhos universitétios, a literatura comparada desempenhou um papel importante no processo de reconhecimento das literaturas africanas. Empenhando-se na dissipagio da ilusdo de familiaridade aparente que os textos escritos nas Iinguas europeias, mas enraizadas num imagindrio radicalmente diferente, pode- iam produzir sobre os leitores menos atentos, a atitude comparatista terd permitido simultaneamente delimitar os pontos de convergéncia entre culturas afticanas ¢ cultura ocidental e sublinhar a irredutivel singulari- dade das produgdes literdrias atric Aparentemente chegou a hora de alargar ¢ ultrapassar 0 campo de relagdes curo-africanas, ja bem inventariado, em proveito de aproxi- mages talvez mais pontuais, centradas sobretudo sobre a prépria Africa © consistindo, por exemplo, na apreciago do lugar e da realidade do discurso nacionalista da produgao literéria, a insergao da tradigo oral na escrita contemporanea, a evolugao dos géneros literdrios pelo contacto ‘com 0s modelos tradicionais, 0 funcionamento do proceso eritico, a definigao ¢ o papel de instncias de consagragao, ete. Por outro lado, parece desejével quebrar a compartimentagio dos eestudos literérios africanos ainda demasiado limitados quer & literatura francéfona, quer a literatura angl6fona, em detrimento da literatura lus6- fona ou das literaturas esctitas em Inguas vernéculas, mas que no estabelecem, a nfo ser ocasionalmente, lagos entre este corpus quidruplo, A abordagem da obra literétia alticana permanece complexa pois mesmo quando escritos nas linguas europeias, estes textos oferecem, com efeito, a particularidade de serem marcados por uma tripla chancela, dado recla- ‘marem simultaneamente a sua ancoragem no continente afticano, 0 seu enraizamento na cultura de um grupo éinico bem determinado e, por fim, as influéncias ocidentais ~ tao variéveis como incontestéveis - que sofreram, BIBLIOGRAFIA Independentemente das obras citadas ao longo da exposicio (que no so geralmente retomadas aqui), indicamos um certo mimero de refe- réncias bibliogréficas suplementares, embora muito sumérias, destinadas ‘a completar a nossa abordagem. OBRAS E ESTUDOS; ‘Amaud, I. Recherches sur la linérature maghrébine de langue francaise. Le cas de Kateb Yacine, Pais: LHarmattan, 1982, Balandicr, G. Anthropo-Logiques, Paris: PUR, 1974, ‘Baudot,A. «Petite anatomic du corpus critique francophone», n Etudes sociocrtiques, n*2, 1984, Bonn, C. La Litérature algérienne de langue frangaise et ses lectures. Inaginaire et discours didées. Shétbrooke: Naaman, 1974 —: Le Roman algérien de tangue frangaise. Pris: L’Harmattan, 1985, _ (CoMPoDIO DELITERATURA COMPARADA 259 Boulaga, B. La Crise du Muntu, Pasi: résence afticaine, 1977 Chovtier, J. Liuérature ndgre, Pass: Armand Colin, 1984 — Lirbre a palabres. Essais sur ta signification des contes et récitswraditionnels Afrique noir. Pass: Hatir, 1986 — dda Livérature aficaine «expression frangaise; oxientation bibliographiquen, information litéraire, n° 3, Msio-Funho, 1978, Dejeux, J. Bibliographic méthodique et critique de la liuératre algérenne de langue Srangaise, 1945-1977. Argslia: swED, 1981 elas, D., Derive, J. «Pour une pédagogie dela leture des ocuvres négro-afticaineséerites en francais», Réponses, suplemento Africa-Oveano Indico Le Frangais dans le monde, n° 3, Janeiro, 1982, Diakhaté, L. «Le mythe dans la poésie populace au Sénégal et sa présence dans Mocuvre Ge. S. Senghor et de Birago Diop, Présence africaine,n.39, 4° Trimestre, 1961 Diop, D. «Contribution au débat sur Ia poésie nationale», Présence africaine, n° 6, Feverciro-Margo 1956, Gassama, M. Kuma. Interrogation sur la litrature negre de langue francaise. Dacas: EA, 1978, Gérard, A. Essis d’histoirelnéraire africaine. Pacis; Sherbrooke: Acct/Naaman, 1984 Hinusses,M, «Lecture iéologiqu et orientation textuelle, Oeuvres et critique, i, 25V, 1979, Hountoundji,P. Sur la philosophie africaine, Paris: Maspero, 1977, Kane, M. eLéerivain atiain et son public», Présenceaficaine, n* 58,2° timestre, 1966. Kimoni,1. Destin de la linérature négro-africaine ou problématique d'une culture, Otaves Naaman, 1975 Kotchy, B. «L‘enseignement de a litératareafticaine; pourquoi faire?» Présenceaficaine, rdmero especial, 1971, Mateso, L. La litérature africaine et sa critique. Paris: AccTIKarthala, 1986, Maclimbe, V. ¥. L'Odeur du Pére, Paris: Présence afrcaine, 1982, Nel G. Giambatista Vito, ou le viol du discoursafrcain, Pais: Haier, coleogho «Monde noir poches, 1984, Okpenwho, 1. «, World literature today, 1981, vol. 55, Senghor| LS. «Problmatique de la Négritude>, Présenceaficane, n° 78, 2° trimestre, 1971, —+ Débat autour des conditions d'une poésic nationale chez les peuples noirs, Présence afrcaine, n° 6, Dezembro-Janeiro, 1956, ‘Snyder, E. «The Problem of Negrtude in Modem Prench Poetry», Comparative Literature ‘Studies, University of Maryland, Advance issue, 1963 ‘Thomas, L. V. «Une idéologie modeme: Ia Négritude, Essai de synthése psychocrtique, Revue de Psychologie des Peuples, 18, 1963. ‘Towa, M. Négritude ou servine? Yaoundé: cLB, 1971 ssn wy tum) UA INVESTIOAGAO COMPARATISEA NUMEROS ESPECIAIS CONSAGRADOS A COLOQUIOS OU A REUNIORS AFRO-COMPARATISTAS: ‘A AFRICA LITERARIA: Mythe et litératre, Col6quio afro-comparatista de Limoges, Société frangaise de litéra- {ure compare, Maio 1977, n° 54/55, 4° timeste, 1979, L? timestre 1980, Critique et réception des literatures négro-africaines, Col6quio da Sorbonne nouvelle, 1-11 Margo, 1978, n.°50, 4. imestre, 1978. ‘Vimage du monde négro-afvcain en Occdent,Cokéquio do Canc. Pts x Vs de- Mame, 21-22 Novembro, 1980, n° 58, 1° wimestre, 1981. Romanciersafricains anglophones, n° 617, 1° timestre, 1983. Romans maghrébins (1967-1983), n° 70, 4. trimestec, 1983, Uinéraures d'Afrique ausrale. L'apartheid et ses représentation,v.° 75, 1° timeste, 1988, OUTRAS REVISTAS: Revue de Psychologie des Peuples, eLittérature d'Afrique nore; identi, culturclle et rela: tion ertquen, n° 23, Abril-Setembro 1980, Fihiopiques, revista trimestral de cultura negro-aftcana, Actes du I Congres mondial des litérarures de langues frangaises, vol. 1,n.9% 3 ¢ 4; 3° 64. trimestres, 1983, ‘Institut de litérature et d'esthétque négro-aficaines, ColGquio sobre Literatura e Estética "Negro-Alricanas, Abidjan, NEA, 1979, Mindraires et contacts de culture, publicagio do Centro de Estudos Franesfonos da ‘Univeisidade de Paris xt, vol 1: Lécrt et Yoral; vol i: L’enseignement des ltéra sures francophones, 1982, Oeuvres et critique, «Réception critique de la litérature afticaine ct antl francaise», ml, 2¥, 1, Outono, 1979, Revue de Linérature comparée, «Livératures francophones et anglophones d'Afrique Aoire», m8 3 ¢ 4 Julho-Setembro-Outubro-Dezemio, 1974. ‘Littérature afrcaine et enscignement», Actes dl Colloque de Bordeaus, 15-17 de mars 1984, Presses Universitaires de Bordeaux, 1985, Venscignement des litérawres africnines & univers, Coléquio organizado pelo Departamento de Literaturas © Civilizagdes Afticanas, Universidade de Marien Ngovabi, Brazavila, 23 e 24 de Janeiro 1981

Você também pode gostar