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2º Tempo

Modernista:
entre tradição e a
ruptura
CECÍLIA MEIRELES
(1901 - 1964)
CECÍLIA MEIRELES
(1901 - 1964)
• Forte herança simbolista;
• Predomina os sentimentos de perda amorosa e
solidão;
• Temática da passagem do tempo e a experiência do
vazio;
• Romanceiro da Inconfidência = visão dramática e
lírica da sociedade mineira do século XVIII, de suas
principais figuras humanas e da Inconfidência.
• A dor existencial = o fluir do tempo dissolve as
ilusões, o corpo, a memória...
Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,


assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,


tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,


tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida a minha face?
Cecília e a modernidade
O vínculo da autora com a modernidade está na
“experiência do vazio”.

Ela não encontra possibilidade de comunicação com


o mundo circundante e seus versos tratam da “sensação
do absurdo da existência e da falta de sentido da vida
contemporânea”.

Assim, só resta à poeta o canto, ou seja “a celebração


do ato de criação poética” = a poesia.
Motivo

Eu canto porque o instante existe


e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
— não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
— mais nada.
Murmúrio

Traze-me um pouco das sombras serenas


que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas,
- vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares


que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares:
- vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança,


aroma perdido, saudade da flor!
- Vê que nem te digo - esperança!
- Vê que nem sequer sonho - amor!
JORGE DE LIMA
(1893 - 1953)
JORGE DE LIMA
(1893 - 1953)
• Sua carreira poética inicia-se sob o signo
parnasiano;
• Apresenta uma fase nordestina, caracterizada
pelo registro poético da realidade existencial,
cultural e histórica da região;
• Valorização da religiosidade de substrato
católico;
• Teve ainda uma fase de celebração da cultura
negra, de seus ritmos e costumes.
Mulher proletária
Mulher proletária —
única fábrica Mulher proletária,
que o operário tem, o operário, teu
(fabrica filhos) proprietário
tu há de ver, há de ver:
na tua superprodução de a tua produção,
máquina humana a tua superprodução,
forneces anjos para o ao contrário das
Senhor Jesus, máquinas burguesas
forneces braços para o salvar o teu proprietário.
senhor burguês.
Essa negra fulô

Ora, se deu que Ó Fulô! Ó Fulô!


chegou (Era a fala da Sinhá)
(isso já faz muito — Vai forrar a
tempo) minha cama]
no bangüê dum meu pentear os meus
avô cabelos,]
uma negra bonitinha, vem ajudar a tirar
chamada negra Fulô. a minha roupa, Fulô!

Essa negra Fulô!


Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Essa negrinha Fulô!
ficou logo pra mucama
pra vigiar a Sinhá,
pra engomar pro Sinhô!

Essa negra Fulô!


Essa negra Fulô!
MURILO MENDES
(1901 - 1980)
MURILO MENDES
(1901 - 1980)
• Lírica de inspiração modernista, em que
(quase) predomina o humor;
• Dimensão religiosa, requintada e quase
hermética;
• Linguagem próxima do surrealismo,
definida por alucinações e uso de
símbolos e alegorias.
Modinha do empregado de banco

Eu sou triste como um prático de farmácia,


sou quase tão triste como um homem que usa costeletas.
Passo o dia inteiro pensando nuns carinhos de mulher
mas só ouço o tectec das máquinas de escrever.

Lá fora chove e a estátua de Floriano fica linda.


Quantas meninas pela vida afora!
E eu alinhando no papel as fortunas dos outros.
Se eu tivesse estes contos punha a andar
a roda da imaginação nos caminhos do mundo.
E os fregueses do Banco
que não fazem nada com estes contos!
Chocam outros contos para não fazerem nada com eles.

Também se o diretor tivesse a minha imaginação


o Banco já não existiria mais
e eu estaria noutro lugar.
Canção do exílio

Minha terra tem macieiras da Califórnia


onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda.
Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá com certidão de idade!
SOLIDARIEDADE

Sou ligado pela herança do espírito e do sangue


Ao mártir, ao assassino, ao anarquista.
Sou ligado
Aos casais na terra e no ar,
Ao vendeiro da esquina,
Ao padre, ao mendigo, à mulher da vida,
Ao mecânico, ao poeta, ao soldado,
Ao santo e ao demônio,
Construídos à minha imagem e semelhança
Poema espiritual

Eu me sinto um fragmento de Deus


Como sou um resto de raiz
Um pouco de água dos mares
O braço desgarrado de uma constelação.

A matéria pensa por ordem de Deus,


Transforma-se e evolui por ordem de Deus.
A matéria variada e bela
É uma das formas visíveis do invisível.

Cristo, dos filhos do homem és o perfeito.


Na Igreja há pernas, seios, ventres e cabelos
Em toda a parte, até nos altares.
Há grandes forças de matéria na terra no mar e no ar
Que se entrelaçam e se casam reproduzindo
Mil versões dos pensamentos divinos.
A matéria é forte e absoluta, sem ela não há poesia.
VINÍCIUS DE MORAIS
(1913 - 1980)

“Eu sou o branco mais preto do Brasil”!


Curiosidades
Alguns de seus poemas cunharam expressões
lapidares, que se entranharam na memória
coletiva nacional, como :

“Porque hoje é sábado”


“Que não seja imortal, posto que é chama, / mas
que seja infinito enquanto dure”
“As (muito) feias que me desculpem, mas beleza é
fundamental”

• Casou-se 9 vezes (!)


VINÍCIUS DE MORAIS – o “poetinha”
(1913 - 1980)
• Neosimbolismo x modernismo (Barroco?)
I - Fase neo-simbolista
conotações místicas (formação religiosa); linguagem
solene (versos longos – que remetem aos versículos
bíblicos); adjetivação exagerada.
II - Fase moderna
vinculação à realidade; o canto do amor concreto e a
exaltação da mulher; a valorização do cotidiano e a
abertura para o social; a utilização da linguagem
coloquial.
Ânsia

Na treva que se fez em torno a mim


Eu vi a carne.
Eu senti a carne que me afogava o peito
E me trazia à boca o beijo maldito.
Eu gritei.
De horror eu gritei que a perdição me possuía a alma
E ninguém me atendeu.
Eu me debati em ânsias impuras
A treva ficou rubra em torno a mim
E eu caí!
(...)
A rosa de Hiroxima

Pensem nas crianças


Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada
Vinícius e o soneto
A revalorização do soneto, depois das radicalizações de
1922, deve-se a Vinícius.

Como nenhum outro lírico brasileiro, ele soube explorar


as possibilidades de combinação do espírito moderno
com essa antiga forma de versificação.

Neobarroco (?)
SONETO DA SEPARAÇÃO
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento


Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez o drama.

De repente, não mais que de repente


Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente

Fez-se do amigo próximo o distante


Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
SONETO DE FIDELIDADE
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento

Quero vivê-lo em cada vão momento


E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim quando mais tarde me procure


Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):


Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure
Vinícius e a música popular

A partir de meados de 1950, Vinícius


aproximou-se da música popular em um
processo de “musicalização da poesia” e que
o transformou no grande letrista (poeta) da
Bossa Nova, criando clássicos
mundialmente conhecidos e parcerias
históricas.
Garota de Ipanema
Parcerias

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