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rua em Ipanema e o fato de estarem ambos agora lutando pela posse da carta.

Dez e vinte, nenhum telefonema. Talvez fosse melhor pedir ajuda. É muita pretensão
achar que se pode resolver sozinho um caso de sequestro. É bem verdade que não se trata de
sequestro comum, não há grandes nem pequenas quantias sendo pedidas, o sequestrador quer
apenas uma carta, ou antes, bilhete. O problema é que não se trata de entregar o bilhete e
receber a moça. Espinosa sabe disso tanto quanto o sequestrador. Uma vez entregue o bilhete,
Rose viveria apenas o tempo necessário para a verificação da autenticidade. Espinosa estava
disposto a correr o risco. Pedir auxílio ao pessoal da delegacia ou da Divisão Antissequestro
poderia significar entregar-se e entregar a carta ao inimigo. Dariam um jeito de ele ser morto
“no tiroteio com a quadrilha dos sequestradores”. Não tinha saída, ou salvava Rose no
momento do encontro ou o mais tardar durante o tempo que o sequestrador levaria para
verificar se a carta era ou não autêntica. Se fosse esta a proposta que o sequestrador viesse a
fazer. Dez e quarenta, o barulho do telefone assustou Espinosa. Era Alba.
— Espinosa, o que está havendo?
— Não está havendo nada, por quê?
— Porra, por quê? Você me despacha misteriosamente no meio da madrugada e em
seguida emudece... é claro que está acontecendo alguma coisa.
— Meu bem, agora não posso explicar... tenho que desligar... preciso deixar o telefone
livre... telefono para você amanhã.
Desligou antes que ela dissesse qualquer coisa.
Às onze e quinze, pegou um livro para ler. Desistiu em poucos minutos. Tinha medo de
dormir e não escutar o telefone tocar. Impossível ouvir música. O vazio da espera não podia
ser preenchido com nada além dos fantasmas de seu próprio imaginário e sempre que tentava
retomar o fio do raciocínio era novamente invadido pelo imaginário. Às duas horas da
madrugada, já não distinguia claramente a realidade da fantasia.

9
Rose estava imóvel enquanto o homem dormia ao seu lado. Queria saber quem era aquele
sujeito que conseguia dormir numa situação como aquela. Teria sido ele o assassino de sua
mãe? Até aquele momento, não a tinha maltratado, a não ser pelo fato de mantê-la em
cativeiro. As restrições físicas que impunha eram compreensíveis como medidas de segurança.
Era a segunda vez que adormecia estando algemados um ao outro. Da primeira vez, chegou a
pensar em seduzi-lo, a situação era propícia, mas desistiu da ideia. Tentar seduzi-lo era quase
a mesma coisa que tentar seduzir um peixe. A aliança de casado indicava algum interesse por
mulheres, mas nas circunstâncias presentes estava tão intensamente obcecado por outra coisa,
que sequer tinha possibilidade de vê-la como objeto sexual, apesar da intimidade provocada
pela proximidade física. Quase não falava e, quando o fazia, era para transmitir instruções
precisas. Em nenhum momento tentou conversar. Ela não apenas não o interessava como
mulher como tampouco o interessava como ser humano, até porque ele mesmo, naquele
momento, não se parecia muito com um ser humano. Também não sabia o que poderia obter
com a sedução. Por acaso ele seria repentinamente tomado de amores por ela e a libertaria?
Agradecido pela excelente trepada, retiraria as algemas e a mandaria para casa? A ideia era
ridícula, aquele brutamontes não teria arquitetado tudo aquilo para no final ceder aos encantos
da vítima. Aquele sujeito não era o Max para quem bastara alguns olhares de moça pudica.
Mas se não tinha esperanças de vir a ser libertada, poderia pelo menos retardar o desfecho.
Tudo indicava que aquela seria a noite definitiva, e, qualquer que fosse o desfecho, ele não iria
deixá-la viva como testemunha. A ideia lhe repugnava, mas dela poderia depender sua
sobrevivência.
Virou lentamente o corpo em direção ao homem, mantendo o braço da algema imóvel.
Queria dar a impressão de estar fazendo esse movimento dormindo. Fechou os olhos,
aproximou seu corpo do dele e passou o braço livre por sobre o seu corpo. Em seguida, ficou
imóvel, sem coragem de abrir os olhos para ver se os dele estavam abertos. Estava
praticamente montada sobre seu braço esquerdo, a cabeça pousada em seu ombro e a mão
sobre sua barriga. Os braços algemados, esticados ao longo dos corpos, pareciam troncos sobre
os quais estava montada, sentia a mão enorme entre suas pernas. Procurou manter a respiração
cadenciada, de quem está dormindo, e esperou. Nada, nenhum movimento da parte dele. Sentia
seu cheiro. Era agradável. Não era cheiro de perfume, era cheiro de homem. Achou que estava
ficando excitada. Revoltante, mas era verdade. Passado algum tempo, decidiu prosseguir.
Continuava de olhos fechados, mas tinha certeza de que os dele estavam abertos. Deixou a
mão que estava sobre a barriga escorregar até a virilha. Manteve a mão apenas pousada, sem
nenhuma pressão além da exercida pelo próprio peso, sentindo qualquer alteração de volume
que lhe desse coragem para prosseguir. Passado algum tempo, o volume ainda parecia normal,
talvez ligeiramente alterado. Aumentou ligeiramente a pressão da mão. Não houve rejeição,
segurou-o como se fossem íntimos. Impossível manter o ritmo normal da respiração e era
evidente que a dele também se alterara, mas o corpo continuava imóvel, menos a parte sob sua
mão. Rose esperou mais um pouco, os cheiros ficaram mais intensos e o volume debaixo da
calça parecia ter atingido o ponto máximo. Devagar, como se ainda temesse acordá-lo, subiu a
mão alguns centímetros, desafivelou o cinto, abriu o zíper e enfiou a mão por debaixo da
cueca. Estava incrivelmente excitada e ambivalente. Até aquele momento o homem não fizera
qualquer movimento. A impressão era de que toda a sua massa muscular aumentava de
volume, sem que ele movesse, voluntariamente, um único músculo. De repente, sentiu a mão
algemada que estava entre suas pernas mover-se, procurar o botão da sua calça jeans, baixar o
zíper, meter-se entre suas pernas arrastando seu próprio braço, o contato da mão revelando o
molhado da boceta, e viu-se levantada no ar e ser colocada sentada sobre ele. Somente então
olhou-o nos olhos.
Com o braço livre, ele puxou a camiseta dela por cima da cabeça e deixou-a presa junto
às algemas do outro braço. Com a mão que estava entre as pernas, forçou-a ficar de pé, apesar
das algemas, e abaixou-lhe o jeans e as calcinhas ao mesmo tempo. Em seguida, livrou-se da
calça e da cueca. Quando Rose agachou-se sobre seu pau, sentindo-o entrar, deixou-se
escorregar devagarinho até embaixo. Foderam algemados, camisetas emboladas no braço das
algemas, Rose subindo e descendo como se formassem os dois um êmbolo bem lubrificado.
Gozou transpirando raiva e prazer. Continuou sentada, imóvel, tronco ereto, cabeça voltada
para cima recusando o olhar do homem. Não queria mudar de posição para não deixar o
sangue refluir e ele sair de dentro dela. Manteve contrações ritmadas, durante um tempo
impossível de se determinar, até sentir o homem crescer dentro dela. Em nenhum momento se
abraçaram ou se beijaram, toda a energia concentrada, ódio e não amor, gozo puro. Quando
recomeçaram, o corpo do homem estava banhado de suor, as camisetas emboladas junto às
algemas eram utilizadas ora por um ora por outro para enxugar o suor do rosto. Nem o homem
nem ela até aquele momento tinham dito uma palavra. Impossível introduzir no gozo da foda a
palavra do prazer. Em seu lugar, gemiam, bufavam, gritavam, engasgavam. A segunda vez foi
mais demorada. O homem suava por todos os poros, cabelos encharcados, respiração ofegante.
Quando terminaram, Rose deixou o corpo relaxar, sentindo uma resistência ao desgrudar-se
dele. Não saiu de cima do homem. Sentou-se sobre seu peito, junto ao pescoço, como se fosse
uma montaria, comprimindo o rosto dele entre as coxas. Permaneceu um tempo nessa posição,
deixando-o sentir o cheiro ácido do sexo. Recomeçou devagar, esfregando a boceta em todo o
seu corpo, deslizando pelo suor. Não era capaz de dizer quanto tempo ficou assim, nem quanto
tempo depois sentiu o pau do homem intumescer, mas não o suficiente para uma penetração.
Continuou se esfregando. Agora ambos suavam abundantemente. O homem tentava
voluntariamente uma ereção, mas o esforço parecia inútil. Ajoelhada, com a cabeça do homem
entre as coxas, Rose lubrificava vaginalmente seu rosto, deixando que o nariz a penetrasse até
sentir que ele perdia a respiração. Sem sair do lugar, girou o corpo, enfiou a cabeça entre as
pernas do homem, lambendo e chupando, até obter uma ereção suficiente para sentar-se
novamente sobre ele. Tinha que manter o movimento ritmado, lentamente para não perder a
posição. O tempo parou. Havia apenas um movimento circular acompanhando o ritmo
compassado do corpo. O homem, músculos retesados, veias do pescoço saltadas, parecia
espremer-se como uma fruta oferecendo seu suco. O colchonete estava inteiramente molhado.
Gozaram em meio a grunhidos e resfolegamentos. Rose caiu sobre o assoalho. Seu colchonete
deslizara para longe. Sentiu o frescor agradável da madeira sob o corpo. Ficou olhando para o
teto durante alguns minutos, o homem estava quieto ao seu lado. O suor já secara inteiramente
quando voltou-se para ele, precisava ir ao banheiro. Ajoelhou-se ao seu lado e seu rosto estava
azulado. Procurou sua respiração, estava morto.

10
Espinosa acordou com o telefone tocando. Deitado no divã da sala, completamente
vestido, procurava o aparelho enquanto pensava em Rose transmitindo ordens do sequestrador.
Não percebeu imediatamente que era dia. Só despertou inteiramente quando ouviu a voz do
delegado de plantão falando seu nome.
— Espinosa, desculpe te acordar a essa hora, mas tem uma ocorrência perto da sua casa.
Uma mulher foi encontrada gritando dentro de um apartamento, algemada a um cara morto, os
dois inteiramente nus e a mulher repete sem parar que quer falar com o inspetor Espinosa da
1aDP.
O endereço era na rua Barata Ribeiro, realmente perto da sua casa. Eram seis horas da
manhã.
Prédio antigo, com mais de uma centena de apartamentos de quarto e sala conjugados,
endereço conhecido do submundo de Copacabana. Dois carros-patrulha da PM estavam parados
na calçada em frente à portaria e dois policiais tomavam café no botequim ao lado. Espinosa
perguntou qual era o andar e se a moça ainda estava lá. Na portaria do prédio pessoas saíam
não para mais um dia de trabalho, mas de mais uma noitada com parceiros anônimos. Subiu no
elevador com um soldado de uma das guarnições estacionadas em frente da portaria.
— Porra, o cara morreu como eu queria morrer, só não entendi por que as algemas.

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