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A importância pedagógica desses debates para a formação dos futuros filósofos e professores de
filosofia é imensa. Começa, por exemplo, por nos convidar a novas abordagens de introdução ao
clássico tema do “nascimento da filosofia”, no embate entre mito e lógos. Entram aqui alguns
“terceiros termos”, que são os mitos, rituais e pensamentos indígenas (Lévi-Strauss, mais uma vez,
desenvolveu importantes comparações entre mitos gregos e indígenas). No outro extremo, a
referência às culturas indígenas esbarra também em questões relativas ao desenvolvimento e à
preservação da natureza, ao esgotamento dos recursos naturais e formas alternativas de produção e
consumo, à biopolítica e ao corpo como uma máquina em contínuos processos de transformações e
canibalizações (enxertos, inseminações, etc).
Esses debates, ademais, nos convidam a revisitar alguns autores brasileiros fundamentais, como
Oswald de Andrade, Sérgio Buarque de Holanda (autor de Visões do paraíso, livro indispensável
acerca das relações entre colonizadores europeus e os indígenas brasileiros), Afonso Arinos, etc,
ampliando a cultura geral por vezes aligeirada de licenciandos e bacharéis, que frequentemente
terminam seus cursos universitários sem terem lido uma linha sequer de alguns dos principais
pensadores brasileiros, incluindo obras de nossos próprios filósofos antecessores mais recentes,
como Gerd Bornheim (que escreveu excelentes textos sobre o tema, de “O bom selvagem como
philosophe e a invenção do mundo sensível” a “O conceito de descobrimento”), Eudoro de Souza,
Vilém Flusser, etc. Neste sentido, seria preciso mencionar, ainda, a possibilidade de um diálogo,
hoje praticamente inexistente, entre nossa produção filosófica e a produção filosófica na América
Latina, a começar pelo conhecimento de clássicos como José Martí, José Carlos Mariatégui ou
Leopoldo Zea, autores que atentaram para a importância das culturas ameríndias na produção
filosófica latinoamericana.
Por fim, e voltando à questão inicial, da existência ou não de uma “filosofia indígena”, será
extremamente auspicioso ampliar o espaço, na universidade, para a afirmação dos pensamentos dos
diversos povos ameríndios (que muitas vezes, e por boas razões, recusam a própria designação de
“indígenas”) narrados por eles próprios; um espaço para leitura e investigação de textos como os de
Davi Kopenawa (A queda do céu, Cia das Letras), por exemplo; espaço que guaranis, xavantes,
krenaks e tantos outros possam um dia ocupar como professores, encontrando acolhida para nele
realizar o difícil exercício de diálogo com as nossas elocubrações filosófico-antropológicas acerca
deles.