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Quem é Marcola, o líder do PCC

Como Marcos Willians Herbas Camacho, o órfão de 9 anos que cheirava cola
na Praça da Sé, se tornou o líder da maior organização criminosa do Brasil.

Por Ricardo Lacerda


13 fev 2019, 17h40 - Publicado em 20 jun 2017, 16h2

(Zé Otávio/Superinteressante)

“Autodeterminado, lúcido e assertivo”. Foram esses os adjetivos usados em


2006 pelo psicólogo Augusto Sá, da Secretaria de Administração Penitenciária
(SAP) de São Paulo, para resumir a personalidade de Marcos Willians Herbas
Camacho, o “Marcola”. Frente a frente com o número 1 do PCC, Augusto buscava
negociar o fim da onda de terror que afligia a capital paulista. Ao sair do encontro,
ele tinha uma certeza e uma ressalva. A certeza: Marcola era um homem “de
firmeza, ousadia e coragem, que teria uma ascensão profissional muito grande se
tivesse oportunidade”. A ressalva: isso não era, de maneira alguma, um elogio.
Nos anos que sucederam os ataques de 2006, Marcola consolidou seu leque de
atributos. Foi com ele no comando que o PCC extinguiu de vez o uso de crack nos
presídios dominados pela facção e deu um basta nos estupros entre detentos. Em
compensação, o assassinato de desafetos dentro e fora das cadeias virou rotina.
Entre os alvos mais marcantes estiveram o juiz-corregedor Antônio José Machado
Dias, executado com oito tiros na cabeça em uma rua de Presidente Prudente (SP).

Mais organizado e temido, o PCC dominou de vez o sistema prisional de São Paulo
– o maior do Brasil, com 231 mil detentos. Focado no tráfico de drogas, o Partido
do Crime estendeu suas operações a novos lugares do país e se internacionalizou,
convertendo-se no maior grupo criminoso do Brasil. Apesar de estar no topo do
organograma do PCC, Marcola sempre negou a posição de líder máximo.
Gosto apurado
O pequeno Marcos estava predestinado a uma vida no crime. Órfão aos 9 anos, ele
perambulava pelas ruas de São Paulo batendo carteiras e roubando toca-fitas na
região do Glicério, Zona Central. O apelido de Marcola vem do tempo em que
cheirava cola na Praça da Sé. Teve diversas idas e vindas da Febem até que, aos
18 anos, acabou preso por roubo a banco. Foi parar no Carandiru, mas a
passagem por outro presídio seria crucial para sua carreira. Em 1993, Marcola
cumpria pena no anexo da Casa de Custódia de Taubaté, o Piranhão, quando o
PCC estava sendo criado. Não deu outra: ao lado de Sombra, ele integrou o grupo
dos primeiros bandidos batizados pelo Partido do Crime.

De volta ao Carandiru, seu status começou a mudar. Marcola conseguiu fugir do


maior presídio da América Latina em mais de uma oportunidade. Fora das grades,
não perdia tempo em capitanear assaltos a bancos e a empresas de transporte de
valores. Em um deles, sua quadrilha levou R$ 10 milhões. Em outro, R$ 5 milhões.
Mas a vida de foragido não durou muito. Embora vivesse no Paraguai, Marcola não
resistia à tentação de visitar o Brasil. Em 1999, foi capturado por policiais que
acharam um tanto suspeito aquele homem que dirigia um Dodge Stratus (na época,
um carrão importado) na Marginal Tietê. Agora, Marcola também era conhecido
como Playboy – porque gostava de se vestir bem, usar roupas de marca e investir
na vaidade. É assim até hoje: em 2016, a Justiça negou um pedido de seus
advogados para fazer aplicações de botox numa clínica fora da cadeia. Com fama
de galanteador, Marcola costumava causar certo frisson entre as namoradas de
outros apenados. Aos cuidados com a aparência soma-se a predileção pela
literatura, que dá ao líder do PCC um nível intelectual acima da média.

Fã de Nietzsche
Condenado a 232 anos e 11 meses por formação de quadrilha, roubo, tráfico de
drogas e homicídio, Marcola rechaça a posição de chefe do PCC. Na CPI do
Tráfico de Armas, em 2006, declarou: “Não existe um ditador. Embora a imprensa
fale, romanticamente, que existe um cara, o líder do crime. Existem pessoas
esclarecidas dentro da prisão, que com isso angariam a confiança de outros
presos”.

Perspicaz, ele sabe o que pode acontecer quando o poder sobe à cabeça. Seus
antecessores foram depostos da facção justamente por conta dos excessos de uma
hierarquia abusiva. E Marcola sempre teve a sabedoria de se colocar entre os
insatisfeitos – especialmente depois da morte de sua ex-mulher, Ana Olivatto.
Durante a CPI, Marcola se manteve sereno e, muitas vezes, foi irônico. Em certo
momento, disse que a sua relação com o PCC era apenas ideológica, sem
envolvimento em qualquer tipo de crime. Noutro diálogo, sorriu quando um
deputado perguntou se o seu livro predileto era A Arte da Guerra, de Sun Tzu –
conforme uma reportagem da época. “Nem gosto muito. Meu preferido é Assim
Falou Zaratustra, do Nietzsche.”

Em fevereiro de 2017, a Justiça de São Paulo determinou que Marcola e outros 10


membros do PCC permaneçam um ano no regime disciplinar diferenciado (RDD).
Na penitenciária de segurança máxima de Presidente Bernardes, ele vive numa
cela individual 22 horas por dia.

Atualização: em 13/fevereiro/2019, o Ministério da Justiça ordenou que Marcola


seja transferido para o presídio federal de Porto Velho, em Rondônia. Ele deverá
ficar lá por no máximo seis meses, e então passar a outra cadeia federal – como a
de Catanduvas (PR) ou a de Campo Grande (MS).

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