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O professor é um

elemento-chave
Isabel Leite
7/12/2017, 22:25 200 2

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Os países que consistentemente têm


melhores desempenhos ou que mais têm
progredido são os que formam os melhores
professores, promovem o seu
desenvolvimento profissional e incentivam a
colaboração.

Nas últimas quatro décadas Portugal fez um


progresso substantivo na educação. Temos hoje
uma população mais escolarizada. Temos
menos jovens a abandonar precocemente a
escola, mais a concluir o ensino secundário e
um desempenho cada vez melhor dos alunos
portugueses nas sucessivas edições de estudos
de avaliação internacional (e.g., TIMMS, PISA).
Mas é possível progredir mais. Apesar da
evolução, a escolaridade média da nossa
população ainda é baixa e o insucesso, expresso
nas taxas de retenção e na percentagem de
alunos com aptidões insuficientes, merece
particular atenção.

Para sermos capazes de enfrentar os desafios


de uma sociedade global, cada vez mais
competitiva, onde o desenvolvimento
económico e o bem-estar social estão
fortemente dependentes do conhecimento, é
imperativo continuar a apostar na preparação
das gerações futuras e universalizar a qualidade
da educação. Ciente da necessidade de um
melhor sistema educativo, a Fundação Belmiro
de Azevedo apresentou em abril de 2016
um think tank para a Educação, o EDULOG,
que tem por missão ajudar a identificar os
problemas reais da Educação no nosso país;
promover o seu estudo, contribuindo com
dados objetivos e cientificamente
fundamentados; propor soluções e debatê-las,
envolvendo a sociedade para que o consenso e
estabilidade emerjam.

O primeiro ano de actividade do EDULOG


arrancou com uma conferência onde dois
economistas, John Friedman e Pedro Carneiro,
apresentaram dados que uma vez mais
salientam a relação inequívoca entre o nível
educacional e o estatuto socio-económico da
população, o papel da educação no combate às
desigualdades sociais e mostram o retorno
económico do investimento público em
educação. Das comunicações e debate
sobressaíram dois elementos comuns.
Primeiro, os estudantes que aprendem com os
melhores educadores/professores têm uma
melhor progressão escolar, maior
probabilidade de ingressar no ensino superior
e, no futuro, tendem a auferir melhores salários
e a viver em contextos mais favoráveis.
Segundo, os professores diferem
significativamente entre si na aprendizagem e
resultados escolares que são capazes de
promover. A mensagem foi clara, o Professor é
um elemento-chave se se pretende melhorar o
sistema educativo, combater desigualdades e
promover oportunidades.
Parte destes dados não nos deve surpreender.
Empiricamente – enquanto professores,
alunos, ou encarregados de educação – temos
certamente a perceção de que o sucesso na
aprendizagem está intrinsecamente
relacionado com a qualidade do ensino e da
interação que o professor é capaz de
estabelecer com os seus alunos. Os resultados
apresentados na conferência de lançamento do
EDULOG e os estudos desenvolvidos por
outros investigadores confirmam esta
impressão.

O estudo e debate acerca do impacto do


professor na aprendizagem dos alunos não é
propriamente um tópico novo. Na área da
Economia foi investigado nos anos 70 por
Hanushek (1971) e recentemente, após 2005,
readquiriu um novo fôlego. A existência de
grandes bases de dados longitudinais, onde a
caracterização socio-demográfica dos alunos e
os seus resultados escolares estão associados
aos dos professores, permitiu a vários cientistas
explorar o efeito do professor no
desenvolvimento e resultados dos alunos.

No domínio das Ciências da Educação, o


extenso trabalho de análise de centenas de
estudos realizado por John Hattie, da
Universidade de Melbourne, é esclarecedor. O
professor é quem mais faz a diferença. A
interação que o professor estabelece com os
seus alunos e aquilo que faz na sala de aula
(e.g., o propósito e clareza com que ensina, a
forma como monitoriza o ritmo de
aprendizagem, o feedback que dá aos alunos)
são cruciais para o sucesso escolar. Por cá, o
recente projeto AQueduto revelou o contributo
determinante que as variáveis relacionadas
com os professores (relacionamento, motivação
e formação pedagógica) tiveram para a
progressiva e sustentada melhoria dos
resultados a Matemática no PISA entre 2003-
2012.

Um outro dado relevante, os países que


consistentemente têm melhores desempenhos
ou que mais têm progredido são os que atraem
e formam os melhores professores, promovem
o seu desenvolvimento profissional e
incentivam a colaboração que assegura a
transmissão de conhecimento entre professores
mais e menos experientes. Não admira, pois,
que isso se reverta num ensino de elevada
qualidade e no reconhecimento e valorização
social da profissão.

A magnitude do efeito do professor, a


variabilidade entre professores e o seu
potencial para melhorar a qualidade da
educação no nosso país despertou a atenção do
EDULOG que assim decidiu abrir candidaturas
para o estabelecimento de parcerias com vista
ao estudo do tema. O concurso desafiava à
investigação centrada na pessoa e papel do
professor como elemento-chave à
aprendizagem do aluno. Foi selecionado o
projeto “O Impacto do Professor nas
Aprendizagens do Aluno: Estimativas para
Portugal”, apresentado pela parceria entre a
Universidade Nova e o University College of
London. Nos próximos 3 anos a equipa de
investigadores propõe-se estimar o contributo
individual do professor, anonimizado, a partir
da análise dos dados nacionais que têm sido
recolhidos ao longo dos últimos anos pelo
Ministério da Educação, o que representa um
importante passo na investigação da Educação
no nosso país.

Os resultados deste estudo são um primeiro


passo que por certo abrirá caminho a novas
linhas de investigação. Qual a relação entre a
distribuição dos professores por escolas e
regiões e as diferenças que se encontram nos
resultados escolares? Existe convergência entre
a eficiência estimada e a perceção dos gestores
escolares, pares, encarregados de educação e
alunos? De que modo essa perceção influencia
as tomadas de decisão na gestão das escolas ou
o apoio dos encarregados de educação aos seus
educandos?

No conjunto espera-se que a resposta a estas


questões contribua para a definição de medidas
que permitam elevar a formação inicial e
contínua dos professores, preparar melhor a
transição da formação académica para a
atividade profissional, aperfeiçoar o
recrutamento e a gestão escolar e contribuir
para uma cada vez maior valorização do papel e
missão do professor. Numa altura em que se
perspetiva, por razões demográficas, a saída a
médio-prazo de uma considerável proporção
do atual corpo docente, pode ainda representar
um estímulo a práticas de partilha de
conhecimento e experiência entre aqueles que
constituem a chave para a universalidade da
qualidade na Educação: os Professores.

Prof. Auxiliar da Universidade de Évora,


Conselho Consultivo do EDULOG

‘Caderno de Apontamentos’ é uma


coluna que discute temas relacionados
com a Educação, através de um autor
convidado.

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