Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Aline Campoli
Campinas, 2017
1
RESUMO:
Essa pesquisa pretende investigar a percepção do usuário comum de internet acerca dos
riscos que a coleta e utilização indiscriminada de dados de navegação representam em
relação à autonomia e as liberdades individuais, no momento em que a identificação de
padrões de comportamento por algoritmos preditivos promete antecipar tendências, e
com isso minimizar riscos econômicos e políticos. (ZUBOFF, 2015)
INTRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA:
2
“Esta nova fé emergiu de uma bizarra fusão da boemia cultural de São
Francisco com as indústrias de alta tecnologia do Vale do Silício.
Promovida em revistas, livros, programas de televisão, páginas da rede,
grupos de notícias e conferências via Internet, a Ideologia Californiana
promiscuamente combina o espírito desgarrado dos hippies e o zelo
empreendedor dos yuppies. Este amálgama de opostos foi atingido
através de uma profunda fé no potencial emancipador das novas
tecnologias da informação. Na utopia digital, todos vão ser ligados e
também ricos.” (BARBROOK, 1996).
Ainda que não tenha atingido a utopia do livre mercado, nem extinguido as
desigualdades entre classes que esse grupo multifacetado aspirava, a popularização da
rede revolucionou a clássica relação unilateral emissor-mensagem-receptor; no
ciberespaço não há mais exclusividade de protagonismo do emissor, ou passividade do
receptor, todos podem ser emissores e todos são receptores, “receptores não são mais
anônimos, passivos e isolados uns dos outros” (LEVY, 1999).
Quando Levy fez essa declaração em 1999 a Google começava a se destacar pela
qualidade de seu mecanismo de busca e por sua filosofia baseada no slogan “Don’t be
evil”. Para conseguir receitas sem cobrar de seus usuários, a empresa criou em 2002 um
sistema próprio de venda de anúncios, o Adwords, que foi lançado com a promessa de
fornecer anúncios relevantes e úteis, ao invés de intrusivos e irritantes1 (atualmente os
anúncios não são exibidos apenas na página de busca da Google, mas também em
qualquer website integrado ao Adsense2). Em 19 anos a empresa especializou-se em um
modelo de negócio que direciona as informações dos seus mais de 2,2bilhões de
usuários3, para os anúncios patrocinados.
1
Informação retirada do Manual do Acionista do Google, lançado em 2004 quando a empresa entrou no
mercado de ações: https://abc.xyz/investor/founders-letters/2004/ipo-letter.html
2
O Adsense que permite integrar websites a plataforma de anúncios do Google, que paga uma parte do
valor arrecadado com a publicidade para o dono do website.
3
Informação da Bussiness Insiders citada em matéria da BBC Brasil:
http://www.bbc.com/portuguese/geral-36833505
4
Big Data: Toda democracia será manipulada? http://outraspalavras.net/posts/big-data-toda-
democracia-sera-manipulada/
3
EUA descreve controversas estratégias baseadas em análises Big Data, aplicadas na
campanha do republicano pela empresa Cambridge Analytcs, a mesma que fez a
campanha do Brexit na Inglaterra. “Estamos muito felizes que nossa abordagem
revolucionária de comunicação dirigida por dados tenha desempenhado papel tão
essencial na extraordinária vitória do presidente eleito Trump”- comunicado a imprensa
de Alexander James Ashburner Nix - CEO da Cambridge Analytica, logo após a eleição
do republicano.
Desenha-se um futuro onde algoritmos aplicados aos dados pessoais poderão apontar
para a probabilidade de um ataque cardíaco ou a incapacidade de pagamento de um
empréstimo e com isso influenciar os valores cobrados pelos serviços, com base em
julgamentos feitos pela máquina. (SCHÖNBERGER, 2013).
5
Ver entrevista sobre Plano Nacional da Internet das Coisas: http://computerworld.com.br/plano-
nacional-de-internet-das-coisas-dara-enfase-formacao-de-mao-de-obra - acesso em 03/12/16
4
momento, as máquinas se tornem cada vez mais “autônomas” e
“inteligentes”, elas continuam, certamente, dependentes de seu design
inicial, das intenções, scripts ou cenários em função dos quais elas foram
imaginadas. Elas são, desde sua concepção (e quaisquer que sejam as
formas que elas assumam em seguida), portadoras de visões do mundo,
expectativas e projeções conscientes ou inconscientes de seus
conceituadores.” (Rouvroy, 2011).
Essa nova lógica de acumulação protagonizada pelo Google e replicada por outros
gigantes do Big Data foi denominada por Shoshana Zuboff como uma nova forma de
capitalismo, o “capitalismo de vigilância”. A autora aponta para a dificuldade que a
maioria dos artigos tem em descrever o que é Big Data, sua teoria é que a origem desse
problema está na tentativa de defini-lo como um objeto tecnológico, resultado ou
capacidade.
5
mesmo seus idealizadores, a exemplo do comentário do cientista Alex Pentland em uma
entrevista7 para a revista Harvard Business:
Os conceitos listados até aqui são importantes para situar o objetivo dessa pesquisa; a
utilização indiscriminada das técnicas big data e data minning, ao colocar análises
matemáticas em primeiro plano, influenciam não apenas o consumo, mas todos os
aspectos da sociedade informatizada, extrapolando os limites do ciberespaço e pondo
em risco questões primordiais como o livre arbítrio e a autonomia do indivíduo.
7
Trecho da entrevista de Alex “Sandy” Pentland, intitulada “Com os grandes dados vêm grandes responsabilidades”,
publicada na Revista Harvard Business Review: https://hbr.org/2014/11/with-big-data-comes-big-responsibility .
Versão traduzida pela revista Harvard Business Brasil, que não está mais disponível no site.
6
OBJETIVOS E JUSTIFICATIVAS:
Esta pesquisa pretende traçar um perfil do usuário de internet, no que tange a percepção
do cidadão comum quanto à utilização dos dados gerados durante a navegação em rede
no momento em que:
Este estudo não pretende posicionar-se a favor ou contra o avanço de tais tecnologias,
ao contrário, espera poder contribuir para que através de reflexões e ponderações éticas,
sejam traçados caminhos que levem a utilização equilibrada dessas informações, até
então impossíveis de se interpretar.
Com base nas informações obtidas a partir de pesquisas e estudos aprofundados, espero
poder apresentar um panorama do perfil do usuário comum de internet no Brasil
especialmente no que tange a percepção quanto aos usos potenciais dos dados de
navegação, e elaborar conclusões que apontem caminhos para uma utilização consciente
dos sistemas conectados em rede.
7
BIBLIOGRAFIA INICIAL PREVISTA:
ASHTON, Kevin. That ‘internet of things’ thing. RFiD Journal, v. 22, n. 7, p. 97-114, 2009.
BARBROOK, Richard. The hi-tech gift economy. first monday, v. 3, n. 12, 1998.
BRUNO, Fernanda. Máquinas de ver, modos de ser: visibilidade e subjetividade nas novas
tecnologias de informação e de comunicação. Revista Famecos, v. 11, n. 24, p. 110-124, 2008.
COLEMAN, E. Gabriella; GOLUB, Alex. Hacker practice Moral genres and the cultural
articulation of liberalism. Anthropological Theory, v. 8, n. 3, p. 255-277, 2008.
EVANGELISTA, Rafael & KANASHIRO, Marta. Cibernética, internet e a nova política dos
sistemas informacionais. In Gabinete Digital: análise de uma experiência. Companhia
Riograndense de Artes Gráficas: Porto Alegre: 2013.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. (23ª. ed.) Vozes:
Petrópolis, 2000.
GALLOWAY, Alexander R. Protocol: How control exists after decentralization. MIT press,
2004.
GALLOWAY, Alexander; THACKER, Eugene. Protocol, control, and networks. Grey Room,
n. 17, p. 6-29, 2004.
GLEICK, James. Acelerado: a velocidade da vida moderna: o desafio de lidar com o tempo. Rio
de Janeiro: Campus, 2000.
KANASHIRO, M.; BRUNO, F.; EVANGELISTA, R.; FIRMINO, R. Big data: Reconstrução e
disputa por novos significados de privacidade.
LÉVY, Pierre. Cibercultura, Editora 34, edição brasileira, São Paulo, 1999.
LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. 4. ed. São Paulo:
Loyola, 2003
Minelli, M.; Chambers, M.; Dhiraj, A. Big data, big analytics: emerging business intelligence
and analytic trends for today´s businesses. Wiley & Sons Inc., New Jersey, 2013.
PALMÅS, Karl. Predicting what you'll do tomorrow: Panspectric surveillance and the
contemporary corporation. Surveillance & Society, v. 8, n. 3, p. 338, 2011.
PENTLAND, Alex. Security and Privacy in Social Networks. Springer: MIT Media Lab,
Cambridge, 2012.
8
PENTLAND, Alex. Social Physics: How social networks can make us smarter. Penguim Books,
United States, 2014.
SANTOS, Laymert Garcia. A informação após a virada cibernética. SANTOS, Laymert et al.
Revolução tecnológica, internet e socialismo. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003.
SIMONDON, Gilbert. El modo de existencia de los objetos técnicos. Prometeo Libros Editorial,
2008.
ZUBOFF, Shoshana. Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information
civilization. Journal of Information Technology, v. 30, n. 1, p. 75-89, 2015.