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Resumo
Objetivos: identificar os elementos protetores do leite materno que atuam na prevenção de
doenças gastrintestinais e respiratórias. Fonte dos dados: a busca foi realizada nas bases
de dados Bireme, Lilacs, Medline e Scielo, utilizando os descritores leite materno, doenças
gastrintestinais e doenças respiratórias, com limites de idiomas (português, inglês e
espanhol) e de período (1996 a 2009). Foram selecionados 46 textos por atenderem aos
objetivos deste trabalho. Síntese dos dados: a IgA é imunoglobulina com maior capacidade
protetora contra ambos os tipos de doenças, por sobreviver às mucosas intestinal e
respiratória. O leite materno também possui outras imunoglobulinas, anticorpos,
oligossacarídeos, lipídeos, peptídeos bioativos, entre outros constituintes exclusivos com
mecanismos específicos que, além da proteção contra essas doenças, estimulam o
desenvolvimento do sistema imune do lactente. Assim, nenhum outro leite possui essas
propriedades e podem até ser a causa destas doenças. Campanhas e ações em Saúde Pública
que incentivam o aleitamento materno devem ser continuamente desenvolvidas e
estimuladas, considerando todos os benefícios que o mesmo proporciona.
1 Nutricionista, aprimoranda na área de Nutrição em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública – USP.
2 Professoras Doutoras do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública – USP.
Faculdade de Saúde Pública – USP - Departamento de Nutrição.
Av. Dr. Arnaldo, 715. Cerqueira César. São Paulo – SP. Cep: 01246-904
Autor responsável: Adriana Passanha. E-mail: adriana.passanha@gmail.com
Endereço para correspondência: Av. Dr. Arnaldo, 715. Cerqueira César. São Paulo – SP. CEP: 01246-904.
Conflito de interesse: nada a declarar.
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Abstract
Objective: to identify the protective elements of breast milk that work in the prevention of
gastrointestinal and respiratory diseases. Sources: the search was performed on Bireme,
Lilacs, Medline and Scielo databases, using keywords breast milk, gastrointestinal disease
and respiratory disease, with limits of languages (English, Portuguese and Spanish) and
period (1996 to 2009). 46 papers were selected for achieving the objectives of this work.
Summary of the findings: the IgA is the immunoglobulin with more protective capability
against both types of disease, to survive the intestinal and respiratory mucosa. Breast milk
also contains other immunoglobulins, antibodies, oligosaccharides, lipids, bioactive peptides,
among other components with unique mechanisms that besides the protection against these
diseases, stimulate the development of infants’ immune systems. No other milk has these
properties, and may even be the cause of these diseases. Campaigns and actions in Public
Health to encourage breastfeeding should be continuously developed and encouraged
considering all the benefits it provides.
Key words: milk, human; gastrointestinal diseases; respiratory tract diseases; breast feeding.
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de que o aleitamento exclusivo deve durar até fecções no ser humano é representada pelas su-
os seis meses de idade5. perfícies mucosas, principalmente dos tratos
O período entre o nascimento e os dois gastrintestinal e respiratório. Através da alimen-
anos de idade é muito crítico para a promoção do tação e da respiração o organismo entra em con-
crescimento, da saúde e desenvolvimento ótimos. tato com microorganismos patogênicos, assim
O aleitamento materno é uma ferramenta privile- como substâncias potencialmente alergênicas ou
giada para assegurar às crianças os melhores re- nocivas23. A amamentação exclusiva salva mi-
sultados possíveis e transitar com êxito esse pe- lhões de crianças a cada ano por prevenir doen-
ríodo tão vulnerável da vida, de maneira a ças infecciosas agudas e crônicas, principalmen-
contribuir com um melhor desempenho nas eta- te respiratórias e intestinais7.
pas seguintes14, auxiliando, também, na preven- Considerando todos os efeitos benéficos
ção de doenças na infância e na idade adulta15. da amamentação e a proteção exclusiva que esta
A amamentação oferece inúmeros bene- oferece contra diversas doenças, o objetivo
fícios para a saúde da criança, sendo a melhor deste estudo é identificar os elementos prote-
maneira capaz de promover seu desenvolvi- tores presentes no leite materno que atuam na
mento integral, pois o leite materno fornece os prevenção de doenças gastrintestinais e doen-
nutrientes necessários para a criança iniciar ças respiratórias.
uma vida saudável16. O leite humano supre as
necessidades do lactente até o sexto mês de
vida17,18, e durante o primeiro ano da criança é METODO
um dos meios mais eficientes de atender seus
aspectos nutricionais e imunológicos19. Trata-se de uma revisão sobre o tema,
Além da composição adequada de nu- onde as informações foram obtidas por meio
trientes, o leite materno possui outros compo- de rastreamento literário sistemático, empre-
nentes que atuam na defesa do organismo do gando-se a técnica booleana utilizando a pala-
lactente, como imunoglobulinas, fatores anti- vra and e os seguintes descritores: leite mater-
inflamatórios e imunoestimuladores. Seus me- no and doenças gastrintestinais; e leite materno
canismos incluem atividade específica contra and doenças respiratórias. Para tanto, utiliza-
agentes infecciosos, crescimento celular da ram-se fontes de pesquisa como publicações
mucosa intestinal aumentando a resistência às específicas e os provedores de pesquisa
infecções, entre outros2,3. Há relatos de apro- Bireme, Lilacs, Medline e Scielo. Como crité-
ximadamente 250 elementos de proteção no lei- rios de busca foram utilizados limites de idio-
te humano, além de fatores de crescimento do mas (português, espanhol e inglês), e de perío-
trato gastrintestinal19. do (1996 a 2009).
A lactação diminui a incidência e/ou a Com estes limites de pesquisa, foram
gravidade de diarreia, botulismo, enterocolite rastreados 302 materiais. Destes, foram sele-
necrotizante, alergias, doenças infecciosas e cionados 46 por atenderem aos objetivos do
respiratórias, entre outras doenças3,5,11,12,20,21, presente trabalho.
incluindo as auto-imunes20, como também es-
timula o desenvolvimento adequado do siste-
ma imunológico do bebê18. ELEMENTOS DE PROTEÇÃO DO LEI-
Outros tipos de leite aumentam os riscos TE MATERNO
de desenvolvimento de doenças e alergias17, e
podem ocasionar lesões no intestino imaturo do Recém-nascidos e lactentes, sobretudo
lactente22. A porta de entrada da maioria das in- nos primeiros seis meses de vida, são mais
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cia de diarreia alcança seu valor máximo17. A Os carboidratos presentes no leite hu-
presença de leite no lúmen intestinal estimula mano são os oligossacarídeos e a lactose. Os
o desenvolvimento de sua mucosa17,28 e a ativi- oligossacarídeos, na presença de peptídeos,
dade da enzima lactase34. De acordo com a re- formam um fator bífido (carboidrato com ni-
visão de Toma & Rea10, bebês amamentados trogênio dialisável). No meio rico em lactose,
exclusivamente apresentaram menor produzirá ácido láctico e succínico, o que di-
morbidade por diarreia em comparação com minui o pH intestinal, tornando o local desfa-
aqueles que receberam aleitamento materno vorável ao crescimento de bactérias
junto com alimentos complementares aos três/ patogênicas, fungos e parasitas. Sendo assim,
quatro meses. a lactose também exerce fator protetor ao de-
Desde as primeiras horas de vida diver- senvolvimento de afecções gastrintestinais,
sas linhagens de Escherichia coli colonizam o promovendo essa colonização benéfica2,38.
intestino humano, passando a fazer parte da sua Esses oligossacarídeos nitrogenados
flora normal. No entanto, algumas destas po- possibilitam a instalação da flora bífida que
dem causar doença intestinal grave23. No re- impede, por ação seletiva, que novas bactérias
cém-nascido, a imaturidade do epitélio intesti- recém-chegadas à luz do intestino e os poten-
nal, a baixa acidez gástrica e a menor atividade ciais agentes patogênicos da diarreia, como a
de enzimas digestivas não constituem uma bar- E. coli, dentre outras enterobactérias, coloni-
reira muito eficiente contra a entrada de micro- zem o trato intestinal18,29,31.
organismos35. A mucina é uma proteína presente no
A partir da década de 1970, com a des- colostro ligada aos glóbulos de gordura. Sua
coberta do fator bifidus, torna-se cada vez mais principal função é inibir a adesão bacteriana
conhecido o mecanismo pelo qual ocorre a pro- ao epitélio intestinal39.
teção da mucosa intestinal contra os agentes Algumas gorduras poliinsaturadas, como
patogênicos. Vários tipos de oligossacarídeos os ácidos araquidônico e linoleico, têm impor-
e glicoconjugados presentes no leite materno tância na síntese de prostaglandinas envolvi-
(conhecidos como agentes prebióticos) estimu- das em funções biológicas que atuam sobre a
lam a colonização do intestino por digestão e sobre a maturação de células intes-
microorganismos benéficos. Esses agentes atu- tinais, propiciando a queda da prevalência de
am na primeira etapa essencial da patogênese, alergia intestinal e contribuindo para a defesa
ao impedir que um microorganismo se fixe na do lactente2,40. Os lipídeos presentes no leite
parede celular36. humano são hidrolisados em ácidos graxos e
Crianças amamentadas exclusivamente monoglicerídeos que têm atividade sobre al-
apresentam uma flora intestinal benéfica, com guns tipos de vírus, de bactérias e de
maior quantidade de bifidobactérias e menos protozoários39.
Clostridium dificile e Escherichia coli, de acor- Nucleotídeos, glutamina e lactoferrina
do com Penders et al.37. Segundo o estudo des- presentes no leite materno influenciam o de-
ses autores, que examinaram as fezes de 1.032 senvolvimento gastrintestinal e as defesas do
bebês holandeses de até um mês de idade, den- organismo3,21,35,41. A glutamina age como prin-
tre os principais fatores determinantes da cipal combustível para o crescimento do
microflora intestinal no início da vida está a ali- epitélio intestinal em períodos de estresse28.
mentação infantil. Já em 1905, havia registros Uma das funções da lactoferrina é quelar
de diferenças na composição da microflora in- íons ferro, que são essenciais para a multipli-
testinal de crianças amamentadas em compara- cação de microorganismos patogênicos, dimi-
ção a crianças desmamadas. nuindo assim sua biodisponibilidade no
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microambiente intestinal, processo que é fa- compensatório. Sendo assim, anticorpos IgM
vorecido pela presença de bicarbonato no leite podem ter um importante papel na defesa das
humano39,42. A lactoferrina é encontrada intacta superfícies mucosas do lactente23.
tanto nas fezes quanto na urina de crianças No decorrer da lactação, mesmo com o
amamentadas, podendo assim exercer um pa- declínio da secreção de IgA no leite materno, a
pel protetor sistêmico23. atividade biológica de inibição da adesão
A lisozima é uma enzima com ação bacteriana permanece inalterada. Esse dado é
bactericida, interagindo sinergicamente com compatível com o fato de que as crianças per-
lactoferrina e IgA 39,42. A proteção contra manecem protegidas contra gastrenterites du-
gastrenterites se traduz numa menor incidên- rante todo o período de aleitamento. Diarreias
cia de diarreias, pela presença de anticorpos são mais frequentes após o desmame, indepen-
IgA presentes no leite materno, reativos com dente da idade em que ocorram. Por sua vez,
patógenos ou toxinas20. esses dados reforçam a importância do leite ma-
A IgA é a principal imunoglobulina do terno para recém-nascidos prematuros e peque-
colostro23,28,43. Ela está presente no intestino de nos para a idade gestacional23.
bebês alimentados com leite humano, impedin- A caseína do leite humano é também um
do a invasão e a aderência de vírus e bactérias de seus vários constituintes que ajudam a pro-
na mucosa intestinal, e neutralizando toxinas teger a criança de infecções gastrintestinais,
e fatores de virulência28. impedindo a aderência de bactérias às células
A principal ação da IgA é se ligar a da mucosa intestinal2.
microorganismos e macromoléculas, inibindo Anticorpos secretores reativos com os
a interação entre bactérias e células epiteliais, fatores de virulência de algumas bactérias são
impedindo sua aderência às superfícies capazes de inibir a adesão bacteriana à mucosa
mucosas, prevenindo o contato de patógenos intestinal e com isso impedir a colonização do
com o epitélio44. Dessa forma, a IgA protege a hospedeiro, impedindo a sequência de eventos
mucosa contra diarréias, pois forma um reves- que culminaria em infecção e diarreia. Esse é
timento protetor nas superfícies mucosas do um importante mecanismo de proteção confe-
lactente23. rido pelo leite materno, que deve ocorrer em
Os anticorpos IgA do colostro resistem casos de diversas infecções iniciadas pela ade-
ao trato gastrintestinal do recém-nascido e po- são de microorganismos às superfícies
dem ser encontrados intactos nas fezes, pre- mucosas45.
servando a mesma reatividade contra antígenos
que apresentavam quando no colostro da mãe,
conservando sua atividade anti-infecciosa ao DOENÇAS RESPIRATÓRIAS
longo de todo o trato gastrintestinal do recém-
nascido23,39,42,45. Sua estrutura peculiar promo- A amamentação exclusiva protege as
ve a essa classe de anticorpos maior resistên- crianças pequenas de evoluírem para quadros
cia à ação de enzimas proteolíticas, abundantes mais graves de infecção respiratória 10,46 .
nas secreções mucosas44. Quando predominante por pelo menos seis
As outras imunoglobulinas são encon- meses e até um ano de idade também pode
tradas no colostro e no leite humano em con- reduzir a prevalência de infecções respirató-
centrações bem mais baixas que a IgA. Dentre rias na infância47,48. O leite materno é capaz
elas, destaca-se a IgM como a segunda mais de reduzir a exposição e a absorção intesti-
abundante. Quando não há IgA suficiente no nal de alergênicos responsáveis por doenças
leite materno a IgM atua como mecanismo respiratórias 49,50.
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