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Tllulo do ongmal Brulo- Lr Kr rt I r )rnç Du Combar
Copynght © 2000 Edmons Deslris-Méolans-Revel. França
Copynght da edrção brasilma © 2012 Editora Pensamento-Culmx Ltda
Texto de acordo com as nO\'as regras ortográficas da hngua portuguesa
t• edtção 2012.
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de qualquer forma ou por qualquer me1o. eletrOnrco ou medlnico, mclusrve forocOpLaS,
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Supervisão da tradução: Shrhan Wagner Buli (6D Dan A1k1ka1)
Para treinar desenvolvimento do Ki no Brasil pode-se procurar o Instituto
Takemussu na Rua Mauro. 331, em São Paulo, www.a1kikar.org.br,
~-ma1l insuakemussu®a1k1kai.org.br

Coordenação edilorial: Denise de C. Rocha Delela e Roseli de S Ferraz


Preparação de originais: Mana Sylv1a Correa Prefácio à edição brasileira .......................... .. 7
Diagramação: Joio Bureau
Prefácio ................... ..... ................................ . 11
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Càmara Brasrle1ra do Livro, SP. Bras1l) u. O que é budo? .............................................. 23
Tok1tsu. Kenji
a A transmissão do budo pelos japoneses ....... 29
Ki e o cammho das artes marcrais I Kenj1 Tolutsu , ~ O problema do budo para praticantes
tradução Lu1z Carlos Cmtra -São Paulo Cuhrix, 2012.
estrangeiros .................................................. 35
Titulo original: em frances· Budo : le Kn et le sens du
combat ~ Uma chave para o budo ................................ 41
~- 45
ISBN 978·85·316·1200·8 Ki na cultura japonesa ..................................
1 Artes marcra1s-Japão 2. Ki (Filosofia chmesa) .;,. A con cepção japonesa de Ki ......................... 49
I Titulo
';/. O conteúdo do combate no kendo ............... 57
ll·ll097 CDD-796.8
a Espaço nas artes de combate ........... ............. 63
lndices para catalogo sistemático
'i). Ki, o guia para o budo ............... ................... 73
l. Artes marctaiS' Esportes 796.8 ·J .!f. Ma , a concretização espacial de ki ............... . 85
~1 Detectar e esconder ..................... ................. 89
D1renos de tradução para a hngua ponuguc~; t
adquiridos com exclusi\idade pela 'Jii. O combate de ki ........................................... 93
EDITORA PENSAMENTO·CULTRIX U DA •Ja
Rua Dr Máno Vicente, 368-04270-000- '>;lo l'.url.. ..,,.
O significado e o valor do combate .............. 99
Fone (ll} 2066·9000- Fa>. (l l ) 206(1 tll)llH
E·marl: atcnd1mento®eduoracuhnx nun lu
hnp://www eduoracuhnx.com hr
que se reserva a propriedade ltterária dest;t lt,uht~ · "'
Fm feno o deposuo legal 5
·J~ Os métodos clássicos de desenvolvimento
do ki em combate......................................... 107
·J~. A convergência de duas abordagens............. 121
•J~ Kiko e o combate.......................................... 127
Prefácio à edição brasileira
Conclusão...................................................... 133

E
ste é o primeiro livro que conheço escrito sobre
artes marciais por um oriental, mas usando uma
visão ocidental, podendo ajudar bastante quem
ainda não compreendeu o aparente paradoxo entre a
forma de transmissão oriental e a ocidental. Nas artes
marciais tradicionais do Oriente existe um mito de que
os grandes mestres são capazes de poderes sobrenatu-
rais usando algum tipo de energia incomum. Essa ideia
que apaixona e atrai pessoas para essas práticas não é
gratuita, e embora gere alguma fantasia, o praticante de
arte marcial experimentado de fato acaba desenvol-
vendo uma percepção muito grande e entrando em con-
tato com sua energia interna, o "Ki", e por isso consegue
na prática real não somente nas artes marciais, mais em
suas atividades do dia a dia, levar grande vantagem
sobre quem não teve oportunidade de se desenvolver
nesse aspecto. Não é fácil separar a ilusão da realidade

6 7
na literatura das artes marciais, principalmente quando Brasil. Dificilmente um praticante de arte marcial vai ler
escrita por orientais. Quando li este livro, escrito por este pequeno livro sem aprender algo importante e que
Kenji Tokitsu, um japonês nato, mas bastante conhece- não sabia antes.
dor do pensamento ocidental, até por possuir um dou-
torado em sociologia, percebi que poderiamos ter pela Wagner Buli
primeira vez, em português, uma obra mais compreen- Aiktkat Shihan, 62 Dan
sível para os praticantes das artes marciais japonesas, Dtretor Técntco da Conf. Brasileira de
Atkido-Brazll Aikikai
principalmente os que cultivam as artes marciais inte-
Rua Mauro, 331- São Paulo- SP-
riores, como o Aikido, o Tai Chi Chuan, o Chi Kung
hupl/vtww.aiktkat org.br
etc., e tratei de colaborar para que ela fosse publicada
em nosso idioma convidando meu aluno de Aikido Luis
Carlos Cintra para traduzi-la e contando, mais uma vez,
com a ajuda da Editora Pensamento-Cultrix que efeti-
vamente incorporou a ideia de trazer bons livros nesta
área para o leitor. Escrevendo em uma linguagem de
nosso cotidiano, os parágrafos, à medida que vão sendo
lidos, vão nos trazendo conceitos que antes podiam não
estar claros, devido à linguagem figurada e à forma de
transmissão mais pelo sentimento usada principalmente
pelos mestres orientais, pois eles temem que as palavras
ditas de forma racional possam deformar as ideias
autênticas. Eles acreditam que se pode captar o ver-
dadeiro significado do "ki" sem explicá-lo. Mas isso
é muito difícil para nós que estamos acostumados a
aprender primeiro a teoria e depois passar para a
prática. Como professor e praticante de Aikido, por
certo recomendo enfaticamente a leitura desta obra
a meus alunos e interessados nesta arte, bem como a
todos os praticantes e mestres de artes marciais do

R 9
Prefácio

ma faca é feita para cortar. Do mesmo modo, o

U propósito original da técnica das artes marciais


era vencer outra pessoa, machucando-a ou
matando-a. Independentemente de quaisquer outros
objetivos ou justificativas que tenham sido elaborados
ao longo do tempo, a técnica das artes marciais foi
desenvolvida para que homens pudessem lutar com
outros homens.
Em nossa sociedade, o combate é muitas vezes dis-
farçado sob a forma de disciplinas com objetivos educa-
cionais ou utilitários. Se compararmos a técnica de
combate à lâmina de uma espada, dependendo do con-
texto no qual a disciplina será usada, essa lâmina deve
receber uma variedade de coberturas protetoras para
abrandar a qualidade de corte de seu gume. Para aplica-
ções militares ou policiais, a lâmina só precisa ser reco-
berta com um tecido fino , mas para fins esportivos ou
de educação física, a lâmina precisa ser cuidadosamente

I 11

J
colocada em diversas bainhas, que às vezes são decora- A sociedade aceita programas que ensinam e desen-
das com bandeiras nacionais ou cores que correspon- volvem técnicas destinadas a vencer os outros fisi-
dem a d1versos valores sociais. camente, técnicas destmadas a matar. Como podemos
Atualmente, a relação entre a lâmina e suas cober- justificar isso dentro do referencial da educação física?
turas protetoras é problemática, uma vez que qualquer Essa realidade é mascarada dando-se a esses programas
pessoa pode aprender a técnica de combate por meio de a aparência de um esporte e fornecendo a desculpa de
urna variedade de disciplinas. Encontramos técnicas de deixar escapar a pressão. "Exerc1cios de combate me
combate sendo usadas em brigas de rua e em diversos fazem sentir bem. são bons para a minha saúde." O
tipos de atividades agressivas que ocorrem em ambien- modo como essas técnicas são aplicadas permanece uma
tes urbanos. A técnica de combate tem um lugar defini- questão de responsabilidade individual. No Ocidente, o
tivo nas manifestações contemporâneas de violência. treinamento de combate é considerado uma técnica e,
Treinadores de atletas usaram técnicas de combate em portanto, um meio para um fim . Como resultado , não
contextos educacionais e obtiveram resultados positi- inclui moralidade; a moralidade envolvida é considerada
vos. Foram bem-sucedidos em canalizar a violência de um acessório.
jovens para uma disciplina e por conta disso consideram Uma qualidade particular do bu.do japonês, que
o treino de técnica de combate como educacional. Natu- sem dúvida também pode ser encontrada em outras tra-
ralmente, suas comunidades locais aprovam isso. Con- dições, é que inclui um senso moral dentro de seu cará-
tudo , me parece que o que limita o uso antissocial ou ter técnico.
criminoso da técnica de combate, o equivalente à bai- O ponto é que , para garantir o resultado , a morali-
nha, é bastante frágil , uma vez que esse controle per- dade ou ética das artes marciais deve derivar direta-
manece uma questão de responsabilidade individual mente do corpo e da técnica prática. ~ão pode ser algo
apenas. Uma pessoa que sabe como usar técnicas peri- imposto externamente. Como estamos lidando com
gosas é ao mesmo tempo um ser moral. Um equilíbrio urna situação em que buda é confundido com atividades
é obtido com a justaposição de técnicas perigosas e de combate em geral , penso que é útil, mesmo necessá-
senso moral. Estamos todos presos numa rede de pres- rio , fornecer uma descrição precisa do significado cul-
sões diversas, e certas pessoas e grupos têm interesse em tural do bu.do e da perspectiva que oferece às pessoas
permitir a erupção da violência e da agressão. Até que que se tomam interessadas por ele. Buda apresenta uma
ponto podemos colocar nossa confiança na moralidade dimensão da atividade humana que pode ser interes-
individual das pessoas hoje em dia? sante para as pessoas que encaram a prática das artes

12 13
marciais como algo muito estranho a elas. Ver o aspecto aplicações: em espetáculos, como forma de entreteni-
do budo pode até servir para atraí-las para essa prática. mento, em várias formas de autodefesa - combate mili-
Budo é uma prática física particular que conduz com tar ou combate no contexto de trabalho policial - e
certeza ao desenvolvimento espiritual. De fato , se as também em brigas de rua. Q_asp-ecw milirária toma
pessoas iniciam budo como uma prática física, seu cami- precedência no Ocidente e o estudo das qualidades Clll-
nho as levará progressivamente em direção a uma !!:!,!:a.is das artes marciais parece ter sido largamente
dimensão psicológica e elas encontrarão uma prática na uegligenciado.
qual o <;grpo e a mente formam uma unidade. Contudo, O teatro Noh, a cerimônia do chá, haiku, Bunraku,
essa possibilidade é grandemente reduzida hoje em dia Kabuki e outras disciplinas semelhantes foram desen-
pela confusão que existe entre budo e diversos tipos de volvidas numa sociedade dominada pela espada. Isso
atividades violentas. O propósito deste livro é tornar
claros para o leitor a abordagem e os fatores particulares -
implica uma concepção de vida e morte que é diferentt
daquela prevalecente em nosso tempo.. A sensibilidade
por meio dos quais o combate pode ser praticado como desses esforços culturais foi moldada por um povo que
budo, de modo que se tome um meio para cultivar o ser vivia num tempo em que a espada desempenhava um
humano como um todo. papel decisivo. O significado profundo das artes mar-
O termo "budo" tomou-se quase sinônimo de "uma ciais japonesas é inseparável desse contexto cultmaJ . No
arte marcial de origem japonesa". É um dos muitos ter- Japão , a cultura do guerreiro sobrevive hoje na forma
mos ligados à atividade de combate que as pessoas manifesta das artes marciais e, de um modo mais geral,
usam de modo mais ou menos intercambiável, sem subjaz a todo o comportamento do povo japonês.
questionar seus significados. Muitas pessoas falam Apesar disso , a prática do budo não é tão evidente
sobre "praticar budo", o que tem a virtude de conferir para os japoneses contemporâneos como se poderia
um toque de elegância à brutalidade do combate. Mas pensar. Desde a modernização do Japão, a aparência das
o estudo real do budo é na verdade bastante raro. Uma cidades japonesas mudou e o modo japonês de vida
das razões principaj~ é que a posição das artes marciais (mesmo o modo como as pessoas se movem) foi pro-
orientais não foi devidamente reconhecida no Ocidente. fundamente abalado e transformado de inúmeras for-
Foram relegadas à periferia do mundo dos esportes, mas. O que resta da cultura tradicional está agora
onde ª-.ÇOmpetjção é o elemento mais importa~. Além profundamente enterrado sob aparências sociais. Por
disso , as artes marciais foram vinculadas à violência e exemplo, até o início do período Meiji, os japoneses
a tudo ligado a ela. Foram usadas numa variedade de caminhavam de modo difereme.

l4 15
Permitindo-nos caricaturar as coisas levemente, Os japoneses continuaram a praticar as artes mar-
podemos dizer que os seguintes estilos típicos eram ciais tradicionais, mas os movimentos físicos usados
correntes no fim do período Edo. Um guerreiro cami- nessas artes deixaram de ser, corno originalmente eram,
nhava mantendo a mão próxima à espada, enfiada extensões dos gestos da vida diária, porque o padrão do
numa faixa na cintura, e dirigia seus movimentos a comportamento físico havia mudado. Os objetivos das
partir do centro de gravidade de sua barriga. Um mer- artes marciais também foram transformados, na medida
cador andava com passos curtos, com o corpo incli- em que essas disciplinas foram adaptadas ao novo sis-
nado para a frente e as mãos apoiadas no alto de seu tema de valores. Num certo sentido, os japoneses atuais
avental. Um artesão caminhava sem balançar seu corpo praticam as artes marciais tradicionais com um corpo
ou suas ferramentas e mantinha os joelhos flexíveis. treinado para imitar um conjunto de gestos habituais
Um agricultor andava com seu corpo inclinado para que está em processo de desaparecimento por mais de
a frente e as mãos na carga que estava sobre seus um século. Inevitavelmente, isso conduziu a uma
ombros. A ética da ordem social feudal reforçou esses mudança na qualidade e no caráter dessas artes.
padrões físicos e acabou por torná-los elementos fixos Quero enfatizar esse primeiro ponto, porque ele
de identidade. é muitas vezes negligenciado. Quando ocidentais
Assim, os japoneses do período feudal não cami- estudam as artes marciais tradicionais japonesas corno
nhavam corno os japoneses de hoje, com os braços são transmitidas hoje, eles não têm consciência da
balançando. Esse estilo de caminhar foi introduzido extensão em que essas artes marciais foram influencia-
pelos ocidentais e o modo japonês de andar mudou. das por sua cultura.
Pois, a partir da época da restauração de 1868, o Japão
adotou o sistema educacional ocidental no domínio do
conhecimento intelectual e também no da educação
física. O poder do Japão moderno estava baseado nesse
novo sistema educacional, que se espalhou rapidamente
pelo país. juntamente com uma rápida redução da taxa
de analfabetismo, o moderno estilo de educação física
foi imposto com a ideia de treinar soldados de acordo
com o modelo ocidental. Isso alterou profundamente o
comportamento físico dos japoneses.

16 17
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O que é Budo?

ontrariamente a uma ideia bastante difundida nos

C círculos de artes marciais, !2lli1g não é uma réplica


das artes marciais como praticadas pelos guer-
reiros do passado. ~ um conceito moderno que tetp
como objetivo o treinamento do ser humanQ como UIJl
todo. intelectual e fisicamente. fazendo uso das disciplG
nas tradicionais de combat~ Como vimos, é uma prática
tradicional feita com padrões modernos de comporta-
mento físico , aos quais questiona.
No Japão, o termo "budo" é usado de um modo
mais confuso. É um termo geral que cobre todas as dis-
ciplinas marciais. Ao mesmo tempo, não se pode dizer
com relação a qualquer disciplina que um iniciante está
praticando bud..Q. porque isso implica um certo modo de
i.aúcé!!. Quando as pessoas falam sobre o espírito da
prática do hendo,judo ou harate, muitas vezes usam uma
qualificação adicional, ligada pela palavra como. Por
exemplo, hendo (judo, harate) como esporte competitivo
ou hendo (judo, lwrate) como buda.

23
que, em sua forma ex trema, os riscos são muito maio-
-----
"Buda" evoca imagens de seriedade, de severidade,
de ritual_. de respeito pelos mais yelhos...f Jlclo mestte,
de medilação silenciosa, e assim por diante. Assim, buda
res. Portanto, umpreciso definir hudo em termos de
austeridade e severidade ou em rermos de um espírito
dá a impressão de uma prática conservadora e uma ati- de ascetismo.
tude austera. A palavra "dojo" eyaca a serenidtl.Qe de UIJl O _gue é buda então? A simples noção de~/~
espaço solene.. com um assoalho de madeira polida. l!!t..Plica a necessidade de refletir sobre a prática técnica
Essas imagens contrastam com aquelas de um esporte das artes marciais~ em conexão. com a nocão de
que acontece num ginásio amplamente iluminado ou ao "caminho".@ O termo data do 12-erí5Wo Edo e significa
ar livre. Na verdade, quando falamos de esporte, a ima- "o caminho do guerreiro". Após o período M~i, seu
gem e mais livre e, de algum modo, mais ensolarada. significado alterou-se para designar o caminho marcial ' (
No Japão, quando as pessoas falam de buda, com numa sociedade que estava sendo transformada pela
relação ao karate, algumas vezes referem-se a uma prá- importação de modelos ocidentais. No presente, é um
tica dura e violenta, com competições nas quais não se termo bastante ambf&uo.
evita a luta até o nocaute; ou outras vezes se referem a Minha intenção é estudar o conceito de buda como
uma prática austera que se distancia de competições e usado para referir-se à prática de nossos contemporâneos.
favorece o combate real, no qual não se evitam sangue No Japão de hoje a modernidade é altamente pre-
e ferimentos. Outras pessoas associam-no a treinamento zada e no momento em que se fala em "caminho", do,
ascético nas montanhas. Confrontação violenta é uma algumas pessoas imediatamente perdem o interesse.
de suas características. Contudo, minha opinião é que essa noção permanece
Em outras disciplinas, como o tiro com arco (kyudo), presente na cultura japonesa contemporânea. Do modo
enfatiza-se o aspecto espiritual e a harmonia do caráter como é manifestado em buda, o caminho não é nem
cerimonial da prática - a ponto de a ideia de combate arcaico nem místico. Sua prática não está restrita a asiá-
ser excluída. ticos e te~~o).L..Jo,o....f~er'.lte~c~id~a~b~a~s!.!:.ta~n~t~e~a~b~e~r~ta~m~e~n.!.!t:=e~c~o:.!!.!mo
Desse modo, no Japão existe uma tendência a defi- uma maneira de buscar uma certa forma de perfeição
nir buda com relação a seu aspecto duro e auste;.o. Mas que qualquer pessoa pode desenvolver com base EdU
essa definição é mais emocional que teórica e não nos exercício_0ísicus. Parece-me que a .maneira pela qu~l
leva muito longe. No que se refere à severidade ou ao certos entusiastas da escalada ou da vela levam suas dis-
alto risco, há disciplinas no campo dos esportes, tais ciplinas ao pomo extremo de colocar a vida em perigo
---·------~---------J
corno escalar montanhas ou corrida de barcos a vela em _é próxima à ideia de "caminho", porque estão procu-

H 25
rando, por meio de técnicas físicas ailamente exigentes, gue enfrentam é o de pôr em prática a ideia de caminho. n
~nferir significado à vida atraves de experiências n55 Uma análise dos problemas encontrados no processo de R.
q_uais confrontam a marte. transmissão da prática do budo, em outra cultura que não
Usando uma análise da prática das artes marciais a japonesa, nos permitirá obter uma melhor compreensão
(, como base, gostaria de descrever as rinci ais caracte- da complexidade desse conceito.
~ g
rísticas do conceito japonês d " amin " o todo da

- -
vida de uma pessoa da momento do nascimento até o
momento da morte. que consrjrui o c~ . Isso inclui
altos e baixos. Cada pessoa trilha esse caminho, mas o
caminho não se impõe a consciência da pessoa e é fácil
dispersar-se com a passagem do tempo. A partir do
m~mento em que falamos de camin~, há um senti~o
L de direção ou de..objetjyo. Mas quando esse sentido não
~eriJ:t:Hmtada como urna prática,~
~udo permaneça uma abstração, mesmo que a pessoa
tenha um conhecimento histórico ou cultural dele.
ÇEando, durante o período de tempo que compõe
nossa vida, a_ssacjama~_prática das anes. marciais com
~' um seotJ"dae d estorco
r .
para nos apnmorarmqs, .
Isto .
e,
c, para nos desenvolvermos como um todo , nasce a ideia
de buda~ independentemente da cultura em que essa
ideia se origine.
eia está presente em
todas as culturas. Contudo, o que os japoneses entendem
por isso me parece bastante diferente daquilo que os oci-
dentais peosam. A diferença nesses conceitos é mascarada
pela noção de progresso e não aparece imediatamente.~

r os ocidentais querem praticar budo de um modo com-


~ me parece que um dos mais importantes problemas

26 27
~
A transmissão do budo
pelos japoneses
r;~
.J,._ ""-.- J';v./, /!
F.f/, Jt ~--:J:>
..(.. "-f:i.v. ct.S J.t.-
v~ , ~amos começar com as dificuldades ou os proble-
f....,"'"atc.:t~~~ mas explícitos ou implícitos que os mestres japo-
neses das artes marciais encontram ao tentar
transmitir o budo para estrangeiros que querem desen-
volver uma prática de artes marciais.
Para os mestres japoneses, uma das principais difi-
culdades é comunicar técnicas físicas em relação com ~
aspectos espirituais. Porque, se eles realmente querem
ser entendidos, serão forçados a adotar uma concepção
relativa de vida, de modo a acomodar a visão dos oci-
dentais, que os levará, de certo modo, a colocar em
questão sua visão de mundo. lsso não é uma coisa fácil.
~ara fazer progresso na prática do b!Y1o, concentra- 1\*
ção, vontad~ convicção e mesmo um espírito impassí-
vel são necessários a fim de perseverar durante anos d.e
n.einamento. A vontade exigida para longos e duros
períodos de treinamento não é necessariamente com-
patível com uma tentativa de profunda reflexão teórica

29
e lógica. A maioria dos mestres obtém a energia neces:._ ~mbém expressar-se em termo~ de g@R.erosidade.- pru:.
sária para nutrir a prática do buda da sensação de pm,- exemplo, quando estudantes estrangeiros são recebidos
curar a perfeição1 mesmo quando não o fazem muito num doja no Japão- até o grau em gue o ponto de vista
conscientemente. dos mestres japoneses não seja desafiado ou abalado. ~)(.
Para mestres da geração que viveu durante a Mas então essa atitude deriva principalmente de uma
R.
Segunda Guerra Mundial, essa sensação deriva de urna ilusão de entendimento que se torna possível pela!!!!-
abordagem que visa chegar ao ~tado de perfeição repu~­ bilidade de comunicar adequadam.e.._nte por meio ~
~tado por uma fusão sincrética da imagem do Buda linguagem. Vi o mesmo padrão repetir-se muitas vezes:
com a imagem dos deuses do xintoí~l:tlD. Essa imagem um mestre diz que esses seguidores ocidentais com-
de perfeição é um valor profundamente presente na preendem o espírito do buda melhor que os estudantes
sociedade japonesa. Contém uma intuição da unidade japoneses. Quando aparece um problema, ele diz
~ entre o mundo humano e o universo todo. Essa tendên- "Estrangeiros são, apesar de tudo , estrangeiros; eles
cia ao universalismo é bastante geral nos círculos do nunca entenderão o buda". Çuando desentendimentos
buda. Além disso, a firmeza e o esforço intenso deman- ~parecem claramente esses mesmos mestres podem
dados pelo buda tendem a reforçar a visão da universa- parecer egocêntricos incompreensíveis ou herméticos
lidade do valor da vida que é conduzida no caminho para seus estudantes ocidentais. Acredito que alguns
-porque pluralidade pode levar a uma perda de direção, estudantes ocidentais tiveram esse tipo de experiência.
mayai. O buda torna possfyel forjar a força para ir dir~­ Deve-se reconhecer gue poucos mestres japoneses
~L tamente em direcão ao objetivo, mesmo às vezes a são inclinados a adquirir um entendimento de outros k
expensas do pensamento crítjco ~temas de pensamento que não os japoneses especial-
A ideia de verdade universal envolve a tendência à mente em relação à prática do buda. Mas sua atitude
simplificação e à justificação, que poderia levar ao tota- também reflete a ausência da abertura pessoal de
litarismo. Ela também é a base para todas as seitas. Não alguém que esteja totalmente devotado a estudar e a
esqueçamos que essa foi uma das justificai iva-. para a entender algo, uma abordagem que não é natural à
ideologia de dominação mundial durante a ~cgunda cultura japonesa. Paq1 a maioria dos mestres mais
Guerra Mundial. Não é meramente por aca-.o que, velhos, buda é único e, como resultado , a comunicação L,
durante as guerras, o buda era facilmente mi-.lllrado com do buda só pode ser uma coisa unilateral: do mestre
um nacionalismo que excluía todos os valmc-. que não para os discípulos e dos japoneses .para os estrangeiros.
aqueles do Japão imperial. Esse universalt~mo~e É impensável para eles que o conceito de buda poderia

30 31
ser reexaminado e modificado ou esclarecido através miti-la a outros. Usando o exemplo da tradição do kenda
=-
do co ntato cultural com estrangeiros. ConLUdo, penso como base, mestres de outras disciplinas devem apren-
que é tempo de reexaminar e esclarecer o conceito de der os elementos de que suas disciplinas precisam para
buda, porque a prática do buda tomou-se agora mundial dar-lhes as qualidades genuínas do buda. Eu diria que
e me parece que essa situação está se tornando cada vez uma disciplina como o karate possui potencial para
mais estabelecida. ir além do kendo atual no campo do buda, porque o
Se os mestres japoneses não são capazes de comu- modelo prático do harate é mais adaptado à moder-
nicar o buda corretamente para o mundo exterior, o buda nidade, enquanto que ninguém pode deixar de ver a
fora do Japão corre o risco de assumir uma face irreco- disparidade entre henda e modernidade. Todavia, a cons-
nhecível e de perder o caráter específico que o faz ser ciência do budo do praticante de karate está rnuilo atrás
o que é. A responsabilidade dos mestres japoneses, daquela do praticante de kendo.

~K
especialmente no caso do ken$4 é ainda ma).Qr_2orq:J,!t Na realidade, hoje, o autoexame quanto à sua qua- ~~
mestres de alto nível são incomparavelmente mais lidade de budo é apropriado para praticantes de todas as
K numerosos no Japão do que em outros país~ Sua res- disciplinas de artes marciais tradicionais japonesas. Res-
ponsabilidade é multifacetada e pesada porque, como o pondendo a esse questionamento , é necessário ter uma

i4t -
vejo, o hendo é atualmente a única disciplina na guaJ...a
ideia de buda. tal como elaborada atrayés da p~e
'2_são ampla do mundo do buda. Visão ampla é necessá-
ria ~fim depnalisar a siruaCàQ atua.l do Japão e de outros
K combate. é preservada em seu sentido plen.o. Com rela- países e para desenvolver uma teoria e método para a
ção às outras disciplinas do buda, por contraste, algumas comunicação do buda que seja capaz de responder ple-
tomaram-se misturadas com esportes de combate e namente a essa situação. Por essas razões, penso que é
outras estão confinadas quase que exclusivamente à prá- essencial a evolução e progresso por parte dos mestres
tica de kata (formas), as quais- erradamente- as fazem e estudantes japoneses.
parecer como práticas folclóricas. Também se deve reco- Esses fatores positivos e negativos me parecem refle-

'
nhecer gue hoje a integridade do henda é ameaçada a raJ
p_onto que sua própria base tomou-se frágil.
Nessa situação, ~ responsabi1idade dos mestres e
estudantes japoneses é primeiro e principalmente~­
servar a herança cultural a herança da kendo e do buda
tir p~blemas fundamentais da comunicação intercultural.
De fato, um tema corrente de discussão no Japão é
a possibilidade de praticar o budo como um meio de
.fUltivar o ser humano como um todo e de propagar as
várias disciplinas do budo em escala global. De meu
,
~u -e desenvolvê-la mais e, segundo, comunicá-la e trans-
~ ponto de vista, tal tentativa só tem sentido se descobrir-

32 33
~
~
mos outro rrtodo de apreen~; a .essência do budo que o
dissocie da cosmaionia japonesa. É essa dimensão do
budo japonês que me dedtco a defimr. Somente essa
dimensão me possibilitara levar a essência do buda parn
~tL
;/( ll::f_Ultura ocWen@. Aprofundando um pouco mais, em O problema do budo para
IJlinha opin~ç não há apenas um budq. mas sim m_ülti-
plas possibilidades para a prática e apreciação do buda,. praticantes estrangeiros
Sendo assim, poderia dizer que a maioria dos mes-
l _tres japoneses, especialmente os mais velhos, tem bem

-pouca consciência da multiplicidade de yisões de vida


com as quais o buda é confrontado hoje em dia, princi-
--....

palmente por causa de sua educação e também por


uais são os problemas mais encontrados por
causa das barreiras de linguagem e de sua falta de expe-
riência em se comunicar com estrangeiros.
Q estudantes estrangeiros, particularmente oci-
dentais?
mjnho, para osjaponeses. é relacionado.com a
~da inteira da pessoa. A noção de budo envolve o ~~
esforço para o aprimoramento de si mesmo. o que quer
c
dizer o aprimoramento do ser em sua totalidade, _por
tpeio da prática de artes marciais. Essa expressão é com-
preensível para os ocidentais, mas eles ~m L
o mesmo significado que os japonese:;.
O caminho para elevar a qualidade como ser
humano através da pratica do º-udo é derivada noJapãp,
como vimos, das idejas do budismo e do xinraísmq. As
pessoas são capazes de atingir o estado de Buda, um
estado divino, e são capazes de tornar-se unas com o
deus de um santuário em particular. Podemos citar, por
exemplo, o santuário Hayashisaki-Jinja, onde o funda-
dor da escola Iai, Hayashisaki Jinsuke-Shigenobu , é

34 35
venerado como igual a um deus . Existe um grande Através desse processo, a prática do buda leva, de
número de santuários onde uma pessoa e venerada certo modo, estudantes ocidentais, assim como mestres
como um deus. Essa noção pressupõe que as pessoas são japoneses, a duvidar e questionar seu modo de ser. Para
capazes, por meio de seu esforço, de chegar a um estado os ocidemais essa .::_ão é uma questão de adotar o que
de perfeição durante a vida. Todas as pessoas têm o podenamos chamar de japonesismo. Alguns ocidentais
potencial de, por meio da elevação de seu valor humano, parecem viver de um modo mais japonês que os japo-
mudar a qualidade de seu ser e obter um nível de mérito neses. !3nso que abdicar da própria identidade ou ~·. Yr
que é inseparável de uma forma do absoluto. Essa visão torná-la ambígua não ajuda; muito pelo contrário, !.. ~F
é manifestamente diferente daquela da cultura cristã, em ~tu/o condm ao forralecimen1f> da iden-
que a distância entre humanos e Deus e insuperável. ~e pois possihdita que se YIYª intensamente no aqut
Discussão filosófica e ética, as artes marciais japo-
nesas ou buda ~ão baseagas furu;laiJJentalmente na_con-
cepção budista e xintoísta do mundo e em um universo
-
e agora, a cada momentQ. Praticar buda fora do Japão
significa que os pralicantes têm que desenvolver a pró-
pria identidade sem depender dos modelos japoneses.
no qual não há absoluto porque nada existe que seja Certos especialistas ocidentais definem budo de

-
relativo . O universo não é fundado sobre o conceito de
Qeus(Absolu}O. Conheço ~iversos mestres japoneses de
outra maneira; eles observam as características comuns
das diversas disciplinas das artes marciais. Desse modo,
artes marciais que são cristã~ gpbora sua fé seja cristã~..
isso não os impede de ter um senso da energia uniyersru
produzem um catálogo qu~ não tem estrutura. Sua abor-
dagem falha ao não levar em consideração a qualidade
,
~*tf no sentido xintoísta e hudistt específica do budo , que reside na noção de treinar ou
• O buda se assenta sobre essa concepção do mundo cultivar o ser humano mais do que nas particularidades
e essa forma de sensibilidade, e demro disso , a ideia dos movimentos empregados nas diversas disciplinas.
de treinar, cultivar, é central. Desenvolver essa ideia no
contexto de outras culturas seria, de certo modo, esten-
der a generosidade da lógica budista de dar vida à rea-
lização por meio da abolição de si mesmo. Toda pessoa
e considerada capaz de aspirar pela busca da perfeição
~ Ê.ercorrendo o caminho. No buda, essa busca é realizadil
f por meio do treinamemo intensivo de técnicas física~

36 37
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número de santuários onde uma pessoa e venerada certo modo, estudantes ocidentais, assim como mestres
como um deus. Essa noção pressupõe que as pessoas são japoneses, a duvidar e questionar seu modo de ser. Para
capazes, por meio de seu esforço, de chegar a um estado os ocidemais essa .::_ão é uma questão de adotar o que
de perfeição durante a vida. Todas as pessoas têm o podenamos chamar de japonesismo. Alguns ocidentais
potencial de, por meio da elevação de seu valor humano, parecem viver de um modo mais japonês que os japo-
mudar a qualidade de seu ser e obter um nível de mérito neses. !3nso que abdicar da própria identidade ou ~·. Yr
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que a distância entre humanos e Deus e insuperável. ~e pois possihdita que se YIYª intensamente no aqut
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nesas ou buda ~ão baseagas furu;laiJJentalmente na_con-
cepção budista e xintoísta do mundo e em um universo
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e agora, a cada momentQ. Praticar buda fora do Japão
significa que os pralicantes têm que desenvolver a pró-
pria identidade sem depender dos modelos japoneses.
no qual não há absoluto porque nada existe que seja Certos especialistas ocidentais definem budo de

-
relativo . O universo não é fundado sobre o conceito de
Qeus(Absolu}O. Conheço ~iversos mestres japoneses de
outra maneira; eles observam as características comuns
das diversas disciplinas das artes marciais. Desse modo,
artes marciais que são cristã~ gpbora sua fé seja cristã~..
isso não os impede de ter um senso da energia uniyersru
produzem um catálogo qu~ não tem estrutura. Sua abor-
dagem falha ao não levar em consideração a qualidade
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~*tf no sentido xintoísta e hudistt específica do budo , que reside na noção de treinar ou
• O buda se assenta sobre essa concepção do mundo cultivar o ser humano mais do que nas particularidades
e essa forma de sensibilidade, e demro disso , a ideia dos movimentos empregados nas diversas disciplinas.
de treinar, cultivar, é central. Desenvolver essa ideia no
contexto de outras culturas seria, de certo modo, esten-
der a generosidade da lógica budista de dar vida à rea-
lização por meio da abolição de si mesmo. Toda pessoa
e considerada capaz de aspirar pela busca da perfeição
~ Ê.ercorrendo o caminho. No buda, essa busca é realizadil
f por meio do treinamemo intensivo de técnicas física~

36 37
então começar, através da técnica, a tomar-se insepará- tipo de intuição; elas são pessoais e não serão claras para
vel da busca pelo significado da vida. Enfatizo "através todos, porque não são baseadas no tipo usual de argu-
da técnica", porque o significado da vida pode ser asso- mentação, mas ganham significado para uma pessoa que
ciado com qualquer outra atividade. N.Q buÊ;J. a grocura esteja praticando budo.

t~
Jlit apalidade da técnica está diretamente relacionad~
com a Qijsca oelo significado da vida. No momento, estou dingindo o treinamento de inverno.
Assim, e não constitui um gênero particular hangeiho. das 5h30 às 7h A luz das estrelas é aquela do
entre as disciplinas de combate, mas sim a qJapeira pela h1 , o movimento das nuvens é aquele do hi e o sol emana
qual alguém ie engajj nl!ma disdplina da arte ~m­ o hi que queima, que é o lli do tomar a miciattva, sen. O
~~
ba!UIO mosuw ;ficácia. hi do cosmos, mais distante que o sol, é o ki da iniciativa
Portanto, é apropriado gensar na buda em dois sen-
~ como um tipo de disciplina e corno .!!ma rela_ção.
antecipada, sen-sen. Continuo em meu treino , usando
4
meu precioso tempo para fortalecer-me através do hi
AL

-
subjetiva. Por exemplo, logo que uma pessoa começa a enquantoj.fonalsms Oaljmemo, a 6m de chegar mais
praticar hendo, aihido ou harate, entrando em uma asso- perto da verdade universaL Faco çsforcos_para atingir o
ciação ou dojo, está graticando uma das disciplinas dg estágio de ir além da vida e da mone, a fim de deixar que

I
- - - Mas o conteúdo de sua prática permanecerá mera- meu ser se funda com o universo. Esse é o mgmemo
mente aquele de um esporte de combate de origem 9Ja!S gui!j para me ]8'W~ear siletlc'96'ment1 com
'k oriental enquanto ela não descogrir1 em seu modo de o universo. Esse é o retorno para SI mesmo e o retoWQ
=
f't wJicá-la. um sentido subjetivo de treinar-se e cultivar a
6
&ara o Y)tip g;ipp a mjm mesmo segurando a espada ~*-+
~\r fusão entre o ~­
si mesma, ou enquanto não houver a ......w: <ie bamhp shin~camo a espada com a qualtçnto sog- L.
~ cesso de mell}gria de s~a técnic,a, com o p&ocesso d~
~ ,. melhoria de seu sçr como um todo
\..-0\'( • Acho interessante citar uma passagem de uma carta Para mim, esse texto é perfeitamente claro e o per-
que recebi no começo de 1999 de um mestre de hendo, cebo através das sensações concretas da experiência viva
um homem de 77 anos de idade, a quem respeito muito do budo que ele me evoca. Lendo o texto, um japonês,
e considero um dos meus professores no caminho do mesmo que não pratique budo, preenche e completa o
budo. Quero apresentar essa passagem porque ela ilustra que é deixado vago- pois o espaço ambí~o dessas sen:
perfeitamente esse processo e as dificuldades que ele tenças está preenchido pelo conteúdo da noção de ki,
.r
envolve. As palavras e frases dessa passagem evocam um uma nalavra que evQ.ca sensações físicas. Traduzidas

<
I
_, "'{~GtJ\l ~ - r
42 1~~~: p~~jo l4~U~N ~ ~ fvf~b DA ~~ ~ eotJl-ftGi ~ (1'To -n
~9...
~
para o inglês, cada palavra assume uma conotação pre-
cisa e esse modo de falar não mais deixa espaços vazios.
A expressão é muito pessoal e é entendida desse modo
em japonês. Tpduzjda para o jngl r~ ,_assume um sentido
universal que não tem em sua língua original Ki na cultura japonesa
O esforço para cultivar a si mesm~ , no sentido que
mencionei, não aparece aqui de um modo abstrato, mas
de urna maneira que é baseada em seosacões corporais
concretas. Essa é uma sensação corporal que qualquer ser
humano pode entender, independentemente de sua ori-
gem cultural. Em outras palavras, essa pacão comoral
é a chavs que permite a qualquer pessoa mtJriqr hwig
~

N
a língua japonesa, um grande número de ex-
~f ptotal~qmolçtamente, ultrapassando obstáculos culturais.
Em que consiste essa sensação corporal? Em japo-
.pressões contêm a palavra "hi", e outras a pres-
supõem. Tive que lidar com essa situação
nês , ela é expressada pela ideia de hi. Vimos agora
quando estava traduzindo o texto de Escritos sobre os
mesmo um exemplo disso.
Cinco Elementos, de Miyamoto Musashi, para meu livro
~orno uma pessoa pode estar certa de que sua R!_á-
Miyamoto Musas hi.*
-
tica de artes marejais está se tomando budp e de que não
está criando uma ilusão? Há um elemento que serve
Nesse texto, Musashi usa o palavra k~koro um
grande número de vezes. Essa palavra é geralmente tra-
para in~icar isso, que faz do budo buda e que ao mesmo duzida como "mente", mas não pode ser traduzida por
tempo o ~oia em seu progressg. Esse é o hi. Nesse sen- apenas uma palavra. Dependendo do contexto, kohoro

~ tido , hi é a c~av' para a lj?rática dp buda. Estamos tra-



tando aqui de urna certeza interior, que é extremamente
pode ser traduzida como "mente, sentimento, sensação,
sentido, pensamento, ideia, significado, coração, centro,
difícil de explicar em palavras, mas que é çgmunjcável núcleo", e assim por diante.
~amente. É por isso que, depois de ter esclarecido a Contudo, mesmo depois de usar essas várias palavras
noção japonesa de hi, examinaremos como isso é prati- para traduzir hohoro, ainda permanece um sentimento de
cado em relação a situações diferentes, para captar ple- incompletude na tradução. Gastei muito tempo tentando
namente essa noção única gue simultaneamente envolve
o ooo e_a wegty, * Kenjt Tokitsu, Miyamoto Musasht (Editions Déslris, 1998).

44 45
descobrir o porquê disso antes de entender que Musashi, Sekishusai, encontramos a seguinte sentença: "Se acon-
~o usar as palavras, estava assumindo como base uma tecer de eu trair o que acabei de escrever, deverei ser
sensação com a gual os japoneses daquele período, espe- punido por Marishiten, Hachiman Daibosatsu, Tenmam
cialmente os praticantes das artes marciais, estavam farni- Tenjin, Kasuga Daimyojin e Atagoyama".
~ e que compartilhavam. Ele estava, de certo Citar o nome de diversos deuses desse modo era
modo, investindo esse meio de expressão com toda a sua um testemunho do mais sério dos compromissos. Escre-
real experiência vivida. (Estou usando a palavra "meio" ver o nome de um deus indicava um compromisso ao
aqui no sentido de um meio ou aglutinante de pigmentos, nível de vida e morte. Os japoneses do período estavam
por exemplo, óleo.) É por isso que, enquanto não captar- imbuídos de um senso da presença do çfurioo na naty_-
mos a natureza desse meio, as expressões de Musashi t:ezâ. Essa atmosfera despertava uma CQP5ciência da sen-
permanecerão incompletas - de certo modo, como se sasão do hi. Há não muito tempo atrás, o povo japonês
fossem vistas com apenas um olho. Permanecerão ambí- ainda vivia com um sentimento da importância daquilo
guas. Se estamos conscientes da presença implícita desse que não é visível. Em minhas memórias de infância no
meio, suas expressões tomam-se substanciais. O que é o Japão, esse tipo de sensação está presente.
~ Aqui, de novo, estamos falando sobre hi.
....
De fato , uma vez que li seu texto e o completei
Através da sensação de ill· os japoneses parecem
haver captada o sentido dos fenômenos naturais sem teo-
tendo em mente o sentimento subjacente de hi, seu sig- !!,r e2Qllicá-los. Eles não excluem as sensações vagas do
nificado tomou-se muito mais claro. Mas como fazemos domínio da fala. Penso que essa é uma das razões pelas
.eara que esse elemento não faladQ_passe para a lmgua quais encontramos um grande número de palavras ono-
ingl~? Esse é,9.Jlroblema fundamenw na traduçãp de matopaicas na língua japonesa. Quando precisam verba-
textos japoneses, particularmente os mais antigos. ~ o elemento intermediante, o meio que corresponde
Também é necessário entender que o significado de a certas ..âensacões ou sentimentos vagos, os japoneses
escrever era diferente para os japoneses da cpoca de YSflm a palavra "hi". Como resultadOJ sensação de hi
Musashi. Por exemplo, no certificado escrito de trans- Qirece estar situada num nível majs profundo e arcaico
missão muitas vezes encontramos as palavras "Sle acon- que as sensações que se tomam objeto de conhecimento.
tecer de eu trair essa confiança, deverei ser punido por Urna das peculiaridades da cultura e da sociedade
tais e tais deuses", usadas tanto pelo mc'itrc que está japonesas me parece ser o fato de que os japoneses conti-
concedendo o certificado como pelo disctpulo quc o está nuaram a dar um lugar importante a esse tipo de percep-
recebendo. Desse modo, no final do certificado tk trans- ção mesmo quando desenvolveram uma lógica moderna.
missão escrito por Kamiizumi Nobutsun,t pa1a Yagyu

46 47
e
A concepção japonesa de ki

credito que a sensacão coroor~ ge ki~

A c_omurnente presente na experiência b nma n ~ .


mas que a forma tornada pela interpretaç!o
dessa sensação varia de cnltma para cultura. Por exem-
plo, o aspecto lógico é muito mais desenvolvido nas
línguas ocidentais do que na língua japonesa. Nas lín-
guas ocidentais não existe - e essa é uma das maiores
dificuldades para a tradução- urna palavra equivalente
~Em japon~. esse termo abrange várias sensações.!
impressões que são misteriosas. vagas e intangíveis, .fill.e
tocam algo na parte mais profunda de nosso S!r, algo
que está conectado a um nível de compreensão que é
provavelmente arcaico ou reprimido.
Esse corpo de impressões difíceis de definir está
presente na experiência da vida do dia a dia, na litera-
tura e nas artes do Japão. Quando é necessário nomeá-
-lo, as pessoas chamam-no de ki.

49
A exclusão dessas sensações e impressões da termi- o processo cartesiano. Ao estar aten!g à sensacão de ltk,
nologia explícita das línguas ocidentais me parece um a pessga ãe qissolve em seu ambiente pois diminui ~
corolário do caráter lógico dessas línguas. Pensamento sensação de ter a própria existência como centro. ~ ;j/
racional provavelmente desenvolvido através da repres- atitu9& está na raiz das ~iferentes técnicai de fortaleci- 1j F
são dessa sensibilidade. o esgam é permeado por dife- mento do hi.
rentes energia 'i. e sabemos que esse espaço existe sem
sermos capazes de definir seu conteúdo. .._ Todo dia usa-
mos aparelhos de televisão, rádios e telefones portáteis
que utilizam ondas eletromagnéticas que não são nem
visíveis nem tangíveis sem equipamento especial. Foi só são separadas de suas origens místicas e aplicadas em
em tempos relaóvamente recentes que a ciência foi capaz conjunto com meios médicos para curar através da esó-
de demonstrar a existência dessas ondas. Contudo, mulação doJl. Em japonês~ não é definido pelo escla-
quando se trata de h1_ não é raro que as pessoas que se recimento de suas características; 9 termo é usado mais
consideram racionais rejeitem a ideia a pdod, porque o quando se â'Wi' a presen&i ds algo que não pode.. ~r
!li não é tangível e, sem dúvida mais profundamente, claramente apreendido. A língua japonesa deixa um
porque está conectado à experiência snhjeti~. O fato é espaço indefinid~ em seu modo de expressão. Parece-me

e-x -
1f7<. que hi não é um conceito abstrato; é um concejra que que é;smente por meio do co~?O que podemos explow
~k
-
~rge dg quyjr ª5 sensacõe.s comorajs por meio das qu@i esse espaco; ao esclarecer o papel desse espaço pode-
se percebe o ambieng; e também, ao mesmo tempo. a '
mos avançar na área da técnica física.
maneira mma,a pessoa está sitJ!ada gele. O mesmo ideograma ê pronunciado .. qi em chinês e
Kj é sentido por meio do CO!JlO e é dada a ele uma hi em japonês. Mesmo que o significado seja similar em
representação mais ou menos definida, dependendo da sua maior parte, há certas diferenças entre a ideia japo-
~ cultura em questão.~ sensação de hi é intensifica@ nesa de hi e a id~chinesa de qi. Em ambos os países, ~x-)<
l,,'f guando a autoconsciência especulativa é empurrada existiram disciplinas destinadas a desenvolver a capaci- -r
~ra um segundo planQ_; Isso acontece em graus varia- dade para QÍ gu hi, por longo tempo. Elas foram propa-
dos , dependendo de quanto as pessoas gueiram ;ban- gadas desde os anos 1970 sob o nome d~ em
*}}1-,.donar seu egq em favor <jg s~ cer;s. Se o ego é çhinês, e@ITWJ em japonês. No presente trabalho, vou
r
LJ reforçado, a sensação de hi diminui. De um certo modo, me limitar a tentar esclarecer o conceito japonês de hi
o estado da mente de alta consciência do hi vai contra tal como se aplica ao domínio das artes marciais.

50
I (I L ~&
Ql ; KÚ(o \ 51
De acordo com o pensamento japonês, ~ é uma enti- diano de libido toca em algo profundo da natureza
dade que toma possível a vida e a existência das coisas. humana e acredito que isso coincide parcialmente com
no universo. É portanto mais do que "energia vital", a ideia de hi.
como é geralmente traduzida. Ki ~xiste nas coisas que Na perspectiva que se desenvolveu no Japão, ~
!!,O.S. parecem deçprovidas de vida otgânica , como as estudar ou desegxo~çr Ai
na prática do buda, ou hiho, "'f-
pedras e também em fenômenos naturais como o vento consiste em tornar-se sensível ao ki no próprio corno
ou a chuva. Ki também reside nas montanhas no mar etc. como um todo, então ao fenômeno externo do hi e final-
Visto dessa maneira, ki parece como urna extensão do mente ao hi do universo. Isso implica ser peoneável ap
primitivo pensamento animista. Contudo, hoje, quando fti._do universo e sentir que o corpo é parte do universE_
a civilização é confrontada com um conjunto diferente preenchido de ki.
de problemas, incluindo a destruição do ambiente natu- Quando a sensação de ki está suficientemente
ral, essa linha de pensamento, rejeitado por um tempo desenvolvida, o hi do corpo está em harmonia com o hi
como arcaico, está agora levantando novas questões. do universo. Os xários mtrgdgs de hjhc; são métod~ por
Atualmente existem diversas tendências que tentam
recuperar qualidades do ser humano que parecem ter
meio dos quais as gessoas procuram tornar-se permcá.-
veis à realidade do ki universal. O último estágio da -r:
sido perdidas no curso do "progresso". Não há dúvida grática de kjha é fyçrn sl!utm_, no qual o corpo torna-se
"*'~
~
de que a acuidade de nossos sentidos de audição, olfato, permeável ao hino grau mais alto possível. Nesse ponto,
tato e visão, que desempenharam papel vital no passado se tem a maestria sobre o hi sem a mais leve intençãq.
distante, ficou entorpecida quando nossos sentidos Há uma comunicação livre com o hi universal; sempre-
foram suplantados por dispositivos materiais. Isso
levantou questões sobre outras capacidades perceptivas
cisar de exercícios, viye-se com hi. Esse é o estágio ma_!;s
alto. ojdeal 12.ersegt!ido por agueles_gue praticam llikQ.
xJJ
que os humanos modernos podem ter perdido e provo- A ideia de hi universal pode se tornar compatível
cou o interesse por diferentes métodos de se conseguir com o pensamento ocidental somente com dificuldade,
bem-estar. Uma pesquisa feita nessa área trouxe à luz mas devo sublinhar que implícita ou explicitamente ela
capacidades perceptivas corporais esquecidas e levou à é essencial à concepção japonesa de hi.
descoberta de um novo nível de percepção, tornado Sem atingir o ponto de furen shuten, quando desen-
acessível pelos avanços científicos. Foram feitas muitas volvemos suficientemente nossa sensibilidade ao hi, n.Qâ
tentativas de encontrar explicações científicas para os .J.Qmamos conscientes de que ngs~e mental é
mistérios escondidos no ser humano . O conceito freu- !!-!.>~!!.Le~~~r.w..cil.:d~o~k!:i. Nesse nível ~odemos sentir

52 53
uma correlaçã2 entre as palavra? e R:iti• em conexão com Assim, o sistema de palavq5 com o qual estamos
as palavras, ki está sujeito a pressões mais ou menos tão profundamente impregnados é também um dos obs-
pesadas. O fato de nomear coisas, de definir precisa- _táculos encontrados na prática do hi.
mente o sentido das coisas ou o sentido de nossas ações, Contudo, não estamos sugerindo de modo algum
inevitavelmente causa uma modulação de nosso ki, por- que se tente recuperar o estado de um ser humano pri-
que o contorno do ki tal como definido pelas palavras, mitivo. Estamos falando sobre um esforço de recuperar
quando o significado é estreitamente circunscrito, eli- ou restabelecer as qualidades, sensibilidades ou as facul-
mina qualquer significado latente. Esclarecer e definir dades que perdemos no curso do desenvolvimento de
!!JlRlica eliminar ou suprimir os contornos vagos e nossa civilização. De certo modo, kiko objeliva dotar o :;k--_.f
i.!!!EJecisos do sentido laten!S. Esse meio de definir em ser civilizado com as qualidades primitivas gue perd_!- -'f-
_Q!Iavras implica uma redução do hi, que é sempre glo- ~ Assim, não é uma questão de tentar voltar para
bal, holístico . Desse modo , nomear um sentimento de trás. Pelo contrário, estamos falando sobre um esfor.~
amor reprime o ódio que está contido nele. O budismo de parte de seres civilizados para ir além das barreiras
nos ensina a confrontar esse conglomerado de senti- com as quais foram confrontado~ e sobre fazer isso pela
mentos sem basear distinções em oposições circunscri-
tas, como no estilo ocidental. Assim, "amor" pode ser -
mobilizacão de seus próprios IlltiOs para restabelecer
faculdade~ue ainda e~tão potencialmente present~.
traduzido como ai e "ódio" como nikushimi(zo), mas Aparecem as palavras, o ki é modulado de acordo
uma máxima de origem budista afirma que os dois equi- com o sentido delas e é reduzido no processo. Como 1
valem à mesma coisa. ~demos separar-nos de palavras enquanto vivemos
~,f::
Se nos constituímos como seres sociais por meio de
palavras, ao mesmo tempo ~efinição de coisas cp!P as
palavras implicam elimina uma parte da realidade de
--
com linguagem? Essa é uma das chaves para os mélQd.os
de kiho. Em hiho, usamos imagçns. sons e movimentos
~vez de palavras para aumentar a profundidade e.ara
*~

~sa experiência viu-ida e, corno resultado, deixa de além das palavras, de forma a conduzir nosso ser ao
.f9ra uma pane ~ignit:icativa clo..lzi. Desse modo, não é mundo do hi.
por acaso que os taoistas assim como os budistas bus-
cam um estado mental à parte do sistema de palavras.
~s procmam apreender a essência das coisas sem deli-

t m!_tá-las e deformá-las por meio das palay~ . Esse é um


estado de vazio ou não ensamentg.
0
~

54 55
~
O conteúdo do combate
no kendo

ara superar os obstáculos culturais e obter a chave

P ~ara o budo, é necessário cultivar nossa sensibUi- ~>Vf,


dade para a sensacãg de hi e permitir que sejamos f< p
guiados em amplitude e profundidade por essa sensação
1

através das técnicas físicas de combate. O aprendizado


no hendo é exemplar para uma exploração do hj por F
meio de técnicas ~e treinamento:~:.,;:·
Nolhendo jnêialmentêlo es (f J:Jde o que
'*
JorJ
é hi de um modo simples, pela expressão N hen ta i ichL *'~
que designa a integração simultânea do ]ll, da ~ e
do~ na técnica de golpear. Com o{Rassar dos anos/ ~~
o praticante de kendo irá aprender quão importante é e-
tomar a o[spsiva durante o combate. Um dos métodos
C I ~k
básicos para chegar a isso é seme. Essa noção complexa
merece uma explicação, porque na prática o nivel do
i'; F
raticante se reflete diretamente na aualidade da sem
=
o praticante.

,
" ~~~V\) )_~<h ~W~j 57
s~tMc.
~ ~eme]signi6ca literalmente "9fensf , no sentido de ~ exru=essa e~ J;A9\'ÍRl~RtQii,_mas estes objerjvam pri- ~
e uma ofensa no nível menta! e não no sentido de um
i
meiramente atingir a mente de seu apanen~. f/6---
gesto ofensivo físico . Contudo, ~ consiste num Durante.Q amçpdizada de lugf% a pessoa começa ~
m.ovimento de alaqys_ ou na simulação dele. Aqui apa- ~aproximar de r"%
por meio de atitudes ou movi- !f:'
JtC.e. um tipo de pposicãgsnrre o mrgq e :â mepte que mentos que comunicam sua combatividade a seu 0120-
i
é apreciavelmente diferente da clássica oposição oci-
, t
~.~envolve myjto mais do que as fintas que sª-º 'êf:k.
,Yf
dental entre eles. Chamarei isso de [ualismo japonês] usadas na l~ . A noção de seme é muito mais profunda [, L_
. ll
~ mcnrs guja o cmp2; mas,_num certo momento , a que aquela de finta. Para uma finta ser bem-sucedtda,
;-
~tua~ão RPde ser reye~a. Em termos mais gerais, seu oponente tem de confundi-Ta com um movime.!J.to
~ ~essoa _pode alcançar a ~e através do corpo e a de ataque real. A finta é uma . tática para .fizer g opa-
tó,.( mente é capaz de ser fortal~da pela prática física . nente acreditar que o falso é reall)bjetiva provocar uma
\ Além disso, se o corno. guiado pela mente, consegue Jeacão adequadª. No Ocidente, as pessoas falam de uma
.re_alizar um determinada avanço si~ificativa,_mloca-se finta bem-sucedida ou malsucedida e ao fazer isso des-
P,O-{]JeSmQJ?lapg gpe a mept;- a tal ponto que se pode crevem somente o movimento , porque a noção de seme
falar de uma (usão de como e mente. Nessa base seu não existe. Se a finta é bem-sucedida, é porque ela con.s- ~
~ corpo pode cancpJistar a mente de outra pesso.ê. Pra-
a
útuiu_o mJP se chama ieme em japonê9 O nonln ~
é, se a ,.. ~
fj" ticantes das artes marciais que ultrapassaram certos finta teve sucesso, foi porque o gesto, por mínimo que f7j
limites, ou monges que praticaram certos Qercício3 tenha sido, s_oosegpiu pernuhar a mente do oponen;.e.
~ físicos ascéticos, conseguem essa. fus~o e ~­ Por isso é que ~ria impreciso definir o processo de
.T.~ dos foram elahorados 12ara conseguir i~. Na crença aprender seme por mejo da descrição de movimentos. O
~ -- L.
I japonesa tradicional , é normal considerar que os gran- gesto de seme é o que comunica algo essencial.
des mestres são capazes de exercer poder sobre espíri- (Eum
nívef mais avancadgJ tentamos 2rovoTli
tos ou demônios que uma pessoa comum seria incapaz Jim Q?Qyimento na mente dq oponente ~em produzir *
até de enfrentar. p.~ sinal~xterior. Nesse estágio, tomamos a ofen- J;l~
~sa concepç_ão tem um gdefini~ nas art~ iva rinci almen través do hi. Isso é chamado de f;
marciais japonesas. Traz à tona a ideia de que, a fim de e atrav · ~~.f
~
I? i em ·
.f]a emanação do próprio hi sem nenhum gesto visí_y_el F(~
6_ dife.rg_nça entre ~me e kbwe reside no lugar ocupado

-
pelo movimento ou gesto. O que os dois têm em comum

58 13[~q{)S ~ci1)W~ ~\~e\1\f 59


r

s~~ ~ J.-
~
fY 83ilt E >
F
é que ambos procuram 6iUsu,uma mudanca na mente
/..J/JL que J20demos explorar o dpmwipJUepral do buda. Essa ...k~.)t\­
~n ~do oponente através do ki - a necessidade conectar
c. .ISSO a um gesto, a um movimento,
. . d:ou menor
.e maiOr noção foi desenvolvida na prática de kendo. Mas para as
outras artes marciais, nas quais há golpes e pancadas,
dependendo do nível. existe a possibilidade de integrar seme a fim de ultrapas-
"Cau3ar pma rpudancal!a mente do oponente" sig- sar o simples nível de lutar para vencer. É por essa razão

{ nifica que esse ato mgvoca no oponente o moyimenjQ


de toda uma acumulação de experiência de combate 1
que farei uma ruJálise de combate em hendo.
Kendo é uma disciplina moderna das artes marciais,
atualizando memórias corporais sobre as quais a ants- desenvolvida a partir da arte da espada dos guerreiros
cipação é baseaQ.a. Desse modo, quem não tem expe- japoneses. É praticada com espadas feitas de bambu
~ !iência de combate não rea,üá de um modo lécnj co em laminado (shinai) , capacete e armadura protetora. Essa
L resposta a seme ou kizeme . . forma foi elaborada no início do século XIX e evoluiu
Olhado de outro modo , o que a pessoa está fazendo juntamente com a modernização do Japão. Após a
é jogar um jogo sutil inerente ao combats, nada mais. O Segunda Guerra Mundial, passou por uma reforma que
que existe nessa tática que poderia torná-la um ele- lhe deu a presente forma. Como a esgrima ocidental, é
mento para o g:ltivo e o treino do ser humano por uma forma de combate com regras precisas na qual dois
inteiro? O gue torna possível que alguém influencie o adversários se enfrentam. Golpes estão limitados à
oponente não é um movimemg, falso ou real ; é o fato cabeça, pulsos e tronco, e estocadas com a ponta limi-

"I
~ de gue §zoloca o pesg Àª existência pg arp. Somente
L Jí ~endo isso é que o ato ganha ya)or no momento d.Q
I combateJiemdganha significado a9 J&Qsrjr g peso d
tadas à garganta e ao peito. Almofadas protetoras tor-
nam possível evitar ferimentos , mas os golpes podem
ser sentidos e são dolorosos até certo ponto - o sufi-
~ um s~ E dessa maneira que podemos tentar não ser ciente para criar apreensão sobre ser atacado.
'1 F perturbados pela seme do adversário. 'P geso de um Durante uma luta de kendo, se concentramos a
ser" significa aguikorpo e mrnW _tJossOfiifPO podpçr atenção no modo como os combatentes cruzam seus
vJ.t/. wturbaJ!g. mesmo que pensemos que a m~te.....es~ shinai, é possível ver que quando as pontas se cruzam,
1[.LV"f' I:Jjcida A wente pode ser perwrbada mesmo que no,sso fazem movimentos sutis, que às vezes são calmos e às
s
vezes leves e rápidos. Esse é o tombate de pontas, o ~
ee
~ tamente. Por causa disso,
ara sustentá-lo dire-
c . · i o r f ncial
combate implícito no qual os praticantes de Jundo se
~ngajam para assumir o controle da linha central,..Qll
r
~L) f
fundamenta l no combate de budo~ E por meio de seme -U,pha vital, de seu oponente, a fim de lhe impor suí1

60 ~~o + M e~~ ~tG50. 1XJ {f~ 61


então começar, através da técnica, a tomar-se insepará- tipo de intuição; elas são pessoais e não serão claras para
vel da busca pelo significado da vida. Enfatizo "através todos, porque não são baseadas no tipo usual de argu-
da técnica", porque o significado da vida pode ser asso- mentação, mas ganham significado para uma pessoa que
ciado com qualquer outra atividade. N.Q buÊ;J. a grocura esteja praticando budo.

t~
Jlit apalidade da técnica está diretamente relacionad~
com a Qijsca oelo significado da vida. No momento, estou dingindo o treinamento de inverno.
Assim, e não constitui um gênero particular hangeiho. das 5h30 às 7h A luz das estrelas é aquela do
entre as disciplinas de combate, mas sim a qJapeira pela h1 , o movimento das nuvens é aquele do hi e o sol emana
qual alguém ie engajj nl!ma disdplina da arte ~m­ o hi que queima, que é o lli do tomar a miciattva, sen. O
~~
ba!UIO mosuw ;ficácia. hi do cosmos, mais distante que o sol, é o ki da iniciativa
Portanto, é apropriado gensar na buda em dois sen-
~ como um tipo de disciplina e corno .!!ma rela_ção.
antecipada, sen-sen. Continuo em meu treino , usando
4
meu precioso tempo para fortalecer-me através do hi
AL

-
subjetiva. Por exemplo, logo que uma pessoa começa a enquantoj.fonalsms Oaljmemo, a 6m de chegar mais
praticar hendo, aihido ou harate, entrando em uma asso- perto da verdade universaL Faco çsforcos_para atingir o
ciação ou dojo, está graticando uma das disciplinas dg estágio de ir além da vida e da mone, a fim de deixar que

I
- - - Mas o conteúdo de sua prática permanecerá mera- meu ser se funda com o universo. Esse é o mgmemo
mente aquele de um esporte de combate de origem 9Ja!S gui!j para me ]8'W~ear siletlc'96'ment1 com
'k oriental enquanto ela não descogrir1 em seu modo de o universo. Esse é o retorno para SI mesmo e o retoWQ
=
f't wJicá-la. um sentido subjetivo de treinar-se e cultivar a
6
&ara o Y)tip g;ipp a mjm mesmo segurando a espada ~*-+
~\r fusão entre o ~­
si mesma, ou enquanto não houver a ......w: <ie bamhp shin~camo a espada com a qualtçnto sog- L.
~ cesso de mell}gria de s~a técnic,a, com o p&ocesso d~
~ ,. melhoria de seu sçr como um todo
\..-0\'( • Acho interessante citar uma passagem de uma carta Para mim, esse texto é perfeitamente claro e o per-
que recebi no começo de 1999 de um mestre de hendo, cebo através das sensações concretas da experiência viva
um homem de 77 anos de idade, a quem respeito muito do budo que ele me evoca. Lendo o texto, um japonês,
e considero um dos meus professores no caminho do mesmo que não pratique budo, preenche e completa o
budo. Quero apresentar essa passagem porque ela ilustra que é deixado vago- pois o espaço ambí~o dessas sen:
perfeitamente esse processo e as dificuldades que ele tenças está preenchido pelo conteúdo da noção de ki,
.r
envolve. As palavras e frases dessa passagem evocam um uma nalavra que evQ.ca sensações físicas. Traduzidas

<
I
_, "'{~GtJ\l ~ - r
42 1~~~: p~~jo l4~U~N ~ ~ fvf~b DA ~~ ~ eotJl-ftGi ~ (1'To -n
~9...
~
para o inglês, cada palavra assume uma conotação pre-
cisa e esse modo de falar não mais deixa espaços vazios.
A expressão é muito pessoal e é entendida desse modo
em japonês. Tpduzjda para o jngl r~ ,_assume um sentido
universal que não tem em sua língua original Ki na cultura japonesa
O esforço para cultivar a si mesm~ , no sentido que
mencionei, não aparece aqui de um modo abstrato, mas
de urna maneira que é baseada em seosacões corporais
concretas. Essa é uma sensação corporal que qualquer ser
humano pode entender, independentemente de sua ori-
gem cultural. Em outras palavras, essa pacão comoral
é a chavs que permite a qualquer pessoa mtJriqr hwig
~

N
a língua japonesa, um grande número de ex-
~f ptotal~qmolçtamente, ultrapassando obstáculos culturais.
Em que consiste essa sensação corporal? Em japo-
.pressões contêm a palavra "hi", e outras a pres-
supõem. Tive que lidar com essa situação
nês , ela é expressada pela ideia de hi. Vimos agora
quando estava traduzindo o texto de Escritos sobre os
mesmo um exemplo disso.
Cinco Elementos, de Miyamoto Musashi, para meu livro
~orno uma pessoa pode estar certa de que sua R!_á-
Miyamoto Musas hi.*
-
tica de artes marejais está se tomando budp e de que não
está criando uma ilusão? Há um elemento que serve
Nesse texto, Musashi usa o palavra k~koro um
grande número de vezes. Essa palavra é geralmente tra-
para in~icar isso, que faz do budo buda e que ao mesmo duzida como "mente", mas não pode ser traduzida por
tempo o ~oia em seu progressg. Esse é o hi. Nesse sen- apenas uma palavra. Dependendo do contexto, kohoro

~ tido , hi é a c~av' para a lj?rática dp buda. Estamos tra-



tando aqui de urna certeza interior, que é extremamente
pode ser traduzida como "mente, sentimento, sensação,
sentido, pensamento, ideia, significado, coração, centro,
difícil de explicar em palavras, mas que é çgmunjcável núcleo", e assim por diante.
~amente. É por isso que, depois de ter esclarecido a Contudo, mesmo depois de usar essas várias palavras
noção japonesa de hi, examinaremos como isso é prati- para traduzir hohoro, ainda permanece um sentimento de
cado em relação a situações diferentes, para captar ple- incompletude na tradução. Gastei muito tempo tentando
namente essa noção única gue simultaneamente envolve
o ooo e_a wegty, * Kenjt Tokitsu, Miyamoto Musasht (Editions Déslris, 1998).

44 45
descobrir o porquê disso antes de entender que Musashi, Sekishusai, encontramos a seguinte sentença: "Se acon-
~o usar as palavras, estava assumindo como base uma tecer de eu trair o que acabei de escrever, deverei ser
sensação com a gual os japoneses daquele período, espe- punido por Marishiten, Hachiman Daibosatsu, Tenmam
cialmente os praticantes das artes marciais, estavam farni- Tenjin, Kasuga Daimyojin e Atagoyama".
~ e que compartilhavam. Ele estava, de certo Citar o nome de diversos deuses desse modo era
modo, investindo esse meio de expressão com toda a sua um testemunho do mais sério dos compromissos. Escre-
real experiência vivida. (Estou usando a palavra "meio" ver o nome de um deus indicava um compromisso ao
aqui no sentido de um meio ou aglutinante de pigmentos, nível de vida e morte. Os japoneses do período estavam
por exemplo, óleo.) É por isso que, enquanto não captar- imbuídos de um senso da presença do çfurioo na naty_-
mos a natureza desse meio, as expressões de Musashi t:ezâ. Essa atmosfera despertava uma CQP5ciência da sen-
permanecerão incompletas - de certo modo, como se sasão do hi. Há não muito tempo atrás, o povo japonês
fossem vistas com apenas um olho. Permanecerão ambí- ainda vivia com um sentimento da importância daquilo
guas. Se estamos conscientes da presença implícita desse que não é visível. Em minhas memórias de infância no
meio, suas expressões tomam-se substanciais. O que é o Japão, esse tipo de sensação está presente.
~ Aqui, de novo, estamos falando sobre hi.
....
De fato , uma vez que li seu texto e o completei
Através da sensação de ill· os japoneses parecem
haver captada o sentido dos fenômenos naturais sem teo-
tendo em mente o sentimento subjacente de hi, seu sig- !!,r e2Qllicá-los. Eles não excluem as sensações vagas do
nificado tomou-se muito mais claro. Mas como fazemos domínio da fala. Penso que essa é uma das razões pelas
.eara que esse elemento não faladQ_passe para a lmgua quais encontramos um grande número de palavras ono-
ingl~? Esse é,9.Jlroblema fundamenw na traduçãp de matopaicas na língua japonesa. Quando precisam verba-
textos japoneses, particularmente os mais antigos. ~ o elemento intermediante, o meio que corresponde
Também é necessário entender que o significado de a certas ..âensacões ou sentimentos vagos, os japoneses
escrever era diferente para os japoneses da cpoca de YSflm a palavra "hi". Como resultadOJ sensação de hi
Musashi. Por exemplo, no certificado escrito de trans- Qirece estar situada num nível majs profundo e arcaico
missão muitas vezes encontramos as palavras "Sle acon- que as sensações que se tomam objeto de conhecimento.
tecer de eu trair essa confiança, deverei ser punido por Urna das peculiaridades da cultura e da sociedade
tais e tais deuses", usadas tanto pelo mc'itrc que está japonesas me parece ser o fato de que os japoneses conti-
concedendo o certificado como pelo disctpulo quc o está nuaram a dar um lugar importante a esse tipo de percep-
recebendo. Desse modo, no final do certificado tk trans- ção mesmo quando desenvolveram uma lógica moderna.
missão escrito por Kamiizumi Nobutsun,t pa1a Yagyu

46 47
e
A concepção japonesa de ki

credito que a sensacão coroor~ ge ki~

A c_omurnente presente na experiência b nma n ~ .


mas que a forma tornada pela interpretaç!o
dessa sensação varia de cnltma para cultura. Por exem-
plo, o aspecto lógico é muito mais desenvolvido nas
línguas ocidentais do que na língua japonesa. Nas lín-
guas ocidentais não existe - e essa é uma das maiores
dificuldades para a tradução- urna palavra equivalente
~Em japon~. esse termo abrange várias sensações.!
impressões que são misteriosas. vagas e intangíveis, .fill.e
tocam algo na parte mais profunda de nosso S!r, algo
que está conectado a um nível de compreensão que é
provavelmente arcaico ou reprimido.
Esse corpo de impressões difíceis de definir está
presente na experiência da vida do dia a dia, na litera-
tura e nas artes do Japão. Quando é necessário nomeá-
-lo, as pessoas chamam-no de ki.

49
A exclusão dessas sensações e impressões da termi- o processo cartesiano. Ao estar aten!g à sensacão de ltk,
nologia explícita das línguas ocidentais me parece um a pessga ãe qissolve em seu ambiente pois diminui ~
corolário do caráter lógico dessas línguas. Pensamento sensação de ter a própria existência como centro. ~ ;j/
racional provavelmente desenvolvido através da repres- atitu9& está na raiz das ~iferentes técnicai de fortaleci- 1j F
são dessa sensibilidade. o esgam é permeado por dife- mento do hi.
rentes energia 'i. e sabemos que esse espaço existe sem
sermos capazes de definir seu conteúdo. .._ Todo dia usa-
mos aparelhos de televisão, rádios e telefones portáteis
que utilizam ondas eletromagnéticas que não são nem
visíveis nem tangíveis sem equipamento especial. Foi só são separadas de suas origens místicas e aplicadas em
em tempos relaóvamente recentes que a ciência foi capaz conjunto com meios médicos para curar através da esó-
de demonstrar a existência dessas ondas. Contudo, mulação doJl. Em japonês~ não é definido pelo escla-
quando se trata de h1_ não é raro que as pessoas que se recimento de suas características; 9 termo é usado mais
consideram racionais rejeitem a ideia a pdod, porque o quando se â'Wi' a presen&i ds algo que não pode.. ~r
!li não é tangível e, sem dúvida mais profundamente, claramente apreendido. A língua japonesa deixa um
porque está conectado à experiência snhjeti~. O fato é espaço indefinid~ em seu modo de expressão. Parece-me

e-x -
1f7<. que hi não é um conceito abstrato; é um concejra que que é;smente por meio do co~?O que podemos explow
~k
-
~rge dg quyjr ª5 sensacõe.s comorajs por meio das qu@i esse espaco; ao esclarecer o papel desse espaço pode-
se percebe o ambieng; e também, ao mesmo tempo. a '
mos avançar na área da técnica física.
maneira mma,a pessoa está sitJ!ada gele. O mesmo ideograma ê pronunciado .. qi em chinês e
Kj é sentido por meio do CO!JlO e é dada a ele uma hi em japonês. Mesmo que o significado seja similar em
representação mais ou menos definida, dependendo da sua maior parte, há certas diferenças entre a ideia japo-
~ cultura em questão.~ sensação de hi é intensifica@ nesa de hi e a id~chinesa de qi. Em ambos os países, ~x-)<
l,,'f guando a autoconsciência especulativa é empurrada existiram disciplinas destinadas a desenvolver a capaci- -r
~ra um segundo planQ_; Isso acontece em graus varia- dade para QÍ gu hi, por longo tempo. Elas foram propa-
dos , dependendo de quanto as pessoas gueiram ;ban- gadas desde os anos 1970 sob o nome d~ em
*}}1-,.donar seu egq em favor <jg s~ cer;s. Se o ego é çhinês, e@ITWJ em japonês. No presente trabalho, vou
r
LJ reforçado, a sensação de hi diminui. De um certo modo, me limitar a tentar esclarecer o conceito japonês de hi
o estado da mente de alta consciência do hi vai contra tal como se aplica ao domínio das artes marciais.

50
I (I L ~&
Ql ; KÚ(o \ 51
De acordo com o pensamento japonês, ~ é uma enti- diano de libido toca em algo profundo da natureza
dade que toma possível a vida e a existência das coisas. humana e acredito que isso coincide parcialmente com
no universo. É portanto mais do que "energia vital", a ideia de hi.
como é geralmente traduzida. Ki ~xiste nas coisas que Na perspectiva que se desenvolveu no Japão, ~
!!,O.S. parecem deçprovidas de vida otgânica , como as estudar ou desegxo~çr Ai
na prática do buda, ou hiho, "'f-
pedras e também em fenômenos naturais como o vento consiste em tornar-se sensível ao ki no próprio corno
ou a chuva. Ki também reside nas montanhas no mar etc. como um todo, então ao fenômeno externo do hi e final-
Visto dessa maneira, ki parece como urna extensão do mente ao hi do universo. Isso implica ser peoneável ap
primitivo pensamento animista. Contudo, hoje, quando fti._do universo e sentir que o corpo é parte do universE_
a civilização é confrontada com um conjunto diferente preenchido de ki.
de problemas, incluindo a destruição do ambiente natu- Quando a sensação de ki está suficientemente
ral, essa linha de pensamento, rejeitado por um tempo desenvolvida, o hi do corpo está em harmonia com o hi
como arcaico, está agora levantando novas questões. do universo. Os xários mtrgdgs de hjhc; são métod~ por
Atualmente existem diversas tendências que tentam
recuperar qualidades do ser humano que parecem ter
meio dos quais as gessoas procuram tornar-se permcá.-
veis à realidade do ki universal. O último estágio da -r:
sido perdidas no curso do "progresso". Não há dúvida grática de kjha é fyçrn sl!utm_, no qual o corpo torna-se
"*'~
~
de que a acuidade de nossos sentidos de audição, olfato, permeável ao hino grau mais alto possível. Nesse ponto,
tato e visão, que desempenharam papel vital no passado se tem a maestria sobre o hi sem a mais leve intençãq.
distante, ficou entorpecida quando nossos sentidos Há uma comunicação livre com o hi universal; sempre-
foram suplantados por dispositivos materiais. Isso
levantou questões sobre outras capacidades perceptivas
cisar de exercícios, viye-se com hi. Esse é o estágio ma_!;s
alto. ojdeal 12.ersegt!ido por agueles_gue praticam llikQ.
xJJ
que os humanos modernos podem ter perdido e provo- A ideia de hi universal pode se tornar compatível
cou o interesse por diferentes métodos de se conseguir com o pensamento ocidental somente com dificuldade,
bem-estar. Uma pesquisa feita nessa área trouxe à luz mas devo sublinhar que implícita ou explicitamente ela
capacidades perceptivas corporais esquecidas e levou à é essencial à concepção japonesa de hi.
descoberta de um novo nível de percepção, tornado Sem atingir o ponto de furen shuten, quando desen-
acessível pelos avanços científicos. Foram feitas muitas volvemos suficientemente nossa sensibilidade ao hi, n.Qâ
tentativas de encontrar explicações científicas para os .J.Qmamos conscientes de que ngs~e mental é
mistérios escondidos no ser humano . O conceito freu- !!-!.>~!!.Le~~~r.w..cil.:d~o~k!:i. Nesse nível ~odemos sentir

52 53
uma correlaçã2 entre as palavra? e R:iti• em conexão com Assim, o sistema de palavq5 com o qual estamos
as palavras, ki está sujeito a pressões mais ou menos tão profundamente impregnados é também um dos obs-
pesadas. O fato de nomear coisas, de definir precisa- _táculos encontrados na prática do hi.
mente o sentido das coisas ou o sentido de nossas ações, Contudo, não estamos sugerindo de modo algum
inevitavelmente causa uma modulação de nosso ki, por- que se tente recuperar o estado de um ser humano pri-
que o contorno do ki tal como definido pelas palavras, mitivo. Estamos falando sobre um esforço de recuperar
quando o significado é estreitamente circunscrito, eli- ou restabelecer as qualidades, sensibilidades ou as facul-
mina qualquer significado latente. Esclarecer e definir dades que perdemos no curso do desenvolvimento de
!!JlRlica eliminar ou suprimir os contornos vagos e nossa civilização. De certo modo, kiko objeliva dotar o :;k--_.f
i.!!!EJecisos do sentido laten!S. Esse meio de definir em ser civilizado com as qualidades primitivas gue perd_!- -'f-
_Q!Iavras implica uma redução do hi, que é sempre glo- ~ Assim, não é uma questão de tentar voltar para
bal, holístico . Desse modo , nomear um sentimento de trás. Pelo contrário, estamos falando sobre um esfor.~
amor reprime o ódio que está contido nele. O budismo de parte de seres civilizados para ir além das barreiras
nos ensina a confrontar esse conglomerado de senti- com as quais foram confrontado~ e sobre fazer isso pela
mentos sem basear distinções em oposições circunscri-
tas, como no estilo ocidental. Assim, "amor" pode ser -
mobilizacão de seus próprios IlltiOs para restabelecer
faculdade~ue ainda e~tão potencialmente present~.
traduzido como ai e "ódio" como nikushimi(zo), mas Aparecem as palavras, o ki é modulado de acordo
uma máxima de origem budista afirma que os dois equi- com o sentido delas e é reduzido no processo. Como 1
valem à mesma coisa. ~demos separar-nos de palavras enquanto vivemos
~,f::
Se nos constituímos como seres sociais por meio de
palavras, ao mesmo tempo ~efinição de coisas cp!P as
palavras implicam elimina uma parte da realidade de
--
com linguagem? Essa é uma das chaves para os mélQd.os
de kiho. Em hiho, usamos imagçns. sons e movimentos
~vez de palavras para aumentar a profundidade e.ara
*~

~sa experiência viu-ida e, corno resultado, deixa de além das palavras, de forma a conduzir nosso ser ao
.f9ra uma pane ~ignit:icativa clo..lzi. Desse modo, não é mundo do hi.
por acaso que os taoistas assim como os budistas bus-
cam um estado mental à parte do sistema de palavras.
~s procmam apreender a essência das coisas sem deli-

t m!_tá-las e deformá-las por meio das palay~ . Esse é um


estado de vazio ou não ensamentg.
0
~

54 55
~
O conteúdo do combate
no kendo

ara superar os obstáculos culturais e obter a chave

P ~ara o budo, é necessário cultivar nossa sensibUi- ~>Vf,


dade para a sensacãg de hi e permitir que sejamos f< p
guiados em amplitude e profundidade por essa sensação
1

através das técnicas físicas de combate. O aprendizado


no hendo é exemplar para uma exploração do hj por F
meio de técnicas ~e treinamento:~:.,;:·
Nolhendo jnêialmentêlo es (f J:Jde o que
'*
JorJ
é hi de um modo simples, pela expressão N hen ta i ichL *'~
que designa a integração simultânea do ]ll, da ~ e
do~ na técnica de golpear. Com o{Rassar dos anos/ ~~
o praticante de kendo irá aprender quão importante é e-
tomar a o[spsiva durante o combate. Um dos métodos
C I ~k
básicos para chegar a isso é seme. Essa noção complexa
merece uma explicação, porque na prática o nivel do
i'; F
raticante se reflete diretamente na aualidade da sem
=
o praticante.

,
" ~~~V\) )_~<h ~W~j 57
s~tMc.
~ ~eme]signi6ca literalmente "9fensf , no sentido de ~ exru=essa e~ J;A9\'ÍRl~RtQii,_mas estes objerjvam pri- ~
e uma ofensa no nível menta! e não no sentido de um
i
meiramente atingir a mente de seu apanen~. f/6---
gesto ofensivo físico . Contudo, ~ consiste num Durante.Q amçpdizada de lugf% a pessoa começa ~
m.ovimento de alaqys_ ou na simulação dele. Aqui apa- ~aproximar de r"%
por meio de atitudes ou movi- !f:'
JtC.e. um tipo de pposicãgsnrre o mrgq e :â mepte que mentos que comunicam sua combatividade a seu 0120-
i
é apreciavelmente diferente da clássica oposição oci-
, t
~.~envolve myjto mais do que as fintas que sª-º 'êf:k.
,Yf
dental entre eles. Chamarei isso de [ualismo japonês] usadas na l~ . A noção de seme é muito mais profunda [, L_
. ll
~ mcnrs guja o cmp2; mas,_num certo momento , a que aquela de finta. Para uma finta ser bem-sucedtda,
;-
~tua~ão RPde ser reye~a. Em termos mais gerais, seu oponente tem de confundi-Ta com um movime.!J.to
~ ~essoa _pode alcançar a ~e através do corpo e a de ataque real. A finta é uma . tática para .fizer g opa-
tó,.( mente é capaz de ser fortal~da pela prática física . nente acreditar que o falso é reall)bjetiva provocar uma
\ Além disso, se o corno. guiado pela mente, consegue Jeacão adequadª. No Ocidente, as pessoas falam de uma
.re_alizar um determinada avanço si~ificativa,_mloca-se finta bem-sucedida ou malsucedida e ao fazer isso des-
P,O-{]JeSmQJ?lapg gpe a mept;- a tal ponto que se pode crevem somente o movimento , porque a noção de seme
falar de uma (usão de como e mente. Nessa base seu não existe. Se a finta é bem-sucedida, é porque ela con.s- ~
~ corpo pode cancpJistar a mente de outra pesso.ê. Pra-
a
útuiu_o mJP se chama ieme em japonê9 O nonln ~
é, se a ,.. ~
fj" ticantes das artes marciais que ultrapassaram certos finta teve sucesso, foi porque o gesto, por mínimo que f7j
limites, ou monges que praticaram certos Qercício3 tenha sido, s_oosegpiu pernuhar a mente do oponen;.e.
~ físicos ascéticos, conseguem essa. fus~o e ~­ Por isso é que ~ria impreciso definir o processo de
.T.~ dos foram elahorados 12ara conseguir i~. Na crença aprender seme por mejo da descrição de movimentos. O
~ -- L.
I japonesa tradicional , é normal considerar que os gran- gesto de seme é o que comunica algo essencial.
des mestres são capazes de exercer poder sobre espíri- (Eum
nívef mais avancadgJ tentamos 2rovoTli
tos ou demônios que uma pessoa comum seria incapaz Jim Q?Qyimento na mente dq oponente ~em produzir *
até de enfrentar. p.~ sinal~xterior. Nesse estágio, tomamos a ofen- J;l~
~sa concepç_ão tem um gdefini~ nas art~ iva rinci almen través do hi. Isso é chamado de f;
marciais japonesas. Traz à tona a ideia de que, a fim de e atrav · ~~.f
~
I? i em ·
.f]a emanação do próprio hi sem nenhum gesto visí_y_el F(~
6_ dife.rg_nça entre ~me e kbwe reside no lugar ocupado

-
pelo movimento ou gesto. O que os dois têm em comum

58 13[~q{)S ~ci1)W~ ~\~e\1\f 59


r

s~~ ~ J.-
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fY 83ilt E >
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é que ambos procuram 6iUsu,uma mudanca na mente
/..J/JL que J20demos explorar o dpmwipJUepral do buda. Essa ...k~.)t\­
~n ~do oponente através do ki - a necessidade conectar
c. .ISSO a um gesto, a um movimento,
. . d:ou menor
.e maiOr noção foi desenvolvida na prática de kendo. Mas para as
outras artes marciais, nas quais há golpes e pancadas,
dependendo do nível. existe a possibilidade de integrar seme a fim de ultrapas-
"Cau3ar pma rpudancal!a mente do oponente" sig- sar o simples nível de lutar para vencer. É por essa razão

{ nifica que esse ato mgvoca no oponente o moyimenjQ


de toda uma acumulação de experiência de combate 1
que farei uma ruJálise de combate em hendo.
Kendo é uma disciplina moderna das artes marciais,
atualizando memórias corporais sobre as quais a ants- desenvolvida a partir da arte da espada dos guerreiros
cipação é baseaQ.a. Desse modo, quem não tem expe- japoneses. É praticada com espadas feitas de bambu
~ !iência de combate não rea,üá de um modo lécnj co em laminado (shinai) , capacete e armadura protetora. Essa
L resposta a seme ou kizeme . . forma foi elaborada no início do século XIX e evoluiu
Olhado de outro modo , o que a pessoa está fazendo juntamente com a modernização do Japão. Após a
é jogar um jogo sutil inerente ao combats, nada mais. O Segunda Guerra Mundial, passou por uma reforma que
que existe nessa tática que poderia torná-la um ele- lhe deu a presente forma. Como a esgrima ocidental, é
mento para o g:ltivo e o treino do ser humano por uma forma de combate com regras precisas na qual dois
inteiro? O gue torna possível que alguém influencie o adversários se enfrentam. Golpes estão limitados à
oponente não é um movimemg, falso ou real ; é o fato cabeça, pulsos e tronco, e estocadas com a ponta limi-

"I
~ de gue §zoloca o pesg Àª existência pg arp. Somente
L Jí ~endo isso é que o ato ganha ya)or no momento d.Q
I combateJiemdganha significado a9 J&Qsrjr g peso d
tadas à garganta e ao peito. Almofadas protetoras tor-
nam possível evitar ferimentos , mas os golpes podem
ser sentidos e são dolorosos até certo ponto - o sufi-
~ um s~ E dessa maneira que podemos tentar não ser ciente para criar apreensão sobre ser atacado.
'1 F perturbados pela seme do adversário. 'P geso de um Durante uma luta de kendo, se concentramos a
ser" significa aguikorpo e mrnW _tJossOfiifPO podpçr atenção no modo como os combatentes cruzam seus
vJ.t/. wturbaJ!g. mesmo que pensemos que a m~te.....es~ shinai, é possível ver que quando as pontas se cruzam,
1[.LV"f' I:Jjcida A wente pode ser perwrbada mesmo que no,sso fazem movimentos sutis, que às vezes são calmos e às
s
vezes leves e rápidos. Esse é o tombate de pontas, o ~
ee
~ tamente. Por causa disso,
ara sustentá-lo dire-
c . · i o r f ncial
combate implícito no qual os praticantes de Jundo se
~ngajam para assumir o controle da linha central,..Qll
r
~L) f
fundamenta l no combate de budo~ E por meio de seme -U,pha vital, de seu oponente, a fim de lhe impor suí1

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