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29/03/2018 O que é o relativismo?

| Presbíteros

O que é o relativismo?
Posted by Presbíteros | jun 9, 2010 | Apologética | 0 |

Em síntese: O relativismo é uma corrente que nega toda verdade absoluta e perene assim como
toda ética absoluta, ficando a critério de cada indivíduo definir a sua verdade e o seu bem. Opõe-
se-lhe o fundamentalismo, que afirma peremptoriamente a existência de algumas verdades e
algumas normas fundamentais. .. O indivíduo se torna o padrão ou a medida de todas as coisas.
Tal atitude está baseada em fatores diversos, entre os quais o historicismo: com efeito a história
mostra que tudo evolui e se tornam obsoletas coisas que em tempos passados eram plenamente
válidas. A Igreja rejeita o relativismo, mas também não aceita o fundamentalismo: ao lado de
verdades e normas perenes, existem outras, de caráter contingente e mutável. Ao cristão toca o
dever de testemunhar ao mundo de hoje que a profissão d fé e a Moral católicas nada têm de
obscurantista e de recusa dos autênticos valores da civilização contemporânea.

No fim do século passado manifestou-se com certa pujança o fenômeno do relativismo. Segundo
esta corrente, o intelecto humano não pode alcançar a verdade como tal, mas apenas aspectos
enquadrados dentro do subjetivismo de quem os professa. Essa relativização da Verdade e da
Ética tem conseqüências de vasto alcance na vida moderna, de modo que lhe dedicaremos as
páginas subseqüentes. Trataremos de apresentar as notas típicas do relativismo, suas causas e a
atitude que cabe ao cristão assumir diante do problema.

1. Relativismo: em que consiste?

O relativismo é a recusa de qualquer proposição filosófica ou ética de valor universal e absoluto.


Tudo o que se diga ou faça é relativo ao lugar, à época e demais circunstâncias nas quais o homem
se encontra. No setor da filosofia não se poderia falar da verdade ou erro-falsidade, como na área
da Moral não se poderia apregoar o bem a realizar e o mal a evitar. O homem (indivíduo) seria a
medida de todas as coisas, como já dizia o filósofo grego Protágoras. Em conseqüência o
comportamento do homem ignora a lei natural, que é a lei de Deus incutida a todo ser humano
desde que ele dispõe do uso da razão; da mesma forma a sociedade só conhece e respeita as leis
que os seus governantes lhe propõem sem questionar a consonância dessas leis (ditas “positivas”)
com a lei do Criador: por conseguinte, se as leis dos governantes legalizam o aborto, a clonagem, o
anti-semitismo. .., a população lhes obedece, não levando em conta que, antes da palavra do
legislador humano, existe a do Legislador Divino, que é a mesma para todos os homens.

Os comentadores dessa situação chegam a falar de uma “ditadura do relativismo”, contra a qual
não há como apelar para uma instância ulterior, mas elevada ou mais profunda. A essa ditadura
aludia o então Cardeal Joseph Ratzinger aos 18 de abril de 2005 na homilia da Missa preparatória
do conclave:

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Baseando-se em Ef 4, 14 (“não vos deixeis sacudir por qualquer vento de doutrina”), advertia o
pregador: “Quantos ventos de doutrina viemos a conhecer nestes últimos decênios, quantas
correntes ideológicas, quantas modalidades de pensar…! O pequeno barco do pensamento de não
poucos cristãos foi freqüentemente agitado por essas ondas, lançado de um extremo para o outro:
do marxismo ao liberalismo ou mesmo libertinismo, do coletivismo ao individualismo radical, do
ateísmo a um vago misticismo religioso, do agnosticismo ao sincretismo. .. Todos os dias nascem
novas seitas e se realiza o que diz São Paulo sobre a falsidade dos homens, sobre a astúcia que
tende a atrair para o erro (Ef 4, 14). O ter uma fé clara, segundo o Credo da Igreja, é muitas vezes
rotulado como fundamentalismo. Entrementes o relativismo ou o deixar-se levar para cá e para lá
por qualquer vento de doutrina aparece como orientação única à altura dos tempos atuais.
Constitui-se assim uma ditadura do relativismo, que nada reconhece de definitivo e deixa como
último critério o próprio eu e suas veleidades”.

Assim é posta de lado a metafísica, de acordo com a advertência de Ludwig Wittgenstein: “É


preciso não falar daquilo que a mente do homem não atinge”.

Examinemos sumariamente algumas modalidades do relativismo:

1.1. Relativismo filosófico

Não se pode pretender chegar a uma verdade objetiva, pois a mente humana não conhece a
realidade como ela é, mas como o sujeito a consegue enquadrar dentro dos seus parâmetros de
pensamento. A verdade portanto não é aquilo que a filosofia clássica ensina (conformação do
intelecto com a realidade em si), mas, ao contrário, é a conformação da realidade com o intelecto.
A verdade assim é algo de subjetivo, pessoal, em vez de ser objetiva e universal, para todos os
homens. Já que não há um intelecto só para todos os homens, mas cada qual tem seu intelecto,
diverso do intelecto do próximo ou mesmo oposto a este, em conseqüência há muitas verdades.
Cada um tem a sua própria verdade.

1.2. Relativismo ético

Não existem normas morais válidas para todos os homens; os valores éticos variam de acordo com
as fases da história e das culturas; há normas e opiniões subjetivas, que o indivíduo formula para si
mesmo, fazendo uso da sua liberdade, que é refreada apenas pelos limites que os direitos alheios
lhe opõem.

O relativismo assim descrito conhece um único absoluto, a saber: o ser humano ou, mais
precisamente, a liberdade de cada ser humano. Essa liberdade é indiscutível .

Pergunta-se agora:

2. Quais as causas do fenômeno relativista?

Apontaremos cinco causas:

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2.1. Filosofia imanentista

Imanência opõe-se a Transcendência. Significa a negação de todo valor que esteja além do
alcance da experiência humana. Ora o relativismo contemporâneo é ateu; vê na religião e na Moral
católicas um obstáculo e um adversário, pois Deus parece escravizar o homem e a Moral católica
parece destinada a tornar o homem infeliz ou cerceado. Como pode o ser humano levar Deus em
conta, já que todo tipo de conhecimento não é senão uma “representação” mental e subjetiva?

2.2. O historicismo

O historicismo ensina que “tudo é histórico” ou provisório e variável; o que ontem era importante,
hoje deixa de ser tal. Ora a verdade é conhecida e vivida na história, sujeita a contínuas mudanças;
ela é “filha do seu tempo”. Tudo o que é verdadeiro e bom é tal unicamente para o seu tempo, e
não de modo universal, para todos os tempos e todos os homens. Nenhuma cultura tem o direito de
se julgar melhor do que as outras; todos os modos de pensar e viver têm o mesmo direito.

2.3. O contínuo e insaciável progresso

Apesar de todas as dificuldades e hesitações por que passa a ciência, há quem julgue que ela trará
ao homem as almejadas respostas; proporcionará um crescente bem-estar, porque desvinculadas
de qualquer ligação religiosa ou moral. Tenha-se em vista a teoria da evolução, que deu início à
nova concepção da humanidade,. .. a época das luzes, que sucedeu ao “obscurantismo”
medieval… os regimes democráticos, que tomam o lugar do ancien regime ou da monarquia
absoluta dos reis…

2.4. O ceticismo

O ceticismo ensina que não há verdades objetivas e normas morais sempre válidas e que, mesmo
que as houvesse, o homem não seria capaz de as apreender. Na época moderna, o ceticismo
desponta com René Descartes (+ 1650), que propõe a “dúvida metódica” e vai dominando o
pensamento posterior sob formas diversas: agnosticismo, empirismo, positivismo de Augusto
Comte, fideísmo, “o pensamento fraco” (como dizem).

O relativismo é marcado também pelo ceticismo. A verdade é pragmática, prática: são verdadeiras
e válidas as teorias que levam a resultados concretos satisfatórios; se determinada concepção
resolve (ao menos aparentemente) um problema concreto, é tida como verídica e ponto de
referência para o comportamento humano.

2.5. O utilitarismo

Associado ao ceticismo, o utilitarismo só aceita o que pode ajudar a viver em certo bem-estar aqui
e agora. Tal bem-estar é geralmente hedonista, ou seja, avesso ao sacrifício, à renúncia, ao
incômodo e tem por programa: “Maximizar o prazer e minimizar a dor”.

Exposto sumariamente o que seja o relativismo, resta perguntar:

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3. Como diante dele se situa a Igreja?

Responderemos em duas etapas

3.1. A Igreja não é fundamentalista

O fundamentalismo é uma atitude que teve origem no ambiente protestante dos Estado Unidos na
segunda metade do século XIX: apega-se ferrenhamente a certas proposições da Bíblia e não
permite que sejam estudadas à luz das pesquisas lingüísticas e arqueológicas modernas, pois a
ciência poria em perigo a fé. Portanto professa a criação do mundo em seis dias de 24 horas;
Moisés seria o autor do Pentateuco tal como chegou até nós; o livro de Daniel terá sido escrito por
inteiro nos tempos de Nabucodonosor (século VI a.C.)… O mundo moderno é dominado por
Satanás, que Jesus derrotará definitivamente quando vier (e talvez venha em breve) a julgar os
homens.

Fundamentalista é, por exemplo, a atitude do Islã, que propõe:

1) o Corão é livro divinamente inspirado e deve ser entendido ao pé da letra;

2) o Islã deve reger as leis do Estado, pois todos devem conformar-se aos preceitos de Alá.

O fundamentalismo, aliás, também penetrou em outras correntes religiosas, como o Judaísmo e o


próprio Cristianismo (em alguns de seus setores).

Há também o fundamentalismo leigo, não religioso, principalmente no campo da política, quando se


procura impor à sociedade o fanatismo de um chefe “carismático” e tirânico.

Pois bem; a Igreja não é fundamentalista. Ela aceita e promove os estudos bíblicos voltados para a
lingüística, à arqueologia, a paleontologia. .. Professa que a Bíblia é inspirada por Deus, que
utilizou formas de pensamento antigo e oriental para se revelar. A Igreja reconhece que, fora dela,
existem valores suscitados pelo próprio Deus ou, como diziam os Padres da Igreja, existem
“sementes do Verbo” (logoi spermatikói); cf. Declaração Nostra Aetate nº 2 do Concílio do Vaticano
II. Professa outrossim a liberdade religiosa ou o direito que todo ser humano tem de estudar
livremente a questão religiosa e viver de acordo com suas conclusões sem ser coagido a abraçar
algum Credo que violente a sua consciência, nem adotar o ateísmo; ver Declaração Dignitatis
Humanae do Concílio:

“2. Este Concílio Vaticano declara que a pessoa humana tem direito à liberdade religiosa. Consiste
tal liberdade em que todos os homens devem ser imunes de coação, tanto por parte de pessoas
particulares, quanto de grupos sociais e de qualquer poder humano, de tal modo que, em matéria
religiosa [in re religiosa], ninguém seja obrigado a agir contra a própria consciência, nem seja
impedido de agir de acordo com ela, em particular e em público, nem só ou associado a outros,
dentro dos devidos limites.

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Declara, além disso, que o direito à liberdade religiosa está realmente fundado na própria dignidade
da pessoa humana, tal como é conhecida tanto pela palavra revelada de Deus como pela própria
razão. Este direito da pessoa humana à liberdade religiosa deve ser de tal forma reconhecido no
ordenamento jurídico da sociedade que se transforme em direito civil”.

Para evitar mal-entendidos, seja dito: o Concílio apregoa a liberdade para pesquisar o problema
religioso. Essa pesquisa, porém, é obrigatória, pois se trata de dar sentido à vida; se Deus existe, o
rumo é um; se não existe, o rumo é outro. Ninguém está autorizado a fugir dessa pergunta: Deus
existe? …Mas pesquise sem sofrer coação.

Há portanto um meio-termo entre o fanatismo cego fundamentalista e o relativismo. Quem não é


relativista, não é necessariamente fanático.

3.2. A Igreja professa a Verdade Absoluta

A inteligência humana foi feita para a Verdade e não para a penumbra das semi-verdades ou do
erro. O homem aspira naturalmente à Verdade; esta aspiração congênita não pode ser frustrada
num mundo em que as demandas têm sua resposta; com efeito

– para o olho, há a luz para a qual ele foi feito.


– para o ouvido, há o som.
– para os pulmões, há o ar.
– para o estômago, há o alimento.

Não haveria então resposta para as aspirações mais elevadas do ser humano à Verdade e ao
Bem?

A Igreja sabe que a Palavra de Deus revela com veracidade quem é Deus e qual o seu plano de
salvação. Fora das verdades da fé, julga que o homem, pesquisando através de altos e baixos,
pode chegar ao conhecimento da Verdade Absoluta.

O fato, porém, de professar a Verdade Absoluta não deve tornar o fiel católico cego e fanático. Sim;
muitos seres humanos podem estar professando o erro, julgando que o erro é a verdade; estão de
boa fé numa fé (ou religião) errônea. Deus não lhes pedirá contas daquilo que Ele não lhes revelou,
mas há de julgá-los de acordo com os ditames da sua consciência que, sincera e candidamente, os
impelia ao erro.

É o que ensina o Concílio do Vaticano II em Lumen Gentium nº 16.

“O Salvador quer que todos os homens sejam salvos. Aqueles portanto que sem culpa ignoram o
Evangelho de Cristo e sua Igreja, mas de coração sincero buscam a Deus e se esforçam, com o
auxílio da graça, por cumprirem com obras a sua vontade conhecida pela voz da consciência,
também esses podem alcançar a salvação eterna. A Divina Providência não recusa os meios
necessários para a salvação àqueles que, sem culpa, ainda não chegaram ao conhecimento
explícito de Deus, mas procuram com a graça divina viver retamente”.

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Há um só Deus para todos os homens; Ele distribui suas luzes sobre todo indivíduo como lhe apraz
e não pede mais do que a justa resposta da criatura à Palavra que o Senhor lhe comunica.

Ao proclamar a verdade absoluta, a Igreja não ignora a influência, às vezes prejudicial, das culturas
na formulação dos juízos religiosos e éticos de cada indivíduo, mas os católicos crêem que esses
possíveis obstáculos e desvios podem ser corrigidos pela insistência de quem procura
sinceramente.

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