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I AS RAÍZES HISTÓRICAS
DO MERCOSUL:
A REGIÃO PLATINA COLOMAL

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L66 AS RAÍZES HiSTÓRICAS DO MERCOSUL:

MAPA 4 ., i
Caminhos dos tropeiros, ligando a regiãoplatina ao resto do Bradil
e movimentação de tropas portuguesas e espanholas no território illâ-
tino no final do Século XVIII,.inícios do KX

( ---* ) - Caminho das Missões, ligando São Borja aos Campos


deVacariaeaLaies.
( --* ) - Caminho de Cristóvão Pereira, ligando Palmares àLà-

(*x**r) - Caminho de Souza Farias, partindo de Morro dos i 4_ A REGIÃO PLATINA NOS SÉCULOS
Conventos até Lajes.
XVII E XVIII: A CULTURA POPULAR
( -..- - ) - Caminho da Praia, ligando a Colônia do Sacramento a
Rio Grande e a Laguna (7709).
( -+ ) - Marcha ofensiva deVertizy Salcedo em 1763.
Neste capítulo, focalizamos o gaúcho e sua cultura, entendendo-o
( -{ ) Exército pacificador, D. Diego de Souza (1811). Concen-
- como urn agente social que, a partir de vivências concretas, elaborou e
trou-se na região de Bagé e dali marchou por Santa Tecla até Maldonado transmitiu uma cultura específica. Nesse sentido, é visto cemo urn
e Paissandu, de onde regressou a Bagé e foi dissolvido. produtor de hábitos, costumes, valores, idéias que se formaram, se
manüveram ou se transformaram à medida que ele experirnentava
relações concretas de dominação ou de subordinação.
Sendo assim, não nos deteremos na identificação e na descrição
de maniÍestações da cultura gaúcha, como o modo d.e vestir, de comer,
seu lazer, linguagem etc. O que pretendemos é pensar o gaúcho como
agente social e que, num ambiente específico e de acordo com urna
rnentalidade, produz sua cultura.
CompÕem, este capítulo, quatro ensaios que se referem à cuitura
do gaúcho sob distintas abordagens.
O primeiro discute a fundamentação teórica que penneia o nosso
entendimento de cultura popular.
O segundo kata dos significados que as palavras ga ticho e gatdério
tiveram em diferentes momentos de sua historicidade. Nesta análise,
apontamos as relaçÕes entre a realidade concreta e o discurso icieológico
que cieram sentido a estes termos-
O terceiro aborda, em um ensaio-síntese, como e por que se
processou a formação da criltura gaúcha no período coioniài. Dástaca,
também, a resistência das camadas populares da campanha, principal-
mente mestiços e nativos, às transformações econôrniàas q,.re Àe proces-
savam na Região.
O quarto e último, através de um estudo de caso, analisa o conflito
e a'iolência que estiveram presentes na realidade da carnpanha platina,
frutos da imposição dos interesses das camadas dominantes e da resis-
tência clas subaltern as.
168 AS RAÍZES HISTÔRICAS DO MERCO§UL: A REcIÃo PLATINA CoLONIAL 169

os vazios da história deste elernento popular despossuído, rro conjunto


4.L - Cultura poPular na Região Flatina Colonial das relações sociais.
privilegiar em nosso estudo a história social e a cultura
Po,: que O, termo popular apresenta significados múltiplos e aplicações
dos grrrpoô ,nÉiri, dJminadosl da Regiào I'latina no período colonial? várias. E importa-nte, pois, que apresentemos o entendimento que temos
Focaüzar a história social das gmíns da campanha, expressão uü[i- dos conceitos cultura e "cultura popular" neste trabalho.
zada por Thompson em La formación de la clase obrera, se faz neces- De acordo mais uma vez com Thompson, agora em sua obra
sário porque histo,...iografia que se refere ao espaço platino não leva em -
a Custonts in Comtnom, há uma relação írrtirra entre costumc e culhrra.
.onsiàe.uçao particilação ã a atuação das classes dominadas como
a " Costunte, no sittgular, deue ser oisto como algo'sui generis',
como ambiàtcia
agentes sociais paúicipantes do processo de constituição da Região' São e nrcntalidade e conlo um aocabulário de discurso, de legitimnçãtt ott dc espe-
.í^u.or^, u, ob.u, dà história ônde aparece corn detalhe tudo que diz ratlÇa qlte se constitlti ttufilL segutlda n.aturcza do lrcrnem, natureza esta
r.rp"ito ao desenvolvirnento do sistàrna de pro{lefo da principal construída ao longo dos séculos, a partir dns experíências concretas de aida e
atividade econômica da Região, ou seja, a pecuária. Mais recentemente, das relações sociais" (1997, p. 1). \zisto desta maneira, o costume se
estudos vêm destacando a lresença de uma produção agrícola na área constitui num endosso ou aplicação de pressão ou protesto popular,
da campanha platina coionial. O mesmo podemos afirm-ar sobre os sendo, na atualidade, também denorninado de cultura.
textos que tratám dos flpos sociais característicos desta região,-dos seus A cultura popular, por sua vez, é entendida como "1...) um sistcnn
usos e ôclstumes. Convém destacar, porém, qtle os temas referentes à uaríndo dc pcnsanrcnlos, atitudes, ttalores e.fonrrtts sinrbólícas ng qtml estanos
cultura regional são focalizados no sàntido de manifestações culturais íncorporados [...]", Burke (Apud ID., ibicl., p. 6) que se plasmam em urn
clissociadas das relações sociais concretas vivenciadas pela sociedade. ecluilíbrio particular de relações sociais. Senclo assim, o tratamento dado I

As nurnerosas e detalhadas descrições do modo de vestir, de comer, dos ao conceito cuitura popular na Região Plahna subentende, intrinsica-
jogos preferidos ou meslno do trabaLho do gaúcho não são, p.ortanto, mente, os de divisão e antagonismo de ciasses sociais, incluindo neces-
i"ãtir_áaur a partir da dinâmica das relações sociais que se estabelecem sidades e expectativas de uma classe que paclece a exploração e resiste
num espaÇo e nulrl tempo determinados e concretos' a ela, mas que, ao mesnro tempo, sofre a inflrlência da cuitura da classe
Apc.rcepçã. cle história cultural que permcia nosso estudoparte dominar-rte em um contínuo proccss() corrtr:rditório de lutas e rcsistôr'r-
cla arráliscr das relações sociais. Procuramos, pt)is, conhecer a forma cias e/ou acomodação c incorporaçàt> a ordcm social vigente.
conro col]r.iveran-I os dcrminados na carTrparüa platina com os que Procurarnos, portanto, an:rlisar a cultrrra popular qr.re foi serrclo
exerciam a dominação. Com tal assertiva, afastamo-nos dos que privi construída na campanha platina durante o período colonial, buscando
legiarn, nas aná-lises, a atr,ração das elites ou classes dirigentes (proprie- identiÍicar seus personagens. Estes foram percebidos na sua prática de
táios de terras e estancieiros, na sociedade plahna, classe patrícia, na produção e relações sociais, como portadores de uma visão de mur-rdo
linguagem européia de Tl-rompson), ou dos que descrevem isoladamen- e expressando comportamentos conectados a sua realidade de vida e de
te ãs aãvidades e experiências da maioria da população' O,que Preten- traL-ralho, isto é, agentes historicamente concretos.
dernos é analisar u áirtâ-i.u das relações sociais a partir da ação e da Juslificamos, ainda, por que escolhemos o períocio colonial para
reação criadoras dos dominados. Para tal, se faz necessária uma reorien- uma análise sobre a cultura popular na Região Platina.
tação no tratamento dado à documentação, a qual já foi muitas vezes Um trabalho sobre esta ternática pode se tornar vazio de conteúdo
trábalhada. A sua releitura busca desvendar o arnbiente, identificar as desde que não esteja colocado dentro de um contexto histórico especí-
necessidadeS e as expectativas do agente sociai celracterístico da campa- fico. Na Região em estudo, podemos privilegiar dois momer-rtos ciistin-
nha plartina, o gaúcl-ro, em u111 processo de intcgração social. Procura- tos no que r-liz respeito à sua cultur.l L)oplrlar-. O primeiro seria o da sua
mcrs, pois, extrãir, r-1as fttrrtes consulta,,las, i.nforn-rtrçr1es que preencham í<;rn-ração, e o segundc), o dc seu qLlase total .lesaparecimento frentc ao
dornínio e ao poder da ctrltrrra burguesa capitalista, ou scja, do serr
crescerrte enclausurarnento pelo rnito e pelo folclore. Para o enter-rdi-
mento deste últirno momento que, no caso da cullura popular da Região
1 Por grupos scxiais dominados entendemos os setores do corp.O social cla campanha platina
- que, como veremos, sernpre estiveram ern Posição de inferioridacie na sociedade que ali se
Platina, é o que vivenciarnos atualmente, se faz necessário conhecer o
«rnstnriu Esta podia ser política (errr relação aos r:riolJos c vt-cinos, por exempio), econômica anteri.or.
(a marginalização, a não-propriedade de bens, a obrigatorieclacL' tle regime de trabalho, entre O período colonial apresentou as condiçÕes onde o processo cle
outras car.rcturísticas) e/ou étnica (os c(rdigos cle contlrtta soci.rl. brurcos, negros, índim orr fc»n-nação dacultura gaúcha ocorrelr. Como csta formação se constittri
mestiços, na sociedade colonial).
t70 \S ltr\lz.lis I ll:-r'l()IilCAS DO t\.ÍEt(LLliLll A F.ECIAO I'I,AI'INA ( OI ( )NI/\I
17t
dr: tim processo ativo que deve a sua realização, tarrto à ação quanio ao crioilo, ser negro, índio, rnulato ou nrcstiço r lt,tt,rrrrinavii
P.)sições ciesi-
guais nesta socieclacle, tão decisivas cltrarrto;r clr-,tcr, o,-r ,'r,io,
corrdicionarnento rlos agentes sociais nela envolvidos, este período de ii.1.,..o
mais de dois séculos pode ser segmentado no que diz respeito ao proprietlade. Não pocremos.esqueccr, assi.r, (rr.r('.rs.rifcr.c.q:as
cre crasse
"
surgirnento e à prática da cr-rltura popular. Duratrte os primeiros 1S0 produziram visões de mundo, varores, necessirr.c-re" o., m..,rr
disturias.
lnos, ()correu a construção da culttira propriamente dita, onde interfe- Entretanto, igualmente o fizeram i'rter-relaç:ôcs c^tre ir;;",;.;r.
.Lr*ros.
riram, nas relações sociais que se estabeleceram, a tradição e a cultura índios e mestiços. Na ncgiã. prati^a, a .rigcnr tlt.ica or.,rrr.,àoi-*o.
clos diversos grupos sociais que participavarn do processo de coloniza- limites das relações de produção - escraviião servidãá r;;
das instâncias do poder - crominados e d.minado..r. À,
- mesmo
ção do tc'rritório, além das condições concretas da exploração econômica p*-,rço.r, .,
do mesmo. Ao final do período colonial, esta cultura foi se consolidando, leis, os direitos, de.tre outros erementos, apresentavarn deierrni.ações
ao mesmo tempo em que, dialeticamente, comeÇava a sofrer pressões e aplicações discriminadoras tanto poru ." distintas.rr";;;i;;
sociais,
para a sua desintegração. Esta fase, corresponde ao momento em que a quanto para os diferer-rtes grupos étnicos.
f«rrmação social capitalista começava a germinar, pressionando por Outro elernerrto que merece.destaque diz respeito à pre_sença de
"reJornms" culturais. Mas, por não ter ainda condições de exelcer o relações de produção corno a servidão e à escravidáo.,uq.rLl".ontexto
clornínio completo, ela acabou por possibilitar urn forte antagonismo de relações sociais- É claro que as restritas condições a. üúãrà"ae
e de
entre a cultura popular e a da dominação. autodetcrminação dos negros escravos e dos índios submetiàãs
à enco-
No primeiro momento, porém, a cultura popular gaúdra, caracte- t:ienda, ao repartirníenÍo e às reduções, estabelecera* .o.aifá""
especí_
rística da Região Platina, aparecelr rnais perceptível naêua autonornia. ficas a esta cultura popular que ali se construiu.
Daí por que estudá-la neste pcríoclo. Por fim, como riltimo elemento a consiclerar dentro das particura-
Há, ainda, algumas especificiclades neste contexto histórico con- ridades d_a Região para a formação da sua cultura
p"p"iori,umos a
creto que precisam ser levadas em consideração no estudo da temática, constatação de que o espaço platino, mesmo contandà áo^ u'p.""".rç.,
a firn de que a análise não se transforme numa generalidade. A prirneira de escrav.s e índios pressionados ao trabalh" r".çua", cànstitur,-,
Jiz rcspeito à convir'ência de crrlturas, no pã.ioao Ae íormação, que num local privilegiaclô para o exercício da resistência à dominação.
"u se
eram diferentes entre si quanto a pensamentos, aütudes e valores, alàrn compa-ranrros a realiclacle social ali eistente com a das suas
regioes
de se encontrarem em distintos estágios de desenvolvimento. sendo limítrofes, ou seja, áreas de reduções jesuíticas a oeste, exp_rlorações
assim, esta cultura em constrlrção contolr com a influência, c-om nraior mineradora e agrícola ao noroeste e norte (Charcas, purug.,.ii ; B;;rl ,

()u rnenor peso, cle elementos da cultrrra clos povos nativos, da branca
I

Central,1, observatnrrs Llue as atividades proàtrtivas que ali:;;j";r;;i-


etrropéia e da ne57a africana, stndo qrre todas, por sua vez, encontra- veram permitirarn unla certa liberdade na forma .o.r-,o o, habitantes
da
vam-se em estágios culturais diferenciados. A classe dos dorninados se Região construíram seu modo de vida. Facilmente, assirn,
u erà.,su areu ,

corrstituiu, do ponto de vista éhrico, predominantemente de índio e de platina tomou-se reduto daqueles que, por várjos motjvos, não sc
rnestiços. A predominância numérica dos nativos fez com que o costume adaptavarn às exigências da_dbminaçao, aesae negros ."..ur,á"
fugiti_
ou a tradição indígena influísse na formação da culturã popular da vos e Índios considerados inJiéis, até úrancos, na gánde
mai.ria solda-
t:anrpanha piatir-ra. Por outro lado, por: menor qr-re fosse o r1úrmero de dos que desertavanr, ;ror nã{r se ajustarern aos paclrões de
comporta-
.lcrnentos brancr-rs, o estágic> de clesenvolvimento e a dominação da rnento exigidos.
cultura curopéia fizeralr com Lflle o costlune ou a tradição d:r mesma
tamlrém influísse significativamentc. o mesmo deve ser relatjvizado em
relacão à ilfluência cla clrltura negra. Esta foi menor, tendo em vista que
a utrlização da relação escrar.'Ísta nas ativitlacles produtivas cia campa-
4.2 - Caudério, gaúcho ea historiografia
nlra rrão foi tão ex])ressi\,11 qrranto nas áreas tlt: plantntiotr r>u cic agriául- Na análisc'da hist,riografia sur-rio-grar.rclense, errfatiza,.r,s:i
txis-
ttira extcnsiva. ti'ncia de p()si\(rcs tl islirrt,rs t,nLr(: os cstuái,):os n() (lu(,(li7
r.(,:,1)(,it(, it(,
Frtrto da dornirraç,'io colorrial, terlivelrnente concreta e específica gaúcl-ro rio-g.r'anclor.rsr,. segur-r,Jo a.rsuns, ele seria
ur-ri r,p,, sr.rcirll clisti,t,
tlesta rcalidaclc', as relaq-cjes sr.rciais qlle se estabeleceram na Regiâr-r oLrtros, o iiãbittrnte típico cle,ir.o *,,o
I'latir-ra trão estivrrranl aj )crias marcaclás pei:r ciominaçãc de classe. ôu- l:._q:::l: t],r.tir-rtr;1,:.rra
rtcA L1cdlcaL1a.l L)r()rluçâo;rer-r,á_ria e/ para um terceiro
geogrri_
grupo, o natural
t'ras varitiveis tarnbém ilterferirarn con'r igual peso, tais como: a domi- do estado do Rio Grancle cto Sul (RSj.'
rr;rcão política e a origem étnicii. S<-.r brirrrco rnetropolitano ou branco
I

472. AS RI\ÍZES HIS'IÓRICA:] DO IVIETiCOSLJL A RECIÂO PLATINA COLONIAL 173

Considerando a produção argerrtina e a ti|u5;ttaia, r"irnos que elas Porém, dentre a muitiplicidade de análises historiográficas cxis-
também apontam o gaúcho como agelnte social característico das suas tetrtes, unr tema é comurn aos estudiosos, ou seja, o que cliz respeiio à
campanhas, vinculando-o à produção pecuáriat. Os l-ristoriadores da origem do gaúcho, se;'a ela étnica, geográfica ou temporal.
corrônte revisionista nos dois paíse:; passaraln a identificá-io como Na rnaioria dos esfudos, encontramtrs a indagação: qtrem foi c'r
figura representativa da nacionalidade. Sendo assim , não foi su{Plesa gaúcho? Várias são as respostas: "[...] ci hombre a caualo" (Cristina l-uccl-re-
cõnstatai sirnilitudes entre as historiografias rio-grandense, uruguaia e si); "[...] jogadores, beberrões, ociosos e 'oagos da campanlta [...]" (Carlos
argentina, no que diz respeito ao ernPrego da paiavra gaúcho- Para Mayo); "[...) qtLe traballutta para sel.t próprío prazer [..]" (Madaiine W.
exãmpiificarmos, dentre os vocábulos utilizados pelos historiadores Nichols); "[...] malcuos, ociosos, t-tngnbundos, changadores [...]" (Montoya);
para se referir ao habitante da campa:nha, destacatnos algttns que apa- "1...) pregtiçosos [...]" (Concoiorcorvo); "[...] qrretn fazia matanÇas clandcsti-
recem nos dois idiomas: nttsdegado [...]" flosé Barran, Benjamim Nahum);"1...]cantponês cLtnraícíos
Português Espar-rhol capitais [...]" (Felix de Azara); "1...)eram índios ninuanos e tapes [...]" (Emílio
gaúcho - gaucho Coni); "[...] são peões colonizadores [...]" (Lucia Sala de Touron, Nelson de
gaudério - gauderio la Torre, Julio C. Rodrigtrez); "1...) segtndo oíajantes nao qtreriom sertir a
coureador - coranrbrero nada, eram ladrões, roubaaant até mtLlheres [...]" (Pablo Blanco Acevedo);
changador - clnngndor "1..1 tipo humano ntnrginalizndo [...]" [José AlÍpio Goulart); "[...] nünades,
vaqLleano - batltteatto sent clrcfes, sem moraí social, com idéias aulgarcs [...]" (Nicolau Dreys); "[...]
vagabrindcr - uttgnrttttndct changadores, ladrões, desourpados, uagahrmdos 1...1 até nu:ados do séc. XIX"
rastreador - rasl rcttdor (Augusto Meyer); "1...) tipo setnibárbnro do Parrrpa, cujos usos, induntenf áría,
contrabandista corrtrabandistn e língua ficarfi conlo patinúnio da etnia rio-grnndense e difundent-se também
vagos üL780S no Praf a, ciando este fator étnico comurn [...]" (Aurélio Porto).
A listagem acirna poderia agruPar dezenas de outras palavras, A historiografia aproxima e muitas vezes coloca corno sinôr-rirnos
porém as mãncionadas já ilustrarn que a oposição entre o gaúcho os termos gaúd-ro e gaudério.
rio-granclense e o gaúcho piatino que a historiografia sulir-ra contempo- No campo literário, contos, romances, poesias, continuam sendo
rânàa pretende apresentar, pode ser interPretlrda como um discurso produzidos, utilizando os termos gaudério e gaúcho em múltiplos
ideoiógico de cunho nacionalista. sentidos. O resgate do ponto de vista l-ristórico também apresenta farta
à literatura existente, quer uruguaia, argentina ou rio-grandense, produção, alpSumas superficiais, outras mais complexas e com interpre-
no que se refere ao gaúcho, é abundante e recorrente- As suas PersPec- tações distintas. O estudo comparativo das historiografias uruguaia,
tivai de análise são inúltiplas, desde etnológicas, antropológicas, histó- argentina e rio-grandense faculta a afirmativa acirna. Dentre as várias
ricas, sociológicas etc. i:rterpretações existentes, privilegiamos a que relaciona gaudérios e
Uma corrente literária de grande peso foi a idealizadora do mito gaúchos com as atividades econômicas desenvolvidas na campanha.
do gaúcln nas historiografias do Rio Grande c1o Sul e dos países do Prata. Segundo este e1!oq.ue, na medida em que o trabalho- organizado e;
-era
Seja em poesias, romances ou contos, emergiu uma figura rníüca, aman- a mão-de-obra clisciplinada, adáptando-se às ativ=idáâeí na-estância, qJ
te da hbêrdade, que só admitia viver sem patrão e seln clomicílio fixo. elemento que exercia as lides pastoris se denominava gaúcho ou peãoll
Destemiclo, solitário, sempre montado ern seu cavalo, percorria os enquanto que os- que não se sujeita-,,am a esta disciplina, embora reali-i
carnpos "sent rei nent lei" ern comunhão com a natureza. Muitos textos, zassem tarefas semelhantes, como trabalhadores temporários, recehiam
consiclerados de história clo RS, reforçaram este discurso nativista, outros nomes, dentre eles o de gaudéricr- contrato, perrnanente t.rt{
sendo que as produçÕes com tais millizes e a lcntla dt-, "tttonarca dns não, identificando novas relaçÕes de trabalho-o
na campanha, diviclir-r cj
coxilltas", originadas clo romantismo do século passaclo, pennanecem trabaihador em duas categorias. Enr outras pralavras, cle possc cle r-rni.
air ra is. contrato e assalar-iado, o hornern do carnpo se integravtr na estrutr-lra,
En-L oposição, outras produções idenhificararn, no goúcl1o, ginexis- social; na ausência destas condições, adquiria qualiiicativos (luc cr er-j
tência do sentimento de pátria, destacaram seus hábitos cruéis, sua ciuíam da sociedade.
wiolência, justificancll:) sua rnarginalidacle sociai atrar'és do seu caráter. Convém reafirm.rrmos que o c.njunto cle assertivas acerca t1o
gaudório e do gaúchrr con'esponcl.cnr a discr,,'sos iclec-rJogicos. S,ro porr-
174 A:I RAIZES I-IISTOI<I(AS ]]O NILIiCL}.tJI \ l(lj(;iAL) pLA]INA C( )r.( )N t.,\ I
775
tos cle vista, preconceitos arraigados, que rePousalrr elll uma traclição corn a ati'rcl.rle cl, cc»rtrirban,lo, isto é, cnci,a.t.r el;r
f,i aceita pel;r
iristoriográfica, que adqtririram foros de verdades absolutas. sociedacle, o ir-rdivícluo que a reaiizA\ra o gaucrério
Para que entendamos como esse processo se efetuoti, se faz neces-
-
nhecirnento social- e.a.do tornou-se contráiia aos interYesscs - gozava cle recc,
cle gmp.s
sário refletir sobre o processo de comunicação, clestacando o espaço que sociais dominantlrs, ela sofren o repírdio social.
.r li-nguagem nele oct-pa. Entendemos a linguagem corno os diversos A historiogrirfia, t- também a litererttrra rnuitas vezL:s, at)re,sentil
meios de expressão que o indivíduo recebe do grupo social ern que vive ram os tt'rnlos .rcirrr.r irlelrtiíic.rdos, deslot.irdos (ie seu m.rn(,nto
iristr,.
e que servem de quadro a toda sua vida mental. Linguagern, no casoertl rico; passaram its i,trgens de permanência, cluando .ru
pauta, se refere aos discursos sobre o gaúcho e o gaudério, não vistos a vian ocorriclo mr.r<1anças. o vo,:ábulo em uso é o mesmo,,..l.Ji.r"tle ha_
sua grafia é:
partir do que era dito, mas, sirn, do que queriam clizer. iclêntica, porém s,a significação mudou, pertencendo a
outra conjuntu-
Constitutivos da linguagem, os vocábulos inseridos em discursos, ra histórica. A linoaridade e a homogeneLação resultam
em desencon_
rnaniÍestam condições históricas concretas, são emissores de mensa- tros entre a ling,agcm.L-m sua expressão r.ãrbal e gráfica
gens, produzem imagerls, constroem corpos conceituais imaginários,
. a,-pr.oa""r,,
histórico em si. A .bra.riterária se permite a liberdáe criadora,
pr>rér..
representações sirnbólicas, enfim, compoem a memória coletiva de a História percle s.a ide^tidade e significação contidas .1';.roiu
grupos e/ou classes sociais, organizados na defesa de seus interesses. proces_so na qual estão embuticios movimento e mudança.
a"
Vocábulos e,/ou discursos em um processo de análise e de crítica o discurso, a ,tilização cle expressões, a recorrência e a substitui-
historiográfica permitem que nos aproxirnemos da consciência dos ção dos mesmos r-rão são fortuitos. Seu in'oiucro é a ideologia. A frinç;1cr
homens, que busquemos explicações para a sua conduta e para a sua e a prática dos discursos nos quais determinados vocábulolro
p,.oj*tr,.l,r
visão cle mundo. ou se ir-rsinuam, rrão sc separam- A função é ideorógica e a
p,'r:ática se
A(s) mudança(s) de vocábulo(s), de discurso(s) são muitas vezes expressa quer na ringuagem articulada, na gestuar, "na ritLrai
indicadores cla emergê.ncia de novas estmturas mentais, imbricadas em conjunto
qller n()
de comportanrentos socioculturais.
mudanças nas -relações de produção e no processo ecorlômico-social. Cclnro, neste ensaio, estamos privilegiando o cajnpo da
iingua_
O termogaúcho, que inclusive levou à construção de correntes geln/ \ran1.s analisar de que forma a palavia gaúcho foi utitizacla
historiográficas fa-aífticitadas no início deste estudo, possui sua própria p"elos
agentes da socieclacle concreta e- qrà ele atr-rou.
história. Tanto no século XVIII quanto no XIX, esteve associado à Se levarmos em consideração os documentos oficiais,
vernos
edificação da imagem do indivíduo que vivia das lides da pecuária, o termo gaticho desip.a'a .s habitantes cla campanha e apareccque n.r
fossem estas atividades permanentes ou ocasionais. I'orém, com as reclação da iegislaç:r() q.e, tentaa/a disciplinar u l^pfo.nç#
transformações no processo histórico da Região Platina, consolidando- chimarrão e, dessii frrrna, defencrer os üric-resses das Cr>rc>as
à. gu.1.,
lbe.icas.
se as relações de produção capitalistas, o gaúcho passou a integrar a
classe trabalhadora, perdendo a su-a indiüiduaiidadé social. E o vocábu- obededend. aos propósitos de cada um. ExeÃplifàando, ternos
1o continuou sua trajetória histórica, enveredando para o campo da
Augus-
to de saint-IJilaire, b,tânico e nafuralista, que se preocupo.
em descre
construção do mito, marcado pelo folc.lore e cristaLizado pela tradição. ver o gaúci-ro nos caracteres biofísicos e na Áua inter-relaião
corn o .reicr
A trajetória histórica do gaudérioj, por sua vez, assirn como a do ern qi're vi'ia- Há, também, rvilriam Mccann q,e, ao avariar
a camparnha
gaúcho, apresenta uma linha de continuidade quanto ao seu sentido buenarrense, n() crLle r-1iz respreito às suas ao.áiçõa, de receber
intrínseco, marcado, no entanto, por rupturas. Segundo um dicionário,
inrrgran-
tes irlandeses, descr:e've- r-rnr i,nr7clro, preguiçoso e co^rrecec-ior
trpeaas
seus sinônirnos são folgado, folião, pândego, farra, vadio, vagabundo, das lides d,r pecrrari.r
trampolineiro e, o que é significativo, seu arrtônimo é trabalhador. os age.tes histor.icr--s estao i.seridos en1 suas co^juntlrras concre-
Portanto, gaudério, distintamer-rte de gaúcho, foi um vocábulo utilizado tas, tcmp()r.ll ees|.1, i.1 l1nt,|tt,. AtnrvestJ,t lilrglragenl
p(,rFlr'\r,llrpr(,g,)_
na criação da imagem de um indivídtro que não rzendia sua forÇa de cla, n-iatrifr.starr ink.r't'sst:s, neces,.iclad.s r. tr:rnores. Nir
q.,r, s. rr,f(-r.e a()s
trabalho, buscav;i seu strstcnto c'n.r atir,,idaclcs ligaclas ao cornércio, seja t'st;uicir-:ir-os, c\i'nlplir. iric'r-rtriic.inros
i-\()r- a ncct.ssirl.rtjc cie , ri5g;r-.r1ag1 glç
tlr: g,aclos ou de couros, r'açaclos or.r roubados. Vinctrlarra-se a atividades .rma n-uio-clo-olrra hiibjl nrr rlcscrnirerrho rJt,tarr.r,r:, discrpliria.ja
considt:racfas como c-lesvios cit-r sisten-r,r viger-rte; foi o iaclritt-r cle gado, o baixo cust.. C.r-rsirlt'r..11r-r essa e clt,
contrabarrdista, o corrtr-itventor social. f'ernos qlre destacar, no c-ntar1to, ;rremissa, err.'s ch.ma'aar r.rr: ,,,qdriL-rtt),,
qLre ,,Pr r\senfA\;Arn cstas concliço"r, :;,r-niui
qLie o reconhecimento rie sua peSSOa r: de sua atividade se encontrava ;l::i:]]:,^r:s
lrdades mLrrirrs L'drr
a qua_
"i"a:, creno_
rirs irábitos cie trabalho. eLrarrcr,
,iii't'{,tntt'tttc ligado Jo\ ltl('\'(rnisnt()s s()\ i,lis r'rn vif(}r. f.xt'nr}rlificatn,,s 'aloritcã.
rr-rir-rri'arr clr: g.úcrr..r,-,I,c1ts Lr Lrc se recLlsa\.irrn
a. tr.balir,, ti'.c.r.iurrr
t,

A REGIAO PLAI'IN.{ COLONtAI,, 777


AS RAÍZES HISTÓRICAS DO N{ERCOsLIL
176 ao co:-rtato coln a reglao r11ll-re-
o corr-rércio, qr-re visava, principaln-rente'
de repulsa sociai' tais como ladrões de
eÍa utilizado corn conotações etc' além de clefeitos congênitos' "'--- de Potosi'
radora o rir'-r da Prattr ct-)lrtl
eado, vagabundos, mal-enttetenicloi u*lrtêr-icia da rota comercial que utilizava
n
e em sociedade'
à vida em famíLia ao mercarlo foi fr'rntfar-nental para.?-l
ãomo incapacidade noituUollo' uma clas vias de acesso ilotosir-ro
nos documentos' nos e esPanhóis' Buscandtr
Tomar.o*o "o "àtJade" que está contido
o
e XIX ocupação do espaço platino pot poti-ttg"ses e usufr-r-rir as vantagens
reLatos d.e contemporâneos
aos acontecimentos dos séculos XVIII encurtara via cie comunicação ao* a_Metrópole
na região das campanhas argentina'
uruguaia e rio-grandenseé' pois'
;" ;;-P"tição de porta áe entrada iSgO,Para as regiões do interior' os
considerar ã possibilidade de pela segunci.a vez, a cidacle
um risco e um ranço positiüsta' Ao
se habitantes de AssunçãÀ fr-rnclaram,
têm ignorado a existên- "*
que, por mtrito tempo airlda, desempeirhotl
o papcl dc
neutralidade em histoã", "t"iiàlrtúoriadores de Buenos Aires
social' e ileg'rl qut' st:rlirigia a I'trtosi'
cia de interesses contraditórios
na estn-rtttra
i<leológicos cidade-escala para o clmércio lcgal era poL'rrc' difícil'
Consicleramos, no entanto' que os comorometimentos A vicla na cidacle e em todã a área ot'scLt redor naquela épt'c'r' a
em sua artic-ulação P'h;ttt 7;t;á".i
tu /'ot t I' a crc sc i d o s' d a 1'reocupa-
fotto.tào iÀào ti.po de produtos alérn c1e tnoedas' Já
válido na co,-lro' afora suas iuúiuc-
com a semântica histórica' são um viés teórico-prático' ;.;ã tà .á"tii,"i" da principalftlel' e o
ção das palavras gâudério e gaúcho i
a falta de rneio circula:rte nos
análise historiográt;'-ã;;rego
i
ras utilidades na vrd;cotiaiur',u, subsii.tuía
urna visáo denominada tra-
I
I
ratiÍica esta afirmação' Enquanto que'^em percepção historica através intercâmbios que se estabeleciam'
^-."-.-To,-'t.,aprodrrçàopecuáriaqtrarrtoirargrÍcola,-ilricialnrente,sc
dicionai, apenas ," ;;P;à'";ã^ tútnet'
a
se cont'"rtà cm fértil recurso de na tent.rtiva de corrscgrrir
da ótica clo trabalhoã áu p'a'ção' clirccionava* :, ru*olà1iãoa., d.o Altt>Pcm, trigo e couros chcgava ac>
na Região Platina' E' ainda alguina Prata em o.'.u' A produção de miliro'
análise Para o estudo das ielações sociais dinâmica' multiÍa- dc mulas' a parte do território qtrc
mais, permit. o ,etottheci'nenío de
uma sociedaáe seu destino upO, p""á""i, '-tt' lombo
que foram' até poucos' porém' os prodtrtos
cetada, na qual atuaram rnuitos homens e mulheres não era barüada P"l"'t á;;* do rio' Aos para
historiografia' os couros' <:o'rróçotonl a ser exPortados
à gor;,'.t,..eotipad os pela ã. pã..,a.", Buenos Aires
"rp.Éitk'"'"nte
o mercardo externo, Ju'ttlo nova configuração à cidade de
e redirecionando o ;;;;ii;'"na da'camp anha.no
1undo, 1o-l1'llil- 1
e cultura PoPular xvitt,'aevido também à difirinuição da prata potostn;r,
;;il-à;;;..,t., .o*"ft"t a ganhar atttonornia €l aPresentolr Llma identi-
4.3 - CamPanha a área platlnr
de uma cultura à proclução pecuária' Sendu
A identificação do esPaço platino como produtor na forrna corno se dade cuja origem ," "ittt'iu cada vez mais
sua origem
dotada de certas esiecúdáaes encontra '.--.<'\ assirn,BuenosAirespassouaseroportocenlralenãomaisdetrânsitil
estruturou o sistema colonial ibérico na
América- -,'-= dc todo um comércio que ali se reaUzava'
. 1 Sobre isso, há à;i;;I"*àntos a de'tutat' o'-t seja'á posiçá"!;*:
que área platina ocuPor'r no contexto A resistência do indígena
,*;. #;ã'..tr"'elit"' 1 e portu-
I colonial, e a nova roàã"à" ocipaçao do eipaço que espanhois da área con-
colorrial e iogr-r
A sociedade dn ri.giaã platina, rlur;inte o per-íodo os ntttrtrFr-r '
quandoda exploração grupos, afora
gueses começaram a desenvolver' anós a independência, eã comPosta por tJois
t: tt.io-prt '-
: quistada' ^ r, ^ ^^;-^ onde -o.lom consl-
^^âo podemos ;ffi;. [-í";a simptif icada,'dividi.r-s. enh't' proprit'tários tfominante:;'
- Ao contrárÍo de outras regiÕes da América e/ou explo- pri"tarior. Entre os p'rimeiros, que constituíam os gruPos
invasão' clestruição dos pnncipais -bt-ns lle
encontravam-se os que detinham o controle
derar o clescobrimettio to"-'o "í ato de
de forma mais complexa' a tomada
e o g''ido' Sergui-rdo a íriit-'r J' -
ração de u*u ro.i"àuãàã'g""ú"aa de um modo ;;;á;4" a1i existenies, ou seia, a terra
de posse da Região Platina ocorreu em
meio à implantaçáo que a1i sJ'.lesenvo'h'iaiI pl'ri li;rrl-r r'i' :

ern atividades conquistarlores, aS ."l-nçO"= aoaioi,


de viver diferente d; q;" ali se desen'rolvia'
Baseou-se fosse eic rirn lir r.
desconhecicias pelos nati- enteirdimento que ,oàu ,..r,, tinira proprict/rrio, ().i-rlittiilr;it),
econôrnicas po.l.o ptolltodo' oti até mesmo ou a Coroa, u,,i^.o*.r tambénr ci gad'tl, nlt]Sn1O l)|)l-iiil:.
'.r-i-ictr
vos da Região. I*^ p* introduziclo Ser proprretário cle u,a estâtrcia tlti cle u'ili't
por Peclro Mendoza
Desde a prirneira fundação de Buenos Aires (1537)' os ou mesrno possuir átgt'*"t centerras. de cabeçaspcpr-rlaçãi
chácara, "f"s f' S:'i' '
forte de Assuncion
(1536) ou por o.";;;; à^ i'"auçao do desigtrava distinçãr: sàcial e podãr polítrco'A n-Lator parte cia
a a ()s :rotol'.'s"
espanhóis buscaram afirmar Posse 9: :"*lt"l'i:1,1'-'^t:Yt'ando co*stit.ría-se de ãcsposs,ídos. Estr-:s corrp-rri-iirant
bovrna e ol'ina e praticando clas t:stâtrcias'
-11L'1'r'llil1l(li..,teri (
produção agrícola, introduzindo à pecuária ".,i.ãtu.,to,
poi)Lri<rres, cor-npc-,stos cle traL-i-ril-radol'rls
'li
178 AS L.\IZES I-IlS I ( )lil( lrO Nlhit( (XiUl. A l(E(ilA() ITLAIINA CL)LL)NL,\l
^S 77c)

oczisionais, condutores tle manadas, recolhedores cie gacio disPerso e resisiência a se iniegrar no processo proclutir,zo como m;io-cle-,obra
rnarcadores de gado, agricuitores e até escrav()s. Muitos cieles viviam à disciplinacla e pernt ilnente.
margem desse sistema sociai, preferirrdo retirar o seu sllstLtnto da caça Enqua.to a pecuária este'e baseada no sistem;r das t,
u-rdiviclual ao gado, de oncle comiarn a canle e vendiam o couro ilegal- índio se rel.rcionotr mell-ror com os brautcos cctlr»rizacirtres. 'acaLras.
Forarl-r os
mente. Na sua maioria, eranl mestiços e índios, mas também havia mintianos, inclusive, os grancles abastecedores de cr>uro.,1()s p()rtLiguc-
brancos pobres e rlegros escravos e liberlos. ses em sacraürento, enquanto que os guaranis fizerarn n, g.,.,ri.i.,.
A utilização prefcrencial dc. índios e mestiços ocorreu porque as apreensoes de girdo paril as estâncias jesuíticas. À mec-lida, porir n, tlrrt.
atividades da pecuária exi giarn m ão-de-obra que apresentasse habilida- o sistema foi se fi-xar-rclo rras estâncias, o nativo encontrou maior clificirl_
des especiais que eles já desenvolviam. dade em participar rlo rncsrno. Quando não conseguiu mals atlrar n()
Este sistema de produção, além de também gerar relações de processo como forçtr cle trabalho,-incorporando-se nã figura c1o gaticho,
produção que se caracterizavam pela liberdacle e ocasionalidade, pos- eie passoti a ser pcrseuuiclo, e tribos inteirrrs for.rm diz-rma.i.rs. Usancl.
sibilitou que, na Região, se estabelecessem relações sociais bastante clessa estratégia, a classe dominante passorr a vencler a úrragern rie qr.rc,
específicas. A falta de trabaiho permanente, a abundância de gado e de a campanha era um territorio vazio, a ser ocupado, quanclo. àa verdaàe,
terras com propriedades mal definidas e a facilidade de movimentação o que havia ocorriLi() fora a extinção de grande parte da população quc
pelo território ocasionaram que as relações entre o dono dos bens de ali habitava
produção e o despossuído oscilasserri clesde o companheirismc até a
perseguição e a rnarginalização. O mesmo índio, assim como o mestiço Com a pecuária, novas experiências sociais de vida
ou o branco pobre, tanto podia servir para matar o gado e extrair o couro _ Ao lo.go do século XVII e parte do X\{II, a exploração da pecuária
nas vacarias ou nos rocieios das estâncias coloniais, atuando, assim, na Região se processou através do sisterna de rracarias qr" o.u'.., incur-
como peão, força de trabalho disciplinada, quanto, ao utilizar-se dos sÕes pelo carnpo para caçar o gado.
mesmos conhecimentos, realizar aqueias atividades apenas com a fina- Duranfe este perí.do, ocorreu a apropriação do a.rirnal que se
lidade cle produzir o set-l auto-sustento. Nessa ocasião, ele era denomi- encontrava disperso nos carnpos, c1e muitas rnaneiras. Dentre estas,
nado de ladrão de gado, contrabandista, changador ou vago. tivemos as arreadas, as quais significavarrr a caça ao gaclo chimarráo
A incorporação das populaçoes nativas ao domínio espanhol e que, após ser levado por várias léguas a uma estânciá, passava a ser
portuguêsnão ocorreu sem resistência por parte dos dominados. As que domesticado, através do aquerenciamento, ou abatido nô local, forne-
viviam em pequenas aldeias estáveis, praticando uma agricr,rltura rudi- cendo couro, came e se]:ci aos seus moradores. or-rtra formi-r de r.,acari.-r
mentar, como os guaranis, sucumbirarn à encomienda, à redução e à consistia nas Licenças que os cabildos concecliam aos seus veci,nos para
servidão, enquanto que as que se baseavam rla caça e na coleta, como recolherem gado alçado (extraviado) e para caçarern o gado sern marca.
os charruas e minuanos, resistiram mais a estas forrnas de incorporação As vacarias que se reaiizavam mais próxirnas dicidade, clestina-
à economia colonial. vam, iniciaLmente, a maior parte do gado iecolhido para o abasto. Com
Por um largo período de tempo, conviveram lado a lado o coloni- o incremento do corn_ércio e a rnaior preserlÇa portuguesa na Região,
zador e o indígena. Ao introdr"rzir o gado naquela área, o branco foi apos a fundação c-ie sacramento, o couro foi aãquirindo maior valor-
colocando ao alcance do índio os prociutos cia colonizaçro, prirneiro o comercíal. Nt>s prirneiros arlc)s cio século xvIII, já se tomiira a base cla
cavalo, depois o gado cia vacaria espanhola. Esporadicamente, passou prosperi,J:rde econônrica rcgional, bem corno centro d6 comórcio reali-
a utiiizar o trabalho do irrdíger-ra e, ao ocupar o território c extinguir suas zaclo por navios eie cornerciantes e contrabandistas portuguc-ses e irrgle-
fontes de coleta e caça, fez com que àqueie restasse apenas o abandono ses e p()r rrar jo: rit,rt.gistro.
clas su.rs terras ou a ürtegrar-se ao processo cokrnizarf()r conro rnão-de- Um p,iipel irrrpLrrtante r-ra defi.icão cr-as frrmas cic e .as
oL,ra ocasioltJI. r-xperiôncias sociais que se tlesenvoiveram na Região platir.,a 'icla
foi c.iaclc>
Esse processo não ocorrell de fomr;i lirrear, scm contraclições. pelils \,aC.triaS. ACI TICSnicr tCmprt rj1tt (-11-lc os rrecil-rc,s rt-celrjartr Iccltç;r
Pre'cisamente nesta árca, encontramo:l r.rm dos Íocos rnais fortes da t)ara ca(:ar t) gad() nulll.ir dt.tcrrninada área. ia occlrrerrclo a alrropriaçnir
reslstêrrcia in,3ígena fora datluel:t ofcrecicla pelzrs comtrniclatles organr- tias-terras re.rlt:ngas ;ror ;rarticuiares. Partt, tlos carnpc>s cla campanha.
z:rd as. Ela ;rbsor-v'etr no\'()s hiil-,itos rlc t« rcii, cle iriilnentação, cl rt r,'estr-ráricr cnliitl, lf.rs>,).t'i)lll la;lr(i llnt l',rll[,() r1r. 111,..11.1y-1-t,r: qir,,,,ti) (.()tr:titrrír.t.itr ps
e, principaln"rente, se miscigenou, contribuilldo para o surgin-iento do latifúr-rdios, comerÇar.inr. u concentrar os dois princinais bens cie
ç,roclu-
ç:.ar.ttl-ro. Pttrem, tantL) () ír-rtlio tluiurto o nrt'slictr .rprcselrl,rr.rm forte ção ali L--rcsetrtt.rs/ ç111 ;.,.,ja, .r [err.t c o ga11o.
180 AS RAIZES HISTORICAS DO MEI{COSUL A I<ECI,,\O I'LATINA CO]-ON]AL 181
c_.rclo europeu mantinira a demarrcla c1o couro platilo para a corrfecçào
Como vimos, a pectiária das vacarias, qtre se desenvolveu durante
o sécLllo X\4I até meados clo XVII, não se preocupoLr com a reprodução
de prroduk>s, como leitos, c--ar-nragcns, molas, bombas, mangueiras de
do gado. Ela permitiu, no entanto, o aproveitamento da mão-de-obra incêrrtlio, válvulas, artigos de infantaria e de cavalaria. Esta
iiroç1113 5s
indígena na atividade produtiva. A maneira comr) se realizava, apreen- devia ar.l fato de o c()uro platino scr m"ris Eross() c resisicnte, pris
dendo o gado que se clistribuía por um vasto território e, muitas vezes, provill-ra dci gado crrol/o qr-re era magro, não possuindo boa qualidar.le
o conduzindo para um outro mais distante, possibilitou o emprego desta
de carrie e quantidade cle gordr-rra.
força de trabalho. Percorrer os campos montado em cavalo, laçar o gado Contraditoriamente, porém, acost,mada ao convívio com o silr:í-
com o auxílio das boleadeiras, dormir ao rclento e comcr o que a cola e à caça ao garlo nas a popuiação livre desenvolver;r
'acarias,
atitucle cle vida nômade, e-spaltranclo-se
natureza ll-re oferecia eram hábitos próximos aos c1a vicla nômade que pelos nllmerosos terrenos Lral-
os índios levavam. dios ou realengos que ali existiarn. I?.elaciorrava-se de fonna peculiar
Os índios guaranis ficaram conhecidos por suas arreadas, onde conr () t.rr'lo, p()is, pala ela, o aninr.rl cra itrnci.rnrentalmelrtc, o scu m(,io
cerca de cinqüenta a sessenta homens,, juntamente com cinco cavalos de subsistência. sendo assim, o cavalo ocupava urn papel fundamer-rtal
para cada um, conduziam manadas cle mais de mil animais até as r1o seu cotidiano, já que, com ele, podia laçar, matar ou amansar tocla
estâncias dos jesuítas. Nelas, realizavam c trabalho mais sedentário de classe cle anirnais, ga-irhar ou percler as corriclas e jogos que ciisputava e
aquerenciamento clo gado, produção de couro, carne salgada, sebo etc. burlar o juiz de paz, saquear urrra puiperia ou rancho,ãtraveisar rios
Os minuanos, por sua vez, se relacionervam mais com os portugueses, ou, ai:rda, chegar a Lrma estância desconheciclzr. E, se porventura não ll-ie
sendo importantes forhecedores de gado orejano e couros sem marca, agradasse aii se empregar, saía novamerlte cnr seu cãvalo, a percorrer a
aos contrabandistas. Os espanhóis também contratavam índios e mes- pror'íncia, sentindo-se em liberdade.
tiços para trabalharem nas suas vacarias e estâncias. Com isto, foi A circulação de homens e de gado era iniensa e se fazia em amplos
surgindo uma forma de vida que a5iregava elementos da tradição espaços. Nesse contexto, conforme virnos, o carralo aparecia como rrreitr
rndígena com outros, trazidos pelos colonizadores e que produziu, na de locon.roção e de prodr-rção funclan-rr:r-rtal. O couro, por sr-la vez, possuía
prática das relações sociais em que estavam inseridos, o universo de um valor de uso tão importar-ite cluanto o de troca.
vakrn's er t1e referências do homem da campanha, o gaúcho. viví.mos,,aquela octrsião, o que os iristoriadores denornirram c1e
A vicla no parnpa era de contínuo sobressalto, pois os índios e os a "era do couro". As casas, os instrumentos dc trabalho, a vestirnenta, as
colonizadores europeus altemavam períodos de paz e de guerra. Os carretas e as pelotas eram feitas, utilizando, principalmente, este rnate-
nativos lutavam pela posse das terras e do gado, resistindo à expansão rial. Aiém ciisso, ele era o produto comercializadc por excelência pela
clo colonizador. Em contraposição, a pecuária possibilitava o encontro Região, entrando na circulação do comércio que se.êulizal,ra através cio
de culturas. As suas atividades exigiam mão-de-obra que apresentasse rio da Prata, tanto na troca pelo metal de potosi, exportarJa para a
habilidade no uso dos instrumentos de trabalho que o indígena possuía, Metrópole, quanto como moeda que perrnitia ao i-rabitanie da campa^l-ra
ctrmo manejo do laço e da boleadeira, a destreza no uso do ctrchillo e a comprar os produtos que faltavam a sua subsistência.
rapidez do cavalgar. Além disso, requeria o conhecimento íntirno do
território que perrnitisse a identificação dos caminhos existentes, a O gaúcho e a sua cultura
localização do gado extraviado e a adequada condução dos rebanhos. caúcho é o non-ie que tem sido dado ao habitar-rte da zo.. cla
A rápida extração do couro dos animais e a slla preparaçào como campanha, tanto na Argentina, no Uruguai, quanto no Brasil. No caso
produto a ser usado ou comercializado também eram atirzidades desen- de nosso país, sen,e para designar, tarn6cur, á população do estaclo cJo
volvidas, habilmente, peia força de trat,alho indígena. Rio c.ande do sul, clado eie pos;suir extensaJpranícies pampeara_q e
O interesse crescente pela riqueza prorrenicnte cla exportação de aprcserltar, descle a sua <-trjoniz;rção a1é o séculi.r
Lrass..tclo, r'u,r.lo cat,r-.,.,,r-r.,,n
collr()s sc constittrirr numa ameaça aos hábitos do h.:rnern cla campa- fc:rternente baseacla na pecr-rária.
nha2 Ainda durante toda a prirneira metacle do século XIX, o couro As hisioriogralias n.rciorrai:; cl.os três países reconhecem o gaúcltcr
continuou a ser o pnncipal produto da pauta das erportações. O mer- como representante c1o seu passado histórico, símbolo clas suas cspeci-
ficiclades nacionais o-tr ;:egionais. seir<,li: assilrr, os historiadores arBCn tr-
nos prefc.rerl rttlaciorrar;i rtrigen dr.r rltrricho c()nt os prrrleirtrs
A consoirdaç.ro da esiância como uniclade de pro.1uçào ctrrrespondeu a unril fa-se dc organr- J-r()\.():i_
dores de Sar,ta Fé, cirl.'rclr írrniia,1.r cm l573 ]rclos esparrhóis. SegLrnci,r
2.1.,;r) (l()s Irtrrtltttos aí)nr \,'istas;i ofcrta cli. ci{.rr()s })arJ r) rnert-.r,lo ntrutdill. ac, nt(,sltto te[rp()
r'Dr qlre d(:,finiit a proprir,clarle prir,atia c'or-.to i).lse da estnlirrr;r Irrrdrrfivir
t-1cs. os prinleiros P()\/()ii(1.-rrcs (r()lrslitLrír:a.nr r'arnílias coI)1 à:; r11tivir.s.
1 tl2 ,\:i Ii,\ll I :S l I I :i'l C)lil( I)O N4 i:tiL-a).i t r I
^S :\ t(ECIAC) PI-AflNz\ C()t,()NIAr
183
tiveram filhos nrestiçc)s que, atiquir.indo hábitos e costumcs irrclígenas, c .rs po'oaclos. A r:xistê.cia de um continge.te
distanciaram-se da societlade espanhola matriz, tomando-se iriottos c1e \.agos, consideracla
uma ameaça àr segura.ça clos pecuaristas, porie sei explicada
li'res e pobres, de.ominados cle ".qarlcftos". Eles eranl conkatados para pcquer-ro dt' pr'ót's ou dc nrào-dc-obra pcr,,on,,ntei,r" d irei,-r
as vacarias ou se organizavam auturlcnlarÍrente para a caça ao gaáo, o ^unrero Iree ri.i
.
ri. requeria, r_oqlo tarnbérn pelo seu caráter sázo.ar. As tartfas cri:rrizrs
qtral contrabandeavam, na maioria d:rs r..ezes. rea-lizacias .as estâ.ci^s erarn simpleJ, sem exigir níveis
Os lristoriad()res ul'ugLt(rit-rs, p1;r sua vez, prefercm rr'lacionar o .i.,rna.. a..
divisão social d. trabaih.. Le'ar ô gado ac, roàe-i., rq,-,e..,r,.ií,-1.
gaúcho ao gar,rdério e ao changador. Cr>rno constroem sua história a oir
Íazer a r.nda nos c,rrais para evitai a sua fuga
partir clo gado existente ni-r Banda oriental, oncle prerlominou, por largo que
"."r-r'.ti"iààcles
envolviarn poucos trabalrraclores, rravenclo in*clusir.e, por parter .los
tempo, o rebanho chirnarr'ão das vacarias do Mar, eles co.sideru^-o estudiosos, a esti,rativa de que, para cada mi1 cabeças á" gào,
gauciério um homem livre, que vivia clo trabalho ocasional or1 percor- havia
um peão empregacio.
rerrdo os campos em busca de um anim;rl do qrral pudesse retirar a carrre Mas, se isso cliz- rerspreito à mã.-de-obra permane^te, crevemos
para seu alimento e o collro L).lra comerciar. Pcrr resistir ao contrato de ressaltar que era gra^de . .írmero de trabarhadàres avulso-s,
trabalho permanente, já qr-re o meio lhe oferercia fácil sobrevivência, o contrata_
dos para os trabalhos ocasio.ais na atividacle pecuária. s"r; ;,;
gauclé'rir> foi consic'lerado, por alguns alrtores, um parasita, um vadio, siste.1.,l
de vacarias ou de criação do gado nas estânciàr, o. c1o outorlo c
urn vagabundo do campo, um laclrão de gado. Entré ele e os comercian- da prima'era correspondiam aos períodos em qlle ^.r",
tes da Colônia do sacramento ou de Montevidéu, aparecia um elemento os t abalrr.rs s"
i^tensificavam- As tarefas nas eúgiam o.*p..go de h.rr-tens
intermediário, ou seja, o changacior. comerciante clandestino, susten- para a caça, a retirada cfo couro "aca.ias
e o transporte dos o.,ir.,-uir, enquantc)
torr e alimentou o contrabanclo do couro, transportando a mercadoria qlle as das estâncias, trabalhaclores avulsoi contrataclos para realizarrern
enr can()as, através dos viirios rios qr-re ligavam os campos do interior a nrarcação, a castr.tÇ.i() ()u a tosquia dos animais
clir lJiurcla Oriental aos rios Uruguai e da l]rata. Este calendário cr.e atividades permitia que arguns pcque.os
or l-ristoriaclores rio-grandenses preocllpam-se em estabelecer as pr-o-
,- prietários, o.c-upa1!gs de terras realengas e peÕes dã estáncias se dedi_
I .lrferenças existentes entre õ gaúcho de àrigem portuguesa e o cle origem cassem à plantação do trigô durantã os meses do inverno
' espanhola- Para eles, apesar de ser também p.êf..er,-ier,-'ente um mãsti- e à sua
colheita, no verão. G,eral,rnente, eram pessoas muito pobres, que já
ço, a índole pacífica do lusitano e a influência da relação escrava na estavaÍn asse.tadas c-ie forma mais perrnanente e que'buscavam,
sociedacle brasileira fizeram do gaúcho rio-grandense Lrm homem mais na
agricultura, gara.tia de alimento porâ a sua firmília. Élantar para
sc'cientário, mais responsável, menos og.essit,o, enfim, o peão de estân- si, em
te'rras desocupadas, ou trabalhai na colheita clo trigo se 'constituiu,
assim, numa outra f.rrna cie sobrevivência da mão-dã-obra
Na t erdade, o termo gaúcho serve para designar os setores popu- ocasional,
no pampa platino.
iares que vivia'r nas áreas de produçã. pecuáriã, esüvessem ou não Para entende.nos a presença do vago, é necessário acrescentar
participando do incipientc'mercado de traÉalho que ali existia. por isso, alguns outros elernentos- um deid diz resp-eito à grande qua.tidade
tantcl peões, trabalhadores com contrato de tr-abalho permanente, como de
terra púbiica que ainc-izi existia, permitind., ,, Ii,rr. circulação ou o
vagos ou gaudérios, conlo aqueles que não possuíàm domicíiio fixo, aproveitamento das nresmas. ouúo diz respeito ao estágio ie
--nem mc'ios conhecidos de subsistência, podem ser assirn clenorninados. des"^-
volvimerrto ern q,c se encontrava a pecuária: o desaparà.rrr.,..,t.,
Duranteo período colonii,rl e a prirneira metacie do século passado, gro-
clativo do gado chir.nrrão não impedru que, nos campos, aincia
ser considerado "aago" cc-lr-rsistia ern algo impreciso, oo ,rl"r^i, tempo fossem
e.contrados a.ir,ais c1.e fugiam das esiânciar o., ,é reproduziarn
qr-re terrivelmente concreto para t- hon-rern cia carnpanha. Ao conceito de
forma espontâr-rea.
cle vago, seguia-se inuitas \rez€rs o dr_, r,ng"1rr,ldo, corno se fossem
causa vida no campo e as lides na pecuária propiciaram o surgu-rrento
e efr:ito ou até mesmo sinôni,r,s. Assiirr, trabaliraclores scm ,
cle u,r hp. srcial .o quai as capacidades fisicas .oú."pffiurrl
<rrr.ladrões cle gado podial. recr:ber o rr.s1-no triltamento, senclri "rr,p."go'
p".õ- ilrtelecttrais. () contato rliroto a.'rrr'.r r, natureza, na lr-rta
o.
glrid.scPresos,desdequt.'esti,r:sserra',leaÇa^cl,.orcle-r,estaLreiecida. p"tn à.r.., s.Lrr..r,i_
_ l'ência, fez delc unr horr-rt'r-r.r forte, enérgico, rrcostrrnaclo
Erúretanto, a preserÇ.1 clestc clcsocupaclo, rragutartclo ao uso do laco
L)elos cam_ e do cucltillo- Acosttrrrr.rLr(,s a ,'-ru vi.lá inrkl,enclentu
p()s, era fnrtrt r1a realicladc s,-rr:ial rtrral, r-rn<1e a pecuá"ria,.or-r-l r"., sisterna cavarleiros itürertrr-rtes, .s g.úchos reprÊ.sL-ntilram ui,.a classe
. o.,.lo.iti-ru,'.iã
cie proct-rção baseado cstância e no LiÍio extensirr.l cla terra, impedia rel-elcle,
a,tora de cri,re s.ci:rlpartr os proprietários clas terras e do gi.ido.
tltiel o horncm se fixasse'a coil) srra fanríliir e ;rii fizes-re proliferar c,s larrchos sob o
s.rL1 ponto cl-r vista, cntrei.trlt(),
Prctencliarl;tl)enas mallter L.r tlr_rl.lu cje
I

184 AS R,À1ZIJS }iIS'fÔIiI(]AS DO N,IERC(TJUI- A RECIÁo PLATINA COLONIAL


185

vida quc acreditavam estar em harrnonia conl () PamPa e com seus enerrgia, mais do que a honesticladc, a educação moral e intelectual. Foi
aburdantes rebanhos. a partir clclas que constr-uiu seu universo i;ocial, escolhendo para lícler
Vários dos seus hábitos, que hoje fazem parte do folclore e do mito e aceitando corno seu superior aquele que mr-lhor as demonitrassr:.
cultr-tral que se criotr em tomo da figura do gaúch<l, foram contestados o sentimento cie liberdade se co.stifuía, talr,ez, no seu maior
e combatjdos peia ciasse dominante, chegando
jnclusive a ser conside- valor. I'ara ele, era mais fácil aceitar os castigos corporais do clue o
rados contravenções sociais. Dentre eles, destacamos o uso da bebida, aprisior-ramento da sua alma. sua concepção de felicidade, assirn, con-
as brlgas, os jogos de azar e os bailes. sistia enr poder gozar da sua liberclade de ir e vir, de escolher oncfe e
Éntretanto, para o habitante da campanha, estas rnanifestações quando trabalhar, não se irnportando em levar urna vida em mcio à
culturais estavam relacionadas com <l seu cotidiano, com a sua forma pobreza, retirando do meio a sua subsistência.
de viver. A bebida, que ele comprava dos nativos, «l ajudava a passar as Tradição, experiêrrcias concretas de vida, valores, represent;rções
noites frias ao relento; os jogos de azar faziam p;rrte do seu lazer diário, constituem, pois, a cultura popular da Região platina, quã apresenta o
visto que o dia de trabalho se encerrava ao entardecer e, muitas vezes, gaúcho como seu agente social. Apesar de as histórias nacionais terem
o clima adverso impedia que, em outros, pudesse trabalhar. Os bailes, procurado isolá-lo em seus territórios correspondentes, ele faz da sua
a música, a dança, por sua vez, se constituíam em fontes de diversão e campanha, seja argentina, uruguaia ou brasileira, o seu lubitat.
de oport rnidade dá manter relações sociais. Como ele costumava cruzar
o pampa em busca de gado, e a distância entre unra e outra estância era
grande, sua vida se caracterizava, em muitos mornentos, pela solidão' 4.4 - Conflito e violência na campanha platina - séculos
IVIII e- xlI
Por isso, apreciava freqüentar bailes, tocar vioia e entoar canções- Estas
cluas últirnas, inclusive, faziam parte da sua vida solitária, quando, à _
noite, apeava do seu cavalo e dorrnia debaixo de um urnbu- Conflito e violê^cia são elementos da realidade da campanha
O gaúcho tirúra a sua própria ética de h'abalho. Para ele, trabalhar platina que clevem ser considerados na anárise da constituição da
significava realizar algurnalarãfa que lhe garantisse a subsistência, mas formação social da Região. vinculados a eles, se encontram os qLre
tarrrbi:m lhe desse prazer- Era assim que enfrentava a atividade assala- dizem respeito à distribuição e uso da ten'a, ao processo e às relaçôes
riacl;r: a realizava em troca de um pagarnento que lhe permitisse com- de produção que aii se desenvolveram durante oô úttiroor a.os cla vjda
pr.rr um poncho, a bebida, o sai de que necessitava, sem, entretanto, colonial e início da fase independente.
buscar nela a razão da sua existência. Esta sua forma particular de A expansão da pecuária exportadora alterou o modo de vida cl:,rs
encarar o trabalho, associada às condições da produção, contribuíam pessoas que viviam na campanha, já que, ao privatizar a terra e os
para torná-lo um itinerante, um trabalhador ocasionai. animais, suprirniu-lhe a liberdade de cavalgar livremente pelos campos
Mas ele não se restringia apenas a isto. Para o gaúcho, trabalhar e de retirar clo meio a ::ua subsistência. A-produção pasioril centrãcla
significava também vivenciar a alegria- Nessc' sentido, recusava-se a numa_unidade de produção básica, por slra .r.r, p.oporcionou qlre o
realizar tarefas de que não gostasse, sendo tnr,ritas vezes tachado de peão fosse se integranclo no processo produtivotaor-,o mão-cle-olrra
preguiçoso, indolente. Considerava stlas ativiclacles preferidas as que assalariada, peça ígrdamental no p.o.eiro cle acumulação.
realizava nas "hierras", ou seja, nos grancies rodeios, que se efetuavam Esta-novq relfldade, trouxe embutida uma alterâção na forma
em 1naÍÇo e setembro geralmente e onde domava, marcava e castrava o CornoeStehomemsere1acionavaComseutrabalho.Se,noquaseextirrto
garlo nascir-1o nos rrreses de inverno e rle verzlo. [,l.-rs se consütuíam num sistema das vacarias,-o gaúcho podia gara.tir sua sobrevir,ê.cia fora
misto dc irabaiho e dr: festa, já que pa:isava di;rs praticanclo com oukos das relar;ôes de trabalho, ou melhor, traÉarhava ocasiorralme.te apcnas
1--i11r1;an.irc:iros slla l-rabiliriacie de cavalgerr, ao ürcsmo ternpo rlue laçava, pa)ra se i-ntegrar nLinra economia cle n-r.ercacir-r, agora, cada rrcz n1ais, cle
Llsa\rzr c.,-t t:rrc:lillo, clo ferro de marcacão etc. passâ\/a a vi'er do scr.r trabalho. Djt. crn oirtras palavras, a proibição ;
Poi"órn, foi n;'rs brigas cle galo e nas iritas .()rporaic que o gaúcho cia come-rcializ.cã. r-le co,ros sen1. mar.cA e a
;rrivairzação r-1er térra e clos
mcliror- associcu sr-ras vivências, conr. seus valores, suas representações, rebairhos induziram- os garichos a retirar a sua subsistóncia cla sr-ra força
sel-r Lma,tinário scci:rl. A virla lir.,re, cheia de en..ocÕes e perip;os que ele ,il irahallro. f.rmherrr ,rs cstáncirs, .ro prepiclârent umâ ccrl ,r tlir ir..to
r

enjr-entar:lr, 1;rçanclo, marr:ando orr rlatalCo o tlac-lo, faz corn que ele s,cjal cio iraball'ro e r-r anmento cla proclúção trastoril, exigirarn que estt,:,
1

convil'es:;c conl a.",iolêrrcia coiporal no seLr <li;r-a-clia, passar-rclo a acei- per sonagens fossem se intr.granc,r ao mercailo de mão-àe-obra, srlja .lc {

iii-1.l t:0rr nahrralitia..l.<t. i:'r)r issr>, r,aloriz.tr',t,r ,rl1ii.','2, it c()t.'agem, il forrla ocusirlnar_[, seja rlc forma pcnraltente.
)
r86 AS tir\izt:s I lts'l'(ititcr.s t)o À.u,1{('(§Ltl A l{l1ctÃL) I,l_At-lN^ ( 1 )l_( )N J.,\ I
itl 187
Como se não bastassem essas transiorm.tçoes, i't trpçào crescerlte t'xe llrsrvanrerrtc ir p.rrtir tlas lorlrr.rs rJc
,;1 clonrirr.rçào, nras t,rrrrh.rr ,rtra't,s
pela pccr"rári:r como atividade econômica preclominante propiciou que c-las formas de resisrência, cias presscies
que clesafia;;;r;;;rô,-ia cromi_
se instalasse, na Regiao, Llma sitr.ração marcada por contladiçoes. Ao nação.
rnesrro ternpo em qlle a pecuária extensiva fazia com qlre a terra se , Neste segrtrento, r,erificamos, pois, como a clomil.ração s.cial r. a
clestinasse à criação e a reproclução do gado, expulsando o horncm que expior.çã. econôm ica, c itacl as an teriormcn te, foram
."a,..,'roat or, neg a -
ali lrabitava e o impedinclo cle povc)ar a campanha, de corrstruir seu clas e^afastadas per.s ciominados. para tal,
abordan.,*
resistê.cia como umA maniÍestação diÍerencia.t" l.r'io.r"r.,,o, .r.,
rarrcho, de alinrentar srra família, ela necessiiava de forçar cle traba.lho,
principarlmente se considerannos que a produção depe.nclia ainda fun- irrterior dt'urna s.ciedade qu('passava por. rransf,rrllaçu(,s ;;;,;';,lorirc,.,,-,..-,
e finalidatit: foranr rl.iJerentes puru codá uma r.rrj. st.rrhL1.
ciamentalmente da habilidade e do conhecimento da mão-de-obra. das classcs s()ciai\ (,n\.()l
A necessidade rle disciplinar o habitante da campanha para as vidas. Em .utras p;rravras, consideramos a resistên.i"
q.,; ;; .fercct,rr
iides nas estâncias e a de o cornpelir ao trabalho assalariado exigiram a às tra.sforr,rações eco.ôrnico-sociais que
se opera'arx, c..r. ;rlg,.r crrr,,
acloçã<> de um sistenla rcpressivc'r, base-ado num aparato ludicial e se efetuava no interirrr cra sociec-lade, oi.,,lo
q.rf p-,n.,.."ri.i,',: ,i., r..(i.rrr
policial que se encontrava sob estritt> controle político que perseguiu e ças' A resistô.cia é r'ista, assi,r, como fruto dàs a.tagonir,r-,.r.
e inerente à societlade capitalista, mesmo .r.. class,.
marginalizotr todo aquele que não tivesse um trabalho co,lchaltado ou se co.siderada na sua fase rli,
r

contratado. A fim de obter urn nraior controle sobre a mão-de-obra, gestaçãt-r.


fr>ram estabelecidas rurra série de restriçóes acerca das relações do Ana'lisam.s as,atitudes que evidenciaram uma
dir as mudanças e de resistir ã.aisciptrna-e à vigirâncru tentati'a cie irnpe-
homem com seu trabalho, as quais abrangiam, também, seus hábitos de
donrinaçâo, no qtre d.iz rcspeito us for.nus a. ir,.,pà.tns pt.r.r
alimerrtação, vestuárir>, lazer, etc. Elas visaram submeter, gradativa- o n,,r"."- ,.],,ii"|i,.,o..,,,.,,
mcntc, o habitante da campanha a não apenas trabalhar Frara viver, mas a terra e com seu trabalho. Consciente-s
cra dificr-rrclua. a.j..r.,.,rrrir.r rii,
viverl':,ara trabalhar. Assim, clentro desta perspectiva, foi elaborada uma mtureira explícita essas resistências, já que nelas
o sirêncic-,, ., r,.r.rplícit..
legislação que atingiu e penalizou os vagos, que controlou a mobi-lidade o in'isíver estão frc'qüentenlente p..r".,tes
e a ocupação dos indivíduos e que chegou a interferir nos seus hábitos vanl.s recorrer a d'cumentos que ürdirôtamente do que o m,nilestt,,
-ái-.
r.,.,s p".rr-,it"rr-., irenti
cle vida, ao proibir o uso do uLchillo, as pulperias volantes, a bebida, o ficá-las' Neste se.tido, consi.l-eiand"
jogo de azar, etc. à;" as questoes reiatir.,as .1() us()
da terra e ao trabalho fora;n alvo de urira legisiaçã.;.r.,;;;;.L..ro,,.,
Ao caracterizarmos a sociedade platina como, fr.rndarnerrtaLmente, orderniudiciaJcos(,Llrr.lo-acatanrentocracaracterizaciot,jtrlg,r,i,lr.onr(l
dividida errtre proprir:tários e ;rão-prttpnetários, ternos qLte reconhecer crime, exarninanr«rs os registros de juízes
de paz e chefcs cie polícia .r
a direção que a classe dos estancieiros e pecuaristas foi imprirnindo a firn dc ictenrificar a ação do homenr .rrnt i.".,tl;;;;i....i..
esse processo de transformação. Como, até este momento, os estudos segundo mornento, Nu,r
TnlfoTg:."s depoirnentos de pecuaristas, fertos às
realizados têm privilegiado o comando dado ao processo pelo grupo vésperas da eraboraçào clo Códig" nirur
áu p.o,ri.,iiu à;'8";;;, A*es,
dominante, consideraÍnos necessário destacar a atuação dos homens pelo senado e Câmara de ReprÉseni;i;r,
de 1g65, onde apareceranr
iivres sem propriedade que compuseram a classe dos trabalhadores, ou
seja, da força de trabalho presente na zona rural da camparúra. Nossa :91:11": "s principaisa.m problemas q"" ãíisàrn;;*;"
açõcs ...,b.. n, q ues rões ct esta c,, i;lodurivt,
proposta é identificar ser.r comportamento frente às muclanças que se Jjp,ill"; l"rll:,.à1?" - a s p., rA (,

operavam na reaLidacle da Região, que não s(> exigiam uma maior A firn de merhor percebermos as reaçoes
participação dos mesmos 11o processo produtivo, mas também afetavam namos, para análise, ;r proví.cia de Buenos
d. homem rural, selecro_
sua maneira de viver, cle se locomover, de se divertir, etc. 1830 a 1840'3 A noss. ver,-nesse nlomento,
Aires, d.r.;l;;;'anos cie
o processo cie tra.sforrnaçãc)
Entendernos que toclo e quaiquer processo histórico emerge e se ali atingira um nír'er cfe dese.vorrir;;ü
capaz dc- proporcionar conl
constr(rl a partir da contradição. Assim, o qtre aqui esfudamos também certa intensidade as muclanças acima referidás
,-ro .,iáu á1, tÀir.lt-,n.t.,r,
se constituin de um complexo clinârnico de experiências, de reiaçÕes e como' tan.rbém, já gera','a pressões contrári;rs
a .ras. e=to .,-,r,trrn.liç,r..,,
cle atividades controladas c cxeclltadas por uma classe social que,
entrL-tanto, rrão cleixor-r der sofrer pressões da c»utra classe ali presentc-,
pressõcs estas que c()rrespoltLlerarn e clevt-m se.r cor-rsiclc',adas corno I Duinteesteperíorloe.rtó lg5?, llur_rros.,\iresera autô
Irror.Íncias L,nidas clo llio tl:r Irrata.
marrifestaçÕes da luta de classes. l.Ja prática, entendenlos que este ,".a.r -r.,, _::íil;:f
Conr'éIl lembrar' tanrbtirtt, qtie a Iieprit,lica s;,,";;'il:'J ;;:;l::i:,.:,til:'l.
Proccss() n2io L-rocie sr'r atrraljslcl() apenas no singular-, istr> é, únrca c (irancle do Srrlst errcontrrva
t,rrr-oivllo."
or]t,.ti:l d. [-i^rriu,ri s. f<;rnr,rr. r r) ] ri:,rri ..
!, I{i(,
ff""ui..ir.r'i.arroupilll3 íl&3-s-l,gli)
r

188 AS IiAÍZ1]S I]IS OIiICAS DC) Nli:,i{CLbL,i


A i<EGIÃO PI-ATII .\A COI-ON],\I- 189

inclusive, foi responsáve1 peia coniuntr"rra políticir marcacla por uma mantinha em suas estâr-rci;rs.5. As palavras de Darwin, que abaixc'r
forte repressão eiontrole social que caracterizott o período. Em outras reprocluzimos, sugereni que o arnprlo conhecimento que o ditador e i1

palavrai, acreditamos qu€t as necessida.des cle elal-,orar uma legislação estar-rcieiro tinha de todas as atividades iigadas à pecuária e a slla
qre compelisse o homeÀ ao trabaiiro e de organiz-ar lrm aP_aratojudicial habiliclade ern manuseaÍ a cuchillo e o cavalo lhe permitiram a prática
á policiai com poder para controlar e solucionar ils qu-estÓes referentes cla donrinação por consenso e não por enfrentamento: "Por esses tncios, c
.ó t.bul},o nãà surgiram gratuitamente. Elas foram fruto também da adotando as roupas e os costtLmes dos gaúchos, obteae utr,o ilimitada poptilari-
resistência que o gaúcho ofereceu ao Processo de transformação por que dade na regiao e, an conseqiiência, utn poder despótrco".(DARWIN, 1942, p.
passava o .it.,.rtr.u econômico-sociài da Região, recusando-s.e ou ofe- 1 13)
recendo reservas ao selr euquadramento como força de trabalho disCi- Nunca é demais reproduzir o texto muito citado, quando Rosas
plinada que retirava do saláiio a sua sobrevivência. diz Covemo Uruguaio em Buenos Aires,
a Santiago Vasquez, agente do
l

' Essà período caracterizou-se por reprimir os vagos€ defender a ao ser eleito governador em 1829:
propriedade. A ancxação de novos carnpos ao território de Buenos Aires
à a êxpansao das exportações de couro e de carne salgada exigiram que [...] conluço e respeíto rrtttitc os tnlentos de muitos dos senhorcs
a populaçao despossuída da campanha fosse mobilizada intensamente, que gol)errlaram o país [...] porém a melt oer todos cotrctiant
r";u pu.o atuar ha guerra contrã os índios e na defesa do território unt grande erro: se conduziam ntuito bem cont as classes
.o.,qrirtudo, seja paia trabalhar nas estâncias que cresciarn.em.núrnero ilustradas, porém desprezoz)rltt ao hornent da classe baixLt. Eu
e exÊensão, principalmente junto à nova fronteira. Contraditoriamente, cotnpreendi isso c me pareceu que lances da reuoluÇao [...]
a integraçãà de noras terras abria possibiliclades Para que o gaúcho haaeríartt dc dar lugar a qlte essa classe sc sobrepuscsse t i

,rrantiiesse o moclo de viver clo antigo sistema, explorando livremente causasse os nniores rnales [...]. Foi preciso me fazer de goúclto
as novas terras e o gado que ali habitava. conto eles, falar como eles, e fazer tudo quanto eles faziatrt,
Sendo assirn, o Governo canalizou sua atenção/ seus recursos e protegê-los,fazer-me seu apoderado, cuidar dc setts útteresses,
sel.r aparato ideol(tgico e administrativo, visando impedir que estas enfitrr, nao medir trabalhos rLefit meios para adquirir ntais stt.L
possil.rilirlades se efótivassem e compelir o homem rural às novas fun- conccito [...]." (Apud ZORRILLA, 19-, p. 157).
çõr.,, .-1,r" clcvcria desc-rnpenhar. Do ponto de vista dos recursos
despen- A documentação referente ao Poder Executivo nos mostrort que a
didos, tenros o exemplo da poiítica da ocupação progressiva do territó- população mral, naquele peíodo, foi objeto cie especial controle poli-
rio dos "saloajes", ao sul da?rovíncÍa, a qual objetivava manter mobili- ciai. Em relação a isso, destacamos o exemplo de que apenas sobre el.r
zada militarmente parte da popuiação rural, impedindo, assim, a lirrre foi mantida a exigência do passaporie para transitar no interior da
exploração das terras conquistadas. Por outro lado, a coerção e o disci- Pror,íncia após o decreto de 26 de janeiro de 1833.6 Da mesma forma a
plinamento da força de trabalho existente foi possír'el, também, devido supressão da Cuarda Nacional e a reedição da legislação que discipli-
aos recursos que o setor policial recebeu, o que the possibilitou exercer nava o uso da mão-de-obra nas colônias permitiu que a perseguiç:ãr'r
sua ação re'pressiva com eficácia. contra os vagos fosse realizada con-r afinco, e a população margin;rl sr'
Do ponto de vista ideológico, cabe clestacar qtle a fonna de atuação recluzisse.
de Ros;rs junto aos despossr.rídos foi marcada por atos de proteção e
iderrtificação com os rnesmos. Neste senticlo, podemos exemplificar,
destacando a sua popular:idade junto àr população negra, tlecorrente do tradicionais, assim corro participava do gosio p--o;rular f.elas corridas de cavalos, as briqas r:1e
gaJo ou jogos comuns nas Íestiviciades pátrias". (1q&1, ir 1 I)
grande número de alÍorrias que suas camparnitas militares propiciaram Intinreros rclatos cle viaiantes e análises cie historiadores inr1icm cste dado. Conro crcmplo,
àos homcns cle cor cla Província. lgL.rahnet-rtt., tt-,l grancle Su;'i Liderança citar:r<rsc,-sdeCharlesDAlt\,YIN\1912,yt.10f crlelohnI-YN"CH(l98.1,p. iI1).
jur-rto à ptrpulação iivre e pobre da cun-rL-r:lnha, r,rirl,:ipralnlente Por seu () No scu ic\to, () d€crcto afirtn:r'a qrtr:: Considcranci0 o I,rvt'rno ()s lnL()lryt nl,,ntr., (iuc s(,
conhecir.nt:nto das lides cio campo, pela vaioriz;tçito qr-re clava aos hábi- irf)r"s('ttt rtlt aos ttrclii írluils (j,.lr necessitanl trarlsjt,)l clerrl r0 rlO territa,rio rla J)rirr,í|eil, c0lI lr
obrigaçào Lluc lhes imPatm de nào pocler r i.rjar strn f,ré\.i(1 passap()rte cla l)clÍci,r, concorr:1,rrr
tos da vicl;r da carnpanh;r'l e pelo elevado lltlll-rercr cie ernpregados que g riecrcir: ;\rl. 1) Tocltrs os inclivícjuos qtre tenlram ilrre sirir cla I,rç»,Íncia,;rrxli:rio faz_i:.lo
lii'ernente ser. lJccnça ou Fassaf)orte da Polícia. Art.3) ()s peôes clos estalreiccimentos de
aiL,rf o rr:ia porlcrio trarlsitri :r c.rilrirtrrtha :icln e c()rreSF)(rltdente boieio Ott L--Sjc do p:rtr.ir.,
I Sobre Ê:tt,t valorlzaçao, Lriiz /rlberto Rornero Iros (-lii ultnte;ttos ,ro tliztr: 'fJo fr'ftpo dc Ilosa-s,
.llno rlo esLabelt-cimenio de tlrre tlc|endan.,". (A(lN, Llrrenos Aircs. Nuer,.r Ilecor:rp,ilrción .1,,
I(,\,r'sv[)ir-rcií)srlplrPr,,r.rnci;rrit'l]uenr,sAirr'::. lSlO-1s76.'l-onrol\r lnrpri,nialVJcr.rrrr,,.
i,rlalri/?. i, rt,lr i.urld l)otLltLL, tjo tt1tt,.ü) n licntr r1'ac/ii r" irr?rri in sr' lrir'rlliiiili'Íl t t)ttt t!ii!udcs 6 ir4ltrrr'-(
1ri77. p. 'it:
i
190 AS R,"r IZES I ll SII )l(lClAS ll() iu[lt(, t]r Lr I- .]
LJura,tu()*()\(',1()dt'Rtrsas,,sclretesdq, l,,lÍciat,l .rrntrlrrig..itlrrs I
Os registros judiciais e policiais .t envi;rr rt'l,rtorios rrrclrsaLs a seus srrperiore5, r,rrde aprt,s,,ntar.aln
rrrrr \ I
A observação dos registros judiciais que corresPondem ao final resrurro c-ias ocorrêncii-rs registraclas, tecendo, às vezós, consideraçtics
\\
do período colonial permite verificar que as caLlsas mais freqilentes Para sotrre, clir-na socia.l Prr'sc.te rraquele rnomento ern seu partido. At;;;;
a abertura de processo diziam respeito ao roubo de gado e de couros, c-lestr's re.latírrios, c()rlstatamc)s qlre o tipo de crinre mais c()n1um
na zoÍrA
bem como à propriedade da terra, solicitadas através cle clenúncias, rurai era o de vag., que licierava as listas, s.eguiclo pelos de e,rbriagu.z,
principalmente, e à ocupação indevida clas mesmas. briga, jogos de carta, trso indc.vid o de cuchiltõ,etc. úerificamos, tarnl-:ér.,
De uma maneira geral, elas se reiaciona\ram às formas de ocupa- que a ordem social na carnpanha, orientacla a partir cios inter:esses c1c,s
ção da terra e de exploração das riquezas da Região pelos seus habitan- proprietários cle terras e pecuaristas, foi de certa forma alcançacla,
tes. Dcmonstravam que estava em andamento a instalação de L[Tra nova principalmente nos primeiros anos que corresponrleram ao se,gún.ro
forrna cle o homem se relacionar com os bens e os meios de produçãc> manciato cle Rosirs, como clernonstram as mer-rçõ.s ali presentú: "[...]
existentes na camparüra, tendo por base o registro da proprieda.-le dos toilto tt salisfnç,1o tla nrrttncinr-_lhc-que no Ttrcsotte rnts tôrrt siilo ntritp pottL.tts
rnesmos. cotllo o obserua V.S. t: ct Pnrtido desfrutahoje deortlern e trarrqiiili.tlnie',10 or-r
Comparando o desenvolvirnento desse processo durante as duas "[-..] , juiz de Pa" encnn'egatlo dessa Cottrissaria tem a ltonra de leaar
aL.t
primeiras ãécadas da época independente corn os dos anos de 1830 a conhecímatto de v.s., a porf e nrcnsal das ocorrênclas dessn secçao, elas f êm sítlo
i840, constatamos que as questões relativas ao uso e à propriedade da nnrito poucns e de potrcn consideraçaol'_!!_
terra e do gado já não eram tão freqüentes neste último peíodo, pois já o exame da crirni.ralidade ruràesclarece em parte as relações
haviam sido equacionadas de maneira mais ou menos st.tisfatória- sociais na campar-rhà. A ci-rmih--arãíaã não podt- ser vista apenas conro
Desta forrna, a política de privatização das terras, lcvacla a efeito m anifestação d e tr n'r comportamento anti-sôcia l provoca cl a por socia i
l -

por Rosas c r> cuidado para qtle se Processasse a marcaÇão do gado e o zação paiológica orr inaclequada de indivíctuor. Êm alguns rrrornentt,s,
icgistro de marcasT contribuíram para formar tal panorama- Se obser- o crime expressa tun status social definido pela maneirã corno o indir.í_
varmos os registros relatir.'os aos anos de 1830-1840, verificamos que duo é percebido, r,alorizado.e.tratado peràs autoridades legais. vrstcr
polrcos se referem a forrnas inclevidas de ocupação das terras- Exempli- sob o prisma das rel^ções sociais, o cúnã pocle clemonstrar ,í conflitrr
ficamos com os do Cornissário de Polícia de San José de las Fiores, que entre grupos soci.is onc-le a classe clomi.ante se utiliz_o, cla lti par.a
rroticiou"1...1 haaer multado Rrunom Arrieta ern 25 pesos Por tü sert rebanlto defender sc-trs intert sses e fez dela instrumento cle pocler, de dor-rrináç., r.
sem pnstos, prejudicado a aizinhança."8 Nesse cas(), os grup.s s,ciais que não se aclaptam às suas clctr:r'rirr.çircs
Mais numerosos são os registros relativos ao roubo de anirnais, o são classificados como crimir-rosos, o que aconteceu, por exern;rlo, coln
que, a nosso ver, indica que os despossuídos aceitavam melhor a priva- os gaúchos que resistiram.à legislaçãó que os obrigava à apresentação
tização da terra. Isto ocorria porque o gado continuava sendo essencial de contrato de tralralho e de passaporte.
para a subsistência dos homens da camparúra, enqtlanto que a terra Como afirma E_ I,. Thompson 1fOaZ, p.3ag_50), a lei existe co.. a
aparecia, por si só, apenas como valor cle uso e de troca incliretos- Assim, função ideológica cle sen,ir aos interesses áa classe áomi.ante e iegiti-
fói freqüente os juízes de paz determinarem a prisão e a cassação da má-la.no pocier. Senrlo assim, a legislaçâo que regulaya o trabalho e
"Ttapelcta" de indivíduos que eram acusados de "haacr carregado aaca considera,a o seu t-lesacato como crime civil pode sõr vista como instm-
allteia" ot "rle lutaer roultado nnnoda de ouelhas".9 mento que os proprietári.s de terras e os peclraristas utilizaram para
Entretanto, ao observarrlos os r:egistros judiciais e policiais dos proteger e alca.çar se,s objeür,os de dominação econôrnica e sociar. A
anos 1830-1840, constatamos que as principais causas das prisÕes, mul- maneira como clefiniranr e perseguiram vagos, desertores e ladrões,
tas e queixas efetuadas dizjam respeito a questÕes reiativas ao trabalho. dentre orttros crimintrsos rurais, o ãioro interesse ecorrômico
de obter um peão dócil L-iar:a trabalhar"xp.essa
nas estâncias.
A rrecessicladr tlt'coloc.r a força de tralr.lho prr,,se.re..r c.llr.p(r-
nl'ra sob uma se\/('r;r lr-gislação criminar, a fi,-r de, porlste nreio,
Nestc senticlo, terros o decretode 27 clr: abril de 1832, que ordenava oconlórcio t-le g.Lclo apenas controiar
coDr uma marca ou marcas iguais, e o de 14 cle outubro de 1&39, que exigia a renovação dos e disciplinar, rr:r't'la, por .utr. lac1o, a presença de resistênci. a est.
registros de nrucas a todos os Pecuaristas- (AcN, Buenos Ailes. Acta del 74 / 10/ 7839. Policía.
Partes de Cítdad. Partcs tlc Cnnrpafin. Dirision Cohícrno Naciorral (DGN), Sala X, 33+1).
8 Idern nota 76- 1(t \4, r/r,s IltClN, (Sat:r X. 33 2-3)
g lclenr nota 7. ll
I

A IIECIAO PLATINA COLONIAL 193


192 AS RAÍZES HISTOzuCAS DO T4ERC(»UL

os grtlPos sociais ali ta par.l CxCCutar SuaS tarefaS. Corno ta1, o cot-rtrole'exercic-lo sobre a c[asse
rlominação e a não-iclentidade cle interesses entre tr:abalhaclora atingiu as SuaS horas de lazer, evitando assim qut: fosseln
afirnrar que as relações que se esta-
p.átá"iJt. r'or tudo isso, podemos despercliçados tempo e e-rrergia'
c-lurante os séculos XVIII '
beleceram na zona ,ràt áo campanha platina e pela Entietanto, para o gaírcho da carnparú"ra, estas proibições altera-
I. do XIX forom, em certâ mediàa, marcadas pelo conflito vam o seu modo áe viver. Acostumado ao uso da bebida, por exernplo,
"-"-aÀr
violência e que o ajudava a passar as noites frias ao relento, ele não considerava a
situação ocorria porque as irnposiçoe.s {os proprietários .'^b.iugru, comô crime. Quando preso por este motivo, preocuPa\ra-se
,ecuaristas entravam direto com as relações que o habitante
"*.oÂftitó em se ciassificar como "1...) não ser tao bêbado 1...1pois senlpre odiei este ztícirt
ã;õ;t;;ã., Ju .u.r-,pu..rta estabelecerír com seu meio' com
atinS;indo a
seu trabalho' e não costrtmo erubriagar-tfic ttcttt ser preSltiçttso".13 O
mesmo entendimento
forma de prover a suà subsistência, d'e se relacionar
há muito estabelecicios' Acostumados a uma tinha sobre o jogo ús brigas com faca, pois ambos faziarn parte do seu
afetando, iogo, costumes lazer diário, 1a qu", -"sÃo quando estava ernpregado, era grande o
e andarilha, d,e cavaleiros itinerantesl2, os gaúchos
vida independente para número de horas livres de que dispunha, visto que o dia cle traball-ro se
representararn uma classe rebelde, potencialmente revolucionária encerTava ao entardecer e, rnuitaS vezes, O clima adverSo fazia com que,
pÀ, isso, autora de crirne sociai' Sob o seu ponto de
a t-lite pecuarista em outros, não Pudesse trabalhar'
", despossuídos pretendiarn rnanter o modo de vida
vista, entretanto, os Os bailes, ã música e a dança, por sua vez, se constituíam em fo.te
à forma de
em que el.s pe.mu.,"ciâm, acrediàndo-o como adequado oe diversão e de oportunidade de manter relações sociais. Como tr
qrà lrrlgurum estar em harmonia com o PamPa seus abun-
e
"*irtàt.iu gaúcho costumava cruro, o pamPa em busca de trabalho, e a clistâr-rcia
clantes rebanhos de gado.
ãntre uma e outra estância era grande, sua vida se caracterizava, em
Em 1g70, José fternand.ez identificou as bases estruturais da cri- muiLos momentos, pela solidão. Por isso, apreciava freqüentar bailes,
análise
minalidade ,.rràI quando escreveu a mais eioqüer-rte.e P-"-"ti:3 tocar a viola e cantãr. Não aceitando, como Martin Fierro,
"1"') qtLe é
clos problernas sociãis da carnparüaplatina em ser-l épicoMartinEierro'
ha.ce l:n Saucho mal-entretetlido, se em baile o surprea'tdenl ["']" (HERNANDEZ, oP' cit'' P
Acr t:screvcr versos .o.r-,o "y atienian ltt relación / que
't,r'rr;'f,,,0u, 51), várias vezes recebeu multas "1...) po, l'nuer.feíto wn baile attt stta casi
r,ttcTtarlrt't1 maridátnsido/ cn4teírosorJdiligente't V^t:!embargo
't,, gc:it- I Io'ticne por ttn banrlido" (HERNANDEZ' 79--' P' 14) o:u"tns scm licença [...]".'n
(ID'' ibid'' P'14)' percebeu Reiletir sobre o papel que as pulperias cxerceranl na zona rrtr:rl
,tii1ir,,',,,, tlttt: (tro ttng'o/ y entraron a persegtinne"
do crime rural representaram comportamentos nos auxilia, também, a expúc.. este perÍodo marcado por c<>nflitos
lúu -.ii,u* cate[oriás sociais, muitas .reres p.o.roàados pela resistência que os traball-raclorcs
inadeqiados a partir dos intereises da ciasse dominante. Falta
ül;"J". colocaram às novas relações de produção e às novas relaçÕes sociais quc
â"?por-.ridades econô^rnicas e de acesso às propriedades, associada.à se instalavam na Regiâo
arbiàarieda de, colocou, assirn, inadequadame^te traball-radores
rurais
As pulperias, vendas rurais ou tabernas, aPesar de todas as proi-
na posição dc' contraventores-
' Ao proibir o uso da bebida, as brigas e os iogos d'.e az.ar' a classe bições e vigilancia que sobre elas se exercerzlm, coutinuaram a scr' (:)
po.,to de Ãcontro preferido pelos gaúchos. Como tais. serviram clc
dorninante tirüra um endereço certo, ou seja, prele.dia disciptinaÍ)a àr".u puru vários Crimes rr.rrais. Em sua obra Facundo, Sarmie.t.r,
máb-ae-ot)r a para o trabãiiro, fazendo com que estivesse sempre-drspos-
up"r.. d" inserir sua análise na concepção vinculada à classe domir-ian-
té, oncle a pulperia se constituía numa ameaça à orciern e aos bons
costumes, deixà que percebamos a importância que elas tiveram na vida
rctratil' com saudade' esta
A pra'si.r de ]uan N4aria Clrrtierrt'z-, escrita na r1ócacla aclui estrtdiltlr' social e ,ra reproãução dos valorcs culturais tlo gaúchtl:
onelc bastaVa possuir um cavitltl str vi\'(:I c solrtt-'r'ive-r na campmha:
virla c-lt- liL.ordadc Paril
''E,tdtchrt ,1al .ynuclto(183E) - Mr ,nbnllrr rrn nti t,irlu, htrí l)i(:11, ttli tttlit:i Lt'st)rL);f i LlttiL'1t |tlc uuclut nti [...] o rcsto do dio, o nlt.;orit? ruurm rctnrintt cttt ttttt{i
'í)ctltltt o:r
rtti Morrt
únru. /vu l,t ,)nr,1 nti qLLtri,la/qttt trs Jlcrtnosn canlo lttt or() - o tttí tiidlt trtt: lLtlhbnfuntulo pLrlltrin- Ali uctn'rttttr cotct tititru'ro da potoqtrinttt'ts Llos nrrcLll'
7;ii,111,fliltrc on cttrtttdtt qutrí0./tti tlLtapctLill nr msultatta,hti
rtlulLlt rtrt l)'rsd§rrúl - Ett lodtt paSo t|
tt tL'lltuttLtrr '1ít'ítto'/por ltts cntrt:ros rcs; ali se dão i: sc aLlqttit-t:trt (1:; tlotícios sL)brr- i': ilt1i)tt"i:
corfiürafLlottril: estnnpo l,as y'ísadas,/alií sus glorias grtfttadasielriLi'
snrrnJri:;. -FttarloenstrsoioslrLcía,lLderabiiydedtspaclto,fittcsp'unttintrobadtclptth't'/si-lra.selPato extrnpiados; traÇant-sa no solo as lllttrc(ts do tnd,;;srtbt' s( rttt,i:
ln csprtclLt le lnncaba:/zartjas V
corrit,/v Lttro lt gonaLta L:, trtcha. - Mí cabailo üa una flccl1o/ tltrrutdo
t1l-if it t lt]1!)tt tittÍ' tttt itls abri*o!/2Tc
,rrrrrVr"t' snlia!,o,'frLutttdrt t'tt rtri. ntatto t)crtclta,4u l\)ltt 'ert'ta
nrrrrrrlns r:ttnnrlo r,ettíithttlolllcottlàra María,/altottttltltttr
tr'sirtr"/'Jr'ias//arrrnstnqucardía-?-i1'c
13 i\CN, IJucnos Airr:s. -§rr:rrtrlria dr /bsrrs. lt'31 185(). DCN. (5iala X, '13-2-7)
!, :,t. t.,..:,,,1.,.t. tx,\ ..,1,
l4 ÂL;N, Buetros Aircs. .l'rlicrt. PttlL'r Ll( t.iitLltltl t-:1,
errti rrlrz:: ,/r'1 rfu?..." (CUTÍ|-RIIEZ, i9 -, p' 81)'
_l 9,1 r\Sti.lizt,SIU-.i t\)iit(.\St.r()N1l:l(L.(l>tJL:
;\ Ii.II,t],IA() It-A'I'I I\JA COI,ON I A L 195
ctlÇít e ti{rc; otlLic sc tent uisto o-ç ,.Í?s/,os do lt.io;
Ltli sa armant nrilitar ao não apresentar () passaporte, eia teirnava em não considerái-lo,
as ctlt1'L'i t1.,5, sr reiotlrtL'c(rt os ,lcrores caooros;
arí se confra- ricmonstrando, assim, c1r-re não aceitava as restriçr1es que erarn irnpüsta_s
terrtiztt pero círcrrrtr do corpo e dos a sua liberclaclc de ir e vir e ao uso da sua força de traball-ro.,o registrc,
TtroLriguri^otrcs dos qtte
pos.sueltt. [...] tt gnticlto estinn, sobrc torlos ãs
coisns, as for.ças tle prisão de Manuel Aguirre serve para ilustrar o que afirrnarrios,lT
físicas, n desl rt:::tt rto nrnncio ,tt ctntalo e, nlóm de ttrclo, o oalor. l)errominanco-se'de "peao dc compo", mas que não sabiadomar, vestincfu-r
trr.rr. ciraPéu cle palha ordinário, casaco e "chiriTtá cle égtrn cordooesa,

t:f,,'; ;i:ti;#í;;;i,;;,1:Í:";::';:,:T:Í;; crtbíoncillo c cnbado de bota dc potro", foi preso no particlo de Ãrrecifes. sen.
passaporte, conduzinclo dois cavalos e uma égua sern as guias corres-
Dessa forma, a persistência do costum_e, pelo pondentes. h'rdagado_sobre sua região de origern, disse seide santragt.r
gaúcho, r1e freqüen_
tar as pr-rlperias,15 incrusir.e as v<rla.tes q.re l-rai,ia.r-r"rrao dei Estero, estando há cerca cle sete meses em La Guardia d.e Lttjan, onáe
pr.riuiaas, e ari
praticar seus crrnres, ou seja, bebc-r, jogar, lutar, cantar, pennaneceu trabalhand<> de "peao para todo trabalho cont D. José'I'obal",
á,.., ,_rà, indica
clas se constittríam rlum.ros rocáià'o.de o gaúch;;"p;.1r*"a
c;r-rc dirigindo-se agora novilrnente para sua terra. Apesar de saber <la neces-
a sua
resistôrrcia, a sua inconft,rmid.ck: às novas sidade de ter o passaporte, não se preocupou em subshtuí-lo, pois l-ravia
exigências da cirtrninação.
Po. otrt.o laclo, .o verificannos que, nelas, de"m-.,.iru perdido aquele que obtivera quando entrara na ProvÍncia áe Buenos
produziam manifestações otrtras do qr" aquelas qr", il;;i, não se Aires. I

a"r,iã., u *rdu.,-
ças ocorriclas na definição de legalidàde, passaram a ser consideradas De uma maneira geral, podemos dizer que os delitos praticados
c()mo contravenções, corlstata,nos que a resistência na campanha se relacionam com as restrições irnpostas aos gaúchcls ncr
f..na isolacla, sile,rci,s;r, e q,,e Lrrscáva ma,.ter arrtigasainda se fazia d,e
reraçõres sociais,
que diz respeitc> à forma como se relacionavam com seu trabill-ro e colrro
de um mod. cle vicra e viiloies culturais que esta'am se divertiam. Isso ocorre porque as Lransformações qr-le se ol)L,rav.rnr na
serrcio extermina_
rlos. estrutura econômico-social da Região impunham a eles urna vicla cacla
ILrst;r referir outro dos crimes rurais que foi tão
frecliie.te como o vez mais clependente c1o trabalho e uma perspectiva oncle este der-ia se
cle'ago e_que, também, pode ser entendiáo como uma'n:ra.iiestaçao, tornar um fim e não .nr rneio de viver. Esta constatação é reforçacla por
por parte do gaúdro, de das alterações q;; algumas clescriçoes do arnbiente social que se fazia preserrtL: r-râ carnpa-
ao seu moclo de vida: a ^ão-aceitação
falta do passaporte. A exigência";;;r.postas nha daquele período, feitas por viajantes e obsen,adores do rneio.
de apresentar
este docu.rento às autoriclacres poriciais ao Ao contrário do que afirmavam freqüerntemente os estancieiros,
.o-pniü;
o tglperlm5nto clo peão de campo e com a reali.lacle
.].;."í"-re corl
clo me io rural. A
c>u seja, que a camlranha sc. caracterizava por ser Lun local orrcle a
resistôncia do ho.rem r.ra] . tocia e qr.ralquer fiscalização insegurança e o perigo e.am constantes devido ao fato de esterr povoada
pelas forças policiais tornava repuisivã esta coerção.
ãa sua vida
por desocupados, assaltar-rtes, ladrões e assassinosl8, o naturaliita Char-
A vida livre, cheia d".erooçõres e perigos em que les Darwin e o viajante william Mac Cann, já citados, deram ênfase à
orde, como e quando devia traúalh,rr, era=cer."oáo o gaúcho decidia hospitalidade e à afabilidade que caracterizava a sua população. llecor-
p"io exigància do
passaporte, ainda mais rlue todo atluele que e.u dando suas noites art relento, Darwin descreveu a alegria que seus
cor-.'si.leradrivago, ou
sej.r, n.Íri possri Ía papcleti rlc c.rrtrato, naà acompanhantes sentiam ao fazer pousada sem lugar áefinido, não
tinh,r tlireito ao circumento.
ivr,is, alnr1a qut'a população tia c.rmparüa
fosst, ftrrtenrt,ntt mencionando medo ()u preocupação quanto a assaitos, roulros, etc
em
sct ts tlt'slucamt'n tos por n 'igiada (\942, p. 101-7). O nrcsrro encontramos no relato de Mac Cann <1tre.
f ,;rl.i; .;,r ;ã.".r.iço
l, rd a a z( )na rtr ral l
<, Íc,ssr,
apesar de ter sido roubado em alguns anirnais, descreveu com ênfaie a
15 \"iri.ssi:oosresistrosdepris.es_rlrinclir,Ítiuosporestarenirc(liientarlricumapulperiaeali
praticaÍcil crimes Corrro temr>s
,,[....]
1I",.,1r" 7,rrr ltm,cr stlo tttciytlrnçiLt ttn ytttlllg)i11 iotrt lacns c
sellt lall,lti{t d( ct)tltrrro I...]'. (.-rcr,-, Bucri()s Aire:r. policút. [,trlrs r( crntp,;.in.'ia:r;
33 i 21. '" .- "'i "" "\!' \ i;:;; para todos os peÕes qui. circulassern tdnt() fora como dentro cla l,ror,Ínciit.
1ô [:nr iE3{]' Iios;rs proibiu 1 7 ACN, llut nos Aircs. 5,,cr,
t,rri r,/{' /i()sít-ç. IU31-1859. DGN, (Sala X, 43 -2,7).
a cnliss.i(r de 1,.:s5;1p611.. par:r as
c()nl isse, cltre os irabitantes rl.r c.u:r[..ur]ra ,lc IlLrerros ;:ror.Ínciirs clo inreritrr, irn})eclincro, 1E Como ext'lnPlo, tcnlos il cirrta clo C<lmissário de Polícia cle Luju ao chefe do Deprl1{pq16p1çy
]ru.lesscpr .o .t""t*n. f-.u ortaa,
Aires
p'o'incias por n10ti'os p()iíti( ()s ()u .rtr,l 1rr1 busca rrc emf)rL-go ceral da Policia, escrita ern i2 de fevereiro de 1g33, qrre c{iz: "[...i e que orrnprin.lo,se corrr
(;\GN, 13.e.as Aires, porÍcia. eratidão em toda a I)rolíncia, se conseg3riria a apreensão dc- tnuitos malfeitores Llue se,1
Pttrtt's tit' cantltaúo f)GN, sara x, 33- I 2)
C.m isso, p;i,.:; ,,",""r'nlr1r.i"u,.r' ,? ..",,"- nenhum proveito à srxiedade cxistem na campanha e ainda mais, se aumentarão os LrraÇos
rlrntt'de trarrarhadrrres neces:,ários à rearizaçãr: do ser'jço
Índios \'1'ljs tarcle, atrar'és cle orttro rlecr eto, conti,.otr
rnilitarju.to à com os de que tanto càrece a Pror'íncia" (ACN, lluenos Aires- Corlrrrrjcrulo do C(\lntlLlnÍtlt tle polítiç ti;
'onteir.
conr a r>Lrrigatoried;rcle do passaporte Merlos. Actn dcl jl/10/18iÁ Po/icr,r. DCN. Sala X, 33-2-5).
t

1"96 AS RAÍZES HISTORICAS DO MERCO'SL]L A RECIAO PLATINA COLONIAL 197

prestativa corn que foi recebido ern todas as habitações, si-ltt assirtr oo rcspaldo daquela; e o peao, se crê injustamente classifit'ado, pode
rnaneira gentil e
ficorrL:r ntt lLtiz dc .Paz, cxigindo arc defesn e o ressarcitnento do prejuízo que o
clesde as mais ricas até as mais pobres.
fato lltc t:attsorl.".24 'Por firn, marlteve e aprofundou as restrições ao
Constatando, Pois, esse ambiente rural, oncie os crimes que- Pre-
dominavam eram os que se referiam à desobediência a uma legislação consumo de bebidas, à prática de jogos de azar, à atuação das pulperias
volantes e aumentou o controle e a punição sobre o abigeato. Corn isso,
relativa à coerção e aodisciplinamento da mão-de-obra, podemos.co4-
siderar estas maniÍestações como urna forma de resistência às transfor- continuou a atingir o homem rural nas condiçÕes básicas de suprir a sua
mações que se op..urrárr.. na vida econômica e social da Província e'à subsistência fora das relaçoes de trabalho e a afetar a sua própria vida
dominaçào qrre sê tentava consagrar. Resurnindo, não podem ser vistas cultural, produzida e reproduzida naquele pampa cle escassa populaçãcr
e abr,rndantes rebanhos de gado-
como evidências de desajustes ou inadaptação social'
O Código Rural representou, em certa medida, a síntese das
Nas entrelinhas do Código Rural relações capital-trabaUlo que se desenvolverarrl na campanha platina
Em 6 de novembro de 1865, o Senado e a Cârnara de Repre- até aquela data. Para sua elaboração, vários proprietários rurais buenai-
renses foram consultados a fim de que emitisselTl suas opiniões sobre
Sentantes da Província de Buenos Aires sancionaram o Código Rural
que, no seu artigo 1", foi definido como sendo "1...1-o conjunto de disposi' alguns dos problemas mais prementes da realidade rural, tendo daí
Observado ern seu resuitaclo o documento Antecedentes e Fundamentos do Proieto cle
fões referentes à{pessoas ntrais e à propriedade nrral".le
conjunto, o código Rural compilou e deu or5;anicidade às leis já exis- Código Rural. Sua leitura e análise servem para o estudo das formas de
tentes na Província desde a década de 1820. resistência, bem como para evidenciar a sua própria ocorrência, na
Ao definir uma formação social regulada pelas relaçÕes livres e caÍrparü1a platina, durante os anos que o antecederam.
assalariadas20 e pela propriedade privada de bens e meios de produ- Consultados sobre questões como o uso de arrnas brancas, a
as leis vagância, o abigeato, o decreto de7823, que previa o contrato por escrito
ção21, estc' clocumentà rãproduziu, com algumas adaptações,
r.xistr-rntcs antcriormente. [teforçou as concliçoes de dominação das para a acimissão de peões e a proibição da antecipação de salários e,
c.lasscs irrrprietárias frente aos despossr-ríclos, a cocrção que eraexercida aürda, scbre as pulperias volantes, local onde ocorriam o maior número
srihrt' trslas a Íim dc que vendessem sua força cle-' trabalho cler forma de deiitos, os estancieiros deram sugestõcs que, pelos seus conteírdos,
materiais e permitiram perceber que os problemas por eles enfrentados, há várias
[)crntárrt(]ntc e disciplinada, bem como os conclici<lnamentos
cuiturais clue- a eleseram rrtpostos com a finalidade de alcançar melhor c1écadas, permaneciam os mesmos, apcnas agravados.
produtividade no emprego da sua força de trabaihc». Assim, temos afirmações como:
Sen<1o assim, o ÔOalgo Rural estabeleceu uma relação direta entre "É escondalosa afalta de rtyteito à propríedade ,ln ,rrorrn."?5
o vago e o mpl-mtretenido, como se este fosse conseqúência daquele, ao
defiliir q.,c,1'[...]será declnrado oago todo aquelc que, carecaldo de donúcílio "É notório que o uso das annas brancas é orígem de lamantáucís
fixo e de tfi'cios conhecidos dc,subsistôncía, prcitulitlue a ntoral ,pctr sua má desgraças e qlte stttt totttl extirtção eoítaría ntLtitos crírncs."26
conrlrLta e uícios habitttnis".2iâo Iegisiar sobre os clireitos e deveres dos Tenho obserztado que cxisf ert nos terrenos de estartcicit't'ts nni-
proprietários e peões assâlariados, privilegiou os prilneir:os, pois, ao tns pottoações de pessons qLtc rtão têrn unt só aninul L)acunt ou
mesrno tempo eITI que dizia, no artigo 235, que "[-..1 non o patrao pode lannr, otr se algo tênt é tão pouco qlte nào corLse?uen'L nün
dtrrante o prazo de contrato despedir o peão, nent o 7tefip podc abandonar íio tÊstlto t11t1fiter n fatttílin cotn carne sonw-Lte. A ntt,tt jttízo, tt-lns
elr outro, resguardou
pntrãct e nutito menos dltrat'Lte a colheita ou tosquia"73, d,t,tttt :;cr re tttouidtts no-< 1tp1,6qjp5 lúrquc-as cottsidt:ro lrcitr-
os clireitrrs iio patrão, ao afirmar que, "[ ..] drrrotttL: o fctttT.ttt tit: contratct,
illr liri: itrrS itiÍ.,1.r's.;f.i 1,, 1,ttt.. r,trt ..:,.t.,t1 [...1."
ct patrot: dcspetlir o pcão desobcLlicnte ,faltttst't rt111ti1;i;15,',, rit''ttcndrt t:xpres-
ltode

19 ACIN, Bucnos Aires. Ccidrro Rrrral Llc la Protíttcirt dc Bttcttrt; t\ir'::' I'edro Ison 1 Cia, Ed., 1E92
:\rl. i p :, f1 Iii,:rr, Ari. 237, p. 33.
2O lJenr not,r 88, 222.p.37. 2: .\-GN, I-lLreno:: Air cs. ulittcccLltnlc v I:'utt,ldntt.tilo:. tltl Pt oyrtli: rlc CodigLt Rur,t-1. Iiirltr,:ntrr rü, llrir'rrrs
21 lilcnr, Ar t 3, p.^rtl. ,.iirrs, l&r.1. p 150.
22 I,.1errr, 28q, p. 40. 26 lJcrr, p. 151.
^ri
23 lclcrrr, r\rl.113.5, .t; I,.i{rnr, t). l5i-l
t,.33
L98 /\s RÂÍZES L{tsfLllucAs DO N4ERCosut. \ l{ll(;lA(-) I,t.AI'lNA cL)L( )NlAi '199

A contissao proporá (as nrcdidas) t1ue act'edite mais justas para ttt'."LIm lrctnent c()tlt poltclls flccessídades e aspírtl\:Ljcs.sr' t)dsfe conr Ltns poLLcoi;
eoitar as deserções quefazemospeõespor um, dois ou nwis difrs, dias de trabalho, pois, cL)ttt sua troPa, cLlsn e cofilida rtoo llrc Jaltarn onde qucr
do traballn que lhes está encomendado, proporcionando com que se clTe?ue".35
ísso considerá.^eis preiuízos ao patrno.'" Este, como outros depoirnentos, nos mostram que as transforma-
ções que ocorriar-n na prociução Pecuária, não foram acornpranl-i;rdas, na
Mesmo crtrcccndo o país dc braços (e quantos oenlant serão
mesrna meditla, per Lura rnudança na forma de vida <lo htltrrerlr rural
poucos por niuitos anos), perdoar o peão do pagamento ào que
e, principalmente, na maneira colrlo ele encarava o trabalho. Ao escre-
recebeu por conta do trabalho^c abrir cantTo a quc estcs não
verem:
,rr,rp rn r,,, s t'tt s (' om I) rot t, i ssos.29
I.. J rt.,,.sc,s peões do camPo,
. é be tt snbítlo, as PoLtcas tt ecessil ades
Deoerá cottsiderar-se oago todo o peao que apareça em um
partido sem licença de seu patrao, a nlenos que este justifique '1":::,ii:::;:,:,;:,:i:,12'::":ir:;ffi,:::,';:::T,:::,i:,'::'{,,;:
ter como oiaer de trabalho próprio e ainLla o seu passaPorte que
axÍrnuiotlo: recclte trinta ptsos diários de salário, e urr dL'tis
o luiz não rleuerá expedir sern a licença do patrão.3u
trl('sr's 17líL' sc ocuP(t, rutttirt o bnstantc Para Passttr o resta do
[...] selhes abonasse uru tanto por cadauago que apreendessem: on) t
íolqa:o ' ttt

este estímulo os empenharia no cumprimento de sua missão'


Os estancieiros ,lavam mostras de que o Peão resistia em aceitar
Perseguidos, assinr, em todos os Partidos, não encontraiam
o papel que lhe cabia na no\ra sociedade em formação, preferindo
abrigá e se oeriam necessitados de contrair-se ao trabalho-3l mãnter, o máximo possível, o modo de vida do sistema de produçáo
Se o roubo ou o abigeato é considerado como praga crônica de anterior.
nossa riquezn pastoil, não tem comparação com o das pulperias Apesar de os pecuaristas comumente se refer-irem aos aitos saLti-
oolantes. O roubo de abigeato poderá prejudicar enr utna, duas rios pagos aos peÕes, considerancio-os inclusive como fator expllcativtr
ou mais cabeças de gado a um, dois ou mais aizinhos; porém, os parao desprezo ao trabalho Permanente, vários são os esttrdiosos que
pulpeir^os nnrbtrlnntes prcjudicam a todos os fazcndeiros em iêm destacado as condições de vida sem conforto e de grande poirreza
-"'
garal em que \riviarr-I os dersl)ossuíclos do camPo. Citamos como exeniplo
Ricaido Roclriguez M,-rlas Lllre, em seu livro lTistoria social del gaucho,
Estas afirmações permitiram visualizar a PermanêIrcia de urn reproduziu testet-nr-u-rhos contemporâneos a<l período, como o de IVIari-
modo de viver produzido a partir de condições concretas que o meio qúita Sanchez, q.'.e escreveu: "[...] a gaúe do cnntpo aiuin tta trmior misâ'ia;
permitia e que o gaúcho resistia em abandonar. Neste sentido, é signi- is saláríos natt lhis pcrnitiant aestír-se 1...1 não ltá urta classc nmis in ju'iadu,
fica[iva a afirmação do pecuarista Matias Mejia que, -ao analisar as o nleuoer, que o gaúchtt " (ID., ibid., p. 128). Ou o editorial do Boletim de
causas da " desnrcr alização' de noss os hontens da campanha"33, descreveu a
l

ia Indústria, que publicou:


situação ali eüstente e que dava condiçÕes Para que a resistência Per-
m.rnecesse viva- Ao identificar que o sistema de produção vigente não Portirn r7rc triste e descortsolante é n imagan qut ttprasentanr
acabara com uln dos maiores Problemas que afetavam a pecuária, ou e rtt ,gtrnl rutssas lnbitnçõcs dtt t:nm1'tttrrha! Llnr clrnrco rlc lí5|utt
seja, o extravio do gado, reconheceu que a Presença deste animal sem ernpLtçntltL t sujn, ttnt poÇo settt Ltocnl qtrc é rnnis o altri?tt do>
clono perrnitia clue se reproduzissem as condiçoes materiais que impul- srtlrrrl; 1i11,' tt bcl-;erTourtt dn .fnrttília, ttttt atrttf)ottl('ttlo tlt' bnrrct t'
sionararn o gaúcho a tentar manter o sell moclo de vida inclependente e t.t Ltl I t t q tr r sc tliz rat c lto strs s çlj e tos ry r t,ier tnt p.,tist n [ .. ]. P o r
11

e-rrarrte.34 Ainda sobre isso, acrescentamos o escrito por outro pectraris-

-1.1 ,,\ fitnla c()utl) secrtti.r ir r.tilo n.rs rstânaias, rit;nde cit' s.rí.t prara oS t odr'tos iiiat t.tnlenrt .

2ii ldL:rn, Ir. 154. 5r,l1d() cstcs lrxais prt r:rri.rnr'ntü f.rote!_liriôs r rlelirtritaclo;, l.rrssibiliteva qrrd alSrlrrc tltrles sr:
2c; ldenr, p. I68. Irercicssemt-lanrlna.ll.I)|r'trlLraisS(),Llnr.atl.rslart:tastliiri.r.rl,,:,".titstlirI(', lllitlLll t)g,.l(:l',
30 I.1,'t., ,r. .tt, ' cxtrariltlo.AperclaclClinitir.r.iealgunsaninrais,ontrctanto, laz-i.rcouque, Infsttl()cllllnenoi
31 ldcm, p. 169-70. intensici;rde, r'lr's ainr:l.r '. ,r:rtt'.rs',cnl l'elI ciurpatrJra, sr:r i intlr' <it' 'rlirrienitr nr'rs \11)e (r5
'lllcon-
32 ldem, p. 170. tras5cnl.
33 AGN,BuenosAires.ÁntcceLlertt,.:rlFtntíLtmotto:tltlPrtV.r:rodcCo,?iso/lrLntl.ltrtprertt'ttdtBtertos 35 itlcnr, 1-' 197
.4.íres,1tÃ1, p. )77. 36 ltlen, p. 172

I
t
l
l

AS RAiZES HISTORICAS DO MEI{COsUL:


A REGIÃO PLATINA COLONIAL 201
2OO
operacionalizar as novas relações que se Processavam no sistema pro-
quetTltdamclescnlçoseqlnsesettrollpasoshabitantesdeum
dutivo. A captação da mão-de-obra pela força, a disciplina do trabalho
país oflde as manadas são imensas? Por que andant desc.alços
dentro da estância, o controle estrito das atividades do peão em aspectos
sobre esqueletos de bestas mortas onde o junco se cria em
que não eram os específicos do trabalho, o valor dos salários e a
abtLn'clân.cia,ondeagramnoemcomfecundidadeeondeto;do.o
formação de forças militares e paramilitares conÍiguraram um conjunto
necessáio para a t''iía cômocla o produz a natureza sem cultfuio?'
sel! de elementos que nos permite concluir que os interesses de estancieiros
De onde oem este enxame de posseiros que não contam Para
e de peões deviam inevitavelmente se chocar.
alimentomaísdoqueLoTspedaçosdecarnequaseapodreçida;
Os gaúchos resistiram às mudanças que se operavam na realidade
pendente da clnça Ete se llrcs está caittdo? QD'' ibid'' p' 40'
'
econôrnica e social da campanha porque não queriam perder aquilo que,
Com a exPansão da pecuária e a gestação {9 uma nowa formação para eles, era sinônimo de liberdade: cavalgar livremente pelos campos,
social, a pobrezã no rneio n-,ral pouco sê alterou.3T Isso
tudo nos indica usar o anirnal para sua subsistência irnediata, trabalhar quando e onde
oue as modificações econômicas e sociais na campanha platina trouxe- lhes aprouvesse, etc. Para eles, os benefícios que passaram a ter com o
üu.,àfi.i"r aos trabalhadores rurais. Em troca de um salário
;';;";.;; trabalho nas estâncias, como moradia, alirnentação, salário, não resul-
que]hespermitiaacrescentarPoucoasuavidamaterial,sejaporqueele taram em alterações na qualidade de suas vidas caPazes de superar a-s
ia., u". àoro gr..,de poder áe compta, ou porque eram Pequenos o vantagens que acreditavarn ter no modo de vida anterior.
númerr>eavariedadedeprodutosquecirculavamnacamparüa,eles Os registros das ocorrências policiais e judiciais evidenciam, por-
alirnen-
viam alteraclos os seus hábitos de vidã diários de vestir, habitar, tanto, que ocoúeram problemas de resistência às mudanças, por parte
tar, divertir, etc. da população despossuída, no momento exato em que elas se processa-
Enfirrr,temosqueconsi<lerarqrrearesistênciaSefaziaPresentena vam. O Código Rural e seus antecedentes, documentos que são cla
semPre
campanha porque, aà contrario de outras localidades, ali o gado década de 1860, dizem-nos que não só os problemas vinham de longa
fora a fonria básica de subsistência do homem. Ao trabalhar como data, mas que houve urna perrnanência de comportamentos frente à
o peão continuou, aPat'cntemente' a.executar nova situação que se instalara na Província,
irsstrlariurdrl nas estâncias, jsto é, ele
;rs nlcsmas atividacles que havia desempenhado r-ro passaclo,
clcsenvolvelr, nurrl meió que sernpre conhecera, tarefas que faziam parte
tlo seu cotidiano. Enfretàto, a iransição Para a nova realidade social,
apesar de rnenos crrel porque se realizal'á no próprio meio do gaúcho'
tárna..a-se rnais difícil Ê q.iu, para as mesmas f,nçoes, a opção deveria
ser feita enh:e a autodeterminação e o sa]ário. Conro este, Por Sua
vezl
não permitia uma sensível elevação do nível de vida, a troca, PaIa
muit-os, parecia ser PoLtco sedutora'
Concluindo, wimos que conflito e violência estiveram presentes na
sociedade rural platina, nà final do período colonial e Lrícios do
inde-
pendente. Ao côntrário de Dongui, que acredita ter esse período se
'apresentado "cheio tle hannonia" ç1OeO, p.41), devido à crescente hege-
moniu cla classe proprietária , "1...) que nrÍo se afintn, entre.tanto - saltto nos
ntornantos inicittii - n'a ltttn contrLt outros st:tores tln clnsse ulta de mnis
antigo
(1969,p. 40), a atuação de indivÍduos classificados como "aítgos
'eltrestígio"
nnllcntre tcli,Jo.s" rral carnpanha exiqiu qllcr os pccuaristas Se cercassem
de um aparato.luclici.rl e poiicial repressivo e coer< itivo. Este sen'iu para

37 As .lescriçÕcs cie f i"ljarltcs, conlo iVlac Cann e l-ôthdn' tleixanl l't'rceber fanrílias humildes'
em ranch6s cle çralha c com condiçt1es dr: r'icla s{'tll.rlhirrtcs às referidas na página
'i'en<lo () nresnro se po.lr: dizer ern relação ao estaLlo clt'Petlriria c fonlt'ctn qrte viviam os
ante.rior.
hirmens clrrc seryiarl nil tÍt)P.l ('Llllcr Iirt)\oc.l\ a IllLIltis i-1g51'1r'irt's'

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