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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS - IFCH

CURSO DE GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

ALUNOS : MARIA ELISA SCOVINO DA SILVA/GEISA SILVA/

GABRIELA ALANA

ECONOMIA AÇUCAREIRA E MINEIRA NO


BRASIL COLONIAL

PROF: MARILENE ROSA NOGUEIRA DA SILVA

HISTÓRIA DO RIO DE JANEIRO COLONIAL

RIO DE JANEIRO

2015

1 Páá giná 1
ECONOMIA AÇUCAREIRA E MINEIRA NO
BRASIL COLONIAL
Maria Elisa Scovino

INTRODUÇÃO

Para o estudo da formação da economia canavieira, João Fragoso em A


Formação da economia colonial no Rio de Janeiro e de sua primeira elite senhorial
(séculos XVI e XVII) capítulo 1 da obra O Antigo Regime nos Trópicos (Séculos XVI-
XVIII), remonta a construção da elite agrária colonial através da apropriação de
recursos da colônia e a formação de mecanismos de crédito e de manutenção de uma
hierarquia altamente excludente. Antônio Carlos Jucá de Sampaio em Os Homens de
Negócio do Rio de janeiro e sua atuação nos quadros do Império Português relata a
formação de uma elite comercial fluminense de grande proeminência e com recursos
para financiar a formação do comércio interno na região aurífera. Ambos os autores
procuram fazer uma análise documental com a utilização de dados estatísticos e
pesquisa empírica para fundamentar seus argumentos e conclusões. O primeiro autor,
João Luís Ribeiro Fragoso estudou na Universidade Federal do Rio de Janeiro com
graduação em História (1979) e mestrado em história agrária (1983), sendo atualmente
professor na dita instituição. Nas últimas décadas realizou estudos na área de História
econômica da América Lusa nos séculos XVI-XVIII com um direcionamento para as
questões sociais, e formação das elites econômicas e metodologia sobre o período pré-
industrial. Já Antônio Carlos Jucá conclui a graduação em História em 1990, mestrado
em história em 1994 e doutorado na Universidade Federal Fluminense, recebendo
prêmio Arquivo Nacional de Pesquisa em 2001. Lecionou na Universidade de Ouro
Preto entre 1996 e 2004, atuando como professor atualmente na Universidade Federal
do Rio de Janeiro. Coordenou o programa de pós-graduação em História social na
UFRJ, e é editor de uma Revista de História chamada Topoi. Seus estudos concentram-
se na História do Brasil colônia. Ambos importantes historiadores da área realizam um
trabalho que contribui de forma determinante para a compreensão dos períodos
retratados nas ditas obras. Levantam o quadro econômico e social da colônia
procurando entender os mecanismos internos do Brasil Colonial e como ocorre a
1 Páá giná 2
construção da economia e das estruturas sociais dentro do Império Ultramarino não
considerando a colônia como simples produtos dos interesses mercantis metropolitanos.

JOÃO FRAGOSO E CARLOS SAMPAIO: A FORMAÇÃO DA


SOCIEDADE AÇUCAREIRA E MINEIRA.

No capítulo I A Formação da Economia Colonial no Rio de Janeiro e de sua


primeira elite senhorial (séculos XVI e XVII), pertencente a obra O Antigo Regime
nos Trópicos(Séculos XVI-XVIII), João Fragoso procura levantar fontes e dados
estatísticos para remontar a sociedade agrária colonial na época do desenvolvimento das
lavouras canavieiras e como ocorre a concentração de recursos e riqueza para a
formação da economia de plantation. Inicia afirmando que a instalação desse produto
ocorre em momento propício para sua inserção no mercado internacional, que de 1550
até o final do século seu preço duplicou. E essa tendência se manteve até 1630, o que
explica o grande crescimento do número de Engenhos e fábricas de açúcar. Nestas
economias se encontra o trabalho escravo negro vindo de diversas partes do Império
Ultramarino, sendo a aguardente e a cachaça importantes para a compra de negros na
Angola. A formação dessa economia se daria entre 1612 e 1629 que representou o
momento primordial a montagem das condições necessárias para dar origem a um
sistema escravista exportador. O uso de registros paroquiais, de batismos, casamentos,
óbitos, escritura pública se mostra crucial para entender a formação de cadeias
genealógicas e de hereditariedade que culminará na futura elite agrária colonial. O autor
adota o nome Conquistadores para se referir ao contingente que desembarcou no
Recôncavo do Guanabara antes de 1600 e originou descendentes. A segunda onda
migratória seria representada pelos povoadores entre 1601 e 1620. Essa população de
conquistadores, povoadores seus descendentes e forasteiros iriam constituir linhagens
extensas. O que se coloca em questão é a criação das condições e recursos necessários
para investir e empreender numa grande economia de plantation e como essa
acumulação primitiva 1era baseada na apropriação e criaria uma forte hierarquia social
dentro da colônia. Mesmo o açúcar sendo uma mercadoria lucrativa, não era suficiente

1
Fernando Novais aponta para uma acumulação primitiva metropolitana, em vez de colonial, dando
ênfase no comércio internacional: “... a expansão européia, mercantil e colonial, processa-se segundo
um impulso fundamental... na transição para o capitalismo industrial... acelerar a primitiva acumulação
capitalista é pois o sentido do movimento...”(NOVAIS, pág. 70)
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para financiar um sistema de produção desse porte, era necessário para tal, a criação de
riquezas e um mecanismo de crédito eficiente.

A partir do século XVI o Império Lusitano sofreria grandes ataques estrangeiros,


como a presença francesa em terreno colonial, o que alerta a metrópole pelo
crescimento em importância do domínio pouco explorado. O grande foco das atenções
lusitanas era ainda as rotas de Comércio com o Oriente, que começa a declinar devido a
competitividade com outros países e em 1562-63 o Atlântico prevalece sobre as Índias o
que acarreta numa maior presença lusa na América e Angola. Fragoso ainda relata que
todo Império Ultramarino se baseava no comércio internacional e que assim, quedas e
crises internas da colônia afetavam diretamente a economia lusitana com aumento da
dívida interna, da inflação e elevação da mortalidade. Assim a prosperidade da
economia açucareira estava relacionada ao aumento populacional português no período.
Mesmo com a queda do comércio do Oriente2, este até 1619 corresponderia a 40% da
receita lusitana e apenas no século XVIII o Brasil suplantaria o comércio oriental.

Um dos pontos a se indagar seria a origem social das parcelas portuguesas que
vieram povoar a colônia e efetivar o domínio metropolitano. A Alta Aristocracia
portuguesa se instalava em Portugal constituindo a corte e aceitavam a administração de
colônias até o Marrocos. Sendo assim, o conjunto que desembarcou na colônia advinha
de famílias com poucos recursos, uma nobreza secundária e pouco imponente e alguns
poucos atraídos pelo excesso de benefícios concedidos pela Coroa. Assim, grande parte
dos primeiros colonizadores era de origem social pobre que irão compor a futura elite
colonial açucareira. Este contingente pobre não teria os recursos necessários para
empreender no plantation, assim a justificativa de alguns autores seria que a produção
de aguardente era usada para a aquisição de escravos que forneceria o lucro necessário
para o investimento açucareiro. Fragoso aponta que a hipótese de colocar a origem da
economia de plantation no comércio internacional de escravos não se sustenta, pois os
registros dessa época (1610-13 e 1630-36) relatam um grande movimento de compra e
venda de terras e poucos recursos em navios e lojas necessárias para impulsionar um
comércio de alta magnificência. Fragoso atenta para a grande relação entre os primeiros
conquistadores e as missões bandeirantes, afirmando que os futuros senhores de

2
Segundo Braudel o comércio com o Oriente seria a primeira grande economia-mundo, sendo
suplantada por Antuérpia, esta por Gênova, depois Amsterdam e Londres. Braudel não inclui Portugal
como centro de convergência de capital na sua análise.
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engenhos praticavam essas atividades adentrando no território brasileiro para a captura
de índios. Estas teriam fornecido a primeira mão de obra e recursos para o início da
cultura canavieira. Outra forma de acumulação primitiva havia sido justamente o tráfico
negreiro, mas não apenas. Muitos futuros senhores haviam sido comerciantes, e
utilizavam seu capital acumulado para investir na produção açucareira. Outro fator que
contribuiu foi a produção de alimentos e de cana. Assim os futuros senhores de engenho
praticavam diversas atividades como captura de índios, comércio, agricultura,
percebendo que não era uma elite lusitana com recursos elevados e sim originários de
diversos ramos e níveis sociais. Porém eram famílias que chegaram por volta de 1600-
1620 que formaram a grande elite agrária e dirigiam a administração da vida pública
colonial, mantendo seus status por mais de três gerações seguidas. A apropriação dos
recursos (terras e homens) e o domínio da câmara foram as principais e mais eficazes
formas de acumulação de capital para a formação da plantation: “Entre as famílias
senhoriais que mantiveram o seu status e engenhos por mais de três gerações, cerca de
2/3 descendiam de conquistadores/primeiros povoadores/ oficiais do rei. Ao mesmo
tempo, foram tais personagens que, ao longo dos seiscentos, dominaram os assentos da
câmara.” (FRAGOSO, pág. 42).

O sistema de mercês originado nas guerras de Reconquista contra muçulmanos


consistia em privilégios concedidos pelo rei a aristocracia que prestava serviços a
Coroa. Esse sistema cresceu e se intensificou muito, de tal maneira que as pensões
concedidas a nobreza chegavam a superar o lucro Atlântico arrecadado. Este sistema
formou uma aristocracia de corte junto ao rei, tendo como benefícios liberdade para usar
rotas de comércio monopolizadas, entrega de cargos em certos ofícios e a posse de
terras nas colônias. No caso do Brasil não apenas a alta nobreza tinha acesso a esses
privilégios, aqueles que prestavam serviços a Portugal também foram presenteados com
terras e postos na administração. Esses cargos eram almejados não pelos salários
imperiais e sim pela possibilidade de usufruir do dinheiro dos juízos de órfãos e órgãos
dentro da colônia, havendo diversas acusações de abusos dirigidas aos ministros que
administravam as finanças. Assim esses cargos e a facilidade de extrair riquezas
funcionaram como um verdadeiro mecanismo de crédito numa economia carente de
recursos. As câmaras também tinham a função de controlar os preços e serviços de
abastecimento, estabelecendo as formas e o acesso da população aos produtos
necessários a sua subsistência. Esses administradores, em muitos casos, investiram mais

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tarde em engenhos e se tornaram senhores criando uma relação próxima e familiar com
os integrantes das câmaras. Esta relação provocou a criação de um vínculo de
reciprocidade que Fragoso intitula Economia do bem comum. Assim a Coroa concedeu
diversos privilégios para que se instalassem na colônia, como o monopólio da carne, do
açúcar, facilidade no tráfico negreiro e mercês a determinadas pessoas, tudo em
benefício ao bem comum. A Coroa escolhia certo grupo para oferecer o monopólio de
bens e serviços em detrimento do resto da população que enfrentava a concorrência
desleal ou se submetia aos senhores da colônia. Assim através dessa Economia do bem
Comum, os privilegiados controlavam o comércio e a produção, e através das vantagens
concedidas criava-se uma hierarquia social excludente. 3Privilégio de uma minoria. A
ascensão social dependia da concessão real. Assim os colonizadores originários da
pequena aristocracia portuguesa se tornaram as melhores famílias da terra.

Após a Revolta de 1660-61 contra os Sá, e com a volta de Salvador Correia de


Sá e Benevides, o grupo vencedor conseguiu manter sua hegemonia criando uma rede
de alianças seladas com casamentos e dotes, cuja principal preocupação era a
permanência de suas condições sociais numa sociedade altamente estratificada. O laço
consanguíneo com os colonizadores e povoadores elevava uma linhagem que se
percebia superior hierarquicamente, também devido a longa estadia nos postos da
Câmara e administração colonial. Suas posições eram reforçadas pelo seu grande poder
de mando, das benesses que recebiam que lhe permitiu uma alta acumulação econômica,
auxiliada com a apropriação de recursos públicos. Os casamentos após a consolidação
da elite colonial era feita no círculo restrito dessa aristocracia o que facilitava as
alianças políticas. O que foi importante para a formação de bandos no interior da
nobreza. As alianças e casamentos eram determinados de acordo com as circunstâncias
históricas. Até 1660 o domínio de Sá era garantido pelo matrimônio com pessoas
ligadas a metrópole. Em 1661 este quadro muda, tendo preferência no casamento com
integrantes das melhores famílias da terra, inclusive com antigos inimigos o que
possibilitou os Sá dominar os assentos do senado. Os Conflitos entre bandos eram
comuns nas colônias, e seria resultado da própria rede de clientelas que dividia a
aristocracia local. Fragoso esclarece que os bandos não era um elemento novo na
sociedade colonial, que os primeiros colonizadores quando desembarcaram em terras
3
O autor confirma a permanência dessa hierarquia em outra obra “O Arcaísmo como Projeto”: “O
núcleo da formação colonial tardia era constituído por um tipo específico de reprodução, no qual os
próprios mecanismos de ascensão social implicavam recriar o padrão excludente.” (FRAGOSO, pág. 19).
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desconhecidas precisaram fazer um esforço para seu próprio reconhecimento como de
qualidade superiores, sendo reconhecidos pela população. A relação com os gentios
também teve papel fundamental, sendo a subordinação dos índios realizada de forma
violenta e através de negociações, cuja própria estrutura de rivalidade entre grupos
indígenas contribuiu para o estabelecimento de formas distintas de contato com o
outros, simultaneamente opressão violenta a certos grupos e alianças com outros. Assim
como a lealdade indígena foi útil tanto contra outras tribos, como para a apropriação de
engenhos vizinhos. De qualquer maneira, as transações e o comércio no interior da
colônia eram fundamentados por esses laços de reciprocidade entre bandos, e não pelo
livre mercado. As trocas e vendas de propriedades entre famílias resolviam questões de
falência, permitindo a manutenção da linhagem e do status referente. De 1651-80 a
principal fonte de crédito era fornecida por famílias senhoriais e pelo Juizado de órfãos.
Esse dado demonstra que uma nobreza secundária lusitana e setores de poucos recursos
foram capazes de construir seus próprios mecanismos de crédito através da apropriação
de terra e mão de obra, e recursos da administração pública, criando um sistema de
financiamento oferecido e adquirido pela própria aristocracia. A arrematação dos
dízimos para a Fazenda Real era um dos principais motivos de acusações contra os
funcionários da Coroa e da disputa entre bandos. A Arrematação de dízimos, os
privilégios em rotas de comércio, a dominação política e as alianças seladas pelo elo
matrimonial foram cruciais para a criação de uma acumulação excludente e restrita a um
pequeno grupo e a permanência dessa estrutura social estratificada.

A partir de 1690 inicia o declínio da economia de plantation no Rio de janeiro.


Os negócios, e o crédito oferecido pelos senhores de engenho diminui substancialmente,
e as famílias tendem a se fechar ainda mais. A fuga para as Minas causa um
despovoamento que agrava a situação das lavouras. Começa a se delinear uma transição
da economia dominada pela aristocracia agrária para a uma mais ligada ao comércio
sendo o negociante o agente e beneficiado principal das novas conjunturas. Mas ainda
se notam casamentos entre comerciantes e nobres, o que demonstra a permanência de
valores tradicionais de superioridade social entre esses dois grupos. Assim ocorre a
substituição de uma elite açucareira baseadas no bem comum para uma classe de
negociantes ligadas ao comércio interno e Ultramarino.

1 Páá giná 7
Antônio Carlos Jucá de Sampaio em Os Homens de Negócio do Rio de janeiro
e sua atuação nos quadros do Império Português aborda o período da mineração na
colônia e afirma que ao longo do século XVIII o Rio de Janeiro vai prevalecer sobre
Salvador, passando a desempenhar um papel estratégico dentro da economia mercantil.
Por volta do século XVII- XVIII ocorre a transição do domínio da nobreza agrária
açucareira para uma elite mercantil que transformará a capitania fluminense no centro
comercial da América Portuguesa vinculado ao comércio interno da região das Minas.
Nem os negociantes lusitanos nem os do Rio de Janeiro monopolizavam o comércio
Ultramarino, e existia pouco investimento nessa atividade por Portugal por não consistir
em lucro seguro e por uma tradição conservadora. A atividade comercial fluminense
estava ligada a grande economia de exportação vinculada à metrópole, pois se
concentravam nas rotas de comércio significativo como o tráfico negreiro 4necessário
para a própria manutenção da sociedade colonial. As documentações apontam para
investimento em grandes embarcações ligado ao comércio de longa distância, este
realizado por um grupo restrito que possuía os recursos necessários de alto custo. Mas
essa relação da classe comercial fluminense com o comércio mercantil do Atlântico era
indispensável para o controle das atividades comerciais dentro da colônia. A atuação
desses comerciantes tanto no tráfico negreiro como no mercado interno demonstra a
diversidade de ramos dessa classe. A interação com essas duas extremidades fazia do
Rio de Janeiro uma ponte e uma região de controle dessas duas áreas:“...é inegável que
tais negociantes estavam situados numa das mais lucrativas encruzilhadas do Império
Português na primeira metade do século XVIII, servindo como a principal ponte entre
as regiões auríferas e o comércio ultramarino.”(SAMPAIO, pág. 85).

A classe mercantil do Rio de Janeiro estava como as principais fornecedoras de


estoques e financiadoras do comércio da região das Minas. Por não possuir recursos
necessários para o alto investimento para a participação do comércio ultramarino,
adquiriam empréstimos com a elite comercial fluminense que possibilitava a formação
desse grupo de comércio interno a inserindo numa condição subordinada aos
negociantes do Rio. A possibilidade da ação no comércio atlântico foi uma forma de
acumulação de capital que permitiu essa oferta de crédito para os comerciantes
mineiros. A instabilidade da atividade comercial fez com que não se formasse em
Portugal uma linhagem de negociantes o que aconteceu no restante da Europa, este fator
4
Vide nota 1 da pagina 2 sobre visão de Fernando Novais.
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abriu espaço para o desenvolvimento de outros grupos e sua inserção no mercado. O
estudo das sociedades de comércio realizadas entre os comerciantes demonstra que as
destinadas ao comércio externo estavam em número superior que as do interno. Mas
como Antonio Jucá esclarece as sociedades de transação externa exigia escritura para o
controle de um comércio entre colônia e metrópole; já as atividades internas ficavam na
informalidade. Mas algumas fontes relatam a existência de sociedades inclusive em
áreas que não havia presença portuguesa o que demonstra a autonomia colonial nos
negócios5. E mesmo as que se dirigiam a metrópole, seu financiamento era realizado
inteiramente com o capital da colônia. Jucá ainda relata a inexistência de diferenças
hierárquicas entre os grupos mercantis coloniais e os metropolitanos, evidenciando a
grande autonomia e estrutura da elite comercial fluminense. Mas o autor deixa claro que
o comércio colonial não suplantava o lusitano, relatando, porém, a não subordinação
destes a classe metropolitana que em vez de se opor criou alianças com a elite local.

O modelo que se baseava as sociedades comerciais entre os negociantes da


colônia sugere a existência de uma colaboração entre a elite colonial. Geralmente divida
entre um que financiava e outro que realizava todo o trabalho do empreendimento, esse
modelo permitiu uma acumulação de capital dentro dos círculos mercantis e contribuiu
para a perpetuação da hierarquia social. A atuação desses homens de negócio, tanto na
arrematação de dízimos e de contratos permitiu uma acumulação financeira sendo tal
prática comum tantos nos meios coloniais como metropolitanos. Em relação à oferta de
crédito não há documentação suficiente para o cálculo do nível das dívidas da elite
mercantil, mas os dados demonstram que a maior parte das atividades foi resultado de
financiamentos. Numa sociedade altamente estratificada a oferta crédito era um fator
importante para a possibilidade de inserção nos negócios. Era fundamental também para
satisfazer as necessidades imediatas numa economia essencialmente agrária e assim
sofrendo com a instabilidade de lavouras e de diferentes estações de ano. Acabava
também estabelecendo uma subordinação entre os financiadores e devedores, o que

5
Há grande discussão historiográfica acerca da autonomia colonial mercantil, a abordagem de Jucá se
contrapõe as linhas tradicionais que afirmam o sentido da colonização como Caio Prado Júnior e
Fernando Novais: “... em função dos mecanismos e ajustamentos dessa fase da formação do capitalismo
moderno... Nesse sentido, a produção colonial orienta-se necessariamente para aqueles produtos que
possam preencher a função do sistema de colonização no contexto do capitalismo mercantil...” (NOVAIS,
pág. 69).

1 Páá giná 9
também contribuía para criação entre uma cadeia que ligava pessoas com ligação
comercial que se vinculava com a concessão de crédito entre esses círculos. O
empréstimo também consistia numa forma de acumulação de capital para os
concessores, e ainda era um mecanismo de manutenção da hierarquia social e de
solidariedade entre senhores de engenho e negociantes.

ANÁLISE CRÍTICA DE FRAGOSO E SAMPAIO.

João Fragoso busca levantar a formação da economia açucareira analisando os


motivos que explicaria a obtenção dos recursos necessário para financiar uma produção
de grande porte, e assim busca compreender como uma aristocracia e grupos pouco
imponentes da metrópole conseguiam montar mecanismos e montar uma estrutura
social e política para a formação do plantation e manutenção de suas posições
conquistadas. Assim constrói um modelo que se contrapõe as analises tradicionais
representadas por Caio Prado Júnior e Fernando Novais baseadas no sentido da
Colonização. Estes autores inserem a economia colonial como secundária, dependente e
consolidada através das iniciativas da metrópole o mercado internacional. Assim
apontam a produção da colônia determinada pelas necessidades e interesses mercantis:
“Efetivamente, é em função daquele sentido básico que se processa a expansão
europeia e se organizam as atividades produtivas no Novo Mundo...em função dos
mecanismos e ajustamentos dessa fase da formação do capitalismo moderno...Nesse
sentido, a produção colonial orienta-se necessariamente para aqueles produtos que
possam preencher a função do sistema de colonização no contexto do capitalismo
mercantil...”(NOVAIS, pág. 69 e 70).

Assim, os ciclos econômicos como açúcar, ouro e café seguiram as necessidades


do mercado internacional e interesses europeus. E que a atividade comercial e as
colônias serviriam para uma acumulação primitiva de capital para o impulso industrial
posterior. Novais, ainda afirma que o tráfico Negreiro seria explicado por essa
necessidade de acumulação de capital e por esta havia se optado pela mão de obra
africana. Nessa problemática afirma que a mão de obra implantada nas colônias deveria
ser necessariamente escrava, pois apenas com uma violenta imposição se aceitaria
trabalhar nas difíceis condições existentes, sendo uma melhor opção procurar sua
subsistência em algum pequeno lote de terra. Caio Prado Júnior faz uma abordagem

1 Páá giná 10
geográfica explicando os motivos para a concentração populacional em determinadas
áreas da colônia seria as condições climáticas e recursos econômicos. Fragoso se
contrapõe a essa preponderância ao fator geográfico: “Parece-nos que a geografia
física pesa muito pouco no estabelecimento de hierarquias econômicas” (FRAGOSO,
Pág. 88), quando fala da economia mineira relatando que se assim fosse O Rio Grande
do Sul não estaria submetido ao capital carioca desde o início da colonização. Caio
Prado Júnior relata a modesta proeminência do comércio interno, colocando o foco no
comércio Ultramarino e o constante desvio das riquezas americanas que eram
direcionadas a Europa. Esses autores se dirigem ao estudo da circulação monetária do
período mercantil, no qual Novais nomeia “fase do capitalismo comercial”, que segundo
Marx seria uma fase precedente ao capitalismo que nasce com a Revolução Industrial já
que o comércio seria uma etapa estéril e apenas se consolidaria tal sistema com presença
de uma estrutura de produção.

João Fragoso procura modelos explicativos alternativos a essas visões, se


contrapondo a essa reduzida importância do mercado interno da colônia e a dependência
e subordinação total da colônia à metrópole. Enquanto os outros autores se atentam para
a circulação de capital, e Marx a estrutura produtiva, Fragoso destaca o conceito de
Formação social. Ao contrário de Caio Prado e Novais que relatam a importância de
acumulação primitiva europeia, o autor atenta para a formação de um acúmulo colonial,
elaborado pelos conquistadores na colônia para assim construírem as bases para a
criação de um sistema produtivo no interior da região fluminense. Essa acumulação é
feita de maneira a criar uma hierarquia social excludente, baseada no privilégio e
monopólios de um pequeno grupo de melhores da terra na apropriação de terra e mão
de obra, pelas benesses concedidos pela Coroa portuguesa e principalmente pelos
mecanismos criados pelos próprios colonizadores para possibilidade de crédito e laços
de reciprocidade para a manutenção de suas posições superiores na estrutura social. A
utilização da economia de bem comum possibilitou a usurpação por parte do corpo
administrativo das finanças públicas produzidas por todo corpo populacional da colônia.

Esta acumulação foi importante para a formação da elite agrária brasileira que
por volta do século XVIII seria suplantada por uma classe comercial devido a
decadência da economia canavieira e a descoberta do ouro na região de Minas. Fragoso
procura destacar que essa estrutura de Antigo Regime baseada em valores tradicionais e

1 Páá giná 11
diferenças sociais permanece mesmo com a ascensão de uma nova conjuntura
econômica. Casamentos de negociantes e nobres continuam para a manutenção da
hierarquia social excludente. A proeminência dos comerciantes não significou a quebra
da estratificação elevada na sociedade colonial:

“Por último, se foi certo que aquela nobreza e suas práticas de acumulação, como
fenômenos majoritários, cederam espaços, em algum momento dos setecentos, a outras
relações sociais mais baseadas no comércio, a prática da exclusão social do
público(para além dos escravos) continuaria como uma das chaves para a acumulação
de riquezas nas mãos de um pequeno grupo de pessoas.”(FRAGOSO, pág. 71).

Antônio Carlos Jucá defende a existência de uma classe comercial com mais
força nos quadros da mineração, e uma elevação significativa do mercado interno. Jucá
afirma que o Rio de Janeiro assume uma posição estratégica como uma ponte entre o
mercado metropolitano e o comércio do interior da colônia. O grupo de negociantes
fluminenses estariam ligados ao comércio internacional de longa distância o que
permitia altos lucros e esta elite teria financiado e possibilitado a criação de um núcleo
de comércio na área mineradora. Como esse frágil comércio não tinha condições de
investir num comércio de grande porte como o ultramarino, havia por meio dos
financiamentos dessa elite mercantil do Rio de Janeiro, encontrado condições para
formar um comércio menor e local, porém subordinado a classe fluminense. O autor
aponta a grande autonomia dessa elite do Rio, no qual as fontes empíricas demonstram
que a atividade mercantil mesmo dirigida a Portugal era realizada com capital
fluminense: “... a documentação com que trabalhamos, sobretudo as escrituras de
formação de sociedades, nos mostra a grande autonomia que essa elite mercantil
carioca tinha em face de sua congênere portuguesa. As sociedades formadas com vistas
ao comércio com Portugal e/ou ilhas atlânticas eram, na sua maioria, compostas
somente por homens de negócio baseados no capital fluminense.”(SAMPAIO, pág. 94).
Aponta inclusive que não havia uma hierarquia entre os comerciantes lusitanos e
fluminenses, apesar da nítida preponderância do comércio da metrópole. Afirma que
não havia uma subordinação da classe mercantil do Rio de Janeiro em relação a
Portugal, que a elite mercantil acaba por estabelecer alianças com os grupos comerciais
da colônia: “...os quais não pretende, ou melhor, não é capaz de retirar de cena ou
subordinar.”(SAMPAIO, pag. 96).

1 Páá giná 12
CONCLUSÃO

Os trabalhos e estudos realizados sobre o período colonial contribuem para a


compreensão desse período crucial da História Brasileira. As diferentes linhas
historiográficas enriquece o debate e incita a reflexão crítica sobre esse momento. Caio
Prado Júnior e Fernando Novais, fazem uma abordagem que insere a economia colonial
como secundária e dependente do comércio metropolitano. Já João Fragoso remonta a
colonização relatando a participação metropolitana que ao procurar efetivar seu domínio
sobre as novas terras e criar súditos no Novo Mundo, acaba por contribuir na formação
de uma classe que adquire interesses próprios, cresce e cria mecanismos e estruturas
sociais e políticas próprias e com certa autonomia. Pode-se inferir que o tradicional
direcionamento da economia colonial como dirigida pela metrópole pode estar
relacionada ao conjunto documental em sua maioria elaborada pelo governo Régio.
Antônio Jucá também defende a autonomia e segue a linha de busca por compreender a
colônia tendo sistemas próprios. Utilizando de dados empíricos e grandes números de
fontes constroem uma abordagem alternativa que visa demonstrar a permanência de
uma estrutura social estratificada e excludente que segundo Fragoso em O Antigo
Regime nos Trópicos sobrevive e é causa da grande desigualdade social brasileira: “Se
existe algum aspecto sobre o qual há consenso entre os analistas da economia
brasileira, é de que nela prepondera uma das distribuições de renda mais desiguais do
mundo ocidental, senão a mais desigual.” (FRAGOSO, pág. 17).

BIBLIOGRAFIA

PRADO JÚNIOR, Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo, Brasiliense, 2006.

PRADO JÚNIOR, Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. 23° Edição, São Paulo,
Brasiliense, 1994.

NOVAIS, Fernando A. Estrutura e dinâmica do Antigo Sistema Colonial (Séculos


XVI – XVIII). São Paulo, Brasiliense, 1986.

1 Páá giná 13
BRAUDEL, Fernand. A Dinâmica do Capitalismo. Tradução Álvaro Cabral. Rio de
Janeiro: Rocco, 1987.

FRAGOSO, João. “A Formação da economia colonial no Rio de Janeiro ( Séc..XVI-


XVII)” In O Antigo Regime nos Trópicos – A Dinâmica Imperial portuguesa
( séc.XVI - XVII). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.,2001 .p.29

SAMPAIO, Antonio Carlos Jucá. Os Homens de Negócio do Rio de Janeiro e sua


atuação nos quadros do Império Português. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,
2001 p.75-105

1 Páá giná 14

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