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Universidade Federal de Goiás

Faculdade de Letras
Programa de Pós-Graduação em Letras e Linguística
Disciplina: Sociolinguística
Professora: Dra. Sílvia Lúcia Bigonjal Braggio
Aluno: Jair Osvaldo Sancha Silva

Revolução da linguagem : uma ode à diversidade linguística

Aos 66 anos, com um rastro bibliotecário de mais de cem livros lançados, o


pesquisador britânico David Crystal é um dos principais linguistas vivos e um dos nomes
centrais de um movimento ainda pouco difundido. Recentemente, Crystal levou ao papel
de modo bastante esquemático as bases desse activismo linguístico, que começou nos
anos 90: a protecção de línguas em extinção. Ele é um "ecologista" de idiomas.

Editado na Inglaterra em uma colecção chamada “Temas para o século 21”, A


revolução da linguagem retoma conceitos de três trabalhos anteriores de Crystal. As
ideias originalmente apresentadas em English as a global language, Language death e
Language and the internet, publicados entre 1997 e 2001, são descritas na nova obra
como partes de um mesmo fenómeno: uma transformação estrutural na ecologia
linguística global em curso desde a década de 1990.
O livro aponta as principais questões que devem ser debatidas e os caminhos
necessários para que as línguas e as variações linguísticas sejam cada vez mais
valorizadas, protegidas e respeitadas. Ao mostrar a importância da aproximação dos
estudos de língua e literatura e do papel da educação nesse processo, Crystal brinda-nos
com uma obra indispensável tanto para estudiosos quanto para interessados no assunto,
abordando temas super interessantes, e, mais importante que isso, do quotidiano, aos
quais não devemos ser alheios e/ou indiferentes, tais como a morte de línguas, a mudança
e a interferência linguísticas, o multilinguismo, o bilinguismo, entre outros.

No início do século 21, o mundo todo observa uma série de transformações


linguísticas dramáticas, que segundo o pesquisador David Crystal marca uma nova era na
evolução da linguagem humana. Ele diz que três importantes tendências são responsáveis
por essas alterações: a emergência do inglês como primeira língua global de facto, a crise
enfrentada por muitas línguas ameaçadas de extinção e o efeito da Internet que motiva o
surgimento de variedades linguísticas novas. “Pode parecer um truísmo, mas sobre a
linguagem, que oferece uma terceira forma de comunicação, diferente da fala e da escrita,
é necessário que se diga: numa era de comunicação global, todos precisam ter
consciência da língua”, afirma Crystal.
A emergência do inglês como a primeira língua internacional do mundo, falada
por um número de pessoas sem precedentes em toda a história, é o ponto de partida da
argumentação de Crystal. Mais importante que isso: o número de falantes não-nativos do
inglês já supera – e muito – o de nativos. Novas palavras e expressões gramaticais
enriquecem e pluralizam a língua de Shakespeare.
As mudanças são inevitáveis. A influência que o inglês sofre de outras línguas é
positiva. Os empréstimos sempre acrescentam valor semântico. Os puristas estão por fora
quando tentam barrar o uso de determinados termos. Quando falamos da e sobre a língua
inglesa, não se pode dizer ISSO é ISSO e AQUILO é AQUILO pois, a cem quilómetros
de distância, a situação linguística, social e étnica pode ser completamente diferente.

São essas as questões abordadas por Crystal no primeiro capítulo; o que


provavelmente vai acontecer ao inglês enquanto lida com pressões para se tornar uma
língua global em um período de tempo relativamente curto. Mas há o outro lado da
moeda. Quando uma língua se torna dominante em um país, existem sempre implicações
para as outras línguas locais: como elas mantêm a identidade? Quando uma língua passa
a ser global, essas implicações afectam todas as línguas. Uma série diferente de perguntas
surge. A influência do inglês vai ser tão forte a ponto de mudar permanentemente o
carácter de todas as outras línguas? E o inglês poderia destruí-las?

A morte das línguas, decorrente dessa supremacia do inglês, é a maior


preocupação de Crystal. O autor, conhecido como um activista pela diversidade
linguística, alerta para um cenário preocupante: a cada duas semanas, morre uma língua
no mundo. Para lutar contra esse perigoso fluxo, o autor tem um plano e pretende
conquistar adeptos: quer que o tema seja abordado na mídia, nas escolas primárias, nas
artes plásticas, na música, na literatura. Quer um prémio – uma espécie de Nobel da
linguística – para os militantes em prol da diversidade das línguas. Quer gritar ao mundo
inteiro: os Pandas precisam de nossa ajuda, mas as línguas também – vamos salvá-las da
extinção!
Com este livro, Crystal tem a esperança de contribuir, ainda que modestamente,
para a tomada de consciência de uma necessidade, a de fazer todo o possível para travar a
morte acelerada das línguas, ou muito simplesmente, o que os homens têm de mais
humano. A morte de um idioma, explica, é a de uma cultura. "Morrem tradições,
folclores, sentimentos, memórias". Crystal defende que o interesse por elas deveria ser
global. "Se existe alguma espécie de animal ou planta em extinção da qual só restam
exemplares na Papua-Nova Guiné ou no Brasil, muitos países ficam comovidos", diz. "A
morte de um dialecto é uma perda tão grande para a humanidade em geral quanto a da
última espécie de um animal."- acrescenta.
Tal como as civilizações, as línguas são mortais. No entanto, aos olhos das
criaturas finitas que somos, a morte das línguas tem algo de perfeitamente insólito e de
exaltante: elas são capazes de ressurreição! Assim, outro propósito deste livro é muito
simples. Ele pretende mostrar três verdades: primeiro, que as línguas, são provavelmente
o que as nossas culturas humanas têm de mais vivo; segundo, que elas são mortais e que
morrem em quantidades impressionantes e a um ritmo assustador, se não se lutar pela sua
manutenção; terceiro, que a sua morte não é um aniquilamento definitivo e que algumas
renascem, se se souber promovê-las.
Defender as línguas humanas na sua diversidade é mais do que defender as
culturas humanas. É defender a própria vida dos homens.
Para evitar a extinção das línguas, deve-se dar vida nova às línguas que se vêem
ameaçadas, ou seja revitalizá-las. Para que tal objectivo seja alcançado é fundamental
documentar a língua, colocá-la no papel ou em seu equivalente digital. Ao morrer, as
pessoas deixam sinais de sua passagem pelo mundo, recuperáveis pela arqueologia. Mas
a língua falada não deixa vestígios. Quando uma língua que jamais foi documentada
morre, é como se jamais tivesse existido.
Outra medida fundamental – tratada no capítulo IV – é a consciencialização das
pessoas desse problema em escala mundial. Essa revitalização só será conseguida com a
participação de todos nós.
A Internet também poderá ter um papel fundamental para o alcance desse
objectivo. O futuro da Internet aponta muito para o multilinguismo, a exploração e o
entendimento interculturais. A Web dá as boas vindas à diversidade linguística global. E
em uma era em que muitas línguas estão morrendo, esse optimismo é realmente
revolucionário.
Para Crystal, a língua na era da Internet é o sinal mais claro de que a situação
linguística actual é revolucionária, sem medo da grandiosidade da palavra. A rede
mundial de computadores inaugurou uma forma de comunicação singular, a meio
caminho entre o oral e o escrito. O discurso da Internet afectou mais os processos
comunicativos do que qualquer outra inovação tecnológica na história desde a invenção
da escrita. E nada mais natural do que criar novos códigos compartilhados entre seus
usuários – por isso Crystal rebate qualquer argumento purista de que as recorrentes
abreviações e neologismos em chats e e-mails sejam prejudiciais às línguas.
Nas páginas de seu livro, Crystal concorda que a Internet vem promovendo uma
enorme revolução na linguagem, mas analisa o fato como algo próprio da linguística. "É
a evolução natural da comunicação", garante o linguista, que, para definir esse fenómeno,
criou o neologismo em inglês "netspeak" (língua da rede). "Não acredito que a expansão
da Internet possa comprometer o uso correcto da gramática. Toda vez que uma nova
tecnologia surge, as pessoas condenam-na sob a acusação de que ela vai assassinar a
língua ou deteriorar a cultura", analisa. "Quando a escrita foi inventada, ela não substituiu
o lugar da fala. Pelo contrário, somou-se a ela. O mesmo ocorreu com a imprensa e a
televisão", continua Crystal.
O desenvolvimento e a utilização da Internet acabaram produzindo, entre seus
usuários, uma linguagem própria, repleta de termos típicos, ou seja, todo o usuário, de
uma maneira ou de outra, acaba compreendendo o conjunto da rede e os termos que
determinam seu conteúdo e funcionamento. As expressões, no campo da lexicologia e da
terminologia, ultrapassam o contexto cibernético e representam um factor concreto da
globalização.
A linguagem conhecida como internetês já é uma realidade que ultrapassou as
fronteiras da Internet. Agora, a preocupação é de como está sendo usada e até que ponto
pode influenciar no aprendizado e na comunicação entre as pessoas.
Muitos professores acreditam que essa linguagem é errada e está acabando com a
língua portuguesa. A preocupação de muitos é que esta nova linguagem da Internet acabe
interferindo na língua portuguesa, pois até verbos novos foram criados, como “deletar”,
“resetar”, derivados dos termos utilizados originalmente em inglês, como "delete" e
"reset", respectivamente. Eu encaro com certa naturalidade, porque como uma língua
viva, ela evolui, transforma-se, isso é natural. Eu acho que é muito importante hoje, o
professor de língua portuguesa, primeiro, não se assustar com o problema, e procurar
conhecer esse código.
É compreensível que muitas pessoas não gostem da mudança, mas a maior parte
das críticas à mudança linguística é infundada. Um certo grau de precaução e cuidado é
sempre desejável, portanto, no interesse de manter a comunicação precisa e efectiva; mas
não há fundamento algum para o extremo pessimismo e conservadorismo que se encontra
tão frequentemente.
A língua muda porque a sociedade muda. Deter ou controlar uma delas exige que
detenhamos ou controlemos a outra – uma tarefa que só pode ter êxito muito limitado. A
mudança linguística é inevitável e raramente previsível, e aqueles que tentam planejar o
futuro de uma língua perdem seu tempo em acreditar que podem fazê-lo - um tempo que
poderia ser melhor gasto em imaginar novas maneiras de capacitar a sociedade a lidar
com as formas lingüísticas novas que acompanham cada geração.
A linguagem da Internet é uma vertente da língua e não é errada. O importante é
saber onde e quando usá-la. Quanto ao aspecto oral da linguagem, o internetês é uma
realidade criativa e inofensiva. O uso do internetês como única opção de linguagem, isso
sim é preocupante. O perigo está no seu uso limitado e no próprio usuário – adolescente
ou não – que só se dedique a escrever e se comunicar desse modo, em tudo na sua vida. A
preocupação é "adoptar" o internetês como único recurso escrito alternativo, exactamente
por ser simplificado e pobre de regras gramaticais e linguísticas.
A saída é saber impor limites. Uma coisa é usar gírias e internetês na
informalidade e com amigos. Outra é levar esses vícios para toda a comunicação. O que
não pode acontecer é passar para o papel (no momento de uma redacção) esta nova
escrita, justamente para se evitar contradições com o modelo pedagogicamente correcto e
aceite pelas línguas. Devemos saber onde usar determinada linguagem. A Internet é um
veículo que exige rapidez, portanto é preciso que se comunique de uma forma veloz.
Uma prova exige conhecimento, portanto a linguagem usada é outra. Ou seja, não
podemos usar a linguagem da Internet em uma prova, da mesma forma que não devemos
usar a linguagem de uma prova na Internet. Em cada caso, se usa um tipo de linguagem
para que um entenda o outro em seu respectivo lugar ou veículo.
Só o tempo irá dizer quais os riscos que o internetês pode provocar na Língua
Portuguesa padrão. Mas uma coisa é certa: do ponto de vista linguístico, essa linguagem
não oferece nenhum perigo.

A revolução da linguagem visa o grande público, pouco habituado com os


conceitos da linguística, e até os leitores não usuários da Internet.
Embora o texto seja um pouco repetitivo, a mensagem final é clara e a leitura, fluida. O
livro de Crystal – uma ode ao pluralismo linguístico – propõe soluções para questões
actuais e decerto agradará ao leigo interessado em línguas e a professores de idiomas,
inclusive o português.  

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