Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
a docência: a construção
da identidade profissional
Maria Heloísa Aguiar da Silva
Os professores vivem tempos difíceis e paradoxais.
Apesar das críticas e das desconfianças em relação
às suas competências profissionais, exige-se-lhes quase tudo.
Temos de ser capazes de pensar nossa profissão.
Antonio Nóvoa
Começando o diálogo
Refletir sobre a docência no Ensino Superior é um desafio que acompanha
a expansão quantitativa desse nível de escolaridade. Assistimos, na última
década do século XX, a um crescimento vertiginoso das vagas nas univer-
sidades. O sonho de se graduar em um curso universitário tornou-se uma
realidade para um número cada vez maior de pessoas.
Cabe fazer aqui uma primeira distinção: temos diferentes respostas para
uma única questão. Por que isso acontece? Em primeiro lugar, é preciso dis-
tinguir definição e representação.
Apagão na educação –
professor foge da sala de aula
(ARCE, 2003)
MEC identifica falta de 250 mil profissionais nas escolas do país. Baixos
salários e más condições de trabalho são apontados como causas.
Cinema e literatura:
desvelando o estereótipo depreciativo
Precisamos compreender o que tem levado a esse processo de rejeição
da docência. A história da profissão docente está associada a diferentes ima-
gens, que oscilam entre a grandiosidade e a mitificação, de um lado, e o des-
prezo e depreciação de outro.
Muitas vezes, ouvir de um aluno expressões como: “Nossa, você não parece
uma professora!”, remetemo-nos a uma reflexão sobre qual parâmetro esse
aluno usou para chegar à conclusão de que alguém parece ou não uma pro-
14
Representações sobre a docência: a construção da identidade profissional
[...]
1
Criança Meu Amor é um livro de literatura infantil publicado em 1924, quando a autora tinha apenas 23 anos. O livro foi adotado nas escolas
do Rio de Janeiro, Pernambuco e Minas Gerais nas décadas de 1920 e 1930.
15
Docência no Ensino Superior
II – Durante o dia todo, a professora pensa em mim, pensa no que sou, pensa no que hei
de ser.
Ela deseja ver-me instruído e bom; e para isso trabalha. Não conhece cansaço, porque não
tem tempo de descansar. Não conhece doenças, porque não pode adoecer. Quem zelaria
por nós?
Não conhece diversões. Que tempo de se divertir, se ela vive pensando em nós, se ela vive
para nós, unicamente para nós!
A professora é a minha proteção e o meu guia. Devo amá-la e respeitá-la como se fosse
também minha mãe. (MEIRELES, 1924, p. 68)
16
Representações sobre a docência: a construção da identidade profissional
O que é o burnout
A crise de identidade vivida atualmente pelos professores tem sido levada
a situações extremas, tal como o desenvolvimento da síndrome de burnout,
cada vez mais comum entre esses profissionais. Esse distúrbio se caracteriza
pela desmotivação, ou melhor, pela “perda do brilho” e pela desistência pro-
fissional, como veremos a seguir.
A síndrome do burnout
(CANTONE, 2006)
17
Docência no Ensino Superior
18
Representações sobre a docência: a construção da identidade profissional
Memória, autobiografia
e histórias de vida
Como uma possibilidade concreta de pensar sobre a profissão docente,
alguns teóricos têm desenvolvido o método autobiográfico de formação con-
tinuada que consiste em refletir sobre o processo pelo qual ele se tornou pro-
fessor, ou seja, sobre o desenvolvimento de seu próprio processo identitário.
Para responder a tais questões, ele deve refletir sobre suas práticas, a in-
tencionalidade do ato educativo, seus valores, suas crenças, ou seja: o seu de-
senvolvimento profissional está associado ao seu desenvolvimento pessoal.
19
Docência no Ensino Superior
Esse movimento ganhou força no Brasil a partir dos anos de 1990, muito
influenciado por produções europeias como a do destacado educador portu-
guês Antonio Nóvoa (1995b). O uso que esse autor faz de algumas narrativas
de professores e de certos relatos autobiográficos permite que se compreen-
da como o professor pode construir sua autoimagem influenciado pelos anos
de exercício de magistério. Como afirma este autor, essa espécie de balan-
ço deve ser feita por todos os professores para que compreendam sob uma
perspectiva mais ampla a lógica que há subentendida em todo seu processo
de formação.
Portanto, em sua obra, Nóvoa (1995b) nos convida a pensar sobre as nossas
próprias questões e propõe a construção de um profissional reflexivo, que
rejeita as metáforas identitárias a que muitos docentes se submetem. Para
descobrirem quem realmente são, os professores não devem buscar amparo
em um discurso de valorização profissional de outras épocas. De acordo com
as palavras do educador português:
A defesa de uma maior autonomia do professorado não se baseia numa qualquer visão
nostálgica da profissão docente, isto é, numa tentativa de reconquista de um qualquer
“paraíso perdido”. Bem pelo contrário, esta defesa é uma aposta de futuro, que anuncia o
fim de um ciclo na história da profissão docente, um ciclo marcado pela subordinação do
professorado a outras instâncias e a outros grupos sociais. (NÓVOA, 1991, p. 528)
20
Representações sobre a docência: a construção da identidade profissional
Aspectos positivos:
amizade;
confiança;
exemplo;
Aspectos negativos:
traumas;
humilhações;
Para finalizar, vamos apreciar a leitura de uma reflexão tão pessoal escrita
por Paulo Freire, renomado educador brasileiro, que tão bem ilustra o método
autobiográfico aqui discutido. O texto faz parte de uma coletânea de peque-
nos textos do autor, escritos no decorrer de 1992 ou proferidos em palestras
e publicados sob a forma de livro, cujo título é Política e Educação (FREIRE,
2001). São textos reflexivos, que retratam a experiência política-pedagógica
do autor.
21
Docência no Ensino Superior
Texto complementar
22
Representações sobre a docência: a construção da identidade profissional
Atividades
1. Segundo Antonio Nóvoa (1995b), os professores vivem uma crise de
identidade. Explique essa afirmação.
23
Docência no Ensino Superior
Nesta atividade, você deve escrever um breve relato sobre sua traje-
tória escolar e refletir sobre as influências que recebeu e as marcas
deixadas na sua vida pessoal e profissional.
Dicas de estudo
Esses três filmes narram histórias docentes, a partir dos quais você poderá
compreender melhor o mito do professor-herói abordado nesta aula.
SOCIEDADE dos Poetas Mortos. Direção de Peter Weir. Abril Vídeo. EUA,
1989. (129min.).
24
Representações sobre a docência: a construção da identidade profissional
25
Docência no
Ensino Superior
Paulo Freire
Ação docente e a
construção de competências
Independentemente de todas as representações sobre a profissão docente,
podemos afirmar que uma competência fundamental para o professor é saber
ensinar. Logo, isto é algo que se aprende e esse aprendizado se dá nos cursos
de formação docente e também no exercício profissional. Saímos dos cursos
universitários com a certificação de estarmos qualificados profissionalmente.
Contudo, é no exercício da docência, na prática da sala de aula, que nos torna-
mos professores. Estamos constantemente nos fazendo e refazendo.
A epígrafe desta aula nos apresenta importantes elementos para uma re-
flexão inicial. “Não há docência sem discência”, ensinou-nos Paulo Freire. A
relação entre ensino e aprendizagem é estabelecida sempre entre sujeitos,
ou seja, pessoas dotadas de vontade, que interagem e participam ativamen-
te do processo. Quando eu ensino, também aprendo; e quando aprendo,
também ensino. O aluno não é um objeto, não é um ser passivo no qual o
Docência no Ensino Superior
professor deposita todo seu conhecimento: ele é um sujeito que quer ou não
quer aprender.
Francisco Imbernón
28
Docência no Ensino Superior
29
Docência no Ensino Superior
Competências docente
Todo esse processo de inovação pedagógica acaba por se refletir na ativi-
dade do professor, pois desse profissional será exigido o papel que vai além
do mero transmissor de conhecimentos: ele precisará dar subsídios aos seus
alunos para que desenvolvam suas respectivas competências.
trabalhar em equipe;
31
Docência no Ensino Superior
Competências relativas
à formação continuada do professor
Dessas competências, é importante destacar aqui a necessidade de o do-
cente refletir continuamente sobre os desafios postos ao seu exercício pro-
fissional. Essas competências passam pelas questões das novas tecnologias
como ferramenta fundamental do trabalho pedagógico; pelos dilemas éticos
da profissão, visto que trabalhamos com seres humanos em formação; e
chegam à necessidade e à responsabilidade de professor administrar a sua
própria formação continuada.
A primeira aula pode “lavar” o professor recentemente saído da escola normal de todas
as suas ilusões e ambições. Isso significa que a sua formação não teve em conta as condições
efetivas da prática, que lhe falamos de uma escola que não existe.
Philippe Perrenoud
32
Docência no Ensino Superior
Uma vez que a formação inicial não é absoluta, completa, ela deve se or-
ganizar a partir de escolhas conscientes, definindo prioridades na formação
dos professores. Deve basear-se em situações cotidianas e refletir sobre as
angústias e anseios comuns ao professor iniciante.
33
Docência no Ensino Superior
Como uma alternativa àqueles que fizeram tais cursos e desejam lecionar
o conhecimento que apreenderam ao longo de sua trajetória acadêmica, há
a formação continuada de docentes, um importante estágio de desenvolvi-
mento profissional.
34
Docência no Ensino Superior
Prática reflexiva
e a profissionalização docente
Se queremos um aluno crítico reflexivo, é preciso um professor crítico reflexivo.
35
Docência no Ensino Superior
Vale notar que a atividade de reflexão deve ser desenvolvida desde a for-
mação inicial do docente – a qual deve, portanto, fornecer instrumentos ao
indivíduo para que continue sua aprendizagem mesmo após ter terminado
seus cursos na universidade.
Assim, podemos afirmar que a prática reflexiva não deve ser episódica e
nem casual, mas um método permanente que valorize os saberes emergidos
da prática pedagógica.
Observa-se então um caminho a ser trilhado para que se alcance uma for-
mação de excelência para o aluno. O aluno reflexivo será formado por um
professor reflexivo em uma escola reflexiva. Esta é, portanto, uma formação
que busca a coerência ao ser expressa em ações conjuntas e coordenadas.
O resultado final de tal processo deve ser uma mudança na aprendizagem
do aluno, mas para que isso ocorra é fundamental que todos os envolvidos
36
Docência no Ensino Superior
pensem sobre sua missão. Segundo Isabel Alarcão (2004, p. 79), ou a “escola é
uma comunidade reflexiva, ou então, é um edifício sem alma”. Assim, o papel
da instituição educativa é colocado em evidência: é ela que vai propiciar ou
não espaços para a reflexão.
Texto complementar
A prática reflexiva
como domínio da complexidade
(PERRENOUD, 2007)
37
Docência no Ensino Superior
38
Docência no Ensino Superior
seja mais realista imaginar que uma formação contínua bem pensa-
da dará novas receitas quando as antigas “não funcionarem mais”;
o professor deve tornar-se alguém que concebe sua própria prática
para enfrentar eficazmente a variabilidade e a transformação de suas
condições de trabalho.
Sem entrar aqui na questão dos processos de formação pela prática re-
flexiva (estudo de caso, análise de práticas, discussões, escrita clínica, por
exemplo), cabe sublinhar que ela exige vários tipos de capitais:
39
Docência no Ensino Superior
Atividades
1. Realize uma entrevista com um professor universitário guiando-se
pelo roteiro abaixo. Analise as respostas obtidas tendo em vista as
discussões desenvolvidas durante essa aula sobre formação docente.
Essa atividade pode ser realizada em grupo ou individualmente, a cri-
tério dos alunos. Depois, recomenda-se que os alunos tenham tempo
suficiente para discutirem entre si as conclusões a que chegaram rea-
lizando tal atividade.
2. Questões:
40
Docência no Ensino Superior
41
Docência no Ensino Superior
42
Docência no Ensino Superior
Não basta que uma peça de vestuário esteja bem cortada, que tenha
cores bonitas e um tecido agradável. É necessário que resista à lavagem!
43
Docência no Ensino Superior
4. Elabore uma reflexão pessoal (que pode incluir menção a alguma ex-
periência vivida) sobre os seus principais anseios e suas expectativas
em relação à docência universitária. Reflita sobre como a formação
continuada pode auxiliá-lo na superação das dificuldades iniciais.
Dica de estudo
Em sua obra Vidas de Professores, Antonio Nóvoa (1995b) nos mostra
com profundidade o modo como a docência toma um espaço signifi-
cativo na vida do professor. A presente obra pretende chamar a aten-
ção para as vidas dos professores, que constituíram, durante muitos
anos, uma espécie de “paradigma perdido” da investigação educacio-
nal. Hoje sabemos que não é possível separar o eu pessoal do eu pro-
fissional, sobretudo numa profissão fortemente impregnada de valores
e de ideais e muito exigente do ponto de vista do empenhamento e da
relação humana. Como descreve Jennifer Nias: “O professor é a pessoa;
e uma parte importante da pessoa é o professor”.
44
Docência no Ensino Superior
45
Avaliação de aprendizagem:
representações e concepções
Charles Hadji
Como se aprende?
48
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
– O Fulano está em sua turma neste ano? Nossa! Você vai sofrer um bocado.
Ele é indisciplinado, desinteressado, não completa as tarefas, não estuda,
parece que quer apenas o diploma...
Muitas vezes, observações dessa natureza são suficientes para que o pro-
fessor que ainda não conhece a turma se influencie e, antes até de ter contato
com seus alunos, já tenha construído uma imagem sobre eles.
A profecia autorrealizadora
(OLIVEIRA, 2007)
49
Docência no Ensino Superior
Tais profecias são elaboradas não apenas devido à influência que recebe-
mos externamente: nós mesmos nos predispomos a atitudes preconceituo-
sas quando julgamos nossos alunos pela forma como se vestem, pela classe
social de que provêm ou pela forma como falam.
50
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
Assim, olhando para o quadro descrito, fica claro que a avaliação do de-
sempenho do aluno é muito mais do que aplicação de instrumentos, aferição
de conteúdos e atribuição de notas.
51
Docência no Ensino Superior
Abordagem da avaliação
no contexto da aprendizagem
Para entendermos onde se insere a avaliação no contexto da aprendiza-
gem, vamos retomar o seguinte questionamento:
52
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
Nesse sentido, faz-se necessária uma revisão que passe por um debate
mais amplo, refletindo sobre:
O que ensinar?
53
Docência no Ensino Superior
Avaliação normativa:
características da avaliação classificatória
Antes de iniciar a discussão sobre a avaliação normativa, é importante que
se analise o quadro abaixo e se observe o ensino e suas dimensões:
ENSINO
COMO,
QUANDO E O
QUE AVALIAR
54
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
medir (nota/conceito);
selecionar (aprovação/reprovação).
[...]
coisa.
ímpar.
55
Docência no Ensino Superior
– Tirei A.
– Descobri que minha vida ficava bem mais fácil quando as pessoas não esperam grande
coisa de mim. (PERRENOUD, 1999, p. 42)
56
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
A ideia de que se pode medir qualquer tipo de aprendizagem e de que avaliar é algo
“técnico”, “preciso”, “objetivo” e inclusive “científico” aparece como pano de fundo de
determinadas concepções de alguns professores sobre avaliação.
Conclusão
A ideia de que a avaliação deve auxiliar o aluno a aprender deve ser priori-
zada nas discussões sobre avaliação da aprendizagem. Há que se considerar
que nada muda de um dia para o outro. Nossas representações e convicções
sobre a avaliação perduram e se cristalizam em nossas mentes e se traduzem
em nossas atitudes pedagógicas.
57
Docência no Ensino Superior
Texto complementar
Que a avaliação possa auxiliar o aluno a aprender não é uma ideia nova.
Desde que a escola existe, pedagogos se revoltam contra as notas e
querem colocar a avaliação mais a serviço do aluno do que do sistema.
Essas evidências são incessantemente redescobertas, e cada geração crê
que “nada mais será como antes”. O que não impede a seguinte de seguir
o mesmo caminho e de sofrer as mesmas desilusões.
58
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
Atividades
1. Leia com atenção o texto complementar e, em seguida, estabeleça
relação entre o que diz o autor e as representações sobre avaliação
abordadas no capítulo. Para fazer essa relação, responda à pergun-
ta abaixo.
59
Docência no Ensino Superior
60
Avaliação de aprendizagem: representações e concepções
Dicas de estudo
Na obra Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens,
Philippe Perrenoud nos mostra a complexidade do problema da ava-
liação, apontando seus antagonismos. O autor demonstra que a avalia-
ção está no âmago das contradições do sistema educativo e, constan-
temente na articulação da seleção e da formação, do reconhecimento
e da negação das desigualdades.
61
Avaliação e aprendizagem:
o sentido da transformação
Avaliação criteriada:
os lugares da avaliação na formação
O que é avaliação criteriada?
Avaliação diagnóstica
É diagnóstica (ou inicial) toda avaliação que afere os processos já percor
ridos pelos alunos no decurso da aprendizagem.
64
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
Avaliação formativa
É formativa toda avaliação que colabora com a aprendizagem. Em relação
ao lugar ocupado na formação do aluno, a avaliação formativa coloca-se no
centro do processo. Segundo Jorba e Sanmartí (2003, p. 30),
A avaliação durante o processo de aprendizagem ou avaliação formativa é um termo
introduzido em 1967 por M. Scriven para se referir a procedimentos utilizados pelos
professores para adaptar seu processo didático aos progressos e necessidades de
aprendizagem observados em seus alunos.
65
Docência no Ensino Superior
Desse modo, uma avaliação não deixa de ser formativa porque se apresen-
ta sob o instrumento de testes de múltipla escolha, nem se configura como
formativa porque o instrumento não é objetivo e permite que o aluno “se
coloque mais” na avaliação. Pode-se realizar avaliação de intenção formativa
inclusive sem o uso de instrumentos: é o posicionamento diante do ato de
avaliar e o desenvolvimento do processo avaliativo que tornam a avaliação
formativa ou não.
66
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
Assim, como seu objetivo principal, ela não só informa ao aluno o seu
percurso escolar mas também tem a função social de garantir que a forma-
ção desenvolvida corresponda às exigências sociais.
67
Docência no Ensino Superior
68
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
Critérios de realização
São regras a respeitar, procedimentos, atos concretos.
Critérios de êxito
Esses critérios determinam os limites da aceitabilidade das tarefas de ava-
liação. Hadji (2001, p. 89) descreve o que considera para o estabelecimento
de critérios de êxito:
[...] pertinência do resultado [...]; sua completude, sua exatidão; sua originalidade e,
enfim, precisa Georgette Nunziati [...] o “volume dos conhecimentos e das ideias em
questão”. A determinação dos critérios de êxito exige que o avaliador saiba o que queria
verificar por intermédio dessa tarefa [...]”
calcular o material;
69
Docência no Ensino Superior
colocar em um molde;
Como propõe Hadji (2001, p. 90), “Deve-se precisar de que ponto de vista
se aprecia o êxito: por exemplo, a exatidão ou a originalidade da produção;
ou então a impressão esteticamente produzida”.
70
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
Conclusão
O texto procurou desenhar um cenário de avaliação capaz de reforçar a
defesa da relação entre avaliação e aprendizagem.
71
Docência no Ensino Superior
72
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
Texto complementar
O gosto e as cores
(BUCKLEY, 2000, p. 79)
Um dia, um menino partiu para a escola. Ele era ainda bem pequeno, e
a escola era bem grande. Porém, quando o menino descobriu que podia
chegar à sua sala entrando diretamente pela porta do pátio, ficou conten-
te. E a escola já não parecia mais tão grande.
Mas a professora disse: “Esperem! Não é para começar ainda!” E ela es-
perou até que todo mundo parecesse pronto. “Agora”, disse a professora,
“nós vamos fazer flores”. “Legal”, pensou o menino. Ele gostava de dese-
nhar flores. E começou a fazer magníficas flores com seus lápis cor-de-
-rosa, laranja e azul.
Mas a professora disse: “Esperem! Eu vou mostrar como fazer!” E ela fez
uma flor vermelha com um caule verde. “Aí está”, disse ela, “agora, vocês
podem começar.”
73
Docência no Ensino Superior
[...]
Quando chegou perto do menino, ela disse: “Você não quer fazer um
desenho?” “Sim”, disse o menino, “o que nós vamos fazer?” “Não sei antes
que você o faça”, disse a professora. “Como eu vou fazer esse desenho?”,
perguntou o menino. “Oh, como você quiser!”, disse a professora. “De
qualquer cor. Se todo mundo fizesse o mesmo desenho, como eu saberia
quem fez o quê?”
“Eu não sei”, disse o menino. E começou a fazer uma flor vermelha com
um caule verde.
Atividades
1. Leia o texto complementar e discuta o limite entre o papel educativo e
o abuso de poder na escola, estabelecendo relação com a avaliação.
74
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
75
Docência no Ensino Superior
Depois de ler esse trecho, responda: o que você propõe que se mude
na escola para que, por consequência, também mude a avaliação?
Dica de estudo
Para esta aula, propomos uma reflexão trazida pelo filme O Clube do Im-
perador (The Emperor’s Club, EUA, 2002), dirigido por Michel Hoffman. A
história aborda o papel da avaliação, no contexto de uma escola para ra-
pazes. Aborda também aspectos importantes relacionados a formas de
avaliar, critérios e notas. Sua análise é interessante para a compreensão
dos processos de ensino, de aprendizagem e – sobretudo – de avaliação.
76
Avaliação e aprendizagem: o sentido da transformação
77
Gestão do trabalho pedagógico:
os professores como
planejadores
Isilda Louzano Perez
O grande desafio que se impõe à Educação, neste novo século, é o da
complexidade. Hoje, o conhecimento ultrapassa o limite da compreensão e
da assimilação e exige dos professores o planejamento da ação didática para
além da dimensão cognitiva. A exigência que se faz é a de inserir a dimensão
da Cultura no ato de planejar, o que implica um novo posicionamento em
relação ao sentido e ao significado do conhecimento.
80
Gestão do trabalho pedagógico: os professores como planejadores
Dimensões da organização
do trabalho pedagógico
Para que se compreenda as dimensões da organização do trabalho pe-
dagógico na escola, é interessante que antes se definam os planos, isto é, os
níveis em que a atividade escolar se insere. Esses planos são definidos por
Philippe Meirieu (2005) como:
plano antropológico;
plano político;
plano didático;
plano pedagógico.
82
Gestão do trabalho pedagógico: os professores como planejadores
83
Docência no Ensino Superior
É preciso que cada vez mais se tenha a clareza de que a sala de aula tra-
balha não só com o conhecimento produzido, mas também produz conhe-
cimento na medida em que a organização do trabalho pedagógico assim o
permita.
Nesse caso, a sala de aula e suas interações passam a produzir novos co-
nhecimentos, decorrentes da prática refletida, avaliada e modificada. Nas pa-
lavras de Garrido,
Houve um tempo em que a pesquisa se debruçou sobre o ensino. Tomou consciência
das insidiosas e ocultas interferências do poder, minando as relações entre os diferentes
atores no dia-a-dia da escola. A perspectiva do professor reflexivo/investigativo abre a
possibilidade para a transformação da escola num espaço de desenvolvimento pessoal,
profissional e organizacional aberto a projetos emancipatórios. Que esta via também nos
permita vislumbrar na vivência da sala de aula e nos ambientes escolares “o máximo de
sabor possível”. (GARRIDO, 2001, p. 139)
84
Gestão do trabalho pedagógico: os professores como planejadores
85
Docência no Ensino Superior
A aula tem que ser percebida como uma síntese complexa, não podendo
ser resumida em um documento chamado plano de aula ou plano de ensino.
E, como síntese complexa, ela traz em si o conteúdo da reflexão crítica que
permeia todas as instâncias que planejam a educação, convergindo para as
ações de ensino e de aprendizagem que dão sentido e definem a própria
função da escola. E é importante lembrar que o planejamento define a atitude
crítica dos professores diante da educação, do ensino e da aprendizagem. Na
definição de Fusari, planejamento é “a atuação concreta dos educadores no
cotidiano do seu trabalho pedagógico, envolvendo as suas ações e situações,
o tempo todo; envolvendo a permanente interação entre educadores e os
próprios educandos” (FUSARI, 1989, p. 10).
Planejamento educacional
Nesta acepção, o planejamento é compreendido como a reflexão neces-
sária para a organização do sistema de educação, em seus diferentes níveis –
nacional, estadual ou municipal. Pressupõe a determinação de objetivos, es-
tratégias e avaliação voltados para a consecução das políticas educacionais.
Planejamento curricular
É a dimensão do planejamento da dinâmica da ação escolar, em qualquer
nível de ensino. O planejamento curricular é “a proposta geral das experiências
de aprendizagem que serão oferecidas pela escola, incorporada nos diversos
componentes curriculares” (VASCONCELLOS apud PADILHA, 2003, p. 33).
Planejamento de ensino
É a efetiva ação dos educadores, no dia-a-dia da prática docente. Remete
a aspectos da interação entre professor e aluno nas atividades de ensino e
aprendizagem.
Planejamento escolar
Refere-se ao planejamento geral da escola; às tomadas de decisão sobre a
organização e o funcionamento da escola e à implementação coletiva do seu
projeto pedagógico.
87
Docência no Ensino Superior
Planejamento didático
Constitui-se nas definições em relação ao desenvolvimento das aulas, no
que se refere aos objetivos, conteúdos, metodologias e avaliação. Diz respei-
to às ações organizativas de um curso, de uma área, de uma disciplina ou de
uma aula.
Plano escolar
É o documento-síntese, resultado do planejamento da escola como um
todo. Articula o projeto pedagógico da escola com os planos de ensino dos
professores.
Plano de curso
É um documento que orienta a trajetória individual e coletiva dos edu-
cadores, registra a essência do currículo e expressa a proposta pedagógica
do curso.
Plano de ensino
É o documento elaborado pelos professores, registrando a sua proposta
de trabalho para uma área ou disciplina, devendo refletir o processo de pla-
nejamento como um todo.
88
Gestão do trabalho pedagógico: os professores como planejadores
89
Docência no Ensino Superior
Texto complementar
90
Gestão do trabalho pedagógico: os professores como planejadores
Atividades
1. Leia com atenção o trecho abaixo, retirado do texto. A seguir, descreva
como o plano de ensino elaborado pelo professor pode refletir memó-
ria, valores e inovações.
91
Docência no Ensino Superior
92
Gestão do trabalho pedagógico: os professores como planejadores
Dica de estudo
Para aqueles que desejarem se aprofundar no tema desta aula, suge-
rimos a leitura de Gimeno Sacristán (1998), que discute o projeto edu-
cativo da escola fazendo uma análise interessante e rica sobre planeja-
mento curricular.
93
A definição de objetivos
e conteúdos
De modo breve, pode-se dizer que a pedagogia frontal se sustenta nas prá-
ticas tradicionais de ensino, em que o professor é considerado o detentor e o
transmissor do conhecimento ao aluno, que é considerado tábula rasa, isto
é, destituído de conhecimentos anteriores. A pedagogia frontal compreende
que a escola, tanto básica como superior, imprime no aluno a base de conheci-
mento de que ele necessita para a sua formação. É uma concepção que coloca
força na transmissão de conhecimentos, na sabedoria do professor diante da
ignorância do aluno, na verticalização das relações entre professor e aluno.
Docência no Ensino Superior
E se o aluno não é uma tábula rasa, o trabalho escolar deve ser planejado le-
vando isso em consideração, levando em conta as diferenças, pois “diferenciar
o ensino é fazer com que cada aprendiz vivencie, tão frequentemente quanto
possível, situações fecundas de aprendizagem” (PERRENOUD, 2000, p. 9).
à construção de conhecimentos;
96
A definição de objetivos e conteúdos
o que se pretende;
Tipologia de conteúdos:
conceituais, atitudinais e procedimentais
A abordagem dos conteúdos de ensino – a seleção que os professores
fazem em relação ao que determinada disciplina/área tem de fundamental
– implica a consideração de uma tipologia que classifica os conteúdos em
conceituais, atitudinais e procedimentais, garantindo a visão da área sobre a
qual se trabalha.
E ainda que cada um desses tipos tenha a sua especificidade, eles não são
estanques e indissociados. Além do que, sempre eles devem ser estabeleci-
dos a partir de contextos que definam:
O que são?
100
A definição de objetivos e conteúdos
Conteúdos conceituais
O conhecimento das diferentes disciplinas ou áreas de conhecimento
pressupõe um conjunto de dados e fatos. Precisa-se de uma base de dados
para se ter a visão da disciplina e a visão da área que a constitui. Porém, não
basta que se tenha à mão uma boa base de dados: é necessário que se saiba
compreendê-la e interpretá-la.
101
Docência no Ensino Superior
Como explica Coll, os fatos e os dados são do tipo “tudo ou nada”, ou seja,
sabe-se ou não sobre determinado fato, não há a possibilidade de se saber
mais ou menos. Por sua vez, o conceito, para ser compreendido, depende de
experiências anteriores que devem ser ativadas e ligadas a novas aprendiza-
gens. Assim, “a compreensão não é algo branco ou preto, como a reprodução
de um nome ou de um dado, mas admite muitos tons de cinza intermediá-
rios” (POZO, 2000, p. 27). Aprender significativamente é diferente de aprender
por apelo à memória, conforme distingue o quadro abaixo.
Esforço deliberado para relacionar os no- Nenhum esforço para integrar os novos co-
vos conhecimentos com os conhecimen- nhecimentos com os conhecimentos já exis-
tos já existentes na estrutura cognitiva. tentes na estrutura cognitiva.
102
A definição de objetivos e conteúdos
103
Docência no Ensino Superior
Conteúdos procedimentais
Como se pode definir o que são procedimentos? Na verdade, procedimen-
tos são ações ordenadas que têm como objetivo a realização de determinadas
ações. Segundo César Coll e Enric Valls (2000, p. 77), os traços característicos
de todo procedimento são:
1
Diretrizes Curriculares da Educação Básica espanhola.
104
A definição de objetivos e conteúdos
imitação de modelos;
Conteúdos atitudinais
Como se define o que são atitudes? A atitude é uma característica da per-
sonalidade individual, ainda que possa ser vista em função de fatores sociais:
normas, papéis, valores, crenças. Bernabé Sarabia apresenta abaixo defini-
ções de atitude segundo autores diferentes.
temperamento;
valores;
opiniões;
cognições e crenças;
hábitos;
habilidades ou inteligência.
106
A definição de objetivos e conteúdos
Não é por acaso que os conteúdos atitudinais estão incluídos nos con
teúdos escolares. Nos objetivos de todas as áreas curriculares, estão implíci-
tas determinadas atitudes esperadas e necessárias para o desenvolvimento
global do aluno.
Concluindo
Este texto objetivou colocar em discussão o significado de competências e
de habilidades, bem como a construção da tipologia dos conteúdos: concei-
tual, atitudinal e procedimental.
O que se pretende frisar é que para cada uma das situações abordadas
pelo texto é preciso que se pensem as características da organização do tra-
balho pedagógico.
107
Docência no Ensino Superior
Texto complementar
108
A definição de objetivos e conteúdos
109
Docência no Ensino Superior
Atividades
1. Na abordagem de Perrenoud, “diferenciar o ensino é fazer com que cada
aprendiz vivencie, tão frequentemente quanto possível, situações fecun-
das de aprendizagem”. Reportando-se às características da pedagogia di-
ferenciada, como se pode explicar o conteúdo do trecho anterior?
110
A definição de objetivos e conteúdos
Dica de estudo
Uma leitura ao documento introdutório dos Parâmetros Curriculares
Nacionais – MEC/SEF, 1997 – pode auxiliar na compreensão do signi-
ficado não só dos conteúdos de ensino, mas da própria concepção da
orientação curricular no sistema brasileiro de ensino. É recomendável
essa aproximação.
111
Metodologias de ensino
conceituais;
atitudinais;
procedimentais.
114
Metodologias de ensino
Visão de conhecimento
Definição de conteúdos
Contextos pré-configurados
115
Docência no Ensino Superior
116
Metodologias de ensino
117
Docência no Ensino Superior
O que este texto passa a abordar agora são essas particularidades da ti-
pologia dos conteúdos, mas sempre para localizá-los na aprendizagem, não
perdendo de vista a unidade de conhecimento que deve ser respeitada.
118
Metodologias de ensino
atividades expositivas.
Conteúdos procedimentais
Os conteúdos procedimentais referem-se ao saber-fazer e trazem consigo
a ideia de desenvolvimento de habilidades específicas e próprias requeridas
por situações também específicas e próprias.
119
Docência no Ensino Superior
Conteúdos atitudinais
Entende-se por conteúdos atitudinais a série de conteúdos que agrega va-
lores, atitudes e normas.
120
Metodologias de ensino
É ainda relevante frisar que a postura mental dos alunos deve incorporar a
ideia de que o como se desenvolvem os conteúdos depende de um o quê os
121
Docência no Ensino Superior
define. Isso pode ficar bem esclarecido nos contratos de aprendizagem – que,
segundo Meirieu, concretizam-se em dois níveis, conforme abaixo.
O autor considera essa fórmula para fazer com que os alunos trabalhem,
interessando-se pelas aulas e dando o salto qualitativo na aprendizagem.
do trabalho pedagógico. Sem dúvida, todos esses recursos podem ser de ex-
trema importância para o desenvolvimento do processo de ensino e aprendi-
zagem, desde que se apresentem integrados à elaboração do planejamento,
aos momentos de intervenção, à avaliação, às peculiaridades dos conteúdos
das aulas e às metodologias selecionadas.
123
Docência no Ensino Superior
Sobre a seleção e o uso de recursos, é importante frisar que deve ser evi-
tada a banalização, isto é, o uso indiscriminado e sem alinhamento ao racio-
cínio pedagógico do professor quanto à organização das aulas, ou a super-
valorização, isto é, a crença de que sem recursos sofisticados não é possível o
desenvolvimento de um trabalho pedagógico de qualidade: os recursos têm
as suas aplicações e devem ser selecionados e utilizados de forma apropria-
da, no contexto da organização do trabalho pedagógico .
124
Metodologias de ensino
É importante que a sala de aula seja vista a partir das relações entre as in-
tenções formativas e os meios para concretizar a aula. Compreender os novos
125
Docência no Ensino Superior
A situação-problema
Particularmente, o texto traz à discussão a metodologia da elaboração de
problema, não para colocá-la pura e simplesmente como um modelo, mas
como a exemplificação de uma metodologia que trabalha a favor da reflexão
crítica, do raciocínio, da análise, da síntese, das propostas de encaminhamen-
tos – todos elementos que colaboram no desenvolvimento de competências
e habilidades. Não é um modelo, no sentido reprodutivo do termo, mas pode
ser validado como referencial no sentido do que Meirieu (1998, p. 168) apre-
senta como “validade de um modelo”:
A validade de um modelo se deve, na realidade, a três elementos indissociáveis: a
qualidade do projeto ético que o inspira (o que se gostaria que fosse o sujeito educando);
sua conformidade – ou, pelo menos, sua não-contradição – como aportes das ciências
humanas (o que se sabe do sujeito tal como é) e a fecundidade de sua ação (o que se pode
fazer com ele para que o sujeito que é se torne o que se gostaria que ele fosse).
[...] o educador, consciente do fato de que explicar uma coisa a outrem é o melhor meio de
impedi-lo de encontrar por si só, assume a tarefa de inventar situações que impõem que
ele se aproprie das soluções necessárias; o sujeito se vê aí, de certa forma, obrigado a usar
a sua inteligência.
127
Docência no Ensino Superior
instruções-alvo;
busca do objetivo;
avaliação do processo.
Qual é o meu objetivo? O que quero fazer com que o aluno adquira e
que para ele representa um patamar de progresso importante?
Que tarefa posso propor que requeira, para ser realizada, o acesso a
esse objetivo (comunicação, reconstituição, enigma, ajuste, resolu-
ção etc.)?
Texto complementar
Atividades
1. Leia a afirmação no box abaixo:
130
Metodologias de ensino
131
Docência no Ensino Superior
Dica de estudo
Uma dica interessante em relação a metodologias é você assistir ao vi
deoclip do Pink Floyd, The Wall, no capítulo em que um professor tradicional
desenvolve a sua aula e comparar essa cena a outras do filme Escritores da
Liberdade (Freedom Writers, EUA, 2007), em que a professora assume uma
conduta metodológica completamente diferente. São bons exemplos para
comparação e análise de metodologias e posturas de professores.
132
Metodologias de ensino
133
Projeto: um salto
qualitativo na organização
do trabalho pedagógico
Isilda Louzano Perez
Antes de abordar os projetos como forma de organização do trabalho pe-
dagógico, é importante fundamentar a discussão sobre os princípios teóricos
e epistemológicos que sustentam a elaboração de projetos dessa natureza.
O termo complexus significa o que tece junto. Por isso, o pensamento com-
plexo é compreendido como aquele que distingue sem separar, aquele que
contextualiza, globaliza, abstrai. Edgar Morin (2005) apresenta os princípios
para se pensar a complexidade, que explicitam o necessário movimento da
“religação” do conhecimento:
136
Projeto: um salto qualitativo na organização do trabalho pedagógico
Interdisciplinaridade
Um conceito bastante próximo à ideia de disciplina vista aqui é a visão de
conhecimento a partir de um processo integrador e dialógico. Implica a mu-
dança de atitude diante do conhecimento: agir e pensar interdisciplinarmente
é substituir a visão fragmentada do conhecimento e do próprio ser humano
por uma visão unitária e integradora. Em relação à atitude interdisciplinar,
Ivani Fazenda (1999, p. 43) diz que “Por atitude interdisciplinar entendo algo
que não pode ser apenas explicado, porém vivido; que não pode ser apenas
analisado, porém sentido, que não pode ser apenas refletido, porém intuído”.
Transdisciplinaridade
A transdisciplinaridade é “a abertura de todas as disciplinas ao que as une
e as ultrapassa” (artigo 3, Carta da transdisciplinaridade – <www.unipazrj.
org.br/transdisciplinaridade.htm>). Pode-se apontar as grandes questões da
transdisciplinaridade a partir dos princípios constituintes da “Carta da trans-
disciplinaridade” (LIMA DE FREITAS, MORIN e NICOLESCU, 1994). Segundo
esse documento, a visão transdisciplinar é incompatível com:
unidimensionalidade da realidade;
137
Docência no Ensino Superior
Concepção e fundamentos
A concepção de pedagogia de projetos data do início do século XX, emba-
sada nas ideias do educador americano John Dewey. Naquele momento, as
questões sobre projetos eram discutidas a partir da premissa de que a “edu-
cação é vida” e não uma mera preparação para a vida. Portanto, a concretude
da realidade cotidiana deveria se fazer presente nos currículos escolares.
138
Projeto: um salto qualitativo na organização do trabalho pedagógico
139
Docência no Ensino Superior
Atividade docente
A necessidade da elaboração de projetos surge de um novo olhar sobre o
conhecimento, isto é, uma visão mais globalizada e abrangente. Isso implica
na mudança de atitudes não só do ponto de vista do currículo, mas de práti-
cas e posturas do professor e do aluno.
140
Projeto: um salto qualitativo na organização do trabalho pedagógico
141
Docência no Ensino Superior
3. Seleciona os conceitos, e
procedimentos para os quais
prevê tratamento no projeto.
9.Preestabelece atividades.
142
Projeto: um salto qualitativo na organização do trabalho pedagógico
16. Autoavaliação.
Texto complementar
144
Projeto: um salto qualitativo na organização do trabalho pedagógico
finalizando minha tese. Leio tudo sobre o assunto. Tenho até um site na
internet, estou plugado no assunto. Sem extrair vesículas, minha vida
profissional não teria o menor sentido…
– Mas, diga-me uma coisa, doutor, e seus pacientes? Estavam com pro-
blemas de vesícula? Era necessário extraí-la?
– Ora, doutor, sua pergunta é irrelevante. Sei lá se estavam ou não com
problemas de vesícula. Isso é um detalhe clínico, o que importa é que fiz
lindas cirurgias e isso só pode engrandecer meu currículo e, é claro, seu
hospital. E agora, se o senhor me permite, estou correndo para uma cirur-
gia. Chegou uma nova paciente e com uma vesícula novinha em folha…
Atividades
1. Reflita sobre a afirmação abaixo.
145
Docência no Ensino Superior
146
Projeto: um salto qualitativo na organização do trabalho pedagógico
Dica de estudo
No livro A Organização do Currículo por Projetos de Trabalho, os autores
Hernandez e Ventura retratam a realidade da Escola Pompeu Fabra, de
Barcelona. Vale a pena conferir nessa leitura, como a escola foi – na prá-
tica e a partir de princípios teóricos – organizando-se rumo aos proje-
tos de trabalho. Trata-se de uma experiência muito interessante de ser
analisada e, por que não, ser vista como uma referência.
147
Pedagogia de projetos:
fundamentos para uma
prática reflexiva
Isilda Louzano Perez
Caracterizada pela complexidade, a sociedade em que vivemos entrecru-
za, cotidianamente, um alucinante volume de aprendizagens, traduzidas em
informações, desafios, problemas a serem abordados, comunicações a serem
estabelecidas. Tudo isso exige novas competências e habilidades dos sujeitos
para gerenciar todas essas informações. Esse tipo de gestão exige, por sua
vez, uma revisão dos contextos formativos em que se dá a educação.
Como diz Isabel Alarcão (2004, p. 14), “o mundo, marcado por tanta rique-
za informativa, precisa do poder clarificador do pensamento”. E, para Edgar
Morin (2005), baseado no filósofo Michel Montaigne, hoje se precisa mais de
cabeças bem feitas do que de cabeças bem cheias, o que remete à exigência
do estabelecimento de uma nova ordem de pensamento, capaz de lidar com
a complexidade da sociedade global buscando a transformação da massa in-
formacional em conhecimento pertinente. E o que é esse conhecimento perti-
nente? Segundo Morin (2005), é o conhecimento que coloca a informação em
um contexto, permitindo a compreensão de seu sentido.
Gerir a escola reflexiva implica, dentre outras coisas, buscar novas alternati-
vas de formação do professor: uma escola reflexiva forma um professor reflexi-
vo. Mas quais são as características do professor reflexivo? Pimenta (2002, p. 18)
afirma “que todo ser humano reflete. Aliás, é isso que o diferencia dos demais
animais. A reflexão é atributo dos seres humanos. Ora, os professores, como
seres humanos, refletem. Então, por que essa moda de professor reflexivo?”
150
Pedagogia de projetos: fundamentos para uma prática reflexiva
151
Docência no Ensino Superior
152
Pedagogia de projetos: fundamentos para uma prática reflexiva
Aprendizagem significativa
O que é aprendizagem? Aprender é compreender e atribuir significado
à realidade e seus contextos. A aprendizagem escolar, particularmente, tem
como finalidade contribuir para a formação e a autoformação do indivíduo
para a vida em sociedade, ou, como ensina Edgar Morin (2005), a educação
deve ensinar a ser cidadão por meio de uma aprendizagem cidadã.
153
Docência no Ensino Superior
significância do material.
organizadores prévios;
diferenciação progressiva;
reconciliação integradora.
Aprendizagem colaborativa
Pode-se definir aprendizagem colaborativa como aquela em que os sujei-
tos aprendem juntos, tanto face a face (no interior de uma escola) quanto
mediados pelo computador. Em qualquer uma dessas situações, a aprendiza-
gem colaborativa tem presença na pedagogia de projetos.
Texto complementar
156
Pedagogia de projetos: fundamentos para uma prática reflexiva
[...]
Atividades
1. Relacione a afirmação abaixo com as características da sociedade
atual e também com o papel e a função da escola.
157
Docência no Ensino Superior
158
Pedagogia de projetos: fundamentos para uma prática reflexiva
Dica de estudo
Uma leitura recomendável para a compreensão da ideia de “uma esco-
la em projeto”, que, de certa forma, amplia a visão sobre o sentido dos
projetos didáticos e os insere em um contexto institucional, é a da obra:
Inovar no Interior da Escola, de Mônica Gather Thurler, Artmed, 2001.
159
Pedagogia de projetos:
da especialidade aos
conhecimentos em rede
Isilda Louzano Perez
Trabalhar a partir de projetos não significa negar a especificidade dos
campos disciplinares: a visão das áreas de conhecimento deve ser preservada
e, com ela, a cientificidade e as experiências socioculturais que caracterizam
as disciplinas. O desenvolvimento de projetos é uma das formas de flexibilizar
os campos do conhecimento; romper as rígidas fronteiras que os fragmen-
tam; buscar o diálogo entre os conteúdos das diferentes áreas, objetivando
uma visão globalizada da realidade.
Organização e desenvolvimento
de projetos: uma visão geral
Como todo procedimento de ordem didático-pedagógica, a organiza-
ção do trabalho pedagógico por projetos pressupõe o estabelecimento de
etapas de ação. Normalmente, são consideradas etapas de desenvolvimento
de projetos:
a definição do tema;
o estabelecimento de objetivos;
a escolha de metodologias;
162
Pedagogia de projetos: da especialidade aos conhecimentos em rede
163
Docência no Ensino Superior
Situação realidade A
Situação realidade B
Situação realidade C
Situação realidade D
164
Pedagogia de projetos: da especialidade aos conhecimentos em rede
Situação realidade E
É importante frisar que todo modelo é sempre uma referência e não uma
receita a ser aplicada em qualquer contexto e circunstância.
165
Docência no Ensino Superior
Sequência Descritores
166
Pedagogia de projetos: da especialidade aos conhecimentos em rede
Pedagogia de projetos:
solidez da aprendizagem
e transferência de conhecimentos
Pensar sobre a transferência de conhecimentos para situações novas
implica refletir sobre a solidez da aprendizagem. Como se pensar na trans-
ferência de conhecimento em se tratando de aprendizagens frágeis, estan-
ques e superficiais?
167
Docência no Ensino Superior
168
Pedagogia de projetos: da especialidade aos conhecimentos em rede
Texto complementar
Comprometer os alunos
em procedimentos de projeto
(PERRENOUD, 2000, p. 67-68)
169
Docência no Ensino Superior
Atividades
1. Segundo Zabala, o desenvolvimento de projetos relaciona-se com a
importância dada ao aprender a aprender e ao envolvimento do alu-
no com sua aprendizagem. Discuta essa relação.
170
Pedagogia de projetos: da especialidade aos conhecimentos em rede
171
Docência no Ensino Superior
Dica de estudo
Fernando Hernández, em entrevista à Revista Nova Escola, esclarece
os principais conceitos que envolvem a sua proposta de “Projetos de
trabalho”, no âmbito da pedagogia de projetos.
172
Pedagogia de projetos: da especialidade aos conhecimentos em rede
173