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RESENHA

1) Andreas Huyssen - Culturas do passado-presente


- Duas temáticas centrais: as consequências do modernismo na obra de artistas
contemporâneos e as políticas da memória, do esquecimento e dos direitos humanos.

- A modernidade não é algo homogêneo. O discurso do modernismo e da memória se


globalizam, mas não criam um modernismo global único ou uma cultura global. Existem
múltiplos, que acompanham as trajetórias nacionais. Autor vê declínio do debate sobre o “pós-
modernismo”, segundo ele uma tentativa norte americana de reivindicar liderança cultural. O
discurso se volta para a modernidade novamente.

- O presente tem ocupado posição dominante na experiência de tempo contemporânea,


mas o Ocidente busca no passado formas de legitimá-lo (com a museificação, por
exemplo), por conta das incertezas do futuro. Na era da informação, a experiência de
tempo é acelerada.
- Propõe uma revisão de conceitos como centro e periferia, global e local, colonial e pós-colonial,
moderno e pós-moderno, ocidental e oriental, porque são contrapontos que pressupõem lado
inferior e superior, e que atenuam a relevância de relações hierárquicas de valor presentes em
todas as culturas.

- Alerta para o perigo da instrumentalização da memória, que pode ser transformada em


objeto da indústria cultural (como o Holocausto o foi), e pode estar a serviço de diferentes
ideologias.
- A obra ajuda a pensar a prática historiadora. Ajuda a analisar as relações entre temporalidades
e especialidades no presente vivido. Reflete sobre como, no presente, se articulam passado e
futuro, alertando para a importância da imaginação de futuros alternativos, desamarrados do
peso asfixiante do passado.

- O autor praticamente não fala do Brasil. Mas o país tem se valido dos conceitos e análises
mobilizadas por ele no crescimento da noção de “cultura da memória”. Por aqui, são relevantes
as memórias da ditadura, por exemplo.

- Defende que os estudos sobre memórias estejam alinhados com a luta por direitos
humanos.
- Existe uma “guinada transnacional” nos debates sobre memória, com contextos nacionais
influenciando outros (Holocausto > Argentina; Comissão da Verdade pós-apartheid > outras
comissões do tipo)

- Primeira parte: a partir das experiências de alguns artistas fora do eixo EUA-Europa (Ásia,
África, América Latina), tenta entender como a cultura/modernidade clássica foi traduzida e
apropriada em países colonizados e pós-coloniais. O que existe em comum nas obras é que
elas lidam com questões da memória a partir de contextos nacionais, sem um padrão pré-
estabelecido, e que se apropriam de modos modernistas de representação.
- O modernismo foi disseminado negociando as ideias de local e global. Mas manter essa
dualidade impede a compreensão transnacional das práticas culturais, sua apropriação, os
fluxos desiguais. Critica o discurso das culturas locais autênticas, que deveriam ser
preservadas da homogeneização da globalização.

- Segunda parte: problematiza as políticas de memória, do esquecimento e de direitos humanos,


retomando debate anterior que fez em “Seduzidos pela memória” (2000).

- Dialoga com Walter Benjamin na emergência da memória como preocupação


cultural e política da contemporaneidade. Utiliza deles conceito de ruína (um olhar
nostálgico sobre o passado), que tem ganhado muita importância com a
museificação, e escombro (um olhar temeroso sobre fatos ruins do passado).
- Benjamin, dialogando com Baudelaire: a memória não como representação do passado,
mas como apresentação dele

- O Holocausto, um escombro, torna-se ruína, alimentando um mercado da memória como


entretenimento (filmes, livros etc sobre o tema).

- Critica o conceito de “memória coletiva” (Halbwachs), como uma memória mais ou menos
estável de um grupo ou nação. A memória nunca é neutra (“abusos de memória”).

- É preciso compreender as assimetrias e competições travadas nas trajetórias


transnacionais da memória.

- Em um mundo obcecado pela memória (e onde tudo pode ser facilmente acessado e
armazenado), o esquecimento é malvisto.
- Entretanto, políticas de esquecimento foram importantes em alguns casos de construção
de um discurso politicamente desejável e de uma esfera pública democrática em
consonância com as políticas nacionais de memória. Por exemplo: o esquecimento das
mortes causadas pela guerrilha urbana na ditadura argentina para se consolidar o consenso
nacional sobre os desaparecidos; ou o esquecimento dos bombardeios dos Aliados na
Alemanha para consolidar o horror do Holocausto.

- Questões que o autor ensaia: pode haver uma ética do esquecimento? Como se dá a
diferença entre esquecimento voluntário e forçado? Algo reprimido ou silenciado foi
esquecido? Talvez possa haver um meio termo entre memória e esquecimento.
- A busca por reparação de injustiças cometidas no passado aproximam as políticas de
memórias das políticas de direitos humanos. É preciso reforçar essa ligação, pensando
ainda na justiça e em ações mais práticas.

- Essa reivindicação tem crescido na questão dos direitos culturais das populações
indígenas ou descendentes de escravizados na América Latina, Canadá e Austrália, assim
como direitos civis na questão da imigração e diáspora. Isso desestabiliza a ideia de
“identidade nacional” e colocam em conflito global e local. O autor critica a concepção de
suposta autenticidade intocada das culturas locais.

- O discurso da memória pode abrir caminho para a compreensão de particularidade


históricas e sociais que o discurso de direitos humanos individuais deixa em segundo
plano.

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