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Faculdade de Medicina da UFRJ – 2017.

TECIDO CONJUNTIVO
LINFOIDE
1. CONSIDERAÇÕES GERAIS
O tecido linfoide é mais uma variedade altamente especializada de tecido conjuntivo. Seu estroma
é formado por tecido reticular, no qual ocorre a proliferação e a diferenciação das linhagens
linfocitárias após sua formação prévia na medula óssea. Dessa maneira, o tecido linfoide tem suas
particularidades relacionadas à montagem da defesa do organismo nos ditos órgãos ou estruturas
linfoides.

No tecido linfoide ocorrem diversos dos mecanismos de respostas imunológicas: interação entre
macrófagos e linfócitos, apresentação de antígenos, produção de citocinas, produção de
imunoglobulinas, entre vários outros. Todos esses eventos envolvem a criação de uma resposta
imunológica (uma defesa) contra organismos estranhos. Em linhas gerais, os linfócitos são
“treinados” para reconhecer o que não faz parte do organismo. Desse “treinamento” emerge a
principal função dos tecidos linfoides no organismo: a de
preparar e de selecionar linfócitos.

Quanto ao estroma, a sustentação se deve essencialmente


ao tecido conjuntivo reticular. Esse tecido forma uma rede
especializada de fibroblastos, de cujos corpos partem
prolongamentos que se associam e formam uma trama
tridimensional de células ditas reticulares. Essas células
produzem uma Matriz Extracelular composta
principalmente de fibras reticulares (colágeno do tipo III).
Esse estroma serve, sob última análise, como um
arcabouço de sustentação para elementos figurados do
sangue em formação ou em “treinamento”.

O TECIDO RETICULAR ENQUANTO ESTROMA HEMATOPOIÉTICO


De maneira geral, o tecido reticular abriga células em formação de diferentes linhagens. Essas
células ficam associadas à malha tridimensional, e, dependendo de sua qualidade, há
formação de duas variedades de tecido:
 Tecido Mieloide: corresponde à maioria das linhagens, e se localiza na medula óssea.
 Tecido Linfoide: corresponde às linhagens linfocitárias, e se localizam em duas
possibilidades: se estiverem delimitadas ou individualizadas por cápsulas conjuntivas,
formarão os órgãos linfoides; se estiverem abaixo de epitélios em mucosas formando
agregados não capsulados, constituirão as formações linfoides subepiteliais.

2. TIPOS CELULARES
Além dos linfócitos, há também presença de células reticulares, plasmócitos, macrófagos e células
dendríticas no tecido linfoide. Esta última é mais uma da classe de células apresentadoras de
antígenos. Sendo assim, ela cumpre o ciclo natural de captura do antígeno → processamento →
obtenção de epitopos → apresentação de epitopos associados à MHC classe II.
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Quanto à diferenciação de células dentríticas, tem-se: células tronco pluripotenciais


hematopoiéticas se diferenciam em células dendríticas imaturas, que são recrutadas para tecidos
periféricos (epitélios estratificados pavimentosos, preferencialmente). Nesses tecidos elas iniciam a
internalização de antígenos que são processados em endossomas e apresentados coligados a
moléculas do MHC da classe II para linfócitos T auxiliares. Após tempo variável no epitélio, essas
células migram para áreas de tecido linfoide nas proximidades, onde complementam sua
maturação, com a expressão de uma série de proteínas membranares (CD40, CD80, CD86, CCR7).
Essa maturação se dá também do ponto de vista maneira funcional, já que há um grande acréscimo
em sua atividade apresentadora, ativando cada vez mais linfócitos T, linfócitos B e células NK.
Ademais, também há acréscimo à produção de citocinas pró-inflamatórias, tais como o TNF, a IL-2
e a IL-10, que influenciam leucócitos de maneira geral.

Células dendríticas têm corpo celular arredondado com prolongamentos relativamente curtos e
não ramificados. Nesse caso, a denominação “célula dendrítica” corresponde ao nome da célula.
Vale ressaltar que essa denominação também pode ser utilizada também como adjetivo: diz-se que
melanócitos são células dendríticas porque possuem forma semelhante (corpo arredondado,
prolongamentos curtos e não ramificados).

Além das células dendríticas, depreende-se que a variedade celular do tecido linfoide define
essencialmente sua função imunológica, bem como delimita e estrutura os eventos da montagem
de respostas imunológicas. Cada célula tem um papel primordial nesses eventos, que serão bem
reiterados em tópicos posteriores desse estudo.

3. CLASSIFICAÇÃO DO TECIDO LINFOIDE


3.1 – Quanto à Disposição de Linfócitos
TECIDO LINFOIDE DIFUSO: linfócitos espalhados aleatoriamente, sem formação de nenhuma figura
definida;

TECIDO LINFOIDE NODULAR: agregados esféricos de linfócitos que formam os nódulos ou folículos
linfoides;

TECIDO LINFOIDE CORDONAL: linfócitos dispostos em estruturadas alongadas e ramificadas, os


chamados cordões linfoides (presentes apenas na região medular dos linfonodos)
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T. Linfoide Difuso
da lâmina própria
de intestino
delgado (à
esquerda); T.
Linfoide Nodular
(no meio); T.
Linfoide Cordonal
da medula de um
linfonodo (à
direita)

3.2 – Quanto à Concentração/Quantidade de Linfócitos


TECIDO LINFOIDE DENSO: alta quantidade de linfócitos. O tecido linfoide difuso, o nodular e o
cordonal são áreas de tecido linfoide denso;

TECIDO LINFOIDE FROUXO: áreas com menor concentração de linfócitos e grande quantidade de
células reticulares do estroma. Essas áreas permitem a passagem e a filtração dos líquidos corporais.
Os antígenos trazidos pelos líquidos ficam retidos na trama tridimensional de tecido reticular.
Os seios dos linfonodos são áreas de tecido linfoide frouxo pelas quais se passa a linfa. A polpa
vermelha do baço (maior órgão linfoide do corpo) é uma área de tecido linfoide frouxo que retém
antígenos do sangue.

T. Linfoide Frouxo da polpa


vermelha do baço (à
esquerda) e T. Linfoide
Denso da placa de Peyer (à
direita)

3.3 – Quanto à Presença de Cápsula Conjuntiva


FORMAÇÕES LINFOIDES SUBEPITELIAIS: agregados não-encapsulados de tecido linfoide nas
mucosas dos tratos digestório, respiratório, urinário e genital;
Nódulos linfoides isolados em mucosas, áreas de tecido linfoide denso difuso nas mucosas, amídalas
(ou tonsilas), placas de Peyer e apêndice vermiforme são exemplos desse tipo de tecido linfoide.

ÓRGÃOS LINFOIDES: massas maiores de tecido linfoide individualizados por uma cápsula conjuntiva;
Os linfonodos, o baço e o timo são exemplos de órgãos linfoides.

3.4 – Quanto ao Local de Maturação dos Linfócitos


ÓRGÃOS LINFOIDES CENTRAIS OU PRIMÁRIOS: locais onde células progenitoras das linhagens
linfocíticas sofrem maturação e se transformam em linfócitos.
O órgão linfoide central para linfócitos T é o Timo. Células progenitoras migram da medula para o
timo, onde as irão adquirir imunocompetência (capacidade de reconhecer organismos estranhos e
de combatê-los, com a expressão de receptores proteicos específicos na membrana plasmática).
Paralelamente, essas células também adquirem imunocompetência para não reconhecer e não
combater as células do próprio organismo.
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Já o órgão linfoide central para linfócitos B seria a Bursa de Fabricius (nas aves) e a medula óssea
(nos mamíferos). Nas aves, as células progenitoras de sua linhagem migram para a Bursa, localizada
próxima à cloaca, onde adquirirão sua imunocompetência. Como seres humanos não tem Bursa de
Fabricius, os linfócitos B adquirem imunocompetência na própria medula óssea. Entretanto, vale
ressaltar que a medula óssea NÃO é um órgão linfoide, ela apenas assume esse papel neste caso
específico.

ÓRGÃOS LINFOIDES PERIFÉRICOS OU SECUNDÁRIOS: locais que recebem os linfócitos T e B


amadurecidos nos órgãos linfoides centrais ou primários. Como exemplo, os linfonodos, o baço e as
formações linfoides subepiteliais são órgçaos linfoides periféricos ou secundários.

4. DINÂMICA CELULAR NO TECIDO LINFOIDE


Os Nódulos Linfoides (como vistos no item 3.1) são agregados esféricos, formados essencialmente
por linfócitos B. São verdadeiros criadouros de linfócitos B, sendo constituídos por cerca de 98-99%
deles. Sob estímulo, alguns deles irão se proliferar e se diferenciar em plasmócitos secretores de
imunoglobulinas. É subdividido em regiões:
 Zona do Manto ou Coroa: região
periférica, mais corada, com linfócitos B
não-ativados ou em ativação. Vale
ressaltar que o aspecto arroxeado dessas
regiões (à coloração H&E) é devido aos
núcleos de linfócitos B, uma vez que
linfócitos não ativados têm núcleo mais
heterocromático, e, portanto, bastante
corado.
 Centro Germinativo: região mais central,
mais palidamente corada, devido a vias de
sinalização que ativaram sequências
gênicas e desespiralizaram o DNA, descondensando a cromatina.

As células dendríticas foliculares (CDFs) são específicas dos nódulos linfoides, e são responsáveis
pela seleção de linfócitos B úteis às respostas imunológicas. A elas é imputada a arquitetura do
nódulo linfoide: produzem quimiocinas específicas que atraem os linfócitos B para uma
determinada área, o que promove sua agregação;
Essas células são de origem incerta, e apresentam receptores para imunoglobulinas e para
componentes do complemento em sua membrana. Os antígenos ligados a imunoglobulinas ou a
componentes do complemento se prendem aos receptores das CDFs, o que os retém em sua
membrana em complexos antígeno-Ig ou antígeno-complemento. Esses complexos oferecerão os
antígenos a inúmeros linfócitos B, que serão selecionados.

Resposta Imunológica de Base Humoral


De maneira geral, essa resposta imunológica envolve a produção de imunoglobulinas e sua posterior
liberação em líquidos (os humores) do organismo. Dessa maneira, as imunoglobulinas se fazem
presentes no sangue, na linfa, no líquido intersticial, no líquido cerebroespinhal, entre outros
humores que são capazes de disseminar a defesa pelo organismo. Isso ocorre porque as
imunoglobulinas produzidas por plasmócitos são moléculas que se solubilizam facilmente em
líquidos corporais.

EVENTOS INICIAIS
Ocorrem essencialmente na região limítrofe entre a zona do manto de um nódulo linfoide e o tecido
linfoide difuso que reveste externamente o nódulo. É caracterizada pela dupla ativação de linfócitos
T auxiliares, tanto por células dendríticas quanto por linfócitos B. Células dendríticas capturam
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antígenos e os apresentam aos linfócitos T auxiliares, enquanto linfócitos B ativados (diretamente


por antígenos ou por células dendríticas) apresentam os antígenos advindos do processamento
também ao mesmo linfócito T auxiliar. Essa dupla ativação (ou biativação) se dá sobretudo na
periferia dos nódulos linfoides.

CONSIDERAÇÕES SOBRE O LINFÓCITO B


Os linfócitos B também apresentam antígenos. Estão em contato com eles graças às
imunoglobulinas IgM e IgD, que servem como receptores para antígenos e que se dispõem
na membrana dos linfócitos B. Havendo contato de antígenos, os linfócitos B internalizam o
complexo antígeno-imunoglobulina e processam os antígenos, obtendo epitopos que são
coligados a moléculas de MHC da classe II. A exposição do complexo epitopo-MHC da classe
II na membrana dos linfócitos B caracteriza essencialmente a apresentação de antígenos aos
linfócitos T auxiliares.

As células dendríticas, típicas APCs, apresentam


antígenos coligados a proteínas do MHC da classe II a
linfócitos T auxiliares. Além disso, essas células
expressam proteínas coestimuladoras (B7-1 e B7-2),
que interagem com a molécula CD28 na membrana do
linfócito T auxiliar e disparam vias de sinalização
relacionadas a um incremento à estimulação do T
auxiliar.

Linfócitos T auxiliares reconhecem o antígeno e as


proteínas coestimuladoras e são estimulados a
expressar a proteína ligante do CD40 (CD540L) e a
produzir citocinas. O CD40L se liga à proteína CD40 na membrana de linfócitos B, o que estimula sua
proliferação e sua diferenciação no nódulo linfóide, juntamente com citocinas produzidas pelo
linfócito T auxiliar.

EVENTOS TARDIOS
Uma vez sob os efeitos das interleucinas, os linfócitos B migrarão para o centro germinativo. Lá
acontecerão diversos eventos relacionados a seleção dessas células.

A maturação por afinidade é um evento que consiste na seleção propriamente dita dos linfócitos
B. Uma vez produzindo imunoglobulinas de alta afinidade por antígenos, serão permitidos a
sobreviver. Caso contrário, fatalmente serão destinados à apoptose.
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Dentro desse contexto, os linfócitos B se proliferam de tal maneira que produzem inúmeros
linfócitos no centro germinativo. Durante essa proliferação, existe um grande rearranjo da
expressão gênica. Esse evento está relacionado à ativação de inúmeros genes que sequenciam as
cadeias polipeptídicas de imunoglobulinas que virão a ser inseridas na membrana plasmática. Essa
infinidade de imunoglobulinas expostas na membrana ocorre de maneira a diversificar as
possibilidades de encaixe com antígenos. O rearranjo do genoma dos linfócitos B visando essa
diversidade é chamada de “Switching” das cadeias de imunoglobulinas.

A expressão de uma quantidade enorme de cadeias polipeptídicas em diferentes linfócitos B


acarreta a criação de uma relativa taxa de diferenciação um dos outros. A discriminação entre
linfócitos tem a intenção de tornar o processo de seleção o mais abrangente possível, levando em
conta a diversidade de antígenos com os quais o indivíduo pode entrar em contato.

A proliferação de linfócitos B estimulados pelas citocinas produzidas pelo T auxiliados biativado


ocorre no centro germinativo. A esses linfócitos que recém iniciaram sua proliferação dá-se o nome
de centroblastos. Enquanto há proliferação,
ocorre ativação de inúmeras sequências gênicas
(o dito switching).

Em dada hora os centroblastos param de se


proliferar e passam a ser chamados de
centrócitos. Essas células já exibem em suas
membranas inúmeras cadeias polipeptídicas de
imunoglobulinas de superfície. Nesse momento,
se inicia a seleção de Linfócitos B.

Há interação entre anticorpos expressos na


membrana dos centrócitos e os antígenos
retidos na membrana de Células Dendríticas
Foliculares (CDFs). A ligação entre a
imunoglobulina produzida pelo linfócito B e o
antígeno da CDF permite a testagem dos
centrócitos: os que têm imunoglobulinas de alta
afinidade por esses antígenos retidos (encaixe
perfeito) são liberados para a diferenciação em
plasmócitos ou em linfócitos B de memória;
aqueles linfócitos B que não obtêm o encaixe
perfeito são fatalmente destinados a apoptose,
sendo que a própria CDF ativa uma cascata de
sinalização de morte programada no centrócito
que falhou no processo de seleção.

Quanto aos dois destinos possíveis dos Linfócitos B, o mais comum deles é a diferenciação em
plasmócitos, células secretoras de imunoglobulinas que serão lançadas nos humores do organismo.
Ademais, os linfócitos B tambpem podem constituir a população de memória, que é imprescindível
em situações de reincidência infecciosa. Em havendo um segundo acesso do mesmo antígeno ao
organismo, esses linfócitos B respondem mais rapidamente em função de possuírem no seu
genoma a memória imunológica específica daquele antígeno. Isso agiliza a resposta do corpo a uma
infecção já contraída anteriormente.

Todo esse processo é a base de funcionamento das vacinas: um antígeno atenuado ou inativado é
injetado, e induz a produção de plasmócitos secretores de imunoglobulinas e de linfócitos B de
memória. Doses de reforço são aplicadas para incrementar a formação dos linfócitos B de memória,
que são mobilizados caso haja uma segunda sensibilização.

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