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Πεντάτευχος

Pentateuco

‫ּתֹורה‬
ָ
TORAH

Codó – MA
2018
Sumário

1 - PENTATEUCO......................................................................................................................................................3
FORMAÇÃO DO PENTATEUCO .............................................................................................................................3
O PENTATEUCO E A HISTÓRIA DE ISRAEL ............................................................................................................4
LEITURA CRISTÃ DO PENTATEUCO ......................................................................................................................5
2 - GÊNESIS ..............................................................................................................................................................5
CONTEÚDO E ESTRUTURA ...................................................................................................................................6
FONTES E GÊNEROS LITERÁRIOS .........................................................................................................................7
TEOLOGIA E LEITURA CRISTÃ ...............................................................................................................................8
3 - ÊXODO ................................................................................................................................................................9
CONTEÚDO E DIVISÃO .........................................................................................................................................9
AUTOR ...............................................................................................................................................................10
GÊNERO LITERÁRIO ...........................................................................................................................................10
LEITURA CRISTÃ E TEOLOGIA .............................................................................................................................10
4 - LEVÍTICO ...........................................................................................................................................................11
CONTEÚDO E DIVISÃO .......................................................................................................................................11
ESPÉCIES DE SACRIFÍCIOS ..................................................................................................................................12
TEOLOGIA E LEITURA CRISTÃ O LEVÍTICO..........................................................................................................13
5 - NÚMEROS ........................................................................................................................................................13
CONTEÚDO E DIVISÃO .......................................................................................................................................14
TEOLOGIA ..........................................................................................................................................................14
LEITURA CRISTÃ .................................................................................................................................................15
6 - DEUTERONÔMIO .............................................................................................................................................15
NOME ................................................................................................................................................................15
TEXTO E CONTEXTO ...........................................................................................................................................16
DIVISÃO..............................................................................................................................................................16
TEOLOGIA ..........................................................................................................................................................17
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1 - PENTATEUCO

Este nome grego significa “cinco rolos”, ou livros, e inclui Génesis, Êxodo, Levítico, Números
e Deuteronômio. A autoria do Pentateuco, tradicionalmente considerado como Lei de Moisés, foi
atribuída a este grande líder do povo hebreu tanto pelo judaísmo como pelo cristianismo antigos. Hoje,
sabe-se que nenhum destes livros se pode atribuir a um único autor e menos ainda a Moisés, pois todos
tiveram uma história literária complexa, como veremos.

Para além desta referência a Moisés, os livros do Pentateuco têm uma certa sequência temática,
pois descrevem as origens do povo de Israel até à sua definitiva instalação em Canaã. Nomeadamente:
a origem da humanidade e do próprio povo hebreu na época patriarcal, a saída do Egito e a longa
travessia do deserto; é nesta última fase que aparecem enquadradas as leis fundamentais para a vida
religiosa e social dos israelitas. Longas secções narrativas alternam com grandes conjuntos de leis.

O modo de escrever daquele tempo, misturando História, Direito e Liturgia, não coincide com o
nosso modo de fazer História; ao mostrarem a intervenção de Deus nessa História, os autores do
Pentateuco pretendem também apresentá-la como modelo da presença de Deus na História de cada povo.

FORMAÇÃO DO PENTATEUCO
Segundo alguns estudiosos, o texto atual deste conjunto resultaria de uma história literária
anterior, a que chamam “fontes” ou “documentos” conhecidos com o nome de Javista (J), Eloísta (E),
Sacerdotal (P) e Deuteronomista (D).

De qualquer modo, o Pentateuco não foi escrito de uma só vez nem é obra de um único escritor.
Foi escrito a partir de tradições orais e escritas que se foram juntando progressivamente e formando
unidades maiores ao longo da história. A junção de todo o material só se deu na época pós-exílica, altura
em que se pode falar da redacção final do Pentateuco. Certamente que o período à volta do Exílio
influenciou a leitura de todo esse património histórico e religioso; mas, as tradições e outros materiais
podem ser bastante antigos e manter, na sua forma final, os traços dessa antiguidade.

Provavelmente, o processo de formação dos cinco primeiros livros da Bíblia desenvolveu-se, nas
suas linhas gerais, em vários períodos.

No início estaria um núcleo narrativo histórico bastante restrito, da época de Salomão. Este núcleo é
depois retomado e ampliado por volta dos finais do séc. VIII a.C., recolhendo tradições e fragmentos do
reino do Norte e relendo tradições antigas numa nova perspectiva.
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No séc. VIII aparece o Deuteronômio primitivo, descoberto no tempo de Josias (622 a.C.) e
incluindo essencialmente leis e um pequeno prólogo. É depois ampliado para dar o texto atual de Dt 1-
28.

As questões levantadas pelo Exílio fazem aparecer a grande obra histórica «deuteronomista» que
se vai elaborando ao longo de várias fases, integrando, de algum modo, todos os materiais já recolhidos
anteriormente. Esta grandiosa reconstrução provoca uma série de retoques «deuteronomistas», ao longo
de todo o texto do Pentateuco, que já estaria redigido.

No exílio da Babilónia aparece o «escrito sacerdotal primitivo», obra dos sacerdotes exilados.

Depois do regresso do Exílio, no séc. V, este escrito é combinado com os precedentes, retocado
e aumentado nalguns aspectos e vai ocupar um lugar dominante no conjunto da narração. A esta redacção
final se deve o termo de toda a trama narrativa na morte de Moisés e, logicamente, a delimitação do
Pentateuco, separando o Deuteronômio do resto da história deuteronomista. Este trabalho deve ter sido
concluído por volta do ano 400 a.C..

O PENTATEUCO E A HISTÓRIA DE ISRAEL


O Pentateuco recebeu inegáveis influências de todos estes documentos ou tradições e de muitos
outros fatores ligados à História e à religião de Israel. Mas, o que os autores do Pentateuco pretendem
manifestar nesta História Sagrada não é tanto o povo com as suas virtualidades e peripécias históricas,
mas o domínio absoluto de Deus sobre todas as coisas e sobre todas as instituições humanas, incluindo
a realeza, que no Médio Oriente era considerada de origem divina. O poder vem de Deus e da sua
Palavra, transmitida pelos seus intermediários.

Esta “Lei” não é um simples conjunto de leis humanas; é um “ensinamento” para viver segundo
a vontade de Deus, um chamamento à perfeição e à santidade: «Porque Eu sou o Senhor que vos fez sair
do Egito, para ser o vosso Deus. Sede santos, porque Eu sou santo.» (Lv 11,45)

O Pentateuco é a Carta magna do judaísmo pós-exílico. Após esta difícil mas frutífera
experiência, o Estado judaico, antes apoiado nas estruturas da monarquia davídica, passa a reger-se
unicamente pela “Lei” de Deus e deixa-se orientar pelos que detêm o monopólio do culto, os sacerdotes.
Uma comunidade monárquica transforma-se numa comunidade cultual em honra do Deus da Aliança.
São os sacerdotes que editam e reeditam a Lei.

Sendo uma História Sagrada em que se manifesta a presença do Deus da Aliança na vida do seu
povo, o Pentateuco desenvolve-se a partir de três fatores principais: a epopeia do Êxodo, a Lei do Sinai
e a fé num Deus único. Por isso, mais tarde, e diferentemente de outros povos, Israel não necessitou da
monarquia para sobreviver.
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LEITURA CRISTÃ DO PENTATEUCO


O Pentateuco é uma história nunca terminada, mas sempre aberta às infinitas possibilidades do
Senhor da História. Podemos, pois, dizer que o resto do Antigo Testamento é, de algum modo, uma
releitura contínua do Pentateuco à luz de novos acontecimentos da História de Israel e do mundo que o
rodeia.

Mas o Pentateuco também aponta para um novo Êxodo, para uma outra Terra Prometida, para
uma outra presença de Deus Jesus Cristo. Ele é a nova Lei, a nova manifestação de um Deus que nunca
cessa de renovar a Aliança com o seu povo. Cristo e os primeiros discípulos leram o Pentateuco como
uma história aberta que se completa na vinda do Messias. A partir daí, a relação do homem com Deus
já não passa pela observância material da Lei, mas pelo seguimento de Cristo. Porém, aquilo que se põe
de lado não é o Pentateuco, mas apenas a interpretação fechada que dele fez o judaísmo rabínico.

Assim, o Pentateuco não só não impede, mas ajuda a compreensão de Cristo e do seu Evangelho:
ao lê-lo, pensamos no Evangelho, e quando lemos o Evangelho, encontramos as suas raízes no
Pentateuco; não se pode ler os mandamentos da Lei, sem os comparar com os mandamentos da Nova
Lei as Bem-aventuranças.

Os cristãos reconhecem em Cristo a Palavra de Deus encarnada, e no Evangelho, a Nova Lei; Lei
que não vem abolir a antiga, mas dar-lhe toda a perfeição (Mt 5,17-18). Cristo, de que Moisés era apenas
uma figura, veio fundar um novo povo, uma nova comunidade, liberta na Páscoa da sua Paixão-
Ressurreição. Numa palavra, Cristo é, para os seus discípulos, a nova Lei, a nova Páscoa, o novo Templo
de Deus entre os homens (Jo 2,21; Ap 21,3.22), a nova Aliança, não apenas com um povo, mas com toda
a Humanidade.
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2 - GÊNESIS

Ao primeiro livro da Bíblia – e, portanto, do Pentateuco – damos hoje o nome de GÉNESIS. É


termo grego e significa “origem”, “nascimento”. Os livros da Bíblia Hebraica não tinham qualquer título.
Eram chamados, simplesmente, pela primeira ou primeiras palavras. Este chamava-se berechit. Os
autores da tradução da Bíblia Hebraica para o grego (Bíblia dos Setenta) acharam por bem dar aos livros
um título de acordo com o seu conteúdo. Como este livro trata do princípio de tudo, chamaram-lhe
GÊNESIS, isto é, Livro das Origens.
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CONTEÚDO E ESTRUTURA
Todos os povos se perguntaram alguma vez: Donde viemos? Qual foi a nossa origem? Quem foi
o fundador do nosso povo? Qual o nosso destino? Umas vezes, essas perguntas eram formuladas a partir
de situações de desgraça coletiva: Que sentido tem o nosso fracasso e o nosso sofrimento? Que sentido
tem a morte irremediável? Há um Alguém que possa responder a todas as interrogações do homem?
Outras vezes, tinham um fundo político, pretendendo legitimar situações de privilégio presente ou
reclamar direitos fundados num passado mais ou menos remoto.
O povo de Israel, na sua reflexão interna ou no confronto com outros povos, religiões e culturas,
colocou a si próprio estas e outras questões semelhantes e deixou-nos as suas respostas neste livro. O
GÉNESIS é, pois, o livro das grandes interrogações e das grandes respostas, não só do povo de Deus,
mas de toda a humanidade. Por isso se diz que este livro é uma espécie de grande pórtico da catedral da
Bíblia, pois de algum modo a resume na totalidade da sua beleza e conteúdo.
O GÊNESIS engloba, também, grande parte da História do povo de Israel: desde “as origens”
até à estadia de Jacob no Egito e a consequente formação das doze tribos. Pretendendo dar-nos uma
concepção histórica, horizontal e dinâmica da História da Salvação, este livro faz a ligação entre “as
origens” da humanidade (1,1) e a História concreta do povo de Israel. Por isso apresenta--nos, sobretudo
nos 11 primeiros capítulos, teologia e catequese em forma de História, ou melhor, de histórias e não de
factos históricos no sentido científico. Poderíamos resumir assim o seu conteúdo:
I. História das Origens (1,1-11,32)
1,1-2,4a: Criação do universo e dos seus habitantes (segundo a tradição Sacerdotal: P).
2,4b-3,24: Formação do homem e da mulher. Origem do pecado (tradição Javista: J).
4,1-24: “História de dois irmãos”, Caim e Abel. Descendência do primeiro.
4,25-5,32: Set e a sua descendência.
6,1-9,17: Corrupção da humanidade e Dilúvio (anti-Criação).
9,18-10,32: Re-criação, a partir de Noé, o homem novo. Lista de povos.
11,1-9: Torre de Babel: a humanidade constrói uma sociedade sem Deus.
11,10-32: Descendência de Sem até Abraão, promessa de um povo novo.

II. História dos Patriarcas (12,1-50,26)


Ciclo de Abraão (12,1-23,20): vocação, emigração para Canaã e Egito. Nascimento de Isaac e Ismael.
Morte de Abraão.
Ciclo de Isaac (24,1-27,46).
Ciclo de Jacob (28,1-36,43): já a partir de 25,19, Jacob começa a tornar-se a personagem principal, tanto
em relação ao pai (Isaac), como em relação a seu irmão Esaú.
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Ciclo de José (37,1-50,26): o penúltimo dos filhos de Jacob, vendido como escravo para o Egito, faz a
ligação histórica e teológica com o livro seguinte, o Êxodo. É um ciclo muito especial, também chamado
História de José.
Este esquema histórico-literário apresenta-se como uma obra prima, não só a nível teológico,
mas também na sua estrutura literária. De facto, a “História das Origens” (cap. 1-11) aparece como
Prólogo histórico-teológico da História de Israel e da humanidade. E pretende ser o elo de ligação entre
a Criação do mundo e Abraão, o pai do povo hebreu (cap. 12). O Egito, como lugar de escravidão do
Povo, é lugar de peregrinação para Abraão, Jacob e José. Estes e outros elementos fazem a ligação deste
livro com o Êxodo e com os outros livros seguintes.

FONTES E GÊNEROS LITERÁRIOS


Donde vem todo este material? O povo hebreu vivia numa região onde se cruzavam muitos povos
e civilizações. Este facto originou um inegável intercâmbio cultural entre eles. Os impérios que
dominaram a Mesopotâmia e o Egito, assim como as civilizações da Fenícia e de Canaã, são a fonte
literária e histórica do GÉNESIS e do AT em geral.
É inegável que nos 11 primeiros capítulos se encontram abundantes elementos dessas culturas,
incluindo alusões a certos mitos da Suméria, da Babilónia e de Ugarit, especialmente aos poemas da
Criação, Enuma-Elish e Atrahasis. O poema de Gilgamesh está também presente no relato do Dilúvio.
Muitas vezes, os autores do Génesis colocam-se em polémica aberta contra os mitos pagãos, como no
caso de 1,1-2,4a.
A História Patriarcal (cap. 12-50) acolheu lendas antigas e referências a El, que faziam parte do
espólio cultural dos santuários cananeus. Encontramos, igualmente, pequenos factos alusivos ao
convívio com povos vizinhos. No que se refere à origem dos Patriarcas, há relatos sobre os antepassados
tribais, heróis antigos, genealogias ou listas de patriarcas (cap. 5) e de povos (cap. 10), e outras histórias
que pretendiam explicar a origem dos povos em geral e de Israel em particular. Por isso, este livro tem
géneros literários variados:
A lenda: é o mais comum e consiste em produzir um relato a partir de um facto real, nome de
pessoa ou de lugar. Há lendas etiológicas, que pretendem explicar, no passado, a “causa” de qualquer
fenómeno ou acontecimento do presente. Um belo exemplo de lenda etiológica é o relato da destruição
de Sodoma e Gomorra. Há ainda lendas etiológicas para explicar a origem de nomes de pessoas (para
Isaac, que significa “rir”, ver 18,9-15; 21,2-7).
A genealogia: é uma lista de nomes que recua o mais longe possível até ao passado, a partir do
presente. Pretende justificar no aspecto jurídico certos acontecimentos, privilégios de uma classe social
ou de um povo (5,1-32; 10; 11,10-32). É sua intenção preencher o imenso espaço entre a Criação e a
História do povo hebreu.
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As sagas ou histórias antigas de todo o género: luta pelos poços, guerras tribais, histórias de
famílias...
Também encontramos aqui a linguagem mítica. Sabemos que os autores do GÊNESIS
combateram os mitos. Mas, para falar dos grandes problemas da humanidade, não deixaram de utilizar
a linguagem e certos elementos mitológicos que estavam em voga, como a criação do homem a partir
do barro (2,7), a árvore da Vida e a árvore da ciência (2,9-10; 3,1-6), o mito da serpente (cap. 3). Todo
este material foi colecionado muito lentamente. Primeiro surgiram pequenos conjuntos à volta de um
santuário, de um acontecimento ou de uma personagem; podemos chamar-lhes tradições, e foram
transmitidas oralmente, ao longo de muitos séculos. Quando aparece a escrita, essas tradições são fixadas
em documentos. Com a queda do Reino do Norte (Samaria), em 722, essas tradições são trazidas para o
Sul (Jerusalém). Finalmente, no período do Exílio (587-538), os redatores da escola Sacerdotal reúnem
todas as grandes tradições e documentos existentes, imprimindo-lhes o seu próprio estilo e teologia.
Podemos dizer que o GÊNESIS contém material recolhido entre os séculos XIII-V a. C.

TEOLOGIA E LEITURA CRISTÃ


Apesar de conter muitos elementos históricos, o GÊNESIS é uma obra essencialmente teológica
que procurava responder aos problemas angustiantes colocados pelo acontecimento do Exílio (séc. VI):
no meio das trevas, Deus é a luz do seu povo; no desespero do cativeiro, Deus há de renovar a Aliança
feita depois da saída do Egito.
Por detrás das “histórias” contadas pelos seus autores, o GÊNESIS contém os grandes temas
teológicos, não somente do Pentateuco mas da Bíblia em geral: a Aliança de Deus com a humanidade,
o pecado do homem, a nova promessa de Aliança, a promessa da Terra Prometida, a bênção de Deus
garantindo a perenidade do Povo, o monoteísmo javista.
O GÊNESIS não foi redigido para escrever História, mas para dizer que Deus domina a História.
Por isso, é essencialmente um livro de catequese e de teologia, mesmo nos 11 primeiros capítulos, em
que não há preocupação histórica ou científica, no sentido atual. Por isso, a Pontifícia Comissão Bíblica,
já em 16 de Janeiro de 1948, dizia, a este respeito: “Estas formas literárias não correspondem a nenhuma
das nossas categorias clássicas e não podem ser julgadas à luz dos géneros literários greco-latinos e
modernos.”
Todos os grandes temas teológicos do GÊNESIS foram relidos pelos cristãos à luz do autor da
nova criação, Jesus Cristo (Jo 1,1-3). As grandes personagens do GÊNESIS – Adão, Eva, Noé, Abraão
e os outros Patriarcas – aparecem frequentemente ao longo do Novo Testamento para lembrar aos crentes
que há uma só História da Salvação. Por isso, o Apocalipse – o último livro da Bíblia – não se
compreende sem o primeiro.
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3 - ÊXODO

O ÊXODO é o segundo livro da Bíblia e do Pentateuco. Na Bíblia Hebraica recebe o título de


Shemôt, isto é, “Nomes”, de acordo com o hábito judaico de intitular os livros a partir das suas palavras
iniciais: “We’elleh shemôt” (= «E estes são os nomes dos filhos de Israel que vieram para o Egito»: 1,1).
O título de ÊXODO provém da versão grega dos Setenta, que procura dar a cada livro um título de
acordo com o seu conteúdo. Neste caso, privilegia os 15 primeiros capítulos, pois é aí que propriamente
se descreve o “Êxodo”, isto é, a “saída” dos israelitas do Egito.
Este léxico tem a ver prevalentemente com os grupos recalcitrantes que Moisés “fez sair” do
Egito pela “estrada do deserto”; mas, dada a importância determinante de Moisés, dos seus grupos e das
suas experiências para a constituição de Israel e a formação da Bíblia, o seu léxico torna-se património
comum, podendo expressar também as “libertações” de outros grupos da “opressão” do domínio egípcio.

CONTEÚDO E DIVISÃO
Pode dividir-se o seu conteúdo do seguinte modo:
I. “Opressão” e “Libertação” dos filhos de Israel no Egito. Este é o tema fundamental de 1,1-15,21. Nesta
secção merecem especial relevo as peripécias no Egito (1,1-7,8), como um povo que nasce no
sofrimento. Seguem-se as pragas (7,8-12,32), como meio violento de libertação.

II. Caminhada pelo deserto (15,22-18,27) do povo, agora livre do Egito.

III. Aliança do Sinai (19,1-24,18). Esta aliança é o encontro criacional ou fundacional de Javé com os
“israelitas”, em que o Senhor se dá a si mesmo ao homem e restitui cada homem a si mesmo, e em que
o homem aceita a dádiva pessoal de Deus e se aceita a si mesmo como dom de Deus com tudo o mais
que lhe é dado: a natureza, a razão, a Lei, a História, o mundo. Por sua vez, a dádiva e a sua aceitação
também reclamam dádiva mútua e, portanto, responsabilidade. O pecado surge como possibilidade da
liberdade humana; mas Deus pode sempre recomeçar tudo de novo.

IV. Código sacerdotal, com especial relevo para a construção do santuário (25,1-31,18). A execução do
mesmo vai ser revelada em 35,1-40,33, com a correspondente organização do culto. Esta narrativa está
encerrada numa inclusão significativa: 40,34-38 descreve a descida do Senhor sobre o santuário com as
mesmas características (nuvem, glória, fogo) com que 24,12-15a descreveu a descida do Senhor sobre o
Sinai, mostrando, assim, que o santuário assumiu o papel do Sinai como lugar da manifestação de Deus.
É a presença da ideologia sacerdotal (conhecida por fonte P), que projeta retrospectivamente no Sinai a
imagem do segundo templo, do seu sacerdócio e do seu culto – em suma, o ideal da comunidade judaica
pós-exílica (ver VI).
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V. Renovação da Aliança do Sinai, relatada em 32,1-34,35.

VI. Código sacerdotal (35,1-40,38): execução das obras relativas ao santuário (ver IV).
O texto normativo do livro do ÊXODO é sobretudo um entrançado de peças narrativas e
legislativas. Nestas últimas, destacam-se o “Decálogo” propriamente dito (20,1-17) e os chamados
“Código da aliança” (20,22-23,19) e “Decálogo ritual” (34,12-26). São a Lei dada por Deus, mas
formulada pelo homem a partir da razão e da experiência.

AUTOR
A antiga tradição judaica, tal como a antiga tradição cristã, atribuíam a Moisés a autoria de todo
o Pentateuco e, por isso, também do livro do ÊXODO. Este modo de pensar está hoje claramente
ultrapassado. Contudo, talvez hoje se avalie também, com mais clareza do que nunca, a eventual ação
determinante de Moisés na constituição de Israel e do corpo bíblico do Pentateuco e do ÊXODO.

GÊNERO LITERÁRIO
O tecido literário deste livro resulta em parte da acostagem horizontal de temáticas por via
redacional (“teoria fragmentária”), mas fundamentalmente da complexidade dinâmica da vida de
múltiplos grupos cujas experiências no terreno vão sendo recolhidas e integradas em contextos
ideológicos mais amplos.
É ainda a questão da “teoria documentária”, embora redimensionada, nas suas componentes
Javista (J), Eloista (E), Deuteronômico-Deuteronomista (D-Dtr) e Sacerdotal (P); das múltiplas “fichas”
que recolhem e da ideologia e intenção das redacções; sem esquecer, também, a redacção final.

LEITURA CRISTÃ E TEOLOGIA


O acontecimento do Êxodo relata a libertação de Israel do Egito pelo Senhor, que faz com esse
povo uma Aliança. Tal acontecimento fundador foi objeto de várias releituras, já dentro da própria
Bíblia, pois toda a teologia e espiritualidade do povo de Israel ficou profundamente marcada por ela.
Assim, o Segundo e Terceiro Isaías vêem a libertação de Judá do domínio da Babilónia como um novo
Êxodo.
Os primeiros discípulos de Jesus e as primeiras comunidades cristãs, que eram de origem judaica,
viram na doutrina de Jesus um “êxodo” novo e definitivo (Lc 4,16-21); e, na sua pessoa, o verdadeiro
libertador, à vista do qual o próprio Moisés era simples figura, e a Lei do Sinai mero pedagogo para
conduzir o povo até ao verdadeiro Mestre, que é Cristo (Gl 3,24). O Novo Testamento apresenta Moisés
como muito inferior a Jesus, que veio trazer a nova Lei (Mt 5,17-48). A Carta aos Hebreus chega mesmo
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a dizer que Moisés já considerava os opróbrios por Cristo superiores aos tesouros do Egito, seguindo em
frente com firmeza, «como se contemplasse o Invisível» (Heb 11,27).
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4 - LEVÍTICO

A Bíblia Hebraica intitulava o terceiro livro do Pentateuco: Wayyiqra (“E chamou”). No entanto,
a tradução grega do hebraico (Setenta) chamou-lhe LEVÍTICO, certamente pela importância da função
litúrgica nele atribuída aos levitas. Levi era um dos filhos de Jacob (Ex 1,2), cuja tribo deveria situar-se
no sul da Palestina e foi escolhida para o serviço religioso e sacerdotal do templo (Dt 10,8-9). Este seria,
pois, o livro do culto do povo da aliança.

CONTEÚDO E DIVISÃO
Os acontecimentos narrados pelo LEVÍTICO situam-se durante a grande viagem desde o Egito
até à terra de Israel, no ambiente geográfico e sobretudo teológico da aliança do Sinai e em estreita
ligação com o Êxodo e os Números. Os últimos capítulos do Êxodo (25-40) são litúrgicos e fazem uma
ligação perfeita com o LEVÍTICO, que é totalmente litúrgico, e a numerosa legislação deste relaciona-
se intimamente com o Êxodo (Ex 25,1-29; 31; 35-40).
Apenas algumas tradições antigas devem pertencer ao tempo histórico da travessia do Sinai, pois
toda a estrutura do culto aqui regulamentada supõe um povo sedentarizado e o culto do templo bem
organizado. Trata-se, talvez, de uma recolha feita pelos sacerdotes de Jerusalém, já depois do Exílio
(séc.VI).
O trágico acontecimento do Exílio diz bem da importância que o culto tinha para este povo. Sem
as seguranças que lhe vinham do rei, a Israel restava a Lei (proclamada agora talvez nas primeiras
sinagogas) e o sacerdócio que mantinha o culto do templo, onde o povo se reunia para as grandes festas,
que faziam reviver a sua consciência de povo de Deus.
O autor, ao situar todo este enorme conjunto de leis cultuais num único local e antes da partida
do Sinai, com a qual começa o livro dos Números, pretende atingir vários objetivos: primeiro, dizer que
todas as leis devem ter o seu fundamento na aliança do Sinai, graciosamente oferecida por Deus ao seu
povo, e que o culto deve ser uma resposta a essa aliança; depois, atribuir toda esta legislação à mediação
de Moisés, que foi o primeiro organizador do povo de Deus. No entanto, quando estas leis cultuais foram
codificadas aqui, já eram praticadas no culto do templo. Isso não obsta a que algumas delas sejam tão
antigas que se percam no tempo.
Mas o culto do povo da aliança não pode limitar-se apenas aos ritos litúrgicos. Daí a inserção,
neste livro, de um “Código de Santidade”, que pertencia também ao ambiente dos sacerdotes-catequistas
do templo. O conteúdo do LEVÍTICO pode alinhar-se, então, em seis grandes secções, constituindo as
quatro primeiras um “Código sacerdotal”. Teríamos, portanto, a seguinte divisão:
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I. Código Sacerdotal (1,1-16,34): inclui as seguintes seções:


1. Ritual dos Sacrifícios (1,1-7,38): holocausto (1), oblações (2), sacrifício de comunhão (3), sacrifício
de expiação (4,1-5,13), sacrifício de reparação (5,14-26), deveres e direitos dos sacerdotes (6-7).
2. Consagração dos sacerdotes e inauguração do culto (8,1-10,20): Ritual da consagração de Aarão e
seus filhos (8), primeiros sacrifícios dos novos sacerdotes (9), irregularidades e normas sobre os
sacerdotes (10).
3. Código da pureza ritual (11,1-15,33): animais puros e impuros (11), purificação da mulher que dá à
luz (12), purificação da lepra (13-14), impureza sexual (15).
4. Dia da grande expiação (16,1-34).

II. Código de Santidade (17,1-26,46): é um conjunto de leis introduzidas pela fórmula “Sede santos
porque Eu sou santo”, que inclui leis sobre a imolação de animais e leis do sangue (17), leis em matéria
sexual (18), deveres para com o próximo (19), penas pelos pecados sexuais (20), santidade dos
sacerdotes (21-22), calendário das festas (23), luzes do santuário e pães da oferenda ou da proposição
(24,1-9), Ano Sabático e Jubileu (25), bênçãos e maldições (26). Como se torna evidente, neste grande
conjunto de leis cultuais, quase metade do livro é constituída pelo “Código de Santidade” (17-26).

III. Apêndice (27,1-34): os votos.

ESPÉCIES DE SACRIFÍCIOS
Para uma boa compreensão do LEVÍTICO, é necessário conhecer o essencial acerca das
diferentes espécies de sacrifícios:
Holocausto: vem do hebraico ‘olah, que significa “subir” e indica o fumo da vítima que sobe para Deus.
A sua característica essencial era a vítima ser totalmente queimada, não ficando para o sacerdote mais
do que a pele. Antes do sacrifício, o oferente colocava as mãos sobre a vítima, em sinal de que lhe
pertencia, reclamando, assim, os benefícios do seu sacrifício. Depois, ele próprio degolava a vítima, e o
sacerdote queimava-a sobre o altar. Este sacrifício pretendia reconhecer o direito absoluto de Deus sobre
todas as coisas (1,1-17; 6,1-6).
Sacrifício de comunhão (ou pacífico: zebah shelamîm): procurava a comunhão com Deus, dando-lhe
graças. Como o holocausto, incluía a imposição das mãos, a imolação da vítima e o derramamento do
seu sangue no altar (3,1-17). A parte mais gorda, considerada a melhor, pertencia a Deus e era queimada;
as outras duas partes eram distribuídas entre o sacerdote e o oferente; este comia-a num banquete
sagrado, para significar a comunhão com a divindade.
Oferta vegetal (minhah, “oferta”): era a oferta de produtos do campo, sobretudo de farinha misturada
com azeite. Este sacrifício estava ligado à oferta da primeira farinha na festa do Pentecostes, mas tornou-
se muito corrente, sendo feito juntamente com os sacrifícios de imolação de animais (ver 2,1-17).
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Sacrifício pelo pecado (hata’t): consistia em oferecer uma vítima por um qualquer pecado. Variava
conforme a gravidade do pecado e a importância da pessoa que pecava; para os pobres, podia comutar-
se pelos animais mais baratos: um par de rolas ou de pombas (5,7; 12,6-8; Lc 2,24). Este sacrifício
distinguia-se dos demais pela aspersão do sangue, «pois o sangue é que faz expiação porque é vida»
(17,10-11). Assumia especial importância na festa da Expiação.
Sacrifício de reparação da ofensa (‘asham): era um sacrifício semelhante ao anterior (5,14-26; 7,7).
Pães da oferenda (ou da proposição, lit., “pães da face”): eram doze pães, colocados sobre uma mesa
que estava diante do Santo dos Santos. Simbolizavam a presença das doze tribos, cada semana, diante
do Deus da aliança. Eram renovados cada sábado e só os sacerdotes os podiam comer (24,5-9).
Ofertas de incenso: o incenso era considerado o perfume mais excelente e, por isso, oferecia-se a Deus
como sinal de adoração e da oração que sobe até Ele. No chamado altar do incenso, que estava diante
do Santo dos Santos, o incenso ardia todos os dias, de manhã e de tarde, em honra do Senhor (2,1.15;
6,8; Ex 30,34-38; Mt 2,11; Lc 1,9).

TEOLOGIA E LEITURA CRISTÃ O LEVÍTICO


Representa a resposta cultual do povo de Israel ao Deus da aliança. Os ritos descritos neste livro
são a forma humana cultual possível, nesse tempo, do povo a Deus.
Jesus Cristo não destruiu este culto (Mt 5,17-20); ele mesmo seguiu várias normas cultuais,
presentes no LEVÍTICO. No entanto, fez uma interpretação mais espiritual, apontando para um culto
que nasça do coração do crente e esteja sempre comprometido com a sua vida concreta e a do mundo
que o rodeia (Mt 5,21-48; Mc 7,1-23; Jo 4,20-21; Rm 12,1). Hoje, continuamos a ler este livro para
encontrar as raízes do culto cristão e para nos alimentarmos com os seus temas teológicos, presentes em
muitos textos do Novo Testamento. A Carta aos Hebreus é o livro do Novo Testamento que mais
explicitamente faz uma leitura cristã do Levítico.
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5 - NÚMEROS

Integrado no grande bloco da Torá ou Pentateuco, o livro dos NÚMEROS recebeu este nome na
tradução grega dos Setenta, por abrir com os números do recenseamento do povo hebraico e, depois,
apresentar outros recenseamentos ao longo da narrativa (cap. 1-4 e 26). Relacionados com este título
podem estar ainda os números das ofertas dos chefes (cap. 7), das ofertas, libações e sacrifícios a oferecer
pelo povo (cap. 15 e 28-29). Trata-se, porém, de um livro narrativo com alguns trechos legislativos, que
se enlaça com o Êxodo, do qual está literariamente separado pelo código legislativo do Levítico.
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CONTEÚDO E DIVISÃO
O conteúdo deste livro abrange as peripécias ou vicissitudes da caminhada pelo deserto, desde o
Sinai até às margens do rio Jordão, fronteira oriental da Terra Prometida. No aspecto histórico, a
narrativa pode dividir-se em três grandes sequências literárias:
I. No deserto do Sinai (1,1-10,10). Referem-se as ordens de Deus para a caminhada através do deserto
com a disposição do acampamento das tribos, os deveres dos levitas e outras leis de carácter ritual.

II. Do Sinai a Moab (10,11-21,35). Os acontecimentos mais importantes desta segunda parte estão
marcados por etapas geográficas, algumas das quais são difíceis de identificar. Descreve-se a caminhada
direta para Cadés-Barnea, mesmo na fronteira sul de Canaã e, depois, a inflexão para oriente e a errância
penosa durante quarenta anos através do deserto até à chegada a Moab, já na fronteira da Terra
Prometida.

III. Na região de Moab (22,1-36,13). Começando com a bênção de Balaão, as narrativas desta terceira
parte apresentam um novo recenseamento dos israelitas, descrevem a nomeação de Josué para substituir
Moisés, contêm algumas prescrições de carácter cultual, narram a luta contra os madianitas e a partilha
de Canaã com a instalação das tribos de Rúben, Gad e parte de Manassés em Guilead, na Transjordânia,
e a recapitulação das etapas do Êxodo.
Como tal, no seu encadeamento histórico, o livro dos NÚMEROS é inseparável da epopeia do
Êxodo. Mas, também nele, é preciso ter presente que as narrativas foram redigidas bastante depois dos
acontecimentos históricos, à luz da perspectiva da fé e da celebração litúrgica do templo de Jerusalém,
já na Terra Prometida.
A redação definitiva deste livro deve colocar-se em data posterior ao exílio da Babilônia. Certas
leis, sobretudo, são determinadas pela prática ritual estabelecida pelos sacerdotes após o Exílio (séc. VI-
V). De resto, só bastante tardiamente, graças a tradições orais muito antigas de proveniência diversa e a
fontes documentais variadas, transmitidas como “memória do passado histórico”, é que terá sido possível
cerzir em unidade literária o conjunto das leis e a sequência dos acontecimentos.

TEOLOGIA
Como quer que seja, toda a narrativa está articulada dentro do binómio da fidelidade-infidelidade
à Aliança, evidenciando o movimento quaternário da História da Salvação: o povo peca, Deus castiga,
o povo arrepende-se, Deus perdoa. Nos interlúdios do contrastante claro-escuro que as tentações
acarretam, surge o difícil papel de Moisés, como mediador das exigências de Deus e advogado das
necessidades e angústias do povo; mas, até ele acaba por sofrer um castigo, sendo privado de entrar na
Terra Prometida, já com ela à vista. É a lei da pedagogia divina, a que até os homens de Deus têm de se
sujeitar.
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Afinal, o Livro dos NÚMEROS não é factualmente histórico; apresenta uma narrativa
historicizante de acentuado valor didático-pragmático para que, no drama dos seus antepassados através
do deserto, o povo eleito, já na Terra Prometida, soubesse enfrentar os desafios e as esperanças do seu
futuro, tal como o pagão Balaão, qual profeta inspirado de Israel, o soube prognosticar (cap. 23-24).

LEITURA CRISTÃ
Este foi um dos livros da Bíblia que não mereceu especial atenção na tradição da Igreja. No
entanto, os modernos estudos sobre a Aliança e sobre a História da Igreja estão a fazer-lhe justiça. Apesar
de não aparecerem aqui explicitamente alguns dos grandes temas do Pentateuco (Criação, Eleição,
Promessa, Aliança, Lei), o livro dos NÚMEROS é já a realização da Aliança de Deus com o seu povo,
por meio do culto.
O tema da bênção, de que o povo é depositário nos quatro oráculos de Balaão (23-24), anuncia a
eleição da dinastia davídica (24,17).
Importante é ainda o tema da Tenda, lugar da Presença (Shekkinah) do Senhor, que caminha no
meio do seu povo.
O tema do Deserto é também fundamental neste livro e foi dos que teve maior ressonância, tanto
no resto do Antigo Testamento como no Novo: o povo de Israel, peregrino pelo deserto durante
“quarenta anos”, tornou-se o protótipo do novo povo de Deus, guiado por Jesus Cristo, que também foi
ao deserto (Mt 4,1-11; Mc 1,12-13; Lc 4,1-13). Jesus Cristo é, para este novo povo liberto, a água viva
(20,2-13; e Jo 4,1-26), o verdadeiro maná (11,6-9; e Jo 6,26-58), a verdadeira serpente de bronze que
salva o seu povo (21,4-9; e Jo 3,13-15; 1 Cor 10,9-11).
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6 - DEUTERONÔMIO

Das cinco narrativas históricas que integram o Pentateuco, o DEUTERONÓMIO constitui a


unidade literária mais heterogénea e diferenciada. Com razão, os exegetas falam de uma nova tradição
ou fonte documental, que se distingue das outras fontes do Pentateuco por motivos de estilo e de teologia
e se prolonga até ao fim do 2.° Livro dos Reis, formando a “Fonte ou História Deuteronomista”.

NOME
“Deuteronômio” quer dizer “segunda Lei”. Foi o nome dado a este livro nas traduções grega e
latina, porque se apresenta como a reedição ou síntese dos textos legislativos anteriores, enquadrada por
um estilo diferente. Na tradição hebraica, chama-se apenas “Debarim” (Palavras), pelo modo como o
texto começa: «Estas são as Palavras». Mas a designação greco-latina sintetiza bem o conteúdo deste
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livro, o qual, mais do que um final do Pentateuco, parece representar sobretudo o começo de uma nova
maneira de escrever a História do Povo Eleito.

TEXTO E CONTEXTO
O texto deste livro teve uma história complicada. A sua origem é geralmente colocada no Reino
do Norte, antes da conquista da Samaria, em 722, aquando da invasão dos assírios. Na bagagem dos
levitas do Norte terá vindo uma primeira redacção do DEUTERONÓMIO, que teria como esquema base
uma celebração litúrgica da Aliança (ver a aliança de Siquém: Js 24). Curiosamente, um século mais
tarde, foi encontrado no templo de Jerusalém o «Livro da Lei do Senhor» ou «Livro da Aliança» (2 Rs
22,8.11; 23,2.21). O rei Josias começou imediatamente a pôr esta Lei em prática, fazendo uma reforma
do culto (2 Rs 23,3-20). A relação entre esta reforma e o DEUTERONÓMIO encontra-se na insistência
da centralização do culto em Jerusalém e na destruição dos cultos idolátricos.
Mas a Lei encontrada no templo poderá ter sido uma redacção posterior ao “esquema da aliança”
que veio do Norte, onde a temática da Palavra, do profeta, da Aliança e do Sinai-Horeb se sobrepunham
à temática do culto e do sacerdócio, que prevaleciam – como era natural – em Jerusalém. No Sul, deve
ter sido feita uma primeira redacção elaborada depois da falhada reforma de Ezequias, ou seja, a meados
do séc. VII a.C.. A última redacção deve ter acontecido aquando da redacção final do Pentateuco: séc.
V-IV a.C.. Tudo isto denota um contexto posterior e uma finalidade catequética.
É no contexto destas diferentes etapas da redacção do DEUTERONÔMIO que deve entender-se
o constante vaivém do tu e do vós no discurso de Moisés, quando se dirige ao povo de Israel (ver 6,1-
3). Apesar desse tu e vós parecer por vezes ilógico, na nossa tradução preferimos respeitar o estilo do
texto original hebraico.

DIVISÃO
Em três grandes discursos atribuídos a Moisés. Com estilo direto, num tom exortativo e profético,
usando temas e frases estereotipadas e repetitivas, o redator final sintetiza o programa ou projeto que
torna possível fazer de Israel uma nova sociedade, segundo os ideais dos tempos puros da caminhada
pelo deserto, num “hoje” de eterno presente. Assim, temos:
I. Primeiro Discurso (1,6-4,43): de forma historicizante, recapitula o passado, desde a planície desértica
da Arabá até à entrada na Terra Prometida de Canaã.

II. Segundo Discurso (4,44-28,68): Moisés apresenta os fundamentos da Aliança e as determinações da


Lei.
Código Deuteronômico: 11,29-26,15.

III. Terceiro Discurso (28,69-30,20): últimas instruções de Moisés.


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IV. Apêndice (31,1-34,12): narra os últimos dias de Moisés, com cânticos e bênçãos, bem como a sua
morte.
Os exegetas apresentam ainda uma outra divisão, atendendo à estrutura da Aliança que percorre
o DEUTERONÔMIO do princípio ao fim:
Introdução: 1,1-5
1. Recordação do passado e exortação a servir o Senhor: 1,6-11,28
2. Proclamação da Lei da Aliança: 11,29-26,15
3. Compromisso mútuo entre Deus e Israel: 26,16-19
4. Bênçãos e maldições: 27,1-30,18
5. Testemunhas da Aliança: 30,19-20.
Este esquema vem confirmar que estamos perante o livro da Aliança por excelência.

TEOLOGIA
O DEUTERONÔMIO é, sem dúvida, um livro de grande riqueza doutrinal, sempre preocupado
em inculcar a fidelidade de Israel a Deus, que é chamado Pai (1,31), e a estabelecer entre os membros
do povo escolhido uma verdadeira fraternidade.
Defende a centralização do culto, dentro do princípio da aliança, que os profetas evidenciaram.
Mesmo insistindo na observância das leis, não deixa de salientar a responsabilidade da consciência
individual e o compromisso pessoal, que a fé no Deus único exige.
Apesar da visão profundamente religiosa e das preocupações teológicas mais voltadas para os
problemas institucionais e nacionais, não deixa de reclamar o amor fraterno e a justiça social,
apresentando leis verdadeiramente humanitárias.
Pela sua intenção de recapitular a Lei e repropor o conceito de aliança, e pela influência que teve
na reflexão sobre a História de Israel, o livro do DEUTERONÔMIO ocupa um lugar central dentro da
Bíblia. E é, por conseguinte, de primeira importância para qualquer tentativa de sistematização de uma
teologia bíblica.

Fonte do Conteúdo: http://capuchinhos.org/biblia/index.php/Pentateuco


http://capuchinhos.org/biblia/index.php/G%C3%A9nesis
http://capuchinhos.org/biblia/index.php/%C3%8Axodo
http://capuchinhos.org/biblia/index.php/Lev%C3%ADtico
http://capuchinhos.org/biblia/index.php/N%C3%BAmeros
http://capuchinhos.org/biblia/index.php/Deuteron%C3%B3mio

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