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Notas sobre o bagual: pecuária, caça e conservação no Pantanal

brasileiro
Felipe Süssekind
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Departamento de Ciências Sociais

Resumo

O gado pantaneiro é múltiplo. Em primeiro lugar, ele é o objeto ou o produto da


principal atividade econômica regional; em segundo, é um elemento chave na dinâmica
ecológica das planícies inundáveis do Pantanal; e é, por fim, tema de uma série de
práticas e experiências culturais singulares. A articulação entre esses três modos de
existência é discutida neste artigo a partir de uma etnografia realizada em fazendas
situadas na região sul do Pantanal. A proposta é refletir sobre o conceito pantaneiro do
bagual em suas articulações com as dicotomias entre o manso e o bravo e entre o
tradicional e o moderno. As muitas relações – ecológicas, culturais, econômicas – em
que o gado está inserido são abordadas a partir dos horizontes de práticas heterogêneos
da pecuária, da caça e da conservação da biodiversidade.

Palavras-chave: etnoecologia, multiespécies, Pantanal, pecuária, bagual

I
Diz que há muito tempo, a minha bisavó – meu pai tava contando –, minha
bisavó foi pegada a laço. Ela ficava no lote de gado bagual. E a turma ficava
assondando pra pegar ela. A pessoa fica totalmente selvagem, né? Muda. Ela se
perdeu e tava com quase um ano assim, todo mundo procurando. Um dia saíram
cedo e, num capão, tinha um gado parado. O gado usa muito aqueles bichos:
curicaca, anhuma1, eles avisam o gado. Cantou lá, o gado rodou assim... E a
turma só com cavalo bom mesmo, de pegar bem pego. Diz que tava sentada,
quebrando coco no coxo. Era ela. No comedouro, perto do gado. O gado nem...
Era a minha bisavó! Ficou selvagem, bagual duma vez.

1
Essas duas espécies de aves habitam o Pantanal: curicaca (Theristicus caudatus) e anhuma
(Anhima cornuta). O canto delas é associado nesta passagem ao comportamento do gado bagual.
O capão tava daqui ali. Aí a turma arrancou. Mas falam que corre duro, hein! o
cavalo suou pra dar nela. Só um cara que alcançou, quase entrando no capão.
Jogou laço, cerrou nela, puxou. Mas ela vinha de unha e pé... Aí jogaram outro
laço, juntou todinho o pessoal, e pegaram. Depois trataram, levaram na igreja,
tudo, e ela voltou ao normal. Só que diz que depois de um mês, ela faleceu.

O caso me foi narrado por Altino, um dos campeiros da fazenda Santo Antônio2,
em junho de 2008. A fazenda, localizada no municipio de Corumbá, era sede de um
projeto científico que investigava o comportamento das onças-pintadas, e foi uma das
bases do meu trabalho de campo3. A narrativa se refere ao tempo em que a bisavó do
narrador era ainda jovem. Ela“corre duro” e depois é “pegada no laço”, como uma
novilha. “Bagual”4 é o termo que se usa no Pantanal para o gado selvagem, ou bravio,
atualmente muito raro ou possivelmente extinto dos pantanais dos rios Miranda e
Abobral, região onde ficava a fazenda Santo Antônio.
Altino tinha sido criado numa outra fazenda, a Bodoquena, uma das maiores e
mais conhecidas propriedades do sul do Pantanal, onde havia tido contato com o gado
bagual. Este tipo de gado, segundo ele, gostava de certos capões de mato mais fechado,
como o “aguaçuzá”. Em conversas com outros vaqueiros ou entrevistas feitas durante a
minha pesquisa, o bagual foi definido como um gado “solto”, “sem dono”, que “vive
no mato” ou “sem marca”.
A única referência direta a um animal que se enquadrava nesta categoria, nas
minhas notas de campo, foi uma fotografia que pertencia ao capataz da Santo Antônio,
seu Joaquim. Estávamos conversando na cantina, e seu Joaquim tinha trazido um
pequeno álbum de fotos para me mostrar. Numa das imagens, posava com uma
onça que havia sido capturada para o projeto de pesquisa. “Pequena” – disse
rindo – “mas saiu bem na foto”. Mais uma foto de seu Joaquim com a onça; em
seguida, ele carneando uma vaca; depois montando um búfalo; depois disso

2
Optei, neste artigo, por utilizar nomes fictícios para a fazenda e para os meus interlocutores.
3
A pesquisa foi realizada em azendas de gado que abrigavam estudos de Biologia da
Conservação sobre onças-pintadas (Panthera onca). A minha proposta era investigar as relações entre as
práticas de campo científicas e as práticas de conhecimento dos vaqueiros e moradores das fazendas do
Pantanal (Süssekind 2010, 2012, 2014)
4
Alguns autores, com Campos Filho (2002) preferem utilizar a grafia “baguá”, que é como se
fala.
algumas imagens de vaqueiros da fazenda trabalhando com o gado. Numa delas,
um bezerro já bastante crescido e magro aparecia amarrado na caçamba de um
trator. Ele me explicou que o animal tinha ficado perdido no fundo de uma
invernada (área de pastagem) e que tinha “virado bagual”.
No período que passei na fazenda, procurei entender melhor as práticas
de manejo e a rotina dos vaqueiros acompanhando de perto a lida com o gado.
Seu Joaquim e os outros campeiros estavam animados com as fotos e filmagens
que eu fazia nessa época, as quais, mais tarde, eles supunham, iria mostrar no
Rio de Janeiro. No dia primeiro de novembro de 2008, fui convidado por Riquelme,
motorista do caminhão da fazenda, para acompanhá-lo quando ia levar sal e vitaminas
para os touros. Ele era o responsável por alimentá-los e insistia há alguns dias em me
mostrar como eram mansos. Chico, o salgador de coxo, seguia junto. Fomos primeiro ao
paiol onde ficavam armazenados os sacos de ração e, na volta, passamos no curral, onde
três carneiros foram amarrados na caçamba do caminhão. A fazenda estava se
desfazendo do capril e alguns animais tinham sido oferecidos aos moradores, conforme
Riquelme me explicou enquanto dirigia de volta para o retiro.
Depois de entregar os carneiros para o capataz, seguimos para a invernada onde
estavam os touros. Chegando lá, ele me chamou atenção para o comportamento calmo
dos animais e fez algumas recomendações, que incluíam não fazer movimentos bruscos
e não encará-los. Depois que deixamos o caminhão, Riquelme e Chico começaram a
tirar os sacos de ração da caçamba e despejar seu conteúdo nos coxos. Aos poucos, os
animais foram se juntando à nossa volta. O tamanho dos touros era impressionante, e
Riquelme fazia questão de me mostrar que era possível andar entre eles, de tão mansos.
As diversas marcações na pele ele ia traduzindo: a marca da Santo Antônio, outra de
uma fazenda vizinha, o ano de nascimento... Essas marcas se sobrepunham a uma
primeira camada que era a pele, o couro do animal. Os touros eram todos zebuínos da
raça Nelore, o “gado branco” dominante em toda a região pantaneira. Na volta para o
retiro, Riquelme relacionou a mansidão do gado a um contraste entre o atual e o
tradicional:

Agora tá tudo diferente; antigamente o fazendeiro dizia: na minha fazenda tem


cavalo xucro, só peão bom mesmo pra montar! Hoje em dia o fazendeiro diz que
até criança monta na tropa dele, que o gado é manso. Hoje em dia o cara que
fala que tem gado bagual na fazenda, que tem cavalo xucro, ficou pra trás.
Afirmou ainda que os fazendeiros antigos gostavam de dizer que matavam onça,
que “tinham orgulho de ir atrás dela”, enquanto os de hoje em dia (numa referência
evidente ao proprietário da fazenda, que financiava um projeto de pesquisa em sua
propriedade) “queriam mais é que tivesse onça na terra deles”. Perguntei o que os
fazendeiros vizinhos achavam da ideia de preservar as onças, e ele afirmou:

Não é todo mundo... É pouca gente que aceita. Aqui do lado, na fazenda vizinha,
com projeto e tudo, o cara já falou que se a onça comer a vaca dele, ele mata.
Não quer saber se tem colar, se não tem. Muitos acham como um predador pra
estragar, pra dar prejuízo. Muitos ainda são assim, têm esse pensamento: Matou
meu gado, eu mato ela.

O colar de rádio é mencionado neste caso como uma espécie de marca de


propriedade, porém não reconhecida como legítima pelo fazendeiro que dizia que ia
matar as onças. Riquelme prosseguiu no seu raciocínio:

O que o fazendeiro quer fazer? Ele quer limpar a invernada. Limpar o campo e
formar pasto pra colocar o gado. Isso aí qualquer fazendeiro. Até eu mesmo se
tivesse fazenda ia fazer isso. Só que daí ele não pensa: eu limpei lá, eu tirei a
capivara, tirei o queixada, tirei o cateto, tirei o cervo – no caso do Pantanal, né?
– e vou colocar o gado branco.

O argumento evoca a disponibilidade de alimento da onça diante da transformação


do ambiente e da eliminação das espécies nativas:

O que tinha de comida pra ela comer ficou escasso, já não tem mais. O que
acontece? O que ela comia foi embora... Aí ela vai passar a comer o gado
branco, o gado que o cara colocou lá. O que eu penso é que pra ela não mudou
nada. Continua tendo comida. Então ela não vai sair dali.

Quero chamar atenção, neste ponto, para o contraste entre o gado branco – o gado
“que o cara colocou lá”, nas palavras de Riquelme – e o gado bagual – que é
mencionado de passagem, juntamente com o cavalo xucro. Xucro e bagual são termos
que designam animais bravos, ou, num certo sentido, selvagens. Eles aparecem nessa
citação como índices do passado, de algo que ficou para trás, enquanto o gado branco
(manso) marca uma passagem para os tempos atuais. Além do branco, os vaqueiros da
fazenda usavam uma série de termos diferentes tanto para as cores dos bois quanto dos
cavalos: “brasina”, “tordilho”, “baio”, entre outros termos. Assim como os touros, o
gado de corte da fazenda era predominantemente branco (ou “fumaça”, quando
salpicado de manchas acinzentadas), sendo que as outras cores pareciam restritas ao de
modo geral ao gado de leite, ou aos bois de trabalho. O cromatismo do gado possui uma
série de referências importantes na literatura antropológica5 e desempenha um papel
fundamental na identificação de cada animal por parte dos vaqueiros, juntamente com
as formas do corpo e dos chifres.
Seu Joaquim, o capataz, era com quem eu mais conversava sobre o gado nos
períodos que passei na Santo Antônio. Logo que cheguei na fazenda pela primeira vez,
ele me mostrou uma listagem com o rebanho da fazenda, dividido em categorias. O
termo “tambeiro” se referia ao gado manso, incluindo as “vacas leiteiras” e os
“sinuelos”, animais que, como me disse na ocasião, “têm até nome”. Sinuelos são os
bois que conduzem a boiada junto com os vaqueiros, usados para buscar o gado
disperso no campo. “Vaca parida”, “touro”, “novilha”, “novilho”, as cinco mil cabeças
de gado da fazenda eram divididas por classes de idade, gênero, e função. O termo
bagual não aparecia na lista de seu Joaquim, que se orgulhava do manejo rigoroso e
controlado da Santo Antônio. Mas ele fez questão de dizer que tinha experiência com
este e “com todo tipo de gado, depois de ter trabalhado trinta e dois anos na fazenda
Bodoquena” (a mesma de onde tinha vindo o vaqueiro Altino).
Fazenda muito tradicional da região, a Bodoquena chegou a ter mais de
quatrocentos mil hectares quando foi formada a partir da antiga Fazenda Francesa 6. Para
falar de sua experiência com o bagual, seu Joaquim me narrou um evento que se passou
no início da década de 1970 – a venda de uma parte da fazenda para o “dono da marca
LS”, Sr. Laucídio Coelho, um dos mais influentes fazendeiros daquela época. De acordo
com o depoimento dele, havia uma grande boiada de gado bagual em uma área da
Bodoquena onde “tinha ainda muito mato”. E, como o novo proprietário não tinha
interesse nesses bois, os vaqueiros da fazenda tiveram que pegá-los, “um a um, à laço”.
O episódio era particularmente interessante, para mim, nesse caso, porque essa

5
Lienhardt, em seu trabalho sobre os pastores africanos dinka, afirma que “Praticamente todo o
extenso vocabulário cromático dos Dinka é de cores de gado” (Lienhardt 1961: 37). O mesmo poderia ser
dito dos Nuer no célebre estudo de Evans-Pritchard (Evans-Pritchard 1940)
6
A antiga Fazenda Francesa foi visitada por Lévi-Strauss em sua passagem pelo Pantanal na
década de 1930 e é descrita em Tristes Trópicos (1955). Sua compra por investidores brasileiros, na
década de 1940, foi motivada pelo movimento de nacionalização promovido pelo governo Vargas, como
relata o estudo de Benevidez e Leonzo (1989) sobre a história das fazendas desta região.
negociação deu origem à San Francisco, uma fazenda que associava a criação de gado
ao ecoturismo, a qual também sediava um projeto de conservação de onças-pintadas.
Seu Joaquim era campeiro quando participou da “bagualhação”7 daquela boiada, e
contou que na época foram capturados mais de mil bois que viviam soltos na área
vendida. Ele descreveu ainda como os vaqueiros tinham levado aos poucos esses bois
com a ajuda dos sinuelos para serem incorporados ao rebanho da fazenda. Relatou que a
boiada bagual ia sendo aos poucos colocada junto com o gado manso de modo que fosse
se acostumando a comer sal nos coxos e perdendo o medo do ser humano, até amansar.
Algum tempo depois dessa conversa, quando visitei a fazenda San Francisco,
encontrei outra versão da mesma negociação de terras, desta vez em um registro escrito.
O texto estava em exposição no salão de visitantes da pousada da fazenda, exposto junto
com uma série de outros textos e fotografias sobre a origem da propriedade. Como
mencionei acima, a fazenda foi formada a partir da divisão das terras compradas junto à
Bodoquena, evento narrado por seu Joaquim. Um histórico da fazenda disponível do
site da San Francisco na internet, reporta que “Em 1973, o patriarca Laucídio Coelho
(…) comprou 100.000 hectares da antiga Fazenda Bodoquena e os dividiu entre seus 12
filhos”.8

O texto a que me refiro era uma homenagem póstuma ao Sr. Laucídio Coelho,
assinado por Antonio Barbosa de Souza, um antigo administrador que trabalhava com o
patriarca da família Coelho. Era uma descrição bastante minuciosa da negociação das
terras da Bodoquena, que retratava a personalidade do Sr. Laucídio a partir da posição
que ele assumira no negócio, não se curvando diante dos “representantes do grande
capital internacional” com os quais estava lidando. A Fazenda Bodoquena, como
reporta o autor do texto, foi “uma sociedade controlada por Walter Moreira Salles
(51%), David Rockefeller (25%) e pelo Sr. Anderson, da empresa norte-americana
Atlantic (25%)”. A sabedoria do patriarca, como atesta a passagem a seguir, consiste em
trazer a negociação para o seu próprio terreno, recusando a proposta de sociedade e
fazendo uma oferta de compra. O Sr. Laucídio Coelho diz:

7
O verbo ‘bagualhar’ e o substantivo ‘bagualhação’ se referem a uma prática tradicional
pantaneira, que em muitos lugares já não existe mais – uma espécie de manejo rústico do gado selvagem,
no qual a castração e o abate costumavam ser feitos no campo.
8
http://www.fazendasanfrancisco.tur.br/historico/. Consultado em 15/12/2015
- Esses senhores de nomes nacional e internacional são banqueiros muito fortes,
mas eles estão demonstrando que não são fazendeiros. Não estão dando conta
da administração da fazenda deles.

A lição final, apresentada em forma de diálogo, se traduz em um aprendizado em


relação ao gado bagual, e envolve a ocupação da terra por boiadas mansas:

– Sr. Laucídio, podemos comprar essa boiada? Acredito que eles nos façam um
bom preço. Devem vender bem barato.
– Antônio, nem dada! De jeito nenhum. Se tirar essa boiada e colocar com
outra, os mansos vão acompanhá-la e ficarão bravos também. Ela vai ficar
ligeira a vida toda. Isso é um veneno. Feche no mangueiro e peça que eles
venham buscar. Você tenta eliminar qualquer sementinha de gado bagual se não
eles levam o manso para ficar bagual. (…)
– Eu aprendi a lição: Boi bagual não serve para nada mesmo.

O autor aprende esta lição do fazendeiro, que considerava o bagual um


“veneno”, porque iria tornar o gado manso ligeiro e arredio. O ponto que me interessa,
neste caso, é o contraste entre a fala dele e a narrativa de seu Joaquim (citada acima) a
respeito do mesmo evento. No caso do texto do administrador da fazenda, escrito do
ponto de vista do comprador da terra, o gado manso é que poderia se tornar bravo em
contato com o bagual. A preocupação do fazendeiro, neste caso, é que os bois mansos
aprendessem o comportamento bagual. Como bom pantaneiro, ele sabe que os
comportamentos e os movimentos são transmitidos entre os animais que fazem parte da
boiada, mas acredita que o efeito de reunir aquela boiada fosse tornar o gado bravo.
No caso da narrativa de seu Joaquim, por sua vez, a sabedoria dos vaqueiros
reside exatamente na percepção contrária: Eles procuram amansar o gado bagual
colocando-o junto da boiada mansa. Compreendem o modo de comunicação
intersubjetiva dos bois, mas apostam no fato de que a junção da boiada resulte em um
processo de amansamento. Em contato com o gado manso, a boiada deixaria o estado
bagual. As duas narrativas parecem compartilhar, entretanto, um ponto de vista em
comum. A partir do engajamento prático, da experiência com o gado, trazem uma
compreensão de que os bois são capazes de se comunicar entre si, e o que fazem a partir
dos seus corpos e movimentos. Conhecem a tendência do rebanho de agir em conjunto,
de seguir padrões de comportamento, mas divergem sobre o sentido do processo.
Tornar-se manso ou tornar-se bravo são os dois sentidos possíveis da relação, porém
todos concordam que o comportamento bovino resulta da interação do rebanho.
Em um estudo realizado na região de Poconé, ao norte do Pantanal, Campos
Filho refere-se ao termo “visonho” para designar o gado “que nunca viu gente”, e que
por isso mesmo seria mais manso do que o bagual:

Este gado [o bagual] é ‘amedontrado de gente’ por ser ou ter sido ‘escarrerado’,
‘bagualhado’, perseguido para ser pego. Os ‘baguás’ correm maiores distâncias
que os ‘visonhos’, não se escondendo por terem grande desconfiança dos
cavaleiro. (Campos Filho 2002: 137)

Neste caso, é importante notar que são as ações humanas de perseguir e


amedrontar que produzem o bagual. Trata-se, neste caso, de uma das acepções possíveis
daquilo que poderíamos designar como selvagem, aqui no sentido daquilo que é
indomável, feroz. O “visonho”, por sua vez, é mais manso justamente porque nunca
teve contato com os seres humanos, porque vive em lugares isolados, lugares mais
selvagens, desta vez em outro sentido, daquilo que é remoto, recôndido, inacessível. Ao
contrário do que poderíamos supor usando como critério a distinção doméstico-
selvagem em sentido meramente classificatório (como por exemplo quando dizemos
que o boi é um animal doméstico e que a onça é um animal selvagem), o gado bagual
não se define pelo pertencimento a uma ordem determinada, mas sim por uma condição
ou estado. Mansidão e braveza não são estados de ser, são antes produtos relacionais de
interações entre os diferentes gados e os humanos. Amansar (que não é a mesma coisa
do que domesticar) é um processo que está em permanente tensão, no Pantanal, em
relação ao movimento do animal de se tornar bagual.

II
A fazenda Santo Antônio tinha uma área de dez mil hectares, tamanho
razoavelmente pequeno para os padrões da região. Era uma comunidade rural habitada,
no período em que fiz a pesquisa, por trinta e quatro pessoas e por um rebanho que
girava em torno de cinco mil cabeças9. O manejo de todo esse gado era conduzida por

9
A proporção entre seres humanos e bovinos (trinta e quatro para cinco mil) pode dar uma ideia
das respectivas populações (de humanos e bovinos) que habitam as áreas rurais dessa região do centro
oeste brasileiro.
apenas seis vaqueiros - incluindo o capataz. Além deles, havia o gerente da fazenda e
um auxiliar administrativo, que eram os responsáveis pela contabilidade, pelos registros
e pelo contato com fornecedores e compradores. O proprietário da fazenda era um
empresário de São Paulo do ramo da construção civil. O escritório, localizado na área da
sede, era o centro administrativo por onde passavam informações sobre tudo que
acontecia dentro dos limites da propriedade. Como é comum nesse contexto, o rádio era
o principal meio de comunicação dentro da fazenda e o canal de notícias entre os
moradores e seus vizinhos.
Seu Joaquim era casado com dona Antônia, e os dois moravam na casa principal
do único retiro da propriedade. O retiro era composto por um conjunto de três casas
próximas. No centro ficava a residência do capataz, sendo que um dos cômodos da casa
funcionava como “cantina”, e dona Antônia era responsável pelas refeições – café,
almoço e jantar – servidas diariamente para os campeiros e os outros funcionários da
fazenda, assim como para os biólogos que trabalhavam no projeto de pesquisa sobre a
onça pantaneira e outros visitantes. Uma segunda casa próxima, menor, era habitada por
um funcionário da fazenda com sua família. Uma terceira casa um pouco afastada
chamada de “galpão”, ou “alojamento” ficava do outro lado de uma área de campo
inundável, e era onde moravam os funcionários “solteiros” (termo que designava
aqueles cuja família não morava na fazenda). Foi onde fiquei hospedado nos períodos
de trabalho de campo.
No tempo da cheia, os campos de pastagem da fazenda ficavam todos alagados e
apenas os capões de mata e as áreas aterradas das habitações humanas e estradas
permaneciam secas. Era o caso quando cheguei à fazenda no mês de março de 2008,
quando os moradores do galpão haviam improvisado uma pequena balsa para atravessar
“zingando” a pequena baía formada entre as duas casas10. Na época da seca, no segundo
semestre, o percurso de cem metros entre a cantina e o alojamento estava
completamente seco e era feito a pé sem problemas.
Num dos dias em que acompanhei o trabalho dos vaqueiros, saí com eles à
cavalo antes do nascer do sol em direção a um piquete de gado onde iriam, como me
disseram, “cuidar dos bezerros”. Depois de cerca de meia hora, um dos campeiros
diminuiu a marcha até parar e, sem descer do cavalo, examinou cuidadosamente o

10
A zinga é um tipo de remo que toma partido do fundo de vegetação raso para permitir a
locomoção em pequenas canoas pelo espelho d’água; é um método utilizado tradicionalmente pelos
pantaneiros para muitos de seus deslocamentos nessa época do ano.
caminho ao redor, no qual identificou o rastro, ou, como dizem por lá, a “batida”, ainda
fresca, de uma onça. Enquanto procuravam pelos bezerros, um pouco mais tarde, ele
comentaria com seus companheiros brincando: “se o gato não comeu...”
Para o trabalho daquele dia, um lote de gado que estava espalhado pela invernada
(um dos pastos da fazenda) foi aos poucos reunido e depois encaminhado para um
cercado grande, ou piquete. Lá dentro, os cinco vaqueiros que participavam do trabalho
se dividiram. Dois deles continuaram montados para capturar, à laço, os animais,
enquanto os outros três aguardavam num canto do cercado com os medicamentos e
apetrechos que seriam usados para tratá-los. Quando um bezerro era trazido – sempre
acompanhado de uma vaca apreensiva –, um dos campeiros se aproximava a pé e o
virava de costas no chão, usando as mãos e o joelho para mantê-lo preso, enquanto seu
companheiro de trabalho usava uma corda para amarrá-lo pelas quatro patas. Em
seguida, a orelha era tatuada, recebendo um brinco com o mesmo número da tatuagem.
No decorrer do processo, eles aplicavam medicamentos e vacinas e tratavam de
ferimentos e bicheiras até que, ao final, o bezerro era erguido pelas patas e pesado com
o auxílio de uma balança manual. Todas as informações eram registradas pelo
encarregado em sua caderneta de campo.
Pude observar então que grande parte do trabalho dos vaqueiros era o de vigiar o
gado e segui-lo à distância pelo campo. Essa relação visual era recíproca, e marcada
pelo movimento contínuo e repetitivo e pela distância espacial. A partir do contato
visual e sonoro, o gado identificava e observava os movimentos dos vaqueiros – a
disparada de um cavalo, o volteio de um laço por cima da cabeça, essas eram as deixas
para que o rebanho se movimentasse. Os campeiros, por sua vez, observavam de longe
o rebanho, avaliando as condições de saúde dos animais de cima da montaria. Apenas
quando era necessária uma identificação adicional, assim como nos momentos em que
iam cuidar ou marcar os animais, essa vigilância à distância era interrompida por
movimentos abruptos. Ao ser capturado, isto é, quando o animal estava sob controle, a
relação visual dava lugar à manipulação e à interação física.
Durante minha estadia na fazenda pude observar algumas vezes o trabalho
dentro do mangueiro, que era dividido em partes: O embute ou seringa é como um funil
que conduz até um corredor estreito de madeira chamado de brete, por onde passa o
gado, uma rês por vez. No início e no fim do corredor, portas de correr eram controladas
por um vaqueiro. Passando pela segunda porta, a rês que vai ser pesada é segura pela
guilhotina – uma estrutura de madeira que se fecha no pescoço para segurar o animal na
balança. No final de tudo isso está o ovo, um pequeno espaço cercado por cinco portas,
controladas de cima por uma pessoa através de alavancas. Quando passavam pelo ovo,
os animais eram nomeados em voz alta por um dos vaqueiros: “vaca”, “macho
desmame”, “fêmea desmame”, “macho mamando”, “fêmea mamando”; em seguida,
cada classe era conduzida a um curral diferente. Os bezerros desmamados machos eram
aqueles que a fazenda iria vender. Enquanto as novilhas ficavam na fazenda para
procriar, os garrotes seriam posteriormente vendidos para abatedouros e açougues em
cidades como Corumbá e Campo Grande. O preço médio era 600 reais por cabeça na
época da pesquisa.
A Santo Antônio trabalhava com cria e recria de novilhos e durante o período da
cheia transportava uma parte do rebanho para o engorde nas pastagens secas de outra
fazenda, na parte alta do Pantanal. O sistema de controle e manejo do rebanho era
rigoroso e a produção vinha crescendo nos últimos anos, conforme relatado por seu
Joaquim. Falando sobre a produção da fazenda e o fornecimento da carne para consumo
interno, ele me disse que o ideal era a vaca ter um bezerro por ano: “se a vaca passa
muito tempo sem produzir, entra na fila para o abate”. É parte da rotina das fazendas do
Pantanal o abate periódico de vacas, as chamadas “matulas”, para o consumo dos
moradores, sendo que o custo, abaixo do mercado, geralmente é descontado no final do
mês no salário de cada um.
O responsável pelo abate e pela carneação na Santo Antônio era o próprio
capataz. A propriedade costumava abater duas vacas por mês: uma para os funcionários
“casados” (aqueles que moravam com a família em uma das casas da fazenda), outra
para a cantina, onde almoçavam os “solteiros”11, que viviam no galpão. A regra geral
era que a cantina servisse carne bovina nas três refeições diárias, incluindo o café da
manhã (no qual tradicionalmente se come o arroz carreteiro), no almoço e no jantar
(nos quais a carne é servida ensopada ou assada, normalmente acompanhada de arroz,
feijão e mandioca). Peixes como o pintado e o pacu eram também apreciados, mas não
foram servidos pela cantina nos períodos em que estive na fazenda a não ser uma única
vez, durante a época da quaresma, quando o costume local é evitar a carne vermelha.
O abate era feito num disco de cimento que ficava na área da sede, bem próximo à
casa do capataz. Fazia parte do cotidiano da propriedade. O clima entre os vaqueiros

11
Sendo que muitos deles eram casados e tinham família nas cidades próximas de Corumbá ou
Miranda.
que participavam da carneação era descontraído. Enquanto trabalhavam, falavam alto e
riam, com comentários a respeito do tamanho da vaca e das peças de carne que iam ficar
para cada um12. Quando terminavam, várias aves carniceiras como carcarás e urubus
estavam à espera das sobras. Ao lado do local do abate havia um pequeno cômodo no
qual o couro era levado para ser salgado para depois ser deixado no sol pendurado na
cerca em frente. Enquanto isso, a carne era cortada em grandes pedaços e pendurada em
ganchos dentro do açougue localizado numa casa ao lado da cantina, de onde seria
dividida entre os moradores.
Estudos antropológicos clássicos sobre as categorias animais e as relações
alimentares nas sociedades ocidentais, como os de Edmund Leach (Leach 1964) e
Marshall Sahlins (Sahlins 1976), mostram como as designações dos animais se baseiam
em sua participação como sujeitos ou objetos na sociedade humana. Sahlins descreve
como o modelo norte-americano default de refeição está firmemente fundado numa
centralidade da carne bovina, sendo ela muitas vezes um símbolo de saúde e de
prestígio social. A sociedade ocidental urbana opera neste caso uma desvinculação
simbólica radical entre o produto alimentar e sua origem animal, sendo que o
ocultamento da natureza orgânica da carne se dá através de dispositivos verbais, o que é
evidenciado pela distinção, na língua inglesa, entre carne como alimento (“meat”) e
como parte do corpo (“flesh”) (Sahlins 1976).
No ambiente rural, por outro lado, existe um engajamento do vaqueiro do com o
animal que vai ser comido enquanto ele está vivo, e a passagem entre os dois tipos de
carne é uma experiência que faz parte do cotidiano dos vaqueiros do Pantanal. Eles
admiram o animal nas vaquejadas e provas de laço, valorizavam o desafio, a rapidez e a
agilidade do novilho, e mais tarde se deleitam ao salgar sua carne13. Quase tudo na vaca
é aproveitado como matéria-prima para a fabricação de seus utensílios e materiais de
trabalho. Um chifre de formato adequado é usado para se fazer a guampa, recipiente no
qual se toma o tereré – o mate gelado que mata a sede e reúne os peões. Depois de ter
sido esticado ao ar livre, limpo e salgado, o couro é curtido com a casca de uma árvore
local, o angico (Anadenthera macrocarpa). É então usado na fabricação dos chicotes,
12
Banducci (1995) caracteriza a designação da matula e o tratamento jocoso e até agressivo
dispensado a ela nas fazendas do Pantanal como processo de afastamento em relação ao animal
selecionado para ser abatido.
13
Penso aqui no ensaio Porque olhar os animais?, de John Berger, quando ele afirma: “Um
camponês gosta do seu porco e fica contente ao salgar sua carne. O que é significativo, e é tão difícil para
o estranho urbano entender, é que as duas afirmações são ligadas por um e, e não por um mas”. (2009: 16)
bainhas de facas, rédeas, badranas (que prendem a sela), o coldre do revólver, o
embornal (onde carregam alimento), os arreadores (usados para produzir um estalo alto
e provocar movimento no rebanho), além, naturalmente, de sapatos, botinas, chapéus,
entre outros acessórios de vestuário.
O couro de um animal abatido era disputado entre os vaqueiros, que esperavam
sua vez para poder utilizá-lo, e o utensílio mais nobre e valorizado entre eles certamente
é o laço. “O laço é a arma do campeiro”, me diziam. Num domingo, que era o dia de
folga na fazenda Santo Antônio, pude observar o trabalho artesanal de Laurindo, que
fabricava para si um novo laço. Cada campeiro é responsável por seus utensílios,
incluindo o laço e todo o equipamento – a tralha de montaria. Laurindo usava quatro
tiras finas compridas de couro, cada uma com uma medida de trinta e cinco braços, que
tinham sido obtidas do corte em formato espiral do couro. Quatro novelos estavam
espalhados pelo chão, e as cordinhas iam sendo trançadas com apoio de uma das
colunas de madeira da varanda do galpão. Cada vez que trançava as tiras, o vaqueiro
usava o peso do corpo para puxar e dar aperto ao trançado, e me explicou que o
movimento seria determinante no resultado final. Quanto mais apertado, mais firme o
laço ficaria.
O corte dessas tiras – chamadas de tentos ou cordinhas – é uma tarefa que requer
uma grande habilidade por parte dos peões. No Pantanal, a reputação de um bom
artesão, assim como a de um bom laçador, como reporta Banducci (1995), pode se
espalhar muito além da fazenda em que ele mora, e seus serviços são apreciados tanto
por outros vaqueiros quanto por fazendeiros e conhecidos. No controle e manejo do
rebanho, o laço dos campeiros é, literalmente, aquilo que conecta o par vaqueiro-e-
cavalo ao animal perseguido. É aquilo que permite ao vaqueiro subjugar e controlar a
força do seu adversário animal. É com o laço que o bezerro é pego para ser cuidado, que
o gado que se solta é conduzido de volta ao rebanho, que o cavalo xucro é amansado e
que o boi bagual se vê capturado. É com ele também que se conduz a matula para o
sacrifício.

III
A pecuária tradicional pantaneira, praticada em grandes extensões de terras
inundáveis, é reconhecida como tendo relativamente pouco impacto ambiental, na
medida em que sempre preservou a vegetação nativa e a biodiversidade (Campos Filho
2002, Mazza et al. 1994). A caça também tende a ser bastante restrita no Pantanal, como
veremos adiante. A partir dos últimos cinquenta ou sessenta, entretanto, houve uma
mudança na pecuária local com a tecnificação da pecuária somada à queda da
rentabilidade do gado pantaneiro e a sua gradual substituição outros tipos de gado.
Um estudo realizado pela Embrapa-Pantanal14, descreve a formação do gado
pantaneiro mostrando como o surgimento de um tipo local foi fruto de um lento
processo adaptativo:

Através do processo de adaptação evolutiva e da ação da seleção natural sobre


os bovinos de origem ibérica, que se reproduziram por várias gerações nas
condições ecológicas do Pantanal, surgiu um tipo local. (Mazza et al.1994: 34)

De acordo com os autores, a substituição do gado ibérico pelos zebuínos de


origem indiana (o gado branco), foi baseada em critérios de mercado, e levou a um
processo acelerado de extinção do gado pantaneiro. Eles mostram como o surgimento
da etnoespécie local se deu a partir de bois baguais que se dispersaram pela região
pantaneira ao longo da história da colonização da bacia do Rio Paraguai, a partir do
século XVIII15. A ameaça de extinção do bovino pantaneiro é remetida assim à
substituição da pecuária tradicional por modelos “de fora” da região, baseados nas
regras do mercado e no manejo intensivo (1994: 35-38).
Numa perspectiva semelhante, Campos Filho aponta para as ambivalências da
pecuária local em relação aos diferentes dipos de gado:

O ‘baguá’ é também símbolo de um atraso econômico, pela sua condição


‘selvagem’ em comparação com animais manejáveis, ‘mansos’. Por isso é que
muitos fazendeiros negam possuí-los, escondendo o fato. Ao mesmo tempo,
valorizam o ‘baguá’ como símbolo do pantaneiro (Campos Filho 2002: 139)16

14
A Embrapa-Pantanal é a mais importante entidade de pesquisa governamental na região, e
desenvolve atualmente alguns projetos voltados para a conservação do Tucura (Mazza et al 1993).
15
Os grupos indígenas Guaicurus e Paiaguás ficaram famosos por serem exímios cavaleiros e
roubarem gado das comitivas que atravessavam seus territórios, oferecendo resistência à colonização da
região sul do Pantanal.

16
O autor usa a grafia “baguá”, seguindo a pronúncia regional. Nas gravações e registros orais
coletados durante a minha própria pesquisa, observa-se esta mesma pronúncia, mas optei neste trabalho
pela utilização do termo “bagual”, acompanhando a grafia usada em outras fontes bibliográficas
(Benevides e Leonzo 1999; Mazza et al 1994, Banducci 1995).
O autor define a existência do gado pantaneiro a partir de uma relação com o
ambiente que extrapolaria o controle humano quando afirma:

Tidos como nativos, os bovinos não necessitam dos humanos para sobreviverem
enquanto espécie no Pantanal. A única categoria efetivamente criada pelos
humanos é o ‘boi’, que é o macho emasculado resultado da castração (2002:
140).

A castração seria, portanto, não só uma ação de manejo, mas também aquilo que
marca a passagem da natureza à cultura. A ideia de que qualquer bovino que é um
animal doméstico, introduzido pela ação humana, é desta forma, como defende o autor,
uma ideia estranha ao modo de vida pantaneiro. Para caracterizar essa percapção dos
bovinos como uma espécie nativa, Campos Filho afirma que se trata de um processo de
“naturalição pela cultura” (2002: 141).
Álvaro Banducci, que trabalhou no Pantanal da Nhecolândia, afirma ainda que:

Na fazenda onde existe o gado bagual o peão se vê como "autêntico", pois deve
acordar cedo, ficar muitas horas sem comer e correr maiores riscos no campo,
ao passo que enxerga no outro um vaqueiro indolente, fraquejado pela
"facilidade" do trabalho (Banducci 1995: 134).

A identidade do pantaneiro é definida em termos das dificuldades e dos desafios


enfrentados e se refere aqui a um tipo de transferência que confere prestígio e valor ao
vaqueiro a partir do animal que ele é capaz de dominar, ou amansar. Para o autor, trata-
se de uma identidade que se constrói em um embate permanente com a dimensão
selvagem, com uma alteridade que precisa ser ordenada, controlada, domada, no
cotidiano das fazendas.
No caso da bagualhação, como é chamada a captura do gado bagual, os princípios
da lida são simplificados ao mínimo: castração, marcação, e abate. Referindo-se a esta
prática, Banducci reporta que “a primeira marca que o peão imprime no gado é um corte
na orelha, feito grande parte das vezes no campo”. E complementa que “a rês que não
possui esse indicativo de manejo e propriedade é também denominada ‘oreia’, tratando-
se de um animal selvagem, bagual” (Banducci 1995: 110-113).
O procedimento pode ser aproximado de outra atividade tradicional nas fazendas
pantaneiras, que é a caçada do porco monteiro. O monteiro, como mencionei
anteriormente, é o porco doméstico que, nos termos locais, “alonga para o mato” e se
torna selvagem. O termo “alongado” corresponde a uma fase de transição, já que,
apenas depois de algumas gerações em estado selvagem é que o porco adquire traços
morfológicos como a pelagem cinza e as presas pronunciadas, que caracterizam o
monteiro. Banducci afirma a esse respeito que:

[O] representante ideal para o consumo humano é o macho, previamente


castrado no campo para a engorda e para perder o cheiro característico - a
“miscazinha”, como se referem ao odor comum às carnes de caça. (Idem: 111)

Ao ser capturado para a castração, o porco é marcado com um corte na orelha ou


no rabo, o que serve posteriormente para a identificação do capado, que é o animal
apropriado para o consumo. O porco monteiro inteiro, chamado de guaiaca, seria o
equivalente do touro, também impróprio ao consumo humano. Há, neste caso, uma
simplificação do manejo ao mínimo, que se traduz em um código binário: marcado e
não marcado; castrado (próprio) ou não castrado (impróprio).
A captura do porco monteiro, uma atividade de caça tradicional, assemelha-se,
assim, à bagualhação do gado. Ambas se baseiam em uma série de elementos a partir
dos quais os animais são classificados e identificados pelos vaqueiros. Ambas as
atividades se situam entre a caça e o pastoreio, implicando procedimentos de
rastreamento, perseguição e captura típicos da caçada e, ao mesmo tempo,
procedimentos de manejo como a marcação e seleção de determinadas classes de
animais para o consumo.

IV
Em estudo sobre o modelo de caça tradicional pantaneiro, Reinado Lourival
considera que trata-se de uma prática ecologicamente sustentável (Lourival 1993). O
motivo principal para esta conclusão é que as práticas de caça em questão têm
justamente o porco monteiro – uma espécie exótica (o porco doméstico asselvajado e
adaptado ao ambiente local) – como presa principal. Ou seja, o argumento é que, ao
substituir as espécies nativas – principalmente os porcos do mato, cateto (Tayassu
tajacu) e queixada (Tayassu pecari) – na preferência dos caçadores locais, o monteiro
diminui a pressão de caça sobre essas espécies (Lourival 1994). Em relação às onças
pintadas e pardas, por outro lado, que são espécies consideradas “daninhas”, ou
“nocivas” pelos criadores de gado, o autor considera que a pressão de caça é de outra
ordem. Historicamente, o desenvolvimento das armas de fogo e a intensificação dos
métodos de manejo de gado amplificaram a eliminação de onças e tornaram o processo
cada vez mais sistemático, o que teria levado à erradicação dessas espécies em algumas
regiões.
Os caçadores de onças no Pantanal eram tradicionalmente matutos, bugres,
contratados pelos proprietários rurais especificamente para “desonçar” determinadas
regiões destinadas à criação de gado17, tornando-as seguras para a o estabelecimento das
comunidades humanas com seus rebanhos. O simbolismo negativo dos predadores para
populações nativas que convivem com eles se liga muitas vezes a um processo de
criminalização e condenação moral que frequentemente acompanha a eliminação ou o
controle sistemático dessas espécies. Um tipo de caçada muito presente na história
pantaneira eram os “safáris”, nos quais caçadores profissionais e guias locais
experientes levavam visitantes ricos do mundo inteiro para caçar onças na região na
primeira metade do século XX. Este tipo de caçada esportiva é descrito com minúcia
pelos livros autobiográficos de caçadores como Sasha Siemel (Siemel 1957) e Tony
Ameida (Almeida 1976). Várias evidências apontam entretanto para a continuidade
desta prática na região pantaneira. Um exemplo notório foi a notícia que circulou
amplamente pela mídia brasileira acerca de um esquema ilegal de safaris que foi alvo de
uma investigação da Polícia Federal brasileira em 2009, resultando em prisões e na
apreensão de armas e cães farejadores18.
Analisando a situação atual, a efetividade da legislação e as propostas existentes
para o manejo da predação no país, especificamente para o caso da onça-pintada,
Siveira e outros abordam o aspecto político da conservação: "Licenças para eliminar
animais daninhos só podem ser dada por uma autoridade competente”. Entretanto, “esta
autoridade competente nunca foi especificada” e “não há nenhuma autorização oficial
ou estatísticas do governo sobre o manejo de predadores no país" (Silveira e outros
2008: 30).
A prática tradicional de eliminação dos felinos com a utilização de cães foi
mencionada em entrevistas feitas em quatro fazendas, de um total de dez visitadas

17
O tema foi explorado por Guimarães Rosa num de seus contos mais geniais, Meu tio o Iauaretê,
de 1961.
18
Uma matéria sobre o caso pode ser encontrada no site do Ibama:
http://www.ibama.gov.br/publicadas/ibama-ms-multa-cacadores-de-oncas-pegos-em-operacao-conjunta-
com-a-pf. Consultado em 28/11/2015
durante a minha pesquisa19. Esse tipo de caça é defendida por proprietários locais
muitas vezes em termos de um controle necessário para a manutenção do negócio. Um
exemplo é o depoimento de um proprietário rural de uma região próxima a Corumbá,
registrado em novembro de 2008, que transcrevo a seguir:

E qual é a importância da onça aqui pro pantaneiro? Tem alguma importância


cultural?

Para falar como pecuarista, se ela não existisse pra mim era muito melhor. Só
que a gente sabe que ela faz parte de uma cadeia alimentar, que ela preda os
outros animais e por isso ela está fazendo o controle. Ela por si fazendo o
controle da população desses outros animais. Mas não tem nada que mata ela,
certo? Só o homem que mata ela. Eu acho o seguinte: Do jeito que é a
legislação, proíbe mas não proíbe, porque não há uma fiscalização. Você pega
o meu exemplo. A minha família está na região há cinquenta anos. A gente faz o
controle há cinquenta anos. Porque a gente está aqui no Pantanal. Nós
preservamos o Pantanal. Se você pegar a minha fazenda, há muito tempo ela é
do mesmo jeito; quer dizer, tem animais, tem o gado. E eu preciso tirar dinheiro
dela. Eu vivo daí, certo? Então, a única saída que eu tenho é eliminando os
indivíduos que tão me dando prejuízo econômico. Eu estou te falando isso: está
trilhado de onça no meu campo. Só que elas não estão me atrapalhando. Então,
deixa elas viverem lá! Eu não estou me incomodando com elas. Não está tendo
problema nenhum.

Este exemplo revela o que parece ser uma atitude bastante recorrente e
demonstra também o descaso do fazendeiro em relação à ação de órgãos públicos em
relação a esta questão. Desde a década de 1980, estudos voltados para a conservação das
onças pantaneiras têm mostrado que a região conservou as condições ambientais e a
base de presas das quais a espécie depende. Em linhas gerais, não é a falta de presas
naturais que faz a onça atacar o gado, mas antes a disponibilidade de um novo recurso
alimentar mais fácil e acessível do que as espécies de presas nativas. O que muitos
desses estudos apontaram, em resumo, é que ao longo de dois séculos de co-habitação
no Pantanal, o gado passou a fazer parte da dieta natural das onças, tornando-se muitas

19
Isso talvez não seja um resultado significativo em termos estatísticos para as regiões de estudo,
na medida em que trabalhei em áreas de influência de projetos conservacionistas e áreas turísticas.
vezes o principal item alimentar em termo de biomassa (Crawshaw & Quigley 1984,
Azevedo & Murray 2007, Cavalcanti e outros 2010).
A legislação de caça é regulamentada no Brasil desde 1967, quando a atividade
foi declarada proibida para qualquer espécie da fauna silvestre nativa. A lei vigente foi
modificada pela última vez em 1988, estabelecendo punições mais severas para os
caçadores. Na prática, no entanto, não há até hoje uma política efetiva do governo
voltada para o manejo e a conservação dos animais silvestres, e muitos proprietários
rurais pantaneiros, como vimos, continuam a reivindicar o direito de abater os animais
que ataquem o gado. Isso faz com que a caça seletiva da espécie seja apontada por
especialistas como a principal ameaça para a conservação da população da onça
pantaneira atualmente (Silveira et al. 2008). É este o conflito sobre o qual os projetos de
conservação atuam.
Mais de 95% da área do Pantanal é ocupada por propriedades privadas, que são
habitadas atualmente por mais de três milhões de cabeças de gado 20, de acordo com
dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Além disso, a pecuária
bovina é uma das principais frentes de desenvolvimento do agronegócio no país e os
fazendeiros são figuras que dominam a cena política no Estado do Mato Grosso e do
Mato Grosso do Sul. Como consequência do quadro complexo de relações ecológicas e
econômicas envolvendo o gado e sua predação pelas onças no Pantanal, as estratégias
desenvolvidas atualmente na região por grandes ONGs internacionais como a WCS
(World Conservation Society) e a WWF (World Wildlife Fund) vinculam a conservação
das onças à cadeia produtiva do gado usando as espécies ameaçadas como chamariz.
A associação entre ambientalismo e pecuária envolve uma série de novos
conceitos, tais como “consumo responsável”, “segurança alimentar”, “rastreabilidade”,
ou “sustentabilidade socioambiental”, e se articula a partir do estabelecimento de
políticas fundadas em indicadores ambientais. Em termos financeiros, em termos de
alianças regionais, áreas de pesquisa, representação pública, conflitos entre grupos de
interesse, relações ecológicas, as associações entre a onça e o gado do Pantanal parecem
se multiplicar interminavelmente. Elas se expandem das fazendas em direção aos outros
agentes que compõe a cadeia produtiva da carne bovina, incluindo frigoríficos,
açougues, distribuidores, cadeias de supermercados e grandes redes de fast-food pelo
mundo a fora. Essa é a cadeia na qual surgem novos elementos ligados aos movimentos
20
Tendo chegado a seis milhões antes da grande enchente de 1974, evento que marca o início de
uma crise da pecuária tradicional pantaneira (Campos Filho 2002).
conservacionistas, como a certificação da carne, os consumidores conscientes e as
espécies ameaçadas de extinção.
A onça pantaneira é aquilo que se convencionou chamar, na Biologia da
Conservação, de uma “espécie bandeira”, ou “espécie chave” para o Pantanal. O
primeiro termo se refere às espécies consideradas carismáticas que são chamarizes para
a atenção pública; o segundo se refere ao fato de que a existência dos grandes
predadores depende da manutenção de toda a cadeia trófica da qual eles dependem, o
que significa que sua preservação implica na de muitas outras espécies (Silveira et al.
2008). Estudos sobre o comportamento da onça pantaneira, como vimos acima,
mostraram que o gado introduzido pelos seres humanos se converteu na presa mais
abundante e mais comum das onças. Isso subverte paradigma e rompe com antigas
concepções a respeito de uma fronteira bem definida e marcada entre o ambiente
selvagem e o ambiente doméstico, ou entre a natureza e a cultura; o “comportamento
natural” das onças pantaneiras envolve a predação do gado doméstico, o que se torna
um elemento incontornável das relações econômicas e ecológicas locais.
A relação simbiótica entre a onça e o gado é boa para se colocar em questão a
definição da situação nos termos de um conflito ecológico entre fazendeiros e onças, no
qual uma espécie selvagem, nativa, se alimenta de uma espécie doméstica, exótica. A
situação que se anuncia no horizonte, quando atentamos para o caráter plural dos
agencimentos envolvidos, talvez não possa ser reduzida apenas a distinções definitivas
entre animais humanos e não humanos, espécies selvagens e domésticas, e conflitos
resultantes da invasão respectivos ambientes. É antes uma situação em que onças, gado
e humanos estão inseridos em processos complexos que envolvem movimentos entre
estados de braveza e mansidão. O manejo intensivo do gado dentro do mangueiro, em
episódios de vacinação e de contagem dos animais, pode ser interpretado como um
aspecto das relação produtivas nas quais o animal é tratado como coisa, objeto, rebanho
indiferenciado. A lida com os animais no campo, por outro lado, é atravessada por
relações múltiplas com indivíduos excepcionais que varam cerca e escapam do rebanho,
com cavalos difíceis de domar, com os bezerros reivindicados pelas onças, com as
mortes causadas por enchentes, cobras e plantas venenosas.

V
Diante da ocupação do Pantanal por novas práticas da pecuária, o gado bagual
começou a desaparecer, e junto com ele uma série de costumes tradicionais. O que
desaparece, neste caso, evidentemente não são só bois, mas também modos de vida e
experiências singulares de mundo que não se restringem às práticas de manejo do
rebanho. No trecho a seguir, Campos Filho fala em uma “cultura bovina” para designar
as relações ecológicas em jogo no Pantanal, de modo que não restringe o papel do gado
apenas ao paradigma da produção, nem tampouco ao da seleção natural:

[C]ada grupo bovino desenvolveu história em seu ‘lugar’, apresentando


comportamentos singulares de migração e utilização de territórios, ambientes e
alimentos nas várias ‘épocas do ano’, chamados de ‘jogo do gado’, repassados
aos animais mais novos, o que permite dizer de uma ‘cultura bovina pantaneira’
(Campos Filho 2002: 126)

O “jogo”, aqui, é ao mesmo tempo uma “utilização dos ambientes” por parte do
gado e aquilo que os vaqueiros aprendem a reconhecer para jogar. O gado é entendido
neste caso como um agente, e não apenas como uma matéria-prima ou objeto para a
cultura humana. A ideia de cultura, quando tomada especificamente como projeto ou
como produção de um ambiente humano – artificial, simbólico, tecnológico –, implica
na existência de um material bruto, de um substrato natural inerte, ao qual
corresponderia a uma concepção instrumental e objetiva da animalidade. A ideia
alternativa da “cultura bovina” aponta, em sentido contrário, para a constatação de que o
gado constrói e reproduz o ambiente do Pantanal, produzindo-o tal como ele é habitado
pelos animais selvagens, pelos próprios rebanhos e pelos vaqueiros.
Como vimos, a pecuária tal como praticada tradicionalmente tem a reputação de
ter conservado em ampla medida a vida selvagem e a biodiversidade regional, sendo
que atualmente as grandes ameaças ao ambiente do Pantanal provém das
transformações motivadas pelo agronegócio tecnificado e intensivo e pela lógica
desenvolvimentista. A conservacão do gado pantaneiro, ou tucura, se inscreve
exatamente aí, como um contrafluxo a este movimento. Considerado atualmente uma
etnoespécie ameaçada de extinção, este tipo de gado associa a manutenção das tradições
e a conservacão dos ecossistemas locais.
Para muitos pantaneiros, a ausência do gado de uma determinada área parece
significar um processo de descaracterização da paisagem, em que o campo se torna
“sujo”, categoria que se refere ao mato cerrado e impenetrável e se diferencia tanto do
“limpo” (o campo aberto das pastagens) quanto dos capões e cordilheiras (áreas
florestadas)21. A pastagem contínua das boiadas “limpa” o campo ao mesmo tempo em
que abre as trilhas por onde os vaqueiros circulam. A ação do gado é entendida, neste
caso, como uma força que produz e mantém a paisagem tal como ela é conhecida e
valorizada pelos pantaneiros.
Para finalizar, gostaria de retomar a história com a qual iniciei este artigo. Nela,
uma mulher (a bisavó do vaqueiro narrador) é tomada por um devir animal quando se
perde no mato e passa a viver com o gado bagual. Depois, há o retorno ao estado normal
a partir de um amansamento vinculado à religiosidade. Mas esse movimento de retorno
não se completa: Um mês depois de capturada, a moça morre22. O que está em jogo na
história é um movimento que atravessa a fronteira entre humanos e animais. A condição
bagual é formulada, no caso, como limite não só do estado de mansidão ou
domesticação de animais não humanos, mas também da própria condição de
humanidade. A condição humana pode ser entendida nesse sentido, como uma condição
domesticada, ou pelo menos amansada.
A oposição entre bravo (bagual) e manso, como em muitas outras partes do Brasil
rural, parece ter, no caso do Pantanal, mais sentido do que aquela entre doméstico e
selvagem. O bagual é um devir, e não um pertencimento a uma classe. Longe dos
sistemas lineares, do comportamento previsível e determinista atribuído aos rebanhos de
gado e aos seres humanos quando nos limitamos à ideia do animal domesticado,
encontramos aqui os elementos dinâmicos e imprevisíveis das relações pantaneiras.
Domar e amansar, de um lado; tornar-se bravo ou bagual, de outro, são possibilidades
em aberto dentro de uma experiência singular e simbiótica de comunidade que inclui
animais humanos e não-humanos.

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21
O contraste entre limpo e sujo remete ao célebre estudo de Mary Douglas Pureza e Perigo
(1966) sobre a associação entre os tabus culturais (principalmente alimentares) e os aspectos
classificatórios e linguísticos da ideia de poluição, ligada a algum tipo de desvio em relação às categorias
normativas usadas para definir o mundo natural.
22
Assim como em alguns dos exemplos citados por Deleuze e Guattari (2007) a respeito de seu
conceito de devir animal, há aqui um movimento de desterritorialização do humano e o agenciamento de
uma aliança demoníaca que arrasta a personagem da história em direção à morte precoce.
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