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Instituto Superior de Educaçaçãodo Vale do Juruena

Prof. Dr. Claudio Silveira Maia

Instituto Superior de Educação do Vale do Juruena

Pós-Graduação Lato Sensu em GESTÃO ESCOLAR COM ÊNFASE NA DIREÇÃO,


COORDENAÇÃO E SUPERVISÃO ESCOLAR

Disciplina: DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR

Professor: Dr. Cláudio Silveira Maia

Av. Gabriel Muller, 1065– Modulo 01 – Juina – MT – CEP 78320-000


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Ementa:

Abordar histórica e criticamente o ensino-aprendizagem de nível superior; considerar as


ferramentas do ensino e do aprendizado contemporâneos; avaliar as estruturas do plano de
ensino e do planejamento educacional, bem como as condições materiais e humanas
implicadas nos programas de ensino superior.

SUMÁRIO

PLANEJAMENTO DE ENSINO.....................................................................................................REGINA BARROS LEAL


DIDÁTICA E EDUCAÇÃO CORPORATIVA..............................................................................ELIANE M. G. BIANCHI
DORMI ALUNO(A)... ACORDEI PROFESSOR(A)............................................................CUNHA; BRITO & CICILLINI
A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA
E A CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PERFIL PARA DOCENTES
UNIVERSITÁRIOS................................................................GRAZIELA G. PACHANE; ELISABETE M. DE A. PEREIRA
DO ENSINO DE CONTEÚDOS AOS SABERES DO PROFESSOR.......................................................ISABEL A. LELIS

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Planejamento de ensino:
peculiaridades significativas
REGINA BARROS LEAL
Universidade de Fortaleza, Brasil

Planejar e pensar andam juntos. Ao começar o dia, o homem pensa e distribui suas
atividades no tempo: o que irá fazer, como fazer, para que fazer, com o que fazer etc. Nas
mais simples e corriqueiras ações humanas, quando o homem pensa de forma a atender suas
metas e seus objetivos, ele está planejando, sem necessariamente criar um instrumental
técnico que norteie suas ações. Essas observações iniciais estão sendo expressas, apenas para
chamar atenção sobre o aspecto cotidiano da ação de planejar e como o planejamento faz
parte da vida. Aquele que não mais planeja, talvez já tenha robotizado suas ações, portanto,
quem sabe, não tem a consciência do que está fazendo, nem se ainda pode construir alguma
coisa. Alguns até dizem: “Nem preciso mais pensar, vou fazendo o que me mandam fazer...
Eu não necessito planejar, já vou fazendo, porque sei onde vai dar...”. E assim por diante.
Nessa circunstância, parece estar presente a alienação do homem como sujeito, na medida em
que assume a atitude de dominado, fazedor dócil e outras tantas denominações que podem ser
imprimidas no sujeito, quando este se torna objeto nas mãos de outrem. Todavia, o objetivo
deste estudo não é discutir tais questões, muito embora elas estejam presentes nas atividades
habituais do homem. O planejamento é um processo que exige organização, sistematização,
previsão, decisão e outros aspectos na pretensão de garantir a eficiência e eficácia de uma
ação, quer seja em um nível micro, quer seja no nível macro. O processo de planejamento está
inserido em vários setores da vida social: planejamento urbano, planejamento econômico,
planejamento habitacional, planejamento familiar, entre outros. Do ponto de vista
educacional, o planejamento é um ato político-pedagógico porque revela intenções e a
intencionalidade, expõe o que se deseja realizar e o que se pretende atingir. Mas o que
significa planejamento do ensino e suas finalidades pedagógicas?1 O que é o planejamento
docente? O plano de aula? O projeto de disciplina? A programação semestral? O projeto
pedagógico? Esses conceitos, atualmente, foram redefinidos, não só por conta da Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, mas também como resultante do novo modelo de
sociedade, onde alguns denominam de sociedade aprendente, outros, sociedade do
conhecimento 2.
O que é importante, do ponto de vista do ensino, é deixar claro que o professor
necessita planejar, refletir sobre sua ação, pensar sobre o que faz, antes, durante e depois. O
ensino superior tem características muito próprias porque objetiva a formação do cidadão, do
profissional, do sujeito enquanto pessoa, enfim de uma formação que o habilite ao trabalho e à
vida. Voltemos a questão inicial. O que significa o planejamento de ensino? Por que o
professor deve planejar? Quais os procedimentos, os instrumentos, as técnicas, os métodos, os
recursos e as finalidades pedagógicas do planejamento de ensino? Um ato político
pedagógico? Uma carta de intenção? Uma reflexão sobre o saber fazer docente?
Antes de desenvolver algumas dessas questões, é imprescindível afirmar que existem
diferentes abordagens sobre o assunto. Tais abordagens se diferenciam pela forma como
tratam a temática, todavia se afinam quantos aos seus elementos constitutivos. Assim
considerado, arrisca-se afirmar que o planejamento do ensino significa, sobretudo, pensar a
ação docente refletindo sobre os objetivos, os conteúdos, os procedimentos metodológicos, a
avaliação do aluno e do professor. O que diferencia é o tratamento que cada abordagem
explica o processo a partir de vários fatores: o político, o técnico, o social, o cultural e o
educacional.

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É essencial enfatizar que o planejamento de ensino implica, especialmente, em uma
ação refletida: o professor elaborando uma reflexão3 permanente de sua prática educativa.
Assim o planejamento de ensino tem características que lhes são próprias, isto,
particularmente, porque lida com os sujeitos aprendentes, portanto sujeitos em processo de
formação humana. Para tal empreendimento, o professor realiza passos que se complementam
e se interpenetram na ação didáticopedagógica. Decidir, prever, selecionar, escolher,
organizar, refazer, redimensionar, refletir sobre o processo antes, durante e depois da ação
concluída. O pensar, a longo prazo, está presente na ação do professor reflexivo4. Planejar,
então, é a previsão sobre o que irá acontecer, é um processo de reflexão sobre a prática
docente, sobre seus objetivos, sobre o que está acontecendo, sobre o que aconteceu. Por fim,
planejar requer uma atitude científica do fazer didático-pedagógico.
Mas como planejar? Quais as ações presentes e como proceder do ponto de vista
operacional, uma vez que é entendido que o planejamento é um processo, um ato político-
pedagógico e, por conseguinte não tem neutralidade porque sua intencionalidade se revela nas
ações de ensino. O que se pretende desenvolver? O cidadão que se deseja formar? A
sociedade que se pretende ajudar a construir? Em primeiro lugar, as fases, os passos, as
etapas, as escolhas, implicam em situações diversificadas, que estão presentes durante o
acontecer em sala de aula, num processo de idas e vindas. Contudo, para efeito de
entendimento, indica-se a realização de um diagnóstico aqui compreendido como uma
situação de análise; de reflexão sobre o circunstante, o local, o global.
Nesse contexto didáticopedagógico: averiguar a quantidade de alunos, os novos
desafios impostos pela sociedade, as condições físicas da instituição, os recursos disponíveis,
nível, as possíveis estratégias de inovação, as expectativas do aluno, o nível intelectual, as
condições socioeconômicas (retrato sócio-cultural do aluno), a cultura institucional a filosofia
da universidade e/ou da instituição de ensino superior, enfim, as condições objetivas e
subjetivas em que o processo de ensino irá acontecer.

Planejamento de ensino: peculiaridades significativas

Tal atitude do docente o encaminhará para uma reflexão de sua ação educativa naquela
instituição e a partir desse diagnóstico inicial, relacionando com o projeto da universidade,
poderá desenvolver uma prática formativa. De posse do Projeto de Ensino oficial5, o docente
irá elaborar sua programação, adaptando-a às suas escolhas, inclusive, inserindo a pesquisa
nos exercícios didáticos. Caso a instituição de ensino superior não apresente o projeto da
disciplina, o professor deverá elaborar observando os seguintes componentes:
a) EMENTA DA DISCIPLINA. Ementa é um resumo dos conteúdos que irão ser trabalhados
no projeto.
b) OBJETIVOS DE ENSINO. Elaborá-los na perspectiva da formação de habilidades a serem
desenvolvidas pelos alunos: habilidades cognitivas, sociais, atitudinais etc. Há níveis
diferenciados de objetivos: objetivo geral, alcançável longo prazo; objetivo específico, o qual
expressa uma habilidade específica a ser pretendida. Este deve explicitar de forma clara a
intenção proposta. Os objetivos variam quanto ao nível, conforme o projeto. Por exemplo; no
Projeto da disciplina: objetivo geral e objetivos específicos para cada unidade do Projeto; no
plano de aula pode comportar mais de um objetivo específico, dependendo do número de
sessões (exemplo: 02 sessões no período da noite, horários A e B). É importante frisar que irá
depender da estrutura pedagógica da instituição, a forma de elaborar projetos e planos. Há
bastante flexibilidade, contanto que no projeto de ensino ou plano de aula, estejam presentes
os seus elementos constitutivos. Portanto, não existem modelos fixos. Destaca-se ainda, que
os objetivos, de uma maneira geral, para deixar claro a ação pretendida, devem iniciar com o
verbo no infinivo porque irá indicar a habilidade desejada. Caso o professor desejar indicar
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outra habilidade no mesmo objetivo, deve usar o outro verbo no gerúndio. Exemplo: Avaliar
as condições socioeconômicas do Nordeste, indicando os fatores determinantes da região. A
formulação de objetivos está diretamente relacionada à seleção de conteúdos.
c) CONTEÚDOS (saber sistematizado, hábitos, atitudes, valores e convicções) 6. Quais são
os conteúdos de ensino? Quais os saberes fundamentais? O professor deverá, na seleção dos
conteúdos, considerar critérios como: validade, relevância, gradualidade, acessibilidade,
interdisciplinaridade, articulação com outras áreas, cientificidade, adequação. Além do
conhecimento da ciência, o professor, por exercer uma função formadora, deve inserir outros
conteúdos: socialização, valores, solidariedade, respeito, ética, política, cooperação,
cidadania, etc.
d) METODOLOGIA (procedimentos metodológicos). Metodologia é o estudo dos métodos.
Metodologia de ensino significa o conjunto de métodos aplicados a situação
didáticopedagógica. Método de ensino é o caminho escolhido pelo professor para organizar as
situações ensinoaprendizagem. A técnica é a operacionalização do método. No planejamento,
ao elaborar o projeto de ensino, o professor antevê quais os métodos e as técnicas que poderá
desenvolver com seu aluno em sala de aula na perspectiva de promover a aprendizagem. E,
juntamente com os alunos, irão avaliando quais são os mais adequados aos diferentes saberes,
ao perfil do grupo, aos objetivos e aos alunos como sujeitos individuais7. Nesse processo
participativo o professor deixa claro suas possibilidades didáticas e o que ele pensa e o que
espera do aluno como sujeito aprendente, suas possibilidades, sua capacidade para aprender,
sua individualidade.
Quando o professor exacerba um método ou uma técnica, poderá estar privilegiando
alguns alunos e excluindo outros, e, mais ainda, deixando de realizar singulares experiências
didáticas que o ajudariam aperfeiçoar sua prática docente e possibilitar ao aluno variadas
formas de aprender. Ainda arriscar a trabalhar o saber de diferentes formas, percorrendo
criativos trajetos em sala de aula. O medo de mudar, às vezes, impede o professor de arriscar
novos caminhos pedagógicos. Daí o significado didático-pedagógico na formação do
professor. Os paradigmas das experiências anteriores podem ser as referências de muitos
professores. Assim posto, é válido para o docente buscar novas técnicas, desbravar novos
caminhos, numa investida esperançosa de quem deseja fazer o melhor, do ponto de vista
metodológico e didático8. Tal atitude implica em estudar sobre a natureza didática de sua
prática educativa. Donald Schon tem sido uma referência teórico-metodológica dos
profissionais que atuam na área de formação de professores por afirmar que os bons
profissionais utilizam um conjunto de processos que não dependem da lógica, da
racionalidade técnica, mas sim, são manifestações de sagacidade, intuição e sensibilidade
artística. Schon orienta para que se observe estes professores para averiguarmos como
desenvolvem suas práticas, como fazem e o que fazem, para colhermos lições para nossos
programas de formação. (O saber fazer-docente, 2002) 9. O professor deve refletir
didaticamente sobre sua prática, pensar no cotidiano sobre o saberfazer em sala de aula, para
não escorregar na mesmice metodológica de utilização dos mesmos recursos e das invariáveis
técnicas de ensino. É importante que o professor estude sobre essa temática, uma vez que há
uma diversidade metodológica que pode ser trabalhada em sem sala de aula e/ou numa
situação didático-pedagógica. Exemplo: exposição com ilustração, trabalhos em grupos,
estudos dirigidos, tarefas individuais, pesquisas, experiências de campo, sociodramas, painéis
de discussão, debates, tribuna livre, exposição com demonstração, júri simulado, aulas
expositivas, seminários, ensino individualizado.
f) RECURSOS DE ENSINO. Com o avanço das novas tecnologias da informação e
comunicação-NTIC, os recursos na área do ensino se tornaram valiosos, principalmente do
ponto de vista do trabalho do professor e do aluno, não só em sala de aula, mas como fonte de
pesquisa. Ao planejar, o professor deverá levar em conta as reais condições dos alunos, os
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recursos disponíveis pelo aluno e na instituição de ensino, a fim de organizar situações
didáticas em que possam utilizar as novas tecnologias, como: datashow, transparências
coloridas, hipertextos, bibliotecas virtuais, Internet, E.mail, sites, teleconferências, vídeos, e
outros recursos mais avançados, na medida em que o professor for se a aperfeiçoando10.
g) AVALIAÇÃO. A avaliação é uma etapa presente quotidianamente em sala de aula, exerce
uma função fundamental, que é a função diagnóstica. O professor deverá acolher as
dificuldades do aluno no sentido de tentar ajudá-lo a superá-las, a vencê-las. Evitar a função
classificatória, comparando sujeitos entre sujeitos. A avaliação deverá considerar o avanço
que aquele aluno obteve durante o curso. Há muito que estudar sobre avaliação11. Um das
dicas é a de realizar as articulações necessárias para que se possa promover testes, provas,
relatórios, e outros instrumentos a partir de uma concepção de avaliação que diz respeito ao
aluno como sujeito de sua aprendizagem12, uma vez que planejar é uma ação dinâmica,
interativa, e acontece antes de se iniciar o processo de ensino, durante e depois do processo. É
uma ação reflexiva, que exige do professor permanente investigação e atualização didático-
pedagógica.

Bibliografia

ALARCÃO, I.: Formação reflexiva dos professores, Estratégias de Supervisão, Porto Editora, 1996.
CARVALHO, A. D.: Novas metodologias em educação, Coleção Educação, São Paulo, Porto Editora,
1995.
CASTRO, Amélia A.: O professor e a didática, Revista Educação, Brasília, 1981.
CUNHA, Maria Isabel: O bom professor e sua prática, Campinas, Papirus, 1989.
FREIRE, Paulo: Pedagogia da autofobia: saberes necessários à prática educativa, Rio de Janeiro, Paz e
Terra, 1997.
GARCIA, M. M.ª: A didática do ensino superior, Campinas, Papirus, 1994.
GENTILI, P. A. A.: Qualidade total na educação, Ed. Mundo Novo, 1995.
GODOY: A didática do ensino superior, São Paulo, Iglu, 1998.
LEITE, D., y MOROSINI, M. (orgs.): Universidade futurante: Produção do ensino e inovação,
Campinas, Papirus, 1997.
LIBÂNEO, José Carlos: Didática, São Paulo, Cortez, 1994.
MERCADO, Luiz Paulo Leopoldo: Formação continuada de professores e novas tecnologias, Maceió,
EDUFAL, 1999.
MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoltte et.: Aprendizagem da docência: processos de investigação e
formação, São Carlos, EdUFSCar, 2002.
MORRISA, W.: O ensino superior: teoria e prática, Rio de Janeiro, Zahar, 1972.
MORAES, V. R. P.: Melhoria do ensino e capacitação docente, Porto Alegre, Editora da
Universidade, 1996.
OLIVEIRA, M. R. N. S. (orgs): Confluências e divergências entre didática e currículo, Campinas,
Papirus, 1998, 176 pp.
NÓVOA, Antônio (coord.): Os professores e sua formação, 2.ª ed., Lisboa, Nova Enciclopédia, 1994.
PERRENNOUD, Philippe: Dez competências para ensinar, Porto Alegre, Artmédicas, 2002.
PIMENTA, S. G.: A didática como mediação na construção da identidade do professor: uma
experiência de ensino e pesquisa na licenciatura, in PIMENTA, S. G.: O estágio na formação de
professores: unidade teoria e prática, São Paulo: Cortez, 1995, pp. 37-69.
SANTANNA, I. M.: Didática: aprender a ensinar, São Paulo, Loyola, 1989.
SAVIANI, D.: Tendências e correntes da educação brasileira, in MENDES, D. T.: Filosofia da
educação brasileira, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1983, pp. 19-47.
SEVERINO, A. J.: Interdisciplinaridade: para além da filosofia do sujeito. São Paulo, Vozes, 1996.
TUGENDHAT, E.: Lições sobre Ética, Petrópolis, Vozes, 1996.
VASCONCELOS, Celso dos S.: Construção da disciplina consciente e interativa na sala de aula e na
escola, 3a ed., Libertad, 1994.
_____. A construção do conhecimento em sala de aula, São Paulo, Libertad, 1994.
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VEIGA, Ilma (coord.): Panejamento do ensino numa perspectiva crítica de educação, in LOPES,
Antonia: Repensando a Didática, Campinas, Ed. Papirus, 2.a ed.

1 É interessante ler VASCONCELOS, Celso: Planejamento. Projeto de Ensino Aprendizagem e


Projeto Político Pedagógico, São Paulo, Libertad, 1999. GANDIM, Danilo: Planejamento como
prática educativa, São Paulo, Edições Loyola, 1985.
2 Recomenda-se, para uma reflexão mais aprofundada sobre as mudanças ocorridas neste modelo de
sociedade, a leitura de MERCADO, Luiz Paulo Leopoldo: Formação continuada de professores e
novas tecnologias, Maceió, EDUFAL, 1999.
3 Sobre o conceito de reflexão indicamos a leitura de ALARCÃO, I.: Formação reflexiva dos
professores. Estratégias de Supervisão, Porto Editora, 1996.
4 SCHON, Donald A.: Formar professores como profissionais reflexivos, in NÓVOA, Antônio
(coord.): Os professores e sua formação, Lisboa, Don Quixote, 1992.
5 Um modelo de Projeto de Ensino encontra-se nesta coletânea de texto, como anexo. É apenas um
modelo, mas contém os elementos essenciais a um projeto pedagógico.
6 Ver como Libâneo classifica os conteúdos de ensino. Muito embora seja um livro para o ensino
fundamental, é interessante a forma como trata a questão, ultrapassando os limites de que os conteúdos
de ensino se resumem ao saber sistematizado. LIBÂNEO, José Carlos: Didática, São Paulo, Cortez,
1994. Põe-se em evidência que há uma nova tendência que enfatiza a formação de competências e
habilidades dos alunos.
7 A postura da construção do conhecimento, segundo Celso Vasconcelos (1996), implica na mudança
de paradigma pedagógico, qual seja, ao invés de dar o raciocínio pronto, de fazer para e pelo aluno
construir a reflexão tomando por base a metodologia dialética, onde o professor é mediador da relação
educando e o objeto de conhecimento.
8 Arriscamos indicar uma bibliografia na área do Ensino Superior sobre metodologia, técnicas, enfim,
meios para mediar os saberes. GARCIA, M. M.ª: A didática do ensino superior, Campinas, Papirus,
1994. ABREU, Maria Célia, e MASETTO, Marcos Tarcísio: O
professor universitário em aula, São Paulo, MG, 1986. MOREIRA, Daniel (org.): Didática do ensino
superior. Técnicas e Tendências, São Paulo, Pioneira, 1997. SILVEIRA, Regina B. L.: A didática e a
questão da qualidade de ensino, in Revista de Humanidade, 7(5), 1990.
BORDENNAVE, Juan Diaz: Estratégias de ensino aprendizagem, Petrópolis, Vozes, 1980. LEAL,
Regina B.: Memorial em dinâmica de grupo, Fortaleza, Edições Dezessete e Trinta, 2001. CASTRO,
Amélia A.: O professor e a didática, Revista Educação, Brasília, 1981.
9 Pesquisa realizada na Universidade de Fortaleza: “O ‘saber-fazer competente’ dos professores para
além do olhar da escola ou a prática docente: saberes revelados no cotidiano escolar”. Professora
coordenadora: Regina Barros Leal. Professoras orientadoras: Mônica Mota Tassigny, Grace Troccoli,
Josenilde Costa. Orientandas: alunas da disciplina de Prática de Ensino e Didática.
10 Recomenda-se a leitura de LEVY, Pierre: As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento
na era da informática. Rio de Janeiro, 1993.
11 O professor deverá conhecer os procedimentos e instrumentos de avaliação, suas funções.
Recomendamos a leitura de VASCONCELOS, Celso dos S.: Avaliação: concepção dialética
libertadora do processo de avaliação escolar, in Cadernos Pedagógicos de Libertad, vol. 3, São Paulo,
Libertad, 1995. LUCKESI, Cipriano Carlos: Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e
proposições. 2.a ed., São Paulo, Cortez, 1995. HOFFMAN, Jussara M.ª: Avaliação: Mitos e desafios,
uma perspectica construtivista, Porto Alegre, Mediana, 1993. HOFFMAN, Jusasara: Avaliação
mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade, Porto Alegre, Mediana, 1993.
12 Indica-se a leitura de Indica-se a leitura de PETRAGLIA, Isabel: Edgar Morin: a educação e a
complexidade do saber, São Paulo, Vozes, 1995. SEVERINO, A. J.: Interdisciplinaridade: para além
da filosofia do sujeito, São Paulo, Vozes, 1996.

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Didática e Educação Corporativa: reflexões sobre o gestor educador e o cuidado


empresarial com a educação continuada.
ELIANE MARIA PIRES GIAVINA BIANCHI
Universidade de São Paulo
eliane.pires.bianchi@terra.com.br

Resumo
Este artigo tem como objetivo conduzir uma reflexão sobre as práticas didáticas presentes na
educação corporativa. O aumento expressivo das universidades corporativas como resposta a
mudanças no cenário econômico e a deficiência existente na educação formal fazem com que
essas entidades tenham um papel importante na educação continuada de nossa população. A
preocupação com estratégias de ensino e de aprendizagem é fundamental para que os
profissionais consigam desenvolver competências importantes ao seu próprio
desenvolvimento, contribuir para o crescimento das empresas e, conseqüentemente, o
progresso das nações. Um caso de educação corporativa, em uma empresa de soluções de
informação, é utilizado para suportar o processo de reflexão. De forma não conclusiva,
percebe-se que a corporação apresenta um rico potencial para a utilização de recursos técnicos
de ensino e aprendizagem. Porém, o papel de um dos principais atores, o gestor, ainda não foi
totalmente transformado em gestor educador. Este novo papel da liderança é fundamental para
garantir a viabilização e consolidação da educação corporativa como instituição
complementar para a educação contínua.

Palavras-chave: educação, educação corporativa, educação continuada, didática, didática em


educação corporativa.

Abstract
This paper has the objective of driving a reflection on the didactic practices present in the
corporate education. The expressive increase of corporate universities as answer to changes in
the economic scenery and to the existent deficiency in the formal education, transformed
those entities in important players in the continued education process of our population.
Concerns with teaching and learning strategies are fundamental and contribute in assuring
professionals´ competencies development, their support for companies´ growth and,
consequently, the progress of the nations. A case of corporate education, in a company of
information solutions, is used to support the reflection process. Non-conclusively, this study
points to a great potential inside the corporate universities for teaching and learning
techniques usage. Therefore, the role of one of its key actors - the leader - was not completely
transformed into the educating leader. This new leadership role is fundamental to consolidate
and sustain the corporate university as a complementary institution on continued education.

Key words: education, corporate education, continuing education, didactic, didactic practices
in corporate education.

1 Introdução.
A educação corporativa pode ser vista como um modismo por algumas pessoas, talvez
por ter surgido na prática empresarial antes de ser teorizada na academia, como outros
modelos e instrumentos de gestão da administração.
A expansão da educação corporativa no Brasil veio responder a duas situações: o
aumento da competitividade global e a fragilidade e precariedade da educação tradicional. Por
um lado, o aumento da competitividade pressionou empresas a terem maior velocidade, maior
inovação, preocupação com qualidade e produtividade; além de adotarem técnicas de gestão
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para atender a esses requisitos como o trabalho em grupo, a participação e o aumento da
comunicação interna. Por outro lado, o histórico de pouca continuidade nos estudos, leva para
as organizações pessoas com deficiências básicas. Nem mesmo a expansão de cursos técnicos
profissionalizantes, conseguiu responder às crescentes demandas do mercado.
Com isso, a organização opta pela educação corporativa como forma de desenvolver
seus recursos e talentos e buscar competitividade sustentada. O papel dessas entidades é o de
desenvolver competências críticas empresariais e humanas fundamentais, priorizando a
comunicação, a colaboração, a capacitação técnica, o raciocínio crítico e a liderança
(MEISTER, 1999). Seu objetivo não é substituir a educação básica tradicional, mas realizar o
processo de educação continuada com foco na renovação do conhecimento, dada a sua rápida
obsolescência e, no desenvolvimento de novas atitudes e habilidades requeridas pelo mercado
de trabalho.
Em alguns casos, uma organização estabelece uma parceria com uma instituição de
ensino para pensar sua estratégia de educação e realizar seus programas. Em outros, seus
recursos internos são responsáveis pelo planejamento, execução, avaliação e controle das
atividades. Será que os recursos internos de uma organização têm a mesma preocupação ou o
preparo dos educadores das entidades de ensino? A liderança das organizações suporta e serve
de exemplo ao processo de aprendizagem? Quais as estratégias de ensino mais adequadas a
esta nova realidade? Será que o aprendizado é aferido?
Muita bibliografia existe sobre didática no ensino superior tradicional, mas esta
abordagem ainda é pouco explorada na educação corporativa. Assim, entender o quê as
organizações entendem por educação, quais recursos de ensino e aprendizagem elas utilizam,
os novos papéis de seus atores, a processo de avaliação do aprendizado, pode contribuir para
aprofundar nosso conhecimento sobre educação continuada, focalizando especialmente a
contribuição das empresas ao desenvolvimento humano, no novo cenário econômico.
Para tal, é traçado um referencial teórico focalizando dois temas principais: a educação
e a didática. Entender o papel da educação corporativa dentro de um cenário de educação
mais amplo é necessário, já que esta nasceu para participar do processo educacional como um
todo. Com relação à didática, faz sentido analisar a didática no ensino superior tradicional
como subsídio para a discussão de seu uso e aplicabilidade na corporação. Didática neste
trabalho será abordada como sendo os princípios, recursos e técnicas de ensino, habilidades
do educador, processo de aprendizagem e aferição de aprendizado. Um estudo de caso
exploratório é utilizado para auxiliar, do modo empírico, a reflexão sobre práticas didáticas na
educação corporativa.
Com este trabalho, espera-se iniciar uma reflexão centrada no aluno
(estudante/funcionário) como paciente de um processo educativo contínuo e realizado por
múltiplas entidades. Um pano de fundo importante é a compreensão da missão principal tanto
da entidade de ensino tradicional quanto da corporação, entendendo as mesmas como
parcerias no desenvolvimento sustentado das nações.

2 Educação: base para o desenvolvimento humano.


Para que serve a educação? Ioschpe (2004) utiliza esta pergunta para explicar que a
educação teve significados distintos através dos tempos. Foi, contudo, com a Revolução Industrial
e uma ampla reforma eleitoral na Inglaterra que se consolidou o processo compulsório de
educação, base do sistema escolar atual. Ainda segundo Ioschope, existem duas visões distintas
sobre o processo educacional: de um lado pedagogos, educadores e filósofos vêem a educação
como um uma ferramenta de libertação e, por outro, empresários e trabalhadores a interpretam
como instrumento de adestramento, isto é, de preparação para o trabalho e manutenção da ordem.
Percebe-se, contudo, que a educação está por trás do desenvolvimento humano, seja na forma de
um valor ou transformada em um requisito prático.
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A educação é também um fenômeno político, argumenta Niskier (2001) uma vez que a
política é a totalização do conjunto de experiências vividas em uma sociedade. A educação deve
estar focada em fenômenos da realidade, amparada pelo conhecimento científico e alinhada à
realidade social na qual está inserida.
Eventualmente, vários termos são usados para se referir à educação: são eles treinamento,
instrução, ensino e educação. É importante o esclarecimento de cada um deles (MANNHEIM e
STEWART, 1974). Treinamento refere-se ao exercício ou prática real realizada por uma pessoa.
Melhora-se a habilidade, mas sem o uso da improvisação ou do julgamento. Para qualquer
vocação, é necessário o treinamento. Instrução é a transmissão do conhecimento, o foco está no
que está sendo comunicado e não em quem comunica ou quem recebe. O ensino pode ser
confundido com a instrução, mas ensino pressupõe uma relação entre quem ensina e quem
aprende. Além do processo de transmissão, o ensino pressupõe e está preocupado com a
compreensão. A educação é um termo bastante mais abrangente que os anteriores. A educação
modifica a natureza do aluno, isto é, através de transmissão de conhecimentos e valores contribui
para a formação do caráter, da personalidade e modifica comportamentos.
Assim, no processo de educação, pode-se utilizar o treinamento, a instrução e o ensino. As
mudanças que acontecem no indivíduo são de caráter duradouro. A escola é uma parte do
processo de educação que começa quando um indivíduo nasce e o acompanha na vida toda.

2.1. A educação no Brasil


Dado o caráter contínuo, político, econômico e social da educação, é fundamental
entender a evolução da educação no Brasil. Souza (2005) constata que Portugal, enquanto
colonizador do Brasil prestou muito pouca atenção a temas como a educação e instrução pública.
O mesmo não aconteceu em outras colônias das Américas: a Harvard College foi criada em 1636,
16 anos após a chegada dos colonizadores a Massachusetts e, a Universidad de San Marco foi
criada em Lima, no Peru, pelos espanhóis, em 1551. Uma conseqüência desse processo, no Brasil,
é que em 1995, 16% da sua população acima de 15 anos ainda era analfabeta.
Brandão (2003) reporta o que aconteceu com a o ensino superior ao longo da história
do Brasil. O cunho filosófico e religioso que pautava a educação jesuítica somente foi
modificado no século XIX, quando a corte portuguesa foi transferida para o Brasil. O foco da
reforma foi formar burocratas, profissionais liberais e profissionais ligados à produção de
bens, com forte influência francesa. A República velha viabilizou a expansão das entidades de
ensino superior, mas foi a partir da Era Vargas que as grandes mudanças aconteceram
culminando com o modelo atual: expansão das universidades públicas e privadas; novas leis
de diretrizes da educação e criação do Ministério da Educação.

Em função dessa história, o tom político foi sempre muito forte. Se, de um lado, a grande
expansão do ensino se deu sob regimes autoritários, de outro, efetivamente ajudou o
desenvolvimento econômico do país.
O tamanho e a diversidade do país, bem como a complexidade de gestão de um sistema de
educação descentralizada trazem uma série de conseqüências em termos de qualidade e
abrangência do ensino, preparo de docentes, pesquisa científica e o ensino continuado. Mas, e
quanto ao alinhamento deste processo de ensino à modernidade?
Quando se fala de modernidade, se fala em racionalização e subjetivação (ÉBOLI, 1999),
e não necessariamente o que vem depois da Idade Moderna. A modernidade está pautando o
cenário macroeconômico atual com a globalização, a inovação, a competitividade e aumento
exponencial do conhecimento. É um processo complexo e multidimensional. Na dimensão
cultural compreende a ética, a valorização do ser humano e o espírito de liberdade. Na dimensão
política é a afirmação da democracia e a preocupação com a cidadania. Na dimensão social
entende o sujeito como parte do movimento social, em um ambiente de justiça. Na dimensão
administrativa persegue uma preocupação com a eficácia por meio de projetos, a visão de futuro e
a esperança. Na dimensão econômica, visa prosperidade e lucro, mas subordina os objetivos
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econômicos aos sociais. E, finalmente, na dimensão tecnológica, pressupõe inovação sempre, sem
menosprezar a criatividade do ser humano.
Souza (2005) desenvolveu uma visão para a educação brasileira. Mesmo sem
intencionalmente alinhar sua visão a esta visão de modernidade, ela o está. O sistema educacional
brasileiro, segundo ele, deve levar em conta a sociedade do conhecimento em um mundo global, a
cidadania e os valores éticos. Os dois principais focos de sua visão são: o desenvolvimento da
capacidade de aprender e a criação de condições para a educação permanente. A escola deve ter
em mente questões como a socialização, o uso do conhecimento acumulado, o desenvolvimento
de habilidades de pensamento, a crítica e raciocínio e a formação do caráter. Além disso, um
indivíduo deve alternar idas-e-vindas entre a academia e o mercado de trabalho, além de tirar
proveito de recursos como a educação a distância e novas tecnologias aplicadas à educação.
Enquanto esta visão não se consolida plenamente, a Universidade Corporativa tem muito a
contribuir.

2.2. A Educação corporativa: seu papel na sociedade e no mercado de trabalho.


A expansão da educação corporativa no Brasil veio responder a duas situações: o aumento
da competitividade global e a fragilidade e precariedade da educação tradicional. Com relação à
questão da educação tradicional, o histórico exposto anteriormente exemplifica a problemática
atual. Embora suportado por boa visão e com novas conquistas, o sistema educacional brasileiro,
ainda está distante de ser um modelo educacional completo: com suporte à formação integral e
educação continuada disponível e com qualidade.
Com relação ao ambiente competitivo atual, algumas forças sustentaram o
aparecimento do fenômeno Universidade Corporativa (MEISTER (1999), ÉBOLI (2004)). A
organização se tornou mais flexível, está mais enxuta para ter capacidade de responder mais
rapidamente ao mercado, num ambiente empresarial turbulento. Com isso, das pessoas são
demandados novos comportamentos. A economia do conhecimento vem requisitando maior
conhecimento por parte dos trabalhadores e, o conteúdo intelectual dos cargos também
aumentou. O conhecimento se torna obsoleto muito rapidamente, exigindo um aprendizado
contínuo. A segurança vitalícia de emprego foi substituída por possibilidade de aprendizado
oferecida pelos empregadores, garantindo assim, a não depreciação desses trabalhadores. È
necessário preparar as pessoas para atuar no cenário global.
Allen (2002) consolidou uma definição para Universidade Corporativa:
“uma entidade educacional que funciona como uma ferramenta estratégica desenhada para auxiliar uma
organização na consecução de sua missão através da condução de atividades que cultivem o
aprendizado, conhecimento e a sabedoria individual e organizacional” (tradução livre da autora).
A Educação Corporativa difere dos tradicionais programas de treinamento corporativos
em vários aspectos. Primeiro, ela foca em desenvolver competências críticas do negócio, isto é,
preocupa-se com competências que agregam valor a produtos e serviços e são difíceis de serem
imitadas. As competências críticas são traduzidas em competências humanas, isto é, como as
pessoas atuarão na consecução dessas competências críticas (FLEURY, 2002). Em segundo lugar,
a EC se preocupa com o aprendizado coletivo e fortalecimento da cultura organizacional. Em
terceiro, atua nas necessidades do negócio, e não nas necessidades individuais. E, em quarto,
adota o conceito de educação inclusiva, seu foco de atuação segue sua cadeia de valor e, em
alguns casos, atende a comunidade também.
Com esse enfoque, fica evidente que a Educação Corporativa não vem competir com a
educação tradicional, e pode fazer uma boa parceira com esta no desenvolvimento do papel de
educação do indivíduo.

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Um sistema de educação corporativa está pautado por uma série de princípios, isto é,
bases filosóficas e fundamentos que norteiam seu desenvolvimento. Éboli (2004) consolidou sete
(7) princípios conforme a figura 11.
Estes princípios, assim como a visão para a educação no Brasil desenvolvida por Souza
(2005), sustentam a visão de modernidade e contribuem para a construção da organização
moderna.

3 Didática: viabilizando o aprendizado.


O termo didática vem do grego e significa a arte de ensinar (GIL, 2006). Ao longo dos anos,
com a evolução da visão de educação, a didática passou a considerar o aluno como o sujeito
da aprendizagem. Caberia ao professor, colocar o aluno em situações em que fosse mobilizada
sua atividade global. O professor passa a ser quem mobiliza e viabiliza o processo de
aprendizagem, e não sujeito do mesmo.
Didática é um termo relacionado a vários outros: educador, aluno, aprendizado, planejamento,
conteúdo, estratégias e técnicas de ensino, recursos, avaliação e ética. Discutir didática significa
discutir todos estes termos abordando seus significados e correlações. Para este trabalho, é
utilizada uma visão mais estratégica dos termos, com ênfase em importância e efetividade, sem a
pretensão de abordar em detalhes questões como técnicas de ensino e o passo a passo dessas
várias atividades e processos.

3.1. Professor ou educador?


Vários autores discutem a questão semântica dos termos professor e educador, e há uma
grande diferença entre eles. O professor está muito preocupado em ensinar, é o centro do
processo, com sua especialidade e conhecimento (GIL, 2006). O educador está preocupado em
incentivar o aluno a expressar suas idéias, e a buscar formas de se desenvolver. Como dizem
Werner e Bower (1984): “educar deixa de ser a arte de introduzir idéias na cabeça das pessoas,
para fazer brotar essas idéias”. Esse “novo” educador deve desenvolver competências e
habilidades para ser eficaz em seu trabalho.
Perrenoud (2000) desenvolveu dez (10) competências fundamentais para o educador, em
ambiente acadêmico. Os focos destas competências estão na forma de relacionamento com os
alunos, no envolvimento do educador com a entidade de ensino e com as famílias dos alunos e, a
preocupação com seu autodesenvolvimento. Sobre relacionamento com os alunos, a ênfase é no
significado da aprendizagem, na contínua análise de sua progressão e no entendimento e respeito
do grupo aprendiz foco. O educador deve estar envolvido com a instituição, desenvolvendo
trabalhos com outros docentes e participando de questões como análise de recursos e
planejamento da instituição. Bastante ênfase é dada à questão de autodesenvolvimento. O
educador deve estar aberto a novas tecnologias, buscar atualização constante e fazer um balanço
contínuo de suas competências. Questões éticas, principalmente ligadas à responsabilidade, justiça
e diversidade são focos contínuos de atenção.
Sant´Anna (1979) propõe nove (9) habilidades técnicas para o ensino, com foco tático. As
habilidades giram em torno do conteúdo, da forma de fazer perguntas, da criação do estímulo para
o aprendizado, da conclusão de ciclos e processos, do uso de exemplos, do uso de realimentação e

1
Fonte: adaptada de Éboli: Educação corporativa no Brasil: mitos e verdades -2004 Figura 1: os setes princípios
de sucesso da educação
corporativaCompetitividadePerpetuidadeConectividadeDisponibilidadeCidadaniaParceriaSustentabilidadeSete
princípios de sucesso da Educação CorporativaElevar o patamar de competitividade por meio da consolidação
das competências críticas.Transmissão da herança cultural, perpetuando a existência da empresa.Comunicação e
interação, relacionamento com públicos internos e externos.Atividades e recursos educacionais de fácil uso e
acesso.Estimular o exercício da cidadania individual e corporativa.Estabelecimento de parcerias internas
(gestores) e externas (instituições de ensino superior.Ser um centro gerador de resultados para a empresa.

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reforços, da preocupação com a integração entre os conteúdos e com a sua própria forma de
comunicação.
Gil (2006) reporta um trabalho de Elaine McEwan que determina traços que definem um
educador eficaz. Esses traços estão divididos em três (3) categorias: pessoais (paixão, visão
realista e positiva e, liderança), ligados a resultado pretendido (atenção permanente, estilo,
persuasão e eficácia instrucional) e ligados a sua vida intelectual (conhecimento teórico, sabedoria
mundana e capacidade intelectual).
Pode-se perfeitamente integrar as competências, habilidades e traços de eficácia dos três
autores para compor o que seria o educador ideal: comportamentos, recursos de trabalho e foco no
resultado. Chama bastante a atenção no perfil desenvolvido, o foco na própria pessoa do
educador. Mesmo sendo o conhecimento um aspecto importante do aprendizado, é a figura e a
postura do educador que fazem a diferença no desenvolvimento de outra pessoa, especialmente
quando se considera o aluno maduro.

3.2. Quem é o aluno adulto?


Existem vários trabalhos de pesquisa que resultaram em classificações e tipificação dos
alunos universitários (do mundo acadêmico americano). Algumas delas levam mais em conta o
ponto de vista emocional, outras o padrão de engajamento em atividades. Esses processos sempre
criaram modelos com muitos tipos, quase sempre perto de dez (10), o que só reforça a diversidade
em comportamento e atitude presente em um grupo de aprendizado. Se por um lado a diversidade
enriquece, trazendo várias perspectivas distintas, por outro ela dá mais trabalho, já que vai exigir
do educador preparo para lidar com diferenças de opinião, com várias experiências acumuladas e
com expectativas de vida também distintas.
O aluno adulto precisa fazer correlações, perceber aplicabilidade do aprendizado, tem
maior senso de urgência já que está entre o mundo acadêmico e o mundo profissional, é mais
crítico. Este perfil complexo e diverso do aluno adulto propõe aos educadores um maior desafio
no exercício de sua profissão.

3.3. Como acontece a aprendizagem?


A aprendizagem acontece quando é verificada uma mudança de comportamento do
indivíduo. E, ela acontece durante toda a vida de uma pessoa. Gómez (2000) reporta dois tipos de
teorias de aprendizagem: as associacionistas e as mediacionais.
Na categoria associacionista estão agrupadas todas as teorias que associam estímulos e
respostas provocados e determinados somente por condições externas; é o processo de
condicionamento. A categoria mediacional inclui todas as teorias que consideram processos
internos do indivíduo associados aos processos externos. Nesta categoria estão Jean Piaget que
considera a maturidade e o desenvolvimento cognitivo no processo de aprendizagem das crianças
e David Ausubel com a aprendizagem significativa (vinculação substancial de novas idéias e
conceitos com a bagagem cognitiva do indivíduo) focada no adulto.
Os processos educacionais estão mais pautados nas teorias mediacionais, que incluem processos
internos dos indivíduos. Porém, como cada indivíduo é diferente do outro, seu processo de
aprendizagem também será único. Existem vários fatores que interferem no processo de
aprendizagem. No campo cognitivo estão as competências intelectuais e a criatividade. Mas, além
disso, motivação, idade, sexo, ambiente social, hábitos de estudo e memória podem interferir no
processo de aprendizado, como reporta Gil (2006).

3.4. Planejamento e conteúdo: aspectos fundamentais para qualquer processo


educacional.
Olhando a questão educação de forma bastante abrangente, e levando-se em conta a
modernidade, as questões de planejamento e conteúdo são muito relevantes. Zabala (2002) reforça
a questão da modernidade quando questiona que modelo de cidadãos nós queremos desenvolver e
as implicações em planejamento e definição do conteúdo educacional que vamos fazer.
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O planejamento ocorre em vários níveis: o planejamento educacional de uma nação, o
planejamento institucional realizado por uma instituição de ensino, o planejamento curricular de
cursos, o planejamento do ensino realizado para uma disciplina e um educador específico ou o
plano de aula (GIL, 2006). Os níveis mais macro influenciam os níveis mais específicos.
No caso de alunos adultos, é importante que eles entendam a cascata do processo de planejamento
para compreender o propósito de uma disciplina dentro de um curso, módulo ou de um processo
de aprendizagem. O que mais o impactará, no curto prazo, é o aspecto mais tático que se traduz
em conteúdo, técnicas e recursos de aprendizagem. Com relação aos conteúdos em processos de
aprendizagem é preciso atentar para alguns pontos. Primeiro é preciso definir conteúdo. O mundo
acadêmico utiliza os termos: conceito, procedimento e atitude para se referir à palavra conteúdo.
Esta visão está bastante próxima da visão de competência desenvolvida no mundo organizacional:
conhecimento, habilidade e atitude. Concluí-se, portanto, que o mais importante não é a
denominação, mas o significado. Nos dois modelos o que importa é: saber o quê, para saber fazer
e saber ser. Deve-se ligar uma teoria ou conceito a uma ação e a uma necessidade interna do
indivíduo, gerando motivação para o aprendizado, segundo o conceito de motivação de Archer
(1997).
Também, é necessário atentar para o aluno. Um conteúdo precisa ter significância para o
aluno, isto é, estar relacionado às suas experiências. Precisa também ser útil e aplicável. Em um
ambiente de aprendizagem em grupo, pode-se ter que adaptar um conteúdo planejado em função
de diversidade do grupo. Quem direciona a adequação ao tempo é o aluno, isto é, seu processo de
aprendizagem. É importante o educador atentar para a relação: tempo, volume de conteúdo e
eficácia do aprendizado. Moreira (2003) ainda reflete que conteúdos diferentes requerem
capacidades diferentes do aluno e que o educador deve estar atento para não deixar haver a
sobrecarga, isto é, não ir além das capacidades do aluno, inibindo o processo de aprendizagem.

3.5. Técnicas e recursos de ensino


Existe um número muito grande técnicas e recursos disponíveis para o ensino. A
utilização de cada uma delas depende do que se espera do processo de aprendizagem, do estilo do
educador e do conteúdo a ser abordado.
É importante o uso variado de técnicas quando se pensa em um aluno passando por um
processo contínuo de aprendizado. Porém, é necessário entender o que cada uma dessas técnicas
pode viabilizar, suas vantagens e desvantagens. Algumas valem ser abordadas, sem a pretensão de
exaurir todo o arsenal de técnicas, para exemplificar a decisão de escolha pelas mesmas.
A aula expositiva é uma exposição contínua de um conferencista na qual o aluno pode ter
a oportunidade de fazer perguntas, mas de forma geral escuta e toma notas. É um processo mais
simples para um docente e interessante quando o aluno está tendo sua primeira experiência com
aquele conteúdo. Contudo, não se levam em conta a diversidade da audiência e o desenvolvimento
de habilidades intelectuais.
O ensino em pequenos grupos aparentemente deixa o aluno mais satisfeito além de
viabilizar o uso maior de raciocínio. O aprendizado acontece no nível individual, viabilizado pelo
processo cooperativo do grupo. O educador é um facilitador do processo de aprendizagem. É
observada uma série de vantagens no processo do grupo: desenvolvimento de habilidades de
comunicação (alunos e professores), desenvolvimento de competências intelectuais e sociais e
crescimento pessoal dos atores. Em termos de modalidade existem os seminários (grupos de
discussão), método do caso (situação para discussão que demanda solução de problemas), jogos
de empresa (simulação longitudinal de uma empresa para tomada de decisão e aferição de
resultados), entre outros. Nestes processos, é requerido um papel bastante abrangente do
educador, demandando muitas das competências, habilidades e traços identificados anteriormente.
Conceituada no mundo organizacional, a técnica de aprendizagem em ação é realizada
ao longo do exercício do trabalho (PINTO, 1994). O processo é de apresentação de um
trabalho, seguido de execução monitorada do mesmo por parte do aprendiz e posterior
avaliação. Uma vantagem é que a parte prática fica muito evidenciada, além de fortalecer o
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desenvolvimento de habilidades de comunicação e competências sociais. No ambiente
acadêmico, esta técnica pode ser encontrada em laboratórios e oficinas. O uso da tecnologia
não vai substituir o professor, mas vai requerer deste um preparo diferenciado e atualização
(ÉBOLI, 2004). Mesmo com a tecnologia viabilizando a educação fora da sala de aula
(MEISTER, 1999), o tutor, professor ou educador é fundamental para preparar o material
neste novo formato, suportar e auxiliar o processo de aprendizagem do aluno e realizar o
processo de avaliação do aprendizado. Para o preparo do material, Gil (2006) reforça que são
necessárias novas competências tecnológicas por parte do professor. Além disso, o tempo
dedicado ao preparo desses materiais pode ser maior, já que além de tirar proveito dos
recursos tecnológicos, o material deve ser renovado com maior freqüência. A tecnologia
favorece a aprendizagem individualizada diz Godoy (2003). Porém, ela pode ser utilizada
para suportar o aprendizado de grupos, moderando a interação e o processo de trabalho do
mesmo. Por parte do aprendiz, acesso à tecnologia e familiaridade com a mesma são
fundamentais.

3.6. Avaliação do aprendizado.


A avaliação do aprendizado é um processo crítico, pois demanda tempo, foco e
critérios por parte do educador e é fonte de ansiedade por parte dos alunos. A avaliação deve
ser entendida como parte integrante do processo de aprendizagem (GIL, 2006). Donald
Kirkpatrick desenvolveu em 1952 sua dissertação sobre avaliação de um treinamento de
supervisores. Mesmo centrado no mundo organizacional, seu modelo é interessante e pode ser
transportado para o mundo acadêmico. Ele define um processo de avaliação em quatro (4)
níveis: reação, aprendizado, comportamento e resultado (KIRKPATRICK, 1998).
A avaliação de reação é realizada pelos alunos sobre o curso ou processo de
aprendizagem. Segundo o autor, as pessoas devem gostar de um processo de aprendizagem
para depois tirar algum proveito dele. A avaliação de aprendizado deve ser realizada de forma
muito objetiva, através de uma prova, por exemplo. Pode ser interessante realizar este tipo de
avaliação antes e depois da exposição do aluno ao processo de aprendizagem, para medir sua
evolução. O terceiro nível proposto por seu processo de avaliação é o comportamento. Deve
ser realizado algum tempo depois do processo de aprendizagem acontecer para verificar se
efetivamente houve a mudança de comportamento por parte do aprendiz. O quarto nível é
bastante difícil de ser realizado e tem por objetivo verificar o resultado efetivo daquele
processo de aprendizagem, preferencialmente, com indicadores qualitativos ou quantitativos
claramente definidos.
Aplicar este modelo no mundo acadêmico pode ser interessante, e é exeqüível. Não se
deve, contudo, esquecer da realimentação contínua durante o processo de aprendizagem, entre
alunos e, entre professor e aluno. As avaliações pontuais não podem substituir a interação
contínua que gera possibilidades de mudanças de comportamento efetivas e no momento
correto.
4 Um caso prático: como estão as práticas didáticas na Educação Corporativa?
O objetivo de utilizar um caso prático foi o de iniciar o processo de reflexão a partir de uma
situação real.

4.1 Metodologia de trabalho.


A decisão foi de trabalhar com um caso único, de forma intrínseca. Não por se tratar este
caso de um exemplo revelador e definido, mas por ele contribuir com informações para o processo
de reflexão (YIN, 1981). Com isso, as reflexões são de caráter exploratório, não conclusivo
(COOPER, 2003). O caso é a experiência vivida pela autora nos anos de 2001 a 2004 enquanto
atuou como executiva de Recursos Humanos com a responsabilidade de introduzir e gerir a
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Universidade Corporativa de uma empresa canadense, atuante na área de comunicação, que
iniciou suas operações na região em 2000. Foram utilizados documentos de trabalho discutidos,
utilizados e apresentados no Brasil, Argentina e Estados Unidos da América, bem como a
memória da autora. Para elaboração do relato, o foco é o Brasil, que representa a melhor
contextualização para as reflexões propostas.
4.2. A Empresa.
A empresa atua na área de comunicação, mais especificamente soluções integradas de
informação. Atua globalmente em vários ramos de informação: educação, saúde, ciência,
financeira, jurídica, impostos, informações regulamentais, entre outros.
A partir de 2000, estabeleceu suas operações na América Latina quando foram adquiridas
empresas no Brasil e em outros países dessa região.
Por característica do próprio negócio, o processo de expansão se dava por aquisição de
empresas familiares locais. Os desafios eram o de caracterizar a qualidade de produtos de forma
global e migrar seus produtos para soluções eletrônicas. Isto seria realizado através de uma
complexa mudança cultural centrada na busca pelo resultado e no valor do capital humano.
A primeira empresa adquirida no Brasil representava a plataforma para o crescimento no
mercado latino americano. Em 2000, essa empresa contava com mais de 1.000 funcionários e
vinha de uma gestão centralizada em seus ex-donos. A estrutura em silos, não viabilizava a troca
de informações. Pouco esforço no treinamento e desenvolvimento das pessoas havia sido
realizado antes do processo de compra. Os produtos periódicos deveriam ser transformados em
soluções integradas de informação. Assim, a implantação da Universidade Corporativa na região
vinha responder a uma série de demandas incluindo, principalmente, a transformação cultural para
viabilizar as mudanças.

4.3. A implantação da Universidade Corporativa no Brasil.


A UC (Universidade Corporativa) foi estruturada buscando desenvolver as demandas do
negócio e tendo como pano de fundo o momento cultural da empresa no Brasil. O modelo
americano de cursos oferecidos sob demanda foi substituído por um modelo de cursos específicos
e obrigatórios. O planejamento das atividades era feito anualmente em função das demandas do
negócio, do resultado dos processos de avaliação individual e das pesquisas de clima. Iniciado
pela área de recursos humanos, as propostas eram validadas pelos gestores locais e negociadas
com a matriz da empresa nos EUA. O objetivo era garantir aderência ao negócio e sintonia com a
filosofia da UC no mundo. O processo de planejamento sugeriu os focos apresentados na figura
22, para os anos de 2001 a 2004. Devido a grandes demandas de desenvolvimento, o planejamento
sustentava a estratégia do negócio em processo de cascata, iniciando pelo preparo da liderança
com posterior envolvimento todas as pessoas e desenvolvimento dos conhecimentos e
competências funcionais específicas. Em 2004, o modelo de funcionamento da UC no Brasil
estava consolidado e em funcionamento.

4.4. O modelo da Universidade Corporativa: UC no Brasil.


O modelo de atuação da UC não foi definido prioritariamente, surgiu ao longo dos quatro
(4) primeiros anos de atuação. O modelo final acabou sendo o de pilares, isto é, focos específicos
de desenvolvimento e bases comuns de suporte aos funcionários.

2
Figura 2: focos da Universidade Corporativa, desenvolvimento gerencial institucional, equipes de venda,
integração dos funcionários.desenvolvimento gerencial institucional e individual, políticas corporativas de T&D,
conhecimentos específicos, conhecimento de produtos.desenvolvimento gerencial institucional e individual,
gestão do conhecimento, essência da empresa, competências, pilar de consultoria e universidade de
vendas.desenvolvimento gerencial, pilares funcionais, gestão do conhecimento, essência da empresa,
responsabilidade social.2001200220032004. Fonte: desenvolvido pela autora para conferência de RH da
organização em 2003.

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A gestão da UC era realizada pelos profissionais de recursos humanos direcionados para a
área de desenvolvimento. Existia a parceria com instituições externas (acadêmicas ou
consultorias) para o desenvolvimento dos programas específicos e parceria com a área de
tecnologia para o suporte ao ambiente de gestão do conhecimento e de cursos mediados por
tecnologia. A estrutura consolidada de funcionamento da UC ficou como apresentada na figura 33.
O pilar liderança de negócios e de pessoas era direcionado ao grupo executivo (gerentes e
diretores) e a supervisão. Para o grupo executivo eram realizados encontros semestrais de trabalho
sobre planos de negócio (preparação e revisão). Esses planos se transformavam em planos
específicos que cada gestor conduzia com sua equipe e reportava em reuniões semanais de
acompanhamento. O grupo da liderança devia se envolver com as decisões de negócio e envolver
sua equipe nas execuções.
O modelo de competências era a base para os trabalhos formais de desenvolvimento deste
grupo de profissionais. Seminários específicos eram ministrados para essa população pela FGV
(Fundação Getúlio Vargas), cursos de extensão ou mestrado fornecidos sob demanda e, alguns
executivos participavam do programa de desenvolvimento corporativo nos EUA com parceria da
Wharton School of University of Pensilvânia. Liderança de pessoas era uma competência
priorizada em função da evolução cultural da organização. Além de um processo corporativo com
o conceito de Motivação e Liderança Eficaz desenvolvido com consultoria parceira, processos de
coaching eram fornecidos a pessoas que sentissem necessidade e vissem a utilidade desta
ferramenta. Partia-se, também, do pressuposto que boa liderança de pessoas é realizada a partir de
um preparo individual. O programa Os sete hábitos das pessoas eficazes do Covey Institute foi o
suporte ao preparo individual adotado.
A universidade de vendas foi estruturada em função de demandas críticas do negócio: a
área de vendas estava dispersa por todo o país, atuando na venda direta; os produtos tinham
atualização freqüente e, novos produtos (em diferentes formatos) eram lançados como estratégia
de consolidação da empresa no mercado.
A solução encontrada foi à aprendizagem mediada por tecnologia. Cursos em formato eletrônico
deveriam ser realizados pelos vendedores e, em reuniões semanais, os supervisores de vendas
faziam o acompanhamento do processo de aprendizagem e amarravam os conteúdos a metas e
processos de trabalho. Além disso, convenções anuais de vendas ajudavam a manter o
comprometimento dos profissionais além de possibilitar uma comunicação única, fundamental em
grandes equipes. Para a supervisão de vendas, workshops trimestrais ajudavam na sua formação
de agente de negócio e gestor de pessoas.
O currículo da área de atendimento especializado foi desenvolvido para auxiliar o
desenvolvimento dos profissionais que prestavam assessoria a clientes, um dos negócios da
empresa. Advogados, contadores, muitos com títulos de mestres e doutores, realizavam assessoria
legal e tributária via telefone ou em reunião de trabalho. Não só era preciso conhecimento
profundo dos assuntos, mas também empatia, capacidade de análise de problemas e habilidades de
comunicação. Em função do alto grau de preparo destes profissionais, foi elaborado um modelo
centrado neles próprios: eram os consultores-tutores.
Um novo consultor recebia uma integração de três meses para iniciar os trabalhos. A partir
daí, um processo de aprendizagem diário era estabelecido. Ciclos de leitura, palestras e discussão
dos conteúdos eram coordenados pelos consultores mais experientes. Temas comportamentais
eram facilitados por entidades externas. O espaço de aprendizagem também era ocupado com
projetos desenvolvidos pelos próprios profissionais da área para solução de questões críticas
identificadas. A grade mensal de aprendizagem era discutida entre a UC e a área de consultoria.
O pilar de competências funcionais abordava todos os profissionais não atendidos pelos
pilares anteriores. Os profissionais realizavam atividades para autodesenvolvimento. Estas
atividades podiam ser: cursos e-learning disponibilizados pela empresa; seminários de gestão de

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Figura 3: modelo de funcionamento da Universidade Corporativa.

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projetos ou sobre o processo produtivo ou cursos específicos em entidades credenciadas. Para
participar desses cursos específicos, os funcionários negociavam com seu gerente e com a UC.
Um aspecto inovador era que, a empresa era parceira no investimento em 50%, mas atuava com
parceria decrescente, isto é, no início do curso pagava 25% e, de forma crescente, realizava sua
parceria de 50%. Com isso, entendia-se a real disposição ao aprendizado por parte do funcionário.
Também fazia parte do processo de desenvolvimento individual o Learning Center, um
espaço físico com vários recursos: livros de gestão ou ficção, DVDs, produtos próprios e de
concorrentes, acesso a computadores e mesas de estudo ou trabalho. A proposta era sinalizar ao
funcionário a valorização da busca pelo aprendizado e do desenvolvimento.
A gestão do conhecimento era realizada de forma aplicada. Uma plataforma global para depósito
e busca de conhecimento era utilizada, mas para facilitar a adaptação das pessoas a esta nova
filosofia, utilizava-se a plataforma como suporte a projetos. Alguns projetos multifuncionais
foram realizados com a parceria de equipes em outras localidades do mundo. A plataforma de
gestão do conhecimento bem como o recurso de teleconferência servia para criar grupos virtuais
de trabalho.
A gestão do conhecimento era uma filosofia tratada além do suporte tecnológico. Reuniões e
fóruns de discussão eram propostos para debater temas ou projetos em andamento como forma
de aumentar as possibilidades de aprendizagem e desenvolver competências individuais.
A essência empresarial funcionava como base para o comprometimento dos funcionários. Além
do processo de integração do novo funcionário várias outras iniciativas eram realizadas para
discutir e consolidar valores e celebrar as conquistas. Duas atividades merecem destaque: a
gincana da solidariedade que desenvolvia equipes de trabalho através da arrecadação de itens para
entidades carentes e a celebração de valores – reconhecimento trimestral de processos ou projetos
em grupo que reforçasse um valor empresarial elegido pela UC.

4.5. As práticas didáticas utilizadas na gestão da UC traziam o resultado esperado?


Em termos de planejamento e definição de conteúdo, pode-se dizer que o processo tinha
consistência e aderência a estratégia do negócio. A comunicação deste processo também era
realizada extensivamente. Porém, nem sempre, os profissionais compreendiam, uma vez que
ainda tinham em mente um modelo de treinamento focado nas necessidades individuais de cada
um.
Com relação a técnicas e recursos de ensino, o modelo da UC era bastante completo,
valorizando as mais variadas técnicas. Percebia-se que, quanto mais baseado no
autodesenvolvimento, menos eficaz era o processo de aprendizagem. A cultura da empresa ainda
não estava consolidada favorecendo o processo de autocontrole. Na área de vendas, embora o
modelo de negócio seguisse para produtos on-line, a pré-disposição dos profissionais para se
engajarem nos cursos mediados por tecnologia, muitas vezes era pequena, prejudicando inclusive
resultados empresariais.
Favorecia-se a aplicabilidade do aprendizado e as correlações entre aprendizado e uso na
prática. O aluno, muitas vezes, não valorizava a oportunidade de aprendizagem e não entendia que
sua sobrevivência no mundo corporativo dependia de sua disponibilidade para novas experiências
e da atualização ou desenvolvimento de novas competências.
Um grande desafio da UC era a sensibilização dos gestores para seu papel de educador.
Poucas vezes eles valorizavam o papel de líder de projeto, tutor ou palestrante. O gestor educador
era um papel que poucos desenvolviam, dependendo de seu estilo pessoal. A falta de cobrança
formal em avaliações de desempenho talvez dificultasse a apropriação deste novo papel por parte
destes líderes.
Em termos de avaliação, sempre se tinha a avaliação de reação dos programas e no caso da
consultoria fazia-se a avaliação de aprendizagem. Com relação ao comportamento, as avaliações
individuais de desempenho tentavam cumprir este papel. Quanto ao resultado, para questões mais
operacionais como atendimento ao cliente na consultoria ou efetividade de conversão de vendas, o
processo de avaliação era realizado e apontava para resultados positivos. Quando se tratava de
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liderança ou questões mais ligadas a mudanças de comportamento, o processo não era
formalmente medido e talvez, pouco valorizado. Ainda havia muito por fazer em termos de
avaliação.
Em termos gerais, conclui-se que a UC estava alinhada aos sete princípios de sucesso
da educação corporativa, mais desenvolvida em alguns (competitividade, perpetuidade,
disponibilidade, cidadania e parceria) e ainda caminhando de forma embrionária nos outros
(sustentabilidade e conectividade). No que se refere às questões táticas de técnicas e recursos,
ou mesmo de planejamento e atenção ao conteúdo, a UC apresenta boas práticas didáticas.
Questões críticas e estratégicas como o papel dos gestores e alunos, fundamentais para o
sucesso do modelo ainda deixavam a desejar. Muito se tinha a percorrer na sensibilização do
aluno (fruto do processo de mudança cultural) e no desenvolvimento do gestor educador.

5. Reflexões sobre práticas didáticas na Educação Corporativa


A UC é somente um exemplo do que acontece nas Universidades Corporativas. Em seu
livro Educação Corporativa no Brasil: mitos e verdades, Éboli (2004) reporta mais 21 casos de
universidades corporativas com alguns de seus programas e recursos. Pode-se inferir novamente
que questões táticas podem estar bem equacionadas. Nestes relatos, a questão dos papéis de
líderes e aprendizes não é abordada. Assim, como na academia, parece crítica o desenvolvimento
dos novos papéis no processo de educação, tanto o de educador e educando, quanto o de gestor e
funcionário, requeridos pela modernidade.
No caso da corporação, delegar a função de educador para um instrutor ou professor
contratado minimiza os ganhos de mudança sustentada de comportamento. O profissional também
precisa entender que a educação é um processo contínuo, demandante e que ele é o ator principal
deste processo. Por melhor equacionadas que estejam às questões táticas nas práticas didáticas
corporativas, elas não conseguem sozinhas, sustentar um bom modelo educacional.
Éboli (2005) reforça vários papéis que o líder na corporação deve ter com relação à educação
corporativa. Além de visionário, patrocinador e controlador do processo, ele deve atuar como
especialista desenvolvendo novos programas com seu conhecimento específico. Também deve
atuar como professor nos programas educacionais e ser um eterno aprendiz demonstrando vontade
de aprender, sensibilizando os demais. O papel de comunicador constante das vantagens do
processo de aprendizagem contínua reforça os anteriores.
Não adianta a boa técnica se os atores principais não estiverem alinhados e focados na
aprendizagem contínua.

6. Considerações Finais
A educação corporativa veio para ficar e estabelecer parceria com a academia no processo
de educação continuada. Pode ser que práticas didáticas no nível tático estejam sendo bem
utilizadas contribuindo para a melhoria do processo de aprendizado. No caso destas práticas, pode
até ser que a universidade corporativa seja mais rica do que a academia, em função da
possibilidade de aplicação imediata do aprendizado.
Porém, muito pouco se investiga sobre o desempenho dos principais atores: o gestor e os
funcionários. Sem a devida sensibilização e valorização dos papéis, em especial o do gestor, os
benefícios deste processo de educação não serão maximizados.
Novas pesquisas devem ser realizadas focalizando as práticas didáticas e, em especial,
analisando o desempenho dos gestores em seus vários papéis para se chegar a uma visão mais
conclusiva sobre o bom desempenho didático da universidade corporativa.
Se a educação é a base do desenvolvimento e ela serve para mobilizar as pessoas em busca
do desenvolvimento, não adiantam só os recursos. È fundamental a sensibilização, engajamento e
comprometimento dos atores para o desenvolvimento sustentado das nações.

Referências Bibliográficas
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DORMI ALUNO (A)... ACORDEI PROFESSOR (A): INTERFACES DA


FORMAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DO ENSINO SUPERIOR

CUNHA, Ana Maria de Oliveira – UFU-anacunha@rapidanet.com.br


BRITO, Taita Talamira Rodrigues – UFU-taita@uesb.br
CICILLINI, Graça Aparecida – UFU-cicillini@com4.com.br
GT: Políticas de Educação Superior / n. 11
Agência Financiadora: CNPQ

DORMI ALUNO (A): DIALOGANDO COM AS BASES DA PESQUISA

O ensino superior no Brasil pode ser considerado como algo recente se comparado a
história da universidade no mundo, principalmente nos países da Europa que já vivenciaram
essa realidade desde o final do século XII. Mas, ao mesmo tempo em que este ensino é
recente, ele tangencia crises que são características da realidade do ensino superior de uma
maneira geral, inclusive para aqueles países onde a tradição desse nível de ensino é uma
característica marcante, como é o caso da Espanha, França, Inglaterra e Alemanha. O
questionamento sobre a finalidade da universidade – sua crise de identidade, a dicotomia entre
sua função de profissionalizar e produzir conhecimento, a crise de autonomia perante o
estado, a sua organização interna perante às demandas externas são alguns dos elementos que
independente do tempo de vida das instituições se fazem presentes no cotidiano de cada uma
delas. O sistema de formação superior público brasileiro, desde seus primeiros passos,
inaugurou uma série de desafios para se legitimar perante a sociedade. Nascido de iniciativas
privadas e isoladas, ele passa a fazer parte do cenário público num período de uma era
populista e de lá para cá vem enfrentando vários desafios para se manter como um bem
público e a serviço da Ciência e do Desenvolvimento Social. Para Chamilian, em estudo
apresentado em 2003, o ensino superior no Brasil apresenta-se hoje com uma estrutura de
proporções consideráveis, se formos comparar à sua realidade de 40 anos atrás. Esse aumento
de oferta ocorreu especialmente pela atuação majoritária da iniciativa privada, que viu no
ensino superior um mercado lucrativo a ser explorado. O poder público, por sua vez, tendo
alcançado o momento forte de expansão na década de 60 e na primeira metade dos anos 70,
retraiu os investimentos para a oferta de vagas e cursos de graduação e concentrou sua ação
no investimento à pesquisa, favorecendo a implementação de cursos de pós-graduação. Essa
falta de incentivo à graduação, se deu pelo desinteresse do governo militar pela formação
profissionalizante do ensino superior devido ao seu interesse na ampliação da formação
técnica secundária – mais popular e com retorno financeiro mais rápido para a nação.
O investimento do setor privado no ensino superior trouxe, segundo Pimenta e
Anastasiou (2002), um aumento do número de docentes, que no período de 1950 a 1992,
passou de 25 mil para um milhão, numa ordem de 40 vezes mais o número de docentes que
ora existiam. Essa explosão de professores acarreta, dentre outras coisas, a ausência de uma
compreensão mais complexa sobre as origens desse professor universitário, o que pensa,
como interage no seu espaço profissional consigo e com os seus pares. Isso porque, os
professores em sua maioria são oriundos dos mais variados cursos, distantes, diga-se de
passagem, de uma preparação para a vida acadêmica que a universidade exige. O convívio
com essa realidade tem suscitado vários debates e trabalhos de pesquisa sobre esse
personagem que atua na formação superior em nosso país. Entre os anos de 2003 a 2005
através de financiamento do CNPq, um projeto de pesquisa intitulado “Desenvolvimento
profissional e docência universitária: entre saberes e práticas” foi desenvolvido por um grupo
de pesquisadoras do Núcleo de Saberes e Práticas Educativas – NUPESPE, tendo como
objetivo investigar como o docente universitário desenvolve-se profissionalmente, que
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saberes e práticas envolvem sua atuação, ou seja, quem são, o que pensam e o que sabem
fazer os profissionais que atuam no contexto da Universidade Federal de Uberlândia. Para
tanto, o olhar dos investigadores pautou-se na figura e fala desses profissionais para,
inicialmente, desvelar pontos relacionados à sua visão de competência profissional frente às
limitações e às condições de trabalho e, a seguir, focalizar seus fazeres educativos.
O trabalho foi realizado com docentes universitários em efetivo exercício e integrantes
da carreira do magistério superior, que passaram a configurar o universo de sujeitos desta
investigação. Os colaboradores, que atuam em 33 cursos de graduação oferecidos pela UFU
(bacharelados e licenciaturas), foram reunidos por área do conhecimento, conforme
classificação do CNPq. Para a obtenção dos dados, foram utilizadas fontes primárias da UFU;
questionários visando à coleta de informações sobre identificação, formação acadêmica,
atividades profissionais e culturais dos docentes; entrevistas semi-estruturadas. Para um total
de professores de 889 efetivos, foram distribuídos 869 questionários, tendo sido recolhidos
368. As informações obtidas por meio dos questionários foram tabuladas e submetidas a
tratamento estatístico. As entrevistas, realizadas por amostragem num total de 37, foram
transcritas e categorizadas em dois grandes blocos: a formação e a prática docente. Para a
análise, os grupos que constituem as oito áreas do conhecimento foram reorganizados em três
grandes áreas. O primeiro grupo reuniu as Áreas de Ciências Exatas e da Terra e das
Engenharias; o segundo grupo reuniu as Áreas de Ciências Biológicas, da Saúde e Agrárias; e
o terceiro agrupou as Áreas de Ciências Sociais Aplicadas, Humanas e a Área de Lingüística e
Artes. Este artigo tem como propósito apresentar dados referentes as áreas de Ciências
Biológicas, da Saúde e Agrárias enfocando questões relacionadas à formação inicial e
continuada de seus professores com a finalidade de discutir as nuanças dessa formação
anunciada em seus depoimentos. Nesse grupo, foram distribuídos 328 questionários, tendo
sido recolhidos 140 respondidos. Para as entrevistas selecionou-se 16 docentes que se
encontravam em diferentes níveis da carreira universitária (auxiliar de ensino, assistente,
adjunto e titular), do sexo feminino e masculino, e que possuíam formação inicial
diferenciada.
Através de entrevistas orais temáticas semidiretivas, foram registrados os depoimentos
dos professores. As fontes orais representam uma possibilidade real de troca de experiências,
de diálogo, de registro, preservação e crítica da prática docente. Esperamos que reflexões
advindas da análise desses dados possam contribuir para a definição de políticas institucionais
voltadas para a formação do professor universitário, mediante apresentação de propostas que
de fato respeitem as peculiaridades e singularidades da formação para o ensino superior. A
formação do professor universitário tem possibilitado vários debates sobre as condições pelas
quais esses atores ingressam na carreira acadêmica. Dos aspectos que vem sendo apontados
nos trabalhos em torno da temática, como a formação desse profissional, a prática docente, a
carreira, a história de vida profissional e as políticas públicas sobre tal profissão, a formação é
o aspecto que, nesse momento para nós, tem suscitado maiores reflexões. Isso devido ao
contexto no qual os professores universitários são/não são preparados para o exercício de sua
profissão. A carreira docente instituída na academia brasileira, supõe quatro níveis iniciais de
formação para o ingresso e progressão na vida acadêmica: o professor Auxiliar, o Assistente,
o Adjunto e o Titular. O primeiro na condição de possuir apenas a graduação (em alguns
casos uma especialização); o segundo, o título de mestre e o terceiro o título de doutor, e o
último além do doutorado, necessita ter uma vasta produção para sua titularidade. Nessa
organização, percebemos que a primeira condição para o ingresso no magistério superior é a
formação inicial numa área específica do conhecimento. Isso implica afirmar que a
universidade propõe para além da formação para a profissão liberal ou a licenciatura para a
Educação Básica, a formação para o engajamento na carreira acadêmica – o que nos remete a

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uma outra questão: os cursos formam, ou tem tido a pretensão de formar professor para o
retorno desses formandos docentes?
Aparentemente não. E as causas podem repousar em diversas variáveis. Segundo
Nogueira (1989) uma das causas dessa realidade pode estar associada à reforma universitária
de 1968 que estabeleceu como princípio norteador, para o desenvolvimento da Universidade
brasileira, a indissociabilidade entre ensino e pesquisa. Este princípio, formal e obrigatório,
acabou por transformar todos os professores universitários em professores pesquisadores.
Com a implementação dos cursos de pós-graduação, procura- se oferecer uma das vias pelas
quais esse tipo de professor pesquisador poderia ser formado. Argumenta-se, então, que tais
cursos teriam como objetivo a formação do professorado competente para atender à expansão
do ensino superior, assegurando, ao mesmo tempo, a elevação dos níveis de qualidade. De
fato, no que diz respeito às Universidades, e também a muitas instituições isoladas de ensino
superior, os cursos de pós-graduação tornaram-se, de lá para cá, a principal fonte de formação
do professorado do ensino superior. É com esse caráter que se recomenda, por exemplo, a
criação da disciplina Metodologia do Ensino Superior como uma disciplina pedagógica na
pós-graduação. Mas, paralelamente, estes cursos têm também como objetivo o estímulo ao
desenvolvimento da pesquisa científica, por meio da preparação adequada de pesquisadores
(CHAMLIAN, 2003), objetivo esse que acaba sendo a principal meta da pós-graduação.
Mais recentemente, no início de 1999, visando a formação de professores para o
ensino superior, uma medida adotada pela Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de
Nível Superior (CAPES), tornou obrigatório o estágio supervisionado na docência como parte
das atividades dos bolsistas de mestrado e de doutorado sob sua tutela, apontando para a
necessidade de alguma formação de caráter pedagógico para aqueles que, realizando cursos de
pós-graduação, tem na atividade docente em nível superior um campo de trabalho possível. A
quase ausência da formação pedagógica para o professor do ensino superior vem delegar um
peso muito grande ao papel da experiência na constituição da prática docente do profissional
que atua nesse nível de ensino. Pimenta e Anastasiou (2002) participam da opinião de que os
professores, quando chegam à docência na Universidade, trazem consigo inúmeras e variadas
experiências do que é ser professor. Experiências que lhes possibilitam dizer quais eram bons
professores. Espelham-se nos professores que foram significativos em suas vidas, isto é, que
contribuíram para a sua formação pessoal e profissional. Na maioria das vezes não se
identificam como professores, uma vez que olham o ser professor e a Universidade do ponto
de vista do ser aluno. O desafio, então, que se impõe é o de colaborar no processo de
passagem de professores que se percebem como ex-alunos da Universidade para ver-se como
professor nessa instituição. Isto é, o desafio de construir a sua identidade de professor
universitário, para o qual os saberes da experiência não bastam. Sobre o rito de passagem de
aluno a professor da Universidade, Tardif, Lessard e Lahye (1991) consideram que no
exercício cotidiano de sua função, o professor defronta-se com vários limites concretos que
não são previsíveis e passíveis de uma definição acabada.
O docente desenvolve então, habilidades pessoais, tais como capacidade de
improvisação, macetes, gestos, atitudes e estilos que possibilitam vencer as barreiras e
construir uma maneira própria de ensinar. Para Tardif, (2002), os saberes do profissional
docente que servem de base para o ensino provêm de diferentes fontes, tais como: a formação
inicial e continuada de professores, do currículo e do espaço do conhecimento das disciplinas
a serem ensinadas, da experiência na profissão, da cultura pessoal profissional, da
aprendizagem com os pares, entre outras. No processo de ensinar e de aprender, considera que
cabe ao professor o papel central, visto que mobiliza e produz saberes durante o exercício de
sua profissão. Para isso, deve ter a capacidade de saber adequar-se metodologicamente, vendo
o ensino não de forma meramente técnica, mas como um conhecimento em processo de
construção. Como cada professor possui uma bagagem de conhecimentos advindos de um
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processo individual de construção, de formação e de desenvolvimento profissional, esta
influencia o seu fazer pedagógico e manifesta-se em significados distintos no ato de educar.
Sobre o saber da experiência Candau (1997) afirma que o professor dialoga com as disciplinas
e realiza sua prática. Dessa forma os saberes da experiência fundam-se no trabalho cotidiano e
no conhecimento de seu meio. São saberes que brotam da experiência e são por ela validados.
Incorporam-se à vivência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de
saber fazer e de saber ser. Se antes a profissão de professor calcava-se no conhecimento
objetivo, no conhecimento das disciplinas, em muito semelhantes às outras profissões, hoje,
apenas dominar esse saber é insuficiente, uma vez que o contexto das aprendizagens não é
mais o mesmo. Imbernóm (2001) afirma que hoje a atividade de ensinar requer uma nova
formação inicial e permanente, pelo fato de o educador dever exercer outras funções, tais
como a motivação, a luta contra a exclusão social, participação, animação de grupo, relações
com estruturas sociais e com a comunidade. Frente a esta nova imposição, pensar a formação
do professor enquanto apropriação profissional supõe a combinação de diferentes estratégias
de formação e uma nova concepção do papel do professor, o que não pode ser feito sem o
envolvimento concreto dos docentes. A produção e a apropriação profissional do professor
supõem mais do que um curso preparatório, visto que os conhecimentos adquiridos em um
curso de formação inicial são insuficientes para que ele desempenhe satisfatoriamente suas
tarefas no âmbito escolar.
Conforme Pimenta; Anastasiou (2002), nos processos de formação de professores, é
preciso considerar a importância dos saberes das áreas de conhecimento (ninguém ensina o
que não sabe), dos saberes pedagógicos (pois o ensinar é uma prática educativa que tem
diferentes e diversas direções de sentido na formação do humano), dos saberes didáticos (que
tratam da articulação da teoria da Educação e da teoria de ensino para ensinar nas situações
contextualizadas), dos saberes da experiência do sujeito professor (que dizem do modo como
nos apropriamos do ser professor em nossa vida). Esses saberes se dirigem àssituações de
ensinar e com elas dialogam, revendo-se, redirecionando-se, ampliando-se e criando. No
entendimento das autoras acima citadas, a construção da identidade com base numa profissão
inicia-se no processo de efetivar a formação na área. Assim, os anos passados na
Universidade já funcionam como preparação e iniciação ao processo identitário e de
profissionalização dos profissionais das diferentes áreas. Quando passam a atuar como
professores no ensino superior, no entanto, fazem-no sem qualquer processo formativo e
mesmo sem que tenham escolhido ser professor. Se for oriundo da área da Educação ou
Licenciatura, teve oportunidade de discutir elementos teóricos e práticos relativos à questão
do ensino e da aprendizagem, ainda que direcionado a outra faixa etária de alunos, com
objetivos de formação, diferenciados da formação profissional universitária. Todavia, como
ocorre na maioria dos casos, sendo de outro quadro profissional, trará consigo um
desempenho desarticulado das funções e objetivos da Educação Superior.
Sobre essa questão, Fernandes (1998) discute que é interessante registrar que para
trabalhar na escola básica e no ensino médio, exige-se a formação pedagógica, mas o
professor que atua no ensino superior não precisa desse saber, que por sua vez, é legitimado
pela Universidade na existência dos cursos de Licenciatura, uma contradição que se gesta na
própria concepção de conhecimento e Ciência que funda seu projeto sóciopolítico-cultural. A
ausência de conhecimentos na chamada área das Ciências humanas e sociais que auxiliariam o
professor a compreender e interpretar suas práticas empobrece o projeto sócio político cultural
vigente na Universidade. Essa carência que poderia ser resolvida na pós-graduação, não o é,
pois nesse espaço, prioriza-se a formação do pesquisador. Dessa forma, a formação do
professor de ensino superior está assentada na pesquisa, conforme os padrões de qualidades
determinados pela pós-graduação stricto sensu. Os programas de doutorado e mestrado são
configurados numa forma que privilegia a especialização, numa ênfase ao conhecimento e
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numa preparação para a pesquisa. Fernandes (1998) analisa que não se trata de negar a
importância da pesquisa para o aprofundamento de seu campo científico, mas sim de situá-la
em sintonia e interpenetração com outras dimensões, tão necessárias e complexas para
construção da identidade do ser professor. Ainda são poucos os estudos que têm sido feitos
sobre a formação pedagógica e a prática cotidiana do professor universitário. Esse fato, de
certa forma, revela o pouco valor dado à formação pedagógica desse professor. Nessa lógica,
o professor vem fazendo sua formação de pós-graduação, construindo uma competência
técnico-científica, reconhecida e legitimada pelos seus pares e alunos. No âmbito
institucional, acredita-se estar contemplada a formação pedagógica pelo fato de, no curso de
Pós-graduação, haver uma disciplina da área pedagógica.

ACORDEI PROFESSOR (A): DANDO VOZES AOS SUJEITOS

Nas entrevistas os professores abordaram sobre sua formação enfocando: a opção pela
docência, as influências sofridas, sua trajetória profissional, sua formação inicial que suscitou
questões como a carência da formação pedagógica e ainda a formação para a docência na pós-
graduação. Alguns entrevistados mencionaram a aprendizagem advinda da experiência.
Abordaram ainda sobre o que é ser professor, e apontaram os conhecimentos necessários para
exercer a docência, onde enfatizaram a necessidade de atualização que traz para a discussão a
formação continuada. Esses diversos aspectos serão ilustrados pelos depoimentos dos
professores e discutidos com base nas leituras realizadas. Embora tenhamos recolhido um rico
e representativo material empírico, em função do espaço disponível para o artigo, iremos
apresentar apenas uma amostra do material coletado. Sobre a opção profissional, é
interessante observar, que enquanto alguns passaram a exercer a profissão docente, como
decorrência de suas atividades de pesquisa, como alunos na pós-graduação, outros decidiram
ser professor universitário, ainda na graduação, entretanto, enfatizam que nunca pensaram em
atuar no ensino básico. Em suas palavras:

A partir do momento que eu comecei o curso de Biologia, assumi que não ia


ser professora de Biologia no ensino fundamental ou médio. A minha opção
era ser professora universitária, principalmente pelo vínculo que existe
entre o ensino e a pesquisa e eu gosto da pesquisa, eu gosto da formação de
pesquisador, então, a minha meta era essa, desde o momento que eu assumi
que ia ser professora. Se eu não tivesse sido professora universitária, eu
teria sido frustrada.

Os professores, quando chegam à docência na Universidade, trazem consigo inúmeras


e variadas experiências do que é ser professor (PIMENTA e ANASTASIOU, 2002;
CANDAU, 1997; TARDIF, 2002). Essas experiências que muitas vezes guiaram sua opção
profissional, vão guiar suas escolhas pedagógicas e até mesmo seu relacionamento com os
alunos. Os entrevistados falaram das influências positivas em sua carreira e destacaram a
importância da escola pública em sua formação, conforme suas avaliações:

Não tive influência da família não, mas do ensino médio sim, onde tive bons
professores. Eu tive grandes privilégios, venho daquele ensino público de
qualidade estudei em escola pública a minha vida inteira, na minha época
ainda era grupo escolar, ginasial e colegial. Naquela época, a escola
pública era excelente. Oriento-me na Didática dos professores, nas aulas
que me mantinham atentas, nas ferramentas que utilizavam, são essas que
eu busco imitar, com certeza.

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Quando os entrevistados falaram de sua trajetória, alguns elementos comuns puderam
ser identificados, tais como: afinidade com a atividade docente, aulas em cursinhos, para se
manterem enquanto estudantes universitários, envolvimento com professores na faculdade,
pós-graduação, oportunidade de prestar concurso.

Minha história com o ensino vem desde o primário, sempre tive facilidade
de ajudar os colegas. Eu já fazia alguma coisa no quadro explicando para
os alunos, na ausência do professor. Depois durante a graduação eu dei
aulas no cursinho como uma forma de auto-sustentação e depois convivendo
aqui na Universidade, com professores, vendo a carreira, já desenvolvendo
alguns trabalhos com eles, eu fui ficando cada vez mais ligado com a área
docente, o que contribuiu para meu aproveitamento durante a graduação.
Surgiu a oportunidade, eu fiz o concurso e estou há mais de quinze anos na
carreira.

Pérez Gómez (1995) questiona a idéia de que a formação inicial tenha como produto,
um profissional pronto para atender às necessidades concretas da sala de aula. Corroborando
essa idéia, foi uníssono na voz dos professores, que a formação inicial não dá conta da
complexidade da atividade docente, e que o desenvolvimento profissional carece de
mecanismos de formação continuada. Sobre a formação inicial e continuada, os professores se
manifestaram destacando a carência da formação pedagógica, mesmo nos cursos de
licenciatura. Nesse sentido é possível afirmar que a universidade não considera a
possibilidade de seu aluno voltar como professor?

O docente universitário não se prepara para ser docente universitário, ele


se prepara para ser pesquisador, para o trabalho docente não existe uma
preparação, na maioria dos cursos. Eu ainda acho que na nossa carreira,
na área de Biologia, têm até um pouquinho dessa formação, tem um
pouquinho de instrumentação, você sabe um pouquinho, você sabe planejar,
você tem um pouquinho de formação pedagógica de estrutura didática,
agora, você vê, as engenharias, a Medicina que são professores que
formaram num curso exclusivamente de Bacharelado, eles não têm nenhuma
formação, no sentido de ser um professor.

A consciência da necessidade da preparação pedagógica ficou evidente nas entrevistas,


bem como a ausência dessa formação na graduação e na pós-graduação. Na maioria das
instituições de ensino superior, incluindo as Universidades, embora seus professores possuam
experiência significativa e mesmo anos de estudos em suas áreas específicas, predomina o
despreparo e até um desconhecimento científico do que seja o processo de
ensino/aprendizagem, pelo qual passam a ser responsáveis a partir do instante em que
ingressam na sala de aula. Geralmente os professores ingressam em departamentos que atuam
em cursos aprovados, em que já estão estabelecidas as disciplinas que ministrarão. Aí
recebem ementas prontas, planejam individual e solitariamente. Os resultados obtidos, não
são objeto de estudo ou análise individual no curso ou departamento. Não recebem qualquer
orientação sobre processos de planejamento, metodológicos ou avaliatórios, não tem de
prestar contas, fazer relatórios, como acontece normalmente nos processos de pesquisa, estes,
sim, objeto de preocupação e controle institucional (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002).
Continuando essa análise, as autoras avaliam que os pesquisadores dos vários campos
do conhecimento (historiadores, químicos, filósofos, biólogos, cientistas políticos, físicos,
matemáticos, artistas, etc) e os profissionais das várias áreas (médicos, dentistas, engenheiros,
advogados, economistas, etc.) adentram o campo da docência no ensino superior como
decorrência natural dessas suas atividades e por razões e interesses variados. Se os professores
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trazem consigo imensa bagagem de conhecimentos nas suas respectivas áreas de pesquisa e de
atuação profissional, na maioria das vezes nunca se questionaram sobre o que significa ser
professor. Do mesmo modo, as instituições que os recebem já dão por suposto que o são,
desobrigando-se, pois, de contribuir para torná-los. Assim, sua passagem para a docência
ocorre naturalmente, dormem profissionais e pesquisadores e acordam professores! Não sem
traumas nem sem, muitas vezes, ocasionar danos aos processos de ensino e aos seus
resultados. Os docentes ilustram a falta de formação pedagógica apontando algumas saídas,
entre as quais a formação continuada, que deveria incluir cursos de Metodologia do Ensino
Superior para os professores recém contratados, bem como para os antigos.

Falta uma formação pedagógica para o docente, nós temos dificuldades, a


gente às vezes acaba aprendendo mais na experiência, e isso não é o
correto. A gente teria que ter alguma formação pedagógica com
profissionais da Pedagogia. Esse deveria ser um dos focos do mestrado. O
problema da pesquisa é importante, mas eu acho que o mestrado deveria ter
um foco grande na formação docente. O aluno deve aprender a pesquisar, a
desenvolver pesquisa, mas não a fundo ainda, o que deve acontecer no
doutorado. Um curso de Metodologia do Ensino Superior por mais esquisito
que possa ser, é muito importante, principalmente aqui onde nós nos
formamos em Medicina e vamos ser professor. O fato de ser um bom médico
não garante que você seja um bom professor e vice-versa. À medida que
você estuda com mais profundidade e reflete o seu papel, muita coisa muda.

A expectativa de que a formação para a docência será realizada na pós-graduação


stricto sensu vem provocando um aumento significativo da demanda por esses cursos e o
crescimento de sua oferta, especialmente na área da Educação, uma vez que se nota uma
ausência da formação para a docência superior nos programas de pós-graduação das demais
áreas. Por outro lado, a não exclusividade da formação nesse nível, expressa na lei, tem
provocado um crescimento da oferta de cursos de pós-graduação lato sensu (especialização)
ou mesmo a introdução neles da disciplina denominada Metodologia do Ensino Superior ou
Didática do Ensino Superior, especificamente voltada à formação docente (PIMENTA;
ANASTASIOU, 2002). A idéia de que a preparação para o exercício do magistério superior
far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado
não se concretiza na prática, como testemunha o discurso dos entrevistados, pautado em suas
experiências.

Acho que infelizmente o mestrado principalmente na área de biológicas, não


te prepara para ser professor. Acredito que saí da faculdade mais ou menos
pronta e quando eu fui fazer mestrado, aprendi a fazer pesquisa e uma série
de coisas e procedimentos laboratoriais, mas a formação acadêmica para
ser professor, eu não tive no mestrado não. E isso é um contra-senso, é um
mestrado e você sai, não tem didática, não tem uma situação real enquanto
aluno de mestrado não, você dorme aluno e acorda professor. Então você
não tem um preparo, uma experiência de assumir uma turma durante o
mestrado. O mestrado deu-me mais maturidade em relação a saber conduzir
os experimentos, orientar aluno, mas no convívio na sala de aula, isso não.
Na Universidade você não é só professor, você é pesquisador e tem que
fazer uma série de outras coisas. Então nessa parte de formação, que não
seja didática, foi muito importante o mestrado. Doutorado resolve isso, não.
Não tem nada, nenhum preparo em Ciências Biológicas, no sentido de
preparar um docente para o ensino superior.

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A falta de qualquer vivência em ensino, que fuja de suas atividades como aluno, vem
ocasionar uma experiência, que pode refletir de forma negativa na constituição do ser
professor. Um zelo da Universidade, com seus futuros docentes, poderia se concretizar, na
forma de uma preparação para os iniciantes, que envolvesse além de aspectos particulares da
realidade da Instituição, uma preparação pedagógica. Os docentes falaram de sua experiência
de enfrentar a situação de ensino, sem nenhuma preparação prévia.

Uberlândia ofereceu vagas para 43 novos docentes, e fez concurso nas suas
várias áreas. Então a gente imagina que seria interessante para esses
docentes que estão entrando, uma capacitação que mostrasse aspectos da
formação, do planejamento, do conteúdo, que mostrasse a ele um pouco da
história da instituição, um pouco da dinâmica do seu grupo de trabalho e
um pouco de Metodologia do Ensino Superior em termos gerais. Acho que
na hora de capacitar pra docência tinha que ser a Pró Reitoria de
Graduação. Então acho que no caso especifico da UFU, seria fundamental
que a Pró Reitoria de Graduação junto com a Pró Reitoria de Recursos
Humanos, organizasse uma Educação continuada voltada para a qualidade
da docência, de técnicas, ou seja, lá o que for, para todos os professores
ingressantes, e aberto aos professores que já são efetivos, pra que esses
também pudessem se qualificar.

A importância do conhecimento pedagógico é lembrada pelos entrevistados ao elencar


os conhecimentos necessários para o exercício da atividade de ensinar, embora priorizem os
conhecimentos específicos. Se antes a profissão docente calcava-se no conhecimento objetivo,
no conhecimento das disciplinas, em muito semelhantes às outras profissões, hoje, apenas
dominar esse saber é insuficiente. Numa análise de Zabalza (2004), o perfil ideal do professor
universitário, em geral, remete à condição de pessoa com grandes conhecimentos em sua
disciplina, e que sabe explicá-los com clareza e convicção aos seus alunos. Entretanto outros
aspectos devem ser considerados. Nóvoa (1995) parte do princípio de que os professores,
independentemente do nível de ensino em que atuam, devem diagnosticar o contexto de
trabalho, tomar decisões, atuar e avaliar sua atuação, para reconduzi-las, no sentido adequado.
Fortalecendo essa discussão, Zabala (1998) aponta que para desenvolver a docência é preciso
dispor de marcos interpretativos e que a melhoria da prática educativa, assim como a melhoria
em qualquer ação humana, passa pelo conhecimento e pelo controle das variáveis que nela
intervem. E porque considera que o processo de ensino-aprendizagem seja extremamente
complexo, defende que os professores tenham à disposição e utilizem referenciais que os
ajudem a planejar avaliar e interpretar o que acontece na sala de aula. Em seus depoimentos,
os professores mostraram-se conscientes de todas essas implicações para o êxito da atividade
de ensinar.

Conhecimentos da docência, sem dúvida nenhuma, incluem conhecimentos


específicos e da parte pedagógica, eu realmente não consigo entender como
a gente poderia trabalhar para formar esse docente, mas eu acho que a
formação que está sendo feita nos cursos superiores não está formando nem
o docente do curso universitário nem o docente do ensino básico. Percebo
que existe uma grande deficiência na formação do professor, por falta de
visão social, formação geral, visão cultural, enfim, preocupação com a
sociedade.

Dentro da discussão dos conhecimentos necessários para exercer a docência a


necessidade de atualização, frente ao crescimento e mutabilidade do conhecimento científico,

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às mudanças de contexto, às novas necessidades da sociedade, foi lembrada pelos professores
como um objetivo importante e que exige dedicação e sacrifícios.

Se for pensar nos conhecimentos da área que você tem responsabilidade, é


claro que tem que ter toda a formação de terceiro grau, pós-graduação,
sempre tem que estar atualizando em termos de participação de eventos de
estar sempre lendo, pesquisando pra realmente esses conhecimentos serem
atualizados e sempre melhorados para que você possa formar o graduando
da melhor maneira possível. Mas é claro que não podemos ficar somente na
área especifica. Temos sempre que estar a par de outros assuntos porque
isso também faz parte da Educação. Para formar o aluno dentro da
concepção mais ampla, conhecimentos das áreas sociais, humanas, são
necessários, não basta a parte técnica, especifica. Você precisa estar sempre
muito atualizado naquilo que estiver ministrando. E é nos estudos de pós-
graduação que se busca essa atualização, é onde se adquire o hábito de se
manter atualizado.

A necessidade de atualização reforça a importância da formação continuada. Pacca


(1994) argumenta que todo profissional, qualquer que seja sua área de atuação, deve
aperfeiçoar-se ou atualizar-se, não só para manter-se em dia com as novas tendências que se
apresentam continuamente, como também para satisfazer exigências próprias de realização
pessoal. No mesmo sentido, Carvalho (1992) comenta que em toda profissão existe a
necessidade de aperfeiçoamento contínuo, pois a quantidade de novas informações geradas é
muito grande. Em educação, principalmente entre os professores que estão em sala de aula,
essa necessidade se faz premente. Essa constatação tem favorecido iniciativas que valorizam a
formação continuada ou em serviço, mediante cursos, seminários, disciplinas de pós-
graduação lato sensu, palestras, estágios, etc. No entanto, essas iniciativas não constituem
regra geral, pois há certo consenso de que a docência no ensino superior não requer formação
no campo do ensinar. Para ela, seria suficiente o domínio de conhecimentos específicos, pois
o que a identifica é a pesquisa e/ou o exercício profissional no campo. Mesmo porque, diz o
dito popular, “quem sabe faz” e “quem não sabe ensina” (PIMENTA; ANASTASIOU, 2002).

DORMINDO E ACORDANDO PROFESSOR (A): INTERFACES DA REALIDADE


DOCENTE

Discutir sobre o universo formativo do professor do ensino superior e levantar algumas


soluções a respeito dos problemas que circundam esse grupo, não tem sido tarefa fácil,
diríamos até que é paradoxal frente à realidade da Educação no Brasil. A forma como o
ensino superior tem sido apontado pelas políticas públicas Nacionais e Internacionais, sua
mercantilização, condicionam muitas vezes a conduta dos professores que assumem a
formação e a auto-formação na academia. O diálogo com as entrevistas e com o referencial
teórico permitiu-nos algumas considerações sobre como os docentes das áreas Agrárias,
Biológicas e da Saúde preparam-se para o exercício da docência. A formação acadêmica que
tais professores vêm recebendo não tem sido satisfatória. Isso porque na formação inicial,
assim como no mestrado e no doutorado, não existe uma preocupação para formação de um
docente que poderá vir assumir uma sala de aula universitária. O que vem sendo reverenciado
na formação, principalmente nos cursos stricto sensu é o ideal de pesquisador, pois na
formação inicial, a ênfase quando no ensino, é para atender à demanda da Educação Básica.
A consciência dos nossos sujeitos de pesquisa sobre a sua situação e dos demais
colegas, apontam para a idéia de que eles refletem sobre sua condição, e na ausência de
maiores referenciais teóricos, terminam por reconhecer e assumir práticas de seus antigos
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professores. Práticas assistidas e representadas nas suas ações como docentes. Isso porque
nesse mesmo quesito eles apontam que o engajamento em atividades de pesquisa na pós-
graduação, ou mesmo em projetos, enquanto aluno da graduação, foi na maioria das vezes o
responsável pela opção pela docência. “Dormi aluno (a) e acordei professor (a)”, é a frase
que, de certa forma, resume a situação de despreparo que os professores que atuam nas áreas
investigadas vivenciam na sua trajetória profissional, principalmente nas profissões liberais. A
interface dormir e acordar, representa também as possibilidades de diálogos que
podem/devem ser tecidas no fazer-se professor. A formação inicial da maioria dos professores
se deu através de instituições públicas, o que revela que o problema da formação está
justamente no lócus de exercício desses professores, dessa forma a solução também está na
prática política dentro das instituições. E é nessa ótica que muitos apontam a formação
continuada como uma possibilidade de se manter atualizado frente ao seu campo de
conhecimento, ou dialogar com aspectos pedagógicos que permeiam sua realidade
profissional que se tornam momentos tensivos frente a suas limitações formativas.

Assim, é consensual que a formação inicial não dá conta da complexidade que envolve a
atividade docente do professor do ensino superior, como também os cursos stricto sensu
posteriores a essa formação não ajudam a resolver esse problema. Um entrevistado chegou a
sugerir que a preocupação maior do mestrado deveria ser a formação do professor para o
ensino superior e não a formação do pesquisador na área específica, a qual poderia acontecer
no doutorado. Instituir cursos sobre Metodologia e Didática no Ensino Superior também se
mostrou como uma opção entre os entrevistados para tentar amenizar as lacunas encontradas
nesse quesito. Por fim, gostaríamos de registrar que os problemas pertinentes à formação para
a docência no ensino superior coexistem junto a tantos outros que se entremeiam no universo
do professor. No entanto, a consciência de que as ausências são presenças no universo
formativo dos docentes, já existe. Os depoimentos colhidos e apresentados nesse trabalho, são
uma forma de materializar tal consciência. Acordar professor universitário é um ritual de
passagem, portanto requer cuidados específicos que respeitem essa singularidade.

5-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1997.
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formação de professores. v.14, p.247-252, 1992.
CHAMLIAN, H. C. Docência na Universidade: professores inovadores na USP. Cadernos
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FERNANDES, C. M. B. Formação do Professor Universitário: tarefa de quem? In:
MASETTO, M. (Org.) Docência Universitária. Campinas, Papirus, 1998. p.95-112.
IMBERNÓN, F. A Educação no Século XXI: os desafios do futuro imediato. Porto
Alegre: Artmed, 2001.
NOGUEIRA, M. A. Universidade, crise e produção do saber. IN: BERNARDO, M. (org.).
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NÓVOA, A. (Org.). Profissão professor. Porto: Porto, 1995.
PACCA, J. L. A. A Atualização do Professor de Física do Segundo Grau: uma proposta.
(Tese de Livre Docência) São Paulo: Universidade de São Paulo, 1994. 124 p.
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PIMENTA, S. G.; ANASTASIOU, L. G. Docência no ensino superior. São Paulo:
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TARDIF, M. Saberes Docentes e Formação Profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
ZABALA, A. A Prática Educativa: como ensinar. Porto Alegre: ArtMed, 1998.
ZABALZA, M. A. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Trad.:
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Revista Iberoamericana de Educación (ISSN: 1681-5653)
A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA E A
CONSTRUÇÃO DE UM NOVO PERFIL PARA DOCENTES
UNIVERSITÁRIOS
Graziela Giusti Pachane
Elisabete Monteiro de Aguiar Pereira
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Brasil

INTRODUÇÃO

Quando se fala em “formação de professores”, vem-nos à cabeça o processo de


formação para a docência na educação básica (ensino fundamental e, no máximo, médio).
Dificilmente a abordagem de formação de professores estende-se para a formação de
professores universitários, como se a formação específica para o magistério nesse nível fosse
algo supérfluo, ou mesmo, desnecessário. No entanto, uma das críticas mais comuns dirigidas
aos cursos superiores diz respeito à didática dos professores universitários, ou seria melhor
dizer, à falta dela. Tal fato pode ser constatado tanto através da literatura específica da área,
como através de conversas com alunos em diferentes tipos de instituição e em diferentes
cursos. Relatos de que o professor sabe a matéria, porém não sabe como transmiti-la ao aluno,
de que não sabe como conduzir a aula, não se importa com o aluno, é distante, por vezes
arrogante, ou que não se preocupa com a docência, priorizando seus trabalhos de pesquisa,
são tão freqüentes que parecem fazer parte da “natureza”, ou da “cultura”, de qualquer
instituição de ensino superior. Ao mesmo tempo, amplia-se cada vez mais a exigência de que
os professores universitários obtenham os títulos de mestre ou doutor. No entanto, é
questionável se esta titulação, do modo como vem sendo realizada, possa contribuir
efetivamente para a melhoria da qualidade didática no ensino superior.

Os programas de pós-graduação, de maneira geral, tendem a priorizar em suas


atividades a condução de pesquisas, tornando-se responsáveis, mesmo que não
intencionalmente, por reproduzir e perpetuar a crença de que para ser professor basta
conhecer a fundo determinado conteúdo ou, no caso específico do ensino superior, ser um
bom pesquisador. Numa breve retrospectiva da história das universidades – de maneira geral
e, mais especificamente, das brasileiras –, é possível observar que a formação exigida do
professor universitário tem sido restrita ao conhecimento aprofundado da disciplina a ser
ensinada, sendo este conhecimento prático (decorrente do exercício profissional) ou
teórico/epistemológico (decorrente do exercício acadêmico). Pouco, ou nada, tem sido exigido
em termos pedagógicos. Acreditamos que possam existir pelo menos três fatores contribuindo
para que, na cultura universitária, a tarefa de ensinar – e conseqüentemente a formação
pedagógica dos professores – sejam relegadas a segundo plano.
Em primeiro lugar, a formação para a docência universitária constituiu-se
historicamente como uma atividade menor. Inicialmente, havia a preocupação com o bom
desempenho profissional, e o treinamento profissional, acreditava-se, poderia ser dado por
qualquer um que soubesse realizar bem determinado ofício. Acreditava-se (como alguns ainda
hoje acreditam) que “quem soubesse fazer, saberia automaticamente ensinar”, não havendo
preocupações mais profundas com a necessidade do preparo pedagógico do professor
(MASETTO, 1998, p. 11). Posteriormente, com a crescente aproximação das universidades
do modelo humboldtiano, voltado à produção de conhecimentos, a preocupação com a
formação de professores para o magistério superior centrou-se na preparação para a condução
de pesquisas e, da mesma maneira, o pedagógico continuou a ser negligenciado, como se as

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atividades realizadas com os alunos de graduação não se configurassem como produção de
conhecimento, mas, simplesmente, repetição do que já havia sido realizado por outros.
Em segundo lugar, também decorrência dessa ênfase na condução de pesquisas, os critérios de
avaliação de produtividade e qualidade docente concentram-se, hoje, na produção acadêmica
destes professores. Ou seja, ensino e pesquisa passam a ser atividades concorrentes, e como os
critérios de avaliação premiam apenas a segunda, uma cultura de desprestígio à docência
acaba sendo alimentada no meio acadêmico, comprometendo, como ressalta Pimentel (1993,
p. 89), a almejada indissociabilidade ensino-pesquisa-extensão.
É possível, portanto, concluir que a prática usual nas universidades concorre para esta
desvalorização do ensino, transmitindo em sua cultura valores díspares para as duas atividades
(ensino e pesquisa). Finalmente, observamos a inexistência de amparo legal que estimule a
formação pedagógica dos professores universitários. A título de exemplo, é válido mencionar
que a legislação brasileira sobre educação, mais especificamente a LDB (Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional) é omissa em relação à formação pedagógica do professor
universitário. Num acompanhamento detalhado dos diversos momentos de discussão da LDB
(cf. SAVIANI, 1998, p. 144), é possível observar-se que na proposta inicial do então senador
Darcy Ribeiro, a preocupação com a formação pedagógica dos professores universitários era
contemplada:

art. 74 – A preparação para o exercício do magistério superior se faz, em nível de


pósgraduação, em programas de mestrado e doutorado, acompanhados da respectiva
formação didático-pedagógica, inclusive de modo a capacitar o uso das modernas
tecnologias do ensino.

No entanto, num processo de “enxugamento” do texto da LDB – além, é claro, das


pressões feitas por diversos setores da sociedade cujos interesses podem ser contrariados com
a exigência de maior capacitação docente –, omitiu-se do texto final a necessidade de
formação pedagógica do professor universitário, configurando-se o texto final como segue:

“Art. 66 - A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-


graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.”

Assim, não encontrando amparo na legislação maior, a formação pedagógica dos


professores universitários fica a cargo dos regimentos de cada instituição responsável pelo
oferecimento de cursos de pós-graduação, refletindo, e ao mesmo tempo regulamentando, a
crença na não necessidade d e que esta formação seja oferecida.

A FORMAÇÃO DE PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS NO CONTEXTO


INTERNACIONAL

Embora tenhamos nos centrado aqui na descrição da situação brasileira, o processo de


ênfase na produção acadêmica – assim como o maior estímulo à pesquisa, em detrimento do
ensino – não ocorre, apenas no Brasil, porém é um fenômeno que pode ser observado
internacionalmente. Citando um texto publicado pelo American Council on Education, no
qual se lê que “o professor universitário é o único profissional de nível superior que entra
para uma carreira sem que passe por qualquer julgamento de pré-requisitos em termos de
competência e de experiência prévia no domínio das habilidades de sua profissão”, Balzan
(1997, p. 7) ressalta que: “as afirmações acima refletem não somente preocupação com a
questão da qualidade do ensino superior, como evidenciam tratar-se de um fenômeno que
ultrapassa as fronteiras dos Estados, adquirindo um nível de abrangência mundial e
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características extremamente complexas, dadas as realidades vigentes em países situados em
diferentes níveis de desenvolvimento sócio-econômico e multiplicidades de culturas
construídas ao longo da história.”
Marcelo García, professor da Universidade de Sevilha, menciona que na Espanha os
programas de doutoramento funcionam como uma espécie de formação inicial de professores
universitários no seu papel ou função de investigação. Em relação à formação pedagógica dos
professores universitários, observa o panorama atual não é muito favorável, sendo que, até
hoje, não existiu uma tradição de formação pedagógica, sendo que os “professores jovens
sempre foram deixados sós, exceto talvez por um breve curso de iniciação” (MARCELO
GARCÍA, 1999, p. 248).
Nesse mesmo sentido, Benedito, Ferrer e Ferreres (1995), num estudo bastante amplo
a respeito do ensino superior na Espanha constatam que “a formação de professores
universitários não tem contado, até agora, com um respaldo legislativo como ocorre com os
outros níveis educativos”. Salientam ainda que, ao consultar-se o Handbook of Research on
Teacher Education de 1990 – a grande compilação de tudo o que ocorre na área nos EUA e
em seu âmbito de influência – no intuito de buscar indícios, pesquisas, tomadas de posição
sobre a formação universitária, depararam-se com uma surpresa “não encontramos nada” (p.
149). Donald Kennedy, ex-reitor da Universidade de Stanford, publicou um livro,
denominado “Academic Duty”, no qual reuniu os resultados de diversas palestras ministradas
a pós-graduandos, futuros professores universitários, acerca dos problemas e desafios
enfrentados pelos professores universitários. Nele, enfatiza a relevância de trabalhos dessa
natureza, mencionando que nos Estados Unidos, muito freqüentemente, pouca atenção é dada
para as responsabilidades que os estudantes de doutorado terão futuramente com o ensino, já
que eles são pressionados a finalizar sua dissertação ou a dar apoio aos programas de seus
orientadores. O autor salienta, ainda, que os professores em treinamento recebem pouca ou
nenhuma preparação para a gama de desafi os profissionais e pessoais que vão enfrentar como
membros efetivos do corpo docente (KENNEDY, 1997, p. 30).
Tais aspectos são também apresentados por Serow (2000) ao discutir os resultados da
pesquisa que conduziu nos Estados Unidos sobre a docência no ensino superior:
“um ponto de concordância entre os entrevistados era de que a pesquisa excedeu em
importância o ensino no sistema de gratificações, e que pesquisas amparadas por fundos
externos e publicações em meios apropriados se tornaram essenciais não apenas para
promoção e efetivação no cargo, mas também para manter a estima aos olhos de seus
pares.” (p. 453)
De acordo com um dos professores entrevistados pelo autor, qualquer um que não
realizasse o tipo correto e a quantidade adequada de pesquisa nunca seria aceito como um
“membro de carteirinha” do corpo docente. O ensino também foi descrito por ele como tendo
pouco status tanto com os chefes das faculdades como entre aqueles que administravam as
universidades. Serow esclarece que isso não significa, necessariamente, que o ensino e a
orientação sejam de todo negligenciados. Ao longo de sua pesquisa, pôde constatar que o
ensino representa um importante peso na avaliação docente, porém, somente quando é
considerado ruim. De acordo com um professor sênior de uma faculdade de engenharia por
ele entrevistado: “Se você dá aula razoavelmente boas, isso é o que é esperado. Se não, o
departamento pode usar isso contra você. (...) A ênfase mudou-se de ‘quão bom professor é
ele’ para ‘quantas queixas nós tivemos dele?’ (...) Através do patrocínio de prêmios
pedagógicos, bolsas para inovações didáticas e outros incentivos, a real intenção dos
administradores era a de evitar ramificações de ensino ruim, através de uma diminuição das
pressões de estudantes, pais, alunos recém-formados e legisladores” (SEROW, 2000, p. 453-
454).

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Podemos perceber, portanto, que o problema que aqui nos propomos a discutir não é
isolado no Brasil. Autores que discutem a formação de professores em outros países abordam
a mesma problemática, destacando não só o desprestígio do ensino em relação à pesquisa e a
falta de formação de seus professores universitários, como também, enfatizando a necessidade
de que tal situação seja revertida e que maior atenção seja dada à formação pedagógica do
(futuro) docente do ensino superior.

FORMAÇÃO PEDAGÓGICA DO PROFESSOR UNIVERSITÁRIO: UMA


NECESSIDADE

Como mencionamos, a formação do docente universitário tem se concentrado na sua


crescente especialização dentro de uma área do saber. De acordo com Vasconcelos (1998, p.
86), há “pouca preocupação com o tema da formação pedagógica de mestres e doutores
oriundos dos diversos cursos de pós-graduação do país. A graduação tem sido ‘alimentada’
por docentes titulados, porém, sem a menor competência pedagógica”. Tal constatação nos
leva a um questionamento acerca da correlação entre a crescente especialização oferecida
pelos cursos de pós-graduação e a melhoria da qualidade docente dos professores
universitários. Marcelo García (1999, p. 244), fazendo referência a trabalhos realizados por
Aparício e Felman, ressalta que, em diversas investigações, a correlação encontrada entre a
produção científica dos professores e a avaliação que seus alunos fazem deles tem sido muito
baixa (em torno de 0,21), concluindo as relações entre produtividade científica e eficácia
docente são escassas, ou como refere Felman (1987, apud Marcelo García, 1999), são
essencialmente independentes uma da outra.
A esse respeito, Pimenta e Anastasiou (2002, p. 190-196) observam que a formação
atualmente oferecida aos pós-graduandos separa-os de qualquer discussão sobre o
pedagógico, desconsiderando, inclusive, que os elementos-chave do processo de pesquisa
(sujeitos envolvidos, tempo, conhecimento, resultados e métodos) não são os mesmos
necessários à atividade de ensinar, e elaboram uma comparação entre as características dos
elementos constituintes de cada atividade.

QUADRO 1
Elementos constituintes das atividades de pesquisa e ensino, segundo Pimenta e Anastasiou
(2002, p. 190-196):

Pesquisa, Ensino, Sujeitos envolvidos


Em geral o trabalho é realizado individualmente; pode haver momentos de trabalho em
grupo, mas o pós-graduando, em geral, trabalha apenas ligado a seu orientador. O professor
está constantemente envolvido com outros sujeitos: seus pares institucionais (chefias e
colegas docentes), alunos, comunidade, etc.
Tempo
Habitualmente é previsto em blocos, conforme o projeto, e comporta alterações
justificadas, submetendo-se, dessa forma, a certa flexibilidade. O processo de ensino em geral
tem de se adequar ao período letivo, não havendo flexibilidade, constituindo-se um
permanente desafio a adequação temporal dos cronogramas curriculares.
Resultados obtidos
Os resultados dizem respeito aos conhecimentos gerados sobre o tema proposto após o
término da pesquisa, que podem levar à confirmação da teoria existente ou à revisão total ou
parcial do referencial científico existente. O ensino deve proporcionar novas elaborações e
novas sínteses aos professores e aos alunos, ampliando a herança cultural e propiciando ao
aluno uma apreensão qualitativamente superior dos quadros teóricos e da própria realidade.
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Conhecimentos
Os conhecimentos constituem-se em sínteses provisórias geradoras de novas propostas
de trabalho. Trata-se, em geral, do trabalho com o conhecimento já existente e sistematizado,
a ser “apropriado” pelo aluno sob a orientação do professor.

Método
É definido ao se propor o problema, tendo em vista a estreita relação entre o objeto, o
campo do conhecimento e a metodologia a ser trabalhada. Depende, inicialmente, da visão de
ciência, de conhecimento e de saber escolar do professor. Considerando as diferenças entre as
atividades de pesquisar e ensinar, as autoras concluem que não seja difícil compreender por
que ser um reconhecido pesquisador, produzindo acréscimos significativos aos quadros
teóricos existentes, não é garantia de excelência no desempenho pedagógico e,
conseqüentemente, por que os programas de pós-graduação não oferecem, necessariamente,
melhoria na qualidade docente: como a pesquisa e a produção de conhecimentos são objetivos
da pós-graduação, os docentes, quando participam desses programas, sistematizam e
desenvolvem habilidades próprias ao método de pesquisa, deixando de lado o
desenvolvimento das características necessárias para o desenvolvimento do ensino. Assim,
podemos perceber que os cursos de formação, quando voltados exclusivamente para a
realização de pesquisas, não atendem às necessidades específicas dos professores no tocante a
suas atividades de docência. Ou seja, a qualificação oferecida pelos cursos de pós-graduação,
como atualmente estruturados, possibilitam aos professores a titulação, porém, a maior
titulação não significa, necessariamente, melhoria na qualidade docente. É válido ressaltar que
os próprios pós-graduandos criticam o despreparo pedagógico com que iniciam seu trabalho
em sala de aula, como levantado por Macedo, Paula e Torres (1998, p.1). Ainda a respeito da
falta de preparo pedagógico dos futuros professores universitários, Kennedy (1997) introduz
uma observação bastante interessante. Segundo o autor, a vasta maioria dos doutorados
acadêmicos são produzidos em universidades, mas grande parte dos professores nelas
formados irá lecionar em instituições de ensino superior bastante diferentes daquelas onde
foram titulados. Dessa forma, “chegam ao trabalho com poucas noções sobre como realizar
a transição de aprendiz experiente para professor novato, ou mesmo sobre o que é esperado
deles como profissionais” (p. 30).
Embora Kennedy esteja se referindo à situação das instituições de ensino superior
americanas, o que ocorre no Brasil não é diferente. Aqui, também, grande parte dos
professores universitários é titulada em universidades, prioritariamente em instituições
públicas (estaduais ou federais), pelas quais não serão necessariamente contratados. Assim,
embora muitos professores sejam formados, ou titulados, em instituições universitárias, com
tradição em pesquisa, o mercado de trabalho que para eles se abre é, muitas vezes, em
instituições não-universitárias, com tradição em ensino. Tendo em vista as recentes políticas
de expansão e flexibilização do sistema de ensino superior brasileiro, essa situação de
diferenciação entre instituições voltadas predominantemente ao ensino ou à pesquisa, e
conseqüentemente a discrepância entre a formação oferecida ao pós-graduando e as tarefas a
serem exercidas em sua futura atuação como professor, torna-se mais acentuada.
O Brasil tem vivenciado um período de diversas alterações no sistema de ensino
superior, que englobam, além do crescimento destacado anteriormente, a expansão e
flexibilização do sistema, mudanças na estrutura curricular (diretrizes curriculares), alterações
nos critérios de ingresso nas IES, exigência de titulação do corpo docente, processos
sistemáticos de avaliação, tanto em âmbito institucional como nacional, entre outros
indicadores, muitos dos quais decorrentes da introdução de novas tecnologias na educação.
Esse processo, no entanto, não tem se dado de modo proporcional entre os diferentes tipos de

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instituição existentes no país, havendo uma diferenciação cada vez maior entre os programas
que incentivam a pesquisa e programas que priorizam o ensino (Gamboa, 1999; Saviani,
1998).
Como observado por Pimenta e Anastasiou (2002, p. 141), as oportunidades de
emprego vêm aumentando com a expansão das instituições particulares de ensino em todo o
território nacional, o que pode ser observado por uma análise dos dados estatísticos
divulgados recentemente pelo MEC/INEP (Pachane, 2003), expansão esta que não é
acompanhada de um processo de profissionalização, nem inicial nem continuada (PIMENTA
e ANASTASIOU, 2002, p. 128-129). Para as autoras, o conhecimento deste sistema é de
extrema importância pois as condições de trabalho dos professores são bastante diversas entre
os diferentes tipos de IES brasileiras e, dependendo do tipo de instituição ao qual o professor
se vincula, um tipo de produção diferente será exigido dele, seja ela relativa a atividades de
docência, de extensão ou pesquisa, cabendo lembrar que a docência estará presente em todos.
A este movimento de expansão desigual entre os diferentes tipos de IES brasileiras
alia-se outro: o processo de flexibilização do sistema (diversificação da oferta), diferenciação
que tende a se aprofundar, refletindo a adequação do sistema em face do crescimento da
demanda e dos novos perfis profissionais exigidos pelo mercado. Aponta-se, hoje, para a
necessidade de criação de cursos mais curtos e/ou voltados a novas especialidades, sejam elas
decorrentes de abordagens interdisciplinares, do avanço da ciência e da tecnologia, da
flexibilização dos campos do saber ou das necessidades criadas pelo gerenciamento de
sistemas de novas tecnologias. Questiona-se, inclusive, qual a formação que o ensino superior
deve oferecer e a quais interesses deve atender. Paralelamente a estas mudanças, o sistema
educacional tem observado um movimento no sentido de democratização do acesso ao ensino
superior, como é possível de ser observado nos resultados do Censo da Educação Superior A
expansão do número de vagas, e a conseqüente ampliação do acesso ao ensino superior,
proporciona uma maior heterogeneidade do público que se dirige às instituições de ensino
superior. Este abre-se a parcelas da população a quem a possibilidade de graduação era,
anteriormente, dificultada.

Hoje, portanto, é necessário ao professor saber lidar com uma diversidade cultural que
antes não existia no ensino superior, decorrente do ingresso de um público cada vez mais
heterogêneo. Um público que pode, por um lado, não estar tão bem preparado, tanto
emocional quanto intelectualmente, para o ingresso no ensino superior; um público talvez
mais jovem, mais imaturo, e, por vezes, pouco motivado e comprometido com sua
aprendizagem, tendo em vista que o ensino superior hoje não é mais garantia de um emprego
estável no futuro, mas um público que pode, por outro lado, ser muito mais exigente quanto à
qualidade do curso oferecido, tendo em vista especialmente o alto grau de competitividade do
mercado de trabalho (MILLAR, 1996, BRIDGES, 1995; SANTOS, 1997; RIBEIRO
JÚNIOR, 2002). Além disso, os professores passam a ter necessidade de aprender a lidar com
turmas cada vez mais numerosas, pois a baixa correlação do número de alunos por professor,
antes tomada como índice de qualidade de um curso, hoje passa a identificar a “ineficiência
do sistema”. É necessário destacar também que o ensino superior, por muito tempo
considerado ponto terminal da educação e voltado à formação profissional, tem agora para si
outras funções e, dependendo do ponto de vista que adotarmos, configura-se apenas como um
primeiro passo rumo a um processo de “lifelong learning” (educação permanente), fenômeno
que vem ocorrendo não apenas no Brasil.
Tais constatações nos levam a uma preocupação em relação à formação dos
professores para atuar no ensino superior e que culminam nos questionamentos propostos por
Morosini (2000, p. 11): “quem são (serão) esses novos professores? Estarão preparados
didaticamente?”.
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Atualmente, a preocupação com a aferição da eficiência do sistema educativo, seja


através do sistema nacional de avaliação ou de programas de avaliação institucional, começa
a desvelar as precariedades e os pontos positivos da área e por influenciar, direta ou
indiretamente, o trabalho dos professores. Como destaca Morosini (2000, p. 13), embora o
sistema nacional de avaliação não estabeleça normas de capacitação didática do docente, há
uma íntima relação entre o desempenho didático do professor e o desempenho do aluno e,
dessa forma, sugere que tais avaliações, mesmo não incidindo diretamente na qualidade
docente, indiretamente, afetam-na. A partir dos pontos até aqui abordados, podemos concluir
que o professor universitário não se forma, hoje, para atuar necessariamente em uma
universidade, porém, num complexo sistema de ensino superior, que envolve diferentes
instituições e tipos de cursos. Mas, mais que isso, além de preparar-se para agir neste meio,
para trabalhar com o novo perfil de alunos que chegam ao ensino superior, como também com
o novo perfil exigido dos egressos do ensino superior, acreditamos que seja necessário a este
professor conhecer esta realidade e saber entendê-la e analisá-la, ou seja, torna-se necessário
que o professor desenvolva estratégias que permitam a ele refletir sobre sua docência e o
contexto mais amplo no qual ela se acha inserida.
Vimos até aqui destacando o trabalho dos professores universitários em termos da
docência (ensino de graduação e pós-graduação) e da realização de atividades de pesquisa
(trabalho na pós-graduação, orientação de alunos, condução de pesquisas próprias,
publicações, participação em encontros científicos, etc.). No entanto, não podemos reduzir as
tarefas dos professores somente a estas duas dimensões. Benedito, Ferrer e Ferreres (1995)
ressaltam que a própria docência tem sido vista com excessivo reducionismo ao ser
identificada somente com as atividades que os professores realizam quando estão na sala de
aula com seus alunos (p. 170). Os autores apontam que as funções que fazem parte do
trabalho do professor universitário são, principalmente, as seguintes: o estudo e a pesquisa; a
docência, sua organização e o aperfeiçoamento de ambas; a comunicação de suas
investigações; a inovação e a comunicação das inovações pedagógicas; a orientação (tutoria) e
a avaliação dos alunos; a participação responsável na seleção de outros professores; a
avaliação da docência e da investigação; a participação na gestão acadêmica; o
estabelecimento de relações com o mundo do trabalho, da cultura etc.; a promoção de relações
e intercâmbio departamental e interuniversitário, e a contribuição para criar um clima de
colaboração entre os professores (BENEDITO, FERRER e FERRERES, 1995, p. 119).
Pimenta e Anastasiou (2002, p. 39), por sua vez, lembram que, para além da docência,
espera-se dos professores seu envolvimento na administração e gestão em seus
departamentos, na universidade, tomando decisões sobre currículos, políticas de pesquisa e
financiamento, não apenas no seu âmbito, mas também no âmbito dos sistemas públicos
estaduais, do sistema nacional de educação e das instituições científicas de fomento, de
políticas de pesquisa, de ensino e de avaliação, aspectos que, de maneira geral, não são
contemplados num processo de formação profissional do docente do ensino superior.

MUDANÇAS NO MUNDO CONTEMPORÂNEO E SEU REFLEXO NO ENSINO


SUPERIOR

Até aqui, analisamos um pouco das mudanças que vêm se processando no contexto
que podemos chamar de “intrínseco” ao ensino superior. No entanto, as modificações não se
processam isoladamente do contexto social, político e econômico mais amplo no qual as IES
se acham envolvidas. As mudanças que vêm ocorrendo no mundo contemporâneo, assim
como das mudanças nos campos das diversas ciências, inclusive da educação levam, elas
também à necessidade de se repensar a formação atualmente oferecida aos futuros professores
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universitários e mesmo àqueles que já exercem suas funções. Temos hoje configurado um
processo de mudanças no contexto global no qual se inserem as instituições de ensino
superior, mudanças relacionadas, em especial, ao avanço científico-tecnológico, a alterações
na organização do trabalho (processo produtivo), à sociedade de informação, aos processos de
globalização da economia e a alterações na relação dos sujeitos com o conhecimento
(MORAES, 1997; RIBEIRO JÚNIOR, 2002). Tais mudanças acabam por afetar, direta ou
indiretamente, a organização das IES, assim como o trabalho realizado em seu interior.
Em complementação às alterações e aos questionamentos suscitados pelas mudanças
decorrentes da “nova ordem mundial” e dos avanços tecnológicos, as instituições de ensino
superior encontram-se imersas em um outro processo de mudanças, não desvinculado dos
outros dois. Como apontado por diversos autores (Santos, 1997; Kuhn, 1991; Pimentel, 1993;
Cunha, 1998; Leite et al., 1998; Pereira, 2002, entre outros), vivemos um período de transição
em que crenças absolutistas e de neutralidade da ciência, assim como de diversos
pressupostos da modernidade, que vigoraram como verdades absolutas durante muito tempo,
passam a ser questionados. As “verdades” passam a ser vistas como sínteses provisórias, o
saber é historicizado e relativizado e a divisão entre disciplinas estanques é questionada. A
confiança do homem na razão é abalada e, conseqüentemente, todo o trabalho realizado
dentro das instituições universitárias. A reestruturação na forma como se concebe o saber, a
influência dos aspectos tecnológicos e toda uma reestruturação na organização social clamam,
portanto, por mudanças na estruturação e nos objetivos do ensino superior, eminentemente
marcados pelo paradigma moderno.

Conseqüentemente, o trabalho a ser realizado pelo professor universitário sofre


também alterações. Torna-se necessário ao professor pensar numa nova forma de ensinar e
aprender que inclua a ousadia de “inovar as práticas de sala de aula, de trilhar caminhos
inseguros, expondo-se e correndo riscos, não se apegando ao poder docente, com medo de
dividi-lo com os alunos e também de desvencilhar-se da racionalidade única”, pondo em
ação outras habilidades que não apenas as cognitivas. Torna-se necessário, ainda, que os
professores passem a pensar-se como “participantes do desvelamento do mundo e da
construção de regras para viver com mais sabedoria e mais prazer” (CASTANHO, 2000, p.
87). Não se pode mais entender o professor como “detentor do saber”, nem o ensino como
transmissão de um conhecimento pronto e acabado. O modelo pelo qual se pautava a
organização do ensino superior não dá mais conta da complexidade do momento que
vivenciamos e é constantemente impulsionado a mudanças. Neste contexto, professores e
alunos passam a construir conjunta e continuamente o conhecimento, embasados nas teorias e
na revisão constante destas, nos questionamentos e nas leituras da realidade e do presente
histórico (PEREIRA, 2002, p. 42).
A indissociabilidade ensino-pesquisa, a perspectiva de produção de conhecimento e a
autonomia de pensamento, o incentivo à criticidade e à criatividade, a flexibilização de
espaços, tempos e modos de aprendizagem, a emergência da interdisciplinaridade, a
necessidade de integração teoria e prática, a necessidade de separação de dicotomias
(teoria/prática, forma/conteúdo entre outras), a necessidade de domínio de novas habilidades
decorrentes de avanços tecnológicos (como uso de realidade virtual), o resgate da ética, a
incorporação da afetividade, a ênfase ao posicionamento político do professor e a
centralização do processo educativo na aprendizagem do aluno, entre outros fatores que aqui
poderíamos enumerar, alteram profundamente o perfil necessário ao professor numa
instituição de ensino superior e nos chamam a atenção para a necessidade de que estes
professores, ou futuros professores, estejam conscientes desses processos nos quais se acham
envolvidos. Percebemos, portanto, que as características necessárias aos professores
universitários hoje, extrapolam – e muito – os limites do conhecimento aprofundado da
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matéria de sua especialização e a aquisição de habilidades necessárias à condução de
pesquisas, e seguem-se a dimensões muito mais amplas, que nos levam a argumentar em
favor da importância da formação pedagógica do professor universitário.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo do texto, apresentamos alguns aspectos que, em nossa opinião, influenciam a


ampliação do consenso quanto à importância da formação pedagógica do professor
universitário e justificam a necessidade de que esta formação seja tomada de forma mais
efetiva. Entre estes aspectos, destacamos: 1) expansão do ensino superior; 2) diversificação do
sistema de ensino superior; 3) instituição de um Estado Avaliativo; 4) mudança do perfil do
aluno ingressante no ensino superior; 5) mudança no perfil esperado do egresso do ensino
superior (e conseqüentemente do papel a ser desempenhado por estas instituições e seus
professores); 6) mudanças no paradigma científico e pedagógico; 7) crescente
percepção/conscientização dos próprios docentes a respeito da necessidade de formação para
a atuação como professores no ensino superior; 8) emergência de um novo perfil de professor
universitário, o que poderá se refletir na exigência de sua formação pedagógica e 9) a baixa
correlação entre a formação atualmente oferecida em cursos de pós -graduação e a melhoria
da qualificação do professor para o exercício da docência no ensino superior.
Ao considerarmos todos os dados apresentados no presente capítulo em conjunto com
as críticas dirigidas à falta de didática dos docentes universitários, como apresentada em
diversos estudos (Balzan, 1988; Cunha, 1989; Comvest, 1996; Masetto, 1998; Pachane, 1998;
Leite et al., 1998, entre outros), podemos concluir que o panorama do ensino superior hoje
aponta, cada vez mais, para a necessidade de formação pedagógica de seus professores,
podendo até vir a se constituir numa exigência do sistema educacional. Tendo em conta que a
visão da preparação para a docência no ensino superior como algo desnecessário vem se
constituindo historicamente e que os critérios de avaliação docente têm se concentrado na
produtividade acadêmica, a tentativa de promover a valorização da atividade docente e do
ensino de graduação, e conseqüentemente da formação pedagógica do professor universitário,
a nosso ver, necessita passar pela mudança na cultura acadêmica, que atribui valores díspares
a cada uma das atividades constituintes do fazer universitário. Dessa maneira, a valorização
do ensino e da formação pedagógica do professor universitário demandaria, em primeiro
lugar, a alteração do modo como as questões pedagógicas são entendidas e tratadas na
universidade, superando a crença de que para ser bom professor basta conhecer
profundamente e conseguir transmitir com clareza determinado conteúdo, ou, no caso mais
específico do ensino superior, ser um bom pesquisador.
Como concluem Benedito, Ferrer e Ferreres (1995) as exigências que neste momento
se colocam ante o desenvolvimento das novas titulações e a implantação de planos de estudo
modernos, flexíveis e relacionados com o mundo do trabalho, assim como o fato de que a
profissão docente se exercita em um contexto espaço-temporal determinado, com umas
pessoas determinadas, que exigem uma adaptação particular àquelas condições e
características pelas quais é necessário preparar o docente, constituem-se em razões mais que
suficientes para considerar que “a docência universitária é importante e a formação de seus
profissionais já não admite demora” (p. 186-187).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BALZAN, Newton César. A didática e a questão da qualidade do ensino superior. Cadernos


Cedes (22). São Paulo: Cortez, 1988.

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______. Do Estudante ao Professor Universitário: caminhos para a didática do ensino
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DO ENSINO DE CONTEÚDOS AOS SABERES DO


PROFESSOR: MUDANÇA DE IDIOMA PEDAGÓGICO?
ISABEL ALICE LELIS4

RESUMO: Este trabalho tem o objetivo de decifrar algumas das tendências da produção
intelectual sobre formação de professores nos últimos vinte anos no Brasil, chamando a
atenção para os “idiomas pedagógicos” que tiveram impacto entre os educadores. No
mapeamento da literatura especializada, alguns autores/textos foram tomados como
exemplares por representarem lógicas de pensamento marcantes a respeito do papel da teoria
e da prática na formação docente. Do balanço efetuado, o que se verificou foi a ruptura de um
idioma pedagógico, passando-se de uma pedagogia marcadamente conteudista sob a
hegemonia de uma razão teórica para uma perspectiva que aponta para uma epistemologia da
prática.

Palavras-chave: formação docente, idioma pedagógico, ensino de conteúdos, saber do


professor, relação teoria/prática.

Assistimos na última década ao aparecimento de uma literatura internacional bastante


fértil no campo da formação de professores, em especial sobre os conhecimentos incorporados
e atualizados pelos professores em seus processos de vida, de trabalho e de formação. Sob
matrizes diversas, o que parece ser consenso é a valorização da prática cotidiana como lugar
de construção de saberes. Em que pese a fertilidade da produção acadêmica há, contudo,
zonas de sombra que precisam ser desvendadas, se considerarmos os desafios de uma escola
de massa e o lugar que nela desempenha o trabalho do professor, especialmente em
sociedades como a nossa que não equacionaram o problema da desigualdade social e escolar.
Se é verdade que a problemática específica do saber escolar e do saber docente,
enquanto tal, só muito recentemente passou a se constituir em objeto de pesquisa no Brasil,
também é verdade que velhos temas já trabalhados desde a década de 1980 reapareceram
travestidos com nova roupagem, sugerindo um retorno a questões que não foram ainda
equacionadas pelas políticas e práticas de formação de professores como, por exemplo, os
conhecimentos de que devem ser portadores os professores e que se atualizam na ação
pedagógica. Uma hipótese é a de que esse retorno não parece significar mera reprodução de
perspectivas de análise já formuladas em outros contextos, mas redimensionamento de
questões que estão no centro da problemática do trabalho docente como, por exemplo, o papel
da teoria e da prática nos processos de formação de professores, os modos como os
professores se relacionam com os saberes.
Neste movimento, o que parece estar em questão é o processo de produção de
discursos com impacto no campo intelectual e que “exprimem maneiras diversas de definir
quais são os ‘problemas’ e consequentemente o leque de soluções disponíveis para combatê-
los” (Almeida e Perosa, 1999, p.1). Dentro dos limites do texto, é nossa intenção analisar
algumas das tendências do debate sobre formação de professores nessas últimas duas décadas
no Brasil, buscando entender as lógicas de pensamento que fundamentaram e ainda
fundamentam algumas propostas presentes na literatura educacional. Trabalhamos na
perspectiva de que, sob determinadas condições de produção, foram elaborados “idiomas
pedagógicos” sobre a formação e trabalho docente na perspectiva de responder aos desafios

4
Professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira e diretora
do Departamento de Educação da PUC-Rio. E-mail: isabell@edu.puc-rio.br
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postos aos sistemas públicos de ensino. Trata-se de uma tentativa de reconstruir, de certa
forma, uma trajetória intelectual nas continuidades e rupturas que apresenta. Em uma
pedagogia dos conteúdos, qual a relação do professor com o saber?
Em contrapartida à segunda metade dos anos de 1970, marcada pela crítica ao papel da
escola na reprodução da estrutura de classes, florescem trabalhos voltados para o
conhecimento dos fatores intra-escolares, como mecanismos de exclusão dos setores
populares, considerando-se a “rede de expectativas e contradições que permeiam a prática
pedagógica” (Souza, 2000, p. 43). Sob diferentes ângulos, é analisada a situação do
magistério na tentativa de encontrar explicações para as precárias condições de
funcionamento dos sistemas públicos de ensino, expressas em altas taxas de exclusão escolar,
principalmente entre segmentos das camadas populares. Em um texto que se tornou referência
no campo dos educadores, Mello (1982) parte do caráter mediador da escola1 para estudar as
representações e expectativas do professor face à escola, ao aluno e aos papéis que
desempenha. Trabalhando sobre o conceito de “representação” de Moscovici,2 bastante
utilizado na investigação educacional, a autora busca dar conta tanto da forma singular como
um corpo de idéias se processa no indivíduo, respeitando a sua contextura psicológica
autônoma, como das condições sociais reais de sua produção (Lelis e Nunes, 1999). A tese
central de Mello passa, nesse momento, pela defesa da competência técnica do professor vista
como mediação através da qual se realizaria o sentido político da educação escolar. Nestes
termos, a competência técnica envolveria tanto o domínio dos conteúdos de ensino pelo
professor como o seu entendimento a respeito das relações entre os vários aspectos da escola,
incluindo-se o peso da formação sobre o modo como percebe a organização da escola e os
resultados de sua ação.
Bem diversa da tendência tecnicista dos anos de1970,3 Mello denuncia ainda a lógica
subjacente à organização do trabalho no interior da escola que acabara por fazer com que o
professor perdesse seus instrumentos de trabalho: do conteúdo (saber) ao método (saber
fazer), restando uma técnica sem competência. Na busca por mapear as causas da
precariedade da prática docente, estaria a dificuldade do professor em se perceber como parte
do problema do ponto de vista das deficiências de sua formação (Mello, 1982). De certa
forma, essa tese provoca impacto e gera um debate intelectual, na medida em que faz emergir
uma polêmica em torno do significado de uma suposta concepção universal sobre
competência, acima dos interesses de classe. Independente das críticas recebidas,4 o texto de
Mello torna-se paradigmático e representa uma forma de pensar o trabalho docente no que ele
era mas também no que deveria ser, surgindo com força a noção de que a escola e, nela, o
professor teriam um papel chave na transmissão do saber elaborado, sistematizado, erudito
de forma a garantir à população a possibilidade de expressar de maneira elaborada os
conteúdos da cultura popular que correspondem a seus interesses (Saviani, 1985).
Trabalhando nas diferenças entre o cientista e o professor do ponto de vista da relação
com o saber, Saviani5 ajuda-nos a entender a constituição de um idioma pedagógico, onde o
professor seria transmissor do saber e não produtor: Enquanto o cientista está interessado em
fazer avançar a sua área de conhecimento, em fazer progredir a ciência, o professor está mais
interessado em fazer progredir o aluno. O professor vê o conhecimento como um meio para o
crescimento do aluno; enquanto para o cientista o conhecimento é um fim, trata-se de
descobrir novos conhecimentos na sua área de atuação. (Saviani, 1985, p.19) Nessa
perspectiva, o conhecimento viria de “fora para dentro”, tendo uma dimensão
instrumentalizadora do ponto de vista político social. Ao professor, caberia a organização dos
processos, de métodos, de modo a garantir a apropriação pelos alunos. (...) um professor de
história ou de matemática; de ciências ou estudos sociais, de comunicação e expressão ou
literatura brasileira etc., tem cada um, uma contribuição específica a dar em vista da
democratização da sociedade brasileira, do atendimento aos interesses das camadas populares,
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da transformação estrutural da sociedade. Tal contribuição se consubstancia na
instrumentalização, isto é, nas ferramentas de caráter histórico, matemático, científico,
literário, etc. que o professor seja capaz de colocar de posse de alunos. (Saviani, 1982, p. 83)
No horizonte de pensar a formação do educador, Saviani afirmava a necessidade de
que o curso de Pedagogia fornecesse uma fundamentação teórica que permitisse uma ação
coerente, o desenvolvimento de uma consciência aguda da realidade em que os futuros
professores iriam atuar e uma instrumentalização técnica que permitisse uma ação futura
eficaz (Saviani, 1980, p. 60). Como forma de garantir o cumprimento dessas finalidades, cada
disciplina do curso de Pedagogia deveria ser trabalhada de modo que os alunos chegassem a
uma teoria geral de educação “no nível atitudinal (‘o que o educador precisa viver’), no nível
crítico-contextual (‘o que o educador precisa fazer’), no nível cognitivo (‘o que o educador
precisa saber’), no nível instrumental (‘o que o educador precisa fazer’)” (Saviani, 1980, p.
61). Sua proposta conferia ao conhecimento científico e à reflexão filosófica uma centralidade
enquanto instrumentos-chave, capazes de transformar positivamente os atributos negativos do
senso comum6 em elementos característicos de uma consciência crítica (Bonamino, 1989).
Em uma filosofia da educação que se afirmava radical, rigorosa e de conjunto, Saviani
encontrava o fermento para uma educação revolucionária.
Analisando o pensamento político pedagógico de Saviani, Bonamino chama a atenção
para o caráter problemático do papel emancipador conferido ao saber elaborado, dada a
natureza iluminista que poderia estar contida nessa formulação: a escola não educa a
consciência social apenas através dos conteúdos críticos devidamente seqüenciados e dosados
que transmite. A consciência da criança não se desenvolve tão somente através de conceitos
que ela assimila em seu contato com os detentores da cultura elaborada, mas as condições
para o desenvolvimento desta consciência crítica são criadas pela participação da criança na
experiência social coletiva, a qual se compõe, em parte, das experiências práticas que a escola
propicia através de sua organização interna e do sentido que assumem suas relações internas.
(Bonamino, 1989, p. 205-206)
Em que pese o investimento intelectual por pensar uma pedagogia crítico-social dos
conteúdos7 e, nela, o papel do educador,8 o que deve ser registrada é a influência desta tese
sobre o campo dos educadores, provocando “discursos sobre teoria”, expressões de um
“abstracionismo pedagógico”, “na obsessiva preocupação em descrever a escola e explicar os
problemas educacionais a partir de hipotéticas relações do processo educativo com outros
processos socioeconômicos” (Azanha, 1992, p. 46), em um claro superdimensionamento da
teoria em detrimento da empiria. Do ponto de vista da prática de pesquisa, os anos de 1980
ficaram a nos dever, em termos do conhecimento sobre as práticas pedagógicas efetivas que
estavam acontecendo na sala de aula. Fiorentini et al. (1998) reforçam essa crítica ao
afirmarem que as pesquisas sobre ensino e formação de professores passaram a priorizar o
estudo de aspectos políticos e pedagógicos amplos. Os saberes escolares, os saberes docentes
tácitos e implícitos e as crenças epistemológicas, como destaca Linhares (1996), seriam muito
pouco valorizados e raramente problematizados ou investigados tanto pela pesquisa
acadêmica educacional como pelos programas de formação de professores. (Fiorentini et al.,
1998, p. 314)
Na busca por efetuar um balanço da pedagogia crítico-social dos conteúdos, Libâneo
(1999), quinze anos depois, procura atualizar o “conteudismo”, chamando a atenção para as
interpretações equivocadas que esvaziavam a abordagem, na identificação mecânica entre
“conteúdo” e “matéria”: conteúdos são os conhecimentos sistematizados, selecionados das
bases das ciências e dos modos de ação acumulados pela experiência social da humanidade e
organizados para serem ensinados na escola; são habilidades e hábitos, vinculados aos
conhecimentos, incluindo métodos e procedimentos de aprendizagem e de estudo; são atitudes

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e convicções envolvendo modos de agir, de sentir e de enfrentar o mundo.9 Mesmo
alargando-se o sentido do que entendemos por “pedagogia dos conteúdos”, permanece o
desafio de pensar nas relações que o professor estabelece com os saberes, considerando-se
que na ação prática, saberes de diferentes ordens (entre os quais situam-se os conteúdos de
ensino) são por ele mobilizados.
Considerando-se que uma pedagogia fundada em conteúdos tinha como justificativa a
transformação política da escola e da sociedade e colocava como necessidade o recurso aos
conhecimentos universais, ao que assistimos foi “o florescimento de um discurso de
culpabilização do professor, dramaticamente similar ao discurso de culpabilização dos alunos
que florescera nos anos 60 e 70” (Almeida e Perosa, 1999, p. 5). Para as autoras, é neste
quadro que a formação de professores torna-se um problema a ser resolvido fora dos espaços
desvalorizados da formação regular. À maneira dos programas de educação compensatória da
década de 70, as práticas de formação dos professores serão também definidas como
oportunidade para o professor “compensar” a má formação recebida nos cursos regulares.
(Idem, p. 6)
Na crítica à formação de professores, o primado da lógica relacional No interior do
debate sobre a formação de professores, vão sendo aprofundados os problemas crônicos
enfrentados pelas instituições formadoras: falta de articulação entre teoria e prática
educacional, entre formação geral e formação pedagógica, entre conteúdos e métodos. Em
texto escrito em 1983, Candau e Lelis trabalham a relação teoria e prática no sentido de
identificar, nas práticas de formação de especialistas e professores, as concepções que
estariam informando aquela relação. Denunciando a perspectiva positivista que caracterizaria
a dicotomia entre teoria e prática, muito presente nos currículos dos cursos, as autoras buscam
na filosofia da práxis formulada por Vazquez (1977) um recurso para pensar uma visão de
unidade entre os dois pólos na perspectiva de uma teoria revigorada, porque formulada a
partir das necessidades da realidade educacional: A teoria em si não transforma o mundo.
Pode contribuir para sua transformação, mas para isto tem que sair de si mesma, e, em
primeiro lugar, tem que ser assimilada pelos que vão ocasionar, com seus atos reais, efetivos,
tal transformação. Entre a teoria e a atividade prática transformadora se insere um trabalho de
educação das consciências, de organização de meios materiais e planos concretos de ação:
tudo isso como passagem indispensável para desenvolver ações reais e efetivas. Nesse
sentido, uma teoria é prática na medida em que materializa, através de uma série de
mediações, o que antes só existia idealmente, como conhecimento da realidade ou antecipação
ideal de sua transformação. (Vazquez, 1977, p. 206)
Se essa via hoje parece ser problemática, dada a supervalorização da teoria em
detrimento da atividade cotidiana prática, considerando-se a infinitude do real e dos processos
de expansão e de revisão do conhecimento, postos pelo fim do leninismo e a derrocada da
União Soviética entre outros acontecimentos, o tema da práxis (que não se confunde com
prática utilitária) pode ainda ajudar a pensar as relações entre conhecimento científico, prática
social e saber docente, apesar da distância de tempo e dos novos desafios para a formação de
professores no Brasil, até porque hoje somos menos arrogantes quanto ao poder da teoria na
explicação e transformação do real.
Considerando que até a primeira metade da década de 1980, a literatura educacional
produzida está bastante marcada pela influência do marxismo nas leituras efetuadas por
Kosik, Gramsci, Vazquez, entre outros, assistimos na segunda metade dessa década ao
esforço de pensar a formação de professores para além das categorias de classe social,
trabalho manual e trabalho intelectual, infra-estrutura e superestrutura, até porque o
pessimismo pedagógico não havia estimulado a elaboração de trabalhos que apontassem
“formas de organização escolar e práticas de sala de aula que pudessem favorecer a
aprendizagem dos alunos de origem social desfavorecida” (Mello, 1993, p. 116).
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Alguns textos são expressões desse esforço por superar uma perspectiva conteudista
stricto sensu como, por exemplo, a reflexão desenvolvida por Candau (1997) em torno aos
novos rumos dos cursos de licenciatura.10 Trabalhando sobre algumas experiências
desenvolvidas em unidades responsáveis pelo ensino da física, da história/geografia e da
língua portuguesa, integrantes de instituições de ensino superior e médio de prestígio no Rio
de Janeiro, Candau (1997) chama a atenção para os obstáculos que as universidades
brasileiras precisam enfrentar na função de preparar consistentemente os professores para os
sistemas de ensino: separação entre atividades de ensino e pesquisa, predomínio da lógica
disciplinar em detrimento de uma prática interdisciplinar, supervalorização do lugar ocupado
pelas faculdades de Educação em detrimento das unidades responsáveis pelo conteúdo
específico. Pensando alternativas para os cursos de licenciatura, Candau defende o primado
do conteúdo específico sobre o conteúdo pedagógico na formação do professor: A
competência básica de todo e qualquer professor é o domínio do conteúdo específico.
Somente a partir deste ponto é possível construir a competência pedagógica. Esta afirmação
não implica a existência de uma relação temporal de sucessão, e sim de uma articulação
epistemológica. É a partir do conteúdo específico, em íntima articulação com ele, que o
tratamento pedagógico deve ser trabalhado. Enquanto as unidades específicas não assumirem
como responsabilidade própria a formação de professores, muito pouco poderão fazer as
unidades de educação. O que se propõe é uma nova concepção e uma reestruturação das
relações de poder presentes nas licenciaturas. Do ponto de vista conceitual, parte-se do
conteúdo específico para trabalhar a dimensão pedagógica em íntima relação com ele.
Assume-se que a liderança deve ser da área específica com a colaboração íntima das unidades
de educação. A responsabilidade deverá ser partilhada intimamente, mas o primado é da área
de conteúdo específico. Somente a partir desta mudança de eixo, que suscitará certamente
muitas resistências, será possível construir uma nova perspectiva para os cursos de
licenciatura. (Candau, 1997, p. 46)
Essa tomada de posição é importante porque revela a importância de se investir no
saber disciplinar, sem o qual não se efetiva a atividade de transmissão de conhecimento,
mesmo considerando-se que o que ensinar teria a primazia sobre o como ensinar. Levando-se
em conta que, até então, a formação de professores vinha sendo analisada no plano político-
pedagógico em sentido mais genérico, a proposta é provocadora, nesse momento, por duas
razões. Primeiro, por deslocar o “centro de gravidade” da formação de professores para as
unidades específicas, obrigando-nos a pensar em uma outra lógica que articula saber
disciplinar e saber pedagógico, sugerindo que a natureza da formação é multidisciplinar e,
portanto, mais complexa do que se supunha nas análises anteriores. Significou pensar o saber
do professor como sendo proveniente de duas fontes (Tardif, Lessard e Lahaye, 1991) –
conhecimento do conteúdo e conhecimento pedagógico –, embora sem a clareza do
significado e do conteúdo do que se estava nomeando como conteúdo pedagógico. A segunda
razão está na defesa da interdisciplinaridade ao enfatizar uma integração interna que, partindo
do conteúdo específico em direção ao pedagógico, garantisse a articulação a partir de núcleos
temáticos (Candau, 1997). Considerando que a formação de professores em cursos de
licenciatura se constituiu historicamente em um esquema onde predominava uma total
separação entre formação geral e formação pedagógica, a idéia de núcleos temáticos parece
promissora, pois pode vir a romper com os “guetos” institucionais, muito fortes na estrutura
universitária até hoje. E, mais, ao introduzir a dimensão epistemológica como eixo instituinte
da formação de professores na premissa de que “o domínio consistente de uma área específica
supõe uma adequada compreensão da construção do seu objeto, dos diferentes enfoques
metodológicos possíveis e suas respectivas bases epistemológicas, de sua lógica e sua
linguagem” (idem, p. 46).

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Mesmo se considerarmos que a afirmação do primado do conteúdo específico sobre o
conteúdo pedagógico poderia estar representando a hierarquização entre os campos do
conhecimento, derivando-se o pedagógico de uma ciência básica, o trabalho teve o mérito de
chamar a atenção para as relações de poder existentes no interior da universidade entre os que
pesquisam e os que ensinam, destacando a importância e a necessidade da investigação sobre
o ensino no horizonte da superação de uma visão intuitiva ou meramente política sobre a
transmissão/apropriação do conhecimento. Partindo da idéia de que a universidade de
pesquisa admitiu formar professores como “espécie de tarifa que ela paga para poder fazer
ciência em paz” (Menezes, 1986, p. 120), pensar a formação prévia de professores pela via da
pesquisa empírica, na ótica disciplinar, representou um avanço, se considerarmos as
resistências e problemas com que nos defrontamos institucionalmente na universidade.
Considerando ainda que perspectivas de análise têm uma história, identifico nesse
trabalho coordenado por Candau (1997), com os problemas que provoca – de natureza
epistemológica, política, pedagógica – o fermento para pensar as políticas de formação de
professores sem o “discurso sobre a teoria” tão freqüente entre os educadores. No balanço
efetuado, contudo, com algumas exceções, chegamos à década de 1990 sem avançarmos sobre
o conhecimento dos processos de ensino, de formação, presos a uma concepção de
competência que pouco avançou sobre quem são os professores, o que sabem, o que não
sabem, como ensinam, como aprendem, que problemas enfrentam no cotidiano de sua prática
profissional. Talvez porque hoje sabemos que sabemos menos e essa consciência nos fez
menos arrogantes, mas mais cuidadosos em definir, indicar um projeto para formação de
professores, sem as fórmulas teóricas abrangentes que invadiram o campo da educação até
bem pouco tempo. O significado da prática cotidiana na constituição dos saberes do professor
Na perspectiva de que “a constituição de um grupo de incompetentes implica a constituição
simultânea de um grupo de competentes” (Almeida, 1999, p. 6), assistimos, desde meados da
década de 1980, à expansão de programas de formação continuada no pressuposto de que,
através de conhecimentos provenientes da universidade, os docentes se equipariam de
ferramentas teórico-metodológicas que lhes permitiriam refletir e modificar suas práticas
(Lelis e Nunes, 2000).

Sob a forma de cursos de rápida duração, de oficinas, esses cursos representaram a


cisão entre os conhecimentos universitários e os saberes dos professores pois, salvo exceções,
partiam (e chegavam) a uma perspectiva fragmentada do conhecimento, ao estabelecerem
uma fratura entre a teoria (que passou a discurso) e a prática (substituída pela técnica)
(Kramer, 1995). Herdeiros de uma pedagogia centrada na transmissão do saber elaborado,
representaram um modelo “clássico” de formação, fundado na hegemonia teórica enquanto a
explicação do real, sendo a teoria confundida com a verdade (Brandão, 1992), com o
agravante de se fazer discurso sobre a teoria. Entretanto, na contramão desta tendência,
sofremos também o impacto de uma literatura internacional que nos chegou nos primeiros
anos da década de 1990, trazendo novos aportes à formação de professores. Seja pela via da
ênfase na relação entre dimensão pessoal, profissional e organizacional da profissão docente
(Nóvoa, 1992),11 seja pela via de que o saber docente provém de várias fontes e de que a
prática cotidiana faz brotar o “saber da experiência” (Tardif, Lessard e Lahaye, 1991),12 ou
ainda do habitus profissional como “gramática geradora de práticas” (Perrenoud, 1993),13 a
fecundidade dessas propostas está, de um lado, na forte crítica à razão instrumental e, de outro
lado, na valorização da prática individual e coletiva como lugar de aprendizagem dos
conhecimentos necessários à existência pessoal, social e profissional (Dominicé, 1990). De
certa forma, é o texto de Tardif, Lessard e Lahaye em 1991 que vem complexificar a lógica
conteudista, ao afirmar que a relação dos docentes com o saber não se reduz à transmissão de
conhecimentos já constituídos, sendo a prática, expressão de múltiplos saberes, incorporados
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em âmbitos, tempos, espaços de socialização diversos. Este texto contribuiu para a
demarcação de um novo idioma pedagógico na consciência de que a prática profissional está
marcada por uma trama de histórias, culturas que ultrapassam a dimensão pedagógica stricto
sensu.
Ou seja, sob ângulos diversos, estes autores ajudaram a pensar a constituição dos
saberes dos professores, em um pauta diversa de uma pedagogia centrada no saber elaborado,
ao refletirem sobre os limites da formação prévia e, nela, dos conhecimentos acadêmicos na
constituição do saber docente; ao afirmarem a centralidade da instituição escolar enquanto
locus de formação do magistério; ao revelarem a força da experiência escolar passada
enquanto aluno no desenvolvimento da prática pedagógica; e, finalmente, ao assinalarem o
caráter de improvisação a marcar o trabalho docente. De certa forma, esta produção efetuou a
“curvatura da vara”, ao conferir à prática uma instância de produção do saber profissional, de
outra latitude se comparado ao papel do conhecimento que provém da universidade. Ao
problematizarem uma perspectiva centrada no saber acadêmico, estimulam o
redimensionamento do sentido da teoria, tomando-a muito mais como hipótese, sendo a
verdade considerada como processo, provisória e parcial (Brandão, 1992). Considerando que
ainda não temos uma tradição em pesquisa acumulada sobre os saberes do professor, sobre a
experiência cotidiana como lugar de construção de saberes, e que vivemos em um momento
de clara hegemonia do projeto neoliberal no campo da educação, algumas questões colocam-
se como desafiadoras: Que cuidados precisamos tomar para não privilegiarmos em excesso a
realidade intra-escolar, micro-social, e perdermos com isto dimensões contextuais do trabalho
docente no plano político social mais amplo? Como evitar o superdimensionamento do
pedagógico, indiferente às diferenças sociais de gênero, classe social e etnia, tão fortes em
nosso país? Como lidar com a dimensão cognitiva articulando-a à esfera das culturas com
seus ritos, símbolos e mitos? Ou seja, trabalhar com a prática, social e profissional, como
espaço de constituição dos saberes do professor, implica não perder de vista o universo
cultural dos diferentes agentes sociais que fazem histórica e culturalmente a escola.
Mas há ainda outras questões trazidas por este idioma pedagógico. Que cuidados
precisamos tomar para não resvalarmos para um praticismo em migalhas, na relativização
quanto ao lugar ocupado pela teoria? Sob que critérios operaremos com a prática profissional,
de modo a torná-la um espaço de construção de saberes rigorosos sem serem rígidos? Como o
saber do mundo da experiência sensível pode ser transposto para uma razão que se quer
dialógica e processual? Se estas questões podem contribuir como bússolas em nossas
pesquisas, certamente será a experiência prática e concreta, com a ajuda das lições do
passado, que nos ajudará a buscar novos objetos, novos problemas, novos idiomas
pedagógicos.

Notas
1. A autora utiliza a categoria da mediação para se referir a “processos de fatos existentes na
realidade objetiva, que são ações recíprocas, a trama das relações que ocorrem entre partes,
forças, fenômenos de uma totalidade” (p. 24).
2. Para Mello (1982), Moscovici deixa claro que as representações não constituem apenas o
reflexo, invertido ou não da realidade de um objeto social, sendo diferentes das imagens, tal
como estas últimas são entendidas em psicologia social. O que dá especificidade às
representações “é que em cada ator singular elas se constituem pela mediação de sua
subjetividade, a qual configura um modo próprio de se apropriar, reelaborar e praticar idéias”
(p. 40).
3. Para Lelis, no tecnicismo, a preocupação estava voltada para a mera instrumentalização
técnica, estando a formação de professores orientada pelo domínio de comportamentos e
habilidades observáveis e mensuráveis ( p. 44).
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4. A polêmica instalada expressou-se em dois textos publicados em Educação & Sociedade,
números 14 e 15, provocados pela tese de Mello (1982): um primeiro, de Nosella (1983),
problematizando a competência técnica como momento prévio do compromisso político, e um
segundo, de Saviani (1983), comentando o texto de Mello (1981) e respondendo a Nosella na
perspectiva de mediar um conflito em torno à função política da escola e sua mediação pela
via da competência técnica.
5. Para Gadotti, a pedagogia dos conteúdos foi desenvolvida no Brasil por Dermeval Saviani,
Guiomar Namo de Mello, José Carlos Libâneo e Carlos Roberto Cury, apoiados por autores
como Georges Snyders, Makarenko, Bernard Charlot, Bogdan Suchodolski e Mario
Manacorda; situa-se como uma das vertentes da pedagogia progressista (p. 92).
6. Para Saviani (1980), “passar do senso comum à consciência filosófica significa passar de
uma concepção fragmentária, incoerente, desarticulada, implícita, degradada, mecânica,
passiva, simplista a uma concepção unitária, coerente, articulada, explícita, original,
intencional, ativa e cultivada” (p. 5).
7. A Pedagogia Crítico Social dos Conteúdos é um movimento que nasce da reunião de
intelectuais em torno da Ande. Para Libâneo, um dos seus principais ideólogos, o nome PSCS
tem sua inspiração na leitura de A mistificação pedagógica, de Bernard Charlot, obra com
forte penetração entre os educadores.
8. O tema da formação do educador mobilizou o campo intelectual, expressando-se sobre a
forma de publicações, encontros, seminários do norte ao sul do país, desde o início dos anos
de 1980. Representava a oposição tanto ao especialista em conteúdo como ao técnico em
educação (Pereira, 2000).
9. Entrevista de Libâneo, concedida por e-mail a alunos do programa de Pós-Graduação em
Educação Brasileira, em maio de 1999.
10. A pesquisa Novos Rumos da Licenciatura foi desenvolvida no período de 1985-1987 e
contou com equipe constituída pelas professoras do Departamento de Educação da PUC-Rio
Vera Maria Ferrão Candau (coord.), Menga Lüdke, Ana Waleska P. C. de Mendonça, Rosina
Wagner e Yara Wall e alunos da pós-graduação.
11. Antonio Nóvoa foi um dos propulsores da tendência ao uso de histórias de vida na
pesquisa sobre formação de professores, especialmente a partir da chegada, em 1992, da obra
Vidas de professores, por ele coordenada.
12. Este artigo foi traduzido por Léa Paixão e publicado em 1991 na revista Teoria e
Educação nº 4. Deve ser considerado um trabalho inaugural no campo do saber docente no
Brasil, expressão de um programa de pesquisa que reúne pesquisadores de várias
universidades canadenses, como Maurice Tardif, Clermont Gauthier, Claude Lessard,
Danielle Raymond, entre outros.
13. Nosso primeiro contato com o pensamento de Philippe Perrenoud deu-se através do livro
Práticas pedagógicas, profissão docente e formação: Perspectivas sociológicas, publicado
pela Dom Quixote, em 1993.

FROM TEACHING THE CONTAINS TO TEACHER’S


KNOWLEDGE: A CHANGE OF THE PEDAGOGIC IDIOM?

ABSTRACT: This work has the objective of to decipher a few tendencies of the intellectual
production about teacher’s education in the last years in Brazil, bringing the attention to the
“pedagogic idioms” which caused impact among educators. In “mapping” specialized
literature, a few authors/texts were taken as examples for they represented the logic of
thought, markly about the significance of the theory and practice in the teacher’s education.
From the balance made, what was noticed, was a rupture from a pedagogy markly with
contains to an epistemology of practice.
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Key words: teacher’s education, pedagogic idiom, teaching contains,


teacher’s knowledge, relation theory-practice.

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