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Bruno Pucci 2
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Este ensaio foi publicado inicialmente na Revista Artefilosofia n. 08, abril de 2010, p.122-133.
Agradecemos a autorização dos Editores da Revista Artefilosofia para a sua republicação.
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Prof. Titular do PPGE/UNIMEP; pesquisador do CNPq; coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisa
Teoria Crítica e Educação. E-mail: bpucci@unimep.br.
novas reflexões a respeito de temas afins. Buscar correspondências entre
Rosa e Adorno na maneira de abordar temas e problemas é tentar decifrar
em suas linguagens indícios que os levaram a estabelecer as ligações entre
o que escrevem e o que suas escritas revelam, entre a palavra exposta e o
que ela pretende expressar. Isto porque os reelaborados ensaios de Adorno
e as estórias de Rosa são exercícios intermitentes de desenvolver o dom
mimético pela linguagem, a capacidade de por ela produzir semelhanças,
faculdade esta em desuso em tempos de intensa racionalidade tecnológica
(Cf. Benjamin, “A doutrina das semelhanças”, 1993, p. 108-113). É sempre
uma tentativa estúrdia de colar a linguagem à coisa, à semelhança de Adão,
quando convocado por Deus a dar nome aos seres, a tomar posse do
mundo pelo logos; quando as coisas foram ditas pela primeira vez.
“Muita coisa importante falta nome.(...) tudo nesta vida é muito cantável”,
afirma Riobaldo em Grande Sertão:veredas (1979, p. 21). E Rosa, dez anos
antes, no conto “São Marcos”, Sagarana, complementa: “E não é sem assim
que as palavras têm canto e plumagem (...). E que a gíria pede sempre
roupa nova e escova” (2001, p. 274-5). Rosa recorre às rimas, às
assonâncias, às aliterações, às onomatopéias, às frases curtas, rápidas,
enérgicas, enfim, ao canto e à cadência rítmica das palavras para ensaiar o
nome da coisa. Diz ele, em entrevista a Harriet de Onís:
“A meu ver, o texto literário precisa ter gosto, sabor próprio – como
na boa poesia. O leitor deve receber sempre uma pequena sensação
de surpresa – isto é, de vida (...). Acho também que as palavras
devem fornecer mais do que significam. As palavras devem
funcionar também por sua forma gráfica, sugestiva e sua
sonoridade, contribuindo para criar uma espécie de ‘música
subjacente’” (Apud Reinaldo, 2005, p.24).
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Walnice Nogueira Galvão, no ensaio “Um vivente, seus avatares”, mostra como o protagonista do
Grande sertão è um vivente de avatares, que vai mostrando suas diferentes faces, conforme às etapas de
sua vida (2008, p. 241-269).
maneira improdutiva, tudo o que, numa etapa anterior, enquanto
conversa fiada, talvez tenha provocado uma atmosfera calorosa,
conveniente a seu desenvolvimento, mas que no presente não passa
de um resíduo insípido e com odor de mofo” (1992, p. 75).
Referências
ADORNO, Theodor W. Terminologia filosófica – Tomo I. Versión castellana
de Ricardo Sanchez Ortiz de Urbina. Madrid: Taurus, 1976.
LAGES, Susana Kampff. João Guimarães Rosa e a saudade. Cotia, SP: Ateliê
Editorial/FAPESP, 2002.