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EDUCAÇÃO EM LUTERO

Educar para a liberdade: Lutero nasceu e cresceu em um mundo cuja liberdade


e o poder estavam intimamente ligadas à posse de grandes faixas de terra1.

Nesta realidade, a educação voltava-se quase que exclusivamente à formação


de clérigos da Igreja e era utilizada como ferramenta para persuadir a população
de que as atrocidades praticadas pela cúria e pelos governos seculares estavam
de acordo com a vontade de Deus. Nesta perspectiva, uma educação mais
ampla geraria a “Liberdade de Consciência”2.

Educar para o bom uso da graça de Deus: para Lutero, é evidente que a
pessoa precisa ter acesso à Palavra de Deus; para tanto, ela precisa ser
alfabetizada, além de instruída nas demais áreas do conhecimento. Como ela
saberá se está agindo de acordo com a vontade de Deus se não puder ter acesso
à sua fonte?

Educar para a cidadania: mesmo com toda a sua trajetória ministerial, a visão
de Lutero sobre o tema educação não se limita ao mundo religioso. Antes, tem
um caráter ético e, consequentemente, cidadão. Conforme a sua visão, a
educação é um requisito fundamental, tanto para o Reino de Deus como para o
mundo secular.

Era lógico que a humanidade não podia ser formada apenas por ministros
religiosos. Era imprescindível que houvessem pessoas instruídas, capacidades
e de bem em todas as suas esferas, sobretudo, na administração.

O mundo precisa de homens e mulheres excelentes e aptos para manter


seu estado secular exteriormente para que então os homens governem o
povo e o país, e as mulheres possam governar bem a casa e educar bem
os filhos e a criadagem3.

Para tanto, Lutero cobrou das autoridades de sua época a criação de escolas –
públicas e obrigatórias – onde os jovens pudessem, de forma lúdica e
pedagógica, desenvolver as suas capacidades.

1
Márcia M. C. de Liberal, p. 3.
2
Márcia M. C. de Liberal, p. 2.
3
Lutero escrevendo aos Conselho de Todas as Cidades. Obras Selecionadas, vol. 5, pg. 318.
Ora, a juventude tem que dançar e pular e está sempre à procura de algo
que cause prazer. Nisto não se pode impedi-la e nem seria bom proibir
tudo. Por que então não criar para elas escolas deste tipo e oferecer-lhe
estas disciplinas? Visto que, pela graça de Deus, está tudo preparado
para que as crianças possam estudar línguas, outras disciplinas e História
com prazer e brincando. Pois as escolas de hoje já não são mais o inferno
e purgatório de nossas escolas, nas quais éramos torturados com
declinações e conjugações, e de tantos açoites, tremor, pavor e
sofrimento não aprendemos simplesmente nada4.

Lutero acreditava que a educação devesse, até mesmo, ser imposta pelas
autoridades territoriais aos seus súditos.

Em minha opinião, porém, também as autoridades têm o dever de obrigar


os súditos a mandarem seus filhos à escola, especialmente aqueles aos
quais me referi acima. Pois na verdade é dever dela preservar os ofícios
e estados supramencionados, para que no futuro possamos ter
pregadores, juristas, pastores, escritores, médicos, professores e outros,
pois não podemos prescindir deles. Se podem obrigar os súditos capazes
de carregar lanças e arcabuzes, escalar os muros e outras coisas mais
que devem ser feitas em caso de guerra, quanto mais podem e devem
obrigar os súditos a mandarem os filhos à escola. Porque aqui se trata de
uma guerra pios, a guerra contra o enfadonho diabo, cujo propósito é
sugar solapadamente cidades e principados, esvaziando-os das pessoas
capacitadas, até retirar o cerne, deixando apenas uma casca vazia de
pessoas inúteis, as quais pode manipular e suar a seu bel-prazer.5

Que motivos que levaram Lutero a se preocupar com a educação?

1. Abandono das escolas. Até então, o ensino visava tão-somente


a carreira religiosa. Com desencantamento com a religião, ninguém mais
buscava proporcionar ensino e educação aos seus filhos. Neste ponto,

4
Lutero escrevendo aos Conselho de Todas as Cidades. Obras Selecionadas, vol. 5, pg. 319.

5
Uma prédica para que se mandem os filhos à Escola, escrita em 1530. Obras Selecionadas, Vol. 5. pg
362.
além de criar e manter escolas, o estado deveria financiar o estudo para
os jovens pobres e, também, sustentar professores competentes6.

2. Valorização da graça. Conforme citado anteriormente, se o


indivíduo não estiver intelectualmente apto, a graça de Deus pode ser
comparada à semente jogada em “solo rochoso” (Mateus 13.5); para que
produza frutos em abundância, a terra precisa estar preparada. Quando a
graça de Deus chegar, é importante que as pessoas estejam em
condições de fazê-la florescer e frutificar.

A final de contas, conforme o Reformador: “A Palavra de Deus e sua graça


são como a chuva de verão, que não retorna ao lugar por onde passou”.
Ou seja, quando o Pai derramar a sua graça, é necessário que a
população esteja preparada para fazer bom uso deste gesto amoroso de
Deus!7

3. Responsabilidade dos pais. Segundo o Reformador, a tarefa


primeira dos pais consiste em educar os filhos. Para explicar esta
situação, Lutero utilizou-se do Salmo 78.5, de Deuteronômio 32.7 e de
outras citações.

Segundo ele, não basta a criação de escolas por parte do estado, é


necessário, também, que os pais enviem as crianças até elas. Caso não
o façam, estão incorrendo num grande pecado:

Aliás, para que vivemos nós velhos senão para cuidar da juventude, ensinar e
educá-la? A própria natureza ensina o valor do ensino. Os animais irracionais
cuidam de seus filhotes e não os abandonam.8

4. A educação deve ser integral. Conforme Lutero, a educação não


pode ser voltada somente aos religiosos, portanto, o seu currículo deve
ser mais amplo. Ali, devem constar línguas e ciências da humanidade.

Além disto, a fé não deveria e nem precisaria ter medo da ciência. A final
de contas, confrontada e dialogando, a fé seria ainda mais valorizada.9

6
Márcia M. C. de Liberal, p. 6.
7
Márcia M. C. de Liberal, p. 7.
8
Márcia M. C. de Liberal, p. 7.
9
Márcia M. C. de Liberal, p. 8.
Considerações finais. Conforme pudemos verificar, Lutero, influenciado
pelos movimentos Renascentista e Humanista10, teve uma visão bastante
moderna de educação para a sua época. A compreensão de que, além do
mundo espiritual, que é atemporal, temos o mundo secular, que a nossa
realidade, permitiu-lhe entender a importância de um currículo mais amplo
para a formação integral e, consequentemente, cidadã dos indivíduos.

Ao mesmo tempo, a proposição de educação uma educação gratuita,


obrigatória, lúdica e com professores bem remunerados aponta, de fato,
para uma compreensão proposta de educação libertadora.

BIBLIOGRAFIA

MENEZES, Arlete Antônia Schmidt. Sobre o Papel da Educação na


Concepção Religiosa de Martinho Lutero. Maringá, 2005. 98f. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação,
Área de Concentração: Fundamentos da Educação. Universidade
Estadual de Maringá.

10
Arlete Schmidt, p. 33.

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