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Saúde pública
10 PROBLEMAS DA SAÚDE NO BRASIL FALTA DE MÉDICOS EPIDEMIA DE OBESIDADE NOTÍCIAS

Ricos 'não deveriam usar o SUS',


diz Dráuzio Varella COMENTE

Luis Barrucho (com imagens de Elisa Kriezis)


Da BBC Brasil em Londres 16/05/2018 07h58 Nos limites da cidade
Moradia irregular cresce no
m n   H { Ouvir texto J Imprimir F Comunicar erro
extremo leste de São Paulo
Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK

Em entrevista à BBC Brasil, médico mais famoso do Brasil diz que país 'ousou dizer que
saúde é um bem de todos e um dever de Estado'

O médico mais famoso do Brasil não tem papas na língua.

Aos 75 anos, o paulistano Dráuzio Varella é dono de opiniões fortes - e polêmicas.

Em entrevista à BBC Brasil no Reino Unido, onde participou de um ciclo de


palestras organizado por estudantes brasileiros, ele defendeu que os ricos deixem
de usar o Sistema Único de Saúde (SUS).

"Um país com mais de 200 milhões de habitantes ousou dizer que saúde é um bem
de todos e um dever de Estado (...) Acho que, num país com a desigualdade do
Brasil, temos uma parte da população com condições econômicas bastante
favoráveis que não deveria usar o SUS. Deveria deixá-lo para quem não tem outra
alternativa: ou se trata pelo SUS ou não se trata. Então, não tem sentido de eu estar
ocupando o lugar do outro, tenho que me entender com a iniciativa privada", diz.

Tampouco economizou palavras duras quanto à intervenção política no Ministério


da Saúde.

"Você sabe quantos ministros da Saúde o Brasil teve de 2000 a 2018? 12. Nos
últimos cinco anos, foram seis. A média de permanência no cargo foi de dez meses. Blog do Josias
Outro problema é que no Brasil temos milhares de cargos de confiança, trocamos Depois de Aécio, Moro
faz pose ao lado de Doria
os diretores de hospitais pelo país inteiro, trocamos os chefes de autarquias...a
em evento em Nova York
cada dez meses os processos são desestruturados. Isso ocorre em todas as
esferas: federal, estadual e municipal. Como você consegue organizar uma
empresa, qualquer uma, se a cada dez meses todos os diretores e gerentes são R$ 1,4 milhão
trocados?", questiona. Processo expõe dívida
de concessionária com
Durante a conversa, Varella também falou sobre sua experiência nos presídios governo da BA
brasileiros, nos quais é voluntário há décadas. Também discorre sobre temas que
costumam gerar polêmica, como a descriminalização das drogas, o aborto, a Na Faixa de Gaza
homossexualidade e o papel da fé no processo de cura. Israel reage com tiros a
pneus queimados é
Veja abaixo os principais trechos da entrevista. criticado por 'excessos'

Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK

Dráuzio Varella: 'A sociedade brasileira, na qual eu me incluo, quer ver bandido na
cadeia. Mas encarcerar simplesmente não melhora a segurança nas cidades'

BBC Brasil: Qual é o principal problema de saúde pública do Brasil?

Dráuzio Varella: São muitos os principais problemas. Temos um sistema único de


saúde no Brasil que as pessoas conhecem mal e que, infelizmente, tem uma má
fama. Mas o SUS continua sendo o maior sistema de saúde do mundo. Um país
com mais de 200 milhões de habitantes ousou dizer que saúde é um bem de todos
e um dever de Estado. Lógico que temos a dificuldade de tornar o SUS realmente
acessível à toda a população, mas também tivermos enormes avanços. Temos o
maior programa de vacinações do mundo, temos o maior programa de transplante
de órgãos gratuito do mundo todo, revolucionamos a epidemia de Aids, e há muitas
outras ilhas de excelência. Por outro lado, há alguns gargalos que dificultam o
acesso. O principal problema está na atenção básica.

BBC Brasil: O sr. falou que o Brasil ousou criar um sistema de saúde que é
universal. Na sua opinião, o SUS deveria deixar de ser universal? Qual seria a
solução de curto prazo para o SUS?

Dráuzio Varella: O SUS foi um grande avanço. Não podemos perder isso. É uma
conquista da sociedade brasileira. Temos que defender o SUS antes de tudo. Mas
acho que, num país com a desigualdade do Brasil, temos uma parte da população
com condições econômicas bastante favoráveis que não deveria usar o SUS.
Deveria deixá-lo para quem não tem outra alternativa: ou se trata pelo SUS ou não
se trata. Então, não tem sentido de eu estar ocupando o lugar do outro, tenho que
me entender com a iniciativa privada. Já outras pessoas defendem o fim da saúde
complementar no Brasil. Acho que isso é um radicalismo incoerente, porque é jogar
em cima do SUS pessoas que já são muito privilegiadas. O que temos que fazer é
aprimorar o SUS.

A solução está dentro do SUS. Para isso, é preciso, em primeiro lugar, impedir a
intervenção política. Você sabe quantos ministros da Saúde o Brasil teve de 2000 a
2018? 12. Nos últimos cinco anos, foram seis. A média de permanência no cargo foi
de dez meses. Outro problema é que no Brasil temos milhares de cargos de
confiança, trocamos os diretores de hospitais pelo país inteiro, trocamos os chefes
de autarquias...a cada dez meses os processos são desestruturados. Isso ocorre
em todas as esferas: federal, estadual e municipal. Como você consegue organizar
uma empresa, qualquer uma, se a cada dez meses todos os diretores e gerentes
são trocados?

O segundo ponto é como vamos gerenciar o SUS. Os recursos são limitados. Mas
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isso não é discussão do Brasil. São limitados na Inglaterra, nos Estados Unidos,
que investem 18% do PIB, ou seja, mais de US$ 2 trilhões para a saúde. Clareamento dental

Poderíamos fazer mais com os recursos que nós temos. Não seria possível dar uma Conheça os procedimentos para
ter dentes mais brancos e saiba
saúde maravilhosa e nem dar tudo para todos. Mas haveria a possibilidade de fazer qual cabe no seu bolso!
mais se tivéssemos organização, já num nível municipal, estadual e até federal mais
razoável. Um gerenciamento mais eficiente do que nós temos hoje.

BBC Brasil: Se o Sr. fosse ministro da Saúde, qual seria sua primeira medida?

Dráuzio Varella: Seria uma tragédia. Não entendo nada de administração pública. Você Manda
Mas eu acho que não existe uma única medida. Primeiro de tudo, é importante
ressaltar a importância política do ministro da Saúde. O ministro da Saúde tem que
ter liderança. Quem é o atual ministro da Saúde do Brasil? O ministério da Saúde é
de um partido político que tem mais representantes na Lava Jato. O ex-ministro da
Saúde (Ricardo Barros) saiu para concorrer à eleição. Seu substituto é o ex-
presidente da Caixa Econômica Federal (Gilberto Occhi), que é do mesmo partido.
Envie fotos, vídeos e relatos para o
Qual é a lógica? Qual é o projeto? Qual é a política pública de saúde que uma WhatsApp do UOL Notícias
pessoa dessas pode trazer para o ministério? Não precisa ser um médico. Mas tem
que ser uma pessoa que ouça os técnicos, que tenha ideias do que fazer para
enfrentar esse enorme desafio. E o enfrentamento desse enorme desafio tem que
começar lá em baixo. Tem que começar na Unidade Básica de Saúde. Porque aí
que você resolve quase todos os problemas. Você viu?
Qual é a imagem do SUS? É o pronto-socorro. Um local cheio de macas no
corredor, com pessoas sentadas no chão e um sujeito falando: 'estou aqui com o
meu pai há quatro horas, ele está doente e ninguém o atende'. Essa é a imagem
que a população faz do SUS. Mas se você for nessa fila, 80% ou mais das pessoas
que estão ali não tinham que estar naquele lugar. Temos a cultura do pronto
socorro no Brasil. Passou mal? Vai para o pronto socorro. Estou com dor de
"Consideradas Famílias de prédio
garganta? Vou para o pronto socorro. Você não devia ir para lá. Isso você resolve
cúmplices", que caiu expulsam
na Unidade Básica de Saúde, desde que essa unidade funcione, desde que você desabafam mães de movimento que
tenha recursos mínimos nesse lugar para tratar os casos mais simples e deixa para presos explorava aluguel
o pronto socorro aqueles que realmente precisam de uma intervenção de urgência.
Começaria por aí.

BBC Brasil: O sr. vem atuando em penitenciárias brasileiras há muito tempo.


Essa dedicação gerou três livros entre eles o best-seller Carandiru, que virou
filme. Como o sr. vê a atual situação das penitenciárias brasileiras?

Dráuzio Varella: A sociedade brasileira, na qual eu me incluo, quer ver bandido na Palestinos sonham Garoto refugiado tem
cadeia. Quando cheguei ao sistema penitenciário, em 1989, no antigo Carandiru, o com volta à terra 70 em papagaio seu
anos após criação único amigo no
Brasil tinha 90 mil prisioneiros, entre homens e mulheres. A população total de
de Israel Afeganistão
presos hoje no Brasil está na casa dos 720 mil. Encarceramos muito mais do que
no passado. Sete vezes mais. Mas a população do país não aumentou sete vezes
mais de 1989 para cá. E a segurança pública melhorou nas cidades brasileiras?

É isso que ninguém reflete. Está na cara que isso é uma guerra perdida. Não é Especiais
assim que vamos resolver o problema. Não é desse jeito. Encarcerar simplesmente
não melhora a segurança nas cidades. A gente se esquece de que esses que estão
sendo presos vão ser libertados em pouco tempo. Mas quando voltam, voltam mais
preparados para o crime. Vão conviver com os mais velhos, que participam de
facções criminosas. Vão sair da cadeia mais organizados, mais articulados, do que
quando entraram. O encarceramento tem que ser repensado.

Está certo prender por quatro anos uma menina que coloca droga na vagina e leva
para o namorado? Quem aqui ganha com isso?

BBC Brasil: Ainda esse existe por parte da sociedade essa mentalidade de
que bandido bom é bandido morto...

Dráuzio Varella: Quem pensa assim pertence a uma de duas classes. Primeiro, a
classe das pessoas que têm o que perder. Ou seja, "não quero ser assaltado, não Acordo de paz entre Coreias
quero que estuprem a minha filha, então mata esses caras, tira eles do caminho". É depende de EUA e China
uma filosofia. Os outros são os que estão lá embaixo na rede social.

Porque quando a gente fala em violência no país, a gente fala da violência contra a
classe média e a classe mais rica. O Rio de Janeiro teve um episódio anos atrás de
um médico que estava andando de bicicleta na Lagoa e morreu ao ser esfaqueado
durante um assalto. Esse caso todo mundo cita até hoje. Mas nesse período, de lá
para cá, quanta gente morreu nas favelas do Rio de Janeiro? Quantas pessoas?
Quantos jovens? Quantos pais de família morreram nas favelas cariocas? Aqueles
TOP 5 Mais lidas do dia
que estão ali naquele local são os que vivem a maior violência. A violência no Brasil
Era de se esperar
é especialmente uma violência contra os pobres, é secundariamente uma violência
contra os que estão numa situação financeira melhor. 1 que Alckmin tivesse
30%, 40% em São
Paulo, diz Goldman
É muito fácil você dizer no Brasil que quem quer trabalhar trabalha e vive bem. Vou
usar uma palavra muito na moda hoje: meritocracia. Meritocracia é bom para quem Às vezes sou
teve formação universitária, condições de vida muito razoáveis, bem privilegiadas.
Aí vale a meritocracia. Agora, como comparar o nosso caso, em que tivemos todas
2 apontado como
libertador-geral, diz
Gilmar Mendes
as oportunidades, com os dos outros que nascem na favela? Qual é a chance de
uma criança dessas competir com a gente? É zero. Não existe possibilidade. Aí Criança de sete anos
você põe essas crianças num lugar violento.
3 vê pai ser morto a
facadas durante
A violência urbana tem inúmeras causas. Três delas foram estudadas briga de trânsito
cientificamente. Em primeiro lugar, uma infância submetida à violência. Uma
infância sem amor, sem carinho dos familiares. Segundo, a falta de estrutura Prometer indulto a
familiar ou social que imponha determinados limites. Ou seja, ter adultos que dão o
exemplo, que sirvam de modelo. E a terceira é a convivência com pares violentos.
4 Lula seria 'uma
loucura', diz Ciro
Gomes na Suécia
Então se você pegar essas três condições, você está falando da população de
todas as periferias de todas as cidades brasileiras. Quando você analisa isso, você PF vê "indícios

5
até acha que o país é pouco violento. claros" de ligação
entre dinheiro do
Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK
tráfico e políticos

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Dráuzio Varella: 'Encarcerar simplesmente não melhora a segurança nas cidades'
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BBC Brasil: Vamos falar agora de temas mais polêmicos. Descriminalização
das drogas. Você é a favor ou contra?

Dráuzio Varella: Essa guerra às drogas nos levou ao quê? Ao pior do mundos.
Estamos aqui em Londres. Eu não uso nada. Você também não. Mas se quisermos
sair às ruas e achar cocaína, não vamos achar? Estamos falando de Londres.
Imagina em São Paulo, no Rio de Janeiro...se a droga entra na cadeia, imagina na
rua.

BBC Brasil: O sr. é a favor da descriminalização para drogas pesadas, por


exemplo?

Dráuzio Varella: Sou a favor da descriminalização sempre. O usuário não pode ser
criminalizado. Isso é uma questão de saúde. Por que não pode ser
descriminalizado? Porque ele não entra nessa querendo virar dependente. Todo
mundo que usa uma droga, pensa no quê? Naquele prazer que está obtendo
naquele momento. A maioria das pessoas que usa droga não se torna dependente.
Tome o exemplo do álcool. De todas as pessoas que bebem, quantas são
alcóolatras? A dependência está associada a fatores comportamentais, sociais e
biológicos. E até genéticos. Por que tratar essa pessoa como bandido? Ela precisa
de ajuda. Trata-se de um problema de saúde.

Outra questão é a legalização das drogas. Vamos chegar fatalmente a esse ponto.
Imagine que hoje nós proibíssemos todo mundo de fumar. O que ia acontecer?
Tremendo tráfico. Por outro lado, não devemos legalizar todas as drogas do dia
para a noite. Temos que começar com a maconha. Por quê? Porque é menos
aditiva. Maconheiro é louco para dizer que maconha não vicia. É lógico que vicia.
Mas ela é menos aditiva. Você não vê ninguém vendendo casa ou carro para
comprar maconha. Você não vê ninguém morrendo de overdose de maconha.

Agora, não é um processo simples. Como você faz? É o Estado que vai vender?
Quando vejo esses meninos fazendo passeata para legalizar a maconha, acho um
raciocínio mágico, não é tão simples. Isso pressupõe uma política séria, muito bem
coordenada, muito bem organizada para começar criar situações que estrangulem o
tráfico economicamente. Porque é a única forma de combatê-lo com inteligência.

Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK

Dráuzio Varella: 'O aborto no Brasil é, na verdade, livre, desde que você tenha dinheiro
para pagar por ele'

BBC Brasil: Ainda sobre esse assunto, existe esse argumento de que
justamente por ser proibido e ilegal, você tem menos pessoas usando, ou
seja, se você descriminaliza, você acaba induzindo que mais pessoas possam
experimentar. Esse argumento faz sentido?

Dráuzio Varella: Faz algum sentido. Acho que é mais ou menos inevitável. O
consumo vai aumentar. Agora, tem que agir lá atrás. Não se pode liberar a
maconha e quem quiser fuma. Você tem que explicar para as crianças quais são os
problemas de fumar maconha. São muitos. Como essa armadilha pode levar à
dependência. Como funciona o cérebro. Qual é a ação da droga no cérebro que faz
com que ele te faça repetir mesmo sem o prazer que sentia antes. Você vê que todo
maconheiro velho reclama da qualidade da maconha atual. Todos se queixam. Na
verdade, a maconha hoje é muito mais forte hoje do que a do passado. É ele que já
não sente mais o mesmo efeito.

Temos que investir na educação. Não estamos fazendo isso com o cigarro? Você
vê meninos e meninas chegando em casa e pedindo para os pais pararem de
fumar. A única forma de combater as drogas é diminuir o número de usuários. Para
isso, precisamos educá-los.

BBC Brasil: Outro assunto muito polêmico é o aborto. O sr. é favor ou contra?

Dráuzio Varella: Sou contra, lógico. Mas mais contra do que eu são as mulheres
que fazem aborto. Elas são contra. A gravidez provoca uma alteração hormonal
imediata na mulher. Desde o instante em que o óvulo chegou no útero, o ambiente
hormonal não é mais o mesmo. Pois a função biológica dessa mudança é preparar
a mulher para aguentar a gravidez. Imagino que não seja fácil.

Sendo assim, se a mulher grávida deseja interromper a gravidez, é porque ela tem
um motivo muito forte para isso. E esse motivo muito forte vai fazer com que ela
interrompa a gravidez, em qualquer circunstância. E quem são as que vão morrer?
As pobres e as negras pobres, que vão fazer o aborto em condições inseguras.
Porque as mulheres de classe média vão fazer com médicos, talvez não em
condições ideais, mas razoáveis. O aborto no Brasil é, na verdade, livre, desde que
você tenha dinheiro para pagar por ele.

Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK

Dráuzio Varella: "Gravidez é um processo feminino. Puramente feminino. O nosso papel


como homens é irrevelante"

BBC Brasil: Há uma PEC - proposta de emenda à Constituição - parada hoje


no Congresso que quer proibir o aborto em circunstâncias nas quais ele é
legal, como feto anencefálo, quando há risco de morte para a mulher por
causa da gravidez ou em casos de estupro. Como o sr. vê isso?

Dráuzio Varella: O Congresso nacional é formado basicamente por homens.


Gravidez é um processo feminino. Puramente feminino. O nosso papel como
homens é irrelevante. Você faz um sexo ao acaso com uma mulher qualquer e essa
mulher vai ter um filho. Você vai dizer que esse filho é seu? Sim, biologicamente é
seu. Porque tem metade dos seus genes. Mas você nunca mais viu essa pessoa.
Ela nunca mais te viu. Nem sabe quem você é. Mas ela tocou a gravidez até o fim.
Levou a gravidez igualzinho à outra que é casada, no civil e no religioso, tudo
certinho. O homem colabora com uma célula. A mulher pega essa célula dele e
constrói uma criança em nove meses, que nasce com boca, nariz e dois olhos. Por
isso que digo que é um processo puramente feminino. Você vai ser pai dessa
criança? Vai. Depois dessa criança nascer, aí você pode ser um pai maravilhoso.
Então, ficam esses homens que não têm ideia desse processo impondo regras. É
uma forma de subjugar as mulheres.

BBC Brasil: Um vídeo do sr. sobre os LGBT viralizou recentemente. Ainda


existe um preconceito muito forte no Brasil ainda contra essa minoria. Como é
que o sr. vê esse preconceito?

Dráuzio Varella: Neste vídeo, eu digo 'que diferença faz para você se seu vizinho
dorme com outro homem? Se a sua vizinha é apaixonada pela colega de escritório?
Se faz diferença, procure um psiquiatra. Você não está legal'. Eu penso assim
mesmo.

O que você tem a ver coma vida dos outros? Duas pessoas se amam, são do
mesmo sexo, qual é o problema? O que isso me atinge? Por que discutir esse
comportamento como se isso fosse uma aberração? A homossexualidade existe em
todos os mamíferos. É uma condição biológica. Você não chega a uma fase da vida
e pergunta a si mesmo se quer ser gay ou heterossexual. A sexualidade é; ela se
impõe. Você tem mulheres e homens que gostam do mesmo sexo e, entre esses
dois extremos, você tem uma gama enorme de comportamentos sexuais. O que
não podemos é querer impor a nossa condição para os outros porque eles são
diferentes.

BBC Brasil: Queria lhe fazer algumas perguntas pessoais. Qual é a sua maior
frustração como médico?

Dráuzio Varella: Existem muitas frustrações. Primeiro com os erros que eu cometi
no decorrer da profissão. Todos nós erramos, mas o erro em medicina pega de um
jeito muito diferente. Eu felizmente não cometi erros graves, que colocassem a vida
dos outros em risco. Mas às vezes tomei decisões que não foram as mais acertadas
naquele momento. Nós médicos temos dificuldade de falar sobre essas coisas. Isso
me dá um pouco de frustração. Outra coisa é você sentir essa disparidade no Brasil
entre a medicina de qualidade oferecida para uma camada muito pequena da
população e uma medicina de baixa qualidade oferecida para a grande massa de
brasileiros.

Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK

Dráuzio Varella: 'Medicina é uma profissão para quem gosta de estudar. Se você não
gosta de estudar, vai fazer outra coisa na vida'

BBC Brasil: Qual conselho o sr. daria para um estudante de medicina que
acabou de se formar?

Dráuzio Varella: Primeiro conselho é o seguinte: medicina é uma profissão para


quem gosta de estudar. Se você não gosta de estudar, vai fazer outra coisa na vida.
Se você dedicar para outra profissão o esforço que dedicamos para a medicina, os
plantões, as horas de estudo, os fins de semana que a gente trabalha, se você
estiver no mercado financeiro, você fica rico com esse tipo de dedicação. Então,
medicina é para quem gosta de estudar, tem prazer de se dedicar à medicina. A
segunda é que você não pode perder a perspectiva. Ou seja, tratar um nicho
populacional sem se preocupar com o resto. Não sou contra o médico ter clínica
particular, ganhar dinheiro. Eu mesmo tenho tudo isso. Mas algum trabalho você vai
ter que fazer para ajudar quem está numa situação mais difícil e que jamais terá
acesso à medicina de qualidade. Essa perspectiva não pode ser perdida.

Cynthia Vanzella/Divulgação Brazil Forum UK

"Isso é uma bobagem", diz Varella sobre religião no processo de cura

BBC Brasil: O sr. se diz ateu mas muita gente fala que o processo de cura foi
ajudado pela religião. Isso é verdade ou é mentira?

Dráuzio Varella: Isso é uma bobagem. Imagina que você teve um tumor de
estômago. Foi operado, fez quimioterapia e rezou bastante para ficar curado. E
você ficou curado. Então, por essa lógica, teria recebido uma dádiva de Deus. Mas
então por que Deus lhe deu esse tumor de estômago? Por que não lhe deu essa
"dádiva" antes? Isso é um desrespeito com os que morreram.

Muita gente também acredita em pensamento positivo. Quer dizer que os que
morreram não tiveram pensamentos positivos? A verdade é que a gente precisa
encontrar uma explicação sobrenatural para fenômenos que a gente não conhece.
Eu trato alguns pacientes e eles se curam e trato outros e eles não se curam. É
assim. O acaso está ligado à natureza humana o tempo todo. Como não consigo
explicar que leis são essas, então, eu digo foi Deus. Prender-se a essas
explicações miraculosas é um empobrecimento da condição humana.

BBC Brasil: O que o médico mais detesta ouvir falar de um paciente?

Dráuzio Varella: Não tinha pensado nisso. Acho que é o "graças a Deus". Você fica
com vontade de dizer: "Graças a Deus?! E eu?! Não ajudei nada?!".

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