Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Afrodescendente
e Indígena
(Lei 11.645/08)
Resumo
Este artigo tem como recorte a questão da arte africana e, com
base nela, uma reflexão sobre a prática de abordagem da cultura
africana em sala de aula e sobre aparatos e categorias de análise
e interpretação que refazem olhares eurocêntricos ou colonizadores
sobre objetos e expressões plásticas produzidas nas Áfricas; propõe,
para tanto, discutir o estatuto de arte dado a esses objetos, para, em
seguida, propor abordagens multidimensionais que levem em conta
tanto o aspecto estético da produção africana quanto os aspectos
espirituais e culturais que os habitam.
Palavras-chaves: história da África, arte africana, estudos pós-
-coloniais.
* Mestre em História Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Douto-
rando em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pesquisador
do Centro de Estudos Culturais Africanos e da Diáspora (CECAFRO) e colaborador
do coletivo Afreaka, site de divulgação de culturas afrodiaspóricas e africanas.Docente
do Curso de História da Universidade Metodista de Piracicaba. rfgmaced@unimep.br.
** Doutor em Ciências Sociais - Antropologia e Mestre em História pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Docente do Curso de História da Universidade
Metodista de Piracicaba. Tem experiência na área de História, com ênfase em História
Contemporânea e História da América. dribeiro@unimep.br.
Abstract
This article aims to discuss the question of African art and, from it,
reflect a practical approach to African culture in classroom rethinks
devices and categories of analysis and interpretation remake Eurocen-
tric gaze or colonization on plastic objects and expressions produced
in Africas and proposing, therefore, discuss the status of art given
to these objects to then propose multidimensional approaches that
take into account both the aesthetic appearance of these objects as
the spiritual and cultural aspects that inhabit them.
Keywords: african history, african art, postcolonial studies.
Resumen
Este artículo tiene como enfoque la cuestión del arte africano y,
a partir de él, reflexionar una práctica de abordaje de la cultura
africana en el aula que replantea aparatos y categorías de análisis
e interpretación que rehacen miradas eurocéntricas o colonizadoras
sobre objetos y expresiones plásticas producidas en las áfricas y pro-
poniendo, para ello, discutir el estatuto de arte dado a esos objetos,
para, luego, proponer abordajes multidimensionales que tengan en
cuenta tanto el aspecto estético de esos objetos como los aspectos
espirituales y culturales que los habitan.
Palabras claves: historia de África; arte africana; estudios pos-
-coloniales
Introdução
3
Neste ponto, é preciso deixar claro que não generalizamos a “África negra” como
um corpo homogêneo e sem tensões e nem com um essencialismo puro e originário.
Como demonstra o antropólogo Peel, em relação à identidade Yoruba, muitas vezes
aquilo que tomamos como identidades atávicas são, de fato, identidades crioulas,
isto é, construídas já na relação e nas zonas de contatos imperialistas e coloniais com
missionários, viajantes e exploradores ocidentais (PEEL, 2000).
4
Aqui, faz-se uma distinção entre as duas categorias: “estético” e “arte”. Arte, pensada
nos termos de Balogun, constitui-se como uma forma de comunicação e expressão de
visão de mundo. O estético, tal como ele apareceu no século XVIII na Europa, seria uma
maneira de julgamento e apreciação de obras de arte, uma prática comum na Europa,
mas incomum na África devido ao caráter sagrado da maioria das obras artísticas. De
qualquer forma, é possível incluir o próprio fundamento epistemológico de Balogun
acerca de sua definição de arte em um regime de enunciação estético, isto é, uma opera-
ção em que se articulam formas artísticas a experiências sensíveis de uma comunidade.
6
Trata-se também de invocar e rejeitar o reducionismo identificado por Stuart Hall como
o “dilema binário”. Nos termos do presente artigo, pode-se pensar o significado da
arte africana de forma “plurivalente” (HALL, 2013, p. 255), ou seja, abandonar tanto
uma ideia essencialista da arte africana quanto uma concepção do olhar modernista no
sentido de uma “ideologia dominadora”. Procura-se, assim, adotar um olhar relacional,
em que a textualidade da arte tradicional africana apareça também cifrada pelo “regime
de enunciação estético” eurocêntrico de que fala o filosofo Jacques Rancière (1999b).
Todos falam sobre a influência que os Negros tiveram sobre mim. O que
posso dizer? Todos nós amávamos fetiches. As formas não tiveram mais
influência em mim do que em Matisse ou Derain. Mas para eles, as más-
caras dos Negros eram apenas como qualquer outra peça de escultura.
Quando eu fui ao velho Trocadero foi apavorante, como o Mercado de
Pulgas. O cheiro. Eu estava completamente sozinho. Eu queria fugir. Mas
eu não parti. Eu fiquei. Eu fiquei. Eu entendi que era muito importante:
algo estava acontecendo comigo, certo? As máscaras não eram como
nenhuma outra peça de escultura. De modo algum. Elas eram objetos
mágicos. E por que não eram mágicas as peças egípcias ou as caldeias?
Não havíamos nos dado conta de que elas eram apenas primitivas, e não
coisas mágicas. As peças negras eram intercessores, mediadores, desde
então eu aprendi a palavra em francês. Elas eram contra tudo – contra
espíritos desconhecidos, ameaçadores... Eu entendi então que eu também
era contra tudo. Eu também acredito que tudo que é desconhecido é um
inimigo! Tudo! Não apenas os detalhes – mulheres, crianças, animais,
tabaco, brincar – mas também o conjunto de tudo. Eu entendi para que
os Negros usavam suas esculturas. Por que esculpir daquele jeito e de
nenhum outro? Aqueles fetiches eram usados para a mesma coisa. Eles
eram armas para ajudar as pessoas a evitar a entrada sob a influência de
espíritos, para ajudá-los a se tornarem independentes. Eles eram ferra-
mentas. Eu entendi naquele momento porque eu era um pintor. Comple-
tamente sozinho naquele museu horroroso, com máscaras, bonecas feitas
pelos peles vermelhas, manequins empoeirados. As Demoiselles devem ter
vindo a mim exatamente naquele dia, mas não de modo nenhum por causa
das formas, não; mas porque foi minha primeira pintura-exorcismo – sim,
certamente (BITTENCOURT, 2012, p. 13-14).
(...) associando tempo a espaço, homem à natureza, arte à vida; que pro-
duzem e repassam mensagens em presença e ‘fabricação’ contínua de
corpos, em interlocuções extraverbais, via imagens e metáforas, figurações
Referências