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20/03/2019 Aposentadoria dos militares: como ela é diferente da previdência do restante da população?

- 11/01/2019 - UOL Economia

Aposentadoria dos militares: como ela é diferente da


previdência do restante da população?

Letícia Mori
Da BBC News Brasil em São Paulo
11/01/2019 18h14

A equipe econômica do governo de Jair Bolsonaro (PSL) planeja enviar em


fevereiro uma proposta consolidada de reforma da Previdência ao
Congresso, segundo o novo ministro da Economia, Paulo Guedes.

Ao que tudo indica, no entanto, os militares devem ficar de fora da reforma --


ou ter regras diferentes. O novo comandante do Exército, general Edson Pujol,
por exemplo, disse que as Forças Armadas não devem ser incluídas na
reforma, e o novo dirigente da Marinha defendeu o sistema diferenciado de
aposentadoria militar.

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O ministro-chefe da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos


Cruz, também já defendeu essa posição publicamente.

Além do presidente --que é capitão reformado do Exército-- e do vice, o general


Hamilton Mourão, o alto escalão do governo Bolsonaro tem seis cargos
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ocupados por militares.

A reforma dos sistemas de aposentaria no Brasil é considerada um tema


essencial para o governo, sem a qual será difícil sanar as contas públicas. E a
inclusão ou não dos militares na mudança tem sido tema polêmico desde o
governo anterior, quando o presidente Michel Temer excluiu os militares de sua
proposta de reforma.

Mas afinal, quais diferenças entre a aposentadoria dos militares e dos civis?

Crescimento da dívida

Entre 2017 e 2018, o déficit de gastos com seguridade social dos militares fora
da ativa subiu mais que o do INSS e mais que o sistema de servidores públicos,
de acordo com dados oficiais.

O rombo com a aposentadoria dos militares foi de R$ 35,9 bilhões para R$


40,54 bilhões (até novembro de 2018), um aumento de 12,5%. O déficit para
2019 está projetado em R$ 43,3 bilhões, de acordo com dados da proposta
orçamentária para esse ano. Esse valor é 47,7% dos R$ 90 bilhões de déficit
previdenciário do setor público.

Enquanto isso, o déficit do INSS cresceu 7,4% entre 2017 e 2018, e o dos
funcionário públicos da União cresceu 5,22% no mesmo período.

O Ministério da Defesa afirma que os valores referentes aos militares inativos


não se tratam de "despesa previdenciária". Portanto, o gasto projetado de R$
43,3 bilhões não pode ser entendido como "déficit previdenciário".

A média de valores das aposentadorias e os tetos também são diferentes.

Militares reformados e da reserva ganham em média R$ 13,7 mil por mês.


Funcionários públicos da União ganham em média R$ 9.000 e quem se

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aposenta pelo INSS custa em média R$ 1.800 por mês para a Previdência --
com grandes discrepâncias entre quem recebe mais e quem recebe menos.

Na Previdência Social, para trabalhadores do setor privado, o teto atual da


aposentadoria é de R$ 5.645. Já um militar que vai para a reserva não possui
um limite máximo para os valores recebidos. Em tese, ele está sujeito ao teto
constitucional, equivalente ao salário de ministros do STF, reajustado
recentemente para R$ 39,3 mil.

Contribuição

Os militares brasileiros não estão vinculados à Previdência Social (o regime


RGPS --Regime Geral de Previdência Social--, administrado pelo INSS) nem ao
sistema previdenciário próprio dos funcionários públicos, o RPPS (Regime
Próprio de Previdência Social).

Eles têm um sistema próprio de seguridade após saírem da ativa, e as muitas


diferenças entre os sistema militar e os sistemas de previdência civil são
resultado de uma grande diferença conceitual.

O entendimento jurídico que se tem em relação à saída dos militares da ativa,


hoje, é que eles na verdade não se aposentam, passam para a reserva e, a
partir de certa idade, são reformados, explica o professor Luís Eduardo Afonso,
especialista em previdência da USP (Universidade de São Paulo).

Na reserva, eles podem ser chamados em caso de guerra, o que na prática não
costuma acontecer, já que o Brasil não convoca reservistas para um conflito
desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Então, o que o militar recebe tecnicamente não é entendido como um benefício


previdenciário, é entendido como um salário, mesmo que na prática ele esteja
inativo. Por isso, os militares na ativa não fazem contribuições para suas

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aposentadorias, apenas para pensões, que vão para dependentes em caso de


infortúnios.

"Na prática, o que acontece é que toda a sociedade está pagando pela
aposentadoria dos militares. É uma alocação de recursos que não é adequada",
afirma Luís Eduardo Afonso.

"Acho que é algo que a gente precisa repensar, já que estamos discutindo
benefícios e custos para todos os setores da sociedade."

A contribuição de um civil para o INSS é de 11% do salário bruto.

Já a única contribuição feita por militares, para pensões, é de 7,5%, que pode
subir para 9% se o militar tiver ingressado antes de 2001 e quiser manter o
benefício de pensão vitalícia para filhas não casadas.

Só o Exército tinha, no início do ano, mais de 67.600 filhas de militares


recebendo um total de R$ 407 milhões por mês, o que dá um valor de mais de
R$ 5 bilhões por ano. A Aeronáutica e a Marinha não divulgam os valores,
apesar de se tratarem de dados públicos. No total, são mais de 110 mil filhas de
militares recebendo pensões.

O Ministério da Defesa afirma que a contribuição para pensões é feita "desde o


início da carreira até o falecimento", "sem que haja qualquer tipo de contribuição
patronal da União".

No entanto, ela não é suficiente para cobrir todas as despesas com pensões --
devem ser gastos R$ 21,2 bilhões com as pensões em 2019, segundo a pasta.
Desse valor, R$ 3,2 bilhões serão cobertos pelas contribuições, deixando um
déficit de R$ 18 bilhões.

Carreira diferente

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A lógica por trás da discrepância é que a carreira militar requer condições


especiais, já que a categoria tem algumas restrições.

Enquanto estão na ativa, militares não têm direito a greve nem a horas extras e
não recolhem FGTS, além de não terem direito a adicionais noturnos e de
periculosidade.

"Obviamente, há diferenças. É uma carreira com muitas especificidades, com


mais riscos, em que, se a pessoa sair, as condições são diferentes", explica o
professor Luís Eduardo Afonso.

No entanto, segundo Afonso e outros especialistas em previdência, os


benefícios para os militares aposentados no Brasil acabam pesando muito mais
nas contas e ultrapassando os concedidos em outros países, como o Reino
Unido e os Estados Unidos.

"A diferença entre a previdência dos militares e o setor privado [qualquer


pessoa que aposente pela Previdência Social] no Brasil é muito grande e muito
diferente de outros países", afirma o professor de direito Jorge Cavalcanti
Boucinhas, da Escola de Administração de Empresas da FGV. "A necessidade
de levar em consideração as especificidades do serviço militar não pode ser
usada para justificar privilégios."

"É questão conceitual: todos os países estão envelhecendo e isso nos obriga a
uma preparação e exige um esforço maior de custeio de toda sociedade,
incluindo os militares", afirma Afonso. "E isso não significa deixar de levar em
consideração as peculiaridades da carreira."

A questão da idade

A legislação atual permite que os militares brasileiros se aposentem com salário


integral após 30 anos de serviço, sem idade mínima. No setor público a idade
mínima é de 55 anos para mulheres e 60 para homens.

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Hoje, não há idade mínima para quem se aposenta por tempo de contribuição
no INSS. Na reforma da Previdência proposta por Temer, se estabeleceria um
limite mínimo de 65 anos para homens e 62 para mulheres --tanto Paulo
Guedes quanto Mourão já demonstraram concordar com essa idade, embora
o presidente já tenha falado em limites menores.

"Temos um sistema previdenciário que gera muitas desigualdades. E para


alguns regimes, a Previdência é muito generosa, permitindo aposentadorias
com valores muito elevados e idade relativamente baixa", afirma o professor
Luís Eduardo Afonso.

Em um relatório de 2017, o TCU (Tribunal de Contas da União) afirma que mais


da metade (55%) dos membros das Forças Armadas no Brasil se aposentam
entre os 45 e os 50 anos de idade.

Segundo o professor Boucinhas, da FGV, os militares também são afetados


pela questão demográfica que se usa para justificar as reformas na Previdência
da iniciativa privada. Ou seja, o envelhecimento da população e o fato de as
pessoas estarem envelhecendo com mais saúde também deve ter um reflexo
para os militares na reserva.

O Ministério da Defesa diz que "tem discutido a questão internamente e com


representantes dos demais órgãos do Governo". Mas, segundo a pasta, "as
atividades desempenhadas pelas Forças Armadas requerem de seus membros
vigor físico compatível".

"O aumento da idade mínima provocaria um envelhecimento inevitável da tropa"


e resultaria na "redução da capacidade operacional das Forças".

No entanto, os analistas não concordam com essa visão.

"O grande argumento, inclusive do presidente, é que o militar velho não pode
estar na ativa", afirma Boucinhas. "Mas isso já evoluiu muito. Hoje, alguém com

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60 anos pode ser absolutamente ativo - afinal, quanto mais alta a patente,
menor a chance de ele estar na linha de frente."

Segundo ele, há muitos cargos de comando e inteligência que um militar mais


velho poderia ocupar.

Reformas

No Brasil, a remuneração dos militares na reserva e as pensões de militares


são regidas por uma série de legislações que vêm desde os anos 1960 - a
última alteração foi por meio de uma medida provisória em 2001.

O benefício vitalício para filhas não casadas foi extinto em 2001, portanto, quem
entrou após essa data nas Forças Armadas não tem mais esse direito. Mas o
governo deve continuar pagando pensões para filhas de militares pelo menos
até 2060, quando ainda devem estar vivas as filhas dos últimos militares que
tiveram direito ao benefício.

O Ministério da Defesa afirma que "algumas medidas têm sido avaliadas com o
intuito de reduzir o déficit das pensões militares, com a ampliação do rol de
contribuintes (contribuição obrigatória inclusive por parte das próprias
pensionistas) e avaliação das condições de elegibilidade".

A pasta também cita a reforma de 2001 como parte dos "esforços impetrados
pelas Forças Armadas" para a redução de gastos.

A mudança não alterou as outras possibilidades de pensão. Viúvas e viúvos de


militares continuam recebendo pensão integral, assim como dependentes de
até 21 anos.

Para os analistas, mesmo levando em conta as suas especificidades, a carreira


militar no Brasil precisa ser repensada com urgência. "Quando mais se retardar

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isso, mais vamos sobrecarregar os trabalhadores da iniciativa privada com os


ônus", afirma Boucinhas.

"Como dizia o (um dos criadores do Plano Real) Gustavo Franco, todo privilégio
vira imposto."

Segundo o ministério, a falta de direitos remuneratórios (como o FGTS) "rende


anualmente à União uma economia da ordem de R$ 23 bilhões, valor
equivalente às despesas com militares inativos. Em outras palavras, significa
dizer que a economia gerada pela ausência de direitos remuneratórios para os
militares ativos em serviço é transferida para o pagamento de inativos."

Apesar de afirmar que o sistema atualmente é "autossustentável", o Ministério


da Defesa diz que "tem conduzido estudos no intuito de aperfeiçoar o Sistema
de Proteção Social dos Militares, visando, no que couber, a redução de gastos,
sem provocar danos colaterais que possam comprometer o cumprimento da
missão constitucional das Forças Armadas".

No entanto, não há uma data para seu envio ao Congresso. "Os estudos já
estão em fase bem avançada, porém, em função da complexidade e a
constante evolução dos acontecimentos, não podem ser entendidos como um
produto acabado", afirma o ministério.

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Aposentado que trabalha pode sacar FGTS todo mês?


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